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ADVOCACIA
PÚBLICA
EM FOCO
VOLUME II
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EM FOCO
VOLUME II
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ADVOCACIA
PÚBLICA
EM FOCO
VOLUME II
Belo Horizonte
2019
2019 - Instituto para o Desenvolvimento Democrático
Capa e Diagramação: Toque Digital
Impressão: Toque Digital
ISBN: 978-85-67134-09-3
APRESENTAÇÃO
Rodolfo Viana Pereira
Thiago Coelho Sacchetto..............................................................................7
A BANALIZAÇÃO DO
CONCEITO DE ATO ÍMPROBO
Caio Mário Lana Cavalcanti...........................................................................9
2 Professor do Centro Universitário UNA. Doutorando em Direito Político pela Universidade Federal de
Minas Gerais. Mestre em Ciências Jurídico-Políticas pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa.
Pós-Graduado em Advocacia Pública pelo IDDE. Advogado.
A BANALIZAÇÃO DO CONCEITO DE ATO
ÍMPROBO
Caio Mário Lana Cavalcanti1
Resumo
Em resumo, o presente artigo aborda o conceito de ato ímprobo e a sua
banalização. Primeiramente, será examinado o tema sob um viés histórico,
oportunidade em que será brevemente analisada a responsabilidade do agente
público no âmbito de cada uma das constituições brasileiras. Posteriormente,
serão averiguadas as peculiaridades que envolvem o ato ímprobo e que o
difere de um ato administrativo simplesmente ilegal. Subsequentemente,
será realizada uma crítica ao Ministério Público enquanto legitimado para
o ajuizamento da ação de improbidade administrativa, concluindo-se que,
não raras as vezes, são manejadas tais ações de modo inapropriado, em
nítida banalização do conceito e sepultamento de direitos fundamentais
constitucionalmente assegurados.
Introdução
O presente artigo tem como principal objetivo abordar quais são as peculiaridades
próprias do elemento qualificador caracterizador da improbidade administrativa no
ordenamento jurídico brasileiro que permitem o enquadramento de determinado ato
como ímprobo e, consequentemente, a penalização do seu agente nos moldes das
severas penas da Lei nº 8.429/1992. Vale dizer, em que pese a riqueza do assunto,
o foco do presente trabalho é a investigação do qualificador que diz respeito ao ato
1 Advogado. Graduado em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Pós-Graduado em
Direito Administrativo pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC Minas). Pós-Graduado
em Advocacia Pública pelo Instituto para o Desenvolvimento Democrático (IDDE), em parceria com o
Centro de Direitos Humanos da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra e com a Faculdade
Arnaldo.
CAVALCANTI, Caio Mário Lana. A banalização do conceito de ato ímprobo. In: PEREIRA, Rodolfo Viana; SACCHETTO,Thiago
Coelho (Orgs.). Advocacia pública em foco. Volume II. Belo Horizonte: IDDE, 2019. p. 9-33. Disponível em: https://doi.
org/10.32445/97885671341091
eivado de improbidade administrativa. Tema atualíssimo e de extrema importância pois,
se de um lado a corrupção é um mal social presente na Administração Pública que
deve ser veementemente combatido, fato é que a improbidade administrativa traduz
instituto cuja aplicação requer o preenchimento de pressupostos específicos, sendo,
portanto, vedado o seu amoldamento para todo e qualquer ato ilegal, o que com pesar
está sendo realizado no âmbito da prática forense.
2 MATTOS, Mauro Roberto Gomes de. O limite da improbidade administrativa: o direito dos administrados
dentro da Lei nº 8.429/92. Rio de Janeiro: América Jurídica, 2006, p. 2.
10
brasileiros e apontar relações entre eles e o tema discutido é relevante, considerando,
sobretudo, que os institutos jurídicos são desenvolvidos sempre inseridos em um
determinado período histórico, fator que, indubitavelmente, influencia em seu conceito
e aplicação.
3 OLIVEIRA, José Roberto Pimenta. Improbidade administrativa e sua autonomia constitucional. Belo
Horizonte: Fórum, 2009, p. 51.
4 OLIVEIRA, José Roberto Pimenta. Improbidade administrativa e sua autonomia constitucional. Belo
Horizonte: Fórum, 2009, p. 56.
5 BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de direito constitucional. 20. ed. São Paulo: Saraiva, 1999, p. 124; SILVA,
José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 25. ed. São Paulo: Malheiros, 2005, p. 89.
A atual Carta Política, observando os anseios sociais, foi inédita ao trazer lite-
ralmente a expressão improbidade administrativa em seu art. 37, §4º, determinando
que os atos ímprobos culminarão com “a suspensão dos direitos políticos, a perda da
função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e
gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível”, confirmando a hipótese
de suspensão dos direitos políticos já prevista no art. 15, V.
Desta feita, observa-se que a intenção do constituinte originário foi tão somente
instituir o sancionamento por ato de improbidade administrativa, complementando os
princípios norteadores da Administração Pública contemplados no art. 37, caput, sem,
contudo, adentrar especificamente nos meios e formas para tanto, concedendo à lei o
poder para tratar e traçar tais contornos.
6 MORAES, Alexandre de. Direito constitucional. 11. ed. São Paulo: Atlas, 2002, p. 344. No mesmo sentido:
NOHARA, Irene Patrícia. Direito administrativo. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2013, p. 877.
Embora rico seja o tema envolvendo as questões acima elencadas, não é o objeto
deste estudo, razão pela qual não serão aprofundadas as suas peculiaridades. A fina-
lidade da presente análise, e é o que se passará a explicitar, é demonstrar que mesmo
que presentes os pressupostos do sujeito ativo, do sujeito passivo e da conduta que
enseje enriquecimento ilícito, lesão ao erário ou violação a princípios norteadores da
Administração Pública, ainda assim não é possível, automaticamente, o enquadramento
da conduta como ímproba. É condição sine qua non, para tal, um elemento subjetivo
qualificador específico: a má-fé8, a desonestidade, o conluio, o dolo, enfim, a vontade
consciente do sujeito ativo em praticar condutas cujas consequências sejam aquelas
8 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial 480367/SP. Brasília, DF, Relator: Min. Luiz Fux,
publicado no DJ de 24 maio 2014, p. 163.
Advogar de modo diverso seria cogitar que ilegalidade e improbidade são termos
coincidentes, e certamente não são. Embora não seja terreno incontroverso na doutrina
administrativista, comungamos do entendimento de que é inconcebível existir improbi-
dade administrativa sem ilegalidade, mas a recíproca nem sempre é verdadeira. Afinal,
é possível que um agente cometa um ato ilegal, embora por intermédio de uma conduta
dotada de boa-fé. Lado outro, não vislumbramos a possibilidade de um agente ímprobo,
desonesto, atuando de má-fé, causar lesão ao erário, se enriquecer ilicitamente ou violar
os princípios da Administração Pública sem que, ao menos, tenha violado a moralidade
administrativa, esculpida no art. 37, caput, da Constituição da República. O simples
fato de um agente público nortear suas condutas pela má-fé configura, a nosso ver,
9 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo. 27. ed. São Paulo: Atlas, 2014, p.
1.089.
10 FIGUEIREDO, Marcelo. Probidade administrativa. 5. ed. São Paulo: Malheiros, 2004, p. 42-43; BRASIL.
Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial 213.994-0, Brasília, DF, Relator: Min. Garcia Vieira,
publicado no DO de 27 setembro de 1999.
Nesse sentido, todo ato ímprobo certamente é ilegal, embora nem todo ato ilegal
seja necessariamente ímprobo: afinal, a improbidade administrativa é a ilegalidade
qualificada pelo elemento subjetivo da corrupção, revelado pela desonestidade, pela
má-fé, pela má índole, pelo mau caráter, pela imoralidade, pela intenção consciente de
utilizar a coisa pública de forma indevida, ocasionando enriquecimento ilícito, lesão
ao erário ou violação aos princípios estruturantes da Administração Pública. Destarte,
nem toda ilegalidade é ímproba, mas toda improbidade administrativa é ilegal. Em
harmonia com o exposto é magistral o magistério de Maria Sylvia Zanella Di Pietro13,
quando explica que “o agente ímprobo pode ser conceituado como aquele que, muito
além de agir em desconformidade com a lei, transgride os princípios norteadores da
moral, configurando-se como um agente desonesto.”
11 CANOTILHO, J.J Gomes. Direito constitucional e teoria da constituição. 2. ed. Coimbra: Almedina, 1998,
p. 1.035.
12 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 12. ed. São Paulo: Malheiros, 2000,
p. 748. Para o administrativista, a violação a um princípio “é a mais grave forma de ilegalidade.”
13 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 18. ed. São Paulo: Atlas, 2005, p. 709. No
mesmo sentido: PAZZAGLINI FILHO, Marino. Lei de improbidade administrativa comentada: aspectos
constitucionais, administrativos, civis, criminais, processuais e de responsabilidade fiscal; legislação
e jurisprudência atualizadas. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2006, p. 18; HARGER, Marcelo. Improbidade
administrativa: comentários à Lei nº 8.429/92. São Paulo: Atlas, 2015, p. 17; NEIVA, José Antônio Lisboa.
Improbidade administrativa. 2. ed. Niterói: Impetus, 2006, p. 125; MATTOS, Mauro Roberto Gomes de.
O limite da improbidade administrativa: o direito dos administrados dentro da Lei nº 8.429/92. Rio de
Janeiro: América Jurídica, 2006, p. 14; STJ, BRASIL. Superior Tribunal de Justiça, Recurso Especial
269683, Rel. Min. Laurita Vaz, publicado no DJ de 03 novembro de 2004, p. 168.
14 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 15. ed. São Paulo: Atlas, 2003, p. 689.
Vale dizer, em desconformidade com sua verdadeira razão de ser e com o conceito
de improbidade, contudo, a Lei nº 8.429/92 prevê a possibilidade de penalização por
ato de improbidade administrativa na modalidade culposa, nos casos de lesão ao erário
(art. 10 – para a configuração do ato ímprobo por enriquecimento ilícito ou violação aos
princípios norteadores da Administração Pública, não há discussões maiores que o dolo
é imprescindível). Trata-se, a nosso ver, de disposição que diverge da intenção verda-
deira do constituinte originário, exposta no art. 37, §4º da Constituição da República
e regulamentada pela Lei de Improbidade Administrativa. E, outrossim, trata-se de
incongruência com o próprio conceito de improbidade administrativa, já discutido
Ainda, também deve ser ressaltado, à luz de uma hermenêutica norteada pela
interpretação histórica, que a própria exposição de motivos16 da Lei nº 8.429/92 deixa
claro que a corrupção é uma das maiores mazelas que ainda afligem o país, o que
robustece ainda mais a tese aqui adotada, no sentido de que não há que se falar em
improbidade – e, consequentemente, de aplicação da LIA – se ausente a desonestidade
do agente da conduta atacada. E, por sua vez, impossível cogitar desonestidade sem
15 BITENCOURT NETO, Eurico. Legalidade e improbidade administrativa: justa aplicação da lei n. 8.429/92.
In: FERRAZ, Luciano; MOTTA, Fabrício (coord. e coautores). Direito público moderno. Belo Horizonte: Del
Rey, 2003, p. 249-250.
17 BITENCOURT NETO, Eurico. Improbidade administrativa e violação a princípios. Belo Horizonte: Del Rey,
2005, p. 137.
18 ALVARENGA, Aristides Junqueira. Reflexões sobre improbidade administrativa no direito brasileiro. In:
BUENO, Cassio Scarpinella; PORTO FILHO, Pedro Paulo de Rezende (coord.). Improbidade administrativa:
questões polêmicas e atuais. São Paulo: Malheiros, 2001, p. 89.
19 HARGER, Marcelo. Improbidade administrativa: comentários à Lei nº 8.429/92. São Paulo: Atlas, 2015, p.
45.
20 CAMMAROSANO, Márcio; PEREIRA, Flávio Henrique Unes. Improbidade e esvaziamento do dolo. In:
Revista de Direito Administrativo Contemporâneo – ReDAC. Fevereiro/2014. São Paulo: Revista dos
Tribunais.
21 STOCO, Rui. Abuso de direito e má-fé processual. São Paulo: RT, 2002, p. 38.
22 FAZZIO JÚNIOR, Waldo. Improbidade administrativa e crimes de prefeitos: comentários, artigo por artigo,
da lei nº 8.492/92 e do DL 201/67. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2003, p. 51; SILVA, De Plácito e. Vocabulário
jurídico. Atualizado por Nagib Slaibi Filho e Gláucia Carvalho. 26. ed. São Paulo: Forense, 2005, p. 715.
23 Em sentido oposto: OSÓRIO, Fábio Medina. Teoria da improbidade administrativa: má gestão pública.
corrupção. ineficiência. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, p. 270 e seguintes. Entende o doutor
em Direito Administrativo que não há óbice para a configuração da modalidade culposa. Não é, contudo,
a nossa visão. Compreende-se, nesta oportunidade, que a improbidade não é harmônica com a culpa
strictu sensu.
24 MATTOS, Mauro Roberto Gomes de. O limite da improbidade administrativa: o direito dos administrados
dentro da Lei nº 8.429/92. Rio de Janeiro: América Jurídica, 2006, p. 290.
Vale dizer, embora o dano ao erário tenha ocorrido por negligência, imperícia
ou imprudência, o agente age com deslealdade ou desonestidade na medida em que
conscientemente tem conhecimento que sua conduta configura uma violação ao dever
de probidade. Ou seja: por culpa o erário restou lesado, mas a conduta ensejadora do
dano restou praticada com repleta consciência da ilicitude, com total voluntariedade
quando da transgressão à probidade.
26 AMARAL, Paulo Osternack. O elemento subjetivo nas ações de improbidade administrativa: uma
análise do entendimento do Superior Tribunal de Justiça. In: Informativo Justen, Pereira, Oliveira e
Talamini, Curitiba, nº 24, fev. 2009. No mesmo sentido: PAZZAGLINI FILHO, Marino. Lei de improbidade
administrativa comentada: aspectos constitucionais, administrativos, civis, criminais, processuais e de
responsabilidade fiscal; legislação e jurisprudência atualizadas. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2006., p. 60 e
seguintes.
E, no campo prático, o Ministério Público muitas vezes não realiza uma investigação
minimamente suficiente para expor um agente público a uma ação de improbidade
administrativa. E, quando o faz, não apresenta indícios mínimos de má-fé a caracterizar
o ato ímprobo, tratando de forma equivalente o agente desonesto e o agente inábil,
contribuindo, portanto, para a banalização do ato ímprobo e para a vulgarização da Lei
nº 8.429/92, o que não é desejável e claramente contrário ao espírito constitucional.
Afinal, como já elucidado, do mesmo modo que a moralidade administrativa deve
ser defendida, o sossego, a intimidade e a imagem são igualmente valores e direitos
a serem preservados, sobretudo se tratando de agentes políticos e de empresas
privadas, pessoas que possuem como bens mais valiosos a boa fama, a boa imagem
e a credibilidade.
Nesse trilho, não poucas vezes agentes públicos honestos ou empresas privadas
idôneas, embora incompetentes em sentido lato, se sujeitam a ações de improbidade
administrativa que, por sua própria natureza, independentemente do seu desfecho,
marcam a vida privada e profissional de tais pessoas. Estar no polo passivo de uma ação
nos moldes da Lei nº 8.429/92, conhecida por condenar agentes públicos desonestos
e empresas corruptas, é estar marcado por uma nódoa que não se dissolve facilmente,
contribuindo largamente para prejuízos pessoais e financeiros sem precedentes,
gerando constrangimento ilegítimo. Em consonância com o aduzido, é primorosa a
colocação de Marcelo Harger, ao criticar o Ministério Público enquanto polo ativo da
ação de improbidade administrativa:
Atualmente quaisquer equívocos ou ilegalidades praticados por um servidor
público podem ser enquadrados na lei de improbidade. Muitas dessas ações,
no entanto, são injustificadas e geram danos irreparáveis aos acusados, pois a
propositura da ação normalmente é acompanhada de matérias jornalísticas. A
absolvição, que somente irá ocorrer tempos depois, jamais servirá para reparar o
dano causado a essas pessoas, que foram marcadas com a pecha de desonestas
antes mesmo de terem sido julgadas. A exemplo do que acontecia em tempos
idos, dá-se aos acusados uma “pena infamante”, que é mais grave do que aquelas
praticadas séculos atrás. É mais séria porque no mundo atual a vergonha não
27 FAZZIO JÚNIOR, Waldo. Atos de improbidade administrativa. São Paulo: Atlas, 2008, p. 315.
Nesta senda, tanto o excesso quanto a deficiência, sob o viés aristotélico, devem
ser evitados: ambos são vícios que estão igualmente distantes da realização da
virtude. Por conseguinte, a provocação do Poder Judiciário deve sempre observar o
agir prudente, meio termo – e, portanto, a virtude in casu – entre o agir temerário e a
ausência do agir, de modo a evitar espetáculos fantasiosos que em nada ajudam na
concretização e no fortalecimento da justiça e do ordenamento jurídico. Sem dúvida,
tão indignante quanto a cultura da impunidade é a injustiça, tão reprovável quanto
a falta de atuação do Ministério Público é, por conseguinte, o seu agir temerário e
desarrazoado. O equilíbrio, pois, revela a virtude a ser buscada pelo órgão ministerial.
28 HARGER, Marcelo. Improbidade administrativa: comentários à Lei nº 8.429/92. São Paulo: Atlas, 2015, p.
2.
30 TÁVORA, Nestor; ALENCAR, Rosmar Rodrigues. Curso de direito processual penal. Salvador: Ed.
JusPodivm, 2017, p. 262.
31 OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. Curso de processo penal. 2. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2003, p. 421.
É por isso que insistimos que a ação de improbidade constitui um escopo próprio,
a saber, o de combater a corrupção por intermédio da penalização do agente público
desonesto. Logo, equivoca-se o Parquet ao, muitas vezes, sequer analisar se há indícios
mínimos de má-fé do acusado previamente ao ajuizamento da ação de improbidade,
configurando abuso do seu direito de ação e causando tumulto ilegítimo na vida pessoal
e pública de agentes honestos32. Importa destacar, nesse sentido, o entendimento de
Carolyne da Frota Cavalcante, que de forma brilhante e digna de aplausos sintetiza o
esboçado ao longo desta oportunidade:
Assim, a ação civil de improbidade administrativa é instrumento hábil para punir
atos deliberados de corrupção, praticados por gestores que se enriquecem
ilicitamente em prejuízo de toda a sociedade. (...)
Deve-se sempre ter em mente que não é qualquer dano ou qualquer ato que é
passível de aplicação das severas sanções previstas na Lei de Improbidade
Administrativa, e esse ponto merece grande reflexão.
Isso porque os membros do MP, titulares dessas ações, vêm buscando, através
das Ações de Improbidade Administrativa, responsabilizar gestores públicos e
particulares por todo e qualquer ato que considere ensejador de danos ao erário,
o que, em verdade, não se coaduna com a ratione da lei.
Na prática, é possível verificar casos em que o Parquet ingressa com ações de
improbidade sem que haja qualquer juízo de valor sobre o ato a ser combatido,
tão somente tentando evitar a prescrição de seu direito de agir, sobretudo em
32 MATTOS, Mauro Roberto Gomes de. O limite da improbidade administrativa: o direito dos administrados
dentro da Lei nº 8.429/92. Rio de Janeiro: América Jurídica, 2006, p. 286.
É nessa acepção que, por fim, coadunamos com a lição de Thiago Marrara, que
afirma que “um exame sistemático da improbidade no caso concreto é imprescindível,
pois não é ideal, nem tampouco justo, que meros erros de gestão sejam confundidos
com atos de improbidade.34”
Considerações finaiS
A corrupção é um mal que deve ser fortemente combatido. É, atualmente, um dos
grandes responsáveis pelo afastamento da consecução do interesse público, na medida
em que muitos agentes públicos utilizam da máquina pública não para a satisfação
dos anseios e necessidades da população, mas para a busca egoísta e desonesta dos
Nesse sentido, entendemos abusivo o direito de ação daquele que ajuíza a ação
de improbidade administrativa sem sequer demonstrar ou vislumbrar um mínimo de
má-fé daqueles integrantes do polo passivo da demanda, em nítida vulgarização do ato
ímprobo, ultrapassando os limites da aplicação da Lei nº 8.429/92. Banalização esta
que não apenas constitui uma afronta aos direitos individuais dos réus, mas contribui
para o enfraquecimento do instituto e para a inviabilização da própria função adminis-
trativa, na medida em que o agente público, por receio, limita suas próprias condutas
na busca do interesse público. Assim, a banalização do ato ímprobo é prejudicial em
todos os aspectos.
Referência
ALVARENGA, Aristides Junqueira. Reflexões sobre improbidade administrativa
no direito brasileiro. In: BUENO, Cassio Scarpinella; PORTO FILHO, Pedro Paulo de
Rezende (Coord.). Improbidade administrativa: questões polêmicas e atuais. São
Paulo: Malheiros, 2001.
AMARAL, Paulo Osternack. O elemento subjetivo nas ações de improbidade
administrativa: uma análise do entendimento do Superior Tribunal de Justiça. In:
Informativo Justen, Pereira, Oliveira e Talamini. Curitiba, nº 24, fev. 2009.
BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de direito constitucional. 20. ed. São Paulo: Saraiva,
1999.
BITENCOURT NETO, Eurico. Improbidade administrativa e violação a princípios. Belo
Horizonte: Del Rey, 2005.
Resumo
O presente artigo discute se os valores repassados pelos municípios
ao Fundeb devem integrar a base para o cálculo dos duodécimos transfe-
ridos pelo Poder Executivo Municipal à Câmara Municipal. A análise parte
da interpretação do art. 29-A da Constituição Federal. A partir da norma
constitucional são delineados quais fatores devem integrar obrigatoriamente
o somatório da base de cálculo para o repasse duodecimal. Em seguida,
faz-se uma pesquisa acerca da natureza jurídica do Fundeb, do histórico
de sua criação e de seu funcionamento. Os parâmetros operacionais e de
distribuição dos valores do Fundeb aos municípios são delineados. A partir
da compreensão do funcionamento do Fundeb, é discutido se os recursos
destinados ou provenientes do fundo podem ser identificados como fatores
que compõem a base de cálculo dos duodécimos. Tendo como parâmetro o
conceito doutrinário de receita tributária, os valores provenientes do Fundeb
são categorizados, de modo a definir em quais circunstâncias eles devem
compor a base de cálculo dos repasses à Câmara. O posicionamento do
STJ sobre a matéria é exposto e contrastado com o presente estudo. Ao
final, conclui pela inclusão dos recursos do Fundeb na base de cálculo dos
duodécimos, com relevantes ressalvas.
1 Especialista em Advocacia Pública pelo Instituto para o Desenvolvimento Democrático – IDDE. Graduado
em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais. Foi Procurador-Geral do Município de Taquaraçu
de Minas. Assessor Administrativo no Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais.
BARROS, César Verdade Costa. O computo dos recursos do Fundeb na base de cálculo dos duodécimos repassados à câmara
municipal. In: PEREIRA, Rodolfo Viana; SACCHETTO,Thiago Coelho (Orgs.). Advocacia pública em foco. Volume II. Belo Horizonte:
IDDE, 2019. p. 35-62. Disponível em https://doi.org/10.32445/97885671341092
Introdução
O Poder Executivo da União tem a obrigação constitucional (art. 168 da CF/1988)
de entregar aos Poderes Legislativo e Judiciário, ao Ministério Público e à Defensoria
Pública, até o dia vinte de cada mês, os recursos consignados em orçamento para estes
entes. Esse repasse é feito na forma de duodécimos. Trata-se da instrumentalização
do princípio da separação dos poderes. Uma vez que o Poder Executivo é o destinatário
primário das receitas, compete a ele realizar a repartição entre os outros poderes,
garantindo assim que os demais possam exercer suas funções com autonomia e
independência.
o Fundeb devem ser excluídas da base de cálculo dos duodécimos. A decisão do STJ
36
anulou o acórdão do Tribunal de Contas de Minas Gerais (TCEMG) proferido na proferido
na Consulta n. 837.614/TCE.
A resposta à indagação foi buscada neste artigo por meio da extração da norma
constitucional contida no art. 29-A da CF/1988, da compreensão do histórico e do
funcionamento do Fundeb e dos conceitos doutrinários sobre receita tributária.
Percorrendo esse caminho, conseguimos realizar o enquadramento jurídico das verbas
destinadas à formação do fundo, com vistas a determinar se elas devem ou não compor
a base de cálculo dos repasses à Câmara Municipal.
3 MINAS GERAIS. Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais. Consulta n.837.614. Relator Conselheiro
Antônio Carlos Andrada. Tribunal Pleno. Sessão 29/06/2011. Disponível em: http://tcnotas.tce.mg.gov.
br/tcjuris/Nota/BuscarArquivo/83739. Acesso em: 07 ago. 2018.
4 MEIRELLES, Henly Lopes. Direito Municipal Brasileiro. 6 ed. São Paulo: Malheiros, 1993. p. 437.
Este repasse deve ser realizado em duodécimos, ou seja: o valor total dos recursos
a ser entregue no ano-exercício deve ser dividido em doze vezes e repassado mensal-
mente. Neste caso, o Poder Executivo atua apenas como órgão de arrecadação, a verba
é do Poder Legislativo. Caso o Executivo não faça a transferência, estará no exercício
irregular do poder, o que habilita a Câmara de ingressar em juízo para obter recursos7.
5 SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 32 ed. São Paulo: Malheiros, 2009.p.
110.
7 OLIVEIRA, Regis Fernandes de. Curso de Direito Financeiro. 5 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013.
p. 446.
8 Art. 29-A. O total da despesa do Poder Legislativo Municipal, incluídos os subsídios dos Vereadores
e excluídos os gastos com inativos, não poderá ultrapassar os seguintes percentuais, relativos ao
somatório da receita tributária e das transferências previstas no § 5º do art. 153 e nos arts. 158 e 159,
efetivamente realizado no exercício anterior:
Ocorre que a listagem das espécies de recursos que compõem a base de cálculo
dos duodécimos não é suficiente para resolver a questão proposta no presente estudo.
Para tanto, faz-se necessário buscar a conceituação doutrinária de receita pública,
receita municipal, receita tributária e diferenciar entrada de receita. Desse modo,
será possível verificar mais adiante, se as receitas que formam o Fundeb são receitas
tributárias e, por consequência, compõem a base de cálculo dos duodécimos.
Ainda de acordo com a lição de Baleeiro12, a receita pública pode ser classificada
entre ordinária e derivada. A receita ordinária advém da exploração estatal da atividade
econômica, enquanto a derivada decorre daquelas provenientes do constrangimento
legal para sua arrecadação, como os tributos, penas pecuniárias, o confisco e as
reparações de guerra13. Oliveira14 trás ainda a categorização das receitas transferidas,
9 MEIRELLES, Henly Lopes. Finanças Municipais. São Paulo: RT, 1979. p.4-5.
10 MEIRELLES, Henly Lopes. Direito Municipal Brasileiro. 6 ed. São Paulo: Malheiros, 1993. p. 135.
11 BALEEIRO, Aliomar. Uma Introdução à Ciência das Finanças. 18 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2012. p. 152.
12 BALEEIRO, Aliomar. Uma Introdução à Ciência das Finanças. 18 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2012. p. 153.
13 HARADA, Kiroshi. Direito Financeiro e Tributário. 19 ed. São Paulo: Atlas, 2010. p.33.
14 OLIVEIRA, Regis Fernandes de. Curso de Direito Financeiro. 5 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013.
p.150.
15 BALEEIRO, Aliomar. Uma Introdução à Ciência das Finanças. 18 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2012. p. 63.
16 Art. 60. Nos dez primeiros anos da promulgação da Constituição, o Poder Público
desenvolverá esforços, com a mobilização de todos os setores organizados da sociedade
e com a aplicação de, pelo menos, cinquenta por cento dos recursos a que se refere o art.
212 da Constituição, para eliminar o analfabetismo e universalizar o ensino fundamental.
Parágrafo único. Em igual prazo, as universidades públicas descentralizarão suas atividades, de modo a
estender suas unidades de ensino superior às cidades de maior densidade populacional.
17 Art. 212. A União aplicará, anualmente, nunca menos de dezoito, e os Estados, o Distrito Federal e
os Municípios vinte e cinco por cento, no mínimo, da receita resultante de impostos, compreendida a
proveniente de transferências, na manutenção e desenvolvimento do ensino.
O Fundef era constituído por20, no mínimo, quinze por cento dos recursos prove-
nientes do: 1) Imposto sobre operações relativas à circulação de mercadorias e sobre
prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação
(ICMS, art. 115, II, da CF/88); 2) Imposto sobre Produtos Industrializados, proporcional
às exportações (IPIexp, art. 159, inciso II da, CF/88); 3) Fundo de Participação dos
Estados (FPE, art. 159, inciso I, alínea “a”, da CF/88) e; 4) Fundo de Participação dos
Municípios (FPM, art. 159, inciso I, alínea “b” da CF/88).
20 § 2º O Fundo referido no parágrafo anterior será constituído por, pelo menos, quinze por cento dos
recursos a que se referem os arts. 155, inciso II; 158, inciso IV; e 159, inciso I, alíneas “a” e “b”; e inciso
II, da Constituição Federal, e será distribuído entre cada Estado e seus Municípios, proporcionalmente ao
número de alunos nas respectivas redes de ensino fundamental.
23 TORRES, Heleno Taveira. Direito Constitucional Financeiro. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014. p.
287.
24 TORRES, Heleno Taveira. Direito Constitucional Financeiro. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014. p.
289.
Ou seja, no dia programado para que seja creditado nas contas dos Estados e dos
Municípios o recurso proveniente do ICMS, 20% da parcela que pertence ao Estado e o
mesmo percentual da participação dos municípios é creditada diretamente na conta
do Fundeb, de modo que os entes recebem em seu caixa somente 80%.
Tal aspecto é extremamente relevante, uma vez que a receita tributária que
pertence aos municípios em decorrência da repartição constitucional não é entregue
ao ente municipal para que este separe 20% e destine ao Fundeb. Os 20% são creditados
diretamente na conta específica do fundo, não transitando previamente pelas contas
dos municípios. Os Estados e Municípios receberão posteriormente na data prevista
para o repasse, a sua cota no valor arrecadado pelo Fundeb.
Ribeirão das Neves, em 2016, possuía 22.157 alunos matriculados em sua rede
municipal de ensino. Seu coeficiente de distribuição definido para o ano de 2017
foi de 0,005470623934. No ano de 2017, sua receita tributária realizada foi de
R$57.419.054,25, sendo que destinou ao Fundeb o valor total R$30.816.541,03, ao
passo que recebeu do Fundeb o valor total de R$ 71.179.973,56. Desse modo, recebeu
R$40.363.432,53 a mais do que enviou. Em 2017, portanto, Ribeirão das Neves foi um
Município Recebedor.
Perceba-se que Nova Lima, apesar de ter uma receita tributária maior do que
Ribeirão das Neves e de contribuir com valor maior para a formação do Fundeb, recebeu
valor muito inferior em comparação com o outro município da Região Metropolitana.
Isso ocorre porque seu coeficiente de distribuição é menor. Por esse motivo, temos
que Nova Lima acaba por perder receita em razão da existência do Fundeb, ao passo
que Ribeirão das Neves acresce suas entradas.
26 Dados extraídos das Demonstrações Contábeis Aplicadas ao Setor Público (DCASP), referentes ao
ano de 2017, enviados pelos Municípios de Nova Lima e Ribeirão das Neves ao TCEMG. Disponível em:
phttps://fiscalizandocomtce.tce.mg.gov.br/Home/Index. Acesso em 02 set. 2018.
A origem de toda receita que compõem o Fundeb é tributária. Entretanto, isso não
basta para afirmarmos que todo recurso que o Município contribui para o Fundeb (ou
que dele recebe) é receita tributária daquele município. A receita pública pressupõe
uma entrada no caixa, razão pela qual inexistindo entrada, não há que se falar em
receita. Desse modo, uma vez que os recursos do Fundeb só acrescem ao patrimônio
do Município após transitarem pela conta do Fundeb Estadual e, posteriormente, serem
divididos para as contas municipais, somente nesse momento haverá ocorrido a entrada.
Além disso, como vimos no caso dos Municípios Pagadores, nem todo recurso
com o qual o município participa para a formação do Fundeb chegará aos seus caixas.
Caso a base de cálculo seja a contribuição municipal feita ao fundo, em nosso exemplo,
Usando como base o conceito formulado por Meirelles28, no qual a “receita pública
é, pois, o conjunto de recursos financeiros que entram para os cofres estatais, provindo de
quaisquer fontes, a fim de acorrer às despesas orçamentárias e adicionais do orçamento”,
toda a entrada decorrente dos depósitos realizados pelo Fundeb nos caixas municipais
poderia ser caracterizada como receita pública, e também como receita tributária, vez
que deriva de tributos. Isso porque o valor, ainda que parcialmente originado de recursos
tributários de outros entes, entrou nos cofres municipais a fim de acorrer às despesas
do município com o desenvolvimento e manutenção do ensino básico.
Entretanto, nesse caso há que se fazer uma ponderação para que o propósito da
norma constitucional não seja deturpado. Como vimos, o Fundeb, assim como seu
antecessor, baseia-se na ideia de redistribuição solidária dos recursos destinados à
educação básica entre os entes federativos. A intenção do fundo era exatamente de que
alguns entes perderiam receita em prol de outros menos favorecidos, os quais teriam
melhores condições de investir em sua educação básica, reduzindo as desigualdades
regionais.
Noutro lado, temos que o art. 29-A da CF/1988, fixou a base de cálculo do limite
dos duodécimos repassados à Câmara, de modo a limitar os gastos do Poder Legislativo
Municipal, como modo de evitar abusos e garantir que os recursos orçamentários
28 MEIRELLES, Henly Lopes. Direito Municipal Brasileiro. 6 ed. São Paulo: Malheiros, 1993. P. 135.
Caso a receita a maior seja incluída na base de cálculo, o Poder Executivo teria
que destinar mais recursos ao Poder Legislativo, os quais não poderiam ser aplicados
em suas atividades essenciais. A sistemática de redistribuição solidária dos recursos
do Fundeb traria o efeito colateral de fazer aumentar os gastos com as Câmaras
Municipais, entretanto que esse nunca foi o propósito do fundo.
29 BRASIL. Proposta de Emenda à Constituição nº 15, de 1998. Mesas da Câmara dos Deputados e do
Senado Federal. Disponível em: http://www.stf.jus.br/arquivo/biblioteca/pec/EmendasConstitucionais/
EC25/Senado/EC025_sen_25031992_ini.pdf. Acesso em 15 ago 2018.
Aplicando-se a fórmula descrita acima nos dois municípios que foram usados
como exemplo, teríamos a determinada situação: a base de cálculo do limite de gastos
da Câmara de Nova Lima para 2018 abarcaria apenas o valor recebido em 2017 (R$
28.547.058,91), enquanto a base de cálculo do limite de gastos da Câmara de Ribeirão
das Neves para 2018 incluiria os valores recebidos somente até o valor da contribuição
(R$30.816.541,03).
30 MINAS GERAIS. Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais. Súmula 102. Publicada no “MG”
de 01/02/2006 - pág. 26. Disponível em: http://www.tce.mg.gov.br/IMG/Legislacao/legiscont/
S%C3%BAmula/S%C3%BAmula%20102-06.pdf. Acesso em 19 ago. 2018.
31 MINAS GERAIS. Tribunal de Contas do Estado de Minas. Tribunal Pleno. Sessão 26 jun. 2011. Processo
nº 837614. Consulta. Notas Taquigráficas. Disponível em: http://tcnotas.tce.mg.gov.br/tcjuris/Nota/
BuscarArquivo/74639
33 BRASIL. RMS 44.795/MG, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, Rel. p/ Acórdão Ministro OG FERNANDES,
SEGUNDA TURMA, julgado em 03/11/2015, DJe 12/02/2016. Disponível em: https://ww2.stj.jus.br/
processo/revista/inteiroteor/?num_registro=201400133556&dt_publicacao=12/02/2016. Acesso em 09
Set. 2018.
O Ministro Humberto Martins, relator do recurso, proferiu seu voto pela denegação
do Recurso em Mandado de Segurança, por entender que: “Em suma, não é possível criar
interpretativamente restrição à fixação do totum contábil do art. 29-A da Constituição
Federal, por ausência de previsão constitucional ou legal e, assim, não se vê o direito
líquido e certo postulado.”.
O conceito doutrinário de receita pública não exige que o recurso que entrou nos
cofres públicos não tenha destinação específica. O STJ no julgamento do RMS 44.795
criou critério para a caracterização de receita pública, sem, entretanto, justificar sua
A decisão do STJ não prestigiou a doutrina sobre a matéria, bem como deu inter-
pretação desarrazoada ao art. 29-A, criando limitação onde a norma constitucional não
previu. Mais acertada esteve a divergência, principalmente no voto-vista da Ministra
Assusete Magalhães. Entretanto, os votos divergentes, não levaram em consideração
o fato de que alguns municípios não recebem em seu caixa todo o valor destinado ao
Fundeb.
Considerações finaiS
A obrigação de repasse dos duodécimos pelo Poder Executivo ao Poder Legislativo
instrumentaliza o Princípio da Separação de Poderes, ao passo que a fixação de limites
dos gastos do Poder Legislativo Municipal garante que não haja abusos na aprovação
das Leis Orçamentárias Anuais dos municípios. A função da norma do art. 29-A foi
criar um teto de gastos para as Câmaras Municipais com base no porte populacional
e arrecadatório dos Municípios.
Doutro lado, a criação do Fundef e do Fundeb, por meio das alterações na redação
original do art. 60 do ADCT, visou criar um mecanismo de participação solidária entre
as três esferas da Federação. Os Estados, o Distrito Federal os Municípios e a União
Os recursos recebidos pelos Municípios do Fundeb são receitas públicas, uma vez
que acrescem permanentemente ao patrimônio do ente municipal. O fato de os recursos
serem vinculados a uma espécie de gastos não tem o condão de descaracterizá-lo
como receita pública. Entretanto, parte desses recursos não é oriundo da receita
própria daquele município. A expressão “receita tributária e transferências” art. 29-A da
CF/1988 faz menção à receita própria do município, e não a transferida de outros entes.
Por tais razões, deverão compor a base de cálculo do limite de gastos da Câmara
Municipal os recursos efetivamente repassados pelo Fundeb ao Município, no exercício
anterior, até o limite de recursos que o Município contribuiu para a formação do fundo.
ReferênciaS
BALEEIRO, Aliomar. Direito Tributário Brasileiro. 11 ed. Rio de Janeiro: Forense,
1999.
BALEEIRO, Aliomar. Uma Introdução à Ciência das Finanças. 18 ed. Rio de Janeiro:
Forense, 2012.
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Texto constitucional
promulgado em 05 de outubro de 1988, com as alterações adotadas pelas Emendas
Constitucionais nos 1/1992 a 99/2017, pelo Decreto Legislativo nº 186/2008 e pelas
Emendas Constitucionais de Revisão nos 1 a 6/1994. Disponível em: Acesso em: 02
ago. 2018.
BRASIL, Emenda Constitucional nº 14, de 12 de setembro de 1996. Modifica os arts.
34, 208, 211 e 212 da Constituição Federal e dá nova redação ao art. 60 do Ato
Resumo
Este trabalho busca realizar análise crítica do acordo de leniência
previsto na Lei federal nº 12.846, de 01 de agosto de 2013, para verificar
lacunas existentes nesta lei que impactam no êxito deste acordo e o papel
dos órgãos públicos de controle. Após a exposição da origem do ajuste, foi
apreciado o artigo 16 da referida norma, ocasião em que foram explicitados
os requisitos do acordo de leniência, a competência para celebração e as
suas consequências, analisando as regras do artigo 17. Foram explicadas as
modificações realizadas pela Medida Provisória nº 703, de 18 de dezembro
de 2015 e dispositivos do decreto nº 8.420, de 18 de março de 2015 sobre o
acordo. Após diferenciar o ajuste de outros instrumentos jurídicos previstos
na legislação, foram apreciadas as lacunas legais existentes quanto à
participação do Ministério Público federal e Tribunal de Contas da União,
à ausência de benefícios para o signatário do acordo em ações judiciais
cíveis ou penal, bem como em relação à atuação da Advocacia-Geral da
União. Destacou-se como indispensável a participação da Advocacia Pública
para implementação dos efeitos do acordo, concluindo como fundamental
uma atuação colaborativa de todos os órgãos de controle nos resultados
do acordo de leniência.
1 Procuradora do Estado da Bahia, Especialista em Direito Público pela UFBA, Especialista em Direito
Social e Infraestrutura pela FGV e Especialista em Advocacia Pública pelo IDDE.
BARRETTO, Fabiana Maria Farias Santos. Acordo de leniência: análise das principais lacunas da lei federal nº 12.846/13 e do papel da
advocacia pública e demais órgãos de controle neste acordo. In: PEREIRA, Rodolfo Viana; SACCHETTO,Thiago Coelho (Orgs.). Advo-
cacia pública em foco. Volume II. Belo Horizonte: IDDE, 2019. p. 63-98. Disponível em: https://doi.org/10.32445/97885671341093
INTRODUÇÃO
O Acordo de Leniência, previsto na Lei federal nº 12.846, de 01 de agosto de 20132
(conhecida como Lei Anticorrupção - LAC), ganhou muita relevância no cenário atual
com a operação policial intitulada “Lava Jato”, que apura delitos envolvendo empresá-
rios e agentes públicos. Com efeito, os crimes praticados no âmbito de contratações
públicas podem ser enquadrados como atos lesivos em licitações e contratos, conforme
o disposto no art. 5º, IV da referida lei, razão pela qual as empresas investigadas
estariam manifestando interesse na celebração do acordo de leniência para obter
atenuação das sanções.
Por isso, após traçar um histórico sobre o acordo de leniência no âmbito federal,
serão analisadas as regras trazidas pela Lei Anticorrupção, a natureza jurídica deste
instituto, diferenciando-o em relação a outros instrumentos jurídicos, bem como serão
demonstradas as principais lacunas existentes na legislação vigente, para finalmente
compreender o papel da Advocacia Pública, ao lado do Ministério da Transparência
3 Segundo o site g1.globo.com, 9(nove) empresas envolvidas na operação “Lava Jato” celebraram acordo
de leniência com o MPF. Disponível em https://g1.globo.com/politica/operacao-lava-jato/noticia/com-
odebrecht-chegam-a-16-os-acordos-de-leniencia-motivados-pela-lava-jato.ghtml. Acesso em 19.11.2017
4 Disponível em https://www.conjur.com.br/2017-ago-22/ministerio-publico-nao-acordos-leniencia-decide-
trf. Acesso em 19.10.2017.
O acordo de leniência foi previsto na referida norma, entre outros motivos, para
garantir o resultado útil do processo administrativo de responsabilização – PAR.
Este instrumento foi disciplinado no Capítulo V da Lei federal nº 12.856/13 em dois
momentos: no art. 16, que trata do acordo celebrado em face da prática de atos lesivos
previstos pela referida Lei Anticorrupção; e no art. 17, que dispõe sobre o ajuste que
pode ser firmado em face da prática de falta administrativa prevista na Lei federal nº
8.666/93.
8 Art. 16. A autoridade máxima de cada órgão ou entidade pública poderá celebrar acordo de leniência com
as pessoas jurídicas responsáveis pela prática dos atos previstos nesta Lei que colaborem efetivamente
com as investigações e o processo administrativo, sendo que dessa colaboração resulte:
I - a identificação dos demais envolvidos na infração, quando couber; e
II - a obtenção célere de informações e documentos que comprovem o ilícito sob apuração.
§ 1o O acordo de que trata o caput somente poderá ser celebrado se preenchidos, cumulativamente, os
seguintes requisitos:
I - a pessoa jurídica seja a primeira a se manifestar sobre seu interesse em cooperar para a apuração do
ato ilícito;
II - a pessoa jurídica cesse completamente seu envolvimento na infração investigada a partir da data de
propositura do acordo;
III - a pessoa jurídica admita sua participação no ilícito e coopere plena e permanentemente com as
investigações e o processo administrativo, comparecendo, sob suas expensas, sempre que solicitada, a
todos os atos processuais, até seu encerramento.
§ 2o A celebração do acordo de leniência isentará a pessoa jurídica das sanções previstas no inciso II do
art. 6o e no inciso IV do art. 19 e reduzirá em até 2/3 (dois terços) o valor da multa aplicável.
§ 3o O acordo de leniência não exime a pessoa jurídica da obrigação de reparar integralmente o dano
causado.
§ 4o O acordo de leniência estipulará as condições necessárias para assegurar a efetividade da
O caput do art. 16 preceitua que o acordo de leniência pode ser celebrado quando
houver uma colaboração efetiva nas investigações e no processo administrativo. Isso
quer dizer que este instrumento jurídico será firmado antes da instauração do processo
administrativo de responsabilização – PAR (leniência prévia) ou no curso do referido
procedimento (leniência concomitante), pois deverá importar em benefício para as
investigações ou para o andamento do referido PAR. Os incisos deste dispositivo
estabelecem que será considerado colaboração efetiva “a identificação dos demais
envolvidos, quando couber e também a obtenção célere de informações e documentos
que comprovem o ilícito sob apuração”. O §4º do art. 16 reforça a necessidade de
estipulação de cláusulas no acordo que garantam a efetividade da colaboração e o
resultado útil do processo.
O art. 16, §1º, através de três incisos, estabeleceu requisitos cumulativos a serem
observados pela pessoa jurídica que irá celebrar este ajuste. Estes requisitos, em
suma, fazem as seguintes exigências: i) manifestação de interesse em cooperação
pela pessoa jurídica; ii) encerramento da prática ilícita a partir da apresentação da
proposta de acordo pela interessada; iii) admissão da sua participação no ato lesivo,
somada a sua cooperação com a investigação e o andamento da instrução processual.
9 MARRARA, Thiago. Comentários ao art. 16. In: DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella; MARRARA, Thiago. Lei
Anticorrupção comentada. Belo Horizonte: Fórum, 2017, p. 222
Outra conclusão que pode ser extraída sobre as autoridades autorizadas a celebrar
o acordo é que, em respeito à autonomia e independência entre os Poderes, bem como
em atenção às regras de competência do art. 8º da LAC, quando o ato lesivo fosse
praticado no âmbito de outro Poder (Legislativo ou Judiciário) ou contra um órgão
autônomo não integrante do Poder Executivo (como Ministério Público e Defensoria
Pública), seria competente para pactuar este ajuste a autoridade máxima de cada um
destes órgãos, por ser o agente público competente para iniciar e aplicar as sanções
do PAR.
diplomáticas de país estrangeiro, de qualquer nível ou esfera de governo, bem como as pessoas jurídicas
controladas, direta ou indiretamente, pelo poder público de país estrangeiro.
11 DIPP, Gilson; CASTILHO, Manoel L. Volkmer de. Comentários sobre a Lei Anticorrupção. São Paulo:
Saraiva, 2016, pág. 89
Todavia, a interpretação acima não parece ser a mais adequada, pois se a intenção
do legislador era estabelecer uma nova espécie de acordo de leniência diversa daquela
prevista no art. 16, o qual seria cabível de forma autônoma no processo administrativo
sancionador instaurado com fundamento na Lei federal nº 8.666/93, pela boa técnica
legislativa, deveria ter realizado tal previsão nas Disposições Finais da LAC. Assim,
seria inserido novo dispositivo na Lei Geral de Licitações e Contratos, estabelecendo
expressamente a possibilidade de firmar ajustes para isenção e atenuação das sanções
administrativas ao celebrante que praticar quaisquer ilícitos previstos no art. 86 a 88
da referida norma, mesmo que estes não encontrem correspondência com alguma
figura “típica” prevista no art. 5º da Lei Anticorrupção, não suscitando as dúvidas ora
levantadas.
12 Art. 17. A administração pública poderá também celebrar acordo de leniência com a pessoa jurídica
responsável pela prática de ilícitos previstos na Lei no 8.666, de 21 de junho de 1993, com vistas à
isenção ou atenuação das sanções administrativas estabelecidas em seus arts. 86 a 88.
O fato é que, seja realizado como único ajuste no PAR ou não, o acordo de leniência
poderá ter reflexos no processo administrativo sancionador porventura instaurado
para apurar a prática de ilícitos previstos na Lei Geral de Licitações e Contratos, o
que é um benefício bastante significativo para pessoas jurídicas que contratam com
a Administração Pública, por ser nítido o interesse destas em não ficar impedida
de participar das contratações públicas, o que decorreria da aplicação da pena de
suspensão temporária ou declaração de inidoneidade do direito de licitar e contratar.
13 FORTINI, Cristiana. Comentários ao art. 17. In: DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella; MARRARA, Thiago. Lei
Anticorrupção comentada. Belo Horizonte: Fórum, 2017, p. 239
14 ZYMLER, Benjamin; DIOS, Laureano Canabarro. Lei Anticorrupção (Lei nº 12.846/2013): uma visão do
controle externo. Belo Horizonte: Fórum, 2016, p. 150
Em primeiro lugar, alterou o caput do art. 16, prevendo que todos entes federativos
poderão, por meio de seus órgãos internos, “de forma isolada ou em conjunto com
o Ministério Público ou com a Advocacia Pública”, celebrar acordo de leniência. Os
parágrafos 11 e 12 deste dispositivo também foram modificados para dispor sobre
esta participação da Advocacia Pública e do Ministério na pactuação deste ajuste. É
possível inferir que tais previsões visavam propiciar o êxito na celebração do acordo
de leniência, visto que a pessoa jurídica interessada precisa de uma garantia de que
o acordo não somente repercute sobre a conclusão do processo administrativo de
responsabilização – PAR, mas também impede o ajuizamento de ação judicial pela
Advocacia e órgão parquet para imposição de sanções de natureza cível previstas
no art. 1916 da Lei federal nº 12.846/13. Tal conclusão é corroborada com a nova
redação dada ao art. 18 pela Medida Provisória, quando estabeleceu que “na esfera
administrativa, a responsabilidade da pessoa jurídica não afasta a possibilidade de
sua responsabilização na esfera judicial, exceto quando expressamente previsto na
celebração do acordo de leniência.”
15 Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2015/Mpv/mpv703.htm#art1,
acesso em 20.12.17.
16 Art. 19. Em razão da prática de atos previstos no art. 5o desta Lei, a União, os Estados, o Distrito Federal
e os Municípios, por meio das respectivas Advocacias Públicas ou órgãos de representação judicial, ou
equivalentes, e o Ministério Público, poderão ajuizar ação com vistas à aplicação das seguintes sanções
às pessoas jurídicas infratoras:
I - perdimento dos bens, direitos ou valores que representem vantagem ou proveito direta ou indiretamente
obtidos da infração, ressalvado o direito do lesado ou de terceiro de boa-fé;
II - suspensão ou interdição parcial de suas atividades;
III - dissolução compulsória da pessoa jurídica;
IV - proibição de receber incentivos, subsídios, subvenções, doações ou empréstimos de órgãos ou
entidades públicas e de instituições financeiras públicas ou controladas pelo poder público, pelo prazo
mínimo de 1 (um) e máximo de 5 (cinco) anos.
A Medida Provisória trouxe dois novos incisos ao caput do art. 16 da LAC para
estabelecer novos critérios para aferição da colaboração efetiva exigida para realização
deste pacto, tais como “a cooperação da pessoa jurídica com as investigações, em
face de sua responsabilidade objetiva” e “o comprometimento da pessoa jurídica na
implementação ou na melhoria de mecanismos internos de integridade”. Pela nova
redação do art. 16, §1º dada pela MP, este comprometimento da pessoa jurídica em
implementar ou melhorar os mecanismos internos de integridade, auditoria, incentivo
às denúncias de irregularidades e à aplicação efetiva de código de ética e de conduta
da empresa passou a ser um novo requisito cumulativo a ser cumprido para ter direito
ao acordo em questão. Ademais, o objetivo da Lei Anticorrupção é prevenir a repetição
de atos de corrupção semelhantes aos que foram detectados.
Merece destaque uma regra trazida pela aludida Medida Provisória, que revogou
o §1º do art. 17 da Lei federal nº 8.429/92, dispositivo que veda a celebração de
transação, acordo ou conciliação nas ações de improbidade. A revogação do referido
dispositivo durante o tempo de vigência da Medida Provisória afastou eventual ques-
tionamento quanto à legalidade da atuação do Ministério Público em transacionar
com uma pessoa jurídica quando o ato lesivo também pudesse ser enquadrado como
improbidade administrativa.
no acordo; e
III - no caso de a pessoa jurídica ser a primeira a firmar o acordo de leniência sobre os atos e fatos investigados,
a redução poderá chegar até a sua completa remissão, não sendo aplicável à pessoa jurídica qualquer
outra sanção de natureza pecuniária decorrente das infrações especificadas no acordo.
Critica-se essa previsão sob dois aspectos. Em primeiro lugar, houve uma nítida
criação de nova regra não prevista na norma legal através de decreto regulamentar, o
que nosso Ordenamento Jurídico não permite. Em segundo, conforme bem salientado
por Benjamin Zymler e Laureano Canabarro Dios, se é possível firmar acordo de leniência
por mais de uma pessoa pelo mesmo fato, isto enfraqueceria o instituto, “...visto que
nenhum dos coatores do ilícito sente-se pressionado a fazer, o que acaba por induzir
que nenhum o faça”19. Isso porque, quando a lei exigiu que a pessoa jurídica fosse a
primeira a manifestar interesse para ser beneficiada, nos casos em que houver mais de
uma pessoa envolvida, indiretamente criou-se uma “corrida” para ver quem irá romper
primeiro o pacto de silêncio existente entre as infratoras que agiam em conluio, para
ter direito aos benefícios.
A falha do legislador ordinário ao prever a regra constante no art. 16, §1º, inciso I da
LAC foi não dispor, em outro dispositivo, sobre algum benefício de menor repercussão
para as demais infratoras que também desejam colaborar com as investigações do PAR,
tal como existe nos ilícitos apurados pelo CADE, que previu o Termo de Compromisso
de Cessação. A Medida Provisória 703, como indicado acima, por um breve período
criou expressamente regras para a primeira pessoa jurídica que apresenta proposta
de acordo (o qual poderá até isentar total das sanções administrativas do art. 6º,
inclusive a pena pecuniária) e para as demais partícipes do ato lesivo (o quantum da
multa somente poderia ser reduzido no máximo 2/3), fazendo com que se mantivesse
o estímulo para que exista uma infratora a ser a primeira a ser manifestar e admitir o
esquema criminoso, denunciando as demais envolvidas.
Valdir Moises Simão e Marcelo Pontes Vianna comungam da tese de que seriam
mecanismos de investigação e não um simples negócio jurídico de transação20. De
20 SIMÃO, Valdir Moysés; VIANNA, Marcelo Pontes. O acordo de leniência na Lei Anticorrupção: histórico,
desafios e perspectivas. São Paulo: Trevisan Editora, 2017, p. 200.
Diogo de Figueiredo Moreira Neto e Rafael Veras de Freitas, por seu turno,
defendem que se trata de ato administrativo consensual, assim dispondo:
“Trata-se de acordo substitutivo: atos administrativos complexos, por meio
dos quais a Administração Pública, pautada pelo princípio da consensualidade,
flexibiliza sua conduta imperativa e celebra com o administrado um acordo, que
tem por objeto substituir, em determinada relação administrativa, uma conduta,
primariamente exigível, por outra secundariamente negociável”23
22 PEREIRA, Victor Alexandre El Khoury M. Acordo de leniência na Lei Anticorrupção (Lei nº 12.846/2013).
Revista Brasileira de Infraestrutura – RBINF, Belo Horizonte, ano 5, n. 9, p. 79-113, jan./jun, 2016, pag.
88-89
23 MOREIRA NETO, Diogo Figueiredo; FREITAS, Rafael Véras. A juridicidade da Lei Anticorrupção: reflexões
e interpretações prospectivas. Fórum Administrativo – FA, Belo Horizonte, ano 14, n. 1, fevereiro 2014.
Disponível em http://www.editoraforum.com.br/wp-content/uploads/2014/01/ART_Diogo-Figueiredo-
Moreira-Neto-et-al_Lei-Anticorrupcao.pdf, Acesso em 18.12.2017
24 Art. 4o O juiz poderá, a requerimento das partes, conceder o perdão judicial, reduzir em até 2/3 (dois
terços) a pena privativa de liberdade ou substituí-la por restritiva de direitos daquele que tenha colaborado
efetiva e voluntariamente com a investigação e com o processo criminal, desde que dessa colaboração
advenha um ou mais dos seguintes resultados:
I - a identificação dos demais coautores e partícipes da organização criminosa e das infrações penais por eles
praticadas;
II - a revelação da estrutura hierárquica e da divisão de tarefas da organização criminosa;
III - a prevenção de infrações penais decorrentes das atividades da organização criminosa;
IV - a recuperação total ou parcial do produto ou do proveito das infrações penais praticadas pela organização
criminosa;
V - a localização de eventual vítima com a sua integridade física preservada.
Após a análise das regras constantes no art. 16 da LAC, observa-se que igualmente
não é possível confundir com Termo de Ajustamento de Conduta previsto na Lei federal
nº 7.347/85. Por meio do TAC, o órgão público que, possui legitimidade para propor
ação civil pública, toma do potencial causador do dano aos interesses transindividuais
previstos no art. 1º da norma, o compromisso de que irá adequar sua conduta aos
ditames da lei, além de prevenir ou reparar eventuais danos, sob pena das cominações
legais.
Todavia, não obstante prevalecer a ideia de que o TAC é uma espécie de negócio
jurídico27, e ainda que se admita que os atos lesivos previstos na LAC violam direitos
transindividuais, é possível apontar diferenças em relação ao acordo de leniência: i) o
ajuste firmado com fulcro na Lei nº 7347/85 pode ser realizado para prevenir o dano
potencial; ii) a conduta do particular pode ser omissiva (o que não ocorre na prática
de atos lesivos) iii) não existe acusação formal de prática de ilícito e nem admissão
de culpa pela pessoa signatária do termo; iv) o TAC não se confunde com transação,
26 PEDROSO, Fernando Gentil Gizzi de Almeida. O acordo de leniência, da Lei Anticorrupção, como instrumento
efetivo para a responsabilização administrativa e civil das pessoas místicas, disponível em http://www.
editoramagister.com/doutrina_27473125_O_ACORDO_DE_LENIENCIA_DA_LEI_ANTICORRUPCAO_
COMO_INSTRUMENTO_EFETIVO_PARA_A_RESPONSABILIZACAO_ADMINISTRATIVA_E_CIVIL_DAS_
PESSOAS_MISTICAS.aspx , acesso em 20.12.17
27 Thays Rodrigues afastou a existência natureza contratual do TAC, pela ausência de patrimonialidade
como caráter essencial, bem como de que este seria uma espécie de transação, por não envolver apenas
diretos/interesses patrimoniais e privados, definindo-o como negócio jurídico bilateral detentor de um
requisito de validade peculiar que é a indisponibilidade do direito metaindividual violado ou ameaçado
de agressão. (RODRIGUES, Thays. A natureza do termo de ajustamento de conduta. Disponível em
https://jus.com.br./artigos/18488/a-natureza-juridica-do-termo-de-ajustamento-de-conduta-/2, acesso
em 20.12.17)
Valdir Moysés Simão e Marcelo Pontes Viana analisaram quatro destes acordos,
informando que o fundamento jurídico citado pelo órgão parquet para a celebração
desses ajustes estariam lastreados nos seguintes dispositivos: art. 129, inciso I, CF;
artigos 13 a 15 da Lei nº 9807/99; art. 1º da Lei nº 9613/98; art. 6º da Lei nº 7347/85;
art. 26 da Convenção de Palermo; art. 37 da Convenção de Mérida; art. 4º a 8º da Lei
nº 12.850/2013; art. 655 e 674 CPC/39, art. 267 e 269 CPC; art. 840 e 932 do Código
Civil e art. 16 a 21 da Lei Anticorrupção28. Os supracitados autores admitem ser válida a
celebração de acordos de leniência com base na lei da Ação Civil Pública, defendendo
o seguinte:
“ Dada a amplitude do espectro da lei da ação civil pública, admite-se seu uso
para buscar condenação da pessoa jurídica que, por meio de determinado ato,
inclusive aquelas passíveis de serem inseridos na categoria de corruptos, atente
contra um ou mais bens jurídicos tutelados, entre eles o patrimônio público”29
Não me parece que essa interpretação seja correta pelos seguintes motivos.
Em primeiro lugar, conforme exposto no tópico anterior, não é possível confundir TAC
com acordo de leniência, eis que não se admite transação (concessões mútuas) em
matéria de direito difuso, como bem explica Rogério Pacheco Alves30. Além disso, se
29 Op. cit. p. 45
30 GARCIA, Emerson; ALVES Rogério Pacheco. Improbidade Administrativa, 6 ed. rev. e ampl. e autlizada;
Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011, p. 733
Ora, não é possível negar que os atos lesivos que implicam em prejuízos aos
cofres públicos, notadamente aqueles descritos no art. 5º, inciso IV (que envolvem
licitações e contratos), não possam também ser enquadrados como atos de improbi-
dade administrativa previsto no art. 9º ou 11 da Lei federal nº 8.429/92. Ocorre que a
referida norma, em seu art. 17, §1º, proíbe expressamente qualquer forma de transação,
acordo ou conciliação envolvendo ato de improbidade administrativa. Logo, se por
acaso existiu alguma legitimidade do órgão parquet, foi pelo curto período em que tal
dispositivo foi revogado pela Medida Provisória nº 703.
Imperioso registrar que Thiago Marrara entende que haveria competência subsi-
diária do Ministério Público, mediante interpretação teleológica do art. 20, parte final:
“O fato de se deslocar a responsabilização administrativa para o processo judicial
movido pelo Ministério Público também deve descolar para esta entidade a
competência de negociar e eventualmente celebrar o acordo de leniência, que,
nesse contexto excepcional, será acoplado ao processo civil e não ao processo
administrativo. Assim, a lacuna do art. 16 em relação ao acordo por excepcional
responsabilização administrativa em processo civil não significa que o acordo
tenha deixado de existir. Ele continua possível, nas mesmas condições do art.
16, mas há que ser solicitado, negociado e celebrado perante o Ministério Público
Estadual ou Federal. Reitere-se: a transferência da competência para imposição
de sanções administrativas ao Judiciário nos casos de omissão administrativa
do ente lesado ocasiona de maneira automática a transferência de competência
para a celebração da leniência ao MP.” 31
Não se tem notícia se nos acordos de leniência noticiados pela imprensa (citados
na introdução deste trabalho) tenham sido observados os requisitos supracitados pelo
órgão ministerial (comprovação de omissão da autoridade administrativa e ação judicial
em curso). Por outro lado, o sitio eletrônico da CGU noticia que este vem atuando na
responsabilização administrativa de empresas, inclusive aquelas investigadas pela
Lava Jato.32
Contudo, outras razões ainda podem ser levantadas para afastar a legitimidade do
Ministério Público na pactuação destes negócios jurídicos. Isso porque, não é possível
admitir, sem previsão legal, que parte estranha ao processo administrativo possa
interferir no exercício do poder sancionador pela Administração. Ou seja, seria um
contrassenso admitir que o MPF possa celebrar acordo para atenuar/isentar sanções
de natureza administrativa (multa e publicação extraordinária de sentença, além das
penalidades do art. 86 a 88 da Lei federal nº 8.666/93) se este órgão externo não é o
legitimado para iniciar ou julgar o processo administrativo de responsabilização – PAR,
e muito menos pode atuar no processo administrativo instaurado para imposição
de penas restritivas ao direito de licitar e contratar com a Administração. Não custa
lembrar que, de certo modo, o Ministério Público valeu-se de tese semelhante a esta ora
suscitada na ADI 5508, quando defendeu que a Polícia Federal não teria competência
para firmar acordos de colaboração premiada justamente por não possuir legitimidade
propor a ação penal pública, conforme noticiado no sítio eletrônico do STF34.
33 “Art. 18. Na esfera administrativa, a responsabilidade da pessoa jurídica não afasta a possibilidade de
sua responsabilização na esfera judicial”.
Por outro lado, é inegável que a participação do Ministério Público é muito impor-
tante para a efetividade da pactuação firmada, na medida em que o compartilhamento
as informações trazidas pela pessoa jurídica interessada na proposta do acordo de
leniência podem não estar trazendo nenhum elemento probatório novo que possa ser
facilmente obtida pela autoridade administrativa, caso a investigação criminal não
esteja correndo em sigilo.
Logo, embora na atual legislação vigente não seja adequado defender a legiti-
midade para atuação prévia do TCU, pelas razões acima expostas, não deixa de ser
producente para que haja participação deste órgão, fiscalizando as negociações e
auxiliando no arbitramento dos prejuízos a serem ressarcidos.
Observa-se que a Lei federal nº 12.846/13 não traz nenhuma regra no sentido de
que a realização de acordo de leniência impede o ajuizamento de ação de improbidade
administrativa pelos órgãos legitimados e a imposição das sanções previstas na Lei
federal nº 8.429/92 para o particular (incluindo aqui pessoa jurídica) que concorreu
para a prática de ato ímprobo em conluio com o agente público.
Observa-se que o art. 16 do Capítulo V da Lei federal nº 12.846/13 não faz nenhuma
referência expressa à atuação da Advocacia Pública ao lado da Controladoria Geral da
União – Ministério da Transparência. O Decreto Regulamentador também padece do
mesmo problema, pois somente se refere à Advocacia Pública no art. 9º, §5º, inciso II,
quando trata da remessa do relatório da Comissão Processante para apurar eventuais
ilícitos em outras instâncias.
Nota-se que esta portaria interministerial veio corrigir o grave equívoco da LAC
em não prever expressamente a participação da Advocacia Pública, na medida em que
este ato normativo previu que a AGU poderá assinar termo de adesão aos Memorandos
de Entendimento celebrados com as pessoas jurídicas antes da entrada em vigor da
aludida portaria (art. 14). Esta atuação conjunta entre CGU e AGU resultou na celebração
de acordo de leniência, no valor de R$574 milhões, com a UTC Engenharia, uma das
empresas acusadas de envolvimento nos ilícitos apurados pela operação “Lava Jato”41.
Com efeito, o art. 131 da Constituição Federal atribui à AGU a competência para
consultoria e assessoria jurídica do Poder Executivo, o que se inclui seus órgãos,
como a CGU, razão pela qual existe uma representação da AGU inserida na estrutura
daquele órgão de controle. Ora, se este negócio jurídico envolve uma transação, que
necessariamente demanda análise de questões jurídicas, não é possível que outra
carreira da Administração Pública direta venha atuar no lugar do advogado público na
realização esta tarefa de consultoria e assessoramento.
Além disso, a Lei Complementar nº 73/2003 estabelece no art. 3º, inciso VI, a
competência exclusiva do Advogado-Geral da União para celebrar acordos que envolvam
ações de interesse da União, estando, por conseguinte, incluído o acordo de leniência.
Importa ainda destacar que, consoante o disposto no art. 20 da LCA, compete à AGU,
em legitimação concorrente com o Ministério Público, promover a responsabilização
judicial da pessoa jurídica que praticou o ato lesivo, para aplicação de sanções cíveis.
Portanto, seria temerário excluir a participação da Advocacia Pública nas negociações
feitas pela CGU, na medida que a responsabilização judicial ainda seria em tese cabível.
Afinal, a União, como pessoa jurídica lesada, estaria atuando, através de seus órgãos,
de forma esquizofrênica.
Logo, sendo possível averiguar que existem pessoas físicas envolvidas na prática
do ato lesivo e que estas são servidores públicos federais, a AGU, como órgão de
representação judicial da União, terá interesse que ocorra adequadamente a responsabi-
lização disciplinar, através do devido processo legal. Ademais, eventual ajuizamento de
ações judiciais pelo servidor punido disciplinarmente será defendida por um Advogado
Público. Competirá também à AGU adotar as medidas judiciais para que haja ressar-
cimento de eventuais danos decorrentes do ato ilícito praticado pelo agente público.
Por estes mesmos motivos, a Advocacia Pública também tem interesse na respon-
sabilização de pessoas jurídicas licitantes e contratadas que praticaram infrações
previstas na Lei federal nº 8.666/93, com vistas à imposição de sanções restritivas
do direito de licitar e contratar com a Administração. Afinal, compete à AGU zelar pela
lisura das contratações administrativas, a fim de que a União não venha a celebrar
contratos com pessoas jurídicas que adotaram condutas inidôneas. O órgão jurídico
também poderá avaliar como deve ser atenuada as sanções acima, com fulcro no art.
17 da LAC, na hipótese de verificar que atenderá melhor ao interesse público não impor
penas impeditivas de contratação com a Administração, em face de grandes obras já
iniciadas, por exemplo.
42 Nesse sentido é a opinião de Valdir Moysés Simão e Marcelo Pontes Vianna (Op. cit. p. 193)
43 Nesse sentido é posicionamento defendido por Nilton C. A. Coutinho. (COUTINHO, Nilton C. A. Probidade
e ética na gestão pública: a Lei nº 12.846/2013 e a importância do advogado público no combate à
corrupção. Fórum Administrativo – FA, Belo Horizonte, ano 15, n. 171, p. 65-10, maio de 2015).
No que concerne à atuação do TCU, mesmo não sendo exigível sua prévia
atuação como condição de eficácia deste negócio jurídico, a celebração do acordo de
leniência obviamente não afasta o exercício da sua competência prevista no art. 71 da
Constituição Federal e nem a imposição das sanções previstas na sua Lei Orgânica.
Assim, nada obsta que esta Corte seja informada da instauração da investigação
preliminar ou do PAR, tendo acesso aos documentos da negociação e atue de forma a
colaborar com o êxito do acordo, auxiliando no arbitramento dos prejuízos que deverão
ser ressarcidos pela celebrante, como dito alhures.
45 Disponível em http://www.cade.gov.br/assuntos/programa-de-leniencia/memorando-de-entendimentos-
sg-e-mpfsp_tcc-e-acordos-de-colaboracao_15-03-2016.pdf, acesso em 15.12.17
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Diante do exposto, analisando a Lei federal nº 12.647/13, que estabeleceu a
possibilidade de pessoas jurídicas firmar acordo de leniência, para isenção e atenuação
das sanções cabíveis diante da prática de atos de corrupção, observa-se que esta norma
possui algumas lacunas que podem atrapalhar a realização deste ajuste, implicando
em insegurança jurídica e desestímulo à sua celebração.
Como registrado no capítulo anterior, nada obsta que seja firmado convênio ou
termo de cooperação entre esses diversos órgãos de controle, com finalidade de
fomentar uma atuação colaborativa dos mesmos na celebração de acordos de leniência,
a fim de que este ajuste alcance seus objetivos, que são a elucidação de práticas
ReferênciaS
COUTINHO, Nilton C. A. Probidade e ética na gestão pública: a Lei nº 12.846/2013 e
a importância do advogado público no combate à corrupção. Fórum Administrativo
– FA, Belo Horizonte, ano 15, n. 171, p. 65-10, maio de 2015
DIPP, Gilson; CASTILHO, Manoel L. Volkmer de. Comentários sobre a Lei
Anticorrupção. São Paulo: Saraiva, 2016.
FORTINI, Cristiana. Comentários ao art. 17. In: DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella;
GARCIA, Emerson; ALVES Rogério Pacheco. Improbidade Administrativa, 6 ed. rev. e
ampl. e autlizada, Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011
MARRARA, Thiago. Comentários ao art. 16. In: DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella;
MARRARA, Thiago. Lei Anticorrupção comentada. Belo Horizonte: Fórum, 2017.
MOREIRA NETO, Diogo Figueiredo; FREITAS, Rafael Véras. A juridicidade da Lei
Anticorrupção: reflexões e interpretações prospectivas. Fórum Administrativo – FA,
Belo Horizonte, ano 14, n. 1, fevereiro 2014. Disponível em http://www.editoraforum.
com.br/wp-content/uploads/2014/01/ART_Diogo-Figueiredo-Moreira-Neto-et-al_
Lei-Anticorrupcao.pdf
PEDROSO, Fernando Gentil Gizzi de Almeida. O acordo de leniência, da
Lei Anticorrupção, como instrumento efetivo para responsabilização
administrativa e civil das pessoas místicas. http://www.editoramagister.com/
doutrina_27473125_O_ACORDO_DE_LENIENCIA_DA_LEI_ANTICORRUPCAO_COMO_
INSTRUMENTO_EFETIVO_PARA_A_RESPONSABILIZACAO_ADMINISTRATIVA_E_
CIVIL_DAS_PESSOAS_MISTICAS.aspx, acesso em 20.12.17
PEREIRA, Victor Alexandre El Khoury M. Acordo de leniência na Lei Anticorrupção
(Lei nº 12.846/2013). Revista Brasileira de Infraestrutura – RBINF, Belo Horizonte,
ano 5, n. 9, p. 79-113, jan./jun, 2016.
Resumo
O artigo aborda os elementos básicos, para que os gestores das
organizações públicas federais possam compreender como o tema do
assédio moral é abordado no ordenamento jurídico brasileiro. Para este fim,
apresentamos inicialmente os principais conceitos e os danos provocados
às vítimas. Em seguida, adentramos na legislação vigente e Projetos de Lei.
Conclusivamente, constatamos que a legislação vigente é suficiente para
que tanto o agressor, quanto o gestor que vier a se omitir, poderão vir a ser
enquadrados no atentado aos fundamentos do Estado Democrático de Direito
e à dignidade da pessoa humana; incorrendo em crime de tortura.
INTRODUÇÃO
O assédio moral tem-se configurado como uma ameaça crescente aos trabalha-
dores, tanto na esfera privada, quanto na esfera pública; caracterizando-se mesmo
como um problema de saúde, que leva a danos na vida profissional e pessoal daqueles
que são vítimas deste tipo de ação.
2 LEYMANN, H. The content and development of Mobbing at work. European Journal of Work and
Organizational Psychology, v. 5, n. 2, pp. 165-184, 1996, p. 168.
4 BARRETO, Margarida. HELOANI, Roberto. Violência, saúde e trabalho: a intolerância e o assédio moral
nas relações laborais. Serv. Soc. Soc., São Paulo, n. 123, p. 544-561, 2015, p. 12
5 NASCIMENTO, Sônia A. C. Mascaro. Assédio moral no ambiente do trabalho. Revista LTR, São Paulo, v.
68, n. 08, p. 922-930, ago. 2004. p. 922
Lis Soboll destaca que ainda que disponível um número significativo de pesquisas
sobre assédio moral no mundo, “a comparação dos estudos torna-se difícil, uma vez que
não há padronização conceitual e metodológica”. No Brasil, o maior consenso é pela
denominação de “assédio moral”; o que em realidade pode levar a uma certa confusão
de entendimento, uma vez que outras ações, que não o assédio moral, também podem
levar ao dano moral. Daí a necessidade de se identificar a sistematização ou repetição
das condutas abusivas.
6 SOBOLL, Lis Andréa Pereira. Assédio moral – organizacional: uma análise da organização do Trabalho.
São Paulo: Casa do Psicólogo®, 2008, p. 29.
7 LEYMANN, H. The content and development of Mobbing at work. European Journal of Work and
Organizational Psychology, v. 5, n. 2, pp. 165-184, 1996.
8 OMS – Organización Mundial de la Salud. Sensibilización sobre el acoso psicológico en el trabajo. Serie
Protección de la salud de los trabajadores. N.04, Geneva, 2004.
Heinz Leymann criou uma ferramenta para calcular a incidência de assédio moral,
através de um questionário, denominado LIPT- Leymann Inventory of Psychological
Terrorization, que descrevia de maneira objetiva 45 atividades que seriam consideradas
como atos de assédio moral. Os autores sobre o assédio moral, onde podemos destacar
SOBOLL e GOSDAL (2009)10, SOBOL (2008)11, apontam entre os critérios de identificação
do assédio moral, a existência de uma interação assimétrica, na qual é estabelecida
uma relação de poder ou força, durante ou pelo processo de assédio, entre agressor
(es) e vítima (s); o caráter processual, no qual se destacam a sistematização e repetição
das atitudes hostis; e a orientação a alvos específicos. É ampla a literatura sobre o
tema. Carisa Bradaschia12 apresenta uma ampla referência de autores, em relação às
táticas empregadas na prática do assédio moral, que pode ser conferida na Tabela 3.
9 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro. volume IV: Responsabilidade Civil – 5. ed. – São
Paulo: Saraiva, 2010, p. 379.
10 SOBOLL, Lis Andrea P. GOSDAL, Thereza Cristina (orgs.). Assédio moral interpessoal e organizacional:
um enfoque interdisciplinar. São Paulo: LTr, 2009.
11 SOBOLL, Lis Andréa Pereira. Assédio moral – organizacional: uma análise da organização do Trabalho.
São Paulo: Casa do Psicólogo®, 2008.
12 BRADASCHIA, Carisa Almeida. Assédio moral no trabalho: a sistematização dos estudos sobre um
campo em construção. Dissertação de Mestrado. Fundação Getúlio Vargas - Escola de Administração de
Empresas de São Paulo. São Paulo, 2007, p. 74.
13 FREITAS, Maria Ester de; HELOANI, José Roberto; BARRETO, Margarida. Assédio Moral no Trabalho.
Cengage Learning, São Paulo, 2008, p. 38.
15 ARAÚJO, Adriane Reis de. Assédio moral organizacional. Revista TRT, Porto Alegre, RS, v. 73, n. 2, p. 203-
214, abr./jun. 2007.
16 SOUZA, Terezinha Martins dos Santos; DUCATTI, I. A gênese do assédio: uma análise histórico-social.
Revista Em Pauta, v. 11, p. 151-172, 2013, p. 164.
17 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro - volume IV: Responsabilidade Civil. 5. ed. São Paulo:
Saraiva, 2010, p. 359.
18 CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. 9. ed. rev. e ampl. São Paulo: Atlas, 2010,
p. 78.
19 NASCIMENTO, Sônia A. C. Mascaro. Assédio moral no ambiente do trabalho. Revista LTR, São Paulo, v.
68, n. 08, p. 922-930, ago. 2004. p. 922
20 BARROS, Alice Monteiro de. Curso de Direito do Trabalho. 10ª edição – atualizada por Jessé Cláudio
Franco de Alencar São Paulo, LTr 80, 2016.
21 OMS – Organización Mundial de la Salud. Sensibilización sobre el acoso psicológico en el trabajo. Serie
Protección de la salud de los trabajadores. N.04, Geneva, 2004, p.16.
Por ocorrer de forma velada, Schiavi23 destaca que muitas vezes “o depoimento
pessoal é o único meio ou principal meio de prova de que dispõe a parte no Processo
do trabalho. Nas hipóteses em que os fatos se passam em locais reservados ou fora
do alcance das testemunhas, como nas de assédio moral e assédio sexual, a palavra
da parte tem grande relevância e é forte elemento de convicção do juiz”.
dignidade da pessoa humana, como consta em seu Art. 1º, inciso III, abaixo transcrito:
Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos
Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático
de Direito e tem como fundamentos: (...) III – a dignidade da pessoa humana.
22 SANTOS, Luciany Michelli Pereira dos. O dano à integridade psíquica e moral decorrente de assédio moral
e violência perversa nas relações cotidianas. Revista de Ciências Jurídicas/Universidade Estadual de
Maringá, Curso de Mestrado em Direito.vol. 1, nº 1, Maringá, Pr: Sthampa, 2003, p. 143.
23 SCHIAVI, Mauro. Manual de Direito de Processo do Trabalho. Da Ação Civil Pública na Esfera Trabalhista.
5ª edição, São Paulo: LTR, fevereiro de 2012, p. 632.
25 SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da Pessoa Humana e Direitos Fundamentais. 8ª ed. Porto Alegre:
Livraria do Advogado, 2010, p. 70.
27 Ibidem.
A Advocacia Geral da União28 destaca que caso não sejam observados o princípio
do devido processo legal e do direito à ampla defesa e contraditório do acusado, o
processo administrativo disciplinar é passível de anulação, total ou parcial.
29 _______. Código civil e normas correlatas. – 7. ed. – Brasília: Senado Federal, Coordenação de Edições
Técnicas, 2016. 372 p.
Art. 927
Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado
a repará-lo.
Art. 932
I – Os pais, pelos filhos menores que estiverem sob sua autoridade e em sua
companhia;
CAPÍTULO II – Da Indenização
Art. 944
30 MAZUCATTO, Isadora Gomes. Raízes Jurídicas. Universidade Positivo. Núcleo de Ciências Humanas e
Sociais Aplicadas. Curso de Direito. – v. 9, n. 2 (jul./dez. 2017). Curitiba, 2017, p. 182.
31 BRASIL. Projeto de Lei Ordinária nº 4.742, de 23 de maio de 2001. Introduz art. 146-A no Código Penal
Brasileiro, Decreto-Lei nº 2.848, de 07 de dezembro de 1940, dispondo sobre o crime de assédio moral no
trabalho.
32 SOUZA, Flávia Lays de; QUIRINO, Israel. Criminalização do assédio moral no ambiente de trabalho. Uma
leitura crítica do Projeto de Lei 4.742/2001. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 20, n.
4501, 28 out. 2015.
33 TRT - 17ª Região - RO 1315.2000.00.17.00.1 - Ac. 2276/2001 - Rel. Juíza Sônia das Dores Dionízio -
20/08/02, na Revista LTr 66-10/1237).
34 BRASIL. Lei Nº 9.455, de 7 de abril de 1997. Define os crimes de tortura e dá outras providências.
35 BRASIL. Lei Nº 8.429, de 2 de junho de 1992. Dispõe sobre as sanções aplicáveis aos agentes públicos
nos casos de enriquecimento ilícito no exercício de mandato, cargo, emprego ou função na administração
pública direta, indireta ou fundacional e dá outras providências.
36 STJ. Superior Tribunal de Justiça. REsp 1286466 RS 2011/0058560-5- Inteiro Teor, 2011.
37 Ibidem.
38 BRASIL. Lei Nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990. Dispõe sobre o regime jurídico dos servidores públicos
civis da União, das autarquias e das fundações públicas federais.
I - Advertência;
II - Suspensão;
III - demissão;
O Art. 132 determina que a demissão do servidor público federal nos seguintes
casos: (...) IV - improbidade administrativa; (...) XIII - transgressão dos incisos IX a
XVI do art. 117.
O servidor público federal, ao qual for imputada qualquer irregularidade, terá pleno
direito ao contraditório e à ampla defesa, princípios esculpidos no inciso LV do Art. 5º
da CF/88, e reforçados nos artigos 143 e 156 da Lei 8.112.
Art. 143. A autoridade que tiver ciência de irregularidade no serviço público é
obrigada a promover a sua apuração imediata, mediante sindicância ou processo
administrativo disciplinar, assegurada ao acusado ampla defesa.
Art. 156. É assegurado ao servidor o direito de acompanhar o processo
pessoalmente ou por intermédio de procurador, arrolar e reinquirir testemunhas,
produzir provas e contraprovas e formular quesitos, quando se tratar de prova
pericial.
§ 1º O presidente da comissão poderá denegar pedidos considerados
39 BRASIL. Projeto de Lei Ordinária nº 4.591, de 2001. Dispõe sobre a aplicação de penalidades à prática
de “assédio moral” por parte de servidores públicos da União, das autarquias e das fundações públicas
federais a seus subordinados, alterando a Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990.
O PL 4.591/ 2001 prevê ainda, a alteração do inciso XIII do Art. 132 para: XIII -
transgressão dos incisos IX a XVI do art. 117 e reincidência de prática de assédio moral
contra subordinado referida no art. 117-A.
Bem como a alteração do Art. 137 para: Art. 137-A demissão ou a destituição de
cargo em comissão, por infringência do art. 117, incisos IX e XI e art. 117-A, incom-
patibiliza o ex-servidor para nova investidura em cargo público federal pelo prazo de
5 (cinco) anos.
Como o PL nº 4.591/ 2001 foi arquivado em janeiro de 2007, pelo atual Regimento
Interno da Câmara dos Deputados40, não cabe mais desarquivamento. Sendo necessária
assim a proposição de um novo Projeto de Lei.
40 BRASIL. Congresso Nacional. Câmara dos Deputados. Regimento interno da Câmara dos Deputados
[recurso eletrônico]: aprovado pela Resolução nº 17, de 1989, e alterado até a Resolução nº 20, de 2016.
– 18. ed. – Brasília: Câmara dos Deputados, Edições Câmara, 2017.
41 ______. Decreto Nº 1.171, de 22 de junho de 1994. Aprova o Código de Ética Profissional do Servidor
Público Civil do Poder Executivo Federal. Seção III – XV.
42 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 15. ed. São Paulo: Malheiros, 2003,
p. 227.
43 BRASIL. Decreto-Lei N.º 5.452, de 1º de maio de 1943. Aprova a Consolidação das Leis do Trabalho.
44 BRASIL. Lei Nº 13.467, de 13 de julho de 2017. Altera a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT),
aprovada pelo Decreto-Lei no 5.452, de 1o de maio de 1943, e as Leis nos 6.019, de 3 de janeiro de 1974,
8.036, de 11 de maio de 1990, e 8.212, de 24 de julho de 1991, a fim de adequar a legislação às novas
relações de trabalho.
45 MAZUCATTO, Isadora Gomes. Raízes Jurídicas. Universidade Positivo. Núcleo de Ciências Humanas e
Sociais Aplicadas. Curso de Direito. – v. 9, n. 2 (jul./dez. 2017). Curitiba, 2017, p. 182.
47 STF. Supremo Tribunal Federal. ADI 3395 MC. Rel. Min. Cezar Peluso. Decisão proferida pelo Min. Nelson
Jobim. 27 jan. 2005, un DJ 4 fev. 2005.
Por outro lado, já quando se trata do direito à greve, previsto no Art. 37, inciso
VII da CF/88, que estabelece que o mesmo “será exercido nos termos e nos limites
definidos em lei específica”; o Supremo Tribunal Federal determinou que, enquanto não
for editada a lei específica regulamentando a greve no serviço público, deve ser aplicada
a Lei nº 7.783/89, que dispõe sobre o exercício do direito de greve na iniciativa privada
Em seu Art. 20, a Lei n. 8.213/1991 admite como formas de acidente do trabalho
a doença do trabalho, sendo esta adquirida ou desencadeada em função de condições
especiais em que o trabalho é realizado e com ele se relacione diretamente”. Para
que seja reconhecido como acidente do trabalho, a perícia médica deverá constatar
ocorrência de nexo técnico epidemiológico entre o trabalho e o agravo elencado na
Classificação Internacional de Doenças (CID); devendo o acidente do trabalho ser
comunicado à Previdência Social até o primeiro dia útil seguinte ao da ocorrência e,
em caso de morte, de imediato, à autoridade competente, sob pena de multa variável
entre o limite mínimo e o limite máximo do salário de contribuição, sucessivamente
aumentada nas reincidências, aplicada e cobrada pela Previdência Social.
Art. 214. A prova do acidente será feita no prazo de 10 (dez) dias, prorro-
gável quando as circunstâncias o exigirem.
48 Ibidem.
IV - os dados epidemiológicos;
V - a literatura atualizada;
50 CFM. CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA. Resolução CFM n. 1.488/98. Dispõe de normas específicas
para médicos que atendam o trabalhador.
51 Os arquivamentos ocorrem no âmbito do Art. 105 do Regimento Interno da Câmara dos Deputados e que
estabelece: “Finda a legislatura, arquivar-se-ão todas as proposições que no seu decurso tenham sido
submetidas à deliberação da Câmara e ainda se encontrem em tramitação, bem como as que abram crédito
suplementar, com pareceres ou sem eles, salvo as: I – com pareceres favoráveis de todas as Comissões;
II – já aprovadas em turno único, em primeiro ou segundo turno; III – que tenham tramitado pelo Senado,
ou dele originárias; IV – de iniciativa popular; V – de iniciativa de outro Poder ou do Procurador-Geral da
República. Parágrafo único. A proposição poderá ser desarquivada mediante requerimento do Autor, ou
Autores, dentro dos primeiros cento e oitenta dias da primeira sessão legislativa ordinária da legislatura
subsequente, retomando a tramitação desde o estágio em que se encontrava”.
Ouvidoria
Recursos Humano
Sindicato
Comissões de ética
Corregedoria
a) defesa da ordem jurídica, ou seja, o Ministério Público deve zelar pela obser-
vância e pelo cumprimento da lei;
Ministério Público
Ministério Público Federal: http://www.mpf.mp.br/
Ministério Público do Trabalho: http://www.pgt.mpt.mpbr/ouvidoria/
No caso do assédio moral, Raimundo Melo53 aponta que o Inquérito Civil nada
mais é do que
(...) um procedimento administrativo e inquisitorial, informal, a cargo do
Ministério Público do trabalho, destinado a investigar sobre ilegalidade do ato
denunciado, a colher elementos de convicção para ajuizamento da Ação Civil
Pública ou de qualquer outra medida judicial e, convencido o órgão condutor,
da irregularidade denunciada, a tomar do inquirido termo de ajustamento de
conduta às disposições legais.
52 BARBOSA, Fernanda Pereira. A legitimidade do Ministério Público do Trabalho para atuar na defesa de
direitos individuais homogêneos por meio da ação civil pública. Âmbito Jurídico, Rio Grande, XVII, n. 121,
fev 2014.
53 MELO, Raimundo Simão de. Ação Civil Pública na Justiça do Trabalho, 5 ª edição, São Paulo: LTR, 2014,
p. 60.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Sem dúvida, todo assédio moral causa dano moral à vítima, mas nem todo dano
moral é causado por situações de assédio moral. Da mesma maneira, ainda que as
situações de assédio moral estejam recheadas de conflitos, não há que se considerar
que a toda situação de conflito, corresponda um caso de assédio moral. Logo, não
há que se confundir eventuais ocorrências, ainda que desagradáveis e que venham a
causar dano moral, com a nefasta prática do assédio moral, que pode mesmo vir a ser
considerada como prática de tortura psicológica.
ReferênciaS
ARAÚJO, Adriane Reis de. Assédio moral organizacional. Revista TRT, Porto
Alegre, RS, v. 73, n. 2, p. 203-214, abr./jun. 2007. Disponível em <https://hdl.handle.
net/20.500.12178/2303>. Acesso em 04/07/2018.
BARBOSA, Fernanda Pereira. A legitimidade do Ministério Público do Trabalho
para atuar na defesa de direitos individuais homogêneos por meio da ação civil
pública. Âmbito Jurídico, Rio Grande, XVII, n. 121, fev 2014. Disponível em: <http://
ambito-juridico.com.br/site/index.php/%3C?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_
id=14270&revista_caderno=25>. Acesso em 03/08/18.
Resumo
Atualmente o orçamento dos entes federados encontra-se em uma
situação de verdadeiro engessamento. Boa parte dos gastos públicos são
gastos obrigatórios ou vinculados, restando aos municípios pouca margem
de investimento. Analisa-se o Estatuto das Cidades e, em especial, as
Operações Urbanas Consorciadas como um mecanismo de arrecadação
e investimento em infraestrutura urbana em um ambiente de restrições
financeiras e orçamentárias, suas limitações espaciais e prescrições legais
no âmbito do Município de Belo Horizonte.
INTRODUÇÃO
A Administração Pública Municipal deve ter como premissa a indução ao desenvol-
vimento urbano, de modo a maximizar a utilização de espaços urbanos e minimizar as
mazelas urbanas, mirando sempre na melhoria da qualidade de vida do cidadão. Desse
modo, ação do Estado sobre as cidades e seu espaço deve ocorrer, primordialmente,
mediante as transformações geopolíticas e econômicas pautadas no planejamento
urbano.
Tal constatação tem se agravado desde a crise fiscal que atingiu os Estados desde
o início da década de 80, que, após terem suas funções expandidas pelo intervencio-
nismo típico do Welfare State, não conseguiam financiar seus déficits nem ampliar sua
capacidade de arrecadação, sob ameaça de uma revolta dos contribuintes, colocando
em dúvida o consenso social que sustentava o Welfare State. Tal situação reforçou a
“ingovernabilidade”, expressão que sintetiza a ideia de que o modelo estatal até então
em vigência, ancorado nas premissas burocráticas weberianas, não respondia mais
aos anseios sociais, sendo percebido como lento e excessivamente apegado a normas,
ou seja, como ineficiente.3 Os governos passaram a ter de conviver com a escassez
de recursos e déficits crescentes e repensar seu papel, reduzindo quantitativamente
a sua intervenção.
Nesse contexto foi promulgado o Estatuto das Cidades, Lei Federal N. 10.257/2001,
que representa uma das mais importantes legislações sobre política de desenvolvimento
urbanos. Inova ao introduzir no ordenamento jurídico vários instrumentos de políticas
urbanas para combater os impactos negativos provocadas pela urbanização. Dentre
eles, destacam-se as operações urbanas consorciadas, as quais além de possibilitarem
a requalificação urbana regulada pelo Estado e, ao mesmo tempo, não oneram o Poder
Público.
3 ABRUCIO, Fernando Luiz. O impacto do modelo gerencial na Administração pública: um breve estudo
sobre a experiência internacional. Brasília: ENAP, 1997 (Cadernos ENAP, nº 10).
140
Nesta linha Karlin Olbertz4 nota que, diante da ausência de controle e planejamento
públicos, ou ainda, do déficit de regulação pública da organização espacial, o mercado
vem agindo livremente nesse espaço. Assim, a operação urbana consorciada pode
traduzir-se em alternativa regulatória e de urbanificação.
4 OLBERTZ, Karlin. Operação urbana consorciada. 2011. Dissertação (Mestrado em Direito do Estado) -
Faculdade de Direito, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2011. p.1.
OPERAÇÕES URBANAS CONSORCIADAS NO MUNICÍPIO DE BELO HORIZONTE: O CASO DA OUC “NOVA 141
BH”
1.1. Urbanismo
O urbanismo é um ramo do conhecimento que se minifesta como técnica, política
e ciência, tendo surgido como uma resposta aos problemas urbanos surgidos com a
urbanização5.
A preocupação tardia do poder público pode ser explicada pelo fato de que até
então a população brasileira era predominantemente rural. Apenas com o agravamento
do fenômeno do êxodo rural é que o urbanismo foi inserido no centro das discussões,
assumindo caráter de função pública.
Isso porquê os bens públicos ficam à disposição de uma coletividade sem que
sua produção seja financiada por todo integrante beneficiado, A produção de tais bens
não recebe incentivos econômicos à iniciativa privada e o mercado autorregulado não
5 SILVA, José Afonso da. Direito urbanístico brasileiro. 6. ed. rev. e atual. São Paulo. Malheiros, 2010. p.27.
6 OLBERTZ, Karlin. Operação urbana consorciada. 2011. Dissertação (Mestrado em Direito do Estado) -
Faculdade de Direito, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2011. p.5
7 OLBERTZ, Karlin. Operação urbana consorciada. 2011. Dissertação (Mestrado em Direito do Estado) -
Faculdade de Direito, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2011. p.6.
Karlin Ollbetz9 conceitua o direito urbanístico como o ramo do direito público que
impõe a disciplina físico social dos espaços habitáveis.
8 SILVA, José Afonso da. Direito urbanístico brasileiro. 6. ed. rev. e atual. São Paulo. Malheiros, 2010.
9 OLBERTZ, Karlin. Operação urbana consorciada. 2011. Dissertação (Mestrado em Direito do Estado) -
Faculdade de Direito, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2011.p.10.
10 SILVA, José Afonso da. Direito urbanístico brasileiro. 6. ed. rev. e atual. São Paulo. Malheiros, 2010.
p.361.
OPERAÇÕES URBANAS CONSORCIADAS NO MUNICÍPIO DE BELO HORIZONTE: O CASO DA OUC “NOVA 143
BH”
Art. 32. Lei municipal específica, baseada no plano diretor, poderá delimitar área
para aplicação de operações consorciadas.
É possível avultar deste conceito três aspectos centrais que devem envolver uma
operação urbana consorciada: a intervenção urbanística; o planejamento realizado pelo
Poder Público, e a ordenação e a parceria público-privada.
A OUC Nova BH, em verdade, sequer saiu da etapa de planejamento de uma política
pública, devido à decisões e interferências dos mais diversos atores.
IV - as finalidades da Operação;
OPERAÇÕES URBANAS CONSORCIADAS NO MUNICÍPIO DE BELO HORIZONTE: O CASO DA OUC “NOVA 145
BH”
4. PODER LEGISLATIVO MUNICIPAL
Nesse sentido, José Antônio Puppim de Oliveira11 enfatiza que temos que reco-
nhecer as limitações do planejamento como ferramenta capaz de prever e controlar o
futuro, da ideia do “visionário” do líder iluminado. Temos que aceitar o papel do plane-
jamento como construtor e articulador de relações na sociedade ou na organização
que busca seu bem comum de maneira ética, justa e responsável. Infelizmente, não
temos o poder de controlar e prever o futuro; nem nós nem ninguém.
11 OLIVEIRA, José Antônio Puppim de. Desafios do planejamento em políticas públicas: diferentes visões
e práticas. Rio de Janeiro. 2005. p.284.
Ora, uma intervenção da monta de uma Operação Urbana Consorciada não nasce
de um dia para o outro, demanda inúmeros estudos, que indicarão inúmeros fatores,
inclusive até que ponto o poder regulador do Estado deve atuar e permitir ao mercado
influenciar, a fim de que se atinja um estado de equilíbrio. Assim entende Karlin Olbertz13:
A OUC “Nova BH” nunca saiu dessa etapa de formulação dos programas e projetos,
desse modo, nunca deixou de ser apenas uma intenção do formulador de políticas
públicas deixando o campo das ideias e passando a ser implementada
12 SECCHI, Leonardo. Políticas Públicas: Conceitos, Esquemas de Análise, Casos Práticos. São Paulo:
Cengage Learning, 2011.
13 OLBERTZ, Karlin. Operação urbana consorciada. 2011. Dissertação (Mestrado em Direito do Estado) -
Faculdade de Direito, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2011. p.6.
OPERAÇÕES URBANAS CONSORCIADAS NO MUNICÍPIO DE BELO HORIZONTE: O CASO DA OUC “NOVA 147
BH”
Cumpre ressaltar que as etapas que compõem o ciclo de uma política pública não
dependem exclusivamente da burocracia técnica do ente público, envolve inúmeros
atores que possuem pontos de conflito (issues) e demais poderes estatais, com inte-
resses diversos e que muitas vezes podem demandar mais do que esperado para que
todos os atores entendam que nenhum deles saiu completamente prejudicado.
A OUC “Nova BH” não teve Projeto de Lei Específica aprovado, logo a Administração
Pública não iniciou as fases relativas à implementação, monitoramento e avaliação da
política. Ou seja, sequer chegou a ser uma Operação Urbana Consorciada implementável.
Tal afirmação, contudo, não significa que os estudos da OUC foram feitos na
carência de autorização legislativa. Tal autorização foi incluída no Plano Diretor do
Município de Belo Horizonte em 2010, portanto antes do início dos estudos.
14 O atual Plano Diretor de Belo Horizonte já era aquele vigente à época do início dos estudos da OUC, não
sofrendo quaisquer alterações no que tange a regulamentação das OUC até a presente data.
OPERAÇÕES URBANAS CONSORCIADAS NO MUNICÍPIO DE BELO HORIZONTE: O CASO DA OUC “NOVA 149
BH”
acordo com o disposto nos arts. 32 a 34 da Lei Federal nº 10.257, de 10 de julho
de 2001, - Estatuto da Cidade (...)
O Plano Diretor, Lei Municipal 7.165/1996, alterado pela Lei Municipal 9.959/2010,
ainda vigente, delimitou algumas áreas a fim de estabelecer regras transitórias, limi-
tando a valorização da terra nos principais setores de crescimento da cidade para onde
está prevista a aplicação do instrumento:
Art. 69-A - Sem prejuízo de outras que venham a ser instituídas por lei específica,
ficam delimitadas as seguintes áreas para operações urbanas consorciadas, nas
quais, até a aprovação da lei de que trata o § 1º do art. 69 desta Lei, prevalecerão
os parâmetros e as condições estabelecidos nesta Lei:
I - as Áreas em Reestruturação no Vetor Norte de Belo Horizonte;
II - o entorno de Corredores Viários Prioritários;
III - o entorno de Corredores de Transporte Coletivo Prioritários;
IV - as Áreas Centrais, indicadas como preferenciais para Operação Urbana nos
termos do Plano de Reabilitação do Hipercentro;
V - as áreas localizadas em um raio de 600 m (seiscentos metros) das estações
de transporte coletivo existentes ou das que vierem a ser implantadas.
§ 1º - A delimitação das áreas de que trata o caput deste artigo é a estabelecida
nos anexos IV e IV-A desta Lei.
Lívia Monteiro16 nota que as demarcações das áreas passíveis de serem abran-
gidas em operações urbanas consorciadas, contidas nos anexos IV e IV-A do plano
Desse modo, cada uma dessas áreas foi regulamentada de forma diferenciada,
sofrendo limitações urbanísticas das mais variadas ordens e com a única finalidade
de evitar que a especulação imobiliária inviabilizasse a implementação de OUCs em
momentos futuros. Tais detalhamentos encontram-se expressos nos artigos 69 – B a
69- O do Plano Diretor.
Muitas das áreas delimitadas nos incisos dos art. 69-A possuem finalidades
semelhantes no contexto urbanístico de Belo Horizonte, como é o caso das Operações
Urbanas Consorciadas dos Corredores Viários Prioritários, artigo 69-K do plano diretor,
e Corredores de Transporte Coletivo Prioritários, artigo 69-L.
Tal situação foi observada por Lívia Monteiro17: As operações urbanas consor-
ciadas Corredores Viários Prioritários, artigo 69-K do plano diretor, e Corredores de
Transporte Coletivo Prioritários, artigo 69-L, têm finalidades semelhantes (...) visam,
fundamentalmente, organizar áreas lindeiras a esses eixos de alta capacidade, com
maior aproveitamento dos espaços considerados subutilizados. Tais áreas possuem,
atualmente, trechos extensos que funcionam apenas como local de passagem e se
configuram como barreiras físicas ao sistema urbano. As intervenções das opera-
ções urbanas a se efetivarem nesses setores devem buscar transformar as “barreiras
urbanas” em eixos de crescimento. Buscam transformar o entorno dos grandes corre-
dores de circulação em locais com equipamentos estratégicos para o desenvolvimento
urbano. Apresentam o potencial de promover expansões qualificadas do centro principal
da cidade, dissipando a qualidade de centro regional, economicamente atraente, a
OPERAÇÕES URBANAS CONSORCIADAS NO MUNICÍPIO DE BELO HORIZONTE: O CASO DA OUC “NOVA 151
BH”
investimentos do setor imobiliário e de atividades econômicas, que possam ampliar
a abrangência de atendimento e a qualificação da metrópole em oferecer comércio e
serviços.
O Plano Diretor não proíbe que o Poder Público realize estudos técnicos de áreas
não demarcadas no Anexo IV e IV-A do Plano Diretor, bem como não fixou a forma como
se daria a realização dos estudos técnicos.
O Plano Diretor apenas implementa diretrizes para que o poder público elabore
os estudos prévios imprescindíveis à implementação de uma OUC em qualquer área
do Município e estabelece requisitos mínimos para o Projeto de Lei Específica de
OUC, que será elaborado pelo Executivo. Ou seja, a etapa de realização de estudos e
elaboração do Projeto de Lei refere-se apenas ao planejamento no ciclo de uma política
pública de OUC.
A lei específica a que se refere o art. 69-A não é uma lei para alteração do plano
diretor. Trata-se da Lei Específica da OUC, que deve ser encaminhada ao Legislativo,
contendo o Plano Urbanístico da OUC, que após a etapa de planejamento e estudos
preliminares, elaborará Projeto de Lei contendo os requisitos elencados no Plano Diretor.
Ou seja, os estudos realizados pelo Município de Belo Horizonte no Projeto da OUC
“Nova BH” não precisavam da lei especifica da OUC, até porquê o poder público precisa
estudar a área, suas potencialidades e limitações antes de detalhar a OUC para apenas
após a apresentação do Projeto de Lei Específica, iniciar a implementação da OUC.
OPERAÇÕES URBANAS CONSORCIADAS NO MUNICÍPIO DE BELO HORIZONTE: O CASO DA OUC “NOVA 153
BH”
e valorização ambiental, podendo ocorrer em qualquer área do município (...)
§ 1º - Cada Operação Urbana Consorciada será instituída por lei específica, de
acordo com o disposto nos arts. 32 a 34 da Lei Federal nº 10.257, de 10 de julho
de 2001, - Estatuto da Cidade. (...)
§ 4º - A lei específica que aprovar ou regulamentar a Operação Urbana
Consorciada deverá conter, no mínimo:
I - a definição da área a ser atingida;
II - o programa básico de ocupação da área;
III - o programa de atendimento econômico e social para a população diretamente
afetada pela Operação;
IV - as finalidades da Operação;
V - o estudo prévio de impacto de vizinhança;
VI - a contrapartida a ser exigida dos proprietários, usuários permanentes e
investidores privados, nos termos do disposto no inciso VI do art. 33 da Lei nº
10.257/01;
VII - a forma de controle da Operação, obrigatoriamente compartilhado com
representação da sociedade civil.
§ 5º - Os recursos obtidos pelo Poder Público Municipal na forma do inciso
VI do § 4º deste artigo serão aplicados, exclusivamente, na própria Operação
Urbana Consorciada.
§ 6º - A partir da aprovação da lei específica de que trata o § 1º do art. 69 desta
Lei, são nulas as licenças e as autorizações a cargo do Poder Público Municipal
expedidas em desacordo com o plano de Operação Urbana Consorciada,
conforme previsto na Lei nº 10.257/01.
§ 7º - O Executivo poderá utilizar, na área objeto da Operação Urbana Consorciada,
mediante previsão na respectiva lei específica, os instrumentos previstos nos
arts. 32 a 34 da Lei nº 10.257/01, bem como a Outorga Onerosa do Direito
de Construir, de acordo com as características de cada Operação Urbana
Consorciada.
Tal plano urbanístico18, por ser lei específica, após aprovado, irá se sobrepor à Lei
de Parcelamento, Uso e Ocupação do Solo (especificamente para a área delimitada
18 Plano Urbanístico não se confunde com Plano Diretor. O Plano Urbanístico é um projeto para a
implementação de alterações de parâmetros urbanísticos, intervenções e planos de ação relativos a
uma Operação Urbana. Isto é, trata-se de um plano específico e detalhado. Já o Plano Diretor é uma
Inicialmente, o Projeto da OUC “Nova BH” se dividia em duas OUC, que, por sua
vez, eram uma composição de áreas já elencadas no Plano Diretor, a saber:
- OUC Av. Andradas / Tereza Cristina / Via Expressa (ou Leste/Oeste): composta
da Área de corredores viários prioritários (Lei Municipal 7.165/1996, art. 69-A, inciso
II), das Áreas Centrais (Lei Municipal 7.165/1996, art. 69-A, inciso IV) e da Área dos
Entornos das Estações de Transporte Coletivo Existentes (Lei Municipal 7.165/1996,
art. 69-A, inciso V).
A junção das OUC Av. Antônio Carlos / Av. Pedro I e OUC Av. Andradas / Tereza
Cristina / Via Expressa se deu por uma opção técnica, baseada no Diagnóstico do
Mercado Imobiliário constante do Estudos de Viabilidade Econômico-Financeira - EVEF,
realizado por consultoria especializada, fato que será detalhado adiante.
Em verdade o plano da operação deve ter sido resultado de um trabalho anterior
à edição da respectiva lei, que apenas terá a função de introduzi-lo no mundo
jurídico. Assim, o plano estará pronto (ainda que não acabado) antes mesmo
de iniciado o processo legislativo. Inclusive, de tal etapa preliminar, que resulta
na produção do plano e na apresentação de um projeto de lei (de iniciativa
privativa do Poder Executivo), e durante todo o processo de tomada de decisão
é necessária a participação da sociedade civil, de forma a legitimar a atuação
urbanística democrática do poder público“.
lei que institui o instrumento básico da política de desenvolvimento e de expansão urbana dentro da
municipalidade de forma genérica.
OPERAÇÕES URBANAS CONSORCIADAS NO MUNICÍPIO DE BELO HORIZONTE: O CASO DA OUC “NOVA 155
BH”
2.3.2. Dos Estudos de Viabilidade Econômico-Financeira – EVEF
e Estudo de Impacto de Vizinhança – EIV
Conforme art. 33 da Lei Federal 10.257/2001 (Estatuto das Cidades), a imple-
mentação de uma OUC deve ser precedida de Estudo de Impacto de Vizinhança - EIV,
porém não se limitando a este documento.
Art. 33. Da lei específica que aprovar a operação urbana consorciada constará
o plano de operação urbana consorciada, contendo, no mínimo:
(...)
V – estudo prévio de impacto de vizinhança;
Para que haja o adequado equilíbrio entre oferta e demanda de CEPAC, de modo a
garantir o sucesso de uma OUC, é imprescindível a elaboração de Estudo de Viabilidade
Econômico-Financeira – EVEF, que, dentre outros, indicará a quantidade total de CEPAC
que serão comercializados, bem como seu valor unitário.
Ainda, vale dizer que o EVEF fornece grandes subsídios para o EIV, uma vez que
o potencial construtivo é diretamente relacionado com o incremento de densidade
populacional, que consiste em um dos principais eventos geradores impacto. Isto é,
quanto maior o potencial construtivo disponibilizado por meio dos CEPAC, maior será
a oferta de imóveis e, consequentemente, maior será o número de novos habitantes e
transeuntes na área da OUC.
OPERAÇÕES URBANAS CONSORCIADAS NO MUNICÍPIO DE BELO HORIZONTE: O CASO DA OUC “NOVA 157
BH”
Produto 1a: Diagnóstico do Mercado Imobiliário;
Tais produtos devem ser elaborados de forma sucessiva por serem um pré-requi-
sito do outro. Ou seja, só é possível elaborar o Produto 1b após a conclusão do Produto
1a e o Produto 1c, após a conclusão do Produto 1b.
Subtotal 2 18 426.526.385,16
Área da OUC 1 1 4.985.651 ,00
3 Bairros Lindeiros 0 -
Entorno Imediato 9 1 54.1 89.1 65,24
Subtotal 3 10 169.174.816,24
Área da OUC 13 286.21 3.009,75
4 Bairros Lindeiros 14 302.325.796,39
Entorno Imediato 8 1 89.452.278,56
Subtotal 4 35 777.991.084,70
Área da OUC 27 426.861 .778,77
5 Bairros Lindeiros 8 1 83.079.402,44
Entorno Imediato 9 1 47.330.1 09,52
Subtotal 5 44 757.271.290,73
Área da OUC 3 37.701 .760,72
6 Bairros Lindeiros 3 1 61 .422.1 20,88
Entorno Imediato 7 222.01 7.807,1 7
Subtotal 6 13 421.141.688,77
TOTAL AC/PI 124 2.589.987.449,26
Área da OUC 11 1 22.236.850,75
Bairros Lindeiros 17 282.686.928,99
ANDRADAS / T. CRISTINA / VIA EXP.
7
Entorno Imediato 10 21 2.851 .682,33
Subtotal 7 38 617.775.462,07
Área da OUC 4 200.882.499,70
8 Bairros Lindeiros 16 1 82.01 7.1 56,33
Entorno Imediato 13 309.782.1 1 9,98
Subtotal 8 33 692.681.776,01
Área da OUC 18 901 .51 3.1 1 4,09
9 Bairros Lindeiros 61 1 .901 .222.986,97
Entorno Imediato 48 2.293.730.066,82
Subtotal 9 127 5.096.466.167,88
Área da OUC 8 84.921 .1 47,25
10 Bairros Lindeiros 38 880.478.71 4,50
Entorno Imediato 34 827.1 22.376,87
Subtotal 10 80 1.792.522.238,62
TOTAL Andradas/TC/VE 278 8.199.445.644,58
Tabela 1: Dados extraídos do Anexo I do Produto 1a do EVEF da OUC Nova BH
OPERAÇÕES URBANAS CONSORCIADAS NO MUNICÍPIO DE BELO HORIZONTE: O CASO DA OUC “NOVA 159
BH”
Como se observa, entre os anos de 2006 e 2013, o mercado de imóveis novos
(lançamentos) no eixo Andradas / Tereza Cristina / Via Expressa (Leste/Oeste) movi-
mentou valores mais do que três vezes superiores àqueles do eixo Antônio Carlos /
Pedro I e, ainda, com mais do que o dobro de empreendimentos lançados.
2 59.956,75 29.378.807,50
5 582.770,1 6 285.557.378,40
8 1 .1 23.474,47
550.502.490,30
9 3.324.990,67 490,00
1 .629.245.428,30
10 1 .1 07.388,73
542.620.477,70
SUBTOTAL 2 6.270.393,88 R$ 3.072.493.001,20
TOTAL 8.089.120,21 R$ 3.963.668.902,90
OPERAÇÕES URBANAS CONSORCIADAS NO MUNICÍPIO DE BELO HORIZONTE: O CASO DA OUC “NOVA 161
BH”
medidas coordenadas pelo Poder Público municipal, com a participação dos
proprietários, moradores, usuários permanentes e investidores privados, com
o objetivo de alcançar em uma área transformações urbanísticas estruturais,
melhorias sociais e a valorização ambiental.
Diante do exposto, evidencia-se claramente que não existe OUC sem o mercado
imobiliário. Neste sentido, qualquer projeto de OUC deve, invariavelmente, considerar
este ator fundamental para a consecução daquela política pública. Este também é o
entendimento de Elias Roberto Leão da Silva 19:
É forçoso concluir que o investimento do mercado imobiliário será determinante
no sucesso ou fracasso de uma operação consorciada. Isto porque, se o Estado
optar por uma operação urbana autofinanciável, ou seja, aquela em que os
recursos obtidos para a implementação de melhorias urbanísticas sejam
oriundos das vendas dos CEPACs, sendo, portanto, advindo de investidores
privados, moradores e proprietários, o lugar que for escolhido terá de ser, na
pior das hipóteses, atrativo para o segmento imobiliário. Se esse lugar não atrair
este mercado, uma operação urbana consorciada estará fadada ao fracasso.
19 SILVA, Elias Roberto Leão da. Operações urbanas consorciadas: uma análise técnica e crítica.
Universidade de Brasília, Brasília, 2015. P.48.
20 SILVA, Elias Roberto Leão da. Operações urbanas consorciadas: uma análise técnica e crítica.
Universidade de Brasília, Brasília, 2015. p.50.
OPERAÇÕES URBANAS CONSORCIADAS NO MUNICÍPIO DE BELO HORIZONTE: O CASO DA OUC “NOVA 163
BH”
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Conforme demonstrado, dentre os inúmeros benefícios que as operações urbanas
consorciadas proporcionam, o maior deles é a sua sustentabilidade financeira, ou
seja, não é necessário o despendimento de recursos públicos para a realização das
intervenções urbanísticas, vez que a arrecadação via CEPAC é vinculada à OUC. Desse
modo, no atual quadro de crise fiscal dos entes federados, a OUC pode surgir como
uma alternativa para o endividamento municipal e a revitalização urbanística.
Para a implementação de uma OUC é necessária Lei Especifica que defina, dentre
outros, a área objeto da operação. Contudo, em momento anterior à implantação cabe
ao poder público a elaboração de estudos, que podem indicar pela viabilidade ou não
da implementação e uma OUC e subsidiam a elaboração do Projeto de Lei Específica
pelo Executivo.
ReferênciaS
ABRUCIO, Fernando Luiz. O impacto do modelo gerencial na Administração pública:
um breve estudo sobre a experiência internacional. Brasília: ENAP, 1997 (Cadernos
ENAP, nº 10).
BELO HORIZONTE. Prefeitura Municipal. Concorrência n° 2011/010: prestação de
serviços de consultoria para elaboração de estudos de viabilidade da “Operação
Urbana Consorciada da Avenida Antônio Carlos / Pedro I” no Município de Belo
Horizonte. Belo Horizonte: Diário Oficial do Município, 2011a. Disponível em:
<portalpbh.pbh.gov.br/pbh/ecp/files.do?...concorrencia_2011_010.pdf>. Acesso
em: 15 de dezembro de 2017.
BELO HORIZONTE. Prefeitura Municipal. Diagnóstico do Mercado Imobiliário
constante no EVEF da “Operação Urbana Consorciada da Avenida Antônio Carlos
/ Pedro I e Leste /Oeste” no Município de Belo Horizonte. Belo Horizonte. 2014.
Disponível em: Disponível em:<< https://ecp.pbh.gov.br/pbh/ecp/comunidade.
do?evento=portlet&pIdPlc=ecpTaxonomiaMenuPortal&app=ouc&ta-
x=44685&lang=pt_BR&pg=10666>> acesso em 01 de maio de 2018
OPERAÇÕES URBANAS CONSORCIADAS NO MUNICÍPIO DE BELO HORIZONTE: O CASO DA OUC “NOVA 165
BH”
SILVA, José Afonso da. Direito urbanístico brasileiro. 6. ed. rev. e atual. São Paulo.
Malheiros, 2010.
SILVA, Elias Roberto Leão da. Operações urbanas consorciadas: uma análise técnica
e crítica. Universidade de Brasília, Brasília, 2015.
Resumo
Este estudo tem por objetivo verificar se a decisão do Supremo Tribunal
Federal, no Recurso Extraordinário 841526, resultou em novo marco, no
Direito brasileiro, sobre a abrangência da responsabilidade civil do Estado
em demandas envolvendo custodiados, especialmente em caso de suicídio,
ou se somente repetiu os cânones firmados anteriormente na doutrina e
jurisprudência do tribunal. Se entendido que lançou um novo marco, busca-
remos assentar se este se aproxima da imputação ao Poder Público de
obrigação como segurador universal. Para tanto, traçaremos, inicialmente,
um breve panorama sobre o tema, perpassando os conceitos e divergências
doutrinárias acerca do risco administrativo, do risco integral, da conduta
omissiva e da subjetividade e objetividade da responsabilidade. A seguir,
analisaremos o julgado em destaque, sob a ótica de Celso Antônio Bandeira
de Mello. Por fim, após apresentarmos nossas conclusões, indicaremos
algumas implicações da tese firmada e das discussões levantadas pelos
Ministros durante a sessão de julgamento, em uma abordagem crítica de
questões conexas ao tema objeto deste.
1 Procuradora do Estado de Goiás, Especialista em Direito Tributário pela Universidade Federal de Goiás.
MORAIS, Marina Regazzoni de. O recurso extraordinário (RE) 841526 e a responsabilidade civil do estado por suicídio de custodiado: o
ente público foi erigido à condição de segurador universal? In: PEREIRA, Rodolfo Viana; SACCHETTO,Thiago Coelho (Orgs.). Advocacia
pública em foco. Volume II. Belo Horizonte: IDDE, 2019. p. 169-192. Disponível em: https://doi.org/10.32445/97885671341096
INTRODUÇÃO
No julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 841526, com repercussão geral reco-
nhecida, o Supremo Tribunal Federal (STF) buscou pacificar o tema da responsabilidade
extracontratual do Poder Público em razão de atos omissivos, mais especificamente,
em decorrência de morte de custodiado dentro de estabelecimento prisional.
Porém, em suma, temos que, apesar desta cisão pretendida pela doutrina civilista
entre responsabilidade civil contratual e extracontratual, ambas são justificadas pela
violação a um dever jurídico preexistente.
Com efeito, o próprio Código Civil prevê, expressamente, dentre outros, no pará-
grafo único do seu artigo 927, a responsabilização civil independentemente de culpa
do agente, em razão do risco da atividade por ele desenvolvida.
A regra do art. 927, parágrafo único, segunda parte, do CC aplica-se sempre que
a atividade normalmente desenvolvida, mesmo sem defeito e não essencialmente
perigosa, induza, por sua natureza, risco especial e diferenciado aos direitos de outrem.
2 TARTUCE, Flávio. Manual de direito civil: volume único. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método,
2012, p. 415.
3 V. g. GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo Curso de Direito Civil. São Paulo:
Malheiros, 2005, p. 41.
4 FURTADO, Lucas Rocha. Curso de direito administrativo. 4. ed. Belo Horizonte: Fórum, 2013, p. 820.
O RECURSO EXTRAORDINÁRIO (RE) 841526 E A RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO POR SUICÍDIO 171
DE CUSTODIADO: O ENTE PÚBLICO FOI ERIGIDO À CONDIÇÃO DE SEGURADOR UNIVERSAL?
São critérios de avaliação desse risco, entre outros, a estatística, a prova técnica e as
máximas de experiência5.
Um bom exemplo, que interessa aos limites deste trabalho, é o exercício, pelo
Estado, do ius puniendi – ou direito de punir. Trata-se de competência a ele unicamente
destinada de sancionar outrem em prol do interesse público na manutenção da paz
social.
6 BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de Direito Administrativo. 32. ed. São Paulo: Malheiros,
2015, p. 1021.
8 BEZERRA DE MELO, Marco Aurélio. Considerações sobre a Responsabilidade Civil do Estado. Gen
Jurídico, 2015. Disponível em: <http://genjuridico.com.br/2015/12/23/consideracoes-sobre-a-sobre-a-
responsabilidade-civil-do-estado/>. Acesso em: 01 ago. 2018.
O RECURSO EXTRAORDINÁRIO (RE) 841526 E A RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO POR SUICÍDIO 173
DE CUSTODIADO: O ENTE PÚBLICO FOI ERIGIDO À CONDIÇÃO DE SEGURADOR UNIVERSAL?
constitucional prevê que “a responsabilidade civil por danos nucleares independe da
existência de culpa” (art. 21, XXIII, “d”). A doutrina entende, nesse caso, que, mesmo
se comprovada a culpa exclusiva do particular pelo dano por ele experimentado, tal
não elidiria a responsabilidade do ente público.
Vemos que essa teorização somente encontrou campo fértil a partir da estrutu-
ração dos Estados de Direito, quando se assentou a sujeição de todos ao império da
lei, sem, em tese, redutos de privilégios odiosos.
Como bem afirmado pelo Relator do Recurso Extraordinário (RE) 841526 – sobre
o qual trataremos adiante –, em seu voto, “a concepção de que o Estado, apesar de
detentor de poderes dotados de imperatividade sobre a esfera de direitos do indivíduo,
resta submetido ao império da lei, configura o núcleo essencial do Estado Democrático
de Direito”.
Assim, sob essa ótica, a responsabilidade civil do Estado seria mero corolário da
submissão do Poder Público ao Direito11.
Diz o autor:
De outro giro, segundo Maria Sylvia Zanella Di Pietro, a teoria do risco administra-
tivo teria substituído a teoria da culpa anônima, preconizando que, independentemente
da culpa do agente público ou mesmo do serviço, deve o Estado responder pelos
danos que causar ao particular, o qual não arcará sozinho com esse ônus, que será
democraticamente, solidariamente e igualitariamente repartido por toda a sociedade13.
Não nos parece razoável, desse modo, imputar às mencionadas pessoas jurídicas
de Direito Público ou de Direito Privado prestadoras de serviços públicos responsabili-
dade objetiva pela ação de seus agentes, negando-lhes essa responsabilidade quando
o agente deixar de atuar, quando se omitir. A existência de dificuldades – ou mesmo
a impossibilidade – de se identificar o agente omisso é absolutamente irrelevante
para caracterizar a omissão estatal. Exatamente em razão das dificuldades para a
identificação do agente se desenvolveu a teoria da falta anônima. Assim, o Estado
13 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 25. ed. São Paulo: Atlas, 2012, p. 701.
O RECURSO EXTRAORDINÁRIO (RE) 841526 E A RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO POR SUICÍDIO 175
DE CUSTODIADO: O ENTE PÚBLICO FOI ERIGIDO À CONDIÇÃO DE SEGURADOR UNIVERSAL?
pode ser responsabilizado pela omissão, ainda que não seja possível identificar o
agente que deixou de praticar o ato ou de desenvolver a atividade que lhe competia14.
Veja-se que os primeiro e último autores até então citados neste tópico, adeptos,
a priori, de correntes doutrinárias opostas, admitem que a responsabilização do ente
público por sua omissão depende da existência, em concreto, da falha do serviço
público.
O autor entenderia, portando, que o dever do Estado de agir e o dano dele decor-
rente explicar-se-iam no campo do nexo de causalidade, sendo despicienda a invocação
da culpa para tanto.
16 Ibidem, p. 821.
O RECURSO EXTRAORDINÁRIO (RE) 841526 E A RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO POR SUICÍDIO 177
DE CUSTODIADO: O ENTE PÚBLICO FOI ERIGIDO À CONDIÇÃO DE SEGURADOR UNIVERSAL?
da teoria do risco integral, repudiada pela Constituição Federal, como já mencionado
acima.
Casos em que não é uma atuação do Estado que produz o dano, mas, por omissão
sua, evento alheio ao Estado causa um dano que o Poder Público tinha o dever de evitar.
É a hipótese da ‘falta de serviço’, nas modalidades em que o ‘serviço não funcionou’
ou ‘funcionou tardiamente’ ou, ainda, funcionou de modo incapaz de obstar à lesão18.
18 Ibidem, p. 1038.
Com efeito: inexistindo obrigação legal de impedir um certo evento danoso (obri-
gação, de resto, só cogitável quando haja possibilidade de impedi-lo mediante atuação
diligente), seria um verdadeiro absurdo imputar ao Estado responsabilidade por um
dano que não causou, pois isto equivaleria a extraí-la do nada; significaria pretender
instaurá-la prescindindo de qualquer fundamento racional ou jurídico19.
Assinale-se, por oportuno, que, tratando-se de responsabilidade civil, urge que, nas
condutas omissivas, além do elemento culposo, se revele a presença de nexo direto de
causalidade entre o fato e o dano sofrido pela vítima. Significa dizer que não pode o
intérprete buscar a relação de causalidade quando há uma ou várias intercausas entre
a omissão e o resultado danoso20.
A preocupação dos autores justifica-se, porque, como visto alhures, o Estado, por
sua missão intrínseca, intervém em quase todos os contextos da vida do administrado,
o qual se vale cotidianamente de serviços, bens públicos, atos normativos emanados
de autoridades públicas etc. De sorte que, se não adotado um freio ao ímpeto de
responsabilizar o ente público, este se obrigaria por praticamente todo infortúnio
vivenciado pelo particular fora de experiências exclusivamente privadas:
19 Ibidem, p. 1041.
20 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 21. ed. Rio de Janeiro, Lumen
Juris, 2009, p. 540.
O RECURSO EXTRAORDINÁRIO (RE) 841526 E A RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO POR SUICÍDIO 179
DE CUSTODIADO: O ENTE PÚBLICO FOI ERIGIDO À CONDIÇÃO DE SEGURADOR UNIVERSAL?
funcionou’. A admitir-se responsabilidade objetiva nessas hipóteses, o Estado estaria
erigido em segurador universal21.
Não há resposta a priori quanto ao que seria o padrão normal tipificador da obri-
gação a que estaria legalmente adstrito. Cabe indicar, no entanto, que a normalidade da
eficiência há de ser apurada em função do meio social, do estádio de desenvolvimento
tecnológico, cultural, econômico e da conjuntura da época, isto é, das possibilidades
reais médias dentro do ambiente em que se produziu o fato danoso22.
Uma baliza eficiente, segundo o autor, é o teor das leis e normas internas que
instituem e regulam o respectivo serviço público, as quais indicam um padrão mínimo
de funcionamento adequado.
Cuida o autor de explicitar que a “culpa presumida” não seria um fator de trans-
mudação da responsabilidade para objetiva, “pois, se o Poder Público provar que não
houve omissão culposa ou dolosa, descaberá responsabilizá-lo; diversamente do que
ocorre na responsabilidade objetiva, em que nada importa se teve, ou não, culpa:
responderá do mesmo modo”24.
24 Ibidem, p. 1043.
[…] não é uma atuação do Estado que produz o dano, contudo é por atividade dele
que se cria a situação propiciatória do dano, porque expôs alguém a risco. […] Nestas
hipóteses, pode-se dizer que não há causação direta e imediata do dano por parte do
Estado, mas seu comportamento ativo entra, de modo mediato, porém decisivo, na
linha de causação26.
25 Ibidem, p. 1046.
O RECURSO EXTRAORDINÁRIO (RE) 841526 E A RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO POR SUICÍDIO 181
DE CUSTODIADO: O ENTE PÚBLICO FOI ERIGIDO À CONDIÇÃO DE SEGURADOR UNIVERSAL?
A partir da diferenciação empreendida por Bandeira de Mello e explicitada acima,
parece-nos que não, porquanto não há relação necessária entre o ímpeto e/ou a conse-
cução do suicídio e, de outro lado, a convivência com infratores da lei penal.
Com efeito, a não ser que a situação concreta sugira o contrário, não se pode
afirmar per si que o risco criado pelo Estado com a guarda de criminosos tenha gerado
no detento o desejo e a ação de ceifar a própria vida.
O RECURSO EXTRAORDINÁRIO (RE) 841526 E A RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO POR SUICÍDIO 183
DE CUSTODIADO: O ENTE PÚBLICO FOI ERIGIDO À CONDIÇÃO DE SEGURADOR UNIVERSAL?
No final do julgamento, firmou-se a seguinte tese de repercussão geral: “Em caso
de inobservância de seu dever específico de proteção previsto no artigo 5º, inciso XLIX,
da Constituição Federal, o Estado é responsável pela morte de detento”.
Pois bem. Segundo o referido artigo 5º, inciso XLIX, da Constituição Federal, “é
assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral”.
É dizer: se o ente estatal não tivesse meios de agir para impedir o dano – a ele
atribuído o ônus dessa prova –, não seria responsabilizado.
O fato é que, caso o Estado não garanta a integridade física e moral do preso,
eventual dano daí advindo será, em regra, indenizável, tendo em conta a dificuldade
de se produzir prova em contrário.
27 “[…] também conhecido como princípio da interpretação efetiva ou da eficiência – [o princípio da máxima
efetividade] é invocado no âmbito dos direitos fundamentais, impondo lhes seja atribuído o sentido que
confira a maior efetividade possível, visando à realização concreta de sua função social” (NOVELINO,
Marcelo. Direito Constitucional. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2012, p. 190).
28 Art. 144, CF. A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para
a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes
órgãos: […].
29 Art. 196, CF. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais
e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e
igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.
O RECURSO EXTRAORDINÁRIO (RE) 841526 E A RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO POR SUICÍDIO 185
DE CUSTODIADO: O ENTE PÚBLICO FOI ERIGIDO À CONDIÇÃO DE SEGURADOR UNIVERSAL?
dever de manter a incolumidade física dos presos, o que afasta a responsabilização civil
do ente público. Adota-se aqui, portanto, a teoria do risco administrativo, que permite a
oposição de causas excludentes do nexo causal - as quais devem ser comprovadas pela
Administração -, rejeitando-se, por consequência, a incidência da teoria do risco integral,
não recepcionada pela ordem constitucional brasileira, que implicaria a imposição de
responsabilidade civil ao Estado por toda e qualquer morte de detento.
Pois bem. Como visto no tópico anterior, o Relator do RE 841526 sob análise,
Ministro Luiz Fux, defendeu e consignou na ementa do acórdão que:
[...] nos casos em que não é possível ao Estado agir para evitar a morte do detento
(que ocorreria mesmo que o preso estivesse em liberdade), rompe-se o nexo de causa-
lidade, afastando-se a responsabilidade do Poder Público, sob pena de adotar-se contra
legem e a opinio doctorum a teoria do risco integral, ao arrepio do texto constitucional.
O SENHOR MINISTRO LUÍS ROBERTO BARROSO - E não acho que seja justo.
Quer dizer, vamos imaginar que o preso esteja engendrando um artefato para matar o
adversário, aí explode na mão dele. O Estado é responsável?
O SENHOR MINISTRO LUÍS ROBERTO BARROSO - É, mas aí nós vamos ter que
responsabilizar o poder público por todos os homicídios, porque não fiscaliza o contra-
bando de armas.
O SENHOR MINISTRO LUIZ FUX (RELATOR) - Não, a tese tem que se submeter,
necessariamente, a essa ampla colegialidade.
O RECURSO EXTRAORDINÁRIO (RE) 841526 E A RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO POR SUICÍDIO 187
DE CUSTODIADO: O ENTE PÚBLICO FOI ERIGIDO À CONDIÇÃO DE SEGURADOR UNIVERSAL?
O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO – E pelo nexo de causalidade que sempre
existirá.
Do quanto exposto até este ponto, não nos parece, contudo, ter sido essa a solução
encampada pela nossa Corte Suprema.
Com efeito, malgrado a tese firmada - “Em caso de inobservância de seu dever
específico de proteção previsto no artigo 5º, inciso XLIX, da Constituição Federal, o
Estado é responsável pela morte de detento” - não tenha deixado expressa a possibi-
lidade de elisão da responsabilidade por comprovação de excludentes de nexo causal
– ou de culpa –, seu texto também não exclui essa leitura.
Nada obstante não tenha sido viável estabelecermos se, no julgado em estudo,
o STF tenha verdadeiramente adotado a teoria subjetiva ou a objetiva por risco admi-
nistrativo, diante da confusão doutrinária e jurisprudencial na diferenciação de ambas,
como observado nos tópicos anteriores, não se pode ignorar que foi reconhecida a
possibilidade de prova da Administração acerca de sua irresponsabilidade.
E isso afasta, ao menos por hora, a conclusão de que o STF tenha, no julgado em
destaque, reputado ao Estado condição de segurador universal.
Ponderou o autor, a nosso ver, se, mesmo ante uma justificativa louvável – proteção
da vítima –, podem os tribunais construir uma jurisprudência defensiva, aparentemente
destituída de respaldo legal e, ainda, em detrimento do erário.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Respondido o questionamento central deste trabalho no tópico anterior, enten-
demos que saber se o STF tendeu para valorar o Estado como segurador universal em
demandas envolvendo danos a detentos não é a única chave de interpretação do RE
841526.
Não pretendemos neste espaço aprofundá-las, mesmo porque, não foi o objeto do
nosso estudo; mas, pela sua conexão com o tema deste, dedicaremos este tópico final
a apresentá-las, na medida em que elas nos auxiliarão no vislumbre da complexidade
dos fatores que circundam a responsabilidade civil do Estado.
O RECURSO EXTRAORDINÁRIO (RE) 841526 E A RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO POR SUICÍDIO 189
DE CUSTODIADO: O ENTE PÚBLICO FOI ERIGIDO À CONDIÇÃO DE SEGURADOR UNIVERSAL?
Pois bem. Como afirmamos ao longo deste artigo, conquanto o STF não tenha
optado pela responsabilidade integral no julgado em debate, sedimentou um agrava-
mento da análise dos pressupostos da responsabilização do ente público em razão do
seu dever constitucional de garantir a integridade física e psicológica dos detentos.
É dizer: o aprisionamento seria causa suficiente e/ou adequada para erigir uma
presunção relativa de “culpa” do poder público por todo e qualquer dano ocorrido em
dependências prisionais?
E mais, na linha de raciocínio seguida por alguns dos Ministros durante a sessão
de julgamento, é forçoso concluir que o reconhecimento do “estado de coisas incons-
titucional” nos presídios redundaria em espécie de salvaguarda à irresponsabilidade
absoluta dos detentos pelos atos por eles cometidos?
Em suma, a decisão do STF não teria resultado em novo marco, no Direito brasi-
leiro, sobre a abrangência da responsabilidade civil do Estado, como verificado no
tópico anterior. Nada obstante, nos trouxe à baila um sem número de questões que nos
possibilitam analisar o amadurecimento, no país, dos temas sobre responsabilidade
civil estatal e sobre o papel deste mesmo Estado, encarnado em cada um dos três
Poderes, na vida das pessoas.
ReferênciaS
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Paulo: Malheiros, 2015.
BEZERRA DE MELO, Marco Aurélio. Considerações sobre a Responsabilidade Civil do
Estado. Gen Jurídico, 2015. Disponível em: <http://genjuridico.com.br/2015/12/23/
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ago. 2018.
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NOVELINO, Marcelo. Direito Constitucional. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense; São
Paulo: Método, 2012
TARTUCE, Flávio. Manual de direito civil: volume único. 2. ed. Rio de Janeiro:
Forense; São Paulo: Método, 2012.
RESUMO
O presente trabalho tem como objetivo analisar a existência de mera
expectativa ou direito subjetivo à nomeação para os aprovados em concurso
público. Neste sentido, destaca-se que importância dos concursos públicos,
principalmente diante do novo prisma constitucional, bem como sua utili-
zação como meio de defesa da moralidade e impessoalidade dos atos da
administração e a constante tensão entre direitos subjetivos do cidadão e
interesse da administração. São analisados também julgados proferidos
pelo Supremo Tribunal Federal sobre a questão e questiona com base nos
pressupostos da Teoria do Direito e Hermenêutica Jurídica a conclusão
alcançada pela mais alta corte judicial brasileira.
1 Pós-graduando em Advocacia Pública pelo Instituto para o Desenvolvimento Democrático – IDDE, Belo
Horizonte - MG. Bacharel em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais – PUC Minas,
Campus Serro, Advogado, Sócio do Escritório Breguêz & Ferreira Advogados Associados.
FERREIRA, Matheus Silva Campos. O direito à nomeação para os aprovados em concurso público segundo a perspectiva do
Supremo Tribunal Federal e da teoria do direito como integridade de Ronald Dworkin. In: PEREIRA, Rodolfo Viana; SACCHETTO,-
Thiago Coelho (Orgs.). Advocacia pública em foco. Volume II. Belo Horizonte: IDDE, 2019. p. 193-220. Disponível em: https://doi.
org/10.32445/97885671341097
INTRODUÇÃO
O advento da Constituição Federal de 1.988 e a efetivação do concurso público
como regra para o acesso do cidadão a cargos efetivos e empregos públicos fez com
a jurisprudência e a doutrina rediscutissem, agora amparados no prisma da liberdade
e garantia de direitos fundamentais, diversos institutos relacionados a matéria.
Neste sentido, sempre amparado neste eterno paradoxo entre direitos individuais
e os interesse da Administração Pública, muito já se discutiu sobre que tipo de relação
passaria existir quando determinado cidadão é aprovado em um concurso público.
Existiria dever da administração pública promover a imediata nomeação deste cidadão
aprovado no certame ou em favor deste existiria mera expectativa de direito a ser
respeitada pelo poder público?
Destaca-se, no entanto, que a regra fixada pelos dois julgados, segundo inter-
pretação dada pelo próprio STF, contemplam exceções que permitem a mitigação do
direito nomeação ao aprovados dentro do número de vagas, bem como a convalidação
da expectativa em direito à nomeação para aqueles que aprovados inicialmente não
Desta forma, buscar-se-á realizar uma análise da questão com base nos pres-
supostos da teoria geral do direito e hermenêutica jurídica, em especial da teoria do
direito como integridade de Ronald Dworkin, e à possibilidade de se chegar a uma
única resposta correta sobre a controvérsia diante de uma proposta construtiva diante
do fato concreto.
2 Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros
e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à
segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...) XXXV - a lei não excluirá da apreciação do Poder
Judiciário lesão ou ameaça a direito;
3 Supremo Tribunal Federal – Recurso Extraordinário de nº 837.311/PI – Relator Ministro Luiz Fux
4 Artigo 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do
Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade,
publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (…) II - a investidura em cargo ou emprego público
depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a
natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações
para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração (…) IV - durante o prazo
improrrogável previsto no edital de convocação, aquele aprovado em concurso público de provas ou
de provas e títulos será convocado com prioridade sobre novos concursados para assumir cargo ou
emprego, na carreira;
Nota-se que a nova ordem constitucional acabou por criar uma expectativa positiva
em favor do cidadão comum, que historicamente não pertencia as elites políticas e/ou
econômicas, de também poder servir ao Estado. Tal expectativa fomentou o aumento
do interesse da população em geral neste tipo de certame e, consequentemente, gerou
maior atenção da doutrina e jurisprudência sobre o seu funcionamento.
5 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. São Paulo: Atlas. 27ª Edição,
2014, páginas 21/22
6 Sobre o sistema de mérito ver: CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo.
São Paulo: Atlas. 27ª Edição, 2014, página 634
Nota-se que a partir de tal precedente reconhece-se que o Poder Público poderia
escolher, dentro do prazo de validade do concurso, o momento em que realizaria a
nomeação daqueles declarados como aprovados no certame, mas não mais poderia
escolher se iria ou não realizar tal ato.
Desta forma toda vez que a administração pública promove concurso público
para o preenchimento de vagas do seu quadro de servidores, ele acaba criando uma
expectativa em favor da população, em especial aos cidadãos que resolvem participar
do certamente, e se vincula diretamente aos termos da concorrência lançada, fato
pelo qual o desrespeito a tais preceitos poderiam criar um sentimento de descredito
frente as instituições que compõe o próprio Estado e colocando em risco o modelo
democrático alcançado.
Isso equivale dizer que, para o Supremo Tribunal Federal, diante de determinadas
circunstâncias, o cidadão aprovado dentro do número de vagas estabelecidas no edital
convocatório do certame poderá não ter confirmado o seu direito subjetivo à nomeação,
bem como poderá certo cidadão ter convalidado sua expectativa em direito à acessar
determinado cargo público, mesmo se inicialmente este não estava classificado dentro
Frisa-se que para que haja a caracterização de tal exceção devem estar presentes
circunstâncias concretas capazes de desequilibrar a constante tensão entre o direito do
cidadão aprovado em concurso, e que por óbvio quer ter acesso ao cargo em disputa,
e a vontade/autonomia da administração, que falando em nome da coletividade, teria
que decidir se promove ou não tal ato.
Desta forma poderão estar em rota de colisão princípios e regras que deveriam
sempre estar harmonizadas para possibilitar o equilíbrio do sistema jurídico e a segu-
rança jurídica dos envolvidos.
Pode-se ainda observar que nos dois julgados em análise os Ministros do STF
tentaram identificar quais situações concretas poderia justificar a aplicação da exceção
Desta forma, conclui Gilmar Mendes, que para motivar a aplicação da exceção em
questão, e no caso concreto, consubstanciar a não nomeação de aprovados dentro do
número de vagas previamente estabelecidas no edital do certame, é necessários que:
a) fique configurado a existência de situações supervenientes ao concurso em questão
que justifiquem a não nomeação do aprovado; b) que tal situação seja imprevisível
pela Administração Pública quando do planejamento e realização do certame; c) que
tal situação imprevisível e superveniente seja também extremamente grave; e d) que
a não realização do ato de nomeação seja extremamente necessária a manutenção
do equilíbrio do Poder Público.
7 DWORKIN, Ronald. Levando os direitos a sério. Trad. Nelson Boeira. São Paulo: Martins Fontes, 2002.
8 Ibidem, p. 36.
9 Ibidem, p. 39.
Cabe salientar que todas as vezes que duas regras em sentido de aplicação
opostos apresentam-se como solução para a resolução de um caso concreto, pela ótica
do tudo ou nada, uma delas deve ser excluída do ordenamento jurídico e não poderá
ser aplicada em casos que seja necessário a sua aplicação.
10 PEDRON, Flávio Barbosa Quinaud. Esclarecimento sobre a tese da única “resposta correta” de Ronald
Dworkin. Revista CEJ, Ano XIII, n. 45, 2009, p. 103.
11 DWORKIN, Ronald. Levando os direitos a sério. Trad. Nelson Boeira. São Paulo: Martins Fontes, 2002, p.
41 Ibidem, p. 42.
Mais uma vez fica claro que a diferença entre as regras e princípios jurídicos se
destaca e fica clara no tocante da aplicação do direito ao fato concreto, onde um atua
pela ótica do tudo ou nada e o outro pela adequação. No entanto, nunca é demais
frisar, que princípios e normas são espécies de normas jurídicas e que não existe entre
elas qualquer questão que possibilite uma maior aplicabilidade ou, até mesmo, uma
hierarquia diferenciada entre elas.
12 OMMATI, José Emílio Medauar. A teoria jurídica de Ronald Dworkin: o direito como integridade. In:
CATTONI DE OLIVEIRA, Marcelo Andrade (coord.). Jurisdição e Hermenêutica Constitucional no Estado
Democrático de Direito. Belo Horizonte: Mandamentos, 2004, p. 155
Sobre esta crítica a teoria de Dworkin, Pedron esclarece que o autor norte-americano:
[...] lembra que seria muito difícil que alguém conseguisse estabelecer a priori
quais são as normas morais que irão reger sua vida. Trata-se, na realidade, de
uma questão argumentativa e, em função disso, dependente mais da aplicação
de uma linha de conduta do que de regras fixas. Ele ainda não nega que possa
haver conflito entre regras; contudo esse conflito se processa em um plano
distinto – no plano da validade, em vez de no plano da adequabilidade.14
13 Neste sentido, conferir: OMMATI, José Emílio Medauar. A teoria jurídica de Ronald Dworkin: O Direito
como integridade. IN: CATTONI, Marcelo (Coordenação). Jurisdição e hermenêutica constitucional. Belo
Horizonte, Mandamentos, 2004, p. 151 a 168
14 PEDRON, Flávio Barbosa Quinaud. Esclarecimento sobre a tese da única “resposta correta” de Ronald
Dworkin. Revista CEJ, Ano XIII, n. 45, 2009, p. 103.
15 No Brasil, destacasse a importância do trabalho de Virgílio Afonso da Silva como interprete e difusor mais
fiel da obra do escritor alemão. Outros autores, como, por exemplo, Gilmar Mendes, por outro lado, realiza
um sincretismo metodológico em suas falas, subvertendo conforme a conveniência o pensamento de
Alexy.
16 ALEXY, Robert. Teoria da Argumentação Jurídica: a teoria do discurso racional como teoria da
argumentação jurídica. Trad. Zilda Silva. São Paulo: Landy, 2001
17 DWORKIN, Ronald. O Império do Direito. Trad. Jefferson Luiz Camargo. São Paulo: Martins Fontes, 1999
18 Destacasse que são casos difíceis, considera o autor, aqueles que não possuem regra expressa que
o regule ou os que os tribunais ainda não se manifestaram sobre a questão. Neste sentido, conferir:
DWORKIN, Ronald. Levando os Direitos a Sério, 1ª Edição, Martins Fontes, São Paulo.
19 Ibidem, p. 165.
Cabe salientar, que este juiz filósofo não pode desconsiderar o fato de que os
outros juízes que vierem antes deles desconsiderem este processo de construção
histórica e cometam alguns equívocos durante a interpretação do direito. Desta forma,
o autor norte-americano desenvolve a teoria dos erros judiciais.
Esta teoria dos erros é dividida em duas etapas. A primeira delas mostra as
consequências de reconhecer um ato institucional como um erro, e a outra limita a
possibilidade de exclusão dos erros. Sobre o funcionamento das etapas da referida
teoria, Pedron esclarece:
Essa primeira parte tem por base duas distinções: (1) de um lado, tem-se a
autoridade de qualquer evento institucional – capacidade de produzir as
conseqüências que se propõe – e, do outro, a força gravitacional do evento. A
classificação de um evento como um erro dá-se apenas questionando sua força
gravitacional e inutilizando-a – sem, com isso, comprometer sua autoridade
específica; e (2) a outra distinção é entre erros enraizados – os quais não
perdem sua autoridade específica, não obstante não detenham mais sua força
gravitacional – e erros passíveis de correção – cuja autoridade específica é
acessória à força gravitacional. Assim, sua classificação garantirá autoridade
às leis, mas não a sua força gravitacional.21
E continua esclarecendo:
A segunda parte da teoria de erros compõe-se de uma justificação mais
detalhada, na forma de um esquema de princípios, para o conjunto das leis
e das decisões, já que sua teoria dos precedentes é construída a partir da
equanimidade. Duas máximas podem ser extraídas dessa segunda parte: (1)
caso Hércules possa demonstrar que um princípio que, no passado, serviu de
justificação para decisões do Legislativo e do Judiciário hoje não dará origem a
20 Ibidem, p. 165.
21 PEDRON, Flávio Barbosa Quinaud. Esclarecimento sobre a tese da única “resposta correta” de Ronald
Dworkin. Revista CEJ, Ano XIII, n. 45, 2009, p. 104.
Neste sentido, fica claro que a atuação do juiz está direcionada a encontrar a
resposta mais adequada para o problema apresentado, uma vez realizado este trabalho
que envolve paciência e pesquisa histórica jurisprudencial, somente uma resposta
será possível de ser construída. Desta forma, fica claro a não postura solipsista do
pensamento dworkiano, que pelo contrário exige, além da participação das partes para a
construção do provimento jurisdicional, também exigirá a construção do processo histó-
rico interpretativo das contribuições jurídicas para o caso. Desta forma, demonstrando
como deverá ser a postura do juiz ao analisar os casos difíceis, esclarece Ommati:
Dessa forma, encarar o Direito como uma questão de princípios leva a que
façamos uma interpretação de toda a história institucional do Direito para que
ele possa ser interpretado à sua melhor luz. Assim, o juiz deve “escolher” o
princípio adequado para regular as diversas situações concretas, descobrindo
os direitos dos cidadãos. O juiz, portanto, não possui discricionariedade, já que
limitado pela argumentação das partes e pelo caso concreto reconstruído pelas
mesmas. Além disso, os juízes devem convencer de que a decisão tomada é a
única correta, no sentido de única adequada para regular a situação que lhe foi
colocada. Se existem regras, essas apenas surgem no momento da decisão, seja
do administrador, seja do juiz, mas sempre como densificação dos princípios
jurídicos existentes. E tais princípios se corporificam nos princípios da igualdade
e liberdade entendidos como tratar a todos com igual respeito e consideração.23
Assim não resta dúvida, de que o pensamento de Dworkin não tem caráter solip-
sista ou discricionário, mas pelo contrário, está totalmente vinculado à percepção dos
princípios que norteiam o direito e a construção histórica até então realizada. Neste
sentido, Pedron esclarece, que “a compreensão de que a atividade decisória dos juízes
não se produz no vácuo, mas sim em constante diálogo com a história”24
22 Ibidem, p. 104.
23 OMMATI, José Emílio Medauar. Existe diferença entre regras e princípios no Direito. Revista Unicena, Sd.
2008, p. 12.
24 PEDRON, Flávio Barbosa Quinaud. A proposta de Ronald Dworkin construtiva do Direito. Revista CEJ, Ano
XIII, n. 47, 2009. 156
25 DWORKIN, Ronald. Levando os direitos a sério. Trad. Nelson Boeira. São Paulo: Martins Fontes, 2002, p.
283.
26 PEDRON, Flávio Barbosa Quinaud. A proposta de Ronald Dworkin construtiva do Direito. Revista CEJ, Ano
XIII, n. 47, 2009. p 158.
27 DWORKIN, Ronald. O Império do Direito. Trad. Jefferson Luiz Camargo. São Paulo: Martins Fontes, 1999
28 LAGES, Cíntia Garabini. A proposta de Ronald Dworkin em o império do Direito. Revista da Faculdade
Mineira de Direito. Belo Horizonte, v. 4, n.7/8, jan./jun., 2001
29 OMMATI, José Emílio Medauar. Existe diferença entre regras e princípios no Direito. Revista Unicena, Sd
Cabe salientar, que segundo Dworkin, a sociedade dever ser entendida como
uma comunidade de princípios, ou seja, uma sociedade de pessoas que reconhecem a
incidência de princípios comuns na condução de suas atividades cotidianas e que são
comumente discutidos para a configuração do melhor conteúdo e sentido a conduzir
as referidas atividades.
31 PEDRON, Flávio Barbosa Quinaud. A proposta de Ronald Dworkin construtiva do Direito. Revista CEJ, Ano
XIII, n. 47, 2009, p. 105.
Esclarece Pedron:
Logo, os direitos e deveres políticos dessa comunidade não estão ligados apenas
às decisões particulares tomadas no passado, mas sim são dependentes de
um sistema de princípios que essas decisões pressupõem ou endossam. A
integridade é, então, compreendida como um ideal aceito de maneira geral e,
por isso mesmo, mostra-se como um compromisso de pessoas.32
32 Ibidem, p. 103.
Assim não existirá resposta pronta para qualquer situação jurídica, mas sim será
concebido a oportunidade para que todos sejam co-construtores de uma resposta
jurídica-social satisfatória e não limitada a requisitos pré-estabelecidos.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente trabalho pretendeu avaliar a questão dos direitos dos aprovados em
concurso público diante do entendimento dominante dos tribunais brasileiros, bem
como propor uma nova forma de construção de uma resposta satisfatória entre a
constante tensão entre interesse individual ou primazia da vontade da administração.
Para tanto, foi utilizado com objeto de análise dois julgados proferidos pelo
Supremo Tribunal Federal tratando sobre a matéria (Recursos Extraordinários de nº
598.099/MS e 837.311/PI), onde conclui-se que somente existiria direito subjetivo à
nomeação para aqueles aprovados dentro do número de vagas previamente estabe-
lecidos no edital convocatório do certame. Aqueles classificados fora do número de
vagas anteriormente fixadas deteriam mera expectativa de direito, mesmo de durante
a vigência do referido concurso surgissem novas vagas para o cargo em disputa.
Assentou ainda o STF que a regra em questão não seria absoluta, podendo ser
desconsiderada diante da excepcionalidade dos fatos postos à análise jurisdicional.
Neste sentido, buscou a mais alta corte judicial brasileiro estabelecer requisitos para
se identificar quais seriam as excepcionalidades capazes de justificar a não aplicação
do entendimento fixado em sede de repercussão geral.
REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICAS
ALEXY, Robert. Teoria da Argumentação Jurídica: a teoria do discurso racional
como teoria da argumentação jurídica. Trad. Zilda Silva. São Paulo: Landy, 2001.
DWORKIN, Ronald. Levando os direitos a sério. Trad. Nelson Boeira. São Paulo:
Martins Fontes, 2002.
DWORKIN, Ronald. Uma questão de princípios. 2 ed. Trad. Luís Carlos Borges.
São Paulo: Martins Fontes, 2001.
DWORKIN, Ronald. O Império do Direito. Trad. Jefferson Luiz Camargo. São Paulo:
Martins Fontes, 1999.
RESUMO
O artigo aborda as ações regressivas previdenciárias ajuizadas pelo
Instituto Nacional da Seguridade Social – INSS com o escopo de obter a
restituição dos custos referentes à implementação precoce de benefícios
previdenciários originados de crimes de trânsito e violência doméstica. A
propositura das referidas demandas encontra esteio nos artigos 120 e 121
da Lei 8.213/91, lidos e interpretados sob a óptica da cláusula geral de
responsabilidade civil - artigos 186 e 927 do Código Civil Brasileiro, que por
sua vez é analisada sob a perspectiva da Constitucionalização do Direito Civil.
Conclui-se que tais ações são constitucionais e, servem a propósitos que
ultrapassam o mero dever de indenizar, revelando-se importante mecanismo
de controle social - contido na função social da responsabilidade civil.
1 Especialista em Advocacia Pública pelo Instituto para o Desenvolvimento Democrático – IDDE, Minas
Gerais - BH e o Ius Gentium Conimbrigae (Centro de Direitos Humanos da Faculdade de Direito da
Universidade de Coimbra – IGC, Coimbra-PT). Bacharel em Direito pela Faculdade de Direito de Ipatinga
– FADIPA. Advogada.
MARQUES, Natália Neves. Cabimento das ações de regresso pelo INSS nos casos de crimes de trânsito e violência doméstica
sob a égide da responsabilidade civil e da constitucionalização do direito civil. In: PEREIRA, Rodolfo Viana; SACCHETTO,Thiago
Coelho (Orgs.). Advocacia pública em foco. Volume II. Belo Horizonte: IDDE, 2019. p. 221-244. Disponível em: https://doi.
org/10.32445/97885671341098
INTRODUÇÃO
O presente artigo tem por objeto de estudo a legitimidade da autarquia previden-
ciária para pleitear o ressarcimento de benefícios previdenciários de origem diversa
daquela expressa nos artigos 120 e 121, ambos da Lei nº 8.213/91, a saber, acidente de
trabalho. A análise em questão ocorrerá com respaldo nos ditames da Responsabilidade
Civil e em uma nítida releitura do Direito Civil com fulcro na Constituição Federal,
também denominado Direito Civil Constitucional.
Enfim, conclui-se que, com supedâneo na lei, doutrina e jurisprudência dos tribunais
pátrios, especialmente dos Tribunais Superiores que as ações regressivas em estudo
são dotadas de validade consoante a aplicação da função social da Responsabilidade
Civil na Constitucionalização do Direito Civil, haja vista que, para além das funções
tradicionais daquela, representam importante instrumento de controle social.
Essa intersecção entre o Direito Civil e o Direito Constitucional faz com que muitos
considerem o Direito Civil Constitucional como uma nova disciplina ou mesmo um
caminho metodológico2.
A partir dessa nova forma de interpretar o Direito Civil, operou-se uma alteração no
cerne dos institutos e conceitos essenciais deste, revigorando-os com a necessidade
de redefinição dos seus limites segundo critérios valorativos estabelecidos pela Carta
Maior.
2 TARTUCE, Flávio. Manual de Direito Civil: volume único. 6. ed. rev., atual. e ampl. Rio de Janeiro:
Forense; São Paulo: Método, 2016, p. 57.
3 Idem.
4 Apud TARTUCE, Flávio. Manual de Direito Civil: volume único. 6. ed. rev., atual. e ampl. Rio de Janeiro:
Forense; São Paulo: Método, 2016, p. 57.
5 FARIAS, Cristiano Chaves de. ROSENVALD, Nelson. Curso de Direito Civil: Parte Geral e LINDB.
Volume 1. 16. ed. rev., atual. e ampl. Salvador: Juspodivm. 2018. p.69.
6 PERLINGIERI, Pietro apud FARIAS, Cristiano Chaves de. ROSENVALD, Nelson. Curso de Direito
Civil: Parte Geral e LINDB. Volume 1. 16. ed. rev., atual. e ampl. Salvador: Juspodivm. 2018. p.69.
CABIMENTO DAS AÇÕES DE REGRESSO PELO INSS NOS CASOS DE CRIMES DE TRÂNSITO E VIOLÊNCIA 223
DOMÉSTICA SOB A ÉGIDE DA RESPONSABILIDADE CIVIL E DA CONSTITUCIONALIZAÇÃO DO DIREITO CIVIL
Ressalta-se que, assim como o Direito Civil sofreu interferências do Direito
Constitucional, este também passou a ser compreendido sob um novo paradigma.
Isso porque a Constituição de 1988 deixou a isenção e a indiferença dos textos cons-
titucionais anteriores que tratavam tão somente de organização político-administrativa
do Estado para dedicar-se também ao tratamento da pessoa humana sob o viés da
cidadania e, especialmente, da dignidade.
1.2. Conceito
Consoante já exposto, o Direito Civil Constitucional está baseado numa visão
unitária do ordenamento jurídico.
Farias e Rosenvald7 ensinam que o Direito Civil Constitucional pode ser compreen-
dido como o “novo sistema de normas e princípios, reguladores da vida privada, relativos
à proteção da pessoa, nas suas mais diferentes dimensões fundamentais (desde os
valores existenciais até os interesses patrimoniais) integrados pela Constituição”.
Pode o Direito Civil Constitucional ser entendido também como uma leitura das
normas de Direito Civil à luz dos princípios e valores consagrados na Constituição, com
o escopo de concretizar o programa constitucional na esfera privada8.
7 FARIAS, Cristiano Chaves de. ROSENVALD, Nelson. Curso de Direito Civil: Parte Geral e LINDB. Volume 1.
16. ed. rev., atual. e ampl. Salvador: Juspodivm. 2018. p.70.
9 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil – v. I / Atual. Maria Celina Bodin de
Moraes. 30. ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Forense, 2017. p. 38.
Tal mudança paradigmática alterou de forma profunda o Direito Civil e suas bases,
dentre elas a Responsabilidade Civil, integrante do ramo jurídico em comento. Abandona
o cenário jurídico o direito privado com caráter puramente patrimonialista, focado
precipuamente na garantia e proteção da propriedade para emergir um direito privado
dotado de função social.
11 MORAES, Maria Celina Bodin de. A constitucionalização do Direito Civil e seus efeitos sobre a
Responsabilidade Civil. Direito, Estado e Sociedade - v.9 - n.29 - p 233 a 258 - jul/dez 2006.
CABIMENTO DAS AÇÕES DE REGRESSO PELO INSS NOS CASOS DE CRIMES DE TRÂNSITO E VIOLÊNCIA 225
DOMÉSTICA SOB A ÉGIDE DA RESPONSABILIDADE CIVIL E DA CONSTITUCIONALIZAÇÃO DO DIREITO CIVIL
A Responsabilidade Civil vincula-se aos dogmas constitucionais, com obediência
aos princípios do fomento da dignidade da pessoa humana, assim bem como da
promoção do bem-estar social, tendo como sustentáculos os princípios da dignidade
da pessoa humana, solidariedade social e justiça distributiva.
Nesse sentido são as lições de Maria Celina Bodin de Moraes ao defender que a
responsabilidade civil em sua noção clássica consistia “na tutela do direito de proprie-
dade e dos demais direitos subjetivos patrimoniais”. Contemporaneamente, prossegue
a jurista, “a dignidade da pessoa humana, a solidariedade social a e justiça distributiva
influenciam profundamente toda a sistemática do dever de ressarcir”12.
12 Idem.
13 GAGLIANO, Pablo Stolze. FILHO, Rodolfo Pamplona. Novo Curso de Direito Civil:
Responsabilidade Civil. Volume 3. 14. ed. São Paulo: Saraiva. 2016. p.49.
Maria Helena Diniz15 preceitua que a Responsabilidade Civil pode ser definida como
a “aplicação de medidas que obriguem alguém a reparar dano moral ou patrimonial
causado a terceiros em razão do ato do próprio imputado, de pessoa por quem ele
responde, ou de fato de coisa ou animal sob sua guarda ou, ainda, de simples imposição
legal”.
Nas precisas lições de Carlos Alberto Bittar16, sempre que ocorrer um dano na
esfera de outrem, sobrevém o dever de reparação, sendo certo que esta é uma conse-
quência inata da vida em sociedade essencial para a existência desta, assim bem como
para o desenvolvimento costumeiro das capacidades de cada ente personalizado.
Com efeito, os atos ilícitos ou antijurídicos contra os bens e valores protegidos pelo
ordenamento jurídico pátrio influem no curso normal das relações sociais e demandam
ações por parte do sistema normativo vigente como forma de restabelecer o equilíbrio
rompido.
14 Ibidem, p.55.
15 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: Responsabilidade Civil. Volume 7. 25.ed. São
Paulo: Saraiva, 2011. p.50.
16 BITTAR, Carlos Alberto, 1993 apud GAGLIANO, Pablo Stolze. FILHO, Rodolfo Pamplona. Novo
Curso de Direito Civil: Responsabilidade Civil. Volume 3. 14. ed. São Paulo: Saraiva. 2016. p.66.
CABIMENTO DAS AÇÕES DE REGRESSO PELO INSS NOS CASOS DE CRIMES DE TRÂNSITO E VIOLÊNCIA 227
DOMÉSTICA SOB A ÉGIDE DA RESPONSABILIDADE CIVIL E DA CONSTITUCIONALIZAÇÃO DO DIREITO CIVIL
lesado, ou mitigar –lhe os efeitos do dano, ao mesmo tempo em que se faça
sentir ao lesante o peso da resposta compatível prevista na ordem jurídica17.
De outro turno, Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho19 apontam três
funções da responsabilidade civil, a saber: a) compensatória do dano à vítima; b)
punitiva do ofensor; c) desmotivação social da conduta lesiva.
17 BITTAR, Carlos Alberto, 1993 apud GAGLIANO, Pablo Stolze. FILHO, Rodolfo Pamplona. Novo
Curso de Direito Civil: Responsabilidade Civil. Volume 3. 14. ed. São Paulo: Saraiva. 2016. p.66.
18 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: Responsabilidade Civil. Volume 7. 25.ed.
São Paulo: Saraiva, 2011. p. 25.
19 GAGLIANO, Pablo Stolze. FILHO, Rodolfo Pamplona. Novo Curso de Direito Civil:
Responsabilidade Civil. Volume 3. 14. ed. São Paulo: Saraiva. 2016. p.67.
20 PINTO, Helena Elias. Função Social e Responsabilidade Civil. 2012. Disponível em <https://www.
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29 jun.2018.
CABIMENTO DAS AÇÕES DE REGRESSO PELO INSS NOS CASOS DE CRIMES DE TRÂNSITO E VIOLÊNCIA 229
DOMÉSTICA SOB A ÉGIDE DA RESPONSABILIDADE CIVIL E DA CONSTITUCIONALIZAÇÃO DO DIREITO CIVIL
Assim, dentro da Responsabilidade Civil, além das funções reparatória e punitiva,
surge com grande força a denominada função social. Acerca da função social, Paulo
Lôbo21 afirma que esta é
incompatível com a noção de direito absoluto, oponível a todos, em que se
admite apenas a limitação externa, negativa. A função social importa limitação
interna, positiva, condicionando o exercício e o próprio direito. Lícito é o interesse
individual quando realiza, igualmente, o interesse social.
Neste contexto, temos que a persuasão produzida pela punição do ofensor não
se limita a produzir efeitos somente na esfera deste. Ela torna público que as condutas
assemelhadas não serão toleradas no corpo social. Por via reflexa, atinge a própria
sociedade, recompondo a estabilidade e a segurança colimadas pelo Direito. Temos
então, que esta função possui caráter socioeducativo.
21 LÔBO, Paulo Luiz Netto. Constitucionalização do Direito Civil. Revista de Informação Legislativa.
Brasília. v. 36, n. 141, p. 99-109, jan./mar. 1999. Disponível em <http://www2.senado.leg.br/bdsf/
handle/id/453>. Acesso em: 26 jul.2018.
22 PINTO, Helena Elias. Função Social e Responsabilidade Civil. 2012. Disponível em <https://www.
google.com/url?sa=t&rct=j&q=&esrc=s&source=web&cd=1&ved=2ahUKEwjFp4Xj6MzcAhUHkpAKHQI_
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29 jun. 2018.
A três, revela-se na busca da estabilidade das relações jurídicas afetadas pelo ato
lesivo. Neste momento a função social é concebida sob o prisma da solidariedade social
com o escopo de estabelecer um equilíbrio entre a lesão perpetrada e uma indenização
que seja, concomitantemente, individual e socialmente justa.
CABIMENTO DAS AÇÕES DE REGRESSO PELO INSS NOS CASOS DE CRIMES DE TRÂNSITO E VIOLÊNCIA 231
DOMÉSTICA SOB A ÉGIDE DA RESPONSABILIDADE CIVIL E DA CONSTITUCIONALIZAÇÃO DO DIREITO CIVIL
O Ministério Público Federal, em seu glossário jurídico24 dispõe que a ação
regressiva
é fundada no direito de uma pessoa (direito de regresso) de haver de outrem
importância por si despendida ou paga no cumprimento de obrigação, cuja
responsabilidade direta e principal a ele pertencia. A ação tem por objetivo
reaver a soma despendida nessa reparação da pessoa cujo dano foi por ela,
individualmente, causado.
25 Apud OLIVEIRA, Júlio César. Ação Regressiva Proposta Pelo Instituto Nacional do Seguro Social Face Às
Empresas: Instrumento De Prevenção De Acidentes De Trabalho. Revista de Direito. Vol. 13. Nº 18. Ano
2010. p. 57-72.
Ao propor ação ressarcitória, deve o INSS provar que o agente lesante – motorista
no caso de crime de trânsito e autor do ato ilícito no caso de violência doméstica – agiu
com culpa ou dolo e que a autarquia federal arcou com o ônus financeiro, requerendo
a restituição dessas quantias ao real causador do dano.
CABIMENTO DAS AÇÕES DE REGRESSO PELO INSS NOS CASOS DE CRIMES DE TRÂNSITO E VIOLÊNCIA 233
DOMÉSTICA SOB A ÉGIDE DA RESPONSABILIDADE CIVIL E DA CONSTITUCIONALIZAÇÃO DO DIREITO CIVIL
3.3.1. Ação Regressiva de Trânsito
No que concerne a este tipo de ação regressiva, possui por pressuposto fático
a ocorrência de acidente de trânsito e que este seja resultado de uma conduta ilícita
por parte do agente causador do acidente em descumprimento às normas dispostas
no Código de Trânsito Brasileiro. Restará então caracterizada a culpa por parte do
agente lesante.
Ademais disso, mister que a vítima do acidente seja segurada do INSS e que seja
gerado o pagamento de algum benefício ou despendidos valores com reabilitação
profissional em virtude do sinistro nos termos do art. 3º da Portaria em tela, in verbis:
Art. 3º Consideram-se despesas previdenciárias ressarcíveis as relativas ao
pagamento, pelo INSS, de pensão por morte e de benefícios por incapacidade,
bem como aquelas decorrentes do custeio do programa de reabilitação
profissional.
O diploma legal supracitado, em seu artigo 5º, define violência doméstica e familiar
contra a mulher como “qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause
morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial”
no âmbito da unidade doméstica, da família ou de qualquer relação íntima de afeto.
Para a propositura da ação regressiva pela Lei Maria da Penha faz-se necessário
comprovar tão somente o nexo de causalidade entre a conduta e o resultado - lesão
ou morte – que originou o benefício previdenciário.
Ressalte-se que, consoante orientações emitidas pela AGU28, tal demanda somente
deve ser proposta quando inexista convivência da vítima com o agressor com o escopo
de não ensejar uma maior vitimização da mulher. Neste contexto, somente será ajuizada
ação regressiva nos casos em que a vítima já se encontre separada do agressor ou nos
casos de morte em que o agressor não detenha a guarda de filhos porventura existentes.
28 BRASIL. Cartilha de Atuação nas Ações Regressivas Previdenciárias. Disponível em: <http://www.agu.
gov.br/page/content/detail/id_conteudo/268218>. Acesso em: 05 ago. 2018.
CABIMENTO DAS AÇÕES DE REGRESSO PELO INSS NOS CASOS DE CRIMES DE TRÂNSITO E VIOLÊNCIA 235
DOMÉSTICA SOB A ÉGIDE DA RESPONSABILIDADE CIVIL E DA CONSTITUCIONALIZAÇÃO DO DIREITO CIVIL
contido nos mencionados dispositivos deve ser lido à luz dos artigos 186 e 927 do
Código Civil que configuram cláusula geral de Responsabilidade Civil, ipsis litteris:
Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência,
violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete
ato ilícito.
Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica
obrigado a repará-lo.
Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de
culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente
desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos
de outrem.
Tomando por base a leitura dos dispositivos contidos nos diplomas normativos
acima transcritos, conclui-se que o INSS pode promover ações regressivas com base
nos artigos 120 e 121 da Lei 8.213/91 nos casos em que reste comprovada a ocorrência
de ato ilícito e a consequente necessidade de reparar o prejuízo sofrido, aplicando-se
os artigos 186 e 927 do Código Civil.
Neste contexto, conforme ensina o Ministro Humberto Martins29, embora seja espe-
cífica a previsão contida na Lei nº 8.213/91 no que diz respeito às ações regressivas
acidentárias, o que possibilita o direito de ressarcimento da autarquia previdenciária
é a prática de uma conduta ilegal.
Analisando o artigo 121 da Lei de Benefícios infere-se que este vai de encontro
ao entendimento acima esboçado, porquanto prevê que o pagamento das prestações
por acidente de trabalho pela Previdência Social não elide a responsabilidade civil da
empresa ou de outrem.
29 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. REsp 1.431.150/RS, 2ª Turma, Rel. Min. Humberto Martins, DJ
02.02.2017. Disponível em: <https://stj.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/433556100/recurso-especial-
resp-1431150-rs-2013-0388171-8/inteiro-teor-433556111?ref=juris-tabs >. Acesso em: 29 jun. 2018.
Não obstante a importância do efeito imediato, verifica-se que tais ações possuem
um objetivo mediato tão ou mais importante que o ressarcimento. Trata-se da prevenção
de futuros acidentes de trânsito e ilícitos em geral. As ações em estudo possuem
importante caráter punitivo-pedagógico.
30 CASTRO, Carlos Alberto Pereira. LAZZARI, João Batista. Manual de Direito Previdenciário. 20. ed.
rev., atual. e ampl. Rio de Janeiro: Forense. 2017. p. 426.
31 LÓCIO, Rodrigo Medeiros. As novas ações regressivas do INSS: uma análise sob a ótica do direito civil-
constitucional e da função social da responsabilidade civil. Revista da AGU, Brasília-DF, v.16, n.03, p.287-
302, jul./set. 2017.
CABIMENTO DAS AÇÕES DE REGRESSO PELO INSS NOS CASOS DE CRIMES DE TRÂNSITO E VIOLÊNCIA 237
DOMÉSTICA SOB A ÉGIDE DA RESPONSABILIDADE CIVIL E DA CONSTITUCIONALIZAÇÃO DO DIREITO CIVIL
Ademais, nota-se também a função social da Responsabilidade Civil sobre o
patrimônio violado que, nos casos postos sob análise revelam-se na compensação
pecuniária à fazenda pública em virtude dos ilícitos cometidos no trânsito e no âmbito
doméstico contra a mulher.
Ressalta-se que a coletividade não deveria suportar tais ilícitos, uma vez que
dentro do risco social não são computadas condutas ilícitas, tais como a do condutor
do veículo que dirige sob efeito de álcool ou do homicida, marido/companheiro que
agride a mulher, que ocasionam invalidez ou morte e culminam na implementação de
benefícios previdenciários em detrimento da previdência social.
32 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. REsp nº 1.431.150/RS, 2ª Turma, Rel. Min. Humberto Martins, D J
02.02.2017. Disponível em: <https://stj.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/433556100/recurso-especial-
resp-1431150-rs-2013-0388171-8/inteiro-teor-433556111?ref=juris-tabs >. Acesso em: 29 jun. 2018.
CABIMENTO DAS AÇÕES DE REGRESSO PELO INSS NOS CASOS DE CRIMES DE TRÂNSITO E VIOLÊNCIA 239
DOMÉSTICA SOB A ÉGIDE DA RESPONSABILIDADE CIVIL E DA CONSTITUCIONALIZAÇÃO DO DIREITO CIVIL
Demais disto, esclareceu o julgador que o benefício resulta da condição de segu-
rada da falecida, razão pela qual seria instituído mesmo que não originasse da prática
de ato ilícito ou mesmo diante da impossibilidade de o agente lesante não possuir bens
para arcar com o pagamento das prestações.
nos termos dos arts. 120 e 121, da Lei n. 8.213/91, o Instituto Nacional do Seguro
Social - INSS encontra-se legitimado a ajuizar ação regressiva contra os responsáveis
pelos danos causados a terceiros, que, eventualmente, tenham auferido benefícios
previdenciários dali decorrentes, desde que demonstrada a ocorrência do evento
danoso, o nexo de causalidade entre este e o pagamento de tais benefícios, bem
assim, a culpabilidade dos supostos responsáveis, como no caso.
36 Brasil. Tribunal Regional Federal da 1ª Região. Apelação Cível- AC 95.00.18878-3 / MG, 5ª Turma,
Rel. Desembargador Federal Souza Prudente, DJ 07.10.2013. Disponível em: <https://www2.cjf.jus.br/
jurisprudencia/trf1/index.xhtml;jsessionid=fNxTxqMfmAgDSNfaSSsclPS3GJ d V v 8 r I b c Q m 3 G g r .
taturana04-hc02:juris-trf1_node01>. Acesso em: 29 jun. 2018.
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em: <http://www.agu.gov.br/page/content/detail/id_conteudo/268218>. Acesso em:
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Brasil. Constituição da República Federativa do Brasil. Texto constitucional
promulgado em 05 de outubro de 1988, com as alterações adotadas pelas Emendas
Constitucionais nos 1/1992 a 99/2017, pelo Decreto Legislativo nº 186/2008 e pelas
Emendas Constitucionais de Revisão nos 1 a 6/1994. Disponível em <http://www.
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da Previdência Social e dá outras providências. Diário Oficial da União – DOU, 25 jul.
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violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos do § 8o do art. 226 da
Constituição Federal, da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de
Discriminação contra as Mulheres e da Convenção Interamericana para Prevenir,
Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher; dispõe sobre a criação dos Juizados
de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher; altera o Código de Processo
Penal, o Código Penal e a Lei de Execução Penal; e dá outras providências. Diário
Oficial da União – DOU, 08 mar. 2006. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/
ccivil_03/_ato2004-2006/2006/lei/l11340.htm>. Acesso em: 06 ago. 2018.
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Especializada Junto ao INSS nº 6, de 18 de janeiro de 2013. Disponível em <http://
www.normaslegais.com.br/legislacao/portaria-conj-pgf-pfe-inss-6-2013.htm>.
Acesso em: 29 jun. 2018.
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça - STJ. Recurso Especial. REsp 1.431.150/RS.
2ª Turma. Rel. Ministro Humberto Martins. Brasília, 23 de agosto de 2016. DJe de
02.12.2017. Disponível em: <https://stj.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/433556100/
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BRASIL. Tribunal Regional Federal da 5ª Região. Apelação Cível – AC/PE nº
08005367420134058300. 4ª Turma, Rel. Desembargador Federal Edílson Nobre, DJ
CABIMENTO DAS AÇÕES DE REGRESSO PELO INSS NOS CASOS DE CRIMES DE TRÂNSITO E VIOLÊNCIA 243
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TARTUCE, Flávio. Manual de Direito Civil: volume único. 6. ed. rev., atual. e ampl. Rio
de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2016.
Resumo
O artigo aborda a negociação coletiva no setor público e as razões que
impedem sua efetiva implementação como método de solução de conflitos
coletivos entre a Administração Pública e seus servidores. Examina as diver-
gências doutrinárias e jurisprudências sobre o tema, as experiências nacionais
de sucesso e o papel da advocacia pública no assessoramento jurídico dos
administradores durante os processos de negociação. Conclusivamente,
enuncia que a admissão da negociação coletiva para os servidores públicos
é um processo inevitável, decorrente da própria dinâmica social produzida
pelo desenvolvimento das relações de trabalho na Administração Pública, e
que, enquanto não há maior regulamentação do tema, é a Advocacia Pública,
enquanto órgão de assessoramento jurídico, uma das principais responsáveis
por garantir, nos processos de negociação, a observância dos princípios de
Direito Administrativo, mormente o da segurança jurídica e o da continuidade
dos serviços públicos.
2 CAIRO JR., José. Curso de Direito do Trabalho. 14. ed. Salvador: Juspodivm, 2018, p. 182.
3 MARINELA, Fernanda. Direito Administrativo. 9. ed. São Paulo: Saraiva, 2015, p. 613.
4 Nem sempre foi assim, porém. Na origem da “função pública” relutava-se em reconhecer a prestação
de serviços em favor da Administração Pública como uma forma de trabalho (ARAÚJO, Florivaldo Dutra.
Negociação Coletiva dos Servidores Públicos. Belo Horizonte: Fórum, 2011, p. 229).
5 MARINELA, Fernanda. Direito Administrativo. 9. ed. São Paulo: Saraiva, 2015, p. 616.
6 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanela. Direito Administrativo. 27. ed. São Paulo: Atlas, 2014, p. 596.
7 MELLO, Celso Antônio Bandeira. Curso de Direito Administrativo. 8. ed. São Paulo: Malheiros, 2007, p.
135.
8 NEIVA, Rogerio. Direito e Processo do Trabalho aplicados à Administração Pública e Fazenda Pública. 2.
ed. São Paulo: Gen Método, 2016, p. 17.
9 CARVALHO, Matheus; OLIVEIRA, João Paulo. Agentes Públicos: Comentários à Lei 8.112/1990. Salvador:
Juspodivm, 2017, p. 13.
10 COUTINHO, Alessandro Dantas; RODOR, Ronald Krüger. Manual de Direito Administrativo. 2. ed. Salvador:
Juspodivm, 2018, p. 274.
11 MARINELA, Fernanda. Direito Administrativo. 9. ed. São Paulo: Saraiva, 2015, p. 625.
12 O presente excerto torna claro o posicionamento do STF, quando da concessão de liminar na Ação
Cautelar 2310: “Os servidores das agências reguladoras hão de estar, necessariamente, submetidos ao
regime de cargo público, ou podem, como previsto na lei em exame, ser contratados para empregos
públicos? Ninguém coloca em dúvida o objetivo maior das agências reguladoras, no que ligado à
proteção do consumidor, sob os mais diversos aspectos negativos - ineficiência, domínio do mercado,
concentração econômica, concorrência desleal e aumento arbitrário dos lucros. Hão de estar as
decisões desses órgãos imunes a aspectos políticos, devendo fazer-se presente, sempre, o contorno
técnico. É isso o exigível não só dos respectivos dirigentes - detentores de mandato -, mas também
dos servidores - reguladores, analistas de suporte à regulação, procuradores, técnicos em regulação
e técnicos em suporte à regulação - Anexo I da Lei nº 9.986/2000 - que, juntamente com os primeiros,
hão de corporificar o próprio Estado nesse mister da mais alta importância, para a efetiva regulação
dos serviços. Prescindir, no caso, da ocupação de cargos públicos, com os direitos e garantias a eles
inerentes, é adotar flexibilidade incompatível com a natureza dos serviços a serem prestados, igualizando
os servidores das agências a prestadores de serviços subalternos, dos quais não se exige, até mesmo,
escolaridade maior, como são serventes, artífices, mecanógrafos, entre outros. Atente-se para a espécie.
Está-se diante de atividade na qual o poder de fiscalização, o poder de polícia fazem-se com envergadura
ímpar, exigindo, por isso mesmo, que aquele que a desempenhe sinta-se seguro, atue sem receios outros,
e isso pressupõe a ocupação de cargo público, a estabilidade prevista no artigo 41 da Constituição
Federal” (BRASIL. Supremo Tribunal Federal. ADI 2310 MC. Rel: Ministro Marco Aurélio, Brasília,
19 de dezembro de 2000. Disponível em: <http://stf.jus.br/portal/jurisprudencia/visualizarEmenta.
asp?s1=000047648&base=baseMonocraticas>. Acesso em 23, julho, 2018).
13 ARAÚJO, Florivaldo Dutra. Negociação Coletiva dos Servidores Públicos. Belo Horizonte: Fórum, 2011, p.
127.
14 DANIEL, Felipe Alexandre Santa Anna Mucci. Natureza jurídica do vínculo Agente-Estado e a adoção de
instrumentos consensuais de participação no regime jurídico disciplinar dos servidores públicos. Revista
Brasileira de Direito Municipal – RBDM, Belo Horizonte, ano 10, n. 33, p. 51-75, jul./set. 2009.
Nessa linha, Vólia Bonfim Cassar conceitua o conflito coletivo de trabalho como a
existência de “divergência de interesses trabalhistas entre um grupo de trabalhadores e
seus empregadores, para defesa de algum interesse coletivo do grupo ou dos membros
que o compõem” 17.
Os conflitos coletivos de trabalho devem, por força do artigo 8º, inciso VI, da
Constituição18, ser intermediados pelos sindicatos. Segundo o artigo 511 da CLT, os
sindicatos são associações para fins de estudo, defesa e coordenação dos interesses
econômicos ou profissionais de todos os que, como empregadores, empregados,
agentes ou trabalhadores autônomos ou profissionais liberais exerçam, respectiva-
mente, as mesmas atividades ou profissões similares ou conexas.
16 MORRISON, Wayne. Filosofia do Direito: Dos Gregos ao Pós-Modernismo. São Paulo: Martins Fontes,
2006, p. 49.
17 CASSAR, Vólia Bomfim. Direito do Trabalho. 14. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2017, p. 1246-1247.
18 CRFB, art. 8º, VI: “é obrigatória a participação dos sindicatos nas negociações coletivas de trabalho”.
20 CRFB, art. 9º: “É assegurado o direito de greve, competindo aos trabalhadores decidir sobre a oportunidade
de exercê-lo e sobre os interesses que devam por meio dele defender”.
21 CASSAR, Vólia Bomfim. Direito do Trabalho. 14. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2017, p. 1295.
22 DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 17. ed. São Paulo: LTr, 2018, p. 1694-1695.
23 CAIRO JR., José. Curso de Direito do Trabalho. 14. ed. Salvador: Juspodivm, 2018, p. 1158.
24 É de longa data que a doutrina considera os métodos de autocomposição os mais eficientes e efetivos
para pacificação dos conflitos sociais. Daniel Amorim Assumpção Neves, por exemplo, defende que,
na autocomposição, “O que determina a solução do conflito não é o exercício da força, como ocorre
na autotutela, mas a vontade das partes, o que é muito mais condizente com o Estado democrático de
direito em que vivemos. Inclusive, é considerado atualmente um excelente meio de pacificação social,
porque inexiste no caso concreto uma decisão impositiva, como ocorre na jurisdição, valorizando-se a
autonomia da vontade das partes na solução do litígio (NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de
Direito Processual Civil. 8. ed. Salvador: Juspodivm, 2016, p. 5).
25 SANTOS, Enoque Ribeiro. Negociação Coletiva de Trabalho nos Setores Público e Privado. 2. ed. São
Paulo: LTr, 2016, p. 81.
26 CRFB, art. 7º, XXVI: “São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria
de sua condição social: (...) XXVI - reconhecimento das convenções e acordos coletivos de trabalho”.
27 GARCIA, Gustavo Filipe Barbosa. Reforma Trabalhista: Análise crítica da Lei 13.467/2017. 3. ed. Salvador:
Juspodivm, 2018, p. 252.
28 CLT, art. 614, §3º: “Não será permitido estipular duração de convenção coletiva ou acordo coletivo de
trabalho superior a dois anos, sendo vedada a ultratividade”.
29 CASSAR, Vólia Bomfim. Direito do Trabalho. 14. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2017, p. 1256.
30 PAES, Arnaldo Boson. Negociação Coletiva, Convenção n. 151 da OIT e Eficácia dos Instrumentos
Negociados. In: SILVA, Clarissa Sampaio; GOMES, Ana Virginia Moreira Gomes (Org.). A Convenção
n. 151 da OIT sobre o Direito de Sindicalização e Negociação na Administração Pública: Desafios na
Realidade Brasileira. São Paulo: LTr, 2017, p. 59.
31 ARAÚJO, Florivaldo Dutra. Negociação Coletiva dos Servidores Públicos. Belo Horizonte: Fórum, 2011, p.
141-142.
32 CRFB, art. 37, VI: “(...) é garantido ao servidor público civil o direito à livre associação sindical”.
33 CRFB, art. 37, VII: “(...) o direito de greve será exercido nos termos e nos limites definidos em lei
específica”.
34 CRFB, art. 142, §3º, IV: “(...)ao militar são proibidas a sindicalização e a greve”.
35 Convenção n. 87 da OIT, art. 2: “Os trabalhadores e os empregadores, sem nenhuma distinção e sem
autorização prévia, têm o direito de constituir as organizações que estimem convenientes, assim como o
de filiar-se a estas organizações, com a única condição de observar os estatutos das mesmas”.
36 Convenção n. 151 da OIT, art. 4: “1. Os trabalhadores da Administração Pública devem usufruir de uma
proteção adequada contra todos os atos de discriminação que acarretem violação da liberdade sindical
em matéria de trabalho. 2. Essa proteção deve aplicar-se, particularmente, em relação aos atos que
tenham por fim: a) Subordinar o emprego de um trabalhador da Administração Pública à condição de
este não se filiar a uma organização de trabalhadores da Administração Pública ou deixar de fazer parte
dessa organização; b) Demitir um trabalhador da Administração Pública ou prejudicá-lo por quaisquer
outros meios, devido à sua filiação a uma organização de trabalhadores da Administração Pública ou à
sua participação nas atividades normais dessa organização”.
37 Convenção n. 151 da OIT, art. 7: “Devem ser tomadas, quando necessário, medidas adequadas às
condições nacionais para encorajar e promover o desenvolvimento e utilização plenos de mecanismos
que permitam a negociação das condições de trabalho entre as autoridades públicas interessadas e
as organizações de trabalhadores da Administração Pública ou de qualquer outro meio que permita
aos representantes dos trabalhadores da Administração Pública participarem na fixação das referidas
condições”.
38 ARAÚJO, Florivaldo Dutra. Negociação Coletiva dos Servidores Públicos. Belo Horizonte: Fórum, 2011, p.
229-230.
Com efeito, Luísa Cristina Pinto e Netto e Ana Cláudia Nascimento Gomes39
destacam que dois dos principais obstáculos à liberdade sindical dos servidores
públicos são o arcaísmo e a inadaptação da CLT e a ausência de uma legislação
adequada que considere as peculiaridades do funcionalismo público, mormente diante
da incompatibilidade do sistema de organização sindical por categoria40 com as ativi-
dades tipicamente desenvolvidas pela Administração, o que conduz ao enfraquecimento
da representatividade dos sindicatos de servidores e, consequentemente, à dificuldade
de efetivação de negociações coletivas.
39 PINTO E NETTO, Luísa Cristina; GOMES, Ana Cláudia Nascimento. Sindicalização na Função Pública
Brasileira: desafios para a implementação da Convenção n. 151 da OIT. In: SILVA, Clarissa Sampaio;
GOMES, Ana Virginia Moreira Gomes (Org.). A Convenção n. 151 da OIT sobre o Direito de Sindicalização
e Negociação na Administração Pública: Desafios na Realidade Brasileira. São Paulo: LTr, 2017, p. 85
(destaques no original).
41 CRFB, art. 39, §3º: “§ 3º Aplica-se aos servidores ocupantes de cargo público o disposto no art. 7º, IV, VII,
VIII, IX, XII, XIII, XV, XVI, XVII, XVIII, XIX, XX, XXII e XXX, podendo a lei estabelecer requisitos diferenciados
de admissão quando a natureza do cargo o exigir”.
42 NEIVA, Rogerio. Direito e Processo do Trabalho aplicados à Administração Pública e Fazenda Pública. 2.
ed. São Paulo: Gen Método, 2016, p. 106.
43 SANTOS, Negociação Coletiva de Trabalho nos Setores Público e Privado. 2. ed. São Paulo: LTr, 2016, p.
186.
44 SANTOS, Negociação Coletiva de Trabalho nos Setores Público e Privado. 2. ed. São Paulo: LTr, 2016, p.
187.
45 Na mesma linha: NEIVA, Rogerio. Direito e Processo do Trabalho aplicados à Administração Pública e
Fazenda Pública. 2. ed. São Paulo: Gen Método, 2016, p. 107.
46 SANTOS, Negociação Coletiva de Trabalho nos Setores Público e Privado. 2. ed. São Paulo: LTr, 2016, p.
186.
47 BRASIL, Supremo Tribunal Federal. Súmula nº 679. A fixação de vencimentos dos servidores públicos
não pode ser objeto de convenção coletiva. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/
menuSuma rioSumulas.asp?sumula=3632>. Acesso em: 17, julho, 2018.
48 Destaca-se a seguinte passagem do Min. Relator Carlos Veloso: “Não sendo possível, portanto, à
Administração Pública transigir no que diz respeito à matéria reservada à lei, segue-se a impossibilidade
de a lei assegurar ao servidor público o direito à negociação coletiva, que compreende acordo entre
sindicatos de empregadores e de empregados, ou entre sindicatos de empregados e empresas e,
malogrado o acordo, o direito de ajuizar o dissídio coletivo. E é justamente isto o que está assegurado no
art. 240, alíneas d (negociação coletiva) e (ajuizamento coletivo frente à Justiça do Trabalho) da citada
Lei 8.112, de 11.12.90. (...) Hoje, mais do que ontem, estou convencido da inconstitucionalidade da
alínea d do art. 240 da Lei 8.112/90, que assegura aos servidores públicos civis da União, das autarquias
e das fundações públicas federais, o direito “de negociação coletiva”, e das disposições que, na alínea e,
do mesmo artigo, asseguram aos referidos servidores públicos o direito à ação coletiva frente à Justiça
do Trabalho. Tais disposições legais violam o art. 37 da Constituição Federal” (BRASIL, Supremo Tribunal
Federal, ADI 492-1. Rel: Ministro Carlos Veloso, Brasília, 12 de novembro de 1992. Disponível em: <http://
redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=2663 82>. Acesso em 17, julho, 2018.
49 PAES, Arnaldo Boson. Negociação Coletiva, Convenção n. 151 da OIT e Eficácia dos Instrumentos
Negociados. In: SILVA, Clarissa Sampaio; GOMES, Ana Virginia Moreira Gomes (Org.). A Convenção
n. 151 da OIT sobre o Direito de Sindicalização e Negociação na Administração Pública: Desafios na
Realidade Brasileira. São Paulo: LTr, 2017, p. 61.
De mais a mais, o artigo 39, §3º, da Constituição faz menção direta ao inciso
XIII do artigo 7º, o qual permite a flexibilização da jornada de trabalho por meio de
instrumentos coletivos, implicando o reconhecimento constitucional, ainda que en
passant, da possibilidade de adoção desses instrumentos pelos servidores públicos.
50 DEMARI, Melissa. A negociação coletiva entre servidores públicos e o Estado. Disponível em: <http://
www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=7582>. Acesso em
21, julho, 2018.
51 Registra-se, inclusive, com o mais elevado respeito à posição do Tribunal, que essa equívoca interpretação
foi cometida pelo STF quando do julgamento da ADI 492-1/DF, ao partir do pressuposto de que, conforme
trecho anteriormente transcrito neste estudo, “a negociação coletiva tem por escopo, basicamente, a
alteração da remuneração”.
52 DEMARI, Melissa. A negociação coletiva entre servidores públicos e o Estado. Disponível em: <http://
www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=7582>. Acesso em
21, julho, 2018.
53 No mesmo sentido: RESENDE, Renato de Sousa. Negociação Coletiva de Servidor Público. São Paulo: LTr,
2012, p. 213.
Vê-se, assim, que a negociação coletiva pode abarcar uma série de temas que,
embora afetem direta e positivamente as condições de trabalho dos servidores, não
possuem qualquer impacto orçamentário ou financeiro direto. Não se pode, por conse-
guinte, reconhecer uma relação de incompatibilidade necessária e absoluta entre o
direito à negociação coletiva e as exigências impostas pelos sistemas de controles
de gastos públicos e as regras constitucionais e legais de execução orçamentária.
Essa constatação, a propósito, fez com que o Tribunal Superior do Trabalho alte-
rasse a redação da OJ nº 05 da SDC, passando a permitir dissídio coletivo em face de
pessoa jurídica de direito público que mantenha empregados, desde que exclusivamente
para apreciação de cláusulas de natureza social54, assim entendidas aquelas que não
possuam reflexos diretos de natureza econômico, a exemplo da instituição de banco
de horas.
54 BRASIL, Tribunal Superior do Trabalho. OJ nº 05 da SDC. Em face de pessoa jurídica de direito público
que mantenha empregados, cabe dissídio coletivo exclusivamente para apreciação de cláusulas de
natureza social. Inteligência da Convenção nº 151 da Organização Internacional do Trabalho, ratificada
pelo Decreto Legislativo nº 206/2010. Disponível em: <http://www3.tst.jus.br/jurisprudencia/OJ_SDC/n_
bol_01.html#TEMA5>. Acesso em: 21, julho, 2018.
55 SANTOS, Enoque Ribeiro. Negociação Coletiva de Trabalho nos Setores Público e Privado. 2. ed. São
Paulo: LTr, 2016, p. 188.
56 A questão da eficácia jurídica dos instrumentos coletivos negociados na Administração Pública, nos
moldes da tese exposta, é peculiar e distingue-se daquela verificada para iniciativa privada, sobretudo
quando se indaga a respeito das consequências jurídicas do descumprimento do pactuado. Se, em
âmbito privado, o caráter normativo e imperativo das normas coletivas, inquestionavelmente assegura
aos trabalhadores o direito de exigir, em Juízo, de seu empregador as prestações acordadas, no setor
público, há necessidade em separar as matérias sujeitas e não submetidas à reserva de lei. Conforme
defende Arnaldo Boson Paes, para os assuntos não submetidos à reserva de lei, os acordos coletivos
produziriam efeitos imediatos, imperativos e inderrogáveis, de modo que poderia o servidor prejudicado
ou o sindicato legitimado reclamar, pela via administrativa ou judicial, contra a Administração Pública, o
cumprimento do acordado. Por outro lado, em caso de recusa do Poder Público em encaminhar o projeto
de lei nos termos acordados, caberia apenas ação de responsabilização da Administração (PAES, Arnaldo
Boson. Negociação Coletiva, Convenção n. 151 da OIT e Eficácia dos Instrumentos Negociados. In: SILVA,
Clarissa Sampaio; GOMES, Ana Virginia Moreira Gomes (Org.). A Convenção n. 151 da OIT sobre o Direito
de Sindicalização e Negociação na Administração Pública: Desafios na Realidade Brasileira. São Paulo:
LTr, 2017, p. 68).
57 ARAÚJO, Florivaldo Dutra. Negociação Coletiva dos Servidores Públicos. Belo Horizonte: Fórum, 2011, p.
363.
58 RESENDE, Renato de Sousa. Negociação Coletiva de Servidor Público. São Paulo: LTr, 2012, p. 228-229.
60 DEMARI, Melissa. A negociação coletiva entre servidores públicos e o Estado. Disponível em: <http://
www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=7582>. Acesso em
21, julho, 2018.
61 RESENDE, Renato de Sousa. Negociação Coletiva de Servidor Público. São Paulo: LTr, 2012, p. 283.
62 RESENDE, Renato de Sousa. Negociação Coletiva de Servidor Público. São Paulo: LTr, 2012, p. 289.
63 SANTOS, Enoque Ribeiro. Negociação Coletiva de Trabalho nos Setores Público e Privado. 2. ed. São
Paulo: LTr, 2016, p. 197.
65 SANTOS, Enoque Ribeiro. Negociação Coletiva de Trabalho nos Setores Público e Privado. 2. ed. São
Paulo: LTr, 2016, p. 197.
66 RESENDE, Renato de Sousa. Negociação Coletiva de Servidor Público. São Paulo: LTr, 2012, p. 286-288.
Para Luísa Cristina Pinto e Netto e Ana Cláudia Nascimento Gomes, a efetiva
implementação da negociação coletiva no serviço público passa, necessariamente,
pela regulamentação infraconstitucional da matéria e por uma urgente reforma sindical
que compatibilize os institutos do Direito Coletivo do Trabalho com as peculiaridades
do setor público:
Para nós, portanto, uma efetiva implementação da Convenção n. 151 da OIT não
está na dependência apenas de um disciplinamento infraconstitucional que espelhe, por
um lado, a novidade da contratualização coletiva no âmbito da Função Pública (o que
necessariamente implicará na definição das matérias aptas a serem contratualizadas;
o valor jurídico dos instrumentos normativos; a necessidade ou não de aprovação do
Poder Legislativo, a depender do objeto negociado; o prazo de vigência; a qualificação
e a competência dos agentes negociadores em nome da Administração Pública, etc.),
conforme tem apontado a grande maioria da doutrina que se tem debruçado sobre
De toda forma, enquanto não editada legislação sobre o tema, não se pode aban-
donar totalmente a utilização do instituto da negociação coletiva, pois a necessidade
de diálogo na resolução de conflitos coletivos é, como visto, um produto da própria
dinâmica social em que inseridas as relações de trabalho na Administração Pública.
Nesse cenário, a alternativa que surge aos administradores, para terem segurança
jurídica na utilização da negociação coletiva, é buscar auxílio de seus órgãos de
assessoramento e consultoria jurídica.
68 PINTO E NETTO, Luísa Cristina; GOMES, Ana Cláudia Nascimento. Sindicalização na Função Pública
Brasileira: desafios para a implementação da Convenção n. 151 da OIT. In: SILVA, Clarissa Sampaio;
GOMES, Ana Virginia Moreira Gomes (Org.). A Convenção n. 151 da OIT sobre o Direito de Sindicalização
e Negociação na Administração Pública: Desafios na Realidade Brasileira. São Paulo: LTr, 2017, p. 89.
69 CRFB, art. 131: “A Advocacia-Geral da União é a instituição que, diretamente ou através de órgão
vinculado, representa a União, judicial e extrajudicialmente, cabendo-lhe, nos termos da lei complementar
que dispuser sobre sua organização e funcionamento, as atividades de consultoria e assessoramento
jurídico do Poder Executivo”.
70 CRFB, art. 132: “Os Procuradores dos Estados e do Distrito Federal, organizados em carreira, na qual
o ingresso dependerá de concurso público de provas e títulos, com a participação da Ordem dos
Advogados do Brasil em todas as suas fases, exercerão a representação judicial e a consultoria jurídica
das respectivas unidades federadas”.
Vislumbra-se, assim, o relevante papel que deve ser exercido pela Advocacia
Pública nos processos de negociação coletiva no setor público, considerando que,
como órgão técnico de consultoria e de assessoramento jurídico, deve zelar para que
o processo e as medidas dele resultantes estejam em conformidade e deem alento
aos princípios de Direito Administrativo, sobretudo ante a ausência de normatização
minuciosa acerca do tema.
Considerações FinaiS
O reconhecimento de que é possível o conflito de interesses entre servidores
e Administração, buscando melhorias nas condições de trabalho, culminou com a
extensão, na Constituição de 1988, aos trabalhadores públicos dos direitos de sindi-
calização e greve. O legislador constituinte, todavia, não conferiu explicitamente aos
servidores públicos a via da negociação coletiva para solução de conflitos, prejudicando,
em um primeiro momento, o pleno exercício dos direitos coletivos de trabalho a esta
categoria de trabalhadores.
ReferênciaS
ARAÚJO, Florivaldo Dutra. Negociação Coletiva dos Servidores Públicos. Belo
Horizonte: Fórum, 2011.
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. ADI 2310 MC. Rel: Ministro Marco Aurélio, Brasília,
19 de dezembro de 2000. Disponível em: <http://stf.jus.br/portal/jurisprudencia/
visualizarEmenta.asp?s1=000047648&base=baseMonocraticas>. Acesso em 23,
julho, 2018.
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Súmula nº 679. A fixação de vencimentos dos
servidores públicos não pode ser objeto de convenção coletiva. Disponível em: <http://
Resumo
Apesar da Lei do SNUC determinar que as áreas inclusas nos limites
de Estações Ecológicas, Reservas Biológicas e Parques Nacionais passem
para a posse e o domínio públicos, o Estado costuma não dispor ou destinar
recursos suficientes para indenizar todos os proprietários dessas extensas
e numerosas terras. Sem regularização fundiária, comumente as Unidades
de Conservação se tornam meros “parques de papel” – territórios legal-
mente protegidos, mas com pouca ou nenhuma efetividade na preservação
ambiental, onde as rígidas limitações ambientais acabam acarretando o
esvaziamento da função econômica das propriedades particulares. O
presente artigo destaca a importância do procedimento de desapropriação
na efetiva instituição das Unidades de Conservação e indica, como alternativa
1 Especialista em Advocacia Pública pelo Instituto para o Desenvolvimento Democrático – IDDE, Belo
Horizonte/MG e o Ius Gentium Conimbrigae (Centro de Direitos Humanos da Faculdade de Direito da
Universidade de Coimbra – IGC, Coimbra/Portugal). Bacharel em Direito pela Universidade Estadual
do Sudoeste da Bahia - UESB. Ex-Advogado do Município de Vitória da Conquista/BA, atuando na área
ambiental. Atualmente, servidor da Vara Federal Ambiental, Agrária e Residual de Porto Alegre/RS –
Seção Judiciária do Rio Grande do Sul. E-mail: tiberiomenezes@gmail.com
MENEZES, Tibério Leal. A importância do procedimento de desapropriação para a tutela ambiental das unidades de conservação e
o instituto jurídico da permuta de bens imóveis entre particulares e o poder público como alternativa às indenizações. In: PEREIRA,
Rodolfo Viana; SACCHETTO,Thiago Coelho (Orgs.). Advocacia pública em foco. Volume II. Belo Horizonte: IDDE, 2019. p. 273-295.
Disponível em: https://doi.org/10.32445/978856713410910
ao pagamento de indenizações milionárias, a efetuação de permutas entre
bens imóveis disponíveis da Administração e os referidos terrenos privados,
visando compatibilizar o direito difuso ao meio ambiente ecologicamente
equilibrado e o direito ao livre exercício dos atributos da propriedade.
Introdução
As áreas que recebem o título de Unidade de Conservação possuem grande impor-
tância para a manutenção do equilíbrio ambiental, em especial para a preservação
da biodiversidade, já que se evita a destruição e a degradação do habitat da fauna
e da flora. Neste sentido, a criação de áreas territoriais especialmente protegidas é
considerada uma das medidas mais eficazes para a conservação de espaços naturais
singulares.
Entretanto, para a efetiva proteção almejada pela Lei do SNUC, não basta a criação
normativa das Unidades de Conservação, sendo necessário o planejamento de sua
concreta implantação, sob pena de se tornarem “parques de papel” - áreas apenas
formalmente protegidas, mas que, na prática, pouco ou nada contribuem para a para
a manutenção do equilíbrio ambiental.
Deste modo, a simples criação das Unidades de Conservação por lei ou por decreto
não implica a transferência automática da propriedade particular ao Poder Público e
acaba gerando potencial conflito de interesses: de um lado, o particular, que se vê
impedido de exercer os poderes inerentes ao domínio, como o de usar, gozar e dispor
do imóvel; do outro, o dever público de tutelar o meio ambiente ecologicamente equi-
librado em área de grande relevância ambiental para a preservação da biodiversidade,
a pesquisa e o turismo ecológico.
274
mínima a qualquer propriedade particular, o dever da proteção à biodiversidade não
deve acarretar expropriação sem indenização.
A IMPORTÂNCIA DO PROCEDIMENTO DE DESAPROPRIAÇÃO PARA A TUTELA AMBIENTAL DAS UNIDADES DE CONSERVAÇÃO E O INSTITUTO 275
JURÍDICO DA PERMUTA DE BENS IMÓVEIS ENTRE PARTICULARES E O PODER PÚBLICO COMO ALTERNATIVA ÀS INDENIZAÇÕES
Inseridos nestes biomas, há certas áreas e ecossistemas que, por sua diversidade
genética e importância na manutenção do equilíbrio ecológico, demandam especial
proteção para a perpetuidade do nosso patrimônio ambiental.
Algumas décadas depois, com o advento da Lei Nacional n.º 6.938/81, mais
precisamente no seu artigo 9°, inciso VI, estabeleceu-se como um dos principais
instrumentos da Política Nacional de Meio Ambiente a “a criação de espaços territoriais
especialmente protegidos pelo Poder Público federal, estadual e municipal, tais como
áreas de proteção ambiental, de relevante interesse ecológico e reservas extrativistas”.
Tal proteção ganhou ainda mais força com a promulgação da Constituição Federal
de 19886, que preceitua:
“Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado,
bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se
6 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil (1988). Vade Mecum Saraiva. Obra coletiva de
autoria de Editora Saraiva com a colaboração de Luiz Roberto Curia, Lívia Céspedes e Fabiana Dias da
Rocha. 21. ed. atual. e ampl. São Paulo: Saraiva. 2016.
7 RODRIGUES, Marcelo Abelha. Direito ambiental esquematizado – 3. Ed. São Paulo: Saraiva, 2016, p. 167.
8 RODRIGUES, Marcelo Abelha. Direito ambiental esquematizado – 3. Ed. São Paulo: Saraiva, 2016, p. 168.
A IMPORTÂNCIA DO PROCEDIMENTO DE DESAPROPRIAÇÃO PARA A TUTELA AMBIENTAL DAS UNIDADES DE CONSERVAÇÃO E O INSTITUTO 277
JURÍDICO DA PERMUTA DE BENS IMÓVEIS ENTRE PARTICULARES E O PODER PÚBLICO COMO ALTERNATIVA ÀS INDENIZAÇÕES
Frederico Amado9 observa que:
“antes da promulgação da Lei do SNUC, alguns desses espaços territoriais já
existiam em nosso ordenamento jurídico, mas de maneira esparsa na legislação
ambiental, a exemplo das áreas de proteção ambiental e das estações ecológicas,
já tratadas pela Lei 6.902/1981, bem como das florestas nacionais (artigo 5.0,
b, do antigo CFlo - Lei 4.771/1965).”
9 AMADO, Frederico Augusto di Trindade. Legislação comentada para concursos – Ambiental. São Paulo:
Método, 2015, p. 665.
10 THOMÉ, Romeu. Manual de Direito Ambiental. 6ª Ed. Salvador: Juspodivm. 2016, p. 385
11 AMADO, Frederico Augusto di Trindade. Legislação comentada para concursos – Ambiental. São Paulo:
Método. 2015, p. 672.
12 BRASIL. Lei nº 9.985, de 18 de julho de 2000. Regulamenta o art. 225, § 1o, incisos I, II, III e VII da
Constituição Federal, institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza e dá outras
providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9985.htm>. Acesso em: 13,
dezembro, 2017.
A IMPORTÂNCIA DO PROCEDIMENTO DE DESAPROPRIAÇÃO PARA A TUTELA AMBIENTAL DAS UNIDADES DE CONSERVAÇÃO E O INSTITUTO 279
JURÍDICO DA PERMUTA DE BENS IMÓVEIS ENTRE PARTICULARES E O PODER PÚBLICO COMO ALTERNATIVA ÀS INDENIZAÇÕES
admitido, a exemplo das Estações Biológicas, Reservas Biológicas, Parques Nacionais,
Monumentos Naturais e Refúgios da Vida Silvestre.
No segundo grupo, por sua vez, a intensidade de proteção é menor, pois são
unidades de conservação que objetivam compatibilizar a conservação da natureza e
o seu uso sustentável, admitindo a exploração de parcela de seus recursos desde que
observados o zoneamento, as limitações legais e o plano de manejo, a exemplo das
Reservas a Extrativistas, Áreas de Proteção Ambiental e Reservas de Desenvolvimento
Sustentável.
13 BRASIL. Lei nº 9.985, de 18 de julho de 2000. Regulamenta o art. 225, § 1o, incisos I, II, III e VII da
Constituição Federal, institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza e dá outras
providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9985.htm>. Acesso em: 13,
dezembro, 2017.
14 AMADO, Frederico Augusto di Trindade. Legislação comentada para concursos – Ambiental. São Paulo:
Método, 2015, p. 666.
O mesmo autor também alerta que a criação de uma Estação Ecológica depende
da elaboração de estudos técnicos, mas a realização de consultas públicas é facul-
tativa, e que pesquisas científicas são permitidas, desde que autorizadas pelo órgão
administrador da unidade de conservação.
15 BRASIL. Lei nº 9.985, de 18 de julho de 2000. Regulamenta o art. 225, § 1o, incisos I, II, III e VII da
Constituição Federal, institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza e dá outras
providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9985.htm>. Acesso em: 13,
dezembro, 2017.
16 THOMÉ, Romeu. Manual de Direito Ambiental. 6ª Ed. Salvador: Juspodivm, 2016, p. 387-388.
A IMPORTÂNCIA DO PROCEDIMENTO DE DESAPROPRIAÇÃO PARA A TUTELA AMBIENTAL DAS UNIDADES DE CONSERVAÇÃO E O INSTITUTO 281
JURÍDICO DA PERMUTA DE BENS IMÓVEIS ENTRE PARTICULARES E O PODER PÚBLICO COMO ALTERNATIVA ÀS INDENIZAÇÕES
1.2 Reservas Biológica
A Lei do SNUC17 conceitua essa modalidade de Unidade de Conservação no artigo
10, transcrito a seguir:
“Art. 10. A Reserva Biológica tem como objetivo a preservação integral da biota e
demais atributos naturais existentes em seus limites, sem interferência humana
direta ou modificações ambientais, excetuando-se as medidas de recuperação de
seus ecossistemas alterados e as ações de manejo necessárias para recuperar e
preservar o equilíbrio natural, a diversidade biológica e os processos ecológicos
naturais.”
17 BRASIL. Lei nº 9.985, de 18 de julho de 2000. Regulamenta o art. 225, § 1o, incisos I, II, III e VII da
Constituição Federal, institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza e dá outras
providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9985.htm>. Acesso em: 13,
dezembro, 2017.
18 THOMÉ, Romeu. Manual de Direito Ambiental. 6ª Ed. Salvador: Juspodivm, 2016, p. 388.
19 BRASIL. Lei nº 9.985, de 18 de julho de 2000. Regulamenta o art. 225, § 1o, incisos I, II, III e VII da
Constituição Federal, institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza e dá outras
providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9985.htm>. Acesso em: 13,
dezembro, 2017.
Tal instrumento jurídico consiste num procedimento por meio do qual o Poder
Público, fundamentado nas necessidades coletivas, determina a retirada de bem privado
do seu proprietário para que passe a fazer parte do patrimônio público, mediante o
pagamento de justa e prévia indenização.
20 THOMÉ, Romeu. Manual de Direito Ambiental. 6ª Ed. Salvador: Juspodivm, 2016, p. 389.
21 CARVALHO, Matheus. Manual de Direito Administrativo. 3ª ed. Salvador: Juspodivm, 2016, p. 977.
A IMPORTÂNCIA DO PROCEDIMENTO DE DESAPROPRIAÇÃO PARA A TUTELA AMBIENTAL DAS UNIDADES DE CONSERVAÇÃO E O INSTITUTO 283
JURÍDICO DA PERMUTA DE BENS IMÓVEIS ENTRE PARTICULARES E O PODER PÚBLICO COMO ALTERNATIVA ÀS INDENIZAÇÕES
O referido doutrinador22 também pondera que o procedimento expropriatório é
situação excepcional, admissível somente quando presentes os rígidos pressupostos
constitucionais, pois a regra é que o Poder Público não interfira no direito da propriedade.
22 CARVALHO, Matheus. Manual de Direito Administrativo. 3ª ed. Salvador: Juspodivm, 2016, p. 976-977.
23 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil (1988). Vade Mecum Saraiva. Obra coletiva de
autoria de Editora Saraiva com a colaboração de Luiz Roberto Curia, Lívia Céspedes e Fabiana Dias da
Rocha. 21. ed. atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2016.
24 DIAS, Matheus Costa. Breve análise sobre a desapropriação por utilidade pública. Jus.com.br. São Paulo,
2010. Disponível em: < https://jus.com.br/artigos/44040/breve-analise-sobre-a-desapropriacao-por-
utilidade-publica>. Acesso em: 10, outubro, 2017.
Por sua vez, a Lei Nacional n.º 4.132/196226 estabelece as hipóteses de ocorrência
de interesse social para fins de desapropriação, destacando-se as previsões das alíneas
VII (“a proteção do solo e a preservação de cursos e mananciais de água e de reservas
florestais”) e VIII (“a utilização de áreas, locais ou bens que, por suas características,
sejam apropriados ao desenvolvimento de atividades turísticas”).
25 BRASIL. Decreto-Lei n.º 3.365, de 21 de junho de 1941. Dispõe sobre desapropriações por utilidade
pública. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del3365.htm>. Acesso em: 13,
dezembro, 2017.
26 BRASIL. Lei n.º 4.132, de 10 de setembro de 1962. Define os casos de desapropriação por interesse
social e dispõe sobre sua aplicação. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l4132.
htm>. Acesso em: 13, dezembro, 2017.
27 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil (1988). Vade Mecum Saraiva. Obra coletiva de
autoria de Editora Saraiva com a colaboração de Luiz Roberto Curia, Lívia Céspedes e Fabiana Dias da
Rocha. 21. ed. atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2016.
28 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 27ª Ed. São Paulo: Malheiros, 2010,
p. 878.
A IMPORTÂNCIA DO PROCEDIMENTO DE DESAPROPRIAÇÃO PARA A TUTELA AMBIENTAL DAS UNIDADES DE CONSERVAÇÃO E O INSTITUTO 285
JURÍDICO DA PERMUTA DE BENS IMÓVEIS ENTRE PARTICULARES E O PODER PÚBLICO COMO ALTERNATIVA ÀS INDENIZAÇÕES
sua intenção de adquirir compulsoriamente um bem determinado e o submete ao jugo
de sua força expropriatória”29.
29 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 27ª Ed. São Paulo: Malheiros, 2010,
p. 878.
30 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 27ª Ed. São Paulo: Malheiros, 2010,
p. 879.
31 BRASIL. Decreto-Lei n.º 3.365, de 21 de junho de 1941. Dispõe sobre desapropriações por utilidade
pública. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del3365.htm>. Acesso em: 13,
dezembro, 2017.
32 BRASIL. Lei n.º 4.132, de 10 de setembro de 1962. Define os casos de desapropriação por interesse
social e dispõe sobre sua aplicação. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l4132.
htm>. Acesso em 13, dezembro, 2017.
Portanto, não é qualquer área do território nacional que merece especial proteção
ambiental, pois nem todos os espaços apresentam características naturais relevantes
e singulares. Diante destas especificidades, não se pode defender a caducidade dos
decretos criadores de unidades de conservação à semelhança das desapropriações
ordinárias, “especialmente porque não se está em jogo apenas o direito de propriedade,
mas também o direito de todos a um meio ambiente ecologicamente equilibrado que
é pressuposto para a fruição, na sua plenitude, dos atributos de uma propriedade.”34
33 ALMEIDA, Ricardo Marques de. A incaducabilidade dos decretos de criação de unidades de conservação
da natureza. Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/28921>. Acesso em: 28, novembro, 2017.
34 ALMEIDA, Ricardo Marques de. A incaducabilidade dos decretos de criação de unidades de conservação
da natureza. Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/28921>. Acesso em: 28, novembro, 2017.
35 ALMEIDA, Ricardo Marques de. A incaducabilidade dos decretos de criação de unidades de conservação
da natureza. Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/28921>. Acesso em: 28, novembro, 2017.
A IMPORTÂNCIA DO PROCEDIMENTO DE DESAPROPRIAÇÃO PARA A TUTELA AMBIENTAL DAS UNIDADES DE CONSERVAÇÃO E O INSTITUTO 287
JURÍDICO DA PERMUTA DE BENS IMÓVEIS ENTRE PARTICULARES E O PODER PÚBLICO COMO ALTERNATIVA ÀS INDENIZAÇÕES
respeito à unidades de conservação criadas mediante lei (art. 225, §1º, III da
CF), que só perdem vigência quando revogadas ou declaradas inconstitucionais.
Assim, admitir a procedência da tese da caducabilidade equivaleria a admitir um
Sistema Nacional de Unidades de Conservação pela metade, em que algumas
unidades caducariam e outras não, a depender da natureza do seu ato de criação.
Um nonsense.”
36 ALMEIDA, Ricardo Marques de. A incaducabilidade dos decretos de criação de unidades de conservação
da natureza. Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/28921>. Acesso em: 28, novembro, 2017.
37 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 27ª Ed. São Paulo: Malheiros, 2010,
p. 878.
Acerca do tema, Tauã Lima Verdan Rangel38 leciona que o contrato de permuta
é o negocio jurídico em que apartes se obrigam, reciprocamente, a entregar coisas,
guardando semelhanças com o instituto da compra e venda, mas não se confundido
com este uma vez que “a permuta constitui uma alienação de uma coisa por outra, ao
38 RANGEL, Tauã Lima Verdan. Contrato de permuta: abordagem conceitual do tema. Disponível em: <
https://bit.ly/2zlKqai>. Acesso em: 28, novembro, 2017.
A IMPORTÂNCIA DO PROCEDIMENTO DE DESAPROPRIAÇÃO PARA A TUTELA AMBIENTAL DAS UNIDADES DE CONSERVAÇÃO E O INSTITUTO 289
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passo que a compra e venda, como troca, traz como particularidade primordial o fato
de um ter uma coisa trocada por dinheiro.”
Vê-se, portanto, que o Poder Público poderá dispor de imóveis não afetados ao
interesse público em troca dos terrenos situados nas Unidades de Conservação, desde
que haja observância aos procedimentos previstos em lei para a transação.
39 RANGEL, Tauã Lima Verdan. Contrato de permuta: abordagem conceitual do tema. Disponível em: <
https://bit.ly/2zlKqai>. Acesso em: 28, novembro, 2017.
40 SAAD, Amauri Feres. Permuta de bens públicos imóveis. RDA – Revista de Direito Administrativo, v. 265,
p. 117-118 Rio de Janeiro, jan./abr, 2014.
Desta forma, a Lei Geral de Licitações prevê os seguintes requisitos para alie-
nação de bens imóveis pelo Poder Público: interesse público devidamente justificado,
autorização legislativa prévia, avaliação prévia do bem a ser permutado e licitação na
modalidade concorrência, esta última dispensada no casos de permuta, tendo em vista
a especificidade dos bens a serem permutados.
Por sua vez, a Lei n.º 9.636/9842 dispõe de modo diverso quanto a competência
para a expedição do ato autorizativo, eis que:
Art. 23. A alienação de bens imóveis da União dependerá de autorização,
mediante ato do Presidente da República, e será sempre precedida de parecer
da SPU quanto à sua oportunidade e conveniência.
§ 1o A alienação ocorrerá quando não houver interesse público, econô- mico
ou social em manter o imóvel no domínio da União, nem inconveniência quanto
41 BRASIL. Lei n.º 8.666, de 21 de junho de 1993. Regulamenta o art. 37, inciso XXI, da Constituição Federal,
institui normas para licitações e contratos da Administração Pública e dá outras providências. Disponível
em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8666cons.htm>. Acesso em: 13, dezembro, 2017.
42 BRASIL. Lei n.º 9.636, de 15 de maio de 1998. Dispõe sobre a regularização, administração, aforamento
e alienação de bens imóveis de domínio da União, altera dispositivos dos Decretos-Leis nos 9.760, de
5 de setembro de 1946, e 2.398, de 21 de dezembro de 1987, regulamenta o § 2odo art. 49 do Ato das
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à preservação ambiental e à defesa nacional, no desaparecimento do vínculo
de propriedade.
§ 2o A competência para autorizar a alienação poderá ser delegada ao Ministro
de Estado da Fazenda, permitida a subdelegação.”
Ademais, por força da própria dicção do citado artigo 84, inciso II, da Carta de
1988, entende-se que a mesma competência para autorização de permutas de bens
públicos com particulares se estende aos chefes do Executivo dos demais entes
federativos, de modo que, conforme destaca Amauri Feres Saad43:
“serão inconstitucionais as constituições estaduais, as leis orgânicas e as leis
ordinárias (federais, estaduais e municipais) sempre que ignorarem que a gestão
dos bens públicos é tarefa eminentemente administrativa, o que implica dizer,
a fim de que não se faça tabula rasa do art. 84, III, da Constituição Federal, que
determina caber ao chefe do Executivo a direção superior da administração
pública, que o regime dos bens públicos nunca poderá ser de tal modo restrito,
que todas decisões relativas a tal matéria caibam exclusiva ou principalmente
ao Poder Legislativo.”
43 SAAD, Amauri Feres. Permuta de bens públicos imóveis. RDA – Revista de Direito Administrativo, v. 265,
p. 117-118 Rio de Janeiro, jan./abr, 2014.
Considerações finaiS
Conforme vimos no presente trabalho, o ato normativo de criação de uma unidade
de conservação, quando não acompanhado do procedimento de desapropriação, acaba
criando severas limitações administrativas aos proprietários atingidos, tendo em vista
que sua instituição não transfere a titularidade das terras inseridas dentro de seus
limites automaticamente para o Poder Público.
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ReferênciaS
ALMEIDA, Ricardo Marques de. A incaducabilidade dos decretos de criação
de unidades de conservação da natureza. Disponível em: <https://jus.com.br/
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Ambiental. São Paulo: Método, 2015.
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Saraiva. Obra coletiva de autoria de Editora Saraiva com a colaboração de Luiz
Roberto Curia, Lívia Céspedes e Fabiana Dias da Rocha. 21. ed. atual. e ampl. São
Paulo: Saraiva, 2016.
BRASIL. Decreto-Lei n.º 3.365, de 21 de junho de 1941. Dispõe sobre desapropriações
por utilidade pública. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/
decreto-lei/Del3365.htm>. Acesso em: 13 dez, 2017.
BRASIL. Lei n.º 4.132, de 10 de setembro de 1962. Define os casos de desapropriação
por interesse social e dispõe sobre sua aplicação. Disponível em: < http://www.
planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l4132.htm>. Acesso em: 13 dez, 2017.
BRASIL. Lei n.º 8.666, de 21 de junho de 1993. Regulamenta o art. 37, inciso XXI, da
Constituição Federal, institui normas para licitações e contratos da Administração
Pública e dá outras providências. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/
ccivil_03/leis/L8666cons.htm>. Acesso em: 13 dez, 2017.
BRASIL. Lei n.º 9.636, de 15 de maio de 1998. Dispõe sobre a regularização,
administração, aforamento e alienação de bens imóveis de domínio da União,
altera dispositivos dos Decretos-Leis nos 9.760, de 5 de setembro de 1946, e 2.398,
de 21 de dezembro de 1987, regulamenta o § 2o do art. 49 do Ato das Disposições
Constitucionais Transitórias, e dá outras providências. Disponível em: <http://www.
planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9636.htm>. Acesso em: 13 dez, 2017.
BRASIL. Lei nº 9.985, de 18 de julho de 2000. Regulamenta o art. 225, § 1o, incisos
I, II, III e VII da Constituição Federal, institui o Sistema Nacional de Unidades de
Conservação da Natureza e dá outras providências. Disponível em: <http://www.
planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9985.htm>. Acesso em: 13 dez, 2017.
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CARVALHO, Matheus. Manual de Direito Administrativo. 3ª ed. Salvador: Juspodivm,
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DIAS, Matheus Costa. Breve análise sobre a desapropriação por utilidade pública.
Disponível em: < https://jus.com.br/artigos/44040/breve-analise-sobre-a-desapro-
priacao-por-utilidade-publica>. Acesso em: 10 out, 2017.
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