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Título original: The Lost Tools of Learning

Por Dorothy Sayers.

Traduzido por Cipriana Leme com permissão da gbt@gbt.org


Revisado por Marili Gomes

©Old School Editora | Todos os direitos reservados

www.oldschooleditora.lemeinc.com
Título original: The Lost Tools of Learning

Por Dorothy Sayers.

Traduzido por Cipriana Leme com permissão da gbt@gbt.org

Revisado por Marili Gomes

Old School Editora

www.oldschooleditora.lemeinc.com

Todos os direitos reservados.


Conteúdo
Nota da Tradutora
Introdução
Por que a educação clássica?
Sobre a educação clássica
Como aplicar a educação clássica
Estados de desenvolvimento e o Trivium
Palavras Finais
Sobre a autora
Nota da Tradutora

Esta é uma tradução livre do discurso da Dorothy Sayers na


Universidade de Oxford, em 1947, sobre os benefícios da educação clássica.
A primeira vez que li este discurso, senti que todas as dúvidas que tinha sobre
a educação clássica e seus benefícios haviam sido respondidas e que não

poderia seguir outro caminho dali em diante.

Como mãe educadora naturalizada brasileira e tradutora há mais de 25


anos, confesso que este foi um dos textos mais difíceis de traduzir,
considerando que meu idioma nativo não é o português. Mesmo assim, estou
convencida de que muitos pais poderão se beneficiar desta maravilhosa
introdução à educação clássica e como este método pode ser aplicado nos
dias de hoje.

Espero que sirva de inspiração para todos os educadores e, para que,

finalmente, possamos melhorar a educação de todas as crianças e resgatar as


ferramentas tão valiosas e elementares que se perderam ao longo do caminho.

Cipriana Leme
Introdução

Para que alguém como eu, cuja experiência em lecionar é


extremamente limitada, possa discutir a educação é algo que certamente
merece uma apologia. É uma conduta para a qual, o atual clima de opinião é
inteiramente favorável. Os bispos dão as suas opiniões sobre a economia; os

biólogos sobre metafísica; químicos inorgânicos sobre teologia; as pessoas


mais irrelevantes são designadas para ministérios altamente técnicos; e
homens toscos e comuns escrevem para os jornais para dizer que Epstein e
Picasso não sabem desenhar. Até certo ponto, e, contanto que as críticas
sejam feitas com modéstia razoável, estas atividades são louváveis.
Especialização demais não é uma coisa boa. Também existe um motivo
excelente para o qual um total amador possa sentir que tem o direito de
opinar sobre a educação. Pois se não somos todos professores profissionais,

todos fomos, em algum momento ou outro, educados. Mesmo que não


tenhamos aprendido nada—talvez em especial se não tivermos aprendido
nada—nossa contribuição à discussão ainda pode ter um valor potencial.

Não obstante, é altamente improvável que as reformas que proponho


sejam de fato postas em prática. Nem os pais, nem as faculdades
qualificadoras, nem as bancas examinadoras, nem os conselhos de
governantes, nem os ministérios de educação as tolerariam por um segundo
sequer. Pois elas se resumem assim: se formos produzir uma sociedade de

pessoas educadas, aptas a preservar sua liberdade intelectual em meio às


complexas pressões da sociedade moderna, devemos retroceder no ciclo do
progresso uns quatrocentos ou quinhentos anos, até o ponto onde a educação
começa a perder de vista seu verdadeiro objetivo, perto do final da Idade
Média.

Antes de rejeitar-me com a frase apropriada—reacionária, romântica,


medievalista, laudator temporis acti (aclamadora de tempos passados), ou
qualquer rótulo que vier à cabeça—eu peço que considere uma ou duas
perguntas miscelâneas que perduram nas mentes, talvez de todos nós, e que
ocasionalmente surgem para nos preocupar.
Por que a educação clássica?

Quando pensamos na idade incrivelmente precoce na qual os jovens


ingressavam na universidade, vamos dizer, nos tempos dos Tudor, e logo
após considerados aptos para assumir a responsabilidade por seus próprios
atos e negócios, estamos inteiramente confortáveis com aquela prolongação

artificial da infância e adolescência intelectual para os anos de maturidade


física que é tão marcada em nosso tempo? Adiar a aceitação da
responsabilidade para uma idade mais avançada traz uma série de
complicações psicológicas que, embora possam interessar aos psiquiatras, são
pouco benéficas para o indivíduo ou para a sociedade. Um robusto argumento
a favor do adiamento da idade de deixar a escola e a prolongação do período
de educação, costume ser que, agora temos muito mais a aprender do que na
Idade Média. Isto é verdadeiro em parte, mas não inteiramente. O menino ou

a menina moderna certamente devem estudar mais matérias—mas isso


sempre significa que eles realmente aprendem mais?

Nunca achou estranho ou desafortunado que hoje, quando a proporção


de alfabetização na Europa Ocidental é maior do que jamais foi, as pessoas
tenham se tornado tão susceptíveis à influência da propaganda e publicidade
em massa do que jamais imaginamos ou pensamos? Você atribui este
fenômeno ao fato meramente mecânico de que a imprensa e a rádio e outros
meios tenham facilitado a divulgação da publicidade por uma área tão
extensa? Ou as vezes tem a desconfortável suspeita de que o produto dos
métodos modernos de educação é pior do que ela ou, ele possa ser em

desembaraçar os fatos das opiniões ou o comprovado do plausível?

Alguma vez, ao ouvir um debate entre pessoas presumidamente


adultas e responsáveis, se incomodou com a extraordinária incapacidade de

um argumentador comum em falar sobre o assunto ou ir ao encontro ou,


refutar os argumentos dos oradores contrários? Ou alguma vez pensou sobre
a extrema alta incidência de matérias irrelevantes que surgem em reuniões de
comitê, ou sobre a assombrosa raridade de pessoas capazes de atuar como
presidentes dos comitês? E ao pensar sobre isto e sobre o fato de que muitos
dos nossos assuntos públicos são resolvidos em debates e comitês, já sentiu
um certo desapontamento?

Você alguma vez seguiu uma discussão no jornal ou em outro meio e

percebeu a frequência com que o autor falha em definir os termos utilizados?


Ou a frequência, quando um escritor consegue definir os termos, em que
outro possa assumir em sua resposta que estava usando os termos no sentido
oposto ao sentido em que já foram definidos? Já se sentiu levemente
incomodado com a quantidade de sintaxe descuidada que tem por aí? E se
esse for o caso, sente-se incomodado porque é deselegante ou porque possa
levar a mal-entendidos perigosos?
Já sentiu que os jovens, após terem deixado a escola, não somente
esquecem quase tudo que aprenderam (o que é esperado), mas também

esquecem ou evidenciam que nunca realmente souberam como aprender um


assunto novo por conta própria? Se incomoda ao conhecer homens e
mulheres adultas que parecem incapazes de distinguir entre um livro que é
extensamente, academicamente e corretamente documentado e, um outro que

não é, para qualquer olho treinado, visivelmente qualquer uma destas coisas?
Ou que possa lidar com um catálogo de biblioteca? Ou que, quando
confrontados com um livro de referência, demonstram a curiosa incapacidade
de extrair dele as passagens relevantes a uma determinada questão que
interessa a eles?

Já se deparou com pessoas para as quais, durante todas as suas vidas, o


“sujeito” permanece como “sujeito”, dividido por anteparos impenetráveis de
todos os outros “sujeitos”, fazendo com que tenham grande dificuldade em

fazer qualquer conexão mental imediata entre, vamos dizer, álgebra e ficção
policial, eliminação de esgoto, e o preço do salmão—ou, de forma mais geral,
entre as esferas de conhecimento como filosofia e economia ou química e
arte?

Sente-se ocasionalmente perturbado pelas coisas escritas por homens e


mulheres adultas para a leitura? Nos deparamos com um biólogo renomado
escrevendo um artigo semanal no sentido de que: "É um argumento contra a
existência de um Criador (acredito que tenha sido mais enfático; mas já que,

desafortunadamente, perdi a referência, colocará sua afirmação no nível

mínimo) “um argumento contra a existência de um Criador de que o mesmo


tipo de variação produzida por seleção natural pode ser produzida sem
restrições por criadores de gado”. Podemos ser tentados a dizer que é, de fato,
um argumento a favor da existência de um Criador. Evidentemente, não é

nem uma coisa nem outra; simplesmente prova que as mesmas causas
materiais (recombinação de cromossomos, por meio do cruzamento de raças,
e assim por diante) são suficientes para justificar todas as variações
observadas – assim como a variação de combinações da mesma dezena de
tons é materialmente suficiente para justificar a sonata do luar de Beethoven e
o ruído que o gato faz ao andar sobre as teclas do piano. Mas o desempenho
do gato não prova nem desaprova a existência de Beethoven; e a única coisa
que o argumento do biólogo consegue provar é que ele é incapaz de distinguir

entre uma causa material e uma causa final.

Vemos aqui uma frase de uma fonte não menos acadêmica do que um
artigo de primeira página do suplemento literário do Times: “O Francês,
Alfred Epinas, apontou que uma certa espécie (por ex. formigas ou vespas) só
pode enfrentar os horrores da vida e da morte por meio da associação. ” Eu
não sei o que o Francês realmente disse; o que o Inglês disse que ele disse é
evidentemente sem sentido. Nunca saberemos se a vida é considerada um
horror pela formiga ou, de qual forma a vespa isolada que você esmaga na

janela, pode “enfrentar” ou não, os horrores da morte. O tema do artigo é o

comportamento em massa dos homens; e as motivações humanas têm sido


inoportunamente transferidas da proposição principal para a instância de
suporte. Assim, o argumento, de fato, assume o que procura provar – um fato
que seria imediatamente aparente se fosse apresentado em um silogismo

formal. Isto é só um exemplo pequeno e aleatório de um vício que permeia


livros inteiros – principalmente livros escritos por homens da ciência sobre
assuntos metafísicos.

Outra citação da mesma questão do TLS se encaixa perfeitamente aqui


para resumir esta coleção aleatória de pensamentos inquietantes—desta vez
da avaliação do Sir Richard Livingstone “Some Tasks for Education”: “Mais
que uma vez o leitor é relembrado do valor de um estudo intensivo de, pelo
menos, uma matéria para aprender o significado do conhecimento e quanta

precisão e persistência são necessárias para alcançá-lo. Porém, há o


reconhecimento pleno do fato desesperador de que o homem pode ter o
domínio de um campo e não mostrar melhor juízo do que seu vizinho em
qualquer outro lugar; ele lembra o que aprendeu, mas esquece completamente
como o aprendeu”.

Eu gostaria de chamar a atenção particularmente para a última frase, a


qual oferece uma explicação daquilo que o escritor corretamente chama de
“fato desesperador” que as habilidades intelectuais concedidas a nós através

da educação não são prontamente transferíveis para outras matérias além

daquelas para as quais adquirimos estas habilidades: "...ele lembra o que


aprendeu, mas esquece completamente como o aprendeu".

Não seria o grande defeito da nossa educação hoje—um defeito


passível de rastreamento todos os sintomas inquietantes de perigo que tenho

mencionado—que, embora consigamos ensinar aos alunos “matérias”,


falhamos lamentavelmente no todo ao ensinar a eles como pensar: eles
aprendem tudo menos a arte de aprender. É como se ensinássemos uma
criança mecanicamente e por princípio básico, a tocar “The Harmonious
Blacksmith” no piano, mas nunca tivéssemos ensinado a escala ou como ler
música; para que, após ter memorizado "The Harmonious Blacksmith," ele
ainda não tivesse a menor noção de como proceder para aprender “The Last
Rose of Summer”. Por que digo, "como se"? Em algumas artes, às vezes

fazemos exatamente isto—pedimos à criança que “se expresse” na pintura


antes de ensiná-la a lidar com as cores e o pincel. Há uma escola de
pensamento que acredita que esta é a forma correta de iniciar o trabalho. Mas
observe: não é a forma que um artesão treinado aprenderá sobre um novo
meio. Ele, tendo aprendido por experiência a melhor forma de economizar
mão de obra e assumir o assunto da forma correta, começará por rabiscar e
brincar com uma peça velha de material para “aprender a manusear a
ferramenta”.
Sobre a educação clássica

Vamos olhar agora para o esquema medieval de educação—a grade


curricular das Escolas. Não importa, por enquanto, se foi criado para crianças
pequenas ou alunos mais velhos ou por quanto tempo as pessoas deveriam
concluí-la. O que importa é o entendimento sobre as coisas que os homens da

Idade Média acreditavam ser o objeto e a ordem correta do processo de


aprendizagem.

A grade era dividida em duas partes: o Trivium e o Quadrivium. A


segunda parte—o Quadrivium--consistia em “matérias” e, não precisa ser
discutido por enquanto. O mais interessante para nós é a composição do
Trivium, que precede o Quadrivium e era a preliminar disciplina para ele.
Consistia em três partes: Gramática, Dialética e Retórica, nesta ordem.

Agora, a primeira coisa que notamos é que duas destas “matérias” não

são de fato o que devemos chamar de “matérias”: são meramente métodos


para lidar com matérias. A Gramática é, de fato, uma “matéria” no sentido de
que definitivamente significa aprender um idioma—nesse período significava
aprender Latim. Mas o idioma em si é meramente um meio pelo qual
expressamos o pensamento. O propósito total do Trivium era, de fato, ensinar
ao aluno o uso correto das ferramentas do aprender antes mesmo que
começasse a aplicá-las às “matérias”. Primeiramente, ele aprendia um
idioma; não só como pedir uma refeição em um idioma estrangeiro, mas a
estrutura do idioma em si—o que era, como era estruturado e como
funcionava. Segundo, ele aprendia como usar o idioma; como definir os
termos e montar frases corretamente; como construir um argumento e como
detectar falácias no argumento. Dialética, por assim dizer, abraçava a Lógica
e o Debate. Terceiro, ele aprendia a expressar-se no idioma-- como dizer o

que precisava dizer de forma elegante e persuasiva.

Ao final do curso, ele precisava compor uma tese sobre algum assunto
definido por seus mestres ou escolhido por ele, e logo defender essa tese
contra a crítica de uma mesa ou corpo docente. Até este momento, ele teria
aprendido—ou estaria em sérios apuros-- não somente a escrever um ensaio
sobre papel, mas a falar de forma audível e inteligível de uma plataforma e
usar sua inteligência com agilidade quando interrogado. Haveria também

perguntas, coerentes e perspicazes, daqueles que já tivessem enfrentado o


desfio do Debate.

É, evidentemente, verdade que partes e traços de uma tradição


medieval ainda perduram, ou têm sido ressuscitadas, no currículo da escola
comum de hoje. Algum conhecimento da gramática ainda é necessário
quando ao aprender um idioma estrangeiro—talvez até diria, “é novamente
necessária”, já que durante minha vida, passamos por fases onde o ensino de
declinação e conjugações foi considerada bastante repreensível, e é

considerado melhor adquirir este conhecimento quando surgir a necessidade.

As sociedades que discutem a escola, florescem; ensaios são escritos; a


necessidade de “autoexpressão” é enfatizada e talvez até exageradamente.
Mas estas atividades são cultivadas mais ou menos em separado, como
pertencentes a matérias especiais onde são estereotipadas em vez de formar

um esquema coerente de treinamento mental para o qual todas as “matérias”


têm uma relação subordinada. “Gramática” pertence especialmente à
“matéria” de idiomas estrangeiros e a composição de ensaios à “matéria”
chamada “Inglês”; enquanto que a Dialética ficou quase que totalmente
divorciada do restante do currículo e é frequentemente praticada não-
sistematicamente e fora do horário escolar como um exercício separado,
vagamente relacionada ao negócio principal de aprender. Em geral, a grande
diferença de ênfase entre os dois conceitos mantém a vigência: a educação

moderna se concentra em “ensinar matérias” deixando o método de pensar,


argumentar, expressar conclusões para ser adquirido pelo estudioso no
decorrer do tempo, enquanto que a educação medieval se concentrava
primeiramente em forjar e aprender a usar as ferramentas do aprender,
utilizando a matéria que fosse útil como material para realizar os desenhos
necessários até que o uso da ferramenta fosse quase instintivo.

“Matérias” de alguma forma devem existir, evidentemente. Não


podemos aprender a teoria da gramática sem aprender o idioma, ou aprender

a argumentar e discursar sem falar sobre algo em particular. As matérias de

discussão da Idade Média foram em grande parte extraídas da teologia, da


ética ou da história da antiguidade. De um modo geral, elas foram
estereotipadas, especialmente perto do final de uma época, e as absurdidades
exageradas dos argumentos escolásticos afligiram Milton e oferecem motivos

de alegria até os dias de hoje. Se realmente forem algo mais banalizados e


triviais do que as matérias usuais de hoje para a “composição de ensaios”, eu
não gostaria de dizer: podemos ficar fartos de “Um Dia das Minhas Férias” e
todo o resto. Mas a maior parte da alegria é inapropriada porque a meta e o
objeto de debater a tese já foram perdidos de vista.

Um orador volúvel, no Brains Trust certa vez, entreteve seu público (e


levou o falecido Charles Williams a um ataque de raiva ao assegurar que na
Idade Média era uma questão de fé saber quantos arcanjos poderiam dançar

na ponta de uma agulha. Nem preciso dizer, espero, que nunca foi uma
questão de fé"; era simplesmente um exercício de debate, cujo tema
estabelecido era a natureza da substância angelical: se os anjos eram matéria,
e se sim, ocupavam espaço? A resposta geralmente julgada correta é, acredito
que os anjos são puras inteligências; não matéria, mas limitados, de modo
que possam ter lugar no espaço, mas não extensão. Uma analogia pode ser
traçada a partir do pensamento humano, que é da mesma forma não-material
e limitada. Assim, se o seu pensamento concentra-se em uma só coisa—como

ponta de uma agulha—está focada lá no sentido de que não está em outro

lugar; embora esteja “lá”, não ocupa nenhum espaço lá, e não há nada que
impeça que um número infinito de diferentes pensamentos de pessoas esteja
concentrado sobre a mesma ponta de agulha ao mesmo tempo. O assunto
apropriado do argumento é assim visto como a distinção entre a localidade e

a extensão no espaço; a matéria sobre a qual o argumento é exercido passa a


ser a natureza dos anjos (embora, como vimos, pode igualmente ter sido outra
coisa; a lição prática a ser tirada do argumento é não utilizar palavras como
“ali” no sentido literal e não-científico, sem especificar se queremos dizer
“localizado ali” ou “ocupando espaço ali”.

Muito desprezo tem sido derramado sobre a paixão medieval pela


crítica minuciosa; mas quando observamos o abusivo descaso que tem sido
praticado, em publicações e na plataforma, de expressões polêmicas com

conotações ambíguas e mutáveis, podemos sentir em nossos corações o


desejo de que todo leitor e ouvinte possa ser tão defensivamente blindado
com sua educação para assim ser capaz de dizer: “Distingo”.

Pois permitimos que nossos jovens saiam desarmados num dia onde a
armadura nunca foi tão necessária. Ensinando-os a ler, os deixamos à mercê
da palavra impressa. Com a invenção do cinema e do rádio, nos asseguramos
de que nenhuma aversão à leitura possa protegê-los da incessante bateria de
palavras, palavras, palavras. Eles não sabem o que as palavras significam;

eles não sabem como evitá-las ou minimizar seu impacto ou lançá-las de

volta; eles são reféns das palavras em suas emoções, em vez de serem os
mestres delas em seu intelecto. Nós, que fomos escandalizados em 1940,
quando os homens foram enviados para lutar contra tanques blindados com
rifles, não ficamos escandalizados quando jovens, homens e mulheres, são

lançados ao mundo para lutar contra a propaganda em massa com um


punhado de “matérias”; e quando classes inteiras e nações inteiras ficam
hipnotizadas pelas artes do orador cativante, temos o atrevimento de nos
surpreender. Falamos muito sobre a importância da educação—falamos em
agir e, apenas ocasionalmente, concedemos um pequeno investimento;
adiamos a idade de conclusão dos estudos e planejamos escolas maiores e
melhores; os professores conscientemente trabalham como escravos dentro e
fora do horário escolar; e mesmo assim, acredito, todo este esforço dedicado

é, em grande parte, frustrado porque perdemos as ferramentas da


aprendizagem e, na sua ausência, somente conseguimos fazer um trabalho
remendado e fragmentado.
Como aplicar a educação clássica

O que, então, devemos fazer? Não podemos voltar à Idade Média. É


um pedido para o qual estamos acostumados. Não podemos voltar—ou
podemos? Explico. Eu gostaria que cada termo nessa preposição fosse
definido. “Voltar” significa um retrocesso no tempo ou a revisão de um erro?

O primeiro é claramente impossível por si só; o segundo é algo que os sábios


fazem todos os dias. “Não é possível”-- não significa que o nosso
comportamento é determinado de forma irreversível ou, simplesmente que tal
ação seria muito difícil, tendo em vista a oposição que provocaria?
Obviamente, o século XX não é e não pode ser o décimo quarto; mas se a
“Idade Média” é, neste contexto, simplesmente uma frase pitoresca que
denota uma certa teoria educacional, parece não haver uma razão a priori pela
qual não devemos “voltar” a ela—com modificações—considerando que já

“voltamos” com modificações, para, por assim dizer, a ideia de encenar peças
do Shakespeare como ele as escreveu, e não as versões “modernizadas” do
Cibber e Garrick, que certa vez pareciam ser a última moda em progresso
teatral.

Vamos, só por um momento, imaginar que tal retrocesso progressivo


fosse possível. Vamos fazer uma varredura de todas as autoridades
educacionais e usar escolares a quem possamos experimentalmente equipar
para o conflito intelectual segundo as regras escolhidas por nós mesmos.
Daremos a eles pais excepcionalmente dóceis; equiparemos nossa escola com
professores que estão perfeitamente familiarizados com os objetivos e
métodos do Trivium; teremos um edifício e um quadro grande o suficiente
para permitir um número pequeno e gerenciável de alunos; e vamos postular
uma Mesa de Examinadores disposta e qualificada para testar e avaliar os
produtos que formamos. Assim preparados, vamos tentar esboçar um plano
de estudos—um Trivium moderno “com modificações” e veremos onde

conseguimos chegar.

Mas primeiro: qual deve ser a idade das crianças? Bem, se devemos
educá-los com métodos novos, seria melhor que não tivessem nada que
precise ser desaprendido; não se pode começar uma coisa boa cedo demais, e,
por sua natureza, o Trivium não é aprendizagem, mas uma preparação para a
aprendizagem. Vamos, portanto, “capturá-los quando jovens”, e exigir do

nosso aluno que seja somente capaz de ler, escrever, e fazer contas.

Estados de desenvolvimento e o Trivium


Minhas opiniões sobre psicologia infantil não são, eu admito,
ortodoxas ou esclarecidas. Olhando para minha vida (desde quando eu era a
criança que conheço melhor e a única criança que posso esperar conhecer do
meu interior), eu reconheço três estados de desenvolvimento. Estes estados,
de forma pronta e tosca, chamarei de Papagaio-Imitador, o Petulante e o

Poético-- este último coincidindo, aproximadamente, com o início da

puberdade. A etapa do Papagaio-Imitador é quando aprender por


memorização é fácil e, em geral, prazeroso; enquanto que o raciocínio é
difícil e, em geral, pouco apreciado. Nesta idade, facilmente memorizamos as
formas e aparências das coisas; gostamos de recitar os números de placas de

carros; sentimos alegria em cantar rimas e o estrondo e trovão de polissílabas


inteligíveis; desfrutamos da mera acumulação das coisas. A idade Petulante
que segue a anterior (e naturalmente a sobrepõe, em certa medida), é
caracterizada por contradições, retrucar, gostar de “pegar as pessoas de
surpresa” (especialmente os mais velhos); e pela proposta de charadas. Sua
capacidade de incomodar os outros é extremamente alta. Geralmente surge no
Quatro Ano. A idade Poética é popularmente conhecida como a idade
“difícil”. É uma idade egocêntrica; ela luta para se expressar; sua

especialidade é ser incompreendida; é inquieta e tenta conseguir sua


independência; e, com sorte e boas orientações, ela deve mostrar os
primórdios da criatividade; a busca da síntese do que já se sabe, e a vontade
deliberada de saber e fazer uma única coisa em detrimento de todas as outras.
Agora parece-me que a composição do Trivium se adapta de forma
singularmente apropriada a estas três idades: A Gramática para o Papagaio-
Imitador, a Dialética para a idade Petulante e a Retórica para a idade Poética.
Comecemos, então, com a Gramática. Isto, na prática, significa a
gramática de uma língua em particular; e deve ser uma língua flexiva. A

estrutura gramatical de uma língua inflexiva é demasiado analítica a ser


compreendida por alguém sem prática prévia em Dialética. Além disso, a
língua flexiva interpreta a inflexiva, enquanto que as inflexivas são pouco
úteis para interpretar a flexiva. Vou dizer também, com firmeza, que o

melhor fundamento para a educação é a Gramática latina. Digo isto não


porque o latim é tradicional e medieval, mas simplesmente porque mesmo
um conhecimento rudimentar do latim reduz o trabalho e as dores da
aprendizagem de quase qualquer outro assunto por, pelo menos, cinquenta
por cento. É a chave para o vocabulário e a estrutura de todas as línguas
Teutônicas, bem como para o vocabulário técnico de todas as ciências e de
toda a literatura da civilização mediterrânica e seus documentos históricos.

Aqueles cuja preferência pedante por uma língua viva convence-os a

privar os alunos de todas estas vantagens podem substituir o russo, cuja


gramática é ainda mais primitiva. O russo é, naturalmente, útil com os outros
dialetos eslavos. Há algo também a ser dito sobre o grego clássico. Mas a
minha escolha é o latim. Tendo, assim, agradado aos Classicistas entre vocês,
continuarei a horrorizá-los adicionando que eu não acredito que seja sábio ou
necessário colocar o aluno comum sobre o leito de Procusto da época
Augustana, com seus versos e oratória altamente elaborada e artificial. O
latim pós-clássico e medieval, que foi uma língua viva até o final do

Renascimento, é mais fácil e, em alguns aspectos, mais animado; o estudo

dele ajuda a dissipar a difundida noção de que a aprendizagem e a literatura


chegaram a uma parada completa quando Cristo nasceu e só voltou a acordar
na Dissolução dos Mosteiros.

O latim deve ser iniciado tão cedo quanto possível—quando o

flexionado discurso não parece mais surpreendente do que qualquer outro


fenômeno em um mundo surpreendente; e quando o canto de “Amo, amas,
amat” seja tão ritualmente agradável quanto os sentimentos ao cantar “atirei o
pau no gato”.

Nesta idade, devemos, é claro, exercitar a mente com outras coisas


além de Gramática latina. A observação e a memória são as faculdades mais
vivas neste período; e se nós estamos aprendendo uma língua estrangeira
contemporânea, devemos começar agora, antes que os músculos faciais e

mentais se rebelem contra estranhas entonações. O francês ou alemão verbal


pode ser praticado junto a disciplina gramatical do latim.

Em inglês, entretanto, verso e prosa podem ser memorizados, e a


memória do aluno deve armazenar histórias de todos os tipos—clássicos
mitos, lendas Europeias, e assim por diante. Eu não acredito que as histórias e
obras-primas clássicas da literatura antiga devem ser utilizadas para praticar
as técnicas de Gramática—essa foi uma falha da educação medieval que não
precisamos perpetuar. As histórias podem ser apreciadas e lembradas em
inglês, e relacionadas com a sua origem em uma fase posterior. A recitação

em voz alta deve ser praticada individualmente ou em coro; pois não


devemos esquecer que estamos lançando as bases para a Discussão e a
Retórica.

A Gramática da história deve consistir, eu acredito, em datas, eventos,

histórias e personalidades. Um conjunto de datas para a qual possamos


associar todo conhecimento histórico posterior é de grande ajuda quando
chegarmos ao momento de instituir a perspectiva da história. Podemos
escolher quaisquer datas: aqueles dos Reis da Inglaterra são bem apropriadas,
desde que venham acompanhadas por imagens de vestimentas, arquitetura, e
outras coisas do cotidiano, de modo que a mera menção de uma data possa
acionar uma apresentação visual forte do período inteiro.

A geografia também será apresentada em seu aspecto factual, com

mapas, recursos naturais, e a apresentação visual de costumes, trajes, flora,


fauna, e assim por diante; e acredito que a memorização obsoleta e
desprestigiada de algumas capitais, rios, montanhas, etc., não fará mal. A
coleção de selos pode ser encorajada.

A ciência, no método Papagaio-Imitador, organiza-se naturalmente e


facilmente em torno de coleções—a identificação e nomenclatura das
amostras e, em geral, o tipo de coisa que costumava ser chamada de “filosofia
natural”. Conhecer o nome e as propriedades das coisas é, nesta idade, uma
satisfação em si; reconhecer um escaravelho à simples vista, e poder garantir

para os mais tolos que, apesar de sua aparência, não dá ferroadas; ser capaz
de distinguir a Cassiopeia e as Plêiades, e, talvez, até mesmo saber quem
eram Cassiopeia e as Plêiades; estar ciente de que uma baleia não é um peixe,
e que um morcego não é um pássaro—todas essas coisas dão uma agradável

sensação de superioridade; enquanto que distinguir uma coral verdadeira de


uma coral falsa ou um fungo comestível de um fungo venenoso é um tipo de
conhecimento que também tem valor prático.

A Gramática da matemática começa, claro, com a tabela de


multiplicação, que, se não aprendida agora nunca será aprendida com prazer;
e com o reconhecimento de formas geométricas e o agrupamento de números.
Esses exercícios levam naturalmente à realização de simples somas
aritméticas. Processos matemáticos mais complexos podem, e talvez devem,

ser adiados por motivos que serão apresentados agora.

Até agora (exceto, é claro, para o latim), nosso currículo não contém
nada que vai muito além da prática comum. A diferença será percebida na
atitude do educador, quem deve olhar para todas essas atividades não como
“matérias” em si, mas como uma coleção de material para uso na próxima
parte do Trivium. Este material é de importância secundária; mas tudo e
qualquer coisa útil que possa ser memorizada deve ser memorizada neste
período, se imediatamente inteligível ou não. A tendência moderna é a de

tentar forçar explicações racionais na mente de uma criança em tenra idade.

Perguntas inteligentes feitas espontaneamente deveriam, é claro, receber uma


resposta imediata e racional; mas é um grande erro supor que uma criança
não pode facilmente desfrutar e se lembrar de coisas que estão além de seu
poder de análise—em particular se as coisas têm um forte e apelo imaginativo

(como, por exemplo, "Kubla Kahn"), um atraente jingle (como algumas das
rimas de memorização para gêneros latinos) ou de uma abundância de
polissílabas ricas e retumbantes (como o Quicunque Vult).

Isso me lembra a Gramática da teologia. Vou adicioná-la ao currículo


porque a teologia é a ciência mestra sem a qual toda a estrutura educacional
carecerá necessariamente da sua síntese final. Aqueles que discordam com
isto terão que se contentar em deixar a educação do aluno cheio de pontas
soltas. Isso importa menos do que poderia, já que quando as ferramentas da

aprendizagem têm sido efetivamente forjadas, o aluno será capaz de


questionar a teologia por si só, e provavelmente insistirá em fazer isso e em
dar sentido a ela. Ainda assim, este assunto deverá ficar pronto e acessível
para que possa ser trabalhado. Na idade gramatical, portanto, devemos
familiarizar-nos com a história de Deus e o Homem em geral—isso é, o
Antigo Testamento e o Novo Testamento apresentados como partes de uma
única narrativa da Criação, da Rebelião e da Redenção—e também com o
Credo, a Oração do Pai Nosso e os Dez Mandamentos. Nesta fase inicial,

estas coisas não precisam ser totalmente compreendidas, mas devem ser

conhecidas e lembradas.

É difícil dizer em que idade, precisamente, devemos passar da


primeira para a segunda parte do Trivium. De um modo geral, a resposta é:
tão logo o aluno mostra-se espirituoso e disposto ao iniciar argumentos

intermináveis. Na primeira parte, as faculdades-chave são a Observação e a


Memória, de modo que, na segunda parte, a faculdade chave é a Razão
Discursiva. Na primeira, o exercício a que o restante do material foi, por
assim dizer, direcionado, era a Gramática do latim; no segundo, o exercício
chave será a Lógica Formal. É aqui que o nosso currículo mostra sua primeira
divergência acentuada dos padrões modernos. O descrédito em que a Lógica
Formal tem caído é totalmente injustificada; e a sua negligência é a causa
principal dos inquietantes sintomas que temos observado na constituição

intelectual moderna. A lógica tem sido desacreditada, em parte, porque


passamos a acreditar que somos condicionados quase inteiramente pelo
intuitivo e o inconsciente. Não há tempo para discutir se isto é verdade; eu
simplesmente observarei que negligenciar a formação adequada da razão é a
melhor maneira possível de torná-la verdadeira. Outra causa para o desfavor
em que a Lógica tem caído é a crença de que é inteiramente baseada em
suposições universais que são improváveis ou tautológicas. Isso não é
verdade. Nem todas as proposições universais são deste tipo. Mas mesmo se

fossem, isso não faria nenhuma diferença, uma vez que cada silogismo cuja

premissa maior seja “Todo A é B” pode ser reformulada em forma hipotética.


A Lógica é a arte de argumentar corretamente: “Se A, então B”. O método
não é invalidado pela natureza hipotética de A. De fato, a utilidade prática da
Lógica Formal hoje não reside tanto no estabelecimento de conclusões

positivas como na rápida detecção e exposição da inferência inválida.

Vamos agora rever rapidamente o nosso material e ver como pode ser
relacionado com a Dialética. No âmbito da Linguagem, nós agora temos o
nosso vocabulário e a morfologia ao nosso alcance; daí em diante, podemos
concentrar-nos na sintaxe e análise (por exemplo, a lógica da construção do
discurso) e a história da língua (por exemplo, como passamos a organizar
nossa fala para transmitir nossos pensamentos).

Nossa Leitura passará da narrativa e a lírica para os ensaios, o

argumento e as críticas, e o aluno aprenderá tentar escrever este tipo de coisa.


Muitas lições—sobre qualquer assunto—assumirão a forma de debates; e o
lugar da recitação individual ou em coral será tomado por peças dramáticas,
com atenção especial para as peças em que um argumento é expressado na
forma dramática.

A matemática-- álgebra, geometria e os mais avançados tipos de


aritmética—agora será introduzida no currículo e assumirá seu lugar como o
que realmente é: não uma matéria separada, mas um subdepartamento da
Lógica. Não é nem mais nem menos do que a regra do silogismo em sua

aplicação específica para número e medida e deve ser ensinada como tal, em
vez de ser, para alguns, um mistério sombrio e, para outros, uma revelação
especial, nem iluminando nem iluminado por qualquer outra parte do
conhecimento.

A história, auxiliada por um sistema simples de ética derivada da


Gramática da teologia, fornecerá muito material apropriado para o debate: O
comportamento deste estadista foi justificado? Qual foi o efeito desta
promulgação? Quais são os argumentos a favor e contra esta ou aquela forma
de governo? Assim, teremos uma introdução à história constitucional—um
assunto sem sentido para a criança, mas de absoluto interesse para aqueles
que estão preparados para discutir e debater. A teologia em si fornecerá
material para a discussão sobre a conduta e a moral; e deve ter seu escopo

estendido por um modelo simplificado do curso de teologia dogmática (isto é,


a estrutura racional do pensamento Cristão), esclarecendo as relações entre o
dogma e a ética, e prestando-se para a aplicação dos princípios éticos em
situações em particular, que é corretamente chamado de casuística. A
geografia e as ciências igualmente fornecerão material para a Dialética.

Mas, acima de tudo, não devemos negligenciar o material que é tão


abundante na vida diária dos próprios alunos.
Há uma deliciosa passagem no livro “The Living Hedge” de Leslie
Paul que conta como um grupo de meninos pequenos se divertiram por dias e

dias discutindo sobre uma extraordinária chuva que havia caído em sua
cidade—uma chuva tão localizada que deixou metade da rua principal úmida
e a outra metade seca. Alguém poderia argumentar corretamente dizer que
havia chovido naquele dia em ou sobre a cidade ou apenas na cidade?

Quantas gotas de água eram necessárias para constituir a chuva? E assim por
diante. A discussão levou a uma série de problemas semelhantes sobre o
descanso e o movimento, o sono e a vigília, este não, este a divisão
infinitesimal do tempo. Toda a passagem é um exemplo admirável do
desenvolvimento espontâneo da faculdade raciocinativa e da sede natural e
adequada do despertar da razão para a definição de termos e a exatidão da
afirmação. Todos os eventos são alimento para tal apetite.

A decisão de um árbitro; o grau ao qual podemos transgredir o espírito

de um regulamento sem estar presos pela letra: em questões como estas, as


crianças nascem casuístas, e sua propensão natural só precisa ser
desenvolvida e treinada—e especialmente, trazida para uma relação
inteligível com os acontecimentos no mundo adulto. Os jornais estão cheios
de bom material para tais exercícios: decisões jurídicas, por um lado, em
casos onde a causa em questão não é demasiado obscura; no outro, um
falacioso raciocínio e argumentos atrapalhados, observados em abundância
em algumas colunas de correspondência de certos jornais.

Onde quer que encontremos a Dialética, é, naturalmente, importante

focar a atenção na beleza e economia de uma demonstração boa ou um


argumento bem apresentado, para não deixar morrer a veneração. A crítica
não deve ser meramente destrutiva; entretanto, tanto o educador quanto os
alunos devem estar preparados para detectar a falácia, o raciocínio

descuidado, a ambiguidade, a irrelevância, e a redundância, e lançar-se sobre


eles, como ratos. Este é o momento quando é útil escrever resumos , com
exercícios como a escrita de um ensaio e a redução do mesmo, quando
escrito, por 25 ou 50 por cento.

Será, sem dúvida, recusada a ideia de que incentivar os jovens na


idade Petulante a intimidar, corrigir e discutir com os mais velhos os tornará
perfeitamente intoleráveis. Minha resposta é que as crianças dessa idade são
intoleráveis de qualquer forma; e que sua vontade natural de argumentar pode

ser tanto canalizada para servir um bom propósito quanto deixada para correr
livre. Podem, de fato, ser um pouco menos intrusivos em casa se forem
disciplinados na escola; e de qualquer maneira, os mais velhos que
abandonaram o princípio saudável de que as crianças devem ser vistas e não
ouvidas não poderão culpar ninguém além de si mesmos.

Mais uma vez, o conteúdo do currículo nesta fase pode ser qualquer
coisa da sua preferência. As “matérias” fornecem o material; mas devem ser
todos considerados como mera munição para o moinho mental sobre o qual
trabalhar. Os alunos devem ser incentivados a procurar sua própria

informação e então orientados a utilizar bibliotecas e livros de referência


adequadamente, e mostrados como identificar quais fontes são confiáveis e
quais não são.

Perto do final desta etapa, os alunos provavelmente começarão a

descobrir que seus conhecimentos e experiências são insuficientes e que suas


inteligências treinadas precisarão de muito mais material para mastigar. A
imaginação—normalmente dormente durante a idade Petulante—irá despertar
e levá-los a suspeitar das limitações da lógica e da razão. Isso significa que
eles estão passando para a idade Poética e estão prontos a iniciar o estudo da
Retórica. As portas do armazém de conhecimento devem agora ser abertas
para que eles possam dar uma olhada da forma que quiserem. As coisas antes
aprendidas pela memorização serão vistas em novos contextos; as coisas uma

vez friamente analisadas agora poderão ser colocadas juntas para formar uma
nova síntese; aqui e ali uma súbita visão trará a mais emocionante de todas as
descobertas: a percepção de que o truísmo é verdadeiro.

É difícil traçar qualquer plano de estudos para o estudo da Retórica:


uma certa liberdade é exigida. Na literatura, deve-se permitir que a
apreciação mais uma vez lidere sobre a crítica destrutiva; e a autoexpressão
escrita pode avançar, com as suas ferramentas agora afiadas para cortar a
limpo e observar a proporção. Qualquer criança que já mostra uma disposição

para se especializar, deve proceder livremente; pois quando o uso das

ferramentas tem sido corretamente e verdadeiramente aprendido, estará


disponível para qualquer estudo, seja qual for. Seria bom, eu acredito, que
cada aluno aprenda a fazer uma ou duas matérias muito bem, enquanto
assistir algumas aulas de matérias subsidiárias a fim de manter sua mente

aberta para as inter-relações de todo o conhecimento. De fato, nesta fase,


nossa dificuldade será a de manter as “matérias” separadas; já que a Dialética
terá mostrado todos os ramos da aprendizagem que possam ser inter-
relacionadas, e a Retórica tende a mostrar que todo o conhecimento é um só.
Mostrar isso e mostrar porque é assim, é preeminentemente tarefa da ciência.
Mesmo com ou sem o estudo da teologia, devemos, pelo menos, insistir que
as crianças com certa inclinação para a especialização em matemática e
ciências sejam obrigadas a assistir a algumas aulas de ciências humanas e

vice-versa. Nesta fase, também, a Gramática latina, tendo feito seu trabalho,
pode ser descartada para aqueles que preferem continuar seus estudos de
linguagem do lado moderno; enquanto aqueles que provavelmente nunca
terão grande uso ou aptidão para a matemática também poderão, de certa
forma, deixar estes estudos de lado por um tempo. De modo geral, tudo
aquilo que for mero instrumental agora poderá ficar em segundo plano,
enquanto a mente treinada é gradualmente preparada para a especialização
em “matérias” que, quando o Trivium for concluído, estará perfeitamente
equipada para enfrentar por si só. A síntese final do Trivium—apresentação

e defesa pública da tese—deve ser restaurada de alguma forma; talvez como


uma espécie de “prova final” durante o último semestre de estudos.

O escopo da Retórica também depende de se o aluno se lançará ao


mundo aos 16 anos ou se continuará para a universidade. Considerando que a

Retórica, de fato, deve ser iniciada aos 14 anos aproximadamente, a primeira


categoria de aluno deve estudar a Gramática dos 9 aos 11 anos e a Dialética
dos 12 aos 14; seus dois últimos anos de estudo devem ser dedicados a
Retórica, que, neste caso, seria do tipo bastante especializada e vocacional,
para que o aluno possa iniciar imediatamente alguma prática de carreira. Um
aluno da segunda categoria terminaria seu curso em Dialética na etapa ou na
escola preparatória, e iniciaria a Retórica durante seus dois primeiros anos de
estudos formais ou na escola pública. Aos 16, ele estará pronto para iniciar

aquelas “matérias” propostas para seus estudos posteriores na universidade: e


essa parte de sua educação corresponderá ao Quadrivium medieval. O que
isso quer dizer é que o aluno comum, cuja educação formal termina aos 16,
fará somente o Trivium; enquanto que os acadêmicos concluirão o Trivium e
o Quadrivium.
Palavras Finais

É o Trivium, então, uma educação suficiente para a vida?


Corretamente ensinado, eu acredito que sim. No final da Dialética, pode
parecer que estas crianças estão bem atrasadas com relação aos seus colegas
educados usando os métodos “modernos” à moda antiga no que se refere ao

conhecimento detalhado de uma matéria específica. Mas depois dos 14 anos,


eles certamente serão capazes de ultrapassar os outros rapidamente. De fato,
não vejo por que um aluno completamente proficiente no Trivium não possa
prosseguir imediatamente para a universidade aos 16 anos, assim provando-
se igual à sua contrapartida medieval, cuja precocidade nos surpreendeu no
início desta discussão. Isso, com certeza, causaria uma comoção no sistema
público de educação, e desconcertaria as universidades significativamente.
Causaria uma grande transformação, por exemplo, na regata Oxford e

Cambridge.

Mas não estou aqui para considerar os sentimentos de entidades


acadêmicas: Eu estou preocupada apenas com o treinamento adequado da
mente para encontrar e lidar com a formidável massa de problemas indigestos
apresentados pelo mundo moderno. As ferramentas do aprender são as
mesmas para toda e qualquer matéria; e a pessoa que souber como usá-las,
em qualquer idade, terá o domínio de uma matéria nova em metade do tempo
com um quarto do esforço de uma pessoa que não tem estas ferramentas a seu
dispor. Aprender seis matérias sem lembrar como foram aprendidas não faz
nada para ajudar o aprendizado de uma sétima matéria; aprender e lembrar a

arte do aprender torna a abordagem de qualquer matéria uma porta aberta.

Fica evidente que o ensino bem sucedido de um currículo neomedieval


dependerá mais do que o habitual do trabalho conjunto de todos os

professores em direção a um propósito comum. Já que nenhuma matéria é


considerada como um mal em si, qualquer rivalidade na sala dos professores
será tristemente inadequada. O fato de que o aluno é obrigado, infelizmente,
por algum motivo, a perder a aula de história às sextas-feiras ou a aula de
Shakespeare às terças-feiras, ou até mesmo omitir toda uma matéria em favor
de outra, não deve causar descontentamento—o essencial é que adquira o
método de aprendizagem em qualquer meio que lhe for mais conveniente. Se
a natureza humana sofrer este duro golpe no orgulho profissional na nossa

própria matéria, há conforto no pensamento de que os resultados das provas


do fim de semestre não serão afetados; já que os papéis serão dispostos de
modo a ser uma prova de método, por qualquer meio.

Vou acrescentar que é muito importante que todos os educadores


sejam, para seu próprio bem, qualificados e obrigados a ensinar as três partes
do Trivium; caso contrário os Mestres da Dialética, especialmente, poderão
ficar com as mentes endurecidas numa permanente adolescência. Por este
motivo, os professores nas escolas preparatórias também devem ter aulas de

Retórica nas escolas públicas a que estão ligados; ou, se eles não estão tão

ligados, então por algum acordo com outras escolas no mesmo bairro. Como
alternativa, os alunos poderiam assistir algumas aulas preliminares em
Retórica na escola preparatória a partir dos treze anos.

Antes de concluir estas sugestões necessariamente muito gerais, eu

deveria dizer porque acho que é necessário, nestes dias, voltar a uma
disciplina que foi descartada. A verdade é que nos últimos trezentos anos
temos vivido de nosso capital educacional. O mundo pós-renascimento,
desnorteado e entusiasmado com a profusão de novas “matérias”, separou-se
da velha disciplina (que, de fato, tornou-se tristemente maçante e
estereotipada em sua aplicação prática) e imaginou que dali em diante
poderia, por assim dizer, passar alegremente pelo novo e estendido
Quadrivium sem passar pelo Trivium. Mas a tradição escolástica, embora

quebrada e mutilada, demorou-se nas escolas e universidades públicas:


Milton, embora tenha protestado muito contra isso, foi formado por isso—o
debate dos Anjos Caídos e a disputa de Abdiel com Satanás tem as marcas
das ferramentas das Escolas, e poderiam, de forma rentável, figurar como
passagens estabelecidas em nossos estudos Dialéticos. Até o século XIX,
nossas relações públicas foram principalmente geridas, e nossos livros e
periódicos principalmente escritos, por pessoas criadas em lares e treinadas
em lugares onde a tradição ainda estava viva na memória e quase no sangue.

Assim, muitas pessoas que hoje são ateias ou agnósticas de religião são

governadas em sua conduta por um código de ética Cristão tão enraizado que
nunca pensariam em questioná-lo.

Mas não podemos viver do capital para sempre. Mesmo a tradição


mais enraizada, se nunca for regada, pode até demorar em morrer, mas no

final morrerá. E hoje um grande número—talvez a maioria—dos homens e


das mulheres que lidam com nossos assuntos, escrevem nossos livros e
jornais e figuram em nossas peças e nossos filmes, discursam de nossas
plataformas e púlpitos—sim, e que educam os nossos jovens—nunca, mesmo
em uma memória tradicional remanescente, foram submetidos à disciplina
Escolástica. É cada vez menos frequente ver que as crianças educadas
carreguem algo dessa tradição com elas. Perdemos as ferramentas da
aprendizagem—o machado e a cunha, o martelo e o serrote, o cinzel e o

aplanador—que eram tão adaptáveis a todas as tarefas. Em vez delas, temos


apenas um conjunto de gabaritos complexos, cada um dos quais fará somente
uma tarefa e nada mais, e ao usar o olho e mão carecem de qualquer
treinamento, de modo que ninguém consiga ver o trabalho como um todo ou
“olhar para o final da obra”.

De que serve empilhar tarefa sobre tarefa e prolongar os dias de


trabalho se no final da obra o objetivo principal não é atingido? A culpa não é
dos professores—eles já trabalham duro demais. A combinada insensatez de

uma civilização que esqueceu suas raízes está forçando eles a carregar o peso

cambaleante de uma estrutura educacional construída sobre a areia. Eles estão


fazendo para seus alunos o trabalho que os próprios alunos deveriam fazer.
Pois o único objetivo da educação é simplesmente isto: ensinar aos homens
como aprender por si mesmos; e toda instrução que não consiga fazer isto é

um esforço despendido em vão.


Sobre a autora

Paul M. Bechtel escreve que Dorothy Leigh Sayers (1893-1957)


iniciou-se brevemente na carreira de ensino após se graduar em Oxford. Ela
publicou uma longa e popular série de romances, traduziu a “Divina
Comédia”, escreveu uma série de peças de rádio e uma defesa da fé cristã.

Durante a segunda guerra mundial, ela morou em Oxford e foi um


membro do grupo que incluía C.S. Lewis, Charles Williams, J.R.R. Tolkien e
Owen Barfield. Por natureza e preferência, ela foi uma estudiosa e
especialista da Idade Média.

Neste ensaio, Miss Sayers sugere que atualmente ensinamos tudo para
nossos filhos menos como aprender. Ela propõe que adotemos uma versão
adequadamente modificada do currículo escolástico medieval por motivos
metodológicos

“The Lost Tools of Learning” (As Ferramentas Perdidas da


Aprendizagem) foi apresentado pela primeira vez por Miss Sayers em Oxford
em 1947.

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