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UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE

FACULDADE DE DIREITO

LUIZ ISMAEL PEREIRA

QUINZE ANOS DE TUTELA ANTECIPADA:

UMA QUESTÃO DE PRINCÍPIOS

SÃO PAULO

2010
LUIZ ISMAEL PEREIRA

QUINZE ANOS DE TUTELA ANTECIPADA:

UMA QUESTÃO DE PRINCÍPIOS

Trabalho de Graduação Interdisciplinar


apresentado à Faculdade de Direito da
Universidade Presbiteriana Mackenzie
como requisito parcial à obtenção do
grau de Bacharel em Direito.

ORIENTADORA: Profª. Drª. Andrea Boari Caraciola.

SÃO PAULO

2010
LUIZ ISMAEL PEREIRA

QUINZE ANOS DE TUTELA ANTECIPADA:

UMA QUESTÃO DE PRINCÍPIOS

Trabalho de Graduação Interdisciplinar


apresentado à Faculdade de Direito da
Universidade Presbiteriana Mackenzie
como requisito parcial à obtenção do
grau de Bacharel em Direito.

Aprovado em 17, de maio de 2010.

BANCA EXAMINADORA

______________________________________________________________

Profª. Dra. Andrea Boari Caraciola – Orientadora


Universidade Presbiteriana Mackenzie

______________________________________________________________

Profª. Ms. Ana Cláudia Pompeu Torezan Andreucci

______________________________________________________________

Prof. Ms. Jouberto Quadros de Passo Calvalcante


"O outro é sempre uma questão de hermenêutica.
Para dizer quem é o outro, preciso relacionar-me a
ele e tentar expressar, com o desconto de uma
distância que jamais será apagada, algo sobre ele" –
O Brasil recalcado, Marcia Tiburi.

"Volta a pergunta maldita: terei realmente escolhido


certo? E o que é o 'certo'? Digo que todo caminho é
caminho, porque nenhum caminho é caminho. Que
aqui ou lá – London, London, Estocolmo, Índia – eu
continuaria perguntando. Minhas mãos transpiram,
transpiram. O nariz seco por dentro. Não quero
escrever mais nada hoje". – Lixo e purpurina, Caio
Fernando Abreu.

“Ser estudante é algo muito sério. É quando os


ideais se formam, é quando mais se pensa num
meio de ajudar o Brasil” – Carta ao Ministro da
Educação, Clarice Lispector.
AGRADECIMENTOS

Sendo o TGI fruto de estudos e preparação ao longo de cinco anos, não


seria possível deixar de agradecer a todos que durante todo esse tempo
contribuíram para sua efetivação. Ficam registrados meus votos:

À minha Casa, a Universidade Presbiteriana Mackenzie: sem o apoio de


todos os colaboradores dessa Instituição, não poderia ter, ao menos, iniciado a
Graduação. Como bolsista durante os cinco anos, pude desenvolver diversas
atividades proporcionadas e que agregaram para o amadurecimento das idéias aqui
expostas. Isso é Mackenzie!

Ao Corpo Docente pelo incentivo e exemplo que dá ao se dedicar à vida


acadêmica. Com o fim de não cometer as injustiças das enumerações, agradeço a
todos na pessoa da Professora Ms. Ana Cláudia Pompeu Torezan Andreucci, mulher
simples, humana, professora de alta qualidade, pesquisadora confiável, ser humano
de grande confiabilidade, companheira de seus alunos na Graduação.

Aos amigos da Turma 405 que nunca deixaram que eu desistisse de


meus ideais, que sempre me apoiaram intelectualmente, ainda que o desânimo
chegasse em determinados momentos: Maria José, Ana Luiza, Vanessa, Natacha,
Camila Morita, Debora Cazzoti, Maria Alice, Milena, Thaisa. Contem sempre comigo.

À Turma do Thiago, amigos inseparáveis que confiaram no


desenvolvimento dessa pesquisa e auxiliaram com debates e com a bibliografia:
Thiago, Cintia, Sueli, Amanda, Cristina, Leonardo, Michelle, Jonathan e Viviani.

À Professora Drª. Andréa Boari Caraciola, minha orientadora e amiga.


Com muita paciência suportou os atrasos, indicou os melhores caminhos a seguir,
respeitou o espírito criativo, valorizou as qualidades, destacou os defeitos, abriu as
portas para a vida acadêmica e deu o melhor exemplo que um aluno de Graduação
poderia ter. Com muita emoção, obrigado! Saiba que SEMPRE lhe serei grato.

Last but not least, à minha família com muito amor e carinho, em
especial à minha Mãe, Maria Aparecida, mulher sem a qual nunca poderia ter
chegado aonde cheguei, que sempre me apoiou e que lutou por mim. Sempre terá
meu agradecimento eterno!
RESUMO

Este trabalho aborda o desenvolvimento histórico da teoria dos princípios, chegando


á visão juspositivista que ganhou espaço após a segunda metade do Séc. XX. Neste
passo, verifica a diferença entre regras e princípios nas teorias de Robert Alexy e
Ronald Dworking, bem como as críticas feitas a elas. Passa a verificar que os
princípios possuem caráter prima facie cuja aplicação necessitada do caso concreto
e da ponderação frente a outras normas. Verifica o papel dos princípios na teoria
dos sistemas autopoiéticos de Nicklas Luhmann e reconhece que o sistema social é
a medida de eficácia de criação e aplicação das normas jurídicas. Passa a olhar
para a proteção jurisdicional pelo prisma constitucional, bem como a
constitucionalização dos princípios processuais como meio de assegurar a aplicação
dos direitos fundamentais. Aponta a importância do princípio do devido processo
legal e, em especial, do contraditório como seu corolário. Sobre a proteção do
entorno social por meio do processo, debruça-se sobre a influência do tempo sobre
o processo e a importância do papel criativo do Direito para driblar as injustiças pela
demora na prestação jurisdicional. Aponta a tutela antecipada como um dos meios
de acelerar o tempo no processo e passa a analisar sua introdução e modificações
passadas e as possíveis diante dos projetos de lei existentes. Por fim passa às
críticas existentes ao instituto da tutela antecipada bem como pensa em meios de
aperfeiçoá-la. Concluí pela aplicação da ponderação na apreciação do pedido de
tutela antecipada com o fim de não serem cometidas injustiças contra o cidadão.

Palavras-chave: teoria dos princípios, Juspositivismo, ponderação, Robert Alexy,


Ronald Dworking, teoria dos sistemas, Nicklas Luhmann, tutela
constitucional do processo, devido processo legal, contraditório,
sociedade, tempo, medidas de aceleração, tutela antecipada,
críticas, proporcionalidade, urgência, justiça.
ABSTRACT

This work approaches the development historical of the principles theory, arriving the
juspositivist vision that after gained space at the second half of the 20th Century.
Thus, it verifies the difference between rules and principles in Robert Alexy and
Ronald Dworking’ principle models, as well as the critical ones made they. It starts to
verify that the principles possess prima facie disposition whose application needed
the case and the balance front to other norms. It verifies the function of the principles
in autopoietic systems theory of Nicklas Luhmann and recognizes that the social
system is the measure of creation effectiveness and application of the rules of law. It
starts to look at for the jurisdictional protection for the Constitution prism, as well as
the procedural principles constitutionalization as half to assure the application of the
basic rights. It points the importance of the beginning of due process of law in special
of the contradictory. On the protection of social needs by means of the process, one
leans over on the influence of the time on the process and the importance of the
creative function of the Right to dribble the injustices for the delay in the judgment. It
points the anticipatory measures as one of the ways to speed up the time in the
process and starts to analyze its last introduction and modifications ahead and the
possible ones of the existing projects of law. Finally it passes to critical the existing
ones to the institute of the anticipatory measures as well as thinks about ways to
perfect it. I concluded for the application of the balance in the appreciation of the
order of anticipatory measures with the end not to be committed injustices against
the citizen.

Key-words: principles theory, juspositivism, balance, Robert Alexy, Ronald


Dworking, systems theory, Nicklas Luhmann, process’ constitutional
protection, due process of law, contradictory, society, time,
acceleration measures, anticipatory measures, critical,
proportionality, urgency, justice.
SUMÁRIO
Página

INTRODUÇÃO ..................................................................................... 10

1. O SISTEMA JURÍDICO: O PAPEL DOS PRINCÍPIOS NO


ORDENAMENTO ................................................................................. 13
1.1. O QUE SÃO PRINCÍPIOS? .................................................................. 13
1.2. O JUSNATURALISMO E A ABSTRAÇÃO DOS PRINCÍPIOS ............. 15
1.3. O JUSPOSITIVISMO E A NORMATIVIDADE SUBSIDIÁRIA DOS
PRINCÍPIOS ......................................................................................... 18
1.4. O PÓS-POSITIVISMO E A REVOLUÇÃO NA TEORIA DOS
PRINCÍPIOS ......................................................................................... 22
1.4.1. A CONTRIBUIÇÃO DE ROBERT ALEXY ............................................ 27
1.4.2. A CONTRIBUIÇÃO DE DWORKIN ...................................................... 31
1.5. O CONCEITO DE SISTEMA NA CIÊNCIA DO DIREITO ..................... 33
1.5.1. A TEORIA DOS SISTEMAS AUTOPOIÉTICOS DE NIKLAS
LUHMANN ............................................................................................ 35
1.5.2. CRÍTICAS À TEORIA DOS SISTEMAS AUTOPOIÉTICOS ................. 38
1.6. OS PRINCÍPIOS NO CONCEITO DE SISTEMA JURÍDICO ................ 40

2. A TUTELA CONSTITUCIONAL DO PROCESSO ............................... 42


2.1. O DIREITO PROCESSUAL CONSTITUCIONAL ................................. 44
2.2. O DIREITO CONSTITUCIONAL PROCESSUAL ................................. 47
2.2.1. O PRINCÍPIO FUNDAMENTAL DO DEVIDO PROCESSO LEGAL .... 52
2.2.1. A GARANTIA CONSTITUCIONAL DO DIREITO DE AÇÃO:
REVISITAÇÃO EM FACE DA EFETIVIDADE, JUSTIÇA E
CELERIDADE........................................................................................ 59
2.2.3. O TEMPO NO PROCESSO E MEDIDAS DE ACELERAÇÃO.............. 62

3. A TUTELA ANTECIPADA ................................................................... 68


3.1. AS REFORMAS PROCESSUAIS ......................................................... 71
3.2. A LEI nº. 8.952/94: O NASCIMENTO DA TUTELA ANTECIPADA ...... 73
3.2.1. CONCEITO, FINALIDADE E VISÃO NO DIREITO COMPARADO ...... 75
3.2.2. ESPÉCIES DE TUTELA ANTECIPADA ............................................... 79
3.3. A LEI Nº. 10.444/02: A REFORMA DA REFORMA .............................. 83
3.4. OS PROJETOS DE LEI PARA NOVA REFORMA ............................... 86
3.5. A TUTELA ANTECIPADA NO PROCESSO DE CONHECIMENTO
DO CPC E OS DEMAIS SUBSISTEMAS PROCESSUAIS .................. 88

4. CONCLUSÃO........................................................................................ 91

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS..................................................... 94

ANEXOS ............................................................................................... 110

ANEXO A – Proposições da Comissão para o Anteprojeto de


CPC ...................................................................................................... 110

ANEXO B – Projeto de Lei que introduziu a tutela antecipada:


PLC nº. 3.803/1993 .............................................................................. 124

ANEXO C – Projeto de Lei que modificou a tutela antecipada:


134
PLC nº. 3.746/2000 ..............................................................................

ANEXO D – Projeto de Lei que tramita no Congresso Nacional


para modificar a tutela antecipada: PLS nº. 186/2005 ..................... 141
ANEXO E – Projeto de Lei que tramita no Congresso para
modificar a tutela cautelar: PLS nº. 20/2006 ..................................... 145

ANEXO F – Parecer da CCJ do Senado sobre o Projeto de Lei


148
que pretende modificar a tutela cautelar: PLS nº. 20/2006 .............
10

INTRODUÇÃO

O interesse no tema desenvolvido no presente trabalho surgiu da


delitimitação de um ainda maior e que sempre nos preocupou: a efetividade do
processo de conhecimento e a eficácia social das decisões judiciais.

De um tema amplo como esse, muitas hipóteses surgiram como meio de


afunilar as pesquisas. Sem isso, o trabalho ficaria sem fim e, ainda assim, com
fôlego para ser desenvolvido. Por isso, optamos pela escolha do instituto da tutela
antecipada como técnica de aceleração do tempo no processo judicial.

A tutela antecipada, como meio processual de adiantar os efeitos da


própria sentença final de mérito, surgiu em nosso ordenamento não há quinze anos,
como poderá pensar o leitor mais apressado do título. O lapso temporal que é
apresentado se refere à introdução do instituto no processo civil de conhecimento de
rito comum, que se deu com a edição da lei nº. 8.952/94, tendo debutado no ano de
2009, quando demos início à apresentação do projeto de Trabalho de Graduação
Interdisciplinar.

Fruto da primeira etapa da reforma processual civil, integrante da Terceira


Onda de acesso à justiça, a tutela antecipada foi fruto de projeto do Poder Executivo
com o fim de dar maior efetividade a um procedimento que se mostrou ineficaz com
o passar dos anos.

Para motivar toda a carga ideológica do trabalho, expondo a intenção do


processualista contemporâneo, comprometido com a tutela das pessoas, foram
incluídos cinco anexos ao final do trabalho. Estes anexos se referem aos projetos de
lei que introduziram e modificaram a tutela antecipada, bem como os que, hoje,
tramitam no Congresso Nacional com o fim de aparar arestas descobertos ao longo
11

destes quinze anos. Além disso, juntamos como anexo as ponderações de


Anteprojeto do Novo Código de Processo Civil, pois o objetivo dessas pesquisas é
contribuir para a ciência processual, não desejando que as alterações que em breve
aconteceraão mate tanto tempo de dedicação.

Quanto ao subtítulo do trabalho, uma questão de princípios, a expressão


foi utilizada, propositalmente, com a ambiguidade característica do termo princípio:
conforme é percebido, demos dois passos para trás, num campo onde não temos
conhecimento de ter sido explorado pelos estudiosos da tutela de urgência.

Deu-se prioridade para começar o trabalho pelo subtítulo, tendo em vista


a relação de precedência dos temas. No primeiro capítulo, explora-se a teoria do
princípio, sem a mínima intenção de esgotar o tema, com o fim de remontar o
contingente necessário para entender como melhor aplicar a tutela antecipada,
tendo em vista se tratar de uma técnica que pondera princípios antagônicos, como o
da efetividade e o do contraditório.

Em que pese o tratamento linear que é dado pela maior parte dos juristas
quando se fala em princípios, o tema nos pareceu bastante árido. Reproduzimos as
idéias dos autores mais influentes na doutrina alienígena, Robert Alexy e Ronald
Dworking, bem como dos mais dedicados estudiosos em nosso país, como Paulo
Bonavides, Humberto Ávila e Luis Virgílio Afonso da Silva. As perguntas a serem
respondidas são: o que são princípios? Como se comportam no ordenamento
jurídico? São normas? Vinculam o juiz?

Não podemos nos esquecer de que o Direito, como sistema social, insere-
se num entorno que o influencia e é influenciado, devendo se preocupar com a
questão da legitimidade, sob pena de ineficácia social. A legitimidade e atuação dos
princípios jurídicos, nesse entorno, também merece atenção. Para tanto, as
pesquisas se debruçaram sobre a teoria dos sistemas autopoiéticos de Nicklas
Luhmann, uma das mais lembradas por quem se preocupa com o tema.

Assim, verificadas as premissas necessárias, bem como a correta


atuação do Direito e seus princípios, o segundo capítulo vem delimitar a tutela
constitucional do processo como consequência da preocupação do jurista com a
proteção das pessoas. O direito constitucional processual recebe destaque devido
às previsões de princípios constitucionais que afetam a relação jurídica processual,
12

bem como fundamentaram a preocupação com técnicas processuais de aceleração


do tempo, onde se insere a tutela antecipada.

No terceiro capítulo, por fim, a tutela antecipada é tratada, sendo


apresentadas as alterações legislativas e as funções e visão comparatista do
instituto. Seguindo a linha desenvolvida nos capítulos anteriores, com dois passos
para trás, neste momento damos cinco para frente, com a necessária base para o
correto entendimento da antecipação dos efeitos da tutela. Como veremos, por falta
das premissas, muito se tem produzido em tese doutrinária que infringe a natureza
dos princípios processuais.

Para tanto, valemo-nos de compilação da doutrina mais autorizada sobre


os temas expostos, bem como da visão jurisprudencial sobre os temas propostos.
Além disso, o posicionamento do direito comparado foi considerado indispensável
para compreender os institutos corretamente.

Assim, com o fim de contribuir com o melhor entendimento do instituto da


tutela antecipada, bem como de sua aplicação nesses quinze anos de vigor no
processo comum de conhecimento, o presente trabalho foi assim estruturado para
uma melhor compreensão lógica.
13

1 – O SISTEMA JURÍDICO:

O PAPEL DOS PRINCÍPIOS NO ORDENAMENTO

1.1. O que são os princípios?

Na conhecida história de Sófocles, Édipo encontra em seu caminho uma


esfinge que lhe propõe um desafio: uma charada. Como sabemos, Édipo respondeu
corretamente, venceu o desafio e prosseguiu sua jornada, culminando em seu
coroamento.

Os jusfilósofos tem enfrentado durante séculos um desafio semelhante.


Até hoje, podemos ouvir a mesma esfinge nos desafiar a responder, mutatis
mutandis: “decifra-me ou te devoro: o que são os princípios?”. Claro que não
receberemos nenhum reino por vencê-la, mas é de grande importância decifrar o
que está envolvido nos princípios dentro na Teoria do Direito, tendo em vista se
tratar, na maioria esmagadora dos ordenamentos jurídicos, de fonte produtora do
direito.

A teoria dos princípios sofreu grandes mudanças na História do Direito.


Evitaremos, primeiramente, sua conceituação, pois, comungando das idéias de
Theodor W. Adorno ao citar Nietzsche, sentimo-nos incapazes de formular tal
definição por um simples motivo: “Todos os conceitos em que um processo em sua
totalidade se resume semioticamente se subtraem a uma definição; somente o que
não tem história pode ser definido” 1.

1
ADORNO, Theodor Ludwig Wiesengrund. Introdução à sociologia. Tradução de Wolfgang Leo
Maar. São Paulo: Editora UNESP, 2008, p. 100.
14

Assim, encarando os princípios por uma visão histórica, percebemos que


seu status foi erguido por muitos dos doutrinadores juspublicistas no Direito
Comparado, migrando do caráter abstrato dos princípios gerais do Direito, de tão
difícil aplicação num ordenamento jurídico estático, para princípios constitucionais
basilares de todo o sistema jurídico. Dessa forma, dentro da dogmática jurídica
predominante nos Estados Democráticos de Direito, eles são, inequivocamente,
normas e fontes do direito.
2
Tendo em vista a palavra “princípio” ser “equívoca” ou “polissêmica” 3,
não são poucos os significados apreendidos para o termo. O muito recomendado
Prof. Paulo Bonavides, lembrando a lição de quem se aventurou no tema, auxilia-
nos ao transcorrer sobre tais significados.

Segundo Luís Diez Prazo4, deriva da linguagem da geometria, “onde


designa as verdades primeiras”. Logo acrescenta que, exatamente por isso, são
“princípios”, ou seja, “porque estão ao princípio”, sendo “as premissas de todo um
sistema que se desenvolve more geometrico”. Paulo Bonavides diz ainda, em
conformidade com Prazo5, que “os princípios são verdades objetivas, nem sempre
pertencentes ao mundo do ser, senão do dever-ser, na qualidade de normas
jurídicas, dotadas de vigência, validez e obrigatoriedade”.

Paulo Bonavides lembra, ainda, a “ponderação elementar” de F. de


Clemente, ao dizer: “assim como quem nasce tem vida física, esteja ou não inscrito
no Registro Civil, também os princípios ‘gozam de vida própria e valor substantivo
pelo mero fato de serem princípios’, figurem ou não nos Códigos” 6, tratamento
influenciado pela visão privatista do Direito Liberal.

2
SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 27ª ed. São Paulo: Malheiros,
2009. p 91.
3
GRAU, Eros Roberto. A ordem econômica na constituição de 1988 (interpretação e crítica). 2ª
ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1990, p. 95.
4
PICAZO, Luís-Diez. Los principios generales del Derecho en el pensamiento de F. de Castro, In:
Anuário de Derecho Civil, t. XXXVI, fasc. 3º, outubro-dezembro/83, pp. 1.267 e 1.268, Apud
BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional. 19ª ed. São Paulo: Malheiros, 2006, pp.
255/256.
5
PICAZO, Luís-Diez, Loc. cit..
6
CLEMENTE, F. de. El método en la aplicación del Derecho Civil. Revista de Derecho Privado, ano
IV, n. 37, outubro/16, pp. 290 e 293, Apud BONAVIDES, Paulo. Op. cit., p. Loc. cit.
15

Embora de tão grande importância, tais conceitos deixaram de lado o fato


de que os princípios foram objeto de apreensão pelo Direito Positivo. Em que pese a
renitência de alguns operadores do Direito em encarar tal realidade, os princípios
possuem caráter normativo de grande importância no nosso ordenamento jurídico.

Essa afirmação é demonstrada pelo desenvolvimento histórico da Ciência


do Direito, bem como das áreas de conhecimento de apoio como a História e a
Filosofia no Direito. Assim, por ser uma Ciência de cunho valorativo e histórico, o
que desde já mostra o acerto de Nietzsche e Adorno contra as definições, mister é
verificar tal evolução e o respectivo contingente, conforme adiante.

1.2. O Jusnaturalismo e a abstração dos princípios

O Jusnaturalismo, no período da Velha Hermenêutica, considerava os


princípios gerais do Direito como abstrações indeterminadas e, assim, carecedoras
de normatividade. Para exemplificar tal modo abstrato de encarar os princípios,
Paulo Bonavides cita Erick Wolf7, ao escrever: “ninguém sabe nada de seguro a
respeito desse Direito Natural, mas todo mundo sente com segurança que ele
existe”.

A justiça, na observação da natureza (ato elementar para a verificação da


existência dos direitos naturais), vinha da idéia de igualdade. Assim, uma estava
impregnada na outra. A ontologia, isto é a filosofia objetivista, era a idéia dominante
no Jusnaturalismo, isto porque o objeto, ou a rerum natura, estava no foco da
investigação. Sob esta ótica, destacam-se os estudos de Platão, Aristóteles, São
Tomás de Aquino e Goethe.8

7
WOLF, Erick, Das problem des naturrechtslehre – Versuch einer orientierung, Karlsruhe, 1955, p. 1,
Apud BONAVIDES, Paulo. Op. cit. p. 261.
8
Arthur Kaufman explica que o motivo da direção da filosofia do direito natural para o objeto: “Esta
atitude nasce do espanto perante o milagre dos milagres: que o sendo é e nada mais [...] O espantar-
se com o ‘estar aí’ de um mundo, que não foi feito por nós, impele a querer saber, a perguntar; pois
como me espanto, tomo consciência de que nada sei, Eu quero saber qual a razão por que o sendo é
e nada mais. Esta é a pergunta da ontologia”. (KAUFMANN, Arthur. Filosofia do direito, teoria do
direito, dogmática jurídica. In ______; HASSEMER, Winfried (orgs.) Introdução à filosofia do direito
e à teoria do direito contemporâneas. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2002, p. 37).
16

É importante observar que não se pode deitar no mesmo leito todo o


pensamento jusnaturalista desenvolvido durante as Idades Antiga e Medieval. Há
uma forte separação entre essas duas formas de ver o direito natural.

Dentre os gregos, um dos primeiros a desenvolver essa idéia foi Sófocles.


“Muitos prodígios há; porém nenhum maior do que o homem” 9. Ao dizer isso,
Sófocles tinha em mente que, o homem, na sua época, mesmo restringindo-se a
trabalhos tidos, hoje, como relativamente simples, desenvolvia demasiadamente
bem suas atividades, como corte de árvores, sua transformação em madeira
aproveitável para construção, o homem se lançando ao mar, o mundo sendo
conquistado, etc.

Eu entendi que os teus éditos não tinham tal poder (o de impedir o


sepultamento), que um mortal pudesse sobrelevar os preceitos, não
escritos, mas imutáveis dos deuses. Porque esses não são de agora, nem
10
de ontem, mas vigoram sempre, e ninguém sabe quando surgiram .

Assim, Sófocles proclama pelas palavras da heroína Antígona a


existência de um direito ligado à pessoa que existente acima do elaborado pela
vontade do homem: aqui, o édito do Rei Creonte; lá, o direito de seu irmão ser
enterrado com seus pertences 11.

Desenvolvendo o raciocínio lançado, em Protágoras, o autor clássico


12
Platão apresenta a idéia de que “o homem é a medida de todas as coisas” . A
princípio, toda percepção da realidade é um processo que dele decorre como o
objeto fruto da natureza. Assim, toda verdade, até mesmo empírica, depende do
sujeito cognoscente, tornando-se construção do ser humano. Neste texto, Platão
ainda apresenta Prometeu concedendo à humanidade a habilidade artística e de
utilização do fogo. O saber passa a diferenciá-lo.

9
SÓFOCLES. Antígona. 5ª ed.. Lisboa: Calouste Gulbenkian, 1992, v. 330-331, p.52.
10
Ibidem. v. 453-457, pp. 56/57.
11
LEMBO, Cláudio. A pessoa: seus direitos. Barueri: Manole, 2007, pp. 11 e 12.
12
RABENHORST, Eduardo Ramalho. Dignidade humana e moralidade democrática. Brasília:
Brasília Jurídica, 2001, p.15.
17

Mas em todos estes casos, tal diferenciação se dava no campo do saber:


dotado da razão, o homem poderia compreender o mundo. Era, na verdade, apenas
uma diferenciação prática dos outros animais. Ainda assim, o homem grego era
muito ligado à sua origem genealógica. O homem, como uma criação ímpar, era
digno e especial apenas para seus pares.

O Jusnaturalismo iluminista era baseado na idéia de que o Direito era


apreendido por todos, de modo individual e universal, com caráter perene e
imutável, aliás, o objeto não se alterava13. Nesse sentido, Giorgio Del Vecchio deixou
clara a doutrina que sustenta a escola:

A escola de direito natural entendeu e entende, essencialmente, sustentar a


não-arbitrariedade do direito, ou seja, a existência de uma relação
necessária entre a substância intrínseca das coisas e as respectivas regras
de direito. Também o princípio acima exposto do direito inato e absoluto da
pessoa responde a esse pensamento fundamental, pois que ele afirma,
precisamente, que a natureza real do homem implica um elemento de
transcendência, uma inerradicável e, por isso mesmo, inalienável faculdade
de superar a ordem dos fenômenos e de encontrar em si mesma a sua
determinação; numa palavra, a autonomia. O direito não pede [sic]
desconhecer esse fato, nem se recusar a tirar-lhe as conseqüências
14
práticas .

Nesse aspecto, o homem como ser cognoscente passa ter um papel


especial na apreensão do que é o direito. O homem não poderia permitir que o
Direito fosse alterado a cada momento histórico. Assim, desenvolveu-se a idéia de
que o Direito é um ser cultural, produto do ser que pensa e, por isso, deveria ser
cristalizado, o que impediria sua mutação a qualquer momento.

Hegel desempenhou um papel importantíssimo nesse momento quando,


pela dialética, pregou que o Estado era o único capaz de declarar de modo
inequívoco o que é o Direito que o homem já havia apreendido pela observação do
objeto. Assim, Hegel marcou o apogeu e derrocada do Jusnaturalismo, pois, por
suas idéias, os juristas verificaram que somente codificando as normas seria

13
Norberto Bobbio comenta: “o direito natural é aquele que tem em toda parte (pantachoû) a mesma
eficária”. (BOBBIO, Norberto. O positivismo jurídico. Trad. Márcio Pugliese, Edson Bini, Carlos E.
Rodrigues. São Paulo: Ícone, 2006, p. 17).
14
DEL VECCHIO, Giorgio. Princípios gerais do direito. Tradução de Fernando de Bragança. Belo
Horizonte: Editora Líder, 2003, p. 57.
18

possível impedir que a idéia de princípios abstratos, “considerada metafísica e


antiquada” 15, pudesse trazer insegurança à idéia de Direito posta pelo Estado.

Mesmo tendo acertado que o ideal de justiça está na essência da idéia de


princípio, os jusnaturalistas foram levados ao descrédito pela formulação tão
somente axiomática de sua concepção. Na nova concepção de mundo que se
instaurava, o Estado de Direito delimitado pela eficácia da lei, tal caráter meramente
programático não teria vez mais.

1.3. O Juspositivismo e a normatividade subsidiária dos princípios

Com a decadência do Jusnaturalismo pelas disputas travadas com a


Escola Histórica e a Escola Exegética, deu-se maior preocupação e força ao culto à
codificação, delineando a tendência dos juristas a entrar numa época, conforme
delineia Paulo Bonavides

[de] positivismo tão forte, tão dominante, tão imperial, que ainda no século
XX os cultores solitários e esparsos da doutrina do Direito Natural nas
universidades e no meio forense pareciam se envergonhar do arcaísmo de
16
professarem uma variante da velha metafísica jurídica .

Nesta época, o Positivismo jurídico vê os princípios gerais do Direito como


verdades gerais, produtos de sucessivos processos de generalização da lei, aqueles
decorrendo destas. De fato, Flórez-Valdés fundamenta tal pensamento dizendo que

15
BARROSO, Luis Roberto; BARCELLOS, Ana Paula de. O começo da história. A nova interpretação
constitucional e o papel dos princípios no direito brasileiro. A nova interpretação constitucional:
ponderação, direitos fundamentais e relações privadas. 3ª ed. rev. Rio de Janeiro: Editora Renovar,
2008, p. 335.
16
BONAVIDES, Paulo. Op. cit., p. 260. No mesmo sentido, Del Vecchio comenta: “Não obstante a
repulsa ao direito natural é reputada, ainda hoje, comumente, indispensável ato de fé e quase dever
de bom crédito para o jurista, do que temos precisamente uma prova na rapidez com que,
interpretando a fórmula acima indicada, se costuma negar, antes de tudo, que ela contenha alusão a
tal direito, como se tratasse de afastar uma injuriosa suspeita” (DEL VECCHIO, Giorgio. Op. cit. pp.
9/10).
19

os princípios, com efeito – prossegue - já estão dentro do Direito Positivo e,


por ser este um sistema coerente, podem ser inferidos do mesmo. Seu valor
lhes – conclui - vem não de serem ditados pela razão ou por constituírem
17
um Direito Natural ou ideal, senão por derivarem das próprias leis .

As leis comandam independentemente dos valores que se esforçasse a


atribuir a elas. O Estado diz o que é o Direito, sendo este nada mais do que o
conjunto dos comandos emanados do poder e que regulamentam a ordem social18.
Fruto do positivismo filosófico, o Juspositivismo pretendera criar a idéia de uma
“ciência jurídica”, buscando objetividade científica, sendo fundada em juízos de fato,
não de valor19, não importando o objeto do filosofar, mas as decisões do sujeito
pensante. Destarte, o Juspositivismo reduziu os princípios gerais do Direito a meras
normas programáticas que são tidas, pela ideologia do Direito Positivo, como meras
fontes subsidiárias de normatividade20.

As Constituições dos Estados Modernos sofreram diversas modificações


em sua forma e matéria. No chamado Antigo Regime, tais cartas de direitos não
eram nada mais do que prolongamentos do pensamento ideológico estéril do
positivismo. Segundo Carla Pinheiro,

Já nas Constituições do Ancien Régime, era dever do senhorio ser justo


com seus súditos. Existiam até direitos adquiridos, Rechtsverbürgung, e
cartas de liberdade, Freiheitsburg, que podiam limitar os direitos do
soberano. Todas essas conquistas não vigoravam, porém, como direitos do
homem diante do Estado, mas por direitos assegurados por meio de

17
FLÓREZ-VALDES, Los princípios generales del Derecho y su formulación constitucional. Madri,
1990, p. 39, Apud BONAVIDES, Paulo. Op. cit., p. 263.
18
LEMBO, Cláudio. Op. cit. pp. 13/14.
19
BARROSO, Luis Roberto; BARCELLOS, Ana Paula de. Op. cit. p. 335.
20
Arthur Kaufmann difere o objetivismo jusnaturalista (espanto quanto ao objeto) do subjetivismo
juspositivista (dúvida quanto ao apreendido pelos sentidos): “A atitude face ao mundo altera-se
quando se começa a filosofar com a dúvida. O olhar não se dirige às coisas tal qual elas se
apresentam, mas ao sujeito pensante. A consciência, não o ser, é a origem. O ser é qualificado como
um produto da consciência. O homem torna-se a medida de todas as coisas, como já ensinara
Protágoras. A filosofia torna-se absolutamente subjectivista, torna-se filosofia da consciência [...] o
que foi dito vale, correspondentemente, para a filosofia do direito. Se esta não tem como ponto de
partida o espanto perante uma ordem inerente ao ser, mas antes a dúvida sobre se uma tal ordem a
existe de todo, então deixa de estar, como diz Rudolf Stannler, o problema do ‘conhecimento do
direito’. Nega-se uma essencialidade autônoma que compreende as leis concebidas pela
omnipotência do legislador (positivismo). A idéia do direito natural já nem sequer é compreendida”.
op. cit,. p. 39/40.
20

acordos. A maioria eram direitos coletivos, não individuais e, não obstante


21
as garantias de que gozavam, poderiam vir a ser subtraídos .

Somente com os movimentos revolucionários ocorridos a partir do século


XVIII tais modificações se mostraram relevantes. Anteriormente, entendia-se por
Constituição, salvo entendimentos diversos, o conjunto de regras e normas
orgânicas que regulavam a atribuição e exercício do poder político, a forma do
governo, a escolha de seus titulares, a ação de tais órgãos etc.

A partir de 1776, com os movimentos revolucionários americanos frente


ao Absolutismo, passou-se a estender ao conceito de Constituição a concepção de
Direitos Fundamentais como uma tentativa de determinar os limites do monstro mais
frio da época: o Estado. Os direitos da personalidade e da dignidade do homem
passaram a ser tratados como bens a serem juridicamente protegidos.

Era a influência do chamado Jusnaturalismo, o qual prega que o Direito


Natural pressupõe a existência de direitos inerentes ao ser humano que antecedem
à lei. Com a mudança do paradigma efetuada pela Escola do Direito Natural, houve
a transposição do entendimento teológico para o racional ao se considerar o ser
humano como titular de tais direitos devidos única e exclusivamente à sua natureza
de homem. Por ser vivo possui prerrogativas que não podem ser violadas, cabendo
ao Estado tutelá-las.

Com a Declaração dos Direitos do Homem, de 1789, ficou clara tal


influência do Jusnaturalismo e sua carga de princípios fundantes, conforme vemos
em seu artigo 16: “Toda a sociedade em que não esteja assegurada a garantia dos
direitos nem determinada a Separação dos Poderes não tem Constituição”. (grifo
nosso)

Como um contrato, a partir de então, súditos e também o soberano


deveriam respeitar a Constituição do Estado como superior a toda e qualquer norma
ou ato normativo, amoldando-se a ela sempre.

21
PINHEIRO, Carla. Direito internacional e direitos fundamentais. Ed. São Paulo: Editora Atlas,
2001 p. 63.
21

22
Na percepção do Prof. Tércio Sampaio Ferraz Jr. , nessa época, a lei
recebe o valor de base principal dos sistemas jurídicos, sendo alçada “[à] principal
fonte do direito”. Desse modo, o direito passa a mudar toda a vez que tais normas
forem mudadas.

Usando os termos de Tércio Sampaio, “essa verdadeira


institucionalização da mutabilidade do direito na cultura de então corresponderá ao
chamado fenômeno da positivação do direito”23. Nos sentidos filosóficos e
sociológicos, continua dizendo que o fenômeno da positivação designa, no primeiro
sentido, “o ato de positivar, isto é, de estabelecer um direito por força de um ato de
vontade... o direito é um conjunto de normas que valem por força de serem postas
pela autoridade constituída e só por força de outra posição podem ser revogadas”.
Já no segundo, “positivação é um fenômeno que naquele século será representado
pela crescente importância da lei votada pelos parlamentos como fonte do direito... A
redução do jurídico ao legal foi crescendo durante o século XIX, até culminar no
chamado legalismo”24.

Não podemos nos posicionar nas fileiras que entendem que o Direito é
apenas aquele previsto pela lei. Tal suposta cientificidade, objetividade, separação
entre sujeito-objeto propostos pelo positivismo não passa de tentativa de
compatibilidade entre o Direito, como ciência social aplicada, às ciências naturais. A
universalização das situações vistas no dia-a-dia da vida social não é válida só
porque existente na produção do legislador. Tais falácias fizeram se levantar
diversas vozes que começaram na filosofia geral do Século XX (Hans-Georg
Gadamer – na hermenêutica; Adorno, Horkkeimer, Marcuse e Benjamin – na filosofia
social; Arendt – na filosofia política).

No campo da Filosofia no Direito25, Norberto Bobbio nos mostra o


equívoco de tal simples concepção de que somente a lei posta designa o que

22
FERRAZ JUNIOR, Tércio Sampaio. Introdução ao estudo do direito: técnica, decisão,
dominação. 4ª ed. São Paulo: Editora Atlas, 2003, p. 74.
23
FERRAZ JUNIOR, Tércio Sampaio. Loc. cit., onde cita Luhmann, Rechtssoziologie. Hamburgo:
Rowohlt Taschenbuch, 1972, sem indicação de página.
24
FERRAZ JUNIOR, Tércio Sampaio. Loc. cit.
25
O termo Filosofia no Direito, em detrimento de Filosofia do Direito, é utilizado por Lenio Luiz Streck
para determinar que a Filosofia não pode ser utilizada como discurso otimizador do Direito, mas sim
“condição de possibilidade”. Pelas razões expostas, adota-se essa terminologia. (STRECK, Lenio
Luiz. Da “justeza dos nomes” à “justeza da resposta”. Revista do Instituto dos Advogados de São
22

Direito, o que é a norma, embora ainda no pensamento Positivista. O Jurista de


Turim adverte:

Os princípios gerais são, a meu ver, normas gerais ou generalíssimas do


sistema, são as normas mais gerais. O nome de princípios induz em
engano, tanto que é velha questão entre juristas se os princípios são ou não
normas. Para mim não há dúvida: os princípios gerais são normas como
26
todas as outras (grifo nosso).

Esta é a posição tomada como a mais correta pelos juristas modernos:


norma é gênero, princípios e regras são espécies de mesma força vinculante.

1.4. O Pós-Positivismo27 e a revolução na teoria dos princípios

Nesta terceira fase, os princípios deixam de ser encarados como apenas


abstrações carecedoras de normatividade, bem como recebem o devido valor a que
se lhes presta, sendo mais do que generalizações do direito positivo. Passa-se,
definitivamente, a encarar o caráter normativo dos princípios, fato que tem obrigado
os Estados e organismos internacionais a salvaguardá-los por meio das leis.

Norberto Bobbio aponta tal momento de mudança quando cita o esforço


da antiga Liga das Nações ao estabelecer a Suprema Corte Permanente de Justiça,
em Haia, nos idos de 1.92028, ao dizer:

Paulo. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, Nova Série, Ano 11, nº. 22, jul-dez. de 2008, p. 138,
nota 5).
26
BOBBIO, Norberto. Teoria do ordenamento jurídico. 10ª ed. Brasília: Editora UNB. 2006, p. 158.
No mesmo sentido, destaca-se o ataque de Giorgio Del Vecchio ao Juspositivismo: “As normas
sancionadas pelo direito positivo podem não corresponder, em absoluto, aos princípios deduzidos da
razão e contradizê-los em parte, ou modificá-los,ou, de vários modos, restringi-los” (DEL VECCHIO,
Giorgio. Op. cit. p. 60.
27
Vale destacar que os conceitos de “pós-positivismo” e “neoconstitucionalismo” baseados numa
“nova hermenêutica” já foram duramente criticados com base na idéia de que, desde a produção de
Carlos Maximiliano, não houve alteração das idéias que hoje seriam expostas como “novas”. Na
verdade, seria um modismo para a apresentação de um direito constitucional nu bem diante de
nossos olhos, como no conto A nova roupa do Rei, de Hans-Christian Andersen. (HORBACH, Carlos
Bastide. A nova roupa do direito constitucional: neo-constitucionalismo [sic], pós-positivismo e outros
modismos. In Revista dos Tribunais. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, ano 96, n. 859, maio
de 2007, pp. 81/91).
23

Uma nova e mais intensa fase acerca da natureza, validade e conteúdo dos
princípios gerais do direito é iniciada quando o art. 38 do Estatuto da Corte
Permanente de Justiça Internacional (1920) enumerou entre as fontes nas
quais a Corte poderia fazer referência para a resolução de uma
controvérsia, além dos tratados e costumes internacionais, na terceira parte
estatuiu ‘os princípios gerais do direito, reconhecidos pelas nações
29
civilizadas’ (tradução nossa).

O jusfilósofo de Turim, sabiamente, refere-se aos efeitos dos princípios


gerais do direito como servindo, agora, ao mesmo fim para que servem as normas
expressas, perguntando, ao cabo: “E por que então não deveriam ser normas?”30.

Percebeu-se, então, que as leis respeitadas sempre à risca não eram tão
bem vistas. O que fazer se o Estado criasse um novo método de execução capital,
atentando contra princípios que existem devido à própria idéia de ser humano?
Como garanti-los? O tempo mostrou que as melhores Constituições seriam, não as
mais bem escritas, nem as mais bem pensadas, mas as que pudessem se adaptar
aos anseios de seu povo. Segundo o professor Vitor Evangelista, “integral o papel
da razão numa tradição viva, eis a fórmula óptima de Constituição [sic]” 31.

Perante as experiências históricas da aniquilação do ser humano


“(inquisição, escravatura, nazismo, stalinismo, polpotismo, genocídios étnicos,

28
Anote-se que tal fórmula foi definitivamente consagrada no artigo 38, 1 “c” do Estatuto de sua
sucessora, a Corte Internacional de Justiça.
29
“Una nuova e piú intensa fase di ricerca sulla natura, sulla validità e sul contenuto dei princìpi
generali di diritto è cominciata quando l’art. 38 dello Statuto della Corte permanente di giustizia
internazionale (1920) enumerò tra le fonti cui la Corte avrebbe potuto far riferimento per risolvere una
controversia, oltre i trattati internazionali e la consuetudine internazionale, al terzo posto ‘i princìpi
generali de diritto riconosciuti dalle nazioni civilli’”. (BOBBIO, Norberto, Principi Generali di Diritto, In:
Novissimo Digesto Italiano. Vol. 13. Turim: Vtet, 1957, pp. 887/896).
30
Paulo Bonavides, Op. cit., p. 264, ainda nos elucida quanto aos pensamentos de Bobbio: “Com
efeito, os critérios [i.e. os diversos critérios elucidativos da distinção que vai dos princípios às “outras”
normas] aparecem congregados por Bobbio em cinco categorias principais. Primeiro, diz ele, ‘os
princípios gerais são pura e simplesmente normas mais gerais’; segundo, ‘são normas fundamentais
ou normas de base do sistema ou traves mestras, como se tem dito metaforicamente, na acepção de
que sem eles o sistema não poderia subsistir como ordenamento efetivo das relações de vida de uma
determinada sociedade’; terceiro, são normas diretivas ou princípios gerais; quarto, são normas
indefinidas, e quinto são normas indiretas”. – referências ao texto de Bobbio, Principi Generali di
Diritto. In Novissimo Digesto Italiano. Vol. 13. Turim: Vtet, 1957, pp. 890 e 891.
31
EVAGELISTA, Vitor. História das constituições políticas internacionais. Lisboa: I.L., 1978, p.
50.
24

regimes militares autoritários)”32-33 princípio como a dignidade da pessoa humana,


núcleo base do Estado Moderno, significam, como muito bem conceitua J.J. Gomes
Canotilho, “sem transcendências ou metafísicas, o reconhecimento do homo
noumenon, ou seja, do indivíduo como limite e fundamento do domínio político da
República” 34.

O Direito veio salvaguardar o que a humanidade tinha de mais caro: a


dignidade do homem e, para isso, instrumentalizou-se com o fim de dar maior
eficácia a essa característica a priori do ser humano. O caráter tridimensional do
Direito, ou dimensões da realidade jurídica, mostrou-se forte nesse momento. Nas
palavras de Miguel Reale ao definir sua teoria do Direito:

Onde quer que haja um fenômeno jurídico, há sempre e necessariamente,


um fato subjacente, um valor que confere determinada significação a esse
fato, inclinando ou determinando a ação dos homens no sentido de atingir
ou preservar certa finalidade ou objetivo e finalmente, uma regra ou norma,
que representa a relação ou medida integra um daqueles elementos ao
35
outro, o fato ao valor .

Os princípios passaram, dessa forma, a ser encarados pelo Estado como


normas, para que seja garantido o minimmum necessário para que a dignidade da
pessoa humana possa se expressar e concretizar como proteção diante das
ingerências36. Bem observou Manuel Gonçalves Ferreira Filho:

32
CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito constitucional e teoria da constituição. 7. ed., 4.
reimp. Coimbra: Almedina, 2006, p. 225.
33
Hannah Arendt, ao relatar o julgamento de Adolf Eichmann ocorrido em Jerusalém, no ano de
1961, descreveu muito bem a situação político-social instaurada na Alemanha durante a Segunda
Guerra Mundial e que legitimou, por meio da legalidade, as ingerências praticadas contra o ser
humano, situação que ficou conhecida na filosofia política como “banalização do mal”. Por todos,
reproduz-se o impacto da autora como um testemunho histórico: “Eichmann, muito menos inteligente
e sem nenhuma formação, percebeu pelo menos vagamente que não era uma ordem, mas a própria
lei que os havia transformado a todos em criminosos. [...] Nem é preciso acrescentar que a
parafernália legal resultante, longe de ser um mero sintoma do pedantismo ou empenho alemão,
serviu muito eficientemente para dar a toda a coisa aparência de legalidade”. (ARENDT, Hannah.
Eichmann em Jerusalém. Traduzido por José Rubens Siqueira. São Paulo: Companhia das Letras,
1999, p. 167).
34
CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Loc. cit..
35
REALE, Miguel. Lições preliminares do Direito. 26ª ed. rev. São Paulo: Editora Saraiva, 2002, p.
65.
36
Para finalizar o suporte filosófico das três teorias, lembram-se, ainda, as palavras de Arthur
Kauffman sobre o direito diante de fatos que de “‘situações-fronteira’ da existência”: “A tomada de
25

A partir do final da Segunda Guerra Mundial, voltou à cena a idéia de que,


acima do direito positivo, existe outro Direito que se imporia a este, lhe
orientaria o conteúdo e a ele estabeleceria limites. Um direito, pois,
“suprapositiivo” ou “supralegal”
Tal Direito se posicionaria acima da própria Constituição, habitualmente
vista como lei suprema. Assim, se poderia também dizê-lo
37
“supraconstitucional”, consoante muitos o fazem .

Hoje, é inegável a função interpretativa e integrativa dos princípios no


processo de acolmatação, ou de se fechar as brechas, dos ordenamentos jurídicos
contemporâneos. Mais recentemente, passaram de uma fase programática – de
normatividade ainda abstrata na aplicação da lei no caso concreto, a uma fase
objetiva, a qual tem determinado o caráter positivo dos princípios, garantindo-se
constitucionalmente sua proteção e dando-se subsídios para que saiam do plano da
idéias e migrem para a aplicação.

Estando, agora, no coração das Constituições Modernas que instituíram


o Estado Democrático de Direito, os princípios têm caráter de “norma normarum, ou
seja, norma das normas”38. Pela constitucionalização, como regras basilares do

consciência desta situações-limite (sic), a percepção da própria fraqueza e impotência impele, já dizia
Epicteto, à tomada de posição, à pergunta sobre o sentido da existência. ‘A aflição ensina a pensar.’
(Ernst Bloch) [...] o positivista vê apenas a lei, fecha-se perante qualquer momento supralegal do
direito pelo poder político, tal como, aliás, experimentamos no nosso século até à náusea. O
jusnaturalista valoriza pouco a lei positiva, apostando em normas pré-concebidas. No entanto, como
não consegue apresentá-las de forma cognoscível, acaba por conduzir à certeza do direito e à
arbitrariedade, o que ficou especialmente patente no século XVIII ‘jusnaturalista’. Daí que, em
nenhuma delas, o direito chegue até si próprio” (op. cit., p. 41).
Claro que, no mesmo sentido de Arthur Kaufmann, entendemos que se deve evitar o existencialismo
extremista de Sartre, isto porque o filósofo desenvolve um conceito extremo de liberdade ao dizer que
“a existência precede a essência”. O sujeito, na concepção existencialista de Sartre, por tomar
consciência que existi possui liberdade ampla para definir-se e também seus princípios de moral e
ética, atingindo o universal ao definir, também, o outro. Daí vem a definição sartreana de angústia
com a responsabilidade que a ampla liberdade traz. O Direito, em sentido contrário, tem como
postulado básico a ordenação das relações sociais, o que implica a restrição das liberdades. Com
isso, já se pode inferir que o existencialismo não possui ampla aceitação na ciência jurídica. A aflição
existencial pela qual a humanidade passou no Século XX nos levou a novos campos, mas nem tudo
pode ser aceito como verdadeiro, sob pena de retorno à barbárie. Para maiores digreções sobre o
existencialismo jurídico, ver BITTAR, Eduardo Carlos Bianca; ALMEIDA, Guilherme Assis de. Curso
de filosofia do direito. 2ª ed. São Paulo: Editora Atlas, 2002, capítulo 20, passim.
37
FERREIRA FILHO, Manuel Gonçalves. Princípios fundamentais do direito constitucional: o
estado da questão no início do século XXI, em face do direito comparado e, particularmente, do
direito positivo brasileiro. São Paulo: Editora Saraiva, 2009, p. 107.
38
BONAVIDES, Paulo, Op. cit., p. 290.
26

Estado, os princípios são as normas supremas do ordenamento jurídico, dando


origem às leis e a elas servindo como limitações.

Como se viu, trata-se de um movimento de reação ao pensamento


jusnaturalista, caracterizado por suas aporias, bem como ao pensamento
juspositivista, mergulhado na razão instrumental, que reduz o direito e justo ao legal.

Parece haver consenso quando se comenta que o mundo, a partir dos


anos 50 de século XX, entrou em uma nova fase de evolução social ecultural. “A
sociedade entrou na era pós-industrial e a cultura na pós-modernidade”39. O que nos
interessa são os traços característicos da pós-modernidade, como anota Paulo
Hamilton Siqueira Jr.40:

(1) sociedade de massa; (2) individualismo; (3) Era da Informática com


tratamento computadorizado das informações e intensificação da linguagem
dos signos; (4) sociedade de consumo; (5) hedonismo; (6) apego à filosofia
niilista, que nega a existência de valores absolutos como verdade e preceito
ético.

Por isso, afirmamos que os preceitos éticos que o pós-positivismo


introduziu, como reação da epstemologia, ao alçar os princípios à categoria
normativa própria, sem depender da força legalista são de ral importância para o
desenvolvimento da proteção do homem.

Muitos foram os pensadores que enriqueceram o desenvolvimento da


doutrina do Pós-Positivismo, estabelecendo as diferenças entre regras e princípios
como Alexy e Dworking. Cabe, neste momento, uma advertência: O Pós-Positivismo
está longe de manter coerência doutrinária. Há diversas concepções, muitas vezes
contraditórias, que possuem igual influência nas Escolas do Direito por todo o
mundo, resultando, ainda, num sincretismo que é acusado como “talvez o pecado

39
SIQUEIRA JR., Paulo Hamilton. Constituição e pós-modernidade. In Revista do Instituto dos
Advogados de São Paulo – IASP. São Paulo: IASP, Nova Série, ano 11, n°. 22, jul .-dez. 2008, p.
205.
40
Ibidem, p. 206.
27

mais sério da doutrina hodierna”41. Mas em algo, todos concordam: os princípios


possuem força normativa tanto quanto as regras.

Tais diferenças são de extrema importância para o posterior


desenvolvimento do trabalho, pois as premissas adotadas poderão alterar as
conclusões. Assim, passa-se a verificar as concepções de ambos os juristas, bem
como as críticas feitas a essas teorias.

1.4.1. A contribuição de Robert Alexy

Robert Alexy, catedrático da Universidade de Kiel, na Alemanha,


desenvoleu uma influente doutrina sobre a força normativa dos princípios. Suas
idéias são expostas de maneira clara em sua obra Teoria dos direitos
fundamentais (Theorie der Grundrecht), a qual foi recebida pela comunidade
jurídica brasileira das academias até a cúpula do Poder Judiciário.

Primeiramente, cabe esclarecer que o fato de Alexy desenvolver toda sua


teoria dos direitos fundamentais seguindo uma metodologia restritiva ao direito posto
na Constituição alemã não anula nosso campo de pesquisa como base de direito
comparado. Aliás, o próprio autor destaca que as “teorias histórico-jurídicas, no
âmbito da interpretação histórica, e teorias de direitos fundamentais de outros
países, no âmbito da interpretação comparada”42, formam papel significativo para
que também possamos entender a ideologia da nossa Constituição, bem como a
interpretação mais moderna dada aos direitos fundamentais.

A importância da teoria desenvolvida por Alexy reside em sua proposta,


para a qual “a ciência dos direitos fundamentais impõe-se como tarefa de dar
respostas racionalmente fundamentadas às questões relativas a esses direitos”43.
Sobre sua proposta, comentaremos mais adiante44.

41
NERY JUNIOR, Nelson. Princípios do processo na constituição federal. 9ª ed. rev., ampl. e
atual. com as novas Súmulas do STF (simples e vinculantes) e com análise sobre a relativização da
coisa julgada. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009, p. 35.
42
ALEXY, Robert. Teoria dos direitos fundamentais. Traduzido por Virgílio Afonso da Silva. São
Paulo: Malheiros, 2008, p. 32.
43
Ibidem, p. 28 e 158.
44
Ver item 1.4.2., infra.
28

Alexy parte do pressuposto de que toda norma de direito fundamental é,


antes de tudo, uma norma, compartilhando dos problemas que acompanham o
conceito do signo estudado pela Filosofia no Direito e pela Ciência do Direito45.
Assim, Alexy deixa claro que a norma e o enunciado normativo se diferem por que
aquela é o conceito primário deste, ou seja, “uma norma é, portanto, o significado de
um enunciado normativo” e, para concluir, diz que “a mesma norma pode ser
expressa por meio de diferentes enunciados normativos” 46.

Alexy parte do conceito para o estudo da estrutura das normas de direito


fundamental, o que mais nos interessará mais de perto, pois, nesse momento, o
autor passa à distinção entre regras e princípios.

A teoria dos direitos fundamentais de Alexy se baseia na expressão:


“tanto regras quanto princípios são normas, porque ambos dizem o que deve ser” 47.
Para diferenciar as espécies de norma, deixa de lado o critério da generalidade,

45
ALEXY, Robert. Op. cit., p. 51.
46
Ibidem., p. 54.
47
Ibidem, p. 87. A condensação das idéias doutrinárias de regras e princípios como espécies do
gênero norma não parece uníssona. No mesmo sentido de Robert Alexy, já se posicionou a maior
parte da doutrina, embora, sem a “conceituação precisa de normas e regras”, como aponta José
Afonso da Silva (op. cit., p. 92), entre os quais se destacam: “O decisivo, por enquanto, é saber que a
qualificação de determinadas normas como princípios ou como regras depende da colaboração
constitutiva do intérprete” (ÀVILA, Humberto. Teoria dos princípios: da definição à aplicação dos
princípios jurídicos. 8ª ed. São Paulo: Malheiros, 2008, p. 35.); “(1) as regras e princípios são duas
espécies de normas; (2) a distinção entre regras e princípios é uma distinção entre duas espécies de
normas” (CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Op. cit., p. 1160.); “Já se torna cada vez mais
difundido entre nós esse avanço fundamental da teoria do direito contemporânea, que, em uma fase
‘pós-positivista’, com a superação da antítese entre o positivismo e o Jusnaturalismo, distingue
normas jurídicas que são regras, em cuja estrutura lógico-deôntica há a descrição de sua ocorrência,
daquelas que são princípios, por não trazerem semelhante descrição de situações jurídicas, mas sim
a prescrição de um valor, que assim adquire validade jurídica objetiva, ou seja, em uma palavra,
positividade” (GUERRA FILHO, Willis Santiago. Processo constitucional e direitos fundamentais.
5ª. ed. ampl. São Paulo: RCS Editora, 2007, pp. 62/63); “[os princípios] Não se contrapõem às
normas, contrapõem-se tão-somente aos conceitos; as normas jurídicas é que se dividem em
normas-princípios e em normas-regras” (MIRANDA, JORGE. Manual de direito constitucional:
Constituição. Tomo II. 5ª. Ed. rev. e atual. Coimbra: Coimbra Editores. p. 250); “As normas
constitucionais encontram-se estruturadas normativamente sob a forma de princípios e de regras”
(PEREIRA, Jane Reis Gonçalves; SILVA, Fernanda Duarte Lopes Lucas da. A estrutura normativa
das normas constitucionais: notas sobre a distinção entre princípios e regras. In Os princípios da
constituição de 1988. PEIXINHO, Manoel Messias. Et alli (Coords). Rio de Janeiro: Editora Lumen
Juris, 2001, p. 3.). Na jurisprudência brasileira, não podemos fechar os olhos para o voto do Min. Eros
Grau no julgamento da ADPF nº. 33-5/PA: “Sr. Presidente, como é possível que, no futuro, alguém
leia esse acórdão com interesse acadêmico, eu queria ressalvar que, para mim, preceito é princípio e
regra; ou seja, preceito ou norma é gênero, espécies são princípio e regra. Única e exclusivamente
com cuidado acadêmico, deixo isso registrado” (STF, ADPF nº. 33, Relator Min. GILMAR MENDES,
Tribunal Pleno, Governo do Estado do Pará e Instituto do Desenvolvimento Econômico-Social do
Pará – IDESP, julgado em 07/12/2005, DJ 27-10-2006, PP-00031, EMENT VOL-02253-01, PP-00001,
RTJ VOL-00199-03, PP-00873, ação julgada procedente por unanimidade).
29

48
filiando-se ao critério hipotético-condicional , procedendo a uma “distinção
qualitativa, e não uma distinção de grau” , ou “de caráter lógico” 50.
49

Para diferenciá-los, o autor reconhece como decisivo que enquanto


aqueles seriam mandamentos de otimização, realizados dentro das realidades
fático-jurídicas existentes no momento da aplicação, estas seriam mandamentos de
determinação, ou seja, valem ou não valem, são satisfeitas ou não são satisfeitas.

Para ficar mais clara a distinção entre regras e princípios, deveríamos,


conforme proposto, verificar os diferentes comportamentos tomados quando se
verifica um conflito de regras e uma colisão entre princípios.

No primeiro caso, a solução ideal seria a introdução de uma cláusula de


exceção, elegendo-se uma das regras conflitantes como geral e, a outra, como
excepcional. Não sendo possível tal solução, deve-se aplicar as regras de solução
de antinomias conhecidas: lex posterior derogat legi priori e lex specialis derogat legi
generali. O importante é ter em mente que a decisão de qual regra é aplicável é uma
decisão sobre validade, não sendo possível que dois juízos que sejam
contraditórios, e com soluções diversas no modo se, então, sejam ambos válidos51.

No segundo caso, a solução para a colisão entre os princípios deverá ser


encontrada na dimensão do peso: em face das condições concretas, o hermeneuta
deverá verificar qual dos princípios tem precedência em face do outro, sendo que
este último terá que ceder. Vale destacar o comentário do autor:

48
Explicando o caráter hipotético-funcional, Humberto Ávila comenta: “Em primeiro lugar, há o critério
do caráter hipotético-condicional, que se fundamenta no fato de as regras possuírem uma hipótese e
uma conseqüência que predeterminam a decisão, sendo aplicadas ao modo se, então, enquanto os
princípios apenas indicam o fundamento a ser utilizado pelo aplicador para futuramente encontrar a
regra para o caso concreto” (ÀVILA, Humberto. Op. cit., p. 39), vale dizer, aquelas permitem a
subsunção de comportamentos, enquanto estes, para Alexy, possuem um caráter ideal no momento
de aplicação (BUSTAMANTE, Thomas da Rosa de. Sobre a justificação e aplicação de normas
jurídicas: Análise das críticas de Klaus Günther e Jürgen Habermas à teoria dos princípios de Robert
Alexy. In Revista de Informação Legislativa. Brasília: Senado Federal, Subsecretaria de Edições
Técnicas, ano 43, nº. 171, jul./set. de 2006, pp. 81/90, em especial p. 82).
49
ALEXY, Robert. Op. cit., p. 91.
50
SILVA, Virgílio Afonso da. Princípios e regras: mitos e equívocos acerca de uma distinção. In
Revista Latino-Americana de Estudos Constitucionais. Belo Horizonte: Del Rey, ano 1, jan./jun.
de 2003, pp. 607/630, em destaque p. 612.
51
ALEXY, Robert. Op. cit., p. 92/93. O autor não se refere expressamente sobre a regra da lex
superior derogat legi inferior, mas se refere ao critério de “importância de cada regra em conflito”.
30

Portanto, se isoladamente considerados, ambos os princípios conduzem a


uma contradição. Isso significa, por sua vez, que um princípio restringe as
possibilidades jurídicas de realização do outro. [...] A solução para essa
colisão consiste no estabelecimento de uma relação de precedência
condicionada entre os princípios, com base nas circunstâncias do caso
52
concreto .

Dessa diferenciação proposta, decorre uma das principais características


dos princípios na obra de Alexy: seu caráter prima facie, que quer dizer que “os
princípios exigem que algo seja realizado na maior medida possível dentro das
possibilidades jurídicas e fáticas existentes”53, ou seja, “o grau de realização, como
visto, pode variar”54.

Como se vê, “a natureza dos princípios implica a máxima da


proporcionalidade, e essa implica aquela”. Assim, dá-se maior força à idéia de que o
sopesamento é primordial para a realização de um princípio em face de outro
antagônico55-56.

Visto o sopesamento para a solução de conflitos decorrentes do caráter


prima facie dos princípios, bem como a inevitável aplicação do princípio da
proporcionalidade, chega-se à conclusão do autor de que não pode subsistir a idéia

52
ALEXY, Robert. Op. cit., p. 96. Por meio de símbolos, Alexy resume: “(K) Se o princípio P1 tem
precedência em face do princípio P2 sob as condições C: (P1 P P2), e se do princípio P1, sob as
condições C, decorre a conseqüência jurídica R, então, vale uma regra que tem C como suporte
fático e R como consequência jurídica: C  R. Uma formulação menos técnica seria: (K’) As
condições sob as quais um princípio tem precedência em face de outro constituem o suporte fático de
uma regra que expressa a consequência jurídica do princípio que tem precedência”. Idem Ibidem, p.
96.
53
Ibidem, pp. 104/105.
54
SILVA, Vírgilio Afonso da. Op. cit., p. 611.
55
ALEXY, Robert. Op. cit., pp. 116/120.
56
O princípio da proporcionalidade é composto por três subprincípios: (i) o da adequação, (ii) o da
necessidade e (i) o da proporcionalidade strictu sensu. Pelo primeiro, verificamos o meio correto para
levar ao fim um determinado interesse. É importante, nesse passo, que a medida leve,
necessariamente, ao fim pretendido, que seja idônea. Pelo segundo, verifica-se a indispensabilidade
da medida para a conservação do direito, vale dizer: se é o meio menos gravoso. Pelo terceiro.
Verifica-se a própria exigência do sopesamento, apreciando-se o conteúdo e a relação custo-
benefício da medida a se adotar. Aparenta-se, portanto, à equidade, conforme comentado por Paulo
Bonavides, visando uma distribuição equânime de ônus (ALEXY, Robert. Op. cit., pp. 116/117;
BONAVIDES, Paulo. Op. cit., pp. 396/398 e 425/427; e BUECHELE, Paulo Arminio Tavares. O
princípio da proporcionalidade e a interpretação constitucional. Rio de Janeiro: Editora Renovar,
1999, pp. 124/135.).
31

de princípios absolutos no ordenamento jurídico, pois, se assim o fosse, a realização


de determinado princípio não conheceria nenhum limite jurídico, somente fático57.

Ocorre que a distinção prima facie dos princípios em face das regras, as
quais, sendo válidas devem ser aplicadas, não exclui a possibilidade de que essas
também possuam um caráter prima facie, o que ocorre com a introdução de
cláusulas de exceção58.

A teoria de Robert Alexy foi aqui exposta em traços gerias no que nos
importa para o desenvolvimento das teorias contemporâneas sobre a distribuição do
tempo no processo como um ato de aplicação de princípios, as quais serão melhor
desenvolvidas e criticadas nos capítulos 3 e 4.

1.4.2. A contribuição de Ronald Dworkin

Ronald Dworkin, catedrático em centros de pesquisa como New York


University School of Law e University College London, é conhecido por militar nas
áreas de Filosofia do Direito e Direito do Estado contra o positivismo jurídico59.
Nessa militância desenvolveu uma original teoria dos direitos fundamentais e da
argumentação jurídica seguida, como a de Robert Alexy, por muitos juristas
brasileiros.

Deve-se destacar, a princípio, que Dworkin se aproxima de grande parte


das idéias de Alexy, baseando-se na distinção por meio de um critério hipotético-
condicional, vale dizer que segue a diretriz se, então, com uma distinção lógica60.

57
Nem mesmo a dignidade da pessoa humana, na doutrina de Alexy, é considera como absoluta.
Isso porque não se trata apenas de um princípio, mas sem de duas normas da dignidade da pessoa
humana: o princípio e a regra. Não é o princípio da dignidade da pessoa humana que é absoluto, mas
a regra diante das realidades fáticas postas para sua realização (ALEXY, Robert. Op. cit. p. 111/114).
58
ALEXY, Robert. Op. cit. p. 103/105.
59
“A crítica de DWORKIN ao positivismo, com sua insistência no papel que desempenham os
princípios na prática de aplicação do direito, instaurou uma crise bastante profunda na teoria do
direito que havia dominado nas décadas anteriores” (PÉREZ, Maria Lourdes Santos. Uma filosofia
para ouriços: uma abordagem do pensamento de Ronald Dworkin. In Ciência Jurídica. Belo
Horizonte: Edições Ciência Jurídica, ano XXII, n. 141, maio/jun. de 2008, pp. 161/187, em destaque p.
165.
60
Dworkin diz expressamente: “A diferença entre princípios jurídicos e regras jurídicas é de natureza
lógica” (DWORKIN, Ronald. Levando os direitos a sério. 2ª Ed. São Paulo: Martins Fontes, 2007, p.
39).
32

Para o autor, as regras tem como característica uma aplicação à maneira


do tudo-ou-nada, ou seja, diante da realidade fática, “então, ou a regra é válida, e
neste caso a resposta que ela fornece deve ser aceita, ou não é válida, e neste caso
em nada contribui para a decisão”. Já os princípios, dada a realidade fática, deverão
ser levados em consideração caso sejam relevantes para o caso, o que demonstra
que “os princípios possuem uma dimensão que as regras não tem – a dimensão do
peso ou da importância”61.

A introdução, nas regras, de termos legalmente indeterminados ou, ainda,


que carreguem um peso axiológico, podem criar, ainda, regras que desempenham
um papel bastante semelhante aos princípios, ‘fazendo com que sua aplicação
dependa, até certo ponto, de princípios e políticas que extrapolam a [própria] regra’62,
mas a exceção deverá estar expressa na norma.

Sobre a existência de princípios antagônicos, Ronald Dworkin parece


seguir a mesma conclusão que Robert Alexy, ao dizer que não será possível a
escolha de um em detrimento total de outro, verbis:

O homem que deve decidir uma questão vê-se, portanto, diante da


exigência de avaliar todos esses princípios conflitantes e antagônicos que
incidem sobre ela e chegar a um veredicto a partir desses princípios, em
63
vez de identificar um dentre eles como “válido” .

De todo o visto, fica claro que Ronald Dworkin serviu de base para a
teoria dos princípios de Robert Alexy, sendo que esta “foi construída efetivamente
sofisticando o conceito de princípio proposto por Dworkin”64.

Assim, verificado o contingente da teoria do direito sobre conteúdo do


termo “princípios”, podemos inferir que sua importância é elevadíssima nessa
quadra da história. Sua coexistência com as regras se trata de uma dicotomia entre

61
DWORKIN, Ronald. Levando os direitos a sério. 2ªed. São Paulo: Martins Fontes, 2007, p. 39, p.
39/42.
62
Ibidem, p. 45.
63
Ibidem, p. 114.
64
CEZNE, Andrea Nárriman. A teoria dos direitos fundamentais: uma análise comparativa das
perspectivas de Ronald Dworkin e Robert Alexy. In Revista de direito constitucional e
internacional. São Paulo: RT, ano 13, n. 52, jul./set. de 2005, pp. 51/67, em destaque pp. 56/57.
33

espécies de normas jurídicas, aplicadas com suas particularidades ao caso


concreto.

Disso verificamos, ainda, que os princípios não podem ser encarados


como sendo absolutos, pois de sua natureza emerge o postulado de ponderação, de
aplicação da proporcionalidade: as limitações do caso concreto e o âmbito de
aplicação dos demais princípios nunca poderão ser esquecidos. O núcleo de eficácia
deve ser mantido.

Essas são as principais importâncias das teorias dos direitos


fundamentais de Robert Alexy e Ronald Doworkin para o pensamento brasileiro,
embora nem sempre possam coexistir em paz.

Ocorre que todo aspecto tecnicista das teorias acima expostas


demonstram um comprometimento que os autores mantêm com o com o positivismo
que pretendem superar, o que não é atingido apenas por elevar, no nível do
discurso, os princípios à categoria de normas 65.

Basta vermos, agora, o conceito de Sistema na Ciência do Direito e


entender o papel dos princípios neste sistema.

1.5. O conceito de sistema na Ciência do Direito.

Para compreendermos, primeiramente, o conceito de sistema e logo após


sua relação com a Ciência do Direito, é de valia entender o significado do termo
“sistema”.

De Plácido e Silva comenta, ainda, que o termo se refere a “um conjunto


de regras e princípios sobre uma matéria”, havendo, entre si, uma relação íntima a
ponto de convergirem para a realização de um único fim 66.

65
A conclusão é de Friedrich Müller, anotada pelo Prof. Nelson Nery Jr. (NERY JUNIOR, Nelson.
Princípios do processo na constituição federal. 9ª ed. rev., ampl. e atual. com as novas Súmulas
do STF (simples e vinculantes) e com análise sobre a relativização da coisa julgada. São Paulo:
Editora Revista dos Tribunais, 2009, p. 30.
66
SILVA, De Plácio e. Vocabulário Jurídico. Vol. 3. 4ª ed., 2ª tiragem. Rio de Janeiro: Editora
Forense, 1996, p. 242. Sobre o extenso verbete sistema, comenta Aurélio Buarque de Holanda
Ferreira: “Sistema. [Do gr. sýstema, ‘reunião’, ‘grupo’, pelo lat. tard. systema.] S. m. 1. Conjunto de
elementos, materiais ou ideais, entre os quais se possa encontrar ou definir alguma relação (5). 2.
34

Parte-se, assim, da idéia de sistema como conjunto uniforme de regras e


princípios, ou estrutura de elementos ideais, os quais convergem harmoniosamente
para a realização de um objetivo, objetivo esse de importância para o todo,
independentemente da vontade ou da tendência individual dos elementos.

Dessa forma, uma teoria dos sistemas sociais vem estudar os elementos
integrantes da sociedade, sejam elementos animados, sejam inanimados, bem como
a relação mantida entre si. Essa relação, ou estrutura, tende a caminhar
conjuntamente para a realização de um fim, ou alguns fins, dependendo da
complexidade das relações e do número de elementos formadores da sociedade, o
que também constitui seu objeto de estudo 67.

Dessa forma, podemos inferir que há diversos tipos de sistemas: o


sistema econômico, o sistema social, o sistema psíquico, o sistema jurídico, entre
outros. Esse último é o que mais nos interessa, pois as regras e princípios
desenvolvidos no decorrer dos séculos pelos juristas criaram, hoje, um alto grau de
complexidade nos diversos ordenamentos jurídicos.

O fim do sistema de regras e princípios jurídicos dependerá pela escala


de valores adotados por cada ordenamento: a justiça, a legalidade, a ordenação das
relações sociais, ou mesmo um misto desses. Devemos, para isso, fazer esforças
para uma verdadeira tomada de consciência teleológica da Ciência do Direito.

Disposição das partes ou dos elementos de um todo, coordenados entre si, e que funcionam como
estrutura organizada [...]. 3. Reunião de elementos naturais da mesma espécie, que constituem um
conjunto intimamente relacionado [...]. 4. Conjunto de instituições políticas ou sociais, e dos métodos
por ela adotados, encarados quer do ponto de vista teórico, quer de sua aplicação prática”
(FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Aurélio Século XXI: o dicionário da língua
portuguesa. 3ª ed. totalmente rev. e atual. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1999, p. 1865/1866).
67
Parece que Alfred Büllesbach chega á mesma conclusão: “A teoria dos sistemas sociológicos não
entende por sistema a tradição, tal como esta é apresentada, por exemplo, por Canaris, antes
compreendendo – como, por exemplo, em Georg Klaus – sob o termo ‘sistema’ a idéia de uma série
de elementos e de uma série de relações entre eles existentes, em que todas as totalidades
isomorfas pertencentes a um tipo são consideradas com um e o mesmo sistema” (BÜLLESBACH,
Alfred. Princípios de teoria dos sistemas. In KAUFFMAN, Arthur; HASSEMER, Winfried (orgs.)
Introdução à filosofia do direito e à teoria do direito contemporâneas. Lisoa: Fundação Calouste
Gulbenkian, 2002, pp. 407/442, em destaque p. 410). No direito brasileiro, destaca-se as lições de
Tércio Sampaio Ferraz Jr.: “Entendemos por sistema um conjunto de objetos e seus atributos
(repertório do sistema), mais as relações entre eles, conforme certas regras (estrutura do sistema)”
(FERRAZ JUNIOR, Tércio Sampaio. Teoria da norma jurídica. 4ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2000,
p. 140).
35

Não podemos deixar de lado a idéia de que, se um sistema faz uma


diferenciação entre um ambiente externo e outro interno, tanto os “objetos” que o
compõe, como “o lado externo da forma” devem receber nossa atenção 68.

Ocorre que há dissenso de a uma teoria dos sistemas que deixe de lado
as especificidades das relações humanas e de suas influências sobre o todo. Tais
teorias tomadas como conservadoras prestigiariam a alienação da visão totalizante
da sociedade e, especificamente, do Direito, vícios cometidos pelo positivismo que
levam a uma injustificada blindagem acrítica. Nesse sentido, vale lembrar as
exortações de Theodor Adorno:

Se quisermos uma caracterização própria do conceito de sociedade, então


o conceito de sistema, o conceito de uma certa ordem dispositiva, de uma
ordem imposta de certo modo abstratamente, seria muito mais adequado do
que o conceito de todo ou de orgânico. A única restrição seria que, quando
falamos do sistema da sociedade, não se trata da sistematização do
69
observador, mas que esse caráter sistêmico reside na própria coisa .

Assim, justifica-se o estudo da influência do sistema social como


ambiente de possibilidades e influências em relação ao sistema jurídico, em
especial, para nosso estudo, referente ao ordenamento brasileiro. Além disso, não
há como não desenvolvermos a idéia de sistema, a partir daqui, sem pensar nas
teorias sistêmicas criadas no último século em especial nas ciências humanas.
Dentre tais, a teoria dos sistemas autopoiéticos do alemão Nicklas Luhmann é a
mais bem construía e de maior influência sem, contudo, furtar-nos das críticas,
conforme veremos.
68
O alerta é feito por Nikals Luhmann: “Um primeiro modo de precisá-lo [i.e. o conceito de sistema],
que conduz imediatamente a um terreno pouco conhecido, reside em entender por sistema não um
determinado tipo de objetos, mas sim uma determinada diferenciação – ou seja, aquela entre sistema
e ambiente. Isso precisa ser compreendido de forma exata. [...] Um sistema é a forma de uma
diferenciação, possuindo, pois, dois lados: o sistema (como o lado interno da forma) e o ambiente
(como lado externo da forma). Somente ambos os lados constituem a diferenciação, a forma, o
conceito. O ambiente, pois, é tão importante para esta forma, tão indispensável, quanto o próprio
sistema” (LUHMANN, Niklas. O conceito de sociedade. In NEVES, Clarissa Eckert Baeta; SAMIOS,
Eva Machado Barbosa (Orgs). Niklas Luhmann: a nova teoria dos sistemas. Porto Alegre: Ed.
Universidade/UFRGS, Goethe-Institut/ICBA, 1997, pp. 75/91, em destaque p. 78).
69
ADORNO, Theodor W. Op. cit., pp. 101 e 127/128. Na Filosofia no Direito brasileira, destacam-se a
quixotesca luta travada nas aulas do Curso de Direito da Universidade Presbiteriana Mackenzie e nas
obras do Prof. Alysson Leandro Mascaro Nascimento contra tal “conservadorismo sistêmico”
(NASCIMENTO, Alysson Mascaro. Lições de Sociologia do Direito. São Paulo: Quartier Latin,
2007, aulas 7 e 8, passim).
36

1.5.1. A teoria dos sistemas autopoiéticos de Niklas Luhmann.

O sociólogo do direito Niklas Luhmann parte do pressuposto de que a


pós-modernidade trouxe uma maior complexidade e diferenciação funcional às
relações sociais e, assim, à própria sociedade. Daí a necessidade de uma teoria dos
sistemas, tendo em vista que estes tenderiam a diminuir a complexidade do
ambiente, complexidade esta que se não for reduzida pode levar ao caos70.

Um sistema será complexo quando contiver mais possibilidades do que


conseguir realizar com o ambiente. Há uma relação inversa entre a complexidade do
ambiente e a interna ao sistema: quanto maior o número de elementos e
subsistemas, menor a força do ambiente a influenciar o sistema. O contrário também
é verdadeiro. Assim, para evitar o caos e a sua autodestruição, o sistema se vê
obrigado a promover uma especialização.

Assim, o ambiente não promove modificações no sistema, mas o irrita e


obriga a se automodificar, ou autoproduzir. Essa é a parte da teoria de Luhmann,
baseado nas pesquisas desenvolvidas por Maturana e Varela no campo das
ciências naturais, teoria essa que caracteriza os sistemas como autopoiéticos e
portadores de um fechamento operacional. Por óbvio, essa comunicação que o
sistema terá com seu entorno se refere a perturbações ou irritações que “apenas
suscitam-lhes reações internas de compensação” ocorridas entres os subsistemas
que compõe a sociedade fragmentária 71.

70
Em certos momentos, a dificuldade aporética da teoria luhmanniana coloca entraves no
entendimento da matéria. O próprio autor entendia que o conceito de sociedade e, por conseqüência,
de uma teoria sistêmica que a descrevesse, “precisaria ser constituído autologicamente” devido à
característica autodescritiva da sociedade (LUHMANN, Niklas. Op. cit. p. 77). Por isso, o Prof.
Orlando Villas Bôas Filho já comentou: “Aliás, a complexidade da teoria dos sistemas acompanha a
complexidade da própria socieidade” (VILLAS BÔAS FILHO, Orlando. O direito na teoria dos
sistemas de Niklas Luhmann. São Paulo: Max Limonad, 2006, p. 12).
71
FEDOZZI, Luciano. A nova teoria dos sistemas de Niklas Luhmann: uma leitura introdutória. In
NEVES, Clarissa Eckert Baeta; SAMIOS, Eva Machado Barbosa (Orgs). Niklas Luhmann: a nova
teoria dos sistemas. Porto Alegre: Ed. Universidade/UFRGS, Goethe-Institut/ICBA, 1997, pp. 18/33,
em destaque pp. 26/27; NASCIMENTO, Alysson Leandro Mascaro. Op. cit., pp.120/122;
NASCIMENTO, Valéria Ribas do. A teoria dos sistemas e a hermenêutica: ponderações introdutórias
a respeito do papel do direito enquanto práxis social efetiva. In Revista eletrônica do curso de
direito da UFSM. Vol. 1, Nº. 2, pp. 51/64, em destaque p. 52. Disponível em
<http://www.ufsm.br/revistadireito/eds/v1n2/a4.pdf>. Acessado em 30 de setembro de 2009; VILLAS
BÔAS, Orlando. Op. cit., pp. 18/19;
37

Para o autor, a construção e o devido conhecimento dos sistemas e


subsistemas sociais permitem a redução da complexidade do ambiente, ou seja, a
redução das possibilidades que possam orientar a vida e a ação humanas,
complexidade esta que, com o tempo, tornar-se-ia prejudicial 72.

Das irritações provocadas pelo entorno ao sistema, ou de um subsistema


a outro, é que se criam as condições de possibilidade de sua evolução e
autodiferenciação.

Mais uma característica se percebe da teoria sistêmica desenvolvida por


Luhmann: em oposição às tradicionais concepções, estas baseadas nas teorias de
Max weber, o autor veio substituir a unidade central, ou elementar, dos sistemas
sociais. Abandona a visão do indivíduo autônomo, substituindo-o pelo próprio
processo comunicativo. Nesse sentido, comenta Clarissa Eckert Baeta Neves:

O social, para Luhmann, é composto de comunicações e não de pessoas. O


indivíduo/a pessoa é parte do sistema psíquico ligado à consciência que
produz pensamento. Apenas comunicação produz comunicação. [...]
Os seres humanos, sistema autoreferentes, que tem na consciência e na
linguagem seu próprio modo de operação autopoiética, são o “meio” da
sociedade, não componentes da mesma. A sociedade supõe homens, mas
73
como seu “meio” .

Como se sabe, as idéias de Luhmann, propagadas no meio acadêmico, são respostas teóricas para a
complexidade da sociedade pós-moderna e, para nosso estudo, para a legitimidade do Direito como
sistema. Ocorre que tais idéias são postas no campo da teoria, sendo indiferente para nós se o
sistema se automodifica por meio de irritações, ou se ambiente exerce influência direta sobre o
interior do sistema. As respostas de Luhmann, em que pese serem bem construídas e dignas de todo
respeito, chegam a ser aporéticas nesse sentido.
72
BÜLLESBACH, Alfred. Op. cit., p. 425. Ocorre que, conforme observado por Habermas, “todos os
sistemas constituem mundos circundantes unas para os outros e reforçam mutuamente a
complexidade do mundo circundante, a qual precisam sempre dominar” (HABERMAS, Jürgen. O
discurso filosófico da humanidade. Traduzido por Luiz Sérgio Repa e Roidnei Nascimento. São
Paulo: Martins Fontes, 2002, p. 515.
73
NEVES, Clarissa Eckert Baeta. Niklas Luhmann e sua obra. In ______; SAMIOS, Eva Machado
Barbosa (Orgs). Niklas Luhmann: a nova teoria dos sistemas. Porto Alegre: Ed.
Universidade/UFRGS, Goethe-Institut/ICBA, 1997, pp. 9/17, em destaque pp. 16/17. No mesmo
sentido da professora gaúcha: NASCIMENTO, Alysson Leandro Mascaro. Op. cit., pp.178/119;
VILLAS BÔAS, Orlando. Op. cit., p. 16.
38

Num breve resumo: para Luhmann, dentre os vários tipos de sistema, o


homem faz parte do sistema psíquico, enquanto a sociedade de um sistema social.
O primeiro está no ambiente da segunda 74.

O Direito, como sistema social, também é inserido nas características


acima citadas. Sendo auto-referencial, recebe as irritações do entorno social,
político, econômico e, porque não, humano, provocando sua autoconstrução.

A legitimidade do Direito, como sistema autopoiético, é questionado


segundo seus padrões internos de modificação, não segundo outro subsistema
social, pois não há uma relação de preferência ou influência direta deste sobre os
demais e vice-versa.

As críticas à teoria luhmanniana são severas, conforme se verá a seguir.

1.5.2. Críticas à teoria dos sistemas autopoiéticos.

A inexistência de um sujeito que se ponha fora do Direito, com o fim de


criticá-lo; o conservadorismo sistêmico; a legitimação do Direito por meio de
referências internas, não relacionadas ao entorno; e a comunicação do sistema
jurídico com um ambiente maculado pela alienação e pela total administração da
sociedade, são alguns dos temas mais relevantes levantados pelos críticos contra
Luhmann.

Sendo o homem parte de um sistema psíquico e, assim, um meio, mas


não um componente do sistema jurídico, não é possível que ele se ponha de forma
crítica frente à produção normativa e às decisões judiciais. Não haveria, assim, um

74
Esclarecendo os tipos de sistemas na teoria luhmanniana, comenta Caroline Morais Kunzler: “Para
Luhmann há quatro tipos de sistemas: não-vivos, vivos, psíquicos e sociais. Os sistemas não-vivos
são incapazes de produzir a si mesmos, por isso não podem ser classificados como autopoiéticos.
Para manterem-se, dependem do ambiente. [...] Os sistemas vivos são, por exemplo, células, os
animais, o corpo humano. Eles são compostos por operações vitais, responsáveis pela manutenção
do sistema. [...] O sistema psíquico é a consciência. Esse sistema é composto de pensamentos e,
assim com os outros sistemas autopoiéticos, ele mesmo reproduz seu elemento. Pensamento gera
pensamento e nada mais. O quarto tipo de sistema é o social, composto de comunicação. A
comunicação é produzida somente através de comunicação” (KUNZLER, Caroline Morais. A teoria
dos sistemas de Niklas Luhmann. In Estudos de sociologia. Araraquara: UNESP, 2004, Nº. 16, pp.
123/136, em destaque p. 127.
39

escopo social do Direito, o qual se importaria com sua própria formação e institutos
com o fim de autorregulação.

Luhmann se prende à legitimidade do sistema jurídico ao procedimento


de produção normativa que leve a um conjunto de decisões “colectivamente
obrigatórias”. Assim, o sistema positivo, com seu processo de legitimação por meio
da legalidade, seria a melhor forma de evitar os princípios imutáveis do
Jusnaturalismo. Estes últimos criariam uma sociedade estática e indefesa frente ao
aumento da complexidade do ambiente 75.

Ocorre que deixar a lei legitimar o sistema jurídico, ao ponto de ser


legítimo toda e qualquer escolha feita in abstrato pelo legislador, levar-nos-ia a um
Estado totalitário assemelhado ao que foi experimentado na Europa no transcorrer
do século XX e conforme visto anteriormente76.

Em que pese as críticas se formarem de forma producente para entender


o pensamento de Luhmann77, importantes ao ponto de ter obrigado o autor a se
pronunciar em diversas vezes com o fim de elucidar certos pontos, não há
verdadeiros motivos para retirarmos o crédito do autor.

É claro que não há cabimento na idéia de que o Direito, por ser


autônomo, autorrefrente, autopoiético não se importe ou tenha importância para os
demais subsistemas. Vale a exortação do Prof. Orlando Villas Bôas Filho que parece
a mais plausível:

É claro que clausura operacional não implica isolamento ou indiferença


solipsista do sistema em relação ao entorno. Conforme apontado no
capítulo segundo, o sistema é uma forma (paradoxal, diga-se de passagem)
composta por dois lados: o sistema e o entorno, de modo que este não é
78
excluído, mas pressuposto pelo sistema .

75
BÜLLESBACH, Alfred. Op. cit., pp. 425/426.
76
Ver o relato de Hannah Arendt, Item 1.4., nota 32.
77
Em especial a crítica de Jürgen Habermas, como no trecho a seguir: “Ele [o direito] não pode
assumir funções de orientação da sociedade como um todo. Quando muito, o direito pode ‘regular’ a
sociedade num sentido metafórico: na medida em que se modifica a si mesmo ele se apresenta a
outros sistemas como um mundo circundante modificado, em relação ao qual os outros podem
‘reagir’ do mesmo modo indireto” (HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entra facticidade e
validade. Vol. 1. Traduzido por Flávio Beno Siebeneicher. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1997, p.
73.
78
VILLAS BÔAS, Orlando. Op. cit., pp. 193/194.
40

Por fim, conforme se verá, entende-se que a visão do Direito como


sistema autopoiético se coaduna com a idéia dos princípios aqui tratados, o que nos
ajuda a entender a força que podem ter na sociedade (aqui referida no sentido lato)
de mudanças cada vez mais rápidas e maiores.

1.6. Os princípios no conceito de sistema jurídico.

Como visto, a idéia de sistema pressupõe a existência de regras e


princípios internos que o permitam se automodificar quando sofrer irritações do
entorno, com o fim de manter sua legitimidade e impedir a instalação do caos, mas
tendem a manter o bloco sistemático.

Assim comentou o Prof. Paulo Bonavides:

Exprimiu o jurista italiano Perassi a opinião de que as normas constitutivas


de um ordenamento não estão insuladas, mas fazem parte de um sistema
onde os princípios gerais atuam como vínculos, mediante os quais elas se
79
congregam de sorte a constituírem um bloco sistemático .

Dessa forma, os princípios jurídicos, mais do que a visão positivista de


normas ao lado das regras, possuem funções de importância dentro do Sistema
Jurídico.

A teoria dos princípios gerou nos últimos anos inúmeros tratados que
pretendem solidificar a visão juspublicística de tais elementos do sistema jurídico.
Dentre algumas funções dos princípios no sistema jurídico e que são vistas da
leitura do presente estudo e merecem destaque 80:

a) Os princípios possuem função interpretativa: tendo em vista nosso


sistema jurídico ser caracterizado por sua abertura, os princípios auxiliam o

79
BONAVIDES, Paulo. Op. cit., p. 275.
80
Parte-se das idéias de Noberto Bobbio, mas com justificação própria. (BOBBIO, Noberto. Principi
Generali di Diritto, In: Novissimo Digesto Italiano, v. 13, Turim, 1957, pp. 895/896).
41

hermeneuta a perceber a interpretação correta segundo os fundamentos do Estado


Constitucional;

b) Os princípios possuem função integrativa: a unidade do ordenamento


jurídico deve estar sempre em mente quando o hermeneuta utilizar os princípios
como forma de integração do sistema;

c) Os princípios possuem função diretiva: como comentado, os princípios,


por sua abertura conceitual que tem como base sua característica prima facie, dão
ao hermeneuta maior proximidade com os valores que fundam o sistema jurídico,
servindo de diretriz para a melhor interpretação;

Como se vê, o Direito não pode se isolar, como se autista fosse, diante
das alterações filosófico-econômico-sociais ocorridas no decorrer da história. O
problema a enfrentar é a crescente velocidade de modificação do ambiente pós-
moderno.

Agora, cabe-nos a verificação do modo como o processo civil foi


influenciado no último século, com transformações de paradigma que forçaram o
legislador e o constituinte a pensarem em mecanismos que aproximassem o
processo da sociedade. Em outras palavras, passamos a verificar como o processo
civil se adaptou (autopoiese) frente à necessidade de acompanhar os anseios do
entorno.
42

2 – A TUTELA CONSTITUCIONAL DO PROCESSO

Desde meados do século XX, observamos um fenômeno jurídico


denominado de “Constitucionalização do Direito”. Conforme referido no capítulo
anterior, as experiências sócio-políticas nos Estados totalitários e ditatoriais criaram
a necessidade de inclusão de valores nas Constituições antes existentes apenas na
doutrina do direito natural com caráter abstrato e não vinculativo.

A positivação do direito natural gerou o desenvolvimento de uma teoria de


direitos fundamentais que penetrou em todo o ordenamento jurídico: passamos a ver
um verdadeiro corte epistemológico promovido no campo da filosofia no direito: no
modo de encará-lo e na metodologia de estudo 81.

81
A observação é propícia, pois alguém poderá, apressadamente, entender que novas disciplinas
surgiram com o fenômeno da constitucionalização dos direitos. Trata-se, na verdade, de um novo
ponto de vista metodológico para os demais ramos infraconstitucionais do Direito, não desnaturando
o caráter autônomo, ou monista, do direito processual. Nas palavras de João Batista Lopes, “estudar
o processo civil com os olhos voltados para a Constituição”. Delimitando a matéria para nossa área
de trabalho, o tratamento do processo civil deve observar as regras e princípios previstos na
Constituição, sob pena de grave infração à carga axiológica prevista no documento que condensa o
discurso social legítimo, ou que se intenta o ser. Obviamente, a metodologia de visão constitucional
não pode desnaturar o direito processual, a ponto de desconsiderar os princípios consagrados em
seu desenvolvimento histórico. Nesse sentido: DINAMARCO, Cândido Rangel. A instrumentalidade
do processo. 13ª Ed. São Paulo: Malheiros, 2008, pp. 25/27; ARAUJO CINTRA, Antonio Carlos de;
GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria geral do processo. 23ª Ed. São
Paulo: Malheiros, 2007, pp. 84/85; LOPES, João Baptista. Efetividade da tutela jurisdicional à luz da
constitucionalização do processo civil. In Revista de processo. São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, ano 29, vol. 116, jul./ago. de 2004, pp. 29/39, em destaque p. 30; NERY JUNIOR, Nelson.
Princípios do processo na constituição federal. 9ª ed. rev., ampl. e atual. com as novas Súmulas
do STF (simples e vinculantes) e com análise sobre a relativização da coisa julgada. São Paulo:
Editora Revista dos Tribunais, 2009, p. 41. Em sentido contrário, Willis Santiago Guerra Filho entende
que “a tendência, porém, parece ir no sentido de que ocorra o desentranhamento da disciplina [de
Direito Processual Constitucional] do corpo do Direito Constitucional, por demandar, inegavelmente, o
estudo por parte do especialista em Direito Processual”. Assim, anota o pioneirismo da Faculdade de
Direito da Universidade Federal do Ceará ao destacar o Direito Processual Constitucional na grade
curricular da graduação (GUERRA FILHO, Willis Santiago. A inclusão do direito processual
43

Nesse sentido, e o que mais nos interesse para o presente o estudo, o


direito processual não ficou imune: a tutela constitucional do processo, ou a relação
82
é uma realidade que não pode ser ignorada . Mas essa realidade passou a ser
reconhecida entre nós tão somente com o advento da Constituição Federal de 1988,
isso após um enorme hiato ditatorial.

Comentando sobre a novidade da Constituição Federal de 1988, o Prof.


Barbosa Moreira tece os seguintes comentários:

As Constituições brasileiras anteriores a 1988 ocupavam-se relativamente


pouco do processo. Em geral, davam atenção ao processo civil que ao
penal, em relação ao qual tratavam de assegurar certas garantias à defesa.
Alguns institutos jurídicos previstos no texto constitucional – como o
mandado de segurança, a ação popular e o recurso extraordinário – sem
dúvida se aplicavam no campo civil. Não se ia, contudo, muito além disso
[...]
O país emergia de longo período de governos arbitrários, durante os quais
não se pode dizer que fossem elas fielmente observadas. Era
compreensível o cuidado de impregnar a nova Constituição de valores
83
inerentes ao Estado de Direito que então se restaurava .

constitucional no curso de graduação em direito. In Revista de Processo. São Paulo: Editora Revista
dos Tribunais, v. 18, nº. 69, jan./mar. de 1993, pp. 111/112, em destaque p. 112); acompanhando-o,
mas, ainda, com problemas terminológicos: MEDINA, Paulo Roberto Gouvêa. A emenda nº. 45/2004
e o direito processual constitucional constitucional. In Revista da ordem dos advogados do Brasil.
Rio de Janeiro: Conselho Federal da OAB, anos XXXV, nº. 80, jan./fev. de 2005, pp. 95/105.
82
Nas palavras de Luigi Paolo Comoglio, Corrado Ferri e Michele Taruffo, não é mais possível
enfrentar o estudo do processo sem considerar a realidade constitucional que o tutela: “A distanza di
oltre mezzo secolo dall’entrata in vigore della Costituzione repubblicana, e dopo la lunga evoluzione
giurisprudenziale che há caratterizzato l’applicazzione dei suoi più importante principi, non è piú
possibile affrontare lo studio del processo senza prendere le mosse da um dúplice dato di fatto. In
primo luogo, è indiscutibile – nel contesto di norme costituzionali ‘rigide’ (art. 138 Cost.) – la presenza
di alcume ‘garanzie minime’, le quali si riflettono in modo diretto sulla disciplina del processo e
sull’organizzazione giudiziaria. In secondo luogo, con l’istituzione della Corte Costituzionale (operante
sin dal 1956), esiste anche in Italia um sistema di controllo giurisdizionale della legittimità delle leggi,
cui – sia pure forme prevalentemente ‘incidentali’ (art. 1 l. cost. 9 febrario 1948 n. 1; artt. 23-36 l. 11
marzo 1953 n. 87) – è affidata, anche nei confronti delle norme anteriori AL 1948, la tutela di quelle
fondamentali garanzie” (COMOGLIO, Luigi Paolo; FERRI, Corrado; TARUFFO, Michele. Lezioni sul
processo civile. 2ª Ed. Bologna: Società editrice Il Mulino, 1998, p. 55). Mutatis mutandis, a situação
brasileira é a mesma.
83
BARBOSA MOREIRA, José Carlos. A constitucionalização do processo no direito brasileiro. In
MAC-GREGOR, Eduardo Ferrer; LELO DE LARREA, Arturo (coords). Estudos de direito
processual constitucional: homenagem brasileira a Héctor Fix-Zamudio em seus 50 anos como
pesquisador do direito. São Paulo: Malheiros, 2009, pp. 47/57, em destaque pp. 47 e 57. Em outro
momento de sua produção intelectual, Barbosa Moreira chega a comentar que, ”com efeito, nenhuma
das nossas anteriores cartas políticas havia mostrado igual preocupação com as garantias das
partes” (BARBOSA MOREIA, José Carlos. Miradas sobre o processo civil contemporâneo. In ______.
Temas de direito processual. Sexta série. São Paulo: Editora Saraiva, 1997, pp. 45/62, em
destaque p. 48).
44

Com as funções de integração (unidade política do Estado), de


organização (organização dos poderes do Estado) e de direção (indicação de um
norte aos poderes do Estado e da força vinculante dos direitos fundamentais), a
84
Constituição passou a base e topo do “edifício normativo brasileiro” e, ainda,
produzindo eficácia horizontal entre os particulares.

Assim, o que chamamos de tutela jurisdicional do processo, passou a


ter “o significado e escopo de assegurar a conformação dos institutos do direito
processual e o seu funcionamento aos princípios que descendem da própria ordem
85
constitucional” , isso em um dos planos do fenômeno da constitucionalização do
processo.

Os juristas, destacando-se, pioneiramente, o mexicano Héctor Fix-


86
Zamudio, o italiano Mauro Cappelletti e o uruguaio Eduardo Juan Couture ,
perceberam o desenvolvimento de dois ramos diversos de tal tutela do processo: o
direito processual constitucional e o direito constitucional processual. Não se
tratam de termos sinonímicos, nem mesmo de mero jogo de palavras, conforme
veremos 87.

2.1. O direito processual constitucional.

84
NERY JUNIOR, Nelson. Op. cit., pp. 38/39.
85
DINAMARCO, Cândido Rangel. A instrumentalidade do processo. 13ª Ed. São Paulo: Malheiros,
2008, p. 27.
86
GUERRA FILHO, Willis Santiago. A inclusão do direito processual constitucional no curso de
graduação em direito. In Revista de Processo. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, v. 18, nº.
69, jan./mar. de 1993, pp. 111/112, em destaque p. 111.
87
Por questão de delimitação de tema, não profundamente muito do direito processual constitucional,
por não ter ligação direta com o trabalho, mas o apresentaremos, pois não é possível dissociar o
sentido processo-Constituição (direito processual constitucional, como fator de efetividade dos
preceitos fundamentais contidos na Constituição) do sentido Constituição-processo (direito
constitucional processual, como fator político fundamental que emerge da Constituição). As
expressões são de Cândido Rangel Dinamarco e são aqui adotadas, ainda que o autor englobe
ambas no direito processual constitucional, sem ao menos se referir ao segundo termo, em posição
contrária dos demais estudiosos no assunto. (DINAMARCO, Cândido Rangel. A instrumentalidade
do processo. 13ª Ed. São Paulo: Malheiros, 2008, p. 26; ______. Instituições de direito
processual civil. 6ª Ed. rev. e atual. São Paulo: Malheiros, 2009, pp. 193/258).
45

O direito processual constitucional é o conjunto de regras e princípios


previstos na Constituição para o desenvolvimento de um processo constitucional
perante uma jurisdição constitucional. Quem o estuda se aventura mais no direito
constitucional que propriamente no processual.

Além do campo de organização da Justiça, entendida aqui como os


88
órgãos componentes do Poder Judiciário , há dois principais campos de estudo
para o direito processual constitucional: o controle de constitucionalidade e a
jurisdição constitucional das liberdades 89.

Para o controle jurisdicional de constitucionalidade dois modelos se


destacam. Esses são encabeçados pelo controle concentrado da Constituição
austríaca de 1920, elaborado por Hans Kelsen, de um lado; e o controle difuso da
tradição americana, com um papel importantíssimo por parte do Chief of Justice
John Marshall, em especial no caso Marbury vs. Madison, de outro.

No modelo austríaco, o controle é realizado por um Tribunal


Constitucional que não se confunde com o Poder Judiciário. Seus membros são, em
regra, eleitos pelos Poderes do Estado entre os magistrados para exercerem cargo
com prazo determinado na Corte. A declaração de (in)constitucionalidade é feita em
abstrato, não se referenciando a um caso concreto.

Já o modelo americano é baseado na idéia de uma Suprema Corte que


se encontra no topo do Poder Judiciário. É um tribunal político, com membros
indicados pelo Poder Executivo. Essa Corte fará a proteção da Constituição
conquanto os casos concretos, de excepcional relevância ou repercussão, cheguem
a ele. Isso não impede que qualquer órgão do Poder Judiciário, do juiz municipal,

88
O que inclui regras sobre (a) órgãos do Poder Judiciário, (b) competência funcional e material, (c)
autonomia administrativa e financeira dos órgãos da Justiça, (d) a carreira – ingresso,
aperfeiçoamento, garantias, responsabilidade, (e) as funções essenciais à administração da Justiça.
A este rol, que foi elaborado por Rogério Lauria Tucci e José Rogério Cruz e Tucci, inclui-se, por
nossa lavra, a competência dada pela EC nº. 45, de 2004, ao Conselho Nacional de Justiça, criado
naquela ocasião: (f) o controle da atuação administrativa e financeira do Poder Judiciário e do
cumprimento dos deveres funcionais dos juízes. (TUCCI, Rogério Lauria; CRUZ E TUCCI, José
Rogério. Constituição de 1988 e processo: regramentos e garantias constitucionais do processo.
São Paulo: Editora Saraiva, 1989, p. 4.
89
Expressões usadas por Ivo Dantas e Cândido Rangel Dinamarco (DANTAS, Ivo. Teoria do
processo constitucional: uma breve visão pessoal. In MAC-GREGOR, Eduardo Ferrer; LELO DE
LARREA, Arturo (coords). Estudos de direito processual constitucional: homenagem brasileira a
Héctor Fix-Zamudio em seus 50 anos como pesquisador do direito. São Paulo: Malheiros, 2009, pp.
105/147, em destaque p. 145; DINAMARCO, Cândido Rangel. A instrumentalidade do processo.
13ª Ed. São Paulo: Malheiros, 2008, p. 26, pp. 21/33.
46

onde houver, aos Plenários de Cortes competentes para analisar recursos, declare a
inconstitucionalidade no caso concreto. Aliás, é um dever dos órgãos do Poder
Judiciário proteger a Constituição.

Já em terra brasilis, o controle de constitucionalidade das leis e atos


normativos é caracterizado pela coexistência dos métodos abstrato e concreto
(sistema misto ou híbrido): o primeiro pelas ações diretas impetradas diretamente no
Supremo Tribunal Federal, com papel idealizado de Corte Constitucional, ou perante
os Tribunais de Justiça e, o segundo, pela declaração de inconstitucionalidade
efetuada em curso de processo que verse sobre caso concreto. Neste último caso, o
Supremo Tribunal Federal exerce papel de Supreme Court pois será o órgão
competente para analisar o controle em última instância 90.

Outra particularidade do Supremo Tribunal Federal é sua composição


política, com indicação pelo Presidente da República e mera sabatina pro forma pelo
Senado, cargo esse que só tem como fim a aposentadoria compulsória dos setenta
anos.

Já a jurisdição constitucional das liberdades é exercida por meio das


ações constitucionais previstas na Constituição como direitos fundamentais, ações
essas também chamadas de remédios constitucionais, como o mandado de
segurança, o habeas corpus e o habeas data.

90
O termo “confusão” é o mais indicado para descrever o anacronismo formado pela concentração
dos dois modelos no sistema brasileiro. Uma das particularidades é que o controle abstrato vincula
erga omnes e o controle concreto inter parte: a mesma norma declarada inconstitucional pelo
Plenário do Supremo pelo controle concreto produz efeitos para as partes, enquanto o resto do país
deve obedecê-la até que o Senado retire a norma do ordenamento por critérios de oportunidade e
conveniência. Já, a norma declarada inconstitucional pelo mesmo Plenário do Supremo, por meio do
controle abstrato, gera efeitos para todo o país, sem necessidade de interferência do Senado.
Registre-se a existência da Rcl nº. 4.335-5, que tramita perante o Plenário do Supremo, com o fim de
acertar essa confusão: os Ministros Gilmar Mendes e Eros Grau, até agora os únicos que
apresentaram voto favorável, pretendem corrigir o erro da Constituição Federal de 1988, no art. 52, X,
para que o controle abstrato e o concreto passem a produzir os mesmos efeitos erga omnes e, isso,
com base na doutrina de Carlos Alberto Lúcio Bitencourt, o qual, já em 1968, advogava pela
vinculação geral no controle de constitucionalidade em casos concretos pelo Pleno da Corte.
(BITTENCOURT, Carlos Alberto Lúcio. O contrôle jurisdicional da constitucionalidade das leis.
2ª. Ed. Rio de Janeiro: Forense, 1968, passim). No mesmo sentido, Mauro Cappelletti veio defender a
jurisidição constitucional com a idéia do check and balances do Poder Judiciário sobre os demais, o
que chama de least dangerous branch, ou a garra menos perigosa (CAPPELLETTI, Mauro.
Constitucionalismo moderno e o papel do poder judiciário na sociedade contemporânea. In Revista
de processo. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, ano 15, nº. 60, out./dez. de 1990, pp.
110/117, em destaque pp. 112/113.
47

2.2. O direito constitucional processual.

A relação Constituição-processo foi desenvolvida no contexto do pós-


positivismo, momento no qual a humanidade necessitava de maiores direitos e
91
garantias frente ao Estado como forma de impedir o totalitarismo . O direito
processual no totalitarismo, em regra, privilegiou a parte mais forte, o Estado, em
detrimento do consumidor da justiça, o jurisdicionado.

Nesse contexto, a Constituição brasileira de 1988 introduziu os direitos e


garantias processuais como direitos fundamentais negativos em oposição à atuação
estatal. Vale dizer que o Estado, em quaisquer funções, não pode deixar de
observá-los. Como se observa nas veementes lições de Cassio Scarpinella Bueno,
“sem nenhum exagero, é impensável falar-se em uma ‘teoria geral do direito
processual civil’ que não parta da Constituição Federal, que não seja diretamente
vinculada e extraída dela” 92.

Conforme comentado, a observância das normas constitucionais no


desenvolvimento da relação jurídica processual se torna verdadeira condição de
legitimidade para a decisão judicial. Sobre a importância deste estudo, comenta
José Joaquim Gomes Canotilho:

A existência de um paradigma constitucional na Constituição portuguesa


obriga a estudar e analisar os diferentes processos não apenas na sua
configuração concreta dada pela lei ordinária (os códigos processuais
ordinários), mas também sob o ângulo da sua conformidade com as normas
constitucionais respeitantes às dimensões processuais das várias
93
jurisdições (grifos no original).

91
Ver item 1.4. supra.
92
BUENO, Cassio Scarpinella. Modelo constitucional do direito processual civil. In Revista de
Processo. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, v. 161, pp. 261/270, em destaque p. 264. No
mesmo sentido, Habscheid, apresentando o relatório geral de estudos de Direito Comparado em
1977 já dizia: “O Estado encarna a organização social, o processo civil reflete as idéias éticas,
ideológicas e políticas que caracterizam uma dada sociedade. Consequentemente, o direito
processual civil não pode e não dee ser considerado de forma isolada, mas na verdade, englobado
em tais ideais e concepções, que se expressam na ordem constitucional” (HABSCHEID, Walther J.
As bases do direito processual civil. Tradução de Arruda Alvim. In Revista de processo. São Paulo:
Editora Revista dos Tribunais, ano. 3, nº. 11/12, jul./dez. de 1978, pp. 117/145, em destaque p. 118).
93
CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Op. cit., p. 967.
48

Pode-se afirmar, sem incorrer em exageros, que o paradigma de


princípios da Constituição brasileira está delimitado em seu preâmbulo94 e no Título I
ao tratar dos princípios fundamentais e objetivos da República Federativa do Brasil.
Dentre esses princípios fundamentais, destaca-se o que mais tem ganhado foros
nos debates e produções acadêmicas nas últimas duas décadas: o princípio da
dignidade da pessoa humana.

O surgimento da idéia de uma dignidade que acompanha o homem


independentemente da positivação estatal, como já vimos 95, surgiu na doutrina do
direito natural. O desenvolvimento moderno desta doutrina pode é remontado à
produção intelectual de Immanuel Kant. Dizia o filósofo:

No reino dos fins, tudo tem um preço ou uma dignidade. Quando uma coisa
tem um preço, pode ser substituída por algo equivalente; por outro lado, a
coisa que se acha acima de todo preço, e por isso não admite qualquer
equivalência, compreende uma dignidade [...]; mas o que se faz condição
para alguma coisa que seja fim em si mesma, isso não tem simplesmente
96
valor relativo ou preço, mas um valor interno, e isso quer dizer, dignidade .

Para nosso auxílio, Kant ainda cuida da liberdade de escolha coexistindo


com a liberdade de todos de acordo com uma lei universal, como Princípio Universal
do Direito, um princípio categórico jurídico: “age só segundo máxima tal que possas
ao mesmo tempo querer que ela se torne lei universal” 97.

O Estado encontra no sentido finalístico do “ser humano” uma limitação


até mesmo na hora de punir. Jamais se pode infligir uma pena meramente como
meio de atingir um favor ao próprio criminoso ou à sociedade civil, o qual deve ser
punido somente porque cometeu um crime. E por que o Estado vê-se limitado

94
Diz o preâmbulo: “Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembléia Nacional
Constituinte para instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos
sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a
justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na
harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das
controvérsias, promulgamos, sob a proteção de Deus, a seguinte CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA
FEDERATIVA DO BRASIL”.
95
Ver item 1.2. supra.
96
KANT, Immanuel. Fundamentação à metafísica dos costumes e outros escritos. São Paulo:
Matin Claret, 2005, p. 65.
97
Ibidem, p. 51.
49

perante o homem? Porque a “sua natureza os distingue” e, por isso, os protege


disso 98. Nas Palavras de Gláucia Correa Retamozo Barcelo Alves:

Tal noção implica que a dignidade de uma pessoa independe de seu status
social, do cargo que ocupa, da sua popularidade, de sua utilidade para os
outros. Esses fatores podem mudar, mas a dignidade atribuída ao ser
humano enquanto agente moral não. Por isso, não se pode dizer, explica
Thomas Hill que uma pessoa tenha mais dignidade que outra. Ao afirmar
que a dignidade não admite equivalente, Kant afirma também que aquele
que é dotado de dignidade não pode ser trocado ou sacrificado sob
qualquer pretexto. O que tem dignidade não tem preço e não pode ser
99
mensurado .

Em que pese entendimento contrário, sendo a dignidade inata à


personalidade, não importará o caso concreto, mesmo o maior dos criminosos terá
sua dignidade protegida. Ela possui tal condão no sentido de serem reconhecido
como pessoas, “ainda que não se portem de forma igualmente digna nas suas
100
relações com seus semelhantes, inclusive consigo mesmos” , não poderá jamais
ser privado de todo o respeito enquanto ser humano.

Conforme assevera José Afonso da Silva, a dignidade humana é um


“valor de todo o ser racional, independentemente da forma como se comporte”.
Mesmo com tais atos (de “comportamento indigno”, para o autor), nada poderá
privar a pessoa de seus direitos fundamentais que protegem sua qualidade digna
intrínseca 101.

O Estado, tendo avocado a jurisdição, não poderia deixar de


instrumentalizar o princípio da dignidade da pessoa humana, um verdadeiro
paradigma constitucional que se pôs no topo e na base do ordenamento jurídico.
Assim, desenvolveu a carta de direitos fundamentais do Título II da Constituição

98
KANT, Immanuel. Op. cit., p. 58.
99
BARCELO ALVES, Gláucia Correa Retamozo. Sobre a dignidade da pessoa. In A reconstrução
do direito Privado: reflexos dos princípios, diretrizes e direitos fundamentais constitucionais no
direito privado. MARTINS-COSTA, Judith (Coord.). São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2002, pp.
213/229, em destaque p. 214.
100
SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais. 4ª Ed. Porto
Alegre: Editora Livraria do Advogado, 2206, p. 44.
101
SILVA, José Afonso da. Poder constituinte e poder popular. 1ª ed., 2ª tiragem. São Paulo:
Malheiros, 2002, p. 148.
50

Federal de 1988, positivando princípios processuais para impedir a infração à


dignidade da pessoa humana 102.

Nesse campo de axiomas traduzidos em normas constitucionais, os


princípios desenvolvem um papel importantíssimo para a processualística
contemporânea, em especial os princípios constitucionais do processo que foram
positivados, certo momento como regras, em outros como princípios. Tais direitos
individuais e sociais foram inseridos como cláusulas pétreas, as quais não podem ao
menos ser objeto de proposta de emenda constitucional para sua supressão.

Esse papel importantíssimo não pode ser encarado como caráter absoluto
dos princípios constitucionais do processo. Conforme verificamos no capítulo
antecedente, os princípios, por sua característica intrínseca de norma com caráter
prima facie sempre precisa ser ponderado no caso concreto frente ao outro(s)
princípio(s) que delimitem seu campo de atuação. São mandamentos de otimização.

Assim, vale a advertência de João Batista Lopes para a


“supervalorização” que se costuma fazer dos princípios constitucionais do processo,
como se toda e qualquer relação jurídica pudesse ser resolvida com a aplicação
direta da Constituição, deixando-se de lado todo o desenvolvimento teórico da
técnica processual, a qual desenvolveu, ainda, princípios processuais
103
infraconstitucionais que merecem igual atenção . Para isso, a hermenêutica tem
papel importantíssimo.

Nesse ponto, vale lembrar o papel que traçamos dos princípios no


sistema jurídico, em que os elementos, no caso princípios constitucionais e

102
Não há como precisar um conceito jurídico para a dignidade da pessoa humana por tratar-se de
termo filosófico. Ocorre que o Direito não ficou inerte frente a suas constantes violações. Positivar
meios de proteção foi de grande auxílio, ainda mais no campo do processo civil, com o fim de
proteger a pessoa humana do desenvolvimento de um processo kafkiano. Vale comentar as palavras
de Ingo Wolfgang Sarlet: “Todavia, importa olvidar que o Direito poderá exercer papel crucial na sua
proteção e promoção, não sendo, portanto, completamente sem fundamento que se sustentou até
mesmo a desnecessidade de uma definição jurídica da dignidade da pessoa humana, na medida em
que, em última análise, se cuida do valor próprio, da natureza do ser humano como tal. No entanto,
quando se cuida de aferir a existência de ofensas à dignidade, não há como prescindir – na esteira do
que leciona González Pérez – de uma clarificação quanto ao que se entende por dignidade da
pessoa, justamente para que se possa constatar e, o que é mais importante, coibir eventuais
violações” (SARLET, Ingo Wolfgang. Op. cit., p. 42; do mesmo autor: A eficácia dos direitos
fundamentais. 6ª Ed. Porto Alegre: Editora Livraria do Advogado, 2006, p. 117).
103
LOPES, João Baptista. Efetividade da tutela jurisdicional à luz da constitucionalização do processo
civil. In Revista de processo. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, ano 29, vol. 119, jul./ago. de
2004, pp. 29/39, pp. 31/32.
51

infraconstitucionais do processo, convergem para a realização de um único fim:


104-
realizar um processo capaz de produzir um resultado efetivo, tempestivo e justo
105
.

Como princípios do processo previstos na Constituição, podemos


destacar os seguintes, dentre tantos outros:

• O devido processo legal;

• A inafastabilidade do controle jurisdicional;

• O contraditório e a ampla defesa;

• A paridade de armas, ou igualdade de tratamento entre as partes;

• O juiz e o promotor natural;

• A proibição da utilização de provas obtidas por meio ilícito;

• A publicidade dos atos processuais;

• A motivação das decisões judiciais;

• A celeridade e a efetividade do processo.

Devido à delimitação do tema proposto, iremos verificar a relação entre


alguns dos princípios elencados: o devido processo legal, tendo como corolários o
contraditório e a ampla defesa, em face da celeridade e efetividade do processo.

A escolha se justifica em face da importância dos princípios destacados


para o acesso à justiça, a concretização dos anseios sociais e a revisitação do
caráter privatista do processo em face das alterações constitucionais, em especial a
promovida pela EC nº. 45, de 2004, alterações no Direito Processual Constitucional
e no Direito Constitucional.

104
Ver item 1.5., supra. Nesse sentido: DINAMARCO, Cândido Rangel. A reforma da reforma. 6ª
Ed., rev. e atual. São Paulo: Malheiros, 2003, p. 29.
105
Por tal caráter sistemático do direito processual constitucional e infraconstitucional, a proteção da
norma legal leva, em última análise, à proteção da norma da Constituição, pois “a efetividade do
ordenamento jurídico nacional como um todo, que é um dos escopos políticos do processo, no fundo
é a efetividade da própria Constituição”, ou seja, “aquele é necessariamente irradiação de preceitos e
princípios constitucionais”, o que irá caracterizar a uniformidade do sistema. (DINAMARCO, Cândido
Rangel. A instrumentalidade do processo. 13ª Ed. São Paulo: Malheiros, 2008, p. 33; ______.
Instituições de direito processual civil. 6ª Ed. rev. e atual. São Paulo: Malheiros, 2009, p. 195;
NERY JUNIOR, Nelson. Op. cit., 41). Assim, não se justifica a atitude empedernida do Supremo
Tribunal Federal em conhecer recurso extraordinário que verse sobre princípios constitucionais do
processo, pois haveria, apenas e tão somente, infração indireta à Constituição.
52

2.2.1. O princípio fundamental do devido processo legal.

No ano de 1.215, a burguesia britânica que se via ameaçada pelo Poder


Executivo, simbolizado pelo Rei João Sem Terra, obrigou-o a assinar o documento
chamado de Magna Carta, garantindo certos direitos da pessoa humana de cunho
liberal, em especial o direito a um procedimento em contraditório, previsto em
abstrato na lei, com o fim de não permitir a existência de surpresas no decorrer de
106
um processo judicial . Foi o primeiro passo para o que denominamos hoje de
devido processo legal, conforme a expressão due process of law consagrada na
Statute of Westminter and the liberties London, conjunto de atos assinado pelo Rei
Eduardo III, em 1.354 107.

Embora, de início, seja eminentemente processual, a due process clause,


108
com base no trinômio vida-liberdade-propriedade , tem dupla aplicação: devido
processo substantivo (substative due process of law) e o processual (procedural due
process of law) 109.

106
O texto da Magna Carta diz: “Nenhum homem deve ser apreendido ou detido, ou despojado de
seus direitos ou de sua propriedade, ser posto à margem da proteção da lei ou exilado, ou perder sua
posição (imunidades) de qualquer outro modo, nem vamos a agir com força contra ele, ou mandar
fazê-lo, exceto por um julgamento por seus pares ou pela lei da terra (direito costumeiro)”. No original:
“No free man shall be seized or imprisoned, or stripped of his rights or possessions, or outlawed or
exiled, or deprived of his standing in any other way, nor will we proceed with force against him, or
send others to do so, except by the lawful judgement of his equals or by the law of the land” (GRÃ
BRETANHA. Magna Carta. Londres: The British Library, documento assinado em 15 de junho de
1215. Disponível em: http://www.bl.uk/treasures/magnacarta/translation/mc_trans.html. Acesso em 2
de nov. de 2009).
107
Diz o texto: “Ninguém será condenado sem julgamento. Além disso, nenhum homem, no estado ou
condição em que estiver, será expulso do país ou de sua residência, nem pego ou aprisionado, nem
deserdado, nem condenado à morte, sem ser chamado a responder por meio de um devido processo
legal”. No original: “None shall be condemned without trial. Also, that no man, of estate or condition
that he be, shall be put out of the land or tenement, nor taken or imprisoned, nor disinherited, nor put
to death, without being brought to answer by due process of law” (RADIN, Max. Handbook of anglo-
american legal history. Saint Paul: West Publishing, 1936, p. 153).
108
NERY JUNIOR, Nelson. Op. cit., p. 79.
109
De início e por muito tempo, somente era conhecido o procedural due process, em primeiro plano
de atuação, aplicação ao direito penal, estendido posteriormente ao processo civil. Muito embora o
princípio já viesse estampado na Quinta Emenda da Constituição Estadunidense, fazendo parte da
Bill of Rights, o substantive due process só surgiu com a Décima Quarta Emenda, em 1886, bem
como com a abertura jurisprudencial da Suprema Corte Americana (SIQUEIRA CASTRO, Carlos
Roberto de. O devido processo legal e a razoabilidade das leis na nova Constituição do Brasil.
Rio de Janeiro: Editora Forense, 1989, pp. 34 e 49; DEL CLARO, Roberto. Devido processo legal –
direito fundamental, princípio constitucional e cláusula aberta do sistema processual civil. In Revista
53

O devido processo legal em seu sentido material tem aplicação prática em


todos os campos do direito ao tutelar a vida, a liberdade e a propriedade ao
regularem situações de direito material, com o fim de impor ao legislador a idéia de
justiça. A dimensão material da cláusula tem como objetivo impedir o abuso dos
110
Poderes do Estado à regra da proporcionalidade . Vale dizer: trata-se da
possibilidade de revisão do conteúdo dos atos de tais Poderes.

O conceito substancial do devido processo legal nunca ficou engessado


na história do instituto. Isso fica bem claro no estudo do direito norte-americano,
onde “há flutuações no próprio conceito, no valor intrínseco e instrumental desse
111
princípio” , desenvolvimento este que se confunde com a própria história da
Suprema Corte Americana, mas que não parece absorvida, totalmente, pela
mentalidade do jurista brasileiro.

Em seu sentido processual, o devido processo legal se refere à


necessária observância das regras legais referentes ao processo judicial e
administrativo. Os demais princípios que enunciamos decorrem logicamente do
procedural due process: se o processo respeitar o espírito da cláusula, não haverá
tratamento desigual, as partes serão chamadas a responder cada alegação contra

de processo. São Paulo: Editora Revisa dos Tribunais. Ano 30, n. 126, ago. de 2005, pp. 260/294,
em destaque pp. 261/262).
110
Para ilustrar a aplicação do aspecto material da due process clause, destaca-se o seguinte julgado
do Supremo Tribunal Federal: “VEDAÇÃO DE COLIGAÇÕES PARTIDÁRIAS APENAS NAS
ELEIÇÕES PROPORCIONAIS - PROIBIÇÃO LEGAL QUE NÃO SE REVELA ARBITRÁRIA OU
IRRAZOÁVEL - RESPEITO À CLÁUSULA DO SUBSTANTIVE DUE PROCESS OF LAW. - O Estado
não pode legislar abusivamente. A atividade legislativa está necessariamente sujeita à rígida
observância de diretriz fundamental, que, encontrando suporte teórico no princípio da
proporcionalidade, veda os excessos normativos e as prescrições irrazoáveis do Poder Público. O
princípio da proporcionalidade - que extrai a sua justificação dogmática de diversas cláusulas
constitucionais, notadamente daquela que veicula a garantia do substantive due process of law -
acha-se vocacionado a inibir e a neutralizar os abusos do Poder Público no exercício de suas
funções, qualificando-se como parâmetro de aferição da própria constitucionalidade material dos atos
estatais. A norma estatal, que não veicula qualquer conteúdo de irrazoabilidade, presta obséquio ao
postulado da proporcionalidade, ajustando-se à cláusula que consagra, em sua dimensão material, o
princípio do substantive due process of law (CF, art. 5º, LIV). Essa cláusula tutelar, ao inibir os efeitos
prejudiciais decorrentes do abuso de poder legislativo, enfatiza a noção de que a prerrogativa de
legislar outorgada ao Estado constitui atribuição jurídica essencialmente limitada, ainda que o
momento de abstrata instauração normativa possa repousar em juízo meramente político ou
discricionário do legislador” (ADI nº. 1407 MC, Relator Ministro Celso de Mello, Tribunal Pleno,
julgado em 07 de mar. de 1996, publicado no Diário da Justiça de 24 de nov. de 2000, p. 86).
111
ROSAS, Roberto. Devido processo legal: evolução norte-americana. In DIREITO, Carlos Alberto
Menezes (Org.). Estudos em homenagem ao prof. Caio Tácito. Rio de Janeiro: Editora Renovar,
1997, pp. 579/589, em destaque p. 589.
54

ela argüidas, não terão vantagens indevidas, terão um julgamento público e


motivado para que possam se convencer dos argumentos do Poder Judiciário etc. 112

Dessa forma, cabe ao Estado proteger a idéia de devido processo legal


processual, por desenvolver medidas legislativas para tornar efetivo, no caso
concreto, o cumprimento das referidas facetas do princípio. Ele o faz através de
normas processuais construídas para promover a concretização da norma
constitucional. Daí o porquê do Supremo Tribunal Federal se referir, certa vez, ao
devido processo legal como sendo um “processo disciplinado por normas legais” 113.

Vale dizer que o processo, por sempre tratar de algum aspecto do


trinômio vida-liberdade-propriedade, será nulo se algum dos aspectos do devido
processo for violado. Esse princípio é a base de um processo judicial ou
administrativo no Estado Democrático (e Social) de Direito. Fugindo dos critérios da
razoabilidade e da proporcionalidade, qualquer decisão não terá condão de produzir
efeitos justos.

E é com essa integração entre os aspectos processual e material que


deve ser estudado o instituto. Não mais se justifica a preocupação apenas com a
conformidade do procedimento previsto in abstrato para caracterizar o devido
112
Esse é o posicionamento de Nelson Nery Junior que se aqui se adota: “Em nosso parecer,
bastaria a norma constitucional haver adotado o princípio do due process of law para que
decorressem todas as consequências processuais que garantiriam aos litigantes o direito a um
processo e a uma sentença justa. É, por assim dizer, o gênero do qual todos os demais princípios e
regras constitucionais são espécies” (NERY JUNIOR, Nelson. Op. cit., p. 77 e 96). A enumeração dos
princípios que decorrem do devido processo legal é necessária para a melhor observação, no campo
infraconstitucional, de aplicação daquele. Isto é, as especificidades tornam mais clara a forma de
atuação para permitir a ponderação no caso concreto, ainda mais pela impossibilidade de se elevar o
princípio do devido processo legal ao caráter de absoluto, conforme já nos posicionamos.
113
“EMENTA: CONSTITUCIONAL. PROCESSUAL CIVIL. MEDIDA CAUTELAR: LIMINAR. Lei 8.437,
de 30.06.92, art. 2º e art. 4º, § 4º, redação da Med. Prov. 1.984-19, hoje Med. Prov. 1.984-22.
ORDEM PÚBLICA: CONCEITO. PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS: C.F., art. 37. ECONOMIA
PÚBLICA: RISCO DE DANO. Lei 8.437, de 1992, art. 4º. I - Lei 8.437, de 1992, § 4º do art. 4º,
introduzido pela Med. Prov. 1.984-19, hoje Med. Prov. 1.984-22: sua não suspensão pelo Supremo
Tribunal Federal na ADIn 2.251-DF, Ministro Sanches, Plenário, 23.08 .2000. II - Lei 8.437, de 1992,
art. 2º: no mandado de segurança coletivo e na ação civil pública, a liminar será concedida, quando
cabível, após a audiência do representante judicial da pessoa jurídica de direito público, que deverá
se pronunciar no prazo de setenta e duas horas. Liminar concedida sem a observância do citado
preceito legal. Inocorrência de risco de perecimento de direito ou de prejuízo irreparável. Ocorrência
de dano à ordem pública, considerada esta em termos de ordem jurídico-processual e jurídico-
administrativa. III - Princípios constitucionais: C.F., art. 37: seu cumprimento faz-se num devido
processo legal, vale dizer, num processo disciplinado por normas legais. Fora daí, tem-se
violação à ordem pública, considerada esta em termos de ordem jurídico-constitucional,
jurídico-administrativa e jurídico-processual. IV - Dano à economia pública com a concessão da
liminar: Lei 8.437/92, art. 4º. V - Agravo não provido”. (Pet nº. 2066 AgR, Relator Ministro Marco
Aurélio, Tribunal Pleno, julgado em 19 de out. de 200, publicado no Diário da Justiça de 28 de fev. de
2003, p. 07 (grifo nosso).
55

processo legal. Trata-se da busca de um processo justo, no aspecto formal que, sem
sombra de dúvidas refletirá materialmente e que garantirá todos os meios possíveis
114
para a “realização do ideal de protetividade dos direitos” . Nas palavras de Lucia
Valle Figueiredo:

Atualmente já não mais é assim porque, conforme já disse, quando o due


process of law passa a ter conteúdo material e não mais apenas formal –
quer dizer, tem duplo conteúdo e vamos ver que, em alguns princípios
processuais, aparece com duplo conteúdo, com conteúdo substancial e com
conteúdo formal [sic]. Os processualistas da atualidade entendem que, no
115
due process of law, está contido tal conteúdo material .

Não deixamos de notar que Roberto Del Claro se posiciona de maneira


diversa, insinuando que no ordenamento jurídico brasileiro, da família da civil law,
não pode se submeter à idéia de um devido processual substancial. Assim se
posiciona:

Porém, se alguns eminentes membros da Suprema Corte dos Estados


Unidos e, respeitável parcela da doutrina do direito constitucional deste
país, defendem que não deveria existir um devido processo legal
substantivo, isto é um sinal mais do que claro de que a doutrina brasileira e
sua recente cláusula devem – porque não precisam – se envolver em tais
controvérsia.
[..]
Falar em devido processo substantivo – ainda mais na Constituição Federal
de 1988 – é um paradoxismo sem suporte no texto ou na história da
Constituição. Interpretar um direito fundamental de conteúdo processual
como sendo uma panacéia universal para as injustiças certamente constitui
uma interpretação forçada e errada do inc. LIV do art. 5º. da Constituição da
116
república .

114
A expressão é de Sérgio Luís Wetzel de Mattos, que faz apologia à conciliação da observância do
procedimento legal, ou ordenado, com a teoria substantiva, ou value oriented theory (MATTOS,
Sérgio Luís Wetzel. O princípio do devido processo legal revisitado. In Revista de processo. São
Paulo: Editora Revista dos Tribunais. Ano 30, n. 120, fev. de 2005, pp. 263/228, em destaque pp.
265/266).
115
FIGUEIREDO, Lúcia Valle. Princípios constitucionais do processo. In Revista trimestral de
direito público. São Paulo: Editora Malheiros, nº. 1/1993, pp. 118/126, em destaque p. 120.
116
DEL CLARO, Roberto. Op. cit., p. 266 e 269.
56

Nesse ponto, uma observação é importante: a inserção do princípio do


devido processo legal no art. 5º, LIV, da Constituição Federal de 1988, não significa
que o instituto não possua história no Brasil antes desta data, e isso por si só serve
para não concordarmos com Roberto Del Claro, que parece manter um
posicionamento conformista.

O art. 179 da Constituição Imperial de 1824 já referenciara, ainda que


indiretamente, alguns campos de sua aplicação. Além disso, muito se escreveu a
respeito da aplicação do due process of law desde promulgação do art. 179 daquela
Constituição até 1988, também em seu aspecto material, ainda que não houvesse
previsão positiva em nosso ordenamento.

Rui Barbosa, João Mendes Junior, Castro Nunes, José Frederico


Marques, Santiago Dantas, Antônio Roberto Sampaio Dória, Ada Pellegrine
Grinover, Humberto Theodoro Junior e Carlos Mário da Silva Velloso são alguns dos
nomes lembrados por Roberto Rosas ao comentar sobre o muito que se fez para a
inclusão do princípio nos debates da Constituinte de 1987 117.

Feito esse rápido apanhado histórico, sem nos atermos a toda extensão e
profundidade do devido processo legal para o sistema processual civil brasileiro,
passamos a verificar sua relação com a garantia do contraditório.

Nesse aspecto, cumpre frisar que o contraditório é corolário do devido


processo legal, dependendo diretamente dele. Vale destacar: processo judicial ou
administrativo sem contraditório pode ser qualquer coisa, menos democrático, legal,
constitucional e devido. Há quem o chame até mesmo de “um dos pilares do
processo” 118.

Ele não é novidade da Constituição de 1988: foi previsto no art. 179, VIII,
da Constituição de 1824; art. 72, §16, da Constituição de 1891; art. 113, nº. 24, da
Constituição de 1934; art. 122, nº. 11, da Constituição de 1937; art. 141, §25, da

117
A lista de juristas que caminharam nesse sentido é exposta por Roberto Rosas. No mesmo
sentido, Rui Portanova comenta que “a interpretação já provinha não só do fato de o princípio estar
consagrado no artigo 8º e 10 da Declaração Universal dos Direitos do Homem, de 1948, como pela
sistematização dos demais princípios que são enfeixados no devido processo legal” (ROSAS,
Roberto. Op. cit., pp. 175/177; PORTANOVA, Rui. Princípios do processo civil. 4ª Ed. Porto Alegre:
Livraria do Advogado, 2001, p. 146).
118
BUENO, Cassio Scarpinella. Os princípios do processo civil transnacional e o código de processo
civil brasileiro: uma primeira aproximação. In Revista de Processo. São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, ano 30, v. 122, abr. de 2005, pp. 167/186, em destaque p. 175.
57

Constituição de 1946; art. 153, §15, da Constituição de 1937, com redação dada
pela Emenda nº. 1, de 17 de outubro de 1969.

O devido processo legal traz consigo a idéia de que a todos deve ser
assegurada a oportunidade de influir no resultado final da causa. Essa influência não
pode ser garantida de maneira pro forma, mas ser efetiva. Resultará, assim, numa
proteção processual prevista em lei e que deverá ser garantida pelo julgador,
compreendendo “o direito à completa proteção jurídica, ou seja, a uma adequada
proteção processual sempre que necessitar de ser ouvido em juízo” 119.

Essa faceta do devido processo legal está insculpida na garantia do


contraditório que é assegurado a “autor, réu, litisdenunciado, opoente, chamado ao
processo – assim como ao assistente litisconsorcial e simples e ao Ministério
120
Público, ainda quando atue na função de fiscal da lei” . Para isso, não basta dar a
conhecer às partes e terceiros o que ocorreu nos autos do processo, mas, também,
dar-lhes toda a oportunidade de exercer os direitos, deveres e ônus processuais que
lhe cabem.

Carlos Alberto Álvaro de Oliveira, em excelente artigo denominado “A


garantia do contraditório”, deixa claro sua posição ao dizer que o processo civil,
como instrumento de realização do direito material, é fruto da produção cultural do
homem, “formado pela confluência de idéias, projetos sociais, políticos e estratégias
de poder reinantes em determinada sociedade, com notas específicas de tempo e
espaço” 121.

119
THEODORO JUNIOR, Humberto. A garantia fundamental do devido processo legal e o exercício
do poder de cautela no direito processual civil. In Revista dos Tribunais. São Paulo: Editora Revista
dos Tribunais. Ano 80, v. 665, mar. de 1991, pp. 11/22, em destaque p. 14. Para Bedaque,
“contraditório nada mais é que a garantia da ampla defesa examinada pelo ângulo do procedimento”,
permitindo, às partes, a necessária paridade de armas pela contraposição de teses, e, ao juiz, a
busca da verdade provável (BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Efetividade do processo e
técnica processual. São Paulo: Malheiros Editores, 2006, pp. 482/483).
120
NERY JUNIOR, Nelson. Op. cit., pp. 205/206.
121
ÁLVARO DE OLIVEIRA, Carlos Alberto. A garantia do contraditório. In Revista Forense. Rio de
Janeiro: Editora Forense, v. 346, abr./jun. de 1999, pp. 9/19, em destaque p. 9. O posicionamento é
original e mantém certa coerência, com o que expomos até o momento, mas uma leitura rápida pode
levar à idéia positivista de que o direito processual se restringe a um objeto ideal, fruto da criação
humana, como se houvesse certa liberdade irrestrita do homem. Para nós, e no sentido que temos
defendido até o momento, o processo civil decorre do desenvolvimento histórico, como toda a ciência
do Direito, mas desenvolver instrumentos ao bel prazer do homem pode levar à desnaturação da
natureza do objeto tutelado, isto é, o direito material e dos escopos sociais que o fundamentam.
58

Com o contraditório não é diferente. Pensar na aplicação deste princípio,


hoje, com o intuito de mirar pra o futuro da ciência processual não terá qualquer
legitimidade se não olharmos para sua aplicação ontem. Assim, é importante
verificar o contingente histórico da garantia constitucional.

No processo comum europeu medieval, o contraditório tinha a função


de intermediar a busca da verdade provável gerada pela aplicação do silogismo
dialético. Exigia-se uma “paritária e recíproca regulamentação do diálogo judiciário”
entre o pensamento apodídico (o certamente verdadeiro) e o sofístico (o certamente
falso) 122.

No processo liberal, guiado pela filosofia do laissez faire, laissez passer,


o Estado avocou a si o monopólio jurisdicional e legislativo para regular o direito
processual. O contraditório, como o próprio princípio da igualdade, passa a ser um
mero requisito para o regular desenvolvimento do processo e “deixa de ser visto
como necessário e intrínseco mecanismo de investigação da ‘verdade’, rebaixado a
123
princípio externo e puramente lógico formal” . A passividade do judiciário (daí o
desenvolvimento do princípio dispositivo) obrigava-o a se concentrar na verificação
de requisitos formais do processo.

No processo social, inaugurado com as preocupações voltadas à


sociedade como “novo” escopo do processo civil no decorrer do século XX, o
contraditório passa a uma nova fase: a efetividade do provimento jurisdicional com o
fim de entregar o que é devido a cada um num tempo razoável para, dessa forma,
124
fazer justiça, “uma das funções principais do Estado” . Para isso, há um grande
esforço para a quebra de dogmas a qualquer custo, como a revitalização do ativismo
judicial, a instrumentalidade das formas, os benefícios sociais da solução dos litígios
privados e a compreensão não unívoca na relação entre sujeito (hermeneuta) e
objeto (texto normativo) 125.

122
ÁLVARO DE OLIVEIRA, Carlos Alberto. A garantia do contraditório. In Revista Forense. Rio de
Janeiro: Editora Forense, v. 346, abr./jun. de 1999, p. 10.
123
Idem ibidem, p.11.
124
BARBOSA MOREIA, José Carlos, O neoprivatismo no processo civil. In Revista de Processo.
São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, ano 30, v. 122, abr. de 2005, pp. 9/21, em destaque p. 18.
125
ALVARO DE OLIVEIRA, Carlos Alberto. Op. cit., p. 11/19; BARBOSA MOREIA, José Carlos,
Ibidem, p. 19.
59

No caminho que tomou o processo civil nas últimas décadas, com a


influência de um direito constitucional que se preocupa cada vez mais com a
dignidade da pessoa humana, às partes deve ser dada uma efetiva possibilidade de
participação na relação jurídica processual.

Há fundados motivos para a doutrina, o legislador e a jurisprudência se


portar dessa forma, mas cuidados devem ser tomados, como vermos.

2.2.2. A garantia constitucional do direito de ação: revisitação em face da


efetividade, justiça e celeridade.

Diversas querelas doutrinárias que surgiram nas fases que marcaram os


estudos sobre a garantia do direito de ação: a teoria civilista, a teoria da ação como
direito potestativo, a teoria da ação no sentido abstrato 126.

Nos últimos anos, particularmente no caso brasileiro, o direito de ação


tem sido afetado pelo conceito de efetividade da prestação jurisdicional. Assim, duas
correntes se formaram: a que acredita ser o direito de ação um poder para requerer
ao Estado a tutela dos direitos que lhe são devidos em cada fase do processo,
independente de existir o direito material a seu favor, mas sendo esse fator decisivo
127
para o fim a que se destina o processo ; bem como a que crê ser um direito de
requerer uma tutela jurisdicional que coincide com a sentença. Em ambos os casos,
um mesmo fator tem norteado os doutrinadores: o dever do Estado, de responder o
reclamo utilizando a técnica adequada para cumprir com efetividade o direito.

O problema do acesso à justiça tem sido mitigado com o passar dos anos.
Muito tem sido feito para que o cidadão possa ingressar no Judiciário ou em formas
alternativas de soluções de controvérsias, com o fim de adquirir uma solução justa
para seus problemas.

126
Para uma profunda visão do desenvolvimento histórico do direito de ação, recomendamos a leitura
da obra de Moacyr Amaral Santos: Primeiras linhas de direito processual civil. Vol. 1. 20ª Ed., rev.
e atual. São Paulo: Editora Saraiva, 1998, capítulo intitulado “Da Ação”.
127
Está claro que o direito de ação se divide em dois: o direito de ação garantido constitucionalmente,
não se ligando à existência do direito material, bem como o direito de ação processual, o qual é
restringido pela existência de pressupostos processuais e condições da ação verificáveis caso a caso
(ARAUJO CINTRA, Antonio Carlos de; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel.
Teoria geral do processo. 23ª Ed. São Paulo: Malheiros, 2007, p. 272).
60

A abertura ao Poder Judiciário se tornou uma verdadeira caixa de


Pandora: sem racionalizar as conseqüências da amplitude dada ao cidadão para
recorrer ao Judiciário, o inchaço das vias jurisdicionais de solução dos conflitos foi
questão de pouco tempo.

Em recente estudo divulgado pelo Conselho Nacional de Justiça, verifica-


se uma queda da taxa de congestionamento nos Cartórios Judiciais do Poder
Judiciário: em 2008, a Justiça Federal de primeiro grau estava com 76,1%, a Justiça
do Trabalho de primeiro grau com 47,5%, a Justiça Comum Estadual de primeiro
128
grau com 79,6% . Números inaceitáveis, tendo em vista não haver outra forma
para que os cidadãos possam ver solucionados problemas que não sejam afetos a
acordos.

Vele destacar a crítica bem pontuada de José Roberto dos Santos


Bedaque:

Facilitou-se o ingresso e, em consequência, o número de processos


aumentou de forma espantosa. Não foram adotadas, todavia, medidas
visando adequar o Poder Judiciário e a técnica processual a essa nova
realidade. Além de a estrutura permanecer a mesma praticamente
129
inalterada, são empregados métodos de trabalho ultrapassados .

Com os olhos voltados para o consumidor da justiça, a preocupação do


Estado tem sido direcionada para alcançar meios dentro e fora do processo para
resolver a morosidade, seja por meios administrativos, seja por “revisitar o sistema
processual” 130.

A doutrina desenvolvida por Oscar Von Bülow, que deu origem na


autonomia do direito processual, deu oportunidade para o desenvolvimento da
cientificidade própria do direito processual civil. Ocorre que parte dos doutrinadores

128
BRASIL. Conselho Nacional de Justiça. Justiça em números: principais fatos e análise da série
histórica. Brasília: CNJ, 2009. Disponível em:
http://www.cnj.jus.br/images/imprensa/resumo_justica_em_numeros_2008.pdf. Acessado em: 22 de
nov. de 2009.
129
BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Efetividade do processo e técnica processual. São
Paulo: Malheiros Editores, 2006, pp. 20/21.
130
BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Direito e processo: influência do direito material sobre o
processo. 2ª Ed., 2ª tiragem. São Paulo: Malheiros Editores, 2001, p. 12.
61

se fechou numa concha, elevando o caráter eminentemente técnico do processo a


um fim em si mesmo, deixando-se de lado “a condição instrumental do processo”,
131
favorecendo o crescimento do formalismo exacerbado . No mesmo sentido,
notaram Humberto Theodoro Junior e Leonardo Greco:

Nessa linha de preocupação, oportuna e correta é a lição atualíssima de


Leonardo Greco, advertindo para os inconvenientes do “cientificismo
processual” centrado no caráter abstrato do direito de ação e no seu
afastamento da função clássica de tutelar o direito, o que, de certa maneira,
transformou o processo num fim em si mesmo e, na prática, não raras
vezes, o tornou instrumento de protelação e embaraço indefinido e
132
intolerável ao reconhecimento do direito do litigante .

Entendemos que a expressão “efetividade do processo”, por ser termo


legal indeterminado, é tautológica: a efetividade do processo se traduz na existência
de um processo efetivo.

Na realidade, a efetividade do processo traduz a preocupação do


hermeneuta e do profissional do foro em geral em tutelar os direitos de modo que
não importem em desgaste desnecessário de tempo, custos e até mesmo saúde.
Vale dizer, a justiça quando tardia se torna injustiça, como já dizia Rui Barbosa.

Trata-se da aptidão para produzir concretamente os resultados esperados


133
do processo que, juntamente com a idéia de justiça substancial, instalou-se como
valor que norteiam a entrega da prestação jurisdicional. Rever a idéia de processo e
procedimento se tornou um verdadeiro corte epistemológico para filosofia no direito
processual.

A evolução histórica do direito processual tem convergido para a


realização de um processo menos formal e que atenda seus escopos sociais e

131
DINAMARCO, Cândido Rangel. A instrumentalidade do processo. 13ª ed. São Paulo: Editora
Saraiva, 2008, p. 316.
132
THEODORO JÚNIOR, Humberto. Novos rumos do direito processual civil: efetividade da
jurisdição. In Revista Dialética de direito processual. São Paulo: Dialética, nº. 26, maio de 2005, p.
21.
133
BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Efetividade do processo e técnica processual. São
Paulo: Malheiros Editores, 2006, p. 32.
62

políticos, não apenas jurídicos. Para isso, a utilização da tecnologia tem sido de
grande auxílio em searas extrajurídicas.

A preocupação com o processo efetivo tutelado em tempo razoável, agora


direito individual (e por que não social?) fundamental, conforme a Constituição
Federal, artigo 5º, LXXVIII, tem como objetivo imediato diminuir a carga de
congestionamento acima referida nos Tribunais e, como objetivo mediato, a entrega
da tutela no tempo devido.

Um apontamento deve ser feito: Emenda nº. 45/04 foi proposta pelo
Poder Executivo com o fim de racionalizar os trabalhos do Poder Judiciário, em
especial. Criou-se um órgão com participação de não magistrados com o fim de
fiscalização administrativa; expandiu-se a força dos precedentes com a inclusão do
instituto da repercussão geral como pressuposto específico do recurso
extraordinário; alargou-se a competência da Justiça do Trabalho; e, finalmente,
inclui-se como direito fundamental o processo célere como direito fundamental.

Ocorre que nos parece uma armadilha do Executivo, o órgão que libere
as verbas para o trabalho do Judiciário: o primeiro transferiu a responsabilidade de
tutelar os direitos em tempo razoável para segundo, muito embora qualquer
implantação de políticas de mutirão de cartorários, informatização, atualização de
magistrados, racionalização de procedimentos nos ofícios judiciais, dependerá de
toda a verba que o Executivo liberar para o Judiciário. A realidade tem sido a pouca
preocupação com a organização judiciária, conduzindo a insatisfação da população
para a figura do juiz como o responsável imediato.

Para o xeque-mate falta pouco.

2.2.3. O tempo no processo e medidas de aceleração.

Embora seja repisar em campos já estudados com profundidade, não é


demais comentarmos que o tempo possui fortes laços com o processo. O que não
se deve é partir de um juízo apodítico, antes, devemos compreender como essa
relação é exercida para que seja encontrado o norte correto para maior efetividade
da prestação jurisdicional.
63

Já estudado por João Mendes Junior, o “processo”, do latim pro, adiante,


e cedere, ir, etimologicamente se refere ao movimento que é direcionado para
frente. Como movimento, o processo tende a um fim, o qual não pode ser alcançado
imediatamente. Para isso, utiliza-se de momentos que se encadeiam de maneira
lógica para que o fim seja alcançado. Garantir que tais movimentos sejam
coordenados significa encarregar-se que vários movimentos não concorram com o
processo que deve ir adiante. Se não forem encadeados como se espera, os
momentos causam um “tumulto”, do latim motu-multo, movimento em muitas
direções 134.

O processo judicial caminha sobre os mesmos princípios: os momentos,


ou atos processuais caminham num movimento que tende no processo de
conhecimento, a uma sentença de procedência com seu devido cumprimento; e, no
processo de execução, à satisfação da obrigação. Os tumultos provocados pelos
instrumentos que retrocedem o movimento processual devem ser utilizados com
parcimônia com o fim de não provocar desgastes desnecessários.

Sendo que os momentos processuais devem ser respeitados, nunca


pulados, com o risco de infração ao princípio do devido processo legal, podemos
concluir que “o tempo não é sempre um inimigo do processo civil, pois muitas vezes
ele exerce tempo efeitos benéficos” 135-136, principalmente na instrução processual.

Cabe destacar que o interesse na aceleração dos efeitos do processo,


diminuindo, dessa forma, a influência do tempo inimigo, desenvolveu-se durante o
século XX, fruto de transformações tão profundas, quanto rápidas, atingindo todos
os campos da sociedade, convencionalmente, chamada de contemporânea, pós-
moderna ou líquida.

134
ALMEIDA JUNIOR, João Mendes de. Direito judiciário brasileiro. 5ª Ed. Rio de Janeiro: Livraria
Freitas Bastos, 1960, pp. 215/217.
135
DUARTE, Ricardo Quass. O tempo inimigo no processo civil. São Paul: LTr, 2009, p. 13. No
mesmo sentido de Ricardo Duarte, José Roberto dos Santos Bedaque também caminha no sentido
de entender que celeridade não é o mesmo que tempo razoável, sendo este último o valor que deve
ser atingido (BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Efetividade do processo e técnica processual.
São Paulo: Malheiros, 2006, p. 48).
136
A referência do “tempo inimigo” vem de Carnelutti, para quem “O valor, que o tempo exerce no
processo é imenso e, em grande parte, desconhecido. Não seria arriscado comparar o tempo a um
inimigo, contra a qual luta o juiz.” No original: “Il valore, Che il tempo há nel processo, è immenso e, in
gran parte, sconosciuto. Non sarebbe azzardato paragonare il tempo a um nemico, contro il quale il
giudice ltta senza posa” (CARNELUTTI, Francesco. Diritto e processo. Napoli: Morano Editore,
1958, p. 354).
64

O saber científico, fruto da razão instrumental, foi responsável, tanto por


grandes progressos na área da saúde, quanto pelas catástrofes genocidas
137
presenciadas pela humanidade . Outra de suas características é o desejo
desenfreado pelo consumo e pelo aumento de patrimônio 138.

Mas nem tudo é apocalíptico: os contratos empresariais evoluíram para


atingir um alto grau de complexidade, os direitos fundamentais passaram a ser mais
bem regulamentados, o meio ambiente passou a chamar mais atenção de pacifistas
e Governos comprometidos com o bem estar social, um esforço entre o terceiro
setor, juntamente com os Estados formam, a cada dia, maior força frente às
condições de trabalho análogas ao escravo. A lista não é, por óbvio, exaustiva, mas
demonstra como as relações sociais do século XX se dinamizaram.

Outro fenômeno importante, e aqui é destacado separadamente com o


claro objetivo de saltar aos olhos, é a maior publicidade das normas jurídicas à
população. Hoje, não é raro encontrar o consumidor, o trabalhador, o empregado ou
o fazendeiro que não conheça, ainda que perfunctoriamente, seus direitos.

Sobre os anseios jurídicos que se desenvolveu na chamada pós-


modernidade, comenta Jaqueline Mielke Silva 139:

A sociedade industrial ampliou a complexidade sócio-econômica e política,


exigindo soluções cada vez mais abstratas e flexíveis, pragmáticas e
abertas. Com a transformação dos conflitos individuais em conflitos
coletivos entre grupos e classes, a mediação formalizada pela ‘práxis social’
se torna problemática. Assim, o surgimento desses novos conflitos conduz à
necessidade de adequação do Direito. O Direito tende a se “adaptar” e
adquire situações próprias à nova situação.

Num mundo que precisa de respostas rápidas, de soluções rápidas paras


os conflitos, de justiça na entrega do que é devido a cada um, o tempo torna-se, de
benéfico a um inimigo do processo civil e da sociedade 140.
137
Ver item 1.3.
138
Como bem lembra Ricardo Quass Duarte, “o tempo representa um valor muito importante para o
homem, a ponto de ter sido consagrado o ditado tempo é dinheiro” (DUARTE, Ricardo Quass. Op.
cit., p. 23).
139
SILVA, Jaqueline Mielke. O direito processual civil como instrumento de realização de
direitos. Porto Alegre: Verbo Jurídico, 2005, p. 43.
65

Dessa forma, o Direito não pode se esquecer de tais clamores sociais e,


assim, fechar-se inteiramente para o ambiente, pois isso o levaria a uma crise
credibilidade interna e externa sem volta. O problema está, apenas, em reduzir o
Direito ao tempo presente, sem repensá-lo de modo crítico.

Pensar os institutos existentes no interior do sistema com uma visão


crítica, conforme exposto no Capítulo 1, o que para os maiores filósofos do século
XX seria a dialética negativa, é o melhor método de se combater o descompasso
entre a norma e o fato social. O positivismo jurídico engessa, pensa somente no
presente, no direito que preserva. Não há uma posição ideológica com o fim de
melhorar os institutos, revisitá-los. Uma tendência que se combate veementemente.

Essa talvez seja a melhor justificação encontrada para se permitir as


reformas setoriais do Código de Processo Civil, principalmente do quadro
positividado no processo de conhecimento.

Como se sabe, o Poder Jurisdicional sofreu um acúmulo de trabalho


desde a década de 70 que não foi esperado. O ânimo de litigância tomou ares que
antes não imaginava. O resultado não poderia ser outro: um número exacerbado de
ações num sistema que preza a verificação de certeza, mesmo que demore anos
para que seja encontrada, levou ao que se chamou de “crise do Poder Judiciário”,
crise esta que atingiu até mesmo a alta cúpula da magistratura nacional: O Supremo
Tribunal Federal.

O jurisdicionado demorava mais de 10 anos para ter a definição de seu


direito e, após isso, tinha um título que lhe garantia um direito que, ainda, deveria ser
executado. Para isso, dava-se início, pasmem, a um novo procedimento, com nova
citação, inúmeros fundamentos de defesa, novos recursos para se chegar,
novamente, à certeza tão querida pelo sistema jurídico, até que, enfim, o bem
jurídico era entregado a quem de direito.

Uma longa caminhada. Longa, custosa, demorada e sem perspectivas de


viabilidade. Resumindo: injusta! Ao final da caminhada, o desgaste sofrido pelo réu
foi muito menor que o do autor.

140
Situação esta que não serve de elogio, pois a busca desenfreada pela resposta rápida por meio do
processo demonstra o vazio existencial da sociedade. Cria-se, de certa forma, um paradoxo entre
querer o resultado rápido, ainda que se pise sobre direitos fundamentais.
66

Vale destacar os dados fornecidos pelo Conselho Nacional de Justiça em


seu sítio na interne (www.cnj.jus.br). Para exemplificar o problema do tempo no
processo, citam-se alguns números: em 2003, a taxa de congestionamento nos
Tribunais de 2º Grau tinha a média de 57,84%. Já em 2008, embora menor, está
longe de ser animadora: a média ficou no patamar de 42,5%.

Dessa forma, os juristas passaram a pensar em meios práticos para essa


aceleração do tempo no processo: a tutela antecipada, a sentença liminar de
improcedência, a restrição ao uso dos recursos, o processo de conhecimento com
fase de cumprimento de sentença (processo sincrético) entre outros.

Esses “meios práticos” geraram o que se costuma chamar na doutrina de


tutelas jurídicas diferenciadas. Sobre o objetivo do processo civil contemporâneo,
comentou Nelson Nery Junior 141:

A doutrina vem apregoando a necessidade da adoção, pelos sistemas de


direito positivos, de tutelas jurídicas diferenciadas, a fim de objetivar-se
alcançar a efetividade do processo da forma mais completa possível, já que
os instrumentos tradicionais não vêm surtindo o efeito desejado. Essas
tutelas podem ser concebidas com a criação de instrumentos mais efetivos
à solução da lide ou com mecanismos de agilização da prestação
jurisdicional.

Essa nova ideologia força-nos a enfocar a doutrina, o sistema positivo e a


hermenêutica processual “a partir da ótica do consumidor dos serviços jurisdicionais
142
[...] e os produtores, esses sim, passaram a ser questionados” , o que poderíamos
chamar, a priori, de um verdadeiro giro hermenêutico-processual.

Luiz Guilherme Marinoni chega a comentar que isso que chamamos de


giro hermenêutico-processual em busca da efetividade só foi possível “porque o
estudioso passou a encarar o processo civil através de um ângulo externo e

141
NERY JUNIOR, Nelson. Atualidades sobre o processo civil: a reforma do código de processo
civil brasileiro de 1994 e de 1995. 2ª Ed., rev. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1996,
p. 60.
142
DINAMARCO, Cândido Rangel. Nasce um novo processo civil. In TEIXEIRA, Sálvio de Figueiredo
(Coord.). Reforma do código de processo civil. São Paulo: Editora Saraiva, 1996, pp. 1/17, em
destaque p. 2.
67

143
eminentemente crítico” . No sentido do que expusemos até o momento, a
constatação do Professor paranaense é verdadeira se, e somente se, este estudioso
se colocar em uma posição metajurídica, ou seja, enxergar o problema da
inefetividade dos institutos pelo conhecimento do entorno social, sem o qual teremos
não visão crítica, mas alienação.

O motivo para esse novo ângulo é simples: tendo em vista que o Estado
avocou para si o poder-dever-atividade-função de dizer de quem é o direito, impediu
a regra de autotutela Tendo avocado a si, deve prestar a jurisdição da melhor forma
possível, pois dar a resposta eficiente impede a queda da legitimidade do Direito 144.

A partir desse ponto, diante das novas técnicas pensadas na doutrina e


introduzidas no ordenamento normativo, ateremos ao instituto da tutela antecipada,
amplamente debatido e, ainda, muito desvirtuado pelo profissional do foro em geral.

143
MARINONI, Luiz Guilherme. Antecipação da tutela. 11ª Ed. rev. e atual. São Paulo: Editora
Revista dos Tribunais, 2009, p. 21.
144
Como diz Wolgang Leo Maar, “a resposta prática precisa interferir no âmbito material sob pena de
ser ilusória. Em seu famoso ensaio sobre a ‘tolerância repressiva’, Marcuse destaca sua crença na
necessidade de recorrer a meios extra-legais pelo oprimidos, se os meios legais esgotaram sua
eficácia” (MAAR, Wolfgang Leo. A educação pela revolução. In SOCHA, Eduardo (Org.). ESCOLA
DE FRANKFURT: uma introdução à obras de Theodor Adorno, Walter Benjamin, Herbert Marcuse
(Dossiê Cult edição especial). São Paulo: Editora Bregantini, 2009, Ano 12, pp. 35/37, em destaque p.
36).
68

3 – A TUTELA ANTECIPADA 145

Como vimos no capítulo anterior, a sociedade impôs a necessidade de


uma resposta mais célere e efetiva do Estado á demanda proposta pelos
jurisdicionados. Isso levou o constituinte, pari passu o legislador infraconstitucional,
a tomar medidas necessárias para acelerar o tempo no processo.

Se ficássemos na afirmação de que o ordenamento jurídico brasileiro faz


parte de uma cultura jurídica codificada que se iniciou com o Código Napoleão em
1804 seria pisar em campo comum. Mais do que isso, vale registrar a dificuldade
que é aprovar um novo Código num Congresso Nacional bipartido, formado por
dirigentes de partidos políticos que, em que pese receberem mandatos, agem de
acordo com interesses institucionalizados, ao invés de sociais.

Quando as novas necessidades autopoiéticas foram introduzidas no


sistema jurídico, os institutos internos viram como meio de solução a modificação, ou
reforma da lei processual vigente. Nada mais natural.

Como se sabe, o Código de Processo Civil de 1973, hoje vigente, é fruto


do projeto elaborado pelo Professor Alfredo Buzaid, eminente membro da “Escola
146
Processual de São Paulo” . Na justificativa ao Código de Processo Civil, o

145
Como se sabe, a antecipação de efeitos da sentença já existia no processo civil antes da lei nº.
8.952, de 13 de dezembro de 1994, como na liminar nas ações possessórias (art. 928, do CPC) e nas
ações civis públicas (art. 11, da lei nº. 7.347, de 24 de julho de 1985), bem como na lei do inquilinato
(art. 59, §1º da lei nº. 8.245, de 18 de outubro de 1991) e no Código de Defesa do Consumidor (art.
84 da lei nº. 8.078, de 11 de setembro de 1990). Os quinze anos aqui apontados são da introdução
do instituto no processo civil de conhecimento regulado pelo CPC.
146
A Escola Processual de São Paulo, já mundialmente conhecida, iniciou seu desenvolvimento com
a chegada de Enrico Tullio Liebman ao Brasil, destacando-se, ainda, como seus membros, José
Frederico Marques, Luiz Eulálio Bueno Vidigal e, atualmente, Kazuo Watanabe, Ada Pellegrini
69

Professor Buzaid deixa clara sua preferência em redigir um novo código, em


detrimento de elaborar reformas parciais para alterar os erros cometidos pelo
legislador anterior. Assim se expressa:

Mas a pouco e pouco nos convencemos de que era mais difícil corrigir o
Código velho que escrever um novo. A emenda ao Código atual requeria
um concerto de opiniões, precisamente nos pontos em que a fidelidade aos
princípios não tolera transigências. E quando a dissensão é insuperável, a
tendência é de resolvê-la mediante concessões, que não raro sacrificam a
verdade científica a meras razões de oportunidade. O grande mal das
reformas parciais é o de transformar o Código em mosaico, com coloridos
147
diversos que traduzem as mais variadas direções.

O Código Buzaid, como se chama carinhosamente a lei ordinária nº.


5.869, de 11 de janeiro de 1973, teve a intenção de inovar, melhorar, tratar com
maior rigor técnico a ciência processual. O Código de 1939 cometeu diversos
deslizes por não acompanhar a doutrina mais moderna a seu tempo. Para citar
apenas um exemplo, não havia correlação típica entre decisões judiciais e meios
impugnativos endoprocessuais, provocando uma maior aplicação do princípio da
fungibilidade recursal 148.

A grande obra arquitetônica de 1973 teve o condão de melhorar o


processo civil, merecendo aplausos na maioria das vezes. Ocorre que, em que pese
ser “uma obra de seu tempo”, por falta do diálogo com a doutrina mais moderna em
prol da efetividade do processo, com base em sua instrumentalidade em relação ao
direito material 149.

Grinover, Cândido Rangel Dinamarco, Nelson Nery Junior e Milton Paulo de Carvalho (GRINOVER,
Ada Pellegrini. Modernidade do direito processual brasileiro. In ______. O processo em evolução. 2ª
Ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1998, pp. 3/19, em destaque, p. 5).
147
BUZAID, Alfredo. Exposição de motivos do código de processo civil. In Vademecum RT. 3ª Ed.,
rev., ampl. e atual. São Paulo: Editora dos Tribunais, 2008, pp. 365/374, em destaque p. 365.
148
Vale verificara o posicionamento de Cândido Rangel Dinamarco: “Eram indisfarçáveis os defeitos
[do Código de 1939] ainda indiferente às grandes conquistas mundiais do processo civil do próprio
tempo em que foi elaborado – o que se revela no trato da competência, dos recursos, da execução
etc.” (DINAMARCO, Cândido Rangel. A reforma da reforma. 6ª Ed., rev. e atual. São Paulo:
Malheiros, 2003, p. 22).
149
DINAMARCO, Cândido Rangel. A reforma do código de processo civil. 5ª Ed., rev. e atual. São
Paulo: Malheiros, 2001, p. 24.
70

Pelo estudo do Código de Ritos fica clara a opção do legislador “nunca


150
com a justiça processual, mas sim com a segurança” , ainda que custasse o
retardamento da cognição e do processo de satisfação por longos anos.

Ocorre que, em tempos de crise legislativa institucional, com a recente


história da aprovação de um Novo Código Civil, cuja tramitação demorou cerca de
vinte e sete anos, bem como o aumento exponencial de Medidas Provisórias que
necessitam de voto no Congresso Nacional, trancando as pautas, a comunidade
jurídica tem optado pela produção de projetos de lei que alterariam, pontualmente, o
sistema 151.

A idéia inspiradora e motriz da reforma do processo civil não se


evidenciou somente pela produção de novas leis. Por isso passamos a chamar essa
nova mentalidade norteando o legislador e o jurista de um giro hermenêutico-
processual: para compreender o sistema processual, seus institutos, sua função,
suas formas de atuação, os resultados que deve produzir e os que, efetivamente,
produz, o hermeneuta pôs do lado de fora deste sistema e de lá passou a observá-
lo. O resultado foi, já na década de 1960, a produção de uma das obras jurídicas
mais importantes do século, pelas mãos hábeis de Mauro Cappelletti: O Relatório de
Provença, posteriormente condensado na obra Acesso à Justiça.

A partir de tal marco histórico, passou-se a verificar três ondas


renovatórias com o intuito comum de universalizar o acesso à justiça: a primeira
onda tem como objetivo eliminar os óbices econômicos para que se tenha uma
resolução justa a determinado conflito; a segunda onda prevê a abertura da eficácia
erga omnes das decisões do Poder Judiciário, aumentando a proteção de direitos
difusos e coletivos; a terceira onda é a de modificação do próprio pensamento do
jurista moderno, inculcando a mentalidade de maior eficácia e eficiência da
prestação promovida pela maior litigiosidade.

150
MASCARO, Alysson Leandro Barbate. Filosofia do direito e filosofia política: a justiça é
possível. São Paulo: Editora Atlas, 2003, p. 70.
151
Um dos objetivos da Comissão reformista, com as chamadas “mini-formas”, foi “acelerar o trâmite
legislativo” (FRIEDE, Reis. Principais inovações no direito processual civil brasileiro. Rio de
Janeiro: Forense Universitária, 1996, p.3). Tal metodologia viabilizaria “encaminhar as sugestões não
em um único Anteprojeto, mas através de vários, setoriais, inclusive para viabilizar a aprovação no
Congresso Nacional, considerando que um único pedido de vista poderia comprometer todo o
trabalho” (TEIXEIRA, Sálvio de Figueiredo. A efetividade do processo e a reforma processual. In
Ajuris. Porto Alegre: Associação dos juízes do Rio Grande do Sul, v. 29, nº. 59, nov. de 1993, pp.
253/268, em destaque p. 258).
71

Dentre essas reformas, estão as leis que criaram, modificaram e


modificarão o instituto da tutela antecipada, encaradas como verdadeira “evolução
do ordenamento jurídico, propriamente do processo civil”, como resposta
autorreferencial do interior do Direito 152.

3.1. As reformas processuais.

Não se ouvida a opção mais célere dos intelectuais do processo civil


153
brasileiro em encaminhar projetos para reformas parciais . O único problema
nessas reformas setoriais está na sua fundamentação, a qual constitui, apenas, uma
justificação, não uma motivação. A diferença reside na base de dados utilizados
para se promover as ondas reformadoras. A maioria dos juristas trabalha com as
alterações após a convolação de projetos de leis em leis. Esse é o maior erro do
positivismo jurídico: o qual justifica as mudanças depois de que se torna direito
posto.

Entendemos que as reformas são muito importantes para o


desenvolvimento do direito processual, mas há grande necessidade de baseá-las
em dados sérios e confiáveis para que os projetos utilizem a corretamente a razão
154
crítica . Muito embora, nos últimos anos, o Conselho Nacional de Justiça tenha
consolidado alguns dados estatísticos e precisos sobre o Poder Judiciário, as
reformas foram pensadas e debatidas antes da existência de tais estudos.

152
RIBEIRO, Diógenes Vicente Hassan. A tutela antecipada da reforma do CPC de 1994 na
perspectiva da teoria dos sistemas sociais de Niklas Luhmann. In Ajuris. Porto Alegre: Associação
dos juízes do Rio Grande do Sul, v. XXXI, nº. 94, jun. de 2004, pp. 51/70, em destaque p. 68.
153
Em sua maioria, são projetos encaminhados ao Governo pelo Instituto Brasileiro de Direito
Processual Civil, hoje presidido pela Professora Tereza de Arruda Alvim Wambier, bem como pela
Escola da Magistratura Nacional, centro encabeçado pelos Ministros Athos Gusmão Carneiro e Sálvio
de Figueiredo Teixeira. Os projetos de reforma parcial em pontos precisos do ordenamento
processual – ou minirreformas – fazem parte do quue Cândido Rangel Dinamarco chama de “tática
de guerrilhas e não de guerra total” (DINAMARCO, Cândido Rangel. Nasce um novo processo civil. In
TEIXEIRA, Sálvio de Figueiredo (Coord.). Reforma do código de processo civil. São Paulo: Editora
Saraiva, 1996, pp. 1/17, em destaque p. 6).
154
Neste sentido: “Mas não é só isso. A aprovação de um novo Código deve ser precedida de
pesquisas sobre os efeitos das reformas até agora realizadas e da situação em que se encontra a
Justiça nos vários rincões do país” (CASTRO LOPES, Maria Elizabeth de; LOPES. João Batista.
Reformas setoriais, harmonia do sistema normativo e efetividade do processo. In Revista de
Processo. São Paulo: Editora dos Tribunais, v. 162, pp. 87/93, em destaque p. 93).
72

O que se critica é o fato de alguns institutos serem alterados sem um


estudo sério que verifique seu ponto de estrangulamento. Muitos trabalham com
suposições e, nelas baseadas, apresentam propostas para as alterações.

Caso se pare para pensar por um momento, isso não é necessário. A


justificação deve ser preterida em favor de uma motivação para, enfim, chegar-se à
melhor técnica processual que torne efetivo o processo. A motivação, baseada em
um discurso com a sociedade leiga e a comunidade acadêmica permitirá, no
seguindo o caminho que temos adotado no presente trabalho, uma maior
legitimação.

Tenta-se aplicar remédio no local do defeito. Mas e esse não for o local
correto? E se o estrangulamento do processo civil não estiver nos institutos
endoprocessuais, mas sim nos exoprocessuais? Nesse caso, usando palavras de
Clito Fornaciari Júnior, o remédio será ineficaz, senão perigoso 155.

A fim de não cometer injustiças, devemos defender a posição doutrinária


de alguns juristas nacionais sérios que sempre se comprometeram com uma visão
progressista do processo civil em busca de melhores condições para a o futuro da
sociedade, ou seja, com uma motivação, adiantando-se ao direito posto. Dentre
estes, e por todos, elogiamos o trabalho dos Professores Kazuo Watanabe, Fátima
Nancy Andrighi e Sálvio de Figueiredo Teixeira, este último sendo o mestre de todos
os reformistas.

Cabe aqui uma observação, aliás, uma constatação: as reformas


processuais tem sido pensadas, debatidas e propostas no seio da magistratura
nacional. Não que seja uma classe despreparada, longe disso, mas não se pode
deixar de esquecer que há um sem número de profissionais que participam
ativamente na aplicação dos institutos processuais dia-a-dia no foro em geral. O
perigo é o estancamento de idéias sem a devida fluidez com a Academia, advocacia,
o Ministério Público e a Defensoria 156.

Registre-se que o Senado nomeou em 2009 uma comissão liderada pelo


Ministro Luiz Fux, do Superior Tribunal de Justiça, composta, ainda, por Adroaldo

155
FORNACIARI JÚNIOR, Clito. A reforma processual civil (artigo por artigo). São Paulo: Editora
Saraiva, 1996, p. XII.
156
No mesmo sentido: MASCARO, Alysson Leandro Barbate. Filosofia do direito e filosofia
política: a justiça é possível. São Paulo: Editora Atlas, 2003, p. 70.
73

Furtado Fabrício, Bruno Dantas, Elpídio Donizetti Nunes, Humberto Theodoro Junior,
Jansen Fialho de Almeida, José Miguel Garcia Medina, José Roberto dos Santos
Bedaque, Marcos Vinicius Furtado Coelho, Paulo Cezar Pinheiro Carneiro e Tereza
Arruda Alvim Wambier, maioria de membros da magistratura aposentados ou na
ativa e uma minoria de Professores conhecedores de processo civil.

O que sairá dessa Comissão já não é um mistério: no início do ano de


2010, foram apresentadas as propostas ao Anteprojeto preliminar ao Supremo
Tribunal Federal, com o fim de proceder a um exame prévio de constitucionalidade,
bem como à comunidade jurídica por meio de audiências públicas, sendo que, em
não muito tempo, será entregue a redação final ao Senado.

Paira uma incerteza no mundo acadêmico sobre a praticidade, os efeitos


dos recursos, a supressão de princípios processuais, o incidente de coletivização
das demandas, frutos da Comissão de Reforma. Esperemos para ter a correta
dimensão deste grande passo 157.

3.2. A lei nº. 8.952/94: o nascimento da tutela antecipada.

158
O Projeto de Lei da Câmara nº. 3.803, de 1993 (PLC nº. 3.803/93) ,
apresentado pelo Poder Executivo com o intuito de promover a continuidade da
primeira onda de reformas do processo de conhecimento com o fim de adequar o
ordenamento infraconstitucional com a ideologia da Constituição de 1988, a qual,
como vimos, veio prever um processo efetivo e que necessita de uma tutela
adequada dos direitos.

Entre as propostas desenvolvidas no seio da produção intelectual do


159
direito processual, veio a alteração do artigo 273 do Código de Ritos . Pela nova

157
Ver a ideologia da Comissão no ANEXO A do presente trabalho.
158
Ver a íntegra do PLC nº. 3.803/93, com a justificativa do Poder Executivo no ANEXO B do
presente trabalho.
159
Redação do art. 273, pela Lei nº. 9.052/94:
Art. 273. O juiz poderá, a requerimento da parte, antecipar, total ou parcialmente, os efeitos da
tutela pretendida no pedido inicial, desde que, existindo prova inequívoca, se convença da
verossimilhança da alegação e:
I - haja fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação; ou
II - fique caracterizado o abuso de direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório do réu.
74

redação pretendida pelo PLC nº. 3.803/93, o processo de conhecimento teria em


regra a possibilidade da antecipação dos efeitos da tutela pretendida pelo autor,
instituto desenvolvido no seio da doutrina alienígena e que era muito necessária
para os novos contornos do processo civil brasileiro, conforme já previa Luiz
Guilherme Marinoni em sua tese de Mestrado defendida em 1991 perante a
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo 160.

Segundo a justificativa do PLC nº. 3.803/93, a idéia da Comissão fora a


de provocar “profundas repercussões na simplificação e eficácia do processo civil
brasileiro”. Com a introdução da tutela antecipada no processo de conhecimento, o
objetivo foi atendido, podendo o autor, agora, usufruir, ainda que de maneira
provisória, do próprio bem jurídico perseguido.

Com o fim de não cometer injustiças, cabe destacar que a Comissão


encarregada da elaboração do Anteprojeto de Modificação do Código de Processo
Civil em 1985, elaborou proposta para a criação do Título IV – DA ANTECIPAÇÃO
DA TUTELA no Livro próprio do processo cautelar. Em contrapartida, outra proposta
feita pelo saudoso Ovídio Araújo Baptista da Silva, previa a modificação do art. 285.
Esta última, vitoriosa, foi modificada pela Comissão de 1993, dando origem ao PLC
nº. 3.803/1993 161.

A necessidade da tutela antecipada de mérito ficou clara com o tempo,


pois a maioria dos profissionais desvirtuavou o poder geral de cautela concedido
pelo legislador ao juiz no artigo 798 do CPC. Manejava-se a famigerada “medida

§ 1º Na decisão que antecipar a tutela, o juiz indicará, de modo claro e preciso, as razões do seu
convencimento.
§ 2º Não se concederá a antecipação da tutela quando houver perigo de irreversibilidade do
provimento antecipado.
§ 3º A execução da tutela antecipada observará, no que couber, o disposto nos incisos II e III do
art. 588.
§ 4º A tutela antecipada poderá ser revogada ou modificada a qualquer tempo, em decisão
fundamentada.
§ 5º Concedida ou não a antecipação da tutela, prosseguirá o processo até final julgamento.
160
Hoje, publicada pela Editora Revista dos Tribunais em sua 11ª edição e por nós referenciada em
diversos momentos.
161
Para maiores detalhes sobre esses antecedentes: NERY JUNIOR, Nelson. Atualidades sobre o
processo civil: a reforma do código de processo civil brasileiro de 1994 e de 1995. 2ª Ed., rev. e
ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1996, p. 61/66.
75

cautelar satisfativa”, termo sem um sentido lógico: ou se acautela o processo para


satisfazer no futuro, ou se satisfaz agora para proteger os riscos que virão 162.

3.2.1. Conceito, finalidade e visão no direito comparado.

Numa tentativa de sistematizar o instituto da tutela antecipada introduzido


no processo de conhecimento, não foram poucos os trabalhos até então produzidos,
com o fim de nortear o aplicador do direito, seja na advocacia, seja na magistratura,
seja no ministério público ou na defensoria pública.

O Professor Carlos Augusto de Assis, em obra que lhe rendeu o título de


Doutor, entende a tutela antecipada “como uma técnica de que se vale o legislador
em determinadas situações. O emprego desta técnica envolve, de alguma forma, a
163
idéia de sumarização” . A sumarização, destacada pelo autor, é a referente ao ato
164
cognitivo, mas não superficial, como se observaria na tutela cautelar . Mantém-se,
ainda, coerente ao aproximar as tutelar de urgência cautelar e antecipatória pela
característica da sumariedade da cognição, sem deixar de afastá-las, quanto às
funções.

Deixa claro seu entendimento ao lecionar:

De fato, conforme deixamos transparecer nos parágrafos acima, somos da


opinião de que a atividade cautelar não se coaduna com a satisfação. Quem
acautela assegura, não satisfaz. Ainda que,para efeito de raciocício, se
admita, como entendem certos autores, a possibilidade de um provimento
acautelatório acabar por se revelar satisfativo (o que, segundo nos parece,
desnaturaria a atividade cautelar), estaríamos, no mínimo, diante de uma
atividade cautelar atípica.

162
BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Tutela cautelar e tutela antecipada: tutelas sumárias e de
urgência (tentativa de sistematização). 5ª Ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2009, p. 300.
163
ASSIS, Carlos Augusto. A antecipação da tutela (à luz da garantia constitucional do devido
processo legal). São Paulo: Malheiros Editores, 2001, p. 70.
164
Ibidem, pp. 70/74. A técnica de sumarização segue a doutrina de Kazuo Watanabe, o primeiro a
sistematizar, no Brasil, a cognição como sendo horizontal (quanto aos elementos objetivos do
processo) e vertical (quanto à profundidade). A cognição sumária da tutela antecipada – no sentido
vertical – é justificada pela urgência (CPC, 273, I) ou pelo objetivo da prestação jurisdicional [CPC,
273, II]. (WATANABE, Kazuo. Da cognição no processo civil. 2ª Ed. atual., 2ª tiragem. São
Campinas: Bookseller, 2000, capítulos 5 e 6, passim).
76

A antecipação de tutela (rectius: dos efeitos da tutela) é vocacionada à


satisfação. É-lhe ínsita, faz parte da sua natureza. O motivo autorizador da
satisfação antecipada pode ser o periculum in mora, na hipótese do inciso I,
ou o abuso do direito de defesa, no caso do inciso II; mas essa
característica essencial não se altera 165. – grifos no original

No mesmo sentido do Professor Mackenzista, Nelson Nery Júnior lembra


que já no direito alemão “a doutrina separa os procedimentos urgentes em
assecuratórios (cautelares) e de regramento (antecipação da tutela de mérito) 166.

Kazuo Watanabe destaca que na antecipação de tutela haverá a


satisfação por meio do “adiantamento dos efeitos, no todo ou em parte, do
provimento postulado”, enquanto na tutela cautelar não há caráter satisfativo, ao
menos que o direito substancial de cautela for alegado – tema que sai dos limites
desse trabalho 167.

João Batista Lopes ilustra bem o caso ao lembrar que as liminares


cautelares traduzem, sim, uma antecipação, mas dos efeitos práticos do próprio
processo cautelar “(não do mérito, é claro)” 168.

Teori Albino Zavascki é duro ao destacar que há características comuns e


a identidade de função constitucional das espécies de tutela de urgência, sem
olvidar para as distinções técnicas 169.

Barbosa Moreira lembra a diferenciação na recente lei processual inglesa


entre as interim injunctions (de nítida feição antecipatória) e as freezing injunctions
(de nítida feição cautelar), espécies do gênero interim remedy, “a acolher-se a

165
ASSIS, Carlos Augusto. Op. cit, pp. 129/130.
166
NERY JUNIOR, Nelson. Atualidades sobre o processo civil: a reforma do código de processo
civil brasileiro de 1994 e de 1995. 2ª Ed., rev. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1996,
p. 66.
167
WATANABE, Kazuo. Tutela antecipatória e tutela específica das obrigações de fazer e não fazer.
In TEIXEIRA, Sálvio de Figueiredo (Coord.). Reforma do código de processo civil. São Paulo:
Editora Saraiva, 1996, pp. 19/51, em destaque p. 38.
168
LOPES, João Batista. Tutela antecipada e o art. 273 do CPC. In WAMBIER, Teresa Arruda Alvim
(Coord.). Aspectos polêmicos da antecipação de tutela. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais,
1997, pp. 204/220, em destaque p. 209.
169
ZAVASKCI, Teori Albino. Antecipação da tutela. 3ª Ed., rev. e ampl. São Paulo: Editora Saraiva,
2000, pp. 46/50.
77

premissa, tão cara a largo setor doutrinário, da substancial diversidade entre as


categorias” 170.

Já para José Roberto dos Santos Bedaque, o instituto consiste numa


“medida de urgência construída segundo técnica cautelar, destinada a conferir
171
eficácia ao provimento final” . O autor inova ao tecer considerações que
enquadram a tutela antecipada como cautelar satisfativa, tendo em vista o
desenvolvimento histórico de ambas as espécies de tutela de urgência. Assim,
prossegue:

Ora, se possuem tantos aspectos que as aproximam, melhor será tratá-las


em conjunto e submetê-las ao mesmo regime jurídico. Esse parece ser o
real interesse no estudo comparativo das espécies de tutelas provisórias, as
de caráter meramente conservativo e as que possuem conteúdo
antecipatório. Dada a similitude existente entre elas, aconselhável recebam
o mesmo tratamento jurídico. Irrelevante considerá-las como modalidades
de cautelar; ou reservar essa denominação apenas para as conservativas
ou não antecipatórias. Importante, sim, é determinar sua substância e
demonstrar que ambas existem com a mesma finalidade e possuem
características praticamente iguais 172.

A consequência da referida aproximação entre a tutela cautelar e a tutela


antecipada, leva Bedaque a, ainda que terminologicamente equivocado, reconhecer
a existência de certa “identidade substancial entre ambas as modalidades” 173.

Luiz Guilherme Marinoni, pioneiro no tema, trata a tutela antecipada com


espírito não tão aberto quanto Bedaque, mas com idéias bem progressistas. Sua
doutrina se baseia na preocupação da utilização do instituto como “corolário do
direito à adequada tutela jurisdicional”, reconhecendo que a proibição da autotutela e

170
BARBOSA MOREIRA, José Carlos. Uma novidade: o código de processo civil inglês. In ______.
Temas de direito processual. Sétima série. São Paulo: Editora Saraiva, 2001, pp. 179/189, em
destaque p. 188.
171
BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Tutela cautelar e tutela antecipada: tutelas sumárias e de
urgência (tentativa de sistematização). 5ª Ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2009, p. 302.
172
Ibidem, p. 310.
173
Ibidem, p. 418.
78

o monopólio da prestação do serviço jurisdicional pelo Estado levam à conclusão da


existência do direito à tutela antecipada 174.

Referenciando a técnica de aceleração com os tipos de provimento da


tutela jurisdicional de conhecimento, Marinoni leciona que a sentença condenatória
terá seu “efeito executivo (ou melhor, a produção antecipada do efeito executivo)”;
posiciona-se contra a doutrina majoritária ao entender que nada impede a
declaração ou a cognição com base em tutela sumária, sendo vedada na tutela
meramente declaratória 175.

Sobre a finalidade do instituto, convém destacar as palavras de Carlos


Henrique Ramos 176:

Ao tratarmos do instituto da antecipação da tutela, mister afirmar que este


não se trata de mero instrumento de antecipação dos efeitos do provimento
final, como pode-se extrair do art. 273 do CPC, mas sim de um nova forma
de tutela satisfativa de direito, ao implicar a superação da dicotomia
processo de conhecimento-processo de execução.. – grifos no original

O desenvolvimento da doutrina nacional se deve à visão comparatista


com os ordenamentos europeus, que desde muito já atualizaram as respectivas
técnicas processuais para autorizar a aceleração da fruição do direito, em especial
na Itália.

No Direito Italiano, a lei nº. 353, de 26 de novembro de 1990, a chamada


Novella de 1990, foi de importância para estabelecer certa ordenação entre a
doutrina e a legislação processual. O artigo 700, do Código de Processo Civil
Italiano, não prevê, ainda, a distinção entre as tutelas de cognição sumária, tendo

174
MARINONI, Luiz Guilherme. Antecipação da tutela. 11ª Ed. rev. e atual. São Paulo: Editora
Revista dos Tribunais, 2009, pp. 131/133.
175
Ibidem, pp. 44/56.
176
RAMOS, Carlos Henrique. Acesso à justiça e efetividade do processo: novos caminhos. Revista
Dialética São Paulo: Editora Dialética, pp. 11/27, em destaque p. 25.
79

gerado querelas na doutrina sobre a existência, ou não, de um verdadeiro poder


geral de cautela 177.

Há notícias de alteração legislativa daquele ordenamento para distinguir a


tutela cautelar da tutela antecipatória que, nas palavras de Luigi Paolo Comoglio,
178
Corrado Ferri e Michele Tarfuffo são bastantes diferentes uma da outra . Ainda,
pretende-se criar um procedimento sumário antecedente para esta última, com força
executiva, sem a necessidade da tutela jurisdicional de mérito 179.

De todas as correntes que se expôs, desde as que são mais sóbrias até
as que beiram ao radicalismo, verifica-se que nesses quinze anos de tutela
antecipada muito se tem feito para o aprimoramento da proteção dos direitos, com o
fim de impedir o tratamento desigual entre as partes, em que pese certos
entendimentos que chocam o bom senso.

Passa-se, agora, a expor as espécies de tutela antecipada conhecidas em


nosso ordenamento: a tutela antecipada assecuratória, a tutela antecipada punitiva e
a tutela antecipada do pedido incontroverso.

3.2.2. Espécies de tutela antecipada.

O artigo 273 do CPC contempla os requisitos e, em consequência, as


espécies de tutela antecipada: a assecuratória, a punitiva e a com base em pedido
incontroverso.

Sobre as duas primeiras, verifica-se que possuem requisitos comuns


constantes no caput do artigo 273, do CPC, com suas especificidades nos incisos I
(assecuratória) e II (punitiva), os quais deverão estar presentes no momento do

177
ASSIS, Carlos Augusto. Op. cit., pp. 79/93; BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Tutela cautelar
e tutela antecipada: tutelas sumárias e de urgência (tentativa de sistematização). 5ª Ed. São Paulo:
Malheiros Editores, 2009, pp. 57.
178
No original: “tutt'altra cosa, evidentemente, è l'anticipazione a scopo satisfattivo (e non cautelare)”
(COMOGLIO, Luigi Paolo; FERRI, Corrado; TARUFFO, Michele. Op. cit., p. 685).
179
GRINOVER, Ada Pelegrini. Tutela jurisdicional diferenciada: a antecipação e sua estabilização.
Revista de processo. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, ano 30, nº. 121, mar. de 2005, pp.
11/37, em destaque p. 31.
80

pedido. Em ambas deverá existir prova inequívoca e pré-constituída que convença o


juiz da verossimilhança da alegação do autor.

Piero Calamandrei declarou, acertadamente, que toda verdade reduz


logicamente a um juízo de verossimilhança. Ainda que o conhecimento da demanda
se forme sobre fatos narrados por testemunhas concordes, a percepção do
magistrado é de que o ocorrido é o mais verossímil possível. Ainda que muitos
chamem-na de “verdade formal”, a verossimilhança é o resultado do ato cognitivo, é
o que parecer ser aos olhos do juiz, ainda que baseado em sofismas 180.

Neste ponto acerta Bedaque ao dispor que a verossimilhança de um fato


leva o julgador a observar o que lhe é narrado como sendo o que provavelmente
ocorreu, como um “fato aparentemente verdadeiro” 181.

O objetivo da prova produzida pela parte que requer a tutela antecipada é


de, exatamente, convencer o juiz de que deve ser deferida a medida sumária, ainda
que de imediato no processo, momento em que a convicção pode se formar em
mais de um sentido 182.

Não se trata de confundir com o requisito de fumus boni iuris que compõe
o mérito da ação cautelar. Não basta que a alegação de fato e de direito seja
verossímil, ou aparente ser verdade, quem requerer a concessão da tutela
antecipada deve apresentar as provas necessárias para que isso fique demonstrado
ao juiz.

Por isso, é correto afirmar que o pedido de tutela antecipada pode ser
reformulado nos autos desde que o conjunto probatório mínimo seja formado para
trazer a visão de verossimilhança ao juiz, ainda que em grau recursal, ou mesmo em
Ação Rescisória.

Além da prova inequívoca acima referida, o § 2º di artigo 273 exige, como


condição negativa para a concessão da medida, que a antecipação dos efeitos da
tutela não seja irreversível. Sendo a tutela antecipada o sopesamento de direitos

180
CALAMANDREI, Piero. Instituições de direito processual civil. Vol. III. 2ª Ed. Campinas:
Bookseller, 2003, pp. 275/277.
181
BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Tutela cautelar e tutela antecipada: tutelas sumárias e de
urgência (tentativa de sistematização). 5ª Ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2009, p. 366.
182
MARINONI, Luiz Guilherme. Antecipação da tutela. 11ª Ed. rev. e atual. São Paulo: Editora
Revista dos Tribunais, 2009, p. 172.
81

que, por meio da cognição sumária, são conhecidos parcialmente, exige-se do juiz a
prudência para a concessão da medida antecipatória requerida.

Nas palavras de Bedaque 183:

A possibilidade de antecipação deve ficar limitada, em princípio, a direitos


absolutos ou com eles conexos. Direitos relativos, como os puramente
patrimoniais, em regra, são assegurados de forma eficaz com tutela cautelar
conservativa, que se revela menos gravosa para quem deve suportá-la.
Assim, a concessão da tutela antecipada somente deve ocorrer quando não
houver outro meio menos drástico para assegurar o resultado do processo.

Da dicção do caput do artigo 273, como já comentado, extrai-se que os


requisitos específicos para concessão das duas primeiras espécies de tutela
antecipada devem vir cumulados com a prova inequívoca de verossimilhança.

Quanto á primeira forma de tutela, a assecuratória, o inciso I do artigo 273


informa que deverá ser demonstrado o “fundado receio” de “dano irreparável ou de
difícil reparação”. Em outras palavras, a urgência, juntamente com a demonstração
da verossimilhança, permite sua concessão.

O dano que vem a ser protegido pela tutela assecuratória não é do


processo que precisa ser protegido. Não há relação de cautela com os efeitos
práticos que a tutela jurisdicional terá com a prolação da sentença. O direito aqui
assegurado é o material, ligado à pessoa que requer. Por isso pode-se concluir que
somente no caso concreto há o preenchimento do termo legal indeterminado
utilizado pelo legislador 184.

Na segunda espécie. A decisão que concede a tutela punitiva, prevista no


inciso II, do artigo 273, deve interpretar a mesma prova de verossimilhança do
alegado em conjunto com a fragilidade da defesa do réu. Importa dizer que não é
cabível a concessão desta espécie de tutela antecipada inaudita altera parte sem
antes ouvir a manifestação do réu.

183
BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Tutela cautelar e tutela antecipada: tutelas sumárias e de
urgência (tentativa de sistematização). 5ª Ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2009, p. 371.
184
Por proteger o bem da vida, ou tutelar as pessoas de riscos que podem ocorrer no decorrer do
processo, Bedaque assemelha, mais uma vez, essa espécie de tutela antecipada com a tutela
cautelar. (Ibidem, p. 354).
82

Aliás, sobre o contraditório diferido, ou mitigado, Carlos Alberto Álvaro de


Oliveira diz que este deve ser concedido apenas, e tão somente, quando for o único
meio idôneo para a proteção dos direitos. Assim comenta 185:

Nesta matéria, ainda mais ressalta o princípio geral da adaptação, de tal


modo que só se poderá adiar o contraditório para um momento posterior na
justa medida em que o provimento judicial, emitido inaudita altera parte, seja
idôneo para atingir a finalidade a que se propõe a lei e em consonância com
os pressupostos nela estabelecidos.

Marinoni nos lembra que a fragilidade da defesa do réu a justificar a tutela


antecipada, neste caso, não pode ser confundida com outras situações processuais
com penas próprias, como o comportamento de litigância de má-fé, ou a defesa
indireta de fatos constitutivos do direito do autor: a defesa deverá infundada,
considerando-se como preponderante a “probabilidade do insucesso da defesa
indireta” 186.

A terceira espécie de tutela antecipada é a que utiliza a técnica da


verificação do pedido incontroverso, ou baseada no direito evidente, prevista no § 6º,
do artigo 273.

Não raro há a cumulação de pedidos num mesmo processo que podem


ser julgados em momentos diferentes. Ainda, parcelas de um mesmo pedido que se
mostram evidentemente de direito do autor. A cumulação objetiva tem como norte a
celeridade e a economia processual. Sendo que a cognição de um pedido, ou
parcela, nem sempre atrapalha na do outro, houve necessidade de criatividade
doutrinária para resolver o impasse.

A doutrina foi criativa, mais uma vez pela mente de Luiz Guilherme
Marinoni, influindo na produção legislativa, chegando a nós por meio do referido §
6º, do artigo 273.

185
ÁLVARO DE OLIVEIRA, Carlos Alberto. Op. cit., p.17.
186
MARINONI, Luiz Guilherme. Antecipação da tutela. 11ª Ed. rev. e atual. São Paulo: Editora
Revista dos Tribunais, 2009, pp. 275/276.
83

Sua aplicação exige a participação do réu, ainda que de modo passivo,


conforme explica Marinoni 187:

Caso o réu não conteste ou reconheça implicitamente um dos pedidos ou


parcela deles, não há racionalidade em obrigar o autor a esperar a instrução
dilatória para obter a tutela do direito que se tornou incontroverso. Nesse
caso, como é óbvio, não há dúvida sobre a aplicação do § 6º.

Tendo em vista que o réu deverá ter oportunidade, mas, ainda assim, se
mostrar inerte em tornar controverso um dos pedidos, ou parcela deles, vale aqui a
advertência acima sobre a tutela punitiva: depende da conduta do réu após o prazo
para resposta 188.

Ocorre que o legislador, na busca da tutela jurisdicional efetiva, não se


contentou com os resultados obtidos com o instituto da tutela antecipada. Continuou
a produção legislativa, conforme veremos a seguir.

3.3. A lei nº. 10.444/02: a reforma da reforma.

O PLC nº. 3.476/2000 foi proposto pelo Poder Executivo a pretexto de


189
“complementar a iniciada reforma desse ordenamento codificado” , em
continuidade à técnica de guerrilha de reforma parcial dos pontos de
estrangulamento do Código de Processo Civil.

Ocorre que, temporalmente, o parecer da douta comissão instituída foi


apresentado cerca de cinco anos após a entrada em vigor da lei que instituiu a tutela
antecipada. Não entendemos como um prazo tão exíguo fora capaz de demonstrar a
incapacidade de produção de efeitos da tutela antecipada instituída na reforma de
1994.

187
MARINONI, Luiz Guilherme. Antecipação da tutela. 11ª Ed. rev. e atual. São Paulo: Editora
Revista dos Tribunais, 2009, pp. 275/276 e 283.
188
ARAÚJO, José Henrique Mouta. Tutela antecipada do pedido incontroverso. Revista autônoma
de processo. Curitiba: Editora Juruá, vol. 1, 2008, p. pp.377/403, em destaque p. 386. O mesmo
autor propõe o reconhecimento dessa tutela como de cognição exauriente e comportando, por ser de
mérito, a possibilidade de impugnação por meio de ação rescisória.
189
Ver a íntegra do PLC nº. 3.476/2000, com a justificativa do Poder Executivo no ANEXO C do
presente trabalho.
84

Houve com a conversão do projeto na Lei nº. 10.444/02 a inclusão de dois


190
parágrafos no artigo 273 . Um deles já foi comentado, trata-se da possibilidade do
deferimento da tutela antecipada do pedido ou de parcelas incontroversas (§ 6º).

Outra novidade, e esta com grande polêmica na doutrina, não tendo


chegado com grande força na jurisprudência, por enquanto, se trata da redação do §
7º do artigo 273, pela qual o legislador entendeu por bem prever a fungibilidade das
tutelas antecipatórias e cautelares quando manejadas incorretamente.

O referido dispositivo legal prevê expressamente a situação em que o


jurisdicionado (na verdade seu advogado) requer uma medida antecipatória, quando
o quer, pelas características do da causa de pedir e do pedido, uma medida
cautelar. Nesses casos, há autorização legal para que o juiz receba o pedido como o
que verdadeiramente é. Presentes os requisitos da fumus boni iuris e do periculum
in mora, indispensáveis para a medida cautelar, essa poderá ser deferida. Sem
maiores complicações.

O problema surge quando o hermeneuta tenta dizer mais do que a


intenção do legislador. Há respeitável doutrina, capitaneada por José Roberto dos
Santos Bedaque, que não vê qualquer problema na concessão de medida
antecipatória quando o pedido efetuado é de medida cautelar. É o que se chama de
fungibilidade de mão dupla.

Conforme já expusemos, Bedaque se baseia no critério de similitude entre


as medidas de urgência, por ele impropriamente chamada de “identidade
191
substancial” . Para o autor, o princípio adstrição do pedido com a decisão judicial
não se aplica quando ocorre equivoco no pedido da tutela de urgência adequada,
mas, somente, com relação ao pedido mediato 192:

190
Art. 273: ...
o
§ 6 A tutela antecipada também poderá ser concedida quando um ou mais dos pedidos
cumulados, ou parcela deles, mostrar-se incontroverso.
o
§ 7 Se o autor, a título de antecipação de tutela, requerer providência de natureza cautelar,
poderá o juiz, quando presentes os respectivos pressupostos, deferir a medida cautelar em caráter
incidental do processo ajuizado.
191
BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Tutela cautelar e tutela antecipada: tutelas sumárias e de
urgência (tentativa de sistematização). 5ª Ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2009, pp. 417/421.
192
Ibidem, p. 419.
85

Fungibilidade não significa, evidentemente, possa o juiz exceder os limites


da própria demanda. Se entre o pronunciamento final e o pedido inicial deve
haver congruência, correlação (CPC, arts. 128 e 460), não se admite a
antecipação de efeitos contidos na pretensão deduzida pelo autor a título de
tutela definitiva. O limite da antecipação é o próprio provimento satisfativo
final favorável ao autor.

Não podemos concordar com Bedaque nesse sentido. Como destacamos


acima, com arrimo da doutrina mais recomendada, a tutela cautelar e a tutela
antecipatória são espécies do mesmo gênero, mas uma permite a fruição do bem
hoje, a outra cuida para que o bem seja fruído no futuro. Não há identidade
substancial alguma, até porque uma coisa só pode ser idêntica a ela mesma.

Nesse sentido, o Professor Milton Paulo de Carvalho reconhece que há


possibilidade de confusão por parte do jurisdicionado (lê-se, seu advogado), sobre
qual medida de urgência requerer. Tanto que, no passado, manejava-se com
frequência a “medida cautelar satisfativa”, conforme noticiamos acima.

Acompanhando a base teórica da teoria dos princípios que expusemos no


primeiro capítulo, Milton Paulo de Carvalho concorda que a adequação do
ordenamento processual pátrio “não pode ferir princípios maiores, sustentáculos do
processo enquanto realizador das garantias constitucionais” 193.

Isso não quer dizer que a concessão da antecipação quando pedida


cautelar seja impossível. Será permitida pelo bom senso quando presentes os
requisitos daquela, tanto os genéricos quanto os específicos.

A doutrina de Marinoni confirma a esposada no presente trabalho. Para o


autor, somente no caso de dúvida objetiva e inexistência de erro grosseiro,
194
presentes os requisitos legais, poderá ser deferida a fungibilidade de mão dupla .
Em outras palavras: quando o autor não souber qual tutela requer, que requeira a
correta!

193
CARVALHO, Milton Paulo de. Garantia de direitos fundamentais na “fungibilidade” das espécies de
tutela de urgência. Revista literária de direito. São Paulo: Editora Jurídica Brasileira, dez. de
2004/jan. de 2005, pp. 8/11, em destaque p. 11.
194
MARINONI, Luiz Guilherme. Antecipação da tutela. 11ª Ed. rev. e atual. São Paulo: Editora
Revista dos Tribunais, 2009, pp. 130/131.
86

De outra forma, caso permitimos o ativismo judicial desmedido para a


concessão ex officio da tutela antecipada e segundo bem lhe parecer, entraremos
num estado de exceção com o apoio do Poder Judiciário. Vale dizer sem termos a
quem recorrer.

Não devemos esquecer, conforme as premissas do primeiro capítulo, que


o positivismo jurídico é caracterizado pelo distanciamento do sujeio-hermeneuta do
objeto-lei. Quanto mais distante, a pretexto de cientificidade, maior a capacidade de
ferir a natureza do objeto.

3.4. Os projetos de lei para nova reforma.

Além do Anteprojeto de Código de Processo Civil que hoje tramita nas


mãos da comissão instituída pelo Senado, há dois projetos de lei que visam a
alteração da tutela antecipada e da tutela cautelar, com influência sobre aquela: são
195
os PLS nº. 186/2005 e o PLS nº. 20/2006 . Daremos destaque às proposições do
primeiro, tendo em vista o objetivo direto de alterar a tutela antecipada.

A proposta apresentada ao Senado por Comissão que inclui José Roberto


dos Santos Bedaque, Luiz Guilherme Marinoni e Ada Pellegrini Grinover, tem como
objetivo a inserção em nosso sistema da estabilização da tutela antecipada em
procedimento monitório. Na justificativa ao PLS, vemos que a Comissão “procura,
em síntese, tornar definitivo e suficiente o comando estabelecido por ocasião da
decisão antecipatória”.

O projeto de modificação do CPC se baseia em estudo de Direito


Comparado organizado pela Professora Ada Pellegrini Grinover, com o fim de
concatenar as técnicas processuais utilizadas em países dos cinco continentes,
citando, por exemplo, as disposições do direito italiano sobre as tutelas de urgência.

No estudo que deu origem às disposições para modificar o artigo 273 do


CPC, conclui-se que a técnica de processos de estrutura monitória são os mais

195
Ver a íntegra dos PLS nº. 186/2005 e PLS nº. 20/2006, com a justificativa do Poder Executivo e,
ainda, o Parecer da CCJ do Senado do segundo, nos ANEXO D, E e F do presente trabalho
respectivamente.
87

difundidos, com o fim de promover a satisfação antecipada do pedido do autor. Diz


Ada Pellegrini Grinover 196:

Chamado de “procedimento ingiuntivo” na Itália, de “mahneverfahen” na


Alemanha e na Áustria, de “injonction de payer” na França e na Bélgica, o
processo monitório é exclusivamente documental em alguns países (como
na Itália, Bélgica e Brasil), conhecendo outros países a forma “pura”, em
que a emissão da escrita do débito (França Alemanha, Áustria). Mas o traço
comum é o de que a cognição se limita à prova produzida pelo requerente e
é normalmente caracterizada pela ausência de contraditório inicial. Somente
se o devedor, após o decreto injuntivo, se opuser à ordem de pagamento, é
que se instaurará o procedimento comum, em contraditório pleno.

Seguindo a linha de pensamento do legislador alienígena, a proposta


prevê a instauração de um procedimento sumário, monitório, no qual o autor requer
a antecipação da tutela satisfativa, com o fim de dosar os efeitos que a cognição
exauriente pode ter sobre o autor que, supostamente, tem direito. Reconhecendo o
respeito ao devido processo legal, o contraditório diferido se tornaria a regra do
sistema, pois se pretende atribuir ao réu o ônus de provocar a cognição plena 197.

Trata-se de técnica inovadora para o ordenamento civil brasileiro, em que


pese a aproximação teórica com o procedimento monitório de adiantamento da
tutela executiva. Como regra, não se prevê a cognição exauriente para a formação
de preclusão com força de coisa julgada. Caso entenda necessário, poderá o réu
mover a ação principal de conhecimento, sem a qual tornará a tutela como final,
caso deferida.

O que preocupa nesse tipo de procedimento é o equilíbrio de forças no


processo civil. Em que pese a difusão dos direitos na sociedade por órgãos como o
IDEC, o PROCON, a TV Justiça e o famoso “boca a boca”, em geral não há uma
cultura jurídica, amplamente, difundida.

196
GRINOVER, Ada Pellegrini Grinover. Op. cit., p. 14.
197
BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Estabilização da tutela antecipada. In COSTA, Hélio
Rubens Batista Ribeiro; DINAMARCO, Pedro Da Silva (Coords.). Linhas mestras do processo civil:
comemoração dos 30 anos de vigência do CPC. São Paulo: Atlas, 2004, pp. 367/396, em destaque p.
393.
88

A respeitável instituição da Defensoria Pública continua defasada, pouco


aparelhada, com poucos defensores concursados, com quadro de pessoal reduzido.
A insegurança gerada por um procedimento posto na mão de um autor com
possibilidade econômica de contratar grandes bancas de advogados para ajuizar um
cidadão que necessite daquela instituição, ou não a procure, pois não sabe como
fazê-lo, é de grande preocupação.

3.5. A tutela antecipada do processo de conhecimento no CPC e os demais


subsistemas processuais.

Por disposição legal dos subsistemas processuais, a tutela antecipada é


aplicável com todas as características até aqui apresentadas, em que pese
disposições legais proibitivas que são viciadas de inconstitucionalidade.

No sistema processual criado para disciplinar o remédio constitucional do


mandado de segurança, hoje, a Lei nº. 12.016, de 7 de agosto de 2.009, o
legislador pecou ao entrar em campo que não lhe era reservado no artigo 7º, § 5º:
aproveitou para perpetuar a inconstitucionalidade da vedação de tutela antecipada
em face do Poder Público 198.

A nova lei do mandado de segurança andou mal ao prever a vedação à


tutela antecipada. Trata-se de tentativa de desarmamento do Poder Judiciário para
controle do Poder Público. Como diz Cássio Scarpinella Bueno, é uma clara

198 o
Art. 7 Ao despachar a inicial, o juiz ordenará:
I - que se notifique o coator do conteúdo da petição inicial, enviando-lhe a segunda via
apresentada com as cópias dos documentos, a fim de que, no prazo de 10 (dez) dias, preste as
informações;
II - que se dê ciência do feito ao órgão de representação judicial da pessoa jurídica interessada,
enviando-lhe cópia da inicial sem documentos, para que, querendo, ingresse no feito;
III - que se suspenda o ato que deu motivo ao pedido, quando houver fundamento relevante e do
ato impugnado puder resultar a ineficácia da medida, caso seja finalmente deferida, sendo
facultado exigir do impetrante caução, fiança ou depósito, com o objetivo de assegurar o
ressarcimento à pessoa jurídica.
[...]
o
§ 5 As vedações relacionadas com a concessão de liminares previstas neste artigo se estendem
o
à tutela antecipada a que se referem os arts. 273 e 461 da Lei n 5.869, de 11 de janeiro de 1973 -
Código de Processo Civil.
89

limitação ao dever-poder geral de antecipação prevista nos dispositivos vedados,


que acaba englobando as hipóteses do artigo 461-A do Código de Ritos 199.

Em que pese a declaração de constitucionalidade ocorrida no Plenário do


Supremo Tribunal Federal sobre a possibilidade de restrições a decisões contra o
Poder Público, não se pode concordar com essa decisão: a Academia não precisa
ceder às decisões do Judiciário quando se mostrarem ilegais, inconstitucionais e
injustas.

No direito processual do trabalho, por força do artigo 769 da


Consolidação das Leis do Trabalho – CLT 200, a técnica antecipatória é aplicável, pois
a lei específica não contém dispositivo próprio a revogar a aplicação do CPC.

Há a exceção do dissídio coletivo que, conforme explica Nelson Pinto


Martins, pois seu caráter, eminentemente, declaratório e constitutivo, obriga ao
ajuizamento da ação de cumprimento. “Logo, não se pode falar em tutela antecipada
no dissídio coletivo” 201.

Francisco Ferreira Jorge Neto e Jouberto de Quadros Pessoa Cavalcante


auxiliam para entendermos alguns casos de aplicação da tutela antecipada naquela
seara 202:

A tutela antecipada é perfeitamente aplicável ao processo trabalhista e deve


ser valorizada, como forma de resguardar o processo como instrumento de
justiça.
Nos processos trabalhistas, a tutela antecipada pode ocorrer em várias
situações, tais como: a) reintegração de empregado estável (legal,
normativa ou contratual), com a fixação de multa diária; b) levantamento dos
depósitos fundiários por alvará judicial; c) levantamento do seguro-
desempregado por alvará judicial; d) anotação do contrato de trabalho na
CTPS; e) anotação de baixa ou retificações na CTPS; f) anotação de
evolução salarial na CTPS; g) fixação de multas, em dissídios coletivos,
para que os grevistas mantenham parte dos serviços em caso dos serviços

199
BUENO, Cassio Scarpinella. A nova lei do mandado de segurança: comentários sistemáticos à
lei nº. 12.016, de 7-8-2009. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 47.
200
Art. 769 - Nos casos omissos, o direito processual comum será fonte subsidiária do direito
processual do trabalho, exceto naquilo em que for incompatível com as normas deste Título.
201
MARTINS, Nelson Pinto. Tutela antecipada e tutela específica no processo do trabalho. 2ª Ed.
São Paulo: Editora Atlas, 2000, p. 38.
202
JORGE NETO, Francisco Ferreira; CAVALCANTE, Jouberto de Quadros Pessoa. Direito
Processual do trabalho. Tomo I. 3ª Ed. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2007, pp. 455/456.
90

ou atividades essenciais (art. 11, Lei nº. 7.783/89); h) determinação par que
o empregador não faça a transferência do empregado (artigos 469 e 659,
IX, CLT).

Anote-se que uma das dificuldades encontradas no processo do trabalho


para o requerimento de tutela antecipada reside no fato de que, naquela área, vigora
o princípio da irrecorribilidade em separado das interlocutórias, obrigando o manejo
do mandado de segurança.

O remédio heróico com interposição nesta situação, diretamente, no


Tribunal Regional do Trabalho, necessita da configuração do direito líquido e certo
para a concessão da segurança. Ocorre que o Poder Judiciário insiste em entender
que a tutela antecipada é faculdade do juiz, não direito da parte, o que impede a
procedência do mandamus 203.

A presente exortação cabe a todos os sistemas onde se aplicam ou se


aplicarem no futuro a tutela antecipada: todos tem direito à adequada tutela
jurisdicional por força da obrigação do Estado em responder ao cidadão em tempo
hábil. Assim a técnica da tutela antecipada, preenchidos os requisitos legais, é
direito do cidadão, não faculdade do juiz.

O Poder Judiciário deve passar a ver o jurisdicionado com a mesma


preocupação que a doutrina mais moderna: como consumidor dos serviços judiciais.
Assim, deve quebrar todo o preconceito que ainda existe acerca da tutela
antecipada, um instituto de grande valia para a tão festejada efetividade do
processo.

203
Mandado de Segurança. Tutela antecipada. Livre arbítrio do julgador. O artigo 273 do CPC
confere discricionariedade ao Magistrado para conceder ou não a tutela pretendida, e tal juízo
de cognição sumária insere-se no livre arbítrio do julgador, sob pena de afronta à liberdade de
apreciação da prova pelo juiz (art. 131 do CPC). Ao Magistrado incumbe a aplicação do direito às
circunstâncias da demanda, e nos limites de seu livre convencimento, sendo-lhe permitido valorar o
compêndio probatório desde que fundamente a sua decisão. O direito à livre sindicalização trata-se
de garantia constitucionalmente assegurada (art. 8º da CF), inexistindo quaisquer indícios a revelar
que a exposição das fichas de filiação violariam a intimidade dos associados – grifo nosso. (TRT da
2ª Região. Mandado de Segurança nº. 10259-2009-000-02-00-4, SDI, Relator Desembargador do
Trabalho Sergio Winnik, julgado em 22.09.2009, publicado em 27.10.2009) - grifamos.
91

CONCLUSÃO

Das pesquisas elaboradas, podemos inferir que para o estudo dos


princípios e de qualquer outro instituto que possua história, é preciso averiguar seu
contingente para se ter o alcance e profundidade corretos.

Diferentemente como se cria no Jusnaturalismo, os princípios não são,


apenas, verdades abstratas que decorrem da natureza humana e não vinculam
normativamente. Nem mesmo merece apoio a teoria do Juspositivismo, quando a lei
não é a única fonte normativa existente e os princípios não decorrem da norma
positivada, mas preexistem à lei. Na era do pós-positivismo jurídico, onde nos
encontramos, os princípios são encarados como normas.

A diferença lógica entre princípios e regras reside no fato de aqueles


necessitarem das condições fático-jurídicas para sua ponderação, enquanto estas
ou valem, e são aplicadas, ou não valem, e são desconsideradas. Assim, fica clara
impossibilidade de existência de princípios absolutos, sempre devem ser sopesados,
sendo impossível o esvaziamento total do núcleo de eficácia de cada um no caso
concreto.

Pela teoria dos sistemas autopoiéticos, considera-se que os sistemas


estejam inseridos numa sociedade complexa, forçando, cada um, a autopoiese dos
demais por meio de interferências. O Direito, como sistema autopoiético sofre
influências do ambiente, como do entorno social, forçando sua modificação por meio
de seus mecanismos internos.

Os princípios desempenham importantes funções no sistema jurídico,


como normas interpretativas, integrativas e diretivas.
92

A principal influência do entorno social no direito processual se viu com a


necessidade de uma tutela constitucional do processo, pela qual foram,
expressamente, previstos direitos e garantias fundamentais para a concretização do
princípio da dignidade da pessoa humana.

O principio do devido processo legal, previsto na Constituição de 1988, é


a base de todo o direito constitucional processual, de onde decorrem os princípios,
que também atuam como direitos fundamentais sem qualquer contradição, a uma
tutela efetiva e ao contraditório.

A necessidade de efetivação desses direitos levou o Estado e o


processualista contemporâneo a desenvolver técnicas de aceleração do tempo no
processo civil, dentre as quais se insere a tutela antecipada.

As reformas processuais setoriais, sob o pretexto de racionalizar o


processo legislativo, tem criado anacronismos com a inserção de ideologias diversas
no mesmo Código de Processo, o que tem gerado confusões na aplicação do direito,
sendo necessária a cautela do julgador e do hermeneuta.

A tutela antecipada é uma evolução do sistema jurídico. Criada


autopoieticamente pela influência da necessidade do entorno social, auxilia em
evitar o descrédito do Poder Judiciário.

A tutela antecipada é gênero das tutelas de urgência que não se confunde


com a tutela cautelar: essa protege o processo para garantir a satisfação; aquela
satisfaz desde já a parte para proteger o direito material.

Há três modalidades de tutela antecipada: a tutela assecuratória, que visa


a urgente proteção do direito material; a tutela punitiva, que visa o desestímulo da
defesa infundada do réu; e a tutela do pedido ou parcelas incontroversos, as quais
sempre deverão ser requeridas pela parte, nunca concedidas de ofício.

Nas tutelas assecuratórias e punitivas, os requisitos de urgência e de


propósito protelatório do réu, respectivamente, devem necessariamente estar
acompanhadas de prova inequívoca de verossimilhança do alegado, ainda que a
prova possa conduzir a resultados diversos, podem ser revogadas ou confirmadas a
qualquer tempo.
93

A cognição da tutela antecipada do pedido ou parcelas incontroversos é


exauriente, não sumária.

O contraditório no deferimento da tutela antecipada está sempre presente,


ainda que de modo diferido, no caso da tutela assecuratória. Nos demais casos
sempre deverá haver a oitiva prévia do réu. Ainda assim, o juiz deve tratar como
exceção a tutela concedida inaudita altera parte.

O juiz deve sempre sopesar os princípios e direitos fundamentais


antagônicos quando apreciar o pedido de tutela antecipada, nunca permitindo o
esvaziamento do núcleo de eficácia do contraditório ou da tutela efetiva.

Não é possível a fungibilidade de mão dupla entre as tutelas de urgência


de maneira indiscriminada: a tutela antecipada só poderá ser deferida quando,
erroneamente, for requerida tutela cautelar, apenas se os requisitos daquela
estiverem presentes, bem como se houver dúvida objetiva e inexistência de erro
grosseiro.

Há projetos de lei no Congresso Nacional que pretendem a modificação


do instituto, bem como a criação de um novo Código de Processo Civil, que
pretendem dinamizar a tutela antecipada para permitir seu processamento prévio ao
processo de conhecimento: é a chamada estabilização da tutela antecipada.

Outros subsistemas processuais, como o do mandado de segurança e do


processo do trabalho, aplicam, subsidiariamente, a regra da tutela antecipada, com
as restrições legais e objetivas próprias.

A tutela antecipada decorre do direito à adequada prestação jurisdicional,


então é direito do cidadão em ver a tutela efetiva dos direitos, com a ressalva do
preenchimento dos requisitos legais.
94

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110

ANEXO A – PROPOSIÇÕES DA COMISSÃO PARA O ANTEPROJETO DE CPC

SENADO FEDERAL

PRESIDÊNCIA

Comissão de Juristas “Novo CPC”

Comissão de Juristas encarregada de elaborar Anteprojeto do


Novo Código de Processo Civil, instituída pelo Ato nº 379, de
2009, do Presidente do Senado Federal, de 30 de setembro de
2009

Membros da Comissão

Luiz Fux (Presidente)

Teresa Arruda Alvim Wambier (Relatora)

Adroaldo Furtado Fabrício

Benedito Cerezzo Pereira Filho

Bruno Dantas

Elpídio Donizetti Nunes

Humberto Theodoro Júnior

Jansen Fialho de Almeida

José Miguel Garcia Medina

José Roberto dos Santos Bedaque

Marcus Vinicius Furtado Coelho

Paulo Cesar Pinheiro Carneiro

Brasília

Dezembro de 2009
111

Exmo. Sr. Presidente do Senado Federal

Senador José Sarney

Honrado com a designação para Presidir a Comissão instituída com a finalidade de


elaboração de um Novo Código de Processo Civil, venho, pelo presente, apresentar
a V. Exa os resultados da primeira faz dos trabalhos, quiçá o mais significativo, qual
o da aprovação das proposições que serão servis à elaboração do Anteprojeto a ser
submetido, às audiências públicas, ao controle prévio da constitucionalidade pelo
Egrégio Supremo Tribunal Federal e, finalmente ao processo legislativo.

A ideologia norteadora dos trabalhos da Comissão foi a de conferir maior celeridade


à prestação da justiça, por isso que, à luz desse ideário maior, foram criados novéis
institutos e abolidos outros que se revelaram ineficientes ao longo do tempo, mercê
da inclusão de ônus financeiro aptos a desencorajar as aventuras judiciais que
abarrotam as Cortes Judiciais do nosso país.

A Comissão, atenta à sólida lição da doutrina de que sempre há bons materiais a


serem aproveitados da legislação anterior, bem como firme na crença de que a
tarefa não se realiza através do mimetismo que se compraz em apenas repetir erros
de outrora, empenhou-se na criação de um novo código erigindo instrumentos
capazes de reduzir o número de demandas e recursos que tramitam pelo Poder
Judiciário.

Esse desígnio restou perseguido, resultando do mesmo a instituição de um


incidente de coletivização dos denominados litígios de massa, o qual evitará a
multiplicação das demandas , na medida em que suscitado o mesmo pelo juiz
diante, numa causa representativa de milhares de outras idênticas quanto à
pretensão nelas encartada, imporá a suspensão de todas, habilitando o magistrado
na ação coletiva, dotada de amplíssima defesa, com todos os recursos previstos nas
leis processuais, proferir uma decisão com amplo espectro, definindo o direito
112

controvertido de tantos quantos se encontram na mesma situação jurídica,


plasmando uma decisão consagradora do principio da isonomia constitucional

A redução do números de recursos hodiernamente existentes. como a eliminação


dos embargos infringentes e o agravo, como regra, ,adotando-se no primeiro grau de
jurisdição uma única impugnação da sentença final, oportunidade em que a parte
poderá manifestar todas as suas irresignações quanto aos atos decisórios proferidos
no curso do processo, ressalvada a tutela de urgência impugnável de imediato por
agravo de instrumento, coadjuvarão o sistema no alcance dessa almejada
celeridade, sem a violação das clausulas que compõem o novo processo civil
constitucional.

A Comissão , por seu turno, não se descurou da simplificação do código e de seus


novéis instrumentos, instituindo procedimento único para o processo de
sentença, adaptável pelo juiz em face do caso concreto, reorganizando o próprio
código conquanto conjunto de normas, dotando-o de uma Parte Geral e de um
Livro relativo ao Processo de Conhecimento, outro referente ao Processo de
Execução, um terceiro acerca dos Procedimentos Especais não incluídos no
Processo de Conhecimento , o quarto inerente aos Recursos e o último e quinto
Livro, sobre as Disposições Gerais e Transitórias.

A Força da Jurisprudência restou deveras prestigiada em todos os graus de


jurisdição, viabilizando a criação de filtros em relação às demandas ab origine,
autorizando o juiz a julgar a causa de plano consoante a jurisprudência sumulada e
oriunda das teses emanadas dos recursos repetitivos, sem prejuízo de tornar
obrigatório para os tribunais das unidades estaduais e federais, a adoção das
teses firmadas nos recursos representativos das controvérsias , previstos,
hodiernamente no artigo
543-C do CPC, evitando a desnecessária duplicação de julgamentos, além de
manter a higidez de uma das funções dos Tribunais Superiores, que é a de
uniformizar a jurisprudência do país.

A Comissão privilegiou a conciliação incluindo-a como o primeiro ato de


convocação do réu a juízo, porquanto nesse momento o desgaste pessoal e
patrimonial das partes é diminuto e encoraja as concessões , mercê de otimizar o
113

relacionamento social com larga margem de eficiência em relação a à prestação


jurisdicional, mantendo a lei esparsa da arbitragem em texto próprio.

Em suma. Exmo. Sr. Presidente José Sarney, a Comissão concluiu nas diversas
proposições que seguem em anexo,que se impunha dotar o processo. e a fortiori, o
Poder Judiciário, de instrumentos capazes , não de enfrentar centenas de milhares
de processos, mas antes, de obstar a ocorrência desse volume de demandas,
com o que, a um só tempo. salvo melhor juízo, sem violação de qualquer comando
constitucional,visou tornar efetivamente alcançável a duração razoável dos
processos, promessa constitucional e ideário de todas as declarações
fundamentais dos direitos do homem e de todas as épocas e continentes, mercê de
propiciar maior qualificação da resposta judicial, realizando o que Hans Kelsen
expressou ser o mais formoso sonho da humanidade. o sonho de justiça.

Ministro Luiz Fux

Presidente da Comissão
114

Decisões acerca das proposições temáticas

- Fase anterior à elaboração da redação dos dispositivos -

1 – Parte Geral

a) O Anteprojeto do Novo Código de Processo Civil será dividido em 6(seis) Livros:


Parte Geral, Processo de Conhecimento, Processo de Execução e Cumprimento de
Sentença, Procedimentos Especiais, Recursos e Disposições Finais e Transitórias.

b) Inclusão das matérias sobre jurisdição, ação, partes, procuradores, Ministério


Público, Órgãos Judiciários e auxiliares, atos processuais, formação, suspensão e
extinção do processo na Parte Geral, excluídas do livro de Processo de
Conhecimento.

c) Incluir na Parte Geral as disposições gerais sobre as Tutelas de cognição,


execução, e de urgência, temas estes previstos no atual Capítulo VII (Processo e
procedimento) do Livro I (Do Processo de Conhecimento) e o Livro IV, que será
substituído, com a eliminação da parte referente aos procedimentos cautelares
específicos.

d) Incluir na Parte Geral as disposições referentes à competência, suspeição e


impedimento.

e) Permanência do sistema de provas no livro da Parte Geral.

f) Inovação de um sistema de provas obtidas extrajudicialmente, como mera


faculdade conferida às partes. e realização de perícia judicial, ex offício e ad
eventum, após a juntada de peças pelos assistentes técnicos das partes.

g) Exclusão da possibilidade jurídica do pedido como condição da ação, tornando-a


matéria de mérito.
115

h) Desburocratização cartorária através da definição mais clara dos atos ordinatórios


a serem praticados pelo escrivão e pela concessão aos advogados da faculdade de
promover a intimação pelo correio do advogado da parte contrária, de testemunhas
etc., com o uso de formulários próprios e juntada aos autos do comprovante do aviso
de recebimento.

i) Exclusão das figuras da oposição, da nomeação à autoria e do chamamento ao


processo, mantendo-se a denunciação à lide, com espectro mais amplo, e a
assistência em suas duas modalidades.

j) Inclusão de Poder ao magistrado, permitindo-o, a seu critério, o chamamento de


amicus curie, sem modificação de competência.

k) Não incluir no novo Código, o processo coletivo, em tramitação no Congresso


Nacional, bem como os processos e procedimentos previstos em leis especiais.

l) Incluir na Parte Geral em parte própria à legitimidade para agir, um incidente de


coletivização (nome provisório), referente à legitimação para as demandas de
massa, com prevenção do juízo e suspensão das ações individuais.

m) Adequar o Novo Código de Processo Civil à lei referente ao processo eletrônico,


compatibilizando a comunicação dos atos processuais com o novel sistema
moderno.

n) Regular, na Parte Geral, a desconsideração da Pessoa Jurídica na forma da lei


civil como condição para a fixação da responsabilidade patrimonial dos sócios na
futura fase de cumprimento da sentença bem como regular o instituto na execução
extrajudicial, garantido o contraditório prévio, aos sócios no próprio processo
satisfativo.

o) Adotar um incidente prévio para manifestação dos sócios antes da constrição dos
bens.

p) A coisa julgada entre as mesmas partes abrangerá as questões prejudiciais,


tornando dispensável a propositura de ação declaratória incidental , observada a a
competência do juízo..
116

2 – Procedimentos Especiais

a) Manutenção dos procedimentos especiais de jurisdição voluntária,


desjudicializando os procedimentos meramente escriturais.

b) Exclusão dos seguintes procedimentos especiais: ação de depósito, ações de


anulação de substituição de títulos ao portador, ações possessórias, ação de
nunciação de obra nova, ação de usucapião e ação de oferecer contas,
compreendidos no processo de conhecimento.

c) Inserir um artigo sobre o procedimento edital, especificando que ele será cabível
nos procedimentos de usucapião de substituição ou anulação de títulos ao portados
e genericamente, em quaisquer outros que por regra de Direito Material, exijam a
citação de interessados incertos.

3 – Processo de Conhecimento

a) Inclusão na Parte Geral de um dispositivo enumerando todos os poderes do


magistrado.excluindo-os do livro próprio do processo de conhecimento.

b) Ampliação dos poderes do magistrado, como, por exemplo:

- adequar as fases e atos processuais às especificações do conflito, de modo a


conferir maior efetividade à tutela do bem jurídico, respeitando-se o contraditório e a
ampla defesa.

c) permitir a alteração do pedido e da causa de pedir em determinadas hipóteses,


assegurando sempre a ampla defesa.

d) determinar o pagamento e/ou o depósito da multa cominada liminarmente, desde


o dia em que for configurado o descumprimento.
117

e) nas ações que tenham por objeto pagamento de condenação de quantia em


dinheiro, o juiz, sempre que possível, poderá prever, além de imposição de multa,
outras medidas indutivas, coercitivas ou sub-rogatórias.

c) As matérias conhecíveis de ofício pelo magistrado, sempre serão submetidas ao


crivo do contraditório.

d) Extinção dos incidentes processuais, como v.g: as exceções de incompetência,


impedimento, suspeição, impugnação ao valor da causa etc, relegando essas
matérias como temas da contestação.

e) Criação de um parágrafo com a finalidade de determinar a apreciação prioritária


pelo magistrado das matérias de impedimento e suspeição.

f) Estabelecer a competência absoluta dos Juizados Especiais.

g) Criação de um procedimento único bifásico, iniciado pela audiência de


conciliação.

h) Extinguir o instituto da reconvenção, permitindo ao réu formular pedido na própria


contestação, que seja conexo com o fundamento do pedido ou da defesa.

i) Adotar como regra o comparecimento espontâneo da testemunha,e como exceção


a intimação por AR, em casos devidamente fundamentados.

j)Em caso de inversão do ônus da prova cuja parte seja beneficiária da justiça
gratuita, o Estado deverá arcar com as despesas.

k) A eficácia preclusiva da coisa julgada (atual art. 474) não incluirá as causas de
pedir.

l) A eventual relativização da coisa julgada, deve seguir as hipóteses atualmente


previstas.

m) Determinar a incidência de multa similar à do atual artigo 475-J nas hipóteses de


sucumbência na impugnação ao cumprimento de sentença e nos embargos à
execução.
118

n) A iniciação da prova pericial. Será ônus da parte , cabendo ao magistrado


eventualmente, caso entenda ser necessário, nomear perito do juízo.

o) Determinar a obrigação de o magistrado ordenar a reunião de ações conexas


propostas em separado, a fim de que sejam decididas simultaneamente, somente
nos caso de possibilidade de risco de decisões contraditórias (atual art. 105).

p) A Prevenção da competência observará o critério único do despacho ordinatório


da citação.

q) Tornar obrigatória a suscitação do conflito para o magistrado que receber o


processo por declinação de competência e não a acolha

r) Os Prazos processuais passam a correr somente em dias úteis.

s) Preferencialmente os juízes titulares deverão realizar as audiências de instrução e


julgamento e os juízes auxiliares (substitutos) as audiências de conciliação.

t) Os prazos processuais para os magistrados proferirem decisões passam a ser


de(20) vinte dias e de 5( cinco) para a prolação dos despachos de mero expediente.

4 – Processo de Execução

a) O cumprimento da sentença por quantia certa é auto-executável.dispensando a


intimação do executado após o transcurso do prazo referido no art. 475-J, incidindo
os consectários referidos transcorrido o prazo legal, após o trânsito em julgado da
decisão.

b) Eliminação da impugnação à execução de sentença que reconhece a existência


de obrigação de pagar quantia em dinheiro.

c) Redefinir, com clareza, o termo a quo de contagem do prazo a que se refere o


atual artigo 475-J do Código de Processo Civil para a incidência da multa,
119

estabelecendo critérios claros e uniformes para os casos atualmente previstos nos


atuais artigos 461, 461-A e 475-J do Código de Processo Civil.

d) Disciplinar a incidência de honorários advocatícios na fase inicial de cumprimento


de sentenças.

e) Fixação dos honorários em 10% a 20% do valor da condenação ou do proveito,


benefício ou vantagem econômica obtida.

f) Fixação dos honorários entre 5% a 10% sobre o valor da condenação ou do da


vantagem econômica obtida, nas causas que envolvam a Fazenda Pública.

g) A verba de honorários advocatícios passa a ostentar, por força do novo código,


textualmente , natureza alimentar .

h) É direito próprio do advogado os honorários na proporção do êxito obtido na


causa, vedando-se a compensação.

i) As multas (astreintes) podem incidir cumulativamente, estabelecendo-se o


seguinte critério para sua avaliação: até o valor correspondente ao da obrigação que
é objeto da ação será devida ao autor da ação e o que exceder a este montante será
devido ao Estado.

j) A multa decorrente de decisão judicial ainda não transitada em julgado ficará


depositada em juízo.

k) Definir com precisão a forma de aperfeiçoamento da “penhora on line” (isto é, do


bloqueio à efetiva penhora), simplificando-o.

l) Permitir a penhora parcial de bens atualmente considerados impenhoráveis,


estabelecendo critérios para tanto, tornando-se flexível a impenhorabilidade.

m) Revisão da ordem prevista no atual artigo 655 do Código de Processo


Civil.ponderando o princípio da utilidade da execução em confronto com o principio
da menor onerosidade
120

n) Definir o prazo para o exercício do direito à adjudicação pelo exeqüente e pelos


demais interessados, e permitir que a mesma seja realizada também após a
tentativa frustrada de arrematação.

o) Eliminar a distinção entre praça e leilão.

p) Estabelecer, como regra, que os atos de alienação (arrematação) sejam


realizados por leilão eletrônico, salvo se as condições da comarca não permitirem a
observância do referido procedimento.

q) Eliminar a necessidade hoje prevista no Código de Processo Civil de duas hastas


públicas (Isto é, a primeira pelo valor da avaliação e a segunda por valor que não
seja considerado vil), permitindo-se que desde a primeira hasta pública o bem seja
alienado por valor inferior à avaliação, desde que não seja considerado preço vil.

r) Eliminar os embargos à arrematação, sendo facultado à parte valer-se de ação


com o intuito de rescindir os atos decisórios, como os atos jurídicos em geral, nos
termos da lei civil (atual artigo 486 do Código de Processo civil).

s) Permitir que, a exemplo do que é hoje autorizado pelo atual artigo 615-A
(averbação da execução), alguns atos de comunicação, inclusive a citação, sejam
materializados por iniciativa do próprio exeqüente e não pelos serventuários da
justiça, estabelecendo critérios precisos para tanto.

t) Disciplinar o reconhecimento da prescrição intercorrente na execução.

u) Corrigir incongruências atualmente existentes no Código de Processo Civil,


decorrentes das muitas reformas realizadas anteriormente, por exemplo, em relação
aos dispositivos que ainda mencionam a carta de sentença, à incidência ou não de
multa a que se refere o atual artigo 415-J na execução de sentença que condena ao
pagamento de pensão alimentícia.

5 – Recursos
121

a) Inclusão das ações autônomas de impugnação no Livro de Recursos.

b) Unificar os prazos recursais em quinze dias úteis salvo os embargos de


declaração.

c) Determinar a ausência de preclusão no 1º grau de jurisdição, extinguindo-se a


figura do agravo, ressalvado o agravo de instrumento para as decisões de urgência
satisfativas ou cautelares.

d) Fixação ampliativa dos honorários, a cada recurso não provido (Sucumbência


Recursal)

e) Estabelecimento de um único recurso de apelação no qual a parte manifestará


todas as suas irresignações quanto às decisões interlocutória proferidas no curso do
processo.

f) Extinção dos embargos infringentes, devendo constar o dever de o magistrado,


cujo voto não tenha prevalecido, relatá-lo expressamente, considerando-se este voto
declarado como sendo integrante do acórdão para todos os efeitos, inclusive para
fins de prequestionamento.

g) Os recursos têm, como regra, apenas o efeito devolutivo, inclusive quanto à


Fazenda Pública, sendo que, em casos excepcionais o efeito suspensivo deverá ser
requerido nos moldes atuais.

h) O recurso de apelação continua sendo interposto no 1º grau de jurisdição,


admitido o juízo de retratação em consonância com Súmulas dos Tribunais
Superiores ou nos termos do atual artigo 543, relegando-se o juízo de
admissibilidade formal para o 2º grau de jurisdição.

i) Manutenção do atual artigo 557, substituindo-se no dispositivo legal a expressão


“jurisprudência dominante”, por critérios menos fluídos:como entendimento
consoante a súmula dos Tribunais Superiores ou a decisão representativa da
controvérsia, tomada com base no regime dos atuais artigos 543-B e 543-C.

j) A Tese adotada no recurso repetitivo passa a ser de obediência obrigatória para


os Tribunais locais.
122

k) Nos casos em que o Egrégio Supremo Tribunal Federal entenda que a questão
versada no recurso extraordinário é de ordem infraconstitucional impõe-se seja o
mesmo remetido ao Superior Tribunal de Justiça, por decisão
irrecorrível.aproveitando-se a impugnação interposta .

l) Nos casos em que o Superior Tribunal de Justiça entenda que a questão versada
no recurso especial é de ordem constitucional, impõe-se a remessa ao Supremo
Tribunal Federal que se entender pela competência do primeiro pode, reenviar o
recurso ao STJ, por decisão irrecorrível.

m)O recurso extraordinário e o recurso especial decididos (acolhidos) com base em


uma das causas de pedir ou em uma das razões de defesa permitem ao Superior
Tribunal de Justiça ou ao Supremo Tribunal Federal o julgamento das demais
matérias, ainda que com relação a elas não tenha havido prequestionamento, sendo
certo que, concluindo-se, ex offício ou a requerimento da parte pela . Necessária
produção de provas, o processo será remetido ao 2º grau de jurisdição, para a
realização da diligência necessária.

n) O acórdão que examine apenas um dos fundamentos da apelação ou da


resposta e desde que interpostos embargos de declaração, permitirá sejam
considerados todos os temas debatidos em eventual recurso especial ou
extraordinário.

o) Nos casos dos atuais artigos 543-B e 543-C, retratando-se o Tribunal a quo quo
remanesce a sua competência para julgar as demais questões que não foram
decididas pelo Tribunal Superior., cabendo, em relação às mesmas os recursos
respectivos.

p) Cabem embargos de divergência de acórdãos comparáveis, que versem


questões idênticas, sejam de mérito ou de admissibilidade recursal.

q) Extingui-se a uniformização de jurisprudência, por força do atual artigo 555,


parágrafo 1º, do Código de Processo Civil.

r) Extinguir a remessa necessária.


123

s) No inciso V da ação rescisória substitui-se a expressão “ofensa a literal


disposição de lei” por “ofensa ao direito”, verificável independentemente de exame
de prova – salvo se tratar de ofensa à lei processual.

t) Esclarecer as hipóteses de cabimento das ações anulatórias de atos judiciais


124

ANEXO B – PROJETO DE LEI QUE INTROUDUZIU A TUTELA ANTECIPADA

PROJETO DE LEI DA CÂMARA Nº 3.803, DE 1993

(Do Poder Executivo)

MENSSAGEM Nº. 255/93

Altera os dispositivos do Código de Processo Civil


sobre o processo de conhecimento e o processo
cautelar.

(À COMISSÃO DE CONSTITUIÇÃO E JUSTIÇA E


DE REDAÇÃO – ART. 24, II).

O Congresso Nacional decreta:

Art. 1º Os dispositivos a seguir enumerados, da Lei nº 5.869, de 11 de


janeiro de 1973 - Código de Processo Civil, passam a vigorar com a seguinte
redação:

"Art. 10. O cônjuge somente necessitará do consentimento do


outro para propor ações que versem sobre direitos reais imobiliários.

§ 1º Ambos os cônjuges serão necessariamente citados para


as ações:

I - que versem sobre direitos reais imobiliários;

.................................................................................

§ 2º Nas ações possessórias, a participação do cônjuge do


autor ou do réu somente é indispensável nos casos de composse ou de
ato por ambos praticados.

.....................................................................................

Art. 18. O juiz, de ofício ou a requerimento, condenará o


litigante de má-fé a indenizar à parte contrária os prejuízos que esta
sofreu, mais os honorários advocatícios e as despesas que efetuou.

......................................................................................
125

§ 2º O valor da indenização será desde logo fixado pelo juiz,


em quantia não superior a vinte por cento sobre o valor da causa, ou
liquidado por arbitramento.

Art. 20. ............................................................................

.......................................................................................

§ 4º Nas causas de pequeno valor, nas de valor inestimável,


naquelas em que não houver condenação ou for vencida a Fazenda
Pública, e nas execuções, embargadas ou não, os honorários serão
fixados consoante apreciação eqüitativa do juiz, atendidas as normas das
alíneas a, b e c do parágrafo anterior.

........................................................................................

Art. 33. ............................................................................

Parágrafo único. O juiz poderá determinar que a parte


responsável pelo pagamento dos honorários do perito deposite em juízo o
valor correspondente a essa remuneração. O numerário, recolhido em
depósito bancário à ordem do juízo e com correção monetária, será
entregue ao perito após a apresentação do laudo, facultada a sua
liberação parcial, quando necessária.

...................................................................................

Art. 38. A procuração geral para o foro, conferida por


instrumento público, ou particular assinado pela parte, habilita o advogado
a praticar todos os atos do processo, salvo para receber citação inicial,
confessar, reconhecer a procedência do pedido, transigir, desistir,
renunciar ao direito sobre que se funda a ação, receber, dar quitação e
firmar compromisso.

....................................................................................

Art. 45. O advogado poderá, a qualquer tempo, renunciar ao


mandato, provando que cientificou o mandante a fim de que este nomeie
substituto. Durante os dez dias seguintes, o advogado continuará a
representar o mandante, desde que necessário para lhe evitar prejuízo.
126

Art. 46. ...............................................................................

Parágrafo único. O juiz poderá limitar o litisconsórcio facultativo


quanto ao número de litigantes, quando este comprometer a rápida
solução do litígio ou dificultar a defesa. O pedido de limitação interrompe
o prazo para resposta, que recomeça da intimação da decisão.

............................................................................................

Art. 125. ...........................................................................

.........................................................................................

IV - tentar, a qualquer tempo, conciliar as partes.

Art.162. ............................................................................

§ 4º Os atos meramente ordinatórios, como a juntada e a vista


obrigatória, independem de despacho, devendo ser praticados de ofício
pelo servidor e revistos pelo juiz quando necessários.

..........................................................................................

Art. 170. É lícito o uso da taquigrafia, da estenotipia, ou de


outro método idôneo, em qualquer juízo ou tribunal.

...........................................................................................

Art. 172. Os atos processuais realizar-se-ão em dias úteis, das


seis às vinte horas.

§ 1º Serão, todavia, concluídos depois das horas os atos


iniciados antes, quando o adiamento prejudicar a diligência ou causar
grave dano.

§ 2º A citação e a penhora poderão, em casos excepcionais, e


mediante autorização expressa do juiz, realizar-se em domingos e
feriados, ou nos dias úteis, fora do horário estabelecido neste artigo,
observado o disposto no art. 5º, inciso XI, da Constituição Federal.

§ 3º Quando o ato tiver que ser praticado em determinado


prazo, por meio de petição, esta deverá ser apresentada no protocolo,
dentro do horário de expediente, nos termos da lei de organização
judiciária local.
127

........................................................................................

Art. 219. ...........................................................................

§ 1º A interrupção da prescrição retroagirá à data da


propositura da ação.

§ 2º Incumbe à parte promover a citação do réu nos dez dias


subseqüentes ao despacho que a ordenar, não ficando prejudicada pela
demora imputável exclusivamente ao serviço judiciário.

§ 3º Não sendo citado o réu, o juiz prorrogará o prazo até o


máximo de noventa dias.

........................................................................................

Art. 239. .........................................................................

Parágrafo único................................................................

......................................................................................

III - a nota de ciente ou certidão de que o interessado não a


apôs no mandado.

......................................................................................

Art. 272. O procedimento comum é ordinário ou sumário.

Parágrafo único. O procedimento especial e o procedimento


sumário regem-se pelas disposições que lhes são próprias, aplicando-se-
lhes, subsidiariamente, as disposições gerais do procedimento ordinário.

Art. 273. O juiz poderá, a requerimento da parte, antecipar,


total ou parcialmente, os efeitos da tutela pretendida no pedido inicial,
desde que, existindo prova inequívoca, se convença da verossimilhança
da alegação e:

I - haja fundado receio de dano irreparável ou de difícil


reparação; ou

II - fique caracterizado o abuso de direito de defesa ou o


manifesto propósito protelatório do réu.
128

§ 1º Na decisão que antecipar a tutela, o juiz indicará, de modo


claro e preciso, as razões do seu convencimento.

§ 2º Não se concederá a antecipação da tutela quando houver


perigo de irreversibilidade do provimento antecipado.

§ 3º A execução da tutela antecipada observará, no que


couber, o disposto nos incisos II e III do art. 588.

§ 4º A tutela antecipada poderá ser revogada ou modificada a


qualquer tempo, em decisão fundamentada.

§ 5º Concedida ou não a antecipação da tutela, prosseguirá o


processo até final julgamento.

.......................................................................................

Art. 296. Indeferida a petição inicial, o autor poderá apelar,


facultado ao juiz, no prazo de quarenta e oito horas, reformar sua decisão.

Parágrafo único. Não sendo reformada a decisão, os autos


serão imediatamente encaminhados ao tribunal competente.

.......................................................................................

Art. 331. Se não se verificar qualquer das hipóteses previstas


nas seções precedentes e a causa versar sobre direitos disponíveis, o juiz
designará audiência de conciliação, a realizar-se no prazo máximo de
trinta dias, à qual deverão comparecer as partes ou seus procuradores,
habilitados a transigir.

§ 1º Obtida a conciliação, será reduzida a termo e homologada


por sentença.

§ 2º Se, por qualquer motivo, não for obtida a conciliação, o juiz


fixará os pontos controvertidos, decidirá as questões processuais
pendentes e determinará as provas a serem produzidas, designando
audiência de instrução e julgamento, se necessário.

........................................................................................

Art. 417. O depoimento, datilografado ou registrado por


taquigrafia, estenotipia ou outro método idôneo de documentação, será
129

assinado pelo juiz, pelo depoente e pelos procuradores, facultando-se às


partes a sua gravação.

Parágrafo único. O depoimento será passado para a versão


datilográfica quando houver recurso da sentença, ou noutros casos,
quando o juiz o determinar, de ofício ou a requerimento da parte.

......................................................................................

Art. 434. Quando o exame tiver por objeto a autenticidade ou a


falsidade de documento, ou for de natureza médico-legal, o perito será
escolhido, de preferência, entre os técnicos dos estabelecimentos oficiais
especializados. O juiz autorizará a remessa dos autos, bem como do
material sujeito a exame, ao diretor do estabelecimento.

.......................................................................................

Art. 460. ..........................................................................

Parágrafo único. A sentença deve ser certa, ainda quando


decida relação jurídica condicional.

Art. 461. Na ação que tenha por objeto o cumprimento de


obrigação de fazer ou não fazer, o juiz concederá a tutela específica da
obrigação ou, se procedente o pedido, determinará providências que
assegurem o resultado prático equivalente ao do adimplemento.

§ 1º A obrigação somente se converterá em perdas e danos se


o autor o requerer ou se impossível a tutela específica ou a obtenção do
resultado prático correspondente.

§ 2º A indenização por perdas e danos dar-se-á sem prejuízo


da multa (art. 287).

§ 3º Sendo relevante o fundamento da demanda e havendo


justificado receio de ineficácia do provimento final, é lícito ao juiz conceder
a tutela liminarmente ou mediante justificação prévia, citado o réu. A
medida liminar poderá ser revogada ou modificada, a qualquer tempo, em
decisão fundamentada.
130

§ 4º O juiz poderá, na hipótese do parágrafo anterior ou na


sentença, impor multa diária ao réu, independentemente de pedido do
autor, se for suficiente ou compatível com a obrigação, fixando-lhe prazo
razoável para o cumprimento do preceito.

§ 5º Para a efetivação da tutela específica ou para a obtenção


do resultado prático equivalente, poderá o juiz, de ofício ou a
requerimento, determinar as medidas necessárias, tais como a busca e
apreensão, remoção de pessoas e coisas, desfazimento de obras,
impedimento de atividade nociva, além de requisição de força policial.

...................................................................................

Art. 800. ..................................................................................

Parágrafo único. Interposto o recurso, a medida cautelar será


requerida diretamente ao tribunal.

...................................................................................

Art. 805. A medida cautelar poderá ser substituída, de ofício ou


a requerimento de qualquer das partes, pela prestação de caução ou
outra garantia menos gravosa para o requerido, sempre que adequada e
suficiente para evitar a lesão ou repará-la integralmente."

Art. 2º Ficam revogados o inciso I do art. 217 e o § 2º do art. 242,


renumerando-se os incisos II a V daquele artigo e o § 3º deste, do Código de
Processo Civil.

Art. 3º Esta lei entra em vigor sessenta dias após a data de sua
publicação.

Brasília,

MENSSAGEM

Senhores Membros do Congresso Nacional.


131

Nos termos do artigo 61 da Constituição Federal, submeto à elevada


deliberação de Vossas Excelências, acompanhado de Exposição de Motivos do
Senhor Ministro de Estado da Justiça, o anexo projeto de lei que “Altera dispositivos
do Código de Processo Civil sobre o processo de conhecimento e o processo
cautelar”.

Brasília, 11 de maio de 1993.

JUSTIFICATIVA

Excelentíssimo Senhor Presidente da República,

1. Submeto à elevada consideração de Vossa Excelência o anexo projeto de


lei, que cuida da reforma do Código de Processo Civil, no que se refere aos
processo de conhecimento e cautela.

2. A proposta resulta de estudos efetuados pelo Instituto Brasileiro de Direito


Processual e pela Escola Nacional de Magistratura, com amplo apoio do Ministério
da Justiça, que, buscando democratizar a reforma do ordenamento codificado,
realizou numerosos encontro e simpósios. Seu texto básico, amplamente divulgado,
mereceu a análise de advogados, magistrados, representante do Ministério Público
e professores.

3. A redação final do projeto foi elaborada por uma comissão de


especialistas na matéria, sob a coordenação dos Ministros Sálvio de Figueiredo
Teixeira (presidente) e Athos Gusmão Carneiro, secretariada pela Desembargadora
Fátima Nancy Andrighi, e conta com a participação dos professores Ada Pellegrini
Grinover, Celso Agrícola Barbi, Humberto Theodoro Júnior, José Carlos Barbosa
Moreira, José Eduardo Carreira Alvim, Kazuo Watanabe e Sérgio Shaione Fadel,
132

levadas em consideração as inúmeras críticas e sugestões recebidas no amplo


debate.

4. Diversas são as alterações e inovações propostas neste projeto, com


profundas repercussões na simplificação e eficácia do processo civil brasileiro,
merecendo destaque:

a) O incentivo à conciliação como forma alternativa de solução do conflito,


inclusive com a previsão da audiência preliminar de conciliação quando a lide versar
direitos disponíveis (arts. 125, V e 331);

b) O estímulo nos modernos métodos de documentação recomendados pela


atual tecnologia (art. 170);

c) A solução tormentosa e antiga polêmica sobre a necessidade ou não da


participação do cônjuge, como autor e réu, nas ações possessórias (art. 10);

d) A dispensa do reconhecimento de firma na procuração outorgada ao


advogado (art. 38);

e) A adoção do litisconsórcio facultativo recusável, recomendada pela doutrina


por força de situações práticas típicas de conflitos hoje verificados na sociedade de
massa em que vivemos (art. 46);

f) A dispensa de despacho judicial de atos meramente ordinários (art. 162, §


4º);

g) A dispensa de atos processuais até às 20:00 horas (art. 172);

h) A introdução do instituto da antecipação da tutela, cercado das necessárias


cautelas 9art. 273), na linha do que se adotou na Lei nº. 8.245/91;

i) A sistemática para tornar mais eficaz o cumprimento de obrigações de fazer


ou não fazer, determinando ao juiz a observância da tutela específica e de
providências que assegurem o resultado prático equivalente ao do adimplemento,
com possibilidade de liminar fundamentada e de imposição de multa ao réu (art.
461);

j) A definição de competência do tribunal para o conhecimento de medida


cautelar, após a interposição do recurso (art. 800, parágrafo único);
133

l) A substituição da medida cautelar pela prestação de caução ou de outra


garantia menos gravosa, desde que eficaz (art. 805);

m) A melhor disciplina do instituto da litigância de má-fé (art. 18), dos honorários


advocatícios na execução (art. 20), dos honorários do perito (art. 33), da renúncia ao
mandato (art. 45), da interrupção da prescrição (art. 239, parágrafo único, III), do
procedimento relativo ao indeferimento da petição inicial e atos subseqüentes (art.
296) e da documentação para a prova pericial (art. 471).

5. Essas as diretrizes que norteiam a elaboração do projeto de lei que tenho


a honra de oferecer ao descortino de Vossa Excelência.

Atenciosamente,

MAURÍCIO CORREA

Ministro da Justiça
134

ANEXO C – PROJETO DE LEI QUE MODIFICOU A TUTELA ANTECIPADA

PROJETO DE LEI DA CÂMARA Nº 3.476, DE 2000

(Do Poder Executivo)

MENSSAGEM Nº. 255/93

Altera os dispositivos do Código de Processo Civil


sobre o processo de conhecimento e o processo
cautelar.

(À COMISSÃO DE CONSTITUIÇÃO E JUSTIÇA E


DE REDAÇÃO – ART. 24, II).

O Congresso Nacional decreta:

Art. 1º Os artigos da Lei no 5.869, de 11 de janeiro de 1973 - Código de


Processo Civil, a seguir mencionados, passam a vigorar com as seguintes
alterações:

"Art.273. ..........................................................................

..........................................................................

§ 3º A efetivação da tutela antecipada observará, no que


couber e conforme sua natureza, as normas previstas nos arts. 588, 461,
§§ 4o e 5o, e 461-A.

..........................................................................

º A tutela antecipada também poderá ser concedida quando um


ou mais dos pedidos cumulados, ou parcela deles, mostrar-se
incontroverso.

§ 7º Se o autor, a título de antecipação de tutela, requerer


providência de natureza cautelar, poderá o juiz, quando presentes os
respectivos pressupostos, deferir a medida cautelar em caráter incidental
do processo ajuizado." (NR)

"Art. 275. ..........................................................................


135

I - nas causas cujo valor não exceda a 60 (sessenta) vezes o


valor do salário mínimo;

..........................................................................NR)

"Art. 280. No procedimento sumário não são admissíveis a


ação declaratória incidental e a intervenção de terceiros, salvo a
assistência, o recurso de terceiro prejudicado e a intervenção fundada em
contrato de seguro."(NR)

"Art. 287. Se o autor pedir que seja imposta ao réu a


abstenção da prática de algum ato, tolerar alguma atividade, prestar ato
ou entregar coisa, poderá requerer cominação de pena pecuniária para o
caso de descumprimento da sentença ou da decisão antecipatória de
tutela (arts. 461, § 4o, e 461-A)." (NR)

"Art. 331. Se não ocorrer qualquer das hipóteses previstas nas


seções precedentes, e versar a causa sobre direitos que admitam
transação, o juiz designará audiência preliminar, a realizar-se no prazo de
30 (trinta) dias, para a qual serão as partes intimadas a comparecer,
podendo fazer-se representar por procurador ou preposto, com poderes
para transigir.

..........................................................................

§ 3o Se o direito em litígio não admitir transação, ou se as


circunstâncias da causa evidenciarem ser improvável sua obtenção, o juiz
poderá, desde logo, sanear o processo e ordenar a produção da prova,
nos termos do § 2o." (NR)

"Art. 461. ..........................................................................

..........................................................................

§ 5o Para a efetivação da tutela específica ou a obtenção do


resultado prático equivalente, poderá o juiz, de ofício ou a requerimento,
determinar as medidas necessárias, tais como a imposição de multa por
tempo de atraso, busca e apreensão, remoção de pessoas e coisas,
desfazimento de obras e impedimento de atividade nociva, se necessário
com requisição de força policial.
136

§ 6o O juiz poderá, de ofício, modificar o valor ou a


periodicidade da multa, caso verifique que se tornou insuficiente ou
excessiva." (NR)

"Art. 588. A execução provisória da sentença far-se-á do


mesmo modo que a definitiva, observadas as seguintes normas:

I - corre por conta e responsabilidade do exeqüente, que se


obriga, se a sentença for reformada, a reparar os prejuízos que o
executado venha a sofrer;

II - o levantamento de depósito em dinheiro, e a prática de atos


que importem alienação de domínio ou dos quais possa resultar grave
dano ao executado, dependem de caução idônea, requerida e prestada
nos próprios autos da execução;

III - fica sem efeito, sobrevindo acórdão que modifique ou anule


a sentença objeto da execução, restituindo-se as partes ao estado
anterior;

IV - eventuais prejuízos serão liquidados no mesmo processo.

§ 1o No caso do inciso III, se a sentença provisoriamente


executada for modificada ou anulada apenas em parte, somente nessa
parte ficará sem efeito a execução.

§ 2o A caução pode ser dispensada nos casos de crédito de


natureza alimentar, até o limite de 60 (sessenta) vezes o salário mínimo,
quando o exeqüente se encontrar em estado de necessidade." (NR)

"Art. 604. ..........................................................................

§ 1o Quando a elaboração da memória do cálculo depender de


dados existentes em poder do devedor ou de terceiro, o juiz, a
requerimento do credor, poderá requisitá-los, fixando prazo de até 30
(trinta) dias para o cumprimento da diligência; se os dados não forem,
injustificadamente, apresentados pelo devedor, reputar-se-ão corretos os
cálculos apresentados pelo credor e a resistência do terceiro será
considerada desobediência.
137

§ 2o Poderá o juiz, antes de determinar a citação, valer-se do


contador do juízo quando a memória apresentada pelo credor
aparentemente exceder os limites da decisão exeqüenda e, ainda, nos
casos de assistência judiciária. Se o credor não concordar com esse
demonstrativo, far-se-á a execução pelo valor originariamente pretendido,
mas a penhora terá por base o valor encontrado pelo contador."(NR)

"Art. 621. O devedor de obrigação de entrega de coisa certa,


constante de título executivo extrajudicial, será citado para, dentro de 10
(dez) dias, satisfazer a obrigação ou, seguro o juízo (art. 737, II),
apresentar embargos.

Parágrafo único. O juiz, ao despachar a inicial, poderá fixar


multa por dia de atraso no cumprimento da obrigação, ficando o
respectivo valor sujeito a alteração, caso se revele insuficiente ou
excessivo."(NR)

"Art. 624. Se o executado entregar a coisa, lavrar-se-á o


respectivo termo e dar-se-á por finda a execução, salvo se esta tiver de
prosseguir para o pagamento de frutos ou ressarcimento de
prejuízos."(NR)

"Art. 627. ..........................................................................

§ 1o Não constando do título o valor da coisa, ou sendo


impossível a sua avaliação, o exeqüente far-lhe-á a estimativa,
sujeitando-se ao arbitramento judicial.

§ 2o Serão apurados em liquidação o valor da coisa e os


prejuízos."(NR)

"Art. 644. A sentença relativa a obrigação de fazer ou não fazer


cumpre-se de acordo com o art. 461, observando-se, subsidiariamente, o
disposto neste Capítulo."(NR)

"Art. 659. ..........................................................................

..........................................................................

§ 4o A penhora de bens imóveis realizar-se-á mediante auto ou


termo de penhora, cabendo ao exeqüente, sem prejuízo da imediata
138

intimação do executado (art. 669), providenciar, para presunção absoluta


de conhecimento por terceiros, o respectivo registro no ofício imobiliário,
mediante apresentação de certidão de inteiro teor do ato e
independentemente de mandado judicial.

§ 5o Nos casos do § 4o, quando apresentada certidão da


respectiva matrícula, a penhora de imóveis, independentemente de onde
se localizem, será realizada por termo nos autos, do qual será intimado o
executado, pessoalmente ou na pessoa de seu advogado, e por este ato
constituído depositário."(NR)

"Art. 814. ..........................................................................

Parágrafo único. Equipara-se à prova literal da dívida líquida e


certa, para efeito de concessão de arresto, a sentença, líquida ou ilíquida,
pendente de recurso, condenando o devedor ao pagamento de dinheiro
ou de prestação que em dinheiro possa converter-se."(NR)

Art. 2º A Lei no 5.869, de 11 de janeiro de 1973, passa a vigorar


acrescida do seguinte art. 461-A:

"Art. 461-A. Na ação que tenha por objeto a entrega de coisa, o juiz, ao
conceder a tutela específica, fixará o prazo para o cumprimento da obrigação.

§ 1o Tratando-se de entrega de coisa determinada pelo gênero e


quantidade, o credor a individualizará na petição inicial, se lhe couber a escolha;
cabendo ao devedor escolher, este a entregará individualizada, no prazo fixado pelo
juiz.

§ 2o Não cumprida a obrigação no prazo estabelecido, expedir-se-á em


favor do credor mandado de busca e apreensão ou de imissão na posse, conforme
se tratar de coisa móvel ou imóvel.

§ 3o Aplica-se à ação prevista neste artigo o disposto nos §§ 1o a 6o do


art. 461." (NR)

Art. 3º A Seção III do Capítulo V do Título VIII do Livro I da Lei no 5.869,


de 11 de janeiro de 1973, passa a denominar-se "Da Audiência Preliminar".
139

Art. 4º O art. 744 da Lei no 5.869, de 11 de janeiro de 1973, passa a


integrar o Capítulo III do Título III do Livro II, vigorando seu caput com a seguinte
redação:

"Art. 744. Na execução para entrega de coisa (art. 621) é lícito ao


devedor deduzir embargos de retenção por benfeitorias.

..........................................................................NR)

Art. 5º Esta Lei entra em vigor 3 (três) meses após a data de sua
publicação.

Brasília,

JUSTIFICATIVA

Excelentíssimo Senhor Presidente da República,

Submeto à elevada consideração de Vossa Excelência o anexo Projeto


de Lei que “Altera a Lei nº. 5.869, de 11 de janeiro de 1973.. Código de Processo
Civil (sic).

1. A proposta, fruto dos trabalhos da Comissão de Alto Nível coordenada


pelos Drs. Sálvio de Figueiredo Teixeira, Diretor da Escola Nacional de Magistratura,
e Athos Gusmão Carneiro, Ministro aposentado do Superior Tribunal de Justiça,
representante pelo Instituto Brasileiro de Direito Processual pela Prfª. Ada Pellegrini
Grinover, constituída em 1991 para estudar o problema da morosidade processual e
propor soluções com vistas à simplificação do Código de Processo Civil, busca
complementar a iniciada reforma desse ordenamento codificado.

2. Para melhor elucidar as razões pelas quais ofereço ao elevado


descortino de Vossa Excelência a presente propositura, optei reproduzir o teor do
Relatório circunstanciado da referida Comissão, que bem demonstra a pertinência e
oportunidade das reformas nela contidas, nos seguintes termos:
140

“Art. 1º do Projeto – Art. 273, § 1º, § 3º e § 6º. Nesse artigo, alusivo à


antecipação dos efeitos da tutela, são sugeridas as seguintes
modificações:

k) Quanto ao § 3º, a proposta compatibiliza a “efetivação” (não se


cuida de “execução”, no sentido processual) da tutela antecipada com as
alterações sugeridas para o art. 588, relativo à execução provisória da
sentença, e com as técnicas de efetivação de tutela específica previstas
no art. 461, §§4º e 5º e 461-A;

l) É acrescentado, como § 6º, dispositivo sugerido por Luiz


Guilherme Marinoni, que explicita a possibilidade de o juiz, nos casos em
que uma parte do pedido ou dos pedidos se torne incontroversa, conceder
desde logo a esse respeito a tutela antecipada. Esta sugestão apresenta-
se consentânea com as preocupações de eficiência do ‘novo’ processo
civil;

m) A redação proposta para o § 7º atende ao princípio da economia


processual, com a adoção da fungibilidade do procedimento, evitando à
parte a necessidade de requerer, em novo processo, medida cautelar
adequada ao caso [...]”;

3. Estas, Senhor Presidente, as normas que integram a presente proposta


e que, se aceitas, hão de constituir importante passo para a reformulação do Direito
Processual Civil, assegurando uma prestação jurisdicional mais célere e eficaz.

Respeitosamente, - José Gregori, Ministro e Estado da Justiça.

Aviso nº. 1.350 – C. Civil.

Em 18 de agosto de 2000.
141

ANEXO D – PROJETO DE LEI QUE TRAMITA NO CONGRESSO NACIONAL


PARA MODIFICAR A TUTELA ANTECIPADA

PROJETO DE LEI DO SENADO Nº 186, DE 2005

Modifica os §§ 4º e 5º do art. 273, e acrescenta os


arts. 273-A, 273-B, 273-C e 273-D à Lei nº 5.869,
de 11 de janeiro de 1973 (Código de Processo
Civil), para permitir a estabilização da tutela
antecipada.

Art. 1º Dê-se aos §§ 4º e 5º do art. 273 da Lei nº 5.869, de 11 de janeiro


de 1973 (Código de Processo Civil), a seguinte redação:

“Art. 273 ...........................................................................

§ 4º A tutela antecipada poderá ser revogada ou modificada,


fundamentadamente, enquanto não se produza a preclusão da decisão
que a concedeu (§1° do art. 273-B e art. 273- C).

§ 5º Na hipótese do inciso I deste artigo, o juiz só concederá a


tutela antecipada sem ouvir a parte contrária em caso de extrema
urgência ou quando verificar que o réu, citado, poderá torná-la ineficaz.

..................................................................................(NR)”.

Art. 2º A Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973 (Código de Processo Civil), passa


vigorar acrescida dos seguintes arts. 273-A, 273-B, 273-C, 273-D:

“Art. 273-A A antecipação de tutela poderá ser requerida em


procedimento antecedente ou na pendência do processo”.

“Art. 273-B Aplicam-se ao procedimento previsto no art. 273-A,


no que couber, as disposições do Livro III, Título único, Capítulo I deste
Código.
142

§ 1º Preclusa a decisão que concedeu a tutela antecipada, é


facultado, no prazo de 60 (sessenta) dias:

a) ao réu, propor demanda que vise à sentença de mérito;

b) ao autor, em caso de antecipação parcial, propor demanda


que vise à satisfação integral da pretensão.

§ 2º Não intentada a ação, a medida antecipatória adquirirá


força de coisa julgada nos limites da decisão proferida”.

“Art. 273-C Preclusa a decisão que concedeu a tutela


antecipada no curso do processo, é facultado à parte interessada
requerer seu prosseguimento, no prazo de 30 (trinta) dias, objetivando o
julgamento de mérito.

Parágrafo único. Não pleiteado o prosseguimento do processo,


a medida antecipatória adquirirá força de coisa julgada nos limites da
decisão proferida”.

“Art. 273-D Proposta a demanda (§ 1° do art. 273-B) ou


retomado o curso do processo (art. 273-C), sua eventual extinção, sem
julgamento do mérito, não ocasionará a ineficácia da medida
antecipatória, ressalvada a carência da ação, se incompatíveis as
decisões.”

Art. 3º Esta lei entrará em vigor três meses após a data de sua
publicação.

JUSTIFICATIVA

Elaborada pelo Instituto Brasileiro de Direito Processual (IBDP), e a


nós encaminhada por sua presidenta, Professora Ada Pellegrini Grinover, a proposta
de estabilização da tutela antecipada procura, em síntese, tornar definitivo e
suficiente o comando estabelecido por ocasião da decisão antecipatória. Não
importa se se trata de antecipação total ou parcial. O que se pretende, por razões
143

eminentemente pragmáticas – mas não destituídas de embasamento teórico – é


deixar que as próprias partes decidam sobre a conveniência, ou não, da instauração
ou do prosseguimento da demanda e sua definição em termos tradicionais, com
atividades instrutórias das partes, cognição plena e exauriente do juiz e a
correspondente sentença de mérito.

Se o ponto definido na decisão antecipatória é o que as partes


efetivamente pretendiam e deixam isso claro por meio de atitude omissiva
consistente em não propor a demanda que vise à sentença de mérito (em se
tratando de antecipação em procedimento antecedente) ou em não requerer o
prosseguimento do processo (quando a antecipação é concedida no curso deste,
tem-se por solucionado o conflito existente entre as partes, ficando coberta pela
coisa julgada a decisão antecipatória, observados os seus limites.

A existência, no passado, de “cautelar satisfativa” é dado revelador de


que o procedimento antecipatório antecedente será de grande utilidade. Aliás, Kazuo
Watanabe já havia defendido a existência da ação de cognição sumária autônoma
(Da cognição no processo civil, Cebepej, São Paulo, 2ª ed., pp. 139-142), o que vem
em apoio da proposta que torna auto-suficiente o procedimento antecedente na
hipótese de preclusão da decisão antecipatória de tutela.

Por outro lado, não pode surpreender a observação de que os


provimentos antecipatórios são, substancialmente, provimentos monitórios.
Salientou-o oportunamente Edoardo Ricci, em alentado estudo em que examinou a
tutela antecipatória brasileira, preconizando sua estabilização (A tutela antecipatória
brasileira vista por um italiano, in Revista de Direito Processual, Gênesis, setembro-
dezembro de 1997, p. 691 ss.). Os pressupostos da monitória e da antecipação
podem ser diversos, mas análoga deve ser a eficácia. E Ovídio Baptista da Silva,
antes mesmo da adoção da ação monitória pelo ordenamento brasileiro, considerou
expressamente as liminares antecipatórias como modalidade de processo monitório
genérico (A antecipação da tutela na recente reforma processual, in Reforma do
CPC, coord. Sálvio de Figueiredo Teixeira, Saraiva, São Paulo, 1996, n. 8).

No sistema pátrio, o mandado monitório não impugnado estabiliza a tutela


diferenciada. Simetricamente, a mesma coisa deve ocorrer com a decisão
antecipatória com a qual as partes se satisfazem, considerando pacificado o conflito:
as partes, e não apenas o demandado, porquanto a antecipação da tutela pode ser
144

parcial, podendo neste caso também o autor ter interesse na instauração ou


prosseguimento da ação de conhecimento. Assim, a instauração ou o
prosseguimento da demanda são considerados ônus do demandado e, em caso de
antecipação parcial, do demandante, sendo a conduta omissiva seguro indício de
que não há mais necessidade da sentença de mérito.

Por outro lado, se a demanda que visa à sentença for intentada ou


prosseguir, a extinção do processo sem julgamento do mérito não tem o condão de
tornar ineficaz a medida antecipatória, que prevalece, ressalvada a hipótese de
carência da ação, se incompatíveis as decisões.

Lembre-se, por oportuno, que o direito italiano vigente já contempla a


possibilidade de estabilização dos provimentos de urgência em diversas
disposições, como o art. 186 “ter” e “quater” CPC e o art. 423, 2º “comma”, CPC
(este último, em matéria de processo do trabalho). E, segundo afirma Ricci, a
sobrevivência da eficácia executiva dos provimentos de urgência à extinção do
processo vem sendo afirmada pela doutrina, em via de interpretação sistemática,
mesmo fora dos casos expressamente previstos (op. e loc. cit.). Agora, o decreto
legislativo nº 5, de 17 de janeiro de 2003 (que entrou em vigor a primeiro de janeiro
de 2004), regulando o processo societário, adota exatamente o mesmo modelo no
art. 23.

Sala das Sessões,

Senador ANTERO PAES DE BARROS

Publicado no Diário do Senado Federal de 25 - 05 - 2005


145

ANEXO E – PROJETO DE LEI QUE TRAMITA NO CONGRESSO PARA


MODIFICAR A TUTELA CAUTELAR

PROJETO DE LEI DO SENADO Nº 20, DE 2006

Acrescenta parágrafo único ao art. 796 da Lei nº


5.869, de 11 de janeiro de 1973 (Código de
Processo Civil), para permitir a estabilização da
tutela antecipada.

Art. 1º O art. 796 da Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973 (Código de


Processo Civil), passa a vigorar acrescido do seguinte parágrafo único:

“Art. 796 ...........................................................................

Parágrafo único. É dispensado o processo principal no


procedimento cautelar que vise a obter tutela de urgência satisfativa”.

Art. 2º Esta lei entra em vigor noventa dias após a data de sua
publicação.

JUSTIFICATIVA

A re-leitura do Processo Cautelar, compreendido nos arts. 796 a 889, do


Código de Processo Civil (CPC), tem alicerçado significativa jurisprudência favorável
à desnecessidade de ajuizamento de ação principal, quando já se encontre em
curso pretensão do autor em pedido de tutela de urgência satisfativa.

Essas decisões jurisprudenciais tem levado em consideração que a tutela


de urgência satisfativa, na prática, é aquela capaz de esgotar o próprio mérito da
pretensão, e o ajuizamento de ação principal, nesses casos, limita-se a atender
formalismo desprovido de essencialidade, condição que causa prejuízo ao autor, ao
réu e ao Estafo; aos dois primeiros, è míngua de conteúdo, porque são levados a
repetir, no processo principal, as razões apresentadas na cautelar; e ao Estado,
146

porque o grande número de processos que o Poder Judiciário enfrenta não se


coaduna com o dever de reexaminar argumentos na mesma instância.

Esclareça-se que as medidas cautelares mão se confundem com a


antecipação parcial ou integral da prestação jurisdicional de mérito, de que trata o
art. 273 do CPC. Antecipação de tutela é medida que integra o Processo de
Conhecimento (Livro I, do CPC), tem por fundamento a verossimilhança das
alegações do autor e por objetivo preservar as condições materiais da causa, até
que se torne possível exarar sentença. Medidas cautelares, por sua vez, destinam-
se a prevenir dano iminente e irreparável, estão elencadas no Processo Cautelar
(Livro III, do CPC) e sua concessão é condicionada à demonstração da existência de
fumaça do bom direito (fumus boni juris) e perigo da demora da prestação
jurisdicional (periculum in mora).

Ao considerar essa diferença entre os institutos, Nelson Nery Jr. e Rosa


Maria de Andrade Nery acentuam, com base na jurisprudência do Superior Tribunal
de Justiça (STJ), que “A antecipação da tutela serve para adiantar, no todo ou em
parte, os efeitos pretendidos com a sentença de mérito a ser proferida ao final. Já a
cautelar visa a garantir o resultado útil do processo principal. Enquanto o pedido de
antecipação de tutela pode ser formulado na própria petição inicial da ação principal,
a medida cautelar deve ser pleiteada em ação separada, sendo vedada a cumulação
dos pedidos principal e cautelar num único processo, conforme decisão proferida
pelo Superior Tribunal de Justiça” (STJ, 2ª Turma, Resp. 60.607-SP, Rel. Min.
Adhemar Maciel, 4/9/97, DJU 6/10/97, P. 49.929).

Certo é que, em diversas hipóteses, o acolhimento da cautelar, pelo


magistrado, põe fim à lide, desde logo, e torna inócua a superveniência de ação
principal, razão pela qual os operadores de direito cunharam a expressão cautelar
satisfativa, malgrado a impropriedade dessa nomenclatura, pois a satisfatividade, a
rigor, deve ser inerente ao mérito. De qualquer modo, o direito pré-existente, por ser
dependente de medida cautelar, para ser restabelecido, dispensa o ajuizamento de
processo principal.

Ilustra essa orientação a decisão proferida pelo Tribunal de Justiça do


Distrito Federal e Territórios, com a seguinte ementa:
147

“Busca e apreensão de menor, mantido em poder do pai, tendo sido a


guarda deferida à mãe. A mãe não precisa de nenhuma ação de
conhecimento, já que seu direito se encontra certificado, pelo que ela se
limita a requerer um provimento cautelar que, liminarmente, ou apenas
sumariamente, restabelecerá o estado das coisas”.
(TJDFT, AGI 2004.00.2.009070-5, Rel. José Divino de Oliveira; DJU
07.06.2005, P. 176, Ac´rdão nº 214.650).

Na mesma linha, a jurisprudência acolhe, em medida cautelar, pedidos de


concessão de alimentos provisionais, pois a única finalidade da prestação de
alimentos é manter vivo o alimentando.

Mas o tema não se limita á prestação de alimentos e guarda de menores.


O professor Humberto Theodoro cita Carnelutti (in Processo Cautela. Edição
Universitária de Direito, 2ª ed. São Paulo, 1976, p. 47), para asseverar que a medida
cautelar satisfativa é cabível sempre que há: a) impedimento à provável mutação da
situação (sequestro, antecipação de prova, exibição de documentos etc.); b)
eliminação de mutação já ocorrida na esfera fática (atentado, busca e apreensão
etc.); e c) antecipação provável ou possível mutação da situação (alimentos
provisionais, guarda provisória de filhos, separação de corpos etc.).

Evidentemente, pois, que a doutrina e a jurisprudência estão a requerer a


atualização do texto da lei, para que se dispense o ajuizamento de ação principal
nas hipóteses em que o processo cautelar vise a obter resultado de natureza
satisfativa.

Contamos, pois, com o apoio dos ilustres Parcs para a répida aprovação
desta proposição.

Sala da Comissão, em 25 de janeiro de 2006.

Senador João Alberto Souza

Publicado no Diário do Senado Federal de 26 – 01 – 2006.


148

ANEXO F – PARECER CA CCJ DO SENADO SOBRE O PROJETO DE LEI QUE


PRETENDE MODIFICAR A TUTELA CAUTELAR

PARECER Nº , DE 2009

Da COMISSÃO DE CONSTITUIÇÃO, JUSTIÇA E


CIDADANIA, em decisão terminativa, sobre o Projeto
de Lei do Senado nº 20, de 2006, de autoria do
Senador João Alberto Souza, que “acrescenta
parágrafo único ao art. 796 da Lei nº 5.869, de 11 de
janeiro de 1973 (Código de Processo Civil), para
dispensar o processo principal no procedimento
cautelar de natureza satisfativa”.

RELATOR: Senador RAIMUNDO COLOMBO

I – RELATÓRIO

Submete-se a decisão terminativa desta Comissão o Projeto de Lei do


Senado nº 20, de 2006, de autoria do ilustre Senador JOÃO ALBERTO SOUZA, no
sentido de dispensar o processo principal na hipótese de o processo cautelar
apresentar natureza satisfativa.

Em sua justificação, pondera o eminente autor que o processo cautelar,


disciplinado pelos arts. 796 a 889 do Código de Processo Civil, tem carreado
jurisprudência favorável à desnecessidade de ajuizamento da ação principal, quando
já satisfeita a pretensão do autor, em pedido de tutela de urgência.

De fato, a tutela de urgência satisfativa, segundo a jurisprudência, é


aquela capaz de esgotar o mérito da pretensão, e o ajuizamento de ação principal
limita-se a atender formalismo desprovido de essencialidade, condição que causa
prejuízos ao autor, ao réu e ao Estado.

A antecipação parcial ou integral da prestação jurisdicional de mérito,


prevista no art. 173 do Código de Processo Civil, integra o processo de
conhecimento e tem por fundamento a verossimilhança das alegações do autor e
por objetivo preservar as condições materiais da causa, até que seja possível exarar
a sentença.
149

As medidas cautelares destinam-se a prevenir dano iminente e


irremediável e estão previstas e elencadas no processo cautelar, e a sua concessão
está condicionada à demonstração da existência de fumaça do bom direito (fumus
boni juris) e ao perigo da demora da prestação jurisdicional (periculum in mora).

Examinando-se várias hipóteses, verifica-se que o acolhimento da


cautelar é capaz de pôr fim à lide, desde logo, e torna inócua a superveniência da
ação principal, razão pela qual foi cunhada a expressão “cautelar satisfativa”,
quando o direito preexistente, dependente de medida cautelar para ser
restabelecido, dispensa o ajuizamento de processo principal.

Inúmeras são as hipóteses em que a medida cautelar satisfativa é


cabível, tais como: busca e apreensão de menor em poder de outrem que não seja o
titular da guarda já deferida; impedimento à modificação do estado das coisas:
seqüestro, antecipação de prova, exibição de documentos, etc.; alimentos
provisionais, separação de corpos, dentre outros.

II – ANÁLISE

O PLS nº 20, de 2006, não apresenta vício de regimentalidade. Com


efeito, nos termos do art. 101, incisos I e II, alínea d, do Regimento Interno do
Senado Federal, cabe à Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania opinar sobre
a constitucionalidade e juridicidade das questões que lhe são submetidas e, no
mérito, emitir parecer sobre matéria afeta ao direito processual.

A proposta em exame encontra-se lavrada em boa técnica legislativa,


dentro dos critérios e requisitos impostos pela Lei Complementar nº 95, de 26 de
fevereiro de 1998, bem atende aos requisitos constitucionais e é dotada de
juridicidade e de regimentalidade.

No mérito, realmente existe a necessidade da atualização do texto legal,


para que seja dispensado o ajuizamento da ação principal, nas hipóteses em que o
processo cautelar vise a obtenção de resultado de natureza satisfativa.

III – VOTO
150

Em face de todo o exposto, somos pela aprovação do Projeto de Lei do


Senado nº 20, de 2006.

Sala da Comissão,

, Presidente

, Relator

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