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O preconceito linguístico: uma breve introdução

O preconceito linguístico é a discriminação contra indivíduos


(geralmente de classe social inferior, das regiões rurais ou
periféricas) que falam de uma forma diferente da elite
urbana. Pode ser entendido como uma forma de expressão do
preconceito social.

Marcos Bagno, um dos principais estudiosos do assunto,


explica que o preconceito linguístico surge porque a norma-
padrão (gramática) tem como base a literatura consagrada
dos séculos passados e ignora completamente os falantes de
hoje em dia. E como a língua é dinâmica – sempre em
evolução – ocorre um descompasso entre como se escreve e
como se fala. Quanto mais a fala da pessoa está distante da
escrita, mais discriminação essa pessoa sofre.

Variedades de Variedades
Norma-padrão
prestígio estigmatizadas

Fala de pessoas das


Gramática Fala de pessoas com
regiões rurais,
(ninguém fala de escolaridade/classe
periféricas, de classe
verdade) social elevada
social inferior

Bagno fala um pouco da história do Brasil para explicar como


se estabeleceu e se propagou tal relação de dominação. Essa
diferenciação entre norma padrão e português brasileiro
reflete um “fantasma colonial”, e também está relacionada a
uma crença de que o brasileiro não sabe bem o português,
somente os portugueses falariam bem essa língua. Além
disso, a história do Brasil é extremamente elitista. O
português, por exemplo, só se tornou língua majoritária por
meio da repressão do governo, na época em que Marquês de
Pombal proibiu que o ensino no Brasil fosse em outras
línguas. Isso não muda com o Império, que manteve o cenário
do país praticamente igual. O mesmo acontece da passagem
para o regime republicano, ocasionado por um golpe da alta
cúpula do exército, e no fim da ditadura, época em que os
levantes sociais foram altamente reprimidos.

De certa forma, a elite e as instituições são forças contrárias à


mudança da língua, como se isso significasse uma
deterioração dela. Porém, todas as línguas mudam: as línguas
estáticas estão mortas, pois é o seu uso que promove a
mudança, ou seja, elas mudam com os falantes. Mesmo a
língua portuguesa mudou muito com o passar do tempo.
Assim, é impossível que essa língua idealizada se torne
referência, pois não é a norma que define o que é certo ou
errado na língua falada, mas a atividade linguística dos
próprios falantes é que molda os critérios.
 

A dominação através do discurso


Os estudos de Marcos Bagno se escoram nas concepções
teóricas de Michel Foucault, filósofo francês, que em seu
livro A Ordem do Discurso (1970), apresenta a hipótese de
que em todas as sociedades existem mecanismos de controle
dos discursos enunciados pelos sujeitos. Foucault também
propõe categorias de procedimentos de controle de discursos,
tais como:
A “interdição”, onde não se pode falar tudo, de tudo, e de
certa maneira, com todas as pessoas. Um exemplo é que não
se conversa com os pais da mesma maneira e nem sobre o
mesmo assunto que se conversa com os amigos, os pais são
figuras de autoridade e exercem certa dominação sobre os
discursos dos filhos.
A “segregação”, onde o que alguém fala é sempre filtrado,
dissecado, para haver uma escolha do que é possível de ser
aceito. Um exemplo pode ocorrer no contexto da sala de aula,
onde uma fala de um aluno que questiona o porquê de se
aprender algo que está sendo ensinado é, muitas vezes,
aceita pelo professor como preguiça do aluno diante do
conteúdo.
A “vontade de verdade”, característica de todo discurso, onde
se procura um sentido de verdades presentes nele. No
exemplo anterior, o professor interpreta a fala como preguiça,
por causa dessa tentativa de achar uma verdade nessa fala.
Para distanciá-lo da percepção que o aluno fala de sua
didática, e da sua consequente falha como educador, por
exemplo.
Outra autora que se inspira em Foucault é Judith Butler, mais
conhecida por seus estudos sobre o gênero. Para Butler, o
gênero é uma performance que reitera uma ou várias normas,
escondidas pela própria performance, logo, não existe um
vínculo natural entre sexo e gênero. Butler mostra que o
ontos (o ser) não precede o logos (o discurso). Isso faz com
que o domínio da ontologia seja também um domínio que
sofre os efeitos do poder (poder, aqui, da forma como é
entendido por Foucault).
Daí os corpos abjetos. Na sua teoria, os discursos não ocupam
um domínio abstrato: eles habitam corpos. E corpos abjetos
são aqueles que não são aceitos, porque não podem existir e
não fazem sentido dentro de determinada cultura. O conceito
de abjeção é fluído, de propósito, e não se reduz à questão do
gênero. Por isso, é possível utilizar tal conceito na análise do
preconceito linguístico.

Assim, os que “falam errado” (a doméstica, corrigida pela


patroa por falar “barrer a casa”, por exemplo[1]) possuem
corpos abjetos, que não importam para a sociedade. Tais
corpos não possuem a condição de sujeito, mas tem
capacidade subversiva, pois mostram os limites do
“português correto”, o ameaçam com a possibilidade de vir a
existir e criam espaços de potência e enfrentamento. Tais
espaços, no caso do preconceito linguístico, podem ser as
gírias e as formas inovadoras de linguagem que existem à
margem da “norma-padrão”, criadas e faladas pelas manas e
manos das favelas que vivem à margem da [so]ci[e]dade.
As gírias, geralmente usadas em um tipo de linguagem mais
coloquial, funcionam como um mecanismo de identificação de
grupos diferentes, fazendo com que as pessoas que fazem
parte de um mesmo grupo usem as mesmas gírias e que uma
pessoa de fora reconheça aquelas pessoas como integrantes
daquele grupo.
Quando as manifestações culturais oriundas das periferias,
como o rap ou o funk, por exemplo, começam a ser difundidas
em outros contextos sociais, algumas gírias são assimiladas
pelos grupos dominantes, especialmente pelos jovens, o que
pode fazer com que a conotação delas se torne um pouco
menos negativa.

Essas gírias podem ser criadas a partir de palavras


inventadas, mas, na maioria dos casos, significantes já
existentes ganham um novo significado, tornando-se um
signo diferente, na linha de acordo com a teórica de Saussure.
Isso pode causar certo estranhamento para uma pessoa que
não faz parte do grupo envolvido, enquanto que, ao mesmo
tempo, uma pessoa de dentro do grupo pode não conhecer o
significado “correto” daquele significante, conhecendo-o
somente no contexto da gíria. E as gírias sempre aparecem
nas falas cotidianas. Quando você diz que a comida do
restaurante estava “zuada”, você usa uma gíria.

Na escrita, no entanto, a gíria não marca sua presença com


tanto destaque, sendo usada, na maioria das vezes, em
transcrições ou para aumentar a eficiência da comunicação
entre o escritor e o leitor. As gírias raramente são escritas nos
textos jornalísticos ou literários e só aparecem entre aspas,
como no parágrafo anterior. Essa rejeição à gíria pela escrita
revela seu baixo prestígio social e o preconceito linguístico
que as pessoas que a utilizam sofrem.

Os meios de comunicação e, principalmente, a internet tem


popularizado as gírias, mas será que essa popularização
enfraquece o preconceito? Seu uso em novelas, noticiários,
propagandas e programas humorísticos é cada vez maior,
mas, muitas vezes, caricato e estereotipado. Esse (mal)uso
das gírias reflete uma tentativa de dominação de um público
alvo: dominação através do discurso.

Segregação e reprodução da dominação


Em uma análise sobre linguagem, pensamento e
representações sociais, Silvia Lane, autora que trabalha com
temas de psicologia social, sugere que a linguagem surgiu
com os seres humanos da necessidade de transformar a
natureza para garantir a sobrevivência, sendo então um
produto da coletividade humana que reproduz uma visão de
mundo.

Para ela, no processo de aquisição de linguagem materna, a


criança aprende a reproduzir a visão de mundo de seu grupo
e é levada a não perturbar a “ordem vigente”. Portanto, se
ela aprende usos da linguagem incompatíveis com o que a
sociedade espera dela, ela se torna marginalizada [2].
A autora ressalta como os papéis sociais exercidos pelas
pessoas se constroem na comunicação, pois os sujeitos que
se comunicam levam em conta a posição em que ele está e a
posição das pessoas que se comunicam com ele para
determinar seu comportamento.

Em uma análise mais profunda, a autora introduz o conceito


de atos ilocutórios, que são falas que caracterizam as
posições ocupadas pelos interlocutores, de forma implícita ou
explícita. Os explícitos são ordens, pedidos, insultos, etc.: eles
deixam claro quem manda e quem obedece na situação. Já os
implícitos só podem ser compreendidos no contexto da
situação, levando em conta a posição que os interlocutores
ocupam. Desta forma, a relação da linguagem com o real
ocorre em função de um mundo já repleto de significações, já
ordenado e já socialmente arrumado. Então, compreender a
linguagem implica conhecer não só o discurso, mas, também,
a realidade na qual os indivíduos que o produzem estão
inseridos.

A linguagem também apoia a segregação entre os grupos, o


que é explicado por Bourdieu. Segundo o sociólogo, a língua
representa riqueza e poder, pois nas relações sociais ocorre a
comunicação e também a expressão de poder, levando a
manutenção das forças existentes na sociedade. Ele explica
que isso ocorre desde que uma classe dominante impõe uma
língua oficial a um território para garantir poder político,
econômico e social sobre um grupo (como no caso de Pombal
no Brasil). Para isso, ela conta com o apoio de instituições,
como a escola e a família.

Dessa forma, a língua que a classe não dominante e


desprivilegiada utiliza é discriminada, e o conhecimento da
língua oficial é dificultado ou deixa de ser fornecido, como
uma forma de manutenção de poder, a qual garante, mais
uma vez, a reprodução de diferenças sociais. Por esse motivo,
as contribuições culturais da elite são aceitas, enquanto as da
classe baixa são ignoradas e reprovadas.

Observa-se, assim, que a língua legítima possui uma


autoridade, reconhecida por todos, e apenas quem tem o
conhecimento dela possui autoridade. Ou seja, um sujeito tem
autoridade por ter acesso a uma língua. A língua apresenta e
representa, então, interesses materiais, e seu uso depende da
posição social, que, por sua vez, depende do acesso à língua,
o que leva à discriminação de certos discursos e à dominação
social.

O papel das instituições


Ainda que o preconceito linguístico possa ocorrer a partir de
qualquer interação social, é importante ressaltar o papel das
instituições nesse processo de criação e reprodução da
dominação social. Nesse sentido, as instituições de educação
formal são bons exemplos, já que elas se propõem a formar, e
fazem isso a partir de uma linguagem específica, ou seja, se
diferenciam de outras trocas cotidianas pelo seu caráter
formal e intencionalidade.

Bourdieu e Passeron mostram como a escola é capaz de


perpetuar a dominação social a partir de sua teoria da
reprodução, baseada no conceito de violência simbólica. Para
eles, toda ação pedagógica é uma violência simbólica à
medida que é a imposição de um poder arbitrário, que se
funda em uma sociedade de classes, profundamente desigual.
Assim, o processo educacional faz a manutenção da
sociedade capitalista, reproduzindo a cultura e a estrutura
desta sociedade. Isso ocorre a partir de uma dupla prática: a
escola promove aqueles que considera aptos para partilharem
dos privilégios sociais e exclui os demais. De uma forma
aparentemente “neutra”, ela localiza os fracassos e as
dificuldades de maneira individual (como falta de habilidade,
por exemplo).

Outra instituição que instaura o preconceito linguístico é a


mídia.  Essa instituição é capaz de solidificar o preconceito
linguístico,  excluindo determinadas formas de expressão e
valorizando outras. Isso pode resultar na exclusão social dos
falantes que possuem variantes de menos prestígio, na
medida em que a mídia valoriza o “português purista”, ou
seja, aquele falado pelas pessoas de classe social elevada.

Mas não pára aí. A mídia também cria estereótipos


preconceituosos de certos grupos de falantes. Isso ocorre, por
exemplo, nas novelas, onde a fala dos nordestinos é
completamente exagerada e alterada, e se torna algo que
não é falado em lugar nenhum do Brasil, muito menos no
Nordeste.

A mídia possui caráter persuasivo, o que, no cenário atual, é


bem perceptível. Ela se utiliza de uma “monopolização
discursiva”, na qual o destinatário
(telespectador/leitor/ouvinte) assume uma posição frágil e o
remetente (jornais, programa de televisão, rádio, etc.) é o
opressor.  Por conta de sua posição privilegiada como
remetente, ela possui grande influência cultural e política –
que pode até chegar a se transformar em manipulação.

Uma questão de Poder


            Tomando Foucault como fio condutor da discussão, é
possível perceber que a língua, como num rap, é um campo
de batalha, que não é imune aos efeitos do Poder. Dessa
forma, mídia, escola, academia e família são instituições
responsáveis não apenas pela reprodução das estruturas de
dominação social, mas pela sua criação. Isso porque – e é o
que Butler pretende demonstrar em seus estudos sobre a
questão do gênero – a própria dominação é uma estrutura
que se insere na dinâmica do discurso: ela não é anterior ou
“natural”.
Assim, se é verdade que é por meio do discurso que a
dominação não só se operacionaliza mas, também, e
principalmente, se institucionaliza, também é verdade que
esse mesmo discurso carrega em si um germe emancipador.
É que, no fundo, não passa de uma questão de poder: poder
inovar e fazer da linguagem um instrumento de luta, de
identificação dos parças e de denúncia das mazelas sociais. E,
para fazer referência a uma dessas formas subversivas de uso
da linguagem, sempre é possível ser um guerreiro do rap[3].

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
 
BAGNO, M. A norma oculta – língua & poder na sociedade
brasileira. 2ª ed. São Paulo: Parábola Editorial, 2003.
BAGNO, M. Preconceito lingüístico – o que é, como se faz. 15
ed. Loyola: São Paulo, 2002
BOURDIEU, P., & MICELI, S. A economia das trocas simbólicas.
Perspectiva: São Paulo, 1974.
BOURDIEU, P; PASSERON, J. C. A reprodução. Elementos para
uma teoria do sistema de ensino. Rio de Janeiro: Francisco
Alves, 1975.
CHOMSKY, N. Mídia: Propaganda Política e Manipulação. ed.
WMF Martins Fontes: São Paulo, 2015
FOUCAULT, M. A ordem do discurso: aula inaugural no Collège
de France. Pronunciada em, v. 2, p. 10, 1998.

PRETI, D. A gíria na língua falada e na escrita: uma longa


história de preconceito social. Fala e escrita em questão, 2,
241-257. 2000.

PRINS, B., MEIJER, I. Como os corpos se tornam matéria:


entrevista com Judith Butler. Rev. Estud. Fem. vol.10 no.1
Florianópolis Jan. 2002.
 

[1]
 Referência ao caso denunciado através da página “Eu
Empregada Doméstica”. Disponível
em: https://m.facebook.com/euempregadadomestica/posts/10
99862086727199?
comment_id=1100131660033575&comment_tracking=%7B
%22tn%22%3A%22R0%22%7D.
[2]
 Isso remete a Bourdieu quando este aponta a existência de
um “capital cultural”, que é herdado. Na perspectiva do autor,
o legado econômico da família transforma-se em capital
cultural através da escola, a qual desempenha um importante
papel na reprodução de estruturas de dominação social.
[3]
 Referência à música “Vida Loka (Parte I)” dos Racionais
Mc’s.
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