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8ª CÂMARA CÍVEL.
Foram apresentadas contrarrazõesao recurso de apelação pelos autores (mov. 321.1, autos
nº 0025561-80.2015 e mov. 151.1, autos nº 0030927-03.2015), por meio das quais alegam a
inovação recursal do argumento relativo à falta de dano moral para os autores Arthur Orlando
Klas Neto, Carlos Eduardo Vianna de Souza Santos e Marcelo Rodrigo Molinari e o não
provimento do recurso.
É o relatório.
O réu sustenta de início que o autor Alexandre Dupas Pereira não possuiria interesse de agir e
também seria parte ilegítima, uma vez que não é mencionado nos trechos das conversas,
tampouco pelos portais de mídia.
Por sua vez a doutrina conceitua a legitimidade ad causam como a coincidência da posição
processual com a situação legitimadora:
Com efeito, na exordial extrai-se como fundamentos da causa de pedir que o autor Alexandre
Dupas Pereira participava do grupo cujas conversas foram divulgadas. Nesse contexto,
com a incontroversa publicidade, todas as manchetes passaram a indicar o supracitado grupo
composto por seus oito integrantes, o que demonstra a legitimidade e interesse do requerente
em se ver reparado pela violação à sua privacidade, tal como defende. Ainda é possível
verificar que num dos “print screen” reproduzido pelo réu sem a permissão do autor a menção
ao nome do mesmo, sendo que, ademais, constou quem compunha o referido grupo na
reportagem do Globo Esporte:
Portanto, o requerente demonstrou seu interesse na pretensão inicial, razão pela qual
deve ser afastada a alegação do réu.
Os autores sustentaram que criaram um grupo por meio do aplicativo “WhatsApp” denominado
“Indomáááááável F.C.” uma vez que mantinham relações com o Coritiba Foot Ball Club, sendo
apaixonados pelo time. Segundo narraram, o grupo era voltado a conversas descontraídas
sobre diversos temas, sendo que eventualmente conversavam sobre assuntos relacionados à
gestão do clube.
Sustentaram que o réu, no entanto, após sair do grupo, passou a divulgar reproduções das
telas das conversas do grupo no intuito de derrubar a direção e se auto promover.
No noticiário “Veja as conversas no WhatsApp que minaram a cúpula do Coritiba” da Gazeta do
Povo, foram divulgados os seguintes teores:
O conteúdo das mensagens também foi objeto dos seguintes noticiários anexados aos autos
(mov. 1.10 a 1.14, autos 0025561-80.2015.8.16.0001): Esporte.bandab.com.br - (a) "
Queríamos fazer um Coritiba melhor', afirma Boulos, que se licencia do Coritiba junto com
André Macias", (b) "Ricardo Guerra fala sobre conversas vazadas, desmente André Macias e
explica saída do Coritiba", (c) "Série de conversas divulgadas resulta em demissões no Coritiba
"; Parana-online.com.br - (d) "Crise na divulgação de mensagens derruba dois vices no Coxa",
(e) "Confira as mensagens de WhatsApp que resultaram na crise do Coritiba", (f) "Dirigentes do
Coritiba pedem afastamento após polêmica no WhatsApp", (g) "Os indomáveis";
Bemparana.com.br - (h) "Não há espaço para os 8 indomáveis no Coritiba ";
Globoesporte.globo.com - (i) "Rapidinhas", (j) "Bruno Kafka explica para Nadja Mauad do GE,
mais sobre 'os indomáveis", (l) "Não existe meio termo e nem perdão", (m) "A parábola do 'a
casa caiu", (n) "A parábola do 'O Indomáááááável F.C.".
Destaque-se ser incontroverso pelo réu a autoria das imagens, conforme confessado pelo
mesmo em contestação (mov. 116.1, autos nº 0025561-80.2015, e mov. 65.1, autos nº
0030927-03.2015):
“Os diálogos copiados pelo Réu não trazem qualquer informação inverídica. Até
porque os Autores nunca contestaram o conteúdo das conversas. Destaque-se
que o Réu, apesar de assumir a autoria das fotos das conversas, nunca
assumiu a responsabilidade pela divulgação junto à imprensa.”
O requerido inicialmente nega que teria repassado o conteúdo à impressa. Ocorre que ao
afirmar que as imagens que circularam na mídia são de sua autoria, não apresentou
justificativa plausível para que justamente essas mesmas imagens fossem parar nos
diversos jornais do estado.
Fato a se considerar ainda é que em boa parte dos veículos de mídia trazidos ao processo o
réu é ressaltado como sendo o propagador da notícia. Vale destacar que não questiona o
requerido, especificadamente, a entrevista que concedeu à Nadja Mauad, do blog do
Globo Esporte, na qual afirma que vazou as imagens com o intuito de dar publicidade
aos fatos (mov. 1.12, autos 0025561-80.2015):
Deveras, a alegação do réu, neste aspecto deve ser rechaçada.
Sustenta o requerido, então, que a publicidade das conversas seria de interesse público,
enquanto que os autores alegam que o grupo possuía caráter privado e, portanto, o réu
violou as suas privacidades.
Vislumbra-se, portanto, um conflito teórico entre o “bloco dos direitos que dão conteúdo à
liberdade de manifestação do pensamento” e o “bloco dos direitos à imagem, honra, intimidade
e vida privada”.
As normas constitucionais apontadas pelo dispositivo, por sua vez, tratam: da livre
manifestação do pensamento e vedação ao anonimato; do direito de resposta e da indenização
pelo dano material, moral ou à imagem; da inviolabilidade da intimidade, da vida privada, da
honra, da imagem das pessoas e da indenização pelos danos decorrentes de sua violação; da
liberdade profissional; e do direito de acesso à informação.
Pois bem. A colisão aparente entre os princípios e diretrizes constitucionais impõe que, sob a
experiência do caso concreto, se observe o critério da proporcionalidade, assegurando a
máxima eficácia ao conjunto normativo da Constituição e maior proteção aos direitos humanos.
Destarte, no plano normativo, não há conflito entre as normas que garantem o direito à
liberdade de manifestação do pensamento e o direito à inviolabilidade da intimidade, da vida
privada, da honra ou da imagem das pessoas. Porém, no plano fático, pode haver uma colisão
real entre esses direitos constitucionais.
A resolução desses conflitos é possível porque os direitos e garantias individuais não têm
caráter absoluto, podendo, em razão disso, sofrer restrições, com o objetivo de
compatibilizá-los com o exercício de outros direitos e garantias.
A propósito:
Assim, se não existem direitos fundamentais absolutos, surgindo uma situação na qual se
apresentem em posições antagônicas, impõe-se proceder à compatibilização entre os mesmos,
mediante o emprego da proporcionalidade, a qual permitirá, por meio de juízos comparativos de
ponderação dos interesses envolvidos no caso concreto, harmonizá-los.
Em resumo, isso significa que, quando se afiguram em posições opostas dois direitos
fundamentais, cabe ao intérprete, à vista do caso concreto, ponderar os interesses envolvidos,
moldando-os de forma a viabilizar a harmonização entre esses direitos, isoladamente
considerados, e entre estes e a Constituição como um todo.
Por outro lado, cediço que a liberdade de expressão de pensamento é, historicamente, um dos
mais antigos direitos assegurados aos homens, encontrando proteção normativa já na
Declaração de Direitos do Homem de 1789, in verbis:
“Art. 11º. A livre comunicação das ideias e das opiniões é um dos mais preciosos
direitos do homem. Todo cidadão pode, portanto, falar, escrever, imprimir livremente,
respondendo, todavia, pelos abusos desta liberdade nos termos previstos na lei.”
A propósito:
“O homem não se contenta como o mero fato de poder ter as opiniões que quiser, [...].
É da sua natureza, no entanto o ir mais longe: o procurar convencer os outros, o fazer
proselitismo. Ele é escravo de um certo princípio de coerência. Se crê em certas ideias
é levado a desejar o seu implemento, a conformar o mundo segundo sua visão,
necessitando destarte da liberdade para exprimir suas crenças e opiniões. A liberdade
de pensamento nesta seara já necessita da proteção jurídica. Não se trata mais de
possuir convicções intimas, o que pode ser atingido independentemente do direito.
Agora não. Para que possa exercitar a liberdade de expressão do seu pensamento, o
homem, como visto, depende do direito. É preciso, pois, que a ordem jurídica lhe
assegure esta prerrogativa e, mais ainda, que regule os meios para que se viabilize
esta transmissão. ” (BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de direito constitucional. 17ª ed.
São Paulo: Saraiva, 1996, p. 174).
A propósito:
“A garantia constitucional de liberdade de manifestação do pensamento (art. 5.º, IV)
deve respeitar, entre outros direitos e garantias fundamentais protegidos, a honra das
pessoas, sob pena de indenização pelo dano moral provocado, como decorre dos
termos do art. 5.º, V e X, da CF. Não se deve confundir, por consequência, liberdade de
expressão com irresponsabilidade de afirmação. Recurso especial provido” (REsp
801.249/SC, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em
09/08/2007, DJ 17/09/2007, p. 257).
Na hipótese dos autos é incontroverso que o grupo era privado, sendo restrito a outras
pessoas, tanto que, num contexto permitido de 100 (cem) integrantes, apenas 9 (nove)
estavam nele, incluindo o réu à época das conversas (antes da divulgação, uma vez que ao
sair do grupo, manteve o histórico de conversas em seu aparelho quando ainda participava):
Além disso, todos os integrantes tinham, de alguma forma, uma relação de proximidade com a
direção do grupo, de modo que por esse contexto poderia eventualmente surgir algum assunto
com feições que interessassem a coletividade. Não prova o réu, no entanto, que o grupo se
destinava a esse propósito informativo.
O que descurou o requerido nisso tudo é que, ao passo que os autores possuíam uma relação
com a direção do time, o que poderia eventualmente interessar à coletividade, não há provas
nos autos de que as opiniões lá proferidas eram oficiais, sobretudo por não se tratar de
um veículo oficial do clube. Isto é, estavam sendo livremente expostas num grupo restrito de
conhecidos, formado por esse aspecto em comum, não destinado a qualquer finalidade
informativa.
Sem ingressar no acerto ou não das opiniões lá proferidas é certo que ao permitir a divulgação
do contexto integral daquilo que estava sendo livremente comentado num grupo restrito – o
que é incontroverso –, o réu violou a privacidade dos seus integrantes porquanto permitiu
a divulgação de conteúdos privados, isto é, juízos de valor (positivos ou negativos),
imagens pessoais, insatisfações enquanto torcedor que não possuíam correlação com o
interesse público das posições que representavam, sem o consentimento dos seus
integrantes.
Vale ressaltar que acaso o réu se sentisse lesado por alguma das opiniões lá proferidas no
grupo poderia ingressar em juízo com os mecanismos judiciais disponíveis, e não agir por
autotutela, em evidente violação às garantias constitucionais reconhecidas a todos.
Na hipótese dos autos é incontroverso o dano moral para os autores André Luiz Macias,
Arthur Orlando Klas Neto, Carlos Adriano Rattmann, Carlos Eduardo Vianna de Souza Santos,
Christian Sant'ana Gaziri, Marcelo Rodrigo Molinari e Pierre Alexandre Boulos, sendo
controvertido o dano para o autor Alexandre Dupas Pereira.
Em que pese o requerido alegar que a referida parte não sofreu danos, é incontroverso que não
apenas fez parte do grupo, o qual foi mencionado nas matérias divulgadas, como também é
citado num dos “print screen” reproduzidos pelo réu sem o seu consentimento (mov. 1.12),
sendo possível compreender a grande interferência dos fatos na vida privada dos autores,
diante da larga repercussão dos eventos na mídia, em especial, num ambiente de grandes
tensões que é o meio esportivo.
O abalo moral em casos dessa natureza é presumível da própria situação (in re ipsa). Aliás, o
Superior Tribunal de Justiça já reconheceu que a violação aos direitos de personalidade,
como é o caso, é capaz, per si, de ensejar a reparação extrapatrimonial, mutatis mutandis: “
Tendo em vista, é razoável estender a mesma interpretação a todas as violações dessa
natureza, considerando que a ofensa a qualquer direito de personalidade provoque um dano
moral in re ipsa.” (STJ, REsp 955.031/MG, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA
TURMA, julgado em 20/03/2012).
Assim, resta demonstrado o abalo moral, cumprindo aferir se o valor fixado em R$ 5.000,00
(cinco mil reais) para cada autor mereceria alteração.
Acresça-se a tal fato o caráter compensatório pela aflição e intranquilidade causadas pelo ato
ilícito cometido, a gravidade e a duração da lesão, a possibilidade de quem deve reparar o
dano e as condições econômicas e sociais do ofendido, levando-se em conta que a reparação
não deve gerar o enriquecimento sem causa, circunstâncias que, igualmente, merecem ser
sopesadas no arbitramento do montante devido a título de danos morais.
No caso dos autos, nota-se que o abalo moral consistiu nos transtornos decorrentes da
publicização de conteúdos privados de mensagens perante a coletividade.
Para o fim de reduzir o valor fixado o requerido justifica que não possui condições
financeiras de arcar com as referidas parcelas, uma vez que beneficiário das benesses
da gratuidade judicial.
De fato, as condições pessoais do ofensor também se prestam como critério balizador do valor
reparatório a ser fixado. No entanto, observa-se que a reparação é individual e somente se
maximizou por conta da pluralidade das vítimas.
Sobre a questão, para efeitos do artigo 926 do CPC/15, embora sejam bastante peculiares as
situações envolvendo reparações por violação a direitos de personalidade, como são a honra, a
privacidade, e a imagem, este Tribunal de Justiça já fixou indenizações da seguinte forma
individualizada:
Nesse contexto, observa-se que em razão da reprodução dos conteúdos privados, os autores
foram expostos em diversos veículos de mídia, sem qualquer abreviação, tendo as suas
opiniões particulares amplamente divulgadas num espaço de grandes tensões e posições
conflitantes que é o ambiente esportivo.
Assim, sopesando tanto a condição pessoal do réu, bem assim as consequências do ato,
entendo que a reparação, fixada em R$ 5.000,00 (cinco mil reais) para cada autor não
comporta redução e, portanto, merece ser mantida.
À vista do exposto, voto por: a) nos autos nº 0025561-80.2015, conhecer em parte, e nessa
extensão, negar provimento ao recurso de apelação; b) nos autos nº 0030927-03.2015,
conhecer e negar provimento ao recurso de apelação.
3. Nessa conformidade:
O julgamento foi presidido pelo (a) Desembargador Hélio Henrique Lopes Fernandes Lima, sem
voto, e dele participaram Juiz Subst. 2ºgrau Ademir Ribeiro Richter (relator), Juiz Subst. 2ºgrau
Alexandre Barbosa Fabiani e Desembargador Marco Antonio Antoniassi.