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Obstipação, encoprese e enurese

Autor(es): Oliva, Mónica


Publicado por: Imprensa da Universidade de Coimbra
URL URI:http://hdl.handle.net/10316.2/43129
persistente:
DOI: DOI:https://doi.org/10.14195/978-989-26-1300-0_28

Accessed : 23-Dec-2019 11:23:42

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IMPRENSA DA UNIVERSIDADE DE COIMBRA
COIMBRA UNIVERSITY PRESS

VOL. II

LIÇÕES DE
PEDIATRIA
GUIOMAR OLIVEIRA
JORGE SARAIVA
COORDENAÇÃO
Capítulo 28.
Obstipação, encoprese e enurese

28
Mónica Oliva
DOI: https://doi.org/10.14195/978-989-26-1300-0_28
CAPÍTULO 28. OBSTIPAÇÃO, ENCOPRESE E ENURESE 89

28.1 OBSTIPAÇÃO E ENCOPRESE


Presença de dois ou mais dos seguintes
critérios, pelo menos durante um mês:
28.1.1 Definições e epidemiologia

1. ≤ duas dejeções / semana (na sanita


A obstipação é uma doença muito preva-
se idade mental ≥ 4 anos);
lente em idade pediátrica, mas frequentemente
2. retenção fecal excessiva ou
subdiagnosticada e tratada de forma pouco efi-
posturas retentivas;
caz. A sua orientação constitui um desafio não
3. dejeções dolorosas ou difíceis;
só para o médico mas também para o doente
4. fezes de grande diâmetro;
e sua família.
5. elevado volume fecal no reto;

A definição de obstipação deve ter em conta


Após controlo do esfíncter, incluir também:
não só as características das fezes (consistência,
6. ≥ um episódio / semana de
frequência das dejeções) mas também sinais/sin-
incontinência fecal;
tomas associados tais como dor, retenção e perda
7. fezes de diâmetro elevado,
de fezes (encoprese ou incontinência fecal).
passiveis de obstruir a sanita.
Segundo os critérios de Roma IV, o diagnós-
tico de obstipação funcional ou seja sem doença
orgânica subjacente, implica a presença de dois
ou mais dos seguintes parâmetros assinalados Quadro 1. Critérios do diagnóstico de obstipação funcional
- Roma IV (2016).
no quadro 1.

Define-se encoprese ou incontinência fe-


cal como a eliminação involuntária ou voluntária O pico de incidência da obstipação ocorre
de fezes em locais inapropriados (roupa interior, entre os dois e os quatro anos, idade do treino
chão,…), em crianças com idade cronológica ou do controlo do esfincter anal.
mental de pelo menos quatro anos e que não
resulta da utilização de fármacos (i.e. laxantes) 28.1.2 Etiologia
ou outra doença que não a obstipação. O tempo
necessário para se fazer o diagnóstico difere con- A grande maioria das obstipações (90 a 95%
soante os critérios utilizados, pelo menos um mês dos casos após o período neonatal) é de natureza
(Roma IV) ou três ou mais meses (Diagnostic and funcional ou seja sem causa orgânica subjacente.
Statistical Manual of Mental Disorders 5 – DMS 5).
As idades-chave para o estabelecimento de
Ao contrário da obstipação na qual não pa- obstipação funcional na criança são a idade do
rece haver predomínio de género em idade pediá- treino do controlo do esfíncter anal, a idade esco-
trica, a encoprese é mais frequente nos rapazes. lar e, mais raramente, na diversificação alimentar
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ou na substituição do leite materno por leite de cuidadores (punição, rejeição,…). Este tipo de
fórmula. incontinência fecal resolve após tratamento da
obstipação.
A idade de controlo do esfíncter anal e de Nos restantes casos, verifica-se uma perda
treino da defecação varia de criança para criança. voluntária de fezes, sem retenção fecal. As fe-
Aos quatro anos, 98% das crianças apresenta zes são de características normais, as perdas são
esta competência pois o desenvolvimento neuro- intermitentes. Está frequentemente associada a
-psico-social atingido, permite-lhes ter a perceção distúrbios de oposição e desafio ou de conduta.
da sensação de defecação, a compreensão da
pressão social para que a dejeção ocorra no local 28.1.3 Fisiopatologia
apropriado, a ativação dos músculos voluntários
envolvidos na continência fecal e a procura do Os clínicos devem estar familiarizados com
bacio/sanita. a fisiopatologia da obstipação funcional, pois só
Uma má experiência no momento de retirar a assim poderão explicá-la à criança e aos pais -
fralda pode determinar obstipação crónica e incon- etapa fundamental para aumentar a adesão ao
tinência fecal subsequente. É importante aguardar tratamento.
pela maturação de cada criança e que este treino
decorra num ambiente tolerante e construtivo. O desencadeante mais frequente da obsti-
pação é uma dejeção dolorosa que pode resultar
As raras causas orgânicas de obstipação po- de fezes muito duras ou de uma fissura anal. Na
derão ser: neuropáticas (doença de Hirschsprung), criança pequena, uma dejeção dolorosa no bacio
anatómicas (ânus anterior), endócrinas (hipotiroi- ou na sanita leva frequentemente à evicção desses
dismo), imunológicas (doença celíaca, alergia às locais. Essa aversão pode ainda dever-se a um
proteínas do leite de vaca), metabólicas (hipercal- treino da defecação prematuro e/ou coercivo.
cémia), entre outros exemplos. Na criança mais velha verifica-se frequentemen-
te indisponibilidade para defecar, ou por querer
Cerca de 90% dos casos de incontinência continuar a brincar, ou por recusa em utilizar
fecal são secundários a obstipação funcional com casas-de-banho fora de casa.
impactação fecal. Nesta situação as fezes elimi- O medo de defecar e o seu adiamento
nadas são habitualmente mais moles e ocorrem conduzem a retenção fecal voluntária, da qual
habitualmente durante o dia. Frequentemente, a resulta estagnação fecal mantida. Estas fezes so-
criança mais velha sente-se envergonhada, evitan- frem reabsorção progressiva de água, adquirindo
do situações em que poderá ficar mais exposta dimensões maiores e tornando-se cada vez mais
como ir a acampamentos ou à escola. O impacte duras. Neste ponto instala-se um ciclo vicioso
negativo causado depende do efeito que tem na que agrava a retenção fecal.
autoestima da criança, do grau de ostracismo A distensão progressiva do reto e das suas
social por parte dos colegas e da atitude dos terminações nervosas leva à perda da sensibilidade
CAPÍTULO 28. OBSTIPAÇÃO, ENCOPRESE E ENURESE 91

Figura 1. Fisiopatologia da obstipação funcional e encoprese. EAI – Esfincter anal interno.


(adaptado de Obstipação e Incontinência Fecal na Criança. Saúde Infantil 2012; 34(1): 25-30)

defecatória. Como consequência, quando se dá o A pesquisa de sinais de alarme visa a exclusão


reflexo de relaxamento do esfíncter anal interno de causas orgânicas.
(em resposta às contrações retais), ocorre fuga
involuntária de fezes. Habitualmente, são fezes Na anamnese, a idade atual da criança e de
mais recentes, pouco consistentes, que passam início das queixas são importantes uma vez que
entre a parede retal e as fezes impactadas (figura há faixas etárias consideradas de risco para o
1). Alguns autores chamam ”soiling” a esta perda aparecimento de obstipação. O início no período
involuntária de fezes líquidas que sujam a roupa neonatal é a favor de causa orgânica.
interior. O padrão de dejeções, isto é, a frequência e
o tipo de fezes (frequentemente volumosas ou em
É muito importante transmitir aos pais que cíbalas) é importante, bem como a presença de
a incontinência fecal no contexto de obstipação retorragias. Na ausência de fissura anal, a presen-
é involuntária, não devendo a criança ser culpa- ça de retorragias representa um sinal de alarme.
bilizada. Os episódios de incontinência fecal devem
ser bem caracterizados, em relação à sua frequên-
28.1.4 Diagnóstico cia, tipo de fezes perdidas e ocorrência de episó-
dios noturnos (sinal de alarme). Os pais devem ser
Na grande maioria dos casos a história clínica questionados sobre possíveis comportamentos de
permite diagnosticar uma obstipação funcional. retenção fecal, nos quais a criança habitualmente
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contrai as nádegas e o pavimento pélvico, faz Muitas crianças com obstipação e encoprese
hiperextensão dos membros inferiores, cruza-os também têm enurese e por vezes refluxo vesico
alternadamente e adota outras posturas bizarras, ureteral, que pode levar a infeções urinárias de
fazendo-o frequentemente longe da vista dos repetição; comorbilidades frequentes mas que po-
adultos. Não é raro os pais interpretarem ”soi- dem indicar causa orgânica. Por outro lado algumas
ling“ como resultado de higiene insuficiente por doenças cursam com obstipação, nomeadamente,
parte da criança; outros interpretam-no como diabetes mellitus, hipotiroidismo, hiperparatiroidismo,
sendo diarreia. paralisia cerebral e neurofibromatose. A realização de
Os principais sinais e sintomas acompanhan- medicação crónica com anticolinérgicos, antiepiléti-
tes da obstipação são: dor abdominal ou à defe- cos, anti-inflamatórios não esteroides, suplementos
cação, distensão abdominal, anorexia, náuseas, de cálcio e ferro também pode estar na origem da
vómitos (se ausência de dejeções há vários dias). obstipação.

Nos antecedentes pessoais é necessário ques- Quanto aos antecedentes familiares, a exis-
tionar sobre a eliminação de mecónio. Perante um tência de obstipação noutros elementos da famí-
atraso (após as primeiras 48 horas de vida), deve-se lia (particularmente na mãe) e de doenças como
suspeitar de oclusão intestinal (atrésia, mal-rotação, hipotiroidismo, doença celíaca e fibrose quística
volvo intestinal), doença de Hirschsprung ou fibrose são relevantes.
quística. Recorde-se que a eliminação de mecónio
ocorre às 24h em 90% dos recém-nascidos de Por último, não esquecer a história psicos-
termo e às 48h em mais de 99%. social, designadamente, alterações no ambiente
A idade em que a criança adquiriu o controlo familiar e/ou escolar, comportamentos de oposi-
de esfíncteres e como decorreu o treino também ção, viagens recentes, suspeita de abuso sexual,
é importante. entre outros.
É fundamental a garantia de que a criança apre-
senta um crescimento estato-ponderal e um desen- O exame objetivo deve ser completo.
volvimento psicomotor adequados. Emagrecimento Distensão abdominal e/ou pregas de desnutrição
ou má progressão ponderal são a favor de causa à inspeção, bem como uma cicatriz de cirurgia
orgânica. prévia, representam sinais de alarme. A inspe-
O conhecimento do tipo de alimentação é par- ção peri-anal revela frequentemente fezes e pode
ticularmente importante: aporte diário de água e mostrar achados que justifiquem a retenção fecal,
fibra, idade de início e cronologia da diversificação como fissura anal (localização habitual às 6/12h)
alimentar, pela possibilidade de no lactente se tratar e anusite infeciosa. Constituem sinais de alarme
de uma obstipação secundária a doença celíaca ou à inspeção peri-anal: ânus anterior, prolapso re-
alergia às proteínas do leite de vaca. tal (obstipação grave, fibrose quística), fístula ou
É importante questionar sobre antecedentes abcesso (doença de Crohn). A inspeção da região
de infeções urinárias e/ou incontinência urinária. sacro-coccígea visa excluir lesões sugestivas de
CAPÍTULO 28. OBSTIPAÇÃO, ENCOPRESE E ENURESE 93

etiologia neurológica (solução de continuidade, A realização de uma radiografia simples do


massa, tufo de pêlos). abdómen para determinar a presença de distensão
A palpação abdominal de crianças com e/ou preenchimento por fezes do cólon é contro-
obstipação revela habitualmente fecalomas na versa, uma vez que não existe correlação entre
fossa ilíaca esquerda e cordão cólico nas im- a imagem radiológica de acumulação de fezes e
pactações fecais mais graves. a clínica de obstipação. Contudo, alguns auto-
A realização de toque retal numa primeira res consideram a possibilidade da sua realização
abordagem é controversa. Este procedimento perante dúvida diagnóstica nas crianças obesas,
adquire maior importância na presença de sinais devido à espessura do panículo adiposo; nas crian-
de alarme, na suspeita de doença orgânica ou ças relutantes à realização do toque retal (fatores
nos casos refratários à terapêutica, após ex- psicológicos, abuso sexual, …) e ainda quando a
plicação à criança e aos pais do seu objetivo. história clínica é sugestiva, mas não existem fezes
O toque retal permite avaliar a sensibilidade palpáveis ao toque retal.
anal, o tónus esfincteriano, o diâmetro retal No caso de atraso na eliminação de mecónio,
e a presença e o tipo de fezes na ampola. é importante excluir doença de Hirschsprung e
Na obstipação funcional é comum o tónus es- fibrose quística. Na suspeita de outra patologia
fincteriano estar ligeiramente diminuído, o reto orgânica, a principal investigação inclui rastreio de
encontrar-se distendido e haver um grande vo- doença celíaca e pesquisa de causas endócrino-
lume de fezes duras na ampola retal. O toque -metabólicas com doseamento sérico de TSH, T4
retal sugere doença de Hirschsprung perante livre, Ca2+ e K+. Um exame imagiológico da coluna
os seguintes achados: tónus muito aumentado, lombossagrada está indicado se houver evidência
ausência de fezes na ampola retal com palpa- de lesão medular.
ção abdominal de fecalomas, saída explosiva
de fezes líquidas e/ou gás após retirada do 28.1.6 Tratamento
dedo do reto.
O exame neurológico é fundamental. Os três grandes objetivos do tratamento são:
A sensibilidade, a força muscular e os reflexos dos desimpactação fecal, prevenção da reacumulação
membros inferiores estão alterados nas patologias de fezes e criação de hábitos intestinais regula-
com envolvimento das raízes sagradas. res. Para atingir estes objetivos recorre-se a três
modalidades complementares: educação, dieta
28.1.5 Exames complementares e fármacos.
de diagnóstico A educação é uma das fases mais impor-
tantes do tratamento da obstipação. Consiste
A história clínica completa permite na grande em desmistificar esta patologia, explicando aos
maioria dos casos excluir causas orgânicas, dispen- pais e, sempre que possível, à criança a sua
sando a necessidade de qualquer meio complementar fisiopatologia, levando-os a compreender que
de diagnóstico. a incontinência fecal é involuntária. O treino
94 MÓNICA OLIVA

intestinal diário consiste em ensinar a criança A desimpactação fecal deve ser realizada
a defecar num horário regular, cinco a dez mi- preferencialmente por via oral, recorrendo em
nutos após duas ou três refeições, aproveitando primeira linha aos laxantes osmóticos. Os laxan-
o reflexo gastro-cólico, relaxadamente e com tes estimulantes podem ser utilizados nos casos
apoio adequado dos pés. Esta medida é impor- refratários ou nos casos de intolerância aos la-
tante para horizontalizar o ângulo ano-retal, xantes osmóticos.
facilitando assim a dejeção. Os laxantes osmóticos orais tais como a lac-
A criança mais velha deve ser incentivada a tulose, o macrogol e o hidróxido de magnésio, têm
registar num diário as suas dejeções e eventuais como principal função aumentar a concentração
episódios de incontinência fecal. Este registo en- de água nas fezes, diminuindo a sua consistência
volve ativamente a criança no processo terapêu- e facilitando a sua eliminação. Não provocam
tico e permite melhor avaliação pelo médico na dependência.
consulta subsequente. Os laxantes estimulantes orais, como o bi-
O reforço positivo das dejeções em local sacodilo e o senne, têm como mecanismo de
apropriado é muito importante, sobretudo na ação o aumento da peristalse intestinal no íleon
criança que está a iniciar o treino da defecação. terminal e no cólon, diminuindo a absorção e
aumentando a secreção de água e eletrólitos
A alimentação destas crianças deve ser pela mucosa do cólon. Os seus principais efeitos
saudável, rica em fibras solúveis e com ingestão adversos são cólicas, melanosis coli reversível
adequada de líquidos. Contudo, o aumento do seu e possibilidade de dependência em uso pro-
consumo para além da dose diária recomendada longado.
não está comprovadamente associado a maior A desimpactação exclusiva por via retal
eficácia do tratamento. deve ser evitada. O uso de microclisteres, su-
positórios e enemas são procedimentos rela-
Em relação à terapêutica farmacológica, a tivamente invasivos, associados a maior risco
desimpactação fecal é normalmente a primeira de iatrogenia e dano psicológico. Têm como
medida necessária antes do início da terapêutica de vantagem permitir uma dejeção num tempo
manutenção, sendo mandatória nos casos em que e espaço adequados, sendo particularmente
existe incontinência fecal. A impactação fecal é úteis nas impactações agudas observadas nos
então definida pela presença de um ou mais dos serviços de urgência.
seguintes aspetos: incontinência fecal, massa dura
localizada nos quadrantes inferiores do abdómen A terapêutica de manutenção visa evitar
durante o exame físico, ampola retal dilatada com a reacumulação de fezes e o reaparecimento de
abundante quantidade de fezes no toque retal e comportamentos de retenção; consiste no uso
quantidade excessiva de fezes no cólon identificada diário de laxantes osmóticos como terapêutica
pela radiografia abdominal, nos casos em que está de primeira linha. O período mínimo de trata-
indicada a sua realização. mento é de dois a três meses, tempo necessário
CAPÍTULO 28. OBSTIPAÇÃO, ENCOPRESE E ENURESE 95

para o reto readquirir o seu diâmetro e sensibi- Mais de metade dos indivíduos seguidos em
lidade habituais. A dose ideal é a que permite a hospitais terciários ficam assintomáticos após um
passagem, pelo menos uma vez por dia, de fezes ano de tratamento e cerca de 65 a 70% depois de
de consistência normal, sem efeitos secundários dois. No entanto, mesmo sob tratamento farma-
relacionados com a dose de fármaco utilizada. cológico e comportamental inicial intensivo, cerca
Os laxantes estimulantes não são habitualmente de um terço das crianças irá manter obstipação
usados como terapêutica diária, contudo podem após cinco anos de seguimento e algumas até
ser utilizados de forma intermitente nos casos após a adolescência. Outro dado importante é
de obstipação grave e refratária, preferencial- que aproximadamente metade das crianças tra-
mente sob a supervisão de gastroenterologista tadas tem uma recidiva nos cinco anos seguintes.
pediátrico. O aparecimento de obstipação antes dos 12 meses
e a presença de incontinência fecal são indicado-
Deve ser explicado aos pais que o processo res de pior prognóstico.
de tratamento é lento (duração habitual superior
a seis meses), caracterizando-se por avanços e 28.1.8 Factos a reter
recuos naturais. Tentativas precoces de suspen-
são farmacológica associam-se a maior taxa de • A obstipação é um diagnóstico com ele-
recidiva. vada prevalência em Pediatria.
• Após o período neonatal 90 a 95% das
Outros tratamentos obstipações são funcionais.
A maioria das crianças e adolescentes com • Em 90% dos casos a encoprese é secun-
obstipação são tratados com as medidas educa- dária à obstipação.
cionais, correção do tipo de alimentação e a te- • A história clínica completa é fundamental
rapêutica convencional previamente descritas. No para o diagnóstico e identificação de si-
entanto, nalgumas crianças o tratamento médico nais de alarme.
é prolongado e pouco eficaz, podendo ser ne- • Raramente são necessários exames com-
cessário intervenção em regime de internamento. plementares de diagnóstico.
Casos refratários poderão ser candidatos a outras • O tratamento deve ser precoce e tem como
modalidades terapêuticas. objetivo a desimpactação, a prevenção da
reacumulação fecal e a criação de hábitos
28.1.7 Prognóstico intestinais regulares.
• A educação da criança e da família, uma
A obstipação e a incontinência fecal, apesar alimentação saudável e o uso de laxantes
de ”benignas“ na sua etiopatogenia e potencial- osmóticos constituem os três pilares do
mente tratáveis, estão associadas a compromisso tratamento.
da qualidade de vida e repercussões sociais im- • O prognóstico depende da eficácia da
portantes. intervenção.
96 MÓNICA OLIVA

28.2 ENURESE após um período de pelo menos seis me-


ses de continência noturna. Está mui-
28.2.1 Definições e epidemiologia tas vezes associada a acontecimentos
ansiogénicos como nascimento de um
À semelhança da obstipação, a enurese é irmão, morte de um familiar próximo,
também um motivo frequente de consulta em divórcio dos pais, mudança de escola,
Pediatria. entre outros.
A criança geralmente adquire o controlo do • Enurese monossintomática: enurese
esfíncter vesical entre os três e os seis anos, ini- numa criança sem qualquer outro sin-
cialmente durante o dia e posteriormente à noite. toma das vias urinárias inferiores e sem
Classicamente consideram-se os cinco anos como história de disfunção vesical.
a idade expectável para a aquisição da continência • Enurese não monossintomática: enure-
urinária noturna. se numa criança com sintomas das vias
urinárias inferiores (aumento/diminuição
A International Children´s Continence Society da frequência miccional, incontinência
define enurese ou enurese noturna como in- diurna, urgência ou hesitação miccional,
continência urinária intermitente durante o sono, polaquiúria, jacto urinário fraco, mano-
numa criança com pelo menos cinco anos. Segundo bras de retenção, sensação de esvazia-
os critérios da DMS-5 esta emissão involuntária e mento incompleto, disúria).
repetida de urina durante o sono, deve ocorrer pelo
menos duas vezes por semana durante três meses Nesta lição iremos abordar apenas a enurese
consecutivos ou causar ansiedade/compromisso noturna monossintomática por ser a forma de
social, não deve ser atribuível a efeito secundário apresentação mais frequente.
de fármaco (i.e. diuréticos, anti psicóticos) ou a
doença (i.e. diabetes, espinha bífida, epilepsia) e A prevalência da enurese depende dos cri-
a criança deverá ter uma idade cronológica ou térios de diagnóstico utilizados. Estima-se que
mental igual ou superior a cinco anos. cerca de 10% das crianças de sete anos, molham
regularmente a cama. Embora a enurese tenda a
A enurese pode ser classificada como pri- desaparecer naturalmente, com uma taxa de re-
mária ou secundária e monossintomática ou não missão espontânea anual de 15%, cerca de 1-2%
monossintomática: permanecerão enuréticos até à idade adulta.
Existe um predomínio no género masculino
• Enurese primária: quando a criança não (1,5-2:1).
teve um período consecutivo de noites Fatores genéticos determinam não só a pro-
secas igual ou superior a seis meses. babilidade de uma criança ter enurese (44% se
• Enurese secundária: quando se verifica a um dos pais foi enurético, 77% se foram os dois)
instalação novamente de noites molhadas mas também a idade da resolução do quadro.
CAPÍTULO 28. OBSTIPAÇÃO, ENCOPRESE E ENURESE 97

Mecanismo Fisiopatologia
monossintomática ou não. É então necessário
Défice noturno de Poliúria noturna
saber a frequência de noites molhadas, o número
vasopressina
Hiperatividade ↓ Capacidade
de episódios/noite e o horário em que ocorrem, a
noturna do detrussor vesical noturna facilidade para despertar com episódios enuréticos
Limiar elevado Não acordam com a ou outros estímulos. A quantidade, o horário e o
de despertar distensão vesical ou com tipo de líquidos ingeridos também é importante
a contração do detrussor
saber. Por exemplo, bebidas com cafeína podem
ter um efeito diurético e causar hiperatividade da
Quadro 2. Mecanismos patogénicos envolvidos na enurese bexiga. A presença de polidipsia e/ou polifagia,
monossintomática.
de alterações do jato urinário, do volume de urina
ou da capacidade de retenção; a presença de in-
continência urinária diurna, de disúria, polaquiúria
28.2.2 Fisiopatologia ou urgência miccional; hematúria ou história de
litíase; obstipação e/ou encoprese; cefaleias, con-
A enurese monossintomática é quase sem- vulsões ou ausências, podem sugerir existência
pre uma situação benigna, explicada por um ou de patologia orgânica.
mais dos mecanismos fisiopatogénicos listados Devem ser identificados fatores predispo-
no quadro 2. nentes como antecedentes familiares de enurese,
características da família, conflitos familiares, nas-
Raramente a enurese pode ser um sintoma cimento de um irmão ou morte de um familiar,
de uma doença orgânica tal como acontece na mudança de escola ou residência, internamento
infeção urinária, nas malformações nefrouroló- recente, entre outros.
gicas, na insuficiência renal, na hipercalciúria, na Deve ser questionado se já foi realizada algu-
diabetes insípida central ou nefrogénica, na dia- ma investigação e/ou terapêutica e os respetivos
betes mellitus, em doenças do sistema nervoso resultados.
central, doenças neurológicas lombossagradas É também necessário avaliar a existência de
ou epilepsia. comorbilidades que podem ter um papel impor-
tante na patogénese e serem responsáveis por
28.2.3 Diagnóstico ausência de resposta à terapêutica instituída.
São exemplo: a obstipação, presente em cerca
Mais uma vez é fundamental realizar uma de um terço dos casos, infeções urinárias de re-
história clinica completa e detalhada. Esta permi- petição (indicador de disfunção vesical), patologia
tir-nos-á fazer o diagnóstico de enurese e identi- do neurodesenvolvimento ou psiquiátrica como
ficar sinais de alarme. perturbação de hiperatividade e défice de aten-
Na anamnese deve ser recolhida informa- ção, ansiedade, depressão; distúrbios do sono
ção que permita classificar a enurese como con- como o síndrome de apneia obstrutiva do sono
tinua ou intermitente, primária ou secundária, e parassónias.
98 MÓNICA OLIVA

Por último é fundamental avaliar como é enurese. Assim é importante analisar a densidade
que a criança e família lidam com este problema urinária (diabetes insípida), glicosúria e cetonúria
(indiferença? vergonha? culpa? castigos? prémios (diabetes melitus), leucocitúria e presença de ni-
pelas noites secas?), a perturbação que causa na tritos (infeção urinária), hematúria e proteinúria
qualidade de vida e no sono de ambos e a atual (doença renal).
motivação de todos. Perante uma enurese não monossintomática,
na suspeita de doença orgânica, ou na ausência
O exame objetivo da criança enurética é de resposta ao tratamento, outros exames po-
habitualmente normal. No entanto este deve ser derão ser necessários e deverão ser solicitados
minucioso para identificar alterações anatómi- caso-a- caso: sumária de urina com sedimento
cas ou neurológicas que possam ser responsáveis urinário e urocultura, ecografia reno-vesical, es-
pela enurese. Deve-se prestar especial atenção à tudo urodinâmico, entre outros.
avaliação do crescimento, da tensão arterial, dos
genitais, da região lombossagrada e efetuar um 28.2.5 Tratamento
exame neurológico. Um atraso estatural pode
acompanhar uma insuficiência renal crónica ou A intervenção deverá iniciar-se pela educa-
outras doenças nefrourológicas que cursam com ção. É necessário explicar à criança e à família o
poliúria. Muitas nefro e uropatias acompanham-se normal funcionamento do trato urinário inferior
de hipertensão arterial. Alterações dos genitais e a patogenia da enurese, salientado que se trata
e da região lombossagrada podem associar-se a de um problema comum que afeta muitas crianças
malformações urológicas. No abdómen, a palpa- e que ninguém é culpado, pelo que a criança não
ção de globo vesical pode indicar obstrução e a deve ser castigada.
presença de fita cólica, obstipação. Alterações da Deverão então ser aconselhadas medi-
marcha, dos reflexos osteotendinosos, da força das comportamentais: assegurar a ingestão
ou tónus muscular dos membros inferiores, da adequada de líquidos durante o dia, limitar o
sensibilidade perineal ou do tónus do esfíncter seu consumo no final do dia e restrição total
anal sugerem patologia neurológica. uma hora antes de deitar; evitar bebidas com
cafeína, alimentos com elevado teor proteico
28.2.4 Exames complementares ou sal; incentivar micções regulares durante o
de diagnóstico dia (quatro a sete/dia) e a última mesmo antes
de deitar. Solicitar o registo das noites secas/
Na avaliação inicial de uma enurese noturna molhadas num calendário. Esta medida tem um
primária monossintomática o único exame neces- efeito psicoterapêutico por si só e permite avaliar
sário é uma análise sumaria de urina ou um teste de forma mais objetiva a resposta às medidas
rápido de urina (tira-teste). Este exame simples, instituídas. Está desaconselhado o uso de fralda
barato e universalmente disponível permite ex- e não é necessário acordar a criança durante a
cluir algumas doenças que podem cursar com noite para urinar.
CAPÍTULO 28. OBSTIPAÇÃO, ENCOPRESE E ENURESE 99

Alguns casos resolvem apenas com esta É a estratégia mais eficaz no tratamento
abordagem. Nesta fase o médico e/ou a família de enurese com uma taxa de sucesso estimada
poderão decidir não progredir na intervenção. em 66 a 70%.

Para além destas medidas gerais, que de- Desmopressina: análogo sintético da vaso-
vem ser instituídas a toda a criança enurética, pressina, diminui a produção noturna de urina e
existem duas opções terapêuticas de primeira por isso é particularmente útil nas crianças com
linha: o alarme e a administração de desmo- poliúria noturna e capacidade vesical normal. Está
pressina. também indicada quando não há motivação para a
Antes dos sete anos não é previsível uma prescrição do alarme ou este não foi eficaz. Cerca
taxa de resposta ao tratamento superior à taxa de de um terço das crianças tem resposta completa e
remissão espontânea da enurese. Contudo este 40% parcial. O potencial de cura é baixo, com uma
pode ser iniciado antes, se o impacte da enurese taxa de recaída elevada. Consoante a formulação
na criança ou na família for negativo. utilizada deverá ser administrado meia a uma hora
Nos casos em que também existem sintomas antes da última micção, ao deitar. É um fármaco
diurnos ou obstipação, estes devem ser tratados seguro, com poucos efeitos secundários, mas se
em primeiro lugar pois poderão ser responsáveis a criança ingerir uma quantidade excessiva de
pela falência do tratamento. líquidos, há risco de intoxicação hídrica, hipona-
trémia e convulsões. Por este motivo recomenda-
Alarme: dispositivo que emite um sinal, -se reduzir a ingestão de líquidos à noite e a sua
habitualmente sonoro, quando o sensor colo- restrição uma hora antes da administração da
cado na roupa interior, humedece. A criança desmopressina e nas oito horas seguintes.
deve acordar com o alarme, ir à sanita terminar
a micção, ajudar na mudança de lençóis e voltar A escolha da terapêutica deve ser discuti-
a aplicar o alarme. Este processo tem que ser da com a família tendo em conta o mecanismo
monitorizado por um adulto para garantir que fisiopatogénico subjacente, as características da
a criança cumpra todos estes passos e simples- criança e a motivação familiar. Perante uma crian-
mente não desligue o alarme e volte a ador- ça com poliúria noturna associada a capacidade
mecer. Pretende-se com este dispositivo criar vesical normal a desmopressina será a melhor
uma resposta condicionada à repleção vesical, opção. Nos outros casos deve-se recomendar o
sendo necessário o seu uso diário. Segundo al- alarme. Na ausência de resposta a um dos trata-
guns autores, o alarme também pode aumentar a mentos deve ser oferecido o outro ou até a sua
capacidade vesical durante a noite. Por requerer associação. Se mesmo assim mantiver enurese
o envolvimento da criança e da família, está ape- é necessário verificar se o tratamento foi feito
nas indicado quando ambos estejam motivados. corretamente, se não se trata de enurese não
É uma boa opção para crianças sem poliúria e monossintomática, que requer outro tipo de in-
com capacidade vesical reduzida. tervenção; se existe alguma comorbilidade como
100 MÓNICA OLIVA

obstipação que deverá ser tratada. Nesta fase, se tratamento a instituir. Permitem ainda identificar
ainda não foi feito, é necessário um diário miccio- famílias pouco motivadas.
nal e pode estar indicada investigação adicional.
O passo terapêutico seguinte será a prescri- Avaliação e orientação das crianças com
ção de um anticolinérgico (terapêutica de segunda enurese secundária devem seguir esta mesma
linha). O fármaco mais utilizado é a oxibutinina, abordagem, tentando identificar e se possível
que atua diminuindo a atividade do detrussor orientar o fator desencadeante.
e aumentando a capacidade vesical. É particu-
larmente útil na enurese não monossintomática 28.2.6 Prognóstico
mas pode ser usada na enurese noturna com
capacidade funcional reduzida, nomeadamente Trata-se habitualmente de uma situação
em associação à desmopressina. benigna, embora uma proporção significativa
A imipramina, um antidepressivo tricí- continue a molhar a cama durante a adolescên-
clico, antigamente muito usada no tratamento cia e alguns até à idade adulta. Este facto pode
da enurese constitui atualmente uma opção de ter um impacte negativo considerável na criança/
terceira linha, a ser utilizada apenas em centros adolescente e na sua família, tornando nestes
diferenciados, tendo em conta o seu potencial casos o tratamento mandatório.
efeito cardiotóxico, podendo ser fatal em caso O efeito negativo depende da limitação que
de intoxicação. causa nas atividades do dia-a-dia (por exemplo
ir dormir a casa de um amigo, ir acampar), da
Eventualmente antes de iniciar o tratamento autoestima da criança, do grau de ostracismo
ou sempre que falhar a primeira opção é útil por parte dos colegas e da forma como os pais
solicitar aos pais e à criança o registo de dados ou cuidadores lidam com esta situação.
objetivos num diário miccional. Durante pelo
menos dois dias deve ser contabilizado o volume 28.2.7 Factos a reter
das micções e de líquidos ingeridos e durante
uma semana registar os episódios de enurese • A enurese é um problema frequente em
(com determinação do volume de urina perdi- idade pediátrica.
do), de incontinência urinária diurna, eventuais • Embora habitualmente benigna, pode
sintomas das vias urinárias inferiores e hábitos causar alterações importantes na auto-
intestinais. -estima da criança e na dinâmica familiar.
Os diários fornecem dados objetivos, ajudam • Os três mecanismos patogénicos envolvi-
a identificar crianças com enurese não monossin- dos são a existência de poliúria noturna,
tomática ou que necessitam de investigação (por hiperatividade do músculo detrussor e um
exemplo com polidipsia), o mecanismo patogéni- limiar de despertar aumentado.
co preponderante (capacidade vesical diminuída • Na avaliação inicial de uma criança com
ou poliúria noturna) e assim escolher o melhor enurese monossintomática recomenda-se
CAPÍTULO 28. OBSTIPAÇÃO, ENCOPRESE E ENURESE 101

uma história clínica dirigida e completa


e uma análise sumária de urina ou tira-
-teste urinária.
• A intervenção inicial passa por estabelecer
hábitos miccionais e de ingestão hídrica
adequados.
• O alarme e a desmopressina são os trata-
mentos de primeira linha. A escolha entre
eles depende do mecanismo patogénico
predominante e do grau de motivação
familiar.

Leitura complementar
Roda J, Rubino G, Lapa P, Oliva M. Obstipação e Incontinência
Fecal na Criança. Saúde Infantil 2012; 34(1): 25-30.
Neveus T, Eggert P, Evans J, et al. Evaluation of and treat-
ment for monosymptomatic enuresis: a standardization
document from the International Children’s Continence
Society. J Urol 2010;183(2): 441-447.
Tabbers MM, DiLorenzo C, Berger MY, et al. Evaluation
and Treatment of Functional Constipation in Infants
and Children: Evidence-Based Recommendations from
ESPGHAN and NASPGHAN. JPGN 2014;58:258-274.
Benninga MA, Nurko S, Faure C, et al. Childhood
Functional Gastrointestinal Disorders:Neonate/Toddler.
Gastroenterology 2016:1443-1455.
Hyman JS, Di Lorenzo C, Saps M, et al. Childhood
Functional Gastrointestinal Disorders:Child/Adolescents.
Gastroenterology 2016;150:1456-1468.
Vande Walle J, Rittig S, Bauer S, et al. Practical consen-
sus guidelines for the management of enuresis.  Eur J
Pediatr 2012;171(6): 971-983.

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