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ARTIGOS
Resumo
Palavras-chave
Abstract
Keywords
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Diálogos entre a fala e a escrita
entrevistas, discursos, cantos, etc. Em uma área que sempre encarou como
relações entre a fala e a escrita têm sido tema de muitas pesquisas. A busca é
outra podem ser influenciadas pelas regras da escrita ou recursos da fala. Que
a despeito da importância que ela nunca deixou de ter, essa perspectiva não
ser que fala e não como um ser que escreve”. Mesmo assim, seja entre leigos
de entender como elas se constituem, como nos afetam, como foi construída a
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ARTIGOS
Ong, Jack Goody e Marshall McLuhan estão entre os mais representativos. Por
isso serão aqui recuperados alguns dos principais pontos da reflexão desses
Oralidade
fala seria uma capacidade inata, como andar. Para outros, envolveria também
ainda outros, explica Mary Kato (1986), que acreditam numa evolução: teríamos
maioria das vezes existiu — sem qualquer escrita; mas nunca a escrita sem a
prontas com valores agregados são muito usadas: “Não o soldado, mas o soldado
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Diálogos entre a fala e a escrita
informações deve ser lento e repetitivo, para que seja compreendido e fixado.
se mais então o que já se sabe, o ancião, que o jovem inovador. Uma ideia
importante para Ong (1998) é a de que, entre povos orais ou que ainda preservam
imensa maioria não teve escrita, além do quê, a invenção da escrita ocorreu em
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ARTIGOS
uso da escrita pelos sumérios da Mesopotâmia foi econômica, ainda que tenha
de um som era entendida como ação, evento. Daí, “o fato de os povos orais
pretendidos. Força e poder que geraram também confusões entre povos com
e sem escrita. Pois estes últimos, em alguns casos, operando com uma lógica
Hoje nos parece tão natural que o documento escrito seja mais “confiável”,
que pode ser difícil crer que, durante muito tempo, o pensamento comum fosse
não sendo uma fonte fidedigna como a autoridade oral”. Ong (1998) cita os
estudos de Clanchy sobre uso da escrita na Inglaterra dos séculos XI e XII, para
testar a perícia intelectual dos estudantes pelo debate oral e nunca pela escrita,
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“[...] não faltam indicações de que ‘ler’, ao longo dos tempos antigos e medievais,
antigo um texto para ser lido, portanto, afinado com outros princípios, como os
autor o ditava em voz alta para si mesmo. O tom de conversa também era
presente, por isso muitos livros começavam com: “‘Hic habes, carissime lector,
librum quem scripset quidam de...’ (Aqui está, caríssimo leitor, um livro que
alheios, muitas vezes sem citar autoria e sem atribuir a si mesmo a autoria do
livro eram práticas comuns. Goldschmidt (apud MCLUHAN, 1972, p. 184) afirma:
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ARTIGOS
produzir os seus próprios livros, copiando à mão o que lhes era ditado em sala.
Cultura escrita
E que, ao longo dos anos, foram assumindo novos contornos. Entre os motivos
Com a escrita, os dados podem ser retidos num volume muito acima da
político e econômico.
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p. 34), em nenhuma outra área ele teve papel tão importante quanto no
registro de propriedades:
escrita foram graves. Eles podem facilmente ser espoliados, inclusive porque
os “dados” fixados pela escrita podem ser falsos. Goody (1987) cita o caso da
mundo letrado, é imposta pelos novos dirigentes, os não letrados são sempre
áreas maiores que as usuais entre esses povos, o que acentua a concentração
nas mãos dos que conseguem mais rapidamente dialogar com as exigências
da cultura escrita. Assim como acontecia no contexto religioso, cada vez mais
o fato de ser letrado vai se tornando condição necessária para se ter acesso a
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ARTIGOS
escrita, fica mais fácil entender a restrição que sempre houve sobre o acesso à
No mundo tipográfico
do século XV. Em seu livro A galáxia de Gutenberg (1972), como anuncia desde
tornam mais acessíveis e legíveis, a leitura passa a ser mais rápida, silenciosa,
É nesse momento que a ênfase no sonoro perde espaço para o visual. Para
o da palavra manuscrita é quase tão grande quanto a que existe entre o não-
alfabetizado e o alfabetizado”.
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Para McLuhan (1972, p. 53), uma consequência do ponto de vista fixo inerente
Isolamento similar é solicitado pela leitura, que, até então, tinha sido
escrita, “as normas só têm uma existência verbal, oral, de modo que as regras
(p. 161). Situação mais complexa é lidar com as mudanças num ambiente com
escrita, por isso tantos anacronismos são mantidos por décadas nas legislações.
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Nasce a propriedade privada das palavras, surgem leis para proteger os direitos
Continuidades
em relação aos meios pelos quais nos comunicamos: telefone, cinema, rádio,
inconteste do visual sobre o sonoro foi relativizado. Com essas novas formas de
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que estaríamos vivendo um tempo novo, mas que, em vários sentidos, evoca
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por sua dimensão mágica e mítica: “Qualquer criança ocidental cresce nessa
únicos e separados entre si” (MCLUHAN, 2011, p. 113). Para os mais novos,
Eles querem papéis a desempenhar. […] Eles já não querem metas ou tarefas
Não foi apenas McLuhan quem viu a relação entre o novo contexto que
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residualmente orais, as coisas podem ser ainda mais complexas. Seja na fala,
como escreve” (LURIA, 1986, p. 172). A isomorfia entre fala e escrita, ao que
tudo indica, tem profunda relação com o gênero utilizado. Ou seja, existem
Gêneros
(oral ou escrita). Dessa forma, ele mostra que, longe de serem estáveis, fala
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Tão diversos que gêneros orais ligados aos mesmos tipos de práticas sociais
o ato de produzir o discurso? Mary Kato (1986, p. 89) cita uma pesquisa de
Bruce e outros autores que “nos abre os olhos para algo que acontece no ato
Bruce e seus colegas pesquisadores, as coisas não ocorrem assim: “As ideias
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expressas podem ser geradoras de ideias antes não cogitadas. Nossos pontos
(KATO, 1986, p. 90). Portanto, exatamente como ocorre na fala, que mais
Considerações finais
vidas, a sua capacidade expressiva, o prazer que gera, os encontros que promove,
escrita. Isto porque “uma função nova se adquire através de uma forma velha
e uma forma nova se adquire através de uma função conhecida” (KATO, 1986,
tome contato com aquilo que ainda não sabe e, assim, passe a dominar esse
— com seus blogs, redes sociais, chats, sites com espaço para comentários,
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ideia que hoje prolifera quanto a haver uma ‘fala por escrito’ deve ser vista com
cautela, pois o que se nota é um hibridismo mais acentuado, algo nunca visto
vocais são alguns dos recursos explorados nessa nova escrita. E talvez venha
desse hibridismo a milagrosa fluência de escreventes de todas idades na internet.
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Referências
BAGNO, M. A norma oculta: língua & poder na sociedade brasileira. São Paulo: Parábola
Editorial, 2003.
1986.
Cortez, 2007.
MARCUSCHI, L.A.; XAVIER, A.C. (orgs.) Hipertexto e gêneros digitais: novas formas de
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