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UNIVERSIDADE FEDERAL DO MARANHÃO

CCH – DEPARTAMENTO DE LETRAS


Disciplina: Fundamentos de Linguística II
Prof Dra.: Glória França.
Equipe: Luciara Dutra Ferreira e Thayze Araujo Alves.

A música como forma de resistência: uma análise de Cálice

A música é uma forma de arte que, entre tantas finalidades, expõe também a visão
do cantor acerca da realidade em que ele vive, como meio de exprimir suas emoções,
angústias e descontentamentos. Concomitantemente, quando pensamos na música
popular brasileira das décadas de 70 e 80, nota-se principalmente o contexto político-
social presente nas canções dos artistas dessa época, assim, em especial, Chico Buarque
e Gilberto Gil compuseram, em 1973, a música Cálice que, devido a seu caráter
confrontante e reivindicador tornou-se um hino atemporal, digno de análise do discurso
nele empregado, visto a semelhança do contexto social da época de produção da música
com o atual. Assim, analisaremos a produção de sentidos nesta música, com base na
Análise de Discurso (AD).
Mas, primeiramente, o que é um discurso para a análise de discurso de linha
francesa?
O discurso nada mais é que a construção de sentidos em um texto, onde os sujeitos
ou sujeito (interlocutores) enunciam a partir do contexto social e histórico em que estão
inseridos. Ou seja, o discurso, levando em conta suas condições de produção é
diretamente afetado pela ideologia de quem discursa. Assim, a AD concebe o sujeito
como um ser dividido entre o consciente e inconsciente, que não diz o que realmente
pensa, mas o que imagina pensar, pois este representa a ideologia do meio em que se
insere.
Outros conceitos importantes para AD como: formação discursiva, memória
discursiva e interdiscurso, também se fazem necessários compreender para a análise aqui
proposta.
Para Pêcheux (1997), principal nome relacionado à Análise de Discurso, a
formação discursiva é o que determina o “que pode ser dito, mas também o que não
deve ser dito e ainda o que pode, mas não convém ser dito”. Ou seja, é aquilo que se pode
ou não dizer dentro de uma dada ideologia e se define pelos interdiscursos. Interdiscurso,
por sua vez, define que nenhum discurso é realmente novo ou inédito, mas sim
“contaminado” por outros, pelo que já foi dito. A memória discursiva é construída pela
repetição dos discursos, é o que restabelece os “implícitos”, outrora citados, ou seja, os
pré-construídos.
Neste sentido, é necessário conhecer o contexto social e político da época em
que a música foi produzida.
Gilberto Gil e Chico Buarque são nomes muito conhecidos no Brasil e fora dele
também, reconhecidos não somente por seus talentos, mas também pelos papéis
desempenhados em um momento denominado como “sombrio” da República Brasileira,
a ditadura militar de 1964. Instaurado em 1 de abril do ano de 1964, esse movimento ficou
conhecido como altamente autoritário e de caráter repressivo, marcado pela censura dos
meios de comunicação que sempre tiveram um papel importante para a formação de
opinião. Neste contexto, para expressar a insatisfação política da época, Chico Buarque e
Gilberto Gil usaram seus discursos de cidadãos no intuito de disseminar seus ideais,
escrevendo assim, a música Cálice, em 1973, entretanto, devido a censura forte da época,
a música só foi lançada 5 anos depois, em 1978.
Analisando-se algumas partes da música percebe-se que o discurso principal
desta, e sustentado veementemente por cada estrofe, é o de protesto. É um grito contra a
repressão e o desejo por uma vida digna, uma realidade social diferente, onde reside os
direitos humanos e direito a vida. Uma vida regida à sua própria maneira, não sendo
impostos valores que não condizem com a ideologia dos indivíduos. Vejamos:
“Pai, afasta de mim esse cálice”
Na primeira frase da música, há uma demonstração de pedido, súplica a um ser
divino. Nota-se a ânsia por uma intervenção para que haja a interrupção do “cale-se”, do
silêncio, da tomada de liberdade. Existe uma sociedade que buscava a libertação e pelo
direito de se expressar, para dizer o que pensa e formular sua própria opinião baseada em
sua ideologia e não aceitar o que lhes era imposto. Analisemos:
“Mesmo calada a boca, resta o peito
Silêncio na cidade não se escuta”
Apesar de não poder expressar-se, era guardado dentro do peito todo o sofrimento
de estar passando por uma ditadura. Sofrimento que machucava constantemente por não
haver opção de saída. O silêncio não é ouvido, não por sua inexistência, mas por opção
por parte da liderança política atuante daquele momento.
Assim, o silêncio aqui é uma forma de resistência. Para a AD, o silêncio também
produz sentido no discurso, o não dizer já é dizer.
“Como é difícil, pai, abrir a porta”
Esse enunciado explicita bem o conceito de sentido para a AD, que não é
transparente, visto que há vários sentidos possíveis para esse verso. Por exemplo, a
imagem de porta pode se referir à uma possível libertação, ou até mesmo ao sentido
denotativo da palavra, em que o sujeito do discurso narra sua luta cotidiana em sair de
casa. Um outro efeito de sentido produzido diz respeito à “porta” na formação discursiva
cristã que faz referência a um novo tempo.
“Quero inventar o meu próprio pecado
Quero morrer do meu próprio veneno”
Nessa estrofe, diferente de todas as outras, há um sujeito que enuncia a partir de
uma formação discursiva esperançosa, em que ele ainda sonha em fazer suas próprias
escolhas, sem censuras, sem repressão, no desejo de viver sob suas próprias regras.
De maneira geral, considerando-se que para a Análise do Discurso, o sujeito é
dividido por um inconsciente, interpelado pela ideologia e constituído por várias vozes
que fazem parte da sua mesma posição social, é evidente nesta canção que os autores
carregam as vozes de várias outras pessoas oprimidas pelo sistema, que, devido ao medo
de mais represálias não puderam expressar-se.
Indo além, segundo Pêcheux (1997), a ideologia fornece o necessário para que
uma palavra ou um enunciado queiram dizer o que realmente dizem, assim, em cálice o
que Chico Buarque e Gilberto Gil dizem faz sentido para quem viveu o mesmo momento
que eles e que compartilharam da sua mesma ideologia.
Assim, na referida canção a memória discursiva se apresenta com a força de um
rompimento, na impossibilidade de dizer. A censura impede, enquanto a música permite,
a fluidez dos sentidos. Os autores da música assumem a posição de sujeitos que enunciam
a partir de uma formação discursiva contestadora. Para isso, os artistas colocam em
evidência as opressões sociais vividas durante o período de repressão da ditadura militar.
Diante disso, é possível compreender que Cálice se inscreve numa formação
ideológica que reivindica a redemocratização e liberdade do povo e do país.
Em resumo, foi possível compreender, pelas condições de produção, que a
formação discursiva em que o sujeito se inscreve é a de protesto, revelando um sujeito
interpelado pela ideologia de liberdade e esperança.
Assim, a música é sim uma forma de arte que serve não apenas para entreter, mas
também para alertar, reivindicar e questionar o sistema. E Cálice é um claro exemplo
disto, uma vez que é uma reflexão individual de toda uma sociedade calada e regida, por
tanto tempo, com apenas uma visão totalitária, sem considerar ao menos, o desejo da
maioria, de uma democracia. É uma canção atemporal, com lições não somente para um
país, mas para toda humanidade, um exemplo do que não deve ser reproduzido e nos
tempos atuais, esperamos que não seja.

REFERÊNCIAS
PÊCHEUX, Michel. Semântica e Discurso: uma crítica à afirmação do óbvio.
Tradução Eni Pulcinelli Orlandi. 3ª Edição. Campinas. SP: Editora da Unicamp. 1997.

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