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RESUMO
A nova versão da série de normas ISO 9000 trouxe mudanças significativas em relação à versão 1994,
com maior enfoque na melhoria contínua, abordagem por processos e abordagem sistêmica. Dentre as
principais mudanças, um item foi criado e refere-se à medição e monitoramento de clientes, produtos,
processos e do próprio sistema de qualidade, de forma a buscar a melhoria contínua de todo o sistema.
O uso de indicadores é uma das formas de se medir e avaliar a qualidade de produtos, processos e
clientes. Procura-se discutir neste trabalho alguns aspectos relacionados com a medição de
desempenho por meio de indicadores em empresas construtoras e incorporadoras de edifícios,
destacando os principais problemas relacionados com a medição dos indicadores e tendências para
melhor utilização desses indicadores.
Palavras-Chave: indicadores, ISO 9000, qualidade, construção civil.
1. INTRODUÇÃO
A nova versão da série de normas ISO 9000 trouxe mudanças significativas em relação à versão 1994,
com maior enfoque na melhoria contínua, abordagem por processos e abordagem sistêmica. Dentre as
principais mudanças, um item foi criado e refere-se à medição e monitoramento de clientes, produtos,
processos e do próprio sistema de qualidade.
A partir da revisão da norma em 2000, passou-se a considerar a medição de desempenho como parte
integrante do sistema de gestão da qualidade. E a partir do monitoramento de processos, produtos e
serviços e da satisfação dos consumidores é que se pode buscar a melhoria contínua do sistema.
O uso de indicadores é uma das formas de se medir e avaliar a qualidade de produtos, processos e
clientes. No entanto, o uso de um sistema de indicadores requer uma estruturação dos indicadores, da
forma de coleta, processamento e análise, da mão-de-obra e utilização dos resultados.
É apresentado um estudo de caso que envolve a aplicação do item 8 da norma ISO 9001:2000 -
Medição, Análise e Melhoria - e o sistema de indicadores de desempenho em uma empresa construtora
e incorporadora localizada na cidade de São Paulo.
Procura-se discutir neste trabalho alguns aspectos relacionados com a medição de desempenho por
meio de indicadores em empresas construtoras e incorporadoras de edifícios, destacando os principais
problemas relacionados com a medição dos indicadores e tendências para melhor utilização desses
indicadores.
2. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA
Responsabilidade
CLIENTE
da administração CLIENTE
Medição
Satisfação
Gestão de
análise e
recursos
melhoria
Requisitos
Legenda:
Atividades que agregam valor
Fluxo de informação
Figura 1: Modelo de abordagem por processos da ISO versão 2000 (NBR ISO 9000, 2000)
Na construção civil, o movimento da qualidade com as empresas se iniciou em 1994, por meio de um
programa de capacitação de empresas construtoras em gestão da qualidade voltado para pequenas e
médias empresas, resultado de uma parceria do CTE (Centro de Tecnologia de Edificações) e o
SindusCon – SP (Sindicato da Indústria da Construção Civil do estado de São Paulo). O primeiro
grupo de empresas adota do sistema proposto pelo CTE em 1995.
Em 1996, a Construtora Lacerda Chaves é a primeira empresa do segmento Edificações a ser
certificada de acordo com a ISO 9002. A partir de então, diversas empresas passaram a adotar sistemas
de gestão da qualidade de acordo com o SiQ-C do PBQP-H (Programa Brasileiro de Qualidade
Produtividade do Habitat), QualiHab da CDHU – SP (Companhia de Desenvolvimento Habitacional e
Urbano do Estado de São Paulo) e ISO 9000:1994 e depois ISO 9000:2000, motivadas por uma série
de motivos, tais como: modismo; reconhecimento do mercado; busca por vantagem competitiva;
exigência para participação em obras de concorrência pública; busca pela melhoria; entre outros.
3. ESTUDO DE CASO
Foi realizado no ano de 2003 um trabalho por meio de estudos de caso que teve como objetivo
verificar a aplicação prática da gestão da qualidade em empresas construtoras com certificação ISO
9001:2000, enfocando apenas um dos requisitos da norma que trata da medição, análise e melhoria
(item 8 da norma ISO 9001:2000). Foi realizada uma entrevista no escritório da empresa e visita a uma
das obras em andamento no momento da pesquisa.
O item 8 da norma ISO 9001:2000 – Medição, Análise e Melhoria - é composto pelos seguintes
requisitos que foram analisados na empresa visitada:
• Medição e Monitoramento:
o Satisfação dos Clientes;
o Auditoria Interna;
o Medição e Monitoramento de processos;
o Medição e Monitoramento do produto;
• Controle de Produto Não Conforme;
• Análise de Dados;
• Melhorias:
o Melhoria Contínua;
o Ação corretiva;
o Ação preventiva.
Neste artigo, será apresentada uma das empresas estudadas no trabalho realizado em 2003, analisando
a importância dos indicadores de desempenho como instrumentos essenciais de qualquer sistema de
medição, análise e melhoria – um dos principais requisitos da norma ISO 9001 lançada em 2000.
CONSELHO
DIRETOR
Comitê da Qualidade
e R.A.
DIRETOR DIRETOR
DIRETOR
SUPRIMENTOS/ TÉCNICO/
COMERCIAL
RECEBÍVEIS ADMINISTRATIVO
CONTABILIDADE
GERENTE
JURÍDICO
SUPRIMENTOS
COMERCIAL
COORD.
COMPRAS ORÇAMENTO E
E NOVOS PLANEJAMENTO
PROJETOS
SUPRIMENTOS
PROJETOS TÉCNICO
A partir das respostas e observações obtidas do estudo de caso e de acordo com os requisitos do item 8
da norma ISO 9001, as informações foram estruturadas em três partes: Avaliação da satisfação dos
clientes, não conformidades e análise de dados; Avaliação dos processos/produtos, não conformidades,
análise de dados e melhoria; e Auditoria interna.
a) Avaliação da Satisfação dos Clientes, Não Conformidades e Análise de Dados
O objetivo deste item é descrever a avaliação da satisfação dos clientes quanto ao atendimento e à
qualidade do produto, bem como retroalimentar o Sistema de Gestão da Qualidade. A empresa dispõe
de um serviço de SAC (Serviço de Atendimento ao Cliente) através de telefone, fax e e-mail.
A avaliação da satisfação dos clientes externos é realizada em dois momentos. O primeiro retrata a
satisfação do cliente desde o momento da compra até a entrega do imóvel, indicando como o cliente
foi atendido no processo de venda do apartamento e fechamento do contrato, sendo realizado durante a
entrega das chaves, após a vistoria do apartamento. Neste momento, o proprietário assina um “termo
de aceite” do imóvel. As informações são registradas em um questionário de satisfação, denominado
pela empresa de “Q1”.
O segundo momento ocorre após a entrega do imóvel, realizado cerca de seis a sete meses de
ocupação do apartamento, durante seu uso. Essas informações são registradas em um outro
questionário de satisfação do cliente, denominado “Q2”. Caso o apartamento apresente algum tipo de
problema em relação à qualidade dos materiais, resistência estrutural ou processo construtivo, as
informações são repassadas ao SAC para que sejam tomadas as devidas providências.
O SAC reúne as informações dos questionários “Q1” e “Q2” em um relatório que é enviado para a
R.A. (Representante da Administração e responsável por liderar o sistema de gestão da qualidade),
para que sejam tomadas as ações preventivas/corretivas pertinentes nos atuais e futuros
empreendimentos.
O serviço de assistência técnica pós-entrega é realizado por uma equipe de manutenção da própria
empresa, resultado das chamadas de problemas nos imóveis solicitadas pelos clientes através do SAC
e analisadas pelo supervisor de manutenção, que entra em contato com o cliente para agendar uma
vistoria.
Duas situações podem ocorrer. Se for detectado que o problema não é de responsabilidade da empresa,
como por exemplo, por mau uso do imóvel, o supervisor entrega um relatório para o cliente com as
razões técnicas observadas. Tanto a solicitação do cliente quanto a resposta técnica são arquivadas.
Caso a solicitação do cliente seja procedente, o supervisor de manutenção faz uma programação das
atividades, preenchendo o relatório de assistência técnica e designando uma equipe responsável pelo
serviço. Após a execução do serviço, o “Termo de Recebimento dos Serviços” constante no relatório é
preenchido e assinado pelo proprietário.
Semestralmente, o SAC analisa os relatórios de todas as obras e emite um “Relatório de Assistência
Técnica Global”, levantando as principais ocorrências no período e analisando estatisticamente a
incidência de falhas.
b) Avaliação dos Processos / Produtos, Não Conformidades, Análise de Dados e Melhoria
Em relação aos processos e produtos durante o processo de produção, existem dois procedimentos,
sendo um para avaliar os materiais e outro para os serviços de execução.
O processo para avaliar os materiais que são entregues em obra é realizado com o auxílio de um
formulário denominado F.V.M. (Ficha de Verificação de Materiais), no qual são identificados o
fornecedor/fabricante, a data, os ensaios, o número das notas fiscais, aprovação do material,
responsável pelo recebimento, os itens a serem inspecionados e os critérios de aceitação/tolerâncias
para cada amostra de material que é controlado (30 ao todo), em um determinado empreendimento.
Também existe um campo para avaliar o prazo e o atendimento do fornecedor.
Em relação aos serviços executados em obra, existe um formulário denominado F.V.S. (Ficha de
Verificação do Serviço) para cada serviço controlado (25 ao todo), onde são identificados o local de
inspeção, a obra, o serviço, as datas de abertura e fechamento, descrevendo os itens que devem ser
inspecionados, os métodos de verificação, tolerâncias e campos para indicar a aprovação ou
reprovação. Caso haja problemas, existe um campo para descrever esses problemas e indicar a solução
adotada, seguindo-se de uma nova inspeção.
Com relação à implementação do processo de melhoria, a empresa dispõe de um formulário
denominado P.A. (Plano de Ação), que apresenta os seguintes campos para serem preenchidos: tipo de
ação (corretiva, preventiva, melhoria ou imediata), data, departamento/obra, a não-conformidade
encontrada e a ação imediata tomada, necessidade de uma ação corretiva (sim ou não), estudo
detalhado da causa, detalhamento da ação para correção da causa, acompanhamento da ação
(verificação da implantação, eliminação das causas e resultados da melhoria), a eficácia da ação,
responsável pela ação.
Segundo a R.A. (representante da administração) da empresa, as ações de melhorias são difíceis de
serem registradas, pois muitas ações que são implementadas em um empreendimento são pontuais e
não são encaradas como medidas de melhoria pela equipe de produção, não retroalimentando o
sistema de gestão da qualidade como um todo.
A empresa dispõe de um checklist interno aplicado nas edificações e constitui um instrumento
utilizado para detectar não-conformidades e atestar que todos os requisitos de qualidade do produto
final foram atendidos. Esse procedimento é realizado pelos próprios engenheiros que visitam obras uns
dos outros.
c) Auditoria Interna
No momento da pesquisa, existiam 8 (oito) pessoas na empresa que haviam concluído o curso de
auditor interno realizado pela mesma empresa de consultoria que orientou a implantação do sistema da
qualidade, dentre as quais apenas 5 (cinco) delas tornaram-se auditores internos oficiais (dois
engenheiros e dois arquitetos), além do diretor técnico que não participa efetivamente das auditorias.
As auditorias externas são realizadas a cada seis meses, e são intercaladas com as auditorias internas.
A Figura 3 ilustra o cronograma de auditorias da empresa no ano de 2003, intercalando uma externa
com uma interna a cada seis meses. A auditoria externa realizada em março de 2003 conferiu à
empresa a certificação segundo a norma ISO 9001:2000.
Ano 2003
Março Junho Setembro Dezembro Março/2004
Como exemplo, segundo a R.A. (representante da administração) da empresa, existe um indicador que
mostra o número de unidades vendidas e outro o retorno financeiro de cada empreendimento. Um fato
muito comum que vinha ocorrendo no momento da pesquisa é que os corretores contratados, externos
à empresa, usam suas habilidades e competências para vender as unidades de um empreendimento,
recebendo a porcentagem sobre as vendas e atingindo um ótimo indicador frente à empresa,
encerrando deste modo seu compromisso com a empresa.
Porém, algum tempo depois, ocorreu em um determinado empreendimento que metade dos clientes
que compraram apartamentos desistiram do imóvel por não apresentarem capacidade de pagamento,
provavelmente devido à falta de esclarecimentos mais detalhados ou omissão de informações durante a
venda. Ou seja, não existe ainda na empresa um sistema que estabeleça relações entre os indicadores
de modo que a empresa possa identificar, monitorar e controlar de forma eficiente e eficaz o
desempenho de seu negócio. Uma possível solução seria integrar um conjunto de indicadores como:
unidades inicialmente vendidas (velocidade de vendas), unidades efetivamente vendidas (retorno
financeiro) e índice de inadimplência (incapacidade de pagamento, insatisfação, desinformação).
Partindo-se para uma análise mais detalhada do sistema de indicadores da empresa estudada,
observam-se os seguintes aspectos:
• o sistema atual de indicadores atual é o mesmo que foi proposto pela empresa de consultoria
que conduziu o processo de implantação do sistema de qualidade;
• alguns indicadores são difíceis de coletar, processar e analisar – apresentando-se como
elementos meramente figurativos;
• apesar de haver interesse na melhoria do sistema de indicadores atual, não há ainda uma
preocupação efetiva com a estruturação de um sistema de indicadores que realmente seja
adequado à empresa, de acordo com suas estratégias, tecnologias, recursos humanos e
financeiros;
• o valor de um indicador não expressa a realidade em determinadas situações, ou seja, o
resultado do indicador se contrapõe a determinadas soluções que são adotadas na prática;
• alguns indicadores não se justificam objetivamente enquanto ferramenta de gestão para análise
do desempenho, identificação de possíveis problemas e controle de processos;
• o valor de um indicador contradiz o valor de outro indicador – não há correlações entre eles;
• não há uma harmonia, correlação entre o sistema de indicadores e o sistema de gestão da
qualidade (SGQ), o que dificulta muitas vezes a análise e a implementação da melhoria
contínua de produtos, processos e do próprio SGQ.
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A própria natureza da indústria da construção, que trabalha ainda com uma mão-de-obra, em sua
grande maioria, terceirizada, pouco qualificada e com baixo nível de instrução, e o baixo índice de
industrialização dos componentes de construção dificultam uma coleta eficiente de dados nos canteiros
de obras e, conseqüentemente, ações de melhoria nos processos construtivos e no produto edifício.
Apesar de muitas empresas possuírem um sistema de gestão da qualidade com certificação ISO 9001
e/ou outras certificações, muitas delas enfrentam no dia-a-dia dificuldades para garantirem que o
sistema esteja “rodando”, ou seja, realmente em funcionamento adequado para que possa trazer
objetivamente os benefícios de qualidade esperados em seus produtos, processos e em relação aos seus
clientes e fornecedores.
Com relação ao estudo de caso, puderam-se notar alguns problemas e dificuldades em relação à
medição de processos e produtos. Dificuldades na coleta de dados e registro; resistência de
engenheiros de obra devido à burocracia e sobrecarga de trabalho; uso de indicadores inadequados;
falta de uma estruturação do sistema de indicadores; apenas um profissional, acúmulo de tarefas para o
responsável pelo sistema, que é quem se encarrega da coordenação do sistema, da documentação, de
visita a obras, e de auditorias, além de propor soluções e resolver problemas.
O que se pode concluir é que não se dá a real importância ao sistema de indicadores nas empresas
construtoras e incorporadoras certificadas, apesar de a medição ser um dos requisitos mais importantes
de um sistema de gestão da qualidade para assegurar que os objetivos estejam sendo cumpridos, sejam
eles para satisfação dos consumidores, controle da qualidade dos produtos e serviços, padronização de
processos, iniciativas de melhoria ou de inovação.
É necessário que as pesquisas com o uso de indicadores possam integrar o sistema de medição com o
sistema de gestão da qualidade (SGQ), de uma forma, porém, diferente de como é feito ainda hoje, em
que uma lista de indicadores é geralmente proposta pela empresa que presta consultoria na
implantação do SGQ, sem que tal conjunto de indicadores reflita as necessidades e a realidade da
organização à qual se destina.
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