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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO

FACULDADE DE ARQUITETURA E URBANISMO

Felipe Giacomin Gripa


N°USP: 10266792

Rediscutindo a renda da terra:


porquê não existe uma renda fundiária urbana

SÃO PAULO
2019
Introdução

O presente trabalho busca esclarecer o conceito de renda da terra ao


comparar duas noções diferentes sobre o tema, promulgadas por Marx e Lojkine e
aliadas à teoria do valor, a fim de que seja possível entender como estas duas
concepções influenciam na leitura da produção do espaço na cidade
contemporânea.
Ao escrever sobre a renda da terra, Marx focou principalmente em discorrer
sobre a renda que ocorria no campo da agricultura, haja visto que este era de maior
importância à época. O capítulo 46 de o capital livro três propõe uma discussão
sobre a renda dos terrenos para construção e a formação do preço do solo,
entretanto é preciso estudá-lo com minúcia, a fim de não cometer possíveis
equívocos, devido ao fato de que, para Marx, o debate principal sobre a renda
concentrava-se na agricultura.
Enquanto isso, ao discorrer sobre o tema, Lojkine afirma, em contraposição a
Marx, que a renda acontece da mesma maneira em qualquer tipo de produção em
um determinado espaço e diferencia-se somente pela inserção do terreno no
território, isto é, se este localiza-se em uma área urbana ou uma área rural.
A aceitação de Lojkine pela academia teve grande impacto na produção
teórica sobre a renda da terra e até hoje vê-se exemplos disso, como por exemplo o
artigo de Botelho que, da mesma forma que Lojkine, trata a renda como se esta
fosse gerada a partir de sua localização. Após a análise dos três excertos, propõe-se
analisar as consequências adquiridas a partir da posição de Lojkine sobre a renda e
que seguem o pensamento da academia atualmente.
O presente estudo mostra-se relevante para que possa-se avançar nas
pesquisas sobre a produção do espaço, seja ele rural ou urbano, e,
consequentemente compreender as dinâmicas atuantes do modo de produção
capitalista no espaço e, como resultado, o processo de espoliação.
O conceito de renda

Para compreender o conceito de renda, é necessário entender sua inserção


na teoria do valor, isto é, a renda estabelece-se como a solução de um problema
teórico da teoria do valor. A fim de resolver a dialética entre preço e valor, Marx
propunha que, diferentemente dos fisiocratas que afirmavam a terra como elemento
criador do valor, a única forma de criação do valor era por meio do trabalho: as
coisas possuem valor de uso e, pelo emprego do trabalho tal valor é transformado
em valor de troca, ou seja, o preço da mercadoria.

[...]cabe ressaltar a historicidade do valor e reiterar como Marx, que a objetividade do


valor não é algo natural ou a-histórico. Essa objetividade se coloca como fato social próprio
das relações capitalistas de produção sendo reposto na circulação, por meio de relações de
troca que se estruturam a partir de processos sociais produtivos a emergência do valor como
trabalho abstrato.1

A partir disso, a teoria do valor propõe que existam três formas de gerar
mais-valia: 1) lucro, gerado apenas por meio de transações econômicas; 2) renda,
formada quando há um monopólio, a propriedade de algo necessário a algum
processo produtivo; 3) juros, representados pela movimentação de capitais. Devido
às contradições inerentes às relações capitalistas de produção, o preço desta
produção estaria fadado a tornar-se um preço regulador do mercado que verteria os
lucros de todos os capitalistas para um valor médio, significando, portanto, a
perequação da taxa de lucro.
Nesse caso, a renda comportar-se-ia como recurso para extrair mais-valia
acima da taxa de lucro médio:

Onde quer que os recursos naturais possam ser objeto de monopólio


e assegurar ao industrial que os explora um lucro suplementar - ... –
apodera-se desse lucro suplementar, na forma de renda, subtraindo-o do

1
PEREIRA, 2018 p.59
capital ativo, aquele que detém o privilégio de dono desses recursos em
virtude de título de propriedade sobre uma parcela do globo terrestre.2

Logo, ao analisarmos o papel da terra na geração de renda, esta servirá como


elemento para impossibilitar a produção média de mais valia que seria gerada pelo
próprio meio de produção capitalista. Assim, a terra pode ser considerada como um
“impulso à acumulação financeira ao considerar os laços da terra com o capital
fictício se apresentando como ativos instrumentalizados pelas finanças.” ​(PEREIRA,
2018).
Ainda assim é preciso entender o elemento terra segundo a teoria do valor: a
terra, por não ser fruto do trabalho, não possui valor devido ao seu processo de
produção, mas possui um valor representado pelo preço da terra quando
mercantilizada. Tal contradição dá-se por meio do fetiche da mercadoria:

Uma relação social definida, estabelecida entre os homens, assume


a forma fantasmagórica de uma relação entre coisas. Para encontrar uma
símile, temos que recorrer à região nebulosa da crença. Aí, os produtos do
cérebro humano parecem dotados de vida própria, figuras autônomas que
mantêm relações entre si e com os seres humanos. É o que ocorre com os
produtos da mão humana, no mundo das mercadorias. Chamo isto de
fetichismo […].3

Dessa maneira, é atribuído preço à terra, pois a relação social que precifica
aquilo que tem valor pelo trabalho, transforma-se em uma relação entre as coisas,
consolidando o direito a uma renda àquele que possuir a propriedade privada da
terra e transformando esta em um tipo de monopólio. Não é atoa que ao ser inquirido
pela comissão bancária de Londres, o imobiliário Edward Capps afirma que
especialmente nas cidades de grande crescimento, torna-se muito mais lucrativo
especular a renda fundiária do que ​especular o próprio imóvel construído ou
aumentar sua produtividade (MARX, 1998).
Faz-se necessário ressaltar como a utilização da palavra especulação, pelo
imobiliário, pode funcionar como um impedidor ao entendimento do conceito de

2
MARX 1998 p. 887
3
​MARX 1994 p. 81
renda. A especulação a priori significa a simples variação do preço de algo em
função do momento ou lugar, enquanto isso, a renda comporta-se como um modo
de capitalização da mais-valia, ou seja, a reposição de uma pressuposição: ao
compreender os ganhos futuros que determinado monopólio oferece ao proprietário,
este por sua vez transporta-os para o presente, fazendo com que a terra funcione
também como um ativo.
Ao constatar-se de que a terra configura-se como um monopólio e isto causa
um impacto no seu preço mercantilizado, é importante distinguir se é a renda que
gera o preço de monopólio ou se o inverso acontece. A fim de construir-se tal
distinção, é possível separá-la em duas categorias: 1) renda fundiária; 2) renda
imobiliária. A renda fundiária está ligada às qualidades intrínsecas à terra, isto é, a
qualidade do solo, capacidade de estabelecerem-se boas estruturas para as
fundações, grande capacidade para o plantio, ou seja, tudo aquilo que está
relacionado com o processo de produção. Dessa forma, quando algum processo
produtivo consegue ter um lucro extraordinário proveniente da renda fundiária, isso
significa que é a renda da terra que está configurando um preço de monopólio.
Enquanto isso, a renda imobiliária representa a fração de mais-valia capturada
devido ao proprietário do imóvel deter um elemento necessário ao processo de
produção, “o espaço, elemento necessário a toda produção e a toda atividade
humana” ​(MARX, 1998), assim, como a renda imobiliária não se concentra no
processo de produção, e sim na circulação da mercadoria, é justamente o preço de
monopólio que gerará um lucro extraordinário de onde a renda far-se-á presente.
Ao analisar o gráfico abaixo, é possível constatar que um capitalista B, ao
possuir um custo de produção relativamente menor que os de seus concorrentes,
detêm uma renda fundiária que será responsável pelo lucro extraordinário, acima de
média. Da mesma maneira, o capitalista A obtém um lucro extraordinário que não
vem diretamente do custo de produção e sim da circulação da mercadoria, dos
fetiches em torno dela, do espaço que ocupa:
Dessa forma, chega-se a outro fenômeno notável: como os dois tipos de
renda atuam de maneira independente tem-se algo que pode ser chamado de
espiral do capital, isto é, como ambas as rendas se retroalimentam, sua constante
reprodução, junto à fetichização da mercadoria, acaba por sustentar a elevação dos
preços de monopólio, fazendo com que o preço da terra alcance valores
exorbitantes.

Nessa tradicional acumulação, a valorização imobiliária do capital combinava


a valorização pela exploração do trabalho e a capitalização da propriedade que,
desde o último quartel do século XX, vem propiciando maiores rendimentos com
processos espoliativos. Processos que espoliam a sociedade inteira em função das
mudanças regulatórias e das condições gerais urbanas provocando a elevação de
preço da propriedade imobiliária.4

4
PEREIRA, 2018 p. 65
A análise de Lojkine

Jean Lojkine, junto à sociologia urbana francesa nos anos 1970, buscou
compreender as condições pelas quais dava-se a urbanização capitalista. Em seu
artigo, ​Existe uma renda fundiária urbana?,​ investigou como a renda agrícola,
discutida por Marx, poderia ser transposta para os terrenos urbanos. Assim, para
que exista uma renda fundiária são necessário dois elementos: 1) a composição
orgânica do capital deve ser inferior à composição orgânica do capital social médio,
ou seja, uma baixa concentração de capital fixo, alta concentração de capital variável
que resultarão em um lucro acima da média. 2) não obstante o primeiro item, é
necessário aquilo que se comportaria para o capital como um entrave, isto é, a terra
comportar-se-ia como ​“aquilo que cristaliza, que fixa o sobrelucro no setor dado é a
existência de um obstáculo, uma força exterior ao capital que impede a livre
circulação de capitais, logo a equiparação do valor e do preço de
produção”(​ LOKINE, 1979. pp. 81), caso contrário o próprio livre jogo da concorrência
eliminaria o sobrelucro adquirido.

O obstáculo que Marx indicava entre a existência da renda fundiária e a livre


circulação do capital não desapareceu. Foi deslocado da oposição pré-monopolista
entre o capital industrial (agrícola) e a renda fundiária, para a oposição, no interior do
capital monopolista, entre a necessidade de aumentar a massa de mais-valia e a
necessidade de preservar as taxas de lucro.5

Dessa forma, prossegue a discussão em busca desses dois parâmetros em


diferentes formas de apropriação fundiária em regiões urbanas a fim de constatar o
aparecimento de lucros extraordinários. As seguintes formas são elencadas: a) A
renda fundiária urbana existe no nível da construção civil (de imóveis) em terrenos
com este fim; b) A renda fundiária urbana existe, mas sob a forma desvirtuada pouco
importante, na relação entre o proprietário de imóveis residenciais e seus ocupantes
não capitalistas (locatários ou co-proprietários submetidos ao aluguel-venda; c) A

5
LOJKINE, 1979 p.90
locação de fábricas e de áreas não industriais por proprietários fundiários; d) A
locação de equipamentos coletivos urbanos por um proprietário fundiário;
Entretanto, a mera transposição das condições da renda fundiária para a
áreas urbanas não consegue abarcar a complexidade que é a produção imobiliária.
Além disso, diferentemente da produção agrícola, na produção imobiliária a terra é
vendida junto da transação econômica tornando ainda mais difícil uma análise da
renda a partir dessa transposição. Dessa forma a discussão foi conduzida a um
campo cego que impossibilita avanços quanto a teoria da renda.
Com o passar do tempo a terra deixou de comportar-se como um obstáculo à
circulação do capital para instrumentalizar-se e reclamar mais participação da
mais-valia global para si, comportando-se como um ativo. Assim:

[...]impõe que o preço da propriedade imobiliária seja sempre um preço


monopolista: um preço superior ao preço de produção. Será preço sempre (de
monopólio) da terra-mercadoria ou do produto imobiliário que não resulta do preço de
produção mas do valor que representa o preço que alcança sua forma mercantil.6

A partir das constatações de Lojkine:

O setor da construção civil e obras públicas possui, como o setor agrícola,


uma composição orgânica de capital notoriamente inferior à composição média, o que
permite a constituição de um sobrelucro 7

E ao considerar a terra como um entrave à circulação de capitais, Lojkine


apenas toma consciência dos tipos captura de mais-valia que ocorrem no nível da
produção imediata e não considera a ​“força fetichista do aprendizado social
constante que dá sustentação e que potencializa a capitalização da propriedade da
terra” (PEREIRA, 2018, pp. 67), e que, portanto, não considera a renda que ocorre
não na produção mas na circulação do produto imobiliário. Com isso, priva-se da
compreensão de que as diferentes rendas podem atuar independentemente e,

6
PEREIRA, 2018 p. 66
7
LOJKINE, 1979 p. 82
assim, conformar aquilo que é chamado de a espiral do capital, ou seja, a
retroalimentação das rendas que elevam o preço da terra cada vez mais.
Por fim, a partir dessa abordagem, obscurece-se a principal atuação da terra
dentro do mercado imobiliário, o potencial de capturar e transferir mais-valia do
excedente global tanto do mesmo setor quanto de outros setores. Ao analisar-se o
cálculo:

Como a terra, nessa relação não se comporta como capital fixo nem como
capital variável, não há como participar da relação que forma o valor da mercadoria,
ao mesmo tempo que se configura como um valor mercadoria que deve ser
considerado no produto imobiliário final. Dessa forma, a terra não participa no
processo de produção de fato, mas é contribuinte do valor do D’ e, assim:

Nas relações de produção e apropriação privada do imóvel (e do valor) o


fetichismo origina-se da possibilidade da forma-mercadoria terra se impor e
representar parte da massa da mais-valia global, como renda capitalizada.8

8
PEREIRA, 2018 p. 67
A problematização de Botelho

Botelho, ao retomar a teoria da renda proposta por Lojkine e a sociologia


urbana francesa, também busca entender a renda que ocorre na produção
imobiliária por meio de uma transposição da renda fundiária agrícola de Marx.

A renda da terra possui o seu correspondente na cidade, e ainda que nas


aglomerações urbanas a renda fundiária não apareça diretamente, ela está incluída
no aluguel dos escritórios, das moradias etc. ou no preço cobrado pelos imóveis.9

Ao fazer tal constatação, declara que a renda da terra, quando transposta


para a situação urbana, perde seu caráter concreto e torna-se abstrato,
apresentando-se como juros do capital investido. A afirmação pode ser contraditória,
tendo em vista que a terra em nenhum dos dois tipos de produção foi produzida a
partir do trabalho, dessa forma, o preço a ela atribuído seria sempre uma abstração
gerada a partir da naturalização do fetiche da mercadoria. Além disso, a renda da
terra não pode ser confundida com os juros do capital investido, pois relaciona-se
com o lucro, seja durante o processo de produção ou de circulação da mercadoria.
Assim como Lojkine, Botelho considera a terra como um entrave à livre
circulação de capitais, pois quando o capitalista paga uma renda pela utilização da
terra, mobiliza improdutivamente parte do seu capital. Como citado anteriormente, tal
prerrogativa pode ser perigosa ao naturalizar o processo de capitalização da terra
para o setor imobiliário:

[...]a verdadeira dificuldade não está na movimentação de mercadorias, mas


na dos capitais. Porque elas [terras] mesmas não são tratadas como mercadorias
“mas como produtos de capitais que reclamam uma participação na massa global de
mais-valia. Certamente a terra não é capital, mas a sua moderna propriedade
funciona como se fosse capital e, por assumir essa função imposta pelo próprio

9
BOTELHO, 2005 p. 26
capital, não poderia ser considerada como externa ou uma força exterior ao capital
como fez Lojkine.10

Em sua análise, ao retomar as diferentes rendas de Lefebvre, afirma existirem


três fatores que podem alterar o preço de um terreno para construção: 1) renda
diferencial I (renda de situação); renda diferencial II (renda de equipamento); 3)
renda absoluta; 4) renda de monopólio. Com isso, vê-se que Botelho ao dar maior
importância as rendas advindas diretamente do processo de produção, desconsidera
a renda imobiliária da mesma forma que Lojkine. Entretanto, contrariamente a este,
ao discorrer sobre a renda de monopolio, trata-a como algo semelhante aquilo que
pode ser entendido como renda imobiliária:

Trata-se, nesse caso, da segunda natureza que, no meio urbano, dada a sua
complexidade, cria pareas exclusivas nas quais seus consumidores estão dispostos a
pagar uma renda de monopólio para poderem ai se localizar, seja em função do
status que tal localização oide conferir ao seu usuário, seja em função de um aesso
privilegiado às centralidade do urbano.11

Apesar disso, é necessário ressaltar que Botelho, assim como Lojkine, dá à


localização papel de grande importância na extração de mais-valia capitalizada em
forma de renda e, ignorando o fato de que as condições materiais, isto é, o ambiente
construído, e afins, são sempre passíveis de ser reproduzidos, e aquilo que não
consegue ser de fato reproduzido é o monopólio sobre determinado espaço,
naturaliza uma inversão do aprendizado social que, a partir do fetichismo, ​“insere o
mercantilismo imobiliário no bojo da formação dos processos modernos de produção
e de apropriação do produto capitalista de maneira que os resultados parecem
condições prévias e estas, resultados ​(PEREIRA, 2018, pp. 66)”.
Da mesma forma, ao assumir a terra como capital fixo, demonstra novamente
a relação fetichizada:

10
PEREIRA, 2018 p. 67
11
BOTELHO, 2005 p. 27
Assim, a terra e o ambiente construído podem formar parte do capital fixo o
que não os impede de circular como valor. 12

Ao qualificar a terra como capital fixo, atribui a ela valor que não poderia
deter, pois tal valor não é fruto do trabalho. Contrariamente a colocação de Botelho,
“a propriedade da terra terra funciona como um ativo que propicia, acelera e
intensifica os movimentos dos capitais, que se relacionam com o capital fictício
(PEREIRA, 2018, pp. 67).​”
Além disso, é interessante notar que Botelho considera o aluguel como uma
forma de renda capitalizada e, diferentemente de Lojkine não reduz sua importância
dentro das relações geradoras de renda. Distingue, como Engels, que o preço do
aluguel é a soma da renda da terra, do juros do capital investido, de uma quantia
para reparos e seguros e, finalmente, as anuidades que amortizar o capital investido.
Enquanto isso, Lojkine denota desvirtuada e pouco importante a renda advinda da
relação de aluguéis e venda e, consequentemente, obscurece uma relação de
grande importância para a captura de renda na produção capitalista do espaço.
Outrossim, o papel da terra dentro das relações de produção capitalistas seria
identificável como meio de acumulação do capital através da renda e contribuinte
para a contínua reprodução da classe dos que não possuem os meios de
subsistência e que tem de vender a sua força de trabalho para reproduzir-se, isto é,
a diferenciação entre aqueles que possuem a propriedade privada da terra e aqueles
que não a tem. Assim, a propriedade privada da terra possui dupla função para as
relações de produção capitalistas.

12
BOTELHO, 2005 p. 29
Conclusão

Ao realizar uma leitura cuidadosa dos três excertos selecionados, deve-se, na


busca por uma teoria da renda que ajude a compreender a dinâmica da produção
capitalista do espaço, sobrepujar a ideia de uma transposição da renda da terra
agrícola em renda da terra urbana, ocasionada pelo fetiche da mercantilização da
propriedade privada da terra e que implica, de maneira geral, em três pontos cegos:
1) A propriedade da terra não funciona como um entrave à livre circulação de
capitais, e sim comporta-se como um ativo, intensificando as relações de
acumulação junto ao capital fictício. Tomar a terra como um entrave dificulta a
compreensão do surgimento do preço da terra, junto ao d’, na conta: ​D - M … P …
M’ - D’ ; 2) A renda gerada com relação ao processo de circulação da mercadoria
imobiliária, isto é, a renda imobiliária, não deve ser ignorada ou tratada de forma
menos importante. A localização muitas vezes é atribuída pelo senso comum como
principal fator para o elevado preço da terra, entretanto tal atribuição obscurece a
relação da renda gerada pela circulação da mercadoria junto ao fetiche da
mercadoria. Ao tratar da teoria do valor, Harvey reitera:

A formação de valor também não pode ser entendida fora do processo de


circulação que a abriga. A interdependência mútua dentro da totalidade da circulação
do capital é o que importa. No caso do capital, no entanto, o processo aparece não
apenas como autorreprodutivo (cíclico), mas também como autoexpansivo (a forma
espiral da acumulação). Isto é assim porque a busca por lucro e mais-valia
impulsionam as trocas de mercadorias, que, por sua vez, promovem e sustentam a
forma valor. O valor torna-se, assim, uma norma reguladora incorporada na esfera da
troca apenas sob as condições de acumulação do capital.13

Enfim, 3) A propriedade da terra como um meio de captura e transferência de


mais-valia de outros setores de produção. Aliado aos dois últimos fatores, faz-se
necessário inserir o monopólio da terra no meio de produção global capitalista, para

13
HARVEY, 2018 p.259
entender de modo efetivo sua atuação na movimentação de capitais e,
consequentemente, no encarecimento da terra para uso da produção imobiliária: ​“[...]
a questão chave é que o imóvel representa um valor de troca sempre maior e
independente da produção. Essa normalidade seria em função de que o preço de
monopólio se forma com autonomia em relação ao valor[...](​ PEREIRA, 2018, pp.
75).”
Em resumo, reitera-se a importância do estudo da renda da terra e,
principalmente, a especificidade do estudo da renda da terra no setor da produção
imobiliária, a fim de romper com as relações fetichistas entre as coisas, e não entre
as pessoas, que preponderam naturalizadas no cotidiano. A obra coletiva
materializada na construção da cidade, socialmente produzida por um conjunto de
bens imobiliários, públicos e privados, deve colocar em perspectiva a produção do
valor e a retenção de renda a fim de que a cidade do futuro não se concretize como
geradora de novas desigualdades:

A mercantilização e a privatização crescente da cidade acaba por elucidar de


maneira mais clara e importante a contradição urbana. A cidade consagrada como
propriedade passará em última instância a representar um mecanismo re(produtor)
de novas desigualdades, subordinando-se à acumulação capitalista em detrimento a
reprodução da força de trabalho.14

14
RUFINO, 2018 p. 108
Bibliografia

BOTELHO, Adriano. A renda fundiária urbana: uma categoria de análise ainda


válida. São Paulo. 2005

HARVEY, D. A recusa de Marx da teoria do valor. Trad.: Carine Botelho Previatti.


Geousp – Espaço e Tempo (Online), v. 22, n. 1, p. 257-264, mês. 2018. ISSN
2179-0892.

LOJKINE, Jean. Existe uma renda fundiária urbana. Livraria Editora Ciências
Humanas. 1979

MARX, Karl. O Capital: crítica da economia política. 6 vols. Rio de Janeiro: Bertrand,
1994.

MARX, Karl. O Capital: livro 3. Renda dos terrenos para construção.


Civilização Brasileira. 1998.

PEREIRA, Paulo C. Xavier (org). Imediato, global e total na produção do espaço: a


financeirização da cidade de São Paulo no século XXI. São Paulo. 2018.

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