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CORRUPÇÃO PÚBLICA E PRIVADA

QUATRO ASPECTOS

ÉTICA nO SERVIÇO PÚBLICO, COnTRATOS,


FInAnCIAmEnTO ELEITORAL E COnTROLE
PÁGINA EM BRANCO
SALOmÃO RIBAS JUnIOR

CORRUPÇÃO PÚBLICA E PRIVADA

QUATRO ASPECTOS
ÉTICA nO SERVIÇO PÚBLICO, COnTRATOS,
FInAnCIAmEnTO ELEITORAL E COnTROLE

Belo Horizonte

2014
© 2014 Editora Fórum Ltda.

É proibida a reprodução total ou parcial desta obra, por qualquer meio eletrônico,

Conselho Editorial

Adilson Abreu Dallari Flávio Henrique Unes Pereira


Alécia Paolucci nogueira Bicalho Floriano de Azevedo marques neto
Alexandre Coutinho Pagliarini Gustavo Justino de Oliveira
André Ramos Tavares Inês Virgínia Prado Soares
Jorge Ulisses Jacoby Fernandes
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Presidente e Editor

Supervisão editorial: marcelo Belico


Revisão: Lucieni B. Santos

www.editoraforum.com.br – editoraforum@editoraforum.com.br

R482c Ribas Junior, Salomão

Corrupção pública e privada: quatro aspectos: ética no serviço

Junior. – Belo Horizonte : Fórum, 2014.

348 p.
ISBn 978-85-7700-927-5

1. Direito administrativo. 2. Direito constitucional. 3. Direito


eleitoral. I. Título.

CDD: 341.3
CDU: 342.9

Brasileira de normas Técnicas (ABnT):

RIBAS JUnIOR, Salomão. Corrupção pública e privada: quatro aspectos: ética no

Fórum, 2014. 348 p. ISBn 978-85-7700-927-5.


DEDICATÓRIA

Dedico este livro a Olinda e Salomão,


meus saudosos pais.
PÁGINA EM BRANCO
AGRADECImEnTOS

O poeta Fernando Pessoa disse há anos, “Deus quer, o homem


sonha, a obra nasce”. Ouso repeti-lo com duas pequenas alterações:
“Deus quer, a pessoa sonha, muitos ajudam, a obra nasce”.
Eu não teria concluído esta obra sem a ajuda, o estímulo e
apoio de muitos, a começar pelos que trataram do objeto em estudo
no passado remoto e recente, e na atualidade. A todos eles, a minha
gratidão.
A mesma que devo aos meus familiares e em especial aos mais
próximos: Chola, minha companheira de quase meio século, meus

Amanda, Antônio e Sabrina.


Agradeço aos Técnicos, Auditores, Conselheiros e Procuradores
dos Tribunais de Contas do Brasil, com lugar destacado para o Tribunal
de Contas do Estado de Santa Catarina e aos meus colaboradores mais

Iliete Pereira da Silva, Ricardo André Cabral Ribas, Trícia munari


Pereira, Valéria Gouvêa Ghanem e Yan Cherem e, em especial, a
Cátia Regina Sché que me ajudou desde a primeira hora em todos os
aspectos do doutorado, a Carlos Tramontin pelas preciosas discussões

traduzida pela Sra. noriko Yamashita.


À Universidade de Salamanca, pela qual publiquei originalmente
a tese Corrupção pública e privada: quatro aspectos: ética no serviço público,
, que deu origem a este livro

aludem” na área do Direito, em 23 de outubro de 2013, orientada pelo


Professor Doutor Pedro Tomás nevado-Batalla moreno, e aprovada
pela banca examinadora cujos membros foram:
Presidente: Professor Doutor nicolás Rodrigues Garcia (USAL)
Vocales: (membros): Professores Doutores
mário Cesar Barreto moraes (UDESC)
José-Antonio Chamorro y Zarza (USAL)
Pilar Jimenez Rius (Tribunal de Contas da Espanha)
Secretário: Roberto Fernández llera (USAL).
Agradeço, também, em especial ao Síndico da Sindicatura de
Cuentas del Principado de Asturias, Antônio Arias Rodríguez, antigo
dirigente universitário, e aos Professores Doutores Nicolás Rodríguez
Garcia, Maria Belén Lozano Garcia e Pedro Tomás Nevado-Batalla
Moreno, este meu paciente orientador e maior estimulador.
EPíGRAFE

En las democracias, los escándalos de corrupción se

las campañas políticas.


Una forma particularmente intolerable de corrupción
política se produce cuando los políticos aceptan
contribuciones ilegales para sus campañas y después
las utilizan para comprar votos.
(ROSE-ACKERmAn, Susan. La corrupción y los
gobiernos: causas, consecuencias y reforma)
PÁGINA EM BRANCO
SUmÁRIO

LISTA DE ABREVIATURAS ................................................................................. 17

PREFÁCIO
ALGUnAS REFLExIOnES SOBRE CORRUPCIÓn Y ÉTICA DEL
BIEn COmÚn
Prof. Dr. D. Pedro Tomás Nevado-Batalla Moreno......................................... 21

CAPíTULO I
InTRODUÇÃO ................................................................................................... 31
1.1 Contextualização do problema ............................................................ 31
1.2 Objetivos gerais ...................................................................................... 32
............................................................................. 33
1.4 Abordagem geral ................................................................................... 33

CAPíTULO II
CORRUPÇÃO ...................................................................................................... 39
2.1 Corrupção nos dicionários ................................................................... 42
2.2 Ciências sociais e a corrupção .............................................................. 44
2.3 Corrupção e as leis penais .................................................................... 47
2.3.1 O direito penal internacional ............................................................... 52
2.4 Corrupção na perspectiva internacional ............................................ 54
2.4.1 Cooperação internacional para combater a corrupção .................... 55
2.4.2 Organização dos Estados Americanos (OEA) ................................... 57
2.4.3 União Europeia e a corrupção .............................................................
2.4.4 OCDE e as recomendações aos setores público e privado ..............
2.4.5 A Convenção da OnU ..........................................................................
2.5 A economia e a corrupção ....................................................................
2.5.1 Causas econômicas da corrupção........................................................
2.5.2 Consequências da corrupção na economia ........................................
...........................................................
......................................................... 70
................................................. 71
2.7 Corrupção na opinião popular ............................................................
2.7.1 Opinião pública...................................................................................... 77
2.7.2 A cor da corrupção na visão popular.................................................. 78
2.8 Corrupção pública ................................................................................. 81
2.8.1 Corrupção política ................................................................................. 84
2.8.1.1 Caso Collor ............................................................................................. 85
2.8.1.2 CPI do orçamento ..................................................................................
2.8.1.3 núcleos de poder e esquemas descobertos........................................ 87
2.8.1.4 Esquema das empreiteiras.................................................................... 90
2.8.1.5 Subvenções sociais ................................................................................. 91
................................................................................ 92
..................................................................... 93
.......................................... 93
........................... 94
...................................................................... 95
..............................................................
........................................................... 97
2.8.2 Corrupção administrativa e improbidade ......................................... 98
2.8.2.1 Sanções por improbidade ................................................................... 109
2.8.2.2 Improbidade e crimes dos Prefeitos ................................................. 109
........................................................................................ 110
2.8.2.4 Crimes e infrações na Lei de Licitações ............................................ 112
2.8.3 Corrupção eleitoral .............................................................................. 114
2.8.3.1 A Lei da Ficha Limpa .......................................................................... 119
2.8.3.2 Fraudes em eleições............................................................................. 122
.............................. 123
2.8.3.4 Conferência nacional dos Bispos do Brasil ..................................... 124
2.8.3.5 movimentos regionais ........................................................................ 125

Consocial ............................................................................................... 125


2.8.3.7 Amigos Associados de Ribeirão Bonito (AmARRIBO)..................
2.8.3.8 O que você tem a ver com a corrupção ............................................ 127
2.9 Corrupção privada .............................................................................. 128
2.9.1 Corrupção na Europa .......................................................................... 131
2.9.2 Lobby e a corrupção.............................................................................. 138
2.9.2.1 Atividades confundidas com o lobby ................................................ 143
2.9.3 Perspectivas de aprovação da regulamentação do lobby................ 155
2.10 Corrupção endêmica ...........................................................................
2.10.1 Corrupção no futebol .......................................................................... 158
2.10.1.1 O caso da CBF ...................................................................................... 158
................................................................................... 159
2.10.3 O caso da FIFA .....................................................................................
2.10.4 Corrupção no futebol italiano ............................................................
2.10.5. Rede de corrupção ...............................................................................
.......................................................................
2.10.7 Operação Vampiro...............................................................................
2.10.8 Desvios de acordo com a mídia .........................................................
2.10.9 Percepção e tolerância popular .......................................................... 170
2.11 medir a corrupção ............................................................................... 171
2.12 Os indicadores da Transparência Internacional .............................. 172
2.13 índice de Percepção da Corrupção.................................................... 173
2.14 Outras tentativas de medir a corrupção ...........................................
2.15 Outro método de medição.................................................................. 180
........................................................................... 181

CAPíTULO III
ÉTICA ................................................................................................................... 185
......................................................................
3.2 Ética aristotélica ...................................................................................
3.3 Ética em Kant ....................................................................................... 187
....................................................................... 187
3.5 A invenção e o renascimento da ética ............................................... 188
....................................................................................... 189
3.7 Ética e a economia ............................................................................... 189
3.8 Exclusão e justiça social ...................................................................... 190
3.9 Ética e o meio ambiente ...................................................................... 190
3.10 Ética, Administração e política .......................................................... 191
.................................................................................. 195
3.11.1 Ética dos médicos ................................................................................ 195
3.11.2 Ética dos advogados ............................................................................ 197
3.11.3 Ética dos jornalistas ............................................................................. 198
3.11.4 Ética no serviço público ...................................................................... 200
3.11.4.1 Conduta da Alta Administração........................................................ 207
3.12 Ética no plano internacional............................................................... 209
3.12.1 Código de Ética da InTOSAI ............................................................. 212
3.13 Ética nos negócios privados ............................................................... 213
3.13.1 Código Olivencia e Informe Aldama ................................................
3.13.2 Boa governança no Brasil ................................................................... 217

CAPíTULO IV
DEmOCRACIA, ELEIÇõES E CORRUPÇÃO ........................................ 221
4.1 Democracia ........................................................................................... 222
4.2 Financiamento dos partidos políticos ............................................... 223
4.3 Financiamento nas Américas Central e do Sul ................................ 225
4.4 Financiamento público........................................................................ 228
4.4.1 Fundo Partidário .................................................................................. 234
4.5 Financiamento privado ....................................................................... 235
............................................................ 237
4.7 Campanhas eleitorais e limites .......................................................... 238
4.8 Os custos indiretos das eleições......................................................... 239

CAPíTULO V
COmPRAS GOVERnAmEnTAIS E COnTRATOS ............................. 243
5.1 Os contratos na Administração Pública ........................................... 245
5.2 Conceitos do contrato administrativo .............................................. 247
5.3 O ciclo da contratação pública ........................................................... 249
5.4 Atos iniciais .......................................................................................... 251
5.5 O edital de licitação ............................................................................. 252
...................................................................... 253
5.7 Tipos de licitação .................................................................................
5.8 Defeitos e impropriedades do edital................................................. 258
5.9 Controle dos contratos .......................................................................
5.10 Caminhos da corrupção nos contratos ............................................
5.10.1 Contrato de obras e serviços ..............................................................
5.10.2 Uma pesquisa pioneira na Alemanha...............................................
.......................................................................................
5.11 Preparação da licitação .......................................................................

CAPíTULO VI
COnTROLE........................................................................................................ 271
............................................................................... 272
............................................................... 277
................................................. 278
............................................................ 279
........................................................................ 279
a posteriori ............................................................................. 280
..... 281
............................. 282
....................................................................... 283
.............................................. 283
...................................................................
............................. 287
................................. 290
........................................................ 291
............................................................. 293
............................................................................
.......................................................................... 298
........................................................... 299
............................................................... 300
.......................................................................... 301
.......................................................... 302
.................................................... 303
................................................................. 304
...................................................................................... 307

CAPíTULO VII
COnSIDERAÇõES FInAIS .......................................................................... 313
7.1 O que é a corrupção? ........................................................................... 313
7.2 Como e onde existe? ............................................................................ 317
7.3 Quais as causas?................................................................................... 319
7.4 Consequências...................................................................................... 321
7.5 Pode ser medida? ................................................................................. 323

eleitoral? ................................................................................................ 324


7.7 Pode ser combatida? ............................................................................
7.8 Por quais meios? .................................................................................. 328
7.9 O que se está fazendo? ........................................................................ 330
7.10 O que falta fazer? ................................................................................. 333

REFERÊnCIAS ..................................................................................................... 337


PÁGINA EM BRANCO
LISTA DE ABREVIATURAS

ABInEE Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica


ABRACOm Associação Brasileira dos Tribunais de Contas dos municípios
ADCT Ato das Disposições Constitucionais Transitórias
AmARRIBO Amigos Associados de Ribeirão Bonito
ATRICOn Associação dos membros dos Tribunais de Contas do Brasil
BID Banco Interamericano de Desenvolvimento
BIRD Banco Internacional para Reconstrução e Desenvolvimento
BnDS Banco nacional de Desenvolvimento Econômico e Social
CBF Confederação Brasileira de Futebol
CCEAAF Código de Conduta Ética da Alta Administração Federal
CE Conselho Europeu
CEIS Cadastro nacional de Empresas Inidôneas e Suspensas
CEmIG Companhia Energética de minas Gerais
CESP Companhia Energética de São Paulo
CGU Controladoria Geral da União
CnBB Conferência nacional dos Bispos do Brasil
CnC Confederação nacional do Comércio

CnJ Conselho nacional de Justiça


COnAB Companhia nacional de Abastecimento
COnAmP Conselho nacional do ministério Público
COnSOCIAL Conferência nacional sobre Transparência e Controle Social
COnURB Companhia de Desenvolvimento e Urbanização
CPI Comissão Parlamentar de Inquérito
CPL Comissão Permanente de Licitação
CPmI Comissão Parlamentar mista de Inquérito
CUT Central Única dos Trabalhadores
CVm Comissão de Valores mobiliários de São Paulo
DASP Departamento Administrativo do Serviço Público
DECOmTEC Departamento de Competitividade e Tecnologia
DnIT Departamento nacional de Infraestrutura de Transportes
DSE Fundação Alemã para o Desenvolvimento Internacional
EFS Entidades de Fiscalização Superior

Dinheiro
FCPA Foreign Corrupt Practices Act
FECOmÉRCIO-RJ Federação do Comércio do Estado do Rio de Janeiro
FIA-USP Fundação Instituto de Administração da Universidade de
São Paulo
FIESP Federação das Indústrias do Estado de São Paulo
FIFA Federação Internacional de Futebol
FmI Fundo monetário Internacional
FnA Federação nacional dos Arquitetos e Urbanistas
FUnDASP Fundação São Paulo
GAECO Grupo de Atuação Especial e Repressão ao Crime Organizado
GD Grupo Deliberativo
GRECO Grupo dos Estados contra Corrupção
GT Grupo Técnico
IBOPE Instituto Brasileiro de Opinião Pública e Estatística
IBGC Instituto Brasileiro de Governança Corporativa
ICC Indicador Agregado de Controle da Corrupção
IDH índice de Desenvolvimento Humano
IPC índice de Percepção da Corrupção
IRB Instituto Rui Barbosa
LDO Lei de Diretrizes Orçamentárias
LOA Lei Orçamentária Anual
LRF Lei de Responsabilidade Fiscal

mPC minstério Público de Contas


mPOG ministério de Planejamento, Orçamento e Gestão
nAG normas de Auditoria Governamental
OAB Ordem dos Advogados do Brasil
OCDE Organización para la Cooperación y el Desarrollo Económicos
OCEx Órgão de Controle Externo
OEA Organização dos Estados Americanos
OnGs Organizações não Governamentais
OnU Organização das nações Unidas
OSCIP Organização da Sociedade Civil de Interesse Público
PAC Programa de Aceleração do Crescimento
PDT Partido Democrático Trabalhista

PF Polícia Federal
PIB Produto Interno Bruto
PL Partido Liberal
PmDB Partido do movimento Democrático do Brasil
Pmn Partido da mobilização nacional
PP Partido Progressista
PPA Plano Plurianual
PPC Produto Per Capita
PR Partido da República
PRE Procuradoria Regional Eleitoral
PROmOEx Programa de modernização dos Órgãos de Controle Externo
PSC Partido Social Cristão
PSDB Partido da Social Democracia Brasileira
PT Partido dos Trabalhadores
PTB Partido Trabalhista Brasileiro
SABESP Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo

SICOnV Sistema de Convênio do Governo Federal


SIVAm Sistema de Vigilância da Amazônica
STF Supremo Tribunal Federal
STn Secretaria do Tesouro nacional
SUDEnE Superintendência do Desenvolvimento do nordeste
TC Tribunal de Contas
TCE Tribunal de Contas do Estado
TCm Tribunal de Contas do município
TCU Tribunal de Contas da União
TI Tecnologia da Informação
TO Tocantins
TRE Tribunal Regional Eleitoral
TSE Tribunal Superior Eleitoral

UFmG Universidade Federal de minas Gerais


PÁGINA EM BRANCO
PREFÁCIO

ALGUnAS REFLExIOnES SOBRE


CORRUPCIÓn Y ÉTICA DEL BIEn COmÚn

Las malas prácticas administrativas o su evolución más nociva y


reprochable, la corrupción pública, se ha convertido en un denominador
común en la gestión pública de una inmensa mayoría de los países. Pocas
naciones pueden exhibir, no sin tremendo orgullo, que sus estructuras
de gobierno y administración no padecen este tipo de patologías y por
lo tanto su sistema político, su democracia, se encuentra saneada.
Esta referencia a la extensión prácticamente global del problema
no supone un vano intento de difuminarlo o diluirlo en la totalidad,
simplemente se trata de realizar una primera aproximación a la
magnitud de esta realidad y a la extensión que alcanza su larga sombra.
Si establecemos en un sumatorio la dimensión cuantitativa y
cualitativa del problema, el tiempo que llevamos padeciendo en muchos
países esta patología, junto a los relativamente escasos avances en la
solución del problema (sobre todo desde la perspectiva del ciudadano
medio), podemos entender que por mucho que se haya escrito y
estudiado, aún no conocemos de manera completa muchos de los
aspectos de este desviado proceder en el ámbito, esencialmente, público
o que, partiendo del sector privado, llega a alcanzar las fronteras de
lo público.
Gravedad cuantitativa pero mucho más significada, desde
nuestro punto de vista, cualitativa ya que supone un impacto directo a

instituciones y representantes. Dicho en otras palabras, los problemas


de malas prácticas y especialmente de corrupción, desde un punto

previsión normativa adecuada y la correcta aplicación de ésta. Así, los


Salomão RibaS JUnioR
22 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

como casos de éxito en cuanto a aplicación del Derecho. Pero el daño


que la corrupción provoca no es posible sanearlo, sin más, a través de
una sentencia o, en su caso, mediante una actuación administrativa. La

recuperarla (podría incluso decirse que es generacional) y es la esencia


del propio sistema democrático. Se está afectando al elemento medular
del sistema de tal forma que no puede ser considerado un bien jurídico
más que resulta ser digno de protección. Es el bien de bienes de una
democracia.
Pero aún más, el problema de la corrupción desde la perspectiva
de la legitimidad y credibilidad del sistema no sólo horada el sistema
desde su epicentro o punto de localización, no es posible acotarlo. La
corrupción extiende también su toxicidad a ámbitos o sectores públicos
donde el desempeño de la función es correcto en términos de legalidad
y acertado para el interés general. Esto es, la corrupción lanza un velo

todos teniendo el nocivo efecto de la falta de credibilidad en el conjunto


del sistema. Pensar que ante la corrupción y su práctica “todos son
iguales” es una patología democrática peligrosa que lleva a que baje
la estima y el apoyo ciudadano a la democracia generando un espacio

Por tanto, redundando en la idea ya expuesta, hay que desentrañar


las raíces del problema, seguir avanzando en el estudio de esta patología
que tanto afecta a la salud democrática de un país, de tal forma que
el pleno conocimiento nos lleve a mejores prácticas que prevengan,
minimicen y, en su caso, respondan de manera determinante y ejemplar.
En el sentido apuntado, el trabajo del Doctor Salomón Ribas Jr.
abunda en el tema con un estudio que aúna los pilares básicos de un
trabajo solvente: el rigor técnico y la experiencia de quien ha vivido
en primera persona diferentes actividades profesionales cuyo objetivo
era fortalecer valores como la igualdad, la libertad, la transparencia,
el fortalecimiento institucional o el respeto a la legalidad. En síntesis,
una intensa vida profesional dedicada la democracia y el Estado de
Derecho, precisamente los rompientes naturales de la corrupción

conocimiento teórico y práctica profesional tamizado por el esfuerzo


y el estudio.
no es por tanto esta obra un trabajo más, ni por el ya apuntado

por los temas que estructuran la obra: ética en el servicio público,


PREFÁCIO
ALGUnAS REFLExIOnES SOBRE CORRUPCIÓn Y ÉTICA DEL BIEn COmÚn
23

lugar a dudas, se libra la batalla contra la corrupción pública, pero


también, como muy acertadamente indica el autor, frente a la corrupción
de naturaleza privada.
Cualquiera de estos temas tiene un carácter capital para cualquier
operador o interesado en la materia y así se encarga de evidenciarlo
el Doctor Ribas Jr.
La ética como fundamento de quien va a ser titular de compe-
tencias y potestades cuyo ejercicio sólo puede estar orientado al interés
general pero también de todos los ciudadanos.
La contratación pública, donde tenemos presente gestión y
recursos públicos, siendo repetido escenario de no pocas malas prácticas
administrativas y gravísimos casos de convergente corrupción pública

clientelismo “
burocracia política llega a ejercer frente a quienes desarrollan funciones
vinculadas a la contratación pública.

ticos, idéntico escenario, por habitual y extendido, de corrupción

por el Profesor nIETO de la existencia de una descarnada lucha por


el poder y su botín1 en la que no importa alterar el orden de prelación

burocracia administrativa, parametrizando sus decisiones en aquellas


materias de especial trascendencia económica como es la contratación
pública a la que antes nos referimos.
El control de la actividad pública, fundamental instrumento

el acierto y legalidad de las decisiones públicas. Control que en pocas


ocasiones ha sido objeto de una intencionada voluntad de preterición

del centro de gravedad de toda acción pública en el bien común, hacia


otro punto o puntos particulares o clientelistas, espurios a dicho bien
común o general.
Cualquiera de estos temas resulta de un interés sobresaliente
que el Doctor Ribas Jr. satisface de manera plena en los diferentes
capítulos de su libro, pero de manera muy somera, quisiera detenerme

1
Pueden consultarse, entre otros, los trabajos “La corrupción en la España democrática” y
“El desgobierno de lo público”.
Salomão RibaS JUnioR
24 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

en el punto relativo a la ética en el desempeño de funciones públicas


y también privadas.
Y es que sin ánimo de ser reiterativo en cuanto al fenómeno de
la corrupción como magnitud de gran escala en todos los sentidos,
entendemos que en su etiología la raíz del problema podemos

supone una gran aportación pero que, si abundamos un poco en el


tema, encierra en sí misma una serie de interrogantes que no resulta
sencillo responder.
¿Qué mueve a altas magistraturas de un Estado a seguir la
sinuosa y oscura senda de la corrupción?
¿Qué le pasa por la mente a un Diputado o un alto cargo de la

propio?
¿Qué razonamiento desarrollan un grupo de Diputados para
dejarse sobornar?
¿Por qué el Presidente de una Comunidad Autónoma o un Estado
federal con un currículo impecable tanto político como profesional
opta por descuidar sus obligaciones como garante del interés genera
en provecho propio?
Todos estos casos y otros cientos que podría mostrarnos el
mapa judicial que trazan las sentencias (generalmente penales y las
causas abiertas aún sub iudice) tienen además el denominador común
de mostrar una corrupción, llamémosla, grosera, de poca elaboración
(si es que se puede admitir algún desarrollo intelectual o técnico en la
materia, en todo caso, reprochable y de necesaria proscripción) que
incluso atenta la inteligencia o conocimientos medios de cualquier
ciudadano. Es, en muchas ocasiones, un proceder sin empacho de
simple saqueo de fondos, muy habitualmente públicos, tan burdo que,

de los sujetos activos involucrados.


Podrían apuntarse varias causas de este intencionado mal
gobierno o mala administración en interés propio que, nada tiene que

razones de incapacidad o negligencia (que también hay ejemplos).


Pues bien, una primera causa, podría ser la ausencia de una
normativa más rigurosa y depurada. nosotros entendemos que no. Si
en algo se ha caracterizado la evolución legislativa de los países sujetos
a un Estado democrático y de Derecho, es la elaboración de una serie
de bloques normativos que cualquier especialista en la materia podría
PREFÁCIO
ALGUnAS REFLExIOnES SOBRE CORRUPCIÓn Y ÉTICA DEL BIEn COmÚn
25

evaluar de manera muy positiva en cuanto a la previsión de técnicas


preventivas, de actuación ex ante, control, transparencia incluso de
reacción a través de la exigencia de responsabilidades administrativas
o penales de indudable efecto disuasorio.
Se mire por donde se mire los ejemplos son elocuentes. Sin

referentes normativos: el “Estatuto Anticorrupción” de Colombia; las

la muy loable y paradigmática “Lei de Improbidade Administrativa” de


Brasil; la severa normativa antisobornos en Reino Unido (“Bribery
Act”); en Argentina la Ley de ética en la función pública; la normativa
peruana en materia procesal y de reparación civil a favor del Estado en
caso de procesos seguidos sobre delitos de corrupción; el desarrollo de
la función constitucional de transparencia y control social del Ecuador;
la Ley contra la Corrupción y el Enriquecimiento Ilícito en la Función
Pública, de Costa Rica; la relativamente reciente Ley Anticorrupción
francesa; etc., etc.
Y todo ello, como podrá apreciar el lector en esta obra, sin
perjuicio de las Convenciones y Tratados internacionales suscritos
sobre la materia.
Como podemos apreciar, entre normas y modelos legislativos
comparados hay para elegir, pero el problema está en su seguimiento y
aplicación. Si hiciéramos una valoración del rendimiento normativo en

el nivel medio bajo de los resultados obtenidos. Y, nuevamente, ahí


tenemos el elemento humano, la actitud de quien tiene las titularidades
activas, las competencias para ejercerlas y, sin duda, quien está dentro
del ámbito subjetivo de aplicación de la norma, como el factor más
débil de la ecuación.
La existencia de muchas normas con un escaso rendimiento,
son malas variables para una buena gobernanza. Algo que, si se me

éste Gobernador de la ínsula Barataria:

no hagas muchas pragmáticas (Decretos), y si las hicieres, procura que


buenas, y sobre todo que se guarden y cumplan, que las pragmáticas
que no se guardan lo mismo es que si no lo fuesen, antes dan a entender
que el príncipe que tuvo discreción y autoridad para hacerlas no tuvo
valor para hacer que se guardasen; y las leyes que atemorizan y no se
ejecutan, vienen a ser como la viga, rey de las ranas, que al principio
las espantó, y con el tiempo la menospreciaron y se subieron sobre ella.
Salomão RibaS JUnioR
CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

lo cual ya nos sitúa de entrada ante la propia persona y su actitud ya

o el espacio en el que se desempeñen funciones públicas, cada persona


debe actuar con responsabilidad y lealtad a los intereses generales que la
legislación concreta o, incluso, en ausencia clara de esta (supuesto más
que improbable) lo debe dictar el sentido común y natural inclinación
que se deduce de una persona honesta.
no obstante, históricamente, el Derecho Público consciente de
la importancia del interés general y el peligro que supone para éste
la debilidad humana ha tratado siempre de establecer controles y

particularizada, pero sí reconocida de manera general, buscando un

ejemplares previsiones que hace la Constitución de Cundinamarca de

- “Supervigilar” (sic) cuidando que ni en los establecimientos


públicos ni en los privados destinados a la instrucción de la
juventud, al fomento de la industria, a la prosperidad del
comercio y al bien general de toda la Provincia se introduzcan
abusos o prácticas contrarios a la felicidad común.
- Establecer como primera obligación del Poder Ejecutivo,
poner en ejecución y dar cumplimiento en todas sus partes a esta
Constitución, impidiendo que el transcurso del tiempo y descuido
introduzcan abusos y corruptelas contrarias a lo que en ella se dispone.
Acertadas menciones de hace ya más de dos siglos que hoy
podríamos admitirlas con aplauso en cualquier norma o Tratado de

posición realista y de lo debe ser la protección del interés general. Sin


duda en las antípodas de las técnicas del gerencialismo público asentado
en la adopción de técnicas y reglas del sector privado. movimiento de
enorme éxito y acogida como punta de lanza de la “nueva forma de
gobernar” o de los “nuevos tiempos en la vida pública” que no sólo
trató de huir del Derecho Público y, particularmente, del Derecho

a la modernización de las administraciones públicas etc.; trató de


enterrarlo.
Pero no se puede ocultar la luna con un dedo y la realidad es
tozuda. La experiencia gerencialista (al menos desde el conocimiento
más cercano a la realidad española) fue devastadora en términos
de malas prácticas y corrupción, de tal forma que a día de hoy
PREFÁCIO
ALGUnAS REFLExIOnES SOBRE CORRUPCIÓn Y ÉTICA DEL BIEn COmÚn
27

los esfuerzos organizativos y normativos puestos en marcha para

demoledora crisis económica están pasando por la racionalización de


la Administración Pública a través de la reactivación de principios y
reglas ya conocidas hace siglos cuyo planteamiento debería ruborizar
al que las presenta como si de una novedad o innovación se tratara. no
hay otra cosa, casi todo está inventado y como dice martin-Retortillo2

permite hacer carantoñas.


El Derecho es una herramienta y depende completamente de
quien lo utilice, de su aptitud y actitud. Y cuando se trata de gestionar
intereses generales, la existencia de garantías y controles debe ser lo
razonable como muy bien podrá apreciar el lector en el desarrollado
estudio que hace el Doctor Ribas Jr. en esta obra.

se ha podido ir viendo, todas ellas conducen a la decisión del individuo,


esencialmente a su actitud más que a su aptitud o pericia que, siendo

preguntas que nos hacíamos líneas atrás me remito.


Y si hacemos el esfuerzo de descender aún más a la práctica
de la gestión, podemos atrevernos a decir que, en ese momento de
decisión donde el gestor no tiene observador alguno, cuando el
procedimiento establecido permite un margen de legal discrecionalidad
o, sencillamente, hay un posible espacio de impunidad, la defensa
del interés general pasa por los valores y compromiso con el bien
común que tenga ese gestor. Lo cual puede parecer poco, pero es

con los controles y garantías establecidas, el interés general estuviera

la integridad del sistema.

debilidad de la ética social del momento en el que nos encontramos. Y no


es que no haya ética o moralidad, claro que existe, se encuentra incluso
formalizada como muy bien el lector también puede comprobar en el
capítulo correspondiente de esta obra. nos referimos a la ética basada en
el bien común que, como un tamiz, depura comportamientos desviados
o irregulares. La interiorización, convencida, connatural, de atención

2
mARTIn-RETORTILLO BAQUER, L.: “Crisis económica y transformaciones administra-
Salomão RibaS JUnioR
28 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

preferente al interés general que de alguna manera ha ido perdiendo


espacio en nuestras sociedades o que no se es capaz de transmitirse,
de capilarizarse, desde la base social a las más altas magistraturas por
cuanto, estas magistraturas, los gestores públicos o privados, son espejo
de la propia sociedad.

como algo real, si el interés general como interés de todos se considera


una mera elaboración de corte teórico-doctrinal, difícilmente podemos
construir estructuras jurídico-organizativas con la solidez necesaria
para sostener el elevado peso que genera una democracia fuerte y
desarrollada.
Democracia donde la igualdad, la libertad, la transparencia, el
meritocrático y libre acceso a cargos y funciones públicas, la legalidad
etc., entre otros principios o valores afectos a la gestión de los asuntos
públicos desde una perspectiva democrática, han de desarrollarse de
manera natural en un marco jurídico formalizado al efecto.
Ausencia o, en el mejor de los casos, debilidad de una ética del
bien común que trastoca todo ya que, como ya decíamos líneas atrás,
se provoca una alteración del orden de prelación de los intereses que
han de ser atendidos. Variación del orden de valores donde el interés

a puestos de inferior categoría, o es, incluso, directamente apartado.


Y ello en contra, por un lado, de lo que indica la norma jurídica que
concreta de manera formal y democrática en qué consiste ese interés
general. Pero también contrario, por otro, del simple sentido común que
debería imponerse entre quienes conforman una sociedad y necesita su
cobertura para subsistir y desarrollarse adecuadamente en parámetros
de igualdad y progreso, cumpliendo el encargo común de la práctica
totalidad de nuestros Textos constitucionales de promover la justicia
social y el bienestar de los ciudadanos.
Tal vez, lo que tratamos de exponer se resuma uno de los pensa-
mientos de Ortega y Gasset sobre la propia civilización y su evolución
a lo largo del tiempo:

La civilización no dura porque a los hombres sólo les interesan los


resultados de la misma: los anestésicos, los automóviles, la radio. Pero
nada de lo que da la civilización es el fruto natural de un árbol endémico.
Todo es resultado de un esfuerzo. Sólo se aguanta una civilización si

el fruto, la civilización se hunde.


PREFÁCIO
ALGUnAS REFLExIOnES SOBRE CORRUPCIÓn Y ÉTICA DEL BIEn COmÚn
29

Actualizando este pensamiento, podemos indicar que el bien

por contribuir a él a través de un servicio desinteresado a los demás.


Servicio que tiene como primera y más sencilla obligación el sujetarse
a la legalidad como manifestación de la voluntad democrática del
conjunto de los ciudadanos a través de sus representantes políticos que

que el respeto a la ley es expresión del respeto a los legisladores y a las


autoridades que han de aplicar sus normas.
Esta podría ser una primera y rápida aproximación a la ética del
bien común que extendiéndose a todos los ciudadanos, debe ser más
exigible aún en quienes se constituyen en autoridad o representantes

ciosamente en la integridad de las instituciones, promoverá y facilitará


el ideal social de la ética del bien común.
Los planteamientos expuestos son sencillos de plasmar en
unas líneas pero, infelizmente, en estos tiempos de cambios, desafíos

sencillo cristalizar en la realidad. Es más, no puede ser un esfuerzo


aislado de juristas o de legisladores pensando que las normas pueden

hemos repetido, las normas ayudan, disciplinan, ordenan pero no hacen


milagros generando, por ejemplo, de la noche a la mañana, una cultura
de cumplimiento o de respeto al interés general.
Creemos que esta tarea requiere de una mayor educación social,
promoción y regeneración de valores, la existencia de ejemplos tangibles
de buenas prácticas y, sobre todo, no olvidar que la gestión debe pro-
porcionar resultados que, como se decía en términos decimonónicos,
proporcionen felicidad a los ciudadanos. Elevados objetivos que reque-
rirán, si en algún momento se aprecian y existe el obligado consenso
para su puesta en práctica, el compromiso de, al menos, esta generación,
en trabajar en aquello que han hecho todos los pueblos a lo largo de
su historia: superar crisis, aun cuando lo ideal sería que no fuera la
necesidad la que nos espolea y se actuara por convencimiento en el
sistema democrático y el bien común sobre el que se asienta.

suscitar más o menos inquietudes al lector, el cual podrá obtener mayor


claridad e incluso respuestas concretas tras la lectura de esta obra cuyo
autor, el Doctor Salomón Ribas Jr., como ya hemos anticipado, otorga
con su nombre la solvencia y seriedad intelectual que trae causa en
Salomão RibaS JUnioR
30 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

una trayectoria vital y profesional dedicada al estudio y el servicio a


los demás.
El que conoce al Doctor Ribas Jr. sabe que puede ser considerado
como uno de esos hombres ejemplares que, de vez en cuando, la
sociedad tiene la fortuna de contar con ellos para contribuir mucho y

Para quienes no lo conocen de manera tan directa, sus obras y

preocupación por la democracia y el Derecho. Sin olvidar su trabajo,


siempre impecable, profesional, integrador, honesto y de elevada
lealtad institucional.
Todo ello posibilita destilar en la persona del Doctor Ribas Jr.,
como en pocos, la esencia reconocible y cercana de una ética del bien
común de la que todos, quienes le conocemos y quienes no, debemos
aprender.

Prof. Dr. D. Pedro Tomás Nevado-Batalla Moreno


Presidente del Consejo Consultivo de Extremadura
CAPíTULO I

InTRODUÇÃO

1.1 Contextualização do problema


A humanidade sempre viveu períodos de expansão, em um
sentido ou outro, de suas descobertas e invenções. na atualidade
denomina-se o processo de universalização de condutas positivas

econômico na perspectiva de que a economia de mercado seria adotada


por todos os países aceleradamente. Isso implicaria em uma nova
espécie de domínio das forças produtoras sobre as consumidoras
de bens, produtos e serviços. Os países não mais produziriam para
o consumo de seu próprio povo, exportando os excedentes. Haveria
alguns países que produziriam para todos os outros. Esses produtos
seriam preferencialmente os de alta tecnologia, mas também os
de custos mais atraentes para os consumidores. As reações não se

no mundo subdesenvolvido em relação aos países ricos (norte-sul)


e as que surgiram das economias menos abertas e conservadoras
(leste-oeste). Em verdade, a acusação de que a globalização era um
movimento no interesse do ocidente para dominar o oriente é falsa.
Em outros momentos da história, ainda que não se tenha dado a
mesma denominação, houve movimentos em sentido contrário. muitas
inovações tecnológicas, no uso das ciências e invenções, surgiram no
oriente e depois migraram para o ocidente. É só olhar para a descoberta

realidade. De qualquer maneira, apesar das reações, a globalização foi


crescendo e expandindo seus próprios horizontes. Perdeu a limitação da
economia para ganhar o amplo espaço das ideias, dos usos e costumes,
e da construção de sociedades politicamente mais democráticas e
Salomão RibaS JUnioR
32 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

socialmente mais igualitárias. O movimento de bens trouxe junto os

circulação mundial do dinheiro trouxe junto perversões do uso desse


mesmo recurso material.
Os negócios privados vieram com os seus inegáveis benefícios
acompanhados dos seus malefícios. A fraude, o suborno, o abuso do

negócios públicos e privados ganharam maior escala e passaram a


ser replicados universalmente. Assim, a corrupção passou a ser uma
questão importante em um determinado momento do processo de
globalização. Trata-se de fenômeno antigo, comum aos países desen-
volvidos e em desenvolvimento, que não vinha merecendo maior
atenção dos organismos internacionais até que se descobriram alguns
efeitos da corrupção sobre a economia (macro e micro), no princípio
apenas nos países em desenvolvimento, atualmente em todos os países,
inclusive nos mais desenvolvidos. Desses efeitos decorrem prejuízos
notáveis para as pessoas, gerando condições sociais lamentáveis.
É nesse quadro geral que o mundo acadêmico passou a ver a

para informar os objetivos gerais. Assim, preliminarmente, buscam-se


respostas para as seguintes indagações: O que é? Como e onde existe?
Quais as suas causas? Quais são suas consequências? Pode ser medida?

combatida? Pode ser eliminada ou contida? Por quais meios? O que se


está fazendo para controlá-la? O que falta fazer?

1.2 Objetivos gerais


A presente obra tem dois objetivos gerais: (i) a realização de
pesquisa sobre aspectos linguísticos, jurídicos, econômicos e sociológicos
da corrupção e (ii) a divulgação para o público das pesquisas, análises
e conclusões delas extraídas sobre o fenômeno da corrupção.
Assim, a leitura vai evidenciar que mesmo seguindo o rigor da

que se pretende é demonstrar se as evidências da corrupção tem corre-


lação com as teorias desenvolvidas pelos doutrinadores de reconhecido
saber em seus respectivos campos de estudo.
CAPíTULO I
InTRODUÇÃO
33

Quatro aspectos concretos serão examinados mais atentamente


no desenvolvimento do tema “corrupção pública e privada”. São eles:

partidos políticos e controle da Administração.

1.4 Abordagem geral


no contexto referido acima, a presente obra tem origem nos
estudos e pesquisas do antigo curso de “Aspectos Jurídicos e Econô-
micos da Corrupção” da Universidade de Salamanca. Do conjunto de
orientações dos seus professores, dos estudos orientados em aula e da
literatura sugerida pelo referido curso de doutorado, surgiu a proposta

um dos aspectos do tema.


O método predominante na exposição é o descritivo e a lingua-
gem obedece a duas ordens de necessidade. Em primeiro plano a

número de pessoas.
A pesquisa envolveu consulta ao mais variado material dispo-

menta de apoio. A experiência acumulada no cotidiano da operação


do Tribunal de Contas de Santa Catarina também se constitui em
importante contribuição para fatos e atos administrativos, bem como
interpretações no conjunto desses órgãos de controle externo. nesse
particular, destacaram-se duas pesquisas feitas para a organização de
um programa de melhoria da qualidade do controle externo brasileiro
PROmOEx.1 A primeira das duas pesquisas básicas foi realizada
pela FIA-USP,2 no ano de 2002, para conhecer as possibilidades e

de acordo com metodologia concebida por essa respeitável instituição

1
Programa de modernização dos Órgãos de Controle Externo do Brasil. Desenvolvido
pelos Tribunais de Contas (através de suas associações: ATRICOn, ABRACOn e IRB) com

2
Fundação Instituto de Administração da Universidade de São Paulo.
Salomão RibaS JUnioR
34 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

universitária, foi consultado — por entrevista e questionários — o


público interno desses órgãos.
A segunda pesquisa foi aplicada, com metodologia assemelhada,
por técnicos da Fundação Getulio Vargas (FGV) em 2003. nessa opor-
tunidade foi pesquisado o denominado público externo com os usuários
diretos e indiretos dos mecanismos de controle externo. Ambas as

volvimento da obra.
É indispensável reconhecer o papel da imprensa brasileira e de
outros países no levantamento de dados e informações sobre fraudes em
geral, crimes contra a Administração Pública e a corrupção em especial.
Entre os documentos informativos e técnicos pesquisados
destacam-se os Relatórios de Auditorias dos Tribunais de Contas e os
de Comissões Parlamentares de Inquérito (CPI) da Câmara e do Senado
do Senado Federal. na mesma linha as investigações sobre a corrupção
realizadas pelo ministério Público e pela Polícia Federal.
no âmbito do controle interno foram importantes para o trabalho
os documentos da CGU,3 bem como no âmbito do controle social o
trabalho de entidades não governamentais que atuam no combate

Com esse material de estudos técnicos e descritivos de casos


concretos é que se alinharão as descrições de conceitos, práticas e modos
de uso e controle dos recursos públicos no Brasil. Em vários pontos há
comparações com a legislação e fatos de outros países como a Alemanha,
Espanha e os EUA, no sentido de melhor avaliar a realidade brasileira
e a situação concreta em exame quando comparada coma de outros

partidos políticos e campanhas eleitorais. Também mereceram atenção


os estudos e soluções da União Europeia, da OnU, da OCDE e da OEA.
Assim, o que se buscará, em primeiro lugar (cap. II), é um con-
ceito adequado da corrupção para os propósitos da obra. Essa busca
passa inicialmente por uma pesquisa linguística, que colaciona os

gados historicamente, que há uma presença constante de rechaço das


pessoas pela má conduta das outras em relação aos bens comuns.

3
Controladoria Geral da União (Governo Federal do Brasil), órgão central dos sistemas de
controle interno e de transparência da gestão governamental.
CAPíTULO I
InTRODUÇÃO
35

na mesma linha estudam-se as teorias das áreas do Direito, das


ciências econômicas e da Sociologia a respeito da corrupção. As pri-
meiras discutem a corrupção como fenômeno jurídico resultante das
carências, necessidades e ambições do ser humano. Procuram-se causas
e efeitos da ruptura das regras legais de conduta. no campo das ciências

causas e as consequências do fenômeno na economia. Já na Sociologia


encontram-se os aspectos culturais e os de formação histórica do povo
que determinam a presença da corrupção. Os usos e costumes — como

suborno para que o servidor público faça ou deixe de fazer algo.


Os mesmos documentos que instrumentam a busca pelo signi-

e secundárias do desvio de conduta das pessoas no uso e abuso dos


recursos públicos.
Esse aspecto da metodologia multidisciplinar mostra a comple-
xidade do que estamos procurando compreender. As causas variam
de acordo com a perspectiva através da qual olhamos o mesmo ato
ou fato. É assim que percebemos condutas ilícitas provocadas pela
ambição individual e estimuladas pela ausência de punição concreta.
É o ângulo de visão mais comum na perspectiva do Direito e das leis

Se buscarmos a perspectiva pela ótica das ciências econômicas


encontraremos outras causas. Elas envolvem menos os sentimentos e
ambições do indivíduo e mais os estímulos para o incremento de sua
própria renda em um determinado quadro. nesse caso, mesmo presente
a ambição, o que materializa o ato é a facilidade que os defeitos do

burocracia impõe forçando a conduta ilegal como solução no processo.


Ainda no aspecto das causas, vamos encontrar situações dife-
rentes no campo da Sociologia e, em particular, da opinião pública.

a tolerância geral com a pequena corrupção. O que é próprio de um


ambiente cultural propício para gerar a grande corrupção. O caldo de
cultura é causa de danos materiais, sociais e psicológicos que afetam
negativamente o patrimônio público.
nesse ponto surge um aspecto central dos estudos ora apresen-

de sabidas as causas e consequências sob os vários aspectos da vida em


comunidade? O Estado é organizado na atualidade — acentuadamente
o Estado Democrático de Direito — sob a separação entre o público e
Salomão RibaS JUnioR
CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

o privado. no primeiro aspecto o patrimônio de todos e no segundo o


patrimônio individual. Por essa perspectiva é que se procura resumir
a corrupção como “o uso do poder público para obter benefícios pri-
vados”.4 Em parte é um conceito válido, contudo, há outros aspectos

privada.
Para esta pesquisa considera-se a corrupção pública como
gênero do qual são espécies: (i) a corrupção política; (ii) a corrupção
administrativa e (iii) a corrupção eleitoral. Poder-se-ia destacar outras
espécies, mas o objetivo desta obra é estudar o fenômeno sob quatro
aspectos concretos:
a) ética dos servidores públicos;
b) contratação pública;

d) controle da Administração.
O outro gênero do fenômeno é a corrupção privada cujos estudos
são mais recentes e inovadores. É onde avultam aspectos da ética nos
negócios, do lobby e governança corporativa.
Uma das subsecções cuida da corrupção quando atinge carac-
terísticas endêmicas. Isto é, quando há constância e a multiplicidade
crescente de setores onde há rompimento de regras legais ou de conduta
ética. Esta última também passa a ser pesquisada na medida em que
é invocada para prevenir e mesmo combater as condutas corruptas.

de acordo com as metodologias mais utilizadas. Trata-se de quan-

desvios de recursos por meio da corrupção. Em conjunto com métodos

com a construção de indicadores dessa natureza.


A questão ética (cap. IV) é um aspecto importante no manejo de
recursos públicos. Isso decorre da necessária conduta ética na vida em
comunidade. Os aspectos relevantes da ética são pesquisados para se

relações entre o público e o privado no Brasil. Para tanto, a partir de


uma conceituação da Ética, examinam-se historicamente as abordagens

Considerando-se a multidisciplinar abordagem inicial da corrup-

internacionais.
CAPíTULO I
InTRODUÇÃO
37

campos do Direito, da economia, da justiça social, do meio ambiente.

do apelo a ela para combater a corrupção.

comuns na atualidade (medicina, advocacia, jornalismo e serviço pú-


blico) permite conhecer a importância dos Códigos de Ética. Isso se
vê na perspectiva de organismos internacionais e empresariais (boa
governança).
no passo seguinte, chega-se ao capítulo V, que cuida da demo-
cracia, eleições e corrupção. São aprofundadas as pesquisas sobre o

sideradas as recentes inovações introduzidas na legislação brasileira.


Examinam-se casos concretos de uso e abuso dos poderes econômico
e político, como já se viu ao analisar a corrupção eleitoral. Em relevo

e, em consequência, no funcionamento correto dos parlamentos.


O título que trata das compras governamentais (cap. VI) destaca
o poder da compra dos governos em geral. Ao analisar as relações entre
o privado (fornecedores de bens, obras e serviços) e o público (União,
Estados, Distrito Federal e municípios) surgem assimetrias e práticas
inadequadas na competição.
Desse imenso potencial — e necessidade — de compras é que
surgem os contratos administrativos. Eles são o instrumento para
concretizar o que o comando legal impõe para o processo de orça-
mentos e de investimentos e gastos públicos com a participação do
setor privado.
Pesquisa-se na doutrina o conceito técnico do contrato adminis-
trativo e dos mecanismos para a sua efetivação. É onde aparecem as
vulnerabilidades — premissas da fraude, da corrupção e do dano ao
erário — do ciclo da contratação pelo Poder Público. Esse ciclo envolve

muitas fases do ciclo de contratação.


Isso permite, como se verá, conhecer os caminhos da corrupção
nos contratos de onde se extrai a necessidade de controle da sua ela-
boração e execução.

se de acordo com lições doutrinárias. Assim, a pesquisa visa conhecer


Salomão RibaS JUnioR
38 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

externos sob aspectos administrativo, legislativo e judicial. Procura-se

nessa parte (cap. VII) dá-se relevo ao controle legislativo e ao


papel de auxílio exercido pelos Tribunais de Contas. As múltiplas funções
dos TCs são pesquisadas com o objetivo de avaliar a sua capacidade de

cadas ao início da presente introdução. Assim, considerando o material


pesquisado — doutrinas, legislações e jurisprudências — deveremos
ter resposta para o que é corrupção.
na mesma linha, ampliando-se o material de pesquisa — casos
concretos e jornalismo investigativo — serão apresentados contornos
de como e onde ela existe.
As questões seguintes — causas e consequências — serão respon-
didas com especial atenção para estudos técnicos nas áreas do Direito
e, sobretudo, a Economia.

buscadas pelo uso dos índices de Percepção da Corrupção (IPC) —


especialmente o da Transparência Internacional (TI) e de outros estudos
técnicos como os da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo.
Vencidas essas questões, passaremos ao exame das possibilidades
de combater a corrupção e eliminá-la. Ou, pelo menos, contê-la. Se isso

a corrupção e o que falta fazer.


CAPíTULO II

CORRUPÇÃO

Corrupção é um termo de uso muito antigo e há referências que

mais presentes no noticiário diário. Dá nome a práticas assemelhadas


e, algumas vezes, a práticas que estão longe de serem iguais e mesmo
assemelhadas.
Diz uma lenda acadêmica que um doutorando de Salamanca

Só parou porque foi advertido por seu orientador, o qual lhe mostrou
que, daquela forma, não concluiria nunca seu trabalho.
Ainda assim, não custa retomar os conceitos em tempos mais
remotos. Isto é importante não só por preciosismo histórico, mas porque
ajuda a compreender porque certas práticas antigas continuam sendo

democráticas consolidadas.
na antiguidade, a ideia de corrupção era vista como manifes-
tação nos corpos físicos, inclusive nos de origem animal. Falava-se de
“corrupção do cadáver”, com o início da putrefação.
mais tarde, com os primeiros pensadores, associou-se esse estágio

humano. Aristóteles (2004), ao escolher as formas de governo boas


ou ideais (monarquia, aristocracia e democracia), contrapôs as outras
formas corrompidas (tirania, oligarquia e demagogia). nestas últimas, o
objetivo do governo não é a satisfação do bem comum, mas o interesse
de um, de um grupo, de poucos.
Há muitos registros na história a respeito da corrupção, sempre
reconhecida como um dano, causando um grande mal. Como se vê no
estudo de Alatas:
Salomão RibaS JUnioR
40 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

Corrupção é reconhecida em muitas culturas como um mal causador


de grande dano, por exemplo:
Hammurabi c 1200 a.C., a Bíblia — Amós 5, 12, Êxodo 23, 8, Isaías 33, 15;

que aceitam subornos devem ser banidos e terem sua propriedade

Cícero no julgamento de Gaius Verres, c 72 a.C., “os homens falsamente


condenados [homens que tenham sido injustamente conde nados]
tinham de negociar com um suborno a sua maneira de execução e
enterro”;
Eleições corruptas na Roma antiga apontando para causas de corrupção
individual (escolha pessoal, desejo), institucional (sem controle,
prestação de contas), situacional (“a única maneira de vencer a eleição”,
ou ganhar um contrato) e, mais genericamente como “ganância humana
e desejo de poder”;
Um edito imperial por Hsiao Ching c 145 a.C., “Qualquer um que
prender ou informar sobre uma pessoa culpada de suborno será dado
a propina recebida pelo acusado”, aonde “Alguns dos funcionários [...]
fazem um negócio de presentes e subornos”.5

Os estudiosos dos Estados modernos alteraram um pouco o


conceito original de corrupção, denominando-a, mesmo em uma forma
ideal de governo, como prática ilícita em benefício de poucos, com
prejuízo para o bem comum.

Essa concisão, contudo, é uma arte difícil de ser construída. Por um


lado, corre-se o risco de pecar pela economia de palavras que a tornam
incompleta e, com isso, imprecisa e pouco abrangente. De outro lado,

sua necessária concisão.

palavra corrupção, chama a atenção para o “denominador comum”


— é um ato que envolve, no mínimo, duas pessoas ou grupos que
corrompem ou são corrompidos. Essa relação implica na transferência
ilícita ou fora das regras de parte do patrimônio público ou coletivo
para o privado ou individual. Em seguida, o autor colaciona algumas
s:

5
ALATAS. Corrupção: a sua natureza, causas e função, p. 90.
CAPíTULO II
CORRUPÇÃO
41

a) a prática do uso do poder do cargo público para a obtenção de ganho

b) é o comportamento de agentes públicos, que foge das normas acei-

c) é o mau uso do poder político para benefícios privados;


d) corrupção governamental é a venda, por parte de funcionários
públicos, de propriedade do governo tendo em vista ganhos pessoais.

Klitgaard quando relata que:

partes individuais tomadas da realidade histórica para compô-la. Assim,

elaborar no decurso da discussão, como seu resultado mais importante,


a melhor formulação conceitual [...]. Assim, se tentamos determinar o
objeto, a análise e a explicação histórica do que estamos tentando obter,

mente, através de uma descrição provisória.7

da corrupção podem-se encontrar, pelo menos, cinco caminhos distintos

Imagina-se que os cultores de uma língua são capazes de sintetizar

legal do termo, o seu conteúdo tem alcance jurídico e é assim que se


tem a ideia da corrupção centrada na lei. O terceiro é apontado pela
Economia quando se tem a ideia da corrupção centrada no mercado e
na separação do público e do privado. O quarto volta-se para a ideia
do bem público a ser protegido em uma perspectiva sociológica. E

profundidade o assunto, tem certa percepção do que seja corrupção.


Assim, alinham-se algumas observações a partir desses caminhos, sem

SILVA. A economia política da corrupção, p. 3.


7
apud KLITGAARD. A corrupção sob controle, p. 40.
Salomão RibaS JUnioR
42 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

ao longo do tempo e em distintas regiões da terra.

2.1 Corrupção nos dicionários


O consagrado dicionário da língua portuguesa de Aurélio
Buarque de Holanda registra a corrupção como sendo “ato ou efeito
de corromper; decomposição; putrefação; devassidão; depravação per-
versão; suborno; peita”.8
Ainda na língua portuguesa e elaborado mais recentemente, o
Dicionário Houaiss da língua portuguesa (2001, p. 848) amplia um pouco
as explicações sobre o sentido e alcance do substantivo corrupção e do
verbo corromper:

corrupção s.f. (1344 cf. IVPm) ato, processo ou efeito de corromper


1 deterioração, decomposição física, orgânica de algo; putrefação
<c. dos alimentos> 2 modificação, adulteração das características
originais de algo <c. de um texto> 3 . depravação de hábitos, costumes
etc.; devassidão 4 ato ou efeito de subornar uma ou mais pessoas em
causa própria ou alheia, ger. com oferecimento de dinheiro; suborno
<usou a c. para aprovar seu projeto em os membros do partido>
5
particular, de meios ilegais para, em benefício próprio, apropriar-se
de informações privilegiadas, ger. acarretando crime de lesa-pátria
<é grande a c. no país> 6 JUR disposição apresentada por funcionário
público de agir em interesse próprio ou de outrem, não cumprindo com
suas funções, prejudicando o andamento do trabalho etc.; prevaricação
* ETIm lat. ‘corrupção’; ver romp-; f.hist. 1344 corrupçon,

de declínio, indecência e suborno * AnT incorrupção; ver tb. antonímia


de declínio e indecência

corromper v. (1255 cf. IVPm) 1 t.d. e pron. tornar(-se) apodrecido


ou estragado (falando de algo concreto); deteriorar-se <a ferrugem
corrompe o ferro> <os alimentos expostos corrompem-se facilmente>
<o ambiente corrompia-se com a falta de ventilação> 2 t.d. e pron.

os jovens> <corrompeu-se na bebida> 3 t.d. tornar diferente do que era


originalmente; adulterar, alterar <a publicação descuidada rompeu
o texto produzido pelo cientista> 4 t.d. subornar (pessoa) em função
de interesse próprio ou de outrem <inescrupuloso, tentou c. o juiz> *

8
FERREIRA. Novo Aurélio século XXI
CAPíTULO II
CORRUPÇÃO
43

ETIm lat. ‘destruir, estragar, corromper,


prejudicar’; ver romp-; f.hist. 1255 coronper, sxIII , sxIV cõrrõper,
sxIV corromper, sxV corromper
aviltar e polui * AnT ver antonímia de aviltar

na língua espanhola tem-se da Real Academia Espanhola


(DICCIOnARIO de la lengua española), onde está anotado que:

corrupción.
(Del lat. ).
1. f. Acción y efecto de corromper.
2. f. Alteración o vicio en un libro o escrito.
3. f. Vicio o abuso introducido en las cosas no materiales. Corrupción de
costumbres, de voces.
4. f. Der. En las organizaciones, especialmente en las públicas, práctica
consistente en la utilización de las funciones y medios de aquellas en
provecho, económico o de otra índole, de sus gestores.

Por sua vez, o renomado dicionário Larousse (1999, p. 400) de-


monstra que:

corrupción
1 Acción y resultado de corromperse una sustancia o materia orgánica:
las altas temperaturas aceleraron la corrupción del cadáver.
2 Alteración, tergiversación: es una corrpción del guión original.
3 abuso, mal uso o exceso: se escandalizaron ante lo que consideraban una
corrupión de las costumbres.
4 Soborno, delito: varios miembros del parlamento fueron sospechosos de
corrupción.
5 Acción de incitar o forzar a una persona a realizar actos contrários a
la moral o a la ley: está acusado de la corrupción de un menor.

naire de I’Académie française (2012):

CORRUPTION n. f. xIIe siècle. Emprunté du latin classique


corruptio, « altération, séduction ». Action de se corrompre, de

1. Le fait de s’altérer, de se décomposer physiquement. La


corruption de la chair. Il y a des terres où les corps se conservent
longtemps à l’abri de la corruption. Spécialt. Le fait de perdre
Salomão RibaS JUnioR
44 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

sa pureté originelle. La corruption des eaux. La corruption de


l’atmosphère dans les grandes villes. Par anal. La corruption de la
langue parlée. La corruption d’un texte. 2. Fig. Avilissement,
dépravation. Dénoncer la corruption des mœurs. La corruption du
cœur. 3. Le fait de détourner une personne de son devoir, de
la soudoyer, de la suborner. User de corruption pour parvenir à ses
DROIT. Corruption active
de fonctionnaire,

propres. Corruption électorale,


La corruption électorale
est punie de la privation des droits civiques. Corruption passive, le
fait de se laisser détourner de son devoir par de l’argent ou tout
autre moyen de subornation.
soupçonné de corruption passive.

pois a expressão serve para designar várias formas de degradação ou


alterações de um estado natural da coisa, do ser, do processo ou mesmo
do equipamento. É o caso da denominada corrupção dos programas
ou bancos de dados dos computadores.

2.2 Ciências sociais e a corrupção

sociais que analisam o tema. num ensaio preparado como introdução


para uma coletânea, Heidenheimer (1970) reúne em três tipos básicos

o desvio de parte de um funcionário público dos deveres formais do

nição que tem servido de base para as análises economicistas sobre


a corrupção. E, terceiro lugar, a de
CAPíTULO II
CORRUPÇÃO
45

público; neste caso, uma prática é considerada como corrupta quando


o interesse comum, pensado como algo que tem existência e pode ser

sobretudo, numa ênfase maior ou menor dada por cada um dos autores
a aspectos do fenômeno que nos outros não estão ausentes mas tem um

por Gibbons (1990). Partindo da idéia de que o conceito de corrupção

Assim, já se viu o conceito nos dicionários e as linhas gerais que,


conforme Heidenheimer (1970), orientam algumas das principais con-
clusões dos doutrinadores em geral.
Há alguns anos, Vito Tanzi (1998) começou a trilhar o caminho
da definição, saindo do latim corrumpere, isto é, uma espécie de
rompimento, de quebra de uma regra legal. Aí se poderia interromper
a busca e saltar prontamente para os códigos penais e os tratados dos
penalistas. Ocorre que o próprio Tanzi segue adiante, apostando que
essa quebra ou rompimento também pode ser de um código de conduta

para o coletivo, normalmente o Estado, e benefícios para um particular


ou grupo de particulares.

mais importante um dos aspectos. não se pode esquecer que se trata


de um fenômeno complexo. Pode ser fruto da ambição desmedida
do agente ou igualmente de defeitos próprios da burocracia e seus

É o que se vê no clássico Dicionário de política, onde os notáveis


pensadores assinalam que:

Assim se designa o fenômeno pelo qual um funcionário público é


levado a agir diverso dos padrões normativos do sistema, favorecendo
interesses particulares em troca de recompensa. Corrupto é, portanto,
o comportamento ilegal de que desempenha um papel na estrutura
estadual.10

9
BEZERRA. Corrupção: um estudo sobre o Poder Público e relações pessoais no Brasil, p. 13.
10
BOBBIO; mATTEUCCI; PASQUInO. Dicionário de política, p. 291.
Salomão RibaS JUnioR
CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

E mais adiante asseveram que:

Podemos distinguir três tipos de corrupção: a prática da peita ou uso da


recompensa escondida para mudar a seu favor o sentir de um funcionário
público; o nepotismo ou concessão de empregos ou contratos públicos
baseados não no mérito, mas nas relações de parentela; o peculato por
desvio ou apropriação e destinação de fundos públicos ao uso privado.11

Sabidamente, o conceito de corrupção varia no tempo e no


espaço. Cada sociedade, no seu próprio tempo histórico, tem o seu
conjunto de regras de conduta nos planos jurídicos, moral e ético. Assim,
em determinados momentos é necessário considerar apenas a vontade
individual, o desejo, as aspirações que levam a pessoa isoladamente a
locupletar-se, por exemplo, dos bens públicos. Há outros momentos

atingindo os mais variados setores de atividades e, até mesmo, toda a


sociedade. É o caso da corrupção endêmica. A sociedade acaba aceitando
como normais certas práticas condenáveis em outra sociedade ou
em outro tempo. Essas práticas ocorrem, especialmente, no campo
político e na burocracia estatal. Bobbio et al. (1991, p. 292) revelam

considerado uma prática social e o suborno, explicitando que:

[...] a corrupção é considerada em termos de legalidade e ilegalidade e


não de moralidade e imoralidade; tem de levar em conta as diferenças
que existem entre praticas sociais e normas legais e a diversidade de
avaliações dos comportamentos que revela no setor privado e no setor
público.

Além dos interessados em se locupletar, há os que na disputa


pelo poder consideram a corrupção como um instrumento. Esse aspecto
instrumental da corrupção é que surge nas relações empresariais
(disputa do mercado) nas relações dos partidos políticos (disputa de
eleições) e nas relações econômicas entre os particulares e o governo.
no Brasil, com um orçamento em 2011 de R$2.073.390.152.400,0012 (dois
trilhões, setenta e três bilhões, trezentos e noventa milhões, cento e
cinquenta e dois mil e quatrocentos reais), o governo é o mais importante

11
Op. cit., p. 292.
12
CAPíTULO II
CORRUPÇÃO
47

comprador de bens e serviços do mercado brasileiro. Especialmente


no setor de obras públicas para infraestrutura há vultosos recursos

para a obtenção de negócios por parte das empresas. De certa forma,


integram os custos do produto comercializado.
Assim, apesar da ampliação da discussão sobre os malefícios da
corrupção nos últimos anos, ainda há quem considere que é um mal
necessário no campo da disputa empresarial e da conhecida lentidão
da burocracia.
São os mesmos autores italianos que assinalam que “em um
sistema jurídico profundamente formalista e burocratizado a corrupção
pode, todavia, contribuir para melhorar o funcionamento do sistema e
para o tornar mais expedito ao desbloquear certas situações”.13

2.3 Corrupção e as leis penais

também provoca variações de sociedade para sociedade no tempo e no

central desta obra, registra-se a perversão ou corrupção de menores,


nesse caso, o autor induz a práticas condenáveis as pessoas menores
de idade. É o que diz o Código Penal Espanhol, ao tratar “de los de-
litos relativos a la prostitución y la corrupción de menores”, em seu
art. 187, dispondo que:

Art. 187. 1. El que induzca, promueva, favorezca o facilite la prostituición


de una persona menor de edad o incapaz, será castigado com las penas
de prisión de uno a cuatro años y multa de doce a veinticuatro meses.
2. Incurrirán en la pena de prisión indicada, en su mitad superior, y
además en la de inhabilitación absoluta de seis a doce años, los que
realicen los hechos prevaliéndose de su condición de autoridad, agente
de ésta o funcionário público.
3. Se impondrán las penas superiores en grado a las previstas en los
apartados anteriores, en sus respectivos casos, cuando el culpable perte-
neciere a una organización o asociación, incluso de carácter transitorio,
que se dedicare a la realización de tales actividades. (CÓDIGO PEnAL
ESPAÑOL, 2005, p. 175)

13
BOBBIO; mATTEUCCI; PASQUInO. Dicionário de política, p. 292.
Salomão RibaS JUnioR
48 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

indicam como conduta criminosa a corrupção de menores.


Assim, no Direito brasileiro, a palavra corrupção, além do signi-
14

do suborno, como será visto adiante.


A corrupção, juridicamente, é uma das espécies de crimes contra a
Administração Pública. Essa abordagem bastante geral requer algumas
anotações. A primeira delas é que além da prática da corrupção, sempre
com o envolvimento de um funcionário público, há uma série de outros
delitos contra a Administração Pública, cujas práticas se confundem.
Assim é que Gómez, em artigo publicado no livro La corrupción
en un mundo globalizado: analisis interdisciplinar, anota que a tutela penal
sobre a corrupção na Administração Pública espanhola chama a atenção
para delitos integrados ao conceito de corrupção pública, como segue:

Tal y como aparecen en la legislación alemana e italiana, y a diferencia


de lo que ocurre en la legislación portuguesa, el Código Penal español
regula en un mismo título los delitos contra la Administración Pública.
El catálago comprendido en el art. 18 ter del Estatuto Orgánico del

concretamente en los apartados b) y h), recoge como delitos que pueden


entenderse como integrados en el concepto de corrupción pública los
siguintes:
a) Delitos de prevaricación.
b) Delitos de abuso o uso indebido de información privilegiada.
c) Delitos de cohecho.

e) malversación de caudales públicos.


f) Fraudes y exacciones ilegales.
g) negociación prohibida a los funcionarios.15

14
perversão s.f 1 ato ou efeito de perverter(-se) 2 condição de
corrupto, de devasso 3 mudança do estado normal <p. da audição> 4 PSICOP obsl.
termo que designa desvios do comportamento e das práticas sexuais normais ou assim
consideradas * ETIm ‘transposição ou inversão (da construção no estilo);

indecência * AnT ver antonímia de indecência (HOUAISS; VILLAR. Dicionário Houaiss da


língua portuguesa, p. 2198).
15
GÓmEZ. Aspectos penales de la corrupción en la administrción pública. In: GARCíA;
CAPARRÓS (Coord.). La corrupción en un mundo globalizado: análisis interdisciplinar,
p. 194.
CAPíTULO II
CORRUPÇÃO
49

Aponta ainda que os avanços doutrinários e a elevação a prin-


cípios e normas constitucionais de regras antes restritas ao direito

O que se protege é a correta administração da máquina burocrática, por


meio da qual o Estado opera na satisfação do interesse geral.
nesse sentido:

En la actualidad, se ha superado ya la vieja idea de aglutinar en


torno a estos delitos cometidos por funcionarios la infracción o el
incumplimiento de los deberes de su cargo y sustituirla por las nuevas
exigências derivadas del texto constitucional, exigências de impar-

nuevos bienes jurídicos necesitados de protección. El título de — Delitos

a todos los tipos comprendidos en este Título el correcto desempeño


de la función pública, comprensiva de la actividad administrativa,
judicial y legislativa.

no caso do Código Penal brasileiro, também se devem anotar


infrações que não se confundem diretamente, sob o aspecto jurídico,
mas não deixam de ter uma relação indireta. É o que revela a leitura
da lei penal e da própria doutrina.
Assim, no caso do peculato pode-se ter o fenômeno da corrupção
como motivação do funcionário para usar bens (públicos ou privados

ou alteração não autorizada de sistema de informações (art. 313-B) é


tipo recente de crime e considera-se mais grave se do procedimento
ilícito resultar dano, seja para a Administração Pública, seja para o
administrado. O mesmo se pode dizer da sonegação ou destruição de

no Brasil são muito comuns os desvios de verbas ou outras


rendas públicas sem ser necessariamente embolsadas por particulares,
porém, aplicadas fora do que dispõe a lei (art. 315).
A maior confusão, contudo, é quando se trata da concussão. na
corrupção típica tem-se o passo inicial na oferta, o que em si já é crime
de corrupção ativa. Em seguida, o tipo penal se completa pela aceitação
do dinheiro ou vantagem pelo funcionário público. na concussão
tem-se apenas a inversão da iniciativa. É o funcionário que exige uma

GÓmEZ. Aspectos penales de la corrupción en la administrción pública. In: GARCíA;


CAPARRÓS (Coord.). La corrupción en un mundo globalizado: análisis interdisciplinar,
p. 194.
Salomão RibaS JUnioR
50 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

17
vantagem ilícita qualquer a um in que

acompanhadas de pagamento ou concessão de vantagem a funcionário


público. O que é penalmente corrupção (art. 312).
São exemplos de outros delitos que confundem: (i) inserção de

mesmo tipo de sistemas; (iii) extravios, sonegação, inutilização de livro


ou documento público; (iv) prevaricação; (v) advocacia administrativa;

outras.

como é do seu dever e função — e sintetizar as informações, contribui

Assim é que merecem destaque alguns dos crimes que envolvem


funcionários públicos, pois implicam em mau uso do dinheiro público
e não são necessariamente atos de corrupção. Os seus autores, contudo,
são chamados de corruptos ou corruptores e os atos praticados como

caso de má gestão, mas caracterizado como infração penal. Diz o art. 315

estabelecida em lei; Pena — detenção, de um a três meses, ou multa”.


na prática da execução dos orçamentos públicos são muito
comuns atos dessa natureza, que dependendo do montante e da

da advocacia administrativa que é o patrocínio de interesse privado


perante a Administração Pública, valendo-se o autor da qualidade de
funcionário público. Igualmente, a violação do sigilo de proposta de

meses a um ano e multa. Registre-se que a corrupção é o fato mais

novembro de 2003). Acrescenta-se que a pena é aumentada de um terço


se o funcionário retarda ou deixa de praticar ato de ofício ou o pratica
infringindo dever funcional.18

17

ou antes, de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida: Pena - reclusão, de dois a
oito anos, e multa (BRASIL, 2012c).
18
Art. 317. Solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que
fora da função, ou antes, de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida, ou aceitar
promessa de tal vantagem: Pena - reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa.
CAPíTULO II
CORRUPÇÃO
51

Além desses aspectos, confundem-se, também, com atos de


corrupção ativa ou passiva e algumas fraudes em que a população se
divide entre os que consideram costume e os que julgam tratar-se de
corrupção. É o caso da tradicional “cola” em concursos de ingresso no
serviço público ou dos exames vestibulares ou de avaliação escolar.

19
Está claro que não se está

memória. A velha cola é coisa folclórica diante de fraudes nos concursos


da atualidade. Há vultosos recursos ilícitos nessas operações.
Estão na mesma linha dos crimes contra o erário o contrabando,
ou o descaminho, bem como a sua facilitação. nesse caso, pode ou não
haver corrupção para o caso de pagamento de suborno ou propina
por essa facilitação — tornar mais fácil, não haver empecilhos — do
funcionário público.
São todas hipóteses de infração que devem ser consideradas
quando se fala de corrupção como sendo “o abuso do poder público

art. 319 do Código Penal (BRASIL, 2012c) como sendo a ação de “retar-
dar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício, ou praticá-lo
contra disposição expressa de lei, para satisfazer interesse ou sentimento
pessoal”, caso muito comum quando se trata de atender ilegalmente
interesse de empreiteiras ou outros fornecedores do Estado.

funcionário retarda ou deixa de praticar qualquer ato de ofício ou o pratica infringindo


dever funcional.

a um ano, ou multa (BRASIL, 2012c).


19

ou de comprometer a credibilidade do certame, conteúdo sigiloso de:


I - concurso público;
II - avaliação ou exame públicos;
III - processo seletivo para ingresso no ensino superior; ou
IV - exame ou processo seletivo previstos em lei:
Pena - reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.

(BRASIL, 2012c).
Salomão RibaS JUnioR
52 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

no âmbito das relações de trabalho pode-se ter a condescendência


criminosa, a violência arbitrária, o abandono ou exercício ilegal de

implicações na corrupção política e administrativa (categorias mais

de proposta feita pelo próprio funcionário público ou por ele facilitada


a terceiro. Essa previsão original do Código Penal não se aplica pela
existência de outra previsão de tipo especial de delito, no caso a regra

2012d), a qual positiva que “devassar o sigilo de proposta apresentada


em procedimento licitatório, ou proporcionar a terceiro o ensejo de
devassá-lo: Pena - detenção, de 2 (dois) a 3 (três) anos, e multa”.
Até aqui se tem as hipóteses de infrações e crimes praticados
por funcionário público,20 porém, ainda se está no campo da corrupção
pública e de suas variáveis. Dessa forma, apesar da diversidade de tipos
penais, todos tendem a serem vistos pela opinião pública e, mesmo pela
“mídia”, como atos de corrupção. Há, ainda, no mesmo documento

Pública, os praticados por particular contra a Administração em geral.

ativa; contrabando ou descaminho; impedimento, perturbação ou


fraude de concorrência; inutilização de edital ou de sinal; e subtração
ou inutilização de livro ou documento. Em 14 de julho de 2000, a Lei

crimes contra a Administração Pública.

2.3.1 O direito penal internacional


E ainda hoje, apesar das sucessivas recomendações da Organi-
zación para la Cooperación y el Desarrollo Económicos (OCDE) e da
Convenção de mérida das nações Unidas, há ainda que se considerar,

20
Art. 327. Considera-se funcionário público, para os efeitos penais, quem, embora transito-
riamente ou sem remuneração, exerce cargo, emprego ou função pública.

paraestatal, e quem trabalha para empresa prestadora de serviço contratada ou conveniada


para a execução de atividade típica da Administração Pública.

Capítulo forem ocupantes de cargos em comissão ou de função de direção ou assessora-


mento de órgão da administração direta, sociedade de economia mista, empresa pública
ou fundação instituída pelo poder público (BRASIL, 2012c).
CAPíTULO II
CORRUPÇÃO
53

nas relações entre empresas e o governo — ou mesmo na competição


das empresas entre si — que os gastos com subornos são despesas
operacionais dedutíveis na apuração dos resultados econômicos ou

em muitos países do denominado primeiro mundo, como normais e


mesmo necessárias no comércio internacional.
Só muito recentemente os EUA (1977) editaram o Foreign Corrupt
Practices Act (FCPA), vedando a prática e criminalizando o suborno
pago a estrangeiro para facilitar negócios de empresas localizadas em
solo americano e, de acordo com Caparrós (2000, p. 235), essa iniciativa
manteve-se solitária durante muitos anos:

Excepción hecha de la Foreign Corrpt Practices Act norteamericana de


1977, pocos se habían preocupado hasta hace muy pocos anos por otogar
21
Desde el punto
de vista jurídico, los ordenamientos nacionales penalizaban la corrupción
en la medida en que poco importaba el carácter internacional del
suborno; lo único relevante es que el funcionario afectado perteneciera
al propio Estado, pues sólo de este modo que daba afectado el interés
jurídico que daba contenido al delito.

Dessa maneira, somente em 17 de dezembro de 1997, a OCDE,


em reunião realizada em Paris, decidiria aprovar a Convenção sobre
o Combate da Corrupção de Agentes Públicos Estrangeiros nas Tran-
sações Comerciais Internacionais, em que os seus membros, em um
primeiro momento, e em seguida, todos os demais países, deveriam
vedar a prática contábil referida e mesmo criminalizar esse tipo de
comportamento nos negócios internacionais.
Considerando a referida tendência dos especialistas em dar mais
ênfase a aspecto ou aspectos da corrupção, de acordo com a sua área
de especialização, pode-se dizer que há abordagens de acordo com o
Direito, com a Economia ou mesmo com a Sociologia.

corrupção, García e Caparrós realçam a importância que o tema assumiu


nos últimos tempos:

21
Según un estudio publicado por la OCDE en mayo de 1977, amén de la Foreign Corrupt

legislación entonces vigente en ciertos Estados — Canadá, Corea del Sur, Grecia, Hungría,
méxico, nueva Zelandia, Reino Unido, Suecia, Turquia — podría servir para castigar,
siquiera parcialmente, la corrupción de funcionarios extranjeros, SALAZAR, Lorenzo:

italiana), Cassazione Penale, vol. xxxVIII (mayo 1998), p. 1529 (n. 1) y 1535 (24).
Salomão RibaS JUnioR
54 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

El análisis de la corrupción es un tema de moda, si nos atenemos a la


abundancia de libros, noticias periodísticas, páginas web, etc., dedi-
cados a poner de relieve a diario este fenómeno que se ha extendido
por todo el mundo, tanto en países industrializados — Estados Unidos,
Japón, Autralia, Francia, Italia, España — como en los que se encuentran
en fase de desarrollo económico, social y político — v.gr., los países
latinoamericanos —. Sin embargo, no nos podemos quedar ahí, en su
dimensión externa (sobornos, cobro de comisiones, favores, enrique-

más atractiva para el gran público, sino que debemos analizar los males
más graves y profundos que lo generan y retroalimentan, y las posibles
alternativas en cuanto a su erradicación. (GARCIA; CAPARRÓS, 2000,
p. 73)

Em seguida, lembram os autores que quando falham todos os


controles sociais para enfrentar abusos:

[...] no queda más remedio que acudir a la presecución y represión


penal de tales comportamientos. De esta forma, como há señalado
AUGER LInÁn, el control judicial tiene que desempeñar un papel
fundamental como sustituto o alternativa del administrativo, en el que
los magistrados representan un poder difuso en el territorio, controlable
institucionalmente por el Ejecutivo. (CAPARRÓS, 2000, p. 73)

Assim, antes de tratar das avaliações dos economistas, dos

âmbito penal. na lei penal, o crime de corrupção se reveste de duas


formas, dependendo do agente da iniciativa. Para o agente corruptor
tem-se a corrupção ativa, para o agente (servidor público) que se deixa
corromper, tem-se a corrupção passiva (Código Penal, arts. 317 e 333).

2.4 Corrupção na perspectiva internacional


Com base nos termos da Convenção da OCDE (Paris, 17.12.1997)
e na Convenção das nações Unidas Contra a Corrupção (mérida,

em transação comercial internacional. Como se viu alhures, o suborno


de funcionário não era delito em se tratando de estrangeiro. O Brasil
acolheu formalmente a Convenção de Paris — que entrara em vigor
em 15.02.1999 — por meio de decisão do Congresso nacional (Decreto
CAPíTULO II
CORRUPÇÃO
55

vigorar no País as regras da Convenção em 23.10.2000, o que tornou

do Código Penal, criminalizando a promessa, a oferta ou a doação de


vantagem indevida a funcionário estrangeiro, para obter a prática ou

transação comercial internacional. A pena de reclusão de um a oito anos


é aumentada se o ato for de ofício ou praticado infringindo dever fun-
cional. na mesma linha e pelos mesmos compromissos internacionais

realizado no próprio País. É uma forma de corrupção em sentido


amplo, bastante comum no âmbito político e burocrático. Trata-se de

ato praticado por funcionário público estrangeiro. Agrava-se a pena


se o infrator alega ou insinua que a vantagem é também destinada a
funcionário público estrangeiro. A operação das aduanas, dos portos e
aeroportos é alvo comum na tentativa ou prática desse tipo de delito.

confundir com as próprias do direito constitucional e administrativo


(Código Penal, art. 337-D).

legislação alemã quanto na italiana são regulados, no mesmo Título,


os delitos contra a Administração Pública (Título xI, Código Penal
Brasileiro). Isso leva a um possível entendimento de que estão todos
integrados ao conceito comum de corrupção pública.

2.4.1 Cooperação internacional para combater a corrupção

e sociais esteve fora da agenda internacional até recentemente. não


parecia haver interesse por um assunto que poderia ter alguns efeitos
negativos localizados, mas sem afetar as sociedades e as relações
internacionais. Entidades como o Fundo monetário Internacional (FmI)
e o Banco Internacional para Reconstrução e Desenvolvimento (BIRD)
não demonstravam preocupações com o fenômeno. O crescimento da
corrupção em cada país visto isoladamente e o fenômeno da globalização
Salomão RibaS JUnioR
CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

provocaram os primeiros estudos desses organismos de cooperação


internacional sobre a corrupção. Começaram a ser examinadas relações
de causa e efeito diante do fenômeno e do desenvolvimento econômico.
no mundo acadêmico, com algumas honrosas exceções, como
é o caso de Klitgaard (1994), mauro (1995) e Rose-Ackerman (2001),
também não se notava maior interesse. Da década de 1980 para os dias
atuais é que os estudos começaram a aumentar.
Curiosamente, as primeiras ações de cooperação tinham por
objetivo a corrupção e os seus efeitos no setor privado.

partisse dos Estados e instituições públicas a iniciativa de atuação inter-


nacional coordenada, nessa área. Porém, os primeiros movimentos no

patrimônio privado em prol dos interesses de empresas atuantes no


comércio internacional, como demonstram os estudos, na década de 70,
da Securities and Enchange Commission, dos Estados Unidos da
América, relativos a subornos pagos a funcionários públicos estrangeiros
por empresas norte-americanas para obtenção de vantagem competitiva
sobre as empresas rivais. A preocupação inicial era com prática de
concorrência desleal no âmbito do comércio exterior. A corrupção de
funcionários estrangeiros permitia a outorga de vantagens a algumas
empresas americanas, o que entendido como concorrência desleal, cujo

desses funcionários estrangeiros. (GARCIA, 2008, p. 271)

Bem antes da Convenção da Organização das nações Unidas


(OnU) contra a corrupção começaram a surgir algumas tentativas
de cooperação regional. É o que reconhece a OnU no preâmbulo do
citado documento.

Recordando o trabalho realizado por outras organizações internacionais


e regionais nesta esfera, incluídas as atividades do Conselho de
Cooperação Aduaneira (também denominado Organização mundial
de Aduanas), o Conselho Europeu, a Liga dos Estados Árabes, a
Organização de Cooperação e Desenvolvimento Econômicos, a Orga-
nização dos Estados Americanos, a União Africana e a União Européia;
Tomando nota com reconhecimento dos instrumentos multilaterais
encaminhados para prevenir e combater a corrupção, incluídos, entre
outros, a Convenção Interamericana contra a Corrupção, aprovada

oC
CAPíTULO II
CORRUPÇÃO
57

envolvidos funcionários das Comunidades Européias e dos Estados


Partes da União Européia, aprovado pelo Conselho da União Européia

dos funcionários públicos estrangeiros nas transações comerciais


internacionais, aprovado pelo Comitê de ministros do Conselho
Europeu em 27 de janeiro de 1999, o Convênio de direito civil sobre a
corrupção, aprovado pelo Comitê de ministros do Conselho Europeu em
4 de novembro de 1999 e a Convenção da União Africana para prevenir
e combater a corrupção, aprovada pelos Chefes de Estado e Governo
da União Africana em 12 de julho de 2003;
Acolhendo com satisfação a entrada em vigor, em 29 de setembro de
2003, da Convenção das nações Unidas contra o Crime Organizado
Internacional [...]. (OnU, 2012b)

Essas convenções regionais, mesmo não produzindo impacto


sobre o comportamento dos agentes públicos e privados dos países
ricos, foram de grande importância para que o fenômeno passasse a
ser visto com mais atenção, especialmente pelos mecanismos de acom-
panhamento de sua implementação pelos países signatários.

2.4.2 Organização dos Estados Americanos (OEA)


na América Latina, datam de 1990 os primeiros estudos siste-
matizados sobre a corrupção com suas causas, consequências e formas
de combatê-las. Depois de sucessivas discussões e declarações no
âmbito de um Grupo de Trabalho sobre Probidade e Ética Pública
foram surgindo os contornos da Convenção Interamericana Contra a
Corrupção. no seu conteúdo atual, o documento da Organização dos
Estados Americanos (OEA) trata da corrupção sobre múltiplas pers-

cada estudo ou documento, a OEA trata da corrupção sob as formas


passiva e ativa, tanto no setor público quanto no privado. Assim, são
atos de corrupção:

a) El requerimiento o la aceptación, directa o indirectamente, por un


funcionario público o una persona que ejerza funciones públicas, de

favores, promesas o ventajas para sí mismo o para otra persona o entidad


a cambio de la realización u omisión de cualquier acto en el ejercicio de
sus funciones públicas;
b) El ofrecimiento o el otorgamiento, directa o indirectamente, a un
funcionario público o a una persona que ejerza funciones públicas, de
Salomão RibaS JUnioR
58 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

favores, promesas o ventajas para ese funcionario público o para otra


persona o entidad a cambio de la realización u omisión de cualquier
acto en el ejercicio de sus funciones públicas;
c) La realización por parte de un funcionario público o una persona
que ejerza funciones públicas de cualquier acto u omisión en el ejercicio

mismo o para un tercero;


d) El aprovechamiento doloso u ocultación de bienes provenientes de

e) La participación como autor, co-autor, instigador, cómplice, encu-


bridor o en cualquier otra forma en la comisión, tentativa de comisión,
asociación o confabulación para la comisión de cualquiera de los actos

A mesma Convenção tratou do suborno internacional, assunto


já resolvido pelo Brasil no plano interno, por meio dos arts. 337-B

Público Estrangeiro), todos do Código Penal. Contudo, as mudanças

penal, ainda estão em discussão no Congresso nacional brasileiro, assim

Essa “Convenção Internacional Contra a Corrupção”, aprovada

de 2002 do Congresso nacional, entrou em vigor em 24 de agosto de

de 2002. O pioneirismo desse documento é reconhecido.

O artigo II esclarece quais são os seus propósitos, deixando delineado,


desde logo, o espectro de sua abrangência: promover e fortalecer, o
desenvolvimento dos mecanismos necessários para prevenir, detectar,
punir e erradicar a corrupção, em cada um dos Estados Partes e pro-

detectar, punir e erradicar a corrupção no exercício das funções

uma série de medidas preventivas, cuja criação ou aperfeiçoamento

declarados, valendo ser transcrito o artigo III, pela importância das


medidas nele arroladas: [...]. (GARCIA, 2008, p. 277)
CAPíTULO II
CORRUPÇÃO
59

O texto da Constituição da OEA, a exemplo de outros docu-


mentos internacionais, estabelece mecanismos de monitoramento
da implementação das medidas referentes aos itens escolhidos. na
primeira rodada estavam listados:
a) progresso na implementação da Convenção;
b) estrutura jurídica e outras medidas concretas;
c) adequação a estrutura jurídica e outras medidas; e

Da avaliação surgiram recomendações que Garcia ressalta:

Interessante notar a grande ênfase que foi dada, naquelas recomenda-

de incentivar o Brasil a continuar a fortalecer os órgãos de controle


superior como o ministério Público, a Política Judiciária, os Tribunais de
Contas, a Comissão de Ética Pública, as Controladorias e Corregedorias,
objetivando assegurar que tal controle seja efetivo, dar-lhes maior apoio,
bem como recursos necessários para o desempenho de suas funções e
fortalecer os mecanismos que permitem a coordenação institucional de
suas funções e fortalecer os mecanismos que permitem a coordenação
institucional de suas atividades, a sua constante avaliação e supervisão,

a consulta dos setores interessados em relação ao desenho de políticas


públicas e a elaboração de projetos de lei, decretos ou resoluções nos
diferentes órgãos do Estado, fortalecer e estimular a participação da
sociedade civil e de organizações não-governamentais na gestão pública,
especificamente nos esforços para prevenir a corrupção, criando,
inclusive, condições pra tanto, divulgando os mecanismos existentes, e

meios eletrônicos. (GARCIA, 2008, p. 280)

Duas medidas legislativas importantes para a transparência das


contas públicas e melhoria do controle social são: (i) a Lei Complementar

Uma e outra obrigam a Administração Pública, em todos os níveis,

orçamentos e gastos em geral. E essa publicidade deve se dar pelo uso


intensivo dos meios eletrônicos.
Salomão RibaS JUnioR
CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

2.4.3 União Europeia e a corrupção


na Europa, quase nas mesmas datas, o Conselho Europeu
(CE), composto de mais de quatro dezenas de países, criou um Grupo
multidisciplinar sobre corrupção. Do trabalho desse grupo surgiram
vinte princípios para a luta contra a corrupção. Esses princípios abran-
gem várias formas de se combater as práticas corruptas pela adoção

adotar mecanismos de transparência e accountability.22 Também são


importantes o livre trânsito das informações e a liberdade de imprensa.
mais tarde, a partir de 1998 em diante, esses compromissos
passaram a constar de duas Convenções: (ii) a de Legislação Criminal; e

de acompanhamento das adesões formais e medidas concretas no âm-


bito de cada país signatário foram adotados com a criação do Grupo
dos Estados contra Corrupção (GRECO). Há semelhanças entre as
metodologias seguidas pela OEA e o CE buscando uma conceituação
comum e medidas preventivas, de controle e de sanção nas legislações
próprias de cada País.
O essencial é o reconhecimento da importância do apoio recí-
proco entre os Estados, para construir mecanismos de prevenção e de

2.4.4 OCDE e as recomendações aos setores público e


privado
A Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico
tem como objetivo coordenar políticas econômicas e sociais, apoiar o
crescimento econômico sustentado, aumentar o emprego e a qualidade
de vida, dentre outros. Atualmente, a OCDE é formada por 34 Países-
membros, sendo que:

Recentemente (2010), quatro novos países tornaram-se membros da


OCDE, a saber: Chile, Eslovênia, Estônia e Israel. Houve distinção no
período decorrido por cada um, desde o pedido de adesão até a efe-
tivação entre estes países. O marco inicial se deu em maio de 2007, por
ocasião da Reunião do Conselho em âmbito ministerial. nela, entre
outras ações, a Organização iniciou a negociação para adesão dos

22
Accountability
sentativo de prestar contas a instâncias controladoras ou a seus representados; respon-
sabilização (tradução livre).
CAPíTULO II
CORRUPÇÃO

referidos países e da Federação Russa e, ainda, decidiram reforçar a


cooperação com Brasil, índia, Indonésia e África do Sul por meio do
programa de ‘engajamento ampliado’ vislumbrando a possibilidade
de adesão futura (PEREIRA, 2011, p. 32).

Foreign
Corrupt Practices Act
esforços para que todos os países adotassem os princípios da lei

a Convenção contra a Corrupção subscrita pelos Países-membros, a


qual entrou em vigor em 1999. Essa “Convenção sobre o Combate
da Corrupção de Funcionários Públicos Estrangeiros em Transações
Comerciais Internacionais”, elaboradas pela OCDE, teve a adesão
do Brasil, aprovada pelo Congresso nacional em 14 de junho de

que introduziu no Código Penal os crimes de suborno de funcionário


estrangeiros em transações internacionais (arts. 337-B, 337-C e 337-D).
Os aspectos mais importantes desse instrumento da OCDE
são: (i) a corrupção é vista de maneira mais atenta e severa do lado
dos que corrompem (corrupção ativa); e (ii) passa a ser considerada
formalmente como problema de todos os países de qualquer estágio
de desenvolvimento econômico. O Brasil é signatário dessa Convenção
e em razão dessa adesão alterou sua legislação penal na parte relativa

é sabido até então, o pagamento de suborno no estrangeiro poderia


ser contabilizado como despesa operacional no país-sede da empresa
corruptora. E não era, obviamente, crime. Essa convenção decide
recomendar aos países mais desenvolvidos que criminalizem a prática
(com sanções severas) e impeçam o procedimento contábil referido.
É oportuno registrar que falta ao Brasil criminalizar as empresas
privadas, como recomenda a OCDE, assunto que está em tramitação
no Congresso nacional.
neste ponto, pode-se acrescentar que o fenômeno econômico
da globalização impôs a cooperação internacional para combater a
globalização das práticas corruptas.

Pode-se ainda dizer que:

A globalização, entendida como movimento econômico da sociedade


contemporânea, “propiciou ao capital internacional maior facilidade para
Salomão RibaS JUnioR
CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

movimentar seus valores”, como informa Silley, todavia, a velocidade


da economia não é acompanhada pela dinâmica do controle estatal.

pluralidade de atores, que se explicam pela atribuição progressiva de

e supranacionais na elaboração e controle das normas internacionais [...].


(BATISTA; OLIVEIRA, 2011, p. 242)

De resto, a internacionalização do Direito é uma realidade. Isso


se dá especialmente no campo dos direitos e garantias coletivos e in-

econômicos acompanham a internalização dos negócios em geral. E


nesse passo, tendo em vista que a corrupção é fenômeno mundial, é
importante a proposta de cooperação internacional no combate e de

2.4.5 A Convenção da OnU


Em diversas outras regiões, além das abrangidas pela OEA e pela
Europa, surgiram estudos que resultaram em documentos de coope-
ração internacional para enfrentar a corrupção.
Com os avanços e recuos dos programas regionais e algumas
medidas da OnU, chegou-se a um cenário exigente de solução mais

internacional como BIRD, BID e FmI, entre outros. Descobriram-se os


malefícios mais acentuados da corrupção e do desperdício e práticas
corruptas até no manejo de programas e projetos dos próprios órgãos

É quando a OnU reconhece a gravidade dos problemas e até


as sérias ameaças decorrentes da corrupção. É assim que surge pri-
meiro a Convenção das nações Unidas contra o Crime Organizado
Internacional (29.09.2003) e, logo em seguida, a Convenção das nações
Unidas Contra a Corrupção (09.12.2003), apresentada e acolhida pelos
países presentes na histórica reunião de mérida (méxico). O preâmbulo
desse documento enfatiza:

Os Estados Partes da presente convenção, preocupados com a gravidade


dos problemas e com as ameaças decorrentes da corrupção, para a
estabilidade e a segurança das sociedades, ao enfraquecer as instituições
e os valores da democracia, da ética e da justiça e ao comprometer o
desenvolvimento sustentável e o Estado de Direito;
CAPíTULO II
CORRUPÇÃO

Preocupados, também, pelos vínculos entre a corrupção e outras formas

nômica, incluindo a lavagem de dinheiro;


Preocupados, ainda, pelos casos de corrupção que penetram diversos
setores da sociedade, os quais podem comprometer uma proporção
importante dos recursos dos Estados e que ameaçam a estabilidade
política e o desenvolvimento sustentável dos mesmos [...]. (OnU, 2012b)

Em seguida é reconhecido que o problema da corrupção deixou


de ser um problema local para “converter-se em um fenômeno transna-
cional que afeta todas as sociedades e economias”, o que exige “a
necessária cooperação internacional para preveni-la e lutar contra ela”.
De fato, aquele US$1 trilhão de dólares em dinheiro sujo, a que se referiu
Rose-Ackerman (2001), provoca a pobreza dos países e a insegurança

sem fronteiras e sem limites. Só podem ser enfrentados por intermédio


de cooperação internacional.
Essa cooperação deve ir além das declarações formais de repúdio
a essas práticas. Exige o fortalecimento das instituições, atualização
das leis, troca de experiências e disposição para estarem “decididos

internacionais de ativos adquiridos ilicitamente e fortalecer a cooperação


internacional para a recuperação destes ativos”. (OnU, 2012b)
Dessa maneira, a Convenção das nações Unidas Contra a Cor-

a) Promover e fortalecer as medidas para prevenir e combater mais

cooperação internacional e a assistência técnica na prevenção e na luta


contra a corrupção, incluída a recuperação de ativos; c) promover a
integridade, a obrigação de render contas e devida gestão dos assuntos
e dos bens públicos. (OnU, 2012b)

a Convenção da OnU aprofunda a ação dos mecanismos para essa

corruptores, cooperação no cumprimento da lei, investigações conjuntas


e técnicas especializadas de investigação. Outro aspecto que mereceu
atenção especial em mérida foi a recuperação de ativos com medidas
para a recuperação direta de bens, assistência técnica e celebração de
acordos bilaterais.
Salomão RibaS JUnioR
CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

Para essa Convenção, que é extensa e detalhada, foram criados


três grupos de trabalho (OnU, 2012b):
a) mecanismo de avaliação da implementação da Convenção;
b) recuperação de ativos; e
c) assistência técnica.
O Brasil esteve presente na reunião de mérida (méxico) em 2003.
O Congresso nacional aprovou a Convenção da OnU pelo Decreto

muitas medidas recomendadas pela OnU no plano interno

Convenção da OnU e na da OCDE.


O Brasil é signatário de vários outros instrumentos internacio-

(ii) melhorar a legislação; (iii) modernizar a atualizar os órgãos e

pessoas nessa luta; e (v) fazer operar adequadamente o controle social.

2.5 A economia e a corrupção


A economia é estudada por várias disciplinas, mas essencial-
mente pelas ciências econômicas. Estas estudam a produção e a
distribuição de bens e serviços entre os indivíduos e entre os países
ou sociedades espalhadas pelo mundo. É sob esse prisma que ela exa-
mina os fenômenos que envolvem produção e consumo. Com esses

ou de conteúdo e sentido econômico. Tanzi (1998) é quem coloca a busca

que, assim como um elefante, a corrupção é difícil de descrever, mas é


prontamente reconhecida quando se encontra.
Ao examinar o fenômeno, a economia que se pretende neutra na

como instrumental. Dessa forma, teria um papel, ainda que importante,


de caráter descritivo da corrupção.

rência de renda ilegal, ilegítima ou resultante de quebra das regras do


mercado, cuide-se de examinar suas causas, dimensão e consequências.
CAPíTULO II
CORRUPÇÃO

A complexidade da matéria indica muitas causas e os economistas

dessas causas. Para tanto, usam formas e metodologias próprias da


economia, como se verá adiante.

corrupção. Sob esse ângulo, deve-se anotar que a economia olha os fenô-
menos econômicos em geral sob a ótica macroeconômica e sob a ótica
microeconômica. no primeiro caso, observa-se a economia regional ou
nacional como um todo. Há de se lembrar de que os estudos sob essa

com Adam Smith em A riqueza das nações

A obra pioneira sobre macroeconomia é a Teoria geral do emprego, do juro


e da moeda
É por esse caminho que se estudam os sistemas econômicos
e a operação das economias nacionais e a internacional. E, ainda,
encontram-se as teorias de mercado e os conceitos básicos (produto,
renda, poupanças, investimento e assim por diante). Daí decorre o
modelo econômico para descrever o funcionamento da economia,
a dinâmica das quantidades agregadas e o desenvolvimento econô-
mico. São nesses estudos que se encontram a presença importante da
corrupção. Trata-se de saber se ela é consequência do modelo e de que
modo afeta o desenvolvimento econômico.
A corrupção (ruptura de regras) é nociva ou pode gerar bene-

desenvolvimento econômico? Há vários estudos e algumas conclusões

nociva), outras para a segunda (pode gerar benefícios). De qualquer


maneira, esse é um aspecto a ser analisado no estudo das consequências
da corrupção.

2.5.1 Causas econômicas da corrupção


O cenário propício para a prática da corrupção — transferência
ilícita de renda do patrimônio público para o privado — apresenta
algumas variáveis que se repetem. Essa repetição de variáveis (tidas
economicamente como causas) e os atos de corrupção, que igualmente
se reproduzem em razão de sua presença é o que permite o estudo
sistemático do fenômeno. Em termos macroeconômicos essas variáveis
são as seguintes:
Salomão RibaS JUnioR
CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

- falta de transparência nos negócios públicos e privados;


- alto poder discricionário nas mãos de poucos e exclusivos dos
funcionários públicos;
- excessiva regulação por parte do Estado;
- economia com preços administrados pelo Poder Público;
- monopólio na concessão de licenças, permissões e autorizações
para o exercício de atividades privadas; e

(1994), mauro (1995), Tanzi (1998) e Rose-Ackerman (2001)


adiante).
Para encontrar causas, dimensões e consequências, os economis-
tas valem-se basicamente de quatro teorias: (i) da ; (ii) teoria
das agências; (iii) teoria dos jogos; e (iv) uso da Proxy.

contexto institucional onde os esforços para maximizar ganhos geram


desperdício social, ao invés de um excedente social” (BUCHAnAn,
1980 apud
como “custos implícitos ou

em muitos casos, pelo provimento, por parte do governo, de direitos de


monopolistas através do suborno e de lobby do governo” (mCnUTT,
apud
A teoria da agência estuda o comportamento do principal e dos
agentes. na visão ampla da organização do Estado, o principal seria o
cidadão ou o conjunto deles (o povo).
Os agentes seriam os burocratas e os políticos no exercício

corrupção, o principal é o dono ou o sócio da empresa e os agentes seus


procuradores, dirigentes ou empregados em geral. Sempre presente

a soberania popular e da atuação delegada aos agentes públicos.


no setor privado tem-se a separação entre propriedade, controle e
gerenciamento. Firma-se um contrato de delegação de encargos entre
o principal e o agente.
Já a conhecida teoria dos jogos estuda os fenômenos pela interação
necessária entre pessoas para chegar a determinados resultados. Uma
decisão não depende apenas de quem a toma, mas de outras decisões
tomadas por outros atores em um dado ambiente estratégico.

prejuízos ao erário é que atuam os controles de variada ordem.


CAPíTULO II
CORRUPÇÃO

Tem-se que a

Já a Proxy é um recurso metodológico dos estudos econômicos


para resolver vazios nessa área. Assim, se não há possibilidade de uso
de determinada variável, busca-se outra (proxy) para atingir o mesmo

a qualidade do custo de material empregado na construção de uma


rodovia, busca-se avaliar o tempo de vida útil desse mesmo pavimento
(o que é uma variável proxy).
no setor privado, há poucos anos, surgiu e ganhou dimensão
a governança corporativa. Em linhas gerais é o “conjunto de práticas
adotadas na gestão de uma empresa que afetam as relações entre
acionistas (majoritários e minoritários), diretoria e conselho de admi-
nistração” (mOnTEIRO, 2003, p. 2). Adiante se verá com mais detalhes
o seu funcionamento.
A corrupção, sob o aspecto econômico, não pode ser atribuída
exclusivamente ao comportamento do indivíduo. Suas causas são
estruturais. Estão relacionadas com a intervenção do governo na
economia. Esse fator é mais importante diante das reservas de mercado,
monopólio e excesso de regulação (mAURO, 1997, p. 4; TAnZI, 1998,
p. 24). Há vários estudos de que a corrupção cresce na relação direta
do número de procedimentos burocráticos que as empresas enfrentam
para entrar em funcionamento, para produzir e vender em um mercado
sob rígido controle estatal. E esses passos burocráticos implicam em
elevados custos, de onde se extrai que o denominado “custo Brasil” é

para vencer os entraves burocráticos.


Sob esse ângulo, é da década de 1970 o apontamento de duas
causas básicas. A primeira é a regulamentação excessiva e a segunda o
poder discricionário dos funcionários públicos. Elas se constituem em
oportunidade e incentivo para a corrupção (ROSE-ACKERmAn, 1978
apud
De fato, a regulamentação é o meio mais intenso de intervenção
estatal. Essa intervenção torna os atores privados do mercado e reféns

o poder discricionário dos servidores públicos. Acrescente-se, ainda, a


falta de transparência e prestação de contas e, nesse sentido, é possível
uma aproximação da fórmula da corrupção imaginada por Klitgaard
(1994). Segundo o autor, a corrupção é igual a monopólio, mais o alto
poder discricionário e menos transparência (C=m+D-T). É assim que
se cria o ambiente propício para que a corrupção nasça e grasse com
os efeitos nefastos conhecidos.
Salomão RibaS JUnioR
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2.5.2 Consequências da corrupção na economia


Conhecida a existência de transferência ilícita de parte do patri-

para o erário. Essa perda não é neutra nem anulável imediatamente


pelo remanejamento ou criação de renda adicional. A diminuição de
recursos públicos reduz a capacidade de investir do Poder Público. Para
calcular esse prejuízo, a primeira coisa a saber é se esses recursos se
transformam em outro investimento na mesma economia ou não. São
comuns as denúncias de que esses recursos desviados são transferidos

Para o Banco mundial, a corrupção afeta a economia, reduzindo


o seu crescimento e aumentando os gastos governamentais. As
consequências da corrupção são as seguintes:
a) diminuição do nível de investimento;

c) altera os gastos, especialmente os investimentos em serviços


básicos; e

Uma das consequências mais graves é a circunstância que,


face aos níveis altos de corrupção, mais diminuem os recursos para
a educação (mAURO, 1997, p. 10). Ora, se níveis bons de educação
são essenciais para o desenvolvimento econômico e social, a falta de
recursos provoca, com a corrupção, um círculo vicioso de pobreza.
De outra parte, deve-se considerar que o baixo nível de inves-
timentos — provocado pela corrupção — compromete os índices de

Agregado de Controle da Corrupção (ICC). Em trabalho distinguido


pela CGU, mores anota ainda que outra consequência econômica da
presença da corrupção é a diminuição do produto per capita (PPC):

Corrupção – gera uma má alocação e desperdício de recursos produtivos


da economia; reduz a produtividade do investimento público; diminui

reduz a competitividade da economia — (gerando) menos produto per

não são essencialmente diferentes as conclusões de Rose-

instability, leakage of public resources, low government legitimacy,


CAPíTULO II
CORRUPÇÃO

reduced human capital, heightened inequality, low interpersonal trust


— law welfare”.
É claro que aí se tem consequências, cuja raiz está no desvio de
recursos e baixo nível de investimentos públicos, mas que afetam a
sociedade em suas múltiplas faces. Chegam a comprometer a própria
democracia e a qualidade de vida. É quando se entra nos círculos
viciosos ou virtuosos. O primeiro — vicioso — mostra “Higher levels

caught” (ROSE-ACKERmAn; TRUEx, 2012, p. 19).


Já no círculo virtuoso tem-se que “Lower levels of corruption

(ROSE-ACKERmAn; TRUEx, 2012, p. 19).


O que se conclui é que possíveis efeitos econômicos positivos de

da imensa quantidade e dimensão dos efeitos negativos.

Diferentemente da visão jurídica que situa a corrupção como


resultante da legalidade ou ilegalidade de uma determinada conduta
ou dos incentivos econômicos (no caso da visão econômica), o
fenômeno é visto como comportamento em determinado ambiente.
Ele é condicionado pelos usos e costumes ou pela cultura dominante
nesse mesmo ambiente. Assim, o nepotismo e o clientelismo não são
necessariamente condutas corruptas na contratação de obras públicas
ou de serviços pelo agente governamental. O princípio da impes-
soalidade na gestão pública é afastado pelo costume de se atender,

eleitorais.

la conducta etiquetada como ‘corrupta’ por algunos observadores


es, sin embargo, considerada como una entrega aceptable de regalos
o de propinas dentro de un país, simplesmente será legalizada y
comunicada” (ROSE-ACKERmAn, 2001, p. 151).
O ser humano, nessa ótica, tem como motivação desse compor-
tamento — ou da aceitação dessa conduta nos negócios públicos — o
seu próprio bem-estar, o de sua família e das pessoas de suas relações
pessoais. Assim, a transferência de parte do patrimônio público para

política e econômica.
Salomão RibaS JUnioR
70 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

Tem-se que a Sociologia estuda o comportamento humano, em


virtude do meio e das relações dos indivíduos entre si e das associações
ou grupos a que pertencem, porém, afasta-se dos conceitos de legali-
dade e ilegalidade ou de criação de renda de que falam os juristas e
os economistas.
Os sociólogos consideram que há prática de corrupção em todos
os momentos da vida em sociedade. São práticas que não são ilegais
para serem consideradas corruptas (rompimento de regras, benefício
individual ou de pequeno grupo em prejuízo do coletivo). Elas são
fruto de situações sociais aceitas (SCHILLInG, 1999).

benefício privado, o patrimonialismo, o nepotismo e o favorecimento

relações sociais faz esmaecer, quando não desaparecer, os conceitos


legais do que é corrupção. Considera-se, nessa circunstância, um
comportamento socialmente aceitável. Aparentemente, o indivíduo
que se rebela condenando a prática é porque está excluído dos seus

sociedade — tem uma percepção diferente da corrupção. Heidenheimer


pondera que “embora certos comportamentos possam ser corruptos
por determinados cidadãos conscientes das normas oficiais, o
compartilhamento desse ponto de vista por outros cidadãos se dá

condicionada pelo seu próprio comportamento e grau de participação


na conduta corrupta, onde:

Indivíduos diferentes percebem um mesmo fato, apresentado como


corrupto, de diversas formas, baseados apenas nos seus interesses,

correlação de similaridade entre os fatos e as suas próprias atitudes

Essas diferenças são bem esclarecidas com as três categorias ou


tipos de corrupção de Heidenheimer (1970), em que o autor ensina que
a corrupção pode ser negra, branca ou cinza.
Corrupção negra ocorre quando há um rechaço social pela

e a sanção prevista em lei. É o caso do desvio de fundos públicos de


CAPíTULO II
CORRUPÇÃO
71

programas sociais (alimentação escolar, rem


para benefícios particulares ou quando se trata de dinheiro resultante

nalizam, mas a sociedade não concorda inteiramente com a sanção. É o


caso do contrabando, da pirataria (sobretudo de obras musicais ou de

Por último, a corrupção é cinza quando uma parte da sociedade


quer ver a conduta punida e outra parte não. É o caso da prostituição,
da venda de bebidas para menores e da embriaguez ao volante.
Esclareça-se que algumas dessas condutas, em si, não são atos
de corrupção. A corrupção, contudo, é que permite que elas sejam
praticadas. Isso se dá pelo pagamento de subornos (prometer, oferecer
ou pagar a um terceiro qualquer quantidade de dinheiro ou quaisquer
outros favores) e propinas (dinheiro obtido ou fornecido de forma

A dimensão econômica da pirataria é impressionante. Para se


ter uma ideia, anote-se que, de acordo com o Conselho nacional de

triplicou no período 2005-2011. Para 2011, projetou que os valores das


apreensões chegariam a R$1,7 bilhão, 30% a mais do que em 2010. A
notícia lista os itens apreendidos (CDs, DVDs, cigarros, óculos, reló-
gios, tênis, bolsas etc.), estimando “que se abolida a prática da pira-
taria no Brasil, seriam arrecadados R$30 bilhões a mais de impostos
e gerados 2 milhões de empregos” (BORGES, 2012). É uma das formas
de corrupção que a maioria da população brasileira não condena.
Pesquisa da Federação do Comércio do Estado do Rio de Janeiro
(FECOmÉRCIO-RJ) aponta que 94% dos consumidores de produtos
piratas compram porque os preços são mais em conta e 12% porque é
mais fácil de se encontrar. Os pesquisados, de outro lado, sabem que

de impostos (75%) (FECOmÉRCIO-RJ, 2012).

apoiadas no que a opinião pública considera ser um ato corrupto, o


que se tratará mais adiante.

clientelismo e o nepotismo como


espécies ou formas de corrupção. Para compreender a linha de
Salomão RibaS JUnioR
72 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

no caso de corrupção pública.

Clientelismo – 1. prática eleitoreira de certos políticos que consiste em


privilegiar uma clientela (conjunto de indivíduos dependentes) em troca
de seus votos; troca de favores entre quem detém o poder e quem vota.
(HOUAISS; VILLAR, 2001, p. 740)
nepotismo – 1. Autoridade exercida pelos sobrinhos ou demais parentes
do papa na administração eclesiástica. 2. favoritismo para com paren-
tes, esp. pelo poder público. 3. preferência por; favoritismo; proteção.
(HOUAISS; VILLAR, 2001, p. 2010)

Bobbio et al.
nepotismo como espécie de corrupção:

Podemos distinguir três tipos de corrupção: a prática da peita ou uso


da recompensa escondida para mudar a seu favor o sentir de um
funcionário público; o nepotismo, ou concessão de empregos ou con-
tratos públicos baseada não no mérito, mas nas relações de parentela;
o peculato por desvio ou apropriação e destinação de fundos públicos
ao uso privado. (BOBBIO et al., 1991, p. 291)

é um país em que se aceita o pagamento da propina para se obter mais


facilmente um documento em uma repartição pública. É o caso da

credencial ou autorização para encaminhar os papéis para emissão


de habilitação para dirigir ou licenciamento de veículos nos órgãos

aceita que não exige maiores demonstrações. O que se paga, e sabendo-


se que parte vai complementar a remuneração de algum servidor, não
é considerada corrupção administrativa. É incluída entre as pequenas
corrupções aceitas com naturalidade pela sociedade. A celeridade na

do que o custo da corrupção para si próprio e para a sociedade. Trata-se


de aspecto prático da doutrina de Bobbio et al. (1991, p. 291) no clássico
Dicionário político.
nessa perspectiva sociológica é que se considera a corrupção
como quebra de uma regra, mas atenua-se a gravidade do ato em razão
do costume, da prática habitual, da cultura local. De outra parte, Bobbio
et al. (1991) consideram o nepotismo como uma forma de corrupção.
CAPíTULO II
CORRUPÇÃO
73

Só uma parcela da opinião pública o vê assim. A maioria — desde que


não haja abuso, exagero, excesso — vê com normalidade essa prática.
não por outra razão, o Congresso nacional brasileiro jamais avançou
na proibição de nomeação de parentes, amigos e correligionários para
cargos em comissão. Foi necessária uma decisão do Supremo Tribunal

a qual dispõe que:

A nomeação de cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral

ou de servidor da mesma pessoa jurídica investido em cargo de direção,

direta e indireta em qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do


Distrito Federal e dos municípios, compreendido o ajuste mediante
designações recíprocas, viola a Constituição Federal. (BRASIL, 2008)

Ainda assim é uma correção incompleta, pois não proíbe e


nem mesmo inibe o compadrio, o clientelismo e a facilitação político-
partidária nas nomeações. E o que é pior, na contratação para forne-
cimento de bens e serviços, não se proíbe os privilégios decorrentes
dessas relações de amizade e partidarismo. Uma pesquisa feita pelo

e divulgado pela revista Veja

pessoas comuns em relação ao exercício do poder.

lei ou descumpriram norma contratual para obter alguma vantagem

corrupção avaliados pelo estudo se tivessem oportunidade. na primeira


hipótese, as irregularidades avaliadas foram as seguintes:

1. Quando tem oportunidade, tenta dar uma “caixinha” ou “gorjeta”


para se livrar de uma multa;
2. Sonega impostos;
3. Recebe benefícios do governo, sabendo que não tem direito a eles;

tipo de vantagem (exemplo: identidade, carteira de motorista, cartei-


rinha de estudante, diploma, etc.);
5. Quando tem uma oportunidade, pede mais de um recibo por um mes-
mo procedimento médico para obter mais reembolso do plano de saúde;
Salomão RibaS JUnioR
74 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

m os originais de marcas famosas sabendo

7. Quando tem uma oportunidade, faz ligação clandestina ou “gato” de


TV a cabo, ou seja, aproveita a instalação do vizinho;
8. Quando tem uma oportunidade, faz ligação clandestina ou “gato”
de água ou luz;
9. Se tem chance, pega ou consome produtos em padarias, supermercados
ou outros estabelecimentos comerciais sem pagar;
10. Apresenta atestados médicos falsos no trabalho ou na escola;
11. Se tem seguro de carro ou de qualquer outro tipo, quando tem uma
oportunidade, frauda o seguro;
12. Compra algo sabendo que é roubado;

para conseguir aposentadoria precoce. (IBOPE, 2012)

tunidade, os atos de corrupção política apontados foram os seguintes:

3. Contratar, sem licitação, empresas de familiares para prestação de


serviços públicos;
4. Pagar despesas pessoais não autorizadas (como compras no cartão
de crédito ou combustível) com dinheiro público;

outras áreas;

prestará serviços ou venderá produtos ao governo;


8. Usar “caixa 2” em campanhas eleitorais;
9. Superfaturar obras públicas e desviar o dinheiro para a campanha
eleitoral do político;
10. Superfaturar obras públicas e desviar o dinheiro para o patrimônio

11. Deputado ou Senador receber dinheiro de empresas privadas para

12. O político contratar “funcionários fantasmas”, ou seja, pessoas

o dinheiro;
13. Trocar o voto a favor do governo por um cargo para familiar ou
amigo. (IBOPE, 2012)
CAPíTULO II
CORRUPÇÃO
75

Como se vê, não se trata de questão de legalidade ou ilegalidade

mas de oportunidade de se obter uma vantagem. Contribui com essas


respostas a dimensão do ganho privado e a raridade da punição. Sabi-
damente, aponta-se no Brasil a impunidade como um dos maiores

consideradas como um retrato de casos de fraude e corrupção apre-


sentados diariamente pela mídia. E todas as hipóteses são reveladoras
da supremacia do interesse privado. De fato, há certa debilidade do
interesse público quando confrontado com o interesse privado. E,
ainda, que ele seja cuidadoso em sua pessoa política para procurar o
interesse comum, ele é mais, ou não menos, cuidadoso para perseguir
seu próprio interesse privado, e aquele de sua família, parentes e amigos

Apesar dessa constatação, a Sociologia não aponta valoração


em termos absolutos dos fatos que mostram quebra de normas, tendo
em vista que:

A abordagem sociológica das relações entre os indivíduos distingue-


se da abordagem biológica, psicológica, econômica e política dessas
relações. Seu interesse focaliza-se no todo das interações sociais e não
em apenas um de seus aspectos, cada um dos quais constitui o domínio

problemas sociais ou a responsabilidade pelas reformas, planejamento

(HOUAISS; VILLAR, 2001, p. 323)

sociais: a teoria e o método (HOUAISS; VILLAR, 2001, p. 323).

das relações usuais entre indivíduos de uma dada comunidade ou


sociedade. mais do que em outros campos do conhecimento humano,

ter uma corrupção negra, cinza ou branca. Esses conceitos são extraídos
da maior ou menor sintonia entre o enunciado da norma e o sentimento
da pessoa ou da sociedade diante do mesmo fato. no primeiro caso, há
coincidência entre um e outro. no segundo, há coincidência parcial e,
Salomão RibaS JUnioR
CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

no terceiro, é absoluta a simetria entre a norma, a sanção e o sentimento


popular.
Essa é uma questão que se resolverá adequadamente pela con-
junção de esforços nos campos da Educação, Cultura e do Direito. neste
último, com a punição dos que transgridem as leis. A impunidade
retroalimenta comportamentos inadequados pela cultura e falta de
educação.

2.7 Corrupção na opinião popular

das pessoas comuns, das pessoas nas ruas. As pessoas têm no seu
sentir ou perceber uma clara noção do certo e do errado. Essa noção é
formada pela educação e pela formação moral e religiosa. A educação23
se processa no seio da família e na sociedade, por meio de uma clássica
instituição: a escola. Essa tal noção, contudo, não estabelece nítidas
distinções entre práticas, como faz o Código Penal. Quase todas as
fraudes e condutas de rompimento com regras de obediência gene-
ralizada são compreendidas como corrupção. É possível que, na ima-
ginação coletiva, a palavra corrupção tenha origem no termo latino
“rumpere” (TAnZI, 1998, p. 559), daí a generalização. Assim, esse
rompimento como indicador da corrupção na opinião comum está
sempre associado a juízos de valor de ordem moral. E, outras vezes, a
uma percepção de natureza ética do necessário equilíbrio para se viver
em sociedade. É corrupto o juiz que decide contra a lei, é corrupto o
árbitro de futebol que decide contrariamente ao clube de preferência.
A palavra usada é outra: ladrão,24 mas o sentimento é de que não
houve um simples erro ou tendência clubística. Parece, sim, que houve

corrupção, inclusive sob a ótica do Direito e da Economia. O mundo


sabidamente encolheu, as distâncias encurtaram, o tempo de trân-
sito das pessoas, dos bens e das notícias reduziu-se. A globalização,

23
Educação – Processo de desenvolvimento da capacidade física, intelectual e moral da

(FERREIRA, 1999, p. 718).


24
Ladrão – Que furta; ladro. Que resulta de roubo, de furto. Aquele que furta ou rouba;
gatuno, ladro, larápio, rato (FERREIRA. Novo Aurélio século XXI: o dicionário da língua
portuguesa, p. 1178).
CAPíTULO II
CORRUPÇÃO
77

termo que se usa para designar originalmente a internacionalização


dos sistemas econômicos, trouxe consigo mesma a aldeia global
(mCLUHAn; FIORE, 1971).
Assim, também, o advento da Internet e a expansão do seu uso

segundo Bonavides (1997, p. 525), “deles depende a concretização da


sociedade aberta do futuro, em sua dimensão de máxima universa-
lidade, para a qual parece o mundo inclinar-se no plano de todas as
relações de convivência”.
Dessa forma, sabe-se ou tem-se noção de tudo o que ocorre no
mundo de forma praticamente instantânea. Graças a isso, pode-se
avaliar o que se passa nos bastidores para descobrir áreas de inci-
dência da fraude e de práticas corruptas até há pouco tidas como
acima de suspeitas. Encontram-se buscas de rendas ilegais, conluios,
improbidade e corrupção em áreas tão distintas como o esporte, as
igrejas, a administração de OnGs, de hospitais, de distribuição de

2.7.1 Opinião pública


A opinião pública não pode ser o resultado da simples soma das
opiniões individuais sobre um determinado assunto. nesse aspecto,

respostas quantitativas uma avaliação qualitativa capaz de expressar


uma opinião geral sobre um tema. É muito provável que, por essa

qualitativas realizadas por interesse eleitoral — não são realizadas


com muita frequência.
O dicionário Houaiss traz a palavra opinião como sendo uma
“maneira de pensar, de ver, de julgar; [...] julgamento pessoal (justo ou
injusto, verdadeiro ou falso) que se tem sobre determinada questão.
Parecer; pensamento [...]” (HOUAISS; VILLAR, 2001, p. 2071). Consa-
grando, ainda, que a opinião pública pode ter duas acepções básicas:
(i) o acordo da totalidade, ou grande maioria, das opiniões de uma
coletividade sobre questões de interesse geral; e (ii) opinião que traduz

destinos de uma coletividade politicamente organizada.


nos meios de comunicação costuma-se fazer um jogo de palavras
para d
confundida com a opinião publicada.
Salomão RibaS JUnioR
78 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

Esse aspecto da expressão pública (de todos, livre) e do que


publicam os veículos de comunicação já mereceu estudos técnicos no
campo da comunicação social. O jornal O Globo (ed. 550, 11 ago. 2009)
tratou da questão em “A opinião pública e a publicada”, de autoria
de Emerson Urizzi Cervi, jornalista, cientista político e professor da
UFPR, aduzindo que:

A discussão sobre se a imprensa representa ou não a opinião pública


lembra a anedota sobe a discussão a respeito de um copo de água pela
metade. Olhando para a parte de cima, diz-se que está meio vazio. Da
parte de baixo diz-se que está meio cheio. É preciso considerar que os
meios de comunicação de massa não são apenas “espaço para debates”;
se o fossem representariam totalmente a opinião pública — não é o caso.
Eles também são “atores”, com interesses e demandas como qualquer
outro ator social envolvido no debate público. Sendo assim, meios de
comunicação são parcialmente capazes de representar a opinião pública,
porém, como também são agentes interessados, geram uma distinção
entre opinião pública e opinião publicada. (CERVI, 2009)

As pesquisas de opinião, a respeito das crenças e do pensamento


das pessoas, são constantes. muitas delas reveladoras de tendências e
opiniões que não são conhecidas de outra maneira.
É o que se viu na parte relativa a uma visão sociológica da
corrupção. Ali são descritas 13 situações de quebra de regras legais,
morais, éticas ou de boa conduta. As respostas mostraram um elevado
número de pessoas admitindo a prática dos atos ali mencionados. Pro-
tegidas pelo anonimato, as pessoas acabam fazendo revelações sinceras
e, de certa forma, surpreendentes (IBOPE, 2012).
na mesma pesquisa, ao ser perguntado sobre o que praticaria
de incorreto se tivesse oportunidade, a primeira resposta foi a escolha
de familiares ou pessoas conhecidas para cargos de confiança. A
outra, revelando que o nepotismo não é rechaçado, admite a mudança
de partido em troca de dinheiro, cargo ou emprego para familiares

nepotismo ou clientelismo, na Administração Pública, não são repelidos


havendo oportunidade (IBOPE, 2012).

2.7.2 A cor da corrupção na visão popular


Como se vê, o patrimonialismo está presente nos costumes,
mesmo entre pessoas comuns que o reprovam nos políticos, mas
admitem que praticariam os atos referidos. Entre as pessoas comuns,
CAPíTULO II
CORRUPÇÃO
79

os atos dessa pesquisa tornam mais evidentes os tons da corrupção

Assim, no desvio de recursos públicos por políticos famosos


ou na sonegação tributária das grandes empresas, tem-se a corrupção
negra. Existe absoluta concordância entre o disposto na lei e a opinião
das pessoas, isto é, uma e outras veem atos graves que devem ser
sancionados com severidade.
Já quando se trata da compra e venda de produtos piratas,
contrabando ou jogos clandestinos, a cor é branca. neste caso, as leis
criminalizam, mas a sociedade não concorda. O cidadão encontra uma

tais atos.
Finalmente, há a corrupção cinza, quando uma parte da socie-
dade quer e a outra não. É o caso da prostituição, venda de bebidas
para menores de 18 anos e embriaguez ao volante.
Talvez para tornar menos repulsivas as práticas que desviam
recursos do patrimônio público para benefício privado é que, na
linguagem popular, há tantas expressões para designar o mesmo
fenômeno. E algumas delas até são simpáticas. na opinião pública, a

a emissão de um documento é providência normal de baixo custo com


altíssimo benefício. O funcionário, porém, encara esse tipo de suborno

dar ao andamento burocrático de determinado assunto. no fundo,

como sendo “[...] maneira hábil, esperta, astuciosa de conseguir algo,

cularmente difícil. Pode deixar que na hora H aparece um amigo e dá

comportamentos assemelhados, como é o caso da “viveja criolla”


dos portenhos da República Argentina. Certamente, não é a mesma
coisa, mas também indica um comportamento capaz de resolver en-
traves legais, éticos ou de outra natureza, no interesse individual em
detrimento do coletivo.

que não se considera propriamente desonesto. Basta ver o êxito do jogo


do truco, tanto no Brasil quanto na Argentina. É um jogo do “blefe”,
da esperteza, da mentira.
Salomão RibaS JUnioR
80 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

De todas essas observações e ressalvas, pode-se concluir que,


para a opinião pública, corrupção são os atos que geram benefícios
para um ou alguns em prejuízo da coletividade. E, também, o que os
meios de comunicação divulgam a respeito dos malfeitos dos polí-
ticos e dirigentes da alta hierarquia. Julgam as pessoas, também, por
corrupção, fraudes na Administração Pública e outras atividades

Heidenheimer (1970). Atos de corrupção são atos ilegais, mas na opinião


popular, nem todos os atos ilegais são atos de corrupção.
É o que se vê nos resultados de um estudo feito pelo IBOPE, sob
o título “Corrupção na política: eleitor vítima ou cúmplice?”. De acordo
com a revista Veja

na semana passada, o Ibope divulgou os resultados de um estudo


intitulado “Corrupção na política: eleitor vítima ou cúmplice?”. Duas mil
pessoas foram entrevistadas ao longo do mês de janeiro, e as conclusões
são incômodas. Quase 90% dos entrevistados declararam que os políticos
brasileiros agem pensando apenas em seu próprio benefício, e 82%
dizem que a classe política brasileira em geral é corrupta. Para 95%
dos entrevistados, superfaturar obras públicas ou desviar recursos do

caixa dois igualmente inadmissível. As coisas se confundem na segunda


parte do levantamento. De maneira abstrata, o brasileiro se acha melhor

geral, é honesto. Ao mesmo tempo, 75% dos entrevistados admitiram


que, se eleitos para um cargo público, poderiam “cair na tentação” de se

pelo menos um ato condenável — como pagar suborno para escapar de


uma multa, apresentar atestados médicos falsos ou consumir produtos
piratas. Os resultados da pesquisa revelam uma dicotomia: a população

E não há como contra-argumentar que a questão não estava em


pauta nas preocupações dos brasileiros. Viviam-se os momentos pós-
denúncia da existência do “mensalão”. Como se sabe, “a tentativa de

do com o Ex-Procurador-Geral da República, Dr. Antonio Fernando de


Souza, em reportagem veiculada no site da revista Veja, referente ao caso
do “mensalão”, perante o Supremo Tribunal Federal (mARQUES, 2012).
O que há mesmo nesses dados é uma curiosa maneira de ver as
coisas pela opinião das pessoas.
CAPíTULO II
CORRUPÇÃO
81

2.8 Corrupção pública


A palavra “público” pode ser interpretada em contraposição ao
que é privado ou o que é secreto. no caso da Administração Pública
— organismo de ação do Estado para a promoção do bem comum — a
interpretação se dá nos dois sentidos. A coisa pública é de todos e está
sujeita a mais ampla publicidade.
O dicionário traz a palavra “público” como sendo “relativo ou
pertencente a um povo, a uma coletividade. Relativo ou pertencente
ao governo de um país, estado, cidade (etc.). Que pertence a todos,
comum”. Ou ainda, no sentido contrário ao secreto, encontra-se
na singela descrição do dicionário, como sendo algo “que é aberto
a quaisquer pessoas. Sem caráter secreto; manifesto; transparente
universalmente conhecido” (HOUAISS; VILLAR, 2001, p. 1574).
Ainda é relevante ver que o princípio da publicidade — não da
propaganda — é da natureza do que é público (de todos) e, em especial,
da Administração Pública. É princípio do direito administrativo que se
incorporou ao direito constitucional positivo dos Estados democráticos.
A Constituição brasileira estabelece que a Administração Pública deva
obedecer aos princípios da legalidade, impessoalidade, publicidade e
caput, Constituição Federal).
Assim, o administrador público está condicionado, em seus
atos, por esses princípios. Todos são de igual valor e importância, mas
pode-se destacar o da legalidade e da probidade como balizadores do
bom uso do dinheiro público. Como princípios, eles permeiam todas
as normas (mesmo as constitucionais) e regras legais e administrativas.
A corrupção golpeia princípios, daí a sua gravidade. É a lição de Celso
Antônio Bandeira de mello (1974, p. 18):

Violar um princípio é muito mais grave que transgredir uma norma.

mandamento obrigatório, mas a todo o sistema de comandos. É a


mais grave forma de ilegalidade ou inconstitucionalidade, conforme
o escalão do princípio atingido, porque representa insurgência contra
todo o sistema, subversão de seus valores fundamentais, contumélia
irremissível a seu arcabouço lógico e corrosão de sua estrutura mestra.
Isto porque, com ofendê-lo, abatem-se as vigas que o sustêm e alui-se
toda a estrutura nele esforçada.

De outra parte, também realçando a importância de princípios, ao


abordar os projetos de reformas e mudanças administrativas, moreno
(2004, p. 101) registra:
Salomão RibaS JUnioR
82 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

Podrían proponerse tantos códigos o recomendaciones sobre buenas


prácticas administrativas como Administraciones existen, atendiendo

sición de estabelecer un listado de principios o prevenciones que se

a) Legalidad.
b) Imparcialidad, orientado la actividade siempre hacia el interés
general.
c) Servicio y proximidad al ciudadano, informando cumplida y adecua-
damente sobre sus derechos.
d) Responsabilidad individual del servidor público.

f) Establecimiento de un sistema de reclamaciones.


El cumplimiento de estas directrices conduciría a que el derecho de
todo ciudadano a una buena Administracíon (derecho ya considerado
en algunos foros como un auténtico derecho fundamental) sea una
realidad. (mOREnO, 2004, p. 101)

no Direito brasileiro, a partir da Constituição de 1988, encontra-

blicos. Aos já referidos destacadamente princípios da legalidade e da


probidade podem-se acrescentar, se já não bastassem aqueles, os da
honestidade, moralidade e decoro.

Banco mundial como sendo “o abuso do poder público para benefício

da corrupção pública pela natureza dos seus agentes e por seu objeto.
A origem dos bens, vantagens ou dinheiro objeto de vista servem para
esclarecer mais de que se trata.
Corrupção, Estado Democrático
de Direito

grupos sociais e indivíduos de desrespeitar ou manipular o ordena-


mento legal vigente, estando associada inegavelmente, em regra, ao

o ideal de corrupção é muito mais elaborado, complexo e articulado do

servidores públicos, a corrupção contamina grande parte da sociedade


e dos indivíduos que a compõem com a tendência de sua destruição
total. (GHIZZO nETO, 2011, p. 75)
CAPíTULO II
CORRUPÇÃO
83

corrupção pública, pela leitura dos dispositivos do Código Penal:

Concussão

que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem


indevida: [...]
Corrupção passiva
Art. 317. Solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou indire-
tamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão
dela, vantagem indevida, ou aceitar promessa de tal vantagem: [...]
Corrupção ativa
Art. 333. Oferecer ou prometer vantagem indevida a funcionário pú-
blico, para determiná-lo a praticar, omitir ou retardar ato de ofício: [...].
(BRASIL, 2012c)

Estão presentes os agentes necessários (corruptor e corrupto),


sendo um deles necessariamente funcionário público. O objeto do ato
é que ele pratique ato ilegal ou que deixe de praticar ato de ofício me-
diante dinheiro ou outra vantagem ilícita. O objeto do ato é atingir o
patrimônio público. Esses são os determinantes da corrupção pública:
(i) ato ilícito lesivo ao patrimônio público; (ii) agente público em pelo
menos um dos lados; e (iii) crime contra a Administração Pública.

esse tipo de ato como corrupção. O que não impediu, como se viu em
capítulos anteriores, o alargamento do conceito e a sua abrangência.
Como delimitador, o conceito economicista: transferência ilícita de

Tanzi (1998) “o abuso do poder público para benefícios privados”.


A expressão “poder público” restringe o tipo de corrupção
que se tratou até aqui. mais adiante tratar-se-á o que se entende por
corrupção privada.
no caso da corrupção pública, pode-se dividi-la em um número

corrupção política e a corrupção eleitoral. Cada um desses tipos tem


suas próprias circunstâncias, meios, agentes e objetos. Alguns desses
aspectos, não raro, se confundem, o que não impede uma abordagem
em separado.
Salomão RibaS JUnioR
84 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

2.8.1 Corrupção política

poder ou a grande corrupção. Pode-se dizer que o que a distingue da


corrupção administrativa é a natureza das funções exercidas por seus

ilegal de renda do patrimônio público para o privado.


Os agentes da corrupção política são políticos ou ocupantes de
altos cargos na Administração. Já os agentes da corrupção administrativa
são os funcionários públicos, os integrantes da burocracia permanente.
O que não quer dizer que os atos praticados não possam confundir-
se com uma e outra prática. Como é sabido, ninguém consegue tirar
recursos do erário ou cometer crimes contra a Administração Pública
agindo isoladamente. A burocracia é organizada de tal forma que o

atividades de opositores políticos, da imprensa e da população em


geral. São várias as formas de corrupção política, como o suborno, o

corrupção política pode permitir a facilitação de negócios criminosos,

terrorismo internacional. A rigor, nenhuma dessas práticas pode existir


sem a presença da corrupção em cada uma de suas fases.
O poder político é uma situação em que surge e prospera a
corrupção; os estudos de teoria política repetem, constantemente, a
frase atribuída a Lord Acton,25 como já se viu anteriormente. “O poder
tende a corromper. O poder absoluto corrompe absolutamente”. Daí se
extrai que o exercício do poder, em si, provoca a conduta independente
da índole do agente. A cobiça é secundária porque é da natureza do
poder provocar a corrupção.
A primeira providência para conter a corrupção política está na
transparência e no dever de prestar contas de quem exerce funções
de poder. Os limites para esse exercício nos Estados Democráticos de
Direito estão nas constituições e no universo legal e jurídico. A limitação
para que esse poder se torne absoluto está, no caso brasileiro, na singela

25
John Emerich Edward Dalberg-Acton, historiador britânico, 1834-1902.
CAPíTULO II
CORRUPÇÃO
85

sil, formada pela união indissolúvel


dos Estados e municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado
Democrático de Direito e tem como fundamentos:
I - a soberania;
II - a cidadania;
III - a dignidade da pessoa humana;
IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;
V - o pluralismo político.
Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio
de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição.
(BRASIL, 2012b)

Para que o poder não seja único, e por isso mesmo tendente a
se tornar absoluto, há uma divisão formal do poder político, como é

“são Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legis-


lativo, o Executivo e o Judiciário” (BRASIL, 2012b).
A corrupção política pode estar presente nas mais diversas áreas
de atuação do poder estatal. Ela é uma forma fácil e rápida de incremento

mecanismos de manutenção das pessoas no Poder. Esses mecanismos


nas democracias são os partidos políticos, os executivos e parlamentares
eleitos e os formadores de opinião, todos suscetíveis de corrupção.

2.8.1.1 Caso Collor

torais ocupa lugar destacado no desvio de recursos públicos. É igual-

política no Brasil revelaram essa associação. Isso aconteceu no caso


Collor, como revelou a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI),
instalada para investigar ações do tesoureiro da campanha presidencial,

campanha veio de atos de corrupção política. Era o caso de vultosas


contribuições de empresas já fornecedoras dos governos. Outras viviam
uma espécie de temor da vitória de um candidato de esquerda, sem
compromissos com o que se autointitulava elite nacional (Lula da
Silva). Outras empresas viviam a expectativa de facilidades ou mesmo
favores governamentais futuros. Era dinheiro dupla ou triplamente
manchado pela ilegalidade. Vinha da s
gem obscura do “Caixa 2” nunca
Salomão RibaS JUnioR
CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

mereceu repulsa acentuada por parte da oposição e da opinião pública.


A oposição silenciou porque, em boa parte, a origem dos recursos que
pagavam suas próprias contas era da mesma fonte; e a opinião pública,
porque não considera ação criminosa a sonegação de impostos. E, no
entanto, a legislação de então era tão frágil que permitiu ao esquema
Collor-PC Farias regularizar R$2 milhões da operação Uruguai. Era
dinheiro adequadamente “lavado”, mediante um “empréstimo” sem

O mais interessante nesse episódio foi o surgimento das “sobras


de campanha”. Isto é, o dinheiro era tanto que, pagas as contas,

“mensalão” (GOVERnO LULA, 2005).


Antes de outro episódio, pode-se examinar um outro caminho

portadores de autoridade; são os que mais se corrompem”.

2.8.1.2 CPI do orçamento


Outro exemplo de corrupção política pode-se encontrar na
atuação dos membros da Comissão de Orçamento do Congresso, nas
décadas de 1970 e 1980. Como costuma acontecer nesses casos, o véu
começou a ser levantado por um episódio menor em 1993.
Investigando um crime passional, a polícia encontrou na casa
do servidor do Senado Federal, José Carlos Alves dos Santos, um saco
contendo US$1 milhão. Interrogado, começou a falar sobre um esquema
de corrupção política que envolvia diversos burocratas de alto nível e,
especialmente, parlamentares. Entre esses, ocupava lugar destacado
o Deputado João Alves, do Estado da Bahia. O escândalo provocou a
criação de uma CPI, que teve na sua direção os respeitados políticos
Senador Jarbas Passarinho (Governador e Ex-ministro da Educação),
como seu Presidente e o Deputado Federal Roberto magalhães
(Ex-Governador de Estado). Estimulada pela mídia, e em consequência
pela opinião pública, a CPI impediu que o espírito de corpo dos par-
lamentares poupasse os principais acusados. A reação popular foi

culminaram com o impeachment de Collor de mello. O parlamento cortou


suas próprias carnes para afastar o mal. Desde o folclórico Deputado
João Alves — que alegou ter ganhado centenas de vezes na loteria
ntação bancária —
até o Presidente da Câmara Federal Ibsen Pinheiro houve cassação.
CAPíTULO II
CORRUPÇÃO
87

O passo seguinte, que seria a investigação e punição do outro


polo da corrupção — os corruptores, isto é, as empresas, sociedades
civis e particularmente empreiteiras — nunca foi dado.
A discussão em torno da CPI dos Corruptores ou da Corrupção
durou algum tempo. Foram calando as vozes até a do Senador Pedro
Simão, conhecido por sua persistência e tenacidade. As novas notícias
políticas sepultaram as antigas e a vida seguiu, voltando a corrupção
para seu habitat preferido: a obscuridade.
Essa CPI fez surgir aspectos da política nacional e da corrupção

envolvia emendas parlamentares, a elaboração do orçamento federal


e a liberação de recursos para vários responsáveis. São ações muito
transparentes e que, no fundo, envolvem a participação direta de
todos os parlamentares federais e de boa parte da classe política. A

jamais foram convocadas a dar esclarecimentos. Os dirigentes e


procuradores dessas empresas certamente contribuiriam para esclarecer
e, sobretudo, prevenir a corrupção.

2.8.1.3 núcleos de poder e esquemas descobertos


A CPI descobriu abusos de poder na elaboração do orçamento
federal. Eles seguiam um rito que poderia começar antes mesmo da
elaboração da proposta orçamentária pelo Poder Executivo. Os vínculos
entre as empreiteiras e os parlamentares (e os partidos políticos)
começam no período das eleições. Durante as campanhas eleitorais

aportavam recursos, considerando a prova da existência do que se


denomina “Caixa 2”. Isto é, dinheiro fora da contabilidade da empresa

do orçamento

nada mais é que a utilização espúria do que é natural existir nas insti-
tuições: o núcleo de poder. O emprego do poder por um certo número
de pessoas, que constituam um centro decisório legitimado pela estru-

natureza própria. Apenas quando o núcleo de poder se desvirtua, por


uma utilização desconforme aos interesses da instituição, é que nasce
a patologia de sua atuação ilegítima. (BRASIL, 2012f)
Salomão RibaS JUnioR
88 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

Considerando o complexo processo de elaboração dos orça-

do Poder Executivo e no Congresso nacional. Como se sabe, a regra


constitucional confere ao Executivo o poder de iniciativa das leis que
envolvem o ciclo orçamentário: Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO);
Lei Orçamentária Anual (LOA); e Plano Plurianual (PPA).

I - o plano plurianual;
II - as diretrizes orçamentárias;
III - os orçamentos anuais. [...] (BRASIL, 2012b).

Se houver uma tendência para quebrar a impessoalidade das leis


orçamentárias, fraudar essa mesma lei e desviar recursos do erário, os
procedimentos começam na fase preparatória. É o momento em que se
discutem as políticas públicas e as prioridades por setor. São os núcleos
de poder que podem se localizar nos ministérios de Planejamento
e da Fazenda. no caso de obras rodoviárias, outros desses núcleos
encontram-se no ministério dos Transportes e no atual Departamento
nacional de Infraestrutura de Transportes (DnIT), antigo DnER.

na Comissão mista de Planos, Orçamentos Públicos e Fiscalização,


conhecida pela designação abreviada de Comissão do Orçamento.
Essa Comissão, no regime constitucional inaugurado com a

Congresso nacional perdeu muito do seu poder, especialmente o de

Executivo.

no período militar, o núcleo de poder a que se refere o deputado Roberto


magalhães deslocou-se para o Poder Executivo, subdividindo-se entre
órgãos do ministério da Fazenda e do ministério do Planejamento,
oscilando entre um e outro de acordo com o maior ou menor poder

toda ordem — que atuavam apenas na área do Executivo no período


anterior — não continuasse a existir desde os primórdios da elaboração
do orçamento. É o que se descobre no relatório da CPI do Orçamento,
CAPíTULO II
CORRUPÇÃO
89

quando se registra que os grupos organizados de interesse e de pressão


iniciam o seu trabalho “quando da elaboração da proposta orçamentária
pelos diversos ministérios; prosseguia com a influência junto ao
Departamento de Orçamento da União e, ao chegar o Orçamento ao

sofrido diversas modelagens, provocadas pelos grupos de pressão, e as


continuava sofrendo enquanto o ministério da Fazenda negociava cortes
nas rubricas próprias de cada ministério”. (RIBAS JR., 2000, p. 221).

os grupos de interesse e de pressão já haviam interferido em três opor-


tunidades, para a alocação de recursos para essa ou aquela obra ou
serviço. Essa constatação levou a CPI a concluir que o esquema não
começava a agir no Congresso. Ali apenas prosseguiam as ações.

preiteiro dissera que estava acostumado a pagar, no Congresso, uma


propina denominada de pedágio. Isto é, pagava apenas para que a
dotação orçamentária já obtida na elaboração do orçamento apenas
passasse sem alterações na Comissão de Orçamento e no Plenário.
Como o Orçamento Geral da União, no fundo, é uma imensa caixa preta
e o prazo para que o Congresso o examine é exíguo, um pequeno grupo
controlava a Comissão de Orçamento e fazia o que queria. A imensa
maioria dos parlamentares não tinha a menor idéia dos seus procedi-
mentos. O controle era exercido através da Presidência da Comissão,
do Relator Geral e de alguns sub-relatores de órgãos com verbas mais

nacional de Desenvolvimento da Educação, a Fundação nacional da


Saúde, o DnER, etc. O Relator Geral que tinha o poder de apresentar a
chamada emenda do relator detinha um poder enorme. Para avaliar esse
poder, basta pinçar do Relatório da CPI que o Deputado João Alves, em
1990, conseguiu com elas dar destinação a 1,09 bilhões de cruzeiros, de

do que 30,2% do total das verbas. Assim é que foi possível nascer a sua
imensa fortuna, atribuída por ele a muita sorte na Loteria Esportiva.
(RIBAS JR., 2000, p. 222)

Essa oportunidade de comando permitia o surgimento de emen-


das do Relator para subvenções sociais e para as mais variadas entidades
o
se terceiros previamente escolhidos pelo esquema. Dele participavam

Federal, Brasília, 1994.


Salomão RibaS JUnioR
90 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

servidores públicos, empresas de consultoria (lobby) e grupos reduzidos


de parlamentares. A articulação desses núcleos de poder fez surgir duas
variantes do esquema: a das empreiteiras e a das subvenções sociais.

2.8.1.4 Esquema das empreiteiras


lobby
(defesa de interesses) das empreiteiras, atuava antes das eleições ou

preiteiras se dá na própria sugestão de obras a prefeitos e governa-


dores. Elaboram elas estudos técnicos sobre as obras e os repassam

O passo seguinte é a garantia das dotações necessárias no Orça-


mento Geral.

Para garantir a execução das obras por determinada empreiteira ou de


certo grupo de empreiteiras, elas organizam uma espécie de cartel. De

provar a existência de um cartel de empreiteiras, que promoviam um


rodízio para vencer as licitações, em fraude ao processo licitatório. Esse
procedimento, não raro, dispensa o concurso direto de funcionários
públicos. Assim é que, ainda de acordo com o relatório em questão,

uma. Havia um verdadeiro rodízio: quem vencia a licitação ia para o

Assegura o relatório que outra forma de fraude do processo licitatório


era a troca de obras por parte dessas grandes empresas. num caso

Queiroz Galvão responsabilizar-se pelas obras do Projeto Pirapama e


entregar a esta última as obras de drenagem da Zona Sul de natal, obra
feita conjuntamente pelas duas empresas. Em seguida, a Construtora
norberto Odebrecht entregava para a Construtora OAS as obras de
Açailândia, Barra do Corda e Vargem Grande, no maranhão, recebendo
em troca parte das obras de Pirapama.
Daí se depreende que não havia real concorrência entre as empresas,

provocando o superfaturamento. (RIBAS JR., 2000, p. 223)

responsabilidade. Os investigados foram apenas os corruptos (passivos)


servidores públicos e parlamentares.
CAPíTULO II
CORRUPÇÃO
91

2.8.1.5 Subvenções sociais


A subvenção social é uma transferência de recursos públicos para
entidades privadas. nos últimos anos, essas entidades, que passaram
a ser denominadas genericamente como OnGs (Organizações não
Governamentais), têm aumentado muito. na mesma linha, os recursos

proporções. Pela legislação aplicável as subvenções sociais regem-se

[...]
Transferências Correntes [...]

despesas as quais não corresponda contraprestação direta em bens ou


serviços, inclusive para contribuições e subvenções destinadas a atender

distinguindo-se como:
I - subvenções sociais, as que se destinem a instituições públicas ou

[...] (BRASIL, 2012e)

As descobertas feitas pela CPI do Orçamento, contudo, não ini-


biram os repasses para as OnGs. naquela investigação congressual,

oriundas de emendas parlamentares. O esquema de desvio de recursos


por essa via mostra parlamentares, seus familiares, amigos próximos,
apoiadores políticos ou terceiros dirigentes de OnGs.
O roteiro da fraude era o seguinte:

a) o parlamentar criava ou patrocinava a criação de uma entidade e


obtinha a sua inscrição no Conselho nacional de Serviço Social; b)

parlamentar, podendo ser seus familiares ou empregados ou aliados


políticos; c) as entidades, por sua vez, organizavam-se em holdings umas
controlando as outras; d) havia casos em que o parlamentar envolvido

fortuna pessoal, em caso de necessidade; e) de acordo com o Relatório

já constatadas pelo TCU, consistentes, principalmente, em desvio de


Salomão RibaS JUnioR
92 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

transferir numerário para os membros do esquema, inexistência dos


serviços sociais que declaravam realizar; f) os parlamentares praticavam
troca de emendas, apresentando uns as de interesse de outros; g) e
ainda o esquema enviava aos ministérios listas de entidades a serem
contempladas com subvenções, conseguindo o descontingenciamento
das verbas. nos ministérios, funcionários em postos-chaves garantiam
as liberações. (RIBAS JR., 2000, p. 224)

O esquema do uso das OnGs para desviar dinheiro do tesouro só


se aperfeiçou com a passagem do tempo. Foi o que se viu recentemente
nos episódios que afastaram os ministros do Turismo e dos Esportes

É sintomático também que a CPI das OnGs não apresentasse

de investigação parlamentar das empreiteiras.

Um dos mais importantes casos de corrupção política surgiu


no governo (Executivo e Congresso nacional) no momento em que se

diretor dos Correios recebendo R$3.000,00 de propina para facilitar


negócios de empresas com a estatal. O Partido Trabalhista Brasileiro
(PTB) era o partido que indicara os diretores dos Correios. Assim, a
imprensa e a oposição ao governo questionaram o Presidente do Partido,

nos Correios, denuncia, em entrevista, que há um poderoso esquema

Segundo ele, parlamentares recebiam, mensalmente, R$30 mil reais para


apoiar e votar com o Governo. O Congresso que investigava a corrupção
na CPI dos Correios decide investigar a questão do “mensalão”. no

o líder do “mensalão”. Diz mais: que o Presidente da República Luiz


Inácio Lula da Silva (PT) sabia do esquema. Arma-se, portanto, uma
enorme discussão política, com ampla cobertura da mídia. São cassados

Dirceu. Uma tentativa de investigação não deu resultados imediatos.


Depois de 8 meses, concluem-se as CPIs, com o indiciamento de
uma centena de pessoas e o envio do Relatório do Deputado Osmar
Serraglio ao ministério Público. Outros escândalos que acabaram sendo
discutidos no mesmo período envolveram os bingos clandestinos.
CAPíTULO II
CORRUPÇÃO
93

até hoje, sobre dirigentes do Partido dos Trabalhadores (PT), envolvidos

Dirceu — a Câmara dos Deputados reviu sua conduta, permitindo que


o corporativismo exacerbado fosse absolvendo outros implicados no
esquema. Este envolveu até o Presidente da Câmara, Deputado João
Paulo Cunha de São Paulo.

Os implicados e seus partidos políticos, no primeiro momento,


tentaram negar a existência do “mensalão”. Um esforço linguístico
transformou o “Caixa 2” em “recursos não contabilizados”, os atos de

em dado momento, pela palavra do maior líder do PT e Presidente

o que todo mudo faz” — o que mostra que se todo mundo procede
assim, mesmo contra a lei e a ética, não há mal em proceder da mesma
maneira. E essa declaração fez parte de um triste episódio com um
pronunciamento feito em Paris e veiculado no Brasil (LAGO, 2012).

Os fatos apurados ou mesmo denunciados no Congresso foram


enviados formalmente no ministério Público Federal. Depois de novas
investigações e coleta de outros dados e informações, o Procurador
Geral decide submeter o caso ao Poder Judiciário. A denúncia aponta
40 pessoas acusadas de vários crimes. A maioria envolvendo compra de
votos no parlamento e corrupção eleitoral com o pagamento ilegal de
dívidas de campanha. A denúncia foi apresentada ao Supremo Tribunal
Federal pelo Procurador Geral da República, Antônio Fernando de

22.08.2007, o Supremo Tribunal Federal aceita a denúncia e abre a

Joaquim Barbosa, encerra a fase de reunião de provas. Em 07.07.2011, o


Salomão RibaS JUnioR
94 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

do seu antecessor e retira dois réus: Luiz Gushiken e Antônio Lamas,


irmão do Tesoureiro do Partido Liberal (PL), Jacinto Lamas.
O Relator trabalha até 19 de dezembro, quando libera o processo
para revisão do ministro Ricardo Lewandowski. O trabalho de revisão

O processo pode ser dividido em núcleos, frutos da ideia do


“fatiamento”. É medida para facilitar o andamento do que se considera
o maior caso de corrupção da história do Brasil. Assim:
1. núcleo Principal – tinha por objetivo assegurar meios para
manter o PT (e seus aliados) no poder. Desviava dinheiro de
órgãos e empresas estatais. Esse dinheiro era destinado a pagar
dívidas de campanha, custear campanhas eleitorais e manter
a sustentação congressual da base aliada. Isso se operava
por meio da compra continuada de votos. Daí o pagamento
mensal. Os principais acusados são: José Dirceu, Deputado
cassado (PT-SP) e Ex-Chefe da Casa Civil; José Genoíno (Ex-
Presidente do PT e Ex-Deputado Federal (PT-SP); e Delúbio
Soraes, Ex-Tesoureiro do PT.
2. núcleo Publicitário – era o núcleo responsável por obter
vantagens do governo para contratos de publicidade com
empresas e órgão estatais. São acusados: marcos Valério, publi-
citário apontado como o maior operador do esquema; Zilmar
Fernandes Silva, publicitária e sócia de Duda mendonça;
Ramon Hollerbach Cardoso, Ex-Sócio de marcos Valério;
Cristiano Paz, Ex-Sócio de marcos Valério; Duda mendonça,
publicitário; Rogério Tolentino, Advogado e Ex-Sócio de
marcos Valério; Simone Vasconcelos, Ex-Gerente da Agência
SmP&B; Geiza Dias dos Santos, Ex-Gerente interna da Agência
SmP&B; e Luiz Gushiken, Ex-ministro de comunicação.
3. núcleo Financeiro – apontado como operador da lavagem
de dinheiro. O sistema distribuía por meio das empresas de
marcos Valério (DnA e SmP&B) que conseguia empréstimos,
dando como garantia os contratos de publicidade com a
Administração Pública. Integravam esse núcleo: Kátia Rabello,

de do Banco do Brasil S.A.; José Roberto Salgado,


Ex-Dirigente do Banco Rural; Ayanna Tenório Torres de Jesus,
CAPíTULO II
CORRUPÇÃO
95

Ex-Dirigente do Banco Rural; Enivaldo Quadrado, doleiro,


Ex-Sócio da corretora Bônus-Banval; Breno Fischberg, doleiro,
Ex-Sócio da corretora Bônus-Banval; e Carlos Alberto Quaglia,
doleiro, Ex-Sócio da corretora natimar.

esquema, recebendo dinheiro para apoiar o governo. A lista

mas serão julgados pelo Supremo Tribunal Federal: João


Paulo Cunha, Deputado PT-SP; Paulo Rocha, Ex-Deputado
PT-PA; Anita Leocádia Pereira da Costa, Ex-Assessora de
Paulo Rocha; Professor Luizinho, Ex-Deputado PT-SP; João
magno, Ex-Deputado PT-mG; Pedro Corrêa, Ex-Deputado
PP-PE (cassado); Pedro Henry, Deputado PP-mT; João Cláudio
Genu, Ex-Assessor do PP na Câmara; Anderson Adauto
Pereira, Ex-ministro dos Transportes; José Luiz Alves, Ex-
Chefe de Gabinete de Anderson Adauto; José Rodrigues Borba,
Ex-Deputado PmDB-PR; Valdemar Costa neto, Deputado
PL-RJ; Jacinto Lamas, Ex-Tesoureiro do PL; Antônio Lamas,
Ex-Tesoureiro do PL; Bispo Rodrigues, Ex-Deputado PL-RJ;

Palmieri, Ex-Primeiro Secretário do PTB; e Romeu Ferreira


Queiroz, Deputado Estadual PSB-mG, (na época era PTB-mG),
(GAZETA DO POVO, 2012).

Os crimes em apreciação
Os acusados listados acima responderão pelos crimes de: For-
mação de Quadrilha (1 a 3 anos); Corrupção Ativa (2 a 12 anos); Cor-
rupção Passiva (2 a 12 anos); Peculato (2 a 12 anos); Evasão de Divisas

ouvidas em 18 Estados e no Exterior. São 50 mil páginas. Ali estão


descritos os crimes acima descritos e apontados os seus responsáveis.
Ao longo de sete anos surgiram as mais contraditórias expli-
cações ou negativas para a existência do esquema. O Ex-Presidente

candidamente que o “mensalão” não existiu. Os brasileiros voltam


os olhos para o Supremo Tribunal Federal. Esperam que 11 homens e
mulheres decidam conforme os fatos, a Constituição, as leis e a ética o
que se passou nos idos de 2005.
Salomão RibaS JUnioR
CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

ados
O volume de recursos usado para a compra de apoio político

do Relatório do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Joaquim


Barbosa, no julgamento da Ação Penal do “mensalão”. Segundo os
dados veiculados pela mídia, a maior parte desses recursos, em torno

SmP&B de marcos Valério. Esse alega que os recursos são empréstimos

Outro aspecto relevante é que o dinheiro público abasteceu


o esquema. no contrato entre a agência DnA e o Banco do Brasil,
R$2,9 milhões foram repasses irregulares de bônus de volume publi-

sem que houvesse comprovação dos serviços prestados. Demonstrou


o ministro Joaquim Barbosa que os repasses da VISAnET (alegação
da defesa de marcos Valério) eram do Banco do Brasil. Esquema
assemelhado ao celebrado pela agência de publicidade SmP&B com a
Câmara Federal. não houve prestação de serviços. O contrato era de

do recurso, que passou a ser considerada “propina”. O restante do

Após cinquenta sessões o Supremo Tribunal Federal, por


expressiva maioria dos seus integrantes, concluiu que: (i) houve desvio
de recursos públicos (Banco do Brasil e Câmara Federal) para o esquema
de compra de apoio parlamentar; (ii) não importa se os recursos foram
ou não usados para dívidas de campanha eleitoral; (iii) os empréstimos
bancários ao PT eram fraudulentos e o dinheiro foi para o esquema; (iv)
os políticos sacaram dinheiro — pessoalmente, por meio de parentes ou

usado para compra de apoio parlamentar no Congresso e não somente


para pagar dívidas de campanhas.
Com raras exceções, os indiciados foram condenados por um ou
mais dos crimes de que foram acusados (corrupção ativa e passiva, for-
mação de quadrilha, lavagem de dinheiro, peculato, evasão de divisas
e gestão fraudulenta). na conclusão desta obra o STF discutia aspectos
da dosimetria das penas (Folha de S. Paulo, 2012, p. A8).
CAPíTULO II
CORRUPÇÃO
97

brasileiro. neologismo usado nos corredores do Congresso quando


circularam informações sobre um pagamento mensal para parla-
mentares votarem a favor do governo, ganhou as manchetes pela boca

Depois dessa denúncia, passou a designar a prática que envolvia


corrupção política e outros crimes conexos. A opinião pública acolheu
o novo termo. Assim, outros atos reprováveis passaram a receber a
mesma denominação.
a) “mensalão” dos Tucanos (PSDB)
nas investigações parlamentares do “mensalão” do PT,
descobriu-se que o mesmo publicitário marcos Valério havia operado

sido o Senador Eduardo Azeredo do Partido da Social Democracia

Estado. As características, sem dúvida, eram semelhantes. O esquema

doações privadas ilegais. Estão envolvidas empresas estatais, como a


Companhia Energética de minas Gerais (CEmIG). O Procurador Geral
da República apresentou denúncia ao STF (20.11.2007), alegando que
o esquema do PSDB em minas Gerais foi “um laboratório” para o
“mensalão”. Em 03.11.2009, o STF aceitou a denúncia e abriu a ação
penal do “mensalão mineiro”.
b) “mensalão” do DEm
na linha de atrair para o mesmo problema, uma operação
(Caixa de Pandora) da Polícia Federal acabou por ser conhecida como
“mensalão” do DEm. Para os apologistas do caos, mais um grande
partido político na vala comum da corrupção. A Polícia Federal

Arruda (DEm).
Em 24 ações de busca e apreensão foram apreendidos R$700
mil reais, US$30 mil dólares, EU$5 mil euros e mais documentos,
mídias e computadores. no primeiro momento, evidenciou-se que
os principais suspeitos de corrupção vinham do governo anterior
(Joaquim Roriz — Partido Social Cristão — PSC). Também nesse caso,
o levantamento do véu começou por um ato bizarro. O Secretário de
Relações Institucionais, Durval Barbosa (servidor dos governos Joaquim
Roriz e José Roberto Arruda), resolve colaborar com a Polícia Federal em
Salomão RibaS JUnioR
98 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

troca de redução da pena em caso de condenação. Respondia a quase


três dezenas de processos judiciais. Passou a relatar a distribuição de
dinheiro a parlamentares, políticos e ao próprio Governador Arruda.
E entregava gravações em DVD que acabaram na mídia aberta. Foram
30 vídeos mostrando negociações espúrias e pagamento de corrupção.
Com a veiculação do vídeo em que recebia dinheiro o Governador
alegou que era para a caridade. Ao correr das investigações, Arruda,

preventivamente (art. 312 do Código Penal) em 11.02.2010. Afastado


do cargo, tentou negociar essa posição de simples afastamento. Foi

Vice-Governador Paulo Octávio. Foi eleito indiretamente o Governador


Rogério Rosso.
A Polícia Federal, ao concluir a operação Caixa de Pandora,
apontou o Governador José Roberto Arruda como chefe de organização
criminosa para desviar dinheiro público para o seu patrimônio e de
outros participantes. Perderam o mandato 11 Deputados Distritais.
Em processo no STF, em que estão indiciadas 37 pessoas, consta que

participantes do esquema. As empresas Linknet, Adler, Call Tecnologia,


Vertax, CTIS, Conecta e Unirepro recebiam recursos sem comprovação
dos serviços prestados. Aparentemente, o dinheiro desviado era
dividido entre o Governador (40%), o Vice (30%) e os Secretários de
Estado (20%) (COSTA, 2012).

2.8.2 Corrupção administrativa e improbidade


A distinção entre modalidades de corrupção pública não é muito
clara. Essa falta de clareza tanto se encontra na lei quanto entre os
doutrinadores. Pode-se dizer que a corrupção administrativa ocorre no
meio burocrático, isto é, na organização do Estado para gerir seus bens
e recursos, inclusive os humanos, para a realização do bem comum. É

está falando.
Para meirelles (2007), o próprio conceito de administração não

O conceito de administração pública não oferece contornos bem

diferentes campos em que se desenvolve a atividade administrativa. A


despeito disso, tentaremos balizar o âmbito de ação do administrador
CAPíTULO II
CORRUPÇÃO
99

público e assinalar os princípios jurídicos básicos que devem nortear a


gestão dos negócios estatais.
Em sentido lato, administrar é gerir interesses, segundo a lei, a moral e a

e interesses geridos são individuais, realiza-se administração particular;


se são da coletividade, realiza-se administração pública. Administração

nidade no âmbito federal, estadual ou municipal, segundo os preceitos


do Direito e da moral, visando ao bem comum.
no Direito Público — do qual o Direito Administrativo é um dos
ramos — a locução Administração Pública tanto designa pessoas e ór-
gãos governamentais como a atividade administrativa em si mesma.
Assim sendo, pode-se falar de administração pública aludindo-se aos

vidade.27 (mEIRELLES, 2007, p. 83).

Outro conceito aponta que:

As atividades administrativas — em seu sentido mais abrangente, a


expressão Administração pública designa o conjunto das atividades

consideradas de interesse público ou comum, numa coletividade ou


numa organização estatal. (BOBBIO et al., 1991, p. 10)

A ideia de burocracia, termo empregado no século xVIII, por


Vincent de Gournay:

do conceito de Burocracia, que se tornou em seguida o objetivo de


longas discussões por parte dos políticos e sociólogos, representa o
aspecto menos original dos estudos weberianos, enquanto todos os seus
elementos podem ser encontrados na ciência da administração alemã
da época. (BOBBIO et al., 1991, p. 125)

as seguintes:

1) O pré-requisito de uma organização burocrática é constituído pela

27
Adverte-se o leitor de que se escreve sempre a expressão Administração Pública, com
maiúsculas, quando há a referência a pessoas e órgãos administrativos, e com minúsculas
Salomão RibaS JUnioR
100 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

os detentores) do poder, o aparelho administrativo e os dominados.


Segue-se daí que as ordens são legítimas somente na medida em que
quem as emite não ultrapasse a ordem jurídica impessoal da qual ele
recebe o seu poder de comando e, sinceramente, que a obediência é

2) na base deste princípio geral da legitimidade, uma organização


burocrática é caracterizada por relações de autoridade entre posições
ordenadas sistematicamente de modo hierárquico, por esferas de

e por uma precisa separação entre pessoas e cargo no sentido de que os


funcionários e os empregados não possuem, a título pessoal, os recursos
administrativos, dos quais devem prestar contas, e não podem apoderar-
se do cargo. Além disso, as funções administrativas são exercidas de
modo continuado e com base em documentos escritos.
3) O pessoal empregado por uma estrutura administrativa burocrática
é tipicamente livre, é assumido contratualmente e, em virtude de suas

estipulado em dinheiro, tem uma carreira regulamentada e considera


o próprio trabalho como uma ocupação em tempo integral. (BOBBIO
et al., 1991, p. 125)

Já a Constituição brasileira, no caput do art. 37, estabelece que


“a administração pública direta e indireta de qualquer dos poderes da
União, dos Estados, do Distrito Federal e dos municípios obedecerá
aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade

de improbidade administrativa serão severamente punidos, inclusive


com o ressarcimento ao erário e perda de bens (Constituição Federal,

nessa linha, colhe-se em Dropa (2012) que:

A expressão designa, tecnicamente, a chamada “corrupção adminis-


trativa”, que, sob diversas formas, promove o desvirtuamento da
Administração Pública de seus fundamentos básicos de moralidade,
afrontando os princípios da ordem jurídica do Estado de Direito.
[...]
O conceito de improbidade é bem mais amplo do que o de ato lesivo

probo, integridade de caráter, honradez. Logo, improbidade é o mesmo


que desonestidade, mau caráter, falta de probidade.
[...]
CAPíTULO II
CORRUPÇÃO
101

como sendo “a corrupção administrativa, que, sob diversas formas,


promove o desvirtuamento da Administração Pública e afronta os
princípios nucleares da ordem jurídica (Estado de Direito, Democrático
e Republicano) revelando-se pela obtenção de vantagens patrimoniais

nistração Pública e pelo favorecimento de poucos em detrimento dos


interesses da sociedade, mediante a concessão de obséquios e privilégios
ilícitos.

ilícita de bens para o setor privado, é a improbidade administrativa.

saudada com um avanço extraordinário na defesa da boa e idônea

comportamentos e atos incompatíveis com o princípio da probidade que


permeia o texto constitucional e o direito administrativo. Assim, não
pode o servidor público, em especial, e os particulares, em geral, praticar
os atos que a lei menciona como ímprobos. Ela “dispõe sobre as sanções
aplicáveis aos agentes públicos nos casos de enriquecimento ilícito no
exercício de mandato, cargo, emprego ou função na administração
pública direta, indireta ou fundacional” (BRASIL, 2012a), de acordo com

os casos de má gestão ou gestão fraudulenta dos negócios públicos. É


a visão de Osório (2007, p. 42), ao ensinar que, “em diversos modelos
comparados, a improbidade já é tida como espécie de má gestão pública,
que comporta atuações dolosas e culposas”. mais recentemente, o
que se vê são que essas duas hipóteses de ocorrência da improbidade
administrativa deflagraram discussões ainda não pacificadas no

Em verdade, as noções de boa gestão ou administração da res


publica é antiga. Atribui-se ao pioneiro do direito administrativo francês
— fonte do direito administrativo brasileiro — maurice Hauriou, a
construção do princípio da moralidade administrativa (OSÓRIO, 2007,
p. 42). Hauriou, ao examinar as decisões do Conselho de Estado da

uma moralidade administrativa que vincula o administrador público

Administração Pública.
Salomão RibaS JUnioR
102 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

Decomain (2007, p. 18) recua ao período colonial para demonstrar


que são antigas as regras sancionatórias da má gestão e a busca de uma
administração sem desvio. Examina depois o Código Penal do Império
(1922-1989) que punia condutas que pudessem ofender o Tesouro ou a
propriedade pública. no começo da República, o Código Penal (Decreto

boa ordem e administração pública’ genericamente designados como


‘malversações, absurdas e omissões dos funcionários públicos’ punindo
os crimes de peita e suborno” (DECOmAIn, 2007, p. 13). Assim, segue-
se no já visto Código Penal atual em interessante processo de revisão
no Congresso nacional.
Em 1988, o princípio do direito administrativo que estabelece a
responsabilidade do servidor em manter-se probo, teve sua importância

estabelecendo que,

[...] os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos


direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos
bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei,
sem prejuízo da ação penal cabível (BRASIL, 2012b).

Em verdade, o servidor está sujeito a quatro ordens de respon-


sabilidade: administrativa; civil; criminal; e improbidade administra-
tiva (mEIRELLES, 2007, p. 499). Dessa forma, essa última hipótese de
transgressão deve ser sindicada e sancionada, se for o caso, “indepen-
dentemente das sanções penais, civis e administrativas” (mEIRELLES,

improbidade administrativa. O que alega é que nem a Constituição nem


a Lei de Improbidade Administrativa conceituam o ato de improbidade.

Constituição do Brasil” que anota: “os atos de improbidade, é dizer,

apud DECOmAIn, 2007, p. 22).


Cita, entre outros, José Cretella Junior e Juarez Freitas. O pri-
meiro invoca “o princípio da moralidade administrativa como um
dos fundamentos para o reconhecimento de que atos de improbidade

art. 37 da Constituição Federal (CRETELLA JUnIOR, 1991, p. 2257 apud


DECOmAIn, 2007, p. 22).
CAPíTULO II
CORRUPÇÃO
103

Já o renomado jurista, professor e doutrinador Juarez Freitas é


lembrado com citação de trecho do seu laureado “O controle dos atos
administrativos e os princípios fundamentais”, onde, pela clareza, é
oportuno repisar o que diz:

Associado ao juridicamente autônomo princípio da moralidade posi-

o princípio da probidade administrativa consiste na proibição de atos


desonestos ou desleais para com a Administração Pública, praticados por
agentes seus ou terceiros, com os mecanismos sancionatórios inscritos

cimento ilícito ou o dano material, a violação do princípio da moralidade


pode e deve ser considerada, em si mesma, apta para caracterizar a
ofensa ao princípio da probidade administrativa, na senda correta de se

em si mesma, inclusive naqueles casos em que se não se vislumbrarem,


incontrovertidos, os danos materiais (FREITAS, 1999 apud DECOmAIn,
2007, p. 23).

Para construir um conceito de improbidade administrativa,


Alexandre de moraes (apud ZILVETI; LOPES, 2004) recorda que:

resultaram prejuízos para a Fazenda Pública, desde que resultassem


locupletamento ilícito, e subsidiariamente a reparação civil do dano e
a incorporação ao patrimônio público de bens de aquisição ilegítima
de pessoa que exercesse ou tivesse exercido função pública. (mORAES
apud ZILVETI; LOPES, 2004, p. 151)

A partir desse marco inicial, a matéria ganhou relevo consti-

disciplinamento.

apud
ZILVETI; LOPES, 2004, p. 151)
Salomão RibaS JUnioR
104 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

A Lei Bilac Pinto, de 1958, estabeleceu regras para combater o

era sancionar severamente a improbidade, com a perda dos bens, por


dano ao erário ou, ainda, enriquecimento ilícito no exercício de função
pública.
Assim,

Atos de improbidade administrativa são aqueles que, possuindo na-

indiretamente os princípios constitucionais e legais da administração


pública, independentemente de importarem enriquecimento ilícito ou
de causarem prejuízo material ao erário público.

É irresponsável aquele que macula, tisna, atinge, agride a moralidade


pública, sendo ímprobo administrador, favorecendo terceiros, prati-
cando a concussão ou sendo ímprobo administrador, favorecendo
terceiros, praticando a concussão ou sendo instrumento de corrupção.

genericamente, corrupção
como “um desvio de conduta aberrante em relação ao padrão moral
consagrado pela comunidade. não apenas um desvio, mas um desvio
pronunciado, grave, insuportável”, e, , como “a conduta
de autoridade que exerce o Poder de modo indevido, em benefício de
interesse privado, em rota de uma retribuição de ordem material”.
Assim, para que se evite o perigo de uma administração corrupta

código da moralidade administrativa” (mORAES apud ZILVETI;


LOPES, 2004, p. 152).
São, portanto, atos de natureza civil, os atos de improbidade
administrativa. Essa caracterização traz como independentes as res-
ponsabilidades civil e penal. Tanto é que a Lei de Improbidade Admi-

a sancionar os administradores ímprobos ocorre sem prejuízo da ação


penal.
CAPíTULO II
CORRUPÇÃO
105

Esclarece Alexandre de moraes (apud ZILVETI; LOPES, 2004,


p. 154) que:

O agente público que, utilizando-se de seu cargo, se apropria ilicitamente

por ato de improbidade, sem prejuízo da responsabilidade penal por


crime contra a administração, prevista no Código Penal ou na legislação
penal especial.
Fábio Konder Comparato ensina que “a própria Constituição distingue
e separa a ação condenatória do responsável por atos de improbidade

obviamente porque aquela demanda não tem natureza penal”.

Supremo Tribunal Federal, conhecido como “mensalão”, o qual envolve


várias pessoas que são ou foram agentes públicos particularmente
em 2005. Recentemente, alguns dos réus e que também são acusados
de improbidade administrativa em Ação Civil Pública tiveram sua

especial) na ação penal anteriormente referida. Contudo, a decisão do


STJ, na ação pública de improbidade administrativa, em nada afeta a
ação penal que corre por razões de foro especial, no Supremo Tribunal
Federal.
De outra parte, a Comissão Especial designada para propor
alterações na legislação penal, inclusive no Código Penal brasileiro, que
data de 1940, incluiu o enriquecimento ilícito entre os crimes a serem
sancionados. A proposta de redação é a seguinte:

Art. 277. Adquirir, vender, emprestar, alugar, receber, ceder, utilizar ou


usufruir de maneira não eventual de bens ou valores móveis ou imó-
veis, cujo valor seja incompatível com os rendimentos auferidos pelo
funcionário público em razão de seu cargo ou por outro meio lícito.
Pena - prisão, de um a cinco anos, além da perda dos bens, se o fato não
constituir elemento de outro crime mais grave.
Parágrafo único. As penas serão aumentadas de metade a dois terços
se a propriedade ou a posse dos bens e valores for atribuída fraudu-
lentamente a terceiras pessoas. (BRASIL, 2012c)

tiver natureza dolosa, houver obtenção de vantagem para o agente,


Salomão RibaS JUnioR
CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

ilicitude da vantagem e nexo causal entre o exercício da função e a


vantagem indevida, se está diante de uma conduta típica. O referido

caso ou casos de enriquecimento ilícito.

nesse sentido:

quecimento ilícito auferir qualquer tipo de vantagem patrimonial


indevida em razão do exercício de cargo, mandato, função, emprego ou

I - receber, para si ou para outrem, dinheiro, bem móvel ou imóvel,


ou qualquer outra vantagem econômica, direta ou indireta, a título de

resse, direto ou indireto, que possa ser atingido ou amparado por ação
ou omissão decorrente das atribuições do agente público;
II - perceber vantagem econômica, direta ou indireta, para facilitar a
aquisição, permuta ou locação de bem móvel ou imóvel, ou a contratação

valor de mercado;
III - perceber vantagem econômica, direta ou indireta, para facilitar a
alienação, permuta ou locação de bem público ou o fornecimento de
serviço por ente estatal por preço inferior ao valor de mercado;
IV - utilizar, em obra ou serviço particular, veículos, máquinas, equi-

bem como o trabalho de servidores públicos, empregados ou terceiros


contratados por essas entidades;
V - receber vantagem econômica de qualquer natureza, direta ou indi-
reta, para tolerar a exploração ou a prática de jogos de azar, de lenocínio,

ilícita, ou aceitar promessa de tal vantagem;


VI - receber vantagem econômica de qualquer natureza, direta ou
indireta, para fazer declaração falsa sobre medição ou avaliação em
obras públicas ou qualquer outro serviço, ou sobre quantidade, peso,
medida, qualidade ou característica de mercadorias ou bens fornecidos

VII - adquirir, para si ou para outrem, no exercício de mandato, cargo,


emprego ou função pública, bens de qualquer natureza cujo valor seja

VIII - aceitar emprego, comissão ou exercer atividade de consultoria


ou assessoramento para pessoa física ou jurídica que tenha interesse
suscetível de ser atingido ou amparado por ação ou omissão decorrente
das atribuições do agente público, durante a atividade;
CAPíTULO II
CORRUPÇÃO
107

Ix - perceber vantagem econômica para intermediar a liberação ou


aplicação de verba pública de qualquer natureza;
x - receber vantagem econômica de qualquer natureza, direta ou indi-
retamente, para omitir ato de ofício, providência ou declaração a que
esteja obrigado;
xI - incorporar, por qualquer forma, ao seu patrimônio bens, rendas,
verbas ou valores integrantes do acervo patrimonial das entidades

xII - usar, em proveito próprio, bens, rendas, verbas ou valores inte-

desta lei. (BRASIL, 2012a)

o patrimônio público. Precedido quase das mesmas características do


artigo anterior (conduta dolosa ou culposa, ilícita, existência de lesão
patrimonial para o ente público, nexo causal), não é necessário que
tenha havido obtenção de vantagem patrimonial pelo agente. Como
se vê nas treze condutas alinhadas pelo artigo:

Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao


erário qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda
patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos

damente:
I - facilitar ou concorrer por qualquer forma para a incorporação ao
patrimônio particular, de pessoa física ou jurídica, de bens, rendas,
verbas ou valores integrantes do acervo patrimonial das entidades

II - permitir ou concorrer para que pessoa física ou jurídica privada


utilize bens, rendas, verbas ou valores integrantes do acervo patrimonial

valores do patrimônio de qualquer das entidades mencionadas no art.

IV - permitir ou facilitar a alienação, permuta ou locação de bem inte-

desta lei, ou ainda a prestação de serviço por parte delas, por preço
inferior ao de mercado;
V - permitir ou facilitar a aquisição, permuta ou locação de bem ou
serviço por preço superior ao de mercado;
Salomão RibaS JUnioR
108 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

m observância das normas legais e

VIII - frustrar a licitude de processo licitatório ou dispensá-lo indevi-


damente;
Ix - ordenar ou permitir a realização de despesas não autorizadas em
lei ou regulamento;
x - agir negligentemente na arrecadação de tributo ou renda, bem como

xI - liberar verba pública sem a estrita observância das normas perti-

xII - permitir, facilitar ou concorrer para que terceiro se enriqueça ilici-


tamente;
xIII - permitir que se utilize, em obra ou serviço particular, veículos, má-
quinas, equipamentos ou material de qualquer natureza, de propriedade

lei, bem como o trabalho de servidor público, empregados ou terceiros


contratados por essas entidades.
xIV - celebrar contrato ou outro instrumento que tenha por objeto a pres-
tação de serviços públicos por meio da gestão associada sem observar
as formalidades previstas na lei;

prévia dotação orçamentária, ou sem observar as formalidades previstas


na lei. (BRASIL, 2012a)

probidade a conduta dolosa, comissiva ou omissiva ilícita (sem gerar


enriquecimento ilícito ou lesão ao patrimônio público), violação dos
deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade e lealdade, atentado
contra os princípios da Administração e o já pré-falado nexo causal:

Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra


os princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que
viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade

daquele previsto, na regra de competência;


II - retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício;
III - revelar fato ou circunstância de que tem ciência em razão das
atribuições e que deva permanecer em segredo;
IV - negar pu
CAPíTULO II
CORRUPÇÃO
109

V - frustrar a licitude de concurso público;


VI - deixar de prestar contas quando esteja obrigado a fazê-lo;
VII - revelar ou permitir que chegue ao conhecimento de terceiro, antes

capaz de afetar o preço de mercadoria, bem ou serviço. (BRASIL, 2012a)

Ainda que não haja enriquecimento público objetivamente iden-

violam os deveres de honestidade e lealdade são de gravidade extrema


e podem ser causas dos outros prejuízos objetivos ao erário.

2.8.2.1 Sanções por improbidade


Vem da Constituição o primeiro comando para sancionar o
administrador ímprobo com a suspensão dos direitos políticos.28 As
sanções são a perda da função pública e o ressarcimento ao erário.
Como já foi visto, são sanções civis, embora de extrema severidade e

Deve-se ainda anotar que as penas que impõem a perda da função


pública ou a restrição de direitos são poucas no direito penal. A rigor,
somente o que consta dos arts. 47, I, e 92, I (Código Penal). nas sanções

por até 10 anos e perda da função pública (Constituição Federal, art. 12).
De outra parte, anota martins Junior (2002) que há uma varie-
dade expressiva de meios e modos de combater a corrupção, a imo-
ralidade administrativa e a improbidade administrativa. São medidas
preventivas e punitivas, todas importantes para assegurar a boa gestão
dos negócios públicos.

2.8.2.2 Improbidade e crimes dos Prefeitos


Ainda no plano dos crimes contra o erário no âmbito dos muni-

a análise de Hely Lopes meire

28
Art. 15. É vedada a cassação de direitos políticos, cuja perda ou suspensão só se dará nos
casos de: [...]
V
Salomão RibaS JUnioR
110 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

[...] as responsabilidades do prefeito, como chefe do executivo municipal,


serão estudadas sob o tríplice aspecto penal, político-administrativo
e civil, visto que no desempenho de suas funções podem incidir em

Dessa forma, no caso de corrupção ou concussão, o Prefeito


responde pelos crimes nos termos do Código Penal. Além disso,
pode responder por infrações político-administrativas perante a Câmara
de Vereadores com a perda, se julgado responsável, do mandato. Em

de 10.07.2001) também preveem a responsabilização do Prefeito por


improbidade administrativa.

A Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) não surgiu como objetivo


declarado de combater a corrupção. A transparência de todos os atos
administrativos que ela obriga é um instrumento indispensável para
conter os atos danosos ao erário. A corrupção, por suas variadas formas,
tem no segredo, no sigilo, na ambiguidade e na ausência de publicidade,
o campo ideal para surgir e prosperar com êxito. Assim, algumas

e execução dos orçamentos públicos será abordada a maioria desses


procedimentos. neste momento é oportuno tratar do que se chamou

19.10.2000, ela foi considerada como consequência da LRF, publicada


no mesmo ano, no mês de maio.
Por essa lei foram criminalizadas algumas condutas adminis-
trativas, promovendo as alterações necessárias no Código Penal (DL

Contratação de operação de crédito


Art. 359-A. Ordenar, autorizar ou realizar operação de crédito, interno
ou externo, sem prévia autorização legislativa:
Pena - reclusão, de 1 (um) a 2 (dois) anos.
CAPíTULO II
CORRUPÇÃO
111

Parágrafo único. Incide na mesma pena quem ordena, autoriza ou realiza


operação de crédito, interno ou externo:
I - com inobservância de limite, condição ou montante estabelecido em
lei ou em resolução do Senado Federal;
II - quando o montante da dívida consolidada ultrapassa o limite
máximo autorizado por lei. (BRASIL, 2012c)

Inscrição de despesas não empenhadas em restos a pagar:

Art. 359-B. Ordenar ou autorizar a inscrição em restos a pagar, de des-


pesa que não tenha sido previamente empenhada ou que exceda limite
estabelecido em lei:

Assunção de obrigação no último ano do mandato ou legislatura:

Art. 359-C. Ordenar ou autorizar a assunção de obrigação, nos dois


últimos quadrimestres do último ano do mandato ou legislatura, cuja

parcela a ser paga no exercício seguinte, que não tenha contrapartida

Pena - reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos. (BRASIL, 2012c)

Ordenação de despesa não autorizada:

Art. 359-D. Ordenar despesa não autorizada por lei: Pena - reclusão, de
1 (um) a 4 (quatro) anos (BRASIL, 2012c).

Prestação de garantia graciosa:

Art. 359-E. Prestar garantia em operação de crédito sem que tenha


sido constituída contragarantia em valor igual ou superior ao valor da
garantia prestada, na forma da lei:
Pena - detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano. (BRASIL, 2012c)

não cancelamento de restos a pagar:

Art. 359-F. Deixar de ordenar, de autorizar ou de promover o cance-


lamento do montante de restos a pagar inscrito em valor superior ao
permitido em lei:
Salomão RibaS JUnioR
112 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

Aumento de despesa total com pessoal, no último ano do


mandato ou legislatura:

Art. 359-G. Ordenar, autorizar ou executar ato que acarrete aumento de

do mandato ou da legislatura:
Pena - reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos. (BRASIL, 2012c)

Oferta pública ou colocação de títulos no mercado:

Art. 359-H. Ordenar, autorizar ou promover a oferta pública ou a

tenham sido criados por lei ou sem que estejam registrados em sistema
centralizado de liquidação e de custódia:
Pena - reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos. (BRASIL, 2012c)

os crimes de responsabilidade. Pela alteração foram acrescentadas


outras hipóteses de crimes contra a Lei Orçamentária. A criminali-
zação é de condutas vedadas pela LRF. Finalmente, a Lei de Crimes

responsabilidade dos Prefeitos e Vereadores”, acrescentando hipóteses

2.8.2.4 Crimes e infrações na Lei de Licitações


Outra lei que contém dispositivos para combater a corrupção

questões penais em outro ramo do Direito. Assim, para Justen Filho

elementos do crime”. O mesmo autor considera que importante


inovação da Lei de Licitações foi “a consagração de uma tutela penal

a) dispensar ou inexigir licitação fora das hipóteses previstas

gibilidade (art. 89);


CAPíTULO II
CORRUPÇÃO
113

b) frustrar ou fraudar, mediante ajuste, combinação ou qualquer


outro expediente, o caráter competitivo do procedimento lici-
tatório, com o intuito de obter, para si ou para outrem, van-
tagem decorrente da adjudicação do objeto da licitação (art.
90);
c) patrocinar, direta ou indiretamente, interesse privado perante

celebração de contrato, cuja invalidação vier a ser decretada


pelo Poder Judiciário (art. 91);

vantagem, inclusive prorrogação contratual, em favor do adju-


dicatário, durante a execução dos contratos celebrados com
o Poder Público, sem autorização em lei, no ato convocatório
da licitação ou nos respectivos instrumentos contratuais, ou,
ainda, pagar fatura com preterição da ordem cronológica de
sua exigibilidade, observando o disposto no art. 121 da Lei
Licitatória (art. 92);
e) impedir, perturbar ou fraudar a realização de qualquer ato de
procedimento licitatório (art. 93);
f) devassar o sigilo de proposta apresentada em procedimento
licitatório, ou proporcionar a terceiro o ensejo de devassá-lo
(art. 94);
g) afastar ou procurar afastar licitante, por meio de violência,
grave ameaça, fraude ou oferecimento de vantagem de qual-
quer tipo (art. 95);
h) fraudar, em prejuízo da Fazenda Pública, licitação instaurada
para aquisição ou venda de bens ou mercadorias, ou contrato

qualquer interessado nos registros cadastrais ou promover


indevidamente a alteração, suspensão ou cancelamento de
registro do inscrito (art. 98).
Pontua-se que todos os crimes acima descritos são de ação penal
pública incondicionada, cabendo ao ministério Público promovê-la
(art. 100). Dessa forma, para melhorar o ferramental do controle social

do ministério Público, inclusive verbalmente (art. 101). mais ainda,


nessa mesma linha, pode ser admitida ação penal privada, subsidiária
Salomão RibaS JUnioR
114 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

da pública, se o ministério Público não ajuizar a ação própria no prazo


legal (art. 103).

2.8.3 Corrupção eleitoral


Entendendo-se a corrupção como uma ruptura de uma norma

seu objetivo, que é a mudança ilícita da vontade do eleitor. Isso pode


ser obtido por muitos meios e modos.

do Brasil.

Art. 299. Dar, oferecer, prometer, solicitar ou receber, para si ou para


outrem, dinheiro, dádiva, ou qualquer outra vantagem, para obter ou
dar voto e para conseguir ou prometer abstenção, ainda que a oferta
não seja aceita. Pena: reclusão até quatro anos e pagamento de cinco a
quinze dias-multa. (BRASIL, 2012l)

Como se vê, o crime de corrupção eleitoral é menor do que a


corrupção eleitoral. O alcance da norma penal consagrada no Código
Eleitoral é limitado. Basta ver que algumas condutas que corrompem
a vontade livre do eleitor e causam prejuízo aos demais candidatos
são apenas vedadas.
As duas grandes questões a serem enfrentadas para que as
eleições sejam de fato livres e democráticas dizem respeito a duas ordens
poderosas, duas estruturas notáveis de poder: o poder econômico e o
poder da máquina burocrática.
O uso de uma ou outra pode conduzir o eleitor a votar de acordo
com interesses ilegítimos e, não raro, exclusos. É na eleição, condi-
cionada por essas variáveis, que se começa a construir a corrupção
administrativa, a improbidade e a grande corrupção política.

Desse modo, nem tudo o que se poderia chamar de “corrupção elei-


toral” coincide com o crime de corrupção eleitoral. O uso da máquina
governamental em prol de uma candidatura, por exemplo, não é cor-

Este é um comportamento antigo e reiterado na história brasileira.


Desde sempre, trata-se de uma forma de abuso de poder econômico e

de nossa população. (GOnÇALVES, 2012)


CAPíTULO II
CORRUPÇÃO
115

A denominação popular para essas práticas é a compra de votos.


É uma espécie de corrupção ativa. Do lado do eleitor, tem-se a venda
do voto, o que se enquadra como comportamento negativo passivo.

venda, oferece seu voto em troca de alguma vantagem.


Como assinalam os estudiosos, a compra e a venda de votos
é antiga. Da mesma forma, no campo da legislação para inibi-la
encontram-se medidas bastante recuadas no tempo. no nascedouro

Código Eleitoral. Isso ocorreu em 1935, 1945 e 1950. no período militar

para a compra de votos foi agravada. Como se viu, agora ela é de 1 a


4 anos de reclusão e pagamento de 5 a 15 dias-multa.
Uma nova lei acrescentou outras condutas ilegais (1999). É
saudada como uma das notáveis conquistas da vontade popular e dos
segmentos da sociedade civil que se dedicam a combater a corrupção
em suas variadas formas e especialmente a eleitoral. Fruto de uma
Campanha da Fraternidade, movimento periódico da Igreja Católica

consolidar medidas importantes. Foi o coroamento de uma campanha


apoiada por todas as religiões e pessoas independentemente de
convicções políticas. Seu slogan
consequências”. A Constituição brasileira permite a iniciativa popular

um milhão de assinaturas.

que reza:

captação de sufrágio, vedada por esta Lei, o candidato doar, oferecer,

vantagem pessoal de qualquer natureza, inclusive emprego ou função


pública, desde o registro da candidatura até o dia da eleição, inclusive,

ou do diploma, observado o procedimento previsto no art. 22 da Lei

Essa disposição legal é um esforço, no sentido de garantir lisura e


idoneidade ao processo eleitoral, afastando as condutas que distorçam o
Salomão RibaS JUnioR
CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

resultado eleitoral. na mesma linha dos crimes eleitorais, eles agridem


os princípios básicos para a vida em comunidade. Entre esses, o da
democracia. É princípio constitucional, mas é mais do que isso, é um
valor precioso, no dizer de José Jairo Gomes:

Trata-se de um dos mais preciosos valores da atualidade. Os valores


são construídos historicamente. Com o tempo, a realização de certas
idéias torna-se consenso na comunidade, passando a moldar-lhe o

transformam-se em referências importantes para a tomada de decisões,


e mesmo para a subsistência daquele modelo de vida social. Impõem-
se naturalmente, de maneira a moldar a estrutura e o pensamento
político da sociedade, participando de sua própria identidade, de seu
modo de ser.
Assim ocorre com a democracia. As inúmeras batalhas travadas em torno
do alargamento da liberdade, para a conquista e a manutenção do poder
político, a luta por maior participação popular no governo e, pois, no

efetivação de direitos sociais, a evolução das instituições — tudo somado

velmente como verdades históricas. (GOmES, 2010, p. 29)

pessoa e da soberania popular. Igualmente, a democracia — de um


Estado Democrático de Direito — garante a cidadania, a dignidade da
pessoa humana, os valores sociais do trabalho e da livre-iniciativa e, por
último, mas não menos importante, o pluralismo político (Constituição

ser legitimado pelo voto popular.


O voto é um dos mais importantes instrumentos democráticos,
pois enseja o exercício da soberania popular e do sufrágio. Cuida-se do
ato pelo qual os cidadãos escolhem os ocupantes dos cargos político-
eletivos. Por ele concretiza-se o processo de manifestação da vontade
popular (GOmES, 2010, p. 29).
É assim que o voto é secreto, direto, igual para todos, livre e, até
mesmo, obrigatório. É um poder-dever decorrente da cidadania. Se
é livre, é porque permite a cada pessoa escolher livremente partidos
políticos e candidatos. É contra qualquer tentativa de obstruir o exercício
dessas condições que se erguem as barreiras legais e éticas. Elas se
destinam a coibir abusos, que tanto podem ser do poder econômico
quanto do poder político, ou da associação de ambos.
CAPíTULO II
CORRUPÇÃO
117

Abuso, nos léxicos, é:

Abuso. [Do lat. abusu.] S.m. 1. mau uso, ou uso errado, excessivo ou
injusto; excesso, descomedimento, abusão. 2. exorbitância de atribuições
ou poderes. 3. aquilo que contraria as boas normas, os bons costumes
[...]. (FERREIRA, 1999, p. 17).

ilegítimo, abusão, excesso 2. uso excessivo ou imoderado de poderes


3. falta de comedimento, exagero, excesso [...]. (HOUAISS; VILLAR,
2001, p. 33)

Assim, o abuso do poder econômico é usar o patrimônio ou os


meios a ele inerentes para forçar o eleitor a votar dessa ou daquela
maneira, a escolher este ou aquele candidato. Tudo conforme as conve-
niências dos detentores do poder econômico.

O termo “econômico”, na expressão em apreço, deve ser tomado em seu

ao controle de bens ou serviços.


Destarte, a expressão “abuso de poder econômico” deve ser compre-
endida como a concretização de ações que denotem mau uso de recursos
patrimoniais detidos, controlados ou disponibilizados ao agente.

ocorrem, revelando a existência de exorbitância, desbordamento ou

estatal. É quando agentes públicos se valem de suas funções e de meios


materiais do Poder Público para atuar, especialmente, nas campanhas
eleitorais. Essa fuga dos deveres constitucionais e funcionais para
atender interesses político-partidários é uma forma de corrupção
eleitoral. É o uso do que se denomina “máquina administrativa”; O
interesse público é afastado ou mesmo suprimido, para dar lugar a
interesses políticos e eleitorais. O primeiro e os segundos não são neces-
sariamente coincidentes.

É intuitivo que a máquina administrativa não pode ser colocada a


serviço de candidaturas no processo eleitoral, já que isso desvirtuaria
completamente a ação estatal, além de desequilibrar o pleito — ferindo
de morte a isonomia que deve permear as campanhas e imperar entre
Salomão RibaS JUnioR
118 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

os candidatos — e fustigar o princípio republicano, que repudia


tratamento privilegiado a pessoas ou classes sociais. no Brasil, é público

Essas são as razões pelas quais se têm as vedações dos arts. 73

dos servidores públicos.


É assim que são vedados atos para:

Art. 73. São proibidas aos agentes públicos, servidores ou não, as se-
guintes condutas tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre
candidatos nos pleitos eleitorais:
I - ceder ou usar, em benefício de candidato, partido político ou coli-

indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Territórios e dos


municípios, ressalvada a realização de convenção partidária;
II - usar materiais ou serviços, custeados pelos Governos ou Casas
Legislativas, que excedam as prerrogativas consignadas nos regimentos
e normas dos órgãos que integram;
III - ceder servidor público ou empregado da administração direta ou
indireta federal, estadual ou municipal do Poder Executivo, ou usar de
seus serviços, para comitês de campanha eleitoral de candidato, partido
político ou coligação, durante o horário de expediente normal, salvo se
o servidor ou empregado estiver licenciado;
IV - fazer ou permitir uso promocional em favor de candidato, partido
político ou coligação, de distribuição gratuita de bens e serviços de
caráter social custeados ou subvencionados pelo Poder Público.
[...] (BRASIL, 2012h).

Art. 377. O serviço de qualquer repartição, federal, estadual, municipal,


autarquia, fundação do Estado, sociedade de economia mista, entidade
mantida ou subvencionada pelo poder público, ou que realiza contrato
com este, inclusive o respectivo prédio e suas dependências não poderá

(BRASIL, 2012i)

Além dessas hipóteses de crime eleitoral e vedação de condutas,


pode-se dizer que há:
CAPíTULO II
CORRUPÇÃO
119

a) crimes no processo de inscrição eleitoral, ou em sentido amplo,


na formação do colégio eleitoral;
b) crimes na organização e funcionamento dos partidos políticos;
c) na propaganda eleitoral;
d) no processo de votação (violação do sigilo, transporte de elei-
tores, oferecimento de comida no dia da eleição);
e) no processo de captura e de apuração dos resultados e do
preenchimento correto dos relatórios e preservação do sigilo
da urna;
f) crimes contra a correta organização e adequado funciona-
mento dos serviços eleitorais; e

2.8.3.1 A Lei da Ficha Limpa


Outra medida destinada a combater a corrupção eleitoral nasceu
de movimentos organizados da sociedade civil. De outro projeto de
iniciativa popular surgiu a oportunidade de impedir-se que participem
das eleições pessoas condenadas por órgãos judiciais colegiados; que
renunciaram a mandatos para fugir da cassação; abusaram do poder
ilicitamente; ou tiveram contas rejeitadas. nesse último caso, por irre-

I - [...]
g) os que tiverem suas contas relativas ao exercício de cargos ou funções

doloso de improbidade administrativa, e por decisão irrecorrível do


órgão competente, salvo se esta houver sido suspensa ou anulada pelo
Poder Judiciário, para as eleições que se realizarem nos 8 (oito) anos
seguintes, contados a partir da data da decisão, aplicando-se o disposto
no inciso II do art. 71 da Constituição Federal, a todos os ordenadores
de despesa, sem exclusão de mandatários que houverem agido nessa
condição. (BRASIL, 2012k)

A Lei da Ficha Limpa estabelece sanções para atos ilegais não


típicos da corrupção. Ao mesmo tempo, veda as candidaturas de
pessoas que não agiram corretamente no exercício de funções públicas.
O alcance da regra só será bem conhecido com a sua aplicação prática.
Salomão RibaS JUnioR
120 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

se pode dizer da interpretação do que é “ato doloso de impropriedade


administrativa”.

eleitorais como “aquelas condutas positivas ou negativas que se tra-


duzem na quebra de um dever cívico de uma sociedade jurídica e

apreciadas pela justiça humana, que interferem na conservação da


ordem institucional, política e democrática de modo a que sua defesa
requeira a aplicação de sanções penais”. (ALVIm; nORAT, 2012, p. 231)

O mesmo autor chama a atenção para a diferença entre as irre-


gularidades e os crimes eleitorais.

Somente se elevam a crimes eleitorais as condutas danosas que o

revela-se de fácil compreensão, quando se lembra da diferença entre as

guisa de exemplo, a veiculação de propaganda por outdoor constitui


ilícito, sem que se possa dizer que caracterize crime. Oposto é o caso
da propaganda de boca de urna, considerada grave o bastante para
representar infração penal. (ALVIm; nORAT, 2012, p. 231)

fase em que ocorrem — como visto acima — é adotada por Citadini,


conforme Alvim e norat (2012, p. 232).
Além dessas fases, devem-se considerar outros aspectos impor-
tantes da campanha política, que podem se caracterizar como corrupção
eleitoral. São as infrações que podem ser praticadas por candidatos —
ou futuros candidatos — ou por terceiros em nome destes.
Estão entre esses aspectos:
a) fazer campanha fora do período que a lei autoriza;

torais;
c) transformar repartições públicas em comitês de determinados
partidos ou candidato;
d) condicionar o atendimento de pleitos administrativos a com-
promisso eleitoral; e,
f) uso promocional em favor de partido ou candidato da distri-
buição de bens e serviços sociais custeados pelo Poder Público.
Outra forma de corrupção ocorre na manipulação da arrecadação,
aplicação e prestação de contas de recursos para campanha eleitoral.
CAPíTULO II
CORRUPÇÃO
121

É o momento em que podem surgir os “laranjas” e o “Caixa 2”. no


primeiro caso são os contribuintes de fachada para esconder os verda-
deiros doadores. no segundo, recebimento de recursos ilegais que são

nessa mesma prestação de contas já viciada pela falsidade na

de “notas frias”, que se referem a serviços que não foram prestados


ou utilizados de outra forma. É de onde sai o dinheiro para a compra
direta de votos.
Outro campo é o do superfaturamento ou subfaturamento de

os desvios na produção (caríssima) de programas de TV e rádio ou da


publicidade (propaganda eleitoral).

mes apontados no processo do “mensalão”. Segundo a denúncia do


Procurador Geral da República, acolhida pelo Supremo Tribunal Fe-
deral, o publicitário Duda mendonça recebeu, em conta no exterior,
R$10 milhões de reais a título de pagamento por serviços prestados
em campanha eleitoral do PT. O fato existiu e foi reconhecido pelo
publicitário e aguarda decisão, quanto ao crime, do STF.
O uso das pesquisas eleitorais também se caracteriza como

A apresentação de uma pesquisa falsa como verdadeira ou com


resultados adulterados é grave. no passado, o abuso de enquetes e

entre si, da mídia e da Justiça Eleitoral. As empresas pesquisadoras

para divulgação pública.


É a regra do art. 33 da Lei Eleitoral, de acordo com Alvim e norat
(2012, p. 129):

O artigo 33 da LE dispõe que as entidades e empresas que realizarem

até 5 dias antes da divulgação de seus resultados, para cada pesquisa,


as seguintes informações: a) quem contratou a pesquisa; b) o valor e a
origem do dinheiro gasto no trabalho; c) a metodologia utilizada e o
período de realização da pesquisa; d) o plano amostral e a ponderação
Salomão RibaS JUnioR
122 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

nível econômico), bem como o local em que a pesquisa foi realizada, o

de campo; f) o questionário completo aplicado ou a ser aplicado; g) o


nome de quem pagou pela realização do trabalho.

Posteriormente ao registro, pode ser instaurado processo de

partidos e coligações. Tanto é que, após o registro, os outros partidos


podem ter acesso aos documentos que fundamentam as pesquisas

pessoas pesquisadas. Essas cautelas são necessárias para coibir o abuso


no manejo de um importante instrumento de orientação, não de pro-
paganda em si.

2.8.3.2 Fraudes em eleições

basta anotar o que se segue. no município “A” de 1300 eleitores —

ou grupo de empresas comprar 200 votos, ou menos, está garantida


a eleição, de acordo com os seus interesses. Porém, se a Prefeitura
contratar, mesmo temporariamente, 200 empregados, está decidida
a eleição de acordo com a vontade do Prefeito. A união entre as duas
expressões do poder reduz os custos da corrupção para ambos e otimiza
os resultados pretendidos.
no mesmo arsenal que os corruptores podem acionar para
ganhar eleições podem até “contrabandear” eleitores. É o caso do
município de Oliveira de Fátima (TO) que, com apenas 700 habitantes

registrados. De acordo com levantamento veiculado pela revista Veja


em 28 ago. 2012, em que confrontou os dados da Justiça Eleitoral com
os do IBGE, “sete em cada dez cidades brasileiras tem mais eleitores

Outro caso concreto registrado pela mesma publicação mostra


uma fraude no interior de minas Gerais.

Em abril, 230 pessoas transferiram seu título eleitoral de Uberlândia


(445000 eleitores) para Indianópolis (eleitorado de 5000). na primeira
cidade, esse movimento passou despercebido. mas no segundo muni-
cípio, onde bastam 95 votos para eleger um vereador e 230 podem
CAPíTULO II
CORRUPÇÃO
123

eleitor recebeu 50 reais para mudar o título; outros 50 reais seriam pagos
depois da eleição, em outubro. A Justiça descobriu a fraude e cancelou
as transferências. (Veja, 2012)

no terceiro caso, que resultou em punição, não se tratou de


pagamento em dinheiro vivo, mas da oferta gratuita de um serviço
médico requisitado, sobretudo nas camadas mais pobres da população.

Sergipe registra um caso exemplar de punição a esse tipo de fraude.


Em 2003 e 2004, o eleitorado de nossa Senhora do Socorro saltou 17%
— mais do que o triplo do aumento médio da população no estado. O
ministério Público investigou a situação e descobriu que a candidata
a vereadora Sandra Teixeira havia oferecido cirurgias de laqueadura a
500 eleitoras de Aracaju para que levassem seus votos para a pequena
cidade, a 15 quilômetros da capital. Sandra foi a vereadora mais votada
naquela eleição, mas, como resultado da investigação, teve o mandato
cassado e acabou presa, num desfecho que, infelizmente, não é regra,
mas exceção. (Veja, 2012)

A captação ilícita de votos ou os crimes eleitorais com o mesmo

governamentais. Valendo-se de documentos de motivação para a reação

de órgão público e OnGs destinadas a combater a corrupção eleitoral é

as sanções e orienta a apresentação de denúncias. O apoio mais forte


é no Estado de Alagoas com os endereços da Procuradoria Regional
Eleitoral (PRE), Tribunal Regional Eleitoral (TRE), Polícia Federal (PF)
e Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).

organização da sociedade civil de meia centena de entidades, com o


objetivo de combater a corrupção nas eleições brasileiras. O movimento

para a lisura das eleições. As mesmas leis, como visto anteriormente,


Salomão RibaS JUnioR
124 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

A primeira é conhecida como a “Lei da Compra de Votos” e a segunda


como “Lei da Ficha Limpa”.
De acordo com o sítio da entidade, ela atua em três eixos prin-

Fiscalização – O objetivo deste eixo é assegurar o cumprimento da Lei

de denúncias, acompanhamento de processos e encaminhamentos de


representações aos órgãos competentes.
Educação – Visa contribuir com a consolidação de uma consciência dos

realizadas ações nos municípios como encontros, palestras e seminários,


em parceria com os Comitês 9840 (Comitês mCCE). material impresso,
como: cartilhas, folderes e cartazes são distribuídos durante os eventos.
monitoramento – Com este eixo, o mCCE realiza tanto o acompanha-

torais e acompanhar as ações de seus candidatos. (mCCE, 2012)

na rede de entidades sociais e empresariais que integram o

rupção estão entre as prioridades de trabalho do mCCE.

2.8.3.4 Conferência nacional dos Bispos do Brasil


A Conferência nacional dos Bispos do Brasil (CnBB) é outra
entidade que além de participar do mCCE, tem manifestado preocu-
pação com os pleitos eleitorais como expressão autêntica da vontade
popular. A CnBB, como registrado antes, apoiou desde o início com a
campanha “Voto não tem preço, tem consequência”, movimento que
resultou na Lei de Compra de Votos.

Limpa, a CnBB, por seu Conselho Episcopal Pastoral (25 a 27.09.2012),


emitiu nota sob o título “Eleições municipais 2012 – Voto Consciente
e Limpo”.
A destacar:
CAPíTULO II
CORRUPÇÃO
125

ocuparem cargos públicos. A esses instrumentos deve associar-se a


consciência de cada eleitor tanto na hora de votar, escolhendo bem seu
candidato, quanto na aplicação destas leis, denunciando candidatos,
partidos, militantes cuja prática se enquadre no que elas prescrevem. A
vigilância por eleições limpas e transparentes é tarefa de todos, porém,
têm especial responsabilidade instituições como a Justiça Eleitoral, nos
níveis Federal, Estadual e municipal, bem como o ministério Público.
Destas instâncias espera-se a plena aplicação das leis que combatem
a corrupção eleitoral, fruto do anseio popular. O resgate da ética na

atenção. (CnBB, 2012)

Apesar da lei que sanciona a compra de votos, vimos que a

da tecnologia, contudo, cuida da recepção correta do voto na cabine


eleitoral e do seu computo. Eliminaram-se as fraudes que ocorriam
nesses momentos dos processos eleitorais, mas apenas nesses. O
pleito municipal de 2012 foi o primeiro que a Lei da Ficha Limpa teve
aplicação. À primeira vista, parece que o eleitor encarou esses atos na
faixa cinza da percepção da corrupção eleitoral. muitos dos impugnados

2.8.3.5 movimentos regionais


Há vários movimentos de caráter regional, inspirados alguns
nessas entidades, que se propõem a combater a corrupção eleitoral. É

— formado pela OAB-PE, Arquidiocese de Olinda e Recife e a Univer-


sidade Católica de Recife (LOREnZATO, 2012).
Há movimentos similares em outras unidades da Federação. De

Controle Social – Consocial


As conferências são reuniões mais solenes e se revestem de
importância, tanto pelos seus participantes quanto pela natureza dos
assuntos que nela são discutidos, e, vez por outra, resolvidos. É assim
Salomão RibaS JUnioR
CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

que se realizam as Conferências da Paz, Conferências de Economia ou as


históricas como a de Yalta, que decidiu o futuro da Europa Pós-Guerra.
Atualmente, algumas conferências têm se realizado no Brasil.
A metodologia envolve discussões sucessivas nos planos municipal,
estadual e nacional.
Entre os assuntos tratados estão educação, saúde e transparência

Entre as conclusões, aponta-se:

eleitorais com um valor limitado e igual para todos, a partir de um


fundo público para todos os partidos, sendo passível de suspensão dos

de partidos políticos, com dados disponibilizados nos portais de


transparência. (COnSOCIAL, 2012)

A mesma Consocial aponta outras medidas para eleições livres,


democráticas e sem corrupção, ou abuso do poder político, ou do poder
econômico.

2.8.3.7 Amigos Associados de Ribeirão Bonito


(AmARRIBO)
A AmARRIBO é uma sociedade civil de interesse público (OSCIP)

administração pública, lideranças políticas e da iniciativa privada,


para acompanhar a gestão dos bens públicos, promover a probidade
e combate a corrupção”. nascida de uma reunião de amigos ligados
ao município de Ribeirão Bonito, foi um movimento pioneiro na
operação do controle social. Vencida a corrupção e o desperdício em
Ribeirão Bonito, a AmARRIBO passou a disseminar sua experiência

de referência. Tem procurado estabelecer uma rede nacional. Atua


no acompanhamento das ações governamentais do Brasil, na imple-

mundial Contra a Corrupção (Brasília-2012) tem a AmARRIBO como


entidade organizadora.
CAPíTULO II
CORRUPÇÃO
127

2.8.3.8 O que você tem a ver com a corrupção

cientização popular — é ideia do Promotor de Justiça de Santa Catarina,

ganhou apoio popular e de instituições como o ministério Público,


Tribunal de Contas (SC), imprensa e setores educacionais. Premiada por
instituições nacionais e internacionais, passou a ter dimensão nacional
e atualmente internacional. A campanha é simples, direta e objetiva.

O programa tem o caráter educativo de trabalhar a problemática da


corrupção, a partir de soluções práticas visíveis, longe do discurso
demagógico tão comum nos dias de hoje. O grande trunfo do ineditismo
do projeto consiste na confecção de um processo cultural em formação de
consciência e de responsabilidade dos cidadãos, a partir de três tipos de
responsabilidades: a) a responsabilidade para com os próprios atos, ou
responsabilidade individual: estou fazendo a minha parte no dia-a-dia?
b) a responsabilidade para com os atos de terceiros, ou responsabilidade
social ou coletiva: estamos cobrando individual e coletivamente a efetiva

dade? c) a responsabilidade para com as gerações futuras a partir de


um agir consciente. (GHIZZO nETO, 2011, p. 209)

A Campanha tem tido êxito comunitário na conscientização da


responsabilidade de todos nesse combate e deseja mais para o futuro
nos meios cultural e educacional. É o que pretende o movimento, de
acordo com o objetivo geral anunciado:

Conscientizar a sociedade, especialmente crianças e adolescentes, a partir

atitudes do cidadão comum, destacando atos rotineiros que contri-

de valores e princípios éticos que contribuam para a construção de


um país mais justo e melhor. (O que Você Tem a Ver com a Corrupção.
Campanha, 2012)

- Reduzir a impunidade nacional, ou seja, cobrar a efetiva punição dos


corruptos e dos corruptores, abrindo um canal real para oferecimento
e encaminhamento de denúncias;
- Educar e estimular as gerações novas através da construção, em
longo prazo, de um Brasil mais justo e mais sério, destacando o papel
fundamental de nossas próprias condutas diárias;
Salomão RibaS JUnioR
128 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

- Aproveitar momentos do cotidiano infanto-juvenil (família, escola e


comunidade) para propiciar a vivência de atividades que os levem a
conhecer esses princípios, estimulando-os a praticá-los no seu ambiente
de convívio social;
- Divulgar a idéia em locais e acontecimentos informais (sociais, espor-
tivos, campanhas e eventos), possibilitando o alcance da campanha a
um público maior. (O que Você Tem a Ver com a Corrupção. Campanha,
2012)

São muitas as parcerias com escolas, administrações públicas,


empresas, clubes esportivos. A destacar o apoio do ministério Público
(COnAmP) e Tribunal de Contas (ATRICOn).

2.9 Corrupção privada


A corrupção privada guarda algumas semelhanças, pelo menos
em suas linhas gerais, com a corrupção pública. De fato, os economis-
tas, ao estabelecerem a teoria de agência, para explicar o fenômeno da
corrupção, deram largos passos para situar a questão da corrupção
privada de forma distinta da pública. Da mesma forma que esta, há
pontos em comum com uma série de fraudes no setor privado, que
podem ser consideradas como atos de corrupção. É assim que, deixando
de lado o clássico conceito de “uso indevido de posição pública para
obtenção de ganhos privados” (SAnDHALTZ; KOETZLE, 2000 apud

trata de algo distinto:

[...] portanto, de outras formas de corrupção na esfera privada, como,


por exemplo, quando os dirigentes de uma empresa se apoderam de
recursos que seriam dos acionistas, assim como de toda a gama de

Este é um efeito da corrupção privada, em que há o prejuízo


de um conjunto de pessoas (os sócios, que podem ser apontados
economicamente como principal) e o ganho ilegal de uns poucos (os

microeconômico. Como visto no Dicionário político de Bobbio et al.


(1991), discute-se tanto no âmbito público quanto no privado o aspecto
utilitário da corrupção.
Dessa forma, parafraseando nathanael Leff (apud
SC
CAPíTULO II
CORRUPÇÃO
129

senvolvidos era um comportamento realista das empresas para vencer


uma burocracia emperrada, ou a má vontade de autoridades locais, que

econômicas, algo como uma taxa contabilizada como qualquer outro


ato operacional. Essa maneira de ver o suborno era compartilhada por
outros autores e, particularmente, muitos empresários e governos do
mundo desenvolvido.
A esses argumentos contrapõem outros como os do próprio
Bobbio et al. (1991), em que considera que:

[...] momentaneamente funcional, principalmente quando os obstáculos


de ordem jurídico-formal impedem o desenvolvimento econômico, a

a longo prazo será negativa, acabando por favorecer umas zonas em


prejuízo de outras. (BOBBIO et al., 1991, p. 293)

Rose-Ackerman (apud
que a “corrupção reduz a transparência dos mercados, impede a com-

a economia e a sociedade como um todo”.


Agora, no âmbito privado, não é só envolvendo as transações
com o setor público que surgem o suborno ou vantagens indevidas na
relação entre principal e agente e empresas na operação do mercado. A
lista de ações que podem ser consideradas corrupção privada é grande.
Entendida essa espécie de corrupção como quando o agente privado age
sem legitimidade ilegal e com prejuízo de uma coletividade, podendo
29
Há uma forte
percepção da corrupção privada no ambiente empresarial. Isso vale para
as grandes, médias e pequenas organizações. Em qualquer uma dessas

de impostos, compra e venda de informações, espionagem, subornos,

aspectos da corrupção privada são pesquisados sob três perspectivas, a


exemplo do que se passa com os estudos sobre a corrupção em geral. A
primeira é a que focaliza os dados forenses com as condenações penais.
A segunda é a desenvolvida por instituições nacionais e internacionais
(Banco mundial e Fóruns mundiais de Economia). A última é a que

29
Estabelecimento industrial ou comercial.
Salomão RibaS JUnioR
130 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

apontando soluções e medidas para combatê-la (BEZERRA, 1995 apud


BORInI; GRISI, 2009, p. 104). Em texto que trata da corrupção no am-

são as pesquisas em que se averigua detalhadamente um contexto


competitivo corrupto com o intuito de entender as implicações da per-
cepção dessas práticas nas estratégias organizacionais das empresas
privadas”.

corrupção, como já visto anteriormente: a dos caçadores de renda; e


da propina. na primeira hipótese, os agentes procuram maximizar sua
renda desprezando regras e limites. Como são poucos que alcançam
os privilégios, há um prejuízo para muitos (no ambiente da própria
empresa, no setor onde compete e para o mercado que deixa de
funcionar em harmonia). O aumento dessa renda dos caçadores obtido
dessa forma gera custos. E estes são arcados por outros que não os

quebrada pela oferta e aceitação da propina (GRAnDVETTER, 1985


apud BORInI; GRISI, 2009, p. 105). As grandes áreas da atividade
empresarial são basicamente a compra, a produção e a venda. no caso
da compra de insumos pode ocorrer, por parte do agente, a aceitação
de suborno para selecionar um fornecedor em prejuízo de outro
ou outros. na compra pode, também, ocorrer o favorecimento por
nepotismo ou partidarismo, com prejuízo para a qualidade ou preço,

pode ocorrer na produção de bens ou serviços, quando os agentes


desviam recursos da empresa para seu proveito. Esses recursos tanto
podem ser desviados diretamente em espécie quanto podem ser gastos
em privilégios (mordomias) exagerados para os agentes. nesse campo
depara-se com o que se poderia chamar de pequena corrupção, mas
ainda assim, presente o exagero e o gasto em benefício de uns ou poucos
(agentes) e o prejuízo de muitos (principal).
Em muitos países, a corrupção como tipo de crime dentre as
fraudes em geral pode ser reconhecida — e sancionada — tanto no
setor público como no privado. nos EUA, sempre lembrados por seu

para realçar a importância que o mal da corrupção tem entre os ame-


ricanos, que os crimes mais graves que um Presidente comete são a
traição e a corrupção (bribery). Assim reza a Constituição dos EUA. Já
o Foreign Corrupt Practices Act (FCPA) criminaliza o procedimento de
CAPíTULO II
CORRUPÇÃO
131

particulares (pessoas físicas) como de empresas (pessoas jurídicas), em


relação aos ganhos ilegais ou transferência ilegal de bens ou valores do
patrimônio público para o privado.
mais recentemente, após a crise econômica de 2008, quando
se evidenciaram casos de má gestão fraudulenta de empresas, novas
medidas de controle e soluções foram adotadas nos EUA. A questão

e medidas disciplinadoras.
na Europa, como veremos em seguida, a corrupção privada é
combatida por medidas da OCDE e da EU.

2.9.1 Corrupção na Europa


na Europa, a maioria dos vinte e sete Estados-membros que
integram a União Europeia alterou suas leis por recomendação da

de corrupção privada devem ser combatidos sistematicamente pela lei,


pelos códigos de conduta ética e de governança corporativa. O que se

empresarial (relação principal-agente). São pontos fundamentais para


uma boa gestão e para a livre concorrência em bases isonômicas de
equilíbrio.
Desde 1999, o Conselho da Europa adotou a criminalização da
corrupção privada. A razão de ser é a preservação da livre concorrência.
no cenário jurídico brasileiro, a criminalização da corrupção
está passando por uma reavaliação. Discute-se no Congresso nacional
duas mudanças importantes: (i) a criminalização das pessoas jurídicas;

Anticorrupção. no segundo, a matéria é tratada na Comissão Especial,


presidida pelo ministro Dipp (STJ), que propõe ampla alteração no
Código Penal.
As duas mudanças seguem uma tendência doutrinária e a orien-

natureza privada em relação ao setor público e os interesses gerais do


próprio setor privado. “El fenómeno de corrupción se traduce, por
tanto, en la interposición de un interés privado sobre el interés público”
(CASCÓn, 2004, p. 128). Insiste esse doutrinador que “el fenómeno
de la corrupción no puede considerar-se exclusivamente del âmbito
público de la administracion”. Relembrando na época (2004) os graves
Salomão RibaS JUnioR
132 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

e assuntos não menos graves em organizações internacionais, como


o Comitê Olímpico Internacional e a Organização Internacional de

que cerca essas empresas e entidades. Se não se trata do interesse pú-


blico (patrimônio público) que está em jogo, há um interesse geral a
ser protegido. Acrescente-se que de lá para os dias atuais, as crises

dalos só aumentam. É o caso das múltiplas falências, que deixaram


desamparados pequenos acionistas e investidores, ocorridas a partir da
quebra do Banco Lehman (EUA). no mínimo houve ruptura de normas
éticas, quando não casos de corrupção explícita, assim considerando o
benefício de uns poucos em prejuízo de muitos.

Es por eso que cobra cada vez más fuerza y sentido el estudio de la
corrupción en el sector privado, fruto de comportamientos desviados
por parte de los centros de poder y decisión (administradores y cargos
directivos laborales, como los factores o gerentes) de las empresas
privadas, generalmente con pryección pública (entidas y establecimentos

particulares y coletivos y, a la postre, de los intereses generales cifrados

conjunto). (CASCOn, 2004, p. 129)

Assim sendo, pode-se falar claramente a respeito da corrupção


privada como sendo “concebida como una desviación fraudulenta o
abusiva de potestades de control y decisión en la empresa privada que

2004, p. 130), e ainda, assinala de forma contundente:

Estos es, junto a la defraudación privada del sector público puede


incluirse la defraudación privada del sector privado por el propio sector
privado, personalizada normalmente en los cargos de administración
y dirección de grandes empresas privadas con proyección pública, sea

condición de sociedad cotizada en mercados de valores o por tratarse


de sociedades de auditoría de cuentas que pueden ayudar o coayuvar

situaciones económicas delicadas antecedentes a una previsible crisis


(cfr. la conexión de la emrpesa de auditoría Arthur Andersen en la crisis
del caso Enron). (CASCÓn, 2004, p. 130)
CAPíTULO II
CORRUPÇÃO
133

no Brasil, em período próximo, bancos e empresas de auditoria


fraudaram o mercado por anos. O caso mais emblemático é o do Banco

na União Europeia, a Ação Comum do Conselho da Europa


(22 de dezembro de 1998) sobre a corrupção no setor privado, considera
que a corrupção:
a) frauda a competição leal;
b) compromete os princípios de abertura e liberdade do mercado;
c) prejudica todo o funcionamento do mercado; e
d) compromete a transparência e a abertura dos mercados.
Com base nesses malefícios, o mesmo documento propõe que se

a sanção de pessoas jurídicas pela prática de atos de corrupção ativa


e passiva.

Puede advertir-se en este instrumento normativo del Consejo de Europa


que el bien jurídico protegido a raíz de la incriminación de conductas
corruptas en el sector privado no es sólo la estructura patrimonial y el
funcionamiento de las empresas afectadas (especialmente la relación de

la estrutura y correcto funcionamento del mercado en términos de libre


y leal competência, con el objetivo último de la transparencia y apertura
del comercio internacional. (CASCÓn, 2004, p. 132)

O Brasil é signatário de vários tratados que impõem aos partici-


pantes soluções legais e administrativas para combater a corrupção
privada. Entre eles tem-se a Convenção da OnU contra a corrupção.
O seu art. 12 trata do setor privado.

Artigo 12
Setor Privado
1. Cada Estado Parte, em conformidade com os princípios fundamentais
de sua legislação interna, adotará medidas para prevenir a corrupção
e melhorar as normas contábeis e de auditoria no setor privado, assim
como, quando proceder, prever sanções civis, administrativas ou penais

dessas medidas.

entre outras coisas, em:


a) Promover a cooperação entre os organismos encarregados de fazer
cumprir a lei e as entidades privadas pertinentes;
Salomão RibaS JUnioR
134 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

b) Promover a formulação de normas e procedimentos com o objetivo


de salvaguardar a integridade das entidades privadas pertinentes,
incluídos códigos de conduta para o correto, honroso e devido exercício

de boas práticas comerciais entre as empresas e as relações contratuais


das empresas com o Estado;
c) Promover a transparência entre entidades privadas, incluídas, quando

envolvidas no estabelecimento e na gestão de empresas;


d) Prevenir a utilização indevida dos procedimentos que regulam as

de subsídios e licenças pelas autoridades públicas para atividades co-


merciais;

privado depois de sua renúncia ou aposentadoria quando essas ativi-


dades ou essa contratação estejam diretamente relacionadas com as
funções desempenhadas ou supervisionadas por esses funcionários
públicos durante sua permanência no cargo;
f) Velar para que as empresas privadas, tendo em conta sua estrutura e

ajudar a prevenir e detectar os atos de corrupção e para que as contas

que sejam necessárias, em conformidade com suas leis e regulamentos

a) O estabelecimento de contas não registradas em livros;


b) A realização de operações não registradas em livros ou mal especi-

c) O registro de gastos inexistentes;


d) O juízo de gastos nos livros de contabilidade com indicação incorreta
de seu objetivo;
e) A utilização de documentos falsos; e
f) A destruição deliberada de documentos de contabilidade antes do
prazo previsto em lei.
4. Cada Estado Parte ditará a dedução tributária relativa aos gastos que
venham a constituir suborno, que é um dos elementos constitutivos
do
Convenção e, quando proceder, relativa a outros gastos que tenham
tido por objetivo promover um comportamento corrupto. (OnU, 2012b)
CAPíTULO II
CORRUPÇÃO
135

Como se vê, é um documento bastante abrangente e claro em

destinadas a dissuadir as práticas corruptas. Estão na mesma linha, as


práticas que sem serem propriamente corruptas são permissivas da
corrupção. Daí o comportamento ético preventivo. As regras pretendem

de interesse, adotadas para o setor público. Entre elas, a quarentena


para contratações de funcionário que deixa por ato de vontade ou por
aposentadoria o serviço público. Algumas providências legislativas para
conter a atuação das pessoas jurídicas estão em curso no parlamento
brasileiro.
O Poder Executivo encaminhou ao Congresso nacional Projeto
de Lei que dispõe sobre a responsabilização administrativa e civil de
pessoas jurídicas pela prática de atos contra a Administração Pública
nacional ou estrangeira. A proposta recebeu atenção mesmo em perío-
do de eleições municipais. Esses períodos costumam afastar os parla-
mentares do Congresso.

em seu segundo texto substitutivo. Há diferenças entre o conteúdo da

da Comissão Especial para posterior deliberação do Plenário. no


Capítulo I – Das Disposições Gerais

“a responsabilização objetiva” e ampliam o alcance da responsabilização


das empresas (pessoas jurídicas, na redação original) acrescentando o
parágrafo único:

da forma de organização ou modelo societário adotado, bem como a


quaisquer fundações, associações de entidades ou pessoas, ou socie-

brasileiro, constituídas de fato ou de direito, ainda que temporariamente.


(CÂmARA DOS DEPUTADOS, 2012c)

no plano da responsabilização, a redação primitiva pretendia


que:

sabilidade individual de seus dirigentes ou administradores ou de


qualquer pessoa natural, autora, co-autora ou partícipe do ato ilícito.
Salomão RibaS JUnioR
CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

responsabilização individual das pessoas naturais referidas no caput.

ticados em seu benefício ou interesse por qualquer de seus agentes,


ainda que tenham agido sem poderes de representação ou sem auto-
rização superior, mesmo que o ato praticado não proporcione a ela

exclusivamente. (CÂmARA DOS DEPUTADOS, 2012c)

A redação do segundo substitutivo altera a proposta original:

dade individual de seus dirigentes ou administradores ou de qualquer


pessoa natural, autora, co-autora ou partícipe do ato ilícito.

responsabilização individual das pessoas naturais referidas no caput.

por atos ilícitos na medida da sua culpabilidade. (CÂmARA DOS


DEPUTADOS, 2012c)

grupo econômico, os dois substitutivos pretendem que ela seja subsi-

os parlamentares pretendem acrescentar norma processual e hipóteses


de reparação integral do dano causado. De qualquer modo, as emendas
pretendem que “a reparação do dano causado é condição indispensável
para interrupção dos efeitos da declaração de inidoneidade”.
A questão do Cadastro nacional de Empresas Inidôneas e Sus-
pensas (CEIS) é tratada de forma mais detalhada pelas emendas substi-
tutivas. Para as questões processuais, as emendas são excessivamente

administrativa de declaração de inidoneidade a exemplo da proposta


original, em que a responsabilidade administrativa da pessoa jurídica
não afasta a responsabilidade judicial.
Por esse caminho, a Administração pode obter outras sanções
mais severas do que o impedimento de negociar com o Poder Público
e reparar o dano.
Essas sanções podem determinar (art. 19):

I - perdimento dos bens, direitos ou valores que representem vantagem


ou proveito direta ou indiretamente obtidos da infração, ressalvado o
direito do lesado ou de terceiro de boa-fé;
CAPíTULO II
CORRUPÇÃO
137

II - suspensão ou interdição parcial de suas atividades;


III - dissolução compulsória da pessoa jurídica. (CÂmARA DOS DEPU-
TADOS, 2012c)

Finalmente, as emendas pretendem que:

Art. 30. A aplicação das sanções previstas nesta lei não afeta os processos
de responsabilização e aplicação de penalidades de correntes de:

1992; e
II - atos ilícitos alcançadas pelas normas de licitações e contratos da
Administração Pública, inclusive no tocante ao Regime Diferenciado de

2011, quando distintos daqueles cujas sanções já tenham sido aplicadas


nos termos desta Lei. (CÂmARA DOS DEPUTADOS, 2012c)

a corrupção privada, consta de uma extensa proposta de alteração do


Código Penal de 1940. Organizada por um grupo de especialistas, a
proposta — entre outras — criminaliza a corrupção ativa e passiva
entre particulares:

A comissão de juristas que discute a reforma do Código Penal aprovou


proposta que criminaliza a corrupção ativa e passiva entre particulares.
A pena prevista vai de um a quatro anos de prisão e multa. Atualmente,
o texto prevê a conduta apenas quando há agente público envolvido. De
acordo com o autor da proposta, advogado marcelo Leal, a inovação irá

Corrupção. Países como Itália, Espanha, França, Alemanha e Inglaterra

neste país encontra-se também arraigado no setor privado. Tivemos a


preocupação de trazer simetria desse tipo [penal] com o que aprovamos
de corrupção no setor público,” esclareceu Leal. O advogado explicou
que o tipo se refere a casos em que um funcionário ou executivo
encarregado das compras numa empresa, por exemplo, só admite
determinado fornecedor porque recebe propina. (Consultor Jurídico, 2012)

Essa alteração, bem como outras previstas pela Comissão Espe-

cordâncias no Parlamento e fora dele. Se a criminalização da corrupção


privada estivesse prevista em um projeto de lei autônomo, talvez
pudesse tramitar mais rapidamente. Em meio a tantas alterações na
Salomão RibaS JUnioR
138 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

lei penal, acaba por ser prejudicada. De qualquer maneira, esse Projeto
terá de iniciar sua tramitação formal.

2.9.2 Lobby e a corrupção


O lobby
origem, a entrada de um edifício, a entrada de uma casa, uma espécie
de sala de espera. Dizia-se que o lobby era o lugar onde as pessoas
permaneciam aguardando a oportunidade, sempre demorada, de serem
recebidas e ouvidas por uma autoridade feudal. Era o local de espera
para a apresentação de um pleito, da defesa dos seus interesses junto
a quem os pudesse satisfazer pela ação ou pela omissão. Se observar

não é muito diferente, o papel de pessoas que abordam os deputados e


senadores pedindo assinaturas de apoio em projetos de lei ou emendas

para o termo lobby. Dessa forma, o dicionário da língua portuguesa de


Aurélio Buarque de Holanda registra o lobby como sendo: “grupo de

determinados interesses. A atividade de tal grupo ou organização”


(FERREIRA, 1999, p. 1228).

Atividade de pressão de um grupo organizado (de interesse, de propa-


ganda etc.) sobre políticos e poderes públicos, que visa exercer sobre

formal do governo; campanha; lobismo. Grupo organizado que

Parlamentar de Inquérito>; nas casa legislativas, amplo salão aberto ao


público, que serve principalmente para os contatos entre os legisladores
e o cidadão; nos E.U.A., grupo de pessoas que frequentam o lobby das

aprovar sua proposta. (HOUAISS; VILLAR, 2001, p. 1775)

De fato, o lobby é a designação genérica para as atividades de


grupos de interesse na busca de soluções políticas, legislativas ou
administrativas para problemas que os afetam. É como se podem iden-

aos governos de qualquer esfera (federal, estadual ou municipal). no


elenco de meios que esses grupos usam para ganhar simpatias para
CAPíTULO II
CORRUPÇÃO
139

ações são indiretas, disfarçadas, mas com o mesmo objetivo.


Os meios são os mais variados, especialmente, em países como o
Brasil, que não têm normatização clara a respeito do lobby
sobre o termo e esclarecimentos sobre os limites da atividade podem
ser encontradas na doutrina. Farhat (2007) reforça a tradução literal do
inglês para o português (antessala, átrio, vestíbulo, entrada). Histori-
camente, a palavra se refere ao lobby da Câmara dos Comuns na
Inglaterra, onde se originou o termo e a prática, e “nele postavam-se

abordá-los em sua passagem para participar das sessões do plenário”


(FARHAT, 2007, p. 50).
lobby, Farhat (2007, p. 50)
Lobby é toda atividade organizada, exercida dentro da

objetivo de ser ouvido pelo poder público para informá-lo e dele obter
medidas, decisões, atitudes”.
E mais adiante, o mesmo autor estabelece dois sentidos principais
para o lobby:

com o objetivo de levar as autoridades a fazer — ou deixar de fazer —


alguma coisa a bem daqueles interesses.
Sentido amplo: indica todo esforço, por meio de quaisquer meios lícitos,

namentais. (FARHAT, 2007, p. 51)

Já no Dicionário de política de norberto Bobbio et al., o lobby é

[...] uma atividade, ou melhor, de um processo, mais do que de uma


organização. É o processo, por meio do qual os representantes de grupos
de interesses, agindo como intermediários, levam ao conhecimento dos
legisladores ou dos os desejos de seus grupos. (BOBBIO
et al.

O fato é que a movimentação de pessoas, entidades representa-


tivas de corporações ou grupos informais, junto aos governos, é usual.
Costuma-se, até mesmo, em linguagem popular, dizer que alguém “está
fazendo lobby”, quando procura o apoio para uma ideia, venda de um
Salomão RibaS JUnioR
140 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

produto ou causa mais abrangente. Qualquer campanha em favor de


alguma coisa pode ser confundida como a atividade dos lobistas. Estes
são considerados como qualquer pessoa que pertence a um lobby, isto
é, a grupo de interesse.
Essas atividades são consideradas por alguns como nocivas ao
interesse público, pois, para eles, trata-se de um mecanismo a mais

patrimonialismo. Outros consideram essa aproximação entre repre-


sentantes da sociedade civil ou do mundo econômico com os agentes
públicos bastante salutar para encontrar soluções adequadas no legis-
lativo e na administração. na verdade, o lobby, desde que exercido com
honestidade e ética, não causa maiores danos ao interesse público e pode
sim contribuir para soluções equilibradas. Já o mau uso do instituto

corruptoras, obviamente, é muito nocivo.


Para uma melhor compreensão da atividade no Brasil devem-
se estabelecer alguns conceitos básicos, a exemplo do que já foi visto
com a palavra lobby. Algumas comparações com as atividades lobistas
em outros países também são úteis para essa compreensão. Assim, as
perguntas que se impõem são: (i) o que são grupos de interesse?; (ii) o
que são grupos de pressão?
O conhecimento de uns e outros é importante, na medida em
que boa parte da doutrina reconhece que o lobby é exercido pelos dois
grupos. Essa ação tanto pode ser direta como indireta. Diretamente, as

legais ou atos burocráticos, e são feitas por integrantes dos próprios

por parlamentares comprometidos ou mesmo representantes desses


interesses no Congresso nacional. Como não há regras legais, a identi-

consultores, assessores ou outras denominações, para a defesa dos


interesses por integrantes dos próprios grupos.
Entre esses, segundo Farhat, os conceitos são os seguintes:

formal ou informalmente ligadas por determinados propósitos, inte-


resses, aspirações ou direitos, divisíveis dos de outros membros ou
segmentos da sociedade. Sua razão de ser consiste em manter vivos os
laços de sua união. Esses grupos podem permanecer em estado latente,
sem adotar um programa formal de ações destinadas a tornar seus
CAPíTULO II
CORRUPÇÃO
141

objetivos aceitáveis pelo Estado, pela sociedade ou por determinados


segmentos desta. Grupo de pressão é o grupo de interesses dotado de

utilizá-los ativamente — para a promoção dos seus objetivos, até vê-los


atingidos. Atua perante toda a sociedade, ou parte dela, ou ainda, diante
de órgãos do Estado — Legislativo ou Executivo —, com competência
para mudar ou manter o status quo referente ao seu interesse. (FARHAT,
2007, p. 145)

Ao lado desses conceitos de ordem prática e muitos úteis para se

debruçaram sobre a matéria. nos EUA, onde o lobby é utilizado de forma


transparente e com aceitação geral, são muitas essas publicações, várias
delas de caráter didático-pedagógico e destinadas aos que pretendem

para a defesa de suas ideias e interesses. É importante para essas pessoas


conhecer as possibilidades e limitações legais e operacionais do lobby.

“grupo de interesses é qualquer grupo social que [...] leva adiante certas
reivindicações, em relação a outros grupos sociais; [nesse sentido, os
grupos de interesses] são elementos de continuidade num mundo em
mudança” (TRUmAn apud

a assertiva de que eles só se distinguem dos grupos de interesse pela


disposição de agir e de pressionar, mesmo os que podem decidir.
Pode-se relacionar um sem número de assuntos que podem ser
objeto de interesse e pressão por parte de grupos. Eles cuidam das
reformas institucionais, políticas, eleitorais, tributária, previdenciária,
ecológica ou defesa do meio ambiente. A esses se somam os de interesse

é o caso da pesca, do carvão, do petróleo e de outras riquezas. Um


elenco grande de grupos trata atentamente das questões corporativas

serviço público não são em número menos expressivo. A área econômica

Aí, cabe a pergunta: quem faz lobby no Brasil? A rigor, só não


fazem lobby — no sentido de defesa dos seus interesses — os que não
conseguem se organizar, mobilizar meios econômicos e acesso aos
que decidem (burocratas de alto escalão e os políticos em geral, os
“policymaker”).
Salomão RibaS JUnioR
142 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

Unidos, sempre se pode conseguir dinheiro para promover ou combater


qualquer causa. Lá, há sempre gente disposta a contribuir [...] a favor
apud FARHAT, 2007,
p. 351).
Aqui no Brasil, a disposição de pagar é restrita quando se trata
de causas sociais e culturais. Quando se trata de questões econô-
micas (indústria, comércio, agricultura), essa mobilização de recursos

lobby. As mu-
danças na legislação eleitoral, ampliando as possibilidades de contri-

pagamento das eleições um defensor (lobista) no Congresso e junto


ao Governo Federal. Respeitada as proporções, o mesmo ocorre nos
planos municipal e estadual. Está claro que essas contribuições são
economicamente facilitadas pelo denominado “Caixa 2”. Esses recursos

não podem ser medidos, mas estimam-se invariavelmente em grandes

economia paralela ou submersa. nesse particular, nem todo o dinheiro

essas operações provoca uma suspeição geral. no caso do Brasil,

Segundo o relatório, ainda não divulgado, brasileiros tinham depositado


de 1970 até 2010 cerca de US$520 bilhões (ou mais de R$1 trilhão) nessas
contas, onde se pode guardar dinheiro em razoável sigilo, sem ter de
responder a muitas perguntas nem pagar imposto. O valor equivale a

leiro. De acordo com o estudo, o tamanho da fuga de capitais do país


é maior do que a dívida externa acumulada no período, de US$324,5
bilhões. O documento foi escrito pelo economista James Henry para
a Tax Justice network, organização independente, focada nesse tipo
de levantamento, que surgiu em 2003 no Parlamento britânico. Henry
cruzou dados do Banco de Compensações Internacionais, do FmI
(Fundo monetário Internacional), do Banco mundial e de governos
para chegar aos valores, segundo informações da BBC. no ranking de
países elaborado pela organização, o Brasil perde apenas para a China
(US$1,2 trilhão), a Rússia (US$779 bilhões) e a Coreia do Sul (US$779
bilhões). na América Latina, além do Brasil, o méxico, a Argentina e
CAPíTULO II
CORRUPÇÃO
143

a Venezuela estão entre os 20 que mais enviaram dinheiro a paraísos

depositados nessas contas, diz o documento. (SOARES, 2012)

Recentemente, algumas notícias sobre a devolução aos cofres


públicos de recursos oriundos da corrupção e depositados em paraísos

Jersey sobre a devolução de US$20 milhões depositados em nome


do Sr. Paulo maluf, ou de seus familiares ou de empresas suas ou de
familiares próximos.
Outro caso é a decisão do Tribunal Federal da Suíça sobre o
desvio de recursos da FIFA, como veremos em seguida.

2.9.2.1 Atividades confundidas com o lobby


A mídia também associa a atividade lobby a práticas repu-
diadas por parte considerável da sociedade. no Governo do Sr.
Fernando Henrique Cardoso (1995-2002), um misterioso caso de lobby
internacional para a compra dos equipamentos do Sistema de Vigilância
da Amazônica (SIVAm), formou-se, assim, um caso apontado como
grande corrupção. De fato eram negócios de cerca de US$1,4 bilhão.
Criado para monitorar toda a região Amazônica, o SIVAm foi
construído pela empresa norte-americana Raytheon. Em novembro de
1995, a Revista ISTOÉ denunciou lobby junto ao Palácio do Planalto, pelo
Sr. José Afonso Assumpção, dono da Líder Táxi Aéreo e representante
da Raytheon no Brasil. Diálogos telefônicos sugeriram comprometi-
mento ético e funcional do embaixador Júlio César Gomes dos Santos,
chefe do Cerimonial do Palácio do Planalto. Em seguida, o Jornal
Folha de São Paulo apresentou novos detalhes em favor desse lobby
internacional (ISTOÉ
afastado das funções. Investigações do ministério Público Federal
e Polícia Federal não apresentaram soluções conclusivas. CPI, no
Congresso, instalada tempos depois, também não elucidou os fatos.
Ficou a impressão de um lobby vitorioso.
Outro caso, este de certa forma pitoresca, foi atribuído ao lobby
das empreiteiras. Ou pelo menos ao lobista de uma empreiteira de
obras com grandes negócios no âmbito governamental. É o que a mídia
denominou de caso Renan ou Renangate (uma alusão pouco feliz a
Salomão RibaS JUnioR
144 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

Empreiteira mendes Junior, teria pagado despesas pessoais da jornalista


mônica Veloso. Comprovadamente, o Senador Renan Calheiros tem

aluguel de apartamento. Outras acusações de atividades de lobby desen-


volvidas pelo então Presidente do Senado foram trazidas a público pelos
principais veículos de comunicação (rádio, televisão, jornal e revista).
A representação, por falta de decoro parlamentar, foi submetida ao
Conselho de Ética que a acolheu por maioria. Submetida ao Plenário,
quarenta senadores votaram pela absolvição, trinta e cinco pela cassação
do mandato e seis se abstiveram. O assunto foi arquivado. Ficaria no ar
algumas questões de lobby
o senador Calheiros de prosseguir sua vida pública.
no coração do Governo, ocupantes e parentes de ocupantes de
cargos no Palácio do Planalto protagonizaram um caso com as cores da
lobby. Trata-se do caso Erenice Guerra,

afastada das importantes funções que exercia.


novamente a imprensa denuncia um caso de lobby. Pelo noticiário
da revista Veja, a ministra-Chefe da Casa Civil Erenice Alves Guerra teria
atuado para viabilizar negócios nos Correios, intermediados por uma

contrato de R$24.700,00 (vinte e quatro mil e setecentos reais) mensais,


assinado em 2009, pretendia aumentar a participação da mTA Linhas
Aéreas e da Via net nos negócios com os Correios. novamente um
caso em que as fronteiras tênues entre o lobby
lobby
no gabinete civil da Presidência da República, envolvendo liberação de
recursos pelo Banco nacional de Desenvolvimento Econômico e Social
(BnDS). Outra acusação falava em ação para projeto de energia solar.

Erenice e o Assessor Vinicius de Oliveira Castro operavam por meio de


consultorias a empresários interessados em contratos com o governo.

do caso. A Justiça Federal deferiu.


Também mereceram a designação de lobby ou lobismo as ativi-
dades envolvendo discussão sobre negócios públicos em uma mansão
de usos suspeitos em Brasília. O principal envolvido era o poderoso
ministro da Fazenda, médico Antonio Palocci.
De acordo com o divulgado pela mídia (jornal O Estado de
S. Paulo
CAPíTULO II
CORRUPÇÃO
145

públicos de Ribeirão Preto alugou uma mansão em Brasília com o


objetivo de realizar reuniões para o lobby junto ao governo Federal. Esses

Ralf Barquete e Vladimir Poleto — promoviam reuniões de serviço


e muitas festas na mansão no Lago Sul de Brasília. A isso chamavam
lobby. Convocado pela CPI dos Bingos, Palocci negou sua presença
na mansão e participação nas atividades de lobby do grupo. Acabou

mais de vinte vezes na mansão; b) era chamado de chefe pelos demais


frequentadores; c) havia festas pelo menos duas vezes por semana;
d) havia reuniões secretas; e) o dinheiro era trazido em mala e divi-
dido entre os participantes; f) outras acusações envolvendo dinheiro
em envelopes, prostitutas etc.
mais tarde, tentaram incriminar o caseiro quebrando ilegalmente

como parlamentar e novamente ministro no governo seguinte.


As consultorias são atividades copiadas das práticas americanas
e também sem regulamentação adequada no Brasil. Flagrados com
patrimônio anormal ou recebendo dinheiro de interessados na ação
governamental, políticos e burocratas de alto nível alegam exercer
atividades de consultoria. Outros são palestrantes muito bem remune-
rados por órgãos representativos do mundo econômico. E há, ainda,
aqueles que circulam nos órgãos de poder, ostentam vida de rico e não
se sabe exatamente do onde tiram meios para custear o bom viver. Aqui

se sabe. no geral é a ação do lobby brasileiro sem lei, sem critério, sem
limites e sem ética.
O médico Antônio Palocci, depois de uma passagem discreta
pela Câmara Federal, cumpriria papel destacado na campanha da Sra.

movimentação de parte dos R$279 milhões gastos. Aparentemente

da Casa Civil do novo governo. Até que surgiu uma denúncia de


inexplicável multiplicação do seu patrimônio pessoal. Ele teria crescido
vinte vezes nos quatro anos em que Palocci atuou como Deputado
Federal. Em 2010, Palocci — que havia declarado bens no valor total de
R$375.000,00 (trezentos e setenta e cinco mil reais) quando se candidatou

milhões e seiscentos mil reais). no ano anterior havia comprado um


Salomão RibaS JUnioR
CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

escritório de R$882.000,00 (oitocentos e oitenta e dois mil reais). (Folha


de S. Paulo, 15 maio 2011). Palo
empresa Projeto par
dades de consultoria que se confundem com o lobby praticado no Brasil.
As explicações não foram convincentes e o ministro se demitiu pela
segunda vez. Restou a questão do exercício de consultoria, concomi-
tantemente ao exercício de mandato parlamentar.
O caso do consultor palestrante Fernando Pimentel é outra forma
de renda. Alega que seu patrimônio e renda foram aumentados por suas
atividades como consultor e palestrante. A insuspeita Federação das
Indústrias de minas Gerais alega que pagou o já ministro do Desen-
volvimento certo montante por palestras e pela presença em reuniões
de trabalho.
As denúncias de irregularidades acima listadas como fruto do
lobby
voltas com atos muito próximos da corrupção. Igualmente prejudiciais

suborno; participação econômica ilegal; e abuso de poder. Qualquer


um desses tipos é tudo ou qualquer coisa, menos lobby legitimamente
conduzido por grupos de interesse ou de pressão.
Como é difícil nesse quadro de confusão semântica, encontrar
lobby — ou pelo menos para o lobby no Brasil
— deve-se olhar o que “o lobby não é” na análise de Farhat (2007, p. 71):

- jogadas escusas, “por baixo do pano”;


- uso de dinheiro para obter favores, “tratamento especial”, exceções

- também não é tudo aquilo mais bem caracterizado e entendido, sob a


rubrica própria, pelo nome certo de corrupção.

Vários estudiosos consideram que isso ocorre pela falta de


regulamentação clara e transparência da atividade, em defesa de
interesses legítimos. De fato, uma proposta concreta de lei disciplinando
o lobby no Brasil tramita há cerca de 30 anos no Parlamento. Trata-se de
Projeto de Lei apresentado pelo então Deputado Federal marco maciel
(AREnA-PE). Depois disso, maciel foi Presidente da Câmara Federal,
Governador do seu Estado, Senador, ministro de Estado (Educação e
Casa Civil) e Vice-Presidente da República (dois mandatos). O projeto
do lobby não prosperou. Atualmente não é mais uma proposta solitária.
CAPíTULO II
CORRUPÇÃO
147

iniciativa, o Senador marco maciel30

Quando assumi a presidência da Câmara, procurei o então Deputado


Célio Borja com a idéia de promover uma reformulação regimental.
Fui desencorajado e acabei colocando em prática outra estratégia: ia
pessoalmente a cada uma das comissões da Casa prestigiar os trabalhos
e colher sugestões. Acabei conseguindo o engajamento necessário para
a reformulação do Regimento Interno. nessa reformulação incluímos
o credenciamento de pessoas e entidades que exerciam lobby com o

acabou sendo adotada também no Senado Federal. (SAnTOS, 2007,


p. 430)

Câmara Federal.
Antes de se tecer mais considerações sobre esse projeto, é
oportuno registrar que a questão do lobby foi exaustivamente exa-
minada pela tese de doutorado de Luiz Carlos dos Santos que trata
da “Regulamentação das atividades de lobby e seu impacto sobre as
relações entre políticos, burocratas e grupos de interesse no ciclo de
políticas públicas – Análise comparativa dos Estados Unidos e Brasil”
(SAnTOS, 2007).
A sua leitura esclarece que tramitaram ou tramitam no Con-
gresso nacional 7 (sete) Projetos de Lei (todos de origem parlamentar) e

as atividades de lobby no Brasil. É no mínimo curioso que essa discipli-


na legal ainda não tenha sido adotada em um país como o Brasil, que
é tido como generoso na produção de normas formais de conduta. O
que se constata é que há interesse da mídia na regulação da atividade e
lobby, ainda
que mascarado sob outras denominações. Há interesses por parte de
grupos de interesse, como é o caso da FIESP, e há interesse de parlamen-
tares, o que se deduz do elevado número de propostas em andamento.
E entre os acadêmicos não são poucos os artigos, dissertações e teses

30
DEBATE – O lobby deve ser legal?. Opção

Acesso em: 21 set. 2007.


Salomão RibaS JUnioR
148 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

normas disciplinadoras da atividade dos lobistas.


Eles simplesmente atuam fortemente no processo decisório do Poder
Executivo e na construção de leis no Parlamento.
no início da década de 1990, após os episódios do impeachment
de Collor de mello e das conclusões da CPI PC-Collor, uma Comissão
Especial criada pelo Presidente da República Itamar Franco (Decreto

lobby
a inclusão de verbas para obras inacabadas ou com irregularidades
(superfaturamento) apontadas pelo Tribunal de Contas da União (TCU).
A Comissão Especial concluiu que uma das razões, se não a principal,
era a falta de regulamentação do lobby.

Todo o debate desta contínua e constante exposição da máquina pública


ao interesse da vida econômica situa o elenco das formas de pressão

pois, no seu padrão regulamentar, abordar o instituto da busca de

torná-la espectadora das formas de patrocínio de interesses frente aos


governantes, com conhecimento de seus contratos de trabalho e de suas
práticas autorizadas.
O Brasil está entre as nações de legislação tardia em matéria de lobbying,
não tendo até agora situado os limites legítimos da motivação dos go-
vernantes. Ofereceu, assim, a Comissão Especial, projeto que retoma o
delineio de iniciativa do Senado Federal, porém desdobrada e desen-
volvida no âmbito da ampla experiência americana, com as práticas das
organizações econômicas e mesmo das sociedades civis, no Congresso
e no executivo. Procurou-se tornar ostensiva a ação desses interesses

(PRESIDÊnCIA DA REPÚBLICA, 1994)

lobby não tenha merecido atenção dos agentes políticos


nos últimos anos. Tanto que no próprio parlamento há sistemas de
representação de interesses. É o caso da regra constitucional que garante
a audiência de pessoas ou organizações em assuntos do seu interesse.

Art. 58. O Congresso nacional e suas Casas terão comissões permanentes


e temporárias, constituídas na forma e com as atribuições previstas no
respectivo regimento ou no ato de que resultar sua criação.
[...]
CAPíTULO II
CORRUPÇÃO
149

II - realizar audiências públicas com entidades da sociedade civil; [...]


IV - receber petições, reclamações, representações ou queixas de qual-
quer pessoa contra atos ou omissões das autoridades ou entidades
públicas;
V - solicitar depoimento de qualquer autoridade ou cidadão; [...].
(BRASIL, 2012b)

no processo legislativo, também os interesses podem ser defen-


didos por meio de projeto de lei.

membro ou Comissão da Câmara dos Deputados, do Senado Federal


ou do Congresso nacional, ao Presidente da República, ao Supremo
Tribunal Federal, aos Tribunais Superiores, ao Procurador-Geral da
República e aos cidadãos, na forma e nos casos previstos nesta Consti-
tuição. [...]

dos Deputados de projeto de lei subscrito por, no mínimo, um por cento


do eleitorado nacional, distribuído pelo menos por cinco Estados, com
não menos de três décimos por cento dos eleitores de cada um deles.
(BRASIL, 2012b)

votos e a segunda afasta, da vida pública, os condenados, na forma que

práticas vedadas pela lei eleitoral. O que se realça, nesse momento, é


o mecanismo de defesa de interesses. As leis de iniciativa popular são

e a que dispõe sobre o Sistema nacional de Habitação de Interesse

a importância do caminho para a participação popular e colocar a

dessa natureza.
nos regimentos internos da Câmara e do Senado também se
encontram regras que admitem o lobby, ao mesmo tempo em que
estabelecem determinadas regras para sua atuação. A palavra lobby não
é empregada, mas a preocupação com o mecanismo de abertura para
a defesa de interesses é evidente.
Salomão RibaS JUnioR
150 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

Outras disposições são feitas sobre o relacionamento entre os


integrantes da alta Administração e interessados em assuntos na área
governamental. Uma portaria polêmica chegou a propor que sempre

estabeleceu regras para “evitar a ocorrência de situações que possam

público”. O Decreto instituiu o “Código de Conduta Ética dos Agentes


Públicos em exercício na Presidência e Vice-Presidência da República”
(SAnTOS, 2007, p. 423), o que se verá melhor no Capítulo sobre a ética
no serviço público.
no caso da admissão da defesa de interesses na Câmara e no
Senado, a regra é que entidades superiores de classe de empregados e

sentantes. Eventualmente, prestar informações e esclarecimentos a


relatores, autores de projetos de lei e comissões técnicas.
Atualmente, além das entidades acima, são admitidas para
credenciamentos outras entidades associativas nacionais ou regionais.
Os representantes de ministérios e outros órgãos também atuam na
defesa dos assuntos de interesses das áreas dos seus órgãos. São muitas
as assessorias parlamentares, quais sejam: CUT, CnJ, CnC, FIESP,
FnA, FORÇA SInDICAL, ABInEE, entre outras entidades de presença
constante no Congresso nacional.
Ainda assim, não se tem uma regulamentação completa sobre
o lobby

interesses não raro escusos. Porém, o lobby governamental (com dezenas

é muito forte e pouco transparente.


Tem-se também o caso da criação e operação das Frentes Parla-

nômica, social e política.


A Frente Parlamentar organiza-se suprapartidariamente por

destinam-se a aprimorar a legislação de acordo com os interesses


superiores da sociedade. Cuidam, contudo, de aspectos legislativos,

grupos de pressão internos que atuam com apoio material (expediente,


espaço pessoal) e político (reconhecimento formal do Congresso e
demai
CAPíTULO II
CORRUPÇÃO
151

Em posição assemelhada, organizam-se as denominadas “ban-


cadas”. Também são suprapartidárias e defendem interesses especí-

ruralista.
Luiz Alberto dos Santos, citando Vigna, enfatiza que:

Alguns cientistas políticos avaliam que a bancada ruralista e outros


grupos de interesse representam uma anomalia do sistema político.
Entendemos que, no Brasil, o sistema partidário não agrega interesses. Os
partidos, apesar dos seus programas, não defendem políticas associadas.
Assim, interesses que poderiam ser conjugados eclodem em proposições
individuais como propostas estanques. Os partidos políticos, em geral,

a gestão do Estado ou do poder. A bancada ruralista conseguiu ocupar


certos nichos do aparelho do Estado, onde exerce o seu poder de mando.
O poder, nestes casos, é exercido de forma qualitativamente diferente

tégica política do governo, mas principalmente obter mais recursos


orçamentários para os setores agrícolas. Este aparelhamento setorial do
Estado só ocorre pela fusão da representatividade própria como força
política interna do Congresso nacional, o que regimentalmente não
poderia haver. (VIGnA apud SAnTOS, 2007, p. 342)

Também têm expressão as Bancadas da Saúde, a Sindicalista, a

Frentes foram a da Saúde (11), Política Rural e Fundiária (11), Direitos


Humanos e minorias (11) e Indústria e Comércio (8) (SAnTOS, 2007,
p. 342).
Como se viu, os grupos de interesse ou os de pressão têm vários
caminhos a explorar no âmbito do Congresso nacional e da Alta Admi-
nistração.
O fato, contudo, é que há expressivos atores reclamando uma

contratados. Entre esses atores estão parlamentares, acadêmicos,


dirigentes de organizações que atuam nas relações entre o privado
e o público. Aí se encontram as assessorias: (i) parlamentares, (ii) de
apoio institucional de relações governamentais, (iii) com o governo,
(iv) relações corporativas. Ou os que simplesmente se autodenominam
“escritórios de representações” ou “de representação em Brasília”. O
lobby existe e argumentam esses atores que é necessário disciplinar
essa atividade.
Salomão RibaS JUnioR
152 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

de
civil é oportuno registrar que isso não ocorre somente no Brasil. São
poucos os países com legislação clara e objetiva em relação ao lobby.
mesmo nos EUA, país onde o lobby tem papel destacado na política, na
administração e no “marketing,” a atualização das leis sobre a matéria

no Brasil, entre as várias propostas de lei regulando a matéria,

Trata-se, sem dúvida, da proposição de conteúdo mais abrangente, e


mais completo, até agora apresentado no âmbito do Poder Legislativo,
que não somente consolida inúmeras contribuições legislativas apre-

subsídios para sua formulação. (SAnTOS, 2007, p. 442)

A leitura dessa proposta mostra sua abrangência, na medida em


que pretende regulamentar o lobby e a atuação dos grupos de interesse
e de pressão em toda a Administração, aí incluídos os órgãos do Poder
Executivo.
É nesse ponto, contudo, que surgiram alguns senões do ponto
de vista constitucional. Alguns parlamentares alegam que, em sendo
iniciativa parlamentar, não se poderia regulamentar o lobby em relação
ao Poder Executivo.

cisão administrativa”, que inclui:

[...] toda e qualquer deliberação de agente público que envolva: a) a


proposição, consideração, elaboração, edição, promulgação, adoção,
alteração ou rescisão de um regulamento ou norma de caráter admi-

de atuação ou diretriz de política, ou a sua aprovação ou rejeição; d)


a revisão, a reavaliação, a aprovação ou a rejeição de um ato admi-
nistrativo; e) a aposição de veto ou sanção a projeto de lei ou a ato
legislativo equivalente; e f) a indicação ou escolha ou a designação ou
nomeação de um indivíduo para exercer cargo, emprego ou função
pública, no âmbito do respectivo órgão ou poder responsável pela
decisão. (SAnTOS, 2007, p. 442)

tal toda e qualquer pessoa jurídica, constituída segundo as leis do País,


CAPíTULO II
CORRUPÇÃO
153

qualquer que seja a sua natureza, que seja dirigida por indivíduo ou
grupo de indivíduos, subordinados ou não a instâncias colegiadas e
que tenham interesse na adoção de determinada decisão administrativa.
lobby ou pressão como
sendo:

de grupo de interesse, ou de alguém atuando em defesa de interesse


próprio ou de terceiros, ou em sentido contrário ao interesse de terceiros.
(CÂmARA DOS DEPUTADOS, 2012a)

entidade não-governamental de qualquer natureza que atue por meio


de pressão dirigida a agente público, seu cônjuge ou companheiro ou

com o objetivo de lograr a tomada de decisão administrativa ou legis-


lativa favorável ao grupo de interesse que representa, ou contrária ao
interesse de terceiros, quando conveniente ao grupo de interesse que
representa. (CÂmARA DOS DEPUTADOS, 2012a)

Outro ponto que provoca discussões é o estabelecimento do


credenciamento ou registro ou cadastramento de todas as pessoas

Administração ou do Poder Legislativo. Esse cadastramento é obri-

vados periodicamente e obrigam os titulares a treinamento e capacitação


para a atividade.
A exemplo do que ocorre com os altos funcionários, os creden-
ciados para o lobby devem encaminhar ao TCU até 31 de dezembro de
cada ano, declaração sobre suas atividades, como se observa:

As pessoas credenciadas para o exercício de atividades de lobby deverão


encaminhar ao Tribunal de Contas da União, até 31 de dezembro de cada
ano, declaração discriminando suas atividades, natureza das matérias de
seu interesse e quaisquer gastos realizados no último exercício relativo

especial pagamentos a pessoas físicas ou jurídicas, a qualquer título,


cujo valor ultrapasse 1.000 Unidades Fiscais de Referência – UFIR. Da
declaração deverão constar, ainda, as proposições cuja aprovação ou
rejeição seja intentada ou a matéria cuja discussão seja desejada, e as
despesas efetuadas pelo declarante com publicidade, elaboração de
Salomão RibaS JUnioR
154 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

textos, publicação de livros, contratação de consultoria, realização de

processo legislativo, ainda que realizadas fora da sede do Congresso


nacional. Caberá ao Tribunal de contas da União divulgar relatório dos
elementos referidos neste artigo até 31 de março do exercício seguinte.
(SAnTOS, 2007, p. 444)

Os Presidentes da Câmara e do Senado, o ministro do Controle


e Transparência (Controladoria Geral da União – CGU) e o Presidente
do TCU podem pedir esclarecimentos sobre suas atividades aos que

administrativa a percepção de vantagens, doação, cortesia ou presente


que possa afetar sua isenção na tomada de decisão administrativa ou

Entre as propostas de Resolução, Santos (2007) destaca o Projeto

o Projeto:

Qualquer pessoa física ou jurídica tem o direito de fazer representar


seus interesses e valores perante a Câmara dos Deputados e de procurar

princípios da legalidade, impessoalidade, publicidade, moralidade e


probidade que norteiam a Administração Pública. (CÂmARA DOS
DEPUTADOS, 2012b)

Para tanto, requer-se o registro perante a mesa Diretora e o cre-


denciamento das pessoas que atuarão.
Exigem-se, para efeito de controle, diversas comunicações e rela-
tórios de atividades anuais. Dele constará o pagamento do trabalho ou

Francisco Rodrigues, assevera que:

contato entre a política e a esfera social seja realizado de forma iguali-


tária e transparente, de maneira a que aqueles distintos setores sociais
tenham condições tanto quanto possível equilibradas de fazer ecoar
suas vozes na arena pública e o façam de acordo com procedimento

sejam do conhecimento dos outros atores interessados — evitando-


se, assim, o apelo dos conchavos a portas fechadas. (CÂmARA DOS
DEPUTADOS, 2012b)
CAPíTULO II
CORRUPÇÃO
155

2.9.3 Perspectivas de aprovação da regulamentação do


lobby
O lobby não é matéria prioritária na pauta do parlamento brasi-
leiro. É assunto que não preocupa objetivamente o eleitorado, exceto

desperdício, corrupção). Fora disso, não há preocupação realmente


com o aperfeiçoamento desse mecanismo de participação na elaboração
das decisões administrativas ou legislativas. É o que se pode extrair do
quadro descrito. O que não impede sua existência.

Hoje, podemos dizer que o lobby é amplamente praticado no Brasil,


principalmente nos chamados “corredores do poder”, ainda que de

Contudo, em que pese o seu exponencial desenvolvimento, o sistema

recedora sobre a matéria. Sabemos que o Direito, assim como a existência


e a efetividade das normas jurídicas positivadas que o compõe, não
consegue preceder ao fato social. no entanto, a dimensão que a
atividade do lobby assumiu no cenário político atual demanda uma
atuação tendente a disciplinar e legitimar a atividade condizente com
a sua importância para a realização do Estado Democrático de Direito.
(LIBARDI, 2012)

O mesmo autor anota que, além desse vazio normativo, o lobby é


utilizado como referência de “condutas marginais” como a corrupção, o

públicas e crimes contra a ordem tributária.


Outro aspecto é o equívoco de considerar como investimento

campanhas eleitorais também se encontra associação com a expressão


lobby. De resto são os exemplos citados anteriormente (casos concretos)
apontados pela mídia como lobby.

lobby os substituam na dis-


cussão com os interessados e no processo de decisão de matérias de sua
própria autoria. Imagina-se, porém, que a transparência permitiria um
controle da sociedade que hoje não existe sobre essa atividade.
Salomão RibaS JUnioR
CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

2.10 Corrupção endêmica


Os casos concretos exemplificadamente citados mostram a
abrangência e a variedade de setores afetados pelas fraudes. É o que se
convenciona chamar de corrupção endêmica. As endemias são “doenças

Ao discorrer sobre a corrupção em determinado momento da

Los actos de corrupción tienden a multiplicarse. La corrupción es


endêmica; sin controles, se expande. Esto es lógico desde el momento
en que un acto de corrupción no puede realizarse individualmente,
sino de a dos. Existen, en efecto, innumerables delitos cuya ejecución
es individual; delitos donde una de las partes es victimario y la otra es
víctima: el asesinato, el robo, la violación, la estafa. El cohecho en cambio

corrupción, en su íntima estructura, requiere una suerte de apostolado.


Una persona sola no puede cometer un acto corrupto. necesita atraer
un cómplice, y es así como el mal se va expandiendo: la corrupción es
contagiosa y este es, creo yo, uno de los argumentos más fuertes en
contra de la posición de algunos pragmáticos según los cuales ciertos
actos corruptos convienen al sistema. (GROnDOnA, 1993, p. 99)

no caso brasileiro, uma visita do Presidente dos EUA (1997) foi


precedida de uma avaliação da embaixada norte-americana. O paper

que a corrupção era endêmica no Brasil e disseminada na Argentina,


país que o Sr. Bill Clinton visitaria depois do Brasil. A observação
causou certa indignação na mídia dos dois países. Apenas porque a
opinião vinha de um país estrangeiro. E, especialmente, dos EUA, o
que costuma despertar os complexos dos povos latino-americanos.
De fato, os brasileiros consideram que a corrupção é um dos maiores
problemas do país. Ao se conhecerem as consequências econômicas,
sociais e políticas das práticas corruptas — o que se acentuou nos
últimos anos — para muitos, esse é o maior problema. De acordo com
as avaliações anteriores, a corrupção não controlada transforma-se em
um mal que corrói o tecido social. Deixa a população diante da situação
descrita por Bobbio et al.:
CAPíTULO II
CORRUPÇÃO
157

São notáveis os efeitos da Corrupção no funcionamento de um sistema


político. Se a Corrupção está largamente espalhada e é ao menos
parcialmente aceita pelas massas e nas relações entre as elites, suas

Corrupção servir tão-só para que a elite mantenha o poder e, além disso,
os corruptores forem elementos externos ao sistema político nacional,
como no caso do colonialismo e neocolonialismo, é provável que seu
uso em larga escala crie, por um lado, tensões no seio das elites e, por
outro, provoque reações nas massas, reações ativas como demonstrações,
ou passivas como apatia e alheamento. De um modo geral, portanto, a
Corrupção é fator de desagregação do sistema. Em um sistema jurídico
profundamente formalista e burocratizado, a Corrupção pode, todavia,
contribuir para melhorar o funcionamento do sistema e para o tornar
mais expedito ao desbloquear certas situações. momentaneamente fun-
cional, principalmente quando os obstáculos de ordem jurídico formal
impedem o desenvolvimento econômico, a Corrupção é apenas um

acabando por favorecer umas zonas em prejuízo de outras. (BOBBIO


et al., 1991, p. 292)

A apresentação de casos concretos, escolhidos sem critérios

variadas, ajudam a compreender a magnitude do problema. Como


visto anteriormente, a mensuração objetiva da corrupção é uma tarefa
impossível. As fórmulas dos economistas dão uma ideia de grandeza

resultados obtidos pelos especialistas em Direito. Esses buscam nas


estatísticas de ações judiciais, decorrentes do crime de corrupção, uma
ideia da dimensão do fenômeno. Uns e outros, contudo, reconhecem
as limitações dos seus critérios para medir a corrupção. Daí a ideia

corrupção para avaliar a sua presença e as consequências nos países


pesquisados.
O fato é que nessas pesquisas divulgadas anualmente pela Trans-
parência Internacional, a posição do Brasil nunca é confortável. Em 2011

critério na amostra da Transparência Internacional.

A nota, no entanto, ainda é baixa na escala que vai de 0 (muito corrupto)


a 10 (muito limpo). Apesar da leve melhora, o Brasil caiu na listagem,

quisados. A queda no índice se explica pela melhora mais acentuada de


outros países no último ano e pela entrada de outros na medição, como
Salomão RibaS JUnioR
158 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

as Bahamas e Santa Lúcia, cuja colocação é melhor que a brasileira. na

182 países pesquisados pela organização Transparência internacional.

Essa não é a única metodologia para medir a corrupção. Também


não é perfeita, mas está entre as geralmente aceitas, como veremos na
seção que trata da medição da corrupção.
O fato é que em termos de percepção não se conhecem con-
testações no caso brasileiro. na política, na mídia, no empresariado,
nas lideranças sindicais e na opinião pública o elevado IPC no Brasil é
aceito como expressão da realidade.

2.10.1 Corrupção no futebol


Essa modalidade esportiva é a mais difundida no Brasil, a exem-
plo do que acontece na maioria dos países latino-americanos. Em outras
partes do mundo se passa o mesmo, como em diversos países euro-
peus, especialmente na Espanha. nos últimos anos, o futebol deixou
de ser apenas prática desportiva para se transformar em um grande
negócio. Envolve a simpatia e os sentimentos de milhões de pessoas
e de inumeráveis interesses econômicos. E assim os casos de fraude,
de “entrega” de um jogo ou outros, de “Caixa 2” na negociação de
transferência de determinados jogadores foram suplantados pelo que
se pode chamar grande corrupção. Os negócios ilícitos iniciais não

2.10.1.1 O caso da CBF


As suspeitas envolvendo sucessivos mandatos na Confederação
Brasileira de Futebol (CBF) e em alguns clubes de maior expressão,
levaram o Senado Federal do Brasil a criar uma Comissão Parlamentar
de Inquérito (CPI), para investigar a corrupção sob diversas formas

revela o arsenal de fraudes dos principais cartolas brasileiros, incrimina


dezessete pessoas” (Veja, 2001, p. 138). Já nessa época, o Presidente da
CBF, Ricardo Teixeira, segundo a Revista, era o principal acusado. As
acusações constantes do Relatório Final de autoria do Senador Geraldo
Althof, aprovado por unanimidade pela CPI, são: (i) lavagem de dinheiro
(R$5 milhões) por meio de fraudes contábeis; (ii) apropriação indébita
CAPíTULO II
CORRUPÇÃO
159

(recebimento de salário indevidamente); (iii) sonegação de impostos;


e (iv) evasão de divisas (compra forjada de imóveis e envio ilegal de

em clima de muita tensão nos meios administrativos do futebol e na


mídia especializada. Registra, a revista Veja, uma tentativa de suborno
feita a um assessor do Senador Althof para alterar o relatório com a

se vê, também daí advêm os recursos para campanhas eleitorais.

Apesar do otimismo de muitos, a CPI e suas conclusões não


impediram que, cinco anos depois, os brasileiros fossem informados
Veja, ed. 23 set. 2005, e várias
outras mídias da época).

de futebol envolvia árbitros e empresários de futebol. Ao mesmo


tempo, alguns desses empresários exploravam jogos de bingo e
outras modalidades de jogos de azar clandestinos. A manipulação

ou clandestinas. A corrupção foi investigada pelo ministério Público,


Polícia e Justiça Desportiva. Uma primeira decisão desta anulou onze
partidas do Campeonato Brasileiro de Futebol, todas apitadas pelo
árbitro Edilson Ferreira de Carvalho. Durante seis anos a questão
tramitou pelos órgãos de investigação e Poder Judiciário. no mês de
fevereiro de 2011, o Ex-Árbitro Carvalho, o empresário nagib Fayad e a

morais na manipulação de resultados dos jogos de futebol.


De acordo com as investigações do Grupo de Atuação Especial
e Repressão ao Crime Organizado (GAECO) e a Polícia Federal, o
esquema funcionava assim: (i) um juiz escalado para determinado
jogo comunicava o fato ao empresário Fayad; (ii) este ligava para os
sócios (três ou mais) donos de jogos para contar o valor da aposta e dos
resultados; e (iii) em seguida Fayad registrava o palpite em dois sites de
apostas conhecidos como Aebet e o Futbet, ambos ilegais e clandestinos.
Os recursos envolvidos eram muito elevados. A modalidade não é
exclusiva do Brasil. na década de 1980 houve crime semelhante no
futebol italiano. no mesmo ano de 2005 houve escândalo semelhan-
te na Alemanha. Escândalos dessa natureza rondam os campeonatos
de futebol da Finlândia, Singapura e Vietnan. Outro é a lavagem de
Salomão RibaS JUnioR
CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

dinheiro nas negociações milionárias entre jogadores, empresários e


clubes (Veja, 2005).

não há recursos públicos sendo desviados e nem funcionários públicos


diretamente envolvidos. A boa-fé do público, contudo, foi golpeada.

Os diálogos, gravados [...] revelaram a existência de uma trama desti-

de milhares de torcedores que, ao adquirir ingressos para um espetáculo

a principal autoridade no campo, em vez de garantir a justeza do re-


sultado e fazer com que o melhor time vença, dedicava-se a ajeitar o

quadrilha. (Veja, 2005)

Esse tipo de prática não se limita ao Brasil, mas é indispensável

penal o crime de corrupção privada.

2.10.3 O caso da FIFA

surgir rumores de um escândalo verdadeiramente grande no âmbito


da maior entidade futebolística, a Federação Internacional de Futebol
(FIFA), entidade que congrega mais de 200 países. Entre os principais
suspeitos, estão os nomes lendários do futebol como João Havelange
e o sempre lembrado Ricardo Teixeira (Presidente da CBF). A longa
investigação envolveu negociações entre procuradores suíços e os
brasileiros envolvidos para devolução de algo em torno de US$2,5

Finalmente, em junho de 2012, os jornais publicaram notícias


a respeito de decisão do Tribunal Federal da Suíça que considerou a
questão de interesse público.

O documento de 42 páginas mapeia um esquema de corrupção que


tomou conta de Fifa. Tudo começou quando o Tribunal de Zug decidiu
investigar a quebra da empresa de marketing da Fifa, a ISL. O que
descobriu foi uma ampla rede de suborno. Em 2010, porém, o caso
envolvendo Teixeira e Havelange foi encerrado depois de um acordo
entre os dois e o procurador suíço. Eles devolveram US$2,5 milhões (R$5

na conta desses cartolas. Teixeira e Havelange receberam subornos


CAPíTULO II
CORRUPÇÃO

num valor total de pelo menos 21,5 milhões de francos suíços (cerca de

entre 1992 e 2004 e o tribunal havia decidido processar os brasileiros por


“atos criminosos em detrimento da Fifa”. “Eles causaram prejuízo para
a Fifa por seu comportamento e enriqueceram ilicitamente”. (CHADE,
2012, p. E1)

pagamentos de comissões no valor de US$122,5 milhões por parte da


empresa ISL a dirigentes (cartolas) do futebol de diversos países”. Há
acusações de uso da ISL e de outras empresas para corromper a escolha
das sedes da Copa do mundo. O mesmo esquema era usado para dire-
cionar as transmissões das Copas do mundo — e outras competições da
FIFA — com exclusividade para algumas TVs. É um negócio de muitos
milhões de dólares, capaz de gerar propinas proporcionais ao volume
de dinheiro envolvido.

Geral durante boa parte da longa gestão do Sr. João Havelange. Impos-
sível não saber desses negócios, muitos dos quais foram registrados na
contabilidade do organismo.
Apesar dessa circunstância, foi poupado pela Justiça da Suíça.
Curiosamente, os advogados da FIFA insinuaram preconceituosamente
que:

A maioria da população de países sul-americanos e africanos é corrupta.

e João Havelange com o argumento de que o “pagamento de subornos


pertence ao salário recorrente da maioria da população” nos países da
“America do Sul e da África”. Os documentos revelados pela Justiça suíça

a disposição da entidade em lutar contra corrupção. A mesma justiça

(CHADE, 2012, p. E1)

de um caso atípico da corrupção pública. Trata-se de matéria para a área


da corrupção privada. O que não se pode deixar de reconhecer, como
fez a Justiça da Suíça, há interesse público no caso. Assim, a fraude nos
cofres da entidade é mais grave e deve ser tratada pelo Código Penal,
onde há a capitulação, como corrupção privada. no Brasil, segundo o
ministério da Justiça:
Salomão RibaS JUnioR
CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

Por conta de acordos Internacionais, João Havelange e Ricardo Teixeira


poderão ser processados no Brasil se houver um pedido de cooperação

cujos efeitos civis (pagamento de multa e indenização, entre outros)


queira executar o Brasil, o procedimento se dá por meio de homologação
de sentença.
[...]
Em eventual investigação existente no Brasil, as autoridades que qui-
serem ter acesso aos documentos produzidos na Suíça deverão fazer
o pedido de cooperação jurídica internacional também através do
Departamento de recuperação de Ativos e Cooperação Internacional

A FIFA anunciou (17.07.2012) a criação de um novo código de


ética e de dois órgãos para prevenir e combater a corrupção no futebol.
O Comitê de Ética vai examinar as denúncias contra João Havelange e
Ricardo Teixeira (recebimento de propina) sob o aspecto moral e ético.
As câmaras de investigação e judicial criadas são braços do Comitê
de Ética e vão investigar também os fatos pretéritos (UOL, 2012). no
primeiro momento, as pessoas convocadas não são ligadas ao futebol.

2.10.4 Corrupção no futebol italiano


na Itália, o esquema de manipulação de resultados abalou a

pessoas. Dessas, 52 são jogadores ou ex-jogadores. Algumas pessoas


foram presas. Os clubes foram multados e outros com pontos negativos
já no início do campeonato. Jogadores foram suspensos, alguns por
longos períodos (AGÊnCIA ESTADO, 2012). O que se tem é um caso
de corrupção privada em sentido amplo, mesmo que as sanções, em sua
maioria, têm se dado na área da justiça esportiva. O bem atingido foi a

em geral.

2.10.5. Rede de corrupção


no primeiro ano do atual governo (Dilma Roussef), além do
caso Palocci (ministro da Casa Civil) já referido, outros seis ministros
deixaram o governo sob suspeita de corrupção e outros crimes contra
a Administração Pública.
CAPíTULO II
CORRUPÇÃO

1) Transportes
De acordo com a mídia, o partido do ministro dos Transportes,

propina das empreiteiras com contratos com o governo. O esquema


envolvia o Departamento nacional de Infraestrutura de Transportes
(DnIT) e a VALEC, estatal que constrói a Ferrovia norte-Sul. O dinheiro
ia para o ministro e para o Deputado Valdemar Costa neto — o
mesmo do escândalo do “mensalão”. Impressionante a atuação de José
Francisco das neves (Juquinha). O Ex-Diretor do DnIT Luiz Antônio

para a campanha presidencial do PT (FARInA, 2012).

2) Agricultura
Um pagamento irregular de R$8 milhões provocou a demissão do
Presidente da Companhia nacional de Abastecimento (COnAB), Oscar
Jucá, irmão do Senador Romero Jucá. O demitido resolveu contar o que
sabia sobre o esquema de corrupção, que teve início quando o ministro

da União (CGU) fez dois relatórios apontando várias irregularidades.


Só a contratação da Fundação São Paulo (FUnDASP), sem licitação,
causou prejuízo de R$1,1 milhão. Com sala privativa no ministério,
um “facilitador de negócios” liberava verbas e subornava servidores.
O Sr. Júlio Froes, aparentemente, cobrava 10% para facilitar contratos
de empresas com o ministério da Agricultura (FARInA, 2012).

3) Trabalho
Outro que teve de deixar o governo foi o Sr. Carlos Lupi (Par-
tido Democrático Trabalhista – PDT), ministro do Trabalho. Um grupo
agia de duas maneiras. Em uma, extorquia Organizações não Gover-
namentais (OnGs) com irregularidades na prestação de contas. Em

integravam o esquema (FARInA, 2012).

4) Turismo
Denúncia do jornal Folha de S. Paulo revelou que o ministro Pedro

usava dinheiro público para pagar funcionários em atividades


particulares. Foram presas 33 pessoas ligadas ao ministério do Turismo.
Salomão RibaS JUnioR
CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

A Polícia Federal apontou indícios de desvios de R$4,4 milhões, ape-

comando político da pasta continuasse com o mesmo grupo político


(FARInA, 2012).

5) Cidades
neste ministério, as denúncias de irregularidades e compra de
apoio político surgiram dos próprios quadros do partido do ministro

denúncias, Deputados recebiam um pagamento periódico para apoiar


a permanência do Deputado negromonte no ministério das Cidades
(FARInA, 2012).

A Polícia Federal realizou uma investigação na área da saúde


dando-lhe o nome de Operação Sanguessuga. A outra denominação

Uma organização criminosa negociava junto aos gabinetes parlamen-

específicos. Com a colaboração de funcionários do ministério da


Saúde eram feitas licitações fraudulentas com superfaturamento de até
120%. O lucro era dividido entre os participantes do esquema. Uma

mostrando que investigara 90 parlamentares e 25 ex-parlamentares.

A lista contemplava parlamentares de vários partidos políticos e de


vários Estados. Estima-se que o esquema movimentou R$110 milhões
em cinco anos.

2.10.7 Operação Vampiro


Também na área da saúde a PF investigou fraudes contra o
ministério da Saúde na compra de medicamentos especialmente deri-
vados do sangue (maio de 2004). Estima-se um prejuízo superior a
R$2 bilhões de reais. Os “lobistas” dos laboratórios monitoravam as
licitações do ministério e se organizam em conluio de preços para
vendas superfaturadas. Foram presos e processados 5 servidores
do ministério da Saúde, 1 da AnVISA, 11 empresários e “lobistas”
(REVISTA ÉPOCA, 31.05.2004).
CAPíTULO II
CORRUPÇÃO

2.10.8 Desvios de acordo com a mídia

rupção em vários pontos do mundo e no Brasil em particular. Esse

a cobertura constante dos procedimentos exercidos pelos órgãos pú-


blicos e organizações não governamentais na descoberta de fraudes e
instauração de processos sancionatórios. O outro ângulo é da posição

lismo investigativo feito pelos jornalistas dos próprios veículos de co-


municação. Dos inúmeros casos que se pode colher da mídia, merece

matéria de marcelo Rocha “Como se desvia dinheiro no Brasil” (Época,


2012).
A matéria relembra textos antigos, como a “Arte de Furtar”

alerta-se o Rei de Portugal Dom João IV sobre os “malfeitos” na colônia


brasileira. A matéria procura que a corrupção está presente desde os
tempos iniciais do Brasil, chegando aos dias atuais, assinalando que:

nos últimos anos, os mecanismos de controle avançaram, as inves-

trabalham mais em parceria. no ano passado, a Controladoria-Geral


da União (CGU) apurou desvios que chegam a R$1,8 bilhão. A soma
é resultado de investigações que envolveram licitações fraudadas,
cobranças indevidas de procedimentos do Sistema Único de Saúde (SUS)
e verbas que seriam empregadas em atividades esportivas para crianças
carentes. Desde 2002, quando a CGU passou a consolidar os números,
os desvios somam R$7,7 bilhões. Esses valores representam o montante
que deve ser cobrado dos responsáveis por essas irregularidades, mas,
sabidamente, está longe de ser o montante que foi roubado no Brasil.
(ROCHA, 2012)

mais adiante, anota-se que:

no ano passado, a Advocacia-Geral da União (AGU) conseguiu recu-


perar R$330 milhões para os cofres públicos em ações que tramitam na
Justiça que envolvem, entre outros, casos de corrupção contra a admi-
nistração pública. Só em 2011, a AGU entrou com ações que pedem a
devolução de R$2,3 bilhões. É uma luta que vale a pena. Ao ler sobre
corrupção praticamente todos os dias na imprensa, é comum que o
Salomão RibaS JUnioR
CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

cidadão muitas vezes se sinta perdido, confuso, desorientado. O guia


a seguir visa mostrar que, de maneira geral, a corrupção não é algo tão
complexo e rocambolesco como muitas vezes pode parecer. Como uma
carta endereçada ao cidadão brasileiro, da mesma forma que Arte de
furtar se dirigia ao rei Dom João IV, o objetivo singelo desse levantamento
é mostrar como se rouba no Brasil atual. Sempre tendo em vista que,

com os “malfeitos”. (ROCHA, 2012)

São mostradas sete modalidades de desvios mais comuns de


recursos públicos no Brasil. O que reforça a impressão de endemia e da
extrema variedade de campos e de meios para a corrupção. Os esquemas

emendas parlamentares, por meio de OnGs, contratos de publicidade,


consultorias. Assim, o quadro investigado mostra os seguintes aspectos:

1. Obras
1. Com a conivência de agentes públicos, empresas se unem e fraudam
licitações para escolher que vai executar uma determinada obra;

garantir vitória na licitação;


3. Com o contrato garantido, ela começa a pedir aditivos. Agentes pú-
blicos envolvidos ajudam a inchar o valor da obra;
4. O governo para mais caro ou por serviços não executados. A fartura
é dividida entre políticos e empresários.
[...]
Aditivos encarecem obras porque incluem providências inexistentes
nos projetos básicos. Segundo o próprio governo, os projetos básicos

Ferrovia Oeste-Leste (do litoral baiano ao Tocantins), os valores orçados


estavam muito acima do necessário. Em apenas um lote da Oeste-Leste
houve um sobrepreço de R$35 milhões, mesmo após recomendações do
TCU. Ao analisar 17 licitações dos Transportes, auditores constataram

(ROCHA, 2012)

2. Eventos

para fazer uma festa ou evento;


2. Essa prefeitura contrata empresas para o evento, sempre por valores
que dispensam concorrência;
CAPíTULO II
CORRUPÇÃO

3. Ligadas a políticos, as empresas contratadas superfaturam os preços


dos serviços prestados;
4. As empresas passam parte do dinheiro recebido para os políticos
envolvidos.
[...]

zenas de contratos com municípios e entidades diversas, inclusive


para a realização das tradicionais festas de São João. Já são mais de
R$13 milhões sendo cobrados de prefeituras. Entre os municípios
reprovados, São João da Barra, no Rio de Janeiro, recebeu mais

a CGU, não apresentaram documentos para comprovar o correto uso


de todo o dinheiro. (ROCHA, 2012)

2. O governo paga as entidades de acordo com o número de cursos,


professores e alunos propostos;
3. As entidades corruptas inventam cursos, aumentam o número de
alunos e simulam a contratação de professores;
4. Depois, enviam ao governo relatório com dados fajutos para acobertar
os desvios.
[...] Em agosto de 2011, o então secretário executivo do ministério
do Turismo, Frederico Costa, e outras 35 pessoas, entre empresários
e servidores públicos, foram presos acusados de participar de uma
quadrilha que fraudava convênios da pasta. Os recursos deveriam
ser aplicados no treinamento em turismo no Amapá. Depois de
colher indícios de que pelo menos R$4 milhões foram desviados, a
Polícia Federal realizou a Operação Voucher. As fraudes, de acordo
com as investigações, tinham como pivô o Instituto Brasileiro de
Desenvolvimento de Infraestrutura Sustentável (Ibrasi), sediado em
São Paulo. Tudo sugere que se trata do típico caso de desvio por meio

4. Emendas parlamentares
1. Deputados e senadores incluem no Orçamento da União propostas
para direcionar gastos do governo federal;
2. Os parlamentares negociam com o Palácio do Planalto a liberação do
d
Salomão RibaS JUnioR
CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

uem vai executar o


serviço bancado com os recursos de sua emenda;

mulação de serviços, parte do dinheiro é desviada.


[...] Funciona assim: cada deputado ou senador pode incluir até
R$15 milhões por ano no Orçamento da União. O parlamentar coloca o
que quiser. Pode ser a construção de uma ponte, a contratação de uma
OnG ou a compra de um equipamento. Assim, considerando quatro

quase R$30,8 bilhões potencialmente manipuláveis. no Senado, com 81


parlamentares e mandato de oito anos, o valor total potencialmente sob

Congresso: R$40,5 bilhões. É um dinheiro e tanto para um poder cuja

aprovar o Orçamento. (ROCHA, 2012)

5. ONGs

2. O governo paga a OnG por determinado serviço;


3. A OnG contrata empresas para executar os serviços. As empresas
devolvem o dinheiro para os participantes do esquema;

ao governo, como se o dinheiro tivesse sido investido.


[...] Somente em 2011, mais de 73 mil entidades repartiram mais de
R$2,7 bilhões de dinheiro público. O problema é que não há garantia
sobre a efetiva aplicação dos recursos. “nada impede que hoje uma
prefeitura faça um convênio com uma OnG para tocar a Educação inteira
do município. Ou a Saúde inteira. Ou uma obra”, diz Luiz navarro, da
CGU. “Aí caímos no problema real: quem escolheu a OnG? Por que
ela foi escolhida? A quem ela pertence? A gente vê coisas absurdas
nas prestações de contas, como OnGs ditas sociais que cuidam até de
trânsito”. (ROCHA, 2012)

Anota-se, por oportuno, que uma CPI para investigar a atuação


das OnGs foi concluída sem completar o seu trabalho.

6. Contratos de publicidade
1. Os editais são direcionados para escolher determinadas empresas;

3. Depois de vencer, a agência corrupta subcontrata empresas ligadas


a seu padrinho político;
CAPíTULO II
CORRUPÇÃO

4. Também pode superfaturar na compra de materiais e serviços


previstos no contrato. (ROCHA, 2012)

se os desvios.

no caso do mensalão, o dinheiro público desviado seria proveniente

e publicitário marcos Valério. Essa foi a conclusão da Polícia Federal.

dos cofres do Banco do Brasil, de um fundo de publicidade chamado


Visanet. Esse Visanet é destinado a ações de maketing do cartão da
bandeira Visa. As agências de Valério produziram ações publicitárias,
mas a maioria dos valores repassados pelo governo teria servido para
abastecer o mensalão. Caberá aos ministros do Supremo Tribunal
Federal, em julgamento previsto para este ano, dizer se essa tese procede.
(ROCHA, 2012)

Ouvido, o Procurador Lucas Furtado do TCU assegurou que, na


sua percepção, “os corruptos migraram de grandes obras públicas para

Há um fato que se repete e força a reflexão. A agência de


publicidade — e o seu marqueteiro — da campanha vencedora acaba
contratada pelo governo senão exclusivamente com as fatias mais
generosas do belo publicitário.

7. Consultorias
1. Órgãos do governo usam o critério subjetivo da “notória especiali-
zação” para contratar empresas de consultoria sem fazer licitação;
2. A consultoria pertence a pessoas ligadas ao político;
3. O serviço nem é executado ou é feito sem nenhum rigor;
4. A empresa de consultoria recebe o pagamento e repassa o dinheiro
aos políticos ou agentes públicos envolvidos.
[...]
Para começar, serviços de consultoria somente deveriam ser contratados
para a execução de atividades que, comprovadamente, não possam ser
desempenhadas por servidores permanentes da administração pública.
mas não é bem isso o que se observa. Usa-se o critério de “notória

físicas ou jurídicas) sem fazer licitação, outro conceito nada objetivo.


(ROCHA, 2012)
Salomão RibaS JUnioR
170 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

Como se pode ver, esses são os casos mais notórios, o que não
impede uma enorme variedade de áreas afetadas. Em seguida veremos
outros casos concretos que ilustram a questão da endemia.
Os setores de licenças e autorizações da Administração Pública
são muito vulneráveis. Contribuem para isso três fatores principais: (i)
excessiva e complexa burocracia; (ii) falta de transparência do processo;
(iii) abusos dos particulares no exercício da atividade licenciada ou
autorizada. É o que se extrai de dois casos no município de São Paulo.

8. Alvarás de construção

prefeitura para liberar construções civis e reformas em casas e prédios.

Antônio Zeppini cumpriu pena de cinco (5) anos de prisão (1998). Dez
anos mais tarde o ministério Público denunciou um novo esquema de
propinas para concessão de licenças na Prefeitura de São Paulo. Com
a participação de servidores, Secretários Regionais e Vereadores da
Câmara municipal de São Paulo, o esquema arrecadava recursos dos
vendedores ambulantes (camelôs). O pagamento de propinas ultra-

no começo de 2008 os camelôs procuraram o ministério Público

que apenas na Região do Brás — onde se concentravam sete (7) mil


ambulantes — os subornos eram de R$800 mil mensais.
As pequenas corrupções também foram investigadas pela Uni-
versidade Federal de minas Gerais (UFmG), em parceria com o Instituto
Vox Populi. Segundo divulgado pelo ministério Público de minas
Gerais, cerca de 20% dos brasileiros, ou seja, um em cada quatro não
as vê como corrupção.

2.10.9 Percepção e tolerância popular


Pesquisa feita pela Universidade Federal de minas Gerais
(UFmG) e o Instituto Vox Populi mostra que pelo menos quatro práticas
de corrupção não são vistas assim pelos brasileiros. Uma lista elabo-
rada com a colaboração do Promotor de Justiça Jairo Cruz moreira,
Coordenador nacional da campanha “O que você tem a ver com a
corrupção” aponta dez atitudes comuns dos brasileiros.
CAPíTULO II
CORRUPÇÃO
171

São elas:
1. não fornecer nota Fiscal;
2. não declarar Imposto de Renda;
3. Tentar subornar o guarda para evitar multas;

9. no trabalho, bater ponto pelo colega;

Segundo ele, “muitas pessoas não enxergam o desvio privado


como corrupção. Só levam em conta a corrupção no ambiente público”
(COnSULTOR JURIDICO, 2012).
Ainda de acordo com a pesquisa acima, “35% dos entrevistados
dizem que algumas coisas podem ser um pouco erradas, mas não
corruptas, como sonegar impostos quando a taxa é cara demais” (COn-
SULTOR JURIDICO, 2012).

2.11 medir a corrupção

críticas de Tanzi (1998) e Rose-Ackerman (2001). Igualmente, ressalva

ACKERmAn, 1999 apud DREHER et al., 2012, p. 2). no mesmo docu-

than US$1 trillion is paid in bribes each year and that countries that
tackle corruption, improve governance and the rule of law could
increase per capita incomes by a staggering 400 percent” (DREHER
et al., 2012, p. 2).
Essa estimativa tem sido repetida em vários papéis de trabalho
ou de estudos do Banco mundial, especialmente os assinados pela con-
ceituada doutrinadora Susan Rose-Ackerman (2001). Como é sabido,

corrupção e de suas consequências na vida dos povos.


De qualquer maneira é muito difícil medir objetiva e diretamente a
corrupção. Um dos esforços pioneiros nesse sentido foi desenvolvido por
mauro, considerando o impacto da corrupção sobre o desenvolvimento
Salomão RibaS JUnioR
172 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

econômico. nesses estudos ele considera que a presença de altos níveis


de corrupção ou a sua disseminação, em um dado país, tem como
consequência baixas taxas de desenvolvimento econômico e de inves-
timentos (mAURO, 1995).
Os métodos utilizados para medir o fenômeno são muitos entre
os economistas. O que provoca menor nível de discussão entre o público

pela Transparência Internacional.


Todos, de qualquer modo, explicam a presença da corrupção
mediante o estudo de causas e indicadores geralmente aceitos. Entre
esses merecem destaque: (i) os fatores políticos; (ii) os fatores históricos;
(iii) os fatores sociais e culturais; e (iv) os fatores econômicos.
Entre os fatores políticos são avaliados aspectos da organização
democrática e da efetividade e legitimidade do seu sistema judicial.
Consideram ainda, sob o aspecto histórico, a difícil separação entre
condicionantes decorrentes desse fator e a operação do regime demo-
crático e dos seus sistemas de controle, em particular, o judicial. Entre os
fatores sociais e culturais são muitas as variáveis (familiares, religiosas,

tamentos corruptos. Sob o domínio dos fatores econômicos são desta-


cados três aspectos: (i) grau de abertura da economia; (ii) volume de
recursos naturais disponíveis; e (iii) tamanho do setor público. Governos

falta de competição livre gera corrupção nas relações de mercado. A


concentração na exploração e exportação de poucos recursos naturais
gera oportunidades de .

autorizações) para as atividades privadas. Por último, a excessiva tribu-


tação para manter a imensa burocracia em funcionamento (DREHER
et al., 2012, p. 5).

2.12 Os indicadores da Transparência Internacional


A Transparência Internacional (TI) é uma Organização não
Governamental (OnG) que tem como objetivo combater a corrupção.
Criada em Berlim (Alemanha) em 1993, sob a liderança do Professor
Peter Eigen — antigo funcionário do Banco mundial — destina-se a
combater a corrupção, a partir de cinco perspectivas: (i) corrupção polí-
tica; (ii) corrupção em contratos internacionais; (iii) corrupção no setor
privado; (iv) convenções internacionais para prevenir a corrupção; e
CAPíTULO II
CORRUPÇÃO
173

(v) pobreza e desenvolvimento. A Transparência Brasil não trabalha

e combate da corrupção.

2.13 índice de Percepção da Corrupção

colaborou para a construção do índice de Percepção da Corrupção


(IPC), da TI, e assegura que “evidências sugerem que uma melhora

0,5 ponto percentual do Produto Interno Bruto (PIB) e em 4 pontos


percentuais nas receitas de um país” (LAmBSDORFF, 2008). É uma
previsão estimulante para lutar contra a corrupção. Se se levar em
conta as variáveis negativas — como se viu antes — que podem ser
contidas ou mesmo eliminadas, ter-se-á mais ânimo para agir contra
a corrupção em todas as suas formas. As causas ou fatores políticos
são provavelmente as mais fáceis de enfrentar. A transparência nos
negócios públicos e nas eleições tende a inibir a corrupção em suas
variáveis política e eleitoral. Restarão os demais fatores que demandam
mais tempo e outros mecanismos, entre os quais a educação, a ética
e a prosperidade, a partir de reformas de base. De qualquer maneira

e avaliar objetivamente as consequências do fenômeno, relacionadas

Esse índice usado pela TI e aguardado com expectativa a cada


ano não é um método de medir a corrupção sem contestações. Há vários

dez ou doze metodologias sobre as quais se constrói o do IPC


têm seus próprios conceitos de corrupção, dos seus efeitos positivos e

medem o grau de desenvolvimento econômico e social dos povos.


Agora, é o índice ou pesquisa que merece a mais ampla divulgação
pela mídia e o mais conhecido, fora do mundo acadêmico.
O IPC é o mais usado pelos governos quando melhoram de po-
sição, e pelos partidos de oposição quando ocorre o inverso. Também
respeitáveis instituições nacionais que — a exemplo da TI — se dedicam
a combater a corrupção — usam-no para avaliar o país e os governos
onde atuam. É o que explica em seu site o Instituto ETHOS de Empresas
e Responsabilidade Social:
Salomão RibaS JUnioR
174 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

O que é corrupção e como o IPC a mede? A corrupção é o abuso do poder

TI, aplicada a ambos os setores, público e privado. O IPC focaliza-se na


corrupção no setor público, a corrupção que envolve agentes públicos,
servidores civis ou políticos. Os dados utilizados para compilar o índice
incluem questões relacionadas ao abuso do poder público e tem o foco

desfalque de fundos públicos e nas questões que exploram a intensidade

ambos os aspectos administrativos e políticos da corrupção. Ao produzir

calcular uma única nota para cada país. (ABRAHÃO, 2012)

Outro aspecto que o ETHOS ressalta é a circunstância de o índice


ser baseado apenas em percepções e o uso de 17 fontes de dados de
13 instituições para o período de 2009 a setembro de 2011.

Por que o índice é baseado apenas em percepções? A corrupção geral-

escândalos, investigações ou processos. Assim, é difícil avaliar os níveis


absolutos de corrupção em países ou territórios com base em dados
empíricos. Possíveis tentativas de fazer isso, tais como pela comparação
de subornos relatados, pelo número de processos apresentados ou pelos

tribunais ou a mídia na investigação e exposição da corrupção. Um

percepções daqueles em posição de oferecer avaliações de corrupção


do setor público daquele país. (ABRAHÃO, 2012)

no livro Medindo a corrupção, os autores Samford e Shacklock

corrupção que permeia os mais altos cargos dos governos nacionais

prevalência das regras legais e da estabilidade da economia.

rupção que envolve trocas de pequenas somas de dinheiro, a concessão


de pequenos favores para os que buscam tratamento preferencial ou o
emprego para amigos e parentes em posições inferiores.
A diferença entre as modalidades não elimina as distorções que a
grande e a pequena corrupção provocam (SAmFORD; SHACKLOCK,
. 211).
CAPíTULO II
CORRUPÇÃO
175

Outro índice produzido pela TI é o da percepção do suborno


transnacional. É o exame dos países corruptores ou das empresas que
se valem dessas práticas para conseguir negócios no exterior. O mesmo
procedimento condenado pela OCDE é criminalizado em vários países,
como se viu anteriormente.
O Bribe Payers Index (índice de Pagadores de Suborno) foi feito

de suborno de empresas dos 22 países maiores exportadores. Dessa


pesquisa nasceu um . nas primeiras posições, estavam os países
cujas empresas têm os menores índices de corrupção. nos últimos
lugares, os países com empresas mais corruptoras. Os países com

da Itália. Entre as empresas que mais oferecem subornos estão as que


prestam serviços públicos, de construção, imobiliárias e petrolíferas. As
mais honestas são as do ramo da pesca, informática e bancos. Os dados
são do Instituto ETHOS, baseados em notícias do Jornal O Estado de
São Paulo, de 09 de dezembro de 2008. na atualidade, a TI considera
que “quando empresas subornam para ganhar contratos, engraxar
as rodas da burocracia, contornar as regras, elas não apenas preju-
dicam seus competidores, mas também as sociedades onde operam”
(TRAnSPARÊnCIA InTERnACIOnAL, homepage, risted, 10 set. 2012).

os últimos 12 meses você acredita que a sua companhia deixou de


vencer um contrato ou ganhou novos negócios neste país, porque um
competidor pagou suborno?”. 73% dos entrevistados disseram não,

negativas para 34% positivas. A pesquisa envolveu 3.000 homens de


negócios em 30 diferentes países, e foi aplicada de maio a julho de 2011,

no Brasil, houve algumas tentativas de medir a corrupção e


mesmo de calcular os prejuízos diretos sobre as contas públicas.
Pelo IPC da TI, a posição do Brasil até novembro de 2011 estava

sociais violentos.
Salomão RibaS JUnioR
CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

2.14 Outras tentativas de medir a corrupção


As entidades e pesquisadores que se propuseram a medir a

já referidas. A utilidade da medida está mais vinculada ao aspecto

recursos públicos desviados. no fundo, o que se busca são números


que deem uma ideia de grandeza da drenagem de recursos do erário
para ganhos privados.
Um dos estudos foi feito pela Federação das Indústrias de São
Paulo (FIESP), por meio de equipe técnica do seu Departamento de
Competitividade e Tecnologia (DECOmTEC). O estudo foi motivado por
pesquisa do IBOPE que apontou, em 2008, que a corrupção é o segundo
problema na ordem de preocupações dos brasileiros. Foi superada
apenas pelas preocupações com a segurança pública. na mesma linha,

corrupção o segundo maior obstáculo ao desenvolvimento empresarial.


À frente apenas está a elevada carga tributária.

A corrupção pode prejudicar seriamente o desempenho econômico de


um país. Entre uma série de problemas, a corrupção afeta as decisões
de investimentos, limita o crescimento econômico, altera a composição
dos gastos governamentais, causa distorções na concorrência, abala a

fatores, a corrupção compromete a competitividade do país, na medida


em que aumenta o custo do investimento produtivo e prejudica a
estabilidade do ambiente de negócios. (FIESP, 2010, p. 7)

Superando o problema da conceituação da corrupção e ado-


tando os critérios do Banco mundial, a corrupção é um desvio dos
deveres associados a um cargo público para o benefício privado. mas
esse conceito pode ser estendido para englobar o benefício a partidos
políticos familiares e classes.
As causas apontadas para a existência do mal no Brasil são co-
nhecidas: (i) elevado poder discricionário; (ii) baixo nível dos salários;
(iii) sistema político; e (iv) desigualdade social e de direitos.
A metodologia escolhida foi considerar o IPC da TI do Brasil e
de outros países em comparação com outros indicadores nos mesmos
países. Assim: (i) esforço na redução da corrupção percebida; (ii) relação
entre IPC e indicador de efetividade do governo; e (iii) relação entre o
IPC e
CAPíTULO II
CORRUPÇÃO
177

As conclusões iniciais apontaram que:

de corrupção percebida de 180 países, cuja média do IPC foi de 4,03,


indicando que a corrupção percebida no Brasil é bastante elevada e

Sistema Judiciário, resultam, em média, três pontos aquém dos indi-


cadores observados nos países da OCDE e nos Selecionados. (FIESP,
2010, p. 7)

na sequência, o mesmo estudo demonstra que os piores índices


de governança estão relacionados com a maior percepção da corrupção,
como se observa na tabela colacionada:

Tabela 1 – Comparação entre países – Relação entre governança e corrupção

Fator Indicador Brasil Países selecionados OCDE

Burocracia

5,00 8,05 7,70

Pública

6,20 8,81 8,61

5,10 8,88 8,61

1
3,70 7,53 6,98

Fonte: * Indicadores de Governança do Banco mundial (2008).

1
Observações: Quando maior o índice, menor a corrupção percebida.
Salomão RibaS JUnioR
178 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

Após outras demonstrações, o estudo da FIESP anota que “os


países em que a corrupção percebida é menor o PIB per capita e o IDH
são mais elevados e maiores, tende a ser a sua competitividade”. Sempre

nindo: “o custo da corrupção representa o montante de recursos que é


desviado das atividades produtivas para as práticas corruptas”. Foram
selecionados 95 países que reuniam todas as informações para permitir
as comparações e as conclusões. Assim, conclui-se que:

na média do período (1990 a 2008), o Brasil possui um produto per

percepção da corrupção igual a média dos países Selecionados de 7,45,


o produto per capita do país passaria a US$9.184, ou seja,um aumento

(FIESP, 2010, p. 25)

Usando como referência a média do IPC desses países (7,45),


calcularam que no período de 1990 a 2008 o custo médio anual da cor-
rupção para o Brasil era de US$8,8 bilhões. A preços correntes de 2008,
o custo anual é de R$41,5 bilhões, o que corresponde a 1,38% do PIB.
Depois, avaliando aspectos do controle frágil, os estudos apontam
que se houvesse mais rigor, estariam substancialmente reduzidos os
pagamentos de subornos, propinas e superfaturamento de compras
governamentais.

Se o país tivesse o mínimo teórico de corrupção percebida (IPC igual


a 10), maior seria o montante de recursos disponíveis, liberados pela
inexistência das práticas corruptas. na medida em que este montante

para o país (o custo da corrupção). Se o país apresentasse um controle


ainda maior da corrupção (IPC igual a 10), o custo médio anual da

Em resumo, os estudos da FIESP, considerando-se o período


1990-2008:

selecionados, estima-se um custo médio anual da corrupção


de 1,38% do PIB; e
- se o IPC do Brasil for de 10,0, estima-se um custo médio anual
da corrupção de 2,3% do PIB.
CAPíTULO II
CORRUPÇÃO
179

Assim, o estudo conclui “que o custo médio da corrupção no


Brasil é estimado entre 1,38% a 2,3% do PIB, isto é, de R$41,5 bilhões a

Já a revista Veja
valendo-se dos seus dados e informações chegou a valores de perdas
com a corrupção bem mais altos. É oportuno registrar que essa revista
teve como matéria de capa o tema corrupção quase uma centena de
vezes nos últimos anos.
O dado é alarmante: R$720 bilhões de reais roubados nos últimos
10 anos. Desse total, 51% são de verbas federais, 30% dos governos esta-
duais e 19% dos municípios. Estima a publicação que foram descobertos
formalmente R$7 bilhões e efetivamente recuperados apenas R$500
milhões de reais. Os percentuais referem-se aos gastos, considerando-se
a estimativa que a corrupção segue a mesma proporção.
Assim, tem-se que a corrupção drena anualmente R$85 bilhões
de reais, o que equivale a 2,3% do PIB. O mesmo levantamento aponta
os ministérios do governo federal e o montante das irregularidades
apontadas:

Saúde (R$2,2 bilhões de reais); Integração nacional (R$1,1 bilhão de

de reais); Trabalho e Emprego (R$475 milhões de reais); Planejamento

tura (R$184 milhões de reais); Ciência e Tecnologia (R$130 milhões de


reais); Previdência (R$120 milhões de reais). (Veja, 2011, p. 77)

Com esses R$85 bilhões seria possível aumentar R$443 reais


o PIB per capita

pessoas, erradicando a miséria e ainda sobrariam R$5 bilhões de reais.


São inúmeros os outros benefícios que poderiam ser custeados
com o dinheiro que vaza para o ralo da corrupção. Para ter ideia da
grandeza do montante, basta que se diga que poderia pagar o Bolsa

mil quilômetros de estradas (17% da malha atual).


no mesmo período (10 anos) em que foram desviados R$720
bilhões, segundo a FIESP, a Controladoria Geral da União (CGU) ana-
lisou 15 mil contratos da União com os Estados, municípios e OnGs.
Encontrou irregularidades em 80% deles. Os desvios encontrados
são aqueles R$7 bilhões acima referidos. Foram recuperados apenas
R$500 milhões. O que permite dizer, segundo a revista Veja (2011),
Salomão RibaS JUnioR
180 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

que a cada 100 reais roubados, apenas 7 centavos são recuperados. “O


custo elevado da corrupção no Brasil prejudica o aumento da renda, o

mais estável” (Veja, 2011, p. 77).

dos recursos públicos desviados. não é, frise-se, um quadro preciso,

a corrupção, apenas dá uma ideia.


As propostas de melhoria do controle sobre este assunto serão
citadas nas conclusões da presente obra.

2.15 Outro método de medição


Uma interessante pesquisa foi desenvolvida (CHEUnG; RAU;

em subornos e quais os benefícios que conseguem. De acordo com o

de suborno envolvendo 107 empresas listadas publicamente em 20


“stock markets”. Todas haviam informado que subornaram servidores
públicos de 52 países ao redor do mundo, no período de 1971 a 2007. A
lista inclui empresas como Siemens, BAE Systems, Hyundai, Lockheed

de casos isolados.
Segundo uma pesquisa atribuída ao
Corruption Survey
que perderam negócios para concorrentes que agiram desonestamente.

naram em outros países a mesma organização. Em relação aos países

para obter negócios (CHEUnG; RAU; STOURAITIS, 2012).


na amostragem dos pesquisadores, estes acentuam:

and bribe as a proportion of the size of the contract (a bribe “tax”).

politicians with greater hold-up power (heads of state, presidents, prime


CAPíTULO II
CORRUPÇÃO
181

ministers, ministers and members of parliament) receive larger bribes.

STOURAITIS, 2012, p. 4)

Quanto aos benefícios, o mesmo documento assinala:

net
gross

divided by the bribe payment), and the proportion of the rents received

value increases by 11 dollars, on average, for each dollar of bribe they

do not
are able to capture the rents from large contracts in the form of larger
bribes. (CHEUnG; RAU; STOURAITIS, 2012, p. 5)

Entre aspectos das conclusões, os pesquisadores relembram o


universo da pesquisa: 107 empresas de capital aberto em 20 mercados
que tenham subornado funcionários públicos em 52 países. Outra
comparação pode ser feita com uma amostra de concorrentes que não
tenham se envolvido com suborno. na mesma conclusão apontam
limitações: (i) a pesquisa está concentrada em grandes incidentes de
corrupção; (ii) a amostra é de empresas que surpreendidas pagando
subornos tiveram a prática amplamente divulgada. O fato é que projetos
importantes — e vultosos — foram conquistados por meio de subornos.
Outras facilidades — especialmente tributárias — foram obtidas com
o pagamento de suborno a funcionários públicos. Daí o dado que de-
monstra um excepcional incremento de cada dólar gasto em suborno.
De cada um dólar há incremento para onze dólares.

O que provoca escândalo ou pelo menos desperta a atenção são


os atos da grande corrupção. Eles são praticados por agentes situados
Salomão RibaS JUnioR
182 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

há conluio ou associação entre agentes dos dois grandes setores da


organização da sociedade. A corrupção é um ato clandestino, escondido,
mas nunca é um ato solitário. A pequena corrupção pode ser praticada
isoladamente. Por exemplo: o peculato de uso de equipamentos do
patrimônio público não precisa do concurso de mais de uma pessoa.
Outras pequenas fraudes também não exigem a formação de qua-
drilha,31
dá-se o inverso. ninguém desvia recursos de uma obra pública agindo
sozinho. A burocracia não permite a ação isolada. De um lado tem-se
a hierarquia e a segregação de funções. Do outro, o processo admi-

de pequena monta que escapam do controle, contados, são constantes.


não se pode desprezar a somatória dos danos causados pela pequena
corrupção.
Um levantamento completo dos desvios anuais no Brasil ainda
está para ser feito. não se pode, contudo, ignorar levantamento feito

Experian (Veja, 2012).

de identidade e falsidade ideológica. Os criminosos usam dados pessoais


das vítimas para comprar produtos ou obter créditos;

de 2012, 11% a mais que no mesmo período em 2010. Geralmente, é a


própria vítima quem passa despercebidamente os dados aos golpistas,
quando preenche formulários em sites suspeitos, por exemplo;
- 37% das tentativas aconteceram no setor de serviços, que envolve
seguradoras, imobiliárias e serviços gerais, como salões de beleza. É
o segmento com mais golpes registrados. Em seguida, vêm o setor de
telefonia, com 30% (o golpista tenta comprar um celular), e o bancário,
com 19% (nele, o contrafeitor tenta abrir uma conta bancária e solicitar
cartões de crédito);

no período tivessem sido bem-sucedidos. (Veja, 2012, p. 54)

Quanto ao setor público, é interessante anotar comentários do


jornal Folha de S. Paulo (30 nov. 1999), em editorial intitulado “A grande
corrupção miúda”.

31
Código Penal – Art. 288. Associarem-se mais de três pessoas, em quadrilha ou bando, para

Parágrafo único - A pena aplica-se em dobro, se a quadrilha ou bando é armado.


CAPíTULO II
CORRUPÇÃO
183

Depois de reconhecer que é comum durante as ondas de investigação de


crimes contra o bem público a expectativa de que se capturem ‘peixes
grandes’ chefes poderosos de quadrilhas, políticos e autoridades de
renome, assinala que jamais há cadeia para grandes culpados para
relembrar que [...] a Folha tem mostrado que, se o nível de corrupção no
Estado é grande, muita vez são os pequenos os responsáveis pelo esbu-
lho. Trata-se da corrupção molecular, do crime aos pequenos bocados,
mas disseminado o bastante para causar muito prejuízo e degradação
moral. (RIBAS JR., 2000, p. 15)

O mesmo jornal viria a anotar, comentando em editorial, a re-


núncia de Severino Cavalcanti da Presidência da Câmara dos Depu-
tados, “assolado por evidências contundentes de corrupção miúda,

— em discurso que não entrará para a história” (Folha de S. Paulo, 2005).


Ao lado, pode-se relembrar: a teoria dos mil pequenos cortes
ou mil pequenos furos. Alguns ou mesmo uma centena não afetam a
vida de uma pessoa. mil pequenos cortes provocam — no conjunto ou
soma — uma hemorragia letal. Alguns pequenos furos em um barril
d’água não esvaziam. mil pequenos furos — dependendo da posição —
provocam o esvaziamento total. Com as pequenas corrupções acontece

e no aviltamento das relações pessoais.


PÁGINA EM BRANCO
CAPíTULO III

ÉTICA

Desde que começaram as buscas mais intensas por meios de


contenção dos atos de corrupção no serviço público, o respeito aos
valores éticos ganhou relevância. De fato, as leis mais amplas e o agra-
vamento das sanções não produziram os efeitos esperados. O aumento
do que os economistas chamam de custo para o corrupto e o corruptor

custos tenham sido elevados a um aspecto importante: a impunidade.


Ela se dá por várias razões, mas, especialmente, porque enquanto o
instrumental da prevenção e do combate está restrito ao direito público,

direito privado. Esse cenário data da última década do século xx e é


encontrado com pequenas variações nos dias atuais.
A busca pelo renascimento dos valores éticos na Administração

corrupção.
Vive-se, na virada do milênio, uma espécie de reencontro com
a necessidade de valores para a vida em comum. Sobre esse momento
histórico, o político democrata-cristão brasileiro André Franco montoro

ilusão se transformou em desespero”. E, ainda no mesmo artigo, relata


que “no campo do direito, da economia, da política, da ciência e da
tecnologia, as grandes expectativas de um sucesso pretensamente neu-
tro, alheio aos valores éticos e humanos tiveram resultado desalentador
e muitas vezes trágico”.

de um renascimento da ética. E ainda que não se tenha resolvido


satisfatoriamente uma série de problemas no campo da ética formal
Salomão RibaS JUnioR
CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

e da ética material, inclusive a sua separação da moral como campo


distinto do saber humano, há uma busca pela ética. Às vezes errática,
equivocada, mas ainda assim, uma busca, uma desesperada busca.
Essa questão acentuou-se com as denúncias, mostrando a con-
vivência da grande e da pequena corrupção nos mais variados setores
da vida em sociedade. A retomada da discussão em torno da ética fez

ética é inata no ser humano ou foi inventada por ele? O que a distingue
da moral? As respostas a essas perguntas podem ser longas, dema-
siadamente longas. Assim, para os objetivos deste texto, trata-se abre-
viadamente do assunto procurando responder o que se espera de uma
ética para o servidor público.

Ética pode ser simplesmente o conjunto de regras para a boa con-


vivência entre os humanos. Desde a Antiguidade discute-se este tema. O
termo vem do grego (ethos) e se confunde com a moral (do latim mores),

da moral, e esta como comportamento ou procedimento, de acordo


com os bons costumes. A ética é uma questão que envolve as rela-
ções humanas, dada a impossibilidade de o ser humano viver isolado
(o animal político de Aristóteles), ele precisa ter um comportamento
adequado a essa circunstância.

3.2 Ética aristotélica

como felicidade. não é apenas o dever de ser moral, mas uma conduta
prática. Aristóteles ia mais longe discutindo o que é a felicidade, a cons-
trução do pensamento, um padrão de conduta dos seres humanos. Essa

nenhuma ação é dirigida ao nada, pelo contrário, o agir humano é dire-

(ARISTÓTELES apud

felicidade é importante na construção da ética pública. O agente público


buscaria a segurança na prática dos seus atos, porque voltados para o
CAPíTULO III
ÉTICA
187

bem coletivo (felicidade) e porque as regras ou valores que elege para

3.3 Ética em Kant


Outro pensador, historicamente mais recente, que traz uma
interpretação da moral e da ética é Kant. Considera que na ética reaviva

de acordo com o seu arbítrio.


“Entende Kant o ser humano como um ente livre e racional que
toma as decisões de acordo com o seu arbítrio” (LImA JR., 2010, p. 79).

de pensar por si própria e não aceita como verdadeiro o estabelecido


por outros como tal, mas só após o seu exame livre e fundamentado”
(LImA JR., 2010, p. 79), destacando assim, o papel da razão. O ser hu-
mano não tem valores criados pela bondade. É por isso que precisa da
imposição do dever. Daí a distinção entre razão pura e razão prática.
Ou “a distinção entre ação por casualidade ou necessidade e ação por

dever, porque, dessa forma, é racionalmente melhor.


Kant discorda de Aristóteles, que via o homem como um todo
e oferece a ideia do dualismo. Vive “em um mundo dividido entre os
apetites sensíveis e os argumentos da razão” (LImA JR., 2010, p. 79).
Isso o aproxima de Platão e Santo Agostinho.

mais tarde publicada no livro


lismo, legou para a posteridade uma curiosa e aparentemente paradoxal
divisão da ética: a ética da convicção e a ética da responsabilidade.
no primeiro caso, a virtude provém da moral. É regulada por valores
da sociedade que não se discutem. São os bons costumes a serem
respeitados a qualquer preço.
É a denominada ética do absoluto, rigidamente formal, trata-se
do ser ou não ser, do bem ou do mal. Pode-se dizer que seu caráter é
deontológico.
Já a ética da responsabilidade, teleológica, volta-se para uma
avaliação das consequências de uma determinada ação. Trata-se de
Salomão RibaS JUnioR
188 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

levar em conta o maior bem que se pode fazer ou o maior mal que se

dos resultados. no campo da política é seguidamente invocada como


necessária para a realização do bem-comum.

em política pode pôr em risco a salvação da alma, melhor dizendo a


pureza dos princípios e instituições”.

3.5 A invenção e o renascimento da ética


Antes de prosseguir deve-se anotar que é preciso diferenciar
a ética da moral, até mesmo porque, para os efeitos de análise da
corrupção, interessa apenas a moralidade administrativa.
Cornu (1998, p. 8) assinala que, “os termos moral e ética aparecem
em diversos autores como equivalentes. E com razão, pois eles remetem,
um pela raiz latina, outro pela raiz grega a idéia de costumes e de
moral”. O mesmo autor estabelece as diferenças. A moral é ponto de
referência de um conjunto de preceitos, voltados para o universal, o
absoluto, é produto da sociedade e a pessoa aceita essas regras para
poder viver em sociedade.
De outro lado, a ética é “aplicação pessoal de um conjunto de

que ele acredita ser boa”. Concluindo, ainda, que “essa concepção

que se pensa ser bom’ (ética) e ‘aquilo que se impõe como obrigatório’
(a moral)” (RICOUER, 1990 apud CORnU, 1998, p. 8).
Com essas resumidas premissas pode-se concluir que a invenção
da ética tem seguidores, mas há os que a consideram como um sentir
inato no ser humano. Isso leva a outra questão, pois se estaria assistindo
a um renascimento da ética.
Cornu observa que, mesmo abandonando a ideia do moral como
sinônimo de ética, deve-se conservar o objeto da moral. Depois, baseado
em Kant anota que:

[...] apreensão da ética pode ser submetida a três níveis de análise. O

das regras morais, no que possuem em comum e naquilo em que


diferem de uma sociedade para outra, de uma época a outra. O segundo

que consiste o Bem e o mal, o Justo e o Injusto, e procura estabelecer


deveres e direitos. O terceiro nível, a meta-ética, baseia-se numa ética
CAPíTULO III
ÉTICA
189

sobre as questões epistemológicas,


lógicas ou semânticas relativas aos dois níveis anteriores e, de outro
lado, ultrapassando o aspecto da crítica formal do discurso moral, sobre
a legitimidade das normas e das práticas. (CORnU, 1998, p. 11)

Dessa forma, pode-se concluir que se têm pensamentos aprio-


rísticos e empiristas a respeito da ética. Os primeiros creem que as
raízes da ética — e dos valores que ela propõe — estão na consciência
do indivíduo, é inata nas pessoas. Os segundos consideram-na fruto do
aprendizado, trata-se de uma invenção. Entre os clássicos apriorísticos
estão Aristóteles, Sócrates e Platão e entre os modernos Descartes,
Spinoza e Seibuz. São empiristas Auguste Comte, Karl marx, Emmanuel
Kant. Para esses, a ética é o resultado de um processo histórico, uma
criação da inteligência humana.

Se as leis não correspondem aos ideais de justiça, é porque se


está diante de um problema ético. Se apenas os que podem pagar têm
acesso ao Judiciário, tem-se um seriíssimo problema ético, mesmo que a
lei seja formalmente igual para todos. Pode-se dizer que fazer boas leis
é um problema político-jurídico; fazer justiça é problema ético-político.

corrupção, igualmente depara-se com um problema ético, se as pessoas

se não se consegue aplicar corretamente a legislação disponível.


A impunidade é uma das causas (incentivos) ao desvio de recur-
sos públicos em benefícios privados (corrupção), que afeta a convivência
das pessoas. Se ética é um dos meios importantes para essa convivência,
a impunidade não é apenas um problema político-jurídico, é uma ques-
tão ético-jurídica. não se trata de criar novas leis ou preencher vazios
legais. Trata-se de fazer funcionar o aparelho estatal e o controle social.
E esse dever é compromisso ético.

3.7 Ética e a economia


As últimas crises econômicas — inclusive a que estava em curso
quando da redação desta obra (2012) — parecem fruto de um sistema
econômico que tem vida própria.
O que diminuiria ou mesmo anularia a responsabilidade ética
dos que o comandam? Comando esse que é exercido por governos,
Salomão RibaS JUnioR
190 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

empresas privadas e demais atores da vida econômica. na verdade,


as crises expuseram aspectos curiosos da lógica econômica. Ela está
centrada em resultados, remuneração do capital, êxito econômico de
novas tecnologias. Para atingir esses objetivos não há freios éticos para
a ação empresarial.
Desse quadro é que começam a surgir indagações sobre os valores
e a missão das empresas.
A busca de novos compromissos empresariais — e de novos
meios de controle — está presente nas regras da governança corporativa.
Dos nomes de boas práticas de governança corporativa é que nasceram

de muitos países, inclusive Espanha e Brasil.


A busca do lucro continua sendo um fator propulsor da eco-
nomia — pelo menos nos países de livre-iniciativa — mas o fator
responsabilidade social das empresas vem crescendo em importância.

3.8 Exclusão e justiça social


Espera-se que a justiça social seja objetivo permanente, inarre-

em sociedade. Ela não pode ser uma construção neutra, natural. A


responsabilidade ética não pode ser do outro, deve ser de cada um e
de todos como coletividade.
Se o sistema econômico-nacional ou mundial — produz desi-
gualdades, injustiças, exclusões, ele não é um sistema eticamente

3.9 Ética e o meio ambiente

sobre esse aspecto da ética:

O ser humano é o senhor da natureza. Ao homem é dado o direito de

riquezas minerais possam proporcionar. E, sendo assim, de acordo com


a moral dominante e os princípios éticos, pensou-se que as suas relações
com o meio ambiente eram apenas econômicas. não havia nenhum
problema ético a ser considerado na coleta do que precisava para bem
CAPíTULO III
ÉTICA
191

E mais, descobrimos que a natureza não propriedade da atual geração,


como não foi das gerações passadas. O meio ambiente é um patrimônio

inteiro. Podemos, até, destruí-lo, mas ao fazermos estaremos cometendo


uma grave infração ética. Será uma espécie de crime ecológico que não
é apenas contra a natureza, mas em prejuízo dos nossos semelhantes
(os seres humanos) e das gerações futuras. Pronto, estamos claramente
diante de um problema ético. Custou, mas chegamos a essa conclusão.
Já não aceitamos mais que o sistema econômico considere a natureza
tão somente como fonte de matérias-primas para a produção de merca-
dorias. Isso torna a própria natureza uma mercadoria. O trabalho
humano que transforma a natureza em proveito do próprio homem
deve realizar-se de modo auto-sustentável para ela própria e para o
ser humano. A voracidade predatória de nosso sistema econômico está
rompendo perigosamente o equilíbrio de auto-sustentabilidade entre
o meio ambiente e o homem. Este pode ser considerado um dos mais
cruciais problemas éticos de nossa geração, por ameaçar claramente a
sobrevivência futura da humanidade e do planeta. Para termos uma
vida digna, é preciso que haja vida. (RIBAS JR., 2003, p. 28)

As questões ecológicas ganharam a importância devida. Isso


ocorreu pela consciência popular estimulada por movimentos orga-
nizados da sociedade civil, por legislações adequadas, pela coope-
ração internacional e sobretudo pela educação. As crianças e jovens
são pessoas engajadas por convicção na defesa do meio ambiente. Isso

3.10 Ética, Administração e política


A construção dos códigos de ética para servidores públicos tem

O código de ética é um conjunto de valores e de normas de con-

princípios gerais da boa administração pública. A política é a ciência e a


técnica da gestão da coisa pública. Ambas, política e ética, estão muito
próximas, e se confundem nas eleições, escolhas e indicações de pessoas
para as mais diversas funções públicas.
mais do que em outras atividades humanas, encontram-se na

vicção e a da responsabilidade. A primeira é a ética do tudo ou nada. A


Salomão RibaS JUnioR
192 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

política pode colocar em risco a salvação da alma, ou melhor dizendo,

Também no campo da ética, bem como no da corrupção, é preciso


recordar que os governos, no último século, tiveram teoricamente três
fases: (i) patrimonialismo; (ii) administração burocrática weberiana; e
(iii) administração gerencial. Isso não quer dizer que uma fase superou
a outra. O comportamento patrimonialista persistiu nas burocracias e
persiste mesmo em setores mais modernos da Administração Pública.
Entende-se por patrimonialismo uma característica de um Estado
onde não há distinção entre o público e o privado. O comportamento
no Brasil é herança do domínio português (1500-1822). O aspecto mais
nocivo e grave é que essa confusão se dá na alta burocracia, nas esferas
mais altas da política, onde todos se aproveitam do erário para criar ou
suplementar suas rendas. na literatura brasileira, o livro de referência
Coronelismo:
enxada e voto, de Victor nunes Leal (1949). Igualmente, deve-se perceber,
no livro , de Sérgio Buarque de Holanda (1995), que o

nialismo na formação do povo brasileiro.


Sobre esse aspecto, Ghizzo neto (2011, p. 11) anota que:

A dominação patrimonial, propriamente dita, se consolida em razão


da formação do conformismo da imutabilidade dos acontecimentos:
“Sempre foi assim, e sempre será!”. A passividade, a impotência e a inca-
pacidade de poder de reação, organização e mobilização social, reforçam
a crença do inevitável. O sistema patrimonial manipula o exercício do
poder e delimita as possibilidades sociais porque tradicionalmente
sempre ocorreu dessa maneira. As relações sociais são estabelecidas
pela obediência ao Pai-maior, consagradas pela vivência pessoal, pelos

pela tradição.

A confusão entre o público e o privado ocorre sempre em des-


favor do primeiro e em favor do segundo. A ética necessária para afastar
essas práticas — que persistem neste início do século xxI — deve
direcionar para vários aspectos. Um é o problema do comportamento
ético na política. Outro é o problema da conduta ética na Administração

jurídicas) nas suas relações com o Estado.


na política, entendida como organização para disputa de
cargos eletivos e conquista de funções de poder, a questão ética não é
preponderante. A rigor, essa preponderância é determinada por dois
CAPíTULO III
ÉTICA
193

fatores: o legal e o apoio popular. As questões de violação da ética

políticos se chegam ao ponto de se tornarem objetivamente crimes. E

da ética, a preocupação é muito menor. A censura popular — segundo


fator — é pouco intensa quando se trata de avaliar atos antiéticos de
políticos ou administradores públicos.
Em passado não muito remoto um processo por suspeita de cor-

dos seus mandatos. Esta foi levada a efeito para evitar os respectivos
processos de cassação dos mandatos, que os inabilitaria por anos para
funções públicas (Constituição Federal, art. 15). Foram os senadores
Antonio Carlos magalhães e José Carlos Almeida (Bahia e Distrito
Federal), por quebra do sigilo do painel eletrônico de votação do Senado,
e o senador Jader Barbalho (Pará), por suspeita de irregularidades em
projetos na área da Superintendência do Desenvolvimento do nordeste
(SUDEnE).
na eleição imediatamente seguinte, os três se candidataram a
postos de congressistas e voltaram com extraordinárias votações ao

de normas de conduta ética não provoca rechaço na opinião pública.


nos anos seguintes, a questão ética no meio congressual viria
a ser muito discutida, particularmente porque envolve congressistas
suspeitos de corrupção. As Comissões de Ética das duas Casas, parti-
cularmente a da Câmara Federal, afastaram a cassação dos mandatos
ou mesmo uma censura ética de vários parlamentares. Até mesmo uma
nova interpretação da conduta ética foi construída casuisticamente.
Para esses órgãos, qualquer deslize ético ou mesmo de improbidade
ou corrupção, cometidos antes do início do mandato, não deve ser
apreciado pelo Congresso. mesmo que esses tenham sido praticados

A Câmara Federal tem um Código de Ética dos Parlamentares


e todo um aparato burocrático para investigar denúncias contra seus
membros. Após a cassação de José Dirceu, contudo, a conduta dos
Deputados — na Comissão de Ética e no Plenário — sofreram alterações.
O Deputado Pedro Henry — réu do “mensalão” no Judiciário — foi

neto (PL) e, “pós-mensalão”, um caso emblemático foi a absolvição


da Deputada Federal Jaqueline Roriz (Pmn-DF). Um vídeo mostrou a
Deputada recebendo dinheiro das mãos de delator do “mensalão” do
Salomão RibaS JUnioR
194 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

DEm, Durval Barbosa. Porém, o Plenário da Câmara o absolveu por

de má conduta ética não ultrapassam o crivo da Comissão de Ética.


O que é mais uma questão que obriga o renascimento da ética.
A ampla divulgação pela mídia de atos e fatos antiéticos ou corruptos

e indiretos.
Há alguns momentos da história brasileira em que houve notáveis
esforços para a superação do patrimonialismo. Isso aconteceu em 1930
com a chegada de Getúlio Dorneles Vargas ao Poder. Repetiu-se, ainda
no período Vargas, com a criação do Departamento Administrativo
do Serviço Público (DASP). no período do regime militar, entre os

qual dispõe sobre a organização da Administração Federal, estabelece


diretrizes para a Reforma Administrativa e dá outras providências.

Carta magna. Essa Constituição nasceu como consequência lógica do

democrática. Durante dois anos, o Congresso nacional ouviu e dis-

um documento singular com uma ampla declaração de direitos e


garantias individuais, ao mesmo tempo em que se buscou instrumentar

de norma constitucional normas e princípios do direito administrativo,


impregnando a Administração Pública de moralidade administrativa,

da leitura do caput do art. 37 da Constituição Federal:

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos


Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos municípios
obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade,

Dessa nova construção surge a necessidade de um Código de


Conduta Ética para uma nova Administração. na mesma linha, esse
código, seguindo uma tendência mundial, estabelece regras de conduta
ética para seus agentes públicos, o que se verá mais adiante, porém,
CAPíTULO III
ÉTICA
195

princípios que envolvem a honestidade e a lealdade no trabalho —

Esses princípios levam em conta a obediência a normas técnicas ou


administrativas para execução de um trabalho da mais alta qualidade.

incorpora as regras de convivência humana. São exemplos: o respeito


aos direitos da pessoa humana; o tratamento respeitoso com os usuários
do produto ou do serviço prestado; e a guarda do sigilo do que lhe é

Em relação ao ambiente de trabalho, deve-se considerar o res-

é dever ético não valer-se de informações privilegiadas para ganhos


pessoais, aviltar preços ou condições de trabalho ou fazer ou permitir
que tenha êxito o tráfico de influência. nesse mesmo ambiente,

aperfeiçoamento e de terceiros e a transmissão adequada da própria


experiência em benefício do êxito coletivo.

çado. É essencial a busca da satisfação do cliente ou usuário do produto

fazer bem feito.

princípios éticos, especialmente os da qualidade, sejam um imperativo


do mercado.

3.11.1 Ética dos médicos


Conforme a natureza do aspecto da vida do indivíduo e da cole-

duta ética. Um dos códigos mais antigos é o constante do Juramento


de Hipócrates, o pai da medicina. É fácil entender a razão de ser dessa

tratam de bens preciosos, de valor incalculável: a saúde e a vida humanas.

tituição Federal brasileira:


Salomão RibaS JUnioR
CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

Estado, garantido

serviços para sua promoção, proteção e recuperação. (BRASIL, 2012b)

da mesma Carta magna:

reza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País

Baseado nos princípios antiquíssimos atribuídos a Hipócrates, os


médicos foram construindo e atualizando o seu código de conduta ética.
Em vigor está o texto aprovado pela Resolução do Conselho Federal

como princípios fundamentais:

coletividade e será exercida sem discriminação de nenhuma natureza;


II - O alvo de toda a atenção do médico é a saúde do ser humano, em
benefício da qual deverá agir com o máximo de zelo e o melhor de sua

IV - Ao médico cabe zelar e trabalhar pelo perfeito desempenho ético

VI - O médico guardará absoluto respeito pelo ser humano e atuará


sempre em seu benefício. Jamais utilizará seus conhecimentos para cau-
sar sofrimento físico ou moral, para o extermínio do ser humano ou para
permitir e acobertar tentativa contra sua dignidade e integridade; [...]
Ix - A medicina não pode, em nenhuma circunstância ou forma, ser
exercida como comércio; [...]
xI - O médico guardará sigilo a respeito das informações de que detenha
conhecimento no desempenho de suas funções, com exceção dos casos
previstos em lei; [...]
xII - O médico empenhar-se-á em melhorar os padrões dos serviços

xxII - nas situações clínicas irreversíveis e terminais, o médico evitará a


realização de procedimentos diagnósticos e terapêuticos desnecessários
e propiciará aos pacientes sob sua atenção todos os cuidados paliativos
apropriados; [...]
CAPíTULO III
ÉTICA
197

xxV - na aplicação dos conhecimentos criados pelas novas tecnologias,


considerando-se suas repercussões tanto nas gerações presentes quanto
nas futuras, o médico zelará para que as pessoas não sejam discriminadas
por nenhuma razão vinculada a herança genética, protegendo-as em
sua dignidade, identidade e integridade. (COnSELHO FEDERAL DE
mEDICInA, 2012)

Até há pouco tempo era difícil que os órgãos de Ética médica


censurassem um médico ou apontassem negligência, erro médico ou

mudando gradativamente. O médico que ferir o seu código de conduta

3.11.2 Ética dos advogados


não é de menor importância a defesa de direitos e garantias

de grande importância para todos e cada uma das pessoas que convivem

área do Direito, particularmente os advogados. O trabalho mal feito

pode privá-la do seu patrimônio. É assim que o Código de Conduta


dos Advogados estabelece as regras éticas de atuação do advogado. na

limites da lei” (BRASIL, 2012b).


Em resumo, algumas das condutas éticas constantes no Código
de Ética e Disciplina da Ordem dos Advogados são as seguintes:

- O exercício da advocacia exige conduta compatível com os preceitos


deste Código, do Estatuto, do Regulamento Geral, dos Provimentos e

estado democrático de direito, da cidadania, da moralidade pública,


da Justiça e da paz social, subordinando a atividade do seu ministério

São deveres do advogado:


I - preservar, em sua conduta, a honra, a nobreza e a dignidade da

II - atuar com destemor, independência, honestidade, decoro, veracidade,


lealdade, dignidade e boa fé;
Salomão RibaS JUnioR
198 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

IV - empenhar-se, permanentemente, em seu aperfeiçoamento pessoal

V - contribuir para o aprimoramento das instituições, do Direito e das


leis;
VI - estimular a conciliação entre os litigantes, prevenindo, sempre que
possível, a instauração de litígios;
VII - aconselhar o cliente a não ingressar em aventura judicial;

ou do cliente; b) patrocinar interesses ligados a outras atividades es-

empreendimentos de cunho manifestamente duvidoso; d) emprestar


concurso aos que atentem contra a ética, a moral, a honestidade e a
dignidade da pessoa humana; e) entender-se diretamente com a parte
adversa que tenha patrono constituído, sem o assentimento deste.
xI - pugnar pela solução dos problemas da cidadania e pela efetivação
dos seus direitos individuais, coletivos e difusos, no âmbito da
comunidade. (COnSELHO FEDERAL DA ORDEm DOS ADVOGADOS
DO BRASIL, 2012)

Esse rol de preceitos não assegura conduta ética de todos, mas é


referencial decisivo. A OAB mantém sua própria Comissão de Ética para

3.11.3 Ética dos jornalistas

reconhecidos pela denominação comum de jornalistas. Aí estão

verídica, falsa, distorcida ou ambígua pode comprometer severamente


a reputação de uma pessoa. Ou o desprestígio de uma empresa que
depende de sua imagem no mercado e perante o público.
É indispensável que haja um comportamento ético no dia a dia

orienta a melhor técnica de coleta e tratamento das informações, para


transformá-las em notícia para o público.
A ponderação entre os princípios gerais da liberdade de opi-
CAPíTULO III
ÉTICA
199

que “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem


das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou
moral decorrente de sua violação” (BRASIL, 2012b).
O Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros, em sua versão mais

para esse exercício. Desta forma:

nidade, com as fontes de informação e entre jornalistas.


Do Direito a informação

de vida em sociedade, que não pode ser impedido por nenhum tipo
de interesse.

de divulgação pública, independente da natureza de sua propriedade.

social e coletivo.

privadas e particulares, cujas atividades produzam efeito na vida em


sociedade, é uma obrigação social.

a aplicação de censura ou autocensura são um delito contra a sociedade.


(COnGRESSO nACIOnAL DOS JORnALISTAS PROFISSIOnAIS,
2012)

na mesma linha de respeito ao equilíbrio entre liberdade de


informação e respeito aos direitos individuais, o mesmo Código impõe
uma série de deveres nos seguintes termos:

fatos, e seu trabalho se pauta pela precisa apuração dos acontecimentos


e sua correta divulgação.

dará a origem e a identidade de suas fontes de informação.

- Divulgar todos os fatos que sejam de interesse público;


- Lutar pela liberdade de pensamento e expressão;
ssão;
Salomão RibaS JUnioR
200 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

os princípios expressos na Declaração Universal dos Direitos do Homem;


- Combater e denunciar todas as formas de corrupção, em especial
quando exercida com o objetivo de controlar a informação;

- Prestigiar as entidades representativas e democráticas da categoria;

A ausência de uma Lei de Imprensa, declarada nula por inconsti-


tucionalidade pelo STF (2011), faz crescer a importância do Código

de informações que afetam a reputação da pessoa. E esta, ofendida,


pode perder-se para sempre.

3.11.4 Ética no serviço público


no serviço público, exige-se um compromisso ético mais acen-
tuado. O usuário desse serviço é mais do que um cliente seduzido pela
propaganda bem feita ou pela fama de qualidade do agente produtor.
Ele é o cidadão ou a cidadã agente e destinatário do serviço público.
Dessa realidade é que emerge a exigência de uma conduta ética
absoluta do cidadão-servidor público para com o cidadão-contribuinte.
Uma condição de mercado, expressão utilizada para reforçar a ideia,
acentua essa exigência de boa conduta ética do servidor público:
a maioria dos serviços prestados pelo Poder Público é de caráter
monopolístico. Esse monopólio vem da exclusividade de certa parte do
conjunto de serviços públicos a ser exercida pelo Estado. Só o Estado
pode autorizar ou expedir certas licenças, permissões ou autorizações.
Esse monopólio é tão amplo que só o Estado pode garantir a existência
legal de uma pessoa pela expedição do registro de nascimento, seu
livre trânsito ou o direito de ir e vir pela carteira de identidade ou

do indivíduo pela expedição da certidão de óbito.


O mesmo se pode dizer da dignidade humana pelo trabalho,
pois é monopólio do Estado a autorização para trabalhar por meio da
carteira de trabalho.
De outra parte, não é diferente o monopólio estatal para a ope-
ração da Pública na satisfação de direitos fundamentais da pessoa
como a saúde, a educação e a previdência social. Pode-se objetar que
CAPíTULO III
ÉTICA
201

de competência exclusiva do Poder Público, o que somente acentua


as características monopolísticas do Poder Público e a exigência pelo
maior e melhor desempenho do servidor público.

comprometidos com princípios de boa conduta, não será viável a correta


aplicação da lei aos casos concretos, postos perante os agentes públicos

a boa qualidade do serviço público. É preciso um empenho pessoal


desses agentes públicos, que vai além da estrita obediência aos ditames
de ordem legal.

junto de princípios (valores), ao qual o indivíduo adere, escolhe como


bom, elege para nortear sua conduta, é necessária certa sistematização
de conceitos. não se pode pretender que essa adesão seja uma questão
de foro íntimo, inalcançável por qualquer controle externo ou sanção
da mesma natureza.
Daí, provavelmente, a origem mais remota dos códigos de con-
duta ética. Eles procuraram sistematizar obrigações, impedimentos e
normas de conduta mais adequados. Aliás, no sentido jurídico, um
código é o conjunto de leis organizadas de forma sistemática para
melhor conhecimento e aplicação. Esse certamente é o objetivo da

partem das regras da Ética como conjunto de valores que agregam

A criação de um Código de Conduta Ética não pode deixar de


ser examinada, a partir da natureza e do objetivo de um documento
como este.
nos dicionários, encontra-se:

código. [Do lat. códice, pelo gen. pl. codicum, poss.] s.m. 1. Coleção de
leis. 2. Conjunto metódico e sistemático de disposições legais relativas
a um assunto ou a um ramo do direito [...]. (FERREIRA, 1999, p. 495)

código. s.m (sxV cf. IVPm) 1. compilação sistemática ou compêndio


de leis, normas e regulamentos <c.civil> <c.eleitoral> [...] 4. Conjunto de
idéias de um indivíduo ou de um grupo sobre o modo adequado de
comportar-se; norma, regra, princípio <seu c. de conduta é muito rígido>
[...]. (HOUAISS; VILLAR, 2001, p. 752)
Salomão RibaS JUnioR
202 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

se deve levar em conta ao examinar regras esparsas de conduta ética


e os códigos existentes.
Os princípios de conteúdo ético que orientam o servidor público
são os constantes do art. 37 da Carta Federal, o qual dispõe que:

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos


Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos municípios
obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade,

compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação


pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes,
com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas
as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente

[...]

dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade


dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em
lei, sem prejuízo da ação penal cabível. (BRASIL, 2012b)

O dever da legalidade está implícito em vários dispositivos do

caput,

veda ao servidor “o uso do cargo ou função, facilidade, amizades,

ou para outrem”, (item xIV, “a”) (BRASIL, 2012g).


Igualmente, o princípio da publicidade é tido como norma im-
portante para a boa conduta ética do servidor, sendo citado na própria
Lei de Licitações, na que regula o processo administrativo e nos decre-

consagrada pela Constituição de 1988 é outra conduta esperada do


servidor. Repetido como dever na gestão dos processos administrativos,
CAPíTULO III
ÉTICA
203

impõe ao servidor público “exercer suas atribuições com rapidez,

ou de qualquer outra espécie de atraso na prestação dos serviços pelo

(BRASIL, 2012b).
A moralidade pública que se refere o texto constitucional deve
permear a legislação e todos os atos administrativos. A sua trans-
gressão é apenada severamente, em especial, pela Lei de Improbidade

ral. A lei do regime jurídico dos servidores diz que é dever destes
“manter conduta compatível com a moralidade administrativa” (Lei

a ser observado nas aquisições do Poder Público.

anota no capítulo I, que trata das regras deontológicas que:

II - O servidor público não poderá jamais desprezar o elemento ético de


sua conduta. Assim, não terá que decidir somente entre o legal e o ilegal,
o justo e o injusto, o conveniente e o inconveniente, o oportuno e o ino-
portuno, mas principalmente entre o honesto e o desonesto, consoante

na conduta do servidor público, é que poderá consolidar a moralidade


do ato administrativo. (BRASIL, 2012g)

Da mesma forma, chama a atenção a gravidade da desatenção aos

são deveres do servidor a cortesia e boa vontade no cumprimento de

além de um tempo razoável “não caracteriza apenas atitude contra a


ética ou ato de desumanidade, mas principalmente grave dano moral
aos usuários dos serviços públicos” (BRASIL, 2012g).
Essas regras de obrigatória conduta estão nos itens x e xI do

Federal:

Ix - A cortesia, a boa vontade, o cuidado e o tempo dedicados ao serviço


público caracterizam o esforço pela disciplina. Tratar mal uma pessoa
Salomão RibaS JUnioR
204 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

dano moral. Da mesma forma, causar dano a qualquer bem pertencente


ao patrimônio público, deteriorando-o, por descuido ou má vontade,

ao Estado, mas a todos os homens de boa vontade que dedicaram sua


inteligência, seu tempo, suas esperanças e seus esforços para construí-
los.

compete ao setor em que exerça suas funções, permitindo a formação de

não caracteriza apenas atitude contra a ética ou ato de desumanidade,


mas principalmente grave dano moral aos usuários dos serviços
públicos. (BRASIL, 2012g)

Esse documento, que veio sintetizar uma série de outras ações de


conduta do servidor público, aborda, ainda, aspectos das remunerações
custeadas pelos tributos, valor social do seu trabalho, conduta pessoal
do cidadão — servidor público, publicidade, verdade, negligência,
disciplina, ausência e harmonia no ambiente do trabalho.

deontológicas sejam de natureza e conteúdo ético — está no inc. VII, que


trata da publicidade dos atos como regra geral e do sigilo como exceção.

VII - Salvo os casos de segurança nacional, investigações policiais ou


interesse superior do Estado e da Administração Pública, a serem pre-
servados em processo previamente declarado sigiloso, nos termos da
lei, a publicidade de qualquer ato administrativo constitui requisito de

contra o bem comum, imputável a quem a negar. (BRASIL, 2012g)

la ou falseá-la, ainda que contrária aos interesses da própria pessoa


interessada ou da Administração Pública. nenhum Estado pode crescer
ou estabilizar-se sobre o poder corruptivo do hábito do erro, da opressão
ou da mentira, que sempre aniquilam até mesmo a dignidade humana
quanto mais a de uma nação. (BRASIL, 2012g)

na parte referente aos deveres do servidor, o Código exige que o


servidor desempenhe a tempo as atribuições do seu cargo. Deve fazê-lo
com rapidez, perfeição e rendimento. Igualmente é seu dever ser probo,
CAPíTULO III
ÉTICA
205

reto, leal e justo (Seção II, xI


(BRASIL, 2012g).
Espera-se que o servidor divulgue e informe a todos os inte-
grantes de sua classe a existência do Código de Ética e estimule o seu

Em seguida, o documento trata das vedações do que é proibido ao


servidor. não podem usar o cargo ou função para facilidades, amizades,

servidores ou ser conivente com infração ao Código de Ética.

xV - E vedado ao servidor público;


a) o uso do cargo ou função, facilidades, amizades, tempo, posição e

b) prejudicar deliberadamente a reputação de outros servidores ou de


cidadãos que deles dependam;
c) ser, em função de seu espírito de solidariedade, conivente com erro ou

de direito por qualquer pessoa, causando-lhe dano moral ou material;

do seu conhecimento para atendimento do seu mister;


f) permitir que perseguições, simpatias, antipatias, caprichos, paixões

os jurisdicionados administrativos ou com colegas hierarquicamente


superiores ou inferiores;
g) pleitear, solicitar, provocar, sugerir ou receber qualquer tipo de

de qualquer espécie, para si, familiares ou qualquer pessoa, para o

h) alterar ou deturpar o teor de documentos que deva encaminhar para


providências;
i) iludir ou tentar iludir qualquer pessoa que necessite do atendimento
em serviços públicos;
j) desviar servidor público para atendimento a interesse particular;
l) retirar da repartição pública, sem estar legalmente autorizado,
qualquer documento, livro ou bem pertencente ao patrimônio público;
m) fazer uso de informações privilegiadas obtidas no âmbito interno de
seu serviço, em benefício próprio, de parentes, de amigos ou de terceiros;
n) apresentar-se embriagado no serviço ou fora dele habitualmente;
o) dar o seu concurso a qualquer instituição que atente contra a moral,
a honestidade ou a dignidade da pessoa humana;
ssional aética ou ligar o seu nome a empreen-
dimentos de cunho duvidoso. (BRASIL, 2012g)
Salomão RibaS JUnioR
CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

É importante destacar a vedação de pleitear ou receber qualquer

g) pleitear, solicitar, provocar, sugerir ou receber qualquer tipo de

de qualquer espécie, para si, familiares ou qualquer pessoa, para o

ou ligar seu nome a nenhum procedimento de cunho duvidoso.


De fato, não é uma vida de facilidades a dos que se propõem
a integrar o serviço público. Ainda assim, ela é necessária para que
se cumpram os princípios gerais que, do âmbito da Constituição,
orientam a Administração Pública. não se pode esquecer que se está
sempre tratando da gestão de recursos públicos e atos para promoção
do bem comum.
Como a ética não pode ser mera declaração de intenções, e sim
práticas concretas, o Código cria mecanismos e instrumentos de controle
e sanções. Assim é que em todos os órgãos deve existir uma Comissão

servidor. Isso envolve tratamento com as pessoas e o tratamento do


patrimônio público.

xVI - Em todos os órgãos e entidades da Administração Pública Federal


direta, indireta autárquica e fundacional, ou em qualquer órgão ou
entidade que exerça atribuições delegadas pelo poder público, deverá
ser criada uma Comissão de Ética, encarregada de orientar e aconselhar

com o patrimônio público, competindo-lhe conhecer concretamente de


imputação ou de procedimento susceptível de censura. (BRASIL, 2012g)

O mesmo Capítulo II do Código cuida de penas por atos de


má conduta ética e informações sobre essa conduta para promoções
na carreira. A pena aplicável é de censura e sua fundamentação deve
constar do parecer e ato próprio da Comissão de Ética.
Entende-se que a ética é essencial como prevenção da corrupção.
Um ambiente de conduta ética previne e afasta os riscos da corrupção
política ou administrativa.
CAPíTULO III
ÉTICA
207

3.11.4.1 Conduta da Alta Administração


nas últimas décadas do século xx e primeira deste, a questão da
conduta dos altos funcionários passou a merecer atenção. O crescimento

de pessoas do setor privado para o público e vice-versa. Essa mudança


de lado nos negócios públicos e privados pode gerar, na ausência de
controles, notáveis prejuízos para a sociedade.
O patrimônio público não se constitui apenas de bens e dinheiros
do Tesouro. Ele é constituído de prestígio, dados e informações. Esses
aspectos patrimoniais, em sentido amplo, têm valores incalculáveis.
Uma informação distribuída assimetricamente no mercado ou utilizada
por um ex-integrante da Administração Pública, em proveito próprio
ou da nova organização que integra, pode gerar graves distorções. Essa
prática pode ocasionar dano ao Estado e prejudicar severamente as
outras organizações que não dispõem da mesma informação.
Outro aspecto é a exploração de prestígio — adquirido em razão
do exercício do cargo ou função — que as pessoas podem realizar no
vai e vem entre o público e o privado.

interesses. Ele tanto pode existir no exercício de um cargo público

não necessita, para ser nocivo, que o interesse seja do ocupante do


cargo. Ele pode manifestar-se indiretamente em relação a terceiros. É
o caso da parentela, do clientelismo e do compadrio. Consequência,
em suma, do patrimonialismo como já visto.
A indicação político-partidária para o exercício de altas funções

de interesses.

geral pode gerar a advocacia administrativa. Esta, quando feita disfar-

probatório em um interminável processo judicial.


São muitos os casos de má conduta ética que antecederam
algumas soluções adotadas por diversos países, entre os quais o Brasil.
no plano internacional, pode-se citar a falta de ética do Presidente

pois houve invasão de sede de partido político. na Alemanha, o caso


Salomão RibaS JUnioR
208 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

de Helmut Kohl, Primeiro-ministro que se valeu de fundos partidários

partidos políticos.
no plano interno, deixando de lado outros casos, teve-se o
notável processo de impeachment do Presidente Collor e a investigação
de emendas parlamentares na CPI do Orçamento. Em todos eles, há a

eleitoral e danos ao erário.

sional do Servidor Público Civil do Poder Executivo Federal, surge o


Código de Conduta da Alta Administração.
As regras de conduta ética dos servidores da alta administração
foram sendo criadas aos poucos, a partir de 1999. Tanto é que a Comissão

Decreto Federal. Por atos seguidos, buscou-se disciplinar:


a) audiência a particulares com agentes públicos;
b) instituição do sistema de gestão da ética; e
c) instituição do Código de Conduta Ética da Alta Administração
Federal (CCEAAF), aprovado em 21.08.2000.
Esse Código de Conduta Ética da Alta Administração Federal
(CCEAAF) pretendeu tornar claras as regras éticas para que a sociedade
avalie a integridade de sua atuação. Pretendeu, também, contribuir para
o aperfeiçoamento dos padrões éticos.

I - tornar claras as regras éticas de conduta das autoridades da alta


Administração Pública Federal, para que a sociedade possa aferir a
integridade e a lisura do processo decisório governamental;
II - contribuir para o aperfeiçoamento dos padrões éticos da Adminis-
tração Pública Federal, a partir do exemplo dado pelas autoridades de
nível hierárquico superior;
III - preservar a imagem e a reputação do administrador público, cuja
conduta esteja de acordo com as normas éticas estabelecidas neste
Código;

de cargo público;

o dever funcional das autoridades públicas da Administração Pública


Federal;
CAPíTULO III
ÉTICA
209

VI - criar mecanismo de consulta, destinado a possibilitar o prévio e

nistrador. (CÓDIGO DE COnDUTA DA ALTA ADmInISTRAÇÃO


FEDERAL)
A atuação da Comissão Ética, aos olhos do público, é bastante
técnica. Algumas questões que a mídia levanta deveriam ser adequa-
damente investigadas.

3.12 Ética no plano internacional

de comportamentos esperados é relativamente recente. Há menos de


duas décadas é que essa tendência em escala global começou a merecer
mais atenção. Esse juízo ou avaliação de realidade pode ser aplicado
tanto ao setor público quanto ao privado.
Veja-se primeiro o setor público, a partir das premissas lançadas
no cenário internacional, na perspectiva da conduta ética dos servidores
públicos. Depois de absorver algumas ações isoladas, a OnU decide
aprovar um Código Internacional de Conduta Ética para os titulares de

medidas Contra la Corrupción, OnU, 28.01.1997). Essa assembleia geral


reconheceu, em primeiro lugar, a gravidade da corrupção. Considerou
que ela põe em perigo a estabilidade e a segurança das sociedades.
mais ainda, reconhece os vínculos entre outros tipos de delinquência
e a corrupção. Já se temia, então, o crime organizado e o processo de
lavagem de dinheiro.

na mesma linha, trabalhava concomitantemente a OCDE. no

que os Estados-membros se guiem por esse Código de Conduta na


luta contra a corrupção.

A leitura dos princípios gerais mostra o caminho que se pretende


trilhar, conforme segue:
Salomão RibaS JUnioR
210 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

I. PRInCIPIOS GEnERALES

interés público.
Por consiguiente, los titulares de cargos públicos serán ante todo leales
a los intereses públicos de su país tal como se expresen a través de las
instituciones democráticas de gobierno.
2. Los titulares de cargos públicos velarán por desempeñar sus obliga-

normas administrativas, y con integridad. Procurarán en todo momento


que los recursos públicos de que sean responsables se administren de

3. Los titulares de cargos públicos serán diligentes, justos e imparciales


en el desempeño de sus funciones y, en particular, en sus relaciones
con el público. En ningún momento darán preferencia indebida ni
discriminarán impropiamente a ningún grupo o individuo, ni abusarán
de otro modo del poder y la autoridad que les han sido conferidos.
(OnU, 2012a)

Em seguida, são resumidas regras de condutas diante de situa-


ções que ocorrem no dia a dia da política e da operação da burocracia.
nessas situações são constantes as relações entre interesses privados e

não se eliminam pela construção de leis abrangentes e rigorosas, mas


surgem de qualquer maneira e é preciso saber enfrentá-los e superá-
los na defesa do interesse público, ou da felicidade aristotélica ou do

II. COnFLICTOS DE InTERESES E InHABILITACIÓn

favorecer indebidamente intereses personales o económicos propios o


de sus familias. no intervendrán en ninguna operación, no ocuparán
ningún cargo o función ni tendrán ningún interés económico, comercial
o semejante que sea incompatible con su cargo, funciones u obligaciones
o con el ejercicio de éstas.
5. Los titulares de cargos públicos, en la medida que lo requiera su cargo
y con arreglo a las leyes o a las normas administrativas, declararán sus

obligaciones públicas y los intereses privados de los titulares de cargos


públicos, éstos acatarán las disposiciones establecidas para reducir o
CAPíTULO III
ÉTICA
211

titulares de cargos públicos no utilizarán indebidamente en ningún


momento dinero, bienes o servicios públicos o información adquirida
en el cumplimiento o como resultado de sus funciones públicas para

7. Los titulares de cargos públicos acatarán las disposiciones establecidas


con arreglo a la ley o a las normas administrativas con miras a evitar
que uma vez que hayan dejado de desempeñar sus funciones públicas
aprovechen indebidamente las ventajas de su antiguo cargo. (OnU,
2012a)

A questão da transparência do patrimônio dos agentes públicos


não foi deixada de lado, apesar das controvérsias que o tema gera.
Dessa forma:

III. DECLARACIÓn DE BIEnES


8. Los titulares de cargos públicos deberán, en consonancia con su
cargo, y conforme a lo permitido o exigido por la ley y las normas
administrativas, cumplir los requisitos de declarar o revelar sus activos
y pasivos personales, así como, de ser posible, los de sus cónyuges u
otros familiares a cargo. (OnU, 2012a)

outra. Os favores e os presentes, mesmo vindos de interessados na


decisão do agente público, podem ser encarados como costume social
ou prática cultural. A redação do item IV deixa uma enorme margem

cumprimento dos seus deveres ou o seu discernimento” (OnU, 2012a).


De qualquer maneira, é um alerta importante:

IV. ACEPTACIÓn DE REGALOS U OTROS FAVORES


9. Los titulares de cargos públicos no solicitarán ni recibirán directa ni

desempeño de sus funciones, el cumplimiento de sus deberes o su buen


criterio. (OnU, 2012a)

O uso de informações privilegiadas — não precisam nem ser

onde são comuns as trocas de posições do setor privado para o público


e vice-versa. no Brasil, esta é uma constante:
Salomão RibaS JUnioR
212 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

V. InFORmACIÓn COnFIDEnCIAL

los titulares de cargos públicos se mantendrán en secreto a menos que


la legislación nacional, el cumplimiento del deber o las necesidades de

siendo válidas tras el abandono de la función pública. (OnU, 2012a)

uma preocupação com as atividades políticas dos agentes públicos.

VI. ACTIVIDADES POLíTICAS


11. Las actividades políticas o de otra índole que realicen los titulares
de cargos públicos fuera del ámbito de su cargo no deberán, de
conformidad con las leyes y las políticas administrativas, mermar

obligaciones. (OnU, 2012a)

trole é que ganha vulto a questão ética. As maiores queixas em relação


aos órgãos de controle externo está na atuação partidária dos seus
membros. Assim, no plano internacional, há mais de três décadas
buscam-se princípios, normas, critérios e recomendações éticas para

3.12.1 Código de Ética da InTOSAI


Em 1988 foram aprovadas duas medidas importantes no xVI
InCOSAI (montevidéu): (i) o Código de Ética da InTOSAI; e (ii) a rees-
truturação das normas de auditoria.

superiores (sigla em inglês). Foi fundada em 1953, em Havana (Cuba),


por representantes de 34 países, entre os quais o Brasil. Depois da
fundação, outro momento importante da InTOSAI ocorreu em 1977
no Peru, com a aprovação da “Declaração de Lima sobre preceitos de
auditoria”. Atualmente, são membros da InTOSAI duas centenas de
EFS (Entidade de Fiscalização Superior). Ela atua mundialmente por
meio dos seus órgãos, programas e atividades. Os seus “standars” de

público dos países associados.


CAPíTULO III
ÉTICA
213

Em montevidéu foram considerados como marcos globais


“A Declaração de Lima” como fundamento e conceitos gerais sobre
auditoria do setor público e o “Código de Ética” como declaração de
valores e princípios para orientar o trabalho dos auditores. Por esse
Código:

5. A conduta dos auditores deve ser irrepreensível em todos os mo-

de um Código de Ética para os auditores do setor público promovem a

Introdução, item 5). Os demais capítulos desse documento tratam so-


bre: a) integridade; b) independência, objetividade e imparcialidade;

Destaca-se a questão da neutralidade política:

20. É essencial manter a neutralidade política — tanto a real como a per-


cebida — da EFS. Para tanto, é importante que os auditores conservem

Isso é relevante para os auditores pelo fato de as EFS manterem em seu


trabalho um estreito contato com os órgãos legislativos, com o poder
executivo ou outros órgãos da Administração que, por lei, podem levar
em consideração os relatórios da EFS. (InTOSAI, 1977, p. 17)

O que se quer com essa neutralidade política é lembrar que a


dedicação a atividades políticas afeta — ou parece afetar, o que também
é grave — a independência e imparcialidade esperada dos auditores.
Essas atividades, mesmo quando toleradas, permitidas ou autorizadas,

3.13 Ética nos negócios privados


no setor privado, as primeiras empresas a adotar um conjunto
de regras de comportamento para si mesmas, como pessoas jurídicas
Salomão RibaS JUnioR
214 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

imagens e de seus produtos. Assim também, como instrumento ope-


racional para viabilização de seu compromisso social, na mesma época,
as empresas começaram a criar códigos de conduta de empregados e
dirigentes. neste último caso, muitas empresas, além de acolherem
princípios gerais dos fundamentos da Ética, estabeleceram um clima
de discussão aberta entre seus empregados. Este clima democrático
tinha como objetivos: (i) dar transparência ao processo; e (ii) estimular
a adesão individual de cada trabalhador.
Essa adesão individual é considerada essencial para a exis-
tência de um compromisso concreto de cada um e de todos com o que
se denomina missão da empresa. missão deve ser entendida como a
síntese do que pretende uma determinada organização fazer. Para
tanto, é necessário que se saiba exatamente o que a organização faz
e para quem faz. E, ainda, porque uma dada organização existe. O
empregado de qualquer nível hierárquico e de qualquer função precisa
ter consciência dessa missão e assumi-la como um compromisso ético.
no setor privado, a ciência da administração, ao estudar fundamentos

o que pretende ser no presente e no futuro. Para atingir esse ideal de


conduta ética como missão e visão, elegem-se os valores que devem
nortear o trabalho individual e coletivo. São os princípios éticos voltados
para a satisfação do cliente, integridade e qualidade do que produz em
bens ou serviços.
Por um bom período não se discutia abertamente a questão ética
na iniciativa privada. Sabia-se que as relações empresariais no mercado
envolviam condutas pouco recomendáveis no plano ético. O que media

de produzir com baixo custo e vender com apreciável lucro. Com mais

especialmente nas sociedades (países) de livre-iniciativa de economia


de mercado. nas relações entre essas organizações privadas e o governo
também havia concentração de esforços em pagar menos tributos. Do
lado dos fornecedores do governo também se notava a capacidade de
vender mais e receber pagamentos no menor prazo possível.

prietários, agentes e funcionários em geral, as regras tinham o objetivo


de lucrar mais para o grupo e para cada um deles em particular. Os
sócios majoritários cuidavam prioritariamente de seus lucros, mesmo
que eles ocorressem em prejuízo dos sócios minoritários. Os agentes
CAPíTULO III
ÉTICA
215

cuidavam de suas vantagens e aumento de renda, mesmo que tal


acorresse em prejuízo do principal (capitalistas proprietários).
Os limites eram ditados pelos critérios elásticos da lei aplicável.
não se consideravam normas, critérios ou limites éticos para produzir

mento ético inadequado. Em primeiro lugar, tinha-se como certo que


os funcionários públicos mal remunerados careciam de incentivos
para as providências governamentais necessárias aos negócios. A

e da lentidão operacional da burocracia estatal. Associe-se a isso, o

nistrativo. É nesse ponto que se vê, em termos práticos, a presença da

Há um sentimento de repulsa em relação ao funcionário corrupto,


seja pela ação passiva (art. 317, Código Penal), seja pela concussão

relação ao empresário, ao lobista, ao consultor e ao político corruptor.


Um episódio dos ministros que ocorreu no governo breve de
Collor no Brasil põe em relevo esses aspectos. Constatou-se que uma
associação de empresas havia pagado propinas a altas autoridades
para ter o aumento dos seus serviços elevados. Havia dependência
de autorização governamental. Quando os jornalistas questionaram
o Presidente da entidade, este respondeu que se não pagassem os
preços, não seriam aumentados e, assim, as empresas quebrariam,
desempregando muitas pessoas. A explicação foi aceita, contudo, pela
ética da convicção, ela deveria ser repelida. Já a ética da responsa-
bilidade — onde se examinam as consequências de praticar ou não o
ato — admite a prática (RIBAS JR., 2000, p. 38).

anos, a não criminalização do suborno a funcionários públicos estran-


geiros. E mesmo a dedução do montante de pagamentos dessa natureza
como despesas operacionais, como visto anteriormente.
nas pequenas e médias corporações, de outra parte, são em

Já no caso das grandes corporações, com inúmeros acionistas, graças


ao capital aberto negociado em bolsas de valores, o problema revela-
se grave. nesse caso, os donos do capital não são conhecidos, a pro-
priedade pulveriza-se. Essas empresas é que provocam estudos sob a
ética do governo corporativo (corporated governance
do fenômeno coube aos anglo-saxões que construíram regras éticas
Salomão RibaS JUnioR
CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

de gestão empresarial. Daí surgiu a teoria da agência, bem como a


construção de regras de governança corporativa. Essas regras foram
agrupadas em códigos, que em realidade, são códigos de ética na gestão
dos negócios empresariais.

3.13.1 Código Olivencia e Informe Aldama


Dois documentos importantes trataram do tema da boa gover-
nança e da conduta ética adequada na Espanha. Os dois estudos
surgiram na linha das recomendações da Comissão Europeia (comu-

de julho).
O chamado bom governo corporativo é “un conjunto de meca-

proteger a los inversores del riesgo de abuso una vez pierden el control
apud
TCU, 1999).
Esse Código (adotado em 1998 para as empresas espanholas),
propõe uma adequada composição e estrutura do Conselho de Admi-

Olivencia (2012) envolvem transparência e a divisão de atribuições e


responsabilidades entre os membros do Conselho de Administração.
As regras do Código surgiram em um ambiente (Espanha) empresarial
de excessivo presidencialismo, conselhos opacos, falta de mecanismos
de controle, gastos excessivos na remuneração de dirigentes e conse-
lheiros, conselhos numerosos, dependentes e perpétuos. O Código
Olivencia é de 1997 e objetiva transparência dos negócios. Surgiu na
esteira do escândalo EnROn e os escândalos “doble contabilidade” e
remuneração abusiva de dirigentes.
As principais recomendações do Código foram:

- La necesidad de separar gestión y propiedad de la empresa,


proponiendo la conveniencia de incorporar al Consejo de Administración
una mayoría de consejeros independientes, es decir, no vinculados a
la dirección de empresa o a los vínculos accionariales de control y que
acceden al cargo por ser profesionales con experiencia y prestigio
profesional
- La misión de los consejeros se basa en defender los intereses de la
sociedad fomentando la toma de decisiones que mejoren la gestión
de la empresa, arbitrar mecanismos para fomentar la defensa de los
intereses del pequeño y mediano inversor
CAPíTULO III
ÉTICA
217

Se contempla la creación de las llamadas comisiones delegadas de


control, que deberán garantizar la función de supervisión del órgano
de administración. Estas comisiones están compuestas por consejeros
externos y serían básicamente: de auditoría
de la contabilidad de la sociedad, de nombramientos cuya misión es la
selección de los consejeros y de retribuciones, que deberá supervisar
la política de remuneración
- Se recomienda un único mandato de cuatro o cinco años
También se sugiere que ningún consejero forme parte de más de tres
consejos de administración, y se recomienda el retiro de los consejeros
a los 70 años, eliminando y declarando nulas las cláusulas de blindaje.
(CÓDIGO OLIVEnCIA, 2012)

Em seguida, no ano de 2003, foi constituída a Comissão Aldama


para realizar uma avaliação desse Código de Boa Conduta dos Con-
selhos de Administração.
A comissão, presidida por Enrique de Aldama y miñón tinha
por mandato:

y sociedades cotizadas. En su primera reunión, la Comisión Especial ha

de Buena Conducta de los consejos de administración de las sociedades


cotizadas

teniendo en cuenta las relaciones entre las sociedades emisoras de


valores y las personas físicas y jurídicas que les prestan sus servicios
profesionales

2012)

nindo os estudos de Olivencia, Aldama e outras avaliações de expertos


na questão da conduta ética empresarial.

3.13.2 Boa governança no Brasil

do movimento nascido nos EUA para proteger os acionistas — princi-

propriedade e gestão empresarial são separadas.


Salomão RibaS JUnioR
218 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

O objetivo dos estudos era a criação de mecanismos adequados


para monitorar e conter os excessos dos executivos das empresas.
Como é sabido, quando os interesses do gestor não coincidem com os

Pelas regras da boa governança, os proprietários (acionistas ou cotistas)


exercem a gestão estratégica e o controle da direção operacional ou
executiva.
Para isso, a exemplo dos modelos dos EUA e da Espanha
(Olivencia e Aldama) vistos anteriormente, criam-se ações para o Con-

As regras gerais da governança corporativa são: (i) transparên-


cia; (ii) o dever de prestar contas; (iii) equidade e ética; e (iv) responsa-
bilidade corporativa e social.
Assim, cada um dos órgãos exerce um papel. O Conselho de
Administração estabelece as linhas gerais ou estratégicas para a em-
presa. Igualmente elege e destitui a diretoria executiva, especialmente

desempenho da diretoria executiva na gestão da empresa. Para tanto,


deve escolher uma auditoria independente e tecnicamente capaz de
auxiliar no processo de avaliação. A prestação de contas deve dar-se
perante o Conselho Fiscal com as competências legais usuais para o
exercício desse outro papel.
O primeiro Código de Boa Governança no Brasil, segundo os
registros do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC),
surgiu em 1999. na primeira versão, concentrava-se no Conselho de
Administração. Serviu de estímulo para a reformulação da Lei das

Valores mobiliários de São Paulo (CVm) lançou uma cartilha sobre o


tema, destacando: (i) administradores; (ii) conselheiros; (iii) acionistas
controladores e minoritários; e (iv) auditores independentes.
A Bolsa de Valores de São Paulo também atua na área da boa

de acordo com critérios conhecidos e aceitos pelo mercado. na mesma

tacam por boas práticas de governança corporativa.


mesmo com esses esforços, o IBGC considera que:

apesar do aprofundamento nos debates sobre governança e da pressão


para adotar boas práticas de governança corporativa, o Brasil ainda se
caracteriza pela alta contratação do controle acionário, pela baixa efeti-
vidade dos conselhos de administração e pela alta sobreposição entre
propriedade e gestão. (IBGC, 2012)
CAPíTULO III
ÉTICA
219

Além de todas as regras de transparência e critérios de respon-


sabilidade, são de fundamental importância os códigos de conduta.
Esses códigos devem orientar dirigentes e funcionários na conduta ética

das empresas em questões ambientais e sociais.


De fato, como admite a Transparência Internacional, as maiores
empresas que atuam em bolsas de valores

[...] ofrecen hoy en dia más información sobre sus programas contra la
corrupción, pero todavia necessitan hacer mucho más para aumentar
la transparencia en la información sobre sus operaciones, según señala
un nuevo estudio de la organización de lucha contra la corrupción.
(TRAnSPAREnCY InTERnATIOnAL, 2012)

A exemplo do IPC sobre Países, a Transparência Internacional

de medidas para combater a corrupção.

Las empresas multinacionales pueden y deben desempeñar una función


importante en la lucha mundial contra la corrupción. A medida en
que el mundo continúa recuperándose del profundo sufrimiento
económico de 2008, los líderes de mayor número de empresas deben

presi denta de Transparency International. La puntuación de las


empresas osciló de 0 a 10 (siendo 0 el mínimo nivel de transparencia
y 10 el máximo nivel) y se basó en la disponibilidad de información
pública sobre sistemas anticorrupción, transparencia en la presentación
de informes sobre su estructura interna y la cantidad de información

las empresas mostraron una mejora en la presentación de informes


sobre sus compromisos con programas de lucha contra la corrupción,
en comparación con el estudio de Transparency International de las
mismas empresas en 2008. Statoil de noruega, la empresa con mayor

de información acerca de sus programas de lucha contra la corrupción,

embargo, el estudio observó que la presentación de informes por bancos


y aseguradoras acerca de medidas de transparencia fue generalmente
inadecuada, a pesar de que la opacidad de las estructuras de estas

atención dedicada a resolver la falta de transparencia en este sector.

puntuación media de 4,2. (TRAnSPAREnCY InTERnATIOnAL, 2012)


Salomão RibaS JUnioR
220 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

corrupção “mediante la divulgación de más información sobre cómo


mitigan la corrupción, haciendo pública su organización y de qué forma
circula el dinero invertido por ellas en los países en los que operan”
(TRAnSPAREnCY InTERnATIOnAL, 2012).

e cidadãs possam saber “cuánto dinero ingressa en los presupuestos


públicos, una cuestión clave de la rendición de cuentas para los
gobiernos de todo el mundo” (TRAnSPAREnCY InTERnATIOnAL,
2012).
Da mesma forma com que devem ser transparentes em suas pró-
prias contas, os estudos da Transparência Internacional das empresas
devem postular subsídios para exportação ou que queiram contratar
com o Poder Público.
CAPíTULO IV

DEmOCRACIA, ELEIÇõES E CORRUPÇÃO

As eleições no Brasil passaram por um longo processo de amadu-


recimento e de constante melhoria. Após a independência e durante o

imperiais o poder de selecionar os eleitores, organizar as listas de


votantes e dos candidatos. O voto não era universal e muito menos
secreto. Os eleitores tinham que dizer nominalmente os votos diante da
mesa eleitoral. Esse arremedo de democracia garantia perenes vitórias
aos simpatizantes do imperador que disputavam eleições. Com a
República, em 1989, instalou-se um novo sistema eleitoral com cédulas,

mesas com queima das cédulas. Ainda assim, durante toda a República
Velha (1889-1930) havia fraudes e corrupção em todo o processo, desde
a recepção, contagem dos votos e diploma dos eleitos. Com a Revolução

mulheres e criação da Justiça Eleitoral (1932). O controle das eleições


passou para um órgão independente do Poder Executivo. Além do

de votos passou a ser feita pelos juizados e tribunais retirando-se o


poder das mesas eleitorais. Ainda, assim, surge o coronelismo para

candidaturas, sem que, no entanto nenhum resultado fosse violado: o


problema deixava de se localizar na apuração dos votos e na diplomação
dos eleitos e se centrava no período pré-votação” (BOHn; FLEISCHER;

A bem da verdade, esta coação continuou existindo com a com-

dinheiro. A urna eletrônica resolveu outros problemas. Os mesmos


Salomão RibaS JUnioR
222 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

bastante singular na comparação com a direção dos sistemas eleitorais


de outras democracias. É este órgão especializado, estruturado em todo
o País que, nos dias correntes, regula a operação de todo o processo
eleitoral.

4.1 Democracia
O Brasil, a exemplo de outros países, é uma república democrá-
tica e representativa, onde os eleitores — todo cidadão ou cidadã no
pleno gozo dos seus direitos políticos — exercem o poder, por meio
dos seus representantes eleitos. Há algumas exceções nos termos da

Estado, o voto, os partidos políticos e a estrutura da Justiça Eleitoral.

mada pela união indissolúvel dos Estados e municípios e do Distrito


Federal, os quais formam o Estado Democrático de Direito, tendo como
fundamento a soberania, a dignidade da pessoa humana, os valores
sociais do trabalho e da livre-iniciativa, bem como do pluralismo político

ras burocráticas: a) União ou Governo Federal; b) Distrito Federal; e

compostas por funcionários, servidores ou empregados públicos, e

escolhidos por partidos políticos ou a eles vinculados. A realização


dessas eleições pressupõe direitos políticos dos cidadãos, operações de
partidos políticos, imensa estrutura jurídico-burocrática de controle e
vultosas somas de dinheiro. A rigor, o modelo brasileiro não é único
e há similitude com soluções de muitos outros países.
Para evitar o desvirtuamento da vontade do eleitor, seguem-se
algumas regras constitucionais e legais.
Entre os direitos políticos do cidadão e da cidadã brasileira está
a garantia do sufrágio universal, voto direto e secreto, com valor igual
para todos, onde o alistamento é gratuito e o voto obrigatório dos
dezoito aos setenta anos e facultativo dos dezesseis aos dezoito anos
e depois de completar os setenta anos de idade (art. 14, Constituição
Federal).

partidos políticos, a Constituição Federal assegura a liberdade de


organização dos partidos políticos resguardando alguns fundamentos
do regime democrático e dos direitos e garantias da pessoa humana.
CAPíTULO IV
DEmOCRACIA, ELEIÇõES E CORRUPÇÃO
223

A ideia é o pluripartidarismo e o caráter nacional desses partidos.


Isto é, devem atuar em todo o território brasileiro e abster de vincular-se

Eles são indispensáveis, de outro lado, para que as pessoas exerçam


o direito político de candidatar-se a cargos eletivos. no Brasil, só os
partidos políticos, preenchidas das várias condições da legislação
eleitoral, podem registrar candidaturas. Estão registrados no Tribunal
Superior Eleitoral 29 partidos políticos. 32 Eles podem concorrer

30 de setembro de 1997 estabelece os procedimentos para a composição,

4.2 Financiamento dos partidos políticos

e das campanhas eleitorais são variadas. A rigor, em nenhum país, o

privado não se encontram soluções que limitem, de uma maneira abso-


luta, a um ou outro dos setores da sociedade. Um rápido exame das
formas comparadas mostra essa variedade.

ciamento das campanhas eleitorais com as dos EUA, sendo esta a maior
democracia da atualidade. Essas comparações devem ser vistas com
cautela, pois se está tratando de sociedades que só tem em comum o fato
de se localizaram no mundo ocidental. As diferenças entre a realidade
brasileira e a norte-americana vão muito além dos aspectos político
eleitorais. Quanto ao sistema, os EUA adotam, preferencialmente, o
sistema privado. Ainda assim, os norte-americanos têm procurado

das intenções da legislação brasileira, ao estabelecer certas vedações e


limites de contribuições para partidos e campanhas eleitorais.

são similares nos dois países: evitar que candidatos disputem em

32
Salomão RibaS JUnioR
224 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

condições desiguais nas eleições, defender o princípio da igualdade

maior obstáculo a reformas é a falta de consenso no Congresso, nos EUA

diretas de empresas aos candidatos nas campanhas e estabelece tetos


máximos para as doações individuais. naquele momento o Congresso
também havia introduzido tetos para os gastos dos candidatos em
campanhas. mas a Suprema Corte numa decisão importante Buckley
vs. Valeo derrubou esta última regra, alegando que isto limitaria a liber-
dade de expressão dos candidatos, garantida na Primeira Emenda da
Constituição americana. (SPECK, 2012)

ções primárias e para a eleição geral. São os “matchin funds”. Também

(Barack e Romney) dispensaram esses fundos para suas respectivas


campanhas.
Outro lado curioso nessa comparação é que no Brasil os contri-
buintes (pessoas e empresas) procuraram o anonimato e os partidos
silenciaram sobre o que arrecadaram. Só mostraram por imperativo
legal e ação da Justiça Eleitoral. nos EUA a arrecadação é anunciada
como pré-resultado da eleição. Quem mais arrecada mais chances de
vitória tem.
no fundo, como assinala Speck, há imperfeições tanto no sistema
americano quanto no brasileiro.

Os dois sistemas enfrentam problemas similares com a excessiva

um regime plutocrático. no caso brasileiro, o caminho para substituir


as doações das empresas privadas parece passar necessariamente pelo

mobilização de recursos privados de pequenos doadores, eventualmente

legislador brasileiro deveria se inspirar na capacidade de reformar o

2012)

De outro lado, a diferença entre usar e não usar fundos públicos


recursos. Os recursos
CAPíTULO IV
DEmOCRACIA, ELEIÇõES E CORRUPÇÃO
225

públicos sofrem limitações quanto ao valor total a ser gasto. Para

ciamento público não poderia gastar mais de US$42 milhões nas prévias
(primárias e cáucus), e até US$84 milhões para as eleições. Optando pelo

Estima-se que tenha gasto US$1 bilhão. mcCain só poderia gastar

por OnGs para o pagamento dos milionários anúncios de televisão.


Essas organizações autorizadas pela Corte Suprema a receber doações
para apoiar de forma independente os candidatos estão crescendo

Estimam-se gastos de US$2,5 bilhões de dólares em 2012. A


metade desses recursos destina-se ao pagamento da campanha pela
mídia (televisão, rádio, jornal etc.). no Brasil, como se verá com detalhes
a seguir, os custos de veiculação da mídia são absorvidos pelo Poder
Público.

4.3 Financiamento nas Américas Central e do Sul


na maioria dos países das América do Sul e Central, o destino
dos recursos públicos para política são para os partidos e para as cam-
panhas eleitorais. É o caso da Argentina, Brasil, Colômbia, Costa Rica,
Equador, Guatemala, méxico, Panamá, Paraguai, República Dominicana
e Uruguai.
São exceções Bolívia, Chile, El Salvador, Honduras, nicarágua,
Peru e Venezuela. nesses países, o uso de recursos públicos é limitado
a uma das hipóteses (aporte eleitoral ou aporte institucional) (RUBIO,
2012).
Os critérios para a distribuição de fundos públicos a partidos
políticos podem ser mistos ou baseado na força eleitoral. São mistos
os critérios na Argentina, Brasil, Equador, Panamá, Paraguai, Peru,
República Dominicana. E baseados exclusivamente no número de
cadeiras parlamentares ou postos políticos eleitorais na Bolívia,
Colômbia, Costa Rica, Chile, El Salvador, Guatemala, Honduras,
nicarágua e Uruguai (RUBIO, 2012).
Outra questão importante para evitar excessos do poder eco-
nômico ou burocrático são os limites e restrições a aportes privados.
Eles podem se referir: (i) a limitações do montante; (ii) proibição de
aportes anônimos; (iii) proibição de aportes estrangeiros; e (v) proibição
Salomão RibaS JUnioR
CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

de aportes de concessionária do Estado. Com limitações em todas essas


áreas, têm-se excessos na região que se está examinando: Argentina,
Bolívia, Chile, Equador, méxico, e Paraguai.
O Brasil não proíbe as doações de empresas concessionárias do
Estado. Os demais países com restrições assemelhadas ao Brasil são
Costa Rica e Peru. Pode-se ver essa situação na Tabela a seguir:33

Tabela 2 – Limites e restrições a aportes aos partidos políticos* – Países


latino-americanos (2005)

Proibição de
Limitação do Proibição Proibição
aportes de
PAÍSES montante de de aportes de aportes
concessionários
aportes anônimos estrangeiros
do Estado
X X X X
X X X X
X X X -
- - - -
X X X -
Chile X X X X
- - - -
X X X X
- - - -
- X X X
México X X X X
- X - X
- X - -
X X X X
Peru X X X -
- - X -
- - - -
- X X X

detalhes.

meios de facilitações da atividade partidária e as formas e critérios


de distribuição dos recursos a cada partido. É de se observar que, na
maioria dos casos, não se encontra uma única fonte, seja ela pública

os meios está o acesso aos veículos de comunicação sem ônus direto


para o partido ou o candidato nas eleições.

33
RUBIO. Financiamento de partidos e campanhas: fundos públicos versus fundos privados.
.
CAPíTULO IV
DEmOCRACIA, ELEIÇõES E CORRUPÇÃO
227

Em outros países, para efeitos de comparação do sistema de

Herman S. Caggiano (2004) sobre “Corrupção e Financiamento de


Campanhas Eleitorais” pode ser visto a seguir:

Quadro 1 – Financiamento público e doações

Doações Limites de
Doações
de Doações
Financiamento provenientes Limites de Prestação
País pessoas (obrigação
Público do despesas de contas
jurídicas e de declarar)
estrangeiro
sindicatos (publicidade)
Bélgica US$125

Brasil Pouco

Inglaterra
República
Checa
França 34 35
US$15036 37

Itália
Espanha
Alemanha
Japão 38
US$475
Suécia

USA 39 US$250

Fonte: CAGGIAnO (2004).

34

dos partidos e das campanhas eleitorais, mediante um reembolso pelo Estado de 50%

conquistaram 5% dos votos. Em 1995, de acordo com tais regras, foi repassado um total de

com o desempenho nas eleições gerais para a Assembleia nacional e a segunda metade

della política e corruzione: il caso francese. In: LAnCHESTER. Finanziamento della política
e corruzione).
35
Desde 1995 e há exceções.
Cada candidato pode receber o valor máximo de 30.000 francos por doador e os partidos
podem receber o montante máximo de 50.000 francos por ano de cada contribuinte (La
France aux Urnes).
37
Para as eleições presidenciais: 120 milhões de francos e para as eleições legislativas 250.000
francos por candidato (cf. mÉDARD. Finanziamento della política e corruzione: il caso
francese. In: LAnCHESTER. Finanziamento della política e corruzione).
38
Desde 1994.
39
A legislação de alguns Estados permite (CAGGIAnO. Corrupção e Financiamento das
Campanhas Eleitorais. In: ZILVETI; LOPES. (Coord.). O regime democrático e a questão da
corrupção política, p. 141).
Salomão RibaS JUnioR
228 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

A mesma autora põe em destaque:

Em verdade, falar em dinheiro como fator de corrupção no campo das


campanhas eleitorais é mero simbolismo. A luta que nesses domínios
é travada constitui pura disputa de poder ou em busca de prestígio.
Portanto, o dinheiro comparece como algo instrumental, o meio que
viabiliza alcançar o poder, o prestígio ou ainda, seu destino, ou seja
como é gasto, pois essa é a trilha que irá desvendar a linha utilizada

recursos próprios da esfera do poder político.

thrown upon transactions involving money illuminates political

40

Forçoso convir, pois, que a idealização de um sistema de controle apto


a assegurar a integridade do processo eleitoral, sob o comando de
seus corolários básicos — “free and fair elections” e “one person, one
vote” — apresenta-se impositiva, porquanto de arrecadação e gastos
de partidos e candidatos, incidente, inclusive, sobre os aportes legais.
(CAGGIANO, 2004, p. 126)

Assiste razão à autora, mas o controle do uso do dinheiro é

informações sobre doações durante a campanha, vedações de fontes e de

4.4 Financiamento público

mente para o Fundo Partidário. Esses são oriundos de arrecadação com


multas eleitorais e outras penalidades pecuniárias e, em especial, do

dos descritos, são usados para o horário obrigatório de propaganda


partidária e eleitoral nas emissoras de rádio e televisão. Os partidos
utilizam esses horários em rede nacional ou estadual e mediante

Esses horários são impropriamente chamados de horário gratuito, uma

40
Financing Politics-Money Elections and Political Reform, p. 3.
CAPíTULO IV
DEmOCRACIA, ELEIÇõES E CORRUPÇÃO
229

Assim, há algumas eleições que são destinadas várias horas aos


partidos políticos para que mostrem seus candidatos. Cessão de horário
obrigatório e seu ônus no início ganhou a denominação de “horário
eleitoral gratuito” ou “propaganda eleitoral gratuita”. O objetivo desse
procedimento é garantir a participação de todos os candidatos. O que se
dizia era que se buscava a igualdade de oportunidades. Esta acabou por
se revelar injusta, tendo em consideração a dimensão de cada partido

Diante desse quadro buscaram-se critérios para a distribuição do


tempo de rádio e televisão entre os candidatos. A partir de um tempo
mínimo — igual para todos — vão se somando segundos e minutos
preciosos, tendo em vista a representação parlamentar no Congresso
nacional. Esse cálculo é feito pela Justiça Eleitoral. Esta, por sua vez,

orientação aos eleitores.


Com o tempo movimentou-se o lobby das emissoras para obter
alguma forma de ressarcimento ou indenização pelo uso dos horários
cedidos por determinação legal. Assim, esse “horário político ou elei-
toral gratuito” deixou de existir. na atualidade, quem paga esse horário
é o cidadão — contribuinte. As emissoras deixam de recolher aos cofres
públicos parcelas elevadas do imposto de renda devido.
Apenas para custear as 39 horas de propaganda eleitoral no rádio
e 39 horas de propaganda eleitoral na televisão nas eleições de 2012

eleições municipais anteriores (2008). no ano de 2008, a União (Receita


Federal) deixou de arrecadar R$242,3 milhões em tributos pelo mesmo
fato (Veja
Quanto aos custos de produção dos programas de propaganda,

mento dos partidos políticos e campanhas eleitorais (especialmente


contribuições de empresas e pessoas). Dependem da qualidade técnica

mais, a declarada gratuidade da propaganda eleitoral feita por esses


meios. Esses programas, inclusive, passaram por um processo profundo
de mudanças nos últimos anos. Do “retrato 3x4” nos tempos da Lei
Falcão,41 passando pelo uso da pirotecnia eletrônica da campanha do

41

seu criador, o então ministro da Justiça Armando Falcão. Esta lei determinava que, na
Salomão RibaS JUnioR
230 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

Sr. Collor e mello (1989) e pelo uso de imagens desabonadoras dos


adversários, chegou-se ao formato atual. Há ampla liberdade para a
crítica e exposição de ideias, limitando-se apenas os excessos, os exa-
geros. Isso isonomicamente em cada uma das candidaturas em disputa.
Em termos de campanhas para a disputa presidencial em 2010,

principais candidatos (2 mulheres e 1 homem) declararam ter gastos

José Serra R$214.495.037,77

na mesma fonte de pesquisa (Transparência Brasil, no site Às


Claras) encontramos as tabelas seguintes que são reproduzidas por
sua enorme contribuição aos estudos.

Doações a Doações a comitês/ Custo do


Ano Total de doações*
candidatos diretórios voto

2002 1,38

2004 7,1

2006 3,22

2008 12,06

2010 5,74

* Descontadas de doações realizadas a candidatos e outros comitês.

propaganda eleitoral, os partidos se limitassem a mencionar a legenda, o currículo e o


número do registro do candidato na Justiça Eleitoral, bem como divulgar, pela televisão,
CAPíTULO IV
DEmOCRACIA, ELEIÇõES E CORRUPÇÃO
231

Tabela 4 – Efetividade (2010)

Receitas de Receitas de
Situação Candidatos Votos Receitas totais
candidatos comitês

20

10

Total 21.769 661.065.142 R$3.202.280.324,10 R$426.482.477,28 R$3.628.762.801,38

* Outros: renúncias, falecimentos, cassações, registro negado.


Salomão RibaS JUnioR
232 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

Distribuição de receitas por situação

Distribuição de receitas por tipo de doador – Inclui doações a comitês


(pessoas físicas excluem doações feitas pelos próprios candidatos)
CAPíTULO IV
DEmOCRACIA, ELEIÇõES E CORRUPÇÃO
233

Tabela 5 – Partidos (2010)

Candidatos Votos Receitas Receitas/Votos


Partidos
Todos Eleitos Todos Eleitos Todos Eleitos Todos Eleitos

PSDB 1.140 187 162.670.218 63.458.123 R$836.981.401,15 R$386.332.494,52 R$5,15 R$6,09

PT 1.363 251 191.515.135 113.666.564 R$778.560.784,80 R$367.644.952,21 R$4,07 R$3,23

PMDB 1.310 245 66.696.654 40.738.523 R$564.486.833,19 R$355.560.915,71 R$8,46 R$8,73

PSB 1.152 118 31.744.084 22.262.366 R$207.821.446,82 R$116.290.168,70 R$6,55 R$5,22

DEM 819 122 26.700.693 13.669.230 R$205.884.538,89 R$115.537.704,13 R$7,71 R$8,45

PDT 1.088 105 17.613.069 7.899.078 R$159.173.835,69 R$51.843.496,25 R$9,04 R$6,56

PR 743 100 18.103.693 11.046.446 R$146.106.115,31 R$78.695.857,61 R$8,07 R$7,12

PP 878 98 22.267.285 12.716.291 R$136.167.699,86 R$81.034.006,39 R$6,12 R$6,37

PTB 1.101 71 16.996.268 7.788.143 R$109.999.060,60 R$53.100.134,33 R$6,47 R$6,82

PPS 856 50 12.789.059 7.822.582 R$103.221.866,05 R$39.855.974,12 R$8,07 R$5,09

PV 1.414 50 34.902.118 2.971.400 R$99.021.328,67 R$24.310.589,22 R$2,84 R$8,18

PC do B 846 34 18.230.062 3.142.476 R$58.546.999,03 R$22.995.916,33 R$3,21 R$7,32

PSC 938 52 8.241.657 3.892.179 R$57.232.114,62 R$25.041.493,21 R$6,94 R$6,43

PMN 746 28 3.719.065 2.276.747 R$41.331.172,24 R$26.356.572,47 R$11,11 R$11,58

PSL 826 19 2.610.189 617.586 R$23.436.873,36 R$5.564.033,01 R$8,98 R$9,01

PRB 604 27 6.516.895 5.023.194 R$19.017.494,81 R$6.344.678,75 R$2,92 R$1,26

PT do B 650 22 3.303.028 647.006 R$18.312.687,35 R$7.243.719,35 R$5,54 R$11,20

PHS 652 9 1.932.305 380.421 R$15.113.409,62 R$3.494.346,70 R$7,82 R$9,19

PTC 955 9 1.852.174 270.534 R$14.596.262,66 R$2.755.831,65 R$7,88 R$10,19

PRP 663 15 1.316.193 387.059 R$13.521.067,54 R$4.089.134,82 R$10,27 R$10,56

PTN 619 13 1.191.356 335.223 R$12.249.774,30 R$4.695.144,10 R$10,28 R$14,01

PRTB 606 12 1.163.532 295.590 R$11.268.655,74 R$3.935.498,67 R$9,68 R$13,31

PSDC 477 8 796.639 104.439 R$7.426.148,79 R$1.410.814,28 R$9,32 R$13,51

PSOL 987 9 6.532.715 1.743.513 R$6.486.891,23 R$1.494.521,89 R$0,99 R$0,86

PSTU 172 0 804.115 0 R$1.066.989,78 R$0,00 R$1,33 R$-

PCB 129 0 301.575 0 R$496.536,36 R$0,00 R$1,65 R$-

PCO 35 0 38.828 0 R$23.905,00 R$0,00 R$0,62 R$-

Total 21.769 1.654 660.548.604 323.154.713 R$3.647.551.893,46 R$1.785.627.998,42 R$5,00 R$5,00


Salomão RibaS JUnioR
234 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

4.4.1 Fundo Partidário


Para o ano de 2013, estava prevista a alocação de cerca de
R$325 milhões para custeio dos partidos registrados no Tribunal
Superior Eleitoral (TSE), que ao todo eram 29 partidos. São recursos

de campanhas eleitorais. Da cota total do Fundo, 95% são distribuídos


entre os partidos políticos, de acordo com a votação obtida nas eleições
para a Câmara dos Deputados. Como se vê, o critério da participação
proporcional também se faz presente na repartição desses recursos
públicos. Os 5% restantes são divididos igualitariamente entre os
partidos registrados.42

Financeira aos Partidos Políticos”. De fato, a proposta governamental


para o orçamento era de R$232 milhões, mas emenda de parlamentares
aumentou a cota do fundo em mais R$100 milhões. “É o maior valor já
proposto pelo Poder Executivo em uma peça orçamentária”.43 É desse
montante que se gasta recursos públicos para manutenção da sede
partidária, propaganda, campanha e fundações ligadas aos partidos.
A arrecadação para as campanhas eleitorais ocorre por meio de outros
mecanismos e dos contribuintes privados. O exposto acima já deu uma

em 2010.

42
O Globo. País. Acesso em: 14 out. 2012.
43
Correio Brasiliense, 14 set. 2012.
CAPíTULO IV
DEmOCRACIA, ELEIÇõES E CORRUPÇÃO
235

4.5 Financiamento privado


Com algumas exceções, as empresas e os particulares em geral
podem contribuir para o funcionamento dos partidos e para o custeio
das campanhas feitas pelos candidatos e pelos partidos políticos. Há
muita facilidade para a transferência dos recursos. Limites, contudo,

caput

O anonimato nas doações privadas é vedado por lei. As con-


tribuições devem ser feitas por via bancária, cheque nominal e cruzado
ou boleto de cobrança devidamente registrado. Desde 2010, admite-se
o uso de cartões de crédito ou débito para doações. Os depósitos em

e o montante.
Há outra forma de doação que gera muitas dúvidas. É o caso
da doação de bens e serviços estimáveis em dinheiro. Ou a cessão de
prédios, equipamentos, carros, serviços de distribuição de propagan-

A regra é a liberdade ampla de doações por empresas privadas,


mas há algumas vedações expressas. É vedado ao candidato receber

Art. 24. É vedado, a partido e candidato, receber direta ou indiretamente


doação em dinheiro ou estimável em dinheiro, inclusive por meio de
publicidade de qualquer espécie, procedente de:
I - entidade ou governo estrangeiro;
II - órgão da administração pública direta e indireta ou fundação mantida
com recursos provenientes do Poder Público;
III - concessionário ou permissionário de serviço público;

contribuição compulsória em virtude de disposição legal;


V - entidade de utilidade pública;
VI - entidade de classe ou sindical;
Salomão RibaS JUnioR
CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

Ix - entidades esportivas;
x - organizações não-governamentais que recebam recursos públicos;
xI - organizações da sociedade civil de interesse público.
Parágrafo único. não se incluem nas vedações de que trata este artigo
as cooperativas cujos cooperados não sejam concessionários ou permis-

com recursos públicos, observado o disposto no art. 81. (BRASIL, 2012i)

Art. 31. É vedado ao partido receber, direta ou indiretamente, sob


qualquer forma ou pretexto, contribuição ou auxílio pecuniário ou
estimável em dinheiro, inclusive através de publicidade de qualquer
espécie, procedente de:
I - entidade ou governo estrangeiros;
II - autoridade ou órgãos públicos, ressalvadas as dotações referidas
no art. 38;
III - autarquias, empresas públicas ou concessionárias de serviços
públicos, sociedades de economia mista e fundações instituídas em
virtude de lei e para cujos recursos concorram órgãos ou entidades
governamentais;
IV - entidade de classe ou sindical. (BRASIL, 2012i)

75 doadores, o que representa 89,5% do total doado. O PmDB, segundo


colocado, também da base de apoio do governo, recebeu 5,2% dos

cipal opositor ao governo recebeu R$2,35 milhões ou 4,3% do total. Os


outros partidos praticamente não arrecadaram. nesse ano não houve
eleições.
O exame da natureza das atividades empresariais dos doadores
mostra que a maior parte dos recursos do PT veio de empreiteiras de
obras públicas. Foi um total de R$48,9 milhões. Também foi o setor com
maior número de doadores: 21 empreiteiras. A maior contribuição foi

doações (DI CUnTO, p. 2012).


nas eleições municipais de 2012 (Prefeitos e Vereadores) as ten-
dências se repetem. As empreiteiras respondem por 49% das doações
CAPíTULO IV
DEmOCRACIA, ELEIÇõES E CORRUPÇÃO
237

de empresas aos partidos políticos. Do total de empreiteiras 52% são


de apenas seis empresas: Andrade Gutierrez, Queiroz Calvão, OAS,
Camargo Correa, Odebrecht e Carioca Chiristiani nielsen. Em dinheiro

dos partidos. Os outros setores constantes dos relartórios do TSE são:

R$382 milhões de 490 doadores. O PT recebeu mais R$177 milhões.


Esses recursos são repassados para campanhas eleitorais. Assim, não
se sabe no Estado ou no município quem são os doadores reais. O que
aparece é o nome do Partido. Esse procedimento é considerado como
doação oculta (GAmA, 2012, p. A10).
As doações são legais, mas não deixam de merecer análise,
observando-se três fatos: (i) os Partidos que estão no governo recebem
extraordinariamente mais do que os de oposição; (ii) a maioria
expressiva dos recursos provém de empreiteiras, prestadoras de ser-
viços e construtoras de obras para o governo; e, (iii) é elevado o volume
das doações ocultas.

Além das vedações expressas, há limites que devem ser obser-

limite é de 10% dos rendimentos do ano anterior ao das eleições (Lei

As empresas e outras pessoas jurídicas podem contribuir até o

limite é o estabelecido por lei ou, na ausência, por seu partido político.

Art. 17. As despesas da campanha eleitoral serão realizadas sob a res-

forma desta Lei.

gastos de campanha para os cargos em disputa; não sendo editada lei

ampla publicidade. (BRASIL, 2012h)


Salomão RibaS JUnioR
238 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

Uma das questões fundamentais na regularidade do processo


eleitoral é o controle. Em países em que não há Justiça Eleitoral, a

(Tribunais de Contas e Controladorias). nos EUA há um órgão para

fundos e gastos com campanhas eleitorais.

pelo TCU, isto é, a aplicação dos recursos do Fundo Partidário. De

da contabilidade e o exame da prestação de contas de partidos políticos


e candidatos será feita pela Justiça Eleitoral. O órgão próprio da Justiça
Eleitoral deve aprovar ou rejeitar as contas.
Tendo em vista a complexidade e volume desse trabalho, a Justiça
Eleitoral pode requisitar apoio dos recursos humanos dos Tribunais
de Contas da União, dos Estados, Distrito Federal e dos municípios. A

apoio de terceiros dos Tribunais de Contas brasileiros.


Assim, observadas as regras legais e os provimentos da Justiça
Eleitoral, essas contas devem ser organizadas de modo a demons-
trar que houve o cumprimento do disposto sobre a matéria nas Leis

sáveis pela arrecadação e aplicação dos recursos;

d) comprovação mediante recibos das doações; e


e) prestações de contas eleitorais por partidos e candidatos e a
respectiva prestação anual partidária.

4.7 Campanhas eleitorais e limites


Os limites da arrecadação já foram vistos anteriormente. Igual-

São limites denominados “quantitativos” e “qualitativos”. O montante

zação deve ser realizada por lei e, na ausência desta, cabe aos partidos

gastos que podem ser considerados como de natureza eleitoral e estão


CAPíTULO IV
DEmOCRACIA, ELEIÇõES E CORRUPÇÃO
239

a) confecção de material impresso de qualquer natureza e


tamanho;
b) propaganda e publicidade direta ou indireta, por qualquer
meio de divulgação, destinada a conquistar votos;
c) aluguel de locais para a promoção de atos de campanha
eleitoral;
d) despesas com transporte ou deslocamento de candidato e de
pessoal a serviço das candidaturas;
e) correspondência e despesas postais;
f) despesas de instalação, organização e funcionamento de

h) montagem e operação de carros de som, de propaganda e


assemelhados;

de candidatura;
j) produção de programas de rádio, televisão ou vídeo,

k) realização de pesquisas ou testes pré-eleitorais;


l) aluguel de bens particulares para veiculação, por qualquer
meio, de propaganda eleitoral;
m) custos com a criação e inclusão de sítios na Internet;
n) multas aplicadas aos partidos ou candidatos por infração do
disposto na legislação eleitoral; e
o) produção de jingles, vinhetas e slogans para propaganda
eleitoral.

4.8 Os custos indiretos das eleições

por meio do Fundo Partidário, desta forma, adota um sistema misto de

As regras que comandam o financiamento das campanhas

campanha eleitoral.
no caso dos recursos destinados aos partidos políticos, inde-
pendente de campanhas eleitorais aos quais podem ser feitas doações,
Salomão RibaS JUnioR
240 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

podem ser usados nas campanhas eleitorais, de acordo com o art. 39,

Essa forma de uso de recursos do Tesouro e arrecadados do


público em geral para campanhas eleitorais vem recebendo algumas

blicação da origem dos recursos durante a campanha eleitoral. A


orientação normativa do Tribunal Superior Eleitoral é no sentido de
informar corretamente. Os candidatos, porém, limitam-se a informar
que receberam “x” reais dos Partidos Políticos a que pertencem e que
os apoiam. Sabe-se que é do caixa do Partido. O que não se sabe pronta-
mente para a transparência eleitoral é quem ou que empresa entregou
o dinheiro ao partido político.
Essas regras têm por objetivo assegurar a igualdade de oportu-
nidade aos candidatos, mais do que isso, pretendem a impessoalidade

nos corpos legislativos que, entre outras, tem a atribuição de exercer


o controle externo. nota-se que em busca desses objetivos são esta-
belecidas muitas limitações na arrecadação e nos gastos partidários e

do Superior Tribunal Eleitoral impõem a transparência, em que devem

são favorecidos indevidamente. É de muita utilidade para o controle


recíproco entre os partidos e para o controle social.
Entre os custos indiretos da operação dos partidos políticos (e
das campanhas eleitorais) é possível incluir as despesas (pagas com
recursos públicos) para o funcionamento dos gabinetes e outros re-
cursos de apoio parlamentar aos detentores de mandato eletivo. Esses
servidores (efetivos e em comissão) atuam nos três níveis de governo:
Congresso nacional; Assembleia Legislativa; e Câmara de Vereadores.

esses servidores atuam permanentemente em favor da reeleição dos


parlamentares a que servem.
Sabidamente, um gabinete parlamentar não se dedica exclusi-
vamente a tratar das grandes questões municipais, estaduais ou

e dos interesses dos chefes políticos e cabos eleitorais. nesse sentido, o


administrador de empresas José Figueiredo realizou pesquisa apurando
que, na Câmara Federal, cada deputado pode contratar até 25 pessoas
CAPíTULO IV
DEmOCRACIA, ELEIÇõES E CORRUPÇÃO
241

com gasto mensal de R$78 mil (verba de gabinete). Como são 513
deputados federais é fácil calcular esse custo para o Tesouro. Ao lado
desses, existem 22 mil cargos de livre nomeação no Governo Federal. Os

422.831 os cargos da mesma natureza. Os Estados têm 150 mil. Assim:

Se em um exercício singelo, estabelecermos que a metade desse contin-


gente trabalha, quando trabalha, em prol de seu empregador-candidato
e não dos interesses públicos, serão 425 mil cabos eleitorais remune-
rados por nós, e não só em época de campanha. Vamos estabelecer,
modestamente, a média salarial de R$2 mil mensais para cada um
— considerando que, em nível federal, os cargos de Direção e Asses-
soramento Superior (DAS) partem de R$2.115 na DAS 1 até R$11.179, na

campanha já existe e arde em nosso bolso!. (FIGUEIREDO, 2012, p. 13)

Fica evidenciado que as verbas de gabinete não custeiam apenas


pessoal. A Transparência Brasil mantém em seu site o “Projeto Exce-
lências – Parlamentares em exercício no País”44 que detalha, entre outras
informações, o uso de verbas indenizatórias. O levantamento, contudo,
é prejudicado, pois poucas, entre as 55 casas legislativas cobertas pelo
Projeto Excelências, prestam informações sobre como os seus membros
empregam as verbas ditas “indenizatórias” (ou “cotas”) que seus
integrantes recebem. Elas se destinam a cobrir despesas com os itens

algumas casas legislativas é possível esse acesso, especialmente, após

18 de novembro de 2011).
Apesar da imprecisão de períodos e dados, pode-se ter uma

custo indireto.

44
Disponível em: <www.excelencias.org.br>.
PÁGINA EM BRANCO
CAPíTULO V

COmPRAS GOVERnAmEnTAIS E
COnTRATOS

Os governos em geral são as maiores estruturas administrativas


dos países que governam. não é, portanto, difícil concluir que estão
entre os maiores consumidores de bens, obras e serviços. Países como
o Brasil, que os governos — União, Estados e municípios — arrecadam
quase 40% do PIB, sabidamente são os maiores compradores do seu

para investimentos e funcionamento da máquina burocrática.


Para promover o bem comum — objetivo básico do Estado Demo-

opera estruturas complexas e variadas.


O Estado, como educador ou responsável pela educação, compra
mão de obra em quantidade apreciável. O mesmo se pode dizer dos
insumos necessários para a operação das redes de escolas públicas.
minimamente, uma escola pública exige um prédio próprio — o que
implica na contratação da obra. Feito o prédio é preciso equipá-lo para

um quadro (negro, verde ou mesmo branco), mesa, cadeira e armário


do professor. Carteiras escolares para os estudantes são outros itens
mínimos necessários. Esses objetos devem ser comprados no mercado.
Além disso, são necessários os materiais de consumo, minimamente,
giz e apagador. A escola pode ainda, nos dias atuais, ser programada
para usar materiais modernos para auxiliar no processo ensino-

objeto de estudo (corpo humano, ou outros modelos dos reinos animal e


vegetal). Essa sala de aula deve ser apoiada por banheiro, água potável
e artigos de higiene. É fácil imaginar quantos itens mais são necessários
para a operação dessa imaginária sala de aula de uma hipotética escola.
Salomão RibaS JUnioR
244 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

É o caso dos livros, cadernos, lápis, apontadores, réguas, compassos


etc., quando fornecidos aos alunos pelo próprio Estado.

ser medida pela regra do art. 212 da Constituição Federal:

Art. 212. A União aplicará, anualmente, nunca menos de dezoito, e


os Estados, o Distrito Federal e os municípios vinte e cinco por cento,
no mínimo, da receita resultante de impostos, compreendida a prove-
niente de transferências, na manutenção e desenvolvimento do ensino.
(BRASIL, 2012b)

Deixando esses exemplos da função educação, podem-se buscar


exemplos da quantidade de bens duráveis e não duráveis necessários

construa outra lista grande e variada de contratos que o Estado faz para
construí-los e mantê-los em funcionamento.
A quantidade de itens de consumo de uma unidade hospitalar
(remédios e outros) pode ser medida aos milhares, a cada período que
se escolha. Assim como as escolas mais modernas, muitos hospitais

na mesma linha de gastos mínimos, a Constituição Federal asse-

Transitórias (ADCT), que o percentual mínimo a ser aplicado em ações


e serviços públicos de saúde é de 15%.
Para se ter uma ideia mais ampla do que os entes governa-
mentais compram, é só multiplicar a imaginária escola aos milhares.

com gastos e investimentos mínimos previstos constitucionalmente.


E o poder de compras dos órgãos de infraestrutura, a começar pelos
de transporte, são 1,4 milhões de quilômetros de estradas a manter e
outros tantos a construir. O mesmo se pode dizer do poder de compra
de estatais (PETROBRAS, BAnCO DO BRASIL, SABESP, CESP, CEmIG,
COnURB).
Os dados estatísticos sobre compras governamentais não são

(SEBRAE) apontam para gastos que variam de R$350 a R$400 bilhões


por ano de compras dos governos, nos três níveis da Administração.
no exterior as estimativas variam de 13% do PIB na Espanha, a 20%
nos Países-membros da OCDE.
CAPíTULO V
COmPRAS GOVERnAmEnTAIS E COnTRATOS
245

Compreende-se, também, o volume e o efeito na economia das


compras governamentais pelo denominado Programa de Aceleração do
Crescimento (PAC) — Equipamentos. Tendo em vista a crise europeia
que deprime o crescimento da economia mundial, o governo brasileiro
decidiu comprar mais equipamentos. Anuncia-se uma aceleração

aquisições de 8.000 caminhões para as Forças Armadas e para os Estados


e municípios com problemas climáticos. Patrulhas agrícolas (3.000

(3.591 unidades) bem como motoniveladoras (1.330 unidades) serão


adquiridas. As duas últimas compras se destinam a melhorar as estradas
vicinais e o escoamento da produção. na mesma linha de incremento

vagões); perfuratrizes (50 unidades); ambulâncias (2.125) e unidades


móveis de odontologia (1.000 unidades). Segue-se uma lista de mais

bilhões na economia brasileira. O que reforça o papel de grande com-


prador do governo (mInISTÉRIO DA FAZEnDA, 2012).

corrupção e são postos em discussão a idoneidade dos agentes públicos


e a excelência dos sistemas de contratação e de controle. Assim, após
essa digressão, a abordagem dos contratos governamentais deve passar
pelos seguintes aspectos:
a) formas de contratação;
b) tipos de contrato;
c) controle dos contratos; e
d) caminhos da corrupção nos contratos.

5.1 Os contratos na Administração Pública

neste capítulo a respeito de contratos. não se cuidará do sentido sócio-

como princípio geral das relações harmoniosas entre as pessoas. Ou


entre essas e os entes públicos. A geração de direitos e deveres por meio
de um pacto — sob as formas escritas e não escritas — está presente entre
os seres humanos desde tempos imemoriais. Examinando as relações
humanas sempre se encontrará os deveres e os direitos estabelecendo
compromissos. Estes podem ser de ordem geral na organização das
sociedades ou de ordem particular entre pessoas.
Salomão RibaS JUnioR
CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

Ao longo da história, o contrato passou a ser normatizado. no


primeiro momento pelos usos e costumes, decidindo-se eventuais
divergências pelo arbítrio do líder político respeitado pelas partes.
Com o direito natural, fundado nos usos e costumes e nos princípios
gerais dos direitos e deveres da pessoa humana, o contrato foi sendo

ordenavam forma e conteúdo dos contratos (Código de Hamurabi e


Código Justiniano).

brasileiro — consolidou os entendimentos sobre o contrato e suas

rosamente cumprida. Daí as expressões “lex inter partes”, isto é, faz


lei, e “pacta sunt servanda”, o que quer dizer que o contratado deve
ser cumprido. Essas duas regras básicas persistem até os dias atuais
nos termos, condições e limites estabelecidos na lei.
nos léxicos é possível encontrar:

contrato. [Var. de contracto (q.v.).] Adj. 1. Contraído. S.m. 2. Ato ou efeito


de contratar. 3. Acordo entre duas ou mais pessoas que transferem entre
si algum direito ou se sujeitam a alguma obrigação. [Sin. pop., nesta
acepç.: contrata.] 4. O documento resultante desse acordo. (FERREIRA,
1999, p. 545)

contrato. S.m. ato ou efeito de contratar; contratação. 1 pacto entre


duas ou mais pessoas, que se obrigam a cumprir o que foi entre elas
combinado sob determinadas condições. 2 JUR acordo de vontades

(HOUAISS; VILLAR, 2001, p. 824)

Desses, o que interessa sobremaneira é o contrato administrativo

Em especial, a aquisição de bens, a construção de obras e a contratação


de serviços. O Estado, por meio da Administração Pública, interfere
intensamente na vida em sociedade.

assume deveres, direitos e obrigações. A rigor, os governos assumem


e delegam esses compromissos, de forma onerosa ou não, também
por intermédio dos ajustes, acordos e convênios. Estes últimos muito
assemelhados aos contratos administrativos.
CAPíTULO V
COmPRAS GOVERnAmEnTAIS E COnTRATOS
247

Em princípio, contrato é um acordo de vontades que cria obri-


gações e direitos entre os contratantes. meirelles (2007) trata assim da
matéria:

Em princípio, todo contrato é negócio jurídico bilateral e comutativo,


isto é, realizado entre pessoas que se obrigam a prestações mútuas e
equivalentes em encargos e vantagens. Como pacto consensual, pres-
supõe liberdade e capacidade jurídica das partes para se obrigarem
validamente; como negócio jurídico, requer objeto lícito e forma prescrita
ou não vedada em lei. (mEIRELLES, 2007, p. 198)

O mesmo autor considera o contrato típico do Direito Privado,


mas utilizado pela Administração Pública. nesse caso, com algumas
adaptações da fórmula original para compor o contrato administrativo,
contudo, há diferenças importantes. no Direito Privado a tônica é

trições de forma. no Direito Público, a Administração deve obedecer

e aos privilégios da Administração para alterar e, mesmo decretar


unilateralmente, a extinção do contrato. Submete-se, é claro, ao interesse
público, mas decide unilateralmente.

5.2 Conceitos do contrato administrativo

é um documento essencial para a Administração, para os administrados


e para os fornecedores de bens e construtores de obras públicas. É onde
devem estar expressas as vontades ou necessidades do Poder Público
e as obrigações do contrato. É onde se materializa concretamente a
intenção de comprar ou contratar e a possibilidade de fornecer ou fazer
constantes do edital e dos primeiros passos da licitação. É praticamente

administrativo.
na doutrina, tem-se em meirelles (2007) que:

Contrato administrativo é o ajuste que a Administração Pública,

nistrativa para a consecução de objetivos de interesse público, nas


condições estabelecidas pela própria administração. nessa conceituação
enquadram-se os ajustes da Administração direta e da indireta, porque
Salomão RibaS JUnioR
248 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

os sujeitem aos preceitos do Direito Público. O contrato administrativo é


sempre consensual e, em regra, formal, oneroso, comutativo e realizado
intuitu personae. É consensual porque consubstancia um acordo de
vontades, e não um ato unilateral e impositivo da Administração; é
formal porque se expressa por escrito e com requisitos especiais; é
oneroso porque remunerado na forma convencionada; é comutativo
porque estabelece compensações recíprocas e equivalentes para as
partes; é intuitu personae porque deve ser executado pelo próprio
contratado, vedadas, em princípio, a sua substituição por outrem ou a
transferência do ajuste. (mEIRELLES, 2007, p. 198)

A lei que regula a contratação pela Administração Pública nas


Disposições Preliminares sobre os contratos dá os seus contornos:

Art. 54. Os contratos administrativos de que trata esta Lei regulam-se


pelas suas cláusulas e pelos preceitos de direito público, aplicando-se-
lhes, supletivamente, os princípios da teoria geral dos contratos e as
disposições de direito privado.

obrigações e responsabilidades das partes, em conformidade com os


termos da licitação e da proposta a que se vinculam.

tação devem atender aos termos do ato que os autorizou e da respectiva


proposta. (BRASIL, 2012d)

Há muitas discussões teóricas sobre a natureza dos contratos


entre a Administração Pública e os particulares, como reconhece Justen
Filho (2005). O que não o impede de consignar:

entre um órgão da Administração Pública e um particular, que produz


direitos e obrigações para ao menos uma das partes. Os contratos
administrativos envolvem ajustes de vontade. Deles deriva uma auto-
regulamentação da conduta das partes. mas há pontos de distinção
extremamente relevantes entre o contrato (tal como conhecido no direito
privado) e o chamado “contrato administrativo”. A Administração
Pública não pode ser atada e tolhida na consecução dos objetivos de

algum “interesse público”, invocado retoricamente pela Administração e


sem respeito a limites e garantias constitucionais. Ao admitir a pactuação
de acordos entre a Administração e os particulares, o Direito pretende
viabilizar e facilitar a consecução pelo Estado das funções que lhe
CAPíTULO V
COmPRAS GOVERnAmEnTAIS E COnTRATOS
249

uma avença pactuada não pode ser um esquema


rígido, rigoroso e imutável — sob pena de frustrar-se a própria função
do “contrato administrativo”. (JUSTEn FILHO, 2005, p. 485)

para contrato administrativo:

todo e qualquer ajuste entre órgãos ou entidades da Administração


Pública e particulares, em que haja um acordo de vontades para a
formação de vínculo e a estipulação de obrigações recíprocas, seja qual
for a denominação utilizada. (mOTTA, 2005, p. 53)

b) ter por objeto a própria execução de um serviço público; e


c) conter cláusulas exorbitantes (mOTTA, 2005, p. 54).
Entre as peculiaridades do contrato administrativo existem as

minadas “cláusulas exorbitantes”, que são inadmissíveis no Direito


Privado, mas são necessárias nos contratos com o Poder Público. Esse
privilégio da Administração Pública, que a rigor é uma das partes con-

(mEIRELLES, 2007, p. 201).

tratuais e relativas ao controle do contrato.

e controle, destacam-se apenas as que causam dano ao erário. É o caso


das alterações contratuais, por meio de aditivos, para supressão de
obrigações ou acréscimo de quantitativos. Outra alteração é a que se

5.3 O ciclo da contratação pública


A rigor, as demandas que acabarão levando a Administração a
contratar nascem na elaboração dos orçamentos públicos. As dotações
Salomão RibaS JUnioR
250 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

orçamento como pré-requisito dos editais de licitação. É nesse ponto que

— propinas para o direcionamento de obras e serviços públicos e desvio


de recursos públicos com superfaturamento. Os desvios de conduta
podem ocorrer na burocracia que elabora a proposta orçamentária, no
âmbito das deliberações parlamentares, nas emendas parlamentares,
nos contingenciamentos e liberações de verbas pelo Poder Executivo.
Em cada uma dessas etapas têm-se meios e oportunidade para a ação
de corruptos e corruptores.
na literatura de mendes (2012) encontram-se questões relativas

que o planejamento da contratação pode ser estruturado em quatorze


diferentes etapas, como descritas a seguir:

solução;

integram o encargo;

Etapa V - Aprovação da autoridade competente;

da modalidade de licitação, se for o caso;

Etapa xII - Elaboração do edital e de anexos;


Etapa xIII - Elaboração e aprovação do edital pela assessoria jurídica;
Etapa xIV - Envio do aviso do edital para publicação. (mEnDES, 2012,
p. 91)

Cada uma dessas etapas deve seguir um rito próprio. Esse rito
é previsto como prática administrativa — orientada pelo comando

da contratação. Antes de qualquer anúncio público — fase externa da

a Administração. São aparentemente aspectos formais, mas em ver-


CAPíTULO V
COmPRAS GOVERnAmEnTAIS E COnTRATOS
251

autoridade competente. Essa responsabilidade pode, presentes certas


circunstâncias, alcançar o parecerista jurídico.
O parágrafo único do art. 38 da Lei de Licitações exige esse

superior a adoção da solução que julgue mais adequada:

Art. 38. O procedimento da licitação será iniciado com a abertura de


processo administrativo, devidamente autuado, protocolado e nume-
rado, contendo a autorização respectiva, a indicação sucinta de seu
objeto e do recurso próprio para a despesa, e ao qual serão juntados
oportunamente: [...]
Parágrafo único. As minutas de editais de licitação, bem como as dos
contratos, acordos, convênios ou ajustes devem ser previamente exami-
nadas e aprovadas por assessoria jurídica da Administração. (BRASIL,
2012d)

dimento na fase externa, modalidade, regime de execução e tipo da


licitação. Em seguida, tem-se a elaboração do edital e sua aprovação
pela assessoria jurídica. É fundamental para o êxito da licitação um tra-
balho coordenado e judicioso da Comissão de Licitação. Essa deve ser
integrada por servidores públicos efetivos e com poderes de atuação,
que lhe assegurem autonomia e independência no exame das propostas.
Os seus membros têm algumas vedações no processo de licitação.
O contrato é um instrumento para que a Administração Pública
compre os bens de que necessita, contrate as obras que são necessárias e
os serviços que podem ou devem ser executados por particulares. Esse

responsabilidades dos contratantes. Cita-se como exemplo: a Admi-


nistração por seus órgãos de obras públicas de um lado e a empreiteira
que vai construir uma estrada, de outro. Esse exemplo, do setor de obras
públicas, é sempre invocado em textos que versam sobre corrupção
pública e privada. São muitas e variadas as ocorrências envolvendo
imensas quantidades de recursos orçamentários.

5.4 Atos iniciais


Antes do contrato é preciso que a demanda que se vai atender
Salomão RibaS JUnioR
252 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

Art. 55. São cláusulas necessárias em todo contrato as que estabeleçam:


[...]

funcional programática e da categoria econômica; [...] (BRASIL, 2012d)

do texto constitucional. no caso brasileiro, a Administração Pública


norteia-se pela “legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade
caput, Constituição Federal) e mais a seguinte
norma imperativa.

Art. 37. [...]

viços, compras e alienações serão contratados mediante processo


de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os
concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento,
mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual

2012b)

O processo de licitações, vencidos os pré-requisitos referidos,


tem duas fases (interna e externa). A externa começa com o edital, como
veremos a seguir.

5.5 O edital de licitação


O direito constitucional brasileiro impõe a licitação como
essencial para a contratação pública (art. 37, xxI, Constituição Federal).

dos editais de licitação.

essencial para a compra. A Administração tem que saber exatamente o


que quer ou necessita e comunicar isso ao mercado por meio do edital.
Se os valores estimados da contratação forem muito elevados (superior

uma audiência pública. O que confunde um pouco, pois se trata de


CAPíTULO V
COmPRAS GOVERnAmEnTAIS E COnTRATOS
253

procedimento externo, antes de concluída a fase interna. mesmo assim,


é o que determina a lei.

Art. 39. Sempre que o valor estimado para uma licitação ou para um
conjunto de licitações simultâneas ou sucessivas for superior a 100 (cem)
vezes o limite previsto no art. 23, inciso I, alínea “c” desta Lei, o processo
licitatório será iniciado, obrigatoriamente, com uma audiência pública
concedida pela autoridade responsável com antecedência mínima de
15 (quinze) dias úteis da data prevista para a publicação do edital, e
divulgada, com a antecedência mínima de 10 (dez) dias úteis de sua
realização, pelos mesmos meios previstos para a publicidade da licitação,

manifestar todos os interessados.

simultâneas aquelas com objetos similares e com realização prevista


para intervalos não superiores a trinta dias e licitações sucessivas aquelas

data anterior a cento e vinte dias após o término do contrato resultante


da licitação antecedente. (BRASIL, 2012d)

O sentido da audiência pública ultrapassa o interesse da Admi-


nistração e dos futuros licitantes ou contratantes. Dela podem participar
e discutir os termos — e até discutir as necessidades do contrato —
outros setores da sociedade. O que também é controverso na doutrina
e nas práticas administrativas. Entendam muitos que o que está em
discussão são apenas os termos do edital e não há conveniência e opor-
tunidade da contratação. Ainda assim, não é pouco, especialmente
diante da complexidade técnica do que pretende o governo e eventuais
dúvidas da própria Administração.

dade da licitação. Sob esse aspecto, a legislação aplicável também leva


em conta a menor complexidade da satisfação da necessidade e os

Art. 22. São modalidades de licitação:


I - concorrência;
II - tomada de preços;
III - convite;
IV - concurso;
Salomão RibaS JUnioR
254 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

V - leilão.

sados que, na fase inicial de habilitação preliminar, comprovem possuir

de seu objeto.

devidamente cadastrados ou que atenderem a todas as condições

pertinente ao seu objeto, cadastrados ou não, escolhidos e convidados


em número mínimo de 3 (três) pela unidade administrativa, a qual

estenderá aos demais cadastrados na correspondente especialidade que


manifestarem seu interesse com antecedência de até 24 (vinte e quatro)
horas da apresentação das propostas.

tuição de prêmios ou remuneração aos vencedores, conforme critérios

mínima de 45 (quarenta e cinco) dias.

para a venda de bens móveis inservíveis para a administração ou de


produtos legalmente apreendidos ou penhorados, ou para a alienação
de bens imóveis prevista no art. 19, a quem oferecer o maior lance, igual

existindo na praça mais de 3 (três) possíveis interessados, a cada novo


convite, realizado para objeto idêntico ou assemelhado, é obrigatório
o convite a, no mínimo, mais um interessado, enquanto existirem
cadastrados não convidados nas últimas licitações. [...]. (BRASIL, 2012d)

Além dessas modalidades de licitação, tem-se a modalidade

aquisição de bens e serviços comuns, cujos padrões de desempenho

licitação, principalmente a modalidade de pregão por meio eletrônico.


Cada uma dessas modalidades atende — ou procura atender
— aspectos do valor e da complexidade dos atos administrativos
necessários para a satisfação da demanda. Vencida a etapa interna do
processo e atendidas as questões que ela suscita, passa-se para fase
externa do processo. É quando o mercado toma conhecimento formal-
mente do que necessita a Administração contratar.
CAPíTULO V
COmPRAS GOVERnAmEnTAIS E COnTRATOS
255

determina que estejam presentes algumas circunstâncias — é tomada

na modalidade mais adequada — pela dispensa da mesma ou pela


declaração da inexigência. nesse sentido:

de realizar a fase externa do processo de contratação. É preciso observar


que não é a licitação, a dispensa ou a inexigência que possui fase interna,
mas sim o processo de contratação. O que se pode dizer apenas é que a

(mEnDES, 2012, p. 249)

Assim, a licitação é uma parte do processo mais amplo de con-


tratação. mais é parte de um amplo processo de alocação de recursos

não é exagero dizer que a licitação é a regra geral que nasce com o
comando constitucional.
A dispensa por inviabilidade da competição ou a inexigência
são exceções. O valor estimado da contratação é um dos critérios para

concorrência, tomada de preços ou convite. É a regra do art. 23 da Lei

Art. 23. As modalidades de licitação a que se referem os incisos I a III


do artigo anterior serão determinadas em função dos seguintes limites,
tendo em vista o valor estimado da contratação:
I - para obras e serviços de engenharia:

b) tomada de preços - até R$1.500.000,00 (um milhão e quinhentos mil


reais);
c) concorrência: acima de R$1.500.000,00 (um milhão e quinhentos mil
reais);
II - para compras e serviços não referidos no inciso anterior:
a) convite - até R$80.000,00 (oitenta mil reais);

reais). [...]. (BRASIL, 2012d)

Há certa vulnerabilidade na escolha da modalidade pelo valor


estimado. Pode, também, ensejar a corrupção, a partir do preço mais
Salomão RibaS JUnioR
CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

limitada ao valor do objeto, sem considerar todos os encargos da


contratação.
Outra questão importante para a licitação é a adoção da moda-
lidade pregão para a contratação dos serviços comuns e de material
de uso corriqueiro.

comuns, ou seja, aqueles cujos padrões de desempenho e qualidade

serviços de informática. (BRASIL, 2010, p. 37)

A orientação do TCU é no sentido da prevalência da regra legal.


Isto é, no uso da modalidade estritamente para aquisição de bens e
contratações de serviços comuns. Há, contudo, esforços no sentido de
ampliar as hipóteses de contratação pelo pregão eletrônico.

5.7 Tipos de licitação


Relembrando que modalidade de licitação é procedimento,
tratam-se, pois, dos tipos de licitação que se referem a critérios de
julgamento. O TCU registra que:

Tipos de licitação mais utilizados para o julgamento das propostas são


os seguintes:
- menor preço;
- melhor técnica;
- técnica e preço. (BRASIL, 2010, p. 108)

Será licitação de menor preço aquela que o edital estabelecer que

o menor preço.
A jurisprudência do TCU insiste que o que interessa é o melhor

produtos de baixa qualidade” (BRASIL, 2010, p. 109).


Já a melhor técnica busca selecionar a proposta mais vantajosa,
tendo por base fatores de ordem técnica. Se, no menor preço, a cautela
CAPíTULO V
COmPRAS GOVERnAmEnTAIS E COnTRATOS
257

é necessária, no caso da melhor técnica ela deve aumentar. no primeiro


caso, o risco é de produtos de má qualidade e por isso mais baratos.
Já a seleção pela melhor técnica permite uma alta subjetividade na

esse tipo de licitação deve ser usado, exclusivamente, nos serviços de


natureza predominantemente intelectual. Serve para a “elaboração de
estudos técnicos preliminares, projetos básicos e executivos, cálculos,

em geral” (BRASIL, 2010, p. 114).

vencedora ou a mais vantajosa pelos critérios de preço e técnica. na


tomada de preço (menor valor), para contratar os mesmos serviços não

para evitar prejuízos ao erário, é a adequada ponderação da nota e peso


atribuídos a cada um dos fatores estabelecidos. Eles podem direcionar
a seleção para a escolha de empresa com base na preferência clientelista
ou corrupção. Assim, o TCU busca prevenir o manejo impróprio de
exigências no edital.
nesse sentido:

E vedada a inclusão em editais de licitação de quesitos de pontuação


técnica para cujo atendimento as empresas licitantes tenham de incorrer
em despesas que sejam desnecessárias e anteriores a própria celebração
do contrato ou frustrem o caráter competitivo do certame. Os fatores
de pontuação técnica, em licitações do tipo técnica e preço, devem ser
adequados e compatíveis com as características do objeto licitado, de

Outro aspecto é o excessivo privilegiamento da técnica, que

subjetividade ao excesso de exigências técnicas. Também se encontram


limites na jurisprudência do TCU:

O privilegio excessivo da técnica em detrimento do preço, sem haver

resultar em contratação a preços desvantajosos para a Administração.


O estabelecimento de condições mais rigorosas na licitação do que
aquelas que serão exigidas durante a execução contratual, especialmente
considerando os aspectos de pontuação da proposta técnica, pode
resultar na seleção de proposta altamente focada em quesitos técnicos
sem correlação com o benefício efetivamente esperado para a execução
Salomão RibaS JUnioR
258 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

contratual, com sobrevalorização dos serviços sem aproveitamento de

(Sumário). (BRASIL, 2010, p. 117)

Em caráter excepcional, admite-se a compra de bens, a execução


de obras ou prestação de serviços de grande vulto. A regra geral,
contudo, é o uso exclusivo na contratação de serviço de natureza predo-
minantemente intelectual.
Uma forma de evitar a licitação — modalidade e tipo — é o
parcelamento indevido de compras. Os Tribunais de Contas alertam
seguidamente a Administração para essa prática.
O Tribunal de Contas da União recomenda:

ou seja, em partes menores e independentes. Difere-se de fracionamento,

modalidade de licitação menos rigorosa que a determinada para a tota-


lidade do valor do objeto a ser licitado. (BRASIL, 2010, p. 227)

A escolha do tipo de licitação deve obedecer aos rígidos critérios


da boa administração. Ele deve permitir a melhor contratação pelo preço
e qualidade mais vantajosos.

5.8 Defeitos e impropriedades do edital


São vários os defeitos que um edital pode conter, levando-o ao
dirigismo da licitação em favor de um ou poucos fornecedores. Esses
defeitos operam em desfavor de outros competidores e, seguramente,
em desfavor da Administração.
Os Tribunais de Contas que requereram os editais para exame
podem impedir contratações dirigidas e outros danos ao erário. Outra
forma de combater a corrupção e outras fraudes nas licitações é apreciar
com celeridade as representações de prejudicados, pelas cláusulas dos
editais ou parcialidade das Comissões de Licitação.
É interessante ver que pontos podem provocar essa situação, a
partir de casos concretos.
O controle dos contratos, a rigor, começa pelo controle de todo
o processo de licitação e, em especial, pelo edital.
Já foi visto alhures que esse é um passo fundamental para
garantir a isonomia entre os participantes e a possibilidade de selecionar
a proposta mais vantajosa para a Administração. Assim, algumas
CAPíTULO V
COmPRAS GOVERnAmEnTAIS E COnTRATOS
259

vedações do TCU (jurisprudência) não podem ser esquecidas na


elaboração do edital. É vedado aos agentes públicos:

1) admitir, prever, incluir ou tolerar, nos atos de convocação, cláusulas


ou condições que comprometam, restrinjam ou frustrem o caráter
competitivo e estabeleçam preferências ou distinções em razão da
naturalidade, da sede ou domicílio dos licitantes ou de qualquer circuns-

2) estabelecer tratamento diferenciado de natureza comercial, legal,


trabalhista, previdenciária ou qualquer outra, entre empresas brasileiras
e estrangeiras, inclusive ao que se refere moeda, modalidade e local de

Essas são as regras gerais e ainda encontram-se outras hipóteses


de ilegalidade de editais na jurisprudência do TCU, dos Tribunais de
Contas dos Estados e municípios e mesmo do Poder Judiciário. São

cionais que viciam os editais, como o ordenador da despesa, o advogado


parecerista e os membros da CPL (Comissão Permanente de Licitação).

receber, examinar e julgar todos os documentos e procedimentos rela-

ser processado com observância das disposições do art. 43, inciso IV, da

com os preços correntes de mercado. Ainda que se que admita que [...]
exista um setor responsável pela pesquisa de preços de bens e serviços
a serem contratados pela administração, a Comissão de Licitação, bem
como a autoridade que homologou o procedimento licitatório, não estão

(Voto do ministro Relator). (BRASIL, 2010, p. 37)

Antes de o edital ser concluído, vários cuidados devem ser ado-


tados pelo administrador. Desde a formulação adequada de Edital e
da existência de previsão orçamentária (PPA, LDO, LOA), até a clareza
do objeto.
no caso de obras públicas, alguns daqueles defeitos (em relação

Os técnicos dos Tribunais de Contas acumularam experiências e podem


apontar, com precisão e relativa facilidade, os pontos de risco para a
fraude.
Salomão RibaS JUnioR
CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

- Pela falta de clareza na descrição do objeto e de outros itens do edital

será executado;
- Pelo detalhamento excessivo da descrição do objeto e de outras exi-
gências — que poderá mencionar itens que apenas alguns interessados
possam oferecer, afastando, de imediato, algum possível concorrente;
- ela exigência de quantitativos elevados em atestados de capacidade

contexto do atual objeto;


- Pela exigência que o(s) atestado(s) de capacidade técnica contenha(m)

importância no contexto do atual objeto, mas que pode ser fator de


decisão do processo;
- Limitação de quantitativos em um único atestado — itens que possam,
sem qualquer comprometimento, demonstrar a capacidade do licitante
em mais de um atestado;

possibilitar a inclusão de critérios subjetivos de julgamento; com a pon-


tuação de maneira subjetiva, pode ser escolhida a vencedora;

de preço — facilita, sobremaneira, o direcionamento;


- Pela exigência de índices econômicos não usuais ou descabidos que

execução — servem para “afastar” aquelas que não possuem índices


“saudáveis”;
- Pela não possibilidade de participação em consórcio — pois somente
empresas isoladamente, que detenham todos os atestados ou todos os
itens em algum atestado é que poderão participar, quando na prática as
empresas são mais especializadas em determinados tipos de serviços; e,
- Prazo de execução reduzido, não usual ou incompatível com neces-
sidade — restringe o universo daqueles que podem atender o prazo

Assim, a forma mais grosseira de dirigir a licitação é fazer constar


do edital a marca de um determinado produto, prática que pode ser
instituída pelos itens do produto ou condições de exceção do serviço ou
da obra. num e noutro casos pode-se eliminar a concorrência e garantir
o contrato para um fornecedor previamente escolhido.
CAPíTULO V
COmPRAS GOVERnAmEnTAIS E COnTRATOS

5.9 Controle dos contratos


Outra cláusula que interessa sobremaneira é a relativa ao controle
da execução do contrato. Esse instrumento é próprio da Administração
e não se destina a interferir no trabalho próprio do contratado, mas
acompanhar passo a passo o cumprimento do que a Administração
contratou. Esse controle deve ser feito sob duas perspectivas distintas
e que se completam: a do controle interno (controle administrativo
típico) e a do controle externo (controle legislativo). Certamente nenhum
contrato ou ato de execução, sob suspeita de violação da lei, pode ser
subtraído ao controle judicial. Os dois aspectos (legislativo e judicial),
será visto mais adiante. nesse passo, cuida-se do controle interno

Para contratar é importante a obediência aos princípios que


orientam a boa gestão dos negócios públicos, dos quais decorre a boa
contratação. Os estudiosos asseguram que esses princípios somente são

fundo. “Para garimpar esses [...] princípios é indispensável mergulhar

autor encontra-se o que se denomina de “uma nova concepção de


contratação pública”. Lista os 10 princípios que considera as ideias
nucleares da contratação pública.

Administração, garanta a indispensável qualidade, possibilite solução


econômica e não restrinja imotivadamente a disputa;
II) Que o preço a ser pago pelo objeto seja justo e exequível;
III) Que sejam observadas as exigências legais de naturezas orçamentária

respeitar a ordem jurídica vigente;


V) Que haja competição efetiva entre os licitantes e que todos disponham
das mesmas informações;

indispensáveis para assegurar e garantir o cumprimento do objeto;


VII) Que nenhum competidor seja eliminado, senão por motivo de
descumprimento de exigência essencial;
VIII) Que todas as decisões adotadas respeitem as exigências da ordem
jurídica, sejam devidamente motivadas e possam ser discutidas;

das propostas for realizada por meio de licitação;


Salomão RibaS JUnioR
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x) Que o contrato seja uma relação de equivalência jurídica entre encargo


e remuneração (preço) a ser obrigatoriamente respeitada durante toda

Como princípios, todos são importantes, pois não se pode perder

a escolha da proposta mais vantajosa.

entre os interessados em construir obras, prestar serviços ou fornecer

mecanismos da lei. Desde o início da elaboração do processo podem ser


explicitados preços de referência, preços mínimos e preços máximos.
Da avaliação de preços no mercado extraem-se regras no mercado para

A clareza de regras e a transparência na alocação de verbas


orçamentárias asseguram um mínimo de garantia para a livre com-
petição entre os possíveis contratados. A assimetria de informações
deve ser evitada. Ao mesmo tempo, deve-se preservar a participação de
todos no processo. Eventuais discriminações ou eliminações precisam

quer a Administração e da escolha dos vencedores é essencial para


um contrato justo e equilibrado. Só assim se pode obter a “relação de
equivalência jurídica” entre os fatores do contrato. O que se pretende,
conforme o comando constitucional (art. 37, xxI, da Constituição
Federal) e a regra licitatória, é que todas “as obras, serviços, inclusive
de publicidade, compras, alienações, concessões, permissões e locações
da administração pública” com terceiros, sejam licitadas. Essa é a regra
geral. Algumas exceções estão previstas na lei.
Ainda mais, a licitação existe para garantir a isonomia e a seleção
mais vantajosa para a Administração:

constitucional da isonomia, a seleção da proposta mais vantajosa para


a administração e a promoção do desenvolvimento nacional susten-
tável e será processada e julgada em estrita conformidade com os
princípios básicos da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da
igualdade, da publicidade, da probidade administrativa, da vinculação
ao instrumento convocatório, do julgamento objetivo e dos que lhes são
correlatos. (BRASIL, 2012d)
CAPíTULO V
COmPRAS GOVERnAmEnTAIS E COnTRATOS

Depois dos trabalhos de organização do processo (fase interna)


é que se constrói o edital, etapas xII, xIII e xIV do elenco elaborado
por mendes (2012) como visto em capítulo anterior. Trata-se, então, de
elaborar o edital e seus anexos, elaboração e aprovação do edital pela
assessoria jurídica e envio para publicação.

5.10 Caminhos da corrupção nos contratos

normas e critérios para uma boa contratação governamental; (ii) as


disposições legais que orientam a contratação pública; (iii) algumas
anotações sobre fragilidades ou áreas de risco; e (iv) possibilidades e
falhas de controle. Essas últimas questões foram tratadas de forma a
reforçar argumentos em favor da importância de um ou outro aspecto
da lei ou critério de administração. Como dito anteriormente, depois de
examinar formas, tipos e controle dos contratos é importante examinar
alguns aspectos da corrupção nos contratos administrativos.
O primeiro passo é separar os contratos pela natureza do seu
objeto. Eles se destinam a uma série de atos e ações da Administração.
É conveniente separar para uma melhor avaliação de aspectos da
fraude ou da corrupção, como a contratação de obras, a de serviços e

tem crescido até mesmo em razão do aumento ou, como querem alguns,
da maior transparência e liberdade que o regime democrático permite.

5.10.1 Contrato de obras e serviços

fabricação, recuperação ou ampliação, realizada por execução direta ou


indireta. Já o serviço é toda atividade destinada a obter determinada
utilidade de interesse para a Administração, tais como:
a) demolição;
b) conserto;
c) instalação;
d) montagem;
e) operação;
f) conservação;
g) reparação;
h) adaptação;
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i) manutenção;
j) transporte;
k) locação de bens;
l) publicidade;
m) seguro; e

item V que discrimina que as obras, serviços e compras de grande


vulto — aquelas cujo valor estimado seja superior a 25 (vinte e cinco)
vezes o limite estabelecido na alínea “c” do inc. I do art. 23 desta lei,
isto é, concorrência acima de R$1,5 milhões de reais.

5.10.2 Uma pesquisa pioneira na Alemanha


O estudo sistemático da corrupção em obras públicas teve um
começo muito importante no Estado de Hessen, na Alemanha. Pro-
movido pelo Tribunal de Contas Regional, ganhou publicidade com a

Este artigo foi assinado pelo Sr. Udo muller, Presidente do Tribunal de
Contas de Hessen. no Seminário de Estudos Comparados da Atuação
dos Tribunais de Contas, os autores do artigo intitulado “A Função
dos Tribunais de Contas: as realidades no Brasil e na Alemanha,”
apresentaram a questão (SKIPIS 1995 apud

Os conhecimentos adquiridos com os trabalhos cotidianos de investi-


gação levaram o Tribunal de Contas de Hessen, como órgão máximo

problemática da corrupção no setor da construção. As experiências

nesse setor. O aumento de conhecimentos relativos a práticas de


corrupção abriu cada vez mais as suas estruturas possibilitando uma
catalogação sistematizada do fenômeno.
[...] Assim, “entre os anos de 1991 e começo de 1993, cobriu o Tribunal
de Contas de Hessen 70 casos de construção de obras públicas em 11
circunscrições estaduais atingindo cerca de 24 comunidades. Por motivo

Uma releitura do texto mostra que a metodologia então criada


permanece atual. Igualmente, as fragilidades dos setores governa-
mentais persistem. Os métodos de fraude foram aperfeiçoados, mas
guardam uma curiosa identidade.
CAPíTULO V
COmPRAS GOVERnAmEnTAIS E COnTRATOS

Uma primeira constatação é de que:

Ela não é exclusiva de pequenos funcionários detentores, em proporções

demonstram com assustadora clareza que a corrupção avança até os


círculos mais elevados de funcionários públicos, chegando inclusive

grande corrupção política envolve os “círculos mais elevados do Poder”.


Segundo aquele estudo, em praticamente todos os setores há
fraudes. É a concentração de recursos (custos) nos setores de sanea-
mento, redes de água, prédios públicos, infraestrutura, pontes, viadutos
e estradas. E a prática da propina em cada uma das fases das contra-
tações era encarada como normal e talvez necessária para a celeridade
processual.

Em 1992, citou Fritz Ulrich Fack, no jornal Frankfurt Allgemein,45


as palavras proferidas por um advogado de defesa em um processo
movido contra dirigentes da Siemens e funcionários da administração
municipal de munique por motivo de corrupção: “O que aqui tem-se
tratado, nada mais é do que a prática usual na concessão de contratos
públicos”. Uma surpreendente declaração que, entretanto, deixa-se

Promotoria e pelos estudos revelados pelo Tribunal de Contas. (RIBAS

O clima burocrático que permite, na fase inicial da corrupção,


a criação de condições para a corrupção, pode ser descrito assim pelo
palestrante do Seminário da DSE (Fundação Alemã para o Desen-
volvimento Internacional):

a) ausente ou fraca visão geral das atividades desenvolvidas; b) tra-


balho conjunto durante anos seguidos dos mesmos funcionários
públicos com os mesmos terceiros (empreiteiros ou fornecedores);
c) ausência ou fraco controle interno; d) a prática de concessões de
serviços públicos (que para os terceiros envolvidos é a base de sua

45
,
Salomão RibaS JUnioR
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existência) face ao monopólio estatal (ex: construção de estradas);


e) discrepância grave entre os salários pagos pela administração pública

f) regulamentos e instruções normativas de difícil aplicação e que, se


concretamente aplicados, prolongam a execução da obra; g) consciência
da impunidade (ilegalidade motivada por anos de prática), motivada

segurança; h) inexistência de vítimas diretas (com exceção do Estado


e concorrentes desavisados) face as práticas corruptivas (ninguém
reclama); i) nem mesmo os concorrentes eventualmente prejudicados

procedimentos nas concorrências futuras, inclusive com as mesmas

como dizem os germânicos — é que os fenômenos se repitam. O fato é


que práticas corruptas, quando não são iguais, guardam semelhança
entre si. Daí a possibilidade de uma tipologia da corrupção (SKIPIS;
mULLER, 1993, p. 509).

Com os casos de corrupção no setor da construção até agora encontrados,


pode-se estabelecer uma tipologia. De grande significado para a
obtenção dessa tipologia é a divisão das obras de construção em três
fases, dentre as quais deixam-se subdividir diversos grupos de casos. A
primeira fase situa-se no período anterior ao da entrega das propostas.
A segunda fase vai da entrega da proposta até a concessão do contrato
e a terceira fase concentra-se no período após a concessão do contrato.

Como visto, a fase inicial que ocorre antes da entrega das pro-
postas é a que envolve o clima de trabalho, a falta de visão, consciência
de impunidade, entre outros. As fases seguintes são as que veremos.
A lembrar a intimidade dos altos dirigentes e os políticos ávidos de
recursos para as campanhas eleitorais. Tanto é que, tempos depois
de estudo, estourou o escândalo Helmut Kohl de corrupção política

União Europeia foi acusado de usar fundos públicos ilegalmente para

mas perdeu as eleições. O que é irrelevante, pois aceita o fato de que


político.
CAPíTULO V
COmPRAS GOVERnAmEnTAIS E COnTRATOS

do contrato, podem ocorrer outras irregularidades com corrupção


(prejuízo para o erário e benefícios para o setor privado). É quando
podem ocorrer alterações no preço da proposta vencedora, mudanças
no objeto previsto no edital e abertura de condições para o jogo de
planilhas. Algumas dessas adulterações, segundo os técnicos do
Tribunal de Hessen, são grosseiras.

As práticas usuais na suplementação posterior do preço são as seguintes:

originais; 2) trocar páginas inteiras ou remover uma das folhas do

cálculo” providencialmente incluídos. (mULLER; SKIPS apud RIBAS

Podem ainda ocorrer, após a abertura dos envelopes de propostas,


negociações ilegais de preços. Podem ser diminuídas ou subtraídas

Com esses exemplos, pode-se examinar a terceira fase que envolve a


execução do contrato, o recebimento da obra e o seu pagamento. São
os casos das medições fraudadas e aditivos contratuais. Esses aditivos
podem incluir trabalhos extras — não previstos no edital — ou incluir
trabalhos que não são executados.

a alguns itens. Faltou por exemplo, comprovação, através das guias,

não foi possível determinar, através de meios plausíveis, a utilidade


de determinados materiais que estavam sendo cobrados através de

os materiais ou serviços não haviam sido efetivamente utilizados ou


realizados. (mULLER; SKIPS apud

no Brasil, as vulnerabilidades ou áreas de risco ou momentos de


risco não diferem muito do que se encontrou no estudo do Tribunal de
Contas de Hessen. no Brasil, pode-se dizer que se tem:
Salomão RibaS JUnioR
CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

o da obra ou serviço; e

na primeira fase, há exemplos descobertos na CPI do Orçamento


e outras investigações mais recentes dos Tribunais de Contas, dos
Parlamentos (CPIs), da Polícia Federal e do ministério Público.

impeachment de Collor, baseou seus estudos na CPI PC-Collor e CPI do


Orçamento, nos quais conclui que:

O que se depara, sim, na contumácia da corrupção arraigada, é a marca


das conjunturas clássicas do subdesenvolvimento, da permanência da
indistinção entre o bem público e o particular no exercício do poder.
mais adiante, registra que os Relatórios das Atividades da Comissão
Especial podem dar conta da sistematização de diversos esquemas

a norma reveste graus crescentes de sutileza, até torná-la invisível ao


controle governamental. (RIBAS JR., 2000, p. 217)

Assim, “O início do papel das empreiteiras se dá na própria


sugestão de obras a prefeitos e governadores. Elaboram elas estudos

apenas para assinatura”. (RIBAS JR., 2000, p. 223)


De acordo com o Relatório Final:

Foi possível comprovar a existência de um cartel de empreiteiras, que


promoviam um rodízio para vencer as licitações, em fraude ao processo
licitatório. Esse procedimento, não raro, dispensa o concurso direto de
funcionários públicos. Ainda de acordo com o Relatório em questão,

uma. Havia um verdadeiro rodízio: quem vencia a licitação ia para o

licitatório era a troca de obras por parte dessas grandes empresas.

Construtora Queiróz Galvão responsabilizar-se pelas obras do Projeto


Pirapama e entregar a esta última as obras de drenagem da Zona Sul
de natal, obra feita conjuntamente pelas duas empresas. Em seguida, A
Construtora norberto Odebrecht entregava para a Construtora OAS as
obras de Açailândia, Barra do Corda e Vargem Grande, no maranhão,
recebendo em troca parte das obras de Pirapama. Daí se depreende

licitações os valores que bem entendiam, quase sempre provocando o


superfaturamento. (RIBAS JR., 2000, p. 223)
CAPíTULO V
COmPRAS GOVERnAmEnTAIS E COnTRATOS

nos últimos anos, com a descoberta de fraudes e corrupção


no ministério dos Transportes — que derrubou o ministro Anderson
Adauto — surgiram novamente notícias de obras incluídas no
orçamento pelas empreiteiras. E, também, a vinculação da inclusão com
a corrupção eleitoral (doações ilegais) até na campanha presidencial.
na elaboração dos editais tem-se outro momento de risco. É

superfaturamento.
É o caso da investigação do TCU sobre doações de projetos de
obras ao DnIT. Essas doações estão sendo feitas por associações em-
presariais, que tem executores (empreiteiras) desses projetos entre
seus membros. É mais rápido para o governo incluir essas obras no
orçamento. E o faz com os parâmetros de custos e quantidades do
projeto. O que pode gerar prejuízos, pois os projetos são feitos sem
acompanhamento de técnicos do DnIT. São quatro casos sob inves-
tigação do TCU nos Estados de Goiás, minas Gerais e Paraná. Análises
do Tribunal em três deles concluíram que os estudos tinham defeitos
parecidos e, se concluídos, poderiam causar superfaturamento total
superior a R$400 milhões, em obras estimadas em R$2 milhões.
As entidades informaram que contrataram os projetos como
contribuição ao desenvolvimento. O DnIT informou que cumprirá as
determinações do TCU (COSTA; AmORA; mELLO, 2012).
Essas revelações surgiram na CPI do Cachoeira, durante o
depoimento do Ex-Diretor do DnIT, Luiz Antônio Pagot. na mesma
oportunidade, o Ex-Diretor revelou ter arrecadado com empreiteiras

Presidência da República em 2010. Outras revelações envolveram a


empreiteira DELTA.

5.11 Preparação da licitação


A possibilidade de licitações serem decididas antes da elaboração
do edital é um fato. Já se fazia presente na década de 1990 na Alemanha
e se faz no Brasil de hoje. Um ou vários artifícios produzem cláusulas,
condições, impedimentos, exigências no edital, que só permite a habi-
litação de empresas mapeadas para o êxito. Isso ocorre com propina

Veja, 13 jul. 2011.

2012.
Salomão RibaS JUnioR
270 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

ou suborno de servidores ou decorre de compromissos assumidos no

o erário em favor de ganhos pessoais ou partidários. Outro dado é o


acordo entre fornecedores e empreiteiras para apresentação de preços
elevados. A própria Lei de Licitações prevê essa hipótese de conluio:

Art. 190. Frustrar ou fraudar mediante ajuste, combinação ou qualquer


outro expediente, o caráter competitivo do procedimento licitatório,
com o intuito de obter, para si ou para outrem, vantagem decorrente
da adjudicação do objeto da licitação. (BRASIL, 2012d)

nessa fase preparatória (interna) podem ser elaborados:


a) orçamentos superestimados;
b) dispensa de licitação sob a alegação de urgência;
c) acordo de preços entre licitantes;
d) inclusão de itens que não serão executados;
e) jogo de planilhas; e
f) contratação de trabalhos já executados.
Um exemplo de manipulação de orçamentos superdimensionados:
a Administração recusa um primeiro orçamento porque é muito ele-
vado. Aceita um segundo bem inferior ao primeiro. Só que a obra pode
ser realizada pela metade do orçamento.

Orçamentos impróprios: são apresentados orçamentos impróprios (valor

temente se prestam ao favorecimento de “manipulações” posteriores.


Um escritório de engenharia, a pedido da comunidade, apresenta o
orçamento (proposta) para a construção de uma rede de escoamento

recusa de pronto o orçamento. Revista a proposta, apresenta, agora, o


escritório, um orçamento de 780.000 Dm, ainda muito acima dos custos
reais, mas que acaba sendo aprovado. Realizado o trabalho, atingiram
os custos globais da obra 372.780 Dm. Assim, com o restante da soma
(utilizado em operações manipulatórias), contribuiu a comunidade

Entre os acordos de preços encontram-se muitas hipóteses e


nuances para a pequena e a grande corrupção.
CAPíTULO VI

COnTROLE

Controle é uma palavra polissêmica nas línguas latinas em geral.


É o que acontece com o idioma português. Em razão dessa multi-

ao abrigo do substantivo controle e do verbo controlar.

controle - s.m. (1922 cf. CT) ato ou efeito de controlar 1. monitoração,

tativas, normas, convenções etc. 2. p. met. Instituição, órgão, setor etc. ao


qual compete tal função [...]. (HOUAISS; VILLAR, 2001, p. 825)

controlar - v. (1919 cf. CT) 1. t.d. submeter a exame e vigilância estritos;


t.d. exercer ação restritiva sobre; conter, regular
[...]. (HOUAISS; VILLAR, 2001, p. 825)

controle - [Do fr. Controle.] S.m. 1. Ato, efeito ou poder de controlar;


domínio, governo. 2. Fiscalização exercida sobre as atividades de
pessoas, órgãos, departamentos, ou sobre produtos, etc., para que tais
atividades, ou produtos, não se desviem das normas preestabelecidas

controlar - [Do fr. Contrôler.] V. t. d. 1. Exercer o controle de: 2. Submeter


a controle: 3. manter o controle, o domínio de si mesmo; conter-se,

no âmbito do Direito e da ciência da administração é que interessa,


mais de perto, o sentido de controle. no texto constitucional, controle
é expressão que se repete 35 vezes (BRASIL, 2012b). Está próxima de

Para comparar anote


texto da Carta Constitucional brasileira de 1988.
Salomão RibaS JUnioR
272 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

fiscalização - [De fiscalizar + ção.] S. f. Ato ou efeito de fiscalizar.


(FERREIRA, 1999, p. 909)

-[ ] V.t.d. 1. Velar por, vigiar, examinando:


2. Submeter a atenta vigilância, sindicar (os atos de outrem). 3. Examinar,

- s.f. (1813 cf. MS)


1.1 vigilância atenta sobre (ger. comportamento, ação); controle 1.2

(HOUAISS; VILLAR, 2001, p. 1345)

fiscalizar - v. (1641 cf. Mas Ant) 1 t.d. verificar se (algo) está-se


realizando como fora previsto; vigiar; 1.1 t.d. e pron. Pôr-se [esp. Ação,
comportamento] sob acurada vigilância; controlar(-se) 2. observar aten-

(HOUAISS; VILLAR, 2001, p. 1345)

Assim, tem-se que o controle pode ser a vigilância legal que a


hierarquia impõe em relação aos órgãos subordinantes e subordinados,
ou mesmo entre órgãos de igual hierarquia, com atribuições de execução

francês

do direito constitucional e administrativo. Já no ramo da ciência da


administração, controlar atrai a ideia de comando, intervenção. Vem da
expressão inglesa “controller” para designar o indivíduo responsável

ou de produção industrial. Assim, de acordo com o Dicionário,


Controller
administrativa, em certas organizações industriais ou comerciais ETIM
ing. Controller (sXV)
controle’ [...]” (HOUAISS; VILLAR, 2001, p. 825).

para o controle público e suas variações. José Afonso da Silva, ao


CAPíTULO VI
COnTROLE
273

expressões formas de controle, tipos de controle e sistemas de controle


são empregadas pela doutrina sem muita precisão de sentido”. (SILVA,

Antes de se tratar do tema sob esse ângulo, é interessante registrar


que a Administração Pública está sob o controle permanente nos termos
constitucionais, legais e regulamentares.
Considerando a divisão dos Poderes do Estado, questão que

Paris, 1755) no seu clássico, tem-se que os controles, em princípio,


são: administrativo; legislativo; e judiciário. O conceito de controle,

faculdade de vigilância, orientação e correção de que um Poder, órgão


ou autoridade exerce sobre a conduta funcional de outro”.

o citado “administrativista” registra que os tipos ou formas de controle


variam segundo o órgão que executa.

Assim, temos a considerar com precedência sobre os demais, por sua


permanência e amplitude, o controle da própria Administração sobre
seus atos e agentes (controle administrativo ou executivo) e, a seguir, o
do Legislativo sobre determinados atos e agentes do Executivo (controle

de qualquer dos Poderes pelo Judiciário, quando lesivos de direito


individual ou do patrimônio público (controle judiciário ou judicial).

Os conceitos sobre cada um desses tipos de controle mostram


diferenças e semelhanças em cada um deles. À primeira vista, tem-se
que o controle administrativo seria típico do Poder Executivo, o controle
legislativo do Poder Legislativo e o controle judicial do Poder Judiciário.

Cada um desses tipos de controle tem características próprias e


são predominantes nos Poderes do Estado, mas não exclusivos, nem
de absoluto domínio de cada um. O Poder Executivo exerce o comando

do Poder Legislativo e ao controle judicial. A Administração Pública é


majoritariamente função do Poder Executivo. não é, contudo, exclu-
siva. O Legislativo tem sua própria administração e pratica atos admi-
Salomão RibaS JUnioR
274 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

competência de cada um dos Poderes do Estado. O mesmo se aplica


ao controle administrativo: ele é exercido no âmbito interno de cada
administração. mais adiante será vista essa outra característica do
controle (interno e externo). O legislador constituinte de 1988 imaginou
uma integração desse tipo de controle: administrativo, interno.

Art. 74. Os Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário manterão, de

I - avaliar o cumprimento das metas previstas no plano plurianual, a


execução dos programas de governo e dos orçamentos da União;

entidades da administração federal, bem como da aplicação de recursos


públicos por entidades de direito privado;
III - exercer o controle das operações de crédito, avais e garantias, bem
como dos direitos e haveres da União;
IV - apoiar o controle externo no exercício de sua missão institucional.

qualquer irregularidade ou ilegalidade, dela darão ciência ao Tribunal


de Contas da União, sob pena de responsabilidade solidária.

legítima para, na forma da lei, denunciar irregularidades ou ilegalidades


perante o Tribunal de Contas da União. (BRASIL, 2012b)

O controle interno, típico controle administrativo, é exercido no


âmbito do órgão público ou do ente público. Destina-se a atuar pre-
ventivamente e em apoio aos responsáveis pelos atos da Administração
e execução dos orçamentos. Desde 1988 ganhou posição na Constituição
Federal (art. 74, CF). A forma de sua organização e das atribuições

entre esse sistema integrado e o controle externo (Tribunal de Contas).


De outra parte, como visto, as tarefas de controle legislativo
(externo) também se confundem com o administrativo (interno), con-
forme a regra do art. 74. Sobre esses dispositivos cabem duas anotações

mais adequado entre os direitos e garantias individuais e coletivos, ou


na parte que disciplina o controle externo com o auxílio do Tribunal de

é que a integração prevista para a operação do controle interno não


foi alcançada. Cada um dos Poderes mantém o seu próprio sistema.
CAPíTULO VI
COnTROLE
275

abilidade solidária dos responsáveis pelo

Já os cidadãos, partidos políticos, associações e sindicatos têm

O controle administrativo, pela sua natureza, é de caráter preven-


tivo. É derivado da autotutela da Administração. no dizer de mileski
(2011, p. 173):

nistração Pública — em sentido amplo — exerce sobre a sua própria


atuação, quanto aos aspectos de legalidade e mérito, por iniciativa
própria ou por provocação, visando manter a sua atuação de acordo
com a exigência constitucional, no que pertine ao atendimento dos
princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e

o de satisfazer as necessidades coletivas.

e avaliação do desempenho da Administração quanto no combate

contra a Administração. na Administração Federal o sistema ainda


não tem as características integradoras entre o Executivo, Legislativo
e Judiciário. Cada um desses órgãos tem os seus próximos controles
internos. De outro lado, no Executivo o controle interno é exercido pela
Controladoria Geral da União que absorveu a antiga Secretaria Federal
de Controle. Criada no governo do Sr. Fernando Henrique Cardoso
(1995-2002), foi consolidada — com acréscimo de outras funções de
controle — no governo do Sr. Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2010). É

os órgãos federais e também em relação aos municípios (recursos


repassados pela União) por um interessante mecanismo de sorteios.
nos anos de atuação foram investigados vários casos de cor-
rupção com a demissão de funcionários públicos. Ultimamente vem
sendo aperfeiçoado o sistema de controle dos convênios federais
(SICOnV).
Outro aspecto da interdependência dos poderes do Estado dá-se
no processo legislativo. Este é externo e envolve aspectos políticos e de
Legislativo, em palavras
Salomão RibaS JUnioR
CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

não faz isso em caráter exclusivo. A elaboração das leis passa por um
processo complexo que envolve a iniciativa, o exame das comissões

sanção ou veto, a eventual promulgação e a publicação para ter validade.

Poder Judiciário. A sanção ou o veto são prerrogativas do Chefe do Poder


Executivo. O que vale dizer que legislar, em sentido amplo, não é tarefa
do Poder Legislativo. Também não é o exercício do controle externo. Este

mas essas tarefas podem ser executadas em muitas circunstâncias


pelo ministério Público e pelo Poder Judiciário. São muito comuns as

revelia do Poder Legislativo e do Tribunal de Contas.


no controle judicial, ainda que a jurisdição seja seu privilégio
inafastável, há vários outros procedimentos no âmbito do Legislativo
com essas características. É o caso da competência para “sustar os atos
normativos do Poder Executivo que exorbitem do poder regulamen-
tar ou dos limites de delegação legislativa” (Constituição Federal,
art. 49, V). Deixando de discutir a prerrogativa do Congresso de “julgar
anualmente as contas prestadas pelo Presidente da República e apreciar
os relatórios sobre a execução dos planos de governo” (Constituição
Federal, art. 49, Ix), é importante cuidar de outras em que há decisão
definitiva do parlamento. É o caso do processo e julgamento do
Presidente e do Vice-Presidente da República, ministros e Comandantes
militares.

Art. 52. [...]


I - processar e julgar o Presidente e o Vice-Presidente da República nos
crimes de responsabilidade, bem como os ministros de Estado e os
Comandantes da marinha, do Exército e da Aeronáutica nos crimes da
mesma natureza conexos com aqueles. (BRASIL, 2012b)

Outra competência que se confunde, para efeitos acadêmicos,


com a jurisdição é o processo e o julgamento dos ministros do Supremo
Tribunal Federal e outros titulares ou integrantes de órgãos superiores
da Administração.

Art. 52. [...]


II - processar e julgar os ministros do Supremo Tribunal Federal, os
membros do Conselho nacional de Justiça e do Conselho nacional do
CAPíTULO VI
COnTROLE
277

ministério Público, o Procurador-Geral da República e o Advogado-


Geral da União nos crimes de responsabilidade. (BRASIL, 2012b)

De qualquer modo, o que se deve extrair é que os controles são


múltiplos e nenhuma das formas ou nenhum dos tipos é exclusivo de
um dos Poderes. Provavelmente pela adequada construção da harmonia
que é a regra para a existência da independência entre os poderes

O controle e o combate da corrupção podem e devem ser feitos em


cada um dos controles referidos. Diante da complexidade do fenômeno
e da sua presença tão marcante na vida nacional é importante que todos
os tipos ou formas de controle atuem de maneira integrada. Certamente
uma forte cooperação entre eles pode contribuir para a sua contenção.
Assim, cabe ao Judiciário:

[...] a instâncias da parte interessada, controlar, “in concreto”, a legiti-


midade dos comportamentos da Administração Pública, anulando suas

condenando-a a indenizar os lesados, quando for o caso. (BAnDEIRA

legalidade, se não houvesse um controle sobre sua aplicação concreta.

O que se deve considerar, como previsto anteriormente, é o

o controle pode ser tanto interno como externo. Como regra geral,
considera-se o controle administrativo tipicamente interno.
Como já visto anteriormente, ele é exercido no âmbito do próprio

ao controle uma atuação preventiva. Esse é o espírito do art. 74 da


Constituição Federal, antes transcrito.

a legalidade de seus próprios atos, no sentido de se ater aos princípios


da legalidade e da supremacia do interesse público, em que se inclui,
inclusive, avaliação envolvendo a conveniência administrativa do ato
praticado. (mILESKI, 2011, p. 172)
Salomão RibaS JUnioR
278 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

A sua existência, segundo mileski (2011), é que permite ao

— dever de anular os seus atos por ilegalidade ou revogá-los por con-


apud mILESKI,
2011, p. 172).
Já o controle externo é o que é exercido por outro Poder ou
órgão. nesse caso, são externos os controles legislativo e judiciário.
mais amplamente reconhecido como tal, o controle legislativo. É a

operacional e patrimonial serão exercidas pelo Congresso nacional,


mediante controle externo e pelo sistema de controle interno de cada
Poder (Constituição Federal, art. 70).

organizam sob a forma de pirâmide com vários níveis de respon-


sabilidade e decisão. Há um escalonamento vertical, decorrente desse
tipo de organização. A Administração compreende a supervisão, coor-

Pelo controle hierárquico a autoridade controladora acompanha, orienta,


direção
hierárquica
sua competência, dão ordens, corrigem os atos inferiores e punem os
subalternos. Vemos, pois, que as faculdades de controle hierárquico se
detêm na faixa do policiamento dos órgãos subordinados e os poderes de
planejamento e do
comando administrativos, com o inerente poder corretivo. (mEIRELLES,

nomas (autarquias e fundações em especial). Pela norma legal indica-


se a autoridade responsável, a autoridade controladora, o que deve

a posteriori. não há intervenção no processo a não ser em períodos


CAPíTULO VI
COnTROLE
279

O controle preventivo, executado previamente, é bastante restrito

passou a ser o controle a posteriori


“É o que antecede a conclusão ou operatividade do ato, como requisito

oportuno pagamento e as autorizações do Senado para que Estados e


municípios contraiam empréstimos. A Lei de Licitações abre algumas
hipóteses de controle prévio de parte dos Tribunais de Contas ao
examinarem representações ou requisitarem editais para licitação. A
rigor, as eventuais impugnações de editais não são regra geral nesses
órgãos de apoio ao controle externo parlamentar. Ainda que sejam ações
importantes para coibir a corrupção pelo clientelismo ou por propina
para agentes públicos, eles não podem suspender — de acordo com a
lei — o prosseguimento da licitação. Tem, contudo, o condão de alertar
e chamar a atenção, inclusive, pela publicidade. Em alguns Estados são
aceitas as impugnações de editais com sua revogação ou correção dos
defeitos apontados pelos Tribunais de Contas. no mais, os Tribunais
de Contas atuam a posteriori. Há esforços no sentido de tornar a ação

concomitante do controle. no âmbito dos Tribunais de Contas pode-se

regularidade de sua formação, como, p. ex., a realização de auditoria


durante a execução do orçamento; o seguimento de um concurso pela

nesses particulares, os Tribunais de Contas, em regra, realizaram

ou recomendações. As operacionais também são próprias do controle


concomitante.
Salomão RibaS JUnioR
280 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

a posteriori
Trata-se do controle que se efetiva após o ato. Pode corrigir,

meio dos Tribunais de Contas são a posteriori. Algumas exceções podem


ser anotadas em ações civis públicas e populares, em que medidas
liminares impedem ou suspendem a execução de determinados atos. É
o caso de editais e contratos em andamento. no âmbito dos Tribunais
de Contas, também em caso de graves suspeitas de malversação de
fundos públicos, são adotadas medidas cautelares. nesse caso, o
Tribunal de Contas da União, ao determinar a sustação de contrato
entre o Congresso nacional e a Companhia das Docas da Bahia, teve
a decisão questionada em mandado de Segurança perante o Supremo

Tribunal de Contas da União. Poder Geral de Cautela. Legitimidade.

possibilidade de o Tribunal de Contas expedir provimentos cautelares,


mesmo sem audiência da parte contrária, desde que mediante decisão
fundamentada. Deliberação do TCU, que, ao deferir a medida cautelar,

Preocupação da Corte de Contas em atender com tal conduta, a exigência

estatais. Procedimento Administrativo em cujo âmbito teriam sido

processo of Law”. (Brasil, Supremo Tribunal Federal, mandado de

Augusto nardes) do Tribunal de Contas da União que determinava a

Companhia das Docas do Estado da Bahia S.A. — CODEBA — Processo

Código de Processo Civil que prevê que “Só em casos excepcionais,


expressamente autorizados por lei, determinará o juiz medidas
cautelares sem a audiência das partes). (BRASIL, 2007)

na mesma linha atua, em casos excepcionais, o Tribunal de


Contas do Estado de Santa Catarina, de acordo com a Instrução

Em caso de urgência, havendo fundada ameaça de grave lesão ao


CAPíTULO VI
COnTROLE
281

decisão de mérito, mediante requerimento fundamentado do órgão de


controle, ou por iniciativa própria, o Relator, sem a prévia manifestação

competente a sustação do procedimento licitatório até manifestação


ulterior que revogue a medida , ou até a deliberação pelo
Tribunal Pleno. (SAnTA CATARInA, 2012)

O exame dos editais é previsto na própria Lei de Licitações (Lei

minar, não tenham forçosamente efeito suspensivo, elas contribuem


para o aperfeiçoamento do processo. É possível corrigir falhas e equí-
vocos e evitar direcionamento das licitações em favor de produto ou

Inquérito
O controle externo é sinônimo de controle legislativo. É a segunda
competência em importância na função legislativa. A primeira é legislar

Legislativo realiza diretamente e com o auxílio dos Tribunais de Contas.


no Brasil, o Legislativo nacional adota o sistema bicameral (Câmara
representando o povo, e Senado representando os Estados). nos Estados
e municípios funciona o sistema unicameral (Assembleias Legislativas
e Câmara de Vereadores).

são exercidos por meio: (i) dos pedidos de informação; (ii) Comissões
Parlamentares de Inquérito (CPI); e (iii) controle externo com o auxílio
dos Tribunais de Contas.
no plano federal, Câmara e Senado têm suas próprias atribui-

conjunto denomina-se Congresso nacional. no caso do impeachment, a


Câmara autoriza a abertura do processo e o Senado julga sob a presi-
dência do Presidente do Supremo Tribunal Federal.
Os órgãos colegiados se subdividem em câmaras ou comissões

trole. na Câmara e no Senado, as comissões são permanentes, tempo-


rárias ou especiais, mistas e de inquérito. Estas desempenham papel
Salomão RibaS JUnioR
282 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

que
“Comissões Parlamentares de Inquérito são organismos que desem-

e controle da administração”.
O requerimento válido para a criação de CPI deve conter três
requisitos: (i) assinatura de um terço dos membros de cada Casa; (ii)
apuração de fato determinado; e (iii) prazo certo de funcionamento.
Esses requisitos, contudo, não são tão rígidos. Fato determinado pode
se transformar em conjunto de fatos que se encadeiam. A rigor, acabam
sendo discutidos e investigados vários assuntos. Serve como exemplo
a Comissão Parlamentar mista de Inquérito (CPmI) dos Correios em
2005, que começou investigando o pagamento de propinas no âmbito
desse órgão e acabou desembocando no “mensalão”. Ou a CPmI do PC
Farias em 1992, que se destinava a investigar as atividades do tesoureiro
da campanha de Collor e acabou em ampla devassa de todo o governo.
As conclusões dessas CPIs podem apontar: (i) medidas admi-
nistrativas; (ii) medidas legislativas; e (iii) medidas judiciais por meio
de representação ao ministério Público.
As Comissões de Inquérito também podem ser mistas, com
integrantes das duas Casas Legislativas. Aí, exige-se para sua criação

Outra atividade de controle importante do Parlamento é o


julgamento da prestação de contas anual do Chefe do Poder Executivo
(Presidente da República, Governadores e Prefeitos).

é exercida mediante controle externo e pelo controle interno de cada


Poder.
A prestação de contas do uso do dinheiro público é princípio
constitucional que se traduz em regra da Constituição. A história

Antiguidade.
Em 1789, na Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão da

que “a sociedade tem o direito de pedir contas a todo agente público


pela sua administração”.
no Brasil, há mais de um século, foi instituído um órgão para
exigir e julgar as contas de todo responsável por dinheiros públicos.
É o caso do Tribunal de Contas da União, como se verá mais adiante.
CAPíTULO VI
COnTROLE
283

controle e dever de prestar contas é


expressa no art. 70 da Constituição.

e patrimonial da União e das entidades da administração direta e

das subvenções e renúncia de receitas, será exercida pelo Congresso


nacional, mediante controle externo, e pelo sistema de controle interno
de cada Poder.
Parágrafo único. Prestará contas qualquer pessoa física ou jurídica, pú-
blica ou privada, que utilize, arrecade, guarde, gerencie ou administre
dinheiros, bens e valores públicos ou pelos quais a União responda,
ou que, em nome desta, assuma obrigações de natureza pecuniária.
(BRASIL, 2012b)

nenhuma pessoa ou ente que de alguma forma utilize recursos


públicos pode eximir-se de prestar contas. As expressões do disposi-
tivo constitucional são abrangentes: utilize, arrecade, guarde, gerencie
ou administre bens e valores públicos. Isso vale, na atualidade, para
pessoas físicas ou jurídicas, públicas ou privadas. O local para receber
e apreciar essas prestações de contas é o Tribunal de Contas.

Já foi visto anteriormente que o Poder Legislativo exerce o


controle externo, mas deve fazê-lo com o auxílio e, não raro, por
intermédio do Tribunal de Contas da União, nos termos do art. 71 da
Constituição Federal, o qual prevê que “o controle externo, a cargo do
Congresso nacional, será exercido com o auxílio do Tribunal de Contas
da União, ao qual compete [...]” (BRASIL, 2012b).
Como se vê, a relação entre o Tribunal de Contas da União e o
parlamento nacional é de auxílio, nos termos da Constituição. A lei-
tura apressada de alguns dá a entender que há, na função de auxiliar,
uma relação de subordinação, o que decididamente não é o caso.

constitucional e não de ato de delegação, autorização ou pedido de


qualquer Poder ou órgão.

A presença dos Tribunais de Contas na Administração Pública


brasileira tem mais de um século. nesse século de atuação o órgão
Salomão RibaS JUnioR
284 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

passou por muitas mudanças acompanhando as havidas no Estado.


Ainda assim, a essência de suas atribuições continua a mesma:
a) agir com independência;
b) auxiliar o Poder Legislativo no Controle Externo;
c) apreciar as contas dos administradores públicos; e

públicos. A cada passo de modernização do Estado brasileiro


correspondeu o mesmo movimento nos Tribunais de Contas.

Caldeira Brandt (Visconde de Barbacena) e de José Inácio Borges, de um


projeto de lei no Senado criando um Tribunal de Contas. As discussões
duraram meio século e o Tribunal não foi criado. Com a República em
1889, o Tribunal de Contas da União (TCU) seria criado por iniciativa
do ministro da Fazenda, Rui Barbosa, em 07 de novembro de 1890. Os

de novembro de 1890, em que a assinatura do Presidente da República


permanece atual.

não basta julgar a administração, denunciar o excesso cometido, colher


a exorbitância, ou a prevaricação, para as punir, circunscrita a estes
limites, essa função tutelar dos dinheiros públicos será muitas vezes
inútil, por omissa, tardia ou impotente. Convém levantar, entre o Poder
que autoriza periodicamente a despesa e o Poder que quotidianamente
a executa, um mediador independente, auxiliar de um e de outro, que,
comunicando com o Legislativo, e intervindo na Administração, seja
não só o vigia, como a mão forte da primeira sobre a segunda, obstando
a perpetração das infrações orçamentárias, por um veto oportuno nos
atos do Executivo, que direta ou indireta, próxima ou remotamente,
, 1999,
p. 257)

A Constituição de 1891 instituiu o TCU, conferindo-lhe compe-

sua legalidade antes de serem prestadas contas ao Congresso nacio-


nal. Essas competências foram consolidadas e ampliadas nos últimos
110 anos.

Tribunal de Contas da União e acusações de excesso. Isso começou com


Floriano Peixoto (segundo Presidente da República) e prosseguiu até
o Presidente Luiz Inácio Lula da Silva (TCU, 2012).
CAPíTULO VI
COnTROLE
285

Em 1934, uma nova Constituição fez incluir entre aquelas


competências,

[...] proceder ao acompanhamento da execução orçamentária, registrar


previamente as despesas e os contratos, julgar as contas dos respon-
sáveis por bens e dinheiros públicos, assim como apresentar parecer
prévio sobre as contas do Presidente da República para posterior enca-

Em 1937, com o Estado novo de Vargas, com exceção do parecer


sobre as contas do Presidente da República, as atribuições foram

antigas atribuições e acrescentada a de julgar a legalidade das aposen-


tadorias, reformas e pensões.

prévio dos atos e dos contratos geradores de despesas, sem prejuízo da


competência para apontar faltas e irregularidades que, se não sanadas,
seriam, então, objeto de representação ao Congresso nacional.
Eliminou-se, também, o julgamento da legalidade de concessões de

nessa etapa. Como inovação, deu-se incumbência ao Tribunal para o

dades dos três poderes da União, instituindo, desde então, os sistemas de


controle externo, a cargo do Congresso nacional, com auxilio da Corte
de Contas, e de controle interno, este exercido pelo Poder Executivo e

Como visto anteriormente, o controle, em razão do local em que


é feito, pode ser interno ou externo. O Tribunal de Contas da União
— e por consequência os Tribunais de Contas estaduais e municipais
— desde o seu nascimento institucional, caracteriza-se como órgão de
controle externo. Com funções claras de auxiliar o Poder Legislativo,
têm competências próprias que derivam da Constituição Federal, art. 71.
Os doutrinadores não hesitam e reconhecem ao Tribunal de
Contas da União essa característica:

O titular do controle externo é o Congresso nacional (Cn), mas isso

compe
da Constituição Federal (CF). não há que se falar, portanto, em
Salomão RibaS JUnioR
CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

subordinação do TCU ao Cn, pois suas competências descendem


diretamente do Poder Constituinte Originário, fazendo com que a Corte
somente seja subordinada a este Poder. Em suma, o TCU apenas auxilia
o Congresso nacional, que é o titular do controle, sem que haja qualquer
subordinação ou vínculo de hierarquia. (AGUIAR; ALBUQUERQUE;
mEDEIROS, 2011, p. 198)

De outro lado, quanto ao momento em que o controle deve ser


exercido, como já citado, pode ser prévio, concomitante e sucessivo
(a posteriori). O TCU teve um período de controle prévio. Os atos de
execução dos orçamentos públicos eram previamente submetidos ao

mudança profunda. A atuação do TCU passou a ser como regra “a


posteriori” e como exceção apriorística ou concomitante. Era uma ten-
dência em curso em outros países. Ainda assim, em alguns deles, os

previamente pelos órgãos de controle externo.


A Constituição de 1988, além de consagrar essa forma e forta-
lecer as demais competências, acrescentou o exame dos princípios

O TCU, em auxílio ao Congresso nacional, deve exercer

patrimonial da União e das entidades da administração direta e indi-

das subvenções e renúncia de receitas, será exercida pelo Congresso


nacional, mediante controle externo, e pelo sistema de controle interno
de cada Poder. (art. 70, Constituição Federal)

micidade dos atos praticados pelo administrador. É por essa ótica que
se combate o desperdício e má gestão.

Há alguns anos, a questão da transparência e da accountability


na Administração Pública tem crescido de importância. O Brasil tem
procurado acompanhar essa tendência. Para tanto, tem reforçado a
CAPíTULO VI
COnTROLE
287

publicidade dos atos administrativos em geral. É princípio constitu-


cional o da publicidade, entre outros, a ser seguido obrigatoriamente
pela Administração Pública direta e indireta, de qualquer dos entes
de governo em qualquer nível (União, Estados, Distrito Federal e
município).

— além da publicidade como anteriormente citado (art. 37, caput,


Constituição Federal).

de prestar contas. Essa expressão, diga-se de passagem, assemelha-se a


uma parte do conteúdo da expressão anglo-saxônica accountability. Para
ela, contudo, não há tradução precisa em português, mas o dever de
prestar contas ajuda a compreender o seu sentido e alcance. A regra é
constitucional, como visto, e está inserida no parágrafo único do art. 70.

Art. 70. [...]


Parágrafo único. Prestará contas qualquer pessoa física ou jurídica,
pública ou privada, que utilize, arrecade, guarde, gerencie ou administre
dinheiros, bens e valores públicos ou pelos quais a União responda,
ou que, em nome desta, assuma obrigações de natureza pecuniária.
(BRASIL, 2012b)

As decisões dos Tribunais de Contas podem determinar a devo-


lução de valores aplicados indevidamente, o recolhimento de multa
proporcional ao dano causado ao erário ou o pagamento de multas por

Deixar de prestar contas é irregularidade gravíssima e sujeita

também impedem os inadimplentes de receber novos recursos públicos.


O endereço para essa prestação de contas é o Tribunal de Contas,
sem prejuízo das competências dos órgãos de controle interno. no
caso da União, a Controladoria Geral da União (CGU) e nos Estados e
municípios, órgãos com competências assemelhadas.

As competências constitucionais do Tribunal de Contas da


União que derivam da Constituição Federal podem ser anali sa-

doras; (iii) assessoras


ou corretivas; (iv) jurisdicionais ou decisórias; e (v) administrativas.
Salomão RibaS JUnioR
288 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

e informa. Funções, não é demais repetir, que se estenderam a todos os


Tribunais de Contas nas suas respectivas jurisdições.
Vejam-se as funções no corpo da Constituição:

Art. 71. O controle externo, a cargo do Congresso nacional, será exercido


com o auxílio do Tribunal de Contas da União, ao qual compete:
função consultiva ou opinativa
I - apreciar as contas prestadas anualmente pelo Presidente da República,
mediante parecer prévio, que deverá ser elaborado em sessenta dias a
contar de seu recebimento;
função decisória
II - julgar as contas dos administradores e demais responsáveis por
dinheiros, bens e valores públicos da administração direta e indireta,
incluídas as fundações e sociedades instituídas e mantidas pelo poder
público federal, e as contas daqueles que derem causa a perda, extravio
ou outra irregularidade de que resulte prejuízo ao erário público;

pessoal, a qualquer título, na administração direta e indireta, incluídas


as fundações instituídas e mantidas pelo poder público, excetuadas as
nomeações para cargo de provimento em comissão, bem como a das con-
cessões de aposentadorias, reformas e pensões, ressalvadas as melhorias
posteriores que não alterem o fundamento legal do ato concessório;

IV - realizar, por iniciativa própria, da Câmara dos Deputados, do


Senado Federal, de comissão técnica ou de inquérito, inspeções e

e patrimonial, nas unidades administrativas dos Poderes Legislativo,


Executivo e Judiciário, e demais entidades referidas no inciso II;

capital social a União participe, de forma direta ou indireta, nos termos


do tratado constitutivo;

mediante convênio, acordo, ajuste ou outros instrumentos congêneres,


a Estado, ao Distrito Federal ou a município;
função informativa
VII - prestar as informações solicitadas pelo Congresso nacional, por
qualquer de suas Casas, ou por qualquer das respectivas comissões,

patrimonial e sobre resultados de auditorias e inspeções realizadas;


função decisória
VIII - aplicar aos responsáveis, em caso de ilegalidade de despesa ou
irregularidade de contas, as sanções previstas em lei, que estabelecerá,
entre outras cominações, multa proporcional ao dano causado ao erário;
CAPíTULO VI
COnTROLE
289

Ix - assinar prazo para que o órgão ou entidade adote as providências

x - sustar, se não atendido, a execução do ato impugnado, comunicando

função corretiva
xI - representar ao Poder competente sobre irregularidades ou abusos
apurados.

Congresso nacional, que solicitará, de imediato, ao Poder Executivo,


as medidas cabíveis.

dias, não efetivar as medidas previstas no parágrafo anterior, o Tribunal


decidirá a respeito.

Estados (TCEs) e Tribunais de Contas dos municípios (TCms), basta a


leitura do art. 75 da Constituição Federal:

Art. 75. As normas estabelecidas nesta seção aplicam-se, no que couber,

Estados e do Distrito Federal, bem como dos Tribunais e Conselhos de


Contas dos municípios.
Parágrafo único. As Constituições estaduais disporão sobre os Tribunais
de Contas respectivos, que serão integrados por sete Conselheiros.
(BRASIL, 2012b)

Considerando-se a divisão clássica dos Poderes do Estado, há


sempre discussão sobre em que esfera de Poder situa-se o Tribunal de
Contas da União (TCU). A assertiva de Rui Barbosa parece um pouco
esquecida com a passagem do tempo. É a fonte mais autêntica da
motivação, da natureza e da função independente imaginada na sua
criação. Isso não impede que a doutrina construa outras interpretações
ou que a jurisprudência disponha de outra maneira. O que interessa é

controle.

Há sempre uma discussão a respeito da posição do Tribunal de Contas


no organograma do poder estatal. Pessoalmente, conforme já expus ao
Salomão RibaS JUnioR
290 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

discorrer sobre a separação dos poderes, harmonia e autonomia, penso

e, no exercício de suas competências constitucionais, subordina-se

a expressão “com o auxílio do Tribunal de Contas”, longe de subordiná-lo

Assim, a posição jurídica mais adequada para o Tribunal de Con-


tas é a sua previsão constitucional, independência no exercício de suas

A primeira providência necessária para se entender os Tribunais


de Contas brasileiros, em um contexto mundial, é dar uma olhada na
gama variada de denominações para os órgãos técnicos de controle
externo.

denominações têm-se:
a) Tribunal de Contas (Brasil, Argentina, Portugal, Uruguai,
Espanha, e Alemanha);
b) Corte de Contas (França);
c) National Audit (Inglaterra, e Canadá);
d) (EUA.);
e) Sindicatura (Espanha); e
f) Controladorias (Chile e a maioria dos demais países sul-
americanos).
A doutrina e a organização mundial de representação dos ór-
gãos de controle (InTOSAI) adotam duas formas de denominação:
(i) Entidades de Fiscalização Superior (EFS); e (ii) Órgão de Controle
Externo (OCEx). É o mais adequado diante da multiplicidade de deno-
minações. Assim, estão no mesmo patamar do Tribunal de Contas da
União (TCU), do Brasil, os órgãos que:

b) sejam autônomos no exercício de suas funções;


c) exerçam funções decisórias no julgamento de contas dos
administradores;
d) exerçam funções informativas; e
e) promovam a correção d
CAPíTULO VI
COnTROLE
291

As funções ou competências não são exatamente as mesmas de


um país para outro. Há casos em que a OCEx é apenas de auditoria
informativa ao parlamento. Em outros, atua concretamente na apli-
cação de sanções, multas e responsabilizações. Outro aspecto de

nidade internacional de OCEx. Direta ou indiretamente são membros

o caso das normativas da “Declaração de Lima”, do Código de Ética,


das normas de Auditoria e outros documentos técnicos da mesma
organização internacional.

A InTOSAI, que procurou estabelecer standards de auditoria


desde sua fundação, na década de 1950 (Havana), reuniu-se na Ix
InCOSAI em outubro de 1977, em Lima (Peru). nessa reunião, com
maciça presença dos seus membros, construiu-se a “Declaração de Lima
sobre Diretrizes para Preceitos de Auditoria”.

ser adotados globalmente.


O seu principal objetivo, a exigência de uma auditoria gover-
namental independente, tem avançado. Os ventos democráticos que
varreram todos os continentes trazem consigo modelos de auditorias
independentes. Pouco importa a denominação da entidade. O que vale
é a sua natureza e as características de sua atuação.
Assim, a Declaração de Lima considera:

um dos pré-requisitos essenciais para a gestão adequada das

das autoridades responsáveis;


b) que cada país deve ter uma EFS, cuja independência seja
garantida pela legislação;
c) que essas EFS tornam-se mais necessárias quando o Estado
amplia suas atividades; e
d) outros aspectos relevantes da necessidade de auditorias inde-
Salomão RibaS JUnioR
292 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

xa:

I. Geral
Seção 1. Propósito da auditoria

ceira pública, já que a gestão de recursos públicos envolve um voto de

pensável de um sistema regulatório cujo objetivo é revelar desvios das

medidas corretivas possam ter tomadas em casos individuais, para fazer


com que os responsáveis por esses desvios assumam a responsabilidade
por eles, para obter o devido ressarcimento ou para tomar medidas

[...]
Seção 3. Auditoria interna e auditoria externa
1. Os serviços de auditoria interna são estabelecidos dentro dos órgãos e
instituições governamentais, enquanto os serviços de auditoria externa
não fazem parte da estrutura organizacional das instituições a serem
auditadas. As Entidades Fiscalizadoras Superiores prestam serviços de
auditoria externa.
2. Os serviços de auditoria interna são necessariamente subordinados
ao chefe do departamento no qual foram estabelecidos. no entanto,
eles são, na maior medida possível, funcional e organizacionalmente
independentes no âmbito de sua respectiva estrutura constitucional.
3. Como uma instituição de auditoria externa, a Entidade Fiscalizadora

sem prejuízo do direito da Entidade Fiscalizadora Superior de levar


a cabo uma auditoria geral, no sentido de garantir a mais adequada
divisão ou designação de tarefas e cooperação entre a Entidade Fisca-
lizadora Superior e a auditoria interna.
Seção 4. Auditoria de legalidade, auditoria de regularidade e auditoria
operacional
1. A tarefa tradicional de Entidades Fiscalizadoras Superiores é auditar

2. Além desse tipo de auditoria, cuja importância se mantém, há um


outro tipo de auditoria igualmente importante — a auditoria ope-

atividades governamentais, inclusive seus sistemas organizacionais e


administrativos.
3. Os objetivos de auditoria de uma Entidade Fiscalizadora Superior

CAPíTULO VI
COnTROLE
293

— têm basicamente a mesma importância. no entanto, cabe


a cada Entidade Fiscalizadora Superior determinar suas prioridades,
caso a caso. (InTOSAI, 1977)

Os capítulos seguintes enfatizam a independência. Esta deve ser


da EFS e cada dos seus membros. Esses entendidos como as pessoas
que precisam tomar pela Entidade Fiscalizadora Superior.

nas relações com o Parlamento e a Administração Pública. Recomenda-


se um “grau muito elevado de iniciativa e autonomia para elas (as EFS),
mesmo quando estiverem atuando como um agente de Parlamento e
estiverem fazendo auditorias seguindo suas instruções” (InTOSAI,
1977).
A Declaração faz, ainda, recomendações sobre a execução de
achados de autoria e pereceres especializados.
Apesar de terem sido emitidos há mais de 30 anos, são atuais os
métodos e procedimentos de auditoria que preconiza. não são menos
atuais o que diz sobre o pessoal de auditoria e as técnicas de trabalho
de auditoria e de elaboração de relatórios.
Ainda sobre a construção de normas de auditoria governamental
devem-se considerar duas iniciativas importantes. A que criou as nor-
mas desse gênero no TCU e as nAGs, construídas pelos TCEs no âmbito
do IRB e ATRICOn. Elas aproximam os Tribunais de Contas brasileiros
dos melhores padrões internacionais de controle.

públicas é o ministério Público de Contas.


Com as características de “custus legis” é órgão que deve atuar

reza desse ministério Público Especial, está contida no art. 130 da


Constituição Federal, a qual prevê que “aos membros do ministério
Público junto aos Tribunais de Contas aplicam-se as disposições desta
seção pertinentes a direitos, vedações e forma de investidura” (BRASIL,
2012b).
A seção constante do capítulo IV que trata das “Funções Essências

que se pode chamar de institucional para evitar confusões — da seguinte


Salomão RibaS JUnioR
294 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

forma: “O ministério Público é i


função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem
jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais
indisponíveis” (BRASIL, 2012b).
Dessa nobre e ampla competência constitucional é que se extraem

De outro lado, sucessivas decisões judiciais têm assegurado que


o ministério Público de Contas, ou, junto aos Tribunais de Contas, ou,
Especial não se confunde com o ministério Público institucional. As
garantias e vedações é que se estendem, não há subordinação como se
pretendia no passado.
Entre essas decisões destaca-se o Acórdão do Pleno do STF na

a) o mPC está na intimidade estrutural dos Tribunais de Contas; e


b) a cláusula da garantia inscrita no art. 130 da Constituição
— que não outorgou ao ministério Público especial as mes-
mas prerrogativas e atributos de autonomia, conferidos ao
ministério Público comum — não se reveste de conteúdo
orgânico-institucional. Acha-se vocacionada, no âmbito de
sua destinação tutelar, a proteger, unicamente, os membros
do ministério Público especial, no relevante desempenho de
suas funções perante os Tribunais de Contas.
A Lei Orgânica do Tribunal de Contas da União assim dispõe
sobre o ministério Público de Contas:

Capítulo VI
ministério Público Junto ao Tribunal
Art. 80. O ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União,
ao qual se aplicam os princípios institucionais da unidade, da
indivisibilidade e da independência funcional, compõe-se de um
procurador-geral, três subprocuradores-gerais e quatro procuradores,
nomeados pelo Presidente da República, dentre brasileiros, bacharéis
em direito.

é constituída pelos cargos de subprocurador-geral e procurador, este


inicial e aquele representando o último nível da carreira, não excedendo
a dez por cento a diferença de vencimentos de uma classe para outra,
respeitada igual diferença entre os cargos de subprocurador-geral e
procurador-geral.
CAPíTULO VI
COnTROLE
295

concurso público de provas e títulos, assegurada a participação da


Ordem dos Advogados do Brasil em sua realização e observada, nas

merecimento.
Art. 81. Competem ao procurador-geral junto ao Tribunal de Contas da

de outras estabelecidas no Regimento Interno, as seguintes atribuições:


I - promover a defesa da ordem jurídica, requerendo, perante o Tribunal
de Contas da União as medidas de interesse da justiça, da administração
e do Erário;

obrigatória sua audiência nos processos de tomada ou prestação de


contas e nos concernentes aos atos de admissão de pessoal e de concessão
de aposentadorias, reformas e pensões;

perante os dirigentes das entidades jurisdicionadas do Tribunal de

desta Lei, remetendo-lhes a documentação e instruções necessárias;


IV - interpor os recursos permitidos em lei.
Art. 82. Aos subprocuradores-gerais e procuradores compete, por
delegação do procurador-geral, exercer as funções previstas no artigo
anterior.
Parágrafo único. Em caso de vacância e em suas ausências e impedi-
mentos por motivo de licença, férias ou outro afastamento legal, o
procurador-geral será substituído pelos subprocuradores-gerais e, na
ausência destes, pelos procuradores, observada, em ambos os casos, a

cargo exercido.
Art. 83. O ministério Público contará com o apoio administrativo e de
pessoal da secretaria do Tribunal, conforme organização estabelecida
no Regimento Interno.
Art. 84. Aos membros do ministério Público junto ao Tribunal de Contas
da União aplicam-se, subsidiariamente, no que couber, as disposições
da Lei orgânica do ministério Público da União, pertinentes a direitos,
garantias, prerrogativas, vedações, regime disciplinar e forma de
investidura no cargo inicial da carreira. (BRASIL, 2012m)

Discute-se no âmbito doutrinário, corporativo e judicial a questão


da autonomia ampla do mPC. Entre os Estados, a simetria com o TCU
Salomão RibaS JUnioR
CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

estrutura, orçamento e autonomia administrativa e são convergentes

Contas.

recomendação ou determinação. no primeiro caso, autoridades sujeitas

orientar-se por sua resposta na interpretação da lei. Confunde-se com


a consulta a opinião que o TCU emite sobre as contas prestadas pelo
Presidente da República. As recomendações podem constar de decisões
sobre casos concretos, no sentido de que não repitam irregularidades
constatadas. As auditorias de caráter operacional também contam com

dos atos praticados em um determinado programa.


Da mesma forma, essas decisões podem conter determinações
expressas de conduta, procedimento ou correção de ato ou conjuntos
de atos.
Ao decidir, o TCU tanto pode julgar as contas como ordenar o
registro de atos de admissão ou de aposentadoria no serviço público.

revisão de registros, demonstrações e procedimentos adotados para a


escrituração, visando avaliar a adequação e veracidade das situações
memorizadas e expostas. A auditoria é uma avaliação, por revisão,

suma, busca “conhecer” pelos registros, documentos, controles, como


sucederam feitos que produziram peças contábeis, através de registros,
embrenhando-se por investigações amplas, quanto o objetivo é descobrir

suprir omissões e lacunas de informações, esclarecer dúvidas ou apurar

e de atos administrativos praticados por qualquer responsável sujeito


CAPíTULO VI
COnTROLE
297

Espécies de auditoria:
a) auditoria contábil

Auditoria relativa ao plano da organização, dos procedimentos e docu-

fornecer uma garantia razoável de que: 1) as operações e o acesso aos


ativos se efetuem em conformidade com as autorizações; 2) as operações
sejam registradas quando necessário; 3) a contabilização dos ativos seja
comparada com a existência física a intervalos razoáveis e eu sejam
tomadas as medidas adequadas relativamente a todas as diferenças não

dade das operações, realizadas por um auditor, com vista a emitir ou


não um parecer. Esta auditoria inclui: 1) análise das contas e da situação

as operações foram corretamente autorizadas, liquidadas, ordenadas,


pagas e registradas; b) foram tomadas medidas apropriadas com vistas
a registrar com exatidão e a proteger todos os ativos, por exemplo:
tesouraria, investimento, inventário dos valores imobiliários, existências.

as operações registradas estão em conformidade com a legalidade geral e

período autorizados; c) todos os diretos e obrigações são apurados e

c) auditoria operacional

diversos órgãos e funções de uma empresa. Tal auditoria testa “como

tal revisão ser feita em conjunto com as demais, no caso de auditoria

Alguns órgãos adotam o nome da auditoria de acordo com o seu


objeto. É o caso das auditorias ambientais ou de gestão. Cogita-se da
hipótese de uma auditoria integral. Também está presente a ideia de
uma auditoria coordenada envolvendo mais de um OCEx.
Salomão RibaS JUnioR
298 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

le
As leis básicas da Administração Pública são leis nacionais,

legislar apenas sobre normas gerais, abrindo um imenso espaço para


a competência concorrente dos Estados e municípios (no caso dos
interesses locais). O fato é que a lei federal é de tal forma minudente
e detalhista que o espaço que existe sob o aspecto formal acaba não
sendo usado. Assim, há quatro décadas, a receita e a despesa obedecem

do Tesouro nacional do ministério da Fazenda. Igualmente têm-se as

e contratações da União, Estado, Distrito Federal e municípios. Os


princípios que regem a questão do pessoal no serviço público também

O nascimento da Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Comple-

cenário. Suas regras para o planejamento e a transparência destinam-


se a condicionar a Administração Pública de qualquer nível ou esfera
de governo. Elas são bastante abrangentes para regular praticamente
todos os setores da Administração (pessoal, aquisições, dívidas etc.) e
todo o ciclo dos orçamentos públicos. nenhuma fase da receita ou da

das contas públicas, mas os meios, prazos, condições e limites que

desperdício. A transparência nas contas públicas é a medida adotada

é que permite a operação a tempo dos órgãos de controle e controle


social. Esse último depende de informações contemporâneas e claras
para agir em favor do interesse coletivo.
no corpo dessas leis encontram-se os seus objetivos que decorrem
dos princípios constitucionais que regem os atos do administrador
público (Constituição Federal, art. 37). O que se espera do sistema

conteúdo dessas leis.


CAPíTULO VI
COnTROLE
299

sistema de controle
Há quem use a denominação “sistema de controle externo”
para o conjunto dos órgãos de auxílio aos Poderes Legislativos. Esses
órgãos são os 34 Tribunais de Contas que existem no Brasil. De fato, há
semelhanças e mesmo algumas identidades entre eles. Contudo, isso

O Dicionário Aurélio traz a palavra sistema como sendo “[...] conjunto


de elementos, materiais ou ideais, entre os quais se possa encontrar ou

Sob esse primeiro prisma tem-se algumas relações entre os Tri-


bunais de Contas. Todos são criados por dispositivo constitucional,
todos têm competências derivadas da Constituição que os cria, todos
obedecem, guardadas as devidas proporções, ao disposto no art. 71 da

um pouco mais adiante (art. 75, caput, da Constituição Federal) têm-se

bem como dos Tribunais e Conselhos de Contas dos municípios”


(BRASIL, 2012b). Outro comando constitucional que assegura certa
uniformidade entre os Tribunais de Contas é o que determina que as
Constituições dos Estados “disporão” sobre os mesmos. Ainda há outro

e dos municípios serão integrados por sete conselheiros. não mais,


nem menos.

Art. 75. As normas estabelecidas nesta seção aplicam-se, no que couber,

Estados e do Distrito Federal, bem como dos Tribunais e Conselhos de


Contas dos municípios.
Parágrafo único. As Constituições estaduais disporão sobre os Tribunais
de Contas respectivos, que serão integrados por sete Conselheiros.
(BRASIL, 2012b)

Outra ideia de sistema é a presença de coordenação e organização


entre si dos seus componentes. nesta linha, o dicionário Aurélio traz,
ainda, a palavra sistema, como sendo “disposição das partes ou dos
Salomão RibaS JUnioR
300 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

elementos de um todo, coordenados entre si e que funcionam como

Pode-se, ainda, considerar o “conjunto de instituições políticas


ou sociais e dos métodos por elas adotados, encarados quer do ponto
de vista teórico, quer do ponto de vista prático” (FERREIRA, 1999,

ensino ou um sistema bancário.


Finalmente, o conjunto de atividades de um determinado setor.
Olhando os TCs por esse conceito, eles integram um sistema, ainda
que cheio de assimetrias e disparidades. O que é frágil para se ter
concretamente um sistema é a organização e a uniformidade de pro-
cedimentos. Ainda assim, há semelhanças estruturais e de processo

sistema judiciário, para dar um exemplo, não há entre os TCs nenhuma


hierarquia ou dependência sistemática.

De fato, ainda que haja obrigação constitucional ou legal nesse sen-

de processo e do resultado esperado. O pré-citado parágrafo único do


art. 75 impõe essa interpretação.

no plano dos orçamentos públicos (receita e despesa), o controle


é típico, próprio e histórico no âmbito dos Tribunais de Contas. não por

criação do TCU, Rui Barbosa assevera que se espera do controle técnico


exercido pelo Tribunal de Contas que se evite que o orçamento seja

O primeiro dos requisitos para a estabilidade de qualquer forma de


governo constitucional consiste em que o orçamento deixe de ser uma
simples combinação formal, como mais ou menos tem sido, sempre,
entre nós, e revista o caráter de uma realidade segura, solene, inacessível
a transgressões impunes. ( , 1999, p. 255)

Para efeitos de realidade na apresentação das contas nacionais é


necessário que a elaboração dos balanços e sua análise levem em conta
a interpretação dos orçamentos públicos. A leitura da ementa dessa lei
permite ver o sentido e o alcance da norma: “Estatui normas Gerais
de Direito Financeiro para elaboração e controle dos orçamentos e
CAPíTULO VI
COnTROLE
301

balanços da União, dos Estados, dos municípios e do Distrito Federal”


(BRASIL, 2012e).

técnicas utilizadas em dois sistemas de informações para o controle: o


orçamento e a contabilidade (mACHADO JR., 2002, p. 11).

alterações. Há sempre no Congresso nacional um ou mais projetos com


o objetivo de disciplinar o assunto e revogá-la. Um deles é o substitu-
tivo global denominado Lei de Qualidade Orçamentária que tramita
no Senado Federal. As linhas gerais em verdade continuam as mesmas.

de consertar as distorções administrativas e remover os empecilhos

administrativos no Brasil. A contabilidade, modernamente, é um pro-


cesso gerador de informações sobre o que a Administração realizou,

as duas técnicas: enquanto a contabilidade possibilita informação para


tomada de decisões, controle e avaliação de desempenho, o orçamento
deverá assegurar informações sobre políticas e programas para

física para a mensuração das ações governamentais. (mACHADO JR.,


2002, p. 11)

Há mudanças na contabilidade pública em andamento. São


estudos do Conselho Federal de Contabilidade, Secretaria do Tesouro
nacional e Tribunais de Contas. A ideia central é uma contabilidade
predominantemente patrimonial.

no caso da licitação e do controle da execução dos contratos


públicos, as regras são comuns para as auditorias, inspeções e demais
atos dos TCs. A regra geral ampla e minuciosa leva a isso. Igualmente,
têm-se normas para toda a Administração Pública (Constituição Federal,

administrativos pertinentes a obras, serviços, inclusive de publicidade,


compras, alienações e locações no âmbito dos Poderes da União, dos
Estados, do Distrito Federal e dos municípios. (BRASIL, 2012d)
Salomão RibaS JUnioR
302 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

de Tribunais de Contas. As regras constitucionais e legais direcionam


soluções sistemáticas. O mesmo não se pode dizer das práticas de
controle e das decisões adotadas pelos TCs nos casos concretos. O
TCU é, por suas decisões, um paradigma, mas apenas para estudos
comparados. não há hipótese de decisões ou súmulas vinculantes para
os demais TCs. É essa uma questão que vem sendo discutida pelos TCs
nos últimos anos.

surgiu por iniciativa governamental com a pretensão de estabelecer

outras medidas. Assegura que essas normas são instituídas com amparo
no capítulo II do Título II da Constituição. Um campo vasto, sem dúvida.

e transparência. O primeiro é voltado para o equilíbrio das contas


públicas e o segundo indispensável para o controle público e social.
Sem planejamento não há como estabelecer adequado e equilibrado
funcionamento da máquina burocrática estatal. Sem transparência não

Para atingir esses objetivos, a Lei de Responsabilidade Fiscal


(LRF) estabelece meios, modos, metas, limites e condições. Há ênfase
para o controle da receita e despesa, bem como o acompanhamento de
sua evolução por parte do TCs.

Capítulo II do Título VI da Constituição.

transparente, em que se previnem riscos e corrigem desvios capazes


de afetar o equilíbrio das contas públicas, mediante o cumprimento de
metas de resultados entre receitas e despesas e a obediência a limites e
condições no que tange a renúncia de receita, geração de despesas com
pessoal, da seguridade social e outras, dívidas consolidada e mobiliária,
operações de crédito, inclusive por antecipação de receita, concessão de
garantia e inscrição em Restos a Pagar.

o Distrito Federal e os municípios. [...] (BRASIL, 2012j)


CAPíTULO VI
COnTROLE
303

Como se nota, também existe aí uma nota explícita para uma


norma de ampla abrangência. De outra parte, reforçando a ideia do
sistema, tem-se a regra de conceituação de referências. Por aí se vê que
sempre que a LRF refere-se a Tribunal de Contas, estará tratando do
Tribunal de Contas da União, Tribunal de Contas dos Estados e Tribunal

minados conteúdos da lei de diretrizes orçamentárias e do orçamento

adentrando, por assim dizer, competência do instrumento legal que

do Texto Constitucional [...]


mesmo assim, a existência da LRF não exclui, de modo algum, a neces-

debate no Parlamento Federal, enfocará os aspectos mais corriqueiros da


orçamentação e registro das receitas e despesas governamentais. É o caso
da forma de apresentação e discussão legislativa dos três instrumentos
que integram o processo orçamentário nacional: o plano plurianual,
a lei de diretrizes orçamentárias e o orçamento anual; da abertura
de créditos adicionais; do regime de contabilização orçamentária; da

demonstrativos contábeis, entre tantos outros aspectos da administração

A ideia de sistema de contas impõe medidas de cooperação,


de integração e de caráter legislativo. nesse último caso de uma Lei
nacional de Processo de Contas. Os Tribunais de Contas, através
de comissão na qual participou o TCU, construíram um anteprojeto
de lei processual. Foi encaminhado ao TCU que decidiu pelo seu
arquivamento. no âmbito da ATRICOn e IRB estuda-se um manual
de Boas Práticas Processuais.

O Programa de modernização dos Órgãos de Controle Externo


(PROmOEx) é uma notável tentativa de estabelecer um sistema de
controle externo ou um sistema de Tribunais de Contas. Sua história
Salomão RibaS JUnioR
304 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

curso de uma discussão entre os Tribunais de Contas e um grupo de


técnicas do ministério de Planejamento, Orçamento e Gestão (mPOG),
a respeito da Lei de Responsabilidade Fiscal.

Quando correu a notícia do envio do projeto de lei complemen-

começou a ser tratada entre os Tribunais de Contas. Havia preocupações


corporativas pelos efeitos dos pretendidos limites de gastos na operação
dos próprios Tribunais de Contas. Anuncia-se contenção rígida nas
despesas correntes e de manutenção com o privilegiamento de inves-
timentos. nesse aspecto, houve controle rigoroso nas despesas de
pessoal. Eram medidas mais rígidas do que as já existentes (Lei Rita

dizer: sempre gastarão mais com pessoal do que com obras ou equi-
pamentos. O principal investimento dos TCs é em recursos humanos.
Em uma reunião do Instituto Rui Barbosa (IRB) em São Paulo
foram discutidos vários aspectos do projeto de lei em tramitação.
Participaram dessa reunião os dirigentes da Associação dos membros
dos Tribunais de Contas do Brasil (ATRICOn) e da Associação Brasileira
dos Tribunais de Contas dos municípios (ABRACOm). Havia, inclusive,
algumas minutas de emendas ao projeto, especialmente as preparadas
pelo Tribunal de Contas de Santa Catarina. Quando foi lembrado que

que os TCs estaduais e municipais estavam fora dessa lista. Como a


Câmara Federal havia criado uma Comissão Especial para examinar
o projeto da LRF, decidiu-se por um contato com essa Comissão, se
possível participando de uma das audiências públicas em andamento.
O Presidente da Comissão era o Deputado Hauly (PR) e o Relator
o Deputado Pedro novaes (mA). O Presidente do IRB, Conselheiro
João Feder (PR), manteve os contatos e foi marcada a audiência. Em

falaria em nome dos Tribunais de Contas. na reunião acabaram falando


outros ilustres Conselheiros. As minutas de emendas foram entregues
ao Relator.
nesse momento começaram os contatos entre a Diretoria do
IRB e um grupo de técnicos do mPOG, que havia elaborado o projeto
governamental e faziam lobby — defendendo, ouvindo e esclarecendo
aspectos das novas normas. Em verdade, houve a exceção de uma
CAPíTULO VI
COnTROLE
305

pequena emenda corretiva do interesse dos TCs, as demais foram


recusadas. O Relator fez o que o governo queria. Perdeu-se uma boa
oportunidade de corrigir alguns defeitos.
De qualquer maneira, construiu-se a LRF com grande aprovação
popular. O espírito da lei é muito claro: a) não gastar mais do que
arrecadar; b) não fazer nada escondido; e c) pegar emprestado somente
o que pode pagar. São princípios de conduta de qualquer boa dona de
casa ou bom chefe de família. A outra lei aprovada alguns meses depois

A aproximação com o mPOG, especialmente por meio do IRB


e mais tarde da ATRICOn e ABRACOm, permitiu o aprofundamento
da discussão. O Governo Federal imaginou algumas fórmulas ine-

imaginou era a captura de dados e informações para um adequado


ajuste de contas públicas pelo ministério da Fazenda (STn). Em pouco
tempo evidenciou-se que os Tribunais de Contas é que dispunham
de capilaridades (no conjunto, apreciam as contas de todos os entes:
União, Estados, Distrito Federal e municípios) e de competência jurí-
dica para requerer os dados ou ir buscá-los (auditorias, inspeções ou
levantamentos in loco). Uma política de cooperação começou a se instalar
com sucessivas reuniões no Rio de Janeiro (sede do BnDS), São Paulo
(sede do TCE) e Brasília (mPOG).
Aqueles estudos mostraram que a União necessitava de um
mecanismo de acompanhamento com a máxima capilaridade e não
poderiam ser os Correios ou a Caixa Econômica, entidades com outras
vocações. Sabia-se que, além dos atos de controle ao nível federal, havia
atos múltiplos de todos os órgãos, de todos os entes da Federação:
União, Estados, Distrito Federal e municípios. E esses somente podem
ser acompanhados com tempo e com rigor técnico pelos Tribunais de
Contas. O caminho do ajuste das contas públicas teria de passar pelo
adequado funcionamento dos Tribunais de Contas. Era preciso saber,
então, se esses estavam preparados tecnicamente para a imensa tarefa.

indispensável para a cooperação. Foi contratada a Fundação Instituto


de Administração da Universidade de São Paulo (FIA-USP) para um
diagnóstico dos Tribunais de Contas. Essa ampla pesquisa, junto ao
público interno dos órgãos em avaliação, mostrou aspectos positivos
e negativos dos TCs. Serviu de base, também, para as negociações

Convencionou-se chamar o conjunto de ações de Programa para a


Salomão RibaS JUnioR
CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

modernização do Controle Externo (PROmOEx). Aprovada a carta-


consulta junto ao BID, as negociações tomaram impulso em 2003
quando, em reunião realizada em São Paulo, decidiu-se pelo aumento
numérico e formalização de um Grupo Técnico (GT) representativo dos
Tribunais de Contas para atuar com o IRB, ATRICOn e ABRACOn,
junto ao Governo Federal e o BID.

locais a serem buscadas foram alcançadas pela mudança de Governo.


Encerrou-se o mandato do Sr. Fernando Henrique Cardoso e começou
o Governo do Sr. Luiz Ignácio Lula da Silva. Isso implicou em uma
rediscussão de todo o programa. Finalmente houve acordo com a nova
equipe federal (mPOG) para a realização de uma segunda pesquisa.
A primeira tinha sido com o público interno, a segunda deveria ser
direcionada para o grupo externo (Poderes Legislativo, Judiciário e
Executivo, ministério Público, órgãos da sociedade civil organizada
etc.). A pesquisa destinava-se a colher dados, opiniões e informações que

Contas Estaduais, Distrital e municipais. Foi contratada pelo Governo


Federal a Fundação Getúlio Vargas. novas e importantes informações

pesquisa anterior (FIA-USP). Criou-se, então, o Grupo Deliberativo do


PROmOEx (GD), permitindo a participação mais direta de membros
dos Tribunais. Finalmente, mPOG, BID, IRB, ATRICOn e ABRACOn
chegaram a um Programa que:

intergovernamentais e interinstitucionais e fortalecer o sistema de


controle externo como instrumento de cidadania e transparente e
regular gestão dos recursos públicos com vistas ao cumprimento de

no mesmo documento, que executaria atividades agrupadas em dois


componentes: um nacional e outro local. Esses componentes se sub-
dividiriam em vários subcomponentes. Os primeiros subcomponentes
nacionais foram: (i) desenvolvimento de vínculos interinstitucionais

Fiscal; e (iii) desenvolvimento de políticas de gestão de soluções com-


partilhadas e de cooperação técnica. Já no plano local, os componentes
CAPíTULO VI
COnTROLE
307

se dividiriam em tantos quantos fossem necessários para promover a


mesma integração e melhoria de qualidade referida no plano nacional.
Uma última consulta ao glossário do IRB mostra que:

O PROmOEx está dividido em duas etapas de três anos cada. A pri-

milhões do Governo Federal e US$21,9 milhões dos Tribunais de Contas.

Ao tempo em que ia sendo executado, o programa foi dando


ênfase a um ou outro aspecto e agregando outros estudos e outras metas

uso da tecnologia da informação, realização de auditorias operacionais

construção de novas normas de auditoria governamental.


O fator mais importante foi o estabelecimento de um fórum
técnico importante com a troca permanente de consultas e informações
entre os Tribunais de Contas. E, igualmente, o diálogo com órgãos

Há, ainda, muito a fazer nesse campo, como se verá nas conclusões
desta obra, porém, deve-se reconhecer o quanto melhorou a atividade
de controle exercida pelos Tribunais de Contas.
no Brasil existem 34 Tribunais de Contas. Um da União, um do
Distrito Federal, vinte e seis Estados. Com atuação no município há um
em São Paulo e outro no Rio de Janeiro. Quatro Estados (Bahia, Ceará,
Goiás e Pará) tem, além do TCE, um Tribunal de Contas dos municípios.
no âmbito dos Estados, do Distrito Federal e dos municípios aplicam-
se as regras da Constituição Federal, exercendo, no ambiente de suas

municipal).

O controle social é basicamente a ação ou reação do indivíduo na

atos que ferem a ética, a moral pública e a harmonia entre as pessoas.


É o que se pode denominar controle natural.
Salomão RibaS JUnioR
308 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

Sob a perspectiva institucional é o controle que pode ser exercido


pelas pessoas ou organizações da sociedade civil. Pode ainda ser o
controle exercido pelo Poder Público ou por entidades de interesse
público.

culadas aos princípios da Sociologia. Para completar o papel do controle


público, isto é, de todos, é que surge outra face do controle social. Essa
face é a que nos interessa mais na presente obra. Assim, o controle social
é a vigilância do cidadão — agindo individual ou coletivamente — sobre

dos negócios públicos. Com base nessas informações formam um juízo


de valor sobre os atos administrativos e podem procurar os meios
necessários para reclamar, denunciar ou mesmo impedir que eles sejam

Restrito aos meios acadêmicos, na primeira fase de sua identi-

controle do governo. Essa é a principal razão ou motivação das pessoas


para buscar informações e agir de acordo com elas. na reorganização do
Estado realizada pelos brasileiros com a Constituição de 1988, a questão
do controle social com a participação popular em órgãos colegiados
consultivos ou de deliberação coletiva teve destaque. O mesmo ocorreu

Assim é que, no Título II, da Constituição Federal, encontramos

Com a mesma ênfase o inc. xxxIII, do mesmo artigo, garante que

xxxIII - todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações


de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão
prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas

Estado; (BRASIL, 2012b)

O direito amplo de petição vem disciplinado o inc. xxxIV, como

mente assegura-se o direito de qualquer cidadão de obter certidão nas


repartições públicas.
CAPíTULO VI
COnTROLE
309

A ação popular há alguns anos é um dos instrumentos mais

responsabilizar agentes públicos por atos ilegais ou irregulares, espe-


cialmente os que promovem dano ao erário. A Constituição de 1988
consagrou a ação.

LxxIII - qualquer cidadão é parte legítima para propor ação popular que
vise a anular ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o

isento de custas judiciais e do ônus da sucumbência; (BRASIL, 2012b)

Se a ação popular não foi uma inovação, o mesmo não se pode


dizer do habeas data. Trata-se de inovação da Carta de 1988 para permitir
o conhecimento de informações a respeito da própria pessoa nos re-
gistros governamentais. É uma oportunidade de o cidadão corrigir
imprecisões ou mesmo equívocos nesses bancos de dados.

LxxII - conceder-se-á “habeas-data”:

impetrante, constantes de registros ou bancos de dados de entidades


governamentais ou de caráter público;

sigiloso, judicial ou administrativo; (BRASIL, 2012b)

O mesmo direito de exercício do controle social, no sentido em


que estamos falando, decorre do princípio geral da publicidade dos atos
de gestão governamental (art. 37, CF). De outro parte, especialmente na
área da ação social, há expressa referência no inc. II do art. 204 quanto

Art. 204. As ações governamentais na área da assistência social serão


realizadas com recursos do orçamento da seguridade social, previstos
no art. 195, além de outras fontes, e organizadas com base nas seguintes
diretrizes: [...]
II - participação da população, por meio de organizações representativas,
na formulação das políticas e no controle das ações em todos os níveis.
(BRASIL, 2012b)
Salomão RibaS JUnioR
310 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

A expressão controle social é usada concretamente na parte


em que a Constituição trata da cultura, em redação introduzida pela

constitucional que determina o regime de colaboração, descentralização,


participação na operação do Sistema nacional de Cultura. Entre as
diretrizes está o controle social dos processos decisórios.

de colaboração, de forma descentralizada e participativa, institui um


processo de gestão e promoção conjunta de políticas públicas de cultura,
democráticas e permanentes, pactuadas entre os entes da Federação e
a sociedade, tendo por objetivo promover o desenvolvimento humano,
social e econômico com pleno exercício dos direitos culturais.
[...] x - democratização dos processos decisórios com participação e
controle social; [...] (BRASIL, 2012b)

parência dos atos e ações de governo. É um dos princípios norteadores

seu art. 48:

será dada ampla divulgação, inclusive em meios eletrônicos de acesso


público: os planos, orçamentos e leis de diretrizes orçamentárias; as
prestações de contas e o respectivo parecer prévio; o Relatório Resumido
da Execução Orçamentária e o Relatório de Gestão Fiscal; e as versões

Parágrafo único. A transparência será assegurada também mediante:

durante os processos de elaboração e discussão dos planos, lei de dire-


trizes orçamentárias e orçamentos;
II - liberação ao pleno conhecimento e acompanhamento da sociedade,
em tempo real, de informações pormenorizadas sobre a execução orça-

que atenda a padrão mínimo de qualidade estabelecido pelo Poder


Executivo da União e ao disposto no art. 48-A. (BRASIL, 2012j)

para assegurar maior transparência e conhecimento instantâneo


das alterações orçamentárias e atos administrativos pela obrigatória
publicação imediata dos mesmos, inclusive nos meios eletrônicos.
CAPíTULO VI
COnTROLE
311

social. não é preciso muito esforço para se compreender que esse


PÁGINA EM BRANCO
CAPíTULO VII

COnSIDERAÇõES FInAIS

7.1 O que é a corrupção?


O exame dos casos concretos e a leitura das teorias a respeito
da corrupção indicam a complexidade desse tipo de conduta dos seres

para um conceito de aceitação geral. Essa aceitação geral inexiste entre


os especialistas. Assim, seria pedir demais que pudesse existir entre
as pessoas comuns. Uns e outros têm a tendência natural de usar a
expressão de acordo com as suas áreas de conhecimento ou o nível de
informação. De qualquer maneira não se pode deixar de reconhecer
que a alegoria usada por Vito Tanzi é das mais próximas da realidade.
A corrupção é como um elefante. É difícil de descrever, mas quando
você encontra um sabe imediatamente reconhecê-lo. É o que ocorre com
as pessoas quando confrontadas com um desvio de conduta. Elas não
precisam de teorias, nem de fórmulas econômicas ou jurídicas, para
saber que se trata de um mau comportamento gerador de uma série
de inconvenientes para a vida em comum. Daí surgirem conceituações
genéricas da opinião popular que são repelidas pelos acadêmicos e
especialmente pelos cultores do Direito. nesse campo os cuidados

isso que há vários crimes contra a Administração Pública, mas cada um


deles tem os contornos próprios e seus autores são alcançados por penas

Em decorrência desses fatos, há fortes correntes de opinião


que consideram que a única fórmula capaz de conter a corrupção é a
Salomão RibaS JUnioR
314 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

reformulação das leis penais. Essa reformulação incluiria outros tipos


entre os crimes contra a Administração e tornariam mais severas as

no campo da lei penal deve ser a última possibilidade de impedi-la e

dades para incluir um conceito que seja aceito universalmente. Há,


nos anos recentes, um esforço entre os estudiosos para construir uma

no campo de estudos das ciências econômicas. Para alguns autores,


vista de maneira neutra sob o aspecto moral e ético pela economia, a
corrupção não é um mal em si mesmo. Ela pode ter sua razão de ser na
superação da lentidão burocrática exercendo certa funcionalidade. O
pagamento de suborno a um funcionário público — em si mesmo um

solução rápida para um problema.


O que se vê das teorias e exemplos colecionados, sob o aspecto
sociológico, é que os atos de corrupção podem ser admitidos sem con-
testação em razão da cultura dominante em dada sociedade, o que

As conceituações adotadas popularmente estão próximas, na sua

comuns, sem responsabilidade política ou intelectual, as mais variadas

Assim, diante de tantas e variadas formas de se construir uma de-

pelo Código Penal e as teorias construídas pelos economistas. Ainda, o


que há de comum entre aquelas duas hipóteses de pesquisa (Direito e
Economia) e as observações sociológicas? Ou que há de comum entre
as três hipóteses (Direito, Economia e Sociologia) e a opinião popular?

começar por apontarmos a principal variável de cada uma das hipóteses


conforme os aspectos pesquisados.
Assim, entre os redatores dos dicionários, em princípio cultores
da pureza da linguagem, a palavra corrupção traduz uma deterioração
material ou moral. no aspecto que nos interessa, é a quebra, a ruptura
CAPíTULO VII
COnSIDERAÇõES FInAIS
315

de uma regra, de uma norma. As consequências desse procedimento são


listadas como um prejuízo material ou moral. Tanto pode ser a perda de
parte do corpo ou do patrimônio com a agregação indevida dessa parte
em outro domínio patrimonial, assim como pode ser a deterioração de
um corpo ou a depravação de hábitos ou de costumes. Já aquela quebra
pode ser vista como o ato de subornar outro para agir de acordo com os
seus próprios interesses e conveniências. É o uso do dinheiro para que
um funcionário, em sentido estrito, faça ou deixe de fazer o que a lei o
obriga para favorecer ilicitamente outro. Podemos dizer que é agir fora
das regras para transferir renda ou patrimônio público ilicitamente para
o patrimônio privado. Isso no campo da corrupção política, mas pode
também ser o mesmo procedimento no meio econômico privado para

forma, vê-se que os dicionários pesquisados, em mais de um idioma,

latina aproxima-os. Para vermos o que tem em comum com as outras

escondido, pois corrupção e transparência são circunstâncias que se


repelem. Há sempre interesse material envolvido, pois não se conhecem
atos de corrupção sem dinheiro, vantagem ou qualquer outra forma de
benefício para as partes em conluio. É sempre uma conduta desonesta,
fraudulenta e com prejuízo para o bem coletivo. Os sinônimos que os
dicionários reconhecem são inúmeros. mesmo a gíria popular usa de
uma série de expressões e gestos que traduzem a ideia geral do que
quer dizer corrupção.
no campo das ciências sociais os especialistas também não são

para uma ou outra denominação, mas mesmo assim são múltiplas as

é a chamada legalista. Assim, temos a ideia da corrupção centrada no


que dizem as leis e em especial o que diz a lei penal. É corrupção o

no caso brasileiro, há setenta anos, corrupção é “exigir para si ou para


outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função, ou antes de
assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida”, de acordo com a

a recebe. É quando temos a ideia de corrupção ativa e corrupção passiva.


Outros crimes contra a Administração Pública, também presentes no
mesmo documento legal, podem estabelecer confusão. Como se vê no
Salomão RibaS JUnioR
CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

texto, essa circunstância se repete em outros países, como a Espanha

os legalistas.
Em sentido mais amplo nas ciências políticas, temos que a cor-
rupção é o ato do funcionário público que foge das regras que o limi-
tam e orientam para favorecer interesses particulares mediante uma
recompensa.
no campo das ciências econômicas, encontramos pesquisas que

das causas e consequências da corrupção. Para tanto, apontam que a


corrupção pode ser um fator que surge das circunstâncias, do modelo
burocrático, da remuneração do funcionário público, dos costumes

regulação e o monopólio estatal, o alto poder discricionário do agente


público, tudo provoca isoladamente ou em conjunto a necessidade
de soluções pelo mercado. E entre essas soluções está a corrupção
como forma de azeitar a engrenagem burocrática. O funcionário mal
remunerado vê nisso uma maneira legítima de aumentar sua renda.

maneira diligente para isso, nada mais justo que ser agraciado com
alguma vantagem.
na perspectiva sociológica também se considera a corrupção
como a ruptura de uma regra ou norma geralmente aceita. Atenua-se,
contudo, o ato de acordo com os usos e costumes, tradição, cultura local.
É por esse lado que o nepotismo, um dos tipos de corrupção de acordo
com autores respeitáveis, não é visto com o mesmo rigor. O nepotismo
em sentido estrito, como parentesco familiar direto, ainda sofre certa
censura, mas o compadrio, o companheirismo, o bairrismo não.
É nesse campo que encontramos terreno para os métodos mais
abertos para a conceituação do termo, mesmo que eles permitam a

se pode invocar a ética weberiana avaliando a conduta pelo que dela

que entre esses resultados e comparações não está o interesse pessoal


satisfeito, nem o ganho privado, mas o interesse ou bem público
protegido ou menos atingido na sua essência.
O que é corrupção, no âmbito da Sociologia, é matéria que não
comporta avaliações muito objetivas. O comportamento corrupto é
considerado fruto das relações usuais entre os indivíduos de uma dada
CAPíTULO VII
COnSIDERAÇõES FInAIS
317

comunidade. Se um presente é que faz a certidão pública ser expedida,


por que condenar o ato? Se as pessoas não acham má a prática, por que
deve a lei apenar os que a praticam? O texto responde a essas perguntas
mostrando que a educação para a ética em sociedade é, como veremos,

A opinião popular encara como corrupção todos os atos que,


ao seu juízo, prejudicam alguém. Assim, também aí não temos um

o cidadão comum é indiferente a prática da oferta ou do recebimento

ato onde haja desvio de dinheiro ilicitamente. Para as pessoas o desvio

Os tons que adquire a corrupção, tanto na perspectiva sociológica


quanto na da opinião pública, foram descritos em admirável teoria de

cinza. Os indivíduos percebem o mesmo fato corrupto — legalmente


— de diversas formas. Baseiam-se nos seus interesses e na sua própria
percepção da moral e da ética.
Assim sendo, a corrupção é negra quando há coincidência plena
entre a lei e a opinião popular. As pessoas aplaudem as sanções legais
para determinado tipo de conduta.
A corrupção é branca quando não há essa coincidência. As pessoas
não concordam por sua expressiva maioria com a criminalização de
determinadas condutas.
Finalmente, a corrupção é cinza quando parte da sociedade
concorda e parte discorda das sanções legais em determinados atos e
circunstâncias de ruptura de uma norma legal. As pessoas assumem
uma atitude dúbia diante de certas quebras de normas de conduta legal.

7.2 Como e onde existe?


A corrupção é uma constante na historia brasileira. As notícias
mais remotas estão em um singelo livro atribuído originalmente ao
Padre Antônio Vieira (Arte de furtar). Surgiu no século xVI e dava
notícia ao Rei de Portugal de como o patrimônio real era dilapidado
no Brasil. Ao longo desses 500 anos sempre se registraram casos de
fraudes ao erário. Da sonegação de tributos ao peculato puro e simples.
Salomão RibaS JUnioR
318 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

O contrabando, como meio de vida, era outra modalidade praticada


pelos habitantes da então colônia portuguesa.
Em alguns momentos de nossa história a questão da corrupção
ganhou relevo. na historia recente isso aconteceu em 1954 (suicídio de
Vargas) com a denúncia do próprio de que havia um mar de lama sob o

muita especulação em torno da corrupção nessa gigantesca obra. O


Sr. Jânio Quadros elegeu-se apoiado na promessa de varrer a corrupção

a corrupção e modernizar o País. Findo o período militar, o primeiro


Presidente civil eleito pelo voto popular (Fernando Collor) prometia
acabar com a corrupção, abrir a economia e modernizar o Estado (1989).
Todos acabaram envolvidos em falcatruas. Os governos seguintes
prometeram as mesmas coisas, mas estiveram sempre sob suspeita. no
mesmo período, como se constatou, houve um dos mais rumorosos casos
de corrupção envolvendo a elaboração do orçamento e a destinação de
recursos para empreiteiras e subvenções sociais. A CPI do Orçamento,

campanha de Collor), mostrou que as emendas parlamentares eram

as campanhas eleitorais. Outros casos de desvio puro e simples de


recursos, através do nepotismo e do clientelismo, ocorriam na alocação
de recursos para entidades privadas.
O exame da ocorrência de casos de corrupção mostra que todo

recursos públicos. não há a menor distinção regional, pois os casos


mais contundentes têm características nacionais.
A descrição de múltiplos casos envolvendo várias atividades

corrupção; (ii) ela ocorre em todos os níveis de governo.


Ao listar os casos mais divulgados pela imprensa é possível

dizer que as modalidades de corrupção administrativa estão presentes


pelo menos nos setores de compras governamentais, de concessão

campo político elas envolvem a compra de apoio no parlamento, a


discriminação ilegítima na aprovação e liberação de recursos oriundos
de emendas parlamentares, a facilitação de negócios de empresas

popular. Uma e outra modalidade, a administrativa e a política, não


CAPíTULO VII
COnSIDERAÇõES FInAIS
319

raro se confundem e envolvem o mesmo objeto. São comuns os casos


em que há a participação da alta administração política e outros níveis
da burocracia.
O que a pesquisa mostra é que o elevado custo das campanhas
eleitorais é uma das causas da corrupção eleitoral. Há incentivo para o

fação dos interesses empresariais dos doadores.


De outra parte, no setor privado também encontramos certas
circunstâncias em que uma empresa, ao usar o suborno para conseguir
seus negócios, acaba prejudicando todas as demais que atuam na mes-

das empresas com o governo. Extrai-se essa conclusão das regras de


boa governança corporativa que há alguns anos orientam a atuação das

cipal e os agentes, na linguagem da economia, devem ser eliminados.

regular do mercado.

7.3 Quais as causas?


As pesquisas mostram que, de acordo com a visão que se usa
para examinar o fenômeno da corrupção, podemos encontrar várias
causas para sua existência. Algumas são de ordem geral e outras são

do que em saber por que ou como ocorre, ela é uma realidade, existe.

humana. Assim, as causas principais são as ambições e as fraquezas


do ser humano. A pesquisa linguística também é útil para se conhecer

e efeitos.
no plano do Direito, uma das causas resulta da condição hu-
mana. O ser humano é por natureza insaciável na satisfação de suas
necessidades ou dos seus desejos. Para contê-los são necessárias boas
leis disciplinando o convívio em sociedade e estabelecendo limites para
os apetites. Dessa forma, em presença da corrupção, suas causas podem
Salomão RibaS JUnioR
320 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

Cada uma dessas causas tem fatos e atos que as geram e também
podem ser apontadas como primárias. Em seguida vêm as causas
secundárias de ordem geral, que são as acima citadas.
Dessa forma, a anomia é fruto do desrespeito generalizado das

pela corrupção endêmica. A repetição dos atos corruptos é que produz


a ruptura da ordem jurídica, dela decorrendo a desintegração das
práticas econômicas e sociais. É notável, de outro lado, que algumas
das consequências da corrupção são geradoras de causas. É quando se

corrupção. Uma e outra são aceitas como inevitáveis em um cenário


de anomia.

corrupção. Certamente, essa é a razão de ser de sucessivas propostas


de novas leis no parlamento com o objetivo de combater a corrupção.

já existentes, maiores sanções aos corruptores e aos corruptos. É esse


o caminho que os legalistas procuram para eliminar o que consideram
causa importante da corrupção.
Ainda no plano jurídico temos a impunidade apontada como
uma das causas da corrupção. Ela pode, no primeiro momento, ser

pelo receio da sanção de lei, ele colhe da impunidade um incentivo.


Esta — a impunidade — não decorre apenas da lei mal feita, mas
especialmente da lei mal aplicada. Essa má aplicação decorre de uma
circunstância curiosa. O instrumental de investigação e de acusação é
o que existe no direito público. Já o instrumental de defesa do acusado
de corrupção é o do direito privado, seguramente mais ágil, mais

da Administração Pública, por seus meios de controle, para produzir

De acordo com os economistas, as causas da corrupção estão


no excesso de regulação do mercado, na burocracia, na administração
de preços, no monopólio estatal, no alto poder discricionário dos bu-
rocratas, na má remuneração dos funcionários públicos e outras causas
estruturais e de processo. A ocorrência do fenômeno está ligada aos

pelos agentes da produção diante do emaranhado legal para a abertura


CAPíTULO VII
COnSIDERAÇõES FInAIS
321

suborno para superar esse entrave. na sequência, em uma economia


excessivamente regulada, as autorizações e licenças são os obstáculos
seguintes ao livre desenvolvimento dos negócios. A administração

burocrático para corrigir preços, o que é imperioso quando há aumento


de custos, particularmente de insumos essenciais.
Outro aspecto apontado como causa incontornável da presença
da corrupção está ligado ao monopólio estatal e ao alto poder de decisão
dos funcionários públicos em geral. De fato, não há concorrência
possível entre o que produz o Estado e outros atores do mercado.
Segundo os economistas, não havendo concorrência são impossíveis
baixos custos, pois não se pode buscar o mesmo produto — seja uma
licença, um alvará, uma autorização — em outra fonte que não o próprio
Estado. Qualquer monopólio é, na visão das ciências econômicas, em
princípio nocivo. As exceções dos monopólios naturais são poucas.
O alto poder discricionário de cada funcionário e do seu con-
junto é apontado como um incentivo ao suborno. Associando-se a
essa circunstância a má remuneração, temos um cenário propício ao

O mesmo pode ocorrer para que o burocrata deixe de praticar atos


obrigatórios de sua função. Como vimos, a fórmula da corrupção en-
volve o monopólio, a falta de transparência e o alto poder discricionário
(C=m+D-T).
Sob a perspectiva da corrupção privada, mais adequadamente
estudada e contida na Europa, temos que ela frauda a competição
leal, compromete os princípios de abertura e liberdade do mercado,
prejudica todo o seu funcionamento com a ausência de transparência.
Essas causas de caráter econômico decorrem, como no setor público,
da ruptura de normas de conduta. Estas podem ser as de natureza
ética que devem presidir os negócios econômicos (produção, comércio,

disciplinam a produção e o consumo, ou ainda dos regulamentos e

7.4 Consequências
De outro lado, as consequências da corrupção são políticas,
econômicas e sociais. no plano político perde-se a perspectiva do debate
de ideias pela utilidade da maioria ou minoria nos parlamentos, ou pela
nomeação de simpatizantes para funções-chave de governo. A discussão
Salomão RibaS JUnioR
322 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

política, a apresentação de programas de governo, de políticas públicas

Estas formas de conquista de apoios políticos e parlamentares


geram o nepotismo, alimentam o clientelismo e mantêm vivos os
aspectos negativos do patrimonialismo.
Como se extrai do exame das pesquisas, a decisão da mais

alcança apenas os que têm laços de parentesco familiar. A vedação de

ou políticos e os companheiros partidários. São comuns as nomeações


de pessoas sem a necessária competência para a função. Tem apenas o

na política. Como são mais de duas dezenas de milhares de funções e


cargos de livre nomeação — respeitados os princípios constitucionais

O clientelismo produz preferências de compras de bens e serviços


de apadrinhados dos membros dos parlamentos e integrantes dos
altos escalões da Administração Pública. A política de clientela é uma
das formas mais negadoras das ideias republicanas e dos programas
políticos delas decorrentes. O que interessa é somente o apoio nas
eleições. Daí resulta um compromisso que envolve o uso da máquina
governamental para atender aos apetites e necessidades do cliente.
Esse procedimento decorre da confusão entre o público e o
privado que caracteriza o patrimonialismo. Conjunto de convicções e

políticas historicamente recentes. nos dias atuais o coronelismo rural


que os brasileiros herdaram dos colonizadores portugueses é substi-
tuído por um coronelismo urbano, como demonstram as fraudes para
a manutenção do poder político.
As consequências econômicas da corrupção envolvem a redução

o crescimento da economia. Vários estudos mostram uma correlação


entre altos níveis de corrupção e baixos níveis do Produto Interno Bruto.
Deve-se ainda considerar como consequências econômicas da

ciência da burocracia estatal e do setor privado. Além disso, há que


se considerar a redução da competitividade da economia, o que gera
diminuição do PIB, como já alertamos antes.
CAPíTULO VII
COnSIDERAÇõES FInAIS
323

Desse quadro decorrem consequências sociais importantes


traduzidas em menos recursos para educação e saúde, menos recursos
para assistência social, menos empregos. Fatos esses que afetam dire-
tamente as camadas mais pobres da população. Há estudos que apontam
uma relação direta entre altos níveis de corrupção e baixos níveis de
desenvolvimento econômico e social. Os países com maiores níveis de
corrupção percebida apresentam baixos índices de Desenvolvimento
Humano (IDH).

7.5 Pode ser medida?


Diante desse quadro, procura-se conhecer a dimensão da cor-

enfrentando há algum tempo. Essa pesquisa é importante na medida


em que não se combate o que não se conhece. Também são inviáveis
medidas de contenção se não se conhece a dimensão do que se quer
conter.
O uso de metodologias diferentes de uma média de resultados de

somar os casos de corrupção levados ao Judiciário. Seria sempre uma


parte do total de recursos desviados. Outro método seria colher dados
e informações da imprensa. Ficaríamos apenas com indicadores de
suspeição, pois por maior que seja o zelo da imprensa são investigações
que não se completam. Daí uma elevada imprecisão. Pode-se ainda
trabalhar com estimativas a partir desses dados.

dade de uma medição objetiva da corrupção. O que se sobressai é o


uso das teorias que construíram os índices de Percepção da Corrupção.
Eles conseguem dar uma ideia aproximada do volume de recursos
desviados.
Pelos indicadores do Banco mundial pode-se aceitar o montante
de US$1 trilhão de recursos desviados anualmente para dar uma ideia
de grandeza monetária do fenômeno.
Assim, os valores apontados para o ambiente brasileiro (R$85

da corrupção pode ser extraída da posição brasileira no IPC da

países pesquisados. As pequenas variações dessa posição na série


Salomão RibaS JUnioR
324 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

metodologia, de elevados níveis de corrupção. E se é assim, podem-se


calcular os prejuízos causados por esse montante de recursos desviados.
não é difícil saber quantos hospitais, postos de saúde, escolas, creches,
asilos e outros equipamentos sociais deixam de ser mantidos ou
construídos anualmente. O mais grave, contudo, não está na dimensão
econômica, nem nesses prejuízos sociais. O mais grave na presença
da corrupção endêmica é a deterioração do tecido social, a quebra da

da inutilidade da conduta ética ou pela sensação de anomia.

eleitoral?
Sem dúvida há nexo causal entre a maioria dos casos de cor-
rupção nos contratos administrativos celebrados entre particulares e

eleitorais.
As evidências desse nexo podem ser encontradas no volume de
recursos doados para campanhas eleitorais por empresas que mantêm
vultosos negócios com os governos. não é preciso esforço extraor-
dinário de imaginação para constatar que essas contribuições não são

redução de tributos ou outras grandes causas do mundo econômico.

máquina burocrática e na contratação de bens, obras e serviços pelos


governos.

partidos políticos que estão no governo são sempre os que recebem mais
recursos dos grandes contribuintes com interesses em fornecimento de
bens e a contratação de obras e serviços com o Poder Público. Como se
viu na pesquisa, os maiores doadores são empreiteiras de obras e ser-
viços para o governo. Em segundo vêm os bancos interessados diretos
nas políticas ditadas pelo governo. não é menor o interesse no setor
de registros de patentes e licenciamentos de vigilância sanitária do que
o da indústria produtora de medicamentos. Ela situa-se logo após os
bancos no volume de recursos doados em campanhas eleitorais.
Se não bastassem as constatações por essas evidências, há inú-
meras alegações formais de implicados em casos de corrupção de que o
dinheiro desviado se destinava ao pagamento de dívidas de campanha.
CAPíTULO VII
COnSIDERAÇõES FInAIS
325

Essas alegações surgiram inclusive no emblemático caso da compra de

pelo Supremo Tribunal Federal. Ali, os defensores dos principais


políticos acusados intentaram fazer prevalecer a tese que os recursos
envolvidos oriundos de “Caixa 2” foram destinados a pagar dívidas

para nenhum deles.

desviado era público e que, no mínimo, houve aplicação ilegal dele. Os


crimes discutidos envolveram corrupção ativa e passiva, formação de
quadrilha e lavagem de dinheiro.
no passado, igualmente, encontramos esse nexo na descoberta de
fraudes oriundas de superfaturamento de obras e entrega de parte do
diferencial para uso em atividades partidárias ou campanhas eleitorais.
Isso foi constatado nitidamente no caso do impedimento do Presidente
Fernando Collor, como visto, e na CPI dos Anões do Orçamento,
igualmente analisada. nos dois episódios houve relação direta entre
o desvio de recursos e o uso desse dinheiro pelos partidos políticos.
na jurisprudência da Justiça Eleitoral também encontramos
casos de corrupção eleitoral ou abuso do poder econômico para apoio a
determinados partidos e candidaturas. Os casos de facilidades obtidas
por empresas nas relações destas com os governos são inúmeros.
Entre as declarações formais de coleta de recursos para cam-
panhas eleitorais há inúmeros depoimentos, quando se analisam
casos que caracterizam a corrupção endêmica no Brasil. Até mesmo

em que há correlação direta entre faturamento da obra e transferência


para o caixa dos partidos políticos.

dos servidores. É essencial que, além da vigilância pelo cumprimento da


disposição legal, os servidores estejam atentos aos deveres de lealdade
e honestidade. A probidade requer de parte dos servidores um cuidado

princípios da Administração Pública.


Os Códigos de Conduta Ética dos servidores públicos contém
uma série de soluções para resolver as dúvidas dos empregados do

interpretação. Igualmente, há nesses Códigos diretrizes para medidas

dências, temos igualmente condições para que prosperem os desvios


de conduta e os prejuízos diretos e indiretos ao erário.
Salomão RibaS JUnioR
CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

adas,
comissões de ética, avaliação de condutas e controle, há mais proba-
bilidade de ocorrer improbidade administrativa. Ela leva ao abandono
dos valores éticos pela busca do aumento da renda mesmo que por
meios ilegais, como é o caso da corrupção.
Essa circunstância decorre do elevado grau de vulnerabilidade
que as ineficiências da burocracia apresentam. não havendo um

corrupção e outros crimes contra a Administração Pública.

7.7 Pode ser combatida?


É possível enfrentar a corrupção? Ela pode ser eliminada ou ao
menos contida? Essas indagações têm algumas respostas ao longo das

as suas causas, é possível eliminá-las ou minimizar os seus efeitos. As


respostas mostram também a complexidade do que se quer enfrentar.
Assim não há soluções simples. Todas indicam a necessidade de um
esforço coletivo e de participação social. Além do mais, mostram as

Ainda que haja mais de uma conclusão a respeito, podemos nos

opinião são: (i) a do relativismo e (ii) a do universalismo. A primeira


considera a corrupção uma presença inexorável nos estágios iniciais de
desenvolvimento dos países. A segunda se inclina pelo caráter universal
do fenômeno. Dessa forma não importa o estágio de desenvolvimento

outra linha de raciocínio encontra sustentação na pesquisa e na doutrina.


A opção entre uma ou outra têm consequências nas respostas objetivas

há quem pense que a corrupção é inata nas pessoas e nada se pode


fazer para extirpá-la da conduta humana. Essa visão fatalista é que
inspira os legalistas que só creem na inteligência da lei para impedir o
ser humano de se locupletar do patrimônio alheio. E é inevitável para
estes que as pessoas que vivem em regiões subdesenvolvidas sejam
mais suscetíveis de serem corruptas.
De qualquer maneira, nos últimos anos, apesar de respeitáveis

caráter universal do comportamento humano. Essa universalidade não é


ange estágios de desenvolvimento, ideologias,
CAPíTULO VII
COnSIDERAÇõES FInAIS
327

regimes econômicos e de governo e mesmo culturas diferentes. Claro


que se é necessário combatê-la — em razão dos prejuízos que causa —
isso não se fará por uma única providência ou pela remoção de algumas
causas ou incentivos para a sua prática.

— por sua complexidade e multiplicidade de causas — é possível


contê-la. no organismo humano havia muitas doenças incuráveis
que hoje cedem aos tratamentos e novos medicamentos. A defesa
do meio ambiente era inviável há poucas décadas. Hoje temos outra
consciência ecológica. Porque não podemos ter outra consciência ética?
A convivência entre os humanos — individual e coletivamente — passa
por um permanente processo de aperfeiçoamento. É o que deve animar

vários exemplos na tese que se conclui.


As sociedades organizadas baseiam-se na existência de meca-
nismos de controle. Esses mecanismos, vê-se nos textos pesquisados,

muitas maneiras.

cado e a sociedade civil.


Ao Estado incumbe o arcabouço constitucional e jurídico
para dizer o que pode e o que não pode ser feito, quais os direitos e
garantias e quais os seus limites. nesse aspecto, o mecanismo legal é
o mais adequado para o controle da corrupção como poder-dever da
autoridade pública. É onde encontramos os princípios essenciais para
o pretendido combate.
Do lado do mercado pretendem-se medidas de garantia da
competição e lealdade nos negócios. Esse controle evita os monopólios,
as fraudes econômicas e, em especial, a boa governança corporativa.
Esta, de presença relativamente recente nas sociedades de livre-
iniciativa — como é o caso brasileiro — cria regras de controle interno
e externo das empresas. É o caso da valorização dos Conselhos de
Administração, Fiscais e de Conduta Ética nas empresas de capital
aberto ou apenas de grande porte.

que denominamos controle social. A sociedade civil organizada tem

os que se propõem a viver em um ambiente democrático e ético. Os


grupos sociais organizam-se, como vimos, em grupos de interesse e
grupos de pressão. Sua ação pode ser do interesse do grupo ou do
interesse público.
Salomão RibaS JUnioR
328 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

e se
houver a cooperação entre os atores referidos: o Estado, o mercado e
a sociedade civil.
É fundamental a cooperação e interação entre os mecanismos
estatais, econômicos e sociais para enfrentar e conter a corrupção.

7.8 Por quais meios?


Se é possível conter a corrupção, é importante ver o que se extrai
nessas conclusões a respeito dos meios necessários para isso.

e dos controles públicos e sociais existente em uma dada sociedade.


As estruturas existentes de controle público externo — judicial
e legislativo — se constituem em um dos meios para combater a
corrupção. no caso do controle judicial, ainda que o Judiciário seja

Os meios podem ser: (i) a prioridade na tramitação de processos


que envolvam crimes contra a Administração Pública e em especial
ressarcimento ao erário; (ii) a criação de câmaras especiais para
julgamento de agentes públicos acusados de corrupção, particularmente
se no exercício de funções executivas. na mesma linha a celeridade
processual ou duração razoável do processo como meio de se combater
uma das causas da corrupção: a sensação de impunidade pela demora
na solução de processos judiciais.
no âmbito do controle legislativo temos oportunidade de criar
meios no seio das casas legislativas e dos Tribunais de Contas. no pri-
meiro caso, os parlamentos deveriam usar efetivamente as investigações
parlamentares para apurar e esclarecer casos de corrupção, afastando a

De outra parte, um meio importante seria que esses parlamentos se


valessem de suas comissões para estudos de medidas de combate ao

A Comissão mista Permanente (Fiscalização e Controle), a única


prevista na Constituição, deve agir mais concretamente de acordo com
o que imaginaram os constituintes: (i) examinando as despesas não
autorizadas e representando o respectivo Tribunal de Contas para

pública; (ii) disciplinando as emendas parlamentares aos orçamentos e


calizando os denominados contingenciamentos. A mesma Comissão
CAPíTULO VII
COnSIDERAÇõES FInAIS
329

incluídos na Lei Orçamentária; (ii) despesas que excedam os créditos

Outros meios importantes estão na reformulação da legislação


de elaboração dos orçamentos e na transparência da sua elaboração e
das emendas parlamentares já referidas. nesse aspecto, o projeto de
lei de Qualidade Fiscal ou Orçamentária deve ter prioridade pelo fato
de assegurar transparência e limitações a alterações personalistas das
propostas orçamentárias.

rupção podem ser adotados pelo próprio Tribunal de Contas ou ainda


em relação ao seu correto funcionamento.
O recrutamento de recursos humanos para os Tribunais de
Contas deve ser reavaliado para que se afastem dos mesmos eventuais

pelos legislativos, processo de escolha dos seus membros que atente


rigorosamente para as exigências constitucionais. Para o pessoal técnico
e de apoio o recrutamento deve se dar por meio de concursos públicos.

Outro meio importante é a adoção pelos Legislativos dos mesmos


critérios de impedimento de candidaturas ao cargo de Conselheiro dos
Tribunais de Contas constantes da denominada Lei da Ficha Limpa.
O mesmo rigor que se está adotando para os ocupantes de cargos le-
gislativos deve ser adotado para o preenchimento de cargos de seus
órgãos auxiliares (Tribunais de Contas).

que haja uniformização na forma de atuação. Para tanto, é imperiosa


uma lei nacional de processo e procedimentos dos Tribunais de Contas.
Dela nascerá a uniformização da jurisprudência das cortes de contas.
É essencial que a transparência das contas e dos atos adminis-
trativos, de acordo com a Lei de Responsabilidade Fiscal, seja feita
pelos Tribunais de Contas em relação a si próprios e em relação a todos

da LRF nesse particular deve ser exemplar por parte dos Tribunais de

a transparência necessária ao funcionamento do controle social. Como

pelos órgãos de controle através das auditorias operacionais. Essa


medida preventiva pode contribuir muito para combater a corrupção.
Salomão RibaS JUnioR
330 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

Outro meio importante para melhorar o desempenho dos


Tribunais de Contas é a existência de um controle externo sobre sua
ação administrativa e conduta funcional dos seus integrantes a exemplo
do que ocorre com o Poder Judiciário e o ministério Público. Está
em tramitação no Congresso nacional emenda constitucional para a
criação de um Conselho nacional dos Tribunais de Contas. Por essa
emenda ao novo Conselho nacional dos Tribunais de Contas, compete

Contas e do cumprimento dos deveres funcionais dos ministros,


Conselheiros e Auditores e membros do ministério Público Especial.
Assim, deverá zelar pela autonomia dos Tribunais e pelo cumprimento
de suas próprias determinações. O órgão deverá receber reclamações
e denúncias relativas aos membros dos TCs.
no âmbito interno de cada órgão da Administração Pública os
meios mais importantes — controle administrativo — são: (i) trans-

(iii) adoção dos Códigos de Conduta Ética; (iv) controle da conduta


funcional através de corregedorias e comissões de ética; (v) remuneração
adequada ao nível de complexidade e responsabilidade dos empregos,
funções e cargos.

7.9 O que se está fazendo?


Os sucessivos episódios de corrupção na contratação pública têm
contribuído para que se busque melhorar o controle.
Há um apreciável esforço para eliminar áreas de risco, vulnera-
bilidades processuais e incentivos para a corrupção.
Algumas das providências mais importantes têm sido as

combater a corrupção. É o caso das Convenções Internacionais (OnU,


OEA e OCDE) e a dois princípios básicos: a transparência e a ética nos
negócios públicos e privados.
A transparência é o objetivo central da Lei de Responsabilidade
que sofreu aperfeiçoamento exatamente no dispositivo que trata desse
aspecto da gestão dos negócios públicos. A essa obrigação de informação
contemporânea do cumprimento de limites, meios e modos da LRF
agregou-se uma outra da mesma importância. Trata-se da Lei de Acesso

regras de transparência seguiu-se a Lei dos Crimes Fiscais que penaliza


— inclusive com prisão — os gestores que as transgridem.
CAPíTULO VII
COnSIDERAÇõES FInAIS
331

Ainda no plano das sanções, também recomendadas a todos os


países, foi alterada a Lei de Lavagem de Dinheiro e o Código Penal na
parte referente ao suborno de funcionários públicos estrangeiros. O
Congresso nacional examina no momento mudanças no Código Penal

sanções aos crimes contra a Administração Pública. Outro projeto de


lei pretende permitir a sanção penal das empresas por corrupção e a
criação de um cadastro nacional de fornecedores inidôneos do governo.
As mudanças na Lei de Lavagem de Dinheiro foram profundas
agravando as penas com a existência e consideração dos crimes
antecedentes. De uma lista reduzida dos crimes antecedentes passou-se
para um conceito amplo. É uma lista aberta para incluir todos os ilícitos

não se pode deixar de considerar entre os esforços para conter a


corrupção a Lei de Improbidade Administrativa. Ela procura alcançar
os que se valem da função pública para enriquecer ilicitamente ou
proporcionar ganhos e vantagens indevidas a terceiros. O estudo da
LIA permite concluir que ela continua sendo um instrumento valioso
para conter o mau uso do dinheiro público, especialmente nas hipóteses
de corrupção administrativa.

e eleitoral houve alguns avanços e há perspectivas para o futuro.


Constatam-se alterações nos gastos com campanhas eleitorais que ini-
biram o uso abusivo do prestígio popular de cantores e artistas. Igual-
mente houve substancial diminuição dos custos nas campanhas com a
proibição de distribuição de uma série de bens a título de propaganda
eleitoral. A diminuição de custos reduz as necessidades de dinheiro.

dinheiro.
Além dessas medidas merecem destaque duas leis concebidas,
estimuladas e propostas ao Congresso nacional por atores do controle

e eleitoral. Igualmente sancionam mais rapidamente os maus gestores


do dinheiro público. no caso da compra de votos o conceito da lei
contribui muito para conter essa prática. E no caso da Ficha Limpa para
impedir que ímprobos e corruptos continuem conquistando sucessivos
mandatos para protegê-los da sanção penal.
A publicidade das contas eleitorais no curso da campanha —
com os nomes dos doadores — ainda não é perfeita, mas é uma ótima
notícia para quem deseja uma eleição limpa. Podem ser mudanças
relativamente tímidas, mas eles são avanços a estimular.
Salomão RibaS JUnioR
332 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

no plano da transparência as exigências de publicação da


declaração de bens de todos os agentes públicos é uma medida já
adotada. O mesmo em relação aos candidatos a cargo eletivos. O exame
da evolução patrimonial, como vimos, tem produzido resultados no

atos contra a Administração Pública.


As recomendações do EnCCLA47 para a cooperação no combate

A imprensa brasileira, como descrito, tem tido papel relevante

e no apoio editorial aos que combatem os desperdícios e os desvios


de recursos públicos. na mesma linha está o jornalismo investigativo.

controle judicial começou a livrar-se da pecha de responsável pela


impunidade. O STF dá um exemplo de cumprimento do esperado pela

todos os processos que investigam atos de corrupção. Além disso, há


outras iniciativas do CnJ em favor da celeridade processual em geral e
nos processos de improbidade e outros crimes contra a Administração
Pública.
no âmbito do Controle Externo, o TCU tem multiplicado suas
inspeções e auditorias. Ao mesmo tempo procura acelerar o andamento
dos processos para que sua atuação seja mais contemporânea aos atos

e procura aperfeiçoamento constante.


É o mesmo que se espera dos Tribunais de Contas após os estágios
iniciais do Programa de modernização dos Órgãos de Controle Externo
(PROmOEx). Por esse programa estima-se a adoção de planejamento
estratégico, uniformização de decisões e redesenho de processos com

A atuação dos Tribunais de Contas pelas auditorias de regulari-


dade deve ser mais objetiva e contemporânea aos atos. Como medida

47
CAPíTULO VII
COnSIDERAÇõES FInAIS
333

para prevenção e melhor gestão o PROmOEx prevê o aumento


continuado das auditorias operacionais.

da transparência e publicidade imediata dos atos administrativos (LRF).


Igualmente a avaliação dos portais dos órgãos públicos (Lei de Acesso

de Contas.

7.10 O que falta fazer?

sociedade. É preciso que as pessoas elejam valores éticos para todos

recursos públicos. Essa retomada de valores éticos vai além da escolha


referida. Ela exige que cada indivíduo e a sociedade em geral sejam

em geral políticos. Essa reação coletiva é básica para o êxito de medidas


administrativas, legislativas e judiciais para proteger o patrimônio
público. Em resumo, pode-se dizer que faltam as providências abaixo
listadas de acordo com cada uma das áreas do Estado, do mercado e
da sociedade civil.
1) Medidas legislativas
a) aprovação das alterações no Código Penal conforme Projeto
de Lei em andamento no Senado Federal;
b) autorização Legislativa para acesso, pelos órgãos de controle,

d) sanção penal para as pessoas jurídicas envolvidas em crimes


contra a Administração Pública e em especial corrupção;
e) aprovação de Lei disciplinando o lobby
Pública de todos os níveis de governo;
f) criminalização da malversação de fundos públicos;
g) reforma eleitoral com a adoção de mecanismos atuais de con-
trole dos abusos no processo eleitoral;

público dos partidos políticos e das campanhas eleitorais;


i) aprovação da Lei de Qualidade Orçamentária disciplinando

emendas parlamentares e liberação de recursos.


Salomão RibaS JUnioR
334 CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

2) Medidas judiciais
a) efetivação da regra constitucional que determina razoável
duração do processo e celeridade de sua tramitação;
b) estabelecimento de regras objetivas para a prioridade de ações
que versem sobre crimes contra a Administração Pública
e em particular visem o ressarcimento ao erário de fundos
desviados;
c) decisão conclusiva a respeito do foro privilegiado para os atos
de improbidade administrativa;
d) cooperação entre os órgãos formais da Justiça Eleitoral e os
órgãos e movimentos da sociedade civil para combater a
corrupção eleitoral;

tituição ao patrimônio público.

3) Medidas administrativas
a) operação e valorização do controle interno;
b) criação de Comissões de Ética em todos os níveis de governo
e órgãos;
c) sistemas de controle efetivo sobre contratos e convênios para
avaliar a correta execução e os resultados obtidos;
d) organização de um cadastro nacional de maus gestores e de
empresas inidôneas;
e) transparência de todos os atos e operação adequada dos
portais de informações ao público;
f) criação de mecanismos especiais de acompanhamento da exe-
cução dos orçamentos públicos, das emendas parlamentares
e liberação dos recursos públicos;
g) cadastro nacional para registro de organizações não governa-
mentais que recebem recursos públicos dando publicidade ao
montante recebido, origem e destinação dos recursos públicos;
h) celeridade na abertura e conclusão de processos de Tomada
de Contas ou outro instrumento para apurar danos ao erário
e responsabilidades.

4) Medidas do mercado
a) cooperação com os órgãos de controle públicos na contenção
dos atos de corrupção, fraudes e outros crimes contra o próprio
mercado e a Administração Pública;
b) disseminação das regras de boa governança corporativa entre
as empresas especialmente nas suas relações com o governo;
CAPíTULO VII
COnSIDERAÇõES FInAIS
335

c) adoção de critérios ríg

d) adoção de princípios éticos (Códigos de Conduta) para seus


dirigentes e empregados nas relações governamentais;
e) conduta empresarial compatível com as regras da livre-iniciativa
e de respeito ao consumidor.

5) Medidas do controle externo

b) cooperação e integração vertical e horizontal entre os Tribunais


de Contas para uniformizar a jurisprudência;
c) criação de um manual de boas práticas processuais enquanto
o Congresso nacional não aprova a Lei Processual nacional
de Controle Externo;
d) estreitar a cooperação com o Poder Legislativo inclusive na

e) valorização dos recursos humanos mediante adequada remu-


neração e programas de treinamento constantes;
f) troca de informações e trabalhos em conjunto entre Tribunais
de Contas, ministério Público, Polícias Federal e Estadual nas

g) organização e disseminação dos Grupos Interssetoriais de

6) Medidas socioeducativas

lização e ao controle do uso de verbas públicas;

d) inclusão no currículo escolar de estudos sobre a ética e o res-


peito aos valores fundamentais;
e) operação do Conselho de Transparência do Governo Federal
e disseminação da criação de órgãos similares nos Estados e
municípios;
f) campanhas sistemáticas de conscientização quanto aos male-
fícios da pirataria (produção e consumo).

causas e das consequências. Também por isso colhem-se conclusões


diversas e propostas de medidas a tomar também diversas.
Salomão RibaS JUnioR
CoRRUPÇão PÚbliCa E PRiVaDa – QUaTRo aSPECToS...

aumentou muito, particularmente nos últimos dez anos. De outro

imprensa, a corrupção aparece mais. De outro lado, deve-se anotar


que a transparência nos negócios público e privado tem aumentado.

um ato complexo e jamais é neutro. Ele tem causas que podem ser

da disposição de luta individual e coletiva e do comportamento ético

É uma luta de todos e de cada um.


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Esta obra foi composta em fonte Palatino Linotype, corpo 10

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