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- Mas por que lhes ensinaram essas coisas? Por que “atenção”? Por
que “aqui e agora”?
- Bem...
- Por que essas são as coisas que a gente sempre esquece. Quero dizer,
a gente se esquece de prestar atenção ao que está acontecendo, e isso
equivale a não estar aqui agora.
- E os mainás voam por aí para nos fazer lembrar? É isso o que você
quer dizer?
Desse modo, agindo de acordo com o roteiro para um ritual de morte descrito
neste seu romance, no qual se busca o nível de conscientização mais elevado na hora de
morrer, Huxley optou por uma droga capaz de expandir a consciência ao invés de
mortificá-la. Assim pensara durante a sua vida, assim aprendeu durante a experiência
com a morte de sua primeira mulher, Maria Huxley, relatada em uma carta para
Humphry Osmond: “Minha experiência com Maria convenceu-me de que os vivos
podem fazer muita coisa para tornar mais fácil a passagem para os moribundos, para
elevar o ato mais puramente fisiológico da existência humana ao nível da
conscientização e talvez até da espiritualidade.”.
Huxley teve uma clara distinção sobre os diferentes tipos de drogas existentes,
assim como os seus diferentes agenciamentos. Ao longo de sua vida, através de seus
livros, cartas e artigos, além de participações em conferências, ele sempre demonstrou
sua preocupação com o avanço farmacológico e as finalidades das drogas que eram ou
poderiam ser lançadas. Muitos críticos consideram Huxley um ensaísta justamente por
suas obras se basearem mais em suas idéias do que no desenrolar das personagens. Em
seu último livro “A Ilha” o autor descreve uma droga, “moksha”, capaz de levar os
habitantes de Pala a explorarem melhor as suas potencialidades desde jovem. Já em
“Admiravel Mundo Novo” (1932) o autor nos apresenta a droga “soma”, utilizada
mediante qualquer motivo banal para uma satisfação imediata. Instaurada como
verdadeira instituição política, soma era um poderoso instrumento de domínio dos
governantes desse mundo fictício.
O escritor temia drogas que poderiam deixar pessoas sentindo-se felizes quando
normalmente se encontrariam em outro estado emocional. Tal droga poderia ser uma
grande ferramenta de controle social e servir a interesses despóticos. Uso fascista das
drogas.
Seu entusiasmo com este encontro fez com que Huxley dedicasse a década final
de sua vida ao psicodelismo. Publicou “As portas da Percepção” (1953), no qual relata
a sua primeira experiência com mescalina. Trocou correspondências constantes com
muitos expoentes desse tópico, como Humphry Osmond, Timothy Leary, Albert
Hoffman dentre outros. Participou assiduamente de simpósios e conferências por
especialistas em sua maioria ligados a área médica a respeito dessas drogas e os seus
efeitos. O escritor chamava para si a responsabilidade de ser uma “ponte” entre a
ciência e o mundo em geral. Suas considerações se pautavam em experimentações
dessas drogas por pessoas sem transtornos mentais, foco privilegiado pelos palestrantes
em questão. Para Huxley, uma pessoa do mundo das letras poderia descrever melhor o
efeito das drogas na mente para o público em geral do que especialistas médicos e
químicos.
Como você diz em sua carta, ainda sabemos muito pouco sobre os
psicodélicos, e até que saibamos bastante mais, acho que o assunto
devia ser discutido, e as investigações descritas, na relativa
privacidade das publicações eruditas, na obscuridade decente de livros
a artigos moderadamente intelectualizados. O que quer que se diga no
ar esta destinado a ser mal compreendido; pois as pessoas tiram do
discurso impresso ou ouvido aquilo que estão predispostas a ouvir e
ler, não o que está lá. Tudo o que a TV pode fazer é aumentar em
milhares o número de pessoas que compreendem mal... (Carta a H.
Osmond de 22-07-1956 in Huxley, 1983:89)
Não é possível negar que Huxley, de fato, tivera grande influência na difusão das
drogas psicodélicas na metade final dos anos 60. Deve-se levar em conta que, antes
desse escritor iniciar sua empreitada nesse tema, nos anos 50, só podia ser encontrado
estudos clínicos e fisiológicos a respeito da droga, não havendo pesquisas literárias ou
humanistas. Foi através de sua obra que as pessoas de fora do mundo científico puderam
travar conhecimento com tais substâncias. Entretanto, o autor sempre enfatizou que o
uso de psicodélicos deveria ser realizado com um direcionamento, como parte de uma
técnica de misticismo aplicado, uma experiência transcendental que permitisse as
pessoas aprimorar as suas percepções ordinárias posteriormente.
Ao longo dos últimos cinco anos tomei mescalina duas vezes e ácido
lisérgico três ou quatro vezes. Minha primeira experiência foi
principalmente estética. Experiências posteriores foram de outra
natureza e ajudaram-me a compreender muitas das declarações
obscuras que se encontram nos escritos dos místicos cristãos e
orientais(...)Parece não haver prova, na literatura publicada, de que a
droga cause vício ou crie uma necessidade de repetição. Há um
sentimento – falo por experiência própria e por relatórios orais dados
a mim por outros – de que a experiência é tão transcendentalmente
importante que não é, em circunstância alguma, uma coisa para ser
encarada com leviandade ou para divertimento. (Carta ao Padre T.
Merton de 10-01-1959; in Huxley, 1983: 127)
1
O King's College of Our Lady of Eton beside Windsor, comumente conhecido como Eton College ou
apenas como Eton, é uma public school para garotos, fundada em 1440 por Henrique VI da Inglaterra
(privativamente e independente. Localizada em Eton, Berkshire, o colégio uma longa lista de alunos e ex-
alunos famosos, incluindo dezenove ex-primeiro-ministros britânicos e os dois atuais príncipes do Reino
Unido.
medicina. Forçado a ler em braile e de uma máquina para escrever, Huxley conseguiu
posteriormente recuperar-se um pouco de sua cegueira, o suficiente para se formar com
honra pela Universidade de Oxford, na qual se dedicara a literatura.
Iniciou a sua carreira literária como poeta, sendo que as suas primeiras poesias –
“A derrota da juventude” (1918) e “Leda” (1920) – demonstram a amargura do seu
autor mediante a provável irreversibilidade de sua cegueira. Pouco tempo depois, o
autor mudou o seu estilo de criação literária e passou a escrever em prosa. Obras como
Amarelo-Cromo (1921), Ronda Grotesca (1923), Folhas Inúteis (1925) e Contraponto
(1928) levaram o jovem escritor a ser comparado com outros dois rebeldes literatos
contemporâneos; Nowel Coward2 e Richard Aldington3. Entretanto, Aldous Huxley
distinguia-se de seus conterrâneos por não somente atacar os modos de vida burguesa,
mas também apresentar sugestões para o seu aperfeiçoamento. Grandes preocupações
filosóficas sempre ocuparam a mente do escritor, e a forma como as abordava em suas
obras, como “Jesting Pilate” (1926), e “Time Must Have a Stop” (1944) levaram
críticos a situarem-no muito mais como um ensaísta do que como um romancista.
Huxley desenvolvia o seu estilo brilhante e que no decorrer de sua carreira, tornou-se a
sua marca.
Huxley viveu a maior parte dos anos 20 na Itália, país que se encontrava sob a
tutela do Estado fascista conduzido por Benito Mussolini. Este período experimentado
pelo escritor fez nascer uma constante preocupação em respeito ao detrimento da
liberdade individual frente ao autoritarismo dos Estados. De fato, a preocupação com a
autonomia individual e a avaliação de muitos problemas que poderiam resultar em
governos despóticos foi uma questão central ao longo de sua vida, sendo uma de suas
2
Noël Pierce Coward (16 de Dezembro de 1899 - 26 de Março de 1973) foi um dramaturgo, ator e
compositor britânico. Por ser um homossexual influente, Noël Coward foi incluído no "livro negro", lista
preparada pelos nazistas que incluía pessoas que deveriam ser presas e assassinadas após a conquista do
Reino Unido.
3
Richard Aldington (8 de Julho de 1892 - 27 de Julho de 1962) foi um escritor britânico. Como poeta,
pertenceu ao grupo dos imagistas. A maior parte dos seus romances como “Death of a Hero” tem a sua
origem nas experiências que viveu durante a I Guerra Mundial.
grandes preocupações. No romance Admirável Mundo Novo, provavelmente o livro
mais conhecido de Huxley, o autor explora e revela muitas questões relacionadas a este
tema.
4
Alusão a Henry Ford, industrial estadunidense que criou a montagem em série para produzir
automóveis em massa por menos e com custos mais baixos.
inicialmente. O autor compara a sua obra com 1984 (1949), escrito por George Orwell e
que retrata o cotidiano de um regime totalitário e repressivo.
Entretanto, não significa que em tal sociedade o controle seja menos eficaz. De
acordo com Huxley,
No livro “Admirável Mundo Novo”, não existia outra droga que não o soma. Esta
substância era utilizada como forma de controle governamental, estendendo o seu
domínio sob a subjetividade e a disposição dos indivíduos.
- Parem! – gritou o Selvagem, com voz retumbante (...) Não tomem essa
droga horrível. É veneno, é veneno (...)
- Vocês não querem ser livres, ser homens? Nem sequer compreendem
o que significa ser homem, o que é a liberdade?(...) Pois bem! Então –
prosseguiu em tom feroz -, então eu vou ensiná-los; vou obriga-los a
ser livres, queiram ou não queiram! – E, abrindo uma janela que dava
para o pátio interno do Hospital, pôs-se a atirar para fora, aos
punhados, as caixinhas de comprimidos de soma.
Admirável Mundo Novo fora muito bem acolhido pela crítica e permitiu ao seu
escritor grande reconhecimento. Mudou-se para Hollywood no ano de 1937, tornando-
se também um roteirista renomado do cinema. Os principais romances escritos por
Huxley nessa fase foram "Também o cisne morre" (1939), "O Tempo pode parar"
(1944), "O macaco e a essência" (1948).
No ano de 1953, Aldous Huxley iniciou contato com o Dr. Humphry Osmond,
um psiquiatra que estudava a relação entra a experiência com a mescalina e a
esquizofrenia. Interessado em experimentar-se com a droga, o escritor fez um convite ao
psiquiatra para que esse se hospedasse em sua residência durante o congresso da
Associação Psiquiátrica Norte-Americana que se realizaria em Los Angeles, pedindo
para que o mesmo trouxesse consigo uma pequena porção da substância, indicando que
lhe agradaria, assim como sua esposa, serem tomados como objetos dessa experiência
conduzida por um estudioso experiente. Osmond concordou com o pedido do escritor,
embora a possibilidade de se tornar conhecido como o homem que enlouqueceu Huxley
o assustara inicialmente.
Huxley acreditava que certas pessoas nasceram com alguma espécie de desvio
capaz de invalidar essa válvula redutora, como os artistas, enquanto em outras, este
desvio pode surgir em caráter temporário.
Huxley via o valor das drogas alucinógenas no sentido que elas davam
às pessoas que perderam o presente da percepção visionária
espontânea pertencente aos místicos, santos e grandes artistas, o
potencial para experimentar este extraordinário estado de consciência
e assim atingir a introspecção do mundo espiritual desses grandes
criadores. Alucinógenos poderiam conduzir a um entendimento
aprofundado do conteúdo místico e religioso e para uma nova e
estimulante experiência das grandes obras de arte. (Hofmann, 1980:77)
3.5 – Reverberações