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Diversidade Sexual na Escola

A LEXANDRE B ORTOLINI 1

Durante o ano de 2007 o Projeto Diversidade Sexual na Escola realizou uma


série de oficinas em escolas da rede pública de ensino da região metropolitana
do Rio de Janeiro. As oficinas, voltadas a profissionais de educação e licen-
ciandos, serviram também como um instrumento de pesquisa e avaliação.
Foram levantados uma série de dados, cuja primeira análise é o que preten-
demos apresentar, acerca das percepções dos profissionais quanto à homos-
sexualidade, travestilidade e transexualidade dentro do contexto educacional,
especialmente no que diz respeito a práticas escolares e situações de violência
e discriminação.

Transformação de paradigmas

Nos anos 1960 teve início um processo de aprofundamento das mudan-


ças sociais com relação ao comportamento e à sexualidade. Os dois movi-
mentos que mais contribuíram para essas transformações foram o movimento
feminista e, mais tarde, os movimentos gay e lésbico (Castro, 2004, p. 31).
Ainda hoje, vivemos um momento de transição, de transformações dos
paradigmas de comportamento sexual e afetivo na nossa sociedade.

1. UFRJ. Colaboradores: Luan Carpes Barros Cassal e Regina Bortolini.

667
Alexandre Bortolini

Como em todo momento de mudança, a realidade de hoje guarda várias


contradições. Ao mesmo tempo em que vemos e convivemos cada dia mais
com uma diversidade sexual cada vez mais rica e menos rotulada, se mantêm
e até se reforçam atitudes preconceituosas, discriminatórias e violentas de
pessoas, grupos e instituições conservadoras.
Esse embate entre o novo e o conservador, entre a conquista dos direi-
tos e a repressão originada nos preconceitos se dá em todo o corpo social, em
diferentes lugares e momentos. Na família, no círculo de amigos, na comu-
nidade, no trabalho e, é claro, na escola.

Nosso campo de trabalho e aprendizado

Desde 2006 o Projeto Diversidade Sexual na Escola desenvolve ativi-


dades, junto a profissionais de educação, que têm como objetivo contribuir
para a superação de um ambiente de sexismo e homofobia nas escolas. Essa
atuação acontece especialmente através de oficinas de sensibilização, que
reúnem todos os profissionais de educação de cada escola. Junto a essa atua-
ção, foi realizada, em 2007 e 2008, uma pesquisa, para levantar algumas
informações sobre a percepção desses profissionais sobre questões ligadas à
homossexualidade, travestilidade, transexualidades, identidades sexuais,
gênero, violência e discriminação. Da massa de dados que foram levantados
nessa pesquisa-ação, tanto via questionário como através de relatos recolhi-
dos, propomos algumas considerações, baseadas também na própria expe-
riência e percepção acumuladas durante esses anos de trabalho, no contato
direto com os educadores.
Numa oficina, realizada na própria escola, é possível alcançar o con-
junto dos profissionais de uma forma mais ampla. Diferentes visões vão se
contrapor, e alguns participantes vão estar ali justamente para marcar o seu
ponto de vista contrário a essa discussão. As contradições, preconceitos, di-
vergências (e por que não, convergências) que convivem no ambiente escolar
ficam mais claras e evidentes. Esse é, exatamente por essa diversidade, um

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Diversidade Sexual na Escola

ambiente excepcional para a construção de um processo de diálogo – às vezes


conflituoso – e de aprendizado – especialmente para pesquisadores – sempre
extremamente rico.

Primeiras percepções

O primeiro dado interessante que nos aparece é a clássica pergunta


sobre homossexualidade e doença.

Sobre a homossexualidade, você acredita que é uma doença?

Ignorado

2% Sim
9%

Não 89%

Esse número, a princípio, parece refletir que uma grande maioria (89%)
não enxerga a homossexualidade de um modo negativo. No entanto, enquanto
só 9% consideram a homossexualidade uma doença, na questão seguinte 18%
dos profissionais de educação vão dizer que a homossexualidade é um desvio
de caráter ou de personalidade. Os dados são próximos quando se trata da
transexualidade/travestilidade (7%/88% e 23%/70%)

669
Alexandre Bortolini

Sobre a homossexualidade, você acredita que é


desvio de caráter ou personalidade?

Ignorado
3% Sim
18%

Não
79%

Aqui talvez seja interessante pensarmos sobre o que significa enxergar


a homossexualidade como uma doença ou como um desvio de caráter. Que
consequência isso traz no momento de lidarmos com essa questão, e mais
especificamente com essas pessoas? Enxergar a homossexualidade como
doença de certa forma pode gerar uma relação de pena, assim como um intuito
de trabalhar por uma cura. Podemos também conjecturar que, por outro lado,
entendê-la como um desvio de caráter pode remeter a uma culpabilização des-
se sujeito e, por consequência, a um intuito de punição.
De qualquer forma, mesmo diante desses números, ainda teríamos aí
uma grande maioria de educadores sem um discurso que rejeite, culpabilize
ou penalize a homossexualidade/travestilidade/transexualidade (79%). No
entanto, quando começamos a esmiuçar mais intensamente algumas questões,
iremos perceber que um número mais considerável de educadores vai apre-
sentar dificuldades com a questão.

670
Diversidade Sexual na Escola

Diversidade sexual na escola

Quando perguntados sobre ter um aluno/aluna homossexual, os


educadores respondem:

Sobre ter um aluno homossexual, você

Ignorado

2%
Não gostaria de ler um
1% aluno homossexual
18%
Não me importaria, desde
que ele ou ela não
expressasse sua
orientação em sala de aula

Não me importaria, mas


60% 19% teria dificuldade para lidar
com a situação

Simplesmente não me
importaria

À margem daqueles que apresentam, na sua fala, alguma dificuldade


com o tema, já se nota um aumento dos 18% da pergunta anterior para 38%
(1% + 18% + 19%). Vale ressaltar duas respostas.
Primeiro, quando os educadores respondem que não se importariam,
desde que o aluno ou aluna não expressasse sua orientação em sala, o que está
claramente em jogo é o reconhecimento ou não das diferentes identidades
sexuais. Mais do que o desejo ou a prática homossexual, o que incomoda no
caso é a visibilização dessa sexualidade através de gestos, jeitos de ser, de
vestir, de falar. O incômodo com essas identidades vai para além do discurso
direto, do “assumir-se” ou não por parte desses aluno. Em sua grande maioria,
está relacionado a comportamentos de gênero conflitantes com os que esse
educador espera ou entende que seja o correto. Esse tipo de visão, sem dúvida,

671
Alexandre Bortolini

tem grandes chances de repercutir em um processo de repressão e negação de


identidades (o que vai ficar mais claro no caso das transexuais e travestis, que
vamos detalhar mais à frente).
Outra fala que chama atenção é a de educadores que dizem não se im-
portar, mas admitem ter dificuldades para lidar com a situação. Essa fala pode
refletir tanto uma sensação de despreparo para trabalhar, como educador,
questões ligadas à sexualidade ou mesmo à diversidade, quanto um autorreco-
nhecimento de suas limitações pessoais. De qualquer forma, já aponta para
uma postura um pouco mais positiva, na medida em que, de certo modo, esse
educador reconhece ou admite a visibilização das identidades sexuais desses
alunos, mesmo que isso ainda lhe incomode de alguma forma.
Mas, diante de um aluno ou aluna homossexual, esses educadores
entendem que alguma atitude deve ser tomada? Se sim, qual?

Qual deve ser a atitude institucional com relação a um aluno/a que a escola
descobriu ser homossexual

Ignorado
7

15 0 afastamento do aluno/a

convocar os
27 responsáveis para
discutir atitudes diante
do faro

encaminhar o/a aluno/a


37 para orientação
psicológica
14
nenhuma

outros

Aqui temos um ponto crucial. 41% (27% + 14%) dos educadores


entendem que devem tomar alguma atitude e, mais do que isso, que essa

672
Diversidade Sexual na Escola

atitude está diretamente relacionada ao aluno homossexual. Além da obvie-


dade do quão prejudicial e desrespeitoso pode ser a convocação dos respon-
sáveis ou o encaminhamento ao psicólogo (o que aliás contraria a própria
orientação dos conselhos de psicologia), a questão é que estes educadores
ainda compreendem a homossexualidade de um aluno como algo que precisa
ser resolvido, discutido, encaminhado, enfim, algo que, se não constitui um
problema declaradamente, se coloca como uma questão com a qual é preciso
lidar e diante da qual precisamos agir.
Apenas 37% não vão propor nenhuma atitude, ou entendendo que a
homossexualidade desse aluno não é, em si, uma questão a lidar, ou que ela
não diz respeito ao trabalho dele como educador.

Fora da escola

E quando essa questão se coloca no nosso universo pessoal ou no


convívio social e público para além do espaço escolar? Tentando entender
como esses educadores lidam particularmente com essa diversidade, lançamos
algumas perguntas.

O que você faria se descobrisse que seu filho é gay ou sua filha é lésbica?

Ignorado

7
0 expulsaria de casa

31 19 encaminhamento para um
psicólogo ou para alguma
orientação religiosa para
tentar revertar a situação
1
aceitaria, desde que ele
não expressamente sua
opção em casa
tentaria aceitar, apesar de
ter dificuldades pessoais
42 com o assunto
aceitaria sem problemas

673
Alexandre Bortolini

O que você faria se descobrisse que seu filho é transexual ou travesti?

Ignorado

expulsaria de casa
8
19 0
encaminharia para um
psicólogo ou para
alguma orientação
24 religiosa para tentar
reverter a situação

aceitaria, desde que ele


não expressasse sua
opção em casa
5
tentaria aceitar, apesar
44 de ter dificuldades
pessoais com o
assunto

Quando analisamos a posição dos educadores com relação a essas


questões em sua vida privada, fica evidente que, se profissionalmente muitos
se posicionam de forma menos conservadora, a grande maioria ainda carrega,
de fato, dificuldades pessoais para lidar com a questão. Com relação a filhos
gays ou lésbicas, 62% dão respostas que demonstram algum grau de
dificuldade com o fato. Quando a questão é uma filha travesti ou transexual,
apenas 19% dos educadores a aceitariam sem problemas.

O que você acha sobre casais homossexuais andando de mãos dadas


ou se beijando em locais públicos?

Ignorado
6% acho um desrespeito às
6%
outraas pessoas
33% acho ruim, pois poderia
representar uma má
15% influência para crianças
e jovens

me chocaria um pouco,
mas não sou contra

não vejo problema

40%

674
Diversidade Sexual na Escola

O que você acha sobre casais homossexuais andando de mãos dadas


ou se beijando na televisão?

4
8 Ignorado

32 acho um desrespeito às
outraas pessoas
acho ruim, pois poderia
representar uma má
27 influência para crianças
e jovens

me chocaria um pouco,
mas não sou contra

não vejo problema


29

Aqui fica evidente que as posições dos educadores no espaço social


extramuros da escola tendem a ser mais conservadoras. Ou, quando despidos
da roupagem de profissionais da educação, podem revelar o que de fato pen-
sam ou sentem. E é difícil imaginar que essas posições pessoais possam não
influenciar posturas no ambiente escolar. Como na pergunta a seguir:

Se na sua escola o namoro e demonstração de afeto entre alunos fosse


permitido, o que você acharia sobre dois alunos (meninos) ou duas alunas
namorando ou andando de mãos dadas na escola?

Ignorado

7% 6% Não deveria ser permitido


de forma alguma
9%
Não deveriam ser
reprimidos diretamente,
mas aconselhados a não
manifestarem sua
orientação sexual dentro
da escola
45%
33% Não veria nenhum
problema, já que a
escola permite o namoro
Outros

675
Alexandre Bortolini

Mesmo que a escola permitisse as demonstrações de afeto, 9% dos


educadores propuseram que elas fossem vedadas aos homossexuais, e 33% os
aconselhariam a não manifestar sua orientação. Mais uma vez vem à tona a
invisibilização da homossexualidade, como uma maneira de tornar a questão
mais “digerível” para muitos educadores. Nos discursos, os educadores
apontaram não apenas que a homossexualidade é algo que deve ficar restrito
à vida privada dos homossexuais (embora o mesmo não seja pedido aos hete-
rossexuais), como também entendem a expressão das identidades sexuais
(seja pelo afeto, seja pelo jeito de ser em contradição com as normas hegemô-
nicas de gênero) como algo que pode “agredir” aos heterossexuais. Ou seja, a
simples expressão dessa sexualidade não-hegemônica já seria, em si, uma
violência aos que compartilham da norma.

Travestilidade e transexualidade

Um dos temas mais difíceis de serem trabalhados é, sem dúvida, a


questão que envolve transexuais e travestis. Todas as discussões acabam por
redundar, de fato, no reconhecimento ou não da identidade feminina que
esses sujeitos apresentam.

Um aluno chegou e pediu para ser chamado de Fernanda*, ou então


Fê*. O nome dele era Fernando* (o nome verdadeiro foi mantido em
sigilo), então era fácil porque esse apelido serve tanto pro masculino
quanto para o feminino. De qualquer maneira, a gente respeitou. E a
direção chegou e decretou, sem consultar a gente, que não podia, tem
que chamar como está na identidade. “A sexualidade de um adolescente
de doze anos ainda está em formação, e ele não foi diagnosticado trans”
etc. Por isso, ele foi obrigado a cair de sunga na piscina. Ele cobria o
corpo com as mãos, como se estivesse seminu. Dava pra ver como aquilo
agredia ele. Ele fez isso três vezes e, depois, ele saiu da escola. Dias
depois de abandonar, ele foi num evento da escola e deu pra ver que

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Diversidade Sexual na Escola

circulava tranquilamente entre os alunos. O preconceito está muito mais


na escola, na direção. Como se o aluno, por ter doze anos, não fosse
dotado de direitos humanos, e não tivesse direitos sexuais e repro-
dutivos. Foi um tapa na cara de todo mundo pra acordar. E disseram que
ele está fazendo ponto perto da nossa casa, mas são as mesmas pessoas
que obrigaram a chamá-lo de Fernando, então não sei se é verdade
(Professora).

(* Com o objetivo de tornar a questão o mais clara possível, utilizamos


aqui termos com os quais não concordamos, mas que são amplamente
difundidos no senso comum.)

Sobre o travestismo*, você acredita que é desnecessário, afinal, por ser


homossexual um homem não precisa se vestir de mulher nem uma mulher se
vestir de homem?

Ignorado
12%

Sim
52%
Nâo
36%

O não reconhecimento da identidade das travestis como uma iden-


tidade válida, mas como algo desnecessário, aponta para aquilo que talvez seja
a maior barreira para que esse segmento consiga alcançar o exercício pleno
de seus direitos no ambiente escolar. Se ser travesti é algo desnecessário, se
não é algo sério ou se eu não reconheço essa identidade, então, não faz sentido
pensar no uso do banheiro feminino, no nome social na chamada e em
nenhuma reivindicação que venha nesse sentido.

677
Alexandre Bortolini

Mas precisa? [uma aluna travesti usar o uniforme feminino] Tem


necessidade disso? (Estagiária de Pedagogia)
Eu tenho que chamar pelo nome que está na carteira de identidade. Se
ela mudar o registro civil dela, aí tudo bem (Professora).

Durante uma das oficinas realizadas em escolas públicas, os professo-


res iniciaram um intenso debate sobre flexibilização ou não de normas e regras
para uma aluna travesti. Depois de muitas idas e vindas, argumentos e contra-
argumentos, uma professora, já exausta, lançou “Ah! Mas ele é homem! E
pronto!”.
Mudar o nome na chamada, permitir o uso do uniforme feminino, com-
partilhar o banheiro das meninas, tudo isso, no fundo, depende de o educador
reconhecer ou rejeitar a identidade feminina da travesti. Se ele reconhece, tudo
é resolvível. Se, pelo contrário, ele rejeita, tudo é empecilho.

O que você faria se tivesse um aluno transexual ou travesti?

Ignorado
4%

0% Não admitiria ter um


travesti como aluno

35% Aceitaria o aluno,


desde que na aula ele
se vestisse como
homem
61%
Aceitaria o aluno, não
importando que
uniforme ele estivesse
vestindo

Talvez grande parte desse não reconhecimento tenha relação com a


experiência concreta de cada um e do contato que já tiveram (ou não tiveram)
com travestis e transexuais. Grande parte das pessoas nunca conheceu ou
conviveu com uma travesti.

678
Diversidade Sexual na Escola

Você tem algum (a):

80 74
amigo ou amiga
homossexual
70
amigo ou amiga transexual
60 ou travesti
parente homossexual
50
parente transsexual ou
travesti
40
Nenhum
28
30

20 16

10 7
2
0

Os estereótipos relatados pelos educadores nas oficinas fazem parte do


senso comum, especialmente do que é retratado pela mídia. Os profissionais,
ao longo da oficina, demonstram um grande desconhecimento do universo das
travestis e transexuais, sem nem mesmo saber exatamente o que signifiquem
essas identidades. Pelo que pudemos perceber, para muitos é como se gays,
travestis e transexuais fossem quase como que gradações da homossexuali-
dade (associada aí também a uma aproximação ao jeito de ser do gênero opos-
to), onde travestis (especialmente) ocupam o lugar do exagero e do excessivo.
O reconhecimento da identidade travesti como uma identidade própria, dife-
renciada da identidade gay é passo necessário para que uma série de alunas
que assim se reconhecem possam ter seus direitos e sua integridade respei-
tados. E para isso é fundamental possibilitar, seja via vídeo, texto ou por
diferentes instrumentos, o contato dos educadores com o universo de travestis
e transexuais, como forma de desconstruir estereótipos.

679
Alexandre Bortolini

Você já presenciou alguma situação de discriminação relativa à


Violência e discriminação
orientação sexual na escola envolvendo

alunos

professores/funcionários e
50% alunos(as)
45% 44%
direção e alunos
40%
35%
35% direção e
30% professores/funcionários
30%
25% 20% pais/mães/responsáveis
de alunos e
20% professores/funcionários
15% 10%
10% pais/mães/responsáveis
4% 5% 5% e alunos
5%
nunca presenciei
0%
situação como esta

Você já presenciou alguma situação de violência física ou verbal


relativa à orientação sexual na escola envolvendo

alunos

professores/funcionários e
60% alunos(as)
51%
direção e alunos
50%
direção e
40% professores/funcionários
34%
30% pais/mães/responsáveis
de alunos e
20% professores/funcionários

pais/mães/responsáveis
10% 7% e alunos
1% 1% 2% 5% nunca presenciei
0% situação como esta

680
Diversidade Sexual na Escola

O índice de 20% para situações de discriminação em que o professor ou


funcionário é agente, embora esperado, aponta para uma realidade muito
preocupante. E, embora pareça um número baixo, 7% é um percentual bem
elevado se considerarmos que o que está em questão são agressões físicas ou
verbais. É bom esclarecer que esses números não podem ser, de modo algum,
tomados como dados estatísticos. Eles não refletem a realidade da violência e
discriminação nas escolas. Eles falam, de fato, sobre a percepção dos profis-
sionais de educação sobre essas situações, contando, inclusive, com a natu-
ralização e banalização que invisibilizam tais situações, como já foi apontado em
outros estudos, como a pesquisa da Unesco, por exemplo (Castro, 2004, p. 280).

Como agir diante da violência?

Mas como esses profissionais agiriam, em tese ou de forma concreta,


diante de situações de violência e discriminação no contexto escolar?

Como você reagiria a uma situação de discriminação por orientação


sexual entre alunos em sua sala de aula?

Levantaria um debate com a


turma sobre o tema
70% Conversaria com o aluno
discriminado sobre as suas
60% atitudes que podem ter
provocado essa situação
50% Mandaria os envolvidos para
a direção, para avaliar o caso
40% Chamaria os responsáveis
do aluno discriminado
30% Chamaria os responsáveis
19% 19% dos alunos que promoveram
20% a discriminação
11% 11% 13%
10%
Não me envolveria, os alunos
são capazes de resolver isso
1%
0% outros

681
Alexandre Bortolini

Nessa questão, o que chama a atenção são os 19% de educadores que


conversariam com o aluno discriminado sobre as suas atitudes que podem ter
provocado o fato, assim como os 11% que chamariam os pais desse aluno. Aqui
fica evidente uma “culpabilização da vítima”, como exemplifica o relato a
seguir:

Mas aí a gente já teve até aqui na escola e viu que não é bom mesmo
(ter alunos homossexuais). Porque o menino dava sempre em cima dos
caras e os caras batiam nele. Aí ficava a maior bagunça. Então era
melhor que não tivesse. Ficava a maior pancadaria. Os alunos não sabem
lidar. Que pena que foi tirado da escola, porque eu havia conseguido que
ele se comportasse melhor [...] (Professor).

Podemos aqui pensar numa relação entre essa atitude e a percepção de


que quando um homossexual expressa ou visibiliza sua identidade sexual isso
pode ser entendido como uma “agressão” aos outros – identificados aí como
pessoas conservadoras ou simplesmente heterossexuais. Assim, a violência
sofrida seria “justificável”, ou seja, uma mera reação (mesmo que despropor-
cional para alguns ), consequência direta do comportamento “desviante” e
“agressivo” daquele jovem gay ou lésbica.

Já tivemos casos aqui na escola, e o grande problema não é conosco,


professores. A gente ficava muito espantado – tatuagem, roupa curta [...]
Agredia. E os professores conversavam com ele para fazer algo mais
natural. Mas os alunos não aceitavam, e ele acabou se afastando da
escola, acho que nem estuda mais (Professora).

Como ponto positivo, dentro disso tudo, 65% dos educadores que
sugerem um debate com a turma sobre o tema. Embora dependendo da forma
como essa discussão seja proposta ou realizada, ela possa redundar em novas
situações de discriminação e violência, esse número já aponta para uma boa
parcela de educadores que não entendem como foco do “problema” o aluno
homossexual, mas sim o preconceito e a intolerância em si.

682
Diversidade Sexual na Escola

Mas e quando o autor dessa discriminação ou violência não é um aluno


ou uma aluna, mas um educador? Ou a própria direção da escola?

Eu fiz um trabalho de educação ambiental onde a gente buscava os


alunos nas escolas, levava pro núcleo, lanchava e ia pro campo. Tava
num ônibus com uma turma, aquela zona de sempre. Tinha um menino
efeminado, e nenhum aluno discriminava, era o xodozinho da turma. O
professor da turma começou a gritar mais alto que os outros pra ele “ô
homo, ô homo, senta aí homo sapiens” (Professora).

E se o autor da discriminação fosse um professor


ou funcionário da escola?

Levaria o caso para a direção


da escola

50%
Denunciaria o caso para a
45% CRE, Secretaria de Educação
45% ou outro órgão responsável
40% Conversaria com o aluno sobre
35% as sua atitudes que podem ter
32%
provocado essa discriminação
30%
Conversamos com meu colega
25% profissional para tentar resolver
20% a situação sem envolver outras
instâncias
15%
8% 10% 9%
10% Não me envolveria, o
3% profissional deve saber o que
5% está fazendo
0% outros

683
Alexandre Bortolini

E se a discriminação partisse da direção da escola?

60% Denunciaria o caso para a


CRE, Secretaria de Educação
49% ou outro órgão responsável
50%
Conversaria com o aluno sobre
as sua atitudes que podem ter
40% provocado essa discriminação
Discutiria a questão em reunião
30% para tentar resolver a situação
sem envolver outras instâncias
20% 18% Não me envolveria, a direção deve
13% saber o que está fazendo
11%
10% 7% outros

0%

O que esses números nos retratam é que os profissionais entrevistados,


em sua maioria, se propõem a lidar com as situações de discriminação e vio-
lência envolvendo colegas ou a direção da escola num universo privado, quase
pessoal, quase nunca recorrendo a instâncias legais ou externas à escola. Ape-
nas 3% (quando o professor/funcionário é o agente) e 7% (quando a direção é
o agente) denunciariam o caso à Coordenadoria de Educação, Secretaria ou
algum outro órgão responsável. A grande maioria (45% e 49%) tentaria resol-
ver o caso pessoalmente ou em reunião, sem envolver outras instâncias.
Para tentar identificar mais claramente as razões para essa atitude
precisaríamos aprofundar mais a pesquisa, embora possamos conjectura que
essas questões estão relacionadas a um certo corporativismo por parte dos
educadores, ou mesmo a uma descrença na atuação de determinadas ins-
tâncias legais ou administrativas.
De qualquer forma, o que nos salta aos olhos é perceber o quanto a
homofobia ainda goza de uma certa margem de tolerância, como algo que

684
Diversidade Sexual na Escola

supostamente pode ser tratado e resolvido entre quatro paredes. Não fizemos,
mas se a questão aqui envolvesse uma discriminação racial e étnica será que
as respostas seriam as mesmas?

Conclusão?

Na experiência que acumulamos ao longo de mais de dois anos realizan-


do oficinas em escolas públicas de todo o estado do Rio de Janeiro, o que se
pode perceber é uma ânsia muito grande por discutir o tema. Isso fica claro a
partir da grande procura de escolas e profissionais por oficinas, cursos e mate-
riais. Ânsia não simplesmente porque a escola quer se atualizar ou algo seme-
lhante, mas porque alunos e alunas gays, lésbicas, travestis, transexuais e bis-
sexuais estão assumindo suas identidades dentro da escola e, em muitos casos,
enfrentando educadores e até a própria direção na afirmação de seus direitos.
Fica evidente em muitos casos a angústia de muitos educadores, que se
sentem incomodados ou com dificuldades em lidar com a diversidade sexual,
ao mesmo tempo em que demonstram um interesse grande em não
desrespeitar ou agredir quem quer que seja, embora não saibam exatamente
como fazer isso.
É fundamental hoje que se ampliem, criem e estabeleçam políticas
públicas voltadas para profissionais de educação que trabalhem para deslocar
as discussões sobre homo/trans/travestilidade do senso comum. É imprescin-
dível aproximar o universo das travestis e transexuais da maioria dos
educadores que o desconhecem completamente. É importante ampliar o
debate mesmo sobre sexualidade, gênero, sexismo, enfim, uma série de
questões mais amplas e que são fundamentais para a superação de um
ambiente homofóbico na escola.
Mais que isso, é preciso estabelecer um ideário de uma educação
democrática, pública e inclusiva. É preciso reconhecer de uma vez por todas
que a diversidade é legítima. A diversidade, segundo o próprio discurso
governamental expresso em documentos como a Lei de Diretrizes e Bases da

685
Alexandre Bortolini

Educação e o Programa Brasil Sem Homofobia, precisa ser encarada como


recurso social para a transformação. Um instrumento, algo essencial para pos-
sibilitar o desenvolvimento humano. A escola precisa reconhecer que estes
alunos (homossexuais, transexuais, travestis, bissexuais, bem como aqueles –
inclusive heterossexuais – que não seguem os padrões hegemônicos de com-
portamento de gênero) têm sim direito à educação pública. E educação plena,
que não tenha como preço a invisibilização de suas identidades, a negação dos
seus jeitos de ser, muito menos a mutilação de seus próprios corpos.

Referências bibliográficas

BRASIL/CONSELHO NACIONAL DE COMBATE À DISCRIMINAÇÃO. Brasil Sem Homofobia:


Programa de Combate à Violência e à Discriminação contra GLTB e Promoção
da Cidadania Homossexual. Brasília, Ministério da Saúde, 2004.
BRASIL/MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. Termo de Referência: Instruções para Apresentação
e Seleção de Projetos de Capacitação/Formação de Profissionais da Educação
Para a Cidadania e a Diversidade Sexual. Brasília, Ministério da Educação,
2005.
CARRARA, S. & RAMOS, S. Política, Direitos, Violência e Homossexualidade. Pesquisa 9ª
Parada do Orgulho GLBT – Rio 2004. Rio de Janeiro, CEPESC, 2005.
CASTRO, M.; ABRAMOVAY M. & SILVA, L. B. Juventudes e Sexualidade. Brasília, Unesco,
2004.

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