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Max Weber e a objetividade do conhecimento nas ciências da

cultura: um breve guia para o texto A ‘Objetividade’ do


Conhecimento na Ciência Social e na Ciência Política (1904)

Jean Henrique Costa*

Resumo
O presente artigo objetiva discutir o sentido da objetividade do conhecimento
empírico-social na obra de Max Weber, especificamente no texto “A
‘Objetividade’ do Conhecimento na Ciência Social e na Ciência Política”, de
1904. Discute-se, no primeiro momento, a distinção entre conhecimento
empírico e juízo de valor; no segundo momento, faz-se uma rápida crítica às
idéias de “lei” e “conexão regular” nas ciências sociais para, em seguida, na
terceira parte, discutir a estrutura da formação dos conceitos típico-ideais como
recursos metodológicos, nos quais, para Weber, expressam a possibilidade da
validade objetiva do conhecimento nas ciências da cultura.
Palavras-chave: Max Weber; Objetividade; Ciências da Cultura; Tipo Ideal.

Max Weber and the objectivity of knowledge in the science of culture: a


brief guide to the text The 'Objectivity' of Knowledge in Social Science and
Political Science (1904)
Abstract
This article discusses the meaning of the objectivity of social-empiric knowledge
in work of Max Weber, specifically in text The 'Objectivity' of Knowledge in
Social Science and Political Science, 1904. It discusses the first time, the
distinction between empirical knowledge and value judgments in the second
time, it is a quick review of the ideas of "law" and "regular connection" to the
social sciences, then in the third part discuss the structure of the formation of
ideal-typical concepts and methodological tools, in which, for him, express the
possibility of objective validity of knowledge in the sciences of culture.
Key words: Max Weber. Objectivity. Science of Culture. Ideal Type.

*
JEAN HENRIQUE COSTA é Sociólogo (DCS/UFRN), bacharel em Turismo (UnP), especialista
em Demografia (DEST/UFRN), mestre em Geografia (PPGe/UFRN) e doutorando em Ciências Sociais
(PGCS/UFRN). Professor da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (UERN). E-mail:
jeanhenrique@uern.br.

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1. Apresentação Jaffé, a direção da revista. Mesmo tendo o
A permanente confusão entre a texto, por conseguinte, a função de
elucidação científica dos fatos e a orientação geral para uma revista, não
reflexão valorativa é uma das deixou de ser uma expressão vital do
características mais difundidas em pensamento de Max Weber, trazendo
nossas disciplinas, e também uma das consigo três questões fundamentais para a
mais prejudiciais. prática científica: 1. A distinção entre
Max Weber “juízo de valor” e “realidade empírica”; 2.
A crítica às idéias de “lei” e “conexão
O breve artigo que se apresenta nas regular” nas ciências da cultura; e 3. O
páginas ulteriores é, ab initio, apenas uma significado da “validade objetiva” por
tentativa de oferecer aos leitores meio da construção de conceitos-limites
iniciantes uma reflexão introdutória (o chamado tipo ideal).
acerca da possibilidade de validade A idéia de objetividade em Weber não
objetiva do conhecimento nas “ciências tem o mesmo sentido de neutralidade,
da cultura”, debate esse fornecido entre o conforme pode sugerir uma leitura mais
final do século XIX e início apressada. Conforme alerta
do século XX pelo sociólogo Gabriel Cohn (1986), a idéia
alemão Max Weber (1864- de objetividade em Weber é
1920). Trata-se aqui de sempre posta entre “aspas”.
revisitar um texto particular Não se pode tratar a idéia de
do autor, buscando melhor objetividade no sentido
compreender os desafios convencional, como o fez
epistemológicos e Durkheim. Completando com
metodológicos de nosso Hall (2003), em ciência social
tempo. toda pesquisa é teorizada,
A análise empreendida funda- mas não se trata exatamente
se no texto “A ‘Objetividade’ de teoria com “T maiúsculo”.
do Conhecimento na Ciência Esses três pontos foram
Social e na Ciência Política”, colocados em 1904 e, mesmo
escritura capital para a com idade centenária, sem
metodologia das ciências sociais. Trata-se sombra de dúvida ainda trazem uma série
de um texto que, embora escrito em de desafios atuais diante das novas
poucas páginas (50 págs., a depender da inquietudes ontológicas e epistemológicas
edição/tradução), não apresenta fácil surgidas no último quartel do século
compreensão, sobretudo para aqueles passado – instabilidade, incerteza,
leitores não tão familiarizados com a obra imprevisibilidade e dinamicidade do
weberiana e seus conceitos sociológicos mundo social. Destarte, uma vez que o
fundamentais. A forma dissertativa é citado documento é basal para a prática
“carregada” e metódica, escrita, em científica hoje e, concomitantemente, de
alguns trechos, para um discípulo ler. intricada compreensão, faz-se aqui um
exercício de esclarecê-lo, não na idéia
O texto foi publicado em 1904 visando (pois seria um infrutífero estouvamento
avalizar as orientações gerais do Arquivo intelectual), nas na forma. Assim, esta
para a Ciência Social e Política Social – breve leitura da arquitetura
Archiv für Sozialwissenschaft und epistemológica weberiana tenta clarificar
Sozialpolitik, no qual coube a Weber, os três pontos supracitados.
juntamente com Werner Sombart e Edgar

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2. A distinção entre a simples valoração própria consciência e sua cosmovisão
e a realidade empírica (juízo de valor e pessoal” (WEBER, 2001, p. 110).
juízo de fato) Decidir-se por uma opção é, para Weber,
exclusivamente um assunto pessoal.
O primeiro pressuposto de uma
investigação científica, para Weber, é o Weber esclarece que juízos de valor são
afastamento básico dos juízos de valor da opiniões pessoais, às vezes muito simples,
análise da vida social, preocupação às vezes bem elaboradas, inclusive em
epistemológica que teve também, alguns casos com pressupostos
guardadas as singularidades, Émile orientadores. Todavia, são apenas
Durkheim, optando por denominar de impressões sobre a realidade. Nada mais
“pré-noções1”. Este afastamento do que isso. Derivam do imediato, da
weberiano não significa, segundo exame impressão do indivíduo sobre sua
de Cohn (1986, p. 22), a defesa em realidade particular. Nada têm de
absoluto “de uma postura indiferente ou objetividade. “Se o sujeito que emite
amorfa perante o mundo, nem tampouco juízos de valor deve professar estes
na busca de compromissos entre valores critérios últimos, isso é um problema
inconciliáveis”. Expressa apenas a pessoal, uma questão de sua vontade e de
distinção entre a busca por objetividade e sua consciência; não tem nada a ver com
o sentido da “valoração” (opinião baseada o conhecimento empírico” (WEBER,
em crenças, sentimentos, valores, etc., ou 2001, p. 111). Porém, o autor ainda alerta
seja, o próprio sacrifício do intelecto para para possibilidade de profissão de fé
Weber). nesses juízos:
Para Weber, “juízos de valor não Sem dúvida, é verdade que
deveriam ser extraídos de maneira exatamente aqueles elementos mais
nenhuma da análise científica, devido ao íntimos da ‘personalidade’, ou seja,
fato de derivarem, em última instância, de os últimos e supremos juízos de
determinados ideais, e de por isso terem valor, que determinam a nossa ação e
origens ‘subjetivas’” (WEBER, 2001, p. conferem sentido e significado à
109). A consciência valorativa não deve nossa vida, são percebidos por nós
guiar a investigação científica. “Ela é como sendo objetivamente válidos
própria do homem da ação: ele pondera e (WEBER, 2001, p. 111).
escolhe, entre os valores em questão, Há uma preocupação weberiana em
aqueles que estão de acordo com sua caracterizar o juízo de valor como sendo
do campo da crença, não tendo, portanto,
1
Durkheim trata as pré-noções como idéias possibilidade de validade objetiva. Para
formadas no âmbito das práticas morais, das ele, “seja como for, somente a partir do
crenças políticas e religiosas, enfim, das práticas pressuposto da fé em valores tem sentido
do sentimento. Para ele, “devemos afastar a intenção de defender certos valores
sistematicamente todas as pré-noções [pois é]
necessário que o sociólogo, quer no momento em publicamente. Porém emitir um juízo
que determina o objeto de suas pesquisas, quer no sobre a validade de tais valores é assunto
decurso das suas demonstrações, se abstenha da fé, [...], mas, certamente, não é tarefa
resolutamente de empregar esses conceitos de uma ciência empírica” (WEBER,
formados fora da ciência e em função de 2001, p. 111).
necessidades que nada têm de científico. É preciso
que se liberte das falsas evidências que dominam A aparência do óbvio é perigosa para a
o espírito do vulgo [...] Pelo menos, se algumas
vezes a necessidade o obriga a servir-se delas, que
ciência, bem como os meios explicativos
o faça com consciência do seu pouco valor [...]” da suposta coerência empírica expressa
(DURKHEIM, 2001, p. 54-55). em valores. Para Weber é dever da

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ciência esclarecer o leitor, o seu usuário compreensiva weberiana. “Nada
final, acerca dos caminhos pelos quais se prejudicou mais o interesse da ciência do
chegou à este ou àquele resultado. “Pois, que não se querer ver os fatos incômodos
uma das tarefas essenciais de qualquer e as realidades da vida na sua dureza”
ciência da vida cultural dos homens é, (WEBER, 2001, p. 113). Isso ocorre,
realmente, desde o início, a apresentação pois, o juízo de valor é particular e, como
clara e transparente de suas idéias, para tal, seleciona o que é bom ou ruim para o
compreendê-las e para saber o porquê de seu projeto de vida. O saber objetivo é
se ter lutado por elas” (WEBER, 2001, p. diferente. Age mediante determinados
110). pressupostos que são, ad corpus,
reconhecidos por toda a comunidade
O conhecimento valorativo, reforça acadêmica. Para Weber, “é certo que – e
Weber, além de ser uma cosmovisão, continuará a sê-lo – se uma demonstração
ainda não nos oferece este caminho científica, metodologicamente correta no
metodológico. É um valor preso em sua setor das ciências sociais, pretende ter
própria construção. Não é uma elucidação alcançado o seu fim, tem de ser aceita
crítica, mas sim uma “cosmovisão”, que, como sendo correta também por um
para o autor, nunca pode ser o resultado chinês” (WEBER, 2001, p. 113-114).
de um avanço do conhecimento empírico.
Weber aponta que o juízo de valor tenta Deve-se buscar tal postura, mesmo
esconder aqueles elementos da realidade quando há problemas no material da
que lhe são incômodos. Isto recebe o pesquisa. O exemplo do “chinês” citado
nome de pseudociência para Carl Sagan pelo autor é uma boa ilustração do
(1996, p. 28-30), onde há a esquiva do pretendido, pois este chinês deve
exame cético e se fornecem respostas reconhecer como válido o ordenamento
fáceis para o coração, enfim, fervilhando- conceitual da realidade empírica. Neste
se de credulidade. Sagan afirma ainda que ponto reconhecem-se algumas leituras
“a pseudociência é mais fácil de ser equivocadas acerca da afirmação
inventada que a ciência, porque os weberiana da universalidade dos
confrontos perturbadores com a realidade procedimentos científicos. Não é que o
são evitados mais facilmente”. No saber chinês tenha que concordar com as
empírico-objetivo tais confrontos com a considerações empíricas de um trabalho
realidade não podem ser evitados, já que específico, mas sim, que ele reconheça a
evitar seria uma ação seletivo-emocional legitimidade científica exposta naquelas
e esta, por sua vez, é de domínio páginas. Não se trata de universalidade
subjetivo. positiva e nem da criação de receitas de
bolo. Nada disso! Weber é claro quanto à
O saber científico, objetivo, racional, questão da ciência social como apreensão
metódico, sistemático e demonstrativo das singularidades históricas e reconhece,
opera com outro sentido: a busca de ver a portanto, não uma única possibilidade de
realidade como ela é (embora sob resposta para determinado fenômeno
múltiplas possibilidades). Conforme a empírico, mas várias possibilidades de
leitura de Reale & Antiseri (2006), Weber causas e conseqüências. Trata-se, pois, de
distingue claramente entre juízos de fato e reconhecer os princípios e não apenas os
juízos de valor, entre aquilo que “é” e resultados.
aquilo que “deve ser”. O “devir” e a
possibilidade de emancipação são Em suma, a “objetividade” é possível,
resultados de outras teorizações e todavia, dependerá dos esforços do
filosofias distintas da sociologia pesquisador em, de um lado, reconhecer a

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impossibilidade de afastamento completo Para Weber (2001, p. 133), “os problemas
dos valores, e, de outro, ter o esforço culturais que fazem mover a humanidade
pessoal de reconhecer esses valores renascem a cada instante, sob um aspecto
(conscientes e inconscientes) e procurar diferente, e permanecem variáveis...”.
ver a realidade independentemente deles. Não há como se pensar em
Eis a tensão da epistemologia em Weber. determinações, relações de exata conexão
causal num objeto que, a priori, já é
Buscando sintetizar este primeiro ponto,
imprevisível. Entregue a um bondoso pai
um juízo de valor se situa no plano da
de família um revolver e aponte o
emoção para com a realidade. É um
resultado de sua ação, sob a forma de lei!
mecanismo opinativo. Pouco possui de
O cientista social imbuído da idéia de lei
válido empiricamente. Contudo, o que é
ou conexão regular, em seu juízo de
um conhecimento empiricamente válido?
valor, diria: é um homem de “bem”,
O que significa, em Weber, objetividade
portanto, nada fará. Caso fosse um
nas ciências sociais? Antes desta
homem com amplos antecedentes
problematização, passemos por um outro
criminais, o diagnóstico seria oposto: este
campo, circunvizinho e necessário a este
cometerá alguma ação de desvio, pois há
debate, visando observar que tal
indícios lógicos para a sua ação. Como
objetividade nas ciências da cultura difere
seria fácil e coerente! Isso não existe nas
da idéia de validade objetiva nas ciências
ciências sociais. O objeto é histórico,
naturais (crítica ao positivismo).
mutável, dinâmico e imprevisível. A
3. A crítica aos modelos de “lei” e única lei que podemos formular é que não
“conexão regular” nas ciências sociais há lei. Existe, para Weber, uma
Weber, ao comparar genericamente racionalidade cognitiva chamada de
objeto e método das ciências sociais com possibilidade objetiva do conhecimento2,
o das ciências da natureza, afirma que expressa em probabilidades de
“repetidas vezes acreditou-se poder acontecimentos. Todavia, é radicalmente
encontrar o critério decisivo também nas diferente de conexão regular.
ciências da cultura, na repetição regular, A idéia de lei também é algo muito frágil,
‘conforme leis’, de determinadas já que há um certo “encobrimento” de
conexões causais” (WEBER, 2001, p. fenômenos que escapam a generalidade
124). Enfatiza ainda que, “segundo essa da lei social. Para os defensores da “lei
concepção, o conteúdo das ‘leis’ que causal” nas ciências sociais, os casos
somos capazes de reconhecer na discrepantes (outliers), ou são
inesgotável diversidade do curso dos secundários, já que precisam ser mais
fenômenos deverá ser o único fator estudados, ou são deixados de lado. Tal
considerado cientificamente ‘essencial’” mecanismo operacional das pesquisas
(WEBER, 2001, p. 125). O balanço feito
pelo autor acerca destas leis causais é, 2
A idéia de possibilidade objetiva do
como facultas agendi (faculdade de agir), conhecimento pode ser mais bem expressa por
nas ciências sociais, impossível na padrões de probabilidades, mas nunca por
concretude de seu objeto, uma vez que regularidades exatas. Segundo Reale & Antiseri
(2006, p. 56), “um fato histórico-social explica-se
esse é dinâmico, heterogêneo e em geral por meio de uma constelação de causas;
imprevisível, não sendo passível, e justamente a fim de determinar o maior ou
portanto, de mensurações exatamente menor peso de uma causa particular, o historiador
causais. Admite também que nem mesmo imagina um possível desenvolvimento do evento,
às ciências naturais, exceto a mecânica excluindo justamente tal causa, e se pergunta o
que teria acontecido se essa causa não tivesse
pura, prescinde do elemento qualitativo. existido”.

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nega a própria essência de uma lei causação social e a noção de sistema
explicativa: a sua fórmula deve valer para originária da biologia figuraram
todos os elementos da realidade na qual fortemente no que o autor chamou de
se aplica os seus princípios. Nem mesmo ciência social canônica, ou às vezes
nas áreas mais quantificáveis das ciências chamada de “consenso ortodoxo”
sociais, por exemplo, o comércio (GIDDENS, 2001).
financeiro, é possível a elaboração de leis,
Abstraindo essa polêmica, Weber assinala
alerta Weber. É uma idéia também frágil
que o cientista social trabalhará, por
nessa área, já que há ações imprevisíveis
conseguinte, com padrões de regularidade
em todas as esferas sociais e no comércio
(probabilidades) e não com leis. Espera-se
financeiro não seria diferente (quanta
das variáveis, desta forma, probabilidades
especulação existe nessa área!). Reforça
de acontecimento, mediante estruturação
Weber (2001, p. 129), por conseguinte,
de outras variáveis, e não acontecimentos
que: “o número e a natureza das causas
estabelecidos mediante regularidades
que determinam qualquer acontecimento
exatas. Esse é um segundo item
são sempre infinitos, e não existe nas importante para a compreensão da
próprias coisas critério algum que permita
objetividade. E o que é essa validade
escolher dentre elas uma fração que possa
objetiva do conhecimento nas ciências
entrar isoladamente em consideração”. O
sociais? Passemos, enfim, ao problema
que se pode deduzir de todo esse debate
nuclear deste escrito.
sobre a regularidade dos fenômenos
nas ciências sociais é que: 4. Por uma validade objetiva para
a ciência social: a construção do
... Existe a possibilidade de
proceder à avaliação das tipo ideal como recurso
influências que nos habituamos metodológico
a esperar geralmente [...]. Essas Weber é enfático ao afirmar que não
influências constituem, por existe uma total objetividade da vida
conseguinte, os efeitos cultural que possa ser empregada
‘adequados’ dos elementos causais
pela análise científica. Sempre há o
em questão [...]. O valor desta
afirmação não é de modo algum
elemento da parcialidade presente nas
diminuído pelo fato de que nunca, análises sociais. Não há como eliminar
mesmo nas chamadas ‘leis alguns “pressupostos”.
econômicas’, se trata de conexões
Não existe uma análise científica
‘regulares’, no sentido estrito das
totalmente ‘objetivada’ da vida
ciências da natureza, mas sim de
cultural [...], ou dos ‘fenômenos
conexões causais adequadas,
sociais’, que seja independente de
expressas em regras, e, portanto, de
determinadas perspectivas especiais e
uma aplicação da categoria de
parciais, graças às quais estas
‘possibilidade objetiva’. (WEBER,
manifestações possam ser, explicita
2001, p. 130).
ou implicitamente, consciente ou
inconscientemente, selecionadas,
Mesmo com a legítima crítica weberiana,
analisadas e organizadas na
a visão acerca das leis causais nas exposição, enquanto objeto de
ciências sociais, segundo Giddens (2001, pesquisa (WEBER, 2001, p. 124).
p. 97), foi predominante “na sociologia
durante boa parte do pós-guerra, [se Os juízos de valor, aqueles mesmo que já
estendendo] amplamente em um amplo discutimos no início deste texto, mesmo
espectro de outras ciências sociais”. O afastados da análise, ainda nos
naturalismo (ou positivismo), a idéia de incomodam. Por quê? Porque a vida

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cultural é uma vida de valor. Nas palavras do conhecimento da realidade
de Weber, o próprio “conceito de cultura individual, pois também a orientação
é um conceito de valor” (WEBER, 2001, da sua convicção pessoal e a difração
p. 127). Não há como o indivíduo de valores no espelho da sua alma
conferem ao seu trabalho uma direção
pesquisador se isolar do mundo em que
(WEBER, 2001, p. 132).
está imbuído. O cientista social é,
concomitantemente, sujeito e objeto de O fato concreto desta impossibilidade de
sua práxis científica. Estuda um mundo afastamento total dos pressupostos
de significados no qual ele mesmo faz subjetivos da análise social não
parte. “Acontece que, tão logo tentamos impossibilita uma análise objetivada e
tomar consciência do modo como se nos válida da vida cultural. Lembra Weber
apresenta imediatamente a vida, (2001, p. 133) que “não devemos deduzir
verificamos que ela se nos manifesta de tudo isso que a investigação científico-
‘dentro’ e ‘fora’ de nós, sob uma quase cultural apenas conseguiria obter
infinita diversidade de eventos que resultados ‘subjetivos’, no sentido de
aparecem e desaparecem sucessiva e serem válidos para uns, mas não para
simultaneamente” outros”.
(WEBER, 2001, p. 124). Destarte, diante de toda
Não há como exercer a esta problematização
prática científica livre de prévia, como chegar a
pressupostos. “A tentativa objetividade do
de um conhecimento da conhecimento nas ciências
realidade ‘livre de da cultura? Nas palavras
pressupostos’ só de Weber (2001, p. 134),
conseguiria produzir um “qual é a lógica e a
caos de ‘juízos estrutura dos conceitos
existenciais’ acerca de com os quais trabalha a
inúmeras concepções ou nossa ciência, à
percepções particulares” semelhança de qualquer
(WEBER, 2001, p. 129). outra? Qual a significação
No entanto, prisioneiros da teoria e da formação
desses esquemas dos teórica dos conceitos para
pressupostos, precisamos, o conhecimento da
como pesquisadores, atuar lado a lado realidade cultural?”.
nesta realidade subjetiva. Precisamos
conviver com esta armadilha do A resposta de Max Weber se fundamenta
conhecimento. Temos, contudo, que na construção do tipo ideal (ou tipo puro)
reconhecer também a sua utilidade como recurso metodológico capaz de se
sensível. esquivar das ciladas do juízo de valor e
dos “pressupostos” subjetivos na análise
Por certo que, sem as idéias de valor da vida sócio-econômica.
do investigador, não existiria nenhum
princípio de seleção, nem o No que diz respeito à investigação, o
conhecimento sensato do real conceito de tipo ideal propõe-se a
singular, da mesma forma como sem formar o juízo de atribuição. Não é
a crença do pesquisador na uma ‘hipótese’, mas pretende apontar
significação de um conteúdo cultural o caminho para a formação de
qualquer, resultaria completamente hipóteses. Embora não constitua uma
desprovido de sentido todo o estudo exposição da realidade, pretende

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conferir a ela meios expressivos No andamento desta discussão dois
unívocos (WEBER, 2001, p. 137). elementos devem ser amplamente
entendidos. 1. As idéias não são as
Esta noção de ideal é rigorosamente
realidades propriamente ditas; portanto,
diferente da idéia de exemplar, do “dever
não se deve proceder no erro da confusão
ser”. Não tem valor moral. Para Weber,
entre teoria e história; e 2. É preciso estar
existem tanto tipos ideais de religiões
atento a questão da apreciação subjetiva.
como de bordéis. O tipo ideal é um
É necessário, pois, “fazer uma distinção
conceito racional construído através de
estrita entre a relação que compara a
idéias, com a finalidade de comparação
realidade com tipos ideais no sentido
com a realidade que, em sua essência, já
lógico, e a apreciação avaliadora dessa
difere em substância desta elaboração
realidade a partir de ideais” (WEBER,
racional. Weber alerta que o tipo ideal
2001, p. 144). Um tipo ideal é diferente
nunca será igual a realidade. É apenas um
de avaliação apreciadora, pois não tem
instrumento de comparação que, na
ligação com o sentido de perfeição
complexidade do tecido histórico-cultural,
(distinção weberiana entre juízos de valor
irá diferir em múltiplos aspectos. A
e juízos de fato). Conforme já dito,
realidade é maior do que os conceitos.
existem tipos ideais tanto de bordeis
Conceito não tem efeito mágico! “A
como de religiões. Há o tipo ideal de
construção de tipos ideais abstratos não
ladrão, de prostituta, de estudante de
interessa como fim, mas única e
economia, de líder carismático, de
exclusivamente como meio de
burocracia, de pastor evangélico,
conhecimento” (WEBER, 2001, p. 139).
empresário moderno, etc.
Para Tragtenberg (2001, p. 24), “a teoria
do tipo ideal é o ponto terminal do O tipo ideal é “uma construção intelectual
processo de pesquisa, representa o destinada à medição e à caracterização
momento maduro da metodologia sistemática das relações individuais, isto
weberiana, o instrumento de pesquisa é, significativos pela sua especificidade”
utilizado por Weber nos seus mais (WEBER, 2001, p. 144). Deve, segundo
importantes estudos”. análise de Tragtenberg (2001, p. 24),
“captar a tipicidade ou a homogeneidade
Trata-se [o tipo ideal] de um quadro dos fenômenos históricos, tendo como
de pensamento, não da realidade finalidade conferir um tratamento
histórica, e muito menos da realidade científico aos mesmos”. Não tem intenção
‘autêntica’; não serve de esquema em de ser teoria geral, já que reconhece que
que se possa incluir a realidade à
tal intenção perderia elementos ricos da
maneira de exemplar. Tem, antes, o
significado de um conceito-limite,
realidade específica e, portanto,
puramente ideal, em relação ao qual complexa. “A finalidade da formação de
se mede a realidade a fim de conceitos de tipo ideal consiste sempre
esclarecer o conteúdo empírico de em tomar rigorosamente consciência não
alguns dos seus elementos do que é genérico, mas, muito pelo
importantes, e com o qual é contrário, do que é específico a
comparada. Tais conceitos são fenômenos culturais” (WEBER, 2001, p.
configurações nas quais construímos 145).
relações, por meio da utilização da
categoria de possibilidade objetiva, Weber ressalta que o tipo ideal pode
que a nossa imaginação, formada e divergir substancialmente da realidade, já
orientada segundo a realidade, julga que esta é sempre mais ampla. Mesmo se
adequadas (WEBER, 2001, p. 140).
tiver sido construído de forma correta, e o

182
decurso efetivo não corresponder ao econômico. A validade objetiva de
decurso do tipo ideal, “teríamos a prova todo saber empírico baseia-se única e
de que em determinadas relações, há exclusivamente na ordenação da
especificidades que o conceito-limite não realidade dada segundo categorias
deu conta” (WEBER, 2001). A realidade que são subjetivas, no sentido
específico de representarem o
é maior do que o conceito e, sabendo
pressuposto do nosso conhecimento e
disso, o próprio tipo ideal pode mostrar de associarem, ao pressuposto de que
sua dimensão de “irrealidade”, isto é, seus é valiosa, aquela verdade que só o
limites. Essa irrealidade, para Weber, não conhecimento empírico nos pode
desperta nenhuma objeção metodológica. proporcionar (WEBER, 2001, p.
Pelo contrário! Amplia a objetividade, na 152).
medida em que mostra os caminhos
percorridos até a inferência empírica. Desfechando, compreende-se que o tipo
ideal, longe de ser um mero conjunto de
Como a realidade sócio-econômica é pressuposições subjetivas; mais longe
dinâmica e inconstante, portanto, ainda de ser uma teorização genérica da
transitória, a construção de tipos ideais vida cultural, é um meio metodológico
deve reconhecer tal mudança e também se objetivado. É um conceito criado
tornar provisória. “Na essência de sua racionalmente, no plano das idéias, para
tarefa está o caráter transitório de todas as servir de comparação com a realidade
construções típico-ideais, mas também o empírica. Visa captar as singularidades da
fato de serem inevitáveis construções vida social não em via de mão única, mas
típico-ideais sempre novas” (WEBER, numa possibilidade de análise multicausal
2001, p. 148). O tipo ideal não passa “de dos fenômenos. De acordo Reale &
tentativas para conferir uma ordem ao Antiseri (2006, p. 55-56), parafraseando
caos dos fatos que incluímos no âmbito Weber:
de nosso interesse” (WEBER, 2001, p.
148). Não é uma cópia representativa da Acentuam-se, por exemplo, alguns
realidade objetiva, mas sim o contrário: traços da ‘economia citadina’, do
um meio objetivo para representar a ‘padre católico’ etc., traços difusos e
realidade. Destaca Tragtenberg (2001) discretos, existentes aqui em maior
medida e ali em menor, e por vezes
que “Weber não aceita a concepção
também ausentes, e assim fazendo
clássica de ciência, segundo a qual ela surgir um modelo, um tipo-ideal ou
pode abranger a ‘substância’ das coisas modelo ideal-típico da economia
[...] Todo conhecimento é hipotético na citadina, ou do padre católico etc.; e
medida em que nenhum sistema reproduz tal tipo ideal serve para ver o quanto
a realidade que é infinita” a realidade efetiva se afasta ou se
(TRAGTENBERG, 2001, p. 25). aproxima do tipo ideal. O tipo ideal é
um instrumento heurístico.
Ao traçar toda essa discussão
metodológica acerca da objetividade do Trata-se, conseqüentemente, de um
saber nas ciências da cultura, Weber recurso humilde, já que reconhece em
conclui afirmando que: todos os momentos as suas limitações. É
também recurso enérgico, já que
Chegamos ao final de nossa possibilita escapar de uma série de
discussão, que teve como único emboscadas do saber, dentre elas, as
propósito destacar a linha quase
idéias de determinismo e lei causal.
imperceptível que separa a ciência da
crença, e pôr a descoberto o sentido
do esforço do conhecimento sócio-

183
5. Considerações finais: algumas conceitos, por um lado, e a
implicações operacionais da distribuição empírica daquilo que
epistemologia weberiana é contextualizado no espaço, no
tempo e na conexão causal, por
Chegando ao ponto nodal desta discussão, outro, aparecem então de tal modo
após ter percorrido as questões centrais ligados entre si, que quase chega a
deste pequeno escrito, algumas ser irresistível a tentação de
considerações de ordem mais ‘forçar’ a realidade para
operacionais pairam no ar. Diante de tal consolidar a validade efetiva da
quadro de referência algumas lições construção da realidade”
práticas estão colocadas por Weber no (WEBER, 2001, p. 147).
texto que findou de ser comentado. E
quais seriam? d) Teorias gerais deixam escapar
na análise da vida humana
a) Não cabe à ciência social dimensões particulares
weberiana a missão de fornecer fundamentais para a crítica
“receitas” para a vida social. É, sociológica. “Uma coisa, sem
como posição epistemológica, dúvida, é certa, em qualquer
uma disciplina compreensiva. Não circunstância: quanto mais
é uma política social aplicada. ‘universal’ for o problema em
“Jamais pode ser tarefa de uma questão, isto é, quanto mais amplo
ciência empírica proporcionar for o seu significado cultural,
normas e ideais obrigatórios, dos quanto menos for possível dar
quais se possa derivar ‘receitas’ uma resposta extraída do material
para a prática” (WEBER, 2001, p. do conhecimento empírico, tanto
109). maior será o papel dos axiomas
últimos e pessoais da fé e das
b) O conhecimento da vida social
idéias éticas” (WEBER, 2001, p.
é infinito, e, assim sendo, somente
112).
uma parte ínfima desta vida pode
ser apreendida de cada vez. e) Não há como se determinar um
“Assim, todo o conhecimento da único sentido para determinados
realidade infinita, realizado pelo aspectos da vida cultural. A
espírito humano finito, baseia-se análise weberiana é multicausal.
na premissa tácita de que apenas Weber ilustra bem este argumento
um fragmento limitado dessa ao criticar a concepção
realidade poderá constituir de cada materialista da história, onde a
vez o objeto da compreensão realidade material dos homens é a
científica...” (WEBER, 2001, p. causa primeira da explicação da
124). realidade. Em Max Weber não há
causas primeiras, segundas ou
c) O pesquisador às vezes é terceiras como determinantes. Há,
“convidado”, consciente ou pois, uma sociologia multicausal.
inconscientemente, para dar a
realidade empírica à consideração Por fim, pensamos que atualmente o solo
que sua imaginação pretender. É de nossas idéias e de nossos problemas
preciso estar atento às astúcias do empíricos é bem mais desafiador e,
desejo. Não se deve forçar a portanto, mais difícil de compreensão.
realidade via caprichos do bel- Temos de um lado a certeza da maior
prazer. “A ordem lógica dos complexificação das vidas sócio-

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econômica e cultural. Isso é inegável, pois 2001, p. 26). É por isso, pois, que Weber
o mundo hoje é mais complexo em suas afirma, pensando nos tipos ideais, que
múltiplas dimensões. A história andou! exagerar é a sua profissão.
Por outro lado, encontramos a existência
de um maior “arsenal” de teorias
convivendo lado a lado (sabendo usar é Referências
quase um conforto epistemológico!). COHN, Gabriel. Introdução sobre Max Weber. In:
Giddens (2001, p. 98) afirma que a lista COHN, Gabriel (org.). Max Weber. 3. ed. São
das perspectivas teóricas que coexistem Paulo: Ática, 1986. (Coleção Grandes Cientistas
Sociais, vol. 13).
atualmente é quase interminável:
etnometodologia, diversas formas de DURKHEIM, Émile. As Regras do Método
Sociológico. Tradução Pietro Nassetti. São Paulo:
interacionismo simbólico e de Martin Claret, 2001.
neoweberianismo, a fenomenologia, o
estruturalismo, a hermenêutica e a crítica GIDDENS, Anthony. O que é ciência social? In:
________. Em Defesa da Sociologia: ensaios,
social. No meio deste emaranhado de interpretações e tréplicas. São Paulo: UNESP,
posições, possibilitar ao conhecimento 2001. p. 97-113.
empírico uma frutífera construção teórica,
HALL, Stuart. Da diáspora: identidades e
se não for um exercício weberiano no mediações culturais. Tradução de Adelaide La
sentido de busca de objetividade, pelo Guardia Resende et al. Belo Horizonte, MG:
menos que seja uma atitude de bom senso UFMG; Brasília: Representação da UNESCO no
intelectual. Brasil, 2003.

Weber não é o único autor a dar REALE, G; ANTISERI, D. Max Weber: o


desencantamento do mundo e a metodologia das
respostas, mas um deles. Um dos grandes ciências histórico-sociais. In: ________. História
méritos weberiano é, em substância, da filosofia: de Nietzsche à Escola de Frankfurt.
reconhecer a premissa metodológica de Vol. 6. Tradução de Ivo Storniolo. São Paulo:
não dar a análise sociológica uma Paulus, 2006.
condição de doutrina, nem tampouco uma SAGAN, Carl. O Mundo Assombrado pelos
visão determinista da realidade. De Demônios: a ciência vista como uma vela no
acordo com Gabriel Cohn (1986, p. 22), escuro. Tradução Rosaura Eichemberg. São Paulo:
Companhia das Letras, 1996.
em Weber, “a validade do conhecimento
obtido se mede pelo confronto com o real TRAGTENBERG, Maurício. Introdução à edição
e não com quaisquer valores e visões do brasileira: a atualidade de Max Weber. In:
WEBER, Max. Metodologia das Ciências
mundo”. Este confronto não significa uma Sociais. Parte 1. Tradução de Augustin Wernet. 4.
construção como reflexo do real, como ed. São Paulo: Cortez; Campinas, SP:
reforça Tragtenberg. Pelo contrário, “é Universidade Estadual de Campinas, 2001.
pelo seu afastamento do real concreto e WEBER, Max. A “objetividade” do conhecimento
através da acentuação unilateral das na ciência social e na ciência política. In:
características de determinados ________. Metodologia das Ciências Sociais.
fenômenos que ele chega a uma Parte 1. Tradução de Augustin Wernet. 4. ed. São
Paulo: Cortez; Campinas, SP: Universidade
explicação mais rigorosa do caos
Estadual de Campinas, 2001. p. 107-154.
existente no social” (TRAGTENBERG,

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