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Ecossocialismo

Crítico ao capitalismo verde, que anseia tornar o capital menos agressivo ao meio
ambiente, o cientista social brasileiro radicado na França, Michael Löwy, enfatiza que é
preciso reorganizar o modo de produção e consumo, atendendo às necessidades reais da
população e à defesa do equilíbrio ecológico. Michael Löwy é cientista social e leciona na
Escola de Altos Estudos em Ciências Sociais, da Universidade de Paris.

O ecossocialismo é uma proposta estratégica que resulta da convergência entre a


reflexão ecológica e a reflexão socialista, a reflexão marxista. O ecossocialismo é uma
reflexão crítica à ecologia não socialista, à ecologia capitalista ou reformista, que
considera possível reformar o capitalismo, desenvolver um capitalismo mais verde, mais
respeitoso ao meio ambiente. Trata-se da crítica e da busca de superação dessa ecologia
reformista, limitada, que não aceita a perspectiva socialista, que não se relaciona com o
processo da luta de classes, que não coloca a questão da propriedade dos meios de
produção. Mas o ecossocialismo é também uma crítica ao socialismo não ecológico, por
exemplo, da União Soviética, onde a perspectiva socialista se perdeu rapidamente com o
processo de burocratização e o resultado foi um processo de industrialização
tremendamente destruidor do meio ambiente.

O projeto ecossocialista implica uma reorganização do conjunto do modo de produção e


de consumo, baseada em critérios exteriores ao mercado capitalista: as necessidades
reais da população e a defesa do equilíbrio ecológico. Isto significa uma economia de
transição ao socialismo, na qual a própria população – e não as leis do mercado ou uma
burocracia política autoritária – decide, num processo de planificação democrática, as
prioridades e os investimentos. Esta transição conduziria não só a um novo modo de
produção e a uma sociedade mais igualitária, mais solidária e mais democrática, mas
também a um modo de vida alternativo, uma nova civilização, ecossocialista, mais além
do reino do dinheiro, dos hábitos de consumo artificialmente induzidos pela publicidade, e
da produção ao infinito de mercadorias inúteis.

As experiências de corte social-democrata fracassaram porque não saíram dos limites de


uma gestão mais social do capitalismo e, nos últimos anos do neoliberalismo, as
experiências de tipo soviético ou stalinista fracassaram por ausência de democracia,
liberdade e auto-organização das classes oprimidas. As duas tinham em comum uma
visão produtivista de exploração da natureza, com dramáticas consequências ecológicas.
O ecossocialismo parte de uma visão crítica destes fracassos e propõe um projeto
democrático, libertário e ecológico.

A crise econômica tem consequências sociais dramáticas – desemprego, crise alimentar


etc. –, mas a crise ecológica coloca em perigo a sobrevivência da vida humana neste
planeta. O processo de mudança climática e aquecimento global, provocado pela lógica
expansiva e destruidora do capitalismo, podem resultar, nas próximas décadas, numa
catástrofe sem precedente na história da humanidade: desertificação das terras,
desaparecimento da água potável, inundação das cidades marítimas pela subida do nível
dos oceanos etc.
Uma das ideias fundamentais do ecossocialismo é a necessidade de uma ruptura com o
capitalismo que vai mais além de uma mudança das relações de produção, das relações
de propriedade. Trata-se de transformar a própria estrutura das forças produtivas, a
estrutura do aparelho produtivo. Há que aplicar ao aparelho produtivo a mesma lógica
que Marx aplicava ao aparelho de Estado a partir da experiência da Comuna de Paris,
quando ele diz o seguinte: os trabalhadores não podem apropriar-se do aparelho de
Estado burguês e usá-lo a serviço do proletariado; não é possível, porque o aparelho do
Estado burguês nunca vai estar a serviço dos trabalhadores.

Então, trata-se de destruir esse aparelho de Estado e de criar um outro tipo de poder.
Essa lógica tem que ser aplicada também ao aparelho produtivo: ele tem que ser, senão
destruído, ao menos radicalmente transformado. Ele não pode ser simplesmente
apropriado pelos trabalhadores, pelo proletariado e posto a trabalhar a seu serviço, mas
precisa ser estruturalmente transformado. É impossível separar a ideia de socialismo, de
uma nova sociedade, da ideia de novas fontes de energia, por exemplo.

As economias emergentes dos países do Sul, da Ásia, África e América Latina devem
se desenvolver, mas isto não significa copiar o modelo de desenvolvimento capitalista do
Ocidente e seu padrão de consumo insustentável. Trata-se de buscar outro modelo, um
desenvolvimento ecossocialista, baseado na agricultura orgânica dos camponeses e nas
cooperativas agrárias, nos transportes coletivos, nas energias alternativas e na satisfação
igualitária e democrática das necessidades sociais da grande maioria. O modelo ocidental
não so é absurdo e irracional, mas não é generalizável: se os chineses quisessem imitar o
American way of life, cinco planetas seriam necessários.

O capitalismo verde é uma contradição nos termos. A lógica intrinsecamente perversa


do sistema capitalista, baseada na concorrência impiedosa, nas exigências de
rentabilidade, na corrida pelo lucro rápido, é necessariamente destruidora do meio
ambiente e responsável pela catastrófica mudança do clima. As pretensas soluções
capitalistas como o etanol, o carro elétrico, a energia atômica, as bolsas de direitos de
emissão são totalmente ilusórias. Os acordos de Kyoto, a fórmula mais avançada até
agora de capitalismo verde, demonstrou-se incapaz de conter o processo de mudança
climática. As soluções que aceitam as regras do jogo capitalista, que se adaptam às
regras do mercado, que aceitam a lógica de expansão infinita do capital, não são
soluções, são incapazes de enfrentar a crise ambiental – uma crise que se transforma,
devido à mudança climática, numa crise de sobrevivência da espécie humana. Como
disse recentemente o secretário das Nações Unidas, Ban Ki Moon: “Estamos correndo
para o abismo com os pés colados no acelerador”.

Por um lado, a crise ecológica é um problema de toda a humanidade, pessoas de várias


classes sociais podem se mobilizar por esta causa. Por outro lado, as classes
dominantes são cegadas por seus interesses imediatos, pensam exclusivamente em
seus lucros, sua competitividade, suas partes de mercado e defendem, com unhas e
dentes, o sistema capitalista responsável pela crise. As classes subalternas, os
trabalhadores da cidade e do campo, os desempregados, o proletariado têm interesses
conflitivos com o capitalismo e podem ser ganhos para o combate ecossocialista. Não se
trata de um processo inevitável, mas de uma possibilidade histórica.
Cresce em todo o mundo a consciência ecológica, a preocupação com as ameaças
profundamente inquietantes que representa a mudança climática. Mas é no curso das
lutas ecossociais contra as multinacionais destruidoras do meio ambiente e contra as
políticas neoliberais que poderá surgir uma perspectiva ecossocialista. Não há nenhuma
garantia; é apenas uma possibilidade, mas dela depende o futuro da vida neste planeta.

Já não é mais possível oferecer uma análise social completa ou minimamente consequente
sem falar da relação do ser humano com o seu entorno, com a natureza e as outras
formas de vida. Isso se dá, por um lado, devido à percepção da finitude material do planeta,
que se faz cada vez mais óbvia. A exploração daquilo que muitos chamam “recursos
naturais” tem um limite – o limite de sua existência. Logo, o pensamento ‘econômico’ de
crescimento linear infinito não pode se ajustar em um mundo finito, e precisa ser revisto,
principalmente, no que diz respeito à sua interface com o mundo natural.

De outro lado, a ascensão do pensamento sistêmico – que percebe a Terra como um


organismo vivo onde todos somos partes conectadas de um mesmo todo, junto com outras
formas de vida – modifica cada vez mais nossa percepção de mundo. Além disso, a ideia
de ciclo torna-se inegável – em nosso planeta, tudo vem de algum lugar; não existe “jogar
fora” em um mundo integrado. Essa visão vem reorientando nossa maneira de estar no
mundo, e alimentando muitas experiências, reflexões e possibilidades.

Capitalismo e Meio Ambiente

Ar e rios poluídos, desmatamentos, estações do ano desreguladas, seca de um lado e


alagamento de outro. Esses são apenas alguns dos problemas ambientais enfrentados
por todos nós. Qual a sua origem? Todos os problemas ambientais estão relacionados à
forma como o capitalismo produz suas mercadorias. É um sistema econômico, por
essência, destruidor da natureza.

O trabalho é, por definição, uma forma de intercâmbio dos humanos com a natureza.
Tudo que é produzido é natureza transformada. A produção deveria funcionar para a
satisfação das necessidades humanas, pois essa relação com a natureza é fundamental
para a própria manutenção da vida, porém, no capitalismo, que busca o lucro em tudo que
produz, essa relação com a natureza sofre modificações profundas. Cada vez mais, a
produção deixa de atender às necessidades humanas para manter ou aumentar os lucros
dos empresários.

Como o lucro se tornou mais importante, os capitalistas começaram a criar necessidades


que justificam produzir tanta coisa desnecessária. Por exemplo: a produção de armas
(que precisam de guerras para ser consumidas); ou uma só pessoa ter 4 ou 5 carros para
se sentir importante; ou um modelo novo de celular ou de televisão a cada mês, dentre
outras coisas que não são essenciais para a existência humana, ou seja, produzem-se
coisas em excesso e sem controle. E como toda essa produção afeta a natureza, há o
desequilíbrio, e o pior: isso acontece ao mesmo tempo em que milhões e milhões de
pessoas passam fome no mundo.

Mesmo que o comportamento individual, em relação à natureza, possa ser bastante


problemático, este ainda não é a causa principal do seu desequilíbrio. Esse é um discurso
que serve para esconder a responsabilidade do sistema social ao qual estamos
submetidos. Todos os desastres ambientais estão ligados com o capitalismo, na causa ou
nas consequências. Mesmo quando se trata de fenômenos puramente naturais (como
furação, terremoto, etc.) podemos ver que os efeitos mais danosos ocorrem onde estão
as populações mais pobres. O desastre é natural, mas os efeitos não.

O desenvolvimento sustentável foi o modelo idealizado pelo poder hegemônico


para dominar a economia e territórios no mundo e servir de modelo apenas para países
pobres e em desenvolvimento, modelo que serviu de base para a construção da política
ambiental brasileira. Segundo seus idealizadores, é o desenvolvimento que procura
satisfazer as necessidades da geração atual, sem comprometer a capacidade das
gerações futuras de satisfazerem as suas próprias necessidades.

O ambientalismo, a economia verde é uma grande enganação, faz parte de um


grande golpe de poderosos, e o desenvolvimento sustentável é uma fantasia, que o
Banco Mundial provou durante esses últimos 20/30 anos que não promove
sustentabilidade ambiental, sustentabilidade econômica e sustentabilidade sociopolítica,
se aproveitou apenas de segmentos pobres para obstaculizar qualquer tentativa de
desenvolvimento na Amazônia e outras regiões ricas existentes em várias partes do
mundo.
Nos últimos anos, várias catástrofes vêm ocorrendo em nosso planeta causando mortes
de milhões de pessoas e a destruição de cidades e do meio-ambiente. A desertificação já
atinge mais de 100 países. Maremotos, chuvas fortes, furacões e secas existem há
séculos. No entanto, tornaram-se mais frequentes e intensos.
Esta foi a razão da Organização das Nações Unidas (ONU) instalar o Painel
Intergovernamental sobre Mudança do Clima (IPCC, sigla em inglês) para debater e
explicar as causas das profundas alterações climáticas que estão acontecendo no mundo.
O 4º. IPCC reuniu 600 cientistas de 40 países e terminou com a divulgação do documento
“Mudança do Clima 2007: a base da ciência”, com graves advertências sobre o futuro
de nosso planeta:

– O nível do mar subirá até 2100 entre 18 e 58 centímetros, provocando novas


inundações e ameaçando de destruição milhares de cidades costeiras, entre elas Nova
Iorque, Veneza, Xangai, Miami, Rio de Janeiro e Recife;

– a temperatura da atmosfera se elevará pelo menos mais 1,8º Celsius além do que já
subiu, e alcançará entre 4º e 6,4º até o fim deste século. Caso se confirme essa elevação
da temperatura, 3,2 bilhões de pessoas sofrerão com a falta de água.

– a camada de gelo sobre o Oceano Ártico pode desaparecer totalmente até o fim do
século; a geleira existente na Groenlândia também desaparecerá em alguns milênios; e,
desde 1960, a cobertura de neve no mundo já diminuiu 20%.

– o aquecimento hoje é o pior em 20 mil anos e cinco dos seis anos mais quentes
ocorreram nos últimos cinco anos, causando secas e agravando a fome no mundo: entre
200 e 600 milhões de pessoas ficarão sem alimentos nos próximos 70 anos.

Sobre a causa dessas mudanças no clima, o relatório afirma que “é muito provável (90%
de chances) que as atividades humanas estejam fazendo a atmosfera esquentar desde
meados do século 20”.
Logo após a divulgação do relatório, os grandes meios de comunicação da burguesia
estamparam manchetes culpando o ser humano pelo aquecimento global. Mas que
culpa têm, pela existência de furações e tsunamis, os 900 milhões de pessoas que vivem
com fome no mundo, ou os 40% da população urbana da África que vivem com menos de
US$ 1 dólar (pouco mais de dois reais) por dia? Que responsabilidade têm, por essas
alterações climáticas, os 350 mil indígenas brasileiros que tiveram suas terras roubadas e
sobreviveram após cinco séculos de “civilização”? Qual a culpa dos dois bilhões de
pessoas que, jogadas na sarjeta pela burguesia, sofre com a falta d’água e vivem abaixo
da linha de pobreza? E os países que foram bombardeados – como o Iraque, o
Afeganistão e a Líbia – têm a mesma responsabilidade que os governos dos EUA e da
Inglaterra, que lançaram milhares de bombas sobre aquelas nações? Que culpa tem para
o aquecimento global um país como Cuba, que não possui nenhuma arma nuclear e
raciona o pouco petróleo importado, quando sabemos que os EUA já realizaram quase 2
mil testes nucleares e possuem mais da metade de todas as armas nucleares existentes
no mundo?

Embora sejam os países imperialistas os maiores responsáveis pela poluição do


mundo e pelo consumo desenfreado de petróleo, carvão, gás e madeira, são as
populações da Ásia, da África e da América Latina que sofrem as piores consequências.
Na realidade, o efeito estufa e o aquecimento global são filhos do sistema capitalista. De
fato, a finalidade do capitalismo é alcançar o maior lucro possível à custa da exploração
do homem e da natureza. Não existe neste sistema nenhuma preocupação com o bem-
estar da população ou com o meio ambiente e a construção de um planeta melhor. Pelo
contrário, a natureza (incluindo nela o homem) é, para o burguês, apenas um meio para
ele acumular capital. Com certeza, o modo capitalista de produção é organizado para
explorar o homem e as riquezas naturais, visando ao enriquecimento da classe capitalista.
Para tanto, o capitalista realiza uma feroz exploração tanto do homem quanto do meio
ambiente, levando ambos ao esgotamento.

O transporte no capitalismo, por exemplo, deixa de ser um meio de as pessoas se


locomoverem para se transformar numa mercadoria que enriquece os acionistas das
indústrias de automóvel. Com efeito, apesar de todos os números que revelam a
gravidade do aquecimento global, os monopólios das indústrias automobilísticas não
param de aumentar a produção de carros e de receber polpudos subsídios dos governos
capitalistas. Preferem, assim, monopólios e governos, produzir milhões e milhões de
automóveis por ano – embora a sociedade não necessite de todos eles –, a investir em
transporte público, mesmo sabendo que esses milhões de carros vão poluir mais o
planeta e transformar exatamente no contrário um meio de transporte criado para
possibilitar às pessoas chegar mais rápido a um lugar, devido aos engarrafamentos.

Questão Indígena

Em toda a América Latina – mas também na América do Norte e em outras regiões do


mundo – as populações indígenas estão na primeira linha do combate à destruição
capitalista do meio ambiente, em defesa da terra, dos rios, das florestas, contra as
empresas mineiras, o agronegócio e outras manifestações da guerra do capital contra a
natureza. Não por acaso os indígenas tiveram um papel determinante na organização da
Conferência de Cochabamba em Defesa da Mãe Terra e contra a Mudança Climática, em
2010, que contou com a participação de dezenas de milhares de delegados de
comunidades indígenas e movimentos sociais. Temos muito a aprender com as
comunidades indígenas, que representam outra visão da relação dos seres humanos com
a natureza, totalmente oposta ao ethos explorador e destruidor do mercantilismo
capitalista. Como diz nosso companheiro, o histórico líder indígena peruano Hugo Blanco:
“Os indígenas já praticam o ecossocialismo há séculos!”.

As Terras Indígenas cobrem uma porção significativa da Amazônia brasileira e são


fundamentais para a reprodução física e sociocultural dos povos indígenas. Os benefícios
e serviços prestados por estas áreas ao clima e desenvolvimento sustentável do bioma,
contudo, ainda são pouco reconhecidos. Tais terras abrigam 173 etnias indígenas e são
fundamentais para a conservação da biodiversidade regional e global, pois as
comunidades indígenas reconhecem o valor da floresta em pé na proteção e manejo
dessas áreas.

Enquanto 20% da floresta amazônica brasileira foi desmatada nos últimos 40 anos, as
Terras Indígenas na Amazônia Legal perderam, somadas, apenas 2% de suas florestas
originais.

Esta característica lhes confere um papel fundamental na prevenção e no controle do


desmatamento, tanto pela extensão de suas áreas - com elevados índices de conservação
ambiental e com os maiores remanescentes florestais do país - quanto pelos modos
tradicionais de vida dos povos indígenas, caracterizados por uma relação harmônica com
os ecossistemas. Em várias regiões, as Terras Indígenas fazem parte de mosaicos ou
corredores de áreas protegidas ainda mais extensos, articuladas com Unidades de
Conservação e Territórios Quilombolas, que bloqueiam o avanço do desmatamento e
promovem outros modelos de ocupação e de governança.

A série Guerreiros da Floresta parece o enredo ideal para ilustrar as contradições do atual
cenário nacional, marcado por vozes que protestam contra a exploração dos madeireiros e
de grandes mineradoras, além dos interesses políticos justificados em nome do
“desenvolvimento”. Desde a chegada dos colonizadores europeus, há mais de 500 anos, o
Brasil acumula uma dívida em relação aos indígenas. Uma conta que ainda está longe de
ser fechada e que demanda como parte do pagamento um processo de reconhecimento,
escuta e visibilidade.

Nas vozes dos líderes Davi Kopenawa, Almir Suruí e Ninawa Inu Huni Kuin, das etnias
Yanomami, Suruí e Huni Kuin, respectivamente, é possível adentrar na cultura indígena
para além das referências particulares e perceber que, apesar das distâncias geográficas e
culturais que separam uma comunidade da outra e também do restante da população
brasileira, a luta pela preservação da natureza e da herança dos povos originários é, na
verdade, um compromisso de todos. Mas é no limite com as grandes produções de soja,
com a criação de gado e ao lado das zonas de garimpos expandidas sobre o território da
Amazônia que etnias como Yanomami, Huni Kuin e Suruí precisam reafirmar sua luta pela
conquista da terra, principalmente em estados como Roraima, Rondônia, Acre e Amazonas.

Foi em nome dessa “integração” e do “desenvolvimento” que o atual governo de Jair


Bolsonaro tem elaborado e acenado com iniciativas para a região que afetam
principalmente os povos indígenas. Desde o segundo turno das eleições até o decorrer do
segundo mês da gestão, já foi indicada a paralisação da demarcação de reservas
indígenas; parte das competências da Fundação Nacional do Índio (Funai) foram
transferidas para o Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos por meio da
Medida Provisória (MP) 870/2019, e toda estrutura destinada ao reconhecimento de terras
indígenas alocada para a pasta da Agricultura, chefiada por Tereza Cristina, apelidada de
“musa do veneno” por estar associada aos interesses do agronegócio.

Ninawa, da etnia Huni Kuin afirma que as propostas do novo governo vão no sentido
contrário ao da preservação, soberania nacional e preocupação com a sobrevivência de
todos. “As ideias dele (Bolsonaro) são geradas a partir de interesses de alguns grupos, que
não entendem nada sobre a questão indígena”, afirma Almir Suruí. “Se o governo
entendesse a importância dos indígenas, das nossas comunidades para a humanidade,
jamais nos trataria dessa forma. O problema é que nós não temos um poder econômico
para poder bancar a campanha deles”, ironiza Ninawa.

De acordo com Instituto Socioambiental (ISA), em geral, as terras indígenas continuam


sendo a “principal barreira contra a destruição da floresta”, cuja preservação é fundamental,
por exemplo, para reduzir os impactos das mudanças climáticas. Muito por conta disso,
para o líder do povo Huni Kuin, qualquer projeto que promova uma compreensão do meio
ambiente somente do ponto de vista econômico não corresponde às aspirações dos povos
originários pela preservação. “Nossa relação é com o sagrado, o espiritual, uma relação de
proteger um ao outro. Em nenhum momento nós, os Huni Kuin, estamos separados da
floresta. Nós somos a floresta, temos essa convicção”.

Amazônia, Agronegócio e Latifúndio

Embora a Amazônia tenha sido devastada continuamente, o noticiário alarmista objetiva


tão somente reforçar a ideia de que os brasileiros são incapazes de cuidar da Amazônia,
justificando-se, assim, a "gestão internacionalmente compartilhada" da floresta. Apontado
como responsável pelo desmatamento, inclusive em áreas de proteção, o movimento
camponês, num verdadeiro malabarismo com a ciência, é convertido em principal
personagem dessa farsa: a aceleração do desmatamento nos últimos anos tem relação
direta com o crescimento do latifúndio, seja de novo tipo — o chamado agronegócio —
ou do velho tipo, que explora força de trabalho escrava e semiescrava nos grotões da
Amazônia.

O Ministério do Trabalho publica, periodicamente, uma Lista Suja do trabalho escravo. A


mais recente arrola nada menos que 183 latifúndios, alguns com o mesmo proprietário, a
grande maioria na região amazônica. Porém esses são apenas os casos descobertos
pelos fiscais. Nenhum desses latifúndios flagrados foi confiscado pelo Estado. Além disso,
diante das dimensões da Amazônia, pode-se apostar que essa prática ocorre em
quantidade muito maior. Com todo tipo de estímulo governamental, acelera-se a
expansão do agronegócio em todos os estados do Norte. Há anos a fronteira agrícola
vem não só destruindo a floresta, como expulsando imensos contingentes de
camponeses cada vez mais para cima no mapa. O gerenciamento de Rondônia oferece
10 anos de isenção fiscal a produtores de cana de açúcar, sem definir se eles vão
produzir cana entre as árvores ou se vão desmatar para o cultivo.
Diante da repercussão internacional negativa dos incêndios criminosos na Amazônia,
chefes de países imperialistas, como Emmanuel Macron (França), sentiram-se
encorajados a se intrometerem nos assuntos internos do país e chegaram a ameaçar
aplicar boicote ao agronegócio e barrar o acordo Mercosul-União Europeia, devido aos
incêndios. Chamando a Amazônia de “nossa casa”, Macron pintou-se como
“ambientalista” enquanto saqueia as riquezas naturais dos países oprimidos.
Tais países imperialistas da Europa se opõem à expansão do latifúndio brasileiro não por
interesses “humanistas”, mas por pretensões coloniais de apoderarem-se dos recursos
naturais da Amazônia a médio e longo prazo.

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