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Terra – Habitats Urbanos e Rurais

O SABER CAMPONÊS NA PREPARAÇÃO DE IGUARIAS DERIVADAS DA


MANDIOCA NO MUNICÍPIO DE LAGARTO/SE E A SOBERANIA ALIMENTAR39.

Felipe da Fonseca SOUZA


Mestrando em Ensino das Ciências Ambientais PROFCIAMB/UFS
felipeffs12@gmail.com
Jonas Emanuel da Rocha ANTÃO
Mestrando em Desenvolvimento e Meio Ambiente PRODEMA/UFS
jonasemanuel96@hotmail.com
Jonatas Ribeiro Marques BARBOSA
Graduado em Geografia (Licenciatura) pela UFS
jonatasmarquestb@hotmail.com
Núbia Dias dos SANTOS
Professora do Programa de Pós Graduação em Ensino das Ciências Ambientais PROFCIAMB/UFS
nubisantos85@gmail.com

RESUMO
O homem camponês é portador de um saber tradicional para além do conhecimento científico,
enquanto patrimônio imaterial de sua identidade. Nesse saber estão contidas variadas expressões
socioculturais e socioambientais, que são fruto da história de suas experiências adquiridas ao longo
do tempo. O presente trabalho apresenta a importância do saber camponês na preparação da
maniçoba e demais derivados da mandioca no município de Lagarto/SE e sua relação na construção
da identidade cultural desse sujeito como patrimônio imaterial/material e o seu papel na soberania
alimentar. A metodologia revisa a literatura acerca das categorias geográficas espaço e lugar,
discutindo o conceito de identidade e sua aplicabilidade no contexto. Com base em estudos
empíricos, análise da malha fundiária, e produção agrícola municipal (IBGE, 2016), verificou-se
que a preparação de tais iguarias não se restringe ao campo, existindo dias específicos para sua
comercialização na cidade, viabilizando a construção de uma identidade e hábitos culturais.
Palavras-Chaves: Saber, Camponês; identidade; iguarias; Lagarto.
ABSTRACT
The peasant man carries a traditional saber beyond scientific knowledge, while the immaterial
patrimony of his identity. The sabers are contained varied socio-cultural and socioenvironmental
expressions, which are the fruit of the history of their own forms acquired over time. The present
work presents a relative importance to the knowledge about the maníic production and the other
data on the nature and the culture of the cultural identity on the subject as immaterial / material
material and the role in the food sobriety. The methodology revisits a literature on local and local
geographic categories, discussing the concept of identity and its applicability in context. Based on
Empirical Studies, Financial Media Analysis and Municipal Initiatives (IBGE, 2016), it was
verified that the production of such delicacies is not restricted to the field, there are days of
exposure for commercialization in the city, making possible the
Keywords: To know; farmer; identity; delicacies; Lagarto.

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Artigo oriundo das reflexões advindas com a Pesquisa: Pelo Espaço do Homem Camponês: estratégias de reprodução
social no território Centro Sul Sergipano com financiamento da COPES/UFS.

ISBN: 978-85-68066-82-9 Página 904


Terra – Habitats Urbanos e Rurais
INTRODUÇÃO

O homem camponês traz consigo um saber cultural intrínseco ao seu modo de vida, seja na
previsão do tempo, no cultivo agrícola, ou na culinária (MOURA, 1986). É um sujeito social que
tem no seu saber um patrimônio imaterial imensurável, é um trabalhador que está diretamente
envolvido com a natureza, conhecedor de seus segredos independentes dos conhecimentos
científicos.
A compreensão das formas e expressões culturais do campesinato, sejam elas expressas nas
técnicas de produção ou na culinária, requer a análise da sua sociabilidade. Tal enfoque sob a ótica
humanista e cultural privilegia aspectos relacionados ao modo de vida dos sujeitos, a sua cultura
material e imaterial, a sua identidade e relações sociais, as quais tendem, muitas das vezes, em
passar desperce idas na sociedade que su alterniza e inferioriza “o outro”, negligenciando o seu
papel e a sua função social como uma forma de negar a sua importância no contexto sóciohistórico.
Evidencia-se a culinária camponesa de um lugar, rica em valores culturais, sendo que o
conhecimento da mesma se constitui na valorização e entendimento do papel dessa prática para a
unidade familiar camponesa, como também para a sociedade de forma geral. Nesse sentido, tem-se
clareza que os conhecimentos das mesmas são relevantes, posto que são práticas singulares as quais
reafirmam a existência de um sujeito social histórico que luta pelo seu lugar numa sociedade
marcada pelo etnocentrismo e pela cultura hegemônica cada vez mais antropofágica (MARTINS,
1993, p. 16-17).
Utilizando-se da teoria do Espaço do Homem Camponês (SANTOS, 2012) este trabalho
busca apresentar a importância do saber camponês na preparação de iguarias como a maniçoba, e
demais derivados da mandioca no município de Lagarto/SE (figura 01) e sua relação na construção
da identidade cultural dos camponeses e da soberania alimentar. A maniçoba, prato típico da
culinária lagartense, de origem indígena, é produzida a partir da folha da mandioca acompanhada de
carne suína e outros ingredientes. Sua comercialização no município se dá em dias específicos, onde
o principal mercado é composto por pessoas residentes no espaço urbano que buscam nesse
alimento uma aproximação com o rural, preservando hábitos culturais.
Além disso, o incentivo à produção e o consumo de tais iguarias podem contribuir para a
manutenção da unidade familiar camponesa, na medida em que se estimula o plantio de gêneros
alimentícios que fazem parte da sua raiz histórica, a exemplo da mandioca. Tais gêneros
alimentícios e iguarias contribuem para a obtenção de renda e de alimento sem a presença de
agrotóxicos nas mesas dos camponeses, pois cria-se as condições para a autonomia do sujeito desde
o plantio ao consumo, garantindo, assim, os princípios norteadores da soberania alimentar a saber: a
liberdade de produção, a diversidade de cultivos, a produção familiar e o respeito a natureza.

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Figura 1 – Município de Lagarto-Sergipe: Localização da área de estudo, 2015.

Fonte: IBGE, 2010

Tais análises derivam das reflexões advindas com os estudos empíricos e exame de dados
viabilizados através da Pesquisa “Pelo Espaço do homem Camponês: estratégias de reprodução
social no território Centro-Sul Sergipano”. A mesma versa sobre o processo de reprodução do
campesinato no centro-sul sergipano, identificando os elementos e fatores explicativos da existência
estrutural do camponês e comparando as estratégias sócioespaciais desenvolvidas por esses sujeitos
sociais para garantirem a sua própria reprodução social no município de Lagarto.
A proposta metodológica revisa a literatura específica acerca das categorias geográficas
espaço e lugar, discute o conceito de identidade, relacionando a importancia da mandiocultura,
principal matéria-prima para a preparação desses alimentos, como fator principal na garantia da
autonomia camponesa no município de Lagarto, onde, através de conversas, entrevistas com 24
camponeses dos povoados Colônia Treze, Brasília, Jenipapo, Açu Velho, Caraíba, Juerama, Boa
Vista, Pista Pau Grande, Urubu Grande e Pé da Serra do município, visitas de campo e
levantamento e análise de dados primários e secundários, é possível compreender as estratégias de
reprodução camponesa possibilitadas pela mandiocultura, ao mesmo tempo constata-se como a
preparação de iguarias derivadas da mandioca resignificam o saber camponês como principal
técnica, ressignificando a relação tradicional entre a preparação e o consumo do alimento não
somente nas propriedades rurais, mas também, na sede municipal.

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O CAMPONÊS COMO SUJEITO SOCIAL NO ESPAÇO RURAL

O espaço rural brasileiro é caracterizado por diversas especificidades compostas por relações
diversas de produção. A teoria do Espaço do Homem Camponês (SANTOS, 2012) investiga as
estratégias de resistência e reprodução social do campesinato em meio as relações contraditórias no
campo viabilizadas pelo movimento desigual, contraditório e combinado do capital.
O camponês persiste neste espaço como sujeito social histórico e sua luta não se
circunscreve como motivação de um passado, numa mobilização arcaica, em prol de um espaço
rural atrasado, mas sim visando estratégias de reprodução e resistência em meio a organização do
espaço rural (MARTINS, 1995; SANTOS 2012). Com a posse da terra os camponeses firmam seus
conhecimentos, saberes e práticas os quais perpassam os itinerários da vida, na construção da sua
identidade e de seus valores culturais no espaço rural.
Nesse espaço rural estão contidas inúmeras ruralidades que caracterizam a atual
dinamicidade do campo. É sabido que o homem camponês traz consigo um saber cultural intrínseco
em sua essência, seja na previsão do tempo, no cultivo agrícola ou até na culinária. O camponês é
um trabalhador que está diretamente envolvido com a natureza, conhecedor de seus segredos
independentes dos conhecimentos científicos (MOURA, 1986).
Esse saber fazer camponês traduz-se num conjunto de práticas/saberes tradicionais que são
oralmente passados de geração em geração das famílias camponesas, os quais se materializam nas
tradicionais produções de alimentos típicos da cultura local, a exemplo dos derivados da mandioca.
Alimentos como o beiju, a tapioca, a maniçoba, o pé-de-moleque, malcasado, dentre outras iguarias
(figura 03) são produzidos de acordo com essas técnicas camponesas, as quais são caracterizadas
como símbolos de uma identidade cultural, sendo a materialização da resistência e da seguridade
alimentar dos lagartenses.

Figura 02 (a esquerda) e 03 (a direita): As fotos apresentam a plantação de Mandioca na Área Rural do


Município de Lagarto/Sergipe e a comercialização de iguarias derivadas da Mandioca na Feira do Povoado
Colônia Treze – Lagarto/Sergipe. 8

Fonte: Badiru e Santos, 2016.

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O espaço segundo Corrêa (2002) é visto como base indispensável para a vida do homem,
encerrando as condições de trabalho, quer naturais quer aquelas socialmente produzidas. Como tal,
o domínio do espaço transforma-se em elemento crucial na história do homem. Assim Santos
(2012), entende a categoria lugar como a escala do acontecimento, da realização material da vida. É
onde símbolos e cultura estão imbrincados na mistura das relações sociais do sujeito com seus pares
e com seu entorno, permitindo o desenvolvimento único na escala do lugar, assim, o camponês
imprime no seu espaço o seu modo de ser, fazer e agir (CARLOS, 1996; TUAN, 1980).
A relação do sujeito camponês com o lugar está presente e é evidenciada nas atividades
laborais valorizadas nas casas de farinha, nas práticas culturais com seus familiares, nos trabalhos
valorizados na roça, nas idas e vindas à feira. Tem-se clareza que é a partir do trabalho que se
materializa o conteúdo da sociabilidade do camponês com seus pares. Assim, as diversas etapas que
envolvem o processo produtivo da farinha de mandioca e seus derivados tornam-se um processo
misto de trabalho e sociabilização.
Essa socialização é visível nas práticas das raspagens da mandioca no processo de produção
da tapioca entre as mulheres. Perante o cozimento da farinha, no manuseio do forno pelos homens.
Na preparação e consumo da maniçoba em família ou na roça durante o cultivo da mandioca. Esse
sentimento de pertencimento ao lugar agrega e personaliza a relação do camponês com a família, a
terra, o lugar, a cultura e a identidade.
Nesse aspecto, o espaço do homem camponês resulta das suas estratégias de vivência e
existência, componentes da sua identidade histórico-cultural desenvolvidas nessa relação espaço
temporal. É no estudo do lugar onde se torna possível identificar as contradições da sociedade em
movimento e perceber os desafios para a consolidação do espaço do homem (CARLOS, 1996;
SANTOS, 2012).
Para Tuan (1980) o lugar possui um espírito, uma personalidade, havendo um sentido que se
manifesta pela apreciação visual ou estética e pelos sentidos a partir de uma longa vivência. Assim
viver em comunidade, em família por várias gerações permite a materialização de relações sólidas e
identitárias no lugar.
Na medida em que o espaço é organizado, dinamizado e vivido em função dos territórios
constituídos por grupos sociais a relação com a identidade constrói o vínculo afetivo ou simbólico
com o lugar (SAQUET, 2009), e ultrapassam os limites do rural e se expandem até o urbano. No
município de Lagarto a produção de iguarias derivadas da mandioca remetem ao saber fazer
camponês.
Nos espaços das feiras livres são comumente comercializados os bolos, beijus, tapiocas, pés
de moleques, bolachas de goma e outras iguarias as quais podem ser consumidas in loco. No caso
da maniçoba a mesma é vendida na residência da família que a produz e a comercializa. As pessoas

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residentes no espaço urbano degustam a maniçoba e buscam nesse alimento a aproximação com o
rural, pois estas iguarias remetem costumes gastronômicos rurais que fazem parte da raiz e da
história dos habitantes das cidades. Estes automaticamente relacionam este prato típico as memórias
de algum familiar, vizinho ou amigo que produzem/produziam tais iguarias ou iguarias similares.
O sabor da maniçoba reaviva a memória degustativa de uma gastronomia recheada de
lembranças da vida no campo. Tem-se assim, a materialização desse saber e sua importância
enquanto elemento cultural e simbólico da presença da ruralidade no espaço urbano. Para Saquet
(2009, p. 4),

Os símbolos que compõem uma identidade não são construções totalmente eventuais;
mantêm sempre determinados vínculos com a realidade concreta. Os vários conflitos pela
defesa de fronteiras, por exemplo, demonstram que as referências espaciais permanecem
relevantes para a definição ou fortalecimento de identidades. A própria memória (coletiva)
de um grupo social precisa de uma referência territorial. O poder simbólico, desta maneira,
pode fazer uso de elementos espaciais, representações e símbolos, constituindo uma
identidade territorial. Esta é definida historicamente. Os territórios e as fronteiras são
fundamentais para a construção das identidades, onde a alteridade fica muitas vezes
condicionada a um determinado limite físico de reprodução dos grupos sociais. (SAQUET,
2009, p. 4.)

Para Haesbaert (1997), não é propriamente o espaço que forma uma identidade, mas a força
política e cultural dos grupos sociais que nele se reproduzem e sua capacidade de produzir uma
determinada escala de identidade, territorialmente mediada. “A identidade pode ter um caráter mais
ou menos duradouro, dependendo das condições de vida de cada grupo social. A identidade
depende da diferença e as diferenças são estabelecidas por sistemas classificatórios inerentes à vida
social” (HAESBAERT, 1997, p. 35). Nesse sentido Saquet (2009, p. 13) salienta que:

A identidade, entre outros processos, corresponde a uma pré-condição subjetiva e objetiva


que, com estímulos oportunos e com ações de governança, pode contribuir para um
processo de desenvolvimento com certa autonomia para os atores de diferentes níveis
sociais, especialmente para os mais necessitados e desamparados pela ação do Estado em
países como o Brasil (SAQUET, 2009, p. 13).

Considera-se que nesse contexto, as perspectivas dessa relação espaço, lugar, e identidade,
condizem com a subjetividade do sujeito na preservação e reprodução do seu modo de vida. Diante
disso Lencioni (2003) ressalta que:

Em virtude da consciência se constituir a partir das experiências vividas, a fenomenologia


chama atenção para o fato de que é pelo vivido que o individuo se põe em contato com o
mundo dos objetos exteriores. Por isso, com a compreensão racional do vivido, com sua
dimensão subjetiva, distante do mundo objetivo e abstrato da ciência, é que se alcança a
essência dos objetos tal como eles se apresentam na consciência (LENCIONI, 2003, p.194).

Assim, o homem camponês mandiocultor lagartense através da relação com a cadeia


produtiva da mandioca, enquanto espaço exterior, permite a reprodução da identidade através da
sedimentação de saberes e práticas vivenciais expressas na elaboração de conhecimentos
sociohistoricamente desenvolvidos, no espaço interior. Ocorre, assim, a criação de um modo de

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vida único, que é materializado nas formas, conteúdos, cores e sabores dos alimentos derivados da
mandioca.

O SABER CAMPONÊS E A RELAÇÃO IDENTITÁRIA NA PRODUÇÃO DE IGUARIAS


DERIVADAS DA MANDIOCA NO MUNICÍPIO DE LAGARTO/SE.

O município de Lagarto, estado de Sergipe, está localizado na região Nordeste do Brasil.


Possui área de 969,577 km2, sendo o segundo maior município em extensão territorial de Sergipe,
apresenta um IDH de 0,625. Sua população total é de 94.861 habitantes, dos quais 48.867 residem
na zona urbana e 45.994 residem na área rural (IBGE, 2010), distribuídos em mais de 100
comunidades rurais.
O município possui uma economia composta por diferentes atividades, a exemplo da
agricultura baseada nas unidades de produção camponesas e nos latifúndios agroexportadores que
cultivam principalmente maracujá, laranja, mandioca, fumo, feijão, amendoim, fava, milho, banana,
batata e coco da baía. Em relação ao efetivo da pecuária tem-se a variação de bovinos de corte e
leite, suínos, equinos, asininos, muares, ovinos, caprinos e aves. Além de expressivo comércio de
bens e serviços e parques industriais com destaque ao Grupo Maratá Alimentícia que influência a
economia municipal tanto no âmbito industrial quanto no agrícola. Sendo assim, para compreender
a organização do espaço agrário lagartense é necessário conhecer como está distribuída sua
estrutura fundiária e onde estão localizados os camponeses, principais responsáveis pelo cultivo
agrícola do município.
A partir dos dados apresentados na tabela 01 constata-se que o município de Lagarto possui
7.868 estabelecimentos agropecuários os quais totalizam uma área de 68.620 hectares. Pode-se
atentar para a desigualdade na distribuição de terras do município, onde 3.595 estabelecimentos
agropecuários com área entre mais de 0 e menos de 1 ha (45,69% do total) ocupam apenas 1.785
hectares, ou seja, quase a metade do número de estabelecimentos abrangem apenas 2,6 % da área
total do município. Na faixa de área de 1 a menos de 10 hectares encontram-se 3.272
estabelecimentos, os quais somam 10.021 hectares, o que equivale a 14,61 % da área total dos
estabelecimentos. De 10 a menos 100 hectares são 851 estabelecimentos (10,82 % do total), no
entanto, os mesmos ocupam 20.372 hectares, ou seja, 29,69 % da área total dos estabelecimentos
existentes no município.
Contata-se que na faixa de área entre 500 e menos de 1000 hectares respondem por apenas
0,17% do numero de estabelecimentos agropecuários, mas ocupam 19.147 hectares, o equivalente a
12,71% da área total dos estabelecimentos. Entre 1000 a menos de 2500 hectares são 4
estabelecimentos que respondem 0,05% do número de estabelecimentos, mais abrangem 5.550

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hectares, equivalentes a 8,09% da área. O município possui um estabelecimento com área superior a
2.500 hectares, assim como a presença de 41 produtores sem área.
Observa-se a concentração de terras nas mãos de poucos, e o elevado número de pequenas
propriedades camponesas que têm como sua principal atividade agrícola a mandiocultura, tomando-
se como base a produção agrícola municipal e a multifuncionalidade da multifuncionalidade da
produção de mandioca dentro da unidade familiar camponesa em Lagarto/SE. Esse dado por si só
confirma a lógica da distribuição desigual no acesso à terra no Brasil. Ou seja, a tabela evidencia
que 87,25% dos estabelecimentos agropecuários do município de Lagarto estão dentro do extrato de
área entre mais de zero e menos de 10 hectares. Compõem 6.867 estabelecimentos (87,28% do
número de estabelecimentos no município), mas somam apenas 11.806 ha (17,21%) da área total.

Tabela 01 – Número e área dos estabelecimentos agropecuários no município de Lagarto - Sergipe, 2006.
Grupos de área total Variável
Número de estabelecimentos Área dos estabelecimentos
agropecuários agropecuários
% ha %
Unidades
Total 7.868 100,00 68.622 100,00
Mais de 0 a menos de 1 há 3.595 45,69 1.785 2,6
De 1 a menos de 10 há 3.272 41,59 10.021 14,61
De 10 a menos de 100 851 10,82 20.372 29,69
De 100 a menos de 500 há 91 1,15 19147 27,9
De 500 a menos de 1000 há 13 0,17 8.722 12,71
De 1000 a menos de 2500 há 4 0,05 5.550 8,09
De 2500 ha e mais 1 0,01 X X
Produtor sem área 41 0,52 0 0,00
Fonte: IBGE, Censo Agropecuário, 2006.
Elaboração: Felipe da Fonseca Souza, 2016.

Essa análise da estrutura fundiária comprova a existência e resistência do camponês mesmo


diante da concentração de terras existente no município, reflexo do processo histórico da formação
espacial brasileira. A tabela 01 demonstra, assim, onde estão localizados os camponeses,
concentrados nos estabelecimentos com menos de 10 hectares o que leva a considerar que a
mandioca é produzida nas pequenas propriedades, cultivadas na unidade de produção familiar
camponesa, contribuindo enquanto estratégia para reprodução deste sujeito social.
Esses dados ratificam a relevância da cadeia produtiva da mandiocultura e
consequentemente da produção camponesa no espaço rural para a economia da regional/local.
Assim, levando em consideração a Produção Agrícola Municipal de Lagarto (IBGE, 2016) com
base nos dados das lavouras temporárias tem-se uma avaliação dos cultivos produzidos no
município e sua influência na economia local, e para a reprodução do sujeito social camponês.
Na tabela 02 são apresentados os dados referentes a área plantada, área colhida, quantidade
produzida e valor da produção de lavouras temporárias no ano de 2016. Observa-se que na relação

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entre área plantada e área colhida houve perdas na produção de feijão nesse período de análise. Tal
fato pode estar relacionado ao tipo de solo, ou ao frequente uso de agrotóxicos nas plantações de
milho e fumo, causando envenenamento e a perda da fertilidade do solo.
Os resultados obtidos na safra de 2016 revelam a importância da mandioca na dinâmica
econômica agrícola municipal. Foram 122.000 toneladas produzidas em 7.600 hectares compondo
uma média de 16 toneladas por hectares, e R$ 73.344 mil reais de valor da produção. Esse resultado
para a realidade local caracteriza uma excelente produção que poderia crescer ainda mais se
houvesse incentivo para tal, o que se observa é o estimulo para o cultivo monocultor do fumo e do
milho, induzida pelas indústrias, que podem futuramente comprometer a policultura e
consequentemente a mandiocultura.

Tabela 02 – Produção Agrícola Municipal: dados da lavoura temporária do município de Lagarto – Sergipe,
no ano de 2016.
Lavoura temporária Variável
Área plantada Área colhida Quantidade Valor da
produzida produção
(ha) (%) (ha) (%) (Toneladas) (Mil (%)
R$)
Amendoim (em casca) (Toneladas) 100 0,97 100 0,97 120 158 0,21
Feijão (em grão) (Toneladas) 100 0,97 50 0,49 18 60 0,08
Fumo (em folha) (Toneladas) 150 1,45 150 1,45 165 627 0,83
Mandioca (Toneladas) 7.600 73,4 7.60 73,7 122.000 73.344 96,8
3 0 9 5
Milho (em grão) (Toneladas) 2.400 23,1 2.40 23,3 2.160 1.544 2,04
9 0
Fonte: IBGE, Produção Agrícola Municipal, 2016.

Observa-se com a tabela 2 que a área destinada ao plantio do milho é a que mais se
aproxima da área destinada ao plantio da mandioca. Esse fato pode ser um sinal de alerta para o
avanço de cultivos monocultores no município, tendo em vista a influência da indústria Maratá nos
cultivos, pois esta indústria produz farinha de milho e outros itens presentes nesse espaço rural. Por
esta razão, torna-se essencial os estudos que versam sobre a relação dos alimentos com a identidade
de um grupo social.
Os estudos sobre alimentos identitários, aqueles que mantêm características socioculturais,
desde a produção ao consumo, interligadas à identidade de indivíduos ou grupos sociais, como os
derivados da mandioca perpassam por uma linha de análise que considera a produção dessas
iguarias e sua relevância no mercado popular como importante meio de comprovação da resistência
do modo de vida camponês, onde a essência do rural é mantida, e o alimento passa a ser
considerado como símbolo de identidade não somente camponesa, mas do povo de Lagarto.
Para Cansanção (2009) dentre todas as comidas a mais representativa sem sombra de
dúvidas é a maniçoba, prato típico que é proveniente do cozimento da folha da mandioca, apreciado

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por muitas pessoas na região. A maniçoba é um prato famoso na cidade de Lagarto, mas que conta
com poucos pontos de venda, concentrada apenas em um dia da semana, o sábado. O preparo exige
uma técnica expecifica para retirar o veneno (toxicidade) da folha de mandioca, técnica camponesa
que é passada oralmente de geração em geração e que afunila o meio de produção deste e de outros
alimentos produzidos a partir do saber camponês. Como salienta Azevedo (2011),

Todo esse ciclo do saber-fazer culinário era mantido dentro da sociedade a partir dos laços
de familiaridade e de amizade, uma vez que as regras em volta da arte culinária eram
repassadas de geração a geração, cuja aprendizagem fazia-se pessoalmente com uma
parenta – avó, mãe, tia, irmã, prima – uma vizinha ou amiga (AZEVEDO, 2011, p. 75).

Essa produção de alimentos pode ser considerada como uma cultura enraizada no território,
sendo intrínseco ao espaço dos sujeitos, como salienta Claval (2001, p. 63), “A cultura é a soma dos
comportamentos, dos saberes, das técnicas, dos conhecimentos e dos valores acumulados pelos
indivíduos durante suas vidas e, em outra escala, pelo conjunto dos grupos de que fazem parte. A
cultura é herança transmitida de uma geração a outra”.
Em relação ao povo lagartense, os saberes peculiares da cultura camponesa tornaram-se
tradição na cidade. Alimentos típicos do meio rural, como a maniçoba, o arroz de galinha e o beiju,
são consumidos em dias específicos em razão da sua forma de preparo e da organização temporal
para seu consumo construída de acordo com a tradição trazida do campo.
O típico arroz de galinha consumido nas noites de sexta-feira, uma técnica cultural
camponesa que mistura arroz branco, galinha caipira e vatapá, que no passado somente era
produzida nas festividades de fim de ano, mas que há muitos anos foi levado para a cidade e hoje é
tido como um alimento tradicional. Além disso, o pé de moleque, a bala de goma, o mal casado e os
bolos típicos, que são derivados da mandioca detêm amplo valor material e imaterial na cultura
lagartense, com seu consumo concentrado aos domingos e dias de feiras livres.
Essa forma de organização espaço temporal em função do alimento é símbolo de identidade
do povo lagartense produzido a partir do saber camponês, caracterizando também a presença de
ruralidades dentro da cidade viabilizadas a partir do modo de vida presente no espaço do homem
camponês. Para Rezende e Menezes (2013) a tradição da transmissão desse saber fazer culinário,
em alguns territórios e grupos sociais, aos poucos foi sendo inutilizada, devido às alterações
impostas pelo avanço do setor industrial e à sua expansão no meio rural e urbano, todavia a
continuidade e a representatividade dessa prática no município de Lagarto apresenta uma estratégia
de resistência da cultura camponesa preservando a essência do saber fazer, demostrando a força da
identidade.
Menezes (2013) discute que a produção desses alimentos está associada ao passado daqueles
que os consomem e as técnicas utilizadas para elaborar, servir e consumi-los são variadas,
indicadoras de suas próprias histórias. Nessas histórias, estão presentes os valores culturais, as

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representações em torno das práticas de obtenção, preparação e consumo de alimentos, os quais
auxiliam na construção e na manutenção de identidade dos grupos sociais. MENEZES (2013),
afirma que:

Esses alimentos portam histórias de vidas individuais e coletivas e estão interligados à


forma como o indivíduo se identifica, ou seja, à sua identidade. A partir dessa realidade, o
agricultor familiar, diante das dificuldades enfrentadas no seu dia-a-dia, transforma
alimentos alicerçados pela procura ascendente do consumidor tendo em vista a garantia da
reprodução econômica e social do grupo familiar. (MENEZES, 2013, p. 10).

Essa relação entre o alimento preparado a partir desse saber histórico camponês apontam para
a importância desse sujeito na sociedade, não somente na produção agrícola, mas também nesse
porte de conhecimento imaterial para além da ciência que deve ser preservado e socializado com
toda a comunidade. Logo, a procura por alimentos identitários na área urbana se dá em decorrência
da população migrante procurar preservar suas tradições de origem, resgatando seus traços culturais
e alimentares (SANTOS, 2012).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A existência do camponês no município de Lagarto está diretamente relacionada à mesma


questão estrutural, relacionada ao processo histórico de formação territorial do estado de Sergipe, na
qual a formação econômica e social caracteriza o modelo da sua reprodução social. O saber advindo
desse sujeito utilizado por esse grupo social não somente no preparo, mas na forma de consumir e
até comercializar as iguarias alimentícias típicas do meio rural no município de Lagarto mostram a
importância da existência camponesa e do seu saber/fazer para além da ciência, o qual é
cuidadosamente transmitido no âmbito familiar e deve ser imensamente valorizado pela sociedade.
A maniçoba, o arroz de galinha, o beiju, a tapioca e os demais derivados da mandioca são
pratos típicos da identidade camponesa que detêm preparo embasado na essência do saber fazer
camponês, ao ser elaborado e consumido não ocorre um simples ato de cozinhar e ingerir um
alimento, mas a ressignificação da cultura desse sujeito.
Em relação às condições exteriores, ou seja, a grande quantidade de raízes de mandioca
produzidas nas pequenas propriedades camponesas permite-se que o interior desse sujeito social,
que é o modo de vida camponês, construa através de um longo processo histórico e familiar, os
elementos identitários os quais fortalecem a reprodução camponesa através da sua importância no
cenário econômico municipal.
Sendo assim, o olhar sobre o camponês impõe um diálogo de saberes e práticas além do
conhecimento adquirido, que perpassa por estratégias, contradições e formas de organização,
concebendo a ciência em sua multidimensionalidade e pluralidade. A pesquisa constata a
importância da população rural e das atividades desenvolvidas na cadeia produtiva da

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mandiocultura como componente singular da economia agrícola municipal e para a segurança
alimentar da população municipal.

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