Vistos, relatados e discutidos estes autos do Apelação nº
0004622-59.2014.8.26.0123, da Comarca de Capão Bonito, em que é apelante FLORIZA SALES DA COSTA, são apelados PREFEITURA MUNICIPAL DE RIBEIRÃO GRANDE e COMPANHIA DE SANEAMENTO BÁSICO DO ESTADO DE SÃO PAULO SABESP.
ACORDAM, em 1ª Câmara Reservada ao Meio Ambiente do Tribunal
de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "Deram provimento ao recurso. V. U.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.
O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores
MOREIRA VIEGAS (Presidente) e MARCELO BERTHE.
São Paulo, 18 de junho de 2015.
RUY ALBERTO LEME CAVALHEIRO
RELATOR Assinatura Eletrônica Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo 1ª Câmara Reservada ao Meio Ambiente __________________ _________________________ __________________
VOTO Nº: 26158
APELAÇÃO Nº: 0004622-59.2014.8.26.0123 COMARCA: Capão Bonito APTE. : Floriza Sales da Costa APDOS : Prefeitura Municipal de Ribeirão Grande e Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo - SABESP Magistrado de 1º grau: Dr. Felipe Abraham de Camargo Jubram
AÇÃO POPULAR. Indeferimento da inicial. Na exordial
existem indícios de ato lesivo ao meio ambiente. As obras relatadas atingem área de preservação permanente. Não se trata de interesse exclusivamente individual, mas coletivo, posto que o direito defendido extrapola o âmbito pessoal da autora. DADO PROVIMENTO ao apelo.
Trata-se de apelação contra respeitável
sentença (fls. 124/125) que indeferiu a petição inicial, com fulcro no artigo 267, inciso I, c.c. artigo 295, inciso III, ambos do Código de Processo Civil, por ausência de interesse de agir, diante da inadequação do provimento escolhido.
Apela a autora (fls. 129/139) afirmando que
a SABESP ajuizou ação de instituição de servidão administrativa, com base em Decreto Municipal que autoriza tal instituição. Entretanto, a faixa de terra englobada para a servidão de passagem abarca imóvel de propriedade da apelante, bem como área de mata ciliar e curso d'água.
Aduz que a SABESP não comprovou ter
realizado estudo, análises ou avaliações ambientais acerca do impacto ou do risco ambiental referente à obra a ser desenvolvida na área, tampouco há provas da existência de autorização ou licença ambiental dos órgãos competentes ou da necessária publicidade dos atos por meio de audiências públicas ou consulta popular.
Sustenta que a SABESP, emitida na posse,
empreendeu atos desproporcionais, tomando medidas que
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levaram à supressão de vegetação ciliar, de árvores, ao
acúmulo de entulhos e lixo, ao assoreamento do leito do rio e a alteração das características naturais da borda do curso d'água.
Alega que o direito ao meio ambiente
saudável é de interesse difuso e que os pleitos constantes na inicial não visam beneficiar a recorrente com exclusividade, mas buscam a tomada de medidas cabíveis para a reparação do dano causado e a paralisação de atos danosos que atingirão toda a coletividade.
Afirma também que o fato de existir mata em
propriedade privada não torna o interesse privado, posto que a preservação de mata ciliar, ou bioma, é imposta por Lei, por meio do Código Florestal e configura interesse difuso.
As contrarrazões de apelo foram devidamente
apresentadas (fls. 144/147). O Ministério Público em segunda instância opinou pelo provimento (fls. 155/163).
É O RELATÓRIO.
O indeferimento da inicial está centrado na
impossibilidade da tutela pleiteada por meio da ação popular, por haver interesse puramente particular na demanda.
Do artigo 5º, inciso LXXIII da Constituição
Federal depreende-se:
LXXIII qualquer cidadão é parte legítima
para propor ação popular que vise a anular ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural, ficando o autor, salvo comprovada má-fé, isento de custas judiciais e do ônus da sucumbência.
Primeiramente, anoto que o direito ao
ingresso de ação popular foi alçado à categoria de direito fundamental. Em segundo, o contexto social atual indica que
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o cidadão está cada vez mais sedento pela participação na
gestão da cidade, do patrimônio público, na defesa dos interesses sociais coletivos, na preservação do meio ambiente, enfim, o cidadão hoje é mais ativo e anseia pela ação das autoridades administrativas em prol da sociedade.
E, nesses moldes, totalmente pertinente a
ação popular proposta. Na inicial existem indícios suficientes de ato lesivo ao meio ambiente, na medida em que os atos praticados pela SABESP recaem em área de preservação permanente, havendo notícias inclusive da supressão de mata ciliar e de árvores e assoreamento de rio.
Não se trata de mero interesse individual,
mas de interesse coletivo, notadamente pela natureza da intervenção. Ainda que haja servidão em propriedade particular, é de se ressaltar que o impacto ambiental resultante da obra não deve ser ignorado porque a área objeto da servidão é banhada por um curso d'água.
Ademais, adoto a sábia ponderação da
Promotora de Justiça designada, conforme parecer acostado aos autos:
“In casu sub examine, é fato que a autora
está diretamente interessada no deslinde da causa, pois sua área foi alvo da servidão administrativa que ora se combate. No entanto, inegável admitir que a ação popular proposta extrapola o âmbito pessoal da autora, já que o ato impugnado viola o meio ambiente, bem de uso comum do povo” (fls. 157).
Portanto, não se pode afirmar que há
exclusivo interesse particular, posto que os fatos narrados demonstram o interesse de toda a sociedade. Assim, a inépcia da inicial deve ser afastada, tendo seguimento a ação.
Ante o exposto, DOU PROVIMENTO ao recurso.
RUY ALBERTO LEME CAVALHEIRO
Relator
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