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MÓDULO III
SEMINÁRIO II – SUSPENSÃO DA EXIGIBILIDADE DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO,
MANDADO DE SEGURANÇA E LIMINARES
1. No art. 151 do CTN, que significa o termo ―exigibilidade‖? Quando surge essa
―exigibilidade‖? E qual o efeito da suspensão da exigibilidade? Impede-se (i) o
lançamento, (ii) a inscrição na dívida ativa, (iii) a execução fiscal; (iv) todos estes
atos? (vide anexo I a IV).
1
Observe-se que, a despeito do equívoco cometido pelo legislador ordinário quanto à
nomenclatura atribuída ao Capítulo III, da Lei 5.172/1966, o que ocorre não é a suspensão do
crédito tributário, mas sim sustação de sua exigibilidade. Este, salvo a ocorrência
superveniente de quaisquer das hipóteses de extinção da obrigação tributária ou da verificação
da incidência de vícios, formais ou materiais, que afetem a higidez do ato administrativo que
lhe deu ensejo (previstas, v.g., no art. 149, do CTN), permanecerá intacto após o lançamento.
A suspensão da exigibilidade do crédito tributário, conforme entendimento
jurisprudencial firmado pelo Superior Tribunal de Justiça, não tem o condão de impedir a
regular constituição do crédito tributário, operada através do lançamento, mas sim de obstar
os atos contra o contribuinte que visem à cobrança do respectivo crédito, tais como a
inscrição em dívida ativa, a execução fiscal e a penhora. Acresce dizer que o dito ato de
lançamento, sendo vinculado e obrigatório, visa impedir a decadência do direito de
constituição do crédito tributário.
Importa mencionar que, caso a hipótese de suspensão da exigibilidade enfrentada seja
aquela prescrita no inciso II do art. 151, do CTN — consoante posicionamento do STJ
exarado no AgRg no REsp nº 1.213.3191, de relatoria do Ministro Castro Meira —, considera-
se ocorrido o lançamento tácito do crédito, caso a Fazenda aceite como integral o respectivo
depósito, razão pela qual não mais se poderia cogitar do transcurso do prazo decadencial nem
na necessidade de seu lançamento de ofício.
2. Em que acepção a expressão ―crédito tributário‖ foi utilizada no art. 151 do CTN?
Essa expressão congrega também liames decorrentes da prática de atos ilícitos (e.g.
multa por desrespeito aos deveres instrumentais)?
1
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Agravo Regimental no Recurso Especial o n. 1.213.319 - SP.
Agravante: Reliance Elétrica LTDA.. Agravado: Fazenda Nacional. Relator: Ministro Castro Meira. Brasília, 28
de maio de 2012. Disponível em: <https://ww2.stj.jus.br/processo/revista/documento/mediado/
?componente=ATC&sequencial=22383125&num_reregist=201001694525&data=20120528&tipo=5&formato=
PDF> Acesso em: 18 ago., 2019.
2
O crédito tributário deve ser tomado como o ―[...] direito subjetivo do sujeito ativo, ao
qual se contrapõe o débito tributário, entendido como o dever jurídico do sujeito passivo‖,
propõe Paulo de Barros Carvalho2.
Quanto à possibilidade de essa expressão congregar liames decorrentes da prática de
atos ilícitos, interessa, inicialmente, examinar o texto do art. 139, do CTN, que designa o
crédito tributário como sendo decorrente da obrigação principal e tendo ―[...] a mesma
natureza desta‖. Nessa senda, perquirindo-se a significação de obrigação tributária constante
na Lei 5.172/1966, inscrita em seu art. 113, constata-se que tal obrigação pode ser principal
ou acessória. Indica o § 1º desse dispositivo legal que a obrigação principal tem como objeto
o ―[...] pagamento de tributo ou penalidade pecuniária e extingue-se juntamente com o
crédito dela decorrente‖.
Importa considerar, entretanto, que tais obrigações — a de pagar tributo e a de pagar
penalidade pecuniária — embora possam consubstanciar o crédito tributário, decorrem de
relações jurídicas distintas e emanam de atos administrativos diversos.
O próprio conceito jurídico de tributo inscrito no art. 3º, do CTN — como sendo toda
prestação pecuniária compulsória que não constitua sanção de ato ilícito — seria, a rigor,
semanticamente incompatível com a ideia de o crédito tributário comportar liames
decorrentes da prática de ilícitos.
O lançamento, como preleciona Paulo de Barros Carvalho, produz regra cujo
antecedente é o fato lícito e o consequente, uma relação jurídica de tributo. Já o ato de
aplicação de penalidade — consistente no auto de infração —, veicula norma que tem ―[...] no
suposto, a descrição de um delito e, no consequente, a instituição de liame jurídico
sancionatório [...]‖3, seja pelo inadimplemento da prestação tributária em tempo hábil, seja
pela inobservância às obrigações acessórias.
2
CARVALHO, Paulo de Barros. Direito tributário: linguagem e método. 7. ed. rev. São Paulo : Noeses, 2018,
p. 526.
3
Ibid., p. 538.
3
a) a equiparação, prescrita pelo art. § 2º do art. 835 do CPC/15, a dinheiro da fiança
bancária e do seguro garantia, tem o condão de consagrar a hipótese de suspensão
do crédito tributário prevista no art. 151, II, do CTN?
Como se pode depreender da leitura do art. 111, inciso I, da Lei 5.172/1966, que
impõe a interpretação literal da legislação tributária que disponha sobre suspensão e exclusão
do crédito tributário, bem como do art. 141 desse Codex, segundo o qual o crédito tributário
regularmente constituído somente tem sua exigibilidade suspensa nos casos previstos em seu
bojo, as hipóteses de suspensão do crédito tributário insertas no artigo 151 do CTN são
definidas em numerus clausus.
O STJ, ao editar a súmula 112, firmou entendimento no sentido de apenas ser possível
a suspensão da exigibilidade do crédito tributário caso o depósito for integral e em dinheiro.
Lado outro, vale examinar o teor do acórdão proferido no REsp 1.381.2544, de relatoria do
ministro Napoleão Nunes Maia Filho, em que se distingue o crédito tributário em sentido
estrito daquele pertinente à multa administrativa imposta no exercício do poder de polícia,
para o qual — diante da alegada inexistência de previsão legal de suspensão da exigibilidade
de crédito não tributário — caberia a aplicação normativo-integrativa do art. 835, § 2º, do
CPC e, portanto, a utilização da fiança bancária e do seguro garantia para fins de suspensão da
exigibilidade de tais créditos.
Fundamenta-se a aplicação das espécies de tutela provisória previstas nos arts. 294 e
ss. do CPC/15 ao processo tributário por força do expresso no inciso V do art. 151 do CTN —
incluído pela Lei Complementar nº 104, de 10 de janeiro de 2001 —, de modo que tais
medidas são meios hábeis à suspensão da exigibilidade do crédito tributário.
Relevante consignar que o novo CPC prevê, como analisa Humberto Theodoro Júnior,
três técnicas processuais de tutela provisória tendentes à minoração dos efeitos deletérios do
4
______. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial o n. 1.381.254 - PR. Recorrente: Agência Nacional de
Transportes Terrestres - ANTT.. Recorrido: Rumo Malha Sul S.A.. Relator: Ministro Napoleão Nunes Mais, 28
de junho de 2019. Disponível em: < https://ww2.stj.jus.br/processo/revista/documento/mediado/?componente=A
TC&sequencial=96729105&num_registro=201301098418&data=20190628&tipo=51&formato=PDF> Acesso
em: 19 ago., 2019.
4
tempo sobre o direito objeto de litígio: a tutela provisória de urgência (i) cautelar
(conservativa) e a (ii) antecipatória (satisfativa), calcadas na probabilidade do direito e no
combate ao perigo do dano; bem como a (iii) tutela de evidência, que visa não
necessariamente obstar o perigo do dano mas sim distribuir o ônus do tempo do processo de
modo justo5.
4. Sobre o depósito judicial efetuado nos autos de uma ação declaratória proposta antes
da constituição do crédito tributário, pergunta-se: trata-se de faculdade do
contribuinte? Há distinção entre depósito judicial para fins do art. 151, II, do CTN e
prestação de caução? O levantamento do depósito judicial pelo contribuinte vincula-
se ao êxito (com trânsito em julgado) da ação pelo contribuinte ou o juiz pode a
qualquer tempo autorizar o levantamento do depósito? (Vide anexo VI).
5
THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil. 59. ed. rev., atual. e ampl. [livro digital].
Rio de Janeiro : Forense, 2018, passim.
5
Acerca da vinculação entre a possibilidade de levantamento do depósito judicial pelo
contribuinte e seu êxito na ação, importa o exame do art. 32, § 2º, da Lei 6.830/1980, que
impõe a devolução ao depositante (subentende-se que na hipótese de procedência da
demanda) ou conversão em renda pela Fazenda (supõe-se que no caso de improcedência) do
valor depositado, monetariamente atualizado, após o trânsito em julgado da decisão, sem,
contudo, tratar expressamente da hipótese de extinção do feito sem resolução do mérito.
Do estudo do anexo VI, observa-se que a jurisprudência prevalecente aponta para
cabimento da conversão do depósito em renda, quando da ocorrência de sentença terminativa,
sob o fundamento de que a ―[...] o cumprimento da obrigação tributária só pode ser excluída
por força de lei ou suspensa de acordo com o que determina o art. 151 do CTN. Fora desse
contexto o contribuinte está obrigado a recolher o tributo‖.
6
Segundo Luiz Guilherme Marinoni, em sua obra intitulada Tutela de Urgência e Tutela de Evidência: soluções
reais diante do tempo da justiça, a técnica da cognição, aplicada pelo órgão jurisdicional no mister da
composição de conflitos, ―[...] permite a construção de procedimentos ajustados às reais necessidades de tutela.
6
direito [...]‖7. Diante disso, não seria razoável cogitar da supressão de tal instrumento
processual, tendente à proteção efetiva e imediata de direitos, no procedimento do Mandado
de Segurança (ação voltada, por excelência, a uma proteção eficaz dos direitos individuais
postos em risco por atos abusivos).
Ademais, importa considerar que toda medida antecipatória dos efeitos da tutela
jurisdicional tem — embora seja predominantemente satisfativa — sob certa perspectiva,
também natureza acautelatória, eis que tendente à minoração os efeitos prejudiciais do tempo
do processo sobre o direito da parte — o que escuda, por via oblíqua, o resultado útil da
prestação jurisdicional, considerando que tal medida contempla a reversibilidade como
premissa.
Tomando-se a dicção do art. 7º, III, da Lei 12.016/2009, observa-se, inclusive, que os
requisitos do fumus boni iuris e do periculum in mora são comuns a ambas as formas de
antecipação de tutela, diferindo (i) quanto à natureza da prova que lhe instrumentaliza (no
mandamus, prova hábil a compor, a posteriori, o juízo exauriente do julgador); (ii) quanto à
finalidade prevalecente (uma satisfativa, outra conservativa).
A cognição pode ser analisada em duas direções: no sentido horizontal, quando a cognição pode ser plena ou
parcial; e no sentido vertical, em que a cognição pode ser exauriente, sumária e superficial‖.
7
MARINONI, Luiz Guilherme. Tutela provisória [livro eletrônico]. São Paulo : Editora Revista dos Tribunais,
2017, passim.
7
agregar ambas as providências, cautelar e satisfativa, bem como ressalta a necessidade de se
interpretar tais institutos de modo integrado, sem que se olvide que a dita tutela de evidência
pressupõe, conforme incisos II e IV, a apresentação prova pré-constituída.
Confrontando tais premissas, conclui-se — tendo-se em vista, inclusive, o diálogo das
fontes como instrumento hermenêutico voltado à consecução dos objetivos e direitos
fundamentais e do ideal de justiça que deve imbuir o Estado Democrático de Direito — que
os vetores axiológicos que integram a técnica processual de cognição sumária e antecipatória
de tutela devem prevalecer sobre a aplicação estrita (e inconsequente) do direito posto, que
apenas atenda a formalidades técnicas em detrimento da efetiva prestação jurisdicional (que,
em última análise, visa à proteção de direitos). Tal posicionamento, a despeito de
aparentemente fustigar o sobreprincípio da segurança jurídica, o privilegia. Isto porque
elimina as eventuais dissonâncias — inerentes a inesgotabilidade e heterogeneidade da
atividade legislativa — e consolida a unidade axiológica do sistema jurídico. Desse modo,
como útil técnica processual de distribuição do ônus do tempo do processo, considero
inteiramente cabível o emprego do instituto da tutela provisória, incluindo-se aquela de
evidência, ao procedimento do Mandado de Segurança.
6. Dado o seguinte caso concreto: Gênesis Waves Ltda. obteve liminar em Mandado de
Segurança para suspender a exigibilidade do crédito tributário que posteriormente
foi ―cassada‖ pela sentença de denegação da segurança. Pergunta-se:
Examinando-se o teor da decisão constante no anexo VII, em cotejo com o que dispõe
o art. 1.012, da Lei 13.105/2015 — que determina que a apelação terá efeito suspensivo, salvo
nas hipóteses previstas no § 1º, quando a sentença começará a produzir imediatamente seus
efeitos, dentre as quais aquela descrita no inciso V, respeitante ao provimento judicial que
confirma, concede ou revoga tutela provisória — constata-se, conquanto o decisum date de
momento anterior a edição do CPC/15, haver consonância com o prescrito no § 4º do
dispositivo legal em lume — que prevê a possibilidade de suspensão da eficácia da sentença
8
pelo relator caso o apelante demonstre a probabilidade de provimento do recurso, ou se,
sendo relevante a fundamentação, houver risco de dano grave ou de difícil reparação.
Assim, é imprescindível o estudo das circunstâncias materiais postas sob exame do
Poder Judiciário para que se possa aferir a pertinência do afastamento dos efeitos da sentença
que desconstituiu os efeitos da liminar.
8
CARVALHO, Paulo de Barros. Direito tributário: linguagem e método. 7. ed. rev. São Paulo : Noeses, 2018,
p. 559.
9
Tendo em vista a literalidade do dispositivo legal acima mencionado, e o emprego do
signo linguístico interrompe, poder-se-ia concluir pela impossibilidade de cômputo dos
encargos de mora anteriores aos trinta dias subsequentes à decisão que considerou devido o
tributo. Contudo, há de se considerar que, vigorando a norma individual e concreta
constituidora do crédito, restando superado o prazo para adimplemento espontâneo da exação,
presente estaria o pressuposto jurídico da mora. De tal modo, que melhor seriam atendidos os
contornos dessa hipótese caso propusesse, o legislador ordinário, para o § 2º, art. 63, da Lei
9.430/1996, a suspensão da incidência da multa de mora e não a interrupção.
Como dito na questão 5, alínea ―a‖, a tutela antecipada e a tutela cautelar, embora
conservem o traço comum da provisoriedade, distinguem-se essencialmente quanto a
finalidade: a primeira, de natureza satisfativa, visa — como já enuncia a expressão — à
antecipação os efeitos que adviriam apenas ao termo da ação, com o ato decisório final; a
segunda, de natureza conservativa, destina-se a garantir a eficácia da prestação jurisdicional,
acautelando o resultado útil do processo.
Posto isto, considerando que o emprego das técnicas processuais (re)distributivas do
ônus do tempo do processo, no âmbito tributário, têm como finalidade precípua a salvaguarda
do direito de propriedade frente a pretensão exacional do Estado, percebe-se a prevalência do
caráter conservativo da medida — conquanto costumem coexistir, em graus que variam
conforme as peculiaridades do caso concreto, as funções satisfativa e conservativa.
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