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UFF – UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE

GRAZIELA CUPELLO

Políticas educacionais do Governo Lula: uma perspectiva de gênero

Niterói
2013
UFF – UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE
FACULDADE DE EDUCAÇÃO

GRAZIELA CUPELLO

Políticas educacionais no Brasil: uma perspectiva de gênero

Monografia apresentada ao curso de Pedagogia da


Faculdade de Educação da Universidade Federal
Fluminense, como requisito parcial para a obtenção
do título de Licenciada em Pedagogia.

Orientadora: Prof. Dra. Mariana Paladino

Niterói
2013
AGRADECIMENTOS

À Professora Mariana Paladino, pela paciência em minha orientação e


por me mostrar tantos caminhos durante a minha pesquisa.

À Professora Gelta Terezinha Ramos Xavier, pela atenção, pelos


ensinamentos e incentivos em minha trajetória acadêmica e construção política.

Aos Professores Andréa Serpa, Eliane Arenas, Sergio Aboud, Tereza


Esteban e Paulo Carrano, Andréa Puppin e Edith Frigotto por tantas aprendizagens e
inspirações.

Às Professoras companheiras do Núcleo de Pesquisas e Estudos em


Currículo – NUPEC/UFF.

Aos funcionários da coordenação do curso de pedagogia da Faculdade de


Educação: Carlos, Renata e Régis, pela eficiência, atenção e dedicação.

Aos meus companheiros do Movimento Estudantil e Feminista


verdadeiramente de Esquerda, em especial, da Assembleia Nacional dos Estudantes
Livres (ANEL), do Partido Socialista dos Trabalhadores Unificados (PSTU), do
Movimento Mulheres em Luta (MML) e os independentes que lutam por uma
universidade pública, gratuita, de qualidade e pela revolução da classe trabalhadora.

A minha família de coração Elza Fernandes, Roberta Rauani e Larinha


pelo carinho e por sempre acreditar em minha capacidade para terminar o curso.

Às minhas companheiras de moradia: Caroline Rocha e Rafaella Barreto,


pela convivência carinhosa e a preservação da paz e da tranqüilidade nesta trajetória.

À minha namorada Thaís Conceição de Carvalho Monteiro, pela


presença nos melhores e piores momentos desta caminhada, pelo carinho e acolhida nas
tristezas e felicidades da vida e pela motivação para continuar sempre.

―O pessoal é político‖
Dedico esta monografia à memória de minha mãe :
Ana Maria Cupello. A primeira pedagoga,
professora e feminista que conheci.
RESUMO

Esta pesquisa objetivou descrever e analisar políticas educacionais de gênero


implementadas a nível federal pelo Governo Lula. A metodologia utilizada foi a de
revisão bibliográfica e documental, que possibilitou relacionar políticas educacionais do
período, conceituando gênero e política pública em uma perspectiva sócio-histórica e,
principalmente, observando os movimentos feministas de cada época, abordando suas
conquistas, reivindicações e investigando mudanças na cultura e nas relações sociais
contemporâneas. Foram também foco de análise os avanços e retrocessos sobre questões
de gênero em políticas governamentais, expressa nos currículos, nos sistemas de ensino,
na formação continuada professores, nos livros didáticos, nas produções de
conhecimentos sobre a questão de gênero na Educação Básica e Superior do Brasil.

Palavras-chave: gênero, política, educação, feminismo, currículo.

ABSTRACT

This study aimed to describe and analyze educational gender policies implemented at
the federal level by the Lula government. The methodology used was the literature and
document review, which enabled relate educational policies of the period,
conceptualizing gender and public policy in a socio-historical perspective, and
especially noting the feminist movements of each era, addressing his conquests, claims
and investigating changes in culture and contemporary social relations. Also been the
focus of analysis progress and setbacks on gender issues in government policies,
expressed in curricula, teaching systems, continuing education teachers, in textbooks, in
the production of knowledge on the issue of gender in the Basic Education and Higher
Brazil

Keywords: gender, politics, education, feminism, curriculum.

RESUMEN

Este estudio tuvo como objetivo describir y analizar las políticas de género educativas
implementadas a nivel federal por el gobierno de Lula. La metodología utilizada fue la
literatura y la revisión de documentos, lo que permitió relacionar las políticas educativas
de la época, la conceptualización de género y políticas públicas desde una perspectiva
socio-histórica, y sobre todo tomando nota de los movimientos feministas de cada
época, dirigiéndose a sus conquistas, las reclamaciones y la investigación de los
cambios en la cultura y las relaciones sociales contemporáneas. Asimismo sido el foco
de los avances y retrocesos en el análisis de las cuestiones de género en las políticas del
gobierno, expresada en los planes de estudio, los sistemas de enseñanza, los maestros de
educación continua, en los libros de texto, en la producción de conocimiento en el tema
de género en la educación básica y superior Brasil.

Palabras clave: género, política, educación, feminismo, curriculo


LISTA DE SIGLAS

ABMCJ Associação Brasileira de Mulheres de Carreira Jurídica


AMB Articulação de Mulheres Brasileiras
ANMTR Articulação Nacional de Mulheres Trabalhadoras Rurais
BPW/BRASIL Federação das Associações de Mulheres de Negócios e Profissionais do Brasil
Convenção para a Eliminação de todas as Formas
CEDAW de Discriminação contra as Mulheres
CEFEMEA Centro Feminista de Estudos e Assessoria
CGT Confederação Geral dos Trabalhadores
CLAM Centro latino-americano em sexualidade e direitos humanos
CMB Confederação das Mulheres do Brasil
CNDM Conselho Nacional dos Direitos da Mulher
CNPM Conferência Nacional de Políticas para as Mulheres
CNPQ Conselho Nacional de Ensino e Pesquisa
CNPQ Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico
CNTE Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação
CONAMI Conselho Nacional das Mulheres Indígenas
CONTAG Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura
CONTEE Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação
CPERS Conselho Estadual dos Professores do Estado do Rio Grande do Sul
CPF Cadastro de pessoa física
CUT Central Única dos Trabalhadores
EaD Ensino a Distância
EJA Educação de Jovens e Adultos
ENADE Exame Nacional de Avaliação de Desempenho do Ensino Superior
ENEM Exame Nacional do Ensino Médio
FBPF Federação Brasileira para o Progresso Feminino
FEBF Faculdade de Educação da Baixada Fluminense
FENATRAD Federação Nacional das Trabalhadoras Domésticas
FFP Faculdade de Formação de Professores
FHC Fernando Henrique Cardoso
FIES Fundo de Financiamento Estudantil
FIPE Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas
FNDE Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação
FPA Fundação Perseu Abramo
Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação Básica e de
FUNDEB Valorização dos Profissionais da Educação
IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
IMS Instituto de Medicina Social
INL Instituto Nacional do Livro Didático
LDB Lei de Diretrizes e Bases da Educação
LEIM Liga pela Eamancipação da Mulher
LGBTT lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais
MAMA Movimento Articulado de Mulheres do Amazonas
MEC Ministério da Educação
MMM Marcha Mundial das Mulheres
NAWSA National American Woman‘s Suffrage Association
OAB Ordem dos Advogados do Brasil
ONU Organização das Nações Unidas
PCN Parâmetros Curriculares Nacionais
PNE Plano Nacional de Educação
PNLD Programa Nacional de Livro didático
PNLEM Programa Nacional do Livro Didático do Ensino Médio
PNPM Plano Nacional de Políticas para as Mulheres
PRF Partido Repuplicano Feminino
PRONAF Programa Nacional de Agricultura Familiar
PRONATEC Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego
PSDB Partido da Social Democracia Brasileira
PT Partido dos Trabalhadores
SECAD Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade
SEED Secretaria de Educação a Distância
SENAC Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial
SENAI Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial
SEPM Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres
SEPPIR Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial
SESI Serviço Social da Indústria
SINAES Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior
SNIG Serviço Nacional de Informações de Gênero
UBM União Brasileira de Mulheres
UERJ Universidade Estadual do Rio de Janeiro
UFF Universidade Federal Fluminense
UFFRJ Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro
UFRJ Universidade Federal do Rio de Janeiro
Unesco Organização das Nações Unidas para educação ciência e cultura
Unicef Fundo das Nações Unidas para a Infância
UNIFEM Fundo de Desenvolvimento das Nações Unidas para a Mulher
UNIRIO Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro
SUMÁRIO

INTRODUÇÃO

Conceituando gênero no Brasil........................................................................................10


A importância dos Movimentos Feministas no Brasil.....................................................13
Organização da Monografia............................................................................................17

CAPÍTULO I: Um breve percurso pela história da educação das mulheres no


Brasil

1.1. A educação feminina no Brasil Colonial.............................................................18


1.2. A educação das mulheres no Período Imperial 1822-1889.................................20
1.3. A educação das meninas nos moldes republicanos e patriarcais.........................25
1.4. A luta das mulheres na educação imposta pela Ditadura Militar........................29
1.5. O auge do neoliberalismo na educação brasileira...............................................30

CAPÍTULO II: Políticas educacionais no Governo Lula voltadas para as questões


de gênero

2.1. Uma breve contextualização das lutas por parte da população feminina no início
do século XXI........................................................................................................39
2.2. A organização da luta feminista no final no final do Governo FHC...................41
2. 3. A criação da Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres...........................44
2.4. A I CNPM e a construção e implementação do PNPM........................................47
2.5. Políticas educacionais coordenadas pela SEPM...................................................51
2.5.1. Programas de ação afirmativa para a mulher no âmbito acadêmico....................52
2.5.2. A parceria com o Programa Nacional de Livro Didático (PNLD).......................53
2.5.3. Programa Gênero e Diversidade na Escola..........................................................54
2.5.3.1. Parcerias estabelecidas para o programa...........................................................54
2.5.3.2. Justificativa, metas e fundamentação.................................................................56
2.5.3.3. Seleção de municípios para o projeto piloto.......................................................57
2.5.3.4. Seleção de professores........................................................................................57
2.5.3.5. Desenvolvimento dos módulos...........................................................................58
2.5.3.6. Dados do projeto piloto......................................................................................59
2.5.3.7. Avaliação do projeto-piloto...............................................................................60

Capítulo III – O impacto das políticas de educação e gênero

3.1. O contexto educacional no Brasil após o Governo Lula......................................61


3.2. Políticas educacionais de Gênero e seus reflexos na Educação Básica..............65
3.3. Os reflexos do Programa Nacional do Livro Didático........................................67
3.3.1. Análise dos livros didáticos no Ensino Fundamental..........................................68
3.3.2. Análise dos livros de Ensino Médio....................................................................69
3.3.3. Análise dos livros de Educação de Jovens e Adultos..........................................70
3.4. O impacto das políticas educacionais de gênero no Ensino Superior..................71
3.4.1. Os impactos na pesquisa acadêmica....................................................................71
3.4.2. Sobre o Prêmio Construindo a Igualdade de Gênero...........................................72
3.4.3. Cursos de pós-graduação e disciplinas de graduação..........................................73

CONCLUSÃO................................................................................................................77
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS........................................................................82
Introdução

Estamos no século XXI e até agora pouco foi feito no campo educacional
brasileiro para instrumentalizar crianças e adolescentes para a compreensão do conceito
de gênero, e pior, contribuímos para reforçar as desigualdades, ao invés de caracterizar as
diferenças de uma forma não-sexista, em um cenário comum de convivência entre
homens e mulheres, entre meninos e meninas.

Muito além de uma classificação por sexo biológico, o conceito de gênero,


segundo a historiadora Joan Scott (1995), deverá ser útil enquanto uma categoria de
análise histórica, para compreender as relações sociais construídas sob um paradigma
histórico, social e educacional.

Simone de Beauvoir, em sua obra ―O segundo sexo‖, uma obra


fundamental para a compreensão dos papéis sociais construídos cultural e historicamente,
revela que ―nenhum destino biológico, psíquico, econômico define a forma que a fêmea
humana assume no seio da sociedade‖ (1967, p.9). Constatando, portanto, como os papéis
sociais são impostos e a própria educação formal e informal é padronizada para a
desigualdade em nosso modelo social, não somente no âmbito escolar, como também em
todas as relações sociais. Ainda no ―Segundo Sexo‖, Beauvoir explicita que, baseando-se
em papéis sociais historicamente construídos, os meninos recebem uma educação para
dominar o mundo e organizar a sociedade segundo o patriarcado (id).

Essa educação sexista perdurou e inculcou princípios baseados na


assimetria de gêneros, inclusive o mito de inferioridade natural da mulher para a
aprendizagem, como atestou Rousseau em sua obra, hoje em dia aclamada por inúmeros
pedagogos:

―Na união dos sexos cada qual concorre igualmente para o objetivo
comum, mas não da mesma maneira. Dessa diversidade nasce a
primeira diferença assinalável entre as relações morais de um e de
outro. Um deve ser ativo e forte, o outro passivo e fraco: é necessário
que um queira e possa, basta que o outro resista pouco.‖ (Rousseau,
1992, p. 424)

10
A partir desse princípio misógino e outros, Rousseau, distinguia a
educação dos meninos da educação das meninas e dedicou apenas um capítulo de
―Emílio‖ à educação das meninas, em que advertia sobre as diferenças ―naturais‖ do sexo
e a necessidade curricular que deveria ser construída em virtude dessas desigualdades.
Não é surpreendente que esse autor, assim como outros intelectuais de épocas passadas,
compartilhassem este tipo de pensamento. O que nos faz questionar é como, após tantos
estudos posteriores, esse tipo de mito ainda sobreviva em nossa época atual, mesmo que
veladamente através da educação escolar.

Tendo em conta esta situação e em estreita vinculação com minha


trajetória como acadêmica na pedagogia e militante política nos movimentos feministas,
LGBT e estudantil, me propus investigar as lutas políticas travadas pelos movimentos
feministas e as políticas educacionais referentes à questão de gênero, considerando como
foco central desta monografia as políticas voltadas para a promoção de equidade de
gênero durante o Governo Lula.

Para tanto, numa primeira instância considerei importante estudar as


políticas anteriores, ao longo da história do Brasil, como também, procurar entender
como a cultura e o papel das mulheres modificaram-se do período colonial até os dias de
hoje. Uma tarefa complexa, pois além de estudar a distinção dos papéis sociais de gênero
de cada época, procurei levantar informações sobre as reivindicações das mulheres e as
principais políticas implementadas em cada período.

No caso das políticas públicas educacionais quanto à questão de gênero


prévias ao governo Lula, procurei correlacioná-las com as demandas e reivindicações dos
movimentos da sociedade civil organizada, procurando assinalar confluências,
divergências e conflitos entre elas. Para isso, discuti não somente com a bibliografia
disponível sobre o tema, como também se fez necessário dialogar com documentos
oficiais e dos movimentos sociais, como o caso dos documentos finais das Conferências
das Mulheres e o Plano Nacional de Políticas para as Mulheres. Utilizei também dados
estatísticos do IBGE para compreender o contexto geral da população feminina quanto ao
acesso à educação, entre outros.

Portanto, a metodologia desta monografia se baseou principalmente em


leitura de bibliografia sobre o tema e análise documental. Inicialmente procurei realizar

11
algumas entrevistas com atores relevantes sobre a temática (do âmbito governamental e
não governamental), mas por problemas de agenda e o escasso tempo para
desenvolvimento da pesquisa não foi possível realizá-las, ficando, portanto, o trabalho
baseado em fontes secundárias.

Como esta monografia focará nas políticas públicas educacionais de


gênero, considero importante esclarecer como entendo esse conceito. Tratando-se de um
termo polissêmico e amplamente discutido pelo meio acadêmico, optei por entendê-lo
como ―uma diretriz elaborada para enfrentar um problema público‖ (SECCHI, 2010, p.
3), o que não o restringe a uma legislação ou a um plano governamental, entendendo
assim que outros atores podem formular políticas públicas.

Mesmo compreendendo que o Estado não é o único agente a estabelecer


políticas públicas, como também os movimentos sociais, grupos e organizações da
sociedade civil podem propor e elaborar políticas de interesse público, a pesquisa em
questão foca nas ações do Governo Lula.

Para compreender e analisar as políticas públicas educacionais me apoiei


na obra ―Política Educacional‖ (2004) de Eneida Oto Shiroma, Maria Célia Marcondes de
Moraes e Olinda Evangelista, que traça um panorama sobre os conceitos de políticas
públicas e Estado, mostra como se tornam uma área importante de conhecimento e como
variam seus sentidos não apenas entre os autores, mas também em termos históricos e dos
discursos legítimos de cada época.

Através dessa ideia, entendo as políticas públicas não somente como uma
concessão governamental às demandas da sociedade, como também produto de lutas e
reivindicações de uma sociedade de classes e, fundamentalmente, das classes
subalternizadas que se organizam para contestar o sistema regido pelas classes
dominantes. Nesse sentido, através da história, identificamos os movimentos instituídos
por essas classes e também segmentos sociais que lutam para reivindicar visibilidade,
reconhecimento de suas próprias existências e principalmente, equidade de direitos
legais.

Nancy Stancki da Luz, ao delimitar o conceito de política pública de


gênero, afirma que para se entender o debate sobre a igualdade de gênero é preciso gerar

12
―discriminações positivas‖, ou seja, reconhecer que existem diferenças entre homens e
mulheres. Porém a igualdade de direitos deverá ser garantida, sendo esta premissa
essencial para esclarecer as diferenças entre políticas de gênero e políticas para as
mulheres. Para deixar clara essa diferença me baseio nas formulações da Secretaria
Especial de Políticas para as Mulheres-SEPM:

―Políticas públicas para as mulheres: Políticas com


centralidade no feminino como parte da reprodução social, ou seja, não
priorizam a importância e o significado que se estabelece no
relacionamento entre os sexos. Enfatiza a responsabilidade feminina
pela reprodução social, pela educação dos filhos, pela demanda por
creches, por saúde e outras necessidades que garantam a manutenção e
permanência da família e não necessariamente o empoderamento e
autonomias femininas.
Políticas públicas de gênero: consideram a
diversidade dos processos de socialização de homens e de mulheres,
cujas conseqüências se fazem presentes ao longo da vida nas relações
individual e coletiva. Tais políticas consideram a natureza dos conflitos
e das negociações que são produzidos nas relações interpessoais que se
estabelecem entre homens e mulheres e internamente entre homens ou
entre mulheres.‖ (2009.p. 199, 200) (grifos meus)

Para descrever e analisar as políticas públicas implementadas pela SEPM,


foi necessário pesquisar documentos elaborados pela própria secretaria e pelo Governo
Federal, consistindo em relatórios de ações, como por exemplo, o ―VI Relatório Nacional
Brasileiro‖ apresentado à Convenção para a Eliminação de todas as Formas de
Discriminação contra as Mulheres (CEDAW), a publicação da SEPM ―Memória 2003-
2006‖, o Plano Nacional de Políticas para as Mulheres (PNPM), bem como o seu devido
relatório de implementação.

A importância dos Movimentos Feministas.

Em nosso país, a luta organizada das mulheres teve início ainda no Brasil
Monárquico, passando pela imprensa feminista com Nísia Floresta e pela campanha pelo
sufrágio feminino no século XX, que irei desenvolver no próximo capítulo. Porém, os
estudos de gênero só começaram a ter certa relevância durante a década de oitenta com o
fim da ditadura militar, não que antes com o advento do feminismo na década setenta, as

13
mulheres já contrapunham ao estabelecimento de ações que cerceavam seus direitos,
porém a academia somente começa a se manifestar com a abertura política.

O Movimento Feminista, em sua origem, foi de fato construído por


mulheres de camadas sociais privilegiadas não somente economicamente, como também
intelectualmente. Cabe notar o fato das primeiras feministas serem notadamente mulheres
com formação no ensino superior, advindas das universidades brasileiras e também
estrangeiras. Assim constituíram-se no interior da Academia, os primeiros núcleos e
grupos de estudo e pesquisa.

O primeiro produto acadêmico a abordar a temática das mulheres, de


acordo com Celi Regina Jardim Pinto em ―Uma história do Feminismo no Brasil‖, foi
uma tese de livre-docência defendida por Heleieth Saffioti em 1967 contando com a
orientação de Florestan Fernandes e, após dois anos, foi publicada como livro recebendo
prefácio de Antônio Candido de Melo. A tese de Saffioti foi um marco por seu mérito
acadêmico e também por trazer o tema da opressão feminina para o interior do debate
marxista.

Mesmo no auge da Ditadura Militar, muitos núcleos e grupos de pesquisa


foram surgindo e na década de 70, tiveram apoio de instituições nacionais, internacionais
e organismos multilaterais para o seu amplo desenvolvimento. As fundações, como por
exemplo, a Fundação Carlos Chagas e a Fundação Ford, estabeleceram concursos para a
distribuição de recursos para pesquisas sobre a mulher, fortalecendo com isso, muitos
núcleos e grupos e trazendo à tona, publicações de diferentes vertentes. Uma dessas
publicações foi o Jornal ―Mulherio‖, financiado pela Fundação Ford, que ao surgir em
1981, contava com importantes feministas paulistas em seu corpo editorial e por muitos
anos, foi leitura obrigatória do Movimento Feminista.

Outros espaços de produção acadêmica sobre as temáticas de gênero e


feminismo foram abertos em muitas reuniões anuais de associações nacionais de áreas de
conhecimento, como por exemplo: Associação Nacional de Pesquisa e Pós-graduação
(ANPOCS) e Associação Nacional de Pesquisa em Educação (ANPED). Estes espaços
acabaram por motivar a construção de Grupos de trabalho para estudar e discutir as
questões de gênero na sociedade.

14
Ainda de acordo com Pinto (2003), os projetos de pesquisa apresentados às
fundações para captação de recursos e os trabalhos expostos em reuniões anuais das
associações nacionais são produtos de discussões e abordagens originadas por estudantes
das áreas das ciências humanas. A autora ainda afirma que, diferente do que aconteceu
nos Estados Unidos, havia uma grande dificuldade em institucionalizar os estudos sobre a
mulher e com isso, criar disciplinas, departamentos e programas de pós-graduação.
Mesmo diante da dificuldade, o primeiro núcleo de estudos foi criado em 1982 através da
iniciativa feminista na Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (Tabak, 2002).

Após a década de oitenta, se observa o crescimento de grupos de estudos e


pesquisas acadêmicas, não somente especificamente de gênero, como também os que
incluem as questões de gênero de modo transversal.

Com relação à organização política das mulheres, é importante esclarecer


que não existiu no Brasil um movimento feminista e sim movimentos feministas, liberais,
radicais e interseccionais. A primeira ―onda‖ do feminismo surgiu com a luta do sufrágio
feminino, no qual mulheres burguesas oriundas de famílias mais abastadas se
organizaram para não somente conquistar o direito ao voto, como também para
candidatarem-se a cargos políticos. A segunda ―onda‖ do feminismo, iniciada nos EUA e
Europa a partir da década de sessenta, fundamentada nos princípios de liberdade sexual, a
favor do divórcio e do aborto, por exemplo, somente foi vivenciada no Brasil com a
abertura democrática e fim da Ditadura Militar e se caracterizou, principalmente, pelo
início da reorganização política das mulheres nos espaços públicos e políticos. A
chamada terceira onda do feminismo, se manifesta no país através de organizações não-
governamentais de mulheres, com o objetivo de criar, programar e expandir políticas
públicas governamentais e grupos formados por partidos e correntes de esquerda lutando
por um feminismo anti-capitalista.

Atualmente, acredita-se que muitos movimentos feministas lutam de forma


mais radical contra as omissões governamentais e também compõem o que chamamos de
―terceira onda‖ do feminismo. Estes movimentos, não participam das conferências
convocadas pelo governo e são construídas por partidos políticos de esquerda e
movimentos independentes que reivindicam demandas que superam o perfil
assistencialista das organizações não governamentais financiadas por fundações

15
internacionais e pelo próprio governo e centrais sindicais que compõem os organismos de
controle social.

Essa fase histórica e atual dos movimentos também é marcada por debates
e conflitos entre o feminismo interseccional e o feminismo classista. Para o feminismo
interseccional não há hierarquia de opressões entre as mulheres, todas são oprimidas em
um sistema capitalista, porém de formas diferentes. O feminismo classista por sua vez
tende a hierarquizar as opressões sob as distinções de raça, classe e orientação sexual. Por
exemplo: a mulher negra, lésbica e trabalhadora seria triplamente oprimida, ao contrário
da mulher branca rica, que seria oprimida apenas por ser mulher.

Movimentos de resistência mais radicais de combate à misoginia e à


violência contra a mulher foram fortalecidos e internacionalizados nessas últimas
décadas. A ―Marcha das Vadias‖, por exemplo, é um movimento que surgiu em abril de
2011, na Escola de Direito Osgode Hall, em Toronto, Canadá, quando um policial
durante uma palestra sobre segurança advertiu às mulheres sobre estupro: ―Disseram-me
que eu não deveria dizer isso, mas as mulheres deviam evitar se vestir como vagabundas,
para não se tornar vítimas...‖ (Hashimoto, 2011). A fala do policial foi considerada pelo
Movimento Feminista como um símbolo dos estereótipos e preconceitos sexistas, assim
como do discurso de senso comum que culpabiliza às próprias vítimas da violência por
elas sofrida.

Atualmente a ―Marcha das Vadias‖, que começou com a organização da


passeata das universitárias de Toronto, tem sido difundida para outras cidades do Canadá,
dos Estados Unidos e praticamente todos os países da América Latina, inclusive o Brasil.
Caracteriza-se como um movimento independente dos governos, sendo construído com a
participação de movimentos autônomos, partidos políticos de esquerda, sindicatos e
entidades do movimento estudantil.

Muitas reivindicações do Movimento Feminista e LGBT ultrapassaram as


barreiras institucionais e marcaram presença durante as ―grandes manifestações‖ de junho
de 2013. De acordo com a mídia, os protestos que começaram contra os aumentos de
passagens em transporte público foram apenas o início. Em decorrência vieram protestos
contra a corrupção, a manipulação da mídia burguesa, a precariedade na saúde e na
educação públicas e o combate às opressões, incluído o de gênero.

16
Assim como o movimento Feminista erigiu-se para lutar pela causa da
conquista de espaços para as mulheres, o movimento negro, o movimento LGBT e o
movimento indígena, por exemplo, se organizam para representar e lutar por suas
populações. As demandas específicas e reivindicações levantadas fazem parte de um todo
que é o combate às opressões. Porém no contexto histórico atual, precisam formar seus
próprios movimentos, intelectuais e militantes para intervir e promover a transformação
social necessária.

Organização da monografia

No primeiro capítulo, descreverei as políticas públicas educacionais


anteriores ao Governo Lula, traçando um breve percurso histórico e relacionando tais
políticas com as lutas e demandas das mulheres em diferentes períodos.

No segundo capítulo, apresentarei e discutirei as principais políticas


públicas educacionais de gênero estabelecidas pelo Governo Lula através da Secretaria
Especial de Políticas para as Mulheres em parceria com o Ministério da Educação,
instituições educacionais e organizações da sociedade civil organizada. Serão foco de
análise a Conferência Nacional de Mulheres Brasileiras e a Conferência Nacional de
Políticas para as Mulheres.

No terceiro capítulo, analisarei alguns indicadores para poder compreender


alguns possíveis resultados e impactos das políticas descritas no capítulo anterior.

Por fim, nas conclusões, retomarei alguns dos principais argumentos dos
três primeiros capítulos e apresentarei uma breve análise da educação posterior ao
Governo Lula, considerando avanços e retrocessos nas políticas educacionais de gênero
com relação à discriminação e combate às desigualdades.

17
Capítulo I

Um breve percurso pela história da educação das mulheres no Brasil.

1.1. A educação feminina no Brasil Colonial

Através de fontes históricas no que se referem à educação escolar das


mulheres durante o período colonial e contato que ocorreu praticamente uma exclusão
deste segmento da população quanto ao acesso à escola, situação que permaneceu até o
século XVII. Por exemplo, ao analisar a ação dos jesuítas na instrução dos índios,
(STAMATTO 2002), verifiquei que não houve inclusão das mulheres indígenas nessa
ação.

Podemos perceber após análise, a inexistência de investimentos na área


educacional por parte da metrópole portuguesa, devido à colonização não ter sido
realizada por famílias de colonos e, sim, predominantemente, por populações masculinas
formadas por aventureiros, trabalhadores braçais e até presidiários do Império Português.
Portanto, não havia o interesse desses homens em construir escolas para os filhos de uma
miscigenação forçada à base do estupro de mulheres indígenas e de negras trazidas do
continente africano. Por esse motivo, inclusive, o objetivo da catequese realizada pelos
jesuítas, algum tempo depois, foi meramente para integrar os índios à subserviência da
Metrópole e convertê-los ao cristianismo.

Com a divisão do território colonial em capitanias hereditárias, os


donatários responsáveis por cada capitania tiveram como parte de sua missão outorgada
pelo reino de Portugal, explorar os recursos naturais, como a cana de açúcar, cuidar e
proteger a população de seus territórios. A educação foi predominantemente realizada
pelos jesuítas da Companhia de Jesus, voltada quase que exclusivamente para a
catequização dos indígenas que eram considerados pelos padres ―papeis em branco‖ a
serem preenchidos pelos ensinamentos da doutrina cristã (COLLARES, CORDEIRO,
ZANLOREZI, 2011, p. 6).

Em meados do século XVI, com a instituição da educação jesuítica para os


índios e, de acordo com a cultura patriarcal portuguesa da época, que não incentivava o
ensino escolar das meninas e mulheres, as primeiras tentativas de expandir a educação
escolar às meninas indígenas, partiram dos próprios índios que não vivenciavam a

18
hierarquia de gênero. Segundo Ribeiro (2011), as relações de gênero entre os indígenas
eram igualitárias e sem razões para diferenças de oportunidades educacionais, não
fazendo sentido condenar a mulher ao analfabetismo e à ignorância.

Ainda de acordo com Ribeiro (2001), a idéia da expansão do ensino às


mulheres foi abraçada pelo Padre Manoel de Nóbrega que, atendendo a uma
reivindicação dos índios, com outros padres, escreveu uma carta à Rainha D. Catarina,
solicitando permissão para educar também as meninas e mulheres indígenas na Bahia. Os
jesuítas alegavam que as mulheres indígenas eram mais assíduas às aulas de catequese e,
por esse motivo, mereciam aprender a ler e escrever.

A resposta da metrópole, no entanto, não foi positiva, considerando o


projeto ―ousado‖ para os moldes tradicionais portugueses que deveriam ser impostos ao
Brasil. Estes viabilizavam a participação da mulher apenas para a reprodução e
procriação, não havendo, portanto, motivos para lecionar uma instrução que poderia ser
―perigosa‖ e atentar contra essa ordem (Id, p. 13).

Inclusive, na própria metrópole não havia escolas para meninas, ―apenas


recolhimentos que visavam ao ensino de afazeres domésticos, e a mentalidade era
considerar a instrução feminina como algo supérfluo e mesmo perigoso.‖ (RODRIGUES,
1962, P. 18)

No período monárquico, observamos a proliferação de instituições


educativas, religiosas e de caridade, nas quais as mulheres começaram a ser instruídas.
Um fato recorrente na época, era que as mulheres que não se casavam, para o desespero
dos pais e irmãos responsáveis por suas filhas e irmãs solteiras, eram praticamente
abandonadas em conventos da igreja católica com o fim de não arcar com o sustento
delas. As mulheres de elite em raras exceções se educavam até a idade para casar,
normalmente na adolescência com a ajuda de preceptores.

Para muitas mulheres os abandonos nos conventos e casas de recolhimento


significaram uma chance de obter instrução sem necessariamente seguir uma carreira
religiosa. Assim, muitos estabelecimentos foram fundados durante o período monárquico,
a partir de 1720, para que a ―honra‖ das mulheres que não conseguiam casar estivesse
protegida (STAMATTO, 2002, p.3). Como exemplo, temos o Convento de Santa Teresa

19
em 1742 na cidade do Rio de Janeiro e o Recolhimento da Luz em 1774 em São Paulo,
que atendiam mulheres solteiras da elite e pobres, inclusive escravas que trabalhavam
como servas nos conventos. O ensino ministrado, além de religioso, era composto de
instruções básicas, como: noções de matemática, leitura e escrita.

Com as reformas educacionais do Marquês de Pombal, iniciadas a partir da


expulsão dos jesuítas, a coroa portuguesa tomou várias medidas para controlar a
educação, segundo os seus objetivos. Tornou-se necessário modernizar gradativamente o
Estado brasileiro com a inclusão restrita das mulheres nas salas de aula em escolas régias
específicas para o público feminino. Assim, algumas escolas foram fundadas, abrindo
também um mercado de trabalho para as mulheres como professoras no magistério
público. Medidas de inclusão, como esta, tornaram-se oficiais em todo o país, porém, as
mulheres se responsabilizariam apenas por lecionar para as meninas.

Em 1772, a Reforma Pombalina burocratizou a administração das escolas


através da criação da Diretoria Geral de Estudos, controlando os conteúdos de ensino e
livros didáticos através da Real Mesa Censória e criando um imposto chamado ―subsídio
literário‖, que passou a ser cobrado em todo o país, destinado a pagar os professores e
professoras do magistério público. Com a chegada da Família Real ao Brasil em 1808,
aumentaram os investimentos educacionais para a formação de quadros na administração
e no exército e, com isso, o número de escolas elementares aumentou, tanto para o sexo
masculino quanto para o feminino, porém sem alcançar a maioria da população, atingindo
somente filhas das famílias mais abastadas.

1.2. A educação das mulheres no Período Imperial 1822-1889

Logo após a independência proclamada por D. Pedro I, criou-se a Lei


Geral sobre o ensino primário do país, em 15 de outubro de 1827, ordenando a construção
de escolas elementares por todo o Império e discriminando a aprendizagem das matérias
por gênero. Ou seja, às meninas não caberiam aprendizagens de matérias consideradas
mais racionais como, por exemplo, a geometria, e, sim, as matérias consideradas ―artes
do lar‖, conhecidas também como ―prendas domésticas‖ (STAMATTO, 2002, p. 5).
Mesmo conhecida por seus princípios positivistas e liberais, a instituição dessa legislação
refletia a cultura patriarcal da época colonial.

20
A situação da mulher, mesmo apresentando melhoras com a abertura na
educação escolar e no mercado de trabalho, ainda estava destinada ao casamento e à
reprodução. Afinal, poucas foram as que ao saírem da escola elementar continuaram seus
estudos para seguir uma carreira profissional. A escola ainda era considerada um lugar
em que as meninas aguardariam por seus matrimônios.

A partir desse período, algumas mulheres no campo da política e da


educação e, através da constituição de uma imprensa feminina, começaram a manifestar a
sua insatisfação e reivindicaram uma educação mais igualitária. Inclusive, Nísia Floresta,
uma educadora reconhecida como pioneira do feminismo no Brasil, autora de vários
artigos sobre educação igualitária e livros como ―O Opúsculo Humanitário‖, publicado
em 1853, fundou, em 1838, o Colégio Augusto destinado a educar exclusivamente
meninas. Tal fato causou polêmica e gerou críticas por parte da imprensa na época devido
ao fato de serem os conteúdos curriculares os mesmos das escolas masculinas, o que, na
época era considerado impróprio e inútil para o universo feminino. Segundo a própria
Nísia, a instalação de uma escola para as mulheres era uma necessidade pública, pois, de
acordo com sua própria pesquisa, havia cerca de ―cinquenta e cinco mil estudantes no
Império e apenas oito mil deles eram do sexo feminino‖. (CASTRO, 2010, p.241).

Defendendo que a fundação de uma escola feminina seria uma motivação


para a educação das meninas, Nísia enquadrou-a em um sistema preparatório de mulheres
para as provas do curso normal e uma vez que a legislação proibia mulheres de lecionar
para meninas, muitas encontrariam uma oportunidade de trabalho e criaria precedente
para mudanças na Lei de Instrução Geral.

Observamos um fenômeno que começou no final do século XIX,


culminando em meados de século XX e que se perpetua até a atualidade. Este fenômeno,
teorizado como a ―feminização do magistério‖, contribuiu para mudanças nas relações de
gênero na medida em que gerou abertura no mercado de trabalho para as mulheres.
Vemos isto se delinear com o estabelecimento da Lei Geral de Instrução Pública de 1827:

―Art. 6o Os professores ensinarão a ler, escrever, as quatro operações de


aritmética, prática de quebrados, decimais e proporções, as noções mais
gerais de geometria prática, a gramática de língua nacional, e os
princípios de moral cristã e da doutrina da religião católica e apostólica
romana, proporcionados à compreensão dos meninos; preferindo para as
leituras a Constituição do Império e a História do Brasil.

21
Art. 7o Os que pretenderem ser providos nas cadeiras serão examinados
publicamente perante os Presidentes, em Conselho; e estes proverão o
que for julgado mais digno e darão parte ao Governo para sua legal
nomeação.
Art. 8o Só serão admitidos à oposição e examinados os cidadãos
brasileiros que estiverem no gozo de seus direitos civis e políticos, sem
nota na regularidade de sua conduta. Art. 9o Os
Professores atuais não serão providos nas cadeiras que novamente se
criarem, sem exame de aprovação, na forma do Art. 7 o.
Art. 10. Os Presidentes, em Conselho, ficam autorizados a conceder
uma gratificação anual que não exceda à terça parte do ordenado,
àqueles Professores, que por mais de doze anos de exercício não
interrompido se tiverem distinguido por sua prudência, desvelos, grande
número e aproveitamento de discípulos.
Art. 11. Haverão escolas de meninas nas cidades e vilas mais populosas,
em que os Presidentes em Conselho, julgarem necessário este
estabelecimento.
Art. 12. As Mestras, além do declarado no Art. 6o, com exclusão das
noções de geometria e limitado a instrução de aritmética só as suas
quatro operações, ensinarão também as prendas que servem à economia
doméstica; e serão nomeadas pelos Presidentes em Conselho, aquelas
mulheres, que sendo brasileiras e de reconhecida honestidade, se
mostrarem com mais conhecimento nos exames feitos na forma do Art.
7o.
Art. 13. As Mestras vencerão os mesmos ordenados e gratificações
concedidas aos Mestres.‖ (UNICAMP, sem data, grifos meus)

O fenômeno de feminização do magistério ocorreu devido a vários


processos. Um deles foi a saída do professorado masculino devido à desvalorização da
profissão, frente ao crescimento do capitalismo e da industrialização que inevitavelmente
valorizou profissões que despertavam para a nova realidade econômica do país e,
portanto, observou-se uma migração numerosa de homens para profissões que ofereciam
maiores oportunidades, inclusive de ganhos materiais.

De acordo com Stamatto (2002), esse fator, especificamente, fez com que
a escassez de professores na educação pública e na particular aumentasse
significativamente e, com isso, algumas políticas foram pensadas e aplicadas na formação
e contratação de docentes. Segundo o autor, ocorreu nesse momento um intenso debate
entre parlamentares nas câmaras legislativas sobre o artigo 7° da Lei Geral de Instrução
Pública, que regulava a aplicação de exames admissionais de mestras e mestres na
educação pública. Muitos parlamentares teriam solicitado a dispensa das mulheres desses
exames.

Contudo, graças a essa lei, as mulheres puderam se inserir no magistério.


Entretanto, mesmo prevendo pagamentos iguais aos professores, independentemente do

22
sexo, na prática este procedimento não se aplicava, pois segundo essa lei somente seriam
contratados professores habilitados nas matérias acordadas por concurso na Lei Geral.
Com isso, os governos provinciais poderiam contratar professores que não recebessem
aprovação nos concursos pagando salários menores.

Podemos considerar igualmente que com as diferenças curriculares e de


conteúdos instituída na escola normal e de acordo com o sexo, seria difícil às mulheres
aprenderem de forma igualitária a dos homens e eram raras as vezes que eram aprovadas
no concurso. Por esse motivo, muitas foram contratadas recebendo salário menor.

Considerando a realidade descrita, evidencia-se a desigualdade imperante


no mundo do trabalho na área educacional. Através de uma brecha na legislação, o
Estado encontrou meios para perpetuar as desigualdades. As mulheres conseguiram,
enfim, chegar à esfera pública com oportunidades de ganhos salariais. Entretanto,
mantendo o perfil imposto e marcado por mitos e diferenças de gênero que estabeleciam
o ―dom natural‖ da mulher para o magistério, porém sem capacidades para a supervisão
ou administração de uma escola, apenas para ensinar.

É interessante observar que para tal atividade, as mulheres precisavam


comprovar ―honestidade e bom comportamento público‖, atestado pelo pároco da cidade,
ter certa idade, ser autorizada pelo pai ou pelo marido, no caso de viuvez apresentar
certidão de óbito e em caso de ser separada deveria justificar sua separação comprovando
―comportamento honrado‖ (STAMATTO, 2002, p. 6).

A partir da primeira reforma constitucional em 1834, as primeiras Escolas


Normais começaram a surgir por iniciativas dos governos provinciais que tinham em suas
Assembléias Legislativas locais a responsabilidade de legislar sobre a instrução pública.
Tal tipo de administração dificultou muito a sua sobrevivência, pois não se contava com
recursos do governo central. Além disso, tais instituições baseavam-se no modelo
europeu e tinham por fim servir ao projeto político hegemônico das classes dominantes,
ou seja, contribuir para a consolidação do poder e dos valores dessa classe (TANURI,
2000).

No ano de 1835, ocorreu a fundação da primeira Escola Normal para a


formação de professores na província do Rio de Janeiro pela lei n° 10. Logo depois outras

23
foram criadas, porém, também não duraram muito tempo. De acordo com Tanuri (2000),
a difusão do ensino mútuo e do método Lancasteriano, garantidos através da Lei de
Instrução Geral, não preparava de forma ampla os futuros mestres e somente a partir de
1870, com a propagação de ideais liberais de democratização do ensino, o Ensino Normal
foi fortalecido.

Algum tempo depois, a partir de 1870, o cenário político nacional sofreu


transformações e o advento da república começou a se pronunciar através de movimentos
pela independência inspirados por intelectuais do período. Nesse sentido, novas
idealizações de popularização da educação se manifestaram e as escolas normais
passaram a ser valorizadas a partir dessas iniciativas de formar o cidadão para uma nova
concepção de sociedade. Segundo Tanury (2000, p. 6) ―paralelamente à valorização das
escolas normais, ocorreu também o enriquecimento de seu currículo, ampliação dos
requisitos para ingresso e sua abertura ao elemento feminino‖.

Para justificar a entrada das mulheres no magistério, que serviria para


sanar a escassez de professores homens, reforçaram-se discursos sexistas fundamentados
por teorias de cientistas, como as de Césare Lombroso, que afirmavam existir
características neurológicas inferiores no cérebro feminino em relação ao masculino, mas,
ao mesmo tempo sustentavam a capacidade ―natural‖ da mulher para educar. Essas
teorias influenciaram as leis educacionais da época e juntamente com argumentos
religiosos que defenderam a ideia da mulher como educadora natural e que impunham a
submissão da mulher através da dualidade ―Eva e Maria‖, negavam à mulher uma função
que não fosse a de mãe, como Maria, mãe de Jesus,

De acordo com Stamatto (2002, p.8), durante o Congresso Internacional de


Educação, em Paris, no ano de 1889, um dos representantes brasileiros, Menezes Viera,
diretor da Escola Normal do Rio de Janeiro, se manifestou reafirmando tal discurso, ao
enfatizar na incontestável capacidade da mulher de ensinar como os homens, porém sem
nenhuma habilidade para qualquer outro cargo. A fala de Viera ia ao encontro do
discurso que já há algum tempo se construía no país, de que as mulheres em virtude de
não possuírem habilidades e competências para profissões mais complexas estariam ―por
natureza enquadradas para a educação das crianças, representada como uma atividade de
amor, de entrega e doação‖ (LOURO, 2009, p.450).

24
Em 1881 ocorreu a inauguração da primeira escola reconhecida como
mista em solo brasileiro, reunindo na mesma sala meninos e meninas: o Colégio
Piracicabano, na cidade de Piracicaba no estado de São Paulo. Cabe destacar que essa
escola mista era dirigida por uma ordem metodista e contou inclusive com a primeira
diretora uma mulher, a missionária Martha Hite Watts, o que representou o fim do
―monopólio religioso do catolicismo‖ na educação brasileira e a gestação de uma
educação mais igualitária (STAMATTO, 2002, p. 7).

1.3. A educação das meninas nos moldes republicanos e patriarcais.

A partir de 1889, com a Proclamação da República, o governo começou a


idealizar os primeiros projetos educacionais inspirados nas mudanças radicais que
aconteciam no país, projetos estes que visavam a transformar o cenário constituído por
uma população majoritariamente analfabeta. De acordo com Veiga (2007), dos 14
milhões de habitantes acima de 15 anos de idade, 85% eram analfabetos. Para enfrentar a
situação, o então Presidente da República Marechal Deodoro da Fonseca, como medida
de organização administrativa, criou a pasta da Secretaria de Estado dos Negócios da
Instrução Pública, Correios e Telégrafos, nomeando Benjamin Constant, quem
empreendeu algumas reformas educacionais para garantir a gratuidade e a instrução laica.

Nesse período, foram fundados Institutos Profissionais Femininos, com o


objetivo de formar mão-de-obra para o projeto republicano liberal e positivista do país,
que incluía construir os ideais da modernidade através da educação, sendo primordial
para o país que seus trabalhadores aspirassem galgar posições superiores e se tornassem
política e economicamente ativos. Segundo Câmara (2000), os institutos consolidaram-se
no século 20, baseando-se no ideário escolanovista e no nacionalismo e patriotismo civil.
Assim, incluiu-se nas reformas decorrentes em vários estados brasileiros, a instauração de
uma nova ordem que entendia a educação escolar como principal fonte para o progresso
do país.

Nos institutos profissionais femininos, diferentemente dos institutos


masculinos, além de cursar disciplinas orientadas para o exercício do magistério nos
currículos, estavam presentes disciplinas relativas à economia doméstica e à puericultura.
Por exemplo, eram de frequência obrigatória, disciplinas tais como: oficinas de cozinha,

25
lavagem, engomado, copa, arranjos caseiros, costura e corte, consideradas na época como
próprias do universo feminino.

A instalação dos institutos profissionais femininos durante o período da


primeira república refletia certos avanços nas questões de gênero. Quando o país
vivenciava o ―entusiasmo pela educação‖ e o ―otimismo pedagógico‖, principalmente
após a reforma da instrução pública proposta pelo então Diretor Geral de Instrução
Pública do Distrito Federal, Fernando Azevedo, a partir de 1927. Verifica-se uma
preocupação em transformar o cidadão obsoleto, em um trabalhador a serviço de um
novo Estado liberal e capitalista, incluindo as mulheres que deveriam estar aptas ao novo
sistema, porém sem abdicar de sua ―natureza‖ maternal e doméstica.

O Estado republicano e liberal, apesar de defender um discurso de


modernização e de educação da população, não abriu mão do patriarcado como sistema
de organização social em que homens e mulheres possuem papéis sociais distintos, e por
vezes, desiguais. Para os positivistas da educação, as mulheres deviam se inserir na nova
ordem econômica e deveriam ser formadas para desempenhar um papel para o qual
estavam naturalmente dotadas: o de ser professora/mãe.

No entanto, nas primeiras décadas do século XX, começaram a surgir os


primeiros movimentos organizados de mulheres reivindicando direitos políticos,
conhecidos como ―sufragistas‖. Segundo Pinto, esses movimentos primeiramente
espalharam-se pela Europa e pelos Estados Unidos, ―construindo a primeira vaga de
feminismo organizado no mundo‖ (2003, p.13).

Ainda na República Velha, observa-se que os ideais da modernidade não


atingiam toda a sociedade de maneira igualitária. Com o crescimento da industrialização,
perpetuavam-se as injustiças e as desigualdades sociais, inclusive na educação, que estava
longe do projeto liberal e positivista republicano, e, sim, uma república fundada nas
oligarquias rurais e no federalismo, abrangendo apenas uma parte privilegiada da
população e relegando ao esquecimento as camadas mais pobres da sociedade.

Dentro dos movimentos anarquistas e socialistas, escolas foram fundadas e


administradas por sindicatos da classe operária. As escolas para os filhos de trabalhadores
apresentavam em contraponto ao modelo instituído pelo governo. Uma educação, laica e

26
libertária, que visava a reflexão crítica sobre as desigualdades de classe e de gênero e, por
esse motivo, preocupavam-se com a educação das meninas.

Logo, a sociedade passou a assistir o levante das mulheres, primeiramente


através dos movimentos sufragistas, que lutaram por assegurar espaço na imprensa da
época, organizando grupos e construindo alianças com diversos setores da sociedade. Em
suas reivindicações, estava a conquista do voto das cidadãs brasileiras, sejam eles
constituídos pelo movimento das mulheres anarquistas ou comunistas ou das liberais
lideradas por Bertha Lutz.

Em 1910, após a primeira eleição para a presidência da República em que


se enfrentaram Hermes da Fonseca, um militar representante das oligarquias, e Rui
Barbosa, um dos líderes da campanha civilista a favor da integração de outros setores
sociais. A derrota deste último e a não aprovação do direto ao voto para as mulheres,
provocou um grupo de mulheres fundasse o Partido Republicano Feminino (PRF). Este se
caracterizou como um ―partido político composto por pessoas que não tinham direitos
políticos‖ (PINTO, 2003, p.18) e mesmo assim foram reivindicar igualdade.

A existência do PRF durou menos de dez anos, porém, sua história


significou muito para os movimentos que o sucederam, pela visibilidade alcançada com a
imprensa carioca, pela organização da primeira marcha, que contou com a presença de
cerca de noventa mulheres, sob as lideranças de Leolinda Daltro e Gilka Machado e
principalmente, por não apenas reivindicar o direito ao voto, como também a
independência e emancipação. Esses objetivos ficam claros no regimento do partido:

―2º Pugnar pela emancipação da mulher brasileira,


despertando-lhe o sentimento de independência e de
solidariedade patriótica, exaltando-a pela coragem, pelo talento e pelo
trabalho (...)
4º Pugnar para que sejam consideradas extensivas à mulher as
disposições constitucionais da República dos Estados Unidos do Brasil,
desse modo incorporando-a na sociedade brasileira (...)
7º Combater, pela tribuna e pela imprensa, a bem do
saneamento social, procurando, no Brasil, extinguir toda e qualquer
exploração relativa ao sexo‖.
(Diário Oficial (17/12/1910)

27
Com o fim do PRF, as mulheres na luta pelo voto feminino, conhecidas
também como “sufragettes” (SOIHET, 2000, p. 4) se organizaram em associações
femininas, como a Liga pela Emancipação Intelectual da Mulher (LEIM) e, mais tarde, a
Federação Brasileira para Progresso Feminino (FBPF). Ambas com liderança exercida
por Bertha Lutz quem, em parceria com a líder americana Carrie Chapman Cat,
presidente da National American Woman’s Suffrage Association (Nawsa), estabeleceu as
diretrizes que o Movimento Feminista tomaria na década de 1920.

Durante a Conferência Interamericana de Mulheres, em Baltimore, EUA,


no ano de 1922, pensando ainda na fundação da Federação Brasileira para o Progresso
Feminino, Bertha Lutz elaborou, com a ajuda de Carrie Chapman Cat, o estatuto da nova
instituição que iria substituir a antiga Liga pela Emancipação Intelectual da Mulher, que
incluía a reivindicação por uma educação igualitária para homens e mulheres.

―1. Promover a educação da mulher e elevar o nível de instrução


feminina.
2. Proteger as mães e a infância.
3. Obter garantias legislativas e práticas para o trabalho feminino.
4. Auxiliar as boas iniciativas da mulher e orientá-la na escolha de uma
profissão.
5. Estimular o espírito de sociabilidade e de cooperação entre as
mulheres e interessá-las pelas questões sociais e de alcance público
6. Assegurar à mulher os direitos políticos que a nossa Constituição lhe
confere e prepará-la para o exercício inteligente desses direitos.
7. Estreitar os laços de amizade com os demais países americanos, a fim
de garantir a manutenção perpétua da Paz e da Justiça no Hemisfério
Ocidental.‖
(SOIHET, 1974, p.101)

O Movimento organizado por Bertha Lutz conseguiu, além da aprovação


do sufrágio feminino, conquistar espaços políticos que mais tarde foram importantes para
a construção de políticas educacionais específicas de gênero. Bertha Lutz quando
incorporada à comissão que elaborou o anteprojeto da Constituição de 1934, contribuiu e
monitorou ações para que a concepção de ―cidadão‖, inscrita na carta magna, pudesse ser
ampliada às mulheres na garantia de seus direitos não somente eleitorais, como também
no mundo do trabalho, na saúde, no bem estar e na educação.

Entretanto, foi somente com a luta do feminismo organizado no interior do


Movimento Anarquista e, posteriormente, no Partido Comunista que o princípio
igualitário de educação foi realmente valorizado e reivindicado. A ―terceira vertente do

28
feminismo‖ ou ―feminismo mal-comportado‖ da época (PINTO, 2003, p.15) foi formada
por mulheres trabalhadoras e intelectuais de movimentos de esquerda que defendiam
radicalmente a libertação e emancipação da mulher através da educação e do fim da
exploração do trabalho.

O Movimento Anarquista chegou ao Brasil através dos primeiros


imigrantes italianos e espanhóis que contribuíram para a organização dos movimentos
operários no Brasil. Introduzindo idéias libertárias, estiveram presentes na construção das
primeiras greves e de forma radical, formularam através de uma imprensa anarquista
consolidada, os debates sobre a exploração do capitalismo. Nessa perspectiva de acabar
com a dominação de classe, o feminismo anarquista constituiu-se priorizando o fim da
opressão das mulheres como elemento secundário ao fim de uma luta maior contra a
exploração do capitalismo. O espaço construído pelo Movimento Anarquista foi
determinante para a emancipação política de muitas mulheres que encontraram, sob essas
condições, uma oportunidade de expressar, de ter voz e a mesma ser reconhecida.

Com o passar das décadas, já com a concepção do magistério como espaço


feminino de atuação consolidada, uma nova identidade foi se formando sobre a
professora e a educação brasileira, alimentada cada vez mais por teorias da Psicologia e
da Sociologia. Essas disciplinas contribuíram para que as políticas se dirigissem, além da
formação das educadoras, aos educandos e educandas, tornando-se o foco da educação.
Essa fase permitiu a constituição da imagem de educadoras e educadores como
especialistas do processo de ensino-aprendizagem e, com isso, a profissão alcançou um
novo patamar de valorização de sua profissão.

1.4. A luta das mulheres na educação imposta pela Ditadura Militar.

Com a chegada do regime militar em 1964, instituindo relações sociais a


partir das estruturas da ditadura imposta pelos militares, novas políticas públicas foram
aplicadas concernentes ao controle dos conteúdos ensinados, às atividades culturais e aos
discursos político-pedagógicos da época.

Em um cenário de censura e punição, elaborou-se uma legislação


específica no campo da educação como o Decreto-lei n° 477 de 26 de fevereiro de 1969,
que procurou disciplinar os professores e as professoras em sala de aula e aparelhar

29
burocraticamente as instituições através de publicações que serviam para orientar o
trabalho nas escolas de forma coerente com o regime militar. Inclusive, foram
introduzidas disciplinas com conteúdo reprodutor de valores que o regime queria moldar
e se restringiu à expressão de discursos que não se adequassem ao ideario conservador e
liberal.

Com as reformas educacionais, incluindo as universidades e a educação


básica, os currículos fixaram o ensino de acordo com o projeto econômico e político da
Ditadura Militar. Para isso, regulamentou-se o ensino primário em integração com o
ginasial e o ensino técnico foi integrado ao ensino médio, contando também com a
cooperação do Sistema S (SENAC, SESI e SENAI). A ideia era que este último se
estruturasse com uma parte de formação geral com matérias obrigatórias em nível
nacional e ensino técnico de acordo com as demandas regionais.

Nas universidades, ocorreu durante o regime uma restrição ainda maior de


vagas para o acesso dos alunos. Devido aos princípios e demandas do capitalismo
crescente, após a reforma 5.540/68, foram criadas normas para adequar as pesquisas
acadêmicas às exigências do mercado de trabalho, criando inclusive, cursos de dois anos
de duração.

O professorado, aos poucos, incorporou novas funções dentro do sistema,


que incluíam as tarefas burocráticas de ordem administrativa, além de transformações no
ato de lecionar, os quais exigiriam ações mais tecnicistas, produtivas e eficientes ao
capital em resposta à internacionalização da economia, através do acelerado processo de
industrialização que atravessava o Brasil. Devido a esses fatores e novo cenário, se
construiu um discurso sobre a carreira dos educadores como ―profissionais do ensino‖
(LOURO, 2009, p.473).

Apesar das críticas que possamos fazer a este novo modelo,


paradoxalmente abriu oportunidades para que as mulheres reivindicassem maiores
salários e melhores condições de trabalho para a sua profissão, uma vez que os altos
índices da inflação evidenciaram uma necessidade real das mulheres aumentarem seus
ganhos. Sendo assim, começaram a se organizar como categoria em consonância com
outro fenômeno que começava a se manifestar, o de ―proletarização da categoria
docente.‖ (id, p.474). E, assim, muitas profissionais integraram sindicatos e associações e

30
foram às ruas para protestar contra os baixos salários, através de greves e paralisações,
mesmo sofrendo com a reação violenta do regime militar.

A partir da década de 70, ocorreram diversas conferências internacionais e


o Plano Decenal de Ação e a Década da Mulher, patrocinadas pela Organização das
Nações Unidas (ONU). Em 1975, especificamente aconteceu o Ano da Mulher, segundo
Tabak (2002, p. 2): ―foram todas iniciativas que deram uma contribuição decisiva para
estimular a participação das mulheres, em todos os continentes, na vida política
nacional‖. Porém, isso só foi possível no Brasil após o fim do regime militar.

Na luta pelo fim da ditadura militar e pela redemocratização do Brasil,


diversos segmentos de mulheres, como as profissionais da educação e mulheres de outros
movimentos sindicais começaram a refletir sobre as consequências da desigual divisão
sexual do trabalho e se articularem com o movimento feminista. Este movimento
começou a ser amplamente divulgado através de muitas mulheres: sindicalistas agindo na
clandestinidade, militantes do movimento estudantil e intelectuais que estudaram na
Europa e principalmente nos Estados Unidos. Estas retornaram para fundar organizações
feministas1, objetivando a promoção da cidadania e a educação política das mulheres,
assim como os primeiros grupos de pesquisa acadêmicos.

Em virtude disso, cresceu o número de mulheres eleitas para o Congresso


Nacional, assim como nas câmaras legislativas estaduais e municipais. Assim, as
mulheres se apropriaram dos espaços públicos de participação políticas já existentes,
como também participaram da criação seus próprios espaços de articulação de políticas
públicas.

Esses espaços seriam os órgãos governamentais dedicados à defesa dos


direitos da mulher, como por exemplo, as comissões, as secretarias e os conselhos. Estes,
em especial, serviram não somente para denunciar casos de violência e discriminação,
como também para atentar educacionalmente sobre os graves efeitos da assimetria entre
gêneros, refletidos na permanência dos mesmos papéis sociais para as mulheres, em
virtude dos estereótipos construídos historicamente.

1
Um deles foi o Centro da Mulher Brasileira (CMB), fundado em 1975, por Branca Moreira Alves.

31
Os conselhos se constituiram com um caráter suprapartidário, para
articular, tendo em vista, as possíveis diferenças sociais e políticas, as reivindicações da
população feminina, as demandas dos movimentos sociais e também para monitorar a
aplicação das políticas públicas pelo Estado.

1.5. O auge do neoliberalismo na educação brasileira

Para escrever sobre o período de 1985 a 2002, caracterizado pela


redemocratização e abertura política após a Ditadura Militar, concordo inicialmente com
a ―abordagem multicêntrica‖ de Secchi (2010, p.2-3), que considera outros atores, além
dos estatais, como protagonistas das políticas públicas, ao contrário da ―abordagem
estatal‖ que, por sua vez, reconhece a influência de atores não estatais, porém não lhes
confere a legitimidade no processo de elaboração e liderança no estabelecimento das
políticas públicas.

De acordo com a abordagem multicêntrica, há indícios na análise da


legislação educacional, de certos avanços de fato, avanços esses creditados aos
movimentos sociais, não somente feminista como também, o de movimento de
diversidade sexual e o movimento negro. Infelizmente, as reivindicações dos movimentos
sociais que representavam segmentos considerados ―minorias‖ pela ordem dominante do
neoliberalismo, alcançaram êxito somente no Governo de Luís Inácio Lula da Silva, a
partir de 2003 e principalmente no início de seu primeiro mandato.

Os primeiros governos eleitos por regimes democráticos não conseguiram


atingir nem de perto os ideais de justiça social que se propunham. No que se refere às
políticas para as mulheres, elas foram praticamente inexistentes, com exceção do
Governo Sarney, que promulgou a Lei n° 7.353 em 29 de agosto de 1985, criando o
Conselho Nacional dos Direitos da Mulher (CNDM). Este conselho se caracterizou pela
ampla e movimentada participação de mulheres de vários segmentos da sociedade civil
organizada, mas teve um caráter apenas consultivo e, por este motivo, não houve
assumidamente uma resposta às demandas dos diversos segmentos populacionais.

Além da criação do CNDM, o governo Sarney foi o responsável pela


organização das comissões de elaboração da Constituição de 1988. Em meio às
contradições da influência neoliberal dos organismos multilaterais, a Carta Magna

32
representou avanços no que tange à consolidação de direitos sociais das camadas sociais
mais pobres, com a regulamentação das leis trabalhistas, e o estabelecimento de direitos
previdenciários. Entretanto, sua identidade como política social continuava a representar
significativamente o patriarcado na linguagem exclusivamente masculina:

―Se, por um lado, o masculino genérico por elas empregado expressa


uma forma comum de se manifestar, por outro, seu uso – especialmente
em textos que tratam de direitos – tem um efeito histórico e político. A
adoção exclusiva do masculino reforça a discriminação sexista‖.
(VIANA, UNBEHAUN; 2002. p. 13).

Talvez não nos deva surpreender a pouca atenção dada à questão do


gênero na Constituição Federal, afinal, uma política pública, principalmente no campo
legislativo é reprodução da sociedade, e principalmente, das classes que a dominam.
Mesmo assim, na análise histórica do texto, é possível observar algumas demandas do
Movimento Feminista atendidas pelas leis trabalhistas, como por exemplo, a licença-
maternidade, concedendo licença remunerada às mulheres trabalhadoras em caso de
maternidade.

Um marco interessante na história da luta das mulheres no Brasil foi a


criação em 1989 do Centro Feminista de Estudos e Assessoria (CFEMEA), com a
responsabilidade de atuar junto às esferas legislativas, intermediando a aprovação de
políticas públicas entre o ―campo político e a sociedade organizada‖ (PINTO, p. 98). A
organização, além de intervir através de publicações, foi também articuladora entre
parlamentares formando uma ―Bancada Feminina Suprapartidária‖ (id).

Com a eleição do presidente Fernando Collor de Mello, em 1990, houve a


sanção de cortes orçamentários que atingiram profundamente a política monetária e social
do país, inclusive com a interrupção drástica do Conselho Nacional dos Direitos da
Mulher. O final do governo de Fernando Collor em 1992 colocou em dúvida a recente
competência dos brasileiros para votar, após sofrer um processo de impeachment em que
praticamente toda a população através de seus movimentos sociais, principalmente o
estudantil, comemorava com manifesto dos ―caras-pintadas‖, onde depois de tantos anos
após o fim da ditadura, estudantes foram às ruas com os rostos pintados impedir um
governo que cada vez mais afundava com crises e denúncias de corrupção.

33
Em seguida, Itamar Franco assumiu de forma definitiva a Presidência da
República, e no ano seguinte em 1993, ocorreu o ―Ano da Mulher‖ organizado pela ONU
e os desdobramentos da primeira ―Conferência Mundial de Educação para todos‖,
realizada na cidade de Jomtiem, na Tailândia, com patrocínio da Unesco e do Unicef que
ocorreu em junho de 1990, contando com representantes brasileiros. O Plano Decenal de
Educação para Todos foi um dos desdobramentos da Conferência, que fez com que o
Ministério da Educação (MEC) e do Desporto adequasse as propostas de educação no
país às metas e princípios desse plano. Para isso, precisou contar com o apoio de
representantes dos movimentos sociais para a reformulação e adequação do plano,
inclusive do movimento feminista.

O UNICEF foi pioneiro no cenário internacional ao traçar diretrizes que


combatiam a discriminação contra as mulheres, através do documento ―The Girl Child:
an investment in the future‖, publicado em 1990. Após a adoção pela ONU da Convenção
dos Direitos da Criança, no qual submete a educação das meninas vinculada ao combate à
pobreza e apresenta como argumento o efeito que as mulheres poderiam ter na criação
dos filhos. Com esta ação, surgem recomendações para políticas públicas que alcancem a
temática, como também que os países colaboradores possam investir em pesquisas para
melhoria dos indicadores estatísticos desagregados por sexo.

Em 1995, a Articulação de Mulheres Brasileiras (AMB) preparou-se para


organizar a comissão de mulheres que iriam participar da Conferência Mundial em
Pequim, como uma entidade responsável por organizar a militância de base através de
fóruns estaduais e obteve conquistas importantes durante a Conferência, motivando a
assinatura do governo brasileiro nos tratados internacionais, fato que contribuiria para a
implementação de políticas abrangentes nas temáticas de gênero.

As metas contidas no Plano Decenal da Educação para Todos, elaborado


pela comissão brasileira, reforçou um compromisso com o fim da desigualdade e a favor
da diversidade e pluralidade do país. No decorrer do texto se reafirma o compromisso
com a educação das meninas, destacando aquelas em situação vulnerável:

―Um compromisso efetivo para superar as disparidades educacionais


deve ser assumido. Os grupos excluídos — os pobres; os meninos e
meninas de rua ou trabalhadores; as populações das periferias urbanas e
zonas rurais; os nômades e os trabalhadores migrantes; os povos
indígenas, as minorias étnicas, raciais e linguísticas, os refugiados; os

34
deslocados pela guerra; e os povos submetidos a um regime de
ocupação — não devem sofrer qualquer tipo de discriminação no acesso
às oportunidades educacionais‖ (Plano Decenal da Educação para
Todos, 1993, p. 61).

O governo de Fernando Henrique Cardoso que começou em 1995 e


estendeu-se até 2002 em segundo mandato, foi considerado por muitos intelectuais da
educação como o mais neoliberal, com reformas políticas que visaram a minimizar os
recursos e investimentos na educação, para a adequação eficiente das recomendações dos
organismos multilaterais, com efeito impactante na realidade da população que foi aos
poucos sendo subtraída de seus direitos sociais conquistados com a Constituição de 1988.
Como justificativa às medidas de cerceamento, o Estado divulgou com exaustão nos
meios de comunicação a ideologia produtivista do capital, que em síntese afirmava que o
problema não era falta de investimentos na educação e, sim, o gerenciamento ineficiente
dos recursos.

Considerada umas das principais políticas do período FHC, o Fundo de


Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (FUNDEF), de
acordo com CAIXETA (2002, p. 542) foi ―concebido para disciplinar os recursos
destinados à educação‖ e implementado a partir de janeiro de 1998. A educação seria
valorizada, portanto, com o objetivo de seguir padrões internacionais de eficiência, sendo
o maior princípio definido pela competitividade no mercado de trabalho.

Para garantir a eficiência dos recursos foram criados antes mesmo do


FUNDEF, o Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM), o Sistema Nacional de
Avaliação da Educação Básica (SAEB) e o Exame Nacional de Cursos, conhecido
vulgarmente como Provão. Tais exames, com o surgimento do FUNDEF, estabelecido
pelo então Ministro Paulo Renato de Sousa, seriam aproveitados também como
mecanismos de controle que forneceriam recursos às escolas por mérito, ou seja, as
escolas que atingissem as metas estipuladas receberiam mais recursos.

O movimento neoliberal instaurado no Brasil e na América Latina, já era


realidade em vários países da Europa e também nos Estados Unidos, e tinha como um dos
seus princípios fundamentais, outorgar à educação escolar a responsabilidade da redução
das desigualdades econômicas e sociais. Os investimentos foram limitados à ordem de
técnicos, como por exemplo, do Banco Mundial que instruíram e impuseram ao Brasil

35
suas normas de utilização de recursos em treinamento de professores, informatização,
confecção de material didático, introdução de sistemas de avaliação e assim por diante.

Os recursos, então, foram direcionados conforme a atingir o melhor custo-


benefício, ao invés de investir na valorização de professores da educação pública,
preferiram-se os investimentos em estrutura administrativa, material didático e exames de
desempenho. Sendo assim, a prioridade era acelerar a ―qualidade de ensino‖ sob uma
perspectiva produtivista, alinhada aos resultados dos primeiros Exames Nacionais,
restringindo verbas públicas para os menos eficientes.

Para reforçar essa tendência, a Lei n° 9.394/96 de Diretrizes e Bases da


Educação Nacional, que estava há oito anos em tramitação no congresso, foi resgatada
para aprovação. Em seu texto original representava os anseios dos movimentos sociais,
com discussão amplamente difundida através do Fórum Nacional em Defesa da Escola
Pública. Entretanto não foi aprovada com o texto original e, sim, suprimida por
substitutivo do Senador Darcy Ribeiro, com intervenção do Governo Federal e
coordenação do Ministério da Educação. Quanto à questão de gênero, embora o texto
apresentasse em seu 4° artigo, no inciso IV, uma reivindicação do movimento feminista
de ampliação de creches para crianças de 0 a 6 anos de idade, não garantia de onde viriam
os recursos.

Depois dessa derrota, restava apenas lutar pela aprovação do Plano


Nacional de Educação, que foi amplamente discutido em conferências por representantes
da sociedade civil organizada. Porém, igualmente ao que aconteceu com a LDB, o plano
que foi encaminhado para votação no Congresso Nacional não foi o mesmo que foi
aprovado, sendo substituído pelo PNE formulado pela própria União. Ainda assim, o
PNE aprovado trouxe referências às questões de gênero sobre o livro didático e expôs
certa preocupação com a reprodução dos estereótipos das mulheres, negros e indígenas.
Também, no que tange ao ensino superior, recomendou tópicos para a formação docente
concernentes com a diversidade cultural, tolerância religiosa, educação sexual e gênero.

Em 1995, o Ministério da Educação elaborou um projeto para a discussão


dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN), que enviou para professores de todos os
níveis e especialistas em educação para avaliação. No retorno, algumas questões foram
incluídas e modificadas através de pareceres. Os PCN serviriam para orientar os

36
currículos nas escolas, não como diretriz obrigatória e, sim, como recomendações para
atentar aos conhecimentos observáveis.

A estrutura dos PCN, publicado dois anos depois em 1997, se compunha


de 10 volumes: o primeiro seria somente a introdução, seis volumes para matérias
obrigatórias, um sobre meio ambiente e saúde, mais um sobre temas transversais, ética e
por último sobre pluralidade cultural e orientação sexual. Essa estrutura evidencia um
marco nas políticas públicas educacionais nas questões de gênero e de diversidade
cultural. Além da estrutura, os princípios a que se destinam os PCN também serviriam de
eixo para as práticas de ensino-aprendizagem em sala de aula.

Entretanto, analisando o conteúdo publicado, verificamos algumas


inconsistências no tratamento do tema que contradizem algumas questões. Por exemplo,
na justificativa, apenas as famílias são mencionadas como reivindicadoras devido ao
crescente número de casos de gravidez indesejada entre adolescentes e de contaminação
pelo vírus HIV. O texto ainda cita uma pesquisa realizada pelo Instituto Data Folha em
10 capitais brasileiras, e aponta que 86% de pessoas se mostraram favoráveis à inclusão
da orientação sexual nos currículos escolares, ou seja, não menciona as reivindicações
dos Movimentos Feministas já apresentados.

Outra questão que caberia questionar é a proposta de exercício do tema


como transversal e não como matéria obrigatória nos currículos, pois, com isso, há
apenas recomendações didáticas, cabendo ou não aos professores seguirem-nas. Porém, o
texto afirma ser necessário ao educador ―ter acesso à formação específica‖ (PCN, 1997,
p. 303). Na publicação, existe ainda um ―bloco de conteúdo‖ referente às relações de
gênero que consegue formular teoricamente as diferenças entre sexo e gênero e
assimetrias de gênero e também consegue formular propostas didáticas para professores
trabalharem o tema em matérias como, por exemplo, história, geografia e ciências. Outro
aspecto a questionar é a falta de menção ao tratamento das identidades e orientações
sexuais, como a questão da homossexualidade, por exemplo.

Após esse breve percurso histórico, em que procurei destacar as políticas


públicas educacionais voltadas para as mulheres, com ênfase nas reivindicações e lutas da
sociedade civil organizada, pretendo no próximo capítulo focar nas políticas do governo

37
do Presidente Luís Inácio Lula da Silva, por considerar o período mais propício às
questões de gênero que desejo evidenciar.

38
Capítulo II

Políticas educacionais no Governo Lula voltadas para as questões de gênero

Neste capítulo analisarei as políticas educacionais brasileiras com foco na


perspectiva de gênero, estabelecidas durante o Governo Lula, em exercício desde o dia
primeiro de janeiro de 2003 até primeiro de janeiro de 2010. O período também chamado
―Era Lula‖, iniciou com um primeiro mandato após a vitória nas eleições de 2002, em
segundo turno contra o adversário político e ex-ministro da saúde do Governo Fernando
Henrique Cardoso, José Serra e continuou em um segundo mandato após sua reeleição
em 2006 ao disputar à presidência contra o então governador do estado de São Paulo,
Geraldo Alckmin.

A posse de Luiz Inácio Lula da Silva significou um avanço setores


organizados como esquerda no país, principalmente para o Partido dos Trabalhadores,
que pela primeira vez chegava ao poder executivo com apoio de diferentes setores
econômicos e sociais, tendo inclusive o apoio da maioria da população brasileira que
parecia almejar um governo voltado para as classes menos favorecidas da sociedade.
Mesmo que muitas políticas econômicas realizadas durante o Governo de Lula
assemelhem-se ao Governo neoliberal de FHC, são, neste período, notadamente que são
estabelecidas as políticas reivindicadas pelos movimentos sociais étnico-raciais, de
diversidade sexual e das mulheres.

Antes de analisar as políticas do Governo Lula, irei contextualizar


brevemente o cenário social da população feminina se estabelece anterior ao período
mencionado, sabendo ser necessário verificar as necessidades e as demandas do
movimento político organizado, como também das mulheres em geral.

2.1. Uma breve contextualização das lutas por parte da população feminina no
início do século XXI

É notadamente no início do século XXI, que se observam mudanças


culturais, alavancadas por fatores econômicos e sociais e por avanços estratégicos dos
movimentos sociais, que perpassam o cenário político.

39
A pesquisa ―A mulher brasileira nos espaços públicos e privados‖ (FPB,
2004) realizada pela Fundação Perseu Abramo (FPA) em parceria com a Secretaria
Nacional de Mulheres do Partido dos Trabalhadores (PT) em outubro de 2001, divulga
não somente dados sobre as mulheres utilizando recortes de raça/etnia, idade, moradia,
situação econômica, profissional e escolaridade, como também, revela conhecimentos
adquiridos pela população feminina no que tange aos seus direitos fundamentais e à
crítica do machismo e do patriarcado. De acordo com a metodologia da pesquisa, foram
entrevistadas 2.502 mulheres distribuídas geograficamente em 187 municípios de 24
estados de área urbanas e rurais, com idade a partir de 15 anos. Segundo os dados obtidos
―forma um amplo retrato de como vivem e o que pensam 61,5 milhões de brasileiras‖
(FPB, 2004, p. 15). A abordagem foi realizada através de questionários estruturados
aplicados exclusivamente por pesquisadoras em entrevistas pessoais e domiciliares.

Da análise dos dados educacionais apresentados na pesquisa, conclui-se


que dois terços das mulheres não possuíam Ensino Fundamental completo e a situação
tornava-se ainda mais desigual quando considerado o recorte racial e a situação das
moradoras das áreas rurais. Um exemplo encontra-se nas mulheres que chegam ao Ensino
Superior: no total, 7% atingiam o terceiro grau em inícios do S. XXI, mas essa
percentagem subia a 9% se apenas se considerava a população identificada como brancas
e baixava a 2% considerando as identificadas como negras e a 1% das que moram no
campo (FPB, 2004, p.16-17).

Dentre as questões presentes na pesquisa, as mulheres foram perguntadas


sobre o que seria ―ser mulher‖ na atualidade e suas respostas revelam alguma
conscientização sobre temas como discriminação e desigualdade no mercado de trabalho,
desejo de independência econômica e social, no que tange ao poder de decisão sobre a
própria vida.

Essas respostas refletem a existência de mudanças culturais na sociedade,


pois mostram que os antigos modelos sexistas que atribuíam às mulheres uma
participação restrita ao âmbito do privado têm em certa medida sido ultrapassados E
também, refletem ações de um Movimento Feminista, considerado por Margareth Rago
como ―a única revolução que realmente vingou no século XX‖. (RAGO, 2004, p. 33)

40
A seguir, caracterizarei brevemente a organização política das mulheres no
período pré-eleitoral que antecede a eleição de Luiz Inácio Lula da Silva, pois foi a partir
deste que o movimento de mulheres passou a vislumbrar novas oportunidades de avanços
nas questões de gênero e na luta por igualdade entre homens e mulheres.

2.2. A organização da luta feminista no final no final do Governo FHC

De acordo com Costa (2010), que cita Sônia Álvarez, existiu no início do
século XXI uma conjuntura internacional propícia para a aceitação das lutas do
Movimento Feminista. Isto ficava evidente nas Conferências Mundiais de Mulheres onde
se reivindicavam políticas públicas.

Um aspecto importante a destacar foi o processo de diversificação do


Movimento Feminista manifestado na Conferência Mundial de Beijing:

―o processo de Beijing possibilitou a ampliação dos espaços e lugares


de atuação das auto-identificadas feministas com a incorporação e
visibilidade de outras identidades feministas: o feminismo negro, o
indígena, governamentais, o das profissionais das ONGs, o das
católicas, o das sindicalistas, isto é, mulheres feministas que não
limitam sua atividade às organizações do feminismo autônomo. Essa
heterogeneidade de práticas pôs em destaque a reconfiguração da
própria identidade política feminista latino-americana cristalizada na
década de 1970 e princípio dos anos 1980, demonstrando o caráter
plural, multicultural e pluriético destes feminismos.‖ (COSTA, apud
ÁLVAREZ, 2010, p. 68)

Outro fato histórico significativo para os movimentos sociais no início do


século XXI foi a construção da ―Plataforma Feminista‖ durante a Conferência Nacional
de Mulheres Brasileiras, realizada em Brasília nos dias 6 e 7 de Junho de 2002. Esta
estabeleceu uma série de princípios e diretrizes para os candidatos e candidatas das
eleições para a Presidência da República e para os Governos Estaduais.

Assim como a plataforma, a conferência mesmo contando com atores


governamentais foi organizada integralmente por representações da sociedade civil. Entre
as redes exclusivamente feministas estavam a Articulação de Mulheres Brasileiras e a
União Brasileira de Mulheres. Entre as redes de feminismo negro e étnico participou a
Articulação de ONGs de Mulheres Negras Brasileiras. Participaram também, a Secretaria
Nacional de Mulheres do Partido Socialista Brasileiro, a Articulação Nacional de
Mulheres Trabalhadoras Rurais, a Secretaria para Assuntos da Mulher Trabalhadora da

41
CONTEE, a Comissão Nacional sobre a Mulher Trabalhadora da CUT, a Rede de
Mulheres no Rádio, a Rede Nacional de Parteiras Tradicionais e a Rede Nacional
Feminista de Saúde, Direitos Sexuais e Direitos Reprodutivos.

A Plataforma Feminista foi construída através da mobilização de 5.200


ativistas reunidas em 26 conferências estaduais ocorridas entre os meses de maio e março
de 2002 e logo depois foi rediscutida e concluída durante a Conferência Nacional de
Mulheres Brasileiras no mês de junho do mesmo ano. De acordo com o texto de
apresentação, a plataforma seria o documento representativo do Movimento de Mulheres
brasileiro por trazer em seus princípios as reivindicações e demandas para os candidatos
às disputas eleitorais. Nos cinco capítulos em que se estrutura a plataforma, realizaram-se
duras críticas ao sistema capitalista neoliberal, ao Estado Mínimo instituído durante o
Governo FHC e se afirmaram princípios feministas, assim como se apresentaram as
demandas nas áreas da saúde, educação, meio ambiente, economia, violência e moradia.

―Com a Plataforma Política Feminista, os movimentos de mulheres


reafirmam seu potencial de contestação, mobilização e elaboração
política e, estrategicamente, posicionam coletivamente os conteúdos de
seus discursos plurais frente ao contexto político brasileiro, reafirmando
sua autonomia de pensamento, projeto e ação. Em um ano eleitoral, de
disputas acirradas, é da maior importância que a Conferência Nacional e
a Plataforma Feminista tenham se tornado a expressão de um conjunto
relevante das mulheres brasileiras que integram diversos movimentos
sociais, afirmando também a diversidade e a capacidade de aliança entre
feministas‖ (PLATAFORMA, 2002 p.7).

A educação na perspectiva abordada pela plataforma apresenta-se


tematicamente como reivindicação de política pública, no sentido de garantir a
universalidade e a equidade no ―acesso ao ensino de qualidade‖, porém, não informa
sobre o conceito de qualidade que visa atingir. Há reivindicações sobre a formação
continuada de professores, através da reorganização do currículo, devendo abranger
questões afirmativas sobre gênero, raça/etnia e geração.

Dentre as reivindicações, há também pontuações determinantes sobre a


democratização das universidades, educação inclusiva para pessoas com deficiência,
garantia de recursos públicos para a merenda escolar e para a inclusão de questões
ambientais no currículo de forma transversal, como também reivindica o
desenvolvimento de projetos dirigidos à juventude e à garantia dos direitos humanos.

42
Ainda reinvindica que o Estado e a iniciativa privada assegurem, especialmente entre as
mulheres, a erradicação do analfabetismo.

Com relação à educação sexual, o texto apresenta desafios em que


estabelece a reformulação e fortalecimento de programas escolares como medida ―para
superar a visão biologizante e determinista‖ sobre a temática da sexualidade,
contemplando também a ―historicidade das relações de gênero‖. A proposta ainda confere
investimentos na capacitação de jovens, professores e outros profissionais da educação de
todos os níveis para o melhor tratamento da temática na prática educativa.

Sobre a cultura, os desafios pautados pela Plataforma Feminista, abordam


a necessidade de transformação de modelos fundamentados no patriarcado e da promoção
de ―uma cultura de respeito à diversidade, fundada na valorização dos direitos humanos
universais e da solidariedade e na afirmação do direito à diferença e à eqüidade,
combatendo a dominação patriarcal, o racismo, a xenofobia, o sexismo e todas as formas
de discriminação.‖ (PLATAFORMA, 2002, p.52).

Segundo Costa (2009), a Plataforma Feminista foi entregue aos candidatos


antes das eleições presidenciais e governamentais do ano de 2002 e divulgada pela
imprensa, além de servir como ―o parâmetro norteador das lutas feministas‖ (COSTA,
2009, p. 73).

Com a vitória de Luís Inácio Lula da Silva, se iniciam políticas afirmativas


para as minorias e, este em um dos seus primeiros atos, institui a Secretaria Especial de
Políticas para as Mulheres. O documento de criação da SPM ressalta o caráter de
prioridade do Governo Lula para combater as desigualdades: ―Ao assumir o Governo, em
2003, o Presidente Lula deixou claro para toda a nação que o combate às desigualdades
seria prioridade em sua gestão.‖ (SEPM, p.8. 2006). O texto reconhece a cooperação do
Conselho Nacional dos Direitos da Mulher (CNDM) da Bancada Feminina na esfera
legislativa e destaca um ―reconhecimento especial‖ aos ―movimentos feministas e de
mulheres do Brasil‖ (id, p.10).

Entretanto, apesar do considerável avanço político que torna visíveis as


questões de gênero nas políticas públicas, abrindo espaço governamental e definindo
recursos financeiros para as ações, verifica-se certo distanciamento da Plataforma

43
Feminista e do próprio movimento de mulheres na época. Tal situação reflete-se na
própria escolha das ministras nomeadas para a SPM que, de acordo com Costa (2009), o
presidente Lula as indicou à revelia do movimento feminista: primeiro, a senadora petista
Emilia Fernandes e, logo depois, a ex-reitora da Universidade Estadual do Rio de Janeiro
(UERJ) Nilcéa Freire, ambas sem qualquer ligação com o movimento.

A pesquisa de documentos disponíveis no site da secretaria, não permitiu


entender de que forma desenvolveu-se a participação dos movimentos de mulheres na
realização do conjunto de ações que a SPM abrangeu. Não existe especificação sobre tal
aspecto.

2. 3. A criação da Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres

De acordo com as informações do site governamental, a Secretaria


Nacional de Política para as Mulheres foi criada em 28 de maio de 2003, em caráter de
prioridade, de acordo com a lei 10.683 que ―dispõe sobre a organização da Presidência da
República e dos Ministérios, e dá outras providências‖.

A lei citada foi aprovada para organizar o governo recém-instituído do


presidente Lula, dando continuidade ao funcionamento de ministérios e secretarias já
existentes e, providenciando a criação de novas secretarias vinculadas diretamente à
Presidência da República, dentre elas, a SEPM

Esta é a forma como se estruturam as secretarias:

―§ 3º Integram ainda a Presidência da República:


I - a Controladoria-Geral da União;
II - a Secretaria Especial do Conselho de Desenvolvimento Econômico
e Social;
III - a Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres;
IV - a Secretaria Especial de Aqüicultura e Pesca;
V - a Secretaria ―Especial dos Direitos Humanos‖.

As competências da nova SPM, por sua vez são definidas no artigo 22:

―Art. 22. À Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres compete


assessorar direta e imediatamente o Presidente da República na
formulação, coordenação e articulação de políticas para as mulheres,
bem como elaborar e implementar campanhas educativas e
antidiscriminatórias de caráter nacional, elaborar o planejamento de
gênero que contribua na ação do governo federal e demais esferas de

44
governo, com vistas na promoção da igualdade, articular, promover e
executar programas de cooperação com organismos nacionais e
internacionais, públicos e privados, voltados à implementação de
políticas para as mulheres, promover o acompanhamento da
implementação de legislação de ação afirmativa e definição de ações
públicas que visem ao cumprimento dos acordos, convenções e planos
de ação assinados pelo Brasil, nos aspectos relativos à igualdade entre
mulheres e homens e de combate à discriminação, tendo como estrutura
básica o Conselho Nacional dos Direitos da Mulher, o Gabinete e até
três Subsecretarias.‖

A Lei 10.683, de 28 de maio de 2003, não explicita quais seriam as


subsecretarias da SEPM. O Decreto 4.625, de 21 de março de 2003, portanto anterior à
lei, ao contrário, deliberava sobre as competências e a estrutura organizacional da
Secretaria:

―CAPÍTULO II
DA ESTRUTURA ORGANIZACIONAL
Art. 2º A Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres tem a
seguinte estrutura organizacional:
I - órgão de assistência direta e imediata ao Secretário Especial:
Gabinete;
II - órgãos específicos singulares:
a) Subsecretaria de Planejamento de Políticas para as Mulheres;
b) Subsecretaria de Monitoramento de Programas e Ações Temáticas;
c) Subsecretaria de Articulação Institucional;
III - órgão colegiado: Conselho Nacional dos Direitos da Mulher -
CNDM.‖

O CNDM, órgão colegiado vinculado à SEPM, passou a funcionar com


uma composição extensa que abrangia além de representantes de 13 ministérios, 20
representantes da sociedade civil organizada, e três mulheres com ―notório conhecimento
das questões de gênero‖. Rose Marie Muraro, Clara Charf e Albertina de Oliveira Costa
(MEMÓRIA, 2006, p.20).

As organizações da sociedade civil representadas no CNDM são:

―Articulação de Mulheres Brasileiras (AMB); Articulação Nacional de


Mulheres Trabalhadoras Rurais (ANMTR); Articulação de Ongs de
Mulheres Negras Brasileiras; Associação Brasileira de Mulheres de
Carreira Jurídica (ABMCJ); Central Única dos Trabalhadores (CUT);
Confederação Geral dos Trabalhadores (CGT); Confederação das
Mulheres do Brasil (CMB); Conselho Nacional das Mulheres Indígenas
(CONAMI); Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação;
(CNTE); Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura;
(CONTAG); Federação das Associações de Mulheres de Negócios e
Profissionais do Brasil (BPW/BRASIL); Federação Nacional das
Trabalhadoras Domésticas (FENATRAD); Fórum de Mulheres do

45
Mercosul; Movimento Articulado de Mulheres do Amazonas (MAMA);
Ordem dos Advogados do Brasil (OAB); Secretaria Nacional da
Marcha Mundial das Mulheres; Secretaria Nacional de Políticas para
Mulher da Força Sindical; União Brasileira de Mulheres (UBM); Rede
Nacional Feminista de Saúde, Direitos Sexuais e Direitos
Reprodutivos‖ (ANAIS, I CNPM. 2004, p. 4).

Inicialmente a secretaria passou a funcionar com a nomeação, em janeiro


de 2003, da pedagoga, especialista em planejamento educacional: Emilia Fernandes.
Líder sindical no Conselho Estadual dos Professores do Estado do Rio Grande do Sul
(CPERS) e já no Partido dos Trabalhadores foi a primeira mulher gaúcha eleita senadora.
Também foi autora da lei de instalação de serviço telefônico gratuito para denúncias de
violência contra a mulher e relatora do Protocolo Facultativo CEDAW/ONU.

Em janeiro de 2004, Emilia Fernandes foi substituída por Nilcéa Freire,


médica, pesquisadora, mestre em zoologia, professora universitária, diretora de
planejamento e orçamento, vice-reitora e reitora da Universidade Estadual do Rio de
Janeiro (UERJ), sendo a primeira mulher a ocupar um cargo de reitora no Brasil, que
permaneceu na SPM até o final do Governo Lula em 2010.

Até a realização da I CNPM, a SPM não desenvolveu qualquer ação ou


programas de governo. Porém, fora da ação da secretaria, podemos citar como política
voltada para as mulheres no início do Governo Lula, o lançamento do Programa Nacional
de Agricultura Familiar (PRONAF– Mulher), coordenado pelo Ministério de
Desenvolvimento Agrário. Estava dirigido a facilitar o acesso das mulheres agricultoras,
silvicultoras, pecuaristas, da pesca, ao crédito disponibilizado pelo Governo Federal. Em
virtude de dificuldades burocráticas das mulheres para aderir ao programa, em 2004 foi
criado o Programa Nacional de Documentação da Mulher trabalhadora, que facilitaria o
registro de documentos, como certidão de nascimento, CPF, carteira de identidade e de
trabalho às mulheres trabalhadoras do campo.

De acordo com a fala do Presidente Lula na abertura da I CNPM, o


Governo Federal além de instituir os programas já mencionados, direcionados às
mulheres do campo, também implantou o Programa de Prevenção, Assistência e Combate
à Violência contra a Mulher, que de acordo com o Presidente Lula, visava não somente
punir o agressor, como também, ―criar mecanismos de prevenção que evitem a agressão‖
(ANAIS, I CNPM, 2004, p.24).

46
De acordo com o registro da transcrição da mesma fala, consta que o
Presidente, também criou em março de 2004 o primeiro ―Grupo de Trabalho
Interministerial‖ para estudar políticas em relação à violência doméstica e que, ainda no
final de 2003, sancionou uma lei que estabelece a notificação compulsória de casos
atendidos de violência contra a mulher em unidades de serviço de saúde públicas ou
privadas.

É notadamente após a I CNPM, que as políticas públicas tomam uma


dimensão maior na sua implementação, com a elaboração do I Plano Nacional de
Políticas para as Mulheres (PNPM).

2.4. A I CNPM e a construção e implementação do PNPM

A realização da I Conferência Nacional de Políticas para as Mulheres


(CNPM) foi um marco do Governo Lula e em todos os aspectos da política brasileira,
pois, pela primeira vez, um governo consultaria a população feminina, representada por
suas devidas delegações, sobre as políticas públicas, que estabeleceriam diretrizes para a
construção do Plano Nacional de Políticas para as Mulheres (PNPM).

Abrangendo um caráter popular, democrático e laico, a I CNPM foi


convocada em julho de 2004 pelo Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, e sua realização
coordenada pela SEPM e pelo CNDM ocorreu nos dias, 15, 16 e 17 do mesmo mês.
Contou com a participação de 1787 delegadas, eleitas em 26 conferências estaduais e do
Distrito Federal, que encaminharam 3844 propostas para a Nacional. Participaram
também 700 observadoras e convidadas.

O Plano Nacional de Políticas para as Mulheres (PNPM), segundo consta


em sua publicação, foi fruto do trabalho de 120 mil mulheres que participaram do seu
processo de elaboração. Instituiu-se ainda um Grupo de Trabalho Interministerial:

―O Grupo de Trabalho Interministerial (GTI), composto por


representantes de sete Ministérios - Saúde; Educação; Trabalho e
Emprego; Justiça; Desenvolvimento Agrário; Desenvolvimento Social;
Planejamento, Orçamento e Gestão -; da Secretaria Especial de Políticas
de Promoção da Igualdade Racial (SEPPIR); do CNDM; e das
Secretarias da Mulher do Estado do Acre e do Município de
Campinas/SP, sob a Coordenação da Secretaria Especial de Políticas
para as Mulheres.‖ (PNPM, 2004, p.13).

47
O GTI foi criado para organizar o plano de ação que objetivaria a
implementação das políticas propostas durante a ICNPM e as já existentes elaboradas
pelo Governo Federal. O trabalho de organização foi realizado, de acordo com o PNPM,
entre os dias 03 de setembro e 26 de novembro. O plano de ação foi consolidado com
metas a serem desenvolvidas até a conferência seguinte, que seria em 2007. Foram ainda
constituídos comitês de articulação e monitoramento a ser coordenado pela SPM e um
comitê técnico de apoio, responsáveis pela implementação do plano. Assim, o PNPM foi
criado respeitando alguns princípios e diretrizes fundamentadas pela I CNPM.

Entre os princípios que orientam o PNPM encontramos: ―igualdade e


respeito à diversidade, princípio da eqüidade, da autonomia das mulheres, da laicidade do
Estado, da universalidade das políticas, da justiça social, da transparência dos atos
públicos e da participação e controle social.‖ (PNPM, 2004, p.27).

Já as diretrizes que serviriam para a formulação das políticas a serem


concretizadas, tendo como base os princípios já mencionados, tinham como eixos:

―• Garantir a implementação de políticas públicas integradas para


construção e promoção da igualdade de gênero, raça e etnia.
• Garantir o desenvolvimento democrático e sustentável levando em
consideração as diversidades regionais, com justiça social, e
assegurando que as políticas de desenvolvimento promovidas pelo
Estado brasileiro sejam direcionadas à superação das desigualdades
econômicas e culturais. Isto implica a realização de ações de caráter
distributivo e desconcentrador de renda e riquezas.
• Garantir o cumprimento dos tratados, acordos e convenções
internacionais firmados e ratificados pelo Estado brasileiro relativos aos
direitos humanos das mulheres.
• Fomentar e implementar políticas de ações afirmativas como
instrumento necessário ao pleno exercício de todos os direitos e
liberdades fundamentais para distintos grupos de mulheres.
• Promover o equilíbrio de poder entre mulheres e homens, em termos
de recursos econômicos, direitos legais, participação política e relações
interpessoais.
• Combater as distintas formas de apropriação e exploração mercantil
do corpo e da vida das mulheres, como a exploração sexual, o tráfico de
mulheres e o consumo de imagens estereotipadas da mulher.
• Reconhecer a violência de gênero, raça e etnia como violência
estrutural e histórica que expressa a opressão das mulheres e precisa ser
tratada como questão de segurança, justiça e saúde pública.
• Reconhecer a responsabilidade do Estado na implementação de
políticas que incidam na divisão social e sexual do trabalho; a
importância social do trabalho tradicionalmente delegado às mulheres
para as relações humanas e produção do viver; a importância dos
equipamentos sociais e serviços correlatos, em especial de atendimento
e cuidado com crianças e idosos.

48
• Contribuir com a educação pública na construção social de valores que
enfatizem a importância do trabalho historicamente realizado pelas
mulheres e a necessidade de viabilizar novas formas para sua
efetivação.
• Garantir a inclusão das questões de gênero, raça e etnia nos currículos,
reconhecer e buscar formas de alterar as práticas educativas, a produção
de conhecimento, a educação formal, a cultura e a comunicação
discriminatórias.
• Garantir a alocação e execução de recursos nos Planos Plurianuais,
Leis de Diretrizes Orçamentárias e Leis Orçamentárias Anuais para
implementação das políticas públicas para as mulheres.
• Elaborar, adotar e divulgar indicadores sociais, econômicos e
culturais, sobre a população afro-descendente e indígena, como
subsídios para a formulação e implantação articulada de políticas
públicas de saúde, previdência social, trabalho, educação e cultura,
levando em consideração a realidade e especificidade urbana e rural.
Dar especial atenção à implantação do quesito cor nos formulários e
registros nas diferentes áreas.
• Formar e capacitar servidores(as) públicos(as) em gênero, raça, etnia e
direitos humanos, de forma a garantir a implementação de políticas
públicas voltadas para a igualdade.
• Garantir a participação e o controle social na formulação,
implementação, monitoramento e avaliação das políticas públicas,
disponibilizando dados e indicadores relacionados aos atos públicos e
garantindo a transparência das ações.
• Criar, fortalecer e ampliar os organismos específicos de direitos e de
políticas para as mulheres no primeiro escalão de governo, nas esferas
federal, estadual e municipal (PNPM, 2004, pp. 33-35).

Como observado nas diretrizes que orientam o PNPM, no que diz respeito
às orientações dadas à educação, reivindica-se assim como em outros documentos tanto
governamentais, quanto de organismos internacionais e dos movimentos de mulheres a
concepção que é importante intervir nos currículos da escola pública e implementar
práticas educativas e da produção de conhecimento a fim de eliminar a discriminação.

O PNPM estabelece ainda objetivos, metas, prioridades e plano de ação.


De acordo com o foco estabelecido pelos meus estudos monográficos, irei focar no eixo
estratégico: ―Educação inclusiva e não sexista‖ (PNPM, 2004, p.51).

Os objetivos definidos pelo PNPM para esse eixo estratégico são:

I. Incorporar a perspectiva de gênero, raça, etnia e orientação sexual no


processo educacional formal e informal.
II. Garantir um sistema educacional não discriminatório, que não
reproduza estereótipos de gênero, raça e etnia.
III. Promover o acesso à educação básica de mulheres jovens e adultas.
IV. Promover a visibilidade da contribuição das mulheres na construção
da história da humanidade.

49
V. Combater os estereótipos de gênero, raça e etnia na cultura e
comunicação.

Através da definição desses objetivos é possível observar a atenção do


PNPM com a educação em aspectos que vão além da educação escolar, compreendendo
ser a educação um processo cultural, social e não somente cognitivo. Nesse sentido, a
concepção pode ser fortalecida por metodologias pedagógicas através de mídias de
comunicação.

São traçadas as seguintes metas para a educação no PNPM:

―A. Reduzir em 15%, entre 2003 e 2007, a taxa de analfabetismo entre


mulheres acima de 45 anos.
B. Aumentar em 12%, entre 2004 e 2007, o número de crianças entre
zero e 06 anos de idade freqüentando creche ou pré-escola, na rede
pública‖.

De acordo com dados apresentados pelo Censo 2000 e publicados pelo


PNPM, existiam 4.562.968 mulheres com mais de 50 anos consideradas analfabetas, não
sendo atingidas por programas nacionais de alfabetização. Desta forma, é possível
verificar através dos dados que à medida que a idade avança, diminui o número de
mulheres alfabetizadas.

Entretanto, mesmo consolidando metas para a alfabetização de mulheres


acima de 45 anos no PNPM de 2004, o Governo Federal em 2008, reconhece que o
―Ministério da Educação, por intermédio do Programa Brasil Alfabetizado, não tem
adotado medidas específicas voltadas à alfabetização e promoção de mulheres mais
velhas e pobres, ainda que uma grande parcela dos inscritos no Programa sejam
mulheres‖ (CEDAW, VI Relatório, 2008, p.92).

As prioridades no PNPM para a educação consistem em:

―2.1. Promover ações no processo educacional para a eqüidade de


gênero, raça, etnia e orientação sexual.
2.2. Ampliar o acesso à educação infantil: creches e pré-escolas.
2.3. Promover a alfabetização e ampliar a oferta de ensino fundamental
para mulheres adultas e idosas, especialmente negras e índias.
2.4. Valorizar as iniciativas culturais das mulheres.
2.5. Estimular a difusão de imagens não discriminatórias e não
estereotipadas das mulheres‖.

2.5. Políticas educacionais coordenadas pela SEPM

50
Desde a criação da SEPM, se reconhece o esforço dos gestores públicos da
pasta na formulação de políticas que visavam o combate à discriminação da mulher e a
construção da igualdade entre os gêneros, desde a garantia de direitos fundamentais, até o
fim de todas as formas de violência. Entretanto, para a educação, as políticas somente
começam a ser executadas a partir de 2005, dois anos após a criação da secretaria.

De acordo com os documentos oficiais, verifica-se que as metas do


Governo Lula seguiam recomendações de organismos internacionais para a educação e o
combate às desigualdades como, por exemplo, a Organização das Nações Unidas (ONU),
Fundo de Desenvolvimento das Nações Unidas para a Mulher (UNIFEM) e a Convenção
para a Eliminação de todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres (CEDAW).
Estas recomendações apontam para a ―criação de uma cultura de igualdade‖ necessária ao
progresso e a restituição de direitos humanos e da cidadania das mulheres (MEMÓRIA,
2006, p.69).

Sabendo que somente leis aplicadas à sociedade com medidas punitivas


não garantem por si só uma mudança cultural na sociedade, políticas de caráter
educacional, visando escolas e universidades públicas, empresas, meios de comunicação
foram tomadas com o objetivo de promover mudanças estimulando o debate e a reflexão.

A seguir, apresentarei os principais programas e ações da SEPM na área da


educação, seguindo uma ordem cronológica, a partir de quando foram implementados.

2.5.1. Programas de ação afirmativa para a mulher no âmbito acadêmico

Em 2005, através de uma parceria formalizada entre a SEPM, Ministério


da Educação (MEC), Ministério da Ciência e Tecnologia e o Conselho Nacional de
Ensino e Pesquisa (CNPQ), o Governo Lula lançou o Programa: ―Mulher e Ciência‖. O
programa ainda contou com o apoio do UNIFEM.

O Programa em sua 1ª edição incluiu projetos relevantes na área


acadêmica, disponibilizando recursos para pesquisas, premiações de trabalhos científicos
e eventos.

Dentro do programa foi lançado o edital 45/2005 do CNPQ de apoio a


pesquisas sobre gênero, mulheres e feminismos. Ainda de acordo com a publicação da

51
SPM, ―Memória 2003-2006‖, o recurso oferecido pelo edital do CNPQ foi de 1,2 milhões
de reais. Foram contempladas 130 propostas entre as 338 apresentadas em 42 áreas de
conhecimento por 25 estados brasileiros.

Como parte do mesmo Programa, foi implementado 1° Prêmio


―Construindo a Igualdade de Gênero‖, que premiou artigos científicos, redações de
estudantes do Ensino Médio e monografias de estudantes graduados e pós-graduados. A
primeira edição do prêmio, por sua vez, teve 1270 redações de Ensino Médio inscritas,
sendo 42 contempladas. Entre os 141 trabalhos de graduação e 176 de pós-graduação,
apenas 3 de cada categoria foram contemplados.

Outra ação do Programa ―Mulher e Ciência‖ foi a realização do ―Encontro


Nacional de Núcleos e Grupos de pesquisas – Pensando Gênero e Ciências‖, que reuniu
em Brasília nos dia 29, 30 e 31 de março de 2006 ―330 pesquisadores de mais de 200
núcleos, de todas as regiões do país‖ (MEMÓRIA, 2006, p.74):

―Entre as diversas recomendações do encontro estão a introdução da


disciplina de gênero nos currículos universitários; a transformação do
Programa Mulher e Ciência em política permanente; o aumento da
participação feminina nos cargos de direção de órgãos financiadores de
pesquisas científicas (CNPq/MCT, Capes/MEC); e a inclusão de
publicações no campo de estudos de gênero, feminismo e diversidade
sexual, nos acervos das bibliotecas nacionais‖ (id).

A criação do Serviço Nacional de Informações de Gênero (SNIG), em


2006, e a difusão virtual e distribuição impressa de revistas acadêmicas, como por
exemplo, a ―Revista de Estudos Feministas‖ e ―Caderno Pagu‖, são uma realidade nos
acervos de bibliotecas universitárias, porém, com certa restrição ao acervo de bibliotecas
públicas.

Com relação à disciplina referindo-se às questões de gênero a ser inserida


nos cursos universitários, sabe-se que não existe uma obrigatoriedade e sim, uma
orientação, portanto, os currículos universitários possuem certa autonomia na fomentação
e seleção das disciplinas. Na Universidade Federal Fluminense, por exemplo, a disciplina
é oferecida apenas como optativa pelo Instituto de Educação Física aos estudantes de
cursos de graduação.

2.5.2. A parceria com o Programa Nacional de Livro Didático (PNLD)

52
A instituição de organismos governamentais para coordenar a
administração de material didático no Brasil começou no final da década de 30, com a
criação do Instituto Nacional do Livro Didático e ao longo dos anos, o INL foi
substituído por outras organizações. No entanto, seguindo Sampaio e Carvalho (2010),
somente no início da década de oitenta é que o livro didático passou a ter uma
importância maior para a educação escolar do país.

Em 1985 foi criado então o PNLD sob a responsabilidade da antiga


Fundação de Assistência ao Estudante (FAE). Em 1997, a FAE foi extinta sendo
substituída pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação, sendo responsável
pelos critérios de avaliação pedagógica o próprio MEC.

O Edital de 1997 instituiu a universalização do acesso gratuito ao livro


didático para todos os alunos das séries iniciais do Ensino Fundamental. Logo depois, já
durante o Governo Lula, o acesso dos estudantes do Ensino Médio também foi garantido
através do Programa Nacional do Livro Didático do Ensino Médio (PNLEM).

Através dessas políticas, o aumento da distribuição de livros didáticos nas


escolas públicas aumentou consideravelmente, de mesma forma que ―aluno carente e
livro didático tornaram-se um binômio inseparável‖ (SAMPAIO; CARVALHO, 2010,
p.9).

Foi estabelecida uma parceria entre a SEPM e o MEC a partir de 2006 para
que fossem realizadas revisões dos materiais didáticos publicados e apoiados pelo PNLD,
retirando, obras que apresentam: ―erros conceituais, informações desatualizadas,
abordagens pedagógicas ultrapassadas, preconceito ou discriminação de qualquer tipo,
falhas no projeto gráfico ou na impressão‖ (SAMPAIO; CARVALHO, 2010, p.23).
Passou a ser inclusive parte dos critérios de avaliação pedagógica dos livros didáticos
recomendados pelo PNLD a atenção à questão de gênero.

Apesar dessa tentativa de investigar e provocar mudanças nos livros


didáticos que servem de suporte à educação brasileira, com relação às questões de gênero,
não encontrei de fato na minha pesquisa informações sobre a retirada de livros já
publicados com conteúdos discriminatórios ou sexistas. Somente encontrei informações

53
sobre a produção e avaliação de livros novos, estruturados a partir de uma abordagem
crítica e bem informada sobre as temáticas de gênero, raça, etnia e diversidade cultural.

2.5.3. Programa Gênero e Diversidade na Escola.

Através de uma ação interministerial entre a Secretaria Especial de


Políticas de Promoção da Igualdade Racial (SEPPIR), a Secretaria de Educação
Continuada, Alfabetização e Diversidade (SECAD), a SPM e a Secretaria de Educação a
Distância (SEED) do Ministério da Educação, em 24 de maio de 2006 foi lançado
oficialmente o Programa Gênero e Diversidade na Escola, contando com a presença do
Presidente Lula e dos ministros Fernando Haddad do MEC, Matilde Ribeiro da SEPPIR a
Nilcéa Freire da SEPM.

De acordo com a publicação lançada pelo próprio programa, seu objetivo


―ousado‖ teria sido ―contribuir‖ para a formação continuada de professores nas questões
de gênero, raça, etnia e diversidade sexual e, com isso, fortalecer o exercício profissional
para as práticas de promoção do respeito à diversidade na escola para que esta não seja
um espaço onde se reproduzam preconceitos. O programa considerou a formação de
educadores como passo inicial para também formar culturalmente crianças e jovens: ―é o
caminho mais consistente e promissor para um mundo sem intolerância, mais plural e
democrático‖ (GDE, 2007, p.16).

2.5.3.1. Parcerias estabelecidas para o programa.

O programa firmou com o British Council, órgão internacional do Reino


Unido responsável pelas questões de educação e cultura que se responsabilizaria não
somente por subsídios financeiros, como também por intercambiar informações
interinstitucionais entre o Brasil e outras nações.

O programa também contou com a parceria do Centro latino-americano em


sexualidade e direitos humanos (CLAM) para o desenvolvimento de metodologia,
elaboração do material didático, seleção de educadores e beneficiados pelo curso.
Coordenando sua execução, a Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ) além de
subsidiar o CLAM, também foi responsável pela certificação dos concluintes do curso.

54
A parceria com a SEED foi considerada estratégica pelo programa, pois
proporcionou a adequação da aprendizagem às tecnologias da educação a distância,
possibilitando, com isso, o aporte estrutural do curso nas ferramentas virtuais.

Por ser o Programa Gênero e Diversidade na Escola realizado a distância,


foi necessário estabelecer parcerias locais com os governos estaduais e municipais para
democratizar o acesso ao ambiente virtual no qual o curso se desenvolveu, principalmente
nos laboratórios de informática das escolas estaduais e nos núcleos tecnológicos das
secretarias de educação.

Às coordenadorias e conselhos de direitos das mulheres, igualdade racial e


LGBT, tanto em nível municipal quanto local foram destinadas as funções de divulgação
e mobilização entre os Movimentos Sociais e a população.

Os Movimentos Sociais não participaram de forma institucional do


desenvolvimento do curso, embora tivessem sido os principais reivindicadores das
políticas públicas, o que se transparece no fato de não constar nomes de organizações nos
documentos oficiais. Fato inclusive, reconhecido pelo Governo Federal através da
publicação sobre o Programa Gênero e Diversidade na Escola, no qual enumera as
políticas governamentais que se refletem diretamente em demandas construídas nos
movimentos:

―1. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB (Lei 9.294,


de 20 de dezembro de 1996), em específico seu artigo 26-A, que
determina a obrigatoriedade do ensino da História e Cultura Afro-
brasileira e Africana nos currículos da Educação Básica (artigo alterado
pela Lei 10.639, de 09 de janeiro de 2003);
2. Política Nacional de Promoção da Igualdade Racial, de 2003;
3. Programa Brasil sem Homofobia, Programa de Combate à Violência
e à Discriminação contra GLBTT e Promoção da Cidadania
Homossexual, de março de 2004;
4. Plano Nacional de Políticas para as Mulheres, de dezembro de 2004.‖
(GDE, 2007. p.19).

Como já foram tratados antes neste trabalho, os planos nacionais, por


exemplo, são frutos das Conferências Nacionais realizadas com a participação de ativistas
dos Movimentos Sociais. Inclusive o Seminário Internacional Educando para a Igualdade
de Gênero, Raça e Orientação Sexual, realizado por parceiros do Programa Gênero e
Diversidade na Escola, contou com a participação de organizações não governamentais e
teve como resultado a assinatura de um ―protocolo de intenções‖, em 11 de agosto de
55
2005, com o objetivo de implementar políticas públicas educacionais. Esse momento foi
considerado ―o primeiro passo‖ para a concepção do Programa Gênero e Diversidade na
Escola (GDE, 2007. p.20).

2.5.3.2. Justificativa, metas e fundamentação

O desenvolvimento do curso respeitou, como mencionado anteriormente,


metas orientadas por demandas dos Movimentos Sociais construídas através das
Conferências Nacionais e expressas nos Plano Nacionais de Políticas Públicas,
principalmente as voltadas para valorizar a diversidade étnico-racial e o combate ao
racismo, a promoção da equidade de gênero e o combate a qualquer forma de
discriminação social. Também se orientou em metas originadas em tratados
internacionais, nos quais o Brasil é signatário, tais como a Declaração Universal de
Direitos Humanos de 1948 e Convenção sobre Eliminação de Todas as Formas de
Discriminação contra a Mulher (CEDAW). Segundo os idealizadores do curso, esses
documentos servem de fundamentação e justificam a necessidade da implantação do
Programa Gênero e Diversidade na Escola com o objetivo de formar professores de
maneira continuada, para atuarem de 5ª a 8ª série do Ensino Fundamental da rede pública,
na construção de uma cultura de respeito às diferenças e à pluralidade.

Sobre a fundamentação pedagógica, o curso afirma ser orientado


teoricamente por técnicos e autores como Paulo Freire, Piaget, Vigotsky e Morin,
segundo a publicação: ―que colocam em destaque a totalidade do ser humano e sua
capacidade de construir significados socialmente importantes.‖ (GDE, 2007. p.37). As
propostas pedagógicas desses intelectuais são consideradas, segundo os idealizadores do
curso, como as mais satisfatórias e com resultados mais positivos do que as metodologias
tradicionais, porém, não se menciona nenhuma pesquisa que comprove tal afirmação.

2.5.3.3. Seleção de municípios para o projeto piloto.

Com relação à seleção de municípios, foram utilizados critérios de


territorialidade visando atingir todas as regiões brasileiras: Niterói e Nova Iguaçu, no
estado do Rio de Janeiro, de acordo com o critério, atingiria a totalidade da região
sudeste; Maringá, no Paraná atingiria toda a região sul; Dourados, no Mato Grosso do

56
Sul cobriria a região centro-oeste; Porto Velho, em Rondônia, a região norte e, por fim,
Salvador, na Bahia cobriria o imenso nordeste.

Agindo como critério de seleção estariam as articulações políticas e


institucionais em municípios que já possuíam coordenadorias ou agências
governamentais de igualdade racial e de mulheres, ou seja, aqueles que já teriam
encaminhado propostas de políticas públicas para as minorias e que em certas regiões
têm representatividade, como, por exemplo, em Dourados, onde, de acordo com a
publicação, os indígenas são predominantes, ou em Salvador, com população em
maioria afrodescendente. Porém, se tratando da primeira experiência a ser aplicada
como piloto e no sistema de educação a distância, justifica-se a tentativa de alcançar as
regiões através de um município, sendo exceção a região sudeste, com dois municípios.

Um fato que considerei significativo foi a ausência de um critério que


selecionasse os municípios por dados baseados na própria discriminação nas escolas,
nos casos de bullying registrados, de violência cometida por menores infratores que
tangem o machismo, o racismo ou a homofobia e até mesmo em pesquisas que geram
dados sobre perfil de professores sobre a aceitação e o respeito à diversidade. Nada
disso pareceu ter sido levado em conta para selecionar os municípios.

2.5.3.4. Seleção de professores.

O curso priorizou como público-alvo os professores, porém contou com a


participação de 200 profissionais da educação em cada um dos municípios selecionados,
entre eles estavam gestores, orientadores educacionais e outras categorias da Educação
Básica. Na seleção de professores cursistas, optou-se por priorizar os que já tivessem
em prática com alunos de 5ª a 8ª séries do ensino fundamental.

Como professores online que atuariam no ambiente virtual ministrando


turmas, foram contratados 30 professores organizados em 36 turmas que, por sua vez,
receberiam 1415 alunos matriculados. Os professores online foram selecionados por
atributos de conhecimentos tecnológicos e conhecimento prévio dos temas inseridos nos
módulos, sendo convocados pós-graduados ou pós-graduandos com formação em áreas
de conhecimento ―afins‖ ao programa, o texto não informa quais seriam as áreas. Mas,
de fato a maioria foi oriunda das ciências sociais.

57
Esses professores receberam uma capacitação para começarem a
trabalhar, dividida em duas partes: a primeira presencial ocorreu na UERJ com
representantes dos núcleos tecnológicos e, de acordo com a publicação, também contou
com professores especialistas em cada uma das grandes temáticas do curso: Gênero,
Diversidade Sexual e Diversidade Étnico-racial. A segunda parte da capacitação foi on
line, diretamente na plataforma virtual utilizada pelo curso, com suporte de
coordenadoras pedagógicas que iam orientando os professores online quando tinham
dúvidas sobre o conteúdo a ministrar ou sobre a forma de ensinar ou trabalhar tais
conteúdos.

2.5.3.5. Desenvolvimento dos módulos

Com o objetivo de realizar um ―debate transversal‖ (GED, 2007, p. 42)


das temáticas, o curso estruturou-se em cinco módulos, sendo o primeiro, uma
apresentação da metodologia do Ensino a Distância (EaD) na primeira unidade do
módulo.

Na segunda unidade do mesmo módulo foi desenvolvida uma


apresentação geral dos temas sobre diversidade, definindo cultura, diversidade cultural,
etnocentrismo, estereótipo, preconceito, dinâmica cultural, respeito e valorização da
diversidade. Por último, se desenvolveram reflexões sobre ―o ambiente escolar em face
dos temas tratados‖ (id). Considerei a concepção deste módulo interessante para a
fundamentação de conceitos trabalhados no combate à discriminação, pois resgata o
entendimento de como processos de desigualdade social e de gênero foram produzidos
historicamente e mantidos até hoje.

O terceiro módulo do curso refere-se aos temas sexualidade e orientação


sexual, abordando problematizações sobre preconceito e discriminação, a partir de um
debate fundamentado na historicidade dos movimentos sociais e no entendimento da
produção das diferenças e desigualdades de gênero e sociais.

O quarto módulo aborda a discussão sobre as relações étnico-raciais e o


racismo no Brasil, enfatizando a construção histórica dessas relações. Também se
analisam os discursos e as teorias sociais vigentes em diferentes períodos históricos, que
justificaram a desigualdade e construiram ―mitos‖ sobre as raças. O módulo concede

58
destaque às ideologias do Estado Nacional, ao mito desenvolvido no Brasil sobre
democracia racial e mostra, a partir de diferentes indicadores, como a discriminação
racial é um dado estrutural da nossa sociedade.

Todos os módulos contam com uma parte mais teórica, de explicação dos
conceitos e uma parte em que estes são relacionados a situações presentes na escola,
visando problematizar e combater os estereótipos e preconceitos existentes. Por fim,
consta uma parte prática, de sugestões de atividades para os professores realizarem em
sala de aula com seus alunos: filmes, músicas, entre outros recursos, são apresentados.

2.5.3.6. Dados do projeto piloto.

O Programa Gênero e Diversidade na Escola no seu primeiro ano de


execução recebeu 1756 inscrições, porém apenas 1415 foram aprovadas, não sendo
informados os critérios da seleção. Dessas 1415 matrículas aprovadas, 865 inscritos
iniciaram o curso.

Entre os inscritos aprovados, a predominância foi de professores de 5ª a


8ª antigas séries do Ensino Fundamental (atual 6ª a 9ª) da rede pública. Também
participaram gestores de secretarias estaduais e municipais.

Houve predominância de mulheres entre os cursistas (85% dos que


iniciaram) e uma maioria com idades entre 30 e 39 anos (38% dos que iniciaram), sendo
62% da rede estadual e 38% da rede municipal. Do total, foram 98% cursistas da área
urbana e 2% da área rural.

Sobre a evasão, o programa reconhece que a taxa foi alta, porém, afirma
que sendo um curso oferecido à distância, a taxa estaria dentro de um limite aceitável
em relação a outros cursos incorporados ao mesmo sistema: ―A evasão ficou entre 19%
e 20% no decorrer dos três meses de duração do curso, índice considerado muito baixo
quando comparado à média de evasão dos cursos de educação a distância, que gira em
torno de 30% a 35%.‖ (GDE, 2007, p.11).

2.5.3.7. Avaliação do projeto-piloto

59
Após o curso, foi realizada uma pesquisa de avaliação do projeto
analisando a perspectiva dos professores online, que preencheram um questionário
contendo 30 perguntas sobre questões consideradas essenciais. O questionário abordou
o conteúdo temático, a metodologia de ensino e tecnologias para o curso a distância.

Em conclusão, o curso foi considerado eficaz, tanto pelos profissionais que


trabalharam em seu funcionamento, quanto pelos professores formados, inclusive no que
tange ao relacionamento transversal das temáticas apresentadas, mesmo reconhecendo a
necessidade de aprimoramento para alcançar um número maior de professores.

De acordo com informações, a maioria dos professores se considera mais


preparada tanto para realizar o trabalho com a temática, quanto para enfrentar situações
que precisem de intervenção para responder a preconceitos na escola onde a maioria,
acredita que o curso foi importante para complementar a formação como educador.

Para finalizar, gostaria de destacar que se bem o Programa Gênero e


Diversidade na Escola foi uma importante iniciativa entre as ações educacionais do
governo Lula voltadas para a eqüidade de gênero, não teve um desdobramento como
política pública de Estado, com continuidade. Isto é, apesar da formação inicial e
continuada de professores na temática de gênero e diversidade sexual ser uma importante
demanda dos movimentos sociais, ainda estas temáticas não constam como disciplinas
obrigatórias nos cursos de licenciatura, nem são oferecidos cursos de formação
continuada de forma sistemática pelos governos estaduais e municipais.

60
Capítulo III

O impacto das políticas de educação e gênero.

Neste capítulo discutirei os impactos das políticas públicas educacionais


de gênero desenvolvidas durante o governo Lula, com base em dados e documentos
oficiais do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), do Ministério da
Educação (MEC) e de algumas pesquisas e estudos aos quais tive acesso. Considero o
estudo do impacto das políticas apresentadas, um critério fundamental de análise social
da população brasileira em um momento pós Governo Lula. E creio que os
questionamentos levantados ao longo da pesquisa se alicerçam na relevância de um
conjunto de averiguações sobre as transformações culturais que atravessam nossa
sociedade.

3.1. O contexto educacional no Brasil após o Governo Lula.

O Governo Lula chegou ao fim com ampla aprovação popular, mais de


80%, de acordo com as pesquisas realizadas na época e, após, disputa eleitoral em
segundo turno com o candidato do PSDB (Partido da Social Democracia Brasileira) José
Serra, sua sucessora, a economista Dilma Roussef, também candidata por uma coligação
liderada pelo PT, venceu e assumiu a Presidência da República em primeiro de janeiro de
2011.

No plano da educação, o Governo Dilma se caracteriza basicamente pela


continuidade e aprofundamento das políticas implementadas ainda no Governo Lula. No
ensino superior, se fortaleceram as parcerias com o setor privado, com transferência de
recursos públicos e isenção fiscal, concedendo bolsas em cursos pagos e empréstimos
através do Fundo de Financiamento Estudantil (FIES). Tem sido significativa também a
expansão das Universidades Federais com a criação de novas universidades e Campi,
principalmente no interior do país e a ampliação do sistema de Ensino à distância.

Para atender às novas demandas produzidas pela expansão nesse nível de


ensino, a eficácia do gerenciamento teve de ser aprimorada com a instituição de práticas
administrativas consideradas mais modernas, como por exemplo, a transferência de
recursos sob controle do Ministério da Educação (MEC) que monitora as universidades
através do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (SINAES) e o Exame

61
Nacional de Avaliação de Desempenho (ENADE), controlando, inclusive, os recursos
financeiros para as Instituições através de uma lógica meritocrática de desempenho.

Na educação básica, também se verifica um aumento de recursos:

―O aporte de recursos do governo federal ao Fundeb, de R$ 2 bilhões


em 2007, aumentou para R$ 3,2 bilhões em 2008, R$ 5,1 bilhões em
2009 e, a partir de 2010, passou a ser no valor correspondente a 10% da
contribuição total dos estados e municípios de todo o país.‖ (site do
FUNDEB).

Os recursos distribuídos pelo FUNDEB são administrados pelos estados e


municípios que também utilizam sistemas de avaliação para controle e distribuição dos
recursos.

O Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego


(PRONATEC), criado pelo Governo Federal em 2011, recebeu um aporte maior de
recursos e a introdução massiva das instituições privadas, tanto as instituições
educacionais que se beneficiaram dos programas, como das empresas que aproveitam a
mão de obra qualificada.

Podemos entender como um impacto positivo das políticas governamentais


educativas do governo Lula o aumento da escolaridade em todos os níveis da educação
básica e do ensino superior. Podemos verificar tal aumento a partir da comparação das
taxas de frequência bruta de crianças e adolescentes entre 2001 e 2011, de acordo com o
IBGE:

62
(IBGE, 2012, p.114)

(IBGE, 2012, p.118)

(IBGE, 2012, p.118)

63
(IBGE, 2012, p.119)

Esses gráficos dão conta de um aumento da escolaridade entre 2001 e


2011. Por exemplo, se consideramos a média de anos de estudo entre os jovens de 18 a 24
anos de idade, percebemos que em 2001 era de 7,9 anos e em 2011 passou para 9,6 anos
de estudo. Também os dados evidenciam um aumento dos jovens que possuem 11 anos
ou mais de estudos completos: em 2001 era 33,7% da faixa dos 18 a 24 anos e em 2011
passou a 54,1%.

Contudo, percebe-se igualmente a persistência de grandes desigualdades


no acesso à educação, segundo renda e raça, sem falar na permanência que afeta
principalmente aos jovens de classes trabalhadoras. Devemos considerar aqui o fator
significativo da evasão escolar, sendo a taxa média brasileira três vezes maior que a de 29
países. Contudo, essa taxa diminuiu, sendo que em 2001 era de 43,8% e em 2011 passou
para 32,2%, com incidência maior entre os homens (37,9%), frente às mulheres (26,6%).

As mulheres são também maioria nos cursos de alfabetização para adultos:


57,9%, sendo que 70,8% se declaram pretas ou pardas. E ainda nos cursos de Educação
de Jovens e Adultos (EJA) ou supletivos, na faixa etária de 15 anos ou mais verificamos
que constituem, em 2011, o 57,1%.

Assim, a partir dos dados divulgados pelo IBGE, se observa nos últimos
anos um aumento da escolarização das mulheres. Apesar destes avanços, ainda se verifica
uma desfasagem em termos de acesso e permanência das mulheres na educação escolar,

64
se comparados a outros países. Também devemos questionar a qualidade do ensino
recebido, inclusive os projetos político-pedagógicos e os conteúdos curriculares que ainda
são baseados na maioria dos casos numa matriz monocultural (racionalista e ocidental) e
patriarcal.

Por outro lado, verificamos que nesse governo atual, assim como
aconteceu durante a presidência de Fernando Henrique, existe uma tendência à
privatização da educação escolar, com remodelações curriculares adequadas ao mercado
de trabalho. Existe uma tentativa explícita de reorganizar o ensino para atendimento
quase que exclusivo a este mercado, incluindo nestas demandas, as mudanças
curriculares, a criação de novos cursos técnicos e tecnológicos e os programas que
beneficiam, como já informado, a educação privada e as empresas.

Em relação aoo avanço das mulheres na educação, apesar de alguns


resultados positivos, percebo que não houve políticas específicas focalizadas, que
incentivassem diretamente o aumento de matrículas de meninas e mulheres na educação
básica e superior. Portanto, estimo que o crescimento educacional seja consequência da
própria luta das mulheres por conquista de escolarização e um novo espaço na sociedade,
decorrente das lutas históricas do movimento feminista, ao longo dos séculos XX e XXI.

3.2. Políticas educacionais de Gênero e seus reflexos na Educação Básica.

Antes de comentar algumas pesquisas que dão conta de certos avanços nos
últimos anos em relação às questões de gênero na educação básica, é necessário
relembrar que foram escassas as políticas implementadas durante o Governo Lula, apesar
de que a eqüidade de gênero e o combate à discriminação e violência contra as mulheres
aparecerem como importantes objetivos da SPM e do MEC. Como já abordei no capítulo
anterior, as principais medidas governamentais na educação básica foram a formação
continuada de professores, através do Programa Gênero e Diversidade na Escola, e o
projeto ―Construindo a Igualdade de Gênero‖, que contemplou a premiação de redações
escolares, monografias, teses e projetos sobre o tema. Não houve outras políticas
orientadas a seguir as recomendações dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) e as
demandas das Conferências Nacionais de Mulheres.

65
Cabe também chamar a atenção para a escassez de informações e dados
sistematizados que permitam avaliar o impacto das políticas executadas durante o
Governo Lula, para verificar se de fato promoveram mudanças culturais quanto à questão
de gênero nos ambientes escolares. Entretanto, mesmo sem pesquisas específicas,
identifiquei a existência de alguns estudos que pemitem obter dados interessantes no que
tange à realidade da discriminação racial e de gênero. Por exemplo, em 2009, a Fundação
Instituto de Pesquisas Econômicas (FIPE) realizou uma pesquisa em 501 escolas públicas
de 27 estados brasileiros, ao todo foram 18.599 respondentes aos questionários aplicados.
Desse número, 15.087 foram estudantes, 1004 foram professores de português e
matemática, 501 foram diretores, 1005 profissionais da educação e 1002 pais, mães e
responsáveis membros de conselho escolar ou associações de pais e mães.

A pesquisa trouxe dados que evidenciam a grave problemática do


preconceito e a discriminação no ambiente escolar: 99,3% dos entrevistados manifestou
possuir algum nível de preconceito: 96,5% seria em relação aos portadores de
necessidades especiais; 94,2% seria com relação às questões étnico-raciais: 93,5% em
relação às questões de gênero; 91,0% seria preconceito geracional; 87,5% seria com
relação à situação socioeconômica, 87,3% manifestou preconceito referente à orientação
sexual. A pesquisa analisou ainda a intensidade de atitudes preconceituosas de acordo
com as respostas obtidas e afirma que 38,2% das atitudes são com relação a preconceito
de gênero, localizada, também em primeiro lugar no ranking do ―preconceito por ator
escolar‖ (FIPE, 2009, p.23), que seria a ação direta dos sujeitos presentes na escola.

É interessante observar como o preconceito em relação ao gênero se


apresenta em terceiro lugar, atrás do preconceito em relação aos portadores de
necessidades especiais e à raça e etnia. Assim, a pesquisa evidencia a necessidade da
efetivação de uma política educacional mais eficiente quanto a promover mudanças
culturais em relação a preconceito e discriminação de gênero, entre outros.

Outra pesquisa interessante, que também demonstra poucas


transformações nas práticas docentes quanto a lidar com a perspectiva de gênero e
diversidade sexual, é a desenvolvida pelo Projeto Diversidade Sexual na Escola. Esse
projeto é coordenado por um núcleo da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e
existe desde 2005, com o objetivo de realizar cursos e oficinas sobre gênero e sexualidade
em escolas da rede pública estadual e municipal.

66
Em 2010, o projeto realizou uma pesquisa com base em questionários
preenchidos por educadores que participam desses cursos ou oficinas. A pesquisa partiu
da ideia de que a escola é uma instituição fundamental para mobilizar à comunidade
contra a discriminação dos LGBT, não somente na violência explícita que os jovens
sofrem, como também valorizando: ―a postura combativa desses jovens diante de um
contexto escolar homofóbico, sexista e heteronormativo‖ (BORTOLINI, 2011, p.152).

Nesse contexto, a pesquisa traz reflexões relevantes sobre a dificuldade


dos professores em lidar com jovens que exploram a visibilidade de sua identidade de
gênero e orientação sexual como instrumentos de resistência e que diferem daquelas
impostas pela heteronormatividade. A partir dos resultados do estudo, o projeto propôs
ações educacionais voltadas para o protagonismo estudantil e o reconhecimento de suas
identidades, ressaltando que seria necessário que tais ações ―não trabalhem atendendo
demandas, mas que fomentem essa demanda, que não apenas dêm conta do que é
reivindicado, mas que estimulem, mobilizem as instituições públicas e os seus sujeitos‖
(BORTOLINI, 2011, p.171).

Observamos também no governo Dilma, alguns retrocessos significativos


em relação às políticas voltadas para a educação de gênero. Entre eles, o veto ao kit anti-
homofobia, no ano de 2012, que foi amplamente noticiado pela imprensa nacional.
Tratava-se de um projeto desenvolvido pelo MEC para estudantes de Ensino Médio, que
consistia em material impresso e audiovisual abordando uma campanha contra a
discriminação à população LGBT (lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais). Às
vésperas de distribuição do material nas escolas, a chamada bancada evangélica do
Congresso Nacional, pressionou o Governo Federal, através do poder executivo para que
o projeto fosse vetado. Assim, o material, que já tinha sido produzido, ficou sem circular
nas escolas.

3.3. Os reflexos do Programa Nacional do Livro Didático.

Segundo o comentado no capítulo anterior, a parceria entre a Secretaria


Nacional de Políticas para as Mulheres e o Programa Nacional do Livro Didático do
MEC foi uma importante iniciativa para a revisão e exclusão de livros que apresentassem

67
conteúdo discriminatório de cunho sexista. Considerando que em muitas regiões do país o
livro didático é praticamente a única fonte de informação para muitos estudantes e
professores, podemos pensar que a introdução de uma nova abordagem sobre as questões
de gênero poderia ser uma excelente ferramenta e recurso para mudança de perspectivas e
práticas instituídas historicamente.

Para entender os alcances de tal programa, analisei o Edital PNLD 2012 e


os guias de livros didáticos selecionados pelo programa. De acordo com o Edital, o
atendimento da temática de gênero consta como critério de avaliação para a exclusão e
indicação de obras, enquanto elemento de formação de cidadania e ética, observado o
respeito às diferenças e o direito à igualdade social e jurídica.

Em pesquisa realizada através da internet, verifiquei as resenhas dos livros


aprovados e indicados para aquisição pelas escolas e constatei que as obras contidas nos
guias estão isentas de preconceito e discriminação de cunho sexista. Porém, não constam
informações sobre se houve (e quantas) obras foram excluídas por não atender tal critério.

3.3.1. Análise dos livros didáticos no Ensino Fundamental.

Para analisar os livros didáticos dos anos iniciais e finais do Ensino


Fundamental selecionei os guias de ciências, história e geografia por considerar que são
essas áreas as que geralmente abordam (se o fazem) a temática de gênero. Verifiquei que
o atendimento a tal temática faz parte do que é chamado como ―critério de cidadania e
ética‖, que tem como objetivo contribuir para a formação em cidadania e o respeito à
diversidade ―evitando estereótipos e associações que depreciem determinados grupos ou
que desvalorizem a contribuição de todos os diferentes segmentos da sociedade‖ (FDE,
p.16, 2012).

Nos guias de ciências existem 22 publicações indicadas para a aquisição


das escolas e, de acordo com as resenhas das mesmas, verifiquei que somente oito delas
trabalham especificamente as questões de gênero vinculadas às relações sociais, à
equidade e à ética.

Dentre as 63 obras do guia de geografia, somente nove explicitam abordar


a temática e contemplam de forma parcial as questões de gênero para a construção da
cidadania. Contudo, nas obras que não trabalham a temática, existem recomendações ao

68
professor para aprofundamento em sala de aula, incentivando que utilize outros recursos
para além do livro didático.

Na apresentação do guia didático dos livros de história realiza-se uma


crítica à historiografia tradicional, que tem abordado principalmente ―fatos históricos
masculinos‖ (Guia de história, 2012, p.14), destacando a invisibilidade histórica da luta
das mulheres, questão omitida no conhecimento escolar. Também se questionam as
representações sobre as mulheres na sua condição subalternizada e passiva, conceituando
que essas representações são utilizadas histórica e socialmente para reforçar preconceitos
e estereótipos. Tendo em vista os critérios estabelecidos, o guia informa que 48 obras
foram aprovadas e disponibilizadas para a aquisição das escolas. Entretanto, a partir da
leitura dos índices e das resenhas, constatei que apenas três abordam a temática do gênero
de uma forma mais aprofundada.

3.3.2. Análise dos livros de Ensino Médio.

Ao revisar os guias de livros didáticos para Ensino Médio, constatei que o


critério de gênero, assim como nos livros do Ensino Fundamental, está presente sendo
utilizado no processo de avaliação das obras. Verifiquei que, principalmente, os livros de
geografia recebem parecer ―fraco‖ ou ―satisfatório‖ de acordo com a maneira de como
abordam a temática.

Os outros guias selecionados para análise, além de geografia, foram o de


história e sociologia, nos quais não encontrei informações sobre a existência do mesmo
parecer. Porém, no guia de história foi possível localizar a informação de utilização do
critério, ao contrário do guia de sociologia, no qual não consta a informação sobre a
utilização do critério de gênero.

Como parte do levantamento quantitativo acerca do trabalho pedagógico


nas obras, constatei que dentre as 13 coleções de geografia indicadas pelo PNLD, cinco
receberam parecer ―satisfatório‖ para a abordagem da temática de gênero e oito coleções
receberam parecer ―fraco‖. Nenhuma recebeu o parecer ―muito bom‖.

Após pesquisar o guia de história, constatei que das 20 coleções, sete


abordam as temáticas de gênero no trabalho pedagógico, com textos complementares,
imagens, aspectos do cotidiano e recomendações de trabalho em sala de aula. Contudo

69
existem críticas por parte dos avaliadores, ressaltando que nessas abordagens se
desconsidera o tratamento da diversidade sexual ao longo da história.

No guia de sociologia, não encontrei informações sobre critérios de


avaliação que encontrei nos demais guias, porém, o artigo III do Edital 2012 PNLD,
informa que os critérios de indicação/exclusão são comuns em todas as áreas. São apenas
dois os livros indicados no guia de sociologia, onde em uma obra constam
recomendações de atividades complementares para o trabalho pedagógico com a temática
de gênero, comum a todas as obras que se mostram insatisfatórias nessa especificidade.

Em outra obra existe a informação de que o conceito de gênero enquanto


sociológico e antropológico é apresentado de forma satisfatória, porém sem relação com
o conceito de alteridade, ou seja, não contém atividades que relacionem a possibilidade
de afirmação do outro enquanto sujeito cultural. Mesmo a temática de gênero não ser uma
questão tratada aprofundadamente nas obras de sociologia, achei interessante a
perspectiva e a abordagem sobre as relações de desigualdade social e a crítica às formas
de naturalização dessas relações devido à falta de uma formação sociológica. Considerei
relevante tal aspecto, se consideramos que a assimetria de gênero geralmente recebe um
tratamento como se fosse parte da ―natureza‖ do homem e da mulher, quando na verdade
é resultado de uma construção social e histórica.

3.3.3. Análise dos livros de Educação de Jovens e Adultos.

Considerando a Educação de Jovens e Adultos (EJA) tão importante


quanto o ensino regular na Educação Básica, foi possível, de acordo com seu guia
específico de livros didáticos verifiquei se as obras indicadas para as escolas realizam
trabalho pedagógico com a temática de gênero.

A princípio, verifiquei que assim como os demais guias do PNLD 2012,


existem recomendações em todas as obras para que o professor amplie a discussão,
através de atividades em sala de aula, com o objetivo de contribuir para a formação da
cidadania, através de pesquisa com seus alunos e elementos trazidos de seus cotidianos.

Em pesquisa através do sumário do guia, foi possível verificar que todas as


obras apresentam a temática de diferentes formas: enfocando a desigualdade entre
homens e mulheres, as mulheres no mundo do trabalho, o aumento populacional de

70
mulheres, Lei Maria da Penha e violência contra a mulher, história das mulheres, o
progresso das mulheres no Brasil etc. Essas diferentes abordagens, por sua vez, são
trabalhadas pedagogicamente de forma transversal às disciplinas e o desenvolvimento,
junto à metodologia, foi considerado por mim como mais aprofundado em relação às
obras contidas nos guias de outros níveis educacionais.

3.4. O impacto das políticas educacionais de gênero no Ensino Superior

Dando continuidade à análise das políticas públicas educacionais de


gênero no Governo Lula, descritas no capítulo anterior, verifiquei alguns resultados
relevantes no Ensino Superior do Brasil. Entre eles, a continuidade do ―Programa Mulher
e Ciências‖, realizado em parceria com o Conselho Nacional de Desenvolvimento
Científico e Tecnológico (CNPQ) e a formação de professores em licenciaturas. Quanto
este último, analisei os currículos de algumas licenciaturas das principais universidades
públicas do Estado do Rio de Janeiro, para verificar se existem disciplinas que abordem a
questão de gênero. Em relação ao ―Programa Mulher e Ciências‖, consultei estatísticas
até 2012, para tentar entender o alcance de tal política após o término do Governo Lula,
incluindo as ações de fomento à pesquisa acadêmica do ―Prêmio Construindo a Igualdade
de Gênero‖.

3.4.1. Os impactos na pesquisa acadêmica.

Após o lançamento do primeiro edital do ―Programa Mulher e Ciências‖,


verifiquei no Brasil um crescimento da produção acadêmica sobre a questão de gênero
nas universidades, em maior parte nas públicas. Para obter esta constatação, pesquisei
no Diretório de Grupos de Pesquisas do CNPQ a existência de grupos que possuem
linha de pesquisa sobre gênero, levando em consideração o ano de criação desses
grupos, o qual poderia ser um reflexo ou impacto do Programa.

O levantamento realizado trouxe os seguintes resultados: de 1980 até


2005 formaram-se 178 grupos de pesquisa e de 2005 até 2013 constituíram-se 372
grupos de pesquisa, que abordam de forma direta ou indireta a questão de gênero. Ou
seja, quando não são específicos em alguma abordagem sobre gênero, relações de
gênero e feminismo, há linhas de pesquisa sobre a temática em contextos de pesquisa
mais abrangentes (principalmente nas áreas de história, literatura e psicologia).

71
No lançamento do último edital de incentivo a projetos do ano de 2012,
por exemplo, o incentivo foi através de recursos do Edital ―Relações de Gênero,
Mulheres e Feminismo‖, Chamada MCTI/CNPq/SPM-PR/MDA Nº 32/2012. Não
encontrei informações sobre a continuidade do edital no ano de 2013.

―A presente chamada tem por objetivo selecionar


propostas para apoio financeiro a projetos que visem a contribuir
significativamente para o desenvolvimento científico e tecnológico do
País, estimulando e fortalecendo a produção de pesquisas e estudos
relacionados aos temas relações de gênero, mulheres e feminismos,
buscando contemplar a intersecção com as seguintes abordagens: classe
social, geração, raça, etnia e sexualidade. Esta chamada reservará
recursos específicos para pesquisas voltadas às temáticas das relações
de gênero no campo e na floresta.‖ (Site do CNPQ)

Através desse edital, o CNPQ realizou duas chamadas contemplando 50


projetos com 100.000 reais e 63 projetos foram contemplados com 50.000 reais.
Reiterando a importância de reservar parte dos recursos especificamente a projetos
voltados às temáticas de relações de gênero no campo e na floresta, demonstrando
preocupação em ampliar as pesquisas para atender populações consideradas mais
vulneráveis sócio-economicamente.

3.4.2. Sobre o Prêmio Construindo a Igualdade de Gênero.

O Prêmio Construindo a Igualdade de Gênero também foi uma ação do


Governo Lula voltada ao incentivo da produção acadêmica sobre tal temática, que se
iniciou em 2005 e teve continuidade, chegando em 2013 a sua 9ª edição. O edital
concedeu premiação financeira para vencedores das categorias: graduação, mestrado,
especialização e doutorado. Os estudantes de Ensino Médio, entretanto, foram
contemplados com equipamentos de informática.

Também foram concedidas bolsas de estudo para todas as categorias e


escolas premiadas com recursos de 10.000 reais, para fortalecer as ações desenvolvidas.
Os ganhadores também foram contemplados com assinaturas anuais da Revista de
Estudos Feministas e Cadernos Pagu, assim como os orientadores dos estudantes
premiados.

De acordo com a SEPM, o total de inscritos entre 2005 até 2012 foram
24.833 trabalhos individuais e 151 projetos educacionais. Dessas inscrições, nas

72
categorias do Ensino Superior foram 1659 estudantes de graduação, 1185 graduados e
estudantes de pós-graduação e 660 mestres e estudantes de doutorado. A região sudeste
concentrou a maioria dos inscritos com 37, 02%.

Para contabilizar as premiações de todas as edições, optei por unir as


categorias de estudantes graduados e estudantes de pós-graduação, pois, ocorreu mudança
de categoria após a 2ª edição do prêmio:

Premiações de todas as edições


Categorias 1° 2° 3° 4° 5° 6° 7° 8° Total
Estudante de pós-graduação e graduado 3 3 3 3 4 4 4 4 28
Estudante de pós-graduação e graduado -Menção
honrosa 7 0 2 2 2 2 0 0 15
Estudante de graduação 3 3 3 3 2 2 2 2 20
Estudante de graduação -Menção honrosa 7 0 2 2 2 0 0 0 13
Estudante de Ensino Médio -Etapa Nacional 4 3 3 3 3 3 3 3 25
Estudante de Ensino Médio -Unidade de Federação 38 11 12 12 8 10 13 13 117
Estudante de Ensino Médio - Menção Honrosa 0 3 2 2 2 0 0 0 9
Projetos pedagógicos de Escolas 0 0 0 0 4 4 8 7 23

O levantamento foi realizado através das publicações do Governo Federal


através da SEPM e do CNPQ. Ao total, de acordo com as fontes, foram 250 premiações,
contando com menções honrosas concedidas a estudantes e escolas, com destaque para
um maior número de estudantes de Ensino Médio.

Acredito que a crescente participação de estudantes e escolas a cada ano de


realização do edital, comprova o interesse pela temática. Contudo, sente-se falta de que
ela se torne uma política educacional permanente.

3.4.3. Cursos de pós-graduação e disciplinas de graduação.

Com relação à inclusão de disciplinas voltadas para a temática de gênero


nos cursos universitários, com objetivo de desconstruir as desigualdades e provocar
reflexões sobre tal realidade, sabe-se que não existe uma obrigatoriedade e sim, uma
orientação, já que os cursos e os currículos universitários possuem certa autonomia no
fomento e seleção das disciplinas.

73
Considero importante destacar que não questiono a autonomia das
universidades e sim o pouco avanço com relação à luta pela equidade e desconstrução das
assimetrias de gênero, que é parte de um processo histórico no Brasil e no mundo. Como
parte desse processo histórico, a educação por vezes contribuiu como um fator de
transformação nas relações de força entre as classes sociais.

Percebo que algumas universidades realizaram avanços, com a criação de


cursos de pós-graduação na área da educação e inclusão de novas disciplinas, assim como
com a inclusão da temática de gênero nas licenciaturas.

Como já mencionei antes, analisei as grades curriculares das principais


universidades do estado do Rio de Janeiro: Universidade Federal Fluminense (UFF),
Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Universidade Federal Rural do Rio de
Janeiro (UFRRJ), Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO) e
Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), focando nos programas de pós-
graduação e nas licenciaturas em pedagogia, história, geografia, educação física e
ciências sociais.

Na UFF, encontrei disciplinas com base na temática de gênero nas


licenciaturas de história, ciências sociais, pedagogia (Pádua) e Educação Física. Destaca-
se na licenciatura em Educação Física, a disciplina ―Gênero e Sexualidade na Escola‖,
que é oferecida como eletiva para alunos de todas as graduações:

UFF - Universidade Federal Fluminense


Licenciatura Disciplinas
Educação Física Gênero e Sexualidade na Escola (Optativa)
Antropologia do gênero
Ciências Sociais
Sociologia das relações de gênero
Antropologia do gênero
Sociologia das relações de gênero
História
Relações de gênero e questão social.
Mulher e classes sociais no Brasil hoje
Diversidade cultural, gênero e sexualidade
Pedagogia (Pádua)
Gênero e masculinidades (optativa)

74
Não encontrei informações sobre a temática ser oferecida por programas
de pós-graduação lato sensu ou stricto sensu na UFF, embora tenha sido comprovada a
existência de núcleos e linhas de pesquisa em relação a gênero.

Na UFRJ, existem disciplinas específicas nas licenciaturas de ciências


sociais, história e pedagogia e, como já informamos, a universidade desenvolve o projeto
―Gênero e Diversidade Sexual na Escola‖, promovendo seminários, grupo de estudos e
oficinas nas escolas da rede pública estadual do Rio de Janeiro:

UFRJ - Universidade Federal do Rio de Janeiro


Licenciatura Disciplinas
Laboratório Estudos Sexualidade Gênero (optativa)
Ciências Sociais Sociologia das Relações Gênero (optativa)
Gênero e Família (optativa)
História Questões de gênero na Idade Média (optativa)
Pedagogia Educação e Gênero (optativa)

Assim como na UNIRIO, na UFRRJ não encontrei informações sobre


disciplinas específicas nas grades curriculares das licenciaturas e nos programas de pós-
graduação, porém existem linhas de pesquisa no mestrado e no doutorado em Ciências
Sociais.

Para a pesquisa na UERJ foi preciso analisar grades curriculares em


licenciaturas e na pós-graduação dos cursos oferecidos no campus Maracanã, na cidade
do Rio de Janeiro, na Faculdade de Formação de Professores (FFP) localizada na cidade
de São Gonçalo e na Faculdade de Educação da Baixada Fluminense (FEBF), abrangendo
os municípios de Nova Iguaçu e Duque de Caxias.

No site da FFP e da FEBF não existem informações sobre o trabalho com a


temática de gênero especificamente no currículo das disciplinas das licenciaturas, como
também não encontrei nos programas de pós-graduação. No Campus Maracanã encontrei
informações de trabalho em programas de pós-graduação nas ciências sociais.

Em parceria com o Centro Latino Americano em Sexualidade e Direitos


Humanos e o Instituto de Medicina Social, a UERJ desenvolveu dois curso de

75
especialização lato sensu e semipresenciais: ―Formação em gestão pública em gênero e
raça‖ e ―Especialização em gênero e sexualidade‖. Os cursos são atuais e recebem
inscrições. Ainda na UERJ (Maracanã), identifiquei a existência de duas disciplinas no
programa de pós-graduação em Ciências Sociais, através de cursos de leitura e seminários
de tese: ―Estudos de gênero e desigualdades contemporâneas‖ e ―Relações de gênero,
poder e política no contexto contemporâneo – Estudos de gênero‖.

Assim, a partir do levantamento realizado nas principais universidades


públicas localizas no Estado do Rio de Janeiro, percebo que ainda são poucas as
disciplinas ofertadas quanto à questão de gênero e elas são quase exclusivamente das
áreas humanas. Outras áreas, como exatas, ciências biológicas, artes, entre outras,
mostram escasso envolvimento com a questão.

76
Conclusão

Ao longo do meu trabalho, procurei evidenciar as lutas das mulheres por


educação escolar, desde as reivindicações por instrução durante o período colonial, até o
período republicano, chamando a atenção para as grandes assimetrias sociais, raciais e de
gênero. Verifiquei a existência de uma luta invisível de mulheres das classes dominantes
e subalternizadas, abandonadas em conventos ou casas de recolhimento por não se
ajustarem a um sistema patriarcal que possibilitava somente aos homens ter domínio
sobre seus projetos de vida.

Considerando esse contexto, a fundação dos institutos profissionais


femininos foi um marco importante para o avanço profissional e educacional das
mulheres, assim como as reformas pombalinas e a instituição da Lei Geral do Ensino
primário de 1827. Também devemos lembrar o processo de ―feminização do magistério‖
e a instituição das Escolas Normais.

As mudanças no cenário social imposto às mulheres possibilitaram a


oportunidade de iniciar carreiras profissionais e saírem parcialmente da esfera do privado,
embora num espaço associado à função materna de cuidados e ensino de valores e de
disciplina, como é o espaço escolar. Percebemos que este ingresso da mulher no
magistério não veio acompanhado de uma transformação nos currículos nem mudanças
nas velhas ideologias sexistas, que perpetuaram perspectivas e papéis de gênero
estereotipados e desiguais.

Já no século XX, as mulheres se organizaram politicamente para lutar


contra o patriarcado, primeiramente com a ―primeira onda‖ do feminismo, lutaram por
sufrágio universal, sem, no entanto, propor mudanças mais profundas, com relação à
educação, por exemplo. Devemos considerar como exceção, as mulheres organizadas nos
movimentos anarquistas e socialistas, consideradas mais radicais, propuseram uma
educação forjada contra as opressões patriarcais do sistema capitalista.

No Brasil, vivenciamos muito pouco do que foi a ―segunda onda‖ do


feminismo devido à intensa repressão da Ditadura Militar, que condenou muitas mulheres
ativistas políticas ao exílio em outros países. Estas mulheres, todavia, no retorno ao país a

77
partir da década de 80, após anos de estudos no exterior, fundaram os primeiros grupos de
pesquisa na academia e disseminaram suas produções científicas sobre gênero através de
teses, revistas e periódicos.

Iniciou-se também uma disputa por espaços de poder político tanto no


legislativo como em outros órgãos que se propunham a desenvolver projetos junto à
população feminina, como também elaborar, implementar e acompanhar/fiscalizar
políticas públicas.

Após a redemocratização, a educação escolar foi vista como um meio de


superar as desigualdades sociais, embora no período neoliberal que teve auge no Governo
FHC, a política educacional esteve atrelada às diretrizes do Banco Mundial, do BID e de
outros órgãos internacionais.

De acordo com meus estudos, as políticas criadas nesse governo não


atingiram as reivindicações dos movimentos sociais quanto à implementação de uma
política educacional que superasse desigualdades. Em relação á questão de gênero,
identifiquei como ação mais relevante as recomendações dos Parâmetros Curriculares
Nacionais (PCN) publicados em 1997. No entanto, não instituem a obrigatoriedade do
ensino, cabendo ao professor decidir por tratar do tema.

Com a chegada do Governo Lula, as reivindicações dos Movimentos


Feministas se renovaram, principalmente através da construção da Plataforma Feminista,
ainda em período eleitoral e depositaram-se novas esperanças em um governo que chegou
ao poder graças ao apoio desses e outros movimentos sociais.

De acordo com minha pesquisa, o Governo Lula foi, até os dias de hoje, o
que mais investiu em políticas públicas de gênero e de diversidade. Criou-se a Secretaria
Especial de Políticas para as Mulheres que desenvolveu programas de educação
continuada, revisão de livros didáticos e publicação de novos materiais e incentivo a
projetos acadêmicos vinculados à temática de gênero.

As duas primeiras Conferências Nacionais de Políticas para as Mulheres


foram tratados neste trabalho como espaços de participação democrática e de definição de
novas propostas muito importantes. Contudo, as conferências não funcionaram de forma

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deliberativa e sim consultiva e muito pouco dos seus Planos Nacionais foram realmente
alcançados pelo governo em suas agendas de políticas públicas (PETINELLI, 2011).

Com relação à educação continuada, foi produtiva a criação de cursos para


professores da educação básica, mas poderia ter se avançado mais e institucionalizado
tais ações, que apenas funcionaram como editais aplicados somente em algumas regiões e
sem continuidade. Foi o caso do Curso Gênero e Diversidade na Escola, parceria entre a
SEPM, a Secad e o Clam/UERJ. Foi moldado no ensino à distância, com a justificativa de
abranger um maior número de professores cursistas e também por questões de diminuir
custos econômicos.

Na formação inicial de professores, pouco avançamos. Analisando a grade


curricular das licenciaturas em pedagogia e ciências humanas das cinco principais
universidades públicas localizadas no Estado do Rio de Janeiro, percebemos que a
maioria não possui alguma disciplina que aborde as questões de gênero, as poucas
existentes são geralmente disciplinas optativas e que não se oferecem todos os semestres.

Em relação ao Programa Nacional do Livro Didático (PNLD), verifiquei


muita produção e trabalho pedagógico na Educação de Jovens e Adultos e a retirada de
material com conteúdo estereotipado ou discriminatório quanto à questão de gênero.
Contudo, é preciso avançar para que todos os materiais indicados pelo PNLD contenham
algum trabalho pedagógico sobre a temática e que o mesmo seja construído em parceria
com os Movimentos Sociais.

Constatamos também como ação governamental significativa um incentivo


às pesquisas de gênero e um crescimento de fato dos grupos de pesquisa e de publicações
referentes a esta temática. Embora seja difícil estimar se tal aumento é resultado das
ações governamentais descritas no capítulo 2, ou porque a temática já tinha adquirido
uma legitimidade no campo acadêmico.

A sucessão de Dilma Rousseff desde o processo eleitoral foi explorada


significativamente por parte dos Movimentos Feministas, considerado um avanço
legítimo da participação política das mulheres. Outros cargos em órgãos governamentais
a nível nacional também foram destinados às mulheres, como por exemplo, ministérios,
presidências de bancos e empresas estatais.

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Compreendendo o Governo Lula e Dilma, consecutivos e identificados sob
as mesmas linhas políticas, considerei alguns fatos ocorridos durante esse último
governo, como retrocessos educacionais e de consciência política sobre gênero e
diversidade sexual, como por exemplo, o Estatuto do Nascituro, o veto ao kit anti-
homofobia e a eleição do deputado pastor Marco Feliciano para a Comissão Parlamentar
de Direitos Humanos.

O pastor, após se posicionar de forma fundamentalista e ainda ser


nomeado pela ―Bancada Evangélica‖ aliada ao Governo Dilma, em sua primeira ação
como presidente da Comissão de Direitos Humanos da Câmara de Deputados, enviou a
votação o Projeto de Lei conhecido como ―Cura Gay‖, que altera a resolução 1999 do
Conselho Federal de Psicologia, para que a homossexualidade pudesse receber tratamento
como doença.

Outra polêmica que vai contra as reivindicações do Movimento Feminista


foi o ―Estatuto do Nascituro‖, em pauta para votação no Congresso Nacional desde 2007.
Prevê direitos iguais para fetos de crianças já nascidas, inclusive a proibição de aborto em
caso de estupro. Considerado um retrocesso pelo Movimento Feminista que conquistou o
direito ao aborto em casos de gravidez por estupro desde 1940. O estatuto ainda concede
―bolsa-estupro‖ para as mulheres que decidem não abortar e inclusive garante direitos de
paternidade ao estuprador.

Concluo esta monografia destacando que apesar de ter abordado uma


temática muito abrangente e complexa, talvez complexa demais para o perfil de um
trabalho acadêmico de graduação, esteve orientada pela preocupação de falar de uma
temática ainda pouco discutida nos cursos de pedagogia. Nesse sentido, quis destacar, de
acordo com Arroyo (2012), a atuação de atores e movimentos sociais de resistência e luta
contra as desigualdades e contra a pedagogia dominante tradicional.

Entendo a escola como mais uma instituição a contribuir com a


transformação social, mas para isso é necessária a apropriação do saber historicamente
acumulado pelas classes subalternas que estão na escola. Visibilizar e democratizar este
saber de forma igualitária na escola para a promoção de uma consciência crítica é uma
das condições que propiciam a transformação da sociedade.

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A co-educação, por sua vez, pode ser proposta para as formulações de
políticas de Estado e projetos político-pedagógicos, através da legislação que motive o
acesso e a permanência igualitária na escola, do sistema educativo incentivador de
carreiras profissionais sem preconceito de gênero, das unidades escolares que eliminem
qualquer elemento que seja segregador e principalmente, dos currículos e das relações
estabelecidas entre professores e alunos.

A proposta curricular para o trabalho pedagógico com a temática de


gênero poderá ser transversal através das disciplinas, como também há de se atentar para
atividades específicas como, por exemplo: palestras e oficinas que promovam o
protagonismo, a criatividade e o empoderamento de crianças e adolescentes.

Desse modo, percebemos que são muitos os desafios para ir além da escola
atual mista e avançar para ―uma política pública propositiva e implementadora de modos
de pensar e transformar as relações de gênero na escola‖ (AUAD, 2006, p.55).

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