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MODERNIZAÇÕES AMBIVALENTES
mente associados a uma gradual transformação em dife- Benjamin Gittel
Filipe Campello é doutor em Filosofia pela rentes âmbitos da sociedade e de modos de vida ligados a
Universidade de Frankfurt e Professor do
(Orgs.)
uma crescente racionalização, industrialização, individua-
Departamento de Filosofia da Universidade
ção e secularização. No entanto, as diversas tentativas de
Federal de Pernambuco, além de coordenar,
nesta mesma instituição, o Núcleo de Estudos definição desse conceito têm demonstrado, antes de tudo,
em Filosofia Política e Ética. Tem publicações as suas ambivalências, seja nos seus critérios de conceitua-
em temas como filosofia política, Hegel, teoria ção, nas dificuldades de diagnóstico de época, ou, ainda, no
crítica e estética. seu controverso ideal normativo.
MODERNIZAÇÕES
AMBIVALENTES
perspectivas interdisciplinares
e transnacionais
R E C I F E
2016
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA
DAS EDITORAS UNIVERSITÁRIAS
Catalogação na fonte
Bibliotecária Joselly de Barros Gonçalves, CRB4-1748
Inclui referências.
ISBN 978-85-415-0783-7 (broch.)
APRESENTAÇÃO 7
INTRODUÇÃO 9
Polissemia e normatividade da modernidade
Filipe Campello, Benjamin Gittel
PARTE I
Conceitos de modernidade e modernizações
CAPÍTULO I 33
Modernidades múltiplas
Shmuel N. Eisenstadt
CAPÍTULO II 77
O universal sob o múltiplo: aceleração social
como chave de compreensão da modernidade
Hartmut Rosa
PARTE II
Dimensões sociais e políticas da modernização
CAPÍTULO V 181
A cidade brasileira:
moderna demais para o século XXI?
Martin Gegner
CAPÍTULO VI 229
Cidades e diversidade: em defesa
do perspectivismo moral no desenho urbano
Érico Andrade, Andréa Storch
III Parte
Crítica cultural e dimensões culturais
da modernização
7
Modernizações ambivalentes: perspectivas interdisciplinares e transnacionais
Os organizadores
8
INTRODUÇÃO
Polissemia e normatividade
da modernidade
Filipe Campello, Benjamin Gittel
I. Modernidade(s)
É recorrente a ideia de que a semântica de um conceito
seja indissociável de sua incorporação de sentido, ou seja, do
nosso uso desse conceito. Em muitos casos, a imprecisão de um
determinado conceito decorre justamente da polissemia que ele,
num sentido pragmático, adquire ao longo de um percurso his-
tórico. O conceito de modernidade é um exemplo emblemático
dessa pluralidade de sentidos, dependente de um amplo leque
de definições. Com efeito, encontramos na vasta literatura um
dissenso interpretativo: enquanto algumas correntes aliam-se
ao sentido de “pós-modernidade”, diversas concepções dis-
tintas entendem a modernidade enquanto projeto inacabado1,
modernidades múltiplas2, ou mesmo, propõem que jamais fo-
mos modernos3. No entanto, no que se refere à polissemia do
conceito de modernidade, trata-se não apenas de tentativas de
1 Habermas 1992.
2 Eisenstadt, artigo neste livro. Para uma apreciação crítica, cf. Schmidt 2007.
3 Latour 2009.
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7 Como afirma Foucault em referência a Kant: “Qual é esta minha atualidade? Qual é
o sentido desta atualidade? E o que faço quando falo desta atualidade? É nisso que
consiste, me parece, essa nova interrogação sobre a modernidade” (Foucault 2008,
p. 340).
8 Heinrich Heine escreve que, à diferença da Revolução Francesa, “[a] revolução ale-
mã não será mais suave e branda por ser precedida pela crítica kantiana, pelo ide-
alismo transcendental de Fichte e mesmo pela filosofia da natureza. Através dessas
doutrinas desenvolveram-se forças revolucionárias que apenas aguardam o dia que
poderão irromper e encher o mundo de temor admiração.” (Heine [1835] 1964, p.
282 ss.)
9 Habermas 2000.
12
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crítica de conceitos fundamentais como valor, verdade e história, que teria resultado
no pensamento de Nietzsche e, posteriormente, de Heidegger.
12 Cf. Habermas 1990.
13 Nietzsche [1872] 1967, p. 273.
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20 Reckwitz 2012.
21 Pelo contexto alemão veja, por exemplo, Kiesel 2004, p. 13-34.
17
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22 Por uma visão geral veja os artigos na oitava edição do Journal of Literary Theory
(2014).
23 Striedter 1989.
24 Lohmeier 2012, p. 86-87.
18
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25 Enquanto por muito tempo os dois movimentos foram vistos como movimentos
essencialmente antiiluministas, esse ponto foi colocado em questão na pesquisa mais
recente em contraposição a uma perspectiva que os vê como complementários em
relação ao Iluminismo. Veja os trabalhos de Gerhard Sauder (1974-80).
26 De forma exemplar no “Diário de minha viagem no ano 1769” de Herder, cuja
primeira parte foi resenhada por Kant. Cf. Sauder 2001.
27 Luhmann 1994.
28 Herzinger 1999.
29 Breuer 2000, p. 103.
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Referências
Bohrer, Karl-Heinz (1999): Die Modernität der Romantik. Zur Tradition ihrer
Verhinderung. In: Urte Helduser, Johannes Weiß (Org.): Die Modernität der
Romantik. Zur Wiederkehr des Ungleichen. Kassel: kassel university press,
p. 49-82.
Bollenbeck, Georg; Saadhof, Jens (2007): Humboldts Tod – Über die Effekte
der Hochschulreform. In: Georg Bollenbeck, Wara Waltraud Wende (Hg.): Der
Bologna-Prozess und die Veränderung der Hochschullandschaft. Heidelberg:
Synchron, p. 11-30.
Ellwein, Thomas (1985): Die Deutsche Universität. Vom Mittelalter bis zur
Gegenwart. Königstein: Athenäum.
Großheim, Michael (1996): “Die namenlose Dummheit, die das Resultat des
Fortschritts ist” – Lebensphilosophische und dialektische Kritik der Moderne.
Logos. Zeitschrift für systematische Philosophie 4, p. 97-133.
27
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Herzinger, Richard (1995): Werden wir alle Jünger? Über die Renaissance
konservativer Modernekritik und die post-postmoderne Sehnsucht nach der
organischen Moderne. In: Kursbuch 122, p. 93-117.
Kittsteiner, Heinz Dieter (2003): Die Stufen der Moderne. In: Johannes
Rohbeck; Herta Nagl-Docekal (Org.): Geschichtsphilosophie und
Kulturkritik. Darmstadt: Wissenschaftliche Buchgesellschaft, p. 91-117.
Luhmann, Niklas (1994): Liebe als Passion. Zur Codierung von Intimität.
Frankfurt a.M: Suhrkamp.
28
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Nietzsche, Friedrich (1967): Die Geburt der Tragödie aus dem Geiste der
Musik. In: Kritische Studienausgabe in 15 Bänden (KSA). Vol. 1. Eds. Giorgio
Colli, Mazzino Montinari. Munich/Berlin: dtv/de Gruyter.
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Winkler, Heinrich August (2000): Der lange Weg nach Westen. Deutsche
Geschichte vom Ende des Alten Reiches bis zum Untergang der Weimarer
Republik. 2 vol. München: C. H. Beck.
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I PARTE
Conceitos de modernidade
e modernizações
CAPÍTULO I
Modernidades múltiplas1
Shmuel N. Eisenstadt
I
A noção de “modernidades múltiplas” denota uma certa
visão do mundo contemporâneo – também da história e das ca-
racterísticas da era moderna – que contraria as visões desde há
muito prevalecentes no discurso acadêmico e geral. Contraria a
visão das teorias “clássicas” da modernização e da convergên-
cia das sociedades industriais, prevalecentes na década de 50,
e contraria as próprias análises clássicas de Marx, Durkheim
e, em grande medida, mesmo a de Weber, pelo menos no que
respeita a uma das leituras que permite a sua obra. Todas elas
assumiam, mesmo que só implicitamente, que o programa cul-
tural da modernidade, tal como se desenvolveu na Europa, e
as constelações institucionais básicas que aí emergiram, acaba-
riam por dominar todas as sociedades modernas e em moder-
1 Uma primeira versão deste artigo foi publicada em inglês na revista Dædalus:
Journal of the American Academy of Arts and Sciences, 129 (1), 2000. Versão em
português publicada originalmente em Sociologia, problemas e práticas, n.º 35,
2001, p. 139-163. Tradução de Frederico Ágoas. Reimpressão autorizada pela
editora.
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II
O programa cultural e político da modernidade, como
começou por ser desenvolvido na Europa ocidental e central,
implicava, como nota Björn Wittrock5, premissas ideológicas e
institucionais distintas. O programa cultural da modernidade
implicava alterações muito diferentes na concepção de ação hu-
mana e do seu lugar no fluir do tempo. Carregava consigo uma
concepção de futuro caracterizada por um número de possibi-
lidades realizáveis através da ação humana autônoma. As pre-
3 Fukuyama 1992.
4 Huntington 1996.
5 Wittrock 2000.
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III
O programa moderno implicava igualmente uma trans-
formação radical das concepções e das premissas da ordem
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11 Ackerman 1991.
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IV
A modernidade implicou também um modo distinto
de construção das fronteiras das coletividades e das identida-
des coletivas12. Desenvolveram-se novas definições concretas
dos componentes básicos das identidades coletivas – civis,
primordiais e universalistas, transcendentais ou “sagradas”.
Desenvolveram-se fortes tendências que procuravam enqua-
drar estas definições em termos absolutos, sublinhando os seus
componentes civis. Ao mesmo tempo, desenharam-se ligações
entre a construção das fronteiras da esfera política e as das
coletividades culturais. Desta forma, tornou-se inevitável que
se enfatizasse a importância das fronteiras territoriais dessas
coletividades, criando tensões contínuas entre os componentes
territoriais e/ou particulares e outros mais alargados, mais uni-
versalistas. Em contraste com as civilizações da era axial, pelo
menos parcialmente, as identidades coletivas já não eram da-
41
Modernizações ambivalentes: perspectivas interdisciplinares e transnacionais
V
À medida que a civilização da modernidade se foi desen-
volvendo, primeiro no ocidente, foi assolada por antinomias
e contradições internas, dando origem a um contínuo discur-
so crítico e a contestações políticas. As antinomias básicas da
modernidade constituíram uma transformação radical em re-
lação às que eram características das civilizações da era axial.
Centradas em questões desconhecidas nessa época anterior,
revelavam desta forma consciência sobre um amplo leque de
visões e interpretações transcendentais. No programa moderno,
estas foram transformadas em conflitos ideológicos entre ava-
liações concorrentes das principais dimensões da experiência
humana (especialmente a razão e as emoções e o seu lugar res-
pectivo na vida e na sociedade humanas). Não existiam afirma-
ções acerca da necessidade de construção ativa da sociedade; o
controlo e a autonomia, a disciplina e a liberdade tornaram-se
assuntos polêmicos.
A clivagem mais crítica, em termos tanto ideológicos
como políticos, talvez tenha sido a que separava visões univer-
salistas e particularistas – entre uma visão que aceitava a exis-
tência de diferentes valores e racionalidades e uma visão que
via diferentes valores e, acima de tudo, a racionalidade, de um
modo totalizante. Esta tensão desenvolveu-se, antes de mais, a
respeito do próprio conceito de razão e do seu lugar na cons-
tituição da sociedade humana. Era manifesta, como Stephen
42
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13 Toulmin 1990.
14 Elias 1983 e 1978-1982; Foucault 1973, 1988, 1975 e 1965.
15 Wagner 1994.
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VI
No interior do discurso político moderno, estas tensões
têm sido manifestas no conflito insanável entre a legitimida-
de de um sem-número de interesses abstratos, individuais e de
grupo, de diferentes concepções de bem comum e ordem moral,
e as ideologias totalitárias que negavam taxativamente a legiti-
midade desses pluralismos. Uma das formas principais da ide-
ologia totalitária sublinhava a primazia das coletividades per-
cepcionadas como entidades ontológicas distintas, assentes em
atributos primordiais ou espirituais comuns – principalmente
a nacionalidade coletiva. Uma segunda forma era a visão ja-
cobina, cujas raízes históricas remontam a fontes escatológicas
medievais. A crença na primazia da política, na possibilidade
de a política ser capaz de reconstituir a sociedade, transfor-
mando-a através da mobilização da ação política participativa,
era central ao pensamento jacobino. Quaisquer que fossem as
diferenças entre estas ideologias coletivistas, elas partilhavam
entre si fortes suspeitas acerca da discussão aberta e pública dos
processos políticos e, especialmente, a respeito das instituições
representativas. Não é surpreendente que partilhassem fortes
tendências autocráticas.
Estas várias tensões inerentes ao programa político da
modernidade estavam fortemente relacionadas com as que
existiam entre os diferentes modos de legitimação dos regimes
modernos – entre, por um lado, a legitimação legal em termos
de adesão civil às regras do jogo e, por outro, os modos de le-
gitimação “substantivos”, os quais dependiam acima de tudo,
na terminologia de Edward Shils16, de diversos componentes
primordiais, “sagrados”, religiosos ou secular-ideológicos.
16 Shils 1975.
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VII
Entre estes ativistas, os movimentos sociais, muitas ve-
zes movimentos de protesto, eram de especial importância. No
cenário moderno, transformaram algumas das principais hete-
rodoxias das civilizações da era axial, especialmente as que pre-
tendiam realizar certas visões utópicas, através da ação política
e da reconstrução do centro. Entre os movimentos que se desen-
volveram durante o século XIX e as seis primeiras décadas do
século XX, os mais importantes foram o movimento liberal e o
socialista/comunista; os quais foram seguidos por outros dois,
assentes em preconceitos nacionalistas, o fascista e o nacional-
socialista. Estes movimentos eram internacionais, mesmo quan-
do as suas bases ou raízes assentavam em países específicos.
Os que alcançaram maior sucesso cristalizaram-se em padrões
ideológicos e institucionais distintos, que se vieram a identifi-
car muitas vezes com um estado específico (como no caso da
França revolucionária e, mais tarde, da Rússia soviética), mas
o seu alcance ultrapassou largamente as fronteiras nacionais17.
Os conflitos entre estes movimentos e outros – religiosos,
cooperativos, sindicalistas ou anarquistas – não eram simples-
mente ideológicos. Todos eles tiveram lugar dentro de limites
específicos da arena política moderna, acabando por ser tam-
bém afetados pelo processo político moderno, especialmente
17 Sobre revoluções e modernidade ver, por exemplo, o número especial sobre “A re-
volução francesa e o nascimento da modernidade”, Social Research (1989). Sobre
o papel desempenhado por grupos de intelectuais heterodoxos em algumas das re-
voluções e em períodos anteriores, ver Augustin Cochin 1924; e 1979; J. Baechler
1979; François Furet 1982; Vladimir C. Nahirny 1981.
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18 Graubard 1986; Kuhnle 1975; Rothstein 1996; Rustow 1956; Thomas 1978;
Thompson 1968; Thomson 1940 e 1960; Geyl 1958; Beloff 1954; Daalder 1971;
Bergier 1974; Lehmbruch 1972; Lorwin 1971; Steiner 1974.
19 Arnason 1990 e 2000; Sun-ker e Otto 1997.
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VIII
Desenvolveram-se diversos temas no seio do discurso da
modernidade sem que nenhum tivesse sido mais importante do
que o que sublinhava o confronto contínuo entre os sectores
mais “tradicionais” da sociedade e os chamados centros ou sec-
tores modernos que se desenvolviam no seu interior. Desta for-
ma, existia também uma tensão inerente entre a cultura da mo-
dernidade, o modelo “racional” moderno do iluminismo que
emergia hegemonicamente em certos períodos e locais, e outros
21 Giddens e Held 1982; Schumpeter 1991; Furet 1982; Furet e Ozouf 1989; Joas
1996.
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IX
A primeira transformação radical das premissas de or-
dem cultural e política teve lugar com a expansão da moderni-
dade para as américas. Emergiram então modernidades distin-
tas, refletindo novos padrões de vida institucional, com novas
autoconcepções e novas formas de consciência coletiva. Dizê-lo
é sublinhar que praticamente desde o começo da expansão da
modernidade se desenvolveram modernidades múltiplas, todas
elas no interior do que pode ser definido como o enquadramen-
to civilizacional ocidental. É importante notar que tais moder-
nidades, de cariz ocidental, mas significativamente diferentes
das europeias, se desenvolveram em primeiro lugar não na Ásia
– Japão, China ou Índia – ou em sociedades muçulmanas, a que
podem ter sido atribuídas pela existência de tradições distinta-
mente não europeias, mas no interior do enquadramento geral
das civilizações ocidentais. Elas refletiam uma transformação
radical das premissas europeias.
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X
A variabilidade das modernidades foi concretizada, so-
bretudo, através do imperialismo econômico e militar e através
do colonialismo, e efetivada pela superioridade econômica, mi-
22 Heideking 2000.
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XI
A apropriação por parte de sociedades não ocidentais de
temas e padrões institucionais específicos das sociedades da ci-
vilização moderna ocidental implicou a seleção, a reinterpreta-
ção e a reformulação contínuas destas ideias importadas. Estas
vieram produzir inovação contínua, com a emergência de novos
programas culturais e políticos, que exibiam novas ideologias e
padrões institucionais. Os programas culturais e institucionais
que se desenvolveram nestas sociedades eram caracterizados,
sobretudo, pela tensão entre concepções de si mesmo como par-
te integrante do mundo moderno e atitudes ambivalentes para
com a modernidade em geral e o ocidente em particular.
Em todas estas sociedades ocorreram transformações de
longo alcance. Estas transformações, moldadas em cada uma
das sociedades pelo impacte combinado das suas respectivas
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XII
Os múltiplos e divergentes casos da idade “clássica” da
modernidade cristalizaram-se durante o século XIX e, sobretu-
do, nas primeiras seis ou sete décadas do século XX, em esta-
dos-nação e estados revolucionários, e em movimentos sociais
na Europa, nas américas e, depois da II Guerra Mundial, na
Ásia. Os contornos institucionais, simbólicos e ideológicos dos
estados nacionais e revolucionários modernos, que chegaram
a ser vistos como a síntese da modernidade, mudaram radical-
mente com a recente intensificação das forças de globalização.
Estas tendências, manifestas sobretudo na crescente autonomia
24 Kaviraj 2000.
25 Eisenstadt 1996.
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26 Friedman 1994; Hannerz 1992; Marcus 1993; AA.VV 1999; Smolicz 1998.
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56
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29 Tambiah 2000.
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XIII
Todos estes desenvolvimentos atestam a decomposição
das principais características estruturais e o enfraquecimento
da hegemonia ideológica dos outrora poderosos estados-nação.
Mas assinalarão eles o “fim da história” e o fim do programa
moderno, sintetizado no desenvolvimento de diferentes pós-mo-
dernidades (assim são chamadas) e, acima de tudo, num recuo
da modernidade patenteado nos movimentos fundamentalistas
e religiosos de cariz comunal, tantas vezes retratados pelos pró-
prios como diametralmente opostos ao programa moderno?
Uma análise mais próxima destes movimentos apresenta
um retrato bem mais complexo. Em primeiro lugar, muitos dos
movimentos fundamentalistas radicais revelam características
distintas do jacobinismo moderno, mesmo quando combina-
das com fortes ideologias antiocidente e antiiluminismo. De
fato, as diferentes visões dos movimentos fundamentalistas têm
sido formuladas em termos comuns ao discurso da moderni-
58
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32 Eisenstadt, s. d.
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XIV
As tentativas de apropriação e de interpretação da mo-
dernidade nos seus próprios termos não se confinam, contudo,
aos movimentos fundamentalistas. Eles constituem antes par-
te de um conjunto de desenvolvimentos muito mais alargados
que têm tido lugar por todo o mundo, como mostra Dale F.
Eickelman35, num ensaio a respeito das sociedades islâmicas.
Dando continuidade aos confrontos entre movimentos religio-
sos reformistas e outros movimentos tradicionais mais antigos
que se desenvolveram nestas comunidades, as tensões inerentes
33 Göle 2000.
34 Idem 1996.
35 Eickelman 2000.
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36 Eickelman 1993.
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Modernizações ambivalentes: perspectivas interdisciplinares e transnacionais
XV
A saliência contínua das tensões entre programas plura-
listas e universalistas, entre identidades multifacetadas por opo-
sição a outras fechadas, e a ambivalência contínua dos novos
centros da modernidade para com os principais centros tradi-
cionais da hegemonia cultural atestam o fato de que, ao ultra-
passar o modelo do estado-nação, estes novos movimentos não
ultrapassaram os problemas básicos da modernidade. Todos
eles são profundamente reflexivos, possuindo a consciência de
que nenhuma resposta às tensões inerentes à modernidade será
a resposta final – mesmo se cada um deles procura à sua pró-
pria maneira fornecer respostas finais e incontestáveis aos dile-
mas irredutíveis da modernidade. Todos eles reconstituíram os
problemas da modernidade em novos contextos históricos, em
novas formas. Todos eles procuram um alcance mundial e a di-
fusão através das diversas mídias. Os problemas que enfrentam,
reconstruindo continuamente as suas identidades coletivas por
referência ao novo contexto global, constituem desafios de pro-
porções sem precedentes. A própria pluralização dos espaços
quotidianos no enquadramento global leva-os a ideias absolu-
tistas altamente ideológicas e, do mesmo passo, transporta-os
para o centro da arena política. O debate em que se inserem
pode ser descrito em termos “civilizacionais”, mas estes mes-
mos termos – o próprio termo “civilização” integrado nesse dis-
curso – são já expressos na nova língua da modernidade, utili-
62
Modernizações ambivalentes: perspectivas interdisciplinares e transnacionais
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XVI
A análise anterior não implica que a experiência histórica
e as tradições culturais destas sociedades não possuam qual-
quer importância no desdobrar das suas dinâmicas de moder-
nidade. O significado das suas tradições anteriores é manifesto
no fato de que entre as sociedades modernas e contemporâneas,
os movimentos fundamentalistas se desenvolvem sobretudo em
sociedades que ganharam forma em contextos de religião mo-
noteísta ecumênica – as civilizações muçulmana, judaica e cris-
tã. Nestes contextos, o sistema político tem sido percepcionado
como a principal arena para a implementação de visões utópi-
cas transcendentais. Por contraste, a reconstrução ideológica do
centro político na forma jacobina tem sido muito mais fraca em
civilizações com orientações “além-mundo” – especialmente na
Índia, e numa medida de certa forma menor, em países budis-
tas. Nestes casos, a ordem política não é percepcionada como
fórum para a implantação de uma visão transcendental38.
Trata-se de um lugar comum observar que as distintas
variedades de democracia moderna na Índia ou no Japão, por
exemplo, podem ser atribuídas ao encontro entre a modernida-
de ocidental e as tradições culturais e as experiências históri-
cas destas sociedades. Isto se aplicava também, evidentemente,
para os diferentes regimes comunistas. Menos compreendido é
o fato de o mesmo se ter passado no que respeita ao primeiro
caso de modernidade – o europeu –, profundamente enraizado
nas premissas culturais e na experiência histórica especifica-
mente europeia39. Mas, tal como no caso da Europa, todas estas
38 Eisenstadt, s. d.
39 Eisenstadt 1987.
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40 AA.VV. 1999.
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Modernizações ambivalentes: perspectivas interdisciplinares e transnacionais
XVII
Estas considerações encontram-se em estreita relação
com os problemas levantados nos ensaios reunidos na revis-
ta Daedalus41. Todos eles discutem, de diversas perspectivas e
através de um grande leque de casos, as características centrais
da modernidade. Do mesmo passo, os estudos aí apresentados
atestam a contínua expansão do leque de possibilidades de in-
terpretações ideológicas, tanto das construções do sentido da
modernidade como dos padrões institucionais da vida políti-
ca e social. Estas considerações confirmam, como demonstra
Nilüfer Göle42, que uma das características mais importantes da
modernidade é simplesmente, mas de modo profundo, o seu po-
tencial para a autocorreção, a sua capacidade de enfrentar pro-
blemas nunca imaginados no seu programa original. Hoje em
dia, os problemas mais importantes são provavelmente aqueles
que se relacionam com o ambiente, com a igualdade entre sexos
e com os novos conflitos políticos e internacionais que já dis-
cutimos. Ao procurar lidar com estes problemas, as diferentes
sociedades contemporâneas podem utilizar de modos cada vez
mais diversos, como nota Tu Weiming43, os recursos culturais
das respectivas tradições civilizacionais.
Do mesmo passo, estes mesmos desenvolvimentos – so-
bretudo a tendência para a constante autocorreção caracterís-
tica da modernidade – tornam mais premente a grande dificul-
dade que é dar resposta a respeito dos limites da modernida-
de. Não se trata de afirmar a inexistência desses limites; mas o
simples fato de levantarmos essa questão, insere-a no seio do
discurso da modernidade.
41 Dædalus: Journal of the American Academy of Arts and Sciences, 129 (1), 2000.
42 Göle 2000.
43 Weiming 2000.
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44 Kolakowsky 1990.
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75
CAPÍTULO II
I. Modernização e aceleração
Teorias da modernidade como as encontramos, primeiro
nas abordagens clássicas de Weber, Durkheim, Marx e Simmel,
depois na esteira de Talcott Parsons, conceituam modernização
usualmente como um processo contínuo de diferenciação (es-
trutural), racionalização (cultural) e/ou individualização (pes-
soal), e, às vezes, como um processo de comoditização ou con-
trole instrumental (van der Loo/van Reijen, 1997). Entretanto,
essas teorias receberam ataques de dois lados. Primeiro, parece
que teorias de modernização concebem a modernidade como
um desenvolvimento unidirecional, reto e contínuo. Assim sen-
do, são incapazes de levar em consideração as várias rupturas,
reveses e variações mesmo dentro da modernidade ocidental.
Depois, alega-se que elas são por demais etno ou eurocêntri-
1 O artigo original foi publicado em: Schmidt, Volker H. (Org.): Modernity at the
Beginning of the 21st Century. Newcastle, UK 2007, p. 37-61. Tradução: Thiago da
Silva Paz.
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2 Por isso o historiador cultural Peter Conrad 1999, p. 9 ousadamente reivindica que
“[m]odernidade diz respeito à aceleração do tempo”, enquanto o teórico cultural
francês Paul Virilio 1986 chama ao estudo da velocidade (dromologia) como a cha-
ve para entender a política e a sociedade.
3 Rosa 2005a, p. 71-89.
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a) Aceleração tecnológica
A primeira, mais óbvia, e mais facilmente mensurável
forma de aceleração é a aceleração de processos intencionais
orientados à meta, de transporte, comunicação, e produção
que podem ser definidos como aceleração tecnológica. Ainda
que não seja sempre fácil de medir a velocidade média desses
6 Hylton White me salientou recentemente que a experiência social dos Zulus poderia
ser interpretada nesse sentido (White 2006).
7 Nesta seção, usei vasto material de um artigo publicado pela Constellations, em
2003 (Rosa 2003).
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10 Cf. Sztompka 1993 ou Müller/Schmid 1995. Peter Laslett 1988 distingue entre 19
diferentes taxas de mudança social interna (econômica, política, cultural, etc.).
11 Lübbe 1998.
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19 Ehrenberg 1999.
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cial irá, por sua vez, levar a uma aceleração do “ritmo da vida”.
E finalmente, como vimos no começo, novas formas de ace-
leração tecnológica serão exigidas para acelerar os processos
de vida produtiva e cotidiana. Assim, o “ciclo de aceleração”
se torna um processo fechado e autopropulsor que, no curso
da modernização, se revela cada vez mais difícil de quebrar ou
interromper (Figura 1).
Todavia, deve ao menos ser mencionado (visto que não
posso desenvolver esse ponto em detalhes aqui) que, em adi-
ção a esse caráter auto-dinâmico da aceleração, há três podero-
sos motores “externos” que historicamente convergiram para
formar o ciclo identificado e que continuam a emprestar-lhe
impulso adicional: o processo de aceleração é compelido pela
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34 Lauer 1981.
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35 Rosa 2005b.
36 N.T.: Etatism, no original. A palavra é derivada do francês étatisme, e pode aparecer
também como Statism, no inglês. Castells 1996.
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40 Os dados produzidos por Robert Levine e seu grupo de pesquisas (1998) sobre a
velocidade da vida em 31 países empresta suporte empírico ao menos para a última
reivindicação.
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113
II PARTE
I. Introdução
A sociologia desenvolveu-se, sob esta ou outra designação
(como “materialismo histórico”), sobretudo combinando acha-
dos teóricos e evidências empíricas. Ao menos foi assim que
os sociólogos “clássicos” procederam – nomeadamente Marx,
Weber, Simmel, Tocqueville e Durkheim. Como é sobejamente
conhecido também, o desenvolvimento da modernidade, fosse
lá como cada um deles a definisse, mais uma vez, usassem ou
não este termo, encontrava-se no cerne de seus esforços. Após
um longo e talvez, mais recentemente, não particularmente pro-
dutivo debate sobre a modernidade e a dita pós-modernidade,
o campo de discussão foi em larga medida evacuado. Isso se
deveu até certo ponto a uma falha intrínseca no quadro em que
o debate se desenrolou, terminando por esposar um caráter for-
temente descritivo antes que analítico, embora apontasse para
uma tendência de longo prazo. Desde então muito da contri-
buição teórica da sociologia foi posta à margem, com avanços
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9 Bhaskar 1975, p. 21-23, 52-56, 69, 101, 104, 141, 212, 247-48 e 250. A indução
para ele se refere a “que justificativa temos para raciocinar de casos particulares na
direção de afirmações gerais”; a edução se refere a extrapolações do “observado”
ao “não observado” ou do passado para o futuro e se justifica apenas se o sistema
é fechado, ou seja, consiste de um processo experimental, uma vez que, dada uma
inclinação, necessariamente se realizará. Ele não tem simpatia pelo “dedutivismo”
porquanto este seria estreitamente ligado ao “efetivismo” (actualism) – a necessária
ocorrência de eventos sendo nele onipresente (Bhaskar 1975, p. 129, 216 e 219).
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52 Sassen, 2006.
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Palavras finais
Propus-me no começo deste artigo a discutir o realismo
no que se refere a conceitos-tendência. Isso deveria permitir
uma apreensão do desenvolvimento direcional da modernida-
de. Bhaskar serviu criticamente como nosso ponto de partida
e o moderno sistema sociedade-estado, com seus subjacentes
mecanismos gerativos, reiterativos e transformativos, como seu
foco substantivo. A meta era mostrar como essa abordagem,
assumindo uma intenção analítica sistemática, deveria ser ar-
ticulada de acordo com uma perspectiva analítica, apresentan-
do uma concepção estratificada do conhecimento, antes que da
realidade. Isso se combinou com uma perspectiva orientada aos
processos. É verdade que mais trabalho precisa ser feito nessa
direção, em termos gerais e no que toca à relação entre estado
e sociedade modernos. Este artigo ofereceu um esboço desse
empreendimento.
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157
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158
CAPÍTULO IV
“Desenvolvimento”: Resultado
ou mito da modernidade?
Elísio Macamo
I. Introdução
“Desenvolvimento” é um conceito difícil de tratar. É politi-
camente controverso e academicamente polémico. É controver-
so do ponto de vista político porque, primeiro, sugere relações
de poder que colocam certos países ou grupos de pessoas em
posição subalterna enquanto confere a outros países ou grupos
de pessoas o privilégio de dizerem aos primeiros como devem
organizar as suas vidas. É essencialmente sobre este problema
que se debruçam algumas das críticas que têm sido feitas à no-
ção de desenvolvimento. O destaque vai para a extremamente
influente crítica de Arturo Escobar, um antropólogo colombia-
no, numa obra em que ele defende a ideia segundo a qual as
instituições de auxílio ao desenvolvimento constituiriam uma
indústria cuja função é a produção dos países em desenvolvi-
mento1. O outro exemplo interessante das críticas que se têm
feito ao conceito de desenvolvimento é de William Easterley,
1 Escobar 1995.
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2 Easterley 2006.
3 Por exemplo, Amin 1974, 1986; Frank 1966.
4 Por exemplo, Rostow 1978.
5 Recordemo-nos aqui da interjeição feita pelo filósofo escocês, David Hume, sobre a
necessidade de se não confundir o que é com o que devia ser (“no oughtfromanis”).
Esta discussão encontra-se no livro III, parte I, secção I do seu livro “A Treatise of
Human Nature”(Hume 2009 [1740]).
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9 Fica de fora uma questão não menos pertinente, a saber se a modernidade ela pró-
pria não seria resultado (ou mito) do desenvolvimento. Não existe nenhuma razão
teoricamente pertinente para excluir estes termos de colocação do problema. Na
verdade, esta questão tem vindo a ser colocada amiúde quando se procura perceber
o que realmente foi determinante para o sucesso económico e político de certas na-
ções. O sucesso económico dos BRICS, sobretudo da China, coloca um forte ponto
de interrogação em torno da tese normativa que define a democracia ou o respeito
pelos direitos humanos como pré-condições do desenvolvimento económico.
10 Searle 1995.
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12 Após a independência de Moçambique em 1975 o país sofreu uma guerra civil que
durou praticamente 16 anos quando um acordo assinado em Roma pôs termo às
hostilidades e permitiu a abertura do sistema político nacional. Foi uma guerra hor-
rível marcada por atrocidades terríveis cometidas contra civis indefesos e inocentes.
Existem vários livros que documentam a brutalidade desta guerra. Vide a propósito
Magaia 1988; Finnegan 1992; Vines 1991; Minter 1994; entre outros.
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14 A este propósito chamo atenção para um texto da minha autoria que discute justa-
mente os efeitos sociais desta condição. Vide Macamo 2005a.
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16 Tenbruck 1987.
17 A referência aqui é ao texto de Georg Simmel sobre o “pobre”. Simmel 1983 [1908].
18 Tenbruck 1987, p. 14; tradução de Elísio Macamo.
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E ele prossegue:
De forma abstrata o conceito de desenvolvimento
constrói o futuro como uma sequência interminável
de “melhorias” e vira, por via disso, uma espécie de
instrução geral para a eliminação de todos os proble-
mas. Ignora que o “desenvolvimento” constitui um
procedimento concreto que produz novas situações
reais que, por sua vez, produzem novos problemas,
e não apenas o “desenvolvimento”. Mas é desta ma-
neira que todos os problemas do futuro são integra-
dos numa ilusão que crê no seu desaparecimento ao
longo do desenvolvimento e que vai conduzir a his-
tória da humanidade a uma espécie de ecumenismo
secular. Em nenhum momento esta visão dum tempo
sem história é perpassada pela ideia dum mundo que
termina como em contos de fadas: e viveram felizes
para todo o sempre.19
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V. Conclusão
O que esta contribuição tentou mostrar é que conceitos
como desenvolvimento e modernidade são termos com conse-
quências. Dito doutro modo, trata-se de termos que não podem
ser usados de forma inocente. O seu uso implica uma certa con-
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Grenze der Entwicklungsvision“. Soziologisches 3, p. 11-37.
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CAPÍTULO V
I. Introdução
Como será discutido em um outro texto é problemáti-
co falar das cidades brasileiras no singular e aconselhável falar
delas no plural1. No entanto, em meio a toda essa pluralidade,
existe no Brasil um Estatuto da Cidade que define as regras
básicas do desenvolvimento urbano para todas as cidades bra-
sileiras2, e, além disso, uma tradição concreta de construção das
cidades brasileiras no século XX, que se caracteriza por uma
recepção especial do Modernismo Europeu.
Neste artigo iniciaremos com a revisão desse histórico da
recepção para mais tarde esboçarmos o caminho próprio brasi-
leiro para a modernidade. Utilizamos os termos “Modernismo“
e “Modernidade” aqui referente à época histórica da arquitetu-
ra e do urbanismo entre os anos de 1920 e 1960. A pergunta
do título faz referência a essa época e questiona se o urbanis-
1 Gegner 2015.
2 Presidência da República 2001.
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3 UN 2001.
4 UNHABITAT 2010.
5 Gegner/Metz 2014, Schwartz 2014.
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6 Recamán 2013.
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7 Le Corbusier 1922a.
8 Le Corbusier 1922b.
9 Le Corbusier 1925a, p. 5.
10 Le Corbusier 1925a, p. 10-13.
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b) Ordem e Progresso
Todos os modernistas tinham a opinião, de que a cau-
sa da situação deplorável citada acima era a construção des-
regrada nos antigos centros das cidades desde a idade média.
No entanto já a primeira onda de modernização na Europa
a partir da metade do século XIX destacada pelas plantas de
Haussmann (1893) em Paris, Hobrecht (1893) em Berlin e de
Cerdà (1867) em Barcelona, assim como a construção da es-
trada circular de Viena (“Ringstraße“) foi marcada para a in-
trodução de regras de construção obrigatórias. Estes tiveram
uma paisagem urbana representativa como objetivo, além de
disciplinar o proletariado. A consequência foi um urban design
com conjuntos habitacionais ortogonais, cortados por grandes
avenidas e bulevares, nas quais o exército e a polícia pudessem
agir eficientemente em rebeliões sociais. Mas a expulsão força-
da dos planejamentos urbanos de grandes áreas de construção
levou primeiramente a uma enorme especulação imobiliária
16 Cowan 2001.
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d) Maior Mobilidade
A separação em grande escala das áreas urbanas segundo
critérios funcionais fizeram necessária uma melhor mobilidade
dos moradores das cidades, comparada ao século XIX, e acima
de tudo acelerada. Enquanto na cidade da idade média se podia
fazer quase todos os caminhos a pé devido a curta distância
entre a casa e o local de trabalho; depois da primeira onda de
modernização e expansão das cidades a partir de 1850 isso se
torna quase impossível por conta das longas distâncias entre o
centro e os subúrbios urbanos ou industriais. Os novos meios
de transporte como os bondes elétricos (a partir de 1881, an-
tes eram movimentados por cavalos) possibilitaram o acesso
das pessoas da cidade às áreas forçadamente distantes. Com os
trens suburbanos assim como com os metrôs a partir de 1900
(Londres como metrópole mais desenvolvida do mundo foi a
primeira a receber já a partir de 1863 um metrô) não foram
diminuídas somente as distâncias, mas os meios de transporte
possibilitaram também que a metrópole incluísse os subúrbios
que por vezes se transformaram em bairros distantes do centro.
Sem exceção, os modernistas ficaram encantados com o
novo meio de transporte a partir de 1920, o automóvel. Ainda
que na época este tenha sido um luxo que somente os ricos
obtinham. Os modernistas sonhavam que o automóvel pudesse
substituir os meios de transporte de massa como ônibus e me-
trô. Até que nesse ponto os modernistas foram bem igualitários,
eles anteciparam a motorização em massa e imaginaram que
no futuro cada cidadão trabalhador teria seu próprio carro. No
entanto, esse sonho só se tornou realidade na Europa após os
anos 1950 – no Brasil somente no século XXI – mas o planeja-
mento de trânsito da cidade já estava voltado para a motoriza-
ção em massa desde 1920.
189
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190
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20 Schulz/Schulz 2008.
21 Mitscherlich 1965.
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28 Warchavchik 1925, p. 1.
29 Gropius 1925; Le Corbusier 1925a.
30 Lira 2011, p. 148.
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44 Mesmo que Lúcio Costa tenha afirmado ter copiado uma borboleta.
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45 Nunes 2006.
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c) Aterro do Flamengo
O ponto final da primeira fase do urbanismo moder-
no brasileiro51 é o projeto do Aterro do Flamengo no Rio de
Janeiro, concretizado de 1961 a 1965, sob a responsabilida-
de em grande parte por Affonso Reidy e Roberto Burle Marx.
Para este projeto foi utilizada a recuperação de terras entre as
praias do Flamengo e da Glória para o plano paisagístico e de
tráfego de carros, para além da construção de conexões de vias
expressas do centro em direção à Botafogo. No total passam
pela praia do Flamengo quatro vias expressas de quatro faixas
de circulação, cada uma com até trezentos metros de vastas
áreas verdes intercaladas que são utilizadas para esporte e são
chamadas de “Parque do Flamengo”. No ápice da Marina da
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52 UNESCO 2013.
53 Ibid.
54 Ver os levantamentos gerais de Villaça 1999, Mori 1999, Nunes 2006, Wisnik 2009,
Observatório das Metrópoles 2009.
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210
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68 IBGE 2010.
69 UN 2010.
70 Brum 2012.
71 Presidência da República 2009.
72 Reis 2006.
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73 Alphaville 2014.
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b) Ordem e progresso
A promessa da modernidade que foi realizada no Brasil
(pelo menos em um exemplo) de forma mais consequente,
foi apresentado a partir dos conceitos de ordem e progresso.
Brasília simboliza por excelência o desejo de desenvolvimen-
to social, modernidade e proteção do futuro sob forma de seu
urbanismo ordenado e da arquitetura funcional. Aqui se mos-
tram os esforços para a formação de uma cultura brasileira
original. Acabar com a história é parte central do programa
de modernização. “O Velho” era tido para intelectuais moder-
nistas radicais como “abrasileiro”74. O que resultou na destrui-
ção do patrimônio colonial em cidades existentes, sem que este
fosse substituído por uma paisagem moderna adequada75. No
espírito de Le Corbusier imperava uma mania de demolição
sob a influência da ideologia dominante de “desenvolvimentis-
mo”76. Dessa forma, os centros históricos do Rio de Janeiro,
São Paulo, São Vicente e outras cidades mais antigas, foram
sistematicamente destruídos a partir de 1930 e substituídos por
uma reconstrução de má qualidade, que por sua vez, tinha mui-
tas vezes apenas 30 anos de existência. A constante “moderni-
zação” das cidades configurou, pelo menos desde o início da
ditadura militar um processo desordenado. O estado retirou
grande parte de sua responsabilidade e a deixou nas mãos de
promotores privados e de sua visão da modernidade. Com isso
foram implementadas nas cidades brasileiras, além dos poucos
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Modernizações ambivalentes: perspectivas interdisciplinares e transnacionais
c) Separação funcional
O meio urbanístico de separação funcional em prol da
melhoria qualitativa das condições de moradia foi utilizado
dogmaticamente na urbanização brasileira. Conceitos como
o das “cidades de curtas distâncias”78 no qual, pelo menos as
funções de morar, descansar e também em parte, trabalhar são
combinadas, não são muito conhecidos e não puderam ser im-
plementados no planejamento das cidades brasileiras. Sem dú-
vida, este conceito é aplicável com mais facilidade na Europa
“pós-industrial”. O Brasil é caracterizado por uma concentra-
ção muito mais elevada de indústrias pesadas e “sujas”. Dessa
maneira, é compreensível um zoneamento mais radical. No
entanto, há no Brasil um grande setor de serviços “limpos”,
que se estabeleceram acima de tudo, em zonas especiais dos
quais os bairros residenciais e as oportunidades de lazer estão
espacialmente separados, o que aumenta a necessidade da mo-
bilidade individual (automóveis). Projetos para revitalizar os
centros históricos das cidades são susceptíveis de ter sucesso
apenas se for possível torná-los novamente atrativos para além
de indústrias de serviços, restaurantes e locais de diversão além
da moradia. Só desta forma será possível parar o tempo da de-
cadência e do risco individual nos espaços públicos dos cen-
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d) Mais mobilidade
O dogma da segregação funcional resulta que a parte
mais ameaçadora do Modernismo para a qualidade de vida da
população urbana, oriente no Brasil o planejamento urbano
para a necessidade individual de proprietários de carros quase
que incondicionalmente79. Só em face do colapso do tráfego
permanente e com o apoio de alguns políticos, são promovidas
de maneira consistente algumas formas coletivas de transporte
desde 201280. Por fim, ficou suficientemente claro que a massa
de tráfego com as suas emissões de CO2, o ruído e a pretensão
estética já batida das ruas das cidades, rodovias e estradas é
uma desgraça permanente e um pesado encargo para os mora-
dores além de perverter os objetivos do modernismo.
79 Gegner 2011.
80 Prefeitura de São Paulo 2014.
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VI. Conclusão
A cidade brasileira é moderna no sentido estritamente
ideológico. O velho é considerado um obstáculo. A abordagem
diferenciada dos modernistas da década de 1930 sobre a cida-
de colonial deu lugar a uma outra avaliação influenciada pela
prevalecente ideologia desenvolvimentista e pela concepção de
lucro bruto no mercado imobiliário em expansão desde os anos
1960. Depois disso o desenvolvimento é dificultado por anti-
gas estruturas de construção e precisa ser substituído por no-
vas construções com número maior possível de área de útil. A
verticalização das cidades brasileiras apresenta apenas superfi-
cialmente o resgate da promessa de progresso e funcionalidade,
porque as torres residenciais são a expressão da segregação so-
84 Castells 2003.
85 Wentz 2000.
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Referências
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décoratif d’ aujourd’hui. Paris: Les Editions G. Crés.
______ (1943): Charte d´Athènes. Dt. (1957): Charta von Athen. Kritische
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Scharoun. Katalog zur Ausstellung in der Akademie der Künste 05.03.-30.04.
1967, Berlin, S. 62-63.
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Wisnik, Guilherme (2009): Estado Crítico. À Derva Nas Cidades. São Paulo:
Publifolha.
227
CAPÍTULO VI
I. Introdução
Ao longa da história a cidade tem uma característica que
lhe acompanha, a saber, a diversidade. Muitas vezes portuárias,
outras vezes centro de importantes rotas comerciais, as cidades
sempre estiveram no epicentro da circulação de ideias, merca-
dorias e pessoas – não é sem motivos que ainda hoje usamos
a expressão centro da cidade para designar o local por onde
passam mais pessoas, diferentes pessoas, e que consegue con-
centrar o comércio e serviços de modo geral. Parte dessa di-
versidade comporta elementos históricos contingentes. Isso é
claro. No entanto, permanece a ideia de que um dos processos
característicos da vida urbana é modo como as pessoas se or-
ganizam no espaço que depende de fatoressociais, históricos e
culturais. Nesse sentido, a essência da cidade é as pessoas e o
modo como elas se organizam espacialmente. O desafio a que
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4 Storch 2000.
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ria. Para subverter esse modelo não vamosnos engajar num dis-
curso que assume para si a determinação do que é o bem públi-
co, o qual poderia ser expresso, permitam-nos usar o conceito
de Rousseau, pela vontade geral. O modelo liberal, como ele foi
aplicado no Recife, falha porque é ineficiente no que concerne
à promoção da cidade como lugar da diversidade, mas uma saí-
da, por assim dizer, centralizadores, típica de alguns discursos
socialistas e modernistas, pode apresentar outra falha, que não
podemos em detalhes explicar aqui, mas que consiste, grosso
modo, em desconsiderar as vontades individuais em nome de
uma vontade geral; acessível para algumas pessoas, especial-
mente, claro, alguns burocratas do Estado e seus técnicos. Ou
seja, se o discurso liberal pode mutilar a cidade para, como
diz João Cabral, fechar secretos, o discurso de matiz socialista
pode, por outro lado, torna a cidade espelho de uma única pers-
pectiva que é acessível apenas a poucas pessoas (os burocratas
e técnicos) e que se sustenta no conceito vago de vontade geral
ou bem comum, que termina por usurpar das pessoas o direito
de decidir sobre a cidade.
Estado e capital podem compor uma forma muito pare-
cida de pensar a cidade de modo unilateral, ainda que para fins
diversos. Um planejamento centralizado, que retire a capaci-
dade de cidade de se reinventar, de ser criativa e que é feito em
nome de uma ideologia cuja legitimidade prescinde da escuta
das pessoas, parece próximo de um planejamento urbano se-
questrado pelo poder do capital, que molda a cidade em função
da conveniência da elite. Essas duas perspectivas sobre a cidade
guardam uma simetria quanto à falta de participação das pes-
soas no processo de decisão política sobre a cidade. De fato,
se é, como alerta Jacobs, “ridículo pensar que nossas cidades
grandes – variadas, cheias de vida, sempre em transformação
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Referências
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Melo, João Cabral (1997): A educação pela pedra e depois. Rio de Janeiro:
Editora Nova Fronteira.
Nozick, Robert (2000): Anarquia, estado e utopia. São Paulo: Martins Fontes.
251
III PARTE
Crítica cultural:
um modo de reflexão da modernidade1
Georg Bollenbeck †
I
Uso conceitual. A crítica cultural não designa nem uma
disciplina nem um método ou uma questão científica. Também
não há quaisquer objetos e temas crítico-culturais seguramente
delineados. O conceito é extensionalmente sem um limite níti-
do, intencionalmente desorganizado e heterogêneo.
Naturalmente há um denominador semântico comum:
quando a fala trata da crítica cultural, então se pensa, primei-
ramente, em manifestações de apelo público por parte de inte-
lectuais, a queixarem-se sobre o declínio dos costumes e da so-
ciedade, sobre a alienação2 e a racionalização, sobre o funesto
1 Tradução de Bruno Lemos Hinrichsen. O artigo original foi publicado pela pri-
meira em: Heinz, Marion; Gretić, Goran (Org.): Philosophie und Zeitgeist im
Nationalsozialismus.Würzburg: Königshausen & Neumann 2006, p. 87-99 e
em uma versão ligeiramente modificada em: Zeitschrift für Kulturphilosophie
1 (2) 2007, p. 201-209. Cf., outrossim: Georg Bollenbeck, Eine Geschichte der
Kulturkritik von Rousseau bis Günther Anders, München 2007.
2 N.T. O termo ‘Entfremdung’ é constituído pelo radical ‘fremd’, adjetivo que quer
dizer tanto ‘estranho’ quanto ‘estrangeiro’, bem como ‘alheio’. Ora, uma vez que se
está a falar em crítica cultura, optou-se pela tradução como ‘alienação’ em detri-
mento de ‘estranhamento’, pois tendo em vista que deve-se em algum ponto pensar
em subjetividade, o termo escolhido é mais relevante.
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II
Um conceito. A expressão remete a um até agora subes-
timado pensamento não disciplinado que mais facilmente pro-
cessa experiências assistemáticas e osmóticas diversas (do saber
cotidiano ao filosófico), bem como conjuntos de conhecimen-
tos. A crítica cultural reclama o direito de interpretar o decurso
da história assim como o estado de coisas e as possibilidades
da sociedade. Sua história abre acesso a uma produção de co-
nhecimento e [produção] de construção de sentido igualmente
substanciais concernentes à história das ideias e da mentali-
dade, resultando sempre novamente em reclamações contra a
Modernidade. Resultados patológicos centrais da modernidade
como a alienação, objetificação ou racionalização, que geral-
mente são atribuídos às teorias sociais marxista e sociológica,
provém dessas histórias de perdas crítico-culturais.
Para historiadores ou analistas do discurso a questão pela
determinação de regras do alcance comunicativo e do impacto
político é mais importante do que a questão pela produção do
conhecimento. O histórico de uso dos conceitos ideologizados
dá informação sobre as interpretações de mundo, mas não se
pode trasladar tais conceitos (quase como decadência ou dege-
nerescência) em categorias do conhecimento.
4 N.T. Embora parece que seja possível traduzir o termo sem problemas para o que
é mundialmente conhecido por “Art nouveau”, acredita-se que preservar o termo
em alemão faz melhor referência ao que se quer dizer, pois na Alemanha a forma de
expressão artística e cultural é conhecida do público como ‘Jugendstil’.
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III
Com o Iluminismo contra o Iluminismo (Ralf
Konersmann). O Iluminismo constitui (no sentido de um con-
ceito do conhecimento e das épocas) o contexto de possibilita-
ção para a crítica cultural da Modernidade. Faz parte de seu
substrato e da condição de ressonância; portanto, public intel-
lectuals dispostos criticamente e um novo tipo de publicidade
para sua crítica; além disso, formas determinadas de saberes, a
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IV
Panorama. Já em Rousseau nós achamos uma antecipa-
ção característica para a crítica cultural. Ele critica o sistema
do Absolutismo tardio, o poder da Igreja e o interior do antigo
regime da nascente sociedade civil – no sentido da sociedade
política, da société civile; no sentido dado por Hegel como dife-
rença entre Estado e sociedade; e, finalmente, no sentido trazido
por Marx como sociedade capitalista-burguesa. Em sua obra
crítico-cultural principal, ou seja, no discurso sobre a origem e
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CAPÍTULO VIII
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16 O atrativo ideológico é tão sedutor que Eisenstein subordina (ou, pelo menos, pre-
tende subordinar) sua técnica cinematográfica ao método e à teoria marxistas. A
montagem teria sido calcada nos cortes de Madame Bovary de Flaubert: tomadas
contrastantes comentam-se umas às outras de modo dialético. Na verdade, entre-
tanto, a rapidez da filmagem e montagem do filme (filmado em dez semanas e cor-
tado em duas) dão a entender que ele se aproxima da mais perfeita expressividade
espontânea, da produção num estado de transe e, portanto, com pouca preocupação
teórica e ideológica. Cf. Gay 2008, p. 371.
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V. Walter Benjamin
Comparado com os escritos de Kracauer e Balázs, o en-
saio de Benjamin é tardio e surpreende, apesar de sua fama
atual no campo teórico, por uma série de pontos cegos e de-
negações. Não toma conhecimento de Bela Balázs31, nem da
longa resenha que Robert Musil dedica a O Homem Visível
em 192532. Exagera, contra as evidências factuais, as virtu-
des democráticas do cinema enquanto arte coletiva controla-
da por coletivos e comitês33. Na iminência dos processos de
Moscou, a teoria de Benjamin é alheia ao perigo que já se de-
senha, tanto na direita fascista, como nas esquerdas europeias
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38 Greenberg 1940.
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gação popular – os quadrinhos: desenhos simples com legendas como “você quer
livrar-se do frio, da fome? “Você quer comer e beber?”, “Junte-se às brigadas de
trabalho humano ou às Brigadas vermelhas”.
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Referências
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Spirit of Film. New York/Oxford: Berghahn.
46 Ele cita como exemplo o presidente da Academia de Letras, Fulda. Cf. Musil 1978b,
p. 1229-1243.
299
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______ (1997b) ‘Der Kult der Zerstreuung’. In: Das Ornament der Masse,
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Musil, Robert (1978a): Der Mann ohne Eigenschaften, Reinbek bei Hamburg:
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Lya Luft e Carlos Abbenseth, Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1978 (sigla
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http://gutenberg.spiegel.de/buch/die-grossstadte-und-das-geistesleben-7738/1
Weber, Max (1992): “Asceticism and the Spirit of Capitalism”. In: Charles
Harrison & Paul Wood (Org.): Art in Theory 1900-1990, Oxford: Blackwell,
p. 135-136.
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Sobre os autores
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304
Modernizações ambivalentes: perspectivas interdisciplinares e transnacionais
305
Título Modernizações ambivalentes:
perspectivas interdisciplinares e transnacionais
Organização Filipe Campello
Benjamin Gittel
Formato 15,5 x 22 cm
Tipografia Lato (títulos)
Sabon (textos)
Papel Pólen 80 g/m2 (miolo)
Triplex 250 g/m2 (capa)
Tiragem 200 exemplares – fevereiro 2016
Impressão e Acabamento Oficina gráfica da Editora UFPE