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ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE HISTÓRIA

Núcleo Rio Grande do Norte

O Ofício do Historiador

ANAIS
Raimundo Nonato Araújo da Rocha
organizador

Natal, 25 a 29 de maio de 2004


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CONFERÊNCIAS E MESAS-REDONDAS

BALANÇO DA HISTORIOGRAFIA NORTE-RIO-GRANDENSE

Professora Denise Mattos Monteiro

A mesa-redonda de hoje tem por objetivo fazer um balanço da historiografia norte-rio-


grandense. Em outras palavras, ela implica numa discussão dessa historiografia, sua evolução,
seus problemas e perspectivas.
Eu gostaria de iniciar com algumas questões que me parecem indispensáveis.
A primeira delas é: porque fazer balanços historiográficos? Qual sua importância?
Um esclarecimento se faz necessário em relação ao objeto da nossa discussão: quando
pensamos em “balanço da historiografia norte-rio-grandense” estamos nos referindo ao que
tem sido produzido pelos historiadores em nosso Estado, mas principalmente sobre o nosso
Estado.
Balanços historiográficos, seja qual for o seu objeto, significam acima de tudo
avaliações críticas da produção existente, com um propósito específico: buscar a renovação
dos estudos e pesquisa na área de História, a partir de diagnósticos que nos permitam pensar
novos temas, problemas e metodologias a serem desenvolvidas. Isto significa dizer que
partimos sempre do “velho” para engendrar o “novo”.
E é nesse engendramento que nos deparamos com uma segunda questão: a relação
indissociável entre historiografia e historicidade. Em que sentido? A avaliação crítica da
produção existente implica na consciência de que todo o conhecimento histórico produzido
tem sua própria historicidade, isto é, ele não pode ser desvinculado do recorte de tempo no
qual foi produzido. Os valores sociais, as visões de mundo, os conflitos ideológicos, os
embates políticos, presentes na sociedade na qual vive e produz o historiador, estão
subjacentes a sua produção. As perguntas que o historiador se coloca, e que se
consubstanciam em temas e problemáticas de pesquisa, nesse sentido, são filhas de seu
tempo. Disso decorre que todo o conhecimento histórico produzido é, inelutavelmente,
incorporado para ser ultrapassado.
Análises historiográficas implicam assim, e necessariamente, no exercício da crítica. E
aqui temos uma terceira questão importante: como a crítica nem sempre é entendida como um
componente essencial e inseparável da produção de conhecimento, os balanços
historiográficos são muitas vezes delicados, para não dizermos espinhosos, especialmente
quando seu objeto remete à produção histórica local, do Estado onde o historiador vive e
trabalha, levando-o a analisar a produção de seus “pares”.
Partindo dessas questões iniciais, eu diria que na evolução da historiografia norte-rio-
grandense podem ser identificadas três fases distintas:
Sobre a primeira delas, não vou me estender muito, visto que ela foi objeto de outra
exposição nessa mesa redonda. Entretanto, alguns comentários me parecem necessários,
porque questões referentes a essa primeira fase estão diretamente ligadas aos problemas e
perspectivas dessa historiografia hoje.
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I ENCONTRO REGIONAL DA ANPUH/RN – ANAIS

No meu ponto de vista, a primeira fase correspondeu aos primeiros 70 anos do século
XX e foi caracterizada, especialmente, pelo peso mítico de Câmara Cascudo. Foi constituída
pela produção de historiadores ligados ao Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do
Norte, pertencentes a uma geração anterior à formação universitária em História. O que me
parece importante frisar é que sua matriz teórica, no sentido de uma certa concepção de
História e de escrita da História, dos valores a serem defendidos e cultuados, encontra-se no
século XIX, quando nasceu a escrita da História no Brasil. Esse nascimento esteve
intimamente articulado ao processo de organização do Estado Nacional, processo esse no qual
os historiadores, reunidos em torno do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, fundado no
Rio de Janeiro, em 1838, desempenharam um importante papel na construção de uma
identidade nacional, de um passado em comum para o “povo” dessa nação que se organizava,
por obra e em função de suas elites.
Em decorrência, essa matriz teórica, e por conseguinte a primeira fase da historiografia
norte-rio-grandense, apresentou dentre suas características principais: uma visão de sociedade
esvaziada de conflitos sociais; uma visão de política como atividade exclusiva das elites; a
recorrência, como tema dos estudos, de determinados fatos históricos enobrecedores, nos
quais celebravam-se certos personagens históricos que deles participaram; a predominância da
descrição sobre a interpretação, originando uma histórica crônica ou factual; e a ausência do
que nós chamamos hoje de rigor metodológico, especialmente no que diz respeito à ausência
de informações sobre a base documental desses estudos.
Essa fase da historiografia norte-rio-grandense eu denomino de “historiografia
clássica”, e em três sentidos, basicamente: em primeiro lugar, a ela correspondem as obras
seminais; em segundo, sua matriz de pensamento é profundamente conservadora e, em
terceiro, nela pode ser identificado um esforço de construção de uma certa identidade norte-
rio-grandense. Sua maior expressão são as três “História do Rio Grande do Norte”, escritas
sucessivamente por Tavares de Lyra (1921), Rocha Pombo (1922) e Câmara Cascudo (1955).
Essa historiografia clássica tem ainda uma grande presença entre nós, persistindo, sobretudo,
no conteúdo de livros didáticos de História do Rio Grande do Norte. Sem dúvida, o peso da
figura de Câmara Cascudo tem um papel fundamental na perpetuação do pensamento
conservador nessa literatura produzida.
A segunda fase da trajetória da historiografia norte-rio-grandense iniciou-se na virada
dos anos 70 para os anos 80 e foi marcada pelo surgimento de uma produção acadêmica. Ela
não pode ser dissociada da própria história da Universidade Federal do Rio Grande do Norte,
uma vez que, nesse período, houve uma saída maciça de professores de seus quadros para a
pós-graduação, aí incluídos alguns poucos professores do Departamento de História, dentre o
então numeroso quadro docente desse Departamento. Em decorrência, houve um avanço
intelectual, ou pelo menos a promessa de um avanço, com a possibilidade de renovação do
conhecimento histórico, através do desenvolvimento de novos temas e problemáticas e da
preocupação com o rigor teórico-metodológico nas pesquisas. 14
Se, por um lado, houve, inegavelmente, um avanço na historiografia norte-rio-
grandense, por outro, dois problemas se apresentaram.

14
São exemplos dessa fase as seguintes dissertações de mestrado: 1930-1934. A Revolução de 30 no Rio
Grande do Norte, de Marlene Mariz; Um outro Nordeste: o algodão na economia do Rio Grande do Norte
(1880-1915), de Denise Monteiro Takeya (ambas publicadas em livro, a primeira em 1982, pelo Centro Gráfico
do Senado Federal, e, a segunda em 1985, pelo Escritório Técnico de Estudos Econômicos do Nordeste, do
Banco do Nordeste do Brasil, Coleção Documentos do Nordeste); A política econômica salineira e o Rio
Grande do Norte, de Márcia Maria Lemos de Souza, e A implantação do protestantismo no Rio Grande do
Norte, de Wicliffe de Andrade Costa.
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CONFERÊNCIAS E MESAS-REDONDAS

O primeiro deles diz respeito a uma solução de continuidade: esses novos


pesquisadores, no geral, não continuaram desenvolvendo suas pesquisas e, dentre os novos e
raros mestres, apenas um se doutorou, consolidando a partir daí uma atividade permanente de
pesquisa, especialmente na área de História Econômica e Social do Nordeste. 15
Dessa forma, abortou-se o que poderia ter sido um trabalho coletivo de pesquisa, no
sentido de uma renovação da historiografia norte-rio-grandense. Nesse sentido, a década de
80, que se seguiu, pode ser considerada uma década perdida.
O vazio que se instalou – e aí reside o segundo problema – foi ocupado pela produção
oriunda de outras áreas que não a História. Assim, as obras que trouxeram algum tipo de
contribuição para um maior conhecimento da História do Rio Grande do Norte foram
produzidas sobretudo na área de Sociologia e Ciência Política, mas também Economia e
Geografia. 16
Em decorrência, houve uma certa expansão desse conhecimento, centrado,
inevitavelmente, na História Político-Social e num recorte temporal contemporâneo (o
período republicano), embora apresentando escassa e pouco rigorosa pesquisa de fontes
históricas, o que é compreensível, considerando-se a não formação específica na área de
História, por parte de seus autores.
De qualquer forma, a importância desses trabalhos, ao preencherem o vazio deixado
por historiadores de formação, originou a nossa dívida para com eles.
Mas nós temos dívidas também com dois estudos pioneiros. O primeiro deles foi a
dissertação de mestrado em História de Janice Theodoro da Silva, sobre as tensões políticas e
ideológicas no processo de implantação da República no Rio Grande do Norte, defendida na
Universidade de São Paulo, em 1975, sob a orientação de José Sebastião Witter, e publicada
sob o título Raízes da Ideologia do Planejamento: Nordeste (1889-1930). 17 A autora
pesquisou, essencialmente, os jornais do período e os Anais da Câmara Federal e do Senado.
O segundo trabalho foi o de Maria Regina Mendonça Furtado Mattos, uma dissertação de
Mestrado em História, defendida na Universidade Federal Fluminense, em 1985, sob o título
Vila do Príncipe – 1850/1890. Sertão do Seridó – um estudo de caso da pobreza. A
dissertação, orientada por Maria Yedda Linhares, enfoca a transição do trabalho escravo para
o trabalho livre no atual município de Caicó, com uma rica pesquisa empírica, especialmente
de documentação cartorial.
A terceira fase da historiografia norte-rio-grandense iniciou-se nos anos 90, alicerçada
em dois movimentos. Por um lado, a renovação do quadro docente do Departamento de
História da UFRN a partir de meados dessa década, através de concursos públicos baseados
no mérito, tornou a titulação e a produção científica cada vez mais importantes. Isso tem
significado uma valorização crescente da pesquisa e da produção de conhecimento. Alguns
dos novos professores realizaram trabalhos de pós-graduação, a nível de mestrado e
doutorado, tendo por objeto temas da História do Rio Grande do Norte. 18 O segundo

15
Refiro-me aqui a mim mesma. Minha tese de doutorado foi publicada sob o título: Europa, França e Ceará:
origens do capital estrangeiro no Brasil (São Paulo/Natal: Hucitec/Edufrn, 1995, Coleção Estudos Históricos,
dirigida por Fernando Novais).
16
São exemplos os trabalhos de István A’rbocz, José Antônio Spinelli, Itamar de Souza, Brasília Carlos Ferreira,
Maria do Livramento Clementino, Geraldo Margela Fernandes, Dalcy Cruz, José Lacerda Felipe e, mais tarde,
Homero Costa. É ainda desse período a dissertação de mestrado em Sociologia, na Unicamp, de Cícero Soares
Neto, sobre o coronelismo.
17
São Paulo: Editora Ciências Humanas, 1978.
18
São exemplos a pesquisa de Fátima Martins Lopes, sobre história indígena, de Almir de Carvalho Bueno,
sobre republicanismo, de Maria Emília Porto, sobre jesuítas, e de Flávia Pedreira, sobre festas.
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I ENCONTRO REGIONAL DA ANPUH/RN – ANAIS

movimento tem sido a passagem para a pós-graduação de ex-alunos do Curso de Graduação


em História da UFRN, o que tem garantido uma produção historiográfica nova, alicerçada nas
dissertações de mestrado que vão surgindo. Em alguns casos, esses novos mestres tornaram-se
professores da própria Universidade, renovando seu quadro docente. 19
Para concluir, eu diria que estamos agora diante de dois desafios. Um deles é recuperar
o vazio da década de 80, num esforço coletivo que nos permita ter uma visão mais sistematiza
da História do Rio Grande do Norte, sob nova perspectiva, evidentemente, que não aquela da
historiografia clássica. Refiro-me a uma visão sistematizada devido ao fato de que a nova
produção existente, por suas características, tem sido pontual e dispersa. O outro desafio é
encontrar os mecanismos que possam traduzir para o ensino fundamental e médio, ainda sob
influência daquela historiografia, especialmente a rede pública, o conhecimento produzido
pelas novas pesquisas, o que envolve problemas relativos não apenas à sistematização de
conhecimento, mas também à produção de material didático e ao ensino de História.
Esses desafios estão aí para serem enfrentados.

Professora Denise Mattos Monteiro

19
Registre-se, por exemplo, as dissertações de Mestrado, por mim orientadas, de Muirakytan K. de Macedo, A
penúltima versão do Seridó: espaço e história no regionalismo seridoense (1998), e de Henrique Alonso Pereira,
O homem da esperança: uma experiência populista no Rio Grande do Norte-1960-1966 (1996). Ambos são
atualmente professores de História, no Campus de Caicó.

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