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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ................................................................................................. 3
1 CONCEITO DE CRIMINOLOGIA ................................................................ 4
2 RAMOS E ATRIBUIÇÕES DA CRIMINOLOGIA ......................................... 5
3 A EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA CRIMINOLOGIA ....................................... 9
4 EVOLUÇÃO DA CRIMINOLOGIA ............................................................. 14
4.1 Precursores da Criminologia na Grécia .............................................. 14
4.2 Precursores da Criminologia em Roma .............................................. 15
4.3 Renascimento e a Criminologia .......................................................... 16
4.4 Período da Antropologia Criminal (1876-1890) .................................. 17
4.5 Período da Sociologia Criminal (1890-1905) ...................................... 18
4.6 Período da Política Criminal ou Fase Eclética (de 1905 às Tendências
Atuais das Teorias Criminológicas) ....................................................................... 19
4.7 Criminologia Tradicional ou Criminologia Clássica. ............................ 19
5 CRIMINALIDADE E CIÊNCIAS AFINS ..................................................... 19
6 OS QUATRO ELEMENTOS RELACIONADOS AO FENÔMENO
CRIMINAL: DO CRIME, DO DELINQUENTE, DAS PENAS E DA VÍTIMA ............... 21
6.1 Elementos do fenômeno criminal ....................................................... 21
6.2 O quarto elemento do fenômeno criminal........................................... 22
6.3 Conceito de Criminogênese ............................................................... 23
6.4 A dinâmica do delito e o itinerário do crime (iter-criminis). As variáveis
23
7 CLASSIFICAÇÃO GERAL DOS CRIMES................................................. 24
7.1 Quanto à previsão legal, segundo a gravidade (crime e contravenção)
25
7.2 Quanto à intenção .............................................................................. 25
7.3 Quanto à materialidade ...................................................................... 25
7.4 Quanto ao sujeito ............................................................................... 27
7.5 Quanto ao objeto ................................................................................ 28
7.6 Quanto à conduta ............................................................................... 30
7.7 Quanto ao processo executivo ........................................................... 30
7.8 Quanto ao concurso de agentes ........................................................ 31
7.9 Quanto aos atos que compõem a execução ...................................... 32

1
7.10 Quanto à persecução criminal......................................................... 32
7.11 Classificação dos crimes em espécie ............................................. 32
8 A PATOLOGIA SOCIAL ............................................................................ 33
8.1 A criminologia e o comportamento humano ....................................... 35
9 A MODERNA CRIMINOLOGIA E OS NOVOS MODELOS TEÓRICOS
EXPLICATIVOS DO FENÔMENO CRIMINOSO ....................................................... 38
9.1 A Biologia Criminal: Antropometria, antropologia, biotipologia,
neurofisiologia, os estudos de Eysenck e Mednick, endocrinologia, o substrato
bioquímico da conduta humana ............................................................................. 38
9.1.1 Antropometria e Antropologia ....................................................... 39
9.1.2 Biotipologia ................................................................................... 42
9.1.3 Endocrinologia .............................................................................. 42
9.1.4 Os estudos de Eysenck e Mednick, o substrato bioquímico da
conduta humana ................................................................................................ 43
9.2 Psicologia Criminal: Psicanálise, psicopatologia e psiquiatria ............ 44
9.3 Sociologia Criminal: A Escola de Chicago, teorias estrutural-
funcionalistas, teorias do conflito (A criminologia crítica), teorias subculturais ...... 45
9.3.1 A Escola de Chicago .................................................................... 45
9.3.2 Teorias estrutural-funcionalistas................................................... 48
9.3.3 Teorias do conflito (A criminologia crítica) .................................... 49
9.4 Teorias do Controle Social; o labelling approach (interacionismo
simbólico e construtivismo social). ......................................................................... 52
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ............................................................... 55
BIBLIOGRAFIA ............................................................................................... 55

2
INTRODUÇÃO

Prezado aluno,

O Grupo Educacional FAVENI, esclarece que o material virtual é semelhante


ao da sala de aula presencial. Em uma sala de aula, é raro – quase improvável - um
aluno se levantar, interromper a exposição, dirigir-se ao professor e fazer uma
pergunta, para que seja esclarecida uma dúvida sobre o tema tratado. O comum é
que esse aluno faça a pergunta em voz alta para todos ouvirem e todos ouvirão a
resposta. No espaço virtual, é a mesma coisa. Não hesite em perguntar, as perguntas
poderão ser direcionadas ao protocolo de atendimento que serão respondidas em
tempo hábil.
Os cursos à distância exigem do aluno tempo e organização. No caso da nossa
disciplina é preciso ter um horário destinado à leitura do texto base e à execução das
avaliações propostas. A vantagem é que poderá reservar o dia da semana e a hora que
lhe convier para isso.
A organização é o quesito indispensável, porque há uma sequência a ser
seguida e prazos definidos para as atividades.

Bons estudos!

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1 CONCEITO DE CRIMINOLOGIA

Fonte: www.eccc.mx

A palavra Criminologia foi empregada pela primeira vez em 1883, por


Topinard, e aplicada de forma universal por Rafael Garofalo, em sua obra
"Criminologia".
Para denominar essa matéria que é a "ciência do delito como conduta", a
história aplicou vários vocábulos, como "antropologia criminal", "biologia criminal",
"endocrinologia criminal", "reflexologia criminal".
Foi Lombroso quem deu início sistemático a antropologia criminal, precedido
anteriormente por João Batista Della Porta (1540/1615) Kaspar Lavater (1741/1801)
e Francisco Gall (1758/1828).
Tendo em vista a aproximação de várias classes do conhecimento, englobando
o saber criminológico e os diferentes âmbitos da realidade que devem ser analisados
para compreender o fenômeno da delinquência, define-se Criminologia como "ciência
empírica e interdisciplinar", que se ocupa da circunstância da esfera humana e social,
relacionadas com o surgimento, a comissão ou omissão do crime, assim como o
tratamento dos violadores da lei.
Jiménez de Asúa diz que:

A criminologia é a ciência causal-explicativa composta de quatro ramos


(antropologia criminal, psicologia criminal, sociologia criminal e penologia) e
distinta das ciências jurídico-repressivas (direito penal, direito processual
penal e política criminal), da ciência da investigação criminal (compreendendo
política criminal, medicina legal, penologia, psiquiatria forense, polícia
judiciária científica, criminalística, psicologia judiciária e estatística criminal)
(Luis Jiménez De Asúa, 1964, apud Paulo Timbó, et al, 2018, p. 04).

4
É lícito afirmar que, como ciência unitária e interdisciplinar que é, a Criminologia
se interliga às ciências humanas. De fato, a Biologia, a Psicologia e a Psicanálise são
instrumentos essenciais à Criminologia Clínica,
Por outro lado e como já foi explanado, a Criminologia igualmente se relaciona
com as ciências criminais: o Direito Penal lhe delimita o objeto; o Direito Processual
Penal inquire a ocorrência do ato criminal e se interessa pelo exame da personalidade
do delinquente; o Direito Penitenciário, através de seus laboratórios de Biotipologia,
regula o programa de ressocialização; a Medicina Legal, a Polícia Judiciária e a
“Policiologia” colaboram na investigação científica da materialidade do fato criminoso.
Pode perceber que os três elementos relacionados ao fenômeno penal - o
crime, o delinquente e a pena - constituem o centro das preocupações das ciências
penais no seu todo, ou seja, a denominada Enciclopédia das Ciências Penais, ciências
que assim são agrupadas e classificadas por Luis Jimenez de Asúa:
a) Ciências Histórico-Filosóficas: História do Direito Penal, Filosofia do Direito
Penal e Direito Penal Comparado;
b) Ciências Causal-Explicativas: Criminologia, Antropologia Criminal,
Sociologia Criminal, Biologia Criminal, Psicologia Criminal e Psicanálise Criminal;
c) Ciências Jurídico-Repressivas: Direito Penal, Direito Processual Penal e
Direito Penitenciário;
d) Ciências Auxiliares e de Pesquisa: Penologia, Política Criminal, Medicina
Legal, Psiquiatria Forense, Polícia Judiciária Científica, Criminalística, Psicologia
Judiciária e Estatística Criminal.

2 RAMOS E ATRIBUIÇÕES DA CRIMINOLOGIA

É importante salientar, ainda uma vez, a natureza científica da Criminologia e


sua autonomia. É ciência autônoma porque possui um objeto perfeitamente
delimitado: os fatos objetivos da prática do crime e luta contra o delito. Sua esfera de
ação, além disso, é demarcada pelo universo normativo do Direito.
Orlando Soares em sua obra, “Curso de Criminologia” disserta que a
delinquência é composta de quatro fenômenos que são: o crime, o delinquente, a pena
e a vítima (Orlando Soares, 2003, apud Evandro Andrade da Silva, 2003, p. 05).

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A propósito, de assinalar que, em reunião internacional da UNESCO, em
Londres, logrou-se desmembrar a Criminologia em dois ramos: Criminologia Geral e
a Criminologia Clínica. Desse conclave participaram criminologia do mais alto nível e,
dentre eles, Pinatel, Kinber, Wolfgang, Sellin e o brasileiro Leonídio Ribeiro. Esse
desmembramento, do consenso da UNESCO, inclusive foi acolhido por Lopez-Rey e
pelo ilustre médico e professor italiano Franco Ferracuti.
Para o sociólogo norte-americano Martin E. Wolfgang e para o psicólogo
italiano Franco Ferracuti, a Criminologia se desdobra em Criminologia Sociológica e
Criminologia Clínica. A Criminologia Sociológica compreende o magistério e a
investigação com base na Sociologia. A Criminologia Clínica se manifesta por via da
aplicação dos conhecimentos criminológicos e do estudo dos problemas forenses e
penitenciários, consistindo, em síntese, na aplicação integrada e conjunta do saber
criminológico e técnico para solução de casos particulares, com fins de diagnóstico e
terapêutica.
As disciplinas preconizadas por Wolfgang e Ferracuti seriam de dois tipos: a)
disciplinas fundamentais ou ciências criminológicas: Biologia Criminal, Psicologia
Criminal, Sociologia Criminal, Penologia e Criminologia propriamente dita; b) ciências
anexas e Medicina Legal, Psicologia Judiciária e Polícia Científica.
Por sua objetividade e abrangência, a divisão adotada pela UNESCO é da
Criminologia Geral e Criminologia Clínica, competindo à primeira a comparação e
sistematização dos resultados obtidos nas diversas ciências criminológicas e
estudando, a partir desse momento, o criminoso, o crime e a criminalidade. O crime
sendo considerado consoante a situação do ato criminoso, sua forma, os fatores da
infração e a dinâmica de determinados delitos. O criminoso sendo analisado segundo
a disposição hereditária, o biótipo, o transtorno mental e o mundo circundante. A
criminalidade sendo encarada em razão de suas tendências, dos tipos criminosos e
da violência empregada.
Como bem esclarecem Wolfgang e Ferracuti, a Criminologia Clínica consiste
no approche interdisciplinar no caso individual, com a contribuição dos princípios e
métodos das ciências criminológicas. O objetivo desse enfoque interdisciplinar é
estudar a personalidade do delinquente para estabelecer o diagnóstico criminológico
e a prognose social, com proposta do plano de ressocialização do criminoso (Marvin
E. Wolfgang et al, 1971, apud Evandro Andrade da Silva, 2003, p. 06). Em outras
palavras: aplicar os princípios e métodos das criminologias especializadas,

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comportando as seguintes etapas: exame, diagnóstico, prognóstico e tratamento. O
grande mérito do exame criminológico é aquele de ensejar o conhecimento integral
do homem delinquente, sem o que não se aplicará uma justiça eficaz e apropriada,
restando mero critério de valorização político-jurídica.
A Criminologia Clínica consiste na aplicação pragmática do conhecimento
teórico da Criminologia Geral, sem que isto desvirtue o caráter autônomo daquela,
conquanto intimamente ligadas ambas as criminologias. Além do mais, a pesquisa
científica tem como ponto de partida a Clínica Criminológica. Clínico e pesquisador se
completam no progresso científico da Criminologia.
Vale lembrar que é a Criminologia Geral que sistematiza os resultados das
criminologias especializadas e os dados da prática criminológica. O caso particular
demanda um estudo interdisciplinar, com supedâneo nas ciências criminológicas e na
experiência clínica dos centros de observação e estabelecimentos de reeducação do
delinquente. A observação científica é um dos métodos da Criminologia Clínica,
seguida de interpretação no caso de diagnóstico criminológico, ainda que na fase de
execução do tratamento reeducativo, antes, portanto, da classificação penitenciária
ou início do programa de reeducação do delinquente.
Para Pinatel, a futura Criminologia sairá da elaboração e sistematização da
prática criminológica (Jean Pinatel, 1984, apud Evandro Andrade da Silva, 2003, p.
07). Tem-se a Criminologia Clínica como o traço de união entre a Criminologia
propriamente dita e a Penologia. A Criminologia Clínica, em última instância, tem por
finalidade o estudo da personalidade do delinquente e o seu tratamento. Dissente, por
consequência, da Psiquiatria Criminal, que se restringe à perícia psiquiátrica e à
avaliação da responsabilidade criminal. No plano científico, na verdade, a Criminologia
Clínica principia onde finda a Psiquiatria Médico-Legal, melhor dizendo, onde se
abandona o domínio patológico.
A rigor, o estudo da Criminologia Clínica deverá absorver sua
interdisciplinaridade e também os seguintes temas: Penologia, Direito Penitenciário,
exame médico-psicológico e social do delinquente, classificação penitenciária e plano
de tratamento reeducativo do preso, espécies de tratamento (institucional em
semiliberdade etc.), métodos de trabalho reeducativo (pedagógicos, psicológicos,
psiquiátricos, sociológicos) execução do processo de cura reeducativo (labor nos
centros de observação, nas casas de reeducação, nos hospitais de custódia e as-
sistência psiquiátrica etc.).

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Embora voltada para a reeducação do delinquente e sua reinserção social, a
Criminologia Clínica igualmente contribui para a prevenção da criminalidade e para a
extirpação das condições criminógenas da sociedade através de pesquisas junto à
coletividade e notadamente em bairros miseráveis e favelas.
Compete, enfim, à Criminologia, servindo-se do método científico, o estudo do
criminoso e do crime, como acontecimentos sociais que são provindos de múltiplas
causas internas e externas. Minudenciando a conceituação, o criminologista Orlando
Soares indica, com descortino, que a Criminologia é ciência que pesquisa: as causas
e concausas da criminalidade; as causas da periculosidade preparatória da
criminalidade; as manifestações e os efeitos da criminalidade e da periculosidade
preparatória da criminalidade; a política a opor, assistencialmente à etiologia da
criminalidade e à periculosidade preparatória da criminalidade (Orlando Soares, 2003,
apud Evandro Andrade da Silva, 2003, p. 06).
É asserção pacífica que a Criminologia tem objeto independente e
determinado. Sendo uma ciência realista e não normativa, a Criminologia tem como
objeto a dimensão naturalística do evento criminoso.
O criminólogo absolutamente não poderá ser observador passivo da sucessão
criminal. Não. Ele terá que ser um participante ativo, seja como cidadão, seja como
pesquisador, contribuindo com seu know-how de conhecimentos na abordagem e
perquirição do fenômeno criminal.

Fonte: cursosonline.uol.com.br

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Utilizar-se-á, o criminologista, da experimentação direta e indireta. Por via da
experimentação direta, alcançada por intermédio de dados propiciados pelos sistemas
penitenciários, ele terá elementos de valia para indagar, verticalmente, a transição do
homem normal ao homem delinquente. Concernentemente à experimentação indireta,
ela será desenvolvida com o estudo dos fatos anormais naturalmente sucedidos.
Aqui, como ensina Roberto Lyra, o criminologista não poderá olvidar que "o
crime é um fato social de consequências jurídicas e não um fato jurídico de aspectos
sociais" (Roberto Lyra, 1990, apud Evandro Andrade da Silva, 2003, p. 07). Terá que
saber o criminologista, por outro lado, que os fatos sociais são processos de interação
que envolve as pessoas, os grupos coletivos e as heranças sociais, não havendo
critérios infalíveis para diferenciar o homem que poderá delinquir daquele que não
poderá delinquir. Comporta, por oportuno, a afirmativa de Gabriel Tarde que "nenhum
de nós pode se gabar de não ser um criminoso nato relativamente a um estado social
determinado, passado, futuro ou possível" (Jean-Gabriel de Tarde, 1886, apud
Evandro Andrade da Silva, 2003, p. 07). A ideia do crime, verdadeiramente, é inata no
homem, talvez preexistindo à sua própria consciência.
A Criminologia é a ciência que estuda o fenômeno criminal, a vítima, as
determinantes endógenas, que isolada ou cumulativamente atuam sobre a pessoa e
a conduta do delinquente, e os meios labor-terapêuticos ou pedagógicos de reintegrá-
lo ao grupamento social.

3 A EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA CRIMINOLOGIA

Condutas que outrora eram atos normais e obrigatórias dos costumes da


época, com o tempo se tornaram crimes, e condutas que outrora eram crime, se
tornaram fatos normais, conforme vejamos a seguir:
Salienta Lombroso que a mesma dificuldade que se apresenta no estudo do
crime, dentre os animais em geral, observa-se em relação aos seres humanos
primitivos (Cesare Lombroso, 1876, apud Evandro Andrade da Silva, 2003, p. 08).
Certas práticas, mais tarde consideradas delituosas, eram, por assim dizer, a
regra geral; todavia, algumas dessas práticas confundem-se em suas origens com
ações menos criminosas.

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Tais práticas, nos diversos idiomas, em sua origem, revelam que não há uma
diferença nítida entre ação e crime, surgindo logo depois a ideia de pecado, ou seja,
desobediência aos deuses.
Todas as línguas convergem no sentido de nos apresentar a rapina e o
assassinato como a primeira fonte da propriedade, aliás, um dos aspectos do
darwinismo social como se verá oportunamente.
Algumas práticas comuns entre os selvagens foram criminalizadas no curso da
civilização, como, por exemplo, o aborto. Em certas épocas, a escassez de alimentos,
as dificuldades de vida e outros fatores constituíram motivos, entre os primitivos, para
a prática do abortamento.
O aborto premeditado, desconhecido dos outros animais, foi comum entre os
selvagens, tanto nas primitivas tribos orientais, como na América, através de
expedientes rústicos, tais como, pancadas redobradas no ventre.
Contemporaneamente, algumas tribos aborígenes brasileiras conservam a
prática do aborto da forma acima referida (in Direitos Humanos na Amazônia,
publicação do Inst. dos Ad. Brasileiros, ps. 226 e 227, RJ,1997).
As mesmas causas do aborto tornaram frequente o infanticídio, entre os
primitivos; sacrificava-se aquele que vinha logo após o primogênito ou o segundo, e
de preferência as meninas, como ocorria na Austrália e na Melanésia.
Na Índia, do Ceilão ao Himalaia, o infanticídio é consagrado pela religião.
No Japão e na China, o infanticídio era uma forma de reduzir o crescimento
populacional. Da mesma maneira, na América e na África.
Em algumas tribos da África Meridional, após o infanticídio a criança era
utilizada como isca para pegar leões; em certas regiões da Austrália matavam-se as
crianças e sua gordura era utilizada em anzóis, para as pescarias.
Na América, dentre os tasmanianos, pele-vermelha e esquimó, a morte da mãe
era motivo para o infanticídio, porque o costume queria que as crianças fossem
enterradas com ela.
Segundo Lombroso, havia outras causas para o infanticídio entre os primitivos:
os preconceitos, por exemplo, como a aversão aos gêmeos, encarados como prova
da infidelidade da mulher, pois entendia-se que o homem só podia produzir um filho
de cada vez (Cesare Lombroso, 1876, apud Evandro Andrade da Silva, 2003, p. 08)
Na África, quando as mulheres não podiam criar seus filhos, desesperadas pela
fome, jogavam-nos no rio.

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O dever de assassinar os pais idosos, com mais de 70 anos, conservou-se, por
transmissão hereditária, como um ato de piedade, mesmo sem necessidade, e às
vezes, por acreditar-se que as qualidades e virtudes do sacrificado se transmitiriam
aos descendentes.
Algumas vezes ocorriam sepultamentos em vida; as vítimas achavam o fato
natural e elas próprias pediam a morte, caminhando deliberadamente em direção à
cova onde deviam repousar em definitivo, ou deixadas em abandono.
A religião ensinava que se entrava na vida futura no mesmo estado em que se
estava para deixar a Terra. O hábito de matar os velhos e os doentes foi praticado na
Europa, Ásia, África e América.
Além do assassinato dos velhos e doentes, ocorriam homicídios de crianças,
mulheres e homens sadios, seja por motivos religiosos, seja por instintos ferozes.
Às vezes, por ira, as disputas conjugais acabavam pelo assassinato da mulher;
o marido, após matá-la, comia o seu coração com um guisado de cabra.
 As concepções lombrosianas, inspiradas na teoria de Darwin, sobre a
criminalidade dentre os animais
Em síntese, no tocante à comparação entre o equivalente daquilo que se
considera crime, entre os homens, e certas ocorrências em relação às plantas,
Lombroso invocou as observações de Darwin e outros naturalistas:
As plantas insetívoras (que comem insetos), cometem assim verdadeiros
assassinatos, atraindo-os por meio duma secreção viscosa, para em seguida os
devorar, como meio de se nutrir.
Outras plantas caçam os insetos à semelhança da maneira como os
pescadores preparam armadilhas para os peixes.
Essas práticas sobressaem com muito mais evidência em relação ao mundo
animal, na ânsia de nutrição, por meio do sacrifício das outras espécies, e, algumas
vezes, através do canibalismo, quando então o ser humano, assim como outros
animais, devoram os da mesma espécie, não só levados por fome, como também por
outras motivações, tais como a ira.
Por sua vez, Ferri distinguiu, só para o assassinato, várias motivações entre os
animais em geral. Certos animais, por exemplo, da mesma espécie, vivem em comum,
mas os mais fortes devoram os mais fracos; isso é comum dentre os peixes (Enrico
Ferri, 1929, apud Evandro Andrade da Silva, 2003, p. 10).

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É frequente não só o canibalismo dentre os animais, como o infanticídio e o
parricídio. A fêmea do crocodilo, às vezes, come seus filhotes, que não sabem nadar.
As abelhas defendem furiosamente as colmeias, onde armazenam o mel, produto do
seu labor. Há roedores - a fêmea do rato, por exemplo - que devoram seus filhotes,
quando molestados. A fêmea do sagui, às vezes, come a cabeça do filhote, ou
esmaga-o contra uma árvore, quando cansada de carregá-lo. Dentre os gatos, as
lebres, os coelhos, alguns comem seus filhotes. O canibalismo e o parricídio são
encontrados dentre as raposas, cujos filhotes se entredevoram, frequentemente, e às
vezes devoram a própria mãe. Certa perversidade, rebeldia e antipatia aparecem em
animais com deformações cranianas, determinando maus instintos e práticas
criminosas. A velhice torna os animais desconfiados, teimosos, perigosos, agressivos,
por isso são expulsos pelos companheiros e então, no isolamento, tornam-se mais
perversos.
A fúria, a ira e a raiva são comuns em certos animais, que matam seus
semelhantes, sem nenhum motivo, violando os hábitos da maioria. Ocorrem também
delitos passionais, por paixões exacerbadas, sobretudo pelo amor, pela cobiça, pelo
ódio. Dentre as aves e os pássaros, às vezes, o macho destrói o próprio ninho, num
acesso de fúria; aves domésticas atacam o ser humano. Durante o cio, as fêmeas,
dentre certos animais, tornam-se furiosas.
Têm-se observadas certas práticas entre as formigas, semelhantes à violência
sexual, por parte dos machos adultos contra os menores, assim como entre certas
aves.
Ocorrem, também, práticas sexuais dentre animais de diferentes espécies, à
semelhança da bestialidade, em relação ao ser humano.
Às vezes, as cegonhas massacram os filhotes das companheiras, sob os olhos
de suas próprias mães; outras matam os membros do bando que no momento da
imigração se recusam ou não conseguem segui-las.
Embora sejam poucos os animais, dentre os gatos, cachorros, elefantes,
cavalos, que se mostram brigões, indomáveis, assassinos, isso, porém, tanto quanto
dentre os seres humanos, repugna aos demais.
A premeditação e a emboscada são comuns nas práticas criminosas dentre os
animais.
Os cinocéfalos (gênero de macacos de cabeça semelhante à do cão) são
perfeitos ladrões. Quando vão saquear uma plantação, colocam uma sentinela, para

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que dê o alarme, no momento em que o homem se aproxima. Esta sentinela deve
ficar muito atenta, porque sabe que se falhar, seus companheiros lhe infligirão a pena
de morte (Cesare Lombroso, 1876, apud Evandro Andrade da Silva, 2003, p. 11).
É importante para uma ciência que tenha um objeto e um método, exame de
seu conteúdo histórico. Na filosofia grega concebia-se a infração contrário a coisa
pública, e o delinquente responsável por sua ação, deveria sofrer uma pena como
elemento pedagógico.
Na Idade Média, mais precisamente no começo do século XVII, a filosofia e a
teologia influenciavam o Direito Penal, havendo uma enorme confusão entre delito e
pecado, delinquente e pecador.
No Código de Hamurabi, no século XVI e XVII A.C., tínhamos já as
responsabilidades distintas entre delinquente rico e delinquente pobre.
Não existe condições exatas de fornecer algo sistematicamente pronto antes
do início da escola clássica, pois o que em realidade havia eram trabalhos esparsos.
A expressão Criminologia teria sido usada pela primeira vez pelo antropólogo
francês Topinard, em 1883. Em 1885, Rafael Garofalo, apresenta uma obra científica
A Criminologia.
A base fundamental do pensamento iluminista foi a partir do reconhecimento
do estado natural. No estado natural, os homens gozam de igual liberdade e se
perdem pelo contrato social, que fazem ganhar sua liberdade civil e a propriedade de
tudo que possuem.
O delinquente que se coloca contra o contrato social é um traidor e, portanto, é
expungido do mesmo.
Cesare Bonesana, Marquês de Beccaria, é quem melhor coloca o problema do
delito e da pena. Adotam os iluministas posição crítica a respeito das coisas existentes
e também respeito ao Estado e sua estrutura.
A Escola Clássica considera a pena um mal que deva eliminar outro mal. Para
a Escola Carrariana, todos os homens são iguais, livres e racionais. Por tal fato, a
pena é eminentemente retribucionista, e seu fundamento está em ter o homem
conspurcado o social.
Nos positivistas, apesar de terem afrontado claramente os clássicos,
encontramos correntes utilitárias, além do racionalismo e do cientificismo.
Foi em 1876, aproximadamente um século após o livro de Beccaria, que
tivemos a primeira edição do Homem Criminoso, de Cesare Lombroso.

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Tínhamos aí as ciências do homem e a contribuição das Origens das espécies,
1859, de Darwin, e Descendentes do homem, 1871.
Foi Comte quem destacou a importância social da ciência, e com tal
significação, da sociedade social. Tudo isso implica a contradição de todo pensamento
iluminista, cujo alicerce é a metafísica.

4 EVOLUÇÃO DA CRIMINOLOGIA

Fonte: www.viu.es/

A sistematização científica da Criminologia constitui esforço recente,


abrangendo inclusive o estudo de sua evolução, segundo o critério de divisão em
períodos históricos ou fases, como o fez Israel Drapkin (Manual de Criminologia, pp.
9-69).

4.1 Precursores da Criminologia na Grécia

Na antiga Grécia, a mitologia está repleta de condutas delituosas: homicídios,


roubos, violações. Zeus, por exemplo, o pai dos deuses, pode ser considerado aquilo
que Lombroso qualificou de "criminoso-nato"; ApoIo é homossexual; Poseidon, deus
do mar, é outro maníaco sexual; Vênus é mentirosa, cruel e adúltera; Hermes, um
criminoso precoce, e assim por diante.

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Dentre os pensadores gregos, que se destacaram no estudo dos problemas
criminais, encontramos algumas ideias precursoras.
Arquimedes (287-212 a.c.), grande físico e matemático, figura como o precursor
da Criminalística, das perícias e exames criminais.
Considera-se Hipócrates o iniciador da corrente biologista da Criminologia.
Por sua vez, Platão (427-347 a.c.) que é considerado o precursor das correntes
sociológicas da Criminologia; assinalava que o crime é produto do meio ambiente; a
miséria é um fator criminógeno, pois produz vadios e indivíduos sórdidos; o ouro é
causa de muitos delitos, porquanto a cobiça é gerada pela abundância, que consegue
apoderar-se da alma enlouquecida pelo desejo.

4.2 Precursores da Criminologia em Roma

Em Roma, Sêneca (c. 4 a.C.-65 d.C.) é considerado o criminólogo de maior


destaque; em sua análise sobre a ira, ele a considera como motor básico do crime,
por isso que a sociedade está sempre em luta fratricida.
Sobre os aspectos das causas econômicas, como causa da criminalidade, não
existe nada em Roma, salvo uma polêmica entre os que a consideravam um fenômeno
social e os estoicos e epicuristas, que exaltavam a pobreza, fonte da felicidade e a
força moral dos homens, pois entendiam que a riqueza os entorpecia e corrompia.
Os chamados "doutores da Igreja" e escolásticos não se ocuparam do
problema da criminalidade, até que o monge Tomás de Aquino (1226-1274) sustentou
algumas ideias próprias a respeito. Na Summa contra gentiles afirma que a pobreza
é em geral uma ocasião de roubo. Na Summa Theologica, defende o furto famélico,
e, sob certos aspectos, ideias socialistas.
Por sua vez, o monge Agostinho, embora vivesse no período de 354 a 430 d.C.,
é considerado um pensador medieval; para ele, a pena de talião "é a justiça dos
injustos". Sustentava que a pena deve significar uma ameaça e um exemplo. Deve
ser também a medida de defesa social, mas, principalmente, contribuir para a
regeneração do culpado.
Da mesma forma, a Astrologia - conhecida desde a Antiguidade, entre os
chineses, hindus, egípcios e os maias -, sustentava que o comportamento se rege
pelos atos e seus movimentos, influenciando assim a conduta delituosa humana.

15
Aliás, desde a mais remota antiguidade, a mitologia, a religião e Astrologia
estavam intimamente ligadas, servindo hoje de meios auxiliares para diversas
ciências. A Astrologia, por exemplo, é considerada vestíbulo da Astronomia.
A Demonologia, por sua vez, estudava a situação dos indivíduos loucos,
sujeitos a ataques de toda ordem, considerando-os possuídos pelos demônios, o que
permitiu inomináveis crueldades e torturas, sob o manto de abusos da religião.
Quando os algozes e torturadores dos tribunais da Inquisição supliciavam o suspeito
de heresia, faziam-no na firme e fanática convicção de que, quebrantando as forças
físicas da vítima, estavam com isso enfraquecendo as resistências dos demônios, os
quais supostamente dominavam os suplicados.
Assim, a Demonologia, tentando estabelecer a relação entre o corpo e a alma
humana - o orgânico e o psíquico -, preocupa-se com a "natureza e as qualidades dos
demônios"; ela tem antecedentes muito antigos, como na religião do Irã, onde se
adorava um deus bom (Ormuz) e um mau (Ahra-Mani).

4.3 Renascimento e a Criminologia

O Renascimento, como se sabe, constituiu um renascer cultural, sustentado


pelos próprios humanistas dos séculos XIV, XV e XVI.
Em oposição aos que consideravam as "trevas medievais", os humanistas
exaltaram os novos tempos, em que ressurgem as Letras e as Artes: Petraca orgulha-
se de haver feito renascer os estudos clássicos, por muitos séculos esquecidos;
Boccaccio atribui a Dante o ressurgimento da poesia e a Giotto, o renascer da pintura,
e assim por diante.
Entre os filósofos e pensadores dos séculos XVI e XVII, relativamente à
Criminologia, destacou-se Thomas Morus (1478-1535), que foi chanceler de Henrique
VIII.
Em sua obra Utopia, Morus descreve a enorme onda de criminalidade que
assolava a Inglaterra, na época em que ele viveu, época essa marcada pela
truculência oficial, com a aplicação sumária da pena de morte. Aliás, o próprio Morus
acabou sendo decapitado por determinação de Henrique VIII.
A Utopia representa a primeira crítica, fundamentada, ao regime burguês em
ascensão e uma análise profunda das particularidades inerentes ao feudalismo em
decadência.

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A primeira parte da obra é o espelho fiel das injustiças e misérias da sociedade
feudal; é, em particular, o martirológico do povo inglês sobre o reinado de Henrique
VIII, um tirano avarento. Eram, porém, várias as causas da opressão e sofrimento do
povo: a nobreza e o clero possuíam a maior parte do solo e das riquezas públicas;
estes bens permaneciam estéreis, enquanto a fome atormentava a população.
Além disso, nessa época, os grandes senhores mantinham na multidão de
vassalos, seja por amor ao fausto, seja para - como polícia particular, capangas -
assegurar a impunidade dos crimes praticados pelos seus amos, ou ainda para utilizar
ditos vassalos como instrumentos de violência contra os habitantes da vila. Essa
vassalagem era o terror do camponês e dos trabalhadores em geral.
Por outro lado, o comércio e a indústria, na Inglaterra não tinham muita
expansão antes das descobertas de Vasco da Gama e Colombo. Assim, as gerações
se sucediam sem finalidade, sem trabalho, sem pão. A agricultura estava em ruínas,
desde que a nascente indústria da lã, prometendo lucros espantosos, fez com que
terras imensas fossem transformadas em pastagens para carneiros. Em
consequência disto, a multidão de camponeses viu-se reduzida à miséria, provocando
a multiplicação da mendicidade, vagabundagem, roubos e assassínios.

4.4 Período da Antropologia Criminal (1876-1890)

Paralelamente ao desenvolvimento das Escolas de Direito Penal surgiram


diversas teorias, que constituíram as bases da sistematização científica da
Criminologia, no século XIX.
Sob certo aspecto, as discussões estiveram centradas, em parte, no enfoque
filosófico acerca do binômio livre arbítrio e determinismo, em relação às condutas
delituosas do ser humano, e de outro lado na questão antropológica, no ativismo.
Malgrado a vulnerabilidade de suas teorias, acerca do criminoso nato, Cesar
Lombroso (1835-1909) desenvolveu uma série de estudos e pesquisas, que
polarizaram as atenções do mundo científico de então, quando, em 1876, ele publica
o seu momentoso livro o Homem Delinquente, onde aborda, inclusive, aspectos
relacionados à criminalidade em geral, dentre as diversas espécies animais, como
vimos anteriormente.
Dentre os fundadores da Escola Positiva, em Direito Penal, considera-se
Lombroso o antropólogo, Garofalo o jurista e Ferri o sociólogo.

17
Incontestavelmente, Lombroso teve o mérito de contribuir para a sis-
tematização científica da Antropologia Criminal, com o que desviou a atenção do fato
criminoso - até então a preocupação máxima dos criminalistas - abrindo o caminho
para o surgimento da Escola Positiva, em oposição à Escola Clássica.

Fonte: www.cicloceap.com.br

4.5 Período da Sociologia Criminal (1890-1905)

Este período evolutivo da Criminologia se confunde com o nome de escola


Francesa ou de Lyon, ou das teorias do meio ambiente. Estas teorias compreendem
todas as concepções sociais e ambientais que se levantaram contra as concepções
lombrosianas, as quais se centravam na ideia de que fatores endógenos, ou seja,
individuais, predominavam na conduta do indivíduo, como decorrência do atavismo,
resultando no criminoso nato.
Para a Escola Francesa, ao contrário, eram os fatores exógenos, isto é,
ambientais, os mais importantes em relação à conduta do indivíduo, levando-o ao
crime, em determinadas circunstâncias.
Para essas teorias contribuíram as ideias de Augusto Comte (798-1857), os
estudos de Quetelet, Emílio Ducpétiot (1804-1868).

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4.6 Período da Política Criminal ou Fase Eclética (de 1905 às Tendências
Atuais das Teorias Criminológicas)

Esse período se caracteriza por uma espécie de trégua na discussão inflamada,


resultante do entrechoque de ideias entre as teorias francesas e italianas, sobre as
teorias lombrosianas.
Surgiram três Escolas:
1) A Terza Scuola
2) A Escola Espiritualista
3) A Escola de Política Criminal

4.7 Criminologia Tradicional ou Criminologia Clássica.

A Criminologia Tradicional ou Criminologia Clássica engloba diferentes matizes


ou vertentes, originários todos, direta ou indiretamente, da fonte comum: a Escola
Positiva.
Para a Criminologia Tradicional ou Clássica há, fundamentalmente, certos
comportamentos humanos considerados maus, em si, apenados em virtudes de
normas que são, supostamente, produto de um consenso coletivo, segundo as
concepções da democracia burguesa, o liberalismo político-econômico.
Em suma, a Criminologia Tradicional ou Criminologia Clássica se revela
estacionária, imobilista. Não atenta para o fundamental: a permanente crise crônica
do sistema capitalista, decorrente dos antagonismos e contradições insuperáveis,
inerentes ao próprio sistema.

5 CRIMINALIDADE E CIÊNCIAS AFINS

O termo enciclopédia se aplica a qualquer obra que abranja todos os ramos do


conhecimento.
Nesse sentido, destacaram-se os cognominados enciclopedistas franceses,
elaboradores da teoria do liberalismo (século XVIII), que serviu de fundamento ao
advento do Estado liberal, após a Revolução Francesa (1789).
Dentre esses enciclopedistas notabilizaram-se D'Alembert, Diderot, Buffon,
Hume, Montesquieu, Rousseau e Helvetius, que procuraram, antes de tudo, "a

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distinção entre a justiça divina e a justiça humana, pugnando pela soberania popular
contra o absolutismo medieval, pelos direitos e garantias individuais contra o Estado
totalitário do Direito divino" (Roberto Lyra, 1956, apud Evandro Andrade da Silva,
2003, p. 25).
Essa época foi considerada o período humanitário do Direito Penal, a partir da
publicação da obra de Cesar Bonesana (1738-1794), marquês de Beccaria, nascido
na Itália, trabalho esse intitulado Tratado dos Delitos e das Penas, quando o autor
contava 26 anos de idade, por volta de 1764; modestamente, ele afirmou que escreveu
dita obra sob a inspiração dos enciclopedistas franceses.
Seja como for, acentua Enrico Ferri, nem os romanos, com sua extraordinária
intuição para os fenômenos jurídicos - intuição essa consubstanciada no acervo
notável que legaram à posteridade no campo do Direito Civil -, nem os juristas da
Idade Média lograram estruturar uma teoria científica em matéria criminal, como
sistema filosófico (Enrico Ferri, 1905, apud Evandro Andrade da Silva, 2003, p. 25).
Nessa perspectiva, antropologia é a ciência do homem, como ser social e
animal. A Antropologia se divide em dois amplos campos de estudo: um se refere à
forma física do homem, o outro a seu comportamento aprendido. Chamam-se,
respectivamente, Antropologia Física e Antropologia Cultural.
A Antropologia Criminal baseia-se nos princípios gerais da Antropologia,
Psicologia, Patologia, Psiquiatria, Biologia, Anatomia, Eugenia, Embriologia e
Biotipologia.
A Biologia Criminal é a ciência que trata dos seres vivos ou organismos, suas
origens, natureza e evolução.
Psicologia Criminal é o ramo da Psicologia que estuda as manifestações
psíquicas, através do estudo e da classificação dos processos psíquicos do homem
delinquente.
Psicanálise Criminal é o ramo da Psicanálise que se dedica ao estudo da
personalidade do delinquente, partindo das angústias e dos complexos de culpa que
o afligem, levando-o à procura da bebida, da droga, enveredando pelos caminhos do
crime, para a solução dos seus problemas íntimos.
Sociologia Criminal é a ciência que estuda o fenômeno criminal do ponto de
vista da influência do meio social sobre a conduta humana criminosa.

20
6 OS QUATRO ELEMENTOS RELACIONADOS AO FENÔMENO CRIMINAL: DO
CRIME, DO DELINQUENTE, DAS PENAS E DA VÍTIMA

Fonte: ribeirao.usp.br

6.1 Elementos do fenômeno criminal

Consideram-se elementos do fenômeno criminal os componentes deste, ou


seja, o crime, o criminoso, a pena e a vítima.
Historicamente, a Escola Clássica do Direito Penal (em que se destacou
Francesco Carrara, Itália, 1805-1888) considerava elementos clássicos dessa ciência
penal o crime e a pena, enfatizando assim esses dois aspectos do fenômeno criminal,
ou seja, a gravidade do fato, consistente na violação da norma dessa natureza, com
a consequente sanção imposta pelo poder competente do Estado.
Esse entendimento orientou as codificações penais surgidas no século XIX,
como no caso do nosso Código Criminal de 1830.
Aliás, a denominação Código Criminal - em lugar de Código Penal demonstra,
por si só, a ênfase atribuída ao elemento crime; na atualidade, alguns penalistas ainda
preferem essa terminologia.
Mais tarde, porém, a Escola Positiva (em que se destacaram Lombroso e Ferri)
começou a chamar a atenção sobre o delinquente, como ser vivo e efetivo,
aparecendo assim como o "protagonista da justiça penal", como o apresentou Ferri,

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considerando-o em sua "personalidade individual, em sua identidade biológica e em
sua realidade como ser profundamente dependente do meio social em que vive"
(Enrico Ferri, 1929, apud Evandro Andrade da Silva, 2003, p. 40).
Daí a oportunidade da afirmação de Gabriel Tarde: "Nenhum de nós pode se
gabar de não ser um criminoso-nato, relativamente a um estado social determinado,
passado, futuro ou possível" (Jean-Gabriel de Tarde, 1886 apud Evandro Andrade da
Silva, 2003, p. 40).
A partir daí o delinquente passou a ter um papel destacado no Direito Penal,
suscitando a atenção dos criminólogos, filósofos, sociólogos, penalistas e outros, no
sentido do esforço de elaboração de normas legislativas específicas, pertinentes ao
sujeito ativo da infração penal, figurando assim como terceiro elemento do fenômeno
criminal.
Nesse sentido, surgiram as normas inscritas nos Códigos Penais, como
aquelas referentes à individualização da pena, periculosidade, aplicação de medida
de segurança, entre outras.

6.2 O quarto elemento do fenômeno criminal

Contemporaneamente, a vítima, sujeito passivo da infração penal, foi


classificada como o quarto elemento do fenômeno criminal.
Passou por três períodos, sendo eles: o protagonismo ou idade de ouro, a
neutralização (vítima foi totalmente abandonada pelo estado, que era o detentor do
direito de punir) e redescobrimento. Foi neste último período que a vítima passa a ser
protegida pelo Estado, onde por volta de 1950 com o estudo vitimológico desenvolvido
por Benjamin Mendelsohn foram reconhecidos os direitos da vítima.
Diante de todo o ocorrido, a vítima ganha espaço após a expansão dos objetos
de estudo da criminologia e a segunda Guerra Mundial.
Em suma, os quatro elementos acima elencados constituem o centro das
preocupações das ciências penais, sob as diferentes angulações, próprias de cada
uma delas, como veremos oportunamente.
A propósito, convencionalmente, o termo penalista serve para designar o
estudioso, professor, tratadista de Direito Penal, enquanto o vocábulo criminalista se
aplica ao causídico, advogado que se dedica às causas criminais, cujo sucesso
profissional costuma proporcionar-lhe larga fama.

22
6.3 Conceito de Criminogênese

A Criminogênese é o capítulo da Criminologia que estuda os mecanismos de


natureza biológica, psicológica e social, através dos quais se engendram e
desencadeiam os comportamentos delituosos.
Trata-se, portanto, dum esforço que requer concorrência interdisciplinar, de
natureza sociológica, econômica, filosófica, política, médica, psicológica para a
conceituação da Criminogênese.
Sob esse aspecto, o psicológico, por exemplo, entrega-se à tarefa de
compreender o crime e descobrir a motivação: "Estudos psicanalíticos modernos
vieram comprovar que o delinquente e aquele que jamais infringiu a lei não são
diferentes morfologicamente no sentido de Lombroso. São diversos na maneira de
dominar os impulsos antissociais, presentes nos criminosos e nos que não o são.
Dessa forma, o delinquente realiza no plano real os próprios impulsos antissociais
inconscientes. Já o indivíduo socialmente adaptado tem maiores possibilidades em
reconhecer que a realização daqueles impulsos redundará em seu próprio prejuízo e
no da comunidade" (Luiz Ângelo Dourado, 1965, apud Evandro Andrade da Silva,
2003, p. 41).
Por sua vez, o político, o criminólogo, o sociólogo, e assim por diante, nas suas
respectivas áreas de conhecimento, enfocarão a questão criminal, buscando a
pesquisa de suas causas, bem como os meios de sua prevenção e modos de
tratamento do criminoso, e assim por diante, contribuindo para o aprimoramento da
Criminogênese.

6.4 A dinâmica do delito e o itinerário do crime (iter-criminis). As variáveis

Segundo os princípios tradicionais de Direito Penal, o delito apresenta


regularmente o chamado iter-criminis (itinerário do crime), o qual é iniciado pela
simples cogitação impunível (nuda cogitatio), seguindo-se a preparação (conatus
remotus) só punível quando em si constitui ilícito penal; adiante a execução (conatus
proximus) e a consumação (meta opta ta).
Nesse contexto, apresenta-se a seguinte indagação, formulada por Mezger: o
delito é um produto da disposição e da índole genuína do delinquente e do meio

23
ambiente, ou seja, uma resultante dos fatores endógenos e exógenos? (Edmund
Mezger, 1935, apud Evandro Andrade da Silva, 2003, p. 41)
Em outras palavras, como se desenvolve a dinâmica do delito? Discussões
acaloradas e intermináveis se desencadearam a respeito, isto é, sobre a relação
recíproca de ambos os tipos de causas e sobre o predomínio das causas internas - as
denominadas Teorias da disposição - e das causas externas - as denominadas
Teorias do meio - no advento de delito.
Hoje, de acordo com a concepção da dinâmica do delito, tanto as causas
pertinentes à disposição, como ao meio não são realidades unívocas, homogêneas,
admitindo-se outras formas de interpretação do fenômeno delituoso, eis que umas
disposições influem sobre as outras, das mais diferentes maneiras.
Há, por exemplo, disposições natas e predisposições, em função das
disposições herdadas ou disposição germinal; disposição adquirida ou personalidade
do sujeito, em determinado momento.
Em suma, há concorrência duma série de aspectos, englobando causas e
fatores, que culminam com o desencadeamento do delito.
Assim, pode verificar-se a ocorrência duma série de causas e fatores
criminógenos, propícios à prática delituosa, mas a interveniência ou incidência de
outros aspectos ou circunstâncias - as chamadas variáveis - acabam influindo no
sentido de impedir a conduta antissocial, fazendo com que os freios inibitórios
prevaleçam, ou seja, ocorra o predomínio daquilo que Benigno Di Tullio denominou
forças crimino-repelentes, contra as forças crimino-impelentes (Benigno Di Tullio,
1950, apud Evandro Andrade da Silva, 2003, p. 42).

7 CLASSIFICAÇÃO GERAL DOS CRIMES

A classificação geral dos crimes, ou seja, o crime apreciado quanto à sua


gravidade, moralidade, objeto, materialidade, do ponto de vista teórico, baseia-se nas
características da ação, nos efeitos que integram o fato, no bem jurídico protegido,
número e qualidade dos sujeitos considerados em cada caso e muitas outras
circunstâncias que dão lugar a uma série de classificações: figura de dano, de perigo,
materiais, de pura atividade, unis subsistentes, comuns, especiais.

24
O estudo dessas classificações contribui para a sistematização dos diversos
títulos: delitos de comissão e de omissão; dolosos e culposos (Sebastián Soler, 1951,
apud Evandro Andrade da Silva, 2003, p. 43).
Esta classificação geral, entretanto, não deve ser confundida com a
classificação dos crimes em espécie, constante da Parte Especial dos Códigos
Penais, que nasceu duma necessidade prática, sendo que, com o tempo,
estabeleceram-se deteminados princípios para a sua elaboração e sistematização.
A classificação geral dos crimes tem sido tratada pelos diferentes autores de
maneira não muito uniforme. Apresentamos a classificação que segue, como
expressão eclética das teorias a respeito dessa matéria:

7.1 Quanto à previsão legal, segundo a gravidade (crime e contravenção)

a) Sistema tripartido: baseado na divisão crime, delito e contravenção,


como o sistema adotado na França;
b) Sistema bipartido: baseado na divisão crime e contravenção, como o
sistema adotado na Itália, Brasil;
c) Sistema unitário: não comporta as divisões acima previstas, como o
sistema adotado na Argentina, México, e extinta URSS.

7.2 Quanto à intenção

a) Dolosos: quando o agente quer o resultado ou assume o risco de


produzi-lo;
b) Preterdolosos ou preterintencionais: quando há dolo no antecedente
(crime principal) e culpa no consequente (crime acessório), como no fur-
to ou roubo (crime principal) e receptação (crime acessório);
c) Culposos: quando há culpa stricto sensu.

7.3 Quanto à materialidade

a) simples: modalidade que não apresenta elementos acidentais, como o


homicídio simples;

25
b) materiais ou de resultado: são os que se tomam perfeitos com a positivação
do resultado, como característico do tipo legal, com a inequívoca lesão do bem jurídico
protegido, como no caso do furto da coisa comum, na violação do domicílio, a extorsão
mediante sequestro;
c) de lesão ou dano: aqueles que só se consideram consumados, quando
ocorre, no mais das vezes, uma lesão efetiva de um bem ou interesse penalmente
tutelado; neles o dolo é de dano, por exemplo, a calúnia, a difamação, a injúria, o
constrangimento ilegal;
d) de perigo: aqueles em que não é necessário que ocorra um dano efetivo e
concreto, bastando a simples existência da ação criminosa, como o fato de ter em
depósito substância entorpecente, ilegalmente;
e) instantâneos: aqueles em a atividade delituosa termina no momento preciso
em que o seu efeito se produz, como no furto, nas ofensas físicas;
f) permanentes ou contínuos: aqueles em que o ato deles constitutivos não
sofre interrupção, permanecendo o agente em estado de criminalidade ou de violação
ininterrupta da lei penal; em tais casos, a consumação se protrai ou interrompe,
dependendo da vontade do agente, ou de flagrante, como o cárcere privado, a
ocultação de menor. É claro que, se o agente se livrar do flagrante, nem por isso estará
isento de responsabilidade criminal, a ser apurada através de inquérito criminal e
subsequente ação penal;
g) instantâneos de efeitos permanentes: aqueles cuja atividade delituosa se
configura em determinado ato, cujos efeitos perduram, como a bigamia;
h) complexos: quando uma infração penal envolve outra, distinta, alheia à
intenção do agente, como a morte da pessoa visada e ferimento de outra;
i) continuados ou sucessivos: aqueles em que o autor pratica vários atos
sucessivos e conexos, materialmente distintos, com uma só intenção e resolução
dolosa, como o agente que furta dum mesmo porta-talheres, várias peças, em dias
diferentes, dentro de breve espaço de tempo;
j) transeuntes: aqueles que não deixam vestígios, como a injúria verbal, a
violação de domicílio;
k) não transeuntes: aqueles que deixam vestígios, como o homicídio, a lesão
corporal;
l) privilegiados: aqueles cometidos em virtude de relevante valor social ou moral
(delictum privilegiatum ou delictum exceptum), como o homicídio privilegiado; o crime

26
consistente em receber de boa-fé, como verdadeira, moeda falsa ou alterada, e a
restitui à circulação, depois de conhecer a falsidade;
m) qualificados: aqueles que se revestem duma forma mais grave, em virtude
de ocorrerem circunstâncias que assim o qualificam, como o homicídio qualificado, o
aborto qualificado;
n) distanciados: aqueles cuja ação e o resultado se separam no tempo ou
espaço, como a sonegação ou destruição de correspondência, a extorsão, a extorsão
mediante sequestro;
o) formais: quando a intenção do agente se presume do seu próprio ato, que
se reputa consumado independentemente do resultado que possa produzir, como a
falsificação de moeda, seja ou não posta em circulação;
p) putativos ou imaginários: aqueles em que o agente considera erroneamente
que sua conduta constitui crime, quando, na verdade não é, como no caso em que
alguém pensa ter alvejado certa pessoa, quando na verdade foi outrem que o fez;
q) putativos por obra do agente provocador: quando, de forma insidiosa, uma
pessoa provoca o agente, levando-o a praticar o crime, ao mesmo tempo que adota
providências com a finalidade de evitar a consumação do mesmo; são os casos de
flagrante preparado;
r) de sangue: aqueles cuja execução causa derramamento de sangue, com o
emprego de arma de fogo, instrumento perfuro cortante;
s) hediondos: aqueles que se revestem das características dos qualificados e
de sangue.

7.4 Quanto ao sujeito

a) comuns: quando há violação do preceito penal, imposto indistintamente a


todos, praticado por qualquer indivíduo;
b) próprios: diz daqueles que só podem ser praticados por determinada
categoria de pessoas, pressupondo no agente qualidade pessoal e particular condição
jurídica, como os crimes falimentares, que só podem ser praticados pelo devedor
comerciante; os crimes praticados por funcionários públicos;
c) de mão própria: aqueles em que todos os elementos do tipo penal devem ser
realizados pessoalmente pelo agente, sendo assim impossível a figura do concurso
de agentes. São semelhantes aos delitos próprios, pois também aqui apenas as

27
pessoas tipicamente referidas podem ser autoras. Todavia, nos delitos próprios é
possível a participação de terceiro, enquanto nos delitos de mão própria tal não
acontece. Assim, são delitos próprios e simultaneamente de mão própria o infanticídio,
o abandono ou exposição de infante, causa honoris, o peculato;
d) unissubjetivos ou individuais: aqueles em que a totalidade dos atos típicos
podem ser praticados por um único autor, como a injúria verbal;
e) plurissubjetivos ou coletivos: aqueles em que são dois ou mais os autores,
distinguindo-se, porém, duas subdivisões, ou seja, os unilaterais ou convergentes ou
de conduta convergente, nos quais as várias participações se orientam em um mesmo
sentido, como no crime de quadrilha ou bando, e os bilaterais ou plurilaterais em que
as várias participações são contrapostas, como no caso de rixa;
f) de mão morta: aqueles que só podem ser praticados pela pessoa indicada,
em função do próprio tipo, como no caso do adultério, do abandono material;
g) funcionais: aqueles cometidos por quem se acha investido de um ofício, ou
função pública, quando no exercício desta e relativamente a esta, como os crimes
praticados por funcionários públicos;
h) especiais: aqueles que exigem como elemento integrativo uma qualidade ou
condição especial do agente, como no caso dos crimes funcionais, falimentares,
militares;
i) multitudinários ou coletivos: aqueles que são praticados por multidão em
tumulto, contra pessoas ou coisas, por ocasião de manifestações públicas, greves;
j) bilaterais: aqueles para cuja consumação se exige o encontro de vontades
de dois agentes, como a receptação;
k) habituais: os que são praticados seguidamente pelo mesmo autor, com a
mesma uniformidade e o mesmo objetivo, como a falsa identidade, o exercício ilegal
da profissão de médico, dentista, advogado;
l) passionais: aqueles em que o agente é impulsionado por uma paixão ou
emoção violenta e irreprimível: o ciúme, um amor egoístico ou contrariado, um ultraje
à honra.

7.5 Quanto ao objeto

a) contra a coisa pública: embora no Direito Penal atual e divisão clássica do


direito romano - delicta publica e delicta privata - não tenha a mesma importância,

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consideram-se crimes contra a coisa pública aqueles que afetam determinados bens
ou interesses eminentemente de ordem pública, tais como os crimes contra a
incolumidade pública, contra a segurança dos meios de comunicação e transporte e
outros serviços públicos, contra a saúde pública;
b) contra a coisa privada: aqueles que afetam exclusivamente os bens ou
pessoas privados, subdivididos em crimes de ação pública e de ação privada;
c) contra a economia popular: aqueles que resultam em lesão de economia
popular, previstos em legislação especial;
d) políticos: aqueles que têm feição exclusivamente política; na prática, hoje,
não mais existe essa modalidade, pois, o político está ligado ao social, ao econômico;
e) político-sociais: a distinção entre crime político e crime político-social provém
do Projeto do Código Penal de Ferri (Itália, 1921). "Antes do surto da grande indústria
e do socialismo, que é fruto seu, os crimes que visavam à organização social tinham
feição exclusivamente política. Esta, porém, passou para o segundo plano. A estrutura
econômica é que é hoje principalmente atacada. A característica específica da
delinquência político-social é ser marcada pelo selo da mais incontestável abnegação,
do altruísmo mais puro e idealístico." (Virgílio de Sá Pereira, 1958, apud Evandro
Andrade da Silva, 2003, p. 47).
f) militares ou castrenses: aqueles próprios, praticados por militares, contra a
hierarquia, a ordem jurídica, o dever, a segurança, a subordinação ou disciplina
militares, previstos na legislação militar;
g) crimes de guerra: aqueles que violam os princípios e as leis que reguIam a
guerra, praticados por militar ou assemelhado que é participar de um conflito armado;
h) falimentares: aqueles praticados pelos comerciantes, cuja falência é
considerada fraudulenta;
i) principais: aqueles que antecedem necessariamente outros, sem o que estes
não podem existir, como o roubo (principal) em relação à receptação (acessório);
j) acessórios: aqueles que exigem um outro como principal e dos quais são
dependentes, como o assassínio a fim de assegurar a prática do roubo, a violação de
domicílio igualmente com o fito de roubo;
k) sexuais: aqueles praticados para satisfazer o impulso erótico ou tendências
libidinosas;

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l) de lesa-pátria: os crimes de alta traição, quando atentam contra a segurança
e a soberania nacionais, por meio de inteligência com potências inimigas, durante o
estado de guerra ou greve convulsão social;
m) pluriofensivos: são aqueles que ofendem a mais de um bem jurídico tutelado
pela lei penal, como o roubo.

7.6 Quanto à conduta

a) comissivo: também chamados de ação; caracterizam-se por um facere, ou


seja, a prática de atos positivos, contrários à lei penal, como o furto, o estupro;
b) omissivos: consistem em um non facere, ou seja, em deixar de fazer o que
a lei penal obriga, como o abandono material;
c) comissivos por omissão ou omissivos impróprios: consistem em produzir, por
meio de uma omissão um resultado definido na lei como crime; no caso, a omissão é
em si mesma incriminada, pois o que caracteriza a responsabilidade penal é ter o
agente faltado a um dever jurídico de agir para impedir o resultado, como o caso da
mãe que, por privar o filho, recém-nascido, de alimentação, deixa-o morrer;
d) comissivos e omissivos: também chamados delitos de conduta mista, pois
se expressam necessariamente em duas formas, isto é, positiva e negativa, ambas
cooperantes, como o parto suposto (comportamento comissivo no ato de apresentar
o filho de outrem a registro e omissivo na ocultação da filiação verdadeira);
e) necessários: aqueles que são praticados em estado de necessidade, em
legítima defesa, em estrito cumprimento de dever legal ou no exercício regular de
direito;
f) de ímpeto: também chamado ex impetu, caracterizam-se pelo desígnio
delituoso instantâneo ou repentino, motivado por cólera, paixão ou terror, sem
preceder deliberação, determinação ou raciocínio, ou seja, per moto imprevisto.

7.7 Quanto ao processo executivo

a) em grau de tentativa: diz crime tentado quando iniciada a execução o crime


não se consuma por circunstâncias alheias à vontade do agente;
b) consumados: o crime é consumado quando nele se reúnem todos os
elementos de sua definição legal;

30
c) frustrados: quando exaurida a ação o agente não logra obter o resultado
perseguido; a ação pode exaurir-se antes da total realização típica (tentativa perfeita),
coincidir com o momento consumativo, ou então ir além deste, mas sem determinar
nova realização típica, e.g., homicídio em que a vítima recebe 11 facadas, morrendo
na primeira; neste exato momento temos o tipo consumado, porém a ação vai exaurir-
se em momento posterior.
d) imperfeitos ou tentativa perfeita: aqueles que não foram consumados por ter
sido interrompidos, ou mal executados, ou, ainda, porque era inidôneo e o meio
empregado pelo agente. São também chamados crimes falhos ou frustrados;
e) perfeitos (delictum pefeito): aqueles que se revestem de todos os elementos
imprescindíveis à sua existência real, e em cuja execução, até sua consumação, a
intenção direta do agente foi inteiramente satisfeita.

7.8 Quanto ao concurso de agentes

a) conexos: são aqueles praticados -1) ao mesmo tempo, por diversas pessoas
reunidas; 2) em consequência de um pacto previamente estabelecido, embora o delito
seja perpetrado em diferentes tempos e lugares; 3) como meio de execução de outros,
ou como expediente para procurar a impunidade; 4) quanto têm com outra infração
uma estreita interdependência, ou nexo de tal natureza que se torna impossível
apreciá-Ios isoladamente, cindindo a prova;
b) de concurso facultativo ou simplesmente coautoria: são os crimes em que a
participação de dois ou mais agentes não constitui elemento fundamental para
configuração do delito;
c) de concurso necessário: são os crimes que exigem para a sua configuração
o concurso de duas ou mais pessoas, quer dizer, a própria descrição típica exige o
concurso, como nos crimes coletivos (caso da quadrilha ou bando) ou nos bilaterais,
sendo que nestes uma das pessoas pode não ser culpável, como nos crimes de
adultério e bigamia.

31
7.9 Quanto aos atos que compõem a execução

a) unissubsistentes: são aqueles cuja execução se compõe de um só ato, o


qual coincide com a consumação, não admitindo assim a tentativa, podendo-se citar
o perigo de contágio venéreo, a omissão de socorro, vilipêndio de cadáver.
b) plurissubsistentes: são aqueles cuja execução se compõe de vários atos ou
fases sucessivas, no tempo ou no espaço, como os crimes distanciados ou a distância,
de que são exemplos, a sonegação ou destruição de correspondência, a extorsão, a
extorsão mediante sequestro.

7.10 Quanto à persecução criminal

a) de ação penal pública;


b) de ação penal condicionada;
c) de ação penal privada.

7.11 Classificação dos crimes em espécie

A classificação dos crimes em espécie decorre de uma necessidade prática de


sistematização, não só para o estudo da natureza dos mesmos, bem como para a sua
codificação, observando-se algumas variações terminológicas nos Códigos Penais
dos diferentes países, quanto às classes e subclasses daqueles.
Daí a denominação adotada pelos Códigos Penais, ou seja, Parte Especial, que
estabelece a classificação dos crimes em espécie, compreendendo-se como espécies
as partes do gênero, sendo que este abrange várias daquelas, conforme os critérios
jurídicos, políticos, filosóficos, sociológicos e econômicos, adotados pelo legislador.
Nessa ordem de ideias, o Código Penal (1940) estabeleceu, em sua Parte
Especial, a sequência de Títulos em que classifica os crimes em espécie, com as
respectivas rubricas, a saber: Titulo I - Dos Crimes Contra a Pessoa (arts. 121 a 154);
Titulo II - Dos Crimes Contra o Patrimônio (arts. 155 a 183); Título III - Dos Crimes
Contra a Propriedade Imaterial (arts. 184 a 196); Título IV - Dos Crimes Contra a
Organização do Trabalho (arts. 197 a 207); Título V - Dos Crimes Contra o Sentimento
Religioso e Contra o Respeito aos Mortos (arts. 208 a 212); Título VI - Dos Crimes
Contra a dignidade sexual (arts. 213 a 234); Título VII - Dos Crimes Contra a Família

32
(arts. 235 a 249); Título VIII - Dos Crimes Contra a Incolumidade Pública (arts. 250 a
285); Título IX - Dos Crimes Contra a Paz Pública (arts. 286 a 288); Título X - Dos
Crimes Contra a Fé Pública (arts. 289 a 311); Título XI - Dos Crimes Contra a
Administração Pública (arts. 312 a 359).
Cabe ressaltar que, além dessas espécies de crimes, existem outras,
constantes da legislação penal extravagante, ou seja, previstas em leis específicas,
elencando determinados tipos penais, em decorrência do processo de
desenvolvimento político, econômico e social.
Com efeito, a miséria e a pobreza não constituem causas ou fatores de-
terminantes, fatais, para que o indivíduo se tome delinquente, bandido, assaltante,
narcotraficante, haja vista que, se assim fosse, a maioria da população mundial
enveredaria por essas práticas delituosas, posto que dita maioria é carente, excluída,
de acordo com as estatísticas existentes a respeito.
Por outro lado, era de se esperar que, dentre as pessoas pertencentes às
famílias abastadas, e que recebem esmerada educação, jamais ocorressem desvios
de comportamento, práticas criminosas; entretanto, isso não se verifica, pois muitas
delas cometem não só delitos típicos do "colarinho branco", como também infração
penais comuns, ou seja, aquelas que os juristas burgueses e pequeno-burgueses
consideram peculiares às "classes subalternas" da sociedade, isto é, o proletariado.

8 A PATOLOGIA SOCIAL

Como assinala J. Alves Garcia, Patologia é a Ciência dos processos mórbidos,


de suas causas, das alterações estruturais ou funcionais do organismo, e da sua
evolução. Todo processo patológico resulta da interação de causas endógenas e
externas, às quais se contrapõem as defesas do organismo. Todo processo passa
pelo clímax e atinge a fase crítica ou crise. Esta termina pela resolução, pela cura ou
restabelecimento da homeostase (estado de equilíbrio), por estado enfermiço
permanente, ou pela morte (J. Alves Garcia, 1979, apud Evandro Andrade da Silva,
2003, p. 51).
Por analogia, prossegue o referido autor, chama-se Patologia Social ao estudo
das desorganizações ou desarmonias internas da sociedade, somadas às pressões
externas. Então, o grupo intui o anormal, acusa o sentimento da mudança brusca da

33
estrutura social, do conflito de culturas, das transformações, ou do ritmo acelerado da
evolução histórica (J. Alves Garcia, 1979, apud Evandro Andrade da Silva, 2003, p.
51).
A crise histórico-social ocorre quando, por um conjunto de circunstâncias, a
situação anteriormente aceitável, toma-se daí em diante intolerável, seja por fatores
sociais, religiosos, políticos, econômicos, ou estes simultaneamente.
Ora, as psicoses e as neuroses têm origem em desregulações ou lesões do
sistema nervoso ou do organismo, sendo certo que a vida psíquica resulta do jogo
perpétuo das influências exteriores ou ambientais e das condições internas. Nenhum
fenômeno mental, normal ou patológico, pode ser exclusivamente endógeno, mas
também nenhuma influência exógena tem a sua eficácia característica se não
encontra um organismo preparado. Convencionou-se, por isso, dizer que certas
afecções mentais são predominantemente endógenas, enquanto outras não
sobretudo exógenas.
Partindo desses princípios, o referido autor chama socioses aos distúrbios
psíquicos ou orgânicos que resultam, predominantemente, das transformações
bruscas das estruturas sociais e culturais (J. Alves Garcia, 1979, apud Evandro
Andrade da Silva, 2003, p. 51).
Em suma, esse quadro social constitui uma força crimino-impelente.
Assim, o quadro social contemporâneo, em escala internacional, revela bruscas
alterações em sua estrutura sociocultural, com profundo reflexo em relação às
doenças mentais e orgânicas, a saber:
a) Aumento do infarto do miocárdio e do alcoolismo femininos, depois que as
mulheres foram expostas às mesmas tensões emocionais a que estão sujeitos os
homens, na luta pela sobrevivência e afirmação social;
b) Agravação da alcoolomania, sob a forma de Delirium tremens, devido às
vivências da solidão e da desesperança; carências alimentares;
c) Transformação da psicose maníaco-depressiva, com a quase desaparição
das grandes crises de excitação, a maior incidência da síndrome melancólica, sob
várias formas e graus;
d) Transformações dos delírios esquizofrênicos, de tipo místico-religioso e
cosmogênico, em delírios hipocondríacos, técnicos, cósmicos e astranáuticos;
e) Redução dos sistemas mentais das psicoses e neuroses, e maior incidência
de fenômenos psicossomáticos, ou organoneuróticos;

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f) Aumento extraordinário, em âmbito mundial, das toxicomanias, sobretudo,
nos jovens.
Diante desse quadro, conclui que existe uma relação direta entre o progresso
tecnológico e o desenvolvimento da agressividade humana, invocando a opinião de
Arnold Toynbee: "O processo atual, em aceleração desordenada da tecnologia,
aumentou agora em grau alarmante a brecha as camadas consciente e inconsciente
da psique humana" (Arnold Toynbee, 1975, apud Evandro Andrade da Silva, 2003, p.
52).

8.1 A criminologia e o comportamento humano

Fonte: nossacausa.com

Um dos aspectos da Criminologia são os distúrbios da personalidade. Dentre


os mais frequentes desses distúrbios, podemos citar as neuroses, as psicoses, as
personalidades psicopáticas e os transtornos da sexualidade ou parafilias. Neuroses
são estados mentais da pessoa humana, que a conduzem à ansiedade, a distúrbios
emocionais como: medo, raiva, rancor, sentimento de culpa.
Pode-se afirmar que as neuroses são afecções muito difundidas, sem base
anatômica conhecida e que, apesar de intimamente ligadas à vida psíquica do
paciente, não lhe alteram a personalidade como as psicoses, e consequentemente se
acompanham de consciência penosa e frequentemente excessiva do estado mórbido
(Odon Ramos Maranhão, 2004, apud Cristiano Menezes, 2014, p. 3). Nessa
perspectiva, de acordo com Newton e Valter Fernandes (Newton Fernandes et al,

35
2002, apud Cristiano Menezes, 2014, p. 3), podemos citar as neuroses obsessivas,
caracterizadas pela constante de obsessões, fobias e tiques obsessivos, cujas formas
de projeção alinham-se á cleptomania, à piromania, ao impulso ao suicídio e ao
homicídio.
O termo psicose surgiu para enfatizar as afecções mentais mais graves. As
psicoses são conjuntos de doenças caracterizadas por distúrbios emocionais do
indivíduo e sua relação com a realidade social, com o convívio em sociedade.
Citamos, dentre outras, a paranoica, a maníaco-depressiva e a carcerária.
Segundo Genival França, "as psicoses paranoicas são transtornos mentais
marcados por concepções delirantes permitindo manifestações de autofilia e
egocentrismo, conservando-se claros pensamento, vontade e ações" (Genival França,
1998, apud Cristiano Menezes, 2014, p. 3). Os paranoicos fantasiam, e nos seus
delírios relacionam o seu bem-estar ou a dor com as pessoas que lhes rodeiam,
atribuindo a estas a causa de seu estado. Temos por exemplo, a paranoia do ciúme,
a de perseguição, a erótica. Seriam paranoicos os assassinos de Abraham Lincoln,
Gandhi, John Lennon e o que atentou contra a vida do Papa João Paulo II (Fernandes,
2002, apud Cristiano Menezes, 2014, p. 3).
A psicose maníaco-depressiva, hoje estudada como transtorno bipolar do
comportamento, é marcada por crises de excitação psicomotora e estado depressivo.
A fase maníaca é caracterizada por hiperatividade motora e psíquica, com agitação e
exaltação da afetividade e do humor. O maníaco não permanece quieto, é eufórico. A
melancólica ou depressiva caracteriza-se pela inibição ou diminuição das funções
psíquicas e motoras. O indivíduo apresenta um quadro marcado pela tristeza,
pessimismo, sentimento de culpa. As tentativas de suicídio são frequentes nesta fase
melancólica (Genival, 1998, apud Cristiano Menezes, 2014, p. 3).
A psicose carcerária é decorrente da privação da liberdade do indivíduo
submetido a estabelecimentos carcerários que não dispõem, em sua grande maioria,
de condições adequadas de espaço, iluminação e alimentação. A pessoa acometida
deste mal manifesta a "síndrome crepuscular de Ganser", apresentando sintomas com
as seguintes características: estranhas alterações da conduta motora e verbal do
indivíduo que, quando interrogado, encerra-se em impenetrável mutismo ou passa a
exibir para respostas ("respostas ao lado"), como se estivera acometido de um estado

36
deficitário orgânico, não raro acompanhado de sintomas depressivos ou catatônicos
(Fernandes, 2002, apud Cristiano Menezes, 2014, p. 3).
A personalidade psicopática é caracterizada por uma distorção do caráter do
indivíduo. Os indivíduos acometidos por tal personalidade geralmente apresentam o
seguinte quadro característico: são inteligentes, amorais, inconstantes, insinceros;
faltam-lhes vergonha e remorso; são egocêntricos, inclinados a condutas mórbidas.
Citamos como tipos, dentre outros: os explosivos ou epileptoides, os perversos ou
amorais, os fanáticos e os mitomaníacos.
Os explosivos ou epileptoides são indivíduos que manifestam em seu
comportamento a habitualidade de um estado colérico, raivoso, agressivo, tanto
verbalmente como fisicamente. Os perversos ou amorais são maldosos, cruéis,
destrutivos. Tais características revelam-se precocemente em crianças, nas
tendências à preguiça, inércia, indocilidade, impulsividade, indiferença, propensos à
criminalidade infanto-juvenil. Na fase adulta, o indivíduo possui grau elevado de
inteligência, podendo ser observadas mentiras, calúnias, delações, furtos, roubos.
Encontram-se no rol dos amorais os incendiários, os vândalos, os "vampiros" e os
envenenadores (Fernandes, 2002, apud Cristiano Menezes, 2014, p. 4).
Os fanáticos tendem a um ânimo constante de euforismo, extrema exaltação
daquilo que desejam. Lutam por seus ideais de forma impulsiva, sem limites, sem
controle. São capazes de praticar qualquer ato delinquente na busca incessante por
seus objetivos. Os mitomaníacos, por sua vez, são acometidos de um desequilíbrio
da inteligência no tocante à realidade. São propensos à mentira, à simulação, à
fantasia. Conseguem distorcer, de forma quase convincente, a realidade dos fatos,
podendo chegar a extremos de delírios e devaneios.
O estudo da sexualidade anômala ou transtornos da sexualidade interessa à
medicina legal, são distúrbios caracterizados por degeneração psíquica ou por fatores
orgânicos glandulares. Citamos como exemplo o sadismo, o masoquismo, a pedofilia,
o vampirismo e a necrofilia. O sadismo, também chamado algolagnia ativa, é
transtorno sexual em que o indivíduo inflige sofrimentos físicos à parceria para obter
o prazer sexual. O termo tem origem no nome do Marquês de Sade (1740), que
acometido do mal, o relatou em seus romances Justina e Julieta. O marquês sentia
prazer em cortar as carnes de suas parceiras e em tratar as chagas das prostitutas
(Gomes, 2004, apud Cristiano Menezes, 2014, p. 4).

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Já o masoquismo é algolagnia passiva, isto é, o indivíduo só consegue sentir
prazer sexual ao sofrer, ao ser humilhado. Jean Jacques Rousseau, filósofo francês
que viveu nos idos anos de 1712 a 1778, bastante conhecido por sua obra Do Contrato
Social (onde trabalha a formação e desenvolvimento da sociedade civil e do próprio
Estado), em um de seus livros publicados após sua morte, Confissões, revela ser
acometido deste transtorno da sexualidade: "Ajoelhar-se aos pés de uma amante
imperiosa, obedecer às suas ordens, pedir perdão de faltas que cometera eram para
mim gozos divinos" (Gomes, 2004, apud Cristiano Menezes, 2014, p. 4).
A pedofilia é parafilia caracterizada pela atração por parceiros sexuais crianças
ou adolescentes. O vampirismo é a aberração venérea na qual a gratificação é
alcançada com o degenerado sugando obsessivamente o sangue de seu parceiro
sexual (Delton Croce et al, 2004, apud Cristiano Menezes, 2014, p. 4)
A necrofilia, por sua vez, trata-se de transtorno caracterizado por prática de
relações sexuais com cadáver. "Alguns necrófilos chegam a violar covas, retirar
corpos em decomposição para satisfazerem seu instinto" (Gomes, 2004, apud
Cristiano Menezes, 2014, p. 4).

9 A MODERNA CRIMINOLOGIA E OS NOVOS MODELOS TEÓRICOS


EXPLICATIVOS DO FENÔMENO CRIMINOSO

9.1 A Biologia Criminal: Antropometria, antropologia, biotipologia,


neurofisiologia, os estudos de Eysenck e Mednick, endocrinologia, o
substrato bioquímico da conduta humana

As orientações biológicas buscam alcançar novamente o “homem delinquente”,


tratando de localizar e identificar em alguma parte de seu corpo – no seu
funcionamento, em algum de seus sistemas e subsistemas – o fator diferencial que
explique a conduta delituosa. Se supõe, portanto, ser o crime consequência de alguma
patologia, disfunção ou transtorno orgânico. E daí surgem diversas hipóteses
analisadas no âmbito de diversas ciências: antropológicas, biotipológicas,
endocrinológicas, genéticas, neurofisiológicas, bioquímicas, etc.
Importa destacar que a Criminologia, em seu desenvolvimento histórico, se
relacionou estreitamente com a Antropologia. Na Antropologia, predominou-se o
enfoque antropométrico.

38
9.1.1 Antropometria e Antropologia

As Teorias Bioantropológicas marcam a chamada Criminologia Etiológica ou


Tradicional (Etios: relativo à essência). Estas teorias trazem a ideia de criminoso e
criminalidade como realidades ontológicas (associadas ao ser) preexistentes ao
sistema de justiça criminal.
Assim, o comportamento social é entendido como convencional (regra) e o
comportamento desviante é entendido como não convencional (exceção).
As Teorias Bioantropológicas têm como característica o fato de justificarem o
crime e de fundamentarem a lógica da origem do crime em um dado ontológico pré-
constituído. Logo, ser crime ou ser criminoso são atributos que estão ligados à
essência de determinados comportamentos e de determinadas pessoas. Assim, ser
criminoso é uma exceção e, por isso, a figura do desviante é uma exceção.
Esse pensamento tem como principal expoente Cesare Lombroso, que integra
a Escola Positiva de Direito Penal. Cesare Lombroso (Itália, 1835-1909) era psiquiatra,
cirurgião, higienista, criminologista, antropólogo e cientista italiano. O grande seguidor
das ideias de Lombroso no Brasil foi Nina Rodrigues, que inclusive reprisou
experimentos de Lombroso, tentando verificar se o conceito de criminoso também
poderia se projetar no Brasil.
Estas correntes de pensamento trabalham o estudo do crime dentro de uma
lógica universalista (traço marcante destas linhas de pensamento), pois determinados
sujeitos são criminosos onde quer que se encontrem.
Lombroso inaugura a antropologia criminal e a Escola Positiva de Direito Penal.
Se valia da utilização de método empírico e iria examinar determinados fatores
antropomórficos, tais como: composição física (como fisionomia, sensibilidade,
agilidade, sexualidade, peso e idade), anomalias cranianas, composição biológica
(como hereditariedade, reação etílica) e psicológica (como senso moral, inteligência,
vaidade, preguiça e astúcia).
Para ele, o criminoso nato era um indivíduo marcado pela presença de
tatuagens, que significava uma insensibilidade a dor. Além disso, possuía mãos
maiores, braços mais compridos, lábios carnudos. Ou seja, o indivíduo já possuiria
dados fenotípicos que traduziriam o ser criminoso.
Lombroso estudava tipologias de criminosos reunindo as suas características.
Assim, existiriam diferentes espécies de criminosos, destacando-se:

39
a) Criminoso Nato: o indivíduo sofria influência biológica, possuía estigmas,
instinto criminoso. Era um ser selvagem da sociedade, o degenerado (cabeça
pequena, deformada, fronte fugidia, sobrancelhas salientes, maçãs afastadas, orelhas
malformadas, braços cumpridos, face enorme, tatuado, impulsivo, mentiroso e falador
de gírias etc.).
b) Criminoso Louco: perversos, loucos morais, alienados mentais que devem
permanecer no hospício. Seriam, os criminosos loucos, indivíduos com capacidade
de compreensão prejudicada.
c) Criminoso de Ocasião: predisposto hereditariamente, são
pseudocriminosos. Podem ser traduzidos pela expressão: “a ocasião faz o ladrão”,
pois assumem hábitos criminosos influenciados pelas circunstâncias que vivem.
d) Criminoso por Paixão: sanguíneos, nervosos, irrefletidos, usam da
violência para solucionar questões passionais. São sujeitos exaltados.
O criminoso nato e o criminoso de ocasião são espécies que devem ser
guardadas. Observe que nem todos os criminosos, para Lombroso, padeciam desse
atavismo determinista. Tanto assim que ele diferenciava o criminoso nato do criminoso
de ocasião.
Quanto ao criminoso nato, uma das críticas sofridas pelo autor estava na
hipótese em que o sujeito nunca tivesse praticado nenhum delito, mas reunisse
características antropomórficas.
Para Lombroso, ainda neste caso de nunca ter praticado delitos, o indivíduo
ainda era considerado criminoso, porque, reunindo características do criminoso nato,
delinquir seria uma questão de tempo. Logo, já seria possível fundamentar uma
medida de segurança a título de prevenção, para que a pessoa não viesse a delinquir.
Já o criminoso de ocasião seria um cidadão “normal” (pseudonormal) com
predisposição ao crime, mas não haveria determinismo ao crime. O criminoso de
ocasião poderia ser corrigido, diferentemente do criminoso nato.
A principal obra de referência do pensamento lombrosiano é o livro “O Homem
Delinquente”, de 1876, bastante criticado posteriormente como uma tipologia
criminosa de viés extremamente racista.
Talvez não existisse à época a noção de que a quebra da neutralidade da
pesquisa experimental se desse precisamente com a própria escolha do campo de
pesquisa. Exemplo: os dados fenotípicos de uma penitenciária brasileira, hoje,
geralmente apresenta criminosos negros, pobres, com lábios mais grossos e nariz

40
mais largo, normalmente de pai desconhecido, tem idade de cerca de 30 (trinta) anos
e com capacidade econômica ativa. Isso demonstra outras questões que não são
passíveis de apreensão em uma pesquisa causal explicativa dentro da lógica
lombrosiana.
Existia, então, racismo, pois Lombroso estudava características de um
criminoso nato a partir de dados que já estavam pré-concebidos, que era a prisão de
determinados indivíduos dentro de estabelecimentos prisionais.
Assim, é importante destacar que, no campo da Antropometria, os principais
avanços se deram com A. Bertillón (1857-1914), que idealizou um complexo sistema
de medidas corporais, que unido à fotografia do delinquente, pretendia servir como
instrumento de identificação destes. Este método acabou sendo adotado por polícias
e presídios de todo o mundo, embora tenha sofrido inúmeras críticas. É importante
que se afirme que as investigações levadas a cabo no âmbito específico da
Antropologia são, de um modo ou de outro, herança da obra lombrosiana. (MOLINA,
2003)
Por sua vez, CH. B. Goring, que dirigiu um importante estudo biométrico-
estatístico, ficou conhecido como o antropólogo que refutou a metodologia e teses
lombrosianas. (Antônio Garcia-Pablos de Molina, 2003 apud Thais Bandeira et al,
2017, p. 42)
Segundo Goring, Lombroso se utilizou de um método “anatômico-patológico”,
baseado em observação direta, sem instrumentos de medição objetivos, que inferia a
suposta normalidade ou anormalidade do indivíduo e os estigmas detectados. Por isso
julgou indispensável o método estatístico, o único que poderia oferecer medições
precisas, confiáveis, reproduzíveis e independentes. A teoria da criminalidade de
Goring parte da relevância dos fatores físicos-constituintes. (Antônio Garcia-Pablos
de Molina, 2003 apud Thais Bandeira et al, 2017, p. 42)
O ato delitivo, em seu juízo, não é produto de uma opção livre do indivíduo,
mas tampouco de uma personalidade doentia e anormal, ou mero contágio do
ambiente e entorno.
E. A. Hooton, que revisou a obra de Goring, criticou severamente sua
metodologia. A tese fundamental de Hooton se resume na ideia de ser o criminoso um
ser organicamente inferior, e o delito produto ou resultante do impacto do meio em um
organismo humano de casta inferior; que modo que só se pode suprimi-lo extirpando
o substrato físico, psíquico ou moral de tal inferioridade, ou mediante sua total

41
segregação em um meio socialmente asséptico. Haveria, assim, significativas
diferenças entre delinquentes e não delinquentes e, bem assim, entre os distintos
grupos criminosos. (Antônio Garcia-Pablos de Molina, 2003 apud Thais Bandeira et
al, 2017, p. 42)

9.1.2 Biotipologia

A Biotipologia é a ciência do tipo humano poliédrico, concebido como unidade


vital (biotipo), com várias facetas: morfologia, fisiologia e psicologia, segundo a
definição de Lavastigne. A premissa da Biotipologia é de que existe uma correlação
entre as características físicas do indivíduo e seus traços psicológicos, entre tipo
somático e corporal e tipo mental e temperamento. Das inúmeras abordagens da
Biotipologia, é possível citar as seguintes escolas: Escola francesa; Escola italiana;
Escola alemã; Escola americana. Em síntese, para cada tipo físico ou corporal, lhe
corresponderia traços caracterológicos e temperamentais próprios.

9.1.3 Endocrinologia

A Endocrinologia também esteve inserida dentro das teorias acerca da


criminalidade. Diversas foram as investigações que trataram de conduzir o
comportamento humano em geral – especificamente o criminal – a processos
hormonais ou endócrino-patológicos.
Nesse passo, M.G. Schlapp e E. H. Smith (1928) compreendiam o crime como
consequência de uma perturbação emocional derivada de um desajuste emocional.
A obra de L. Berman (EUA) também aborda valorosos dados sobre a inter-
relação existente entre atividade glandular, personalidade e problemas de
comportamento. As explicações endocrinológicas rechaçam o caráter hereditário dos
transtornos glandulares, salvo alguns casos de criminosos sexuais; acreditam na
viabilidade de cura de quem padece de tais disfunções, mediante adequado
tratamento hormonal; outro ponto é que a influência eventualmente criminógena das
mesmas não é direta, mas indireta.
No estudo da delinquência agressiva e sexual, proliferaram-se investigações
sobre a eventual relação entre testosterona e a conduta criminosa. Bem como foram
produzidos diversos estudos sobre a criminalidade feminina, na qual se havia

42
demonstrado que mulheres cometem mais crimes com motivo nos desajustes
hormonais próprios do período menstrual. Em síntese, a Endocrinologia colocou em
evidencia a influência da atividade hormonal no temperamento e caráter do indivíduo.
Os estudos levados à cabo pela Genética também foram referências para as
explicações teóricas de orientação biológica do delito. Nesse contexto, diversas são
as tentativas de explicar condutas antissociais, desviadas ou delitivas em função de
patologias cerebrais, sobretudo após a criação do eletroencefalógrafo - EEG (aparelho
que permite registrar a atividade elétrica do cérebro). A Neurofisiologia moderna está
inserida nesta realidade. No Reino Unido, os estudos eletroencefalográficos
pretenderam verificar as hipóteses concretas: que muitos dos denominados “crimes
sem motivo aparente” respondem a anomalias cerebrais graves que o EEG detecta.

9.1.4 Os estudos de Eysenck e Mednick, o substrato bioquímico da conduta humana

Uma recente hipótese, baseada nos estudos de Eysenck, surgiu afirmando que
o funcionamento do sistema nervoso autônomo pode predispor o indivíduo a um
comportamento antissocial e delitivo. Outras investigações posteriores ressaltaram a
transcendência do sistema nervoso autônomo, como as investigações de Mednick.
Suas investigações insinuam a incapacidade do psicopata para aprender com
o castigo, de modo que um determinado substrato biológico lhe impediria formar uma
consciência social.
Noutro giro, a Sociobiologia se torna um novo impulso às explicações do crime
desde bases biológicas. A característica mais destacada deste enfoque reside na
consideração do fator biológico, do ambiental e do processo de aprendizagem como
reciprocamente interdependentes.
Para a Sociobiologia moderna, o homem é um organismo biossocial, de modo
que seu comportamento se influencia por condições físicas e fatores ambientais.
Nessa linha, todo comportamento social, incluso o criminoso, é um comportamento
aprendido. Mas essa aprendizagem não se controla através de processos sociais de
interação, mas sim por outros meios, de natureza bioquímica e celular.

43
9.2 Psicologia Criminal: Psicanálise, psicopatologia e psiquiatria

A doutrina criminológica observa com muito cuidado e muita preocupação a


relação proposta entre a criminologia e outros campos do conhecimento, tais como a
psicanálise, a psicopatologia e a psiquiatria. Os modelos de integração, ao tentarem
reunir estes diferentes campos do saber, acabam por tender a “criar” uma outra
vertente de pensamento, normalmente designada pela qualificação terminológica
“criminal” ou “jurídica”.
É o que acontece, por exemplo, com a psicologia criminal, sociologia jurídica,
além de tantas outras disciplinas integradas que compilam elementos (muitas vezes
metodologicamente inconciliáveis) em um suposto campo único do saber.
É nesse contexto que Salo de Carvalho diferencia a criminologia dramática e a
criminologia trágica. “A primeira, denominada criminologia dramática, de perspectiva
idealista e metafísica, buscaria associar-se a outros saberes, na condição de saber
menor, para qualificar-se como ciência, e, inserida no ideal cientificista moderno,
fragmentar o estudo do seu objeto para melhor conhecê-lo e alcançar suas
finalidades” (Salo de Carvalho, 2008 apud Thais Bandeira et al, 2017, p. 44).
Portanto, há uma enorme preocupação em se definir uma associação pseudo-
integrativa entre a criminologia/direito/sociologia e outro campo do saber, pois,
normalmente, esta pretensão está relacionada, ainda que implicitamente, ao reforço
de um viés hierárquico entre estes ramos do conhecimento.
Explica-se: quando falamos em psicologia criminal, naturalmente
compreendemos tal “ramo” como algo menos importante que a psicologia, e
igualmente menos importante que a criminologia. O conteúdo oriundo daquela
disciplina naturalmente é compreendido como algo de menor valor.
Diferentemente, a criminologia trágica “intentaria romper com a tradição
idealizadora das ciências e, ao abdicar de quaisquer pretensões epistemológicas,
procuraria produzir discursos problematizadores dos sintomas sociais
contemporâneos, com a específica perspectiva de reduzir os danos e os sofrimentos
provocados pelas violências, públicas (institucionais) ou privadas (interindividuais)”
(Salo de Carvalho, 2008 apud Thais Bandeira et al, 2017, p. 45).
Para Salo de Carvalho, é nesse ponto de compreensão, no âmbito da
criminologia trágica, “que se entende possível o diálogo entre psicanálise e
criminologia, ou seja, na convergência dos discursos para a análise crítica do mal-

44
estar contemporâneo que se traduz de inúmeras formas na reprodução das violências”
(Salo de Carvalho, 2008 apud Thais Bandeira et al, 2017, p. 45).
Portanto, quando se fala em psicologia criminal, estamos diante de uma
terminologia ultrapassada, que deverá ter por verdadeiro intuito a promoção de um
diálogo não hierarquizado entre o direito, a criminologia, a psicologia, a psiquiatria e a
psicopatologia de modo a compreender melhor como estes diferentes campos de
conhecimento observam a origem do crime e, a partir daí, seus pontos de aproximação
e de distanciamento.

9.3 Sociologia Criminal: A Escola de Chicago, teorias estrutural-


funcionalistas, teorias do conflito (A criminologia crítica), teorias
subculturais

9.3.1 A Escola de Chicago

A criminologia americana se iniciou nas décadas de 20 e 30, à sombra da


Universidade de Chicago, com a teoria ecológica e os múltiplos trabalhos empíricos
que inspirou.
É considerada uma teoria de consenso e tem como principais expoentes
pioneira de Robert Park e Ernest Burguess. Em sede de sociologia, a escola
criminológica de Chicago encarou o crime como fenômeno ligado a uma área natural
(Lélio Braga Calhau, 2009 apud Thais Bandeira et al, 2017, p. 45).
A Escola de Chicago coincide historicamente com o período das grandes
migrações e da formação das grandes metrópoles, de modo que teve que se afrontar
com o problema característico do ghetto. As sucessivas ondas de imigrantes
arrumavam-se segundo critérios rigidamente étnicos, dando origem a comunidades
tendencialmente estanques. (Lélio Braga Calhau, 2009 apud Thais Bandeira et al,
2017, p. 45)
Diante disso, parecia natural que se optasse por um modelo ecológico - ou seja,
de teorias macrossociológicas da criminalidade equilíbrio entre a comunidade humana
e o ambiente natural - para o enquadramento dos fenômenos sociais.
A Escola teve como características seu empirismo e sua finalidade pragmática.
Isto é, o emprego da observação direta em todas as investigações e pela finalidade
pragmática a que se orientavam: um diagnóstico confiável sobre os urgentes
problemas sociais da realidade norte-americana de seu tempo.

45
É importante saber que os seus representantes iniciais não eram sociólogos
nem juristas, senão jornalistas, predominando em todo o caso, o amplo espectro das
ciências do espírito.
A Escola de Chicago pode ter seu trabalho melhor compreendido dividindo-o
em duas fases: a Primeira Escola vai de 1915 a 1940, enquanto a segunda escola vai
de 1945 a 1960. O trabalho dessa escola explorou a relação entre a organização do
espaço urbano e a criminalidade.
A referida Escola se tornou bastante importante para o estudo da criminalidade
urbana. As teorias estabelecidas por seus sociólogos durante aquele período
influenciaram valiosos estudos urbanos sobre o crime, que foram posteriormente
conduzidos nos Estados Unidos e na Inglaterra.
A primeira teoria da Escola de Chicago é a teoria ecológica. Para os defensores
dessa teoria, a cidade produz delinquência. Existiriam para esses autores até áreas
bastante definidas, onde a criminalidade se concentra e outras em que seria bastante
reduzida.
A teoria ecológica explica esse efeito criminógeno da grande cidade, com base
nos conceitos de desorganização e contágio inerentes aos modernos núcleos urbanos
e, sobretudo, a deficiência do controle social desses núcleos.

A deterioração dos grupos primários (família etc.), a modificação qualitativa


das relações interpessoais que se tornam superficiais, a alta mobilidade e a
perda de raízes no lugar de residência, a crise dos valores tradicionais e
familiares, a superpopulação, a tentadora proximidade às áreas comerciais e
industriais onde se acumula riqueza e o citado enfraquecimento do controle
social criam um meio desorganizado e criminógeno. (Lélio Braga Calhau,
2009 apud Thais Bandeira et al, 2017, p. 46)

Ernest Burgess desenvolveu a teoria das zonas concêntricas, que explorava a


relação entre espaço urbano e a criminalidade. O modelo ecológico buscava um
equilíbrio entre a comunidade humana e o ambiente natural, trabalhando com o
método de observação participante.
Entendeu, então, que a cidade se expande a partir de seu centro, estruturando-
se em formas concêntricas. Assim, temos: comércio > residências pobres/crimes >
residências um pouco melhores > residências de luxo > classes média e alta
(“sucessão”, importante princípio ecológico).

46
Fonte: Criminologia, Thais Bandeira e Daniela Portugal, 2017, p. 47

A Escola de Chicago e a Ecologia Criminal observam a relação entre o meio e


a criminalidade, trabalhando a teoria das zonas concêntricas, ou seja, análise do
processo de expansão das cidades e a relação deste processo com o nascimento do
comportamento criminoso (os focos de criminalidade se distribuem de maneira
diferenciada na expansão social).
Na constituição dos grandes centros urbanos tem-se o comércio que se
expande para as residências mais pobres, residências de classe média, residências
de classe média alta e, por fim, zonas de luxo. Logo, tem-se zonas concêntricas.
Assim, as residências de luxo estariam nas regiões mais afastadas do centro, ao
passo que as regiões mais pobres estariam situadas próximas aos grandes centros
comerciais.
Esta lógica é um pouco diferente do que se observa na realidade do continente
Americano (as pessoas mais ricas se situam no entorno dos centros urbanos e nas
regiões mais afastadas tem-se as regiões mais pobres). Zaffaroni já falava da figura
do ser marginal, como um sujeito que está à margem tanto espacialmente, quanto
política e socialmente. A lógica na Escola de Chicago seria diferente. Nas zonas mais
pobres haveria probabilidade maior da prática delitiva do que nas zonas mais ricas e
afastadas dos grandes centros comerciais.
Entende-se, então, que com a escola de Chicago, a Criminologia abandonou o
paradigma até então dominante do positivismo criminológico, do delinquente nato de
Lombroso, passando a focar nas influências que o ambiente, e no presente caso, que
as cidades podem ter no fenômeno criminal.

47
Ganhou-se qualidade metodológica, já que com os estudos da escola de
Chicago criou-se também o ambiente cultural para as teorias que se sucederam e que
são a feição da moderna Criminologia.
Foi a sociologia americana, em especial com a escola de Chicago, que passou
a utilizar os socialsurveys (inquéritos sociais) na investigação da criminalidade, sendo
um importante instrumento para o conhecimento do índice real da criminalidade de
uma cidade ou bairro.

9.3.2 Teorias estrutural-funcionalistas

A teoria estrutural-funcionalista foi introduzida por Émile Durkheim e


desenvolvida por Robert K. Merton, como teoria da anomia (“Nomus” relativo à norma
e “a” como uma negação). Segundo Alessandro Baratta, esta teoria constitui a
primeira alternativa clássica à utilização das características biopsicológicas do
delinquente e, em razão disso, também uma alternativa à variante positivista do
princípio do bem e do mal (Alessandro Baratta, 2004 apud Thais Bandeira et al, 2017,
p. 48).
Durkheim sustenta que o crime não constitui uma enfermidade social, mas, sim,
um elemento funcional da vida social, pois presentes em todas as sociedades, de
modo que somente seriam patológicas as suas formas anómalas, como no caso de
seu excessivo incremento. Por essa perspectiva, desenvolve seu raciocínio para
concluir que o desvio individual se torna instrumento de transformação e renovação
social (Alessandro Baratta, 2004 apud Thais Bandeira et al, 2017, p. 48).
Ao desenvolver a teoria de Durkheim, Robert Merton interpreta o desvio como
um produto da estrutura social, que é tão normal quanto o próprio comportamento
conforme as regras e valores predominantes. Com isso, defende que a sociedade não
apenas produz um efeito repressivo, mas também estimulante, motivando tanto
comportamentos conforme normas e valores, como comportamento desviados, tendo
ambos a mesma natureza (Robert Merton, 2002 apud Thais Bandeira et al, 2017, p.
48).
Como se vê, a teoria estrutural-funcionalista parte da premissa de que falta
coesão e ordem na sociedade, de modo que normas nem sempre refletem os valores
sociais, provocando uma falta de identidade social. Assim, em determinadas

48
situações, o indivíduo vai se identificar com seus próprios interesses mais do que com
os interesses do grupo.
O crime seria uma forma individual de adaptação no quadro de uma sociedade
agônica em face de meios escassos.
Logo, tem-se uma sociedade em que os meios são escassos, que vive situação
de intensa escassez e, diante disso, tem-se o desmantelamento dos valores sociais,
a sobreposição dos interesses do indivíduo em detrimento dos valores sociais. Como
uma forma de sobreviver, o indivíduo irá encontrar no crime a sua forma de atuação.
Cuida-se, pois, de uma teoria de consenso.
Em síntese, a teoria estrutural-funcionalista defende que (i) não se deve buscar
as causas dos desvios nos fatores bioantropológicos e naturais, tampouco na situação
patológica da estrutura social; (ii) o desvio é um fenômeno normal da estrutura social;
(iii) o desvio somente será negativo para a existência e desenvolvimento da estrutura
social se forem ultrapassados determinados limites, gerando um estado de
desorganização, de modo que todo o sistema de regras de conduta perca o valor,
enquanto ainda não se tenha afirmado um novo sistema (que é a chamada situação
de “anomia”).

9.3.3 Teorias do conflito (A criminologia crítica)

A teoria do conflito parte do pressuposto de que a ordem social está fundada


necessariamente na coerção, na força e na dominação; nega-se a busca do consenso.
Nesse contexto, a criminologia crítica/radical examina de que maneira a distribuição
do poder econômico acaba interferindo no processo. O modelo explicativo da
criminologia radical se reconduz aos princípios do marxismo.
A criminologia radical distingue entre crimes que são expressão de um sistema
intrinsecamente criminoso [v.g., a criminalidade de white-collar, o racismo, a
corrupção, o belicismo) e crimes das classes mais desprotegidas. Este, que constitui
o verdadeiro problema criminal da sociedade capitalista, nem sempre é encarado com
simpatia pelos criminólogos radicais. Na medida em que se traduz num ato individual
de revolta, este crime revela uma falta de consciência de classe e representa um
dispêndio gratuito de energias que importa canalizar para a revolução.
A grande obra acerca da Criminologia Crítica é a obra de Alessandro Baratta,
denominada “Criminologia Crítica e Crítica do Direito Penal”, publicada pela Editora

49
Revan. Baratta nesta obra examina justamente a dinâmica de distribuição de poder
econômico na rotulação de determinados comportamentos como criminosos. Aqueles
que detêm o poder de rotular crimes e, por consequência, criminosos, são aqueles
que detêm o poderio econômico em detrimento do proletariado (alvo do processo de
etiquetamento).
A Teoria do Labelling Approach não legitima o rotulamento, apenas analisa
como ele se dá. Aqui tem-se um ensaio crítico deste processo, no sentido de analisar
que esta distribuição de poder entre quem rotula e quem é rotulado irá refletir a
dinâmica econômica de um determinado grupo, se reconduzindo ao pensamento
marxista que vai diferenciar os detentores do capital do proletariado.
Neste âmbito, insere-se o conceito de seletividade penal, que acusa a ausência
de neutralidade no processo de tipificação de comportamentos (etiquetamento). Isso
porque etiquetar uma determinada conduta para que seja tratada como criminosa
implica rotular e etiquetar também indivíduos, ou seja, define-se contra quais
indivíduos se exercerá o aparato punitivo.
No direito nacional, o rol de crimes tratados com maior minúcia são os crimes
contra o patrimônio (maiores penas). Inclusive, quando se analisa a pena de homicídio
simples com outras condutas com finalidade patrimonial, observa-se que as penas
mais elevadas são previstas para os crimes patrimoniais, e não para os crimes nos
quais a finalidade do indivíduo em si é atentar contra a vida.
A finalidade patrimonial é interpretada de maneira mais gravosa pelo nosso
legislador e pelos aplicadores do Direito. Esta escolha se dá no processo de
criminalização da conduta e no processo da efetiva aplicação da lei penal. Logo, essa
seletiva penal marca a ausência de neutralidade e a escolha por parte do Estado dos
agentes que serão alcança- dos pelo aparato criminoso.
Se examinarmos os ambientes prisionais, a massa encarcerada corresponde a
uma massa que teria capacidade econômica ativa. Portanto, a finalidade é retirar a
massa do mercado de trabalho, para que esse mercado de trabalho seja deixado para
outra parcela da sociedade, além de demonstrar que o Estado tem o interesse de se
valer dessa mão de obra a partir de outros modelos de exploração, sobretudo quando
se pensa nos presídios privatizados.
Outro livro muito interessante de ser trabalhado é o de Juarez Cirino dos Santos
chamado “A Criminologia Radical”. Este autor também observa a lógica das relações
econômicas e a maneira como o proletariado é atingido nos processos de tipificação

50
a partir da supremacia dos interesses dos detentores do poder econômico. Há duas
teses de Juarez Cirino que revelam um pensamento crítico radical, que são a
coculpabilidade e conflito de deveres (Juarez Cirino dos Santos, 2006 apud Thais
Bandeira et al, 2017, p. 51).
A coculpabilidade é trabalhada por Zaffaroni, quando trata da culpabilidade por
vulnerabilidade (indivíduos abandonados pelo Estado). Neste caso, o Estado que
desampara seria corresponsável pelo crime praticado por estes indivíduos, que
poderiam gozar de uma atenuante de pena. Aqui no Brasil existe a atenuante de pena
do art. 66 do Código Penal.
Juarez Cirino radicaliza este pensamento para poder dizer que este indivíduo
age em conflito de deveres, age entre a não privatização e prostituição dos seus filhos
e o cometimento do crime. Nos dois caminhos o indivíduo estaria infringindo normas
de conduta. Se ele resolve praticar um crime, estaríamos diante de caso de
inexigibilidade de conduta diversa, isto reflete um pensamento criminológico marxista,
um pensamento extraído da criminologia crítica. Muito embora não se tenha nenhuma
decisão jurisprudencial excluindo culpabilidade com fundamento nisso, já temos
julgados que atenuam a pena.
Por fim, o livro de Eugenio Raul Zaffaroni chamado “Em busca das penas
perdidas” trabalha não só o conceito de seletividade penal, como também os conceitos
de criminalização primária, criminalização secundária, cifra oculta - cifra “negra”, zona
obscura, “dark number” ou “ciffre noir” e cifra dourada.
Quando falamos de criminalização, seu processo é seletivo (escolhe quem quer
punir). Esta escolha se projeta tanto para a criminalização primária (tipificação criminal
das condutas em si, sendo que este processo também não é neutro), quanto para a
criminalização secundária (quando se coloca em prática a aplicação da norma penal
por meio das instâncias de controle, que também é seletiva).
Zaffaroni também trabalha os conceitos de cifra oculta, ou seja, consistem em
margens da criminalidade que não chegam ao conhecimento das instâncias oficiais
de controle. Esta criminalidade que não é do conhecimento do Estado compõe as
cifras ocultas. Ao lado das cifras ocultas, existem as cifras douradas, que são a
projeção das cifras ocultas, porém no plano da criminalidade de colarinho branco, da
criminalidade econômica (condutas que o Estado realmente não quer punir).
Com isso, a teoria crítica combateu diversos posicionamentos das outras
teorias da criminalidade. Esse clima de questionamento da criminologia propiciou o

51
florescimento, alguns anos depois, de três tendências da Criminologia: o neorrealismo
de esquerda, o direito penal mínimo e o abolicionismo criminal. O abolicionismo
criminal não encontra grande aceitação na América Latina, e, em especial, no Brasil.
Eventualmente encontramos defensores do Direito Penal Mínimo que recusam o
rótulo de abolicionistas, mas que agem como tais. O neorrealismo de esquerda (e o
seu respectivo movimento de law and ordef) e o direito penal mínimo são, talvez, duas
das posições ideológicas de maior debate na atual Criminologia, que serão a seguir
desenvolvidos.

9.4 Teorias do Controle Social; o labelling approach (interacionismo simbólico


e construtivismo social).

A Teoria do labeling approach, surgida nos Estados Unidos por volta dos anos
70, possui outros nomes que devem ser lembrados, são eles: Teoria da rotulação
(também conhecida como teoria interacionista, teoria da reação social, do labelling
approach ou do etiquetamento).
É considerada um dos marcos das teorias de conflito. A teoria do etiquetamento
rompeu paradigmas. Ela deu um giro profundo na forma de se analisar o crime. Deixou
de centrar estudos no fenômeno delitivo em si e passou a focar suas atenções na
reação social proveniente da ocorrência de um determinado delito.
Lembre-se que, até então, o estudo esteve focado na origem do crime, no crime
em si (teorias sociológicas do consenso) ou no criminoso (teorias biológicas). A teoria
do etiquetamento muda o foco de estudo. Deixa-se de focar no crime e no criminoso
para examinar a origem do delito, as causas e consequências do controle social,
passa-se a focar no processo de criminalização e na forma como o indivíduo reage a
esse processo de criminalização.
Logo, desvia o centro de estudo do crime e criminoso para passar a estudar o
processo de criminalização em si, como também a forma como o indivíduo criminoso
reage a este processo.
Os principais representantes dessa linha de pensamento são Erving Goffman
e Howard Becker.
A própria etimologia da palavra nos ajuda a compreender o conceito da teoria.
Veja que “Label” significa etiqueta e “Approach” significa empreender, colocar. Logo,
trata-se da teoria do colocar as etiquetas ou Teoria do Etiquetamento. Ela também é

52
referida como Teoria do Interacionismo Simbólico, porque vai observar a interação
entre o indivíduo e o criminoso no momento em que o Estado diz que ele é criminoso
e a forma como esse indivíduo interage com o Estado diante disso.
Analisa-se como o indivíduo criminoso reage a esta etiqueta colocada pelo
Estado referente a um determinado comportamento. Dentro desta lógica, imagine uma
grande prateleira de condutas, cabendo ao detentor do poder de tipificação de
condutas criminosas a atividade de colocar etiquetas, etiquetando alguns
comportamentos como lícitos e outros como ilícitos e proibidos. Diante deste processo
quais são os fatores envolvidos? Até onde podemos considerar o desvio social como
ato ou ação de um indivíduo? Até que medida o crime é um produto do indivíduo?
Essas perguntas são importantes, pois o processo de tipificação de condutas é
o ponto de partida para um processo de estigmatização social. No momento em que
se tipificam determinados comportamentos, se está estigmatizando de maneira
decisiva aqueles que venham a praticar aquele tipo de crime.
Um indivíduo tendo praticado o comportamento criminoso, será tido como
sujeito incapaz de seguir as normas de um corpo social, estando, portanto, de fora e
fora do corpo social, é um “outsider”. O conceito de “outsiders” é um conceito relativo,
visto que se pode ter dentro de um subgrupo delinquente a compreensão de que o
“outsider” é aquele que dita as normas. Contudo, dentro da lógica de distribuição de
poder, o “outsider” que será efetivamente atingido pelo sistema repressor penal é
justamente aquele que não age de acordo com as normas etiquetadas pelas
instâncias oficiais de controle (Estado e meios formais de categorização de condutas
como criminosas ou não).
Seguindo Becker, os grupos sociais criam os desvios ao fazerem as regras cuja
infração constitui o desvio e ao aplicarem tais regras a certas pessoas em particular,
qualificando-as como marginais. Os processos de desvios, assim, podem ser
considerados primários e secundários (Howard S. Becker, 2008 apud Thais Bandeira
et al, 2017, p. 53).
O desvio primário corresponde à primeira ação delitiva do sujeito, que pode ter
como finalidade resolver alguma necessidade, por exemplo, econômica, ou produz-se
para acomodar sua conduta às expectativas de determinado grupo subcultural.
O desvio secundário se refere à repetição dos atos delitivos, especialmente a
partir da associação forçada do indivíduo com outros sujeitos delinquentes. (Rogério
Greco, 2013 apud Thais Bandeira et al, 2017, p. 53).

53
Diante disso, observa-se que a teoria do labelling approach privilegia, na
análise do comportamento desviado, o funcionamento das instâncias de controle
social (criminalização secundária), ou seja, a reação social aos comportamentos
assim etiquetados. Crime e reação social são, segundo esse enfoque, manifestações
de uma só realidade: a interação social.
Não há como compreender o crime senão em referência aos controles sociais.
Com as teorias da criminalidade e da reação penal baseadas sobre o labelling
approach, e com as teorias conflituais, tem lugar no âmbito da sociologia criminal
contemporânea a passagem da criminologia liberal para a criminologia crítica. Uma
passagem, como parece evidente, que ocorre lentamente e sem uma verdadeira
solução de continuidade. A recepção alemã do labelling approach em particular é um
momento importante dessa passagem.
Essa direção de pesquisa parte da consideração de que não se pode
compreender a criminalidade se não se estuda a ação do sistema penal que a define
e reage contra ela, começando pelas normas abstratas até as instâncias oficiais
(polícia, juízes, instituições penitenciárias que as aplicam), e que, por isso, o status
social do delinquente pressupõe, necessariamente, o efeito da atividade das
instâncias oficiais de controle social da delinquência. Enquanto não adquire esse
status aquele que, apesar de ter realizado o mesmo comportamento punível, não é
alcançado, todavia, pela ação daquelas instâncias. Portanto, este não é considerado
e tratado pela sociedade como delinquente.
Nesse sentido, o labeling approach tem se ocupado principalmente das reações
das instâncias oficiais de controle social, consideradas na sua função, constitutiva em
face da criminalidade. Sob o ponto de vista, tem estudado o efeito estigmatizante da
atividade da polícia, dos órgãos de acusação pública e dos juízes. Alessandro Baratta,
2004 apud Thais Bandeira et al, 2017, p. 54).
Não interessam, enfim, à perspectiva interacionista as causas do desvio
primário, mas só os processos de criminalização secundário, vale dizer, os processos
de funcionamento de reação e controle sociais, que são, em última análise, os
responsáveis pelo surgimento do desvio como tal. Ou seja, para o interacionismo, o
delito é apenas um rótulo social derivado do processo de etiquetamento (Lélio Braga
Calhau, 2009 apud Thais Bandeira et al, 2017, p. 54).

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