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Em “A Invenção da Celebridade”, Antoine Lilti revela que o fenômeno gerou uma linhagem de
heróis midiáticos destruídos em público
Reféns do sucesso
ESCÂNDALO Maria Antonieta em tela de Élisabeth Vigée Lebrun, exposta na Academia em 1783:
o vestido de musselina virou moda e chocou a nobreza por mostrar a rainha na intimidade
14/09/18 - 09h30
A frase soa plausível na boca de uma estrela pop atual como Ariana Grande. Mas é atribuída ao
poeta Lord Byron, que a teria dito num resmungo. No início do século XIX, Com seus poemas
satânicos, Byron protagonizou a primeira onda de erotismo feminino. Rebelde, belo e radical,
tornou-se não só o ídolo de uma religião pagã, o romantismo, mas o amante secreto de cada
uma das leitoras que se apaixonaram por sua imagem, fixada nas gravuras baratas. Como ele
temia, o byronismo estava ridicularizado em 1840.
Não é de hoje que se criam figuras públicas com a promoção de seus nomes nos meios de
comunicação para cedo ou tarde ser esquecidas e linchadas. É o que demonstra o historiador
francês Antoine Lilti no livro “A Invenção da Celebridade (1750-1850)”, da editora Record. Lilti
estará no Rio de Janeiro em São Paulo em 24 e 25/9 para divulgar a obra, resultado de dez anos
de pesquisa.
Lilti explica os mecanismos da celebridade e como eles alteraram a forma de praticar e divulgar
política, artes, filosofia, literatura, esportes e até crimes. A cultura das celebridades não é uma
característica da sociedade hipermidiática, mas remonta ao século XVIII, no despontar do
iluminismo, da opinião pública e das primeiras técnicas de comunicação à distância, como
jornais, revistas, prensas de gravura e ateliês de moda. “A expansão da celebridade é ligada ao
desenvolvimento da publicidade e uma nova concepção do eu”, afirma Lilti. “Essas duas
revoluções constituem as duas faces da modernidade.”
Folheto pornô
A partir da nova esfera pública, a celebridade suplantou os dois outros gêneros clássicos de
notoriedade: a glória e a reputação. A primeira se deve às façanhas póstumas. A segunda
depende de um grupo e da socialização de opiniões. A celebridade desperta a curiosidade do
grande público e estabelece com ele um pacto de “intimidade à distância”.
O teatro foi o primeiro local público a encenar o espetáculo midiático da celebridade. Cantoras e
castratos rendiam colunas de fofocas e folhetins. Mesmo as atrizes trágicas padeciam. A inglesa
Sarah Siddons e a francesa Rachel eram surpreendidas na intimidade por hordas de
admiradores.
No auge da fama, renegou a fábrica de opinião que ajudou a elaborar. Não adiantou:
admiradores o perseguiam. Rousseau foi o primeiro escritor a ficar célebre por não querer ser
célebre. Morreu crente de que era vítima de um complô, como muitos que o sucederiam.
A celebridade encerra um paradoxo: é o sonho coletivo de ascensão social, mas alvo de críticas e
ironias, por ser considerada superficial e efêmera. “A celebridade nunca foi legítima”, diz Lilti.
“Mas nunca deixou de ser cobiçada.”