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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO

UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ


UNIVERSIDADE DO ESTADO DO AMAZONAS
REDE AMAZÔNICA DE EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS E MATEMÁTICA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS E MATEMÁTICA
POLO ACADÊMICO UFMT

SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO


EXPRESSOS POR PROFESSORES EGRESSOS DO PROGRAMA DE
BOLSA DE INICIAÇÃO À DOCÊNCIA EM QUÍMICA DA UFMT

MARCEL THIAGO DAMASCENO RIBEIRO

BELÉM–PA
2016
MARCEL THIAGO DAMASCENO RIBEIRO

SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO


EXPRESSOS POR PROFESSORES EGRESSOS DO PROGRAMA DE
BOLSA DE INICIAÇÃO À DOCÊNCIA EM QUÍMICA DA UFMT

Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação


em Ciências e Matemática, do Programa de Doutorado da Rede
Amazônica de Educação em Ciências e Matemática, Área de
Concentração Educação em Ciências, Linha de Pesquisa:
Formação de Professores, do Polo Acadêmico da Universidade
Federal do Mato Grosso, sob orientação da Prof.ª Dr.ª Terezinha
Valim Oliver Gonçalves (UFPA), como exigência para a
obtenção do título de Doutor em Educação em Ciências e
Matemática.

BELÉM–PA
2016
Dados Internacionais de Catalogação na Fonte.

D155s Ribeiro, Marcel Thiago Damasceno.


Saberes Científicos e Pedagógicos de Conteúdo Expressos por Professores
Egressos do Programa de Bolsa de Iniciação à Docência em Química da UFMT / Marcel
Thiago Damasceno Ribeiro. - 2016
161f.: il. color; 30 cm.

Orientadora: Terezinha Valim Oliver Gonçalves.


Tese (doutorado) - Universidade Federal de Mato Grosso, Rede Amazônica de
Educação em Ciências e Matemática, Programa de Pós-Graduação em Ensino de
Ciências e Matemática, Cuiabá, 2016. Inclui bibliografia.

1. Pesquisa Narrativa. 2. Formação de Professores de Química.


3. Iniciação à Docência. 4. Saberes Docentes. I. Título.

Ficha catalográfica elaborada automaticamente de acordo com os dados fornecidos pelo (a) autor (a).
Permitida a reprodução parcial ou total, desde que citada à fonte.
UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ
UNIVERSIDADE DO ESTADO DO AMAZONAS
REDE AMAZÔNICA DE EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS E MATEMÁTICA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS E MATEMÁTICA
POLO ACADÊMICO UFMT

TESE DE DOUTORADO

SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDO


EXPRESSOS POR PROFESSORES EGRESSOS DO PROGRAMA DE
BOLSA DE INICIAÇÃO À DOCÊNCIA EM QUÍMICA DA UFMT
Autor: Marcel Thiago Damasceno Ribeiro
Orientadora: Prof.ª Dra. Terezinha Valim Oliver Gonçalves

Este exemplar corresponde à redação final da tese a ser defendida por


Marcel Thiago Damasceno Ribeiro sob aprovação da Comissão
Julgadora.
Data: 13 de dezembro de 2016.

Banca Examinadora:

BELÉM–PA
2016
À minha mãe Antônia Rosangela Damasceno Ribeiro, que
sempre viveu sua vida em função de seus filhos. Registro agora,
mais uma vez, minha gratidão pelo carinho e amor que sempre
me ofertou.
É preciso que o formando, desde o princípio mesmo da sua
experiência formadora, assumindo-se como sujeito também da
produção do saber, se convença definitivamente de que ensinar
não é transferir conhecimento, mas criar possibilidades para
sua produção ou a sua construção.

Paulo Freire
AGRADECIMENTOS

A Deus, pelo o dom da minha vida, por me presentear com pessoas especiais nesta
jornada, pelas oportunidades que me deu e pelos desafios que me lançam ao crescimento.
À Professora Doutora Terezinha Valim Oliver Gonçalves, pelo seu acolhimento
sensível e carinhoso, pelo respeito dispensado em minha travessia, e por sua mediação
científica no desenvolvimento de meu trabalho de doutoramento. A minha gratidão!
À minha mãe, Antônia Rosangela Damasceno Ribeiro e minhas irmãs Katiúscia
Paula D. Ribeiro e Mayara Mayra D. Ribeiro que, apesar de todas as dificuldades impostas
pela vida, sempre estivemos unidos.
Aos meus sobrinhos-filhos (Joseany, Victor Hugo e Maria Antônia) e minhas
filhinhas (Branquinha, Belinha e Charlotte) por deixarem meus dias mais alegres e suaves
nessa travessia do doutorado.
À minha querida avó, Lenir de Oliveira Ribeiro (in memoriam), pelas doces
lembranças da minha infância.
Ao meu pai, Joadirson de Oliveira Ribeiro que, apesar da ausência, sempre vibra e
se orgulha de minhas conquistas.
Ao meu grande amigo e companheiro, Claudiney Pereira de Souza, sempre presente
me auxiliando e ajudando nos momentos mais difíceis.
Ao Laboratório de Pesquisa e Ensino de Química – LabPEQ/UFMT, na pessoa da
Prof.ª Dra. Irene Cristina de Mello, agradeço pela amizade, acolhida e pela oportunidade de
desenvolvimento pessoal e profissional.
Aos professores do Departamento de Química da UFMT, pela amizade e partilha de
experiências profissionais.
Aos examinadores internos, Professora Doutora Elizabeth Antonia Leonel de
Moraes Martines – UNIR/REAMEC, e Professor Doutor Tadeu Oliver Gonçalves –
UFPA/REAMEC, e examinadores externos, Professora Doutora Andrela Garibaldi Loureiro
Parente– UFPA, Professora Doutora France Fraiha-Martins – UFPA por terem aceito o
convite e por enriquecerem este trabalho com suas brilhantes e certeiras contribuições.
Aos professores do Programa de Pós-Graduação em Educação em Ciências e
Matemática da Rede Amazônica de Educação em Ciências e Matemática, que contribuíram
nas disciplinas para meu crescimento intelectual.
À FAPEMAT, pelo auxílio das bolsas trimestrais.
Aos meus amigos de doutorado, Glauce Viana, Eliane, Kátia, Nídia, Anderson,
Eberson, Edilberto, Felício, Nério, Evanil, Sandra Neves, pessoas especiais que me apoiam,
acompanham e com quem compartilhei as conquistas e as preocupações desta caminhada.
Às professoras colaboradoras dessa pesquisa, Curie, Mayer, Franklin e Meitner,
pelos momentos de reflexão e (auto) formação proporcionados.
Agradeço, enfim, a todos que contribuíram para a construção desta tese e da minha
história. Muito obrigado!
RESUMO

Este trabalho de doutorado se insere no âmbito das pesquisas que buscam aprofundar a
compreensão dos Saberes Docentes e Formação de Professores de Química e Iniciação à
Docência em Química para a Educação Básica. Nesse sentido, apresento o problema da
pesquisa: Como se configuram e se expressam saberes científicos e pedagógicos de conteúdos
químicos subjacentes à docência de professores egressos do Programa de Bolsa de Iniciação
à Docência em Química da UFMT, ao relatarem o ensino de Química que realizam na
Educação Básica? Assumo a Pesquisa Narrativa como método de pesquisa, pois os
pressupostos da pesquisa narrativa possibilitam ao pesquisador a sistematização das
experiências vividas pelos professores no contexto educacional e o estabelecimento de
relações entre os conhecimentos dos professores sobre o processo de produção de seus saberes
e de como trabalham com o saber produzido. Esta pesquisa tem como sujeitos quatro
pibidianos egressos do curso de Licenciatura em Química da UFMT, campus Cuiabá-MT, que
estão atuando como professores de Química na Educação Básica. Concernente ao problema
de pesquisa, optei pelos seguintes instrumentos investigativos: questionário, tendo em vista a
caracterização dos sujeitos; depoimentos dos sujeitos envolvidos na pesquisa sob a forma de
entrevista semiestruturada, registros em áudio do grupo focal realizado com os professores
egressos e análises de documentos (como PPC da Licenciatura em Química, campus Cuiabá,
da estrutura curricular de 1997/1 e 2010/1 e dos Subprojetos de Química do PIBID dos editais
de 2007 e 2011). Para analisar os textos de campo e produzir os textos de pesquisa, adotei a
Análise Textual Discursiva, que corresponde a uma metodologia de análise de dados e
informações de natureza qualitativa com o propósito de produzir novas compreensões sobre
as narrativas investigadas. Assumo a tese de que a base de saberes científicos e pedagógicos
de conteúdo necessários ao ensino de Química pode ser catalizada na formação inicial pela
participação em projetos de iniciação à docência no ambiente escolar desde o início do curso,
o que potencializa a produção de saberes sobre a docência e práticas pedagógicas
diferenciadas com vistas à educação para a cidadania. Dessa forma, pretendo, portanto, com
os resultados obtidos com a presente tese, que estes possam suscitar ideias para o
desenvolvimento de políticas públicas e curriculares para a formação de professores de
Química para a Educação Básica, pois os resultados evidenciam que os saberes científicos e
pedagógicos de conteúdo considerados como necessários à formação do professor são um
exemplo do esforço intelectual que o docente tem de fazer na compreensão de um corpo de
conhecimentos necessários à prática pedagógica. Entendo que esses conhecimentos têm de ser
abordados na formação inicial. Por isso, o rompimento com o modelo de formação que
prioriza a teoria em detrimento da prática não pode significar um currículo de
supervalorização da prática em detrimento a formação teórica, mas sim uma abordagem
dialética desses modelos na formação do profissional.

PALAVRAS-CHAVE: Pesquisa Narrativa - Formação de Professores de Química –


Iniciação à Docência - Saberes Docentes.
ABSTRACT

This doctoral work is part of the research that seeks to deepen the understanding of Teaching
Knowledge and Teacher Training in Chemistry and Initiation to Teaching in Chemistry for
Basic Education. In this sense, I present the research problem: How are scientific knowledge
and pedagogical knowledge of chemical contents underlying the teaching of professors who
are graduates of the Bolsa de Iniciação da Educação em Química da UFMT Program, when
they relate the teaching of Chemistry that they carry out in the Basic education? I assume
Narrative Research as a research method because the presuppositions of narrative research
enable the researcher to systematize the experiences lived by the teachers in the educational
context and the establishment of relationships between the teachers' knowledge about the
production process of their knowledge and how they work With the knowledge produced.
This research has as subjects four pibidians graduates of the degree in Chemistry of the
UFMT, campus Cuiabá-MT, who are acting as teachers of Chemistry in Basic Education.
Concerning the research problem, I opted for the following investigative instruments:
questionnaire, in view of the characterization of the subjects; Interviews of the subjects
involved in the research in the form of a semi-structured interview, audio recordings of the
focal group performed with the egressed teachers and document analyzes (such as PPC of the
Chemistry Degree, Cuiabá campus, of the curriculum structure of 1997/1 and 2010/1 And of
the Chemical Subprojects of PIBID of the 2007 and 2011 calls for proposals). In order to
analyze the field texts and produce the research texts, I adopted Discursive Textual Analysis,
which corresponds to a methodology of data analysis and information of a qualitative nature
with the purpose of producing new understandings about the narratives investigated. I assume
that the base of scientific knowledge and pedagogical content necessary for the teaching of
Chemistry can be catalyzed in the initial formation by the participation in projects of initiation
to teaching in the school environment since the beginning of the course, which potentiates the
production of knowledge about Teaching and differentiated pedagogical practices with a view
to education for citizenship. Thus, I intend, therefore, with the results obtained with the
present thesis, that they may elicit ideas for the development of public and curricular policies
for the training of Chemistry teachers for Basic Education, since the results show that the
scientific and Pedagogical content considered necessary for teacher training are an example of
the intellectual effort that the teacher has to make in the understanding of a body of
knowledge necessary for pedagogical practice. I understand that such knowledge has to be
addressed in initial training. Therefore, the break with the training model that prioritizes
theory to the detriment of practice can not mean a curriculum of overvaluation of practice
over theoretical training, but rather a dialectical approach of these models in professional
training.

KEYWORDS: Narrative Research - Training of Teachers of Chemistry - Introduction to


Teaching - Teaching Knowledge.
LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Figura 01 - Desenho estratégico/interacionista do Programa PIBID........................ 56


Figura 02 - O Reservatório de Saberes em Gauthier et al. ...................................... 70
Figura 03 - Saberes da Docência em Pimenta.......................................................... 73
Figura 04 - Base de Conhecimentos na Perspectiva de Shulman............................. 74
Figura 05 - Fios Condutores dos Saberes Docentes em Tardif................................ 84
Figura 06 - Tipologia dos Saberes Docentes............................................................ 92
Figura 07 - Focos de Interesse da Química............................................................... 107
Figura 08 - Aspectos do conhecimento químico...................................................... 108
Figura 09 - O tubo de raios catódicos simples, usado por J. J. Thomson................. 117
Figura 10 - Modelo atômico proposto por J. J. Thomson......................................... 118
Figura 11 - Experimento de Rutherford sobre espalhamento de partículas (α)........ 119
Figura 12 - Modelo Atômico proposto por Rutherford............................................ 120
Figura 13 - Transferência de energia para os elétrons, segundo Bohr...................... 122
LISTA DE TABELAS

Tabela 1 - Quantitativo de Egressos do Curso de Licenciatura em Química da


UFMT de 2009/1 a 2014/1....................................................................... 36
Tabela 2 - Distribuição da Carga Horária do Curso de Licenciatura em Química
2010/1...................................................................................................... 53
Tabela 3 - Distribuição da Carga Horária do PCC do Curso de Licenciatura em
Química 2010/1........................................................................................ 54
LISTA DE QUADROS

Quadro 1 - Classificação e Particularidades das Pesquisas sobre Saberes


Docentes................................................................................................... 92
Quadro 2- Características dos Modelos Didáticos.................................................... 96
Quadro 3 - Organização dos Modelos Didáticos das Professoras Colaboradoras…. 97
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ABNT – Associação Brasileira de Normas Técnicas


CAPES – Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior
CBQ – Congresso Brasileiro de Química
CCET – Centro de Ciências Exatas e Tecnológica
CCT – Centro de Ciências e Tecnologia
CNE – Conselho Nacional de Educação
CNPQ – Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico
COMFOR – Comitê de Formação Continuada dos Professores da Educação Básica
CONSEPE – Conselho Superior de Ensino, Pesquisa e Extensão
CRQ – Conselho Regional de Química
CTSA – Ciência, Tecnologia, Sociedade e Ambiente
DCN – Diretrizes Curriculares Nacionais
DEB - Diretoria de Educação Básica Presencial
DESUP – Diretoria de Supervisão
ECODEQC - Encontro Centro-Oeste de Debates sobre Ensino de Química e Ciências
EDEQ - Encontro de Debates sobre Ensino de Química
ETFMT – Escola Técnica Federal de Mato Grosso
ENADE – Exame Nacional de Desempenho de Estudantes
ENEM – Exame Nacional do Ensino Médio
ENEQ – Encontro Nacional de Ensino de Química
ENNEQ - Encontro Norte-Nordeste de Ensino de Química
ESEQ - Encontro Sudeste de Ensino de Química
FE – Faculdade de Educação
IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
IES – Instituições de Ensino Superior
IFMT – Instituto Federal de Mato Grosso
INEP – Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira
IQ – Instituto de Química
LabPEQ – Laboratório de Pesquisa e Ensino de Química
LDB – Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
MEB – Movimento de Educação de Base
MEC – Ministério da Educação
MEC – Ministério da Educação e Cultura
OCNEM – Orientações Curriculares Nacionais para o Ensino Médio
PARFOR - Plano Nacional de Formação para o Magistério da Educação Básica
PCC – Prática como Componente Curricular
PCK – Pedagogical Content Knowledge
PCKC – Pedagogical Content Knowledge Chemicals
PCNEM - Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Médio
PDE - Plano de Desenvolvimento da Educação
PDI - Programa de Desenvolvimento Institucional
PEQ – Prática de Ensino de Química
PIBID – Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência
PNE – Plano Nacional de Educação
PPC – Projeto Pedagógico de Curso
PPGECEM – Programa de Pós-Graduação em Educação em Ciências e Matemática
PPP – Projeto Político Pedagógico
PROEG – Pró-Reitoria de Ensino de Graduação
PROUNI – Programa Universidade para Todos
PUC/SP - Pontifícia Universidade Católica de São Paulo
REAMEC – Rede Amazônica de Educação em Ciências e Matemática
REUNI – Reestruturação e Expansão das Universidades Federais
SBQ – Sociedade Brasileira de Química
SECADI – Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão
SEDUC/MT – Secretaria do Estado de Educação de Mato Grosso
SEMIPEQ – Semana de Minicursos das Práticas de Ensino de Química da UFMT
SESu – Secretaria de Educação Superior
SIGA – Sistema de Informação e Gestão Acadêmica
TCC – Trabalho de Conclusão de Curso
UFMT – Universidade Federal de Mato Grosso
USP – Universidade de São Paulo
SUMÁRIO

INTRODUÇÃO................................................................................................................ 16
I - PERCURSOS VIVIDOS: OPÇÕES DE UM CAMINHAR................................... 18
Reflexões Sobre o Movimento de Construção do Objeto de
Investigação....................................................................................................................... 23

II - O CAMINHAR DA INVESTIGAÇÃO: DA DEFINIÇÃO


METODOLÓGICA AO CENÁRIO E SUJEITOS DO PROCESSO........................ 30
Instrumentos de Registro de Informações e a Composição dos Textos de
Campo................................................................................................................................ 33
Cenário da Pesquisa e Seleção dos Sujeitos...................................................................... 35
Caracterização dos Sujeitos............................................................................................... 37
Análise de Resultados: Análise Textual Discursiva.......................................................... 39

III - FORMAÇÃO INICIAL E INICIAÇÃO À DOCÊNCIA EM QUÍMICA NA


UFMT: UMA ANÁLISE DOCUMENTAL................................................................... 42
O Curso de Licenciatura em Química da UFMT campus Cuiabá: Situando o Contexto
da Formação dos Sujeitos Investigados............................................................................. 45
O Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência na UFMT............................ 55
Itinerário do Subprojeto Química – PIBID em Cuiabá na UFMT..................................... 59

IV - EDUCADORES QUÍMICOS INICIANTES E SABERES NECESSÁRIOS À


ATUAÇÃO PROFISSIONAL: DAS NARRATIVAS DE SI A MODELOS
DIDÁTICOS ADOTADOS............................................................................................. 65
A Base de Conhecimentos dos Professores em Questão: Tipologias e Concepções......... 66
Trajetórias da Formação Inicial e Continuada dos Educadores Químicos egressos do
PIBID................................................................................................................................. 77
Iniciação à Docência e os Saberes Necessários à Atuação Profissional na Perspectiva
de Tardif ........................................................................................................................... 82
Modelos Didáticos e Aproximação da Realidade Educativa............................................ 93

V - SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDOS


QUÍMICOS: EPISÓDIOS DE AULAS DO ENSINO MÉDIO................................... 103
Saberes Científicos na Educação Básica: O Ensino de Química em Foco........................ 104
Aspectos Epistemológicos do Conhecimento Científico em Gaston Bachelard............... 109
Modelos Atômicos em Destaque: O que a literatura Química atual aponta? ................... 114
Episódios de Aula sobre Modelos Atômicos..................................................................... 125
Ácidos e Bases em Questão: O que a literatura Química atual apresenta? ...................... 134
Episódios de Aula sobre Ácidos e Bases........................................................................... 137

CONSIDERAÇÕES PROVISÓRIAS............................................................................ 145


REFERÊNCIAS............................................................................................................... 154
16

INTRODUÇÃO

A arte de lembrar remete ao sujeito a observar-se numa dimensão genealógica, como


um processo de recuperação do eu, e a memória narrativa marca um olhar sobre si
em diferentes tempos e espaços, os quais se articulam com as lembranças e as
possibilidades de narrar às experiências (Elizeu Clementino de Souza).

Este trabalho foi organizado de forma a viabilizar a identificação dos caminhos


construídos e percorridos, dos aportes teóricos adotados assumidos e dos significados
construídos/reconstruídos ao longo do percurso formativo e investigativo.
Em minha trajetória, como professor formador, algumas reflexões têm estado
presentes no meu dia a dia, na perspectiva de responder perguntas seminais que norteiam este
trabalho, tais como: O que os professores precisam saber para poder ensinar e para que seu
ensino possa conduzir as aprendizagens dos seus educandos? Como os professores constroem
conhecimentos sobre o ensino? O que deveria saber todo aquele que planeja exercer esse
ofício? Qual a base de conhecimento indispensável para a atuação profissional dos
profissionais em Educação Química? Levanto essas questões reflexivas com o desejo de
aprender e continuar progredindo na carreira, de contribuir para a melhoria da formação de
professores de Ciências e Química, motivos que me conduziram a este trabalho de tese.
Considero que a tessitura desta tese corresponde a alinhavos feitos sobre o chão de
onde pisa quem fez a tessitura. Novas tramas poderiam ser explicitadas, sob outros olhares,
outros chãos. Assim, sigo com a pretensão em narrar as experiências das trajetórias formativas
e as práticas pedagógicas de professores egressos do Programa de Bolsa de Iniciação à
Docência em Química e do curso de Licenciatura em Química da UFMT.
Neste trabalho, além das questões explicitamente abordadas, podem-se encontrar
muitas outras questões fundamentais que convidam a prolongar a reflexão, a questionar os
modelos, os dispositivos, as práticas e, fundamentalmente, a relação com o saber e a maneira
de abordar o estudo do processo de ensino-aprendizagem em Química, convidando,
constantemente, a voltar ao essencial.
Na primeira seção, focalizo a trajetória de minha narrativa pessoal e as reflexões
sobre o movimento de busca pelo objeto desta investigação.
Na segunda seção, apresento a opção metodológica da pesquisa, o cenário e a seleção
dos sujeitos, os instrumentos de registros de informações, a composição dos textos de campo,
a caracterização dos sujeitos e a proposta das análises dos resultados.
17

Na terceira seção, narro a eclosão de um novo ramo da Química na área de Educação


Química e construo o histórico da constituição da formação inicial de professores de Química
da UFMT do Campus Cuiabá e a política de valorização e incentivo à docência por meio do
PIBID na UFMT dos sujeitos de pesquisa envolvidos.
Na quarta seção, faço uma revisão sistemática sobre os saberes necessários à atuação
profissional com o objetivo de buscar fundamentos teóricos conceituais norteadores desta
investigação sobre saberes e busco trazer as análises das trajetórias de formação inicial e
continuada obtidas dos diálogos com os sujeitos dessa pesquisa, durante a entrevista
semiestruturada, bem como narrativas expressas nas dinâmicas do tempo de sua formação e
de sua história, buscando evidenciar como esses professores constroem, trabalham e
expressam os saberes necessários à docência e apresento o modelo didático de cada professor
colaborador da pesquisa.
Na quinta seção, focalizo os Saberes Científicos no contexto do ensino de Química e
os aspectos epistemológicos na perspectiva de Bachelard (1996) e busco a compreensão de
como se configuram os Saberes Científicos e Saberes Pedagógicos dos Conteúdos Químicos,
na perspectiva de Shulman (1986), subjacentes à docência dos sujeitos investigados, por meio
dos relatos de episódios de aulas com conceitos químicos do Ensino Médio, sendo que para
cada conceito trago o que a literatura Química atual discorre sobre esses assuntos.
Dessa forma, encerro o texto desta tese, evidenciando a provisoriedade e a
continuidade dos processos formativos, pois a realidade de formação e desenvolvimento
profissional que foi analisada pode se modificar, uma vez que a formação, tanto inicial quanto
continuada está em constante transformação, em perpétuo movimento, tal como uma sinfonia
sempre inacabada.
18

I - PERCURSOS VIVIDOS: OPÇÕES DE UM CAMINHAR

Compreender/viver a formação do conhecimento e o conhecimento da formação


significa instrumentalizar-se com uma condição ímpar para definir situações e
decidir sobre a vida em qualificações (Roberto Sidnei Macedo).

Inicio esse texto narrando experiências vivenciadas ao longo da minha vida e


formação, inspirando-me em Josso (2004), quando discute o processo de reflexão de um
caminhar para si. Faço isto ao revisitar o passado, olhando meu percurso de formação com o
olhar do presente, evidenciando as minhas práticas formativas inerentes aos percursos
acadêmicos e profissionais e outras experiências de aprendizagens significativas, que me
permitem um movimento de (auto) formação e (auto) conhecimento que, de acordo com Josso
(2004, p. 60): “poderá inaugurar a emergência de um eu mais consciente e perspicaz para
orientar o futuro da sua realização e reexaminar, na sua caminhada, os pressupostos das suas
opções”.
Nesse sentido, a reflexão sobre aquilo que foi formador na minha vida me permite
situar o que hoje eu penso e faço dessas experiências e como elas me levaram ao encontro do
objeto e objetivo desta proposta investigativa. E é com essa ambiência experiencial que
conduzo a produção desta tese, trazendo como aporte teórico especialmente as ideias de
Gonçalves (2000), Josso (2004), Nóvoa (2007), Fraiha-Martins (2014).
Sobrinho de professora, desde a infância a docência me sondava, pois quando eu
tinha doze anos de idade, em virtude do divórcio dos meus pais, fui morar com uma tia que
era professora de Ciências e Matemática de ensino supletivo em escola pública em Cuiabá-
MT. Cursei o final do Ensino Fundamental em escola pública, residindo com essa tia, e todas
as noites eu a acompanhava em suas aulas para a 1ª e 2ª séries do Ensino Fundamental para
jovens e adultos. Assim, ainda criança, cursando a 2ª etapa do Ensino Fundamental, eu
auxiliava os alunos de minha tia, tirando dúvidas de Matemática, nascendo daí minha paixão
pela docência. A partir da experiência de viver com minha tia e pelo incentivo aos estudos que
ela me dispensava, sempre tive a convicção de que seria ser professor.
No ano de 1996, voltei a morar com minha mãe e minhas duas irmãs, e tive que
começar a trabalhar desde jovem para ajudar na subsistência da família. Meu primeiro
19

emprego foi em uma escola de informática como office-boy1, e nesse mesmo ano comecei a
fazer o Ensino Médio na então Escola Técnica Federal de Mato Grosso (ETF/MT), nos dias
atuais denominada Instituto Federal de Mato Grosso (IFMT), fazendo o Ensino Médio
integrado com o Curso Técnico em Telecomunicações. Nesse período, tive excelentes
professores de Química, que me despertaram o fascínio por essa ciência e, como estudante de
Ensino Médio, sempre me destacava nas aulas e avaliações de Química, bem como atuando
como monitor dessa disciplina, auxiliando colegas que tinham dificuldades de aprendizagem.
A partir daí, comecei a ter em mente que o ramo profissional que eu realmente pretendia
seguir não era a Engenharia Elétrica para dar continuidade ao meu curso técnico da área
eletroeletrônica e, sim, o ramo da Química.
No ano de 2000, prestei vestibular para o curso de Licenciatura em Química e passei
em 5º lugar na seleção da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT). A escolha pelo
curso de licenciatura desde o início foi consciente, uma vez que queria fazer um curso que me
habilitasse a ser professor, pois a partir das experiências de docência, em minha infância, com
minha tia, como disse anteriormente, eu já tinha essa pretensão.
No segundo ano de graduação, eu comecei a lecionar na Educação Básica como
professor interino em escola pública e, de carteira assinada, em escola particular, ensinando as
disciplinas de Química e Matemática, devido à falta de profissionais habilitados nessa área
para o Ensino Médio e para poder me manter e ajudar financeiramente minha família. No meu
período de graduação, eu lecionava no período matutino para a Educação Básica e no período
vespertino e noturno cursava as disciplinas do curso de Química na UFMT.
O início de minha carreira docente, portanto, ocorreu em concomitância a minha
formação inicial, como narrei anteriormente, quando vivi as fases de exploração e de
estabilização como proposto por Huberman (2007). De acordo com esse autor, na fase de
exploração o professor escolhe, provisoriamente, a sua profissão, mas no meu caso a escolha
se deu, sobretudo pela necessidade imediata de trabalho, e iniciei meu trabalho por meio de
tentativas e erros, pois não tinha o amálgama dos saberes disciplinares, curriculares e
pedagógicos inerentes à profissão docente, que pudessem subsidiar a minha prática
pedagógica. Contudo, eu era sempre muito cuidadoso com as minhas aulas e estudioso, pois
como eu sentia a necessidade de ser aceito no meu círculo profissional, eu planejava as
minhas aulas e pegava orientações com professores mais experientes para que tudo pudesse

1
Lançarei mão do uso da fonte do texto em negrito quando intenciono chamar a atenção do leitor para algum
termo ou expressão.
20

dar certo, pois eu já tinha a preocupação de transformar os conhecimentos científicos em


conhecimentos escolares, mesmo sem conhecer o conceito de mediação didática2.
Ainda na fase de exploração, experimentei o que Simon Veenman (1984) chama de
(reality shock) choque da realidade, pois o meu primeiro ano de docência foi de intenso
processo de aprendizagem, sobretudo no contexto da prática. Ensinar Química na Educação
Básica, naquele contexto, se apresentava muito complexo para mim, pois essa ciência tem, de
modo equivocado no meu entender, parte de seu objeto de estudo muito distante do educando,
por exemplo, átomos, moléculas, íons, elétrons, mol..., são conceitos que não existem no
senso comum das pessoas, como ocorre com os principais assuntos da Física, tais como:
corpo, massa, tempo e velocidade, que fazem parte do cotidiano da maioria da população.
Mais tarde, passei a compreender, com Chassot (1993), o quanto a situação da
Química é complexa. Nos dias atuais, considero que o meu choque da realidade se deu em
virtude, também, da fase sincrética de saberes dos conteúdos específicos, curriculares e
pedagógicos em que eu me encontrava em minha formação, pois só fui começar a atingir a
síntese destes saberes ao concluir a minha formação inicial (SHULMAN, 1986;
VASCONCELLOS, 2005).
No decorrer dessa fase de exploração como docente, em paralelo a minha formação
inicial na graduação, passei para a fase de estabilização, pois comecei a ter destaque nas
instituições onde eu lecionava. Nessa fase, eu já conseguia recontextualizar ou ressignificar os
meus saberes experienciais com os saberes que eram aprendidos na academia no contexto de
minha prática docente (TARDIF, 2012).
Ainda na minha formação inicial em Licenciatura em Química na UFMT, da qual
hoje eu integro o quadro docente e, ao mesmo tempo, me desenvolvo profissionalmente,
apesar de ter sido formado em uma estrutura curricular no formato 3+1, como apresento na
seção III desta pesquisa, tive excelentes professores que me ajudaram e incentivaram ainda
mais minha paixão pela Química, pela Educação e, consequentemente, pela Docência, e hoje
tenho o privilégio de tê-los como meus colegas de trabalho.
Desde o ano de 2001, atuando com as disciplinas de Química e Matemática na
Educação Básica em escolas públicas e privadas em Cuiabá-MT, a modalidade com que mais

2
Utilizo a expressão mediação didática, pois defendo que o termo transposição didática não representa o
processo de reconstrução de saberes na instituição escolar. O termo de transposição didática tende a estar
associado à ideia de reprodução, movimento de transportar de um lugar para outro, sem alterações. Dessa forma,
assumo a expressão mediação didática na mesma perspectiva que Lopes (1997, p. 564): “não no sentido
genérico, ação de relacionar duas ou mais coisas, de servir de intermediário ou “ponte”, de permitir uma
passagem de uma coisa a outra. Mas no sentido dialético: processo de constituição de uma realidade através de
mediações contraditórias, de relações complexas, não imediatas, com um profundo sentido de dialogia”.
21

me identificava a trabalhar era a Educação de Jovens e Adultos (EJA) e, anos mais tarde ao
ser aprovado em concurso público para professor da Rede Pública Estadual de Mato Grosso,
tomei posse e tive a experiência de atuar como coordenador pedagógico por dois anos no
maior Centro de Educação de Jovens e Adultos (CEJA3) de Mato Grosso, o CEJA Cesário
Neto. Ser professor da EJA na Educação Básica era um grande desafio, pois eu tinha
necessidade de aprender com novos contextos, desconstruindo barreiras veiculadas pelo
pensamento conservador, respeitando os saberes dessa parcela da população mantida à
margem do processo educativo, como maneira de enfrentamento da exclusão social. Percebia
também que eu possuía marca identitária semelhante e, ao mesmo tempo, singular, com meus
educandos, como se nós compartilhássemos o encontro de diversas experiências: o encontro
da desigualdade de oportunidades; da negação do direito à educação e à formação; o encontro
das jornadas duplas ou triplas de trabalho; o encontro do desemprego ou do subemprego; e,
consequentemente, o encontro da luta pela afirmação do direito na busca de construção de um
projeto apropriado aos diferentes segmentos marginalizados a quem a EJA se destina
(RIBEIRO, 2009).
Após o término da minha formação inicial na graduação e atuando como docente na
Educação Básica, eu compreendia que necessitava de mais ferramentas teóricas para a minha
prática educativa e, consequentemente, eu buscava concretizar o meu projeto pessoal de ser
um bom professor. Nesse sentido, no ano de 2005 fiz um curso de Pós-Graduação lato sensu
em Didática e Docência no Ensino Superior no Centro Universitário de Várzea-Grande
(UNIVAG). A partir daí, começou o meu despertar para a compreensão do fenômeno da
educação por meio da pesquisa. A opção por essa formação continuada ocorreu em virtude de
ser a única disponível à época voltada para educação na região de Cuiabá e Várzea-Grande, -
MT.
Movido pelo desejo de ampliar a minha base de conhecimentos e progredir na
carreira, conciliando interesses pessoais com profissionais, no mês de novembro de 2006 fiz a
seleção de Mestrado em Educação na Universidade Federal de Mato Grosso e ingressei na
linha de Movimentos Sociais no Grupo de Pesquisa Educação, Jovens e Democracia sob a

3
No ano de 2008, o Estado de Mato Grosso através da SEDUC/MT, destacou-se no cenário nacional como um
dos Estados que em sua ação de governo priorizou a Educação de Jovens e Adultos. Com o decreto nº 1.123, de
28 de janeiro de 2008, regulamenta a criação de Centros de Educação de Jovens e Adultos – CEJAS, que tem por
objetivo constituir identidade própria para a modalidade Educação de Jovens e Adultos e oferecer formas
diferenciadas de atendimento que compreendam a educação formal e não-formal integradas ao mundo do
trabalho, reconhecendo as especificidades dos sujeitos participantes e dos diferentes tempos e espaços
formativos.
22

orientação inicial da professora Dra. Maria Aparecida Morgado, doutora em Psicologia Social
pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUCSP).
Minha intenção de pesquisa no curso de mestrado nasceu de uma variedade de
situações, observações e questionamentos ocorridos durante minha vida profissional como
professor de Química da rede estadual de Educação Básica em Mato Grosso, na modalidade
de ensino Educação de Jovens e Adultos. Essas situações foram relacionadas ao meu desejo
de entender a causa do número expressivo de jovens participantes nessa modalidade e poder
contribuir e melhorar o ensino de Química nessa mesma modalidade de ensino.
Como minha intenção inicial na pesquisa era compreender o fenômeno da Juventude
na EJA, fiz a opção de seleção de Mestrado na linha de Movimentos Sociais para um Grupo
de Pesquisa que investigava o fenômeno juvenil brasileiro e mato-grossense. No entanto, ao
final do primeiro ano, minha orientadora, Maria Aparecida Morgado, teve problemas de
saúde, não podendo assim seguir com a orientação de minha dissertação, sendo substituída
pela professora Dra. Irene Cristina de Mello, doutora em Educação na linha de Ensino de
Ciências pela Universidade de São Paulo (USP).
No meu segundo ano de Mestrado, com a nova orientação, migrei da linha de
Movimentos Sociais para a de Teorias e Práticas Pedagógicas do Grupo de Pesquisa Ensino
em Ciências e me integrei, também, ao Laboratório de Pesquisa e Ensino de Química
(LabPEQ). A partir da contribuição e orientação da nova orientadora, minha pesquisa
continuou no enfoque do fenômeno da juventude na EJA, mas também passou a ter a
preocupação de contribuir para a formação de professores de Química que atuam nessa
modalidade da Educação Básica. Em abril de 2009, defendi minha dissertação intitulada:
Jovens na Educação de Jovens e Adultos e sua Interação com o Ensino de Química.
Em maio de 2009, já terminado o mestrado e ainda atuando como professor de
Química na Educação Básica, ingressei na carreira docente no Ensino Superior como
professor substituto e, no mesmo ano, no mês de outubro via concurso público como
professor efetivo para atuar com as disciplinas de Práticas de Ensino no curso de Licenciatura
em Química do campus Cuiabá na UFMT.
Minha trajetória como docente do Ensino Superior inclui, entre os vários percursos
formativos, a docência em curso de Licenciatura em Ciências Naturais e Matemática a
distância nos polos da Universidade Aberta do Brasil (UAB/UFMT) de Pontes e Lacerda e
Diamantino e Licenciatura em Química e Bacharelado em Química presencial no campus de
Cuiabá; a coordenação de curso de graduação (Licenciatura em Química/Departamento de
Química/ICET/UFMT) e de curso de pós-graduação lato sensu (Educação de Jovens e
23

Adultos para a Juventude) da Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade


e Inclusão (SECADI) do Ministério da Educação (MEC) ofertada pelo Comitê de Formação
Continuada dos Professores da Educação Básica (COMFOR/UFMT); a participação e
coordenação de projetos de extensão como a Semana de Minicursos das Práticas de Ensino de
Química (SEMIPEQ); a participação e coordenação do Programa de Tutoria em Química da
UFMT; a participação e coordenação do Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à
Docência em Química (PIBID).
Com o desejo de aprender e continuar progredindo na carreira, de contribuir para a
melhoria da formação de professores de Ciências e Química, motivos que me conduziram ao
ingresso no doutorado em Educação em Ciências e Matemática da Rede Amazônica de
Educação em Ciências e Matemática (PPGECEM/REAMEC) na linha de pesquisa Formação
de Professores.
No doutorado, passei a integrar o Grupo de Estudos e Pesquisas sobre Formação de
Professores (TRANS) FORMAÇÃO. Esse grupo de pesquisa situa-se no Programa de Pós-
Graduação em Educação em Ciências e Matemática da UFPA, e tem por finalidade investigar,
por meio da pesquisa qualitativa, tendo a abordagem narrativa e (auto) biográfica como uma
das práticas investigativas consolidadas, inovações e processos de formação de professores,
saberes construídos durante a prática docente, práticas e experiências de formação e
desenvolvimento profissional de professores em processos de formação inicial e continuada,
em processos de formação reflexiva e pesquisas sobre a prática docente na área de Educação
em Ciências (GONÇALVES, 2011).
Com o meu ingresso no grupo de pesquisa (Trans) formação e da realização de uma
disciplina eletiva de doutorado, que eu cursei no mês de março de 2014, em Belém-PA na
UFPA, pela REAMEC, intitulada Pesquisa Narrativa em Educação em Ciências e
Matemática, comecei a fazer a reflexão da busca do meu objeto de investigação, bem como a
definir meu método de pesquisa que apresento nos tópicos a seguir.

Reflexões Sobre o Movimento de Construção do Objeto de Investigação

A formação inicial de professores tem levantado discussões e ocupado um espaço


significativo no cenário nacional brasileiro a partir dos anos de 1990, sobretudo no âmbito dos
debates sobre a educação, em virtude das relações de interdependência que se estabelecem
entre formação e Educação Básica, chegando-se a afirmar que, em certa medida, essa
formação inicial dos professores tem impacto direto na qualidade da Educação Básica.
24

No âmbito dos cursos de graduação para formação inicial de professores ou nas


pesquisas científicas produzidas, essa formação se apresenta complexa diante dos inúmeros
desafios inerentes à profissão docente. A complexidade na formação vai além do ensino que
pretende uma mera atualização científica, pedagógica e didática, transformando-se na
possibilidade de criar espaços de participação, reflexão e formação para que as pessoas
aprendam e se adaptem para conviver com a mudança e com a incerteza (IMBERNÓN,
2011).
Se aceitar que a docência é uma profissão, de acordo com Imbernón (2011, p. 28)
“não será para assumir privilégios contra ou à frente dos outros, mas para que, mediante seu
exercício, o conhecimento específico do professor se ponha a serviço da mudança da
significação da pessoa”. Para Imbernón (2011), o conceito de “profissão” não é neutro e nem
científico,

Mas é produto de um determinado conteúdo ideológico e contextual; uma ideologia


que influencia a prática profissional, já que as profissões são legitimadas pelo
contexto e pelo conceito popular, uma parte do aparelho da sociedade que
analisamos e que deve ser estudado observando a utilização que se faz dele e a
função que desempenha nas atividades de tal sociedade (p. 28).

Nesta perspectiva, ser um profissional da educação significa participar na


emancipação das pessoas, ajudando-as a tornarem-se mais livres e menos dependentes do
poder econômico, político e social. Ao reconhecer a importância política e social da profissão
docente na emancipação das pessoas e suas complexidades inerentes à formação desses
profissionais, evidencia-se também que essa profissão docente em outros países e,
principalmente, no Brasil, tem pouco prestígio social e financeiro e, como consequência, os
cursos de licenciaturas são os menos atrativos aos jovens estudantes da Educação Básica, que
almejam cursar uma graduação. Imbernón (2006, p. 46), “analisando questões europeias em
relação aos professores, destaca a escassez deste profissional que é indicada por vários países
como resultado de uma profissão pouco atrativa, portanto, pouco valorizada na visão social”
(GATTI, 2013).
Sobre a desvalorização da profissão docente, de acordo com Gatti (2013, p. 153):

Múltiplos fatores associados ao movimento histórico-social são apontados como


levando à construção de uma representação social e dos seus profissionais, em geral
ancorada na ideia de desvalorização por sua formação rápida e fácil, na expressão de
vários agentes sociais, por seus salários, tipo de carreira, condição socioeconômica
ou de seu exercício como vocação ou missão, por amor e doação.
25

Discursos como o exercício da docência como vocação ou missão, por amor e


doação retiram o caráter de profissionalismo como central ao exercício da docência,
carregando dessa forma para a identidade dos professores apenas a marca de doação,
escurecendo o caráter fundamental de agente social da preservação e recriação da cultura
(GATTI, 2013).
Muitos problemas relacionados à qualidade da educação pública podem ser
explicados, fundamentalmente, por falta de professores habilitados e qualificados, em
especial, na área das Ciências da Natureza e Matemática. No Estado de Mato Grosso não é
muito diferente de outros estados federativos do Brasil. Há grande falta de professores com
formação acadêmica específica em Química, Física e Matemática, e os aspectos que
contribuem para isso, de acordo com Mello (2012), são as baixas remunerações do corpo
docente, insuficiência de formação inicial e continuada de professores, problemas de gestão
escolar, condições de trabalhos escolares precários, violência, desvalorização da escola e do
professor perante os educandos e a sociedade, o baixo nível de aprendizagem, dentre outros.
A falta de demanda de professores habilitados nessas áreas, além de ser algo preocupante,
demonstra um sinal de urgência e alerta aos gestores da educação brasileira.
Pesquisas, como a de Gatti (2013), enfocando o tema da valorização da docência,
revelam que tal aspecto está na dependência e relevância de valorizar a Educação Básica
como um todo. A esse respeito, diz a autora:

Essa valorização está centrada na construção de uma nova realidade no interior das
escolas públicas, um valor que só virá quando nessas escolas houver outras
condições de ambiência e trabalho. Imagem da educação pública vincula-se à
imagem da docência e vice-versa. Mais ainda, está na dependência, também, de se
atribuir à docência na Educação Básica uma condição profissional clara em seus
contornos e características, e nas formas de agir dentro das escolas, há que se gerar
uma conjunção dialética entre ações políticas em educação e movimentos
pedagógicos nas escolas. É essa conjunção que pode vir a criar novas representações
sociais sobre o valor da escola pública e o valor de seus professores (p. 156).

É nesse contexto, que surge como uma das atuais ações de políticas federais para a
formação de professores, no cenário nacional brasileiro, no ano de 2007, o Programa
Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência (PIBID), com a finalidade de apoiar a
formação de estudantes de licenciatura, visando aprimorar a formação inicial dos docentes,
valorizar o magistério e contribuir para a elevação da qualidade da Educação Básica. Sobre
esse Programa de Iniciação à Docência, em especial, no curso de Licenciatura em Química do
campus de Cuiabá da Universidade Federal de Mato Grosso, dou maiores detalhes na seção
III.
26

Ainda, na pauta das discussões sobre a profissionalização docente, várias


perspectivas se apresentam tendo em vista os muitos aspectos que incidem sobre o processo
da formação docente. Algumas perspectivas apontam para a necessidade de um Código de
Ética para o Magistério, para a atomização dessa formação e suas implicações para a
profissionalização da docência, os fundamentos da formação no processo inicial e continuado,
a importância da relação entre teoria e prática, e a base de conhecimento4 que constitui o
amálgama dessa formação, conforme discutem autores, tais como Shulman (1986; 1987),
Gonçalves e Gonçalves (1998), Gonçalves (2000; 2012), Tardif e Lessard (2009), Mizukami
(2011), Pimenta (2012); Tardif (2012); Gauthier et al. (2013), dentre outros.
Na contribuição desses debates, Gonçalves5 (2012) explicita que nas últimas décadas
tem havido interesse crescente pela problemática ligada à formação e ao desenvolvimento
profissional de professores e de formadores de professores, no âmbito da Educação
Matemática e Científica. Expressa sua relevância como temática desafiadora no contexto da
educação brasileira, sobretudo na realidade da população amazônica. Gonçalves (2012, p. 5)
afirma que: “Esta tem sido uma realidade em que os problemas e desafios pedagógicos usuais,
traduzidos no predomínio da lógica memorística e instrumental de ensino e aprendizagem,
potencializam-se por meio de processos de exclusão sócio-educacional”.
Nesta perspectiva, para Contreras (2002, apud GONÇALVES, 2012, p. 09):

O professor, sua formação, seu desenvolvimento profissional e os saberes que


servem de base para a sua prática educativa, importantes na constituição da própria
identidade docente, precisam ser investigados, analisados, comunicados e vistos
como processos não desvinculados das outras dimensões da ação, da
profissionalidade e da autonomia docente [grifo nosso].

De acordo com Therrien (2010), o professor funda o seu trabalho em uma dupla
competência oriunda e objeto de sua formação; a competência em um determinado campo

4
“Knowledge base” (base de conhecimento) expressão em inglês empregada, frequentemente, em um sentido
amplo, podendo englobar todos os saberes do docente necessários e indispensáveis à atuação profissional:
conhecimento do conteúdo, saber experiencial, conhecimento das crianças, conhecimento de si mesmo, cultural
entre outros (GAUTHIER et al., 2013, p. 18).
5
No dia 02/07/2012 para potencializar os estudos e pesquisas ligadas à formação e ao desenvolvimento
profissional de professores de Ciências e Matemática no âmbito da Amazônia Legal, a professora e pesquisadora
Dra. Terezinha Valim Oliver Gonçalves da Universidade Federal do Pará – UFPA do Instituto de Educação
Matemática e Científica – IEMCI, cadastrou um projeto de pesquisa junto ao Conselho Nacional de
Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) do edital universal/CNPq – nº 14/2012 intitulado “Saberes
Matemáticos e Científicos e Pedagógicos do Conteúdo expressos por professores que ensinam nos anos iniciais
do Ensino Fundamental na Amazônia Legal”. Este projeto interage com pesquisadores da UFMT e da UEA, por
meio da Rede Amazônica de Educação em Ciências e Matemática – REAMEC, na qual se situa o Programa de
Doutorado em Educação em Ciências e Matemática, programa esse em associação de IES em REDE da
Amazônia Legal.
27

disciplinar e a competência no campo pedagógico, ou seja, o saber dos conteúdos e o saber


ensinar. Esses conhecimentos são múltiplos e heterogêneos, moldados na relação dialética do
saber e do fazer, da teoria e da prática que na ecologia da sala de aula são confrontados com a
complexidade da vida da atual sociedade.
Para Gonçalves (2000), uma questão de suma importância na formação dos futuros
professores de Ciências e Matemática, tanto para o Ensino Fundamental quanto para o Ensino
Médio, diz respeito a quais conteúdos (saberes) profissionais são fundamentais para essa
formação. O autor complementa que:

Sabe-se que o conteúdo de Ciências e/ou Matemática isoladamente não basta e que
os conhecimentos pedagógicos “neutros” e dissociados dos conceitos de nada ou
muito pouco ajudam na tarefa docente. Que conhecimentos, então, são fundamentais
à prática profissional? Como desenvolvê-los durante a licenciatura? Que
estratégias/atitudes de formação seriam necessárias, tanto por parte do formador,
quanto do estudante universitário? Como os saberes da ação pedagógica podem ser
construídos? (2000, p. 25).

Defendo, com Maldaner (2006), que a atividade docente não deve se restringir
somente à aplicação de teorias, métodos, procedimentos e regras ensinadas no curso de
licenciatura, porque a prática profissional caracteriza-se pela incerteza, pela singularidade,
pelo conflito de valores, pela complexidade, para a qual nenhuma teoria pedagógica pode dar
conta de resolver os problemas, constituindo-se, portanto, em práticas que precisam ser
investigadas para serem melhoradas.
Diante desses pressupostos e com o objetivo de compreender melhor a base de
conhecimento indispensável para a atuação docente dos profissionais em Educação Química,
me proponho, nesta pesquisa a investigar os Saberes Científicos e Pedagógicos de
Conteúdos Químicos expressos por professores egressos do Programa de Bolsa de
Iniciação à Docência em Química da UFMT. Esses professores egressos tiveram a
oportunidade de participar de uma política pública do governo com vistas à iniciação e
valorização do magistério. Portanto, parto da premissa de que os sentidos que cada professor
egresso do curso de Licenciatura em Química do campus Cuiabá participante do Subprojeto
Química do PIBID da UFMT atribui às experiências vividas na sua formação inicial e com a
participação nesse programa é subjetivo e vinculado a outras experiências, com outros
sentidos (JOSSO, 2009). Nesses termos, almejo encontrar respostas às indagações que
expresso do seguinte modo:
28

 Que movimentos – teóricos, metodológicos e epistemológicos – de formação e


docência contribuem para a constituição dos professores egressos do Programa de Bolsa
de Iniciação à Docência da UFMT que ensinam Química na Educação Básica?
 Quais conteúdos de Química esses professores egressos ensinam na Educação
Básica (Ensino Fundamental e/ou Médio)?
Pretendo encontrar respostas às perguntas acima propostas, em busca de elucidar e
tecer significados às experiências de formação, e construir compreensão mais aprofundada a
respeito dos saberes científicos e pedagógicos de conteúdo (SHULMAN, 1986) expressos
pelos sujeitos participantes desta investigação. Diante do exposto, ao debruçar-me sobre essas
questões norteadoras apresento o problema de pesquisa: Como se configuram e se
expressam saberes científicos e pedagógicos de conteúdos químicos subjacentes à
docência de professores egressos do Programa de Bolsa de Iniciação à Docência em
Química da UFMT, ao relatarem o ensino de Química que realizam na Educação
Básica?
Ao buscar respostas às indagações norteadoras e ao problema de pesquisa, partirei
das experiências vividas6 desses professores egressos, pois compreendo, com Clandinin e
Connelly (2011), que as experiências são expressas pelas histórias que as pessoas vivem e
narram, quando falam de si. As pessoas vivem histórias e, ao contar essas histórias se
reafirmam, modificam-se e criam novas histórias. As histórias vividas e contadas educam a
nós mesmos e aos outros, incluindo-se os jovens e os recém-pesquisadores em suas
comunidades.
As memórias evocadas dessas histórias revelam como o passado e o presente estão
intimamente relacionados com a constituição de nossa identidade como profissionais
professores, revelando-se um caminho fecundo para a formação docente à medida que as
reminiscências desses sujeitos, a partir das narrativas, possam ensinar-lhes a compreender e
transformar suas maneiras de ser e estar na docência (CHAVES, 2005).
Nessa perspectiva, Cunha afirma que as “[...] narrativas provocam mudanças na
forma como as pessoas compreendem a si próprias e aos outros e, por este motivo, são
também importantes estratégias formadoras de consciência numa perspectiva emancipadora”.
(1997, p. 185).

6
O conceito de experiência de acordo com Josso (2004, p. 27) “apresenta-se como um conceito aglutinador dos
projetos de conhecimento da formação no decurso da vida”. A autora cita que um autor de referência quanto ao
conceito de experiência é John Dewey.
29

De acordo com Marques (2003), formar um professor não é simplesmente dotá-lo de


uma bagagem de conhecimentos e habilidades, mas é desenvolver nele a competência de aliar
a sensibilidade para os fatos empíricos à reflexão sobre os sentidos, que assumem no conjunto
das determinações amplas, que os fazem reais e historicamente situados. Essas são tarefas de
aprendizado longo, que exigem tempo contínuo de maturação, em que se encadeiam os
pequenos passos, tanto na história pessoal de cada educando e professor quanto na história
institucional dos cursos, pelos quais não podem apenas transitar as gerações condenadas a
começar tudo de novo e sair sem deixar vestígios. “As pessoas e as instituições que não
documentam suas próprias experiências e o que delas aprenderam têm vida fugaz e pobre”
(MARQUES, 2003, p. 96).
Nesses termos, com o problema de investigação posto nesta pesquisa, defendo a tese
de que a base de saberes científicos e pedagógicos de conteúdo necessários ao ensino de
Química pode ser catalizada na formação inicial pela participação em projetos de
iniciação à docência no ambiente escolar desde o início do curso, o que potencializa a
produção de saberes sobre a docência e práticas pedagógicas diferenciadas com vistas à
educação para a cidadania.
Diante do exposto, almejo produzir ideias e interpretações em torno dos debates
sobre saberes docentes e formação de professores de Química, colaborando possivelmente,
em termos mais amplos com o desenvolvimento de políticas públicas e curriculares para a
formação de professores de Ciências e Química.
30

II - O CAMINHAR DA INVESTIGAÇÃO: DA DEFINIÇÃO


METODOLÓGICA AO CENÁRIO E SUJEITOS DO PROCESSO

O grupo

Quatro mulheres iniciantes na docência.


E eu, iniciante na pesquisa narrativa.
Quanta riqueza, singularidades e heterogeneidade!

Experiências anteriores contrastantes,


Que remetem ao campo, à cidade,
Quase todos, pau rodados, ou seja, que não são de Cuiabá.
Mas, quando meninos, meu bom Jesus mandou buscar.

Idas e Vindas.
Alguns escolheram a docência por profissão,
E outros escolheram a licenciatura para alcançar o bacharelado.
Mas na docência todos ficaram porque pelo PIBID passaram.
Alguns levam à escola, à turma da educação básica regular,
À escola ciclada, à Educação de Jovens e Adultos.
Em escola pública e particular.
Conflitos com a evasão, repetência, abandonos temporários e recomeços.

Em meio a problemas familiares, econômicos e de saúde...


Perdas de entes queridos, lutas, conquistas, amores correspondidos e seus frutos,
Outros em busca do amor, na universidade se graduaram.
Cada um com sua singularidade, e na bagagem esperanças, conhecimentos,
Valores e crenças.

Todos trabalham uma carga horária superior a trinta horas semanais,


Para conseguir sobreviver com salários de professores,
E conquistar seus ideais.

Tem gente que até a Pós-Graduação alcançou...


E muitos que não alcançaram almejam alcançar,
Na esperança de uma educação pública de qualidade poder melhorar.
No vai e vem da vida escolhemos,
E ao escolher também somos escolhidos.

Na trilha dessa poesia com os traços dos sujeitos da pesquisa e do investigador, cuja
escolha metodológica assumida apresento a seguir, explicito o caminho percorrido para
construção dos textos de campo e os eixos de análise escolhidos para a compreensão do
fenômeno estudado.
Ao me aproximar da pesquisa narrativa, na perspectiva difundida por pesquisadores
como Clandinin e Connelly (2011), Gonçalves (2011) e Aragão (2011), privilegio a
experiência vivida pelos participantes da pesquisa que realizo, tanto como estudantes, em
processo de formação, quanto como docentes, em sua prática de professores de Química.
Nessa perspectiva, formulo o problema de investigação nos seguintes termos: Como se
configuram e se expressam saberes científicos e pedagógicos de conteúdos químicos
31

subjacentes à docência de professores egressos do Programa de Bolsa de Iniciação à


Docência em Química da UFMT, ao relatarem o ensino de Química que realizam na
Educação Básica?
Os pressupostos da pesquisa narrativa possibilitam ao pesquisador a sistematização
das experiências vividas pelos professores no contexto educacional relacionando os
conhecimentos sobre o que os professores sabem, como produzem seus saberes, como
trabalham com o saber produzido. Estes pressupostos proporcionam identificar os
conhecimentos utilizados pelos professores no desenvolvimento de suas práticas pedagógicas,
e a forma como constroem esses conhecimentos. Além disso, oportunizam ao pesquisador
compreender o processo de formação do sujeito, colocando-o em lugar de destaque, como ator
principal e autônomo, nas questões relacionadas às suas aprendizagens.
Em face da pesquisa narrativa e segundo as considerações de Connelly e Clandinin:

[...] La razón principal para el uso de la narrativa en la investigación educativa es


que los seres humanos somos organismos contadores de historias, organismos que
individual y socialmente, vivimos vidas relatadas (2008, p. 11).

Clandinin e Connelly complementam a ideia de que a narrativa pode ser estudada


tanto como fenômeno, quanto como método:

[...] Vemos o ensino e o conhecimento do professor como expressos em histórias


sociais e individuais corporificadas, e pensamos narrativamente à medida que
entramos na relação da pesquisa com os professores, à medida que criamos textos de
campo e escrevemos histórias sobre vidas educacionais (2011, p. 32).

Ao fazer uma proposta de pesquisa que pretende estudar saberes docentes e formação
de professores, a pesquisa narrativa se faz pertinente, pois de acordo com Ribeiro (2000, apud
ARAGÃO 2011, p.15) “ Na vida não há fatos, o que há são histórias...” [grifo do autor].
Aragão (2011), afirma que, tanto professores como discentes são contadores de histórias e
personagens, não só das histórias de todos os envolvidos, mas, também, das suas próprias
histórias.
Aragão, complementa que:

[...] tendemos a chamar de história ou relato ao fenômeno, e de narrativa à


investigação e à feição final do texto resultante. Assim, quando dizemos que nós
vivemos vidas relatáveis e contamos histórias dessas vidas, precisamos dizer – para
explicitar – que os pesquisadores que são investigadores narrativos buscam recolher
essas vidas, descrevê-las e, por sua vez, contar histórias sobre elas, escrevendo seus
relatos de tais experiências em uma narrativa (2011, p. 15) [grifo do autor].
32

A base epistemológica que subjaz à pesquisa narrativa como método de pesquisa


tende à globalidade, com uma base multirreferencial7, situando-se no paradigma da
complexidade8 (MORIN, 1995). As explicações e os detalhes estão presentes em uma boa
narrativa, criando a trama e o contexto, que lhe conferem autenticidade.
De acordo com Clandinin e Connelly (2011), as narrativas se deslocam do passado e
surgem em um espaço “3D” tridimensional específico, que se pode chamar de campo de
pesquisa. Nesta perspectiva, Gonçalves, afirma que:

[...] quem escreve uma pesquisa narrativa vai, em um só documento, do presente ao


passado e ao futuro, enquanto vai dando corpo e consistência à história, tecendo a
trama da pesquisa narrativa, o que produz um movimento importante nesse tipo de
pesquisa, baseada em histórias relatadas, a partir de memórias orais ou escritas
(2011, p. 69).

Gonçalves corrobora que:

[...] uma boa narrativa deve convidar o leitor a refletir sobre as suas próprias
experiências de vida, fazendo pensar sobre a sua vivência profissional ou pessoal.
Isso parece acontecer quando o leitor de uma história se entrosa de tal maneira com
ela que produz significados seus, reconhecendo-se de algum modo naquelas
circunstâncias, naqueles contextos, evocando as suas próprias lembranças sobre
situações vividas, ressignificando-as (2011, p. 69).

Na concepção de Galvão (2005), a narrativa como metodologia de investigação


implica uma negociação de poder, representando, assim, a entrada pessoal na vida de outra
pessoa. A autora complementa que: “Não se trata de uma batalha pessoal, mas é um processo
ontológico, porque nós somos, pelo menos parcialmente, constituídos pelas histórias que
contamos aos outros e a nós mesmos acerca das experiências que vamos tendo” (p. 330). Por
isto mesmo, concordo com Clandinin e Connelly (2011), quando dizem que a pesquisa
narrativa tem uma dimensão pessoal e social.
Por fim, levando em consideração as características básicas explicitadas acima acerca
da pesquisa narrativa, assumo a pesquisa narrativa como abordagem metodológica, pois
reconheço que ela me possibilita reconstruir e analisar histórias de vida, formação e
desenvolvimento profissional de professores, sem recortes reducionistas, sem simplificar a
7
A multirreferencialidade é um termo utilizado por Ardoino, professor da Universidade de Paris VIII, cujo
conceito vem se desenvolvendo em seus trabalhos desde a década de 1960. De acordo com Gonçalves (2011), a
multirreferencialidade dá luzes e abre caminhos possibilitando buscar aportes teóricos em diversas áreas do
conhecimento. Lida com a complexidade do objeto, evitando o seu reducionismo e permitindo vê-lo de
diferentes ângulos sem pretender esgotá-lo, fazendo em função dele as leituras possíveis.
8
De acordo com Japiassú e Marcondes (2006), a complexidade é a noção desenvolvida por Edgar Morin para
responder aos principais desafios do pensamento contemporâneo. Gonçalves, (2011) complementa que a
complexidade busca dar uma visão global, sem querer encontrar a completude; procura-se olhar de modo plural
para o objeto de pesquisa, sem pretender esgotar as possibilidades de outros olhares.
33

complexidade presente na formação de professores e na sua prática docente. A pesquisa


narrativa constitui-se uma abordagem importante para/na construção de conhecimentos sobre
processos de formação e desenvolvimento profissional de professores, bem como para a
formação de professores reflexivos e pesquisadores da sua própria prática (GONÇALVES,
2011).
Passo, a seguir, a informar sobre a produção dos textos de campo.

Instrumentos de Registro de Informações e a Composição dos Textos de Campo

Os textos de campo são criados, não são encontrados e nem descobertos, pelos
participantes e pesquisadores e têm o objetivo de representar/registrar aspectos da experiência
de campo (CLANDININ e CONNELLY, 2011).
De acordo com Aragão (2011), vários procedimentos de registro de informações são
passíveis de adoção conjunta, na abordagem da pesquisa narrativa, visto que o investigador e
o sujeito investigado trabalham juntos em uma relação de colaboração.
As informações de interesse da pesquisa narrativa podem ser registradas de várias
formas, tais como:

[...] na forma de registros de campo, anotações em diários, entrevistas semi ou não-


estruturadas, histórias de vida (orais ou escritas), observações diretas, em situações
de contar histórias, por meio de cartas, autobiografias, documentos diversos e, além
disso, por meio do projetos, relatórios, boletins de rendimento escolar, programações
de aula, regulamentos e normas escritas, como também analisando metáforas,
princípios, imagens e filosofias pessoais de vida e de profissão (GONÇALVES,
2011, p. 65).

Ao adotar a Pesquisa Narrativa como método de pesquisa na presente tese, faço a


opção por não analisar a prática pedagógica no chão da escola, mas o pensamento desses
professores de Química, ao relatarem suas práticas, pressupondo que as concepções expressas,
em suas narrativas, se fazem presentes na configuração de suas práticas.
Concernente às questões norteadoras da pesquisa, faço a opção pelos seguintes
instrumentos investigativos: i) questionário I, cujas respostas me auxiliam a construir a
caracterização dos sujeitos; ii) depoimentos dos sujeitos envolvidos na pesquisa sob a forma
de entrevista semiestruturada; iii) registro em áudio e transcrito do grupo focal realizado
com os professores egressos; iv) análises de documentos como (PPC da Licenciatura em
Química, campus Cuiabá, da estrutura curricular de 1997/1 e 2010/1 e dos Subprojetos de
Química do PIBID dos editais de 2007 e 2011); v) questionário II, tendo em vista a
34

apreensão do modelo didático dos professores egressos com base no instrumento de Santos Jr
e Marcondes (2010).
Para Gonçalves (2011), as idas e vindas do material empírico ao teórico e vice-versa
são procedimentos usuais e desejáveis na pesquisa narrativa, pois:

Enquanto o pesquisador não se tornar impregnado das falas dos sujeitos


investigados, não consegue organizar os dados e fazer opções estruturais de análise
como, por exemplo, o estabelecimento de categorias, episódios ou princípios
(p.67) [grifo nosso].

A entrevista semiestruturada teve como finalidade colher relatos de experiências


concernentes às duas primeiras indagações orientadoras dessa pesquisa, que foram
organizadas em três blocos, a saber: I) Depoimento sobre a história de vida; II) Trajetórias de
formação inicial e continuada dos egressos e III) Saberes que subjazem à docência dos
egressos. A orientação dessa entrevista foi apoiada em Nóvoa (2010), pois no processo de
formação profissional a formação é sempre da própria pessoa que se forma, o que ocorre na
medida em que elabora compreensão sobre o seu percurso de vida e formação. Nesses termos,
por meio desses três blocos orientadores, considero o sujeito investigado como autor do seu
processo de formação, por meio da reflexão retrospectiva sobre seu percurso de formação.
Com a finalidade de identificar e compreender saberes científicos e saberes
pedagógicos de conteúdos químicos desses professores, propus a realização de dois momentos
de grupo focal9, centrado nos conceitos declarados pelos professores na entrevista
semiestruturada, como prioritários em sua prática docente na Educação Básica10, tais como:
modelos atômicos e ácidos e bases, com a implicação e a discussão de critérios
epistemológicos e teórico-metodológicos relativos aos seguintes aspectos: como ocorreu o
planejamento, a introdução, o desenvolvimento e a avaliação desses conceitos, e relacionando
seu ensino com assuntos ou temas da vivência dos educandos.

9
Os dois momentos do grupo focal foram realizados na mesma manhã do terceiro sábado do mês de agosto de
2015 na sala de estudos do Laboratório de Ensino e Pesquisa em Química – LabPEQ/UFMT. A opção da
realização do grupo focal no dia de sábado foi em virtude de ser o único dia e período em que todas as
participantes tiveram disponibilidade de se encontrar e as mesmas na realização do grupo fizeram a opção do
momento ser registrado apenas em áudio e não em vídeo. Dessa forma, se sentiriam mais confortáveis em
participar não sendo filmadas.
10
A opção de trabalhar no grupo focal com os conceitos que mais gostam de lecionar em detrimento dos
conceitos que sentem mais dificuldades está pautada em poder serem mais significativos os relatos de
experiências sobre os Saberes Científicos e Pedagógicos de Conteúdos Químicos desses conceitos ensinados,
podendo assim atingir o objetivo proposto da pesquisa.
35

Posteriormente, após as transcrições das narrativas sobre ácidos e bases, foi aplicado
um questionário11 sobre os aspectos da temática que foi trabalhada, visando suplementar a
interação grupal.

Cenário da Pesquisa e Seleção dos Sujeitos

Em relação ao cenário da pesquisa, este diz respeito ao contexto do Curso de


Licenciatura em Química do campus Cuiabá da Universidade Federal de Mato Grosso, no
qual se inclui o Programa de Bolsa de Iniciação à Docência em Química da mesma
universidade. A justificativa pela escolha desse curso de licenciatura e do subprojeto
Química-PIBID está calcada na minha participação efetiva na formação inicial dos
licenciados participantes do curso, como professor das disciplinas de Práticas de Ensino de
Química (PEQ) e como coordenador do subprojeto Química – PIBID, no período de agosto de
2009 a fevereiro de 2013, participando, assim, das experiências de formação dos sujeitos
pesquisados.
Considerando que o meu ingresso como professor no curso de Licenciatura em
Química da UFMT ocorreu como substituto, em maio de 2009, e no mês de outubro do
mesmo ano tomei posse como professor de carreira na instituição, por meio de concurso
público, inicialmente tinha feito a opção de pesquisar as experiências de todos os licenciados
em Química formados nos períodos de 2009/1 a 2014/1, pois entendia, de forma primária, que
tinha participado das experiências formativas de todos os professores egressos nesse período.
A escolha por esse recorte temporal se deu em virtude de o primeiro semestre de
2009 corresponder a minha entrada como docente na universidade e o primeiro semestre de
2014 para fechamento do período, por eu ter me afastado das minhas atividades acadêmicas
para conclusão do doutorado, que vinha sendo cursado em serviço, com acúmulo de funções
acadêmicas e administrativas, tanto na graduação como na pós-graduação lato sensu. Tendo
esse período em mente, fui à busca do quantitativo de professores egressos no Sistema de
Informações de Gestão Acadêmica (SIGA) da UFMT e obtive um total de oitenta e oito
egressos nesse período, sendo que desse total, vinte e três egressos haviam participado do
PIBID em Química da UFMT, dos editais da DEB/CAPES 2007 e 2011, ano em que atuei
como coordenador do subprojeto.

11
A necessidade do questionário para complementar o grupo focal se deu em virtude das narrativas dos
episódios de aulas sobre a temática de ácidos e bases ter ficado muito no âmbito pragmático.
36

Por compartilhar da mesma compreensão de Fraiha-Martins (2014) de que a pesquisa


de cunho qualitativo não traz, em primeiro plano, a quantidade analisada em sua
superficialidade, mas sim a análise verticalizada, rigorosa e minuciosa dos sujeitos da
pesquisa, compreendendo-os como organismos complexos imersos em um sistema igualmente
complexo, dos oitenta e oito professores egressos, decidi investigar os vinte e três professores
que participaram do PIBID, no período de 2009 a 2014. Na Tabela 1 são expressos os
quantitativos de egressos levantados no SIGA/UFMT.

Tabela 1: Quantitativo de Egressos do Curso de Licenciatura em Química da UFMT de 2009/1 a 2014/1.


FORMANDOS EM FORMANDOS EM TOTAL DE
LICENCIATURA EM QUÍMICA E LICENCIATURA EM QUÍMICA EGRESSOS POR
TAMBÉM EGRESSOS DO PIBID NÃO PARTICIPANTES DO PIBID SEMESTRE
2009/1 2 7 9
2009/2 3 5 8
2010/1 1 6 7
2010/2 6 9 15
2011/1 2 9 11
2011/2 1 2 3
2012/1 *** 3 3
2012/2 1 9 10
2013/1 5 8 13
2013/2 1 5 6
2014/1 1 2 3
Total de 23 65 88
Formandos
Fonte: Elaboração do autor, baseado nos dados do SIGA/UFMT (2014)

Ao delimitar a participação dos vinte e três professores egressos, e levando em


consideração o problema de pesquisa suscitado, a escolha desses professores não poderia ser
aleatória ou se justificar somente no fato de terem participado do PIBID. Quero dizer com
isso que há o critério da intencionalidade, pois determinados sujeitos podem ser capazes de
propiciar informações relevantes ao problema de pesquisa e aos objetivos propostos
(FRAIHA-MARTINS, 2014).
Essa intencionalidade investigativa me fez estabelecer outros critérios de seleção
definidos, quais sejam: i) professores/egressos que responderam ao questionário de
caracterização; ii) que atuaram e/ou estejam atuando com a disciplina de Química no
Ensino Fundamental e/ou Médio; iii) que estejam residindo em Cuiabá-MT ou Várzea-
Grande-MT; iv) que se propuserem a participar da presente pesquisa e assinarem o
termo de livre consentimento esclarecido.
37

Tendo delimitado o perfil dos sujeitos que eu pretendia obter na presente pesquisa, o
passo seguinte foi começar a construir os textos de campo. A primeira tarefa foi de aplicar o
questionário para caracterizar os sujeitos, e ao catalogar o número de egressos do curso de
Licenciatura em Química pelo SIGA/UFMT, obtive acesso aos dados pessoais desses
licenciados como os endereços eletrônicos. De posse do endereço virtual dos vinte e três
egressos, enviei carta de apresentação da pesquisa, junto com o questionário por e-mail,
dando prazo de cerca de 20 dias para que retornassem o questionário respondido.
Nesse intervalo de tempo, a fim de fomentar a maior participação de todos, criei um
grupo fechado intitulado Pesquisa do Professor Marcel, na rede social Facebook, pelo qual
foram adicionados os vinte e três sujeitos. No grupo da rede social, coloquei a logomarca do
subprojeto Química – PIBID, explicando a finalidade e o objetivo da pesquisa que eu estava
realizando e manifestando o desejo de contar com a participação de todos. Chegado o dia da
entrega do questionário, recebi o retorno de sete professores egressos que haviam devolvido o
questionário respondido por e-mail. Fiz uma dilatação de prazo de mais dez dias e obtive mais
quatro questionários respondidos, totalizando onze participantes.

Caracterização dos Sujeitos

Dos onze egressos que responderam ao questionário de caracterização, oito são do


gênero feminino e três do gênero masculino; sete estão atuando como docentes de Química na
Educação Básica, sendo seis do gênero feminino e um do gênero masculino; uma está fazendo
Mestrado em Recursos Hídricos na UFMT; uma está fazendo curso de direito em uma
universidade privada de Cuiabá e, por isso, ambas não estão lecionando; dois estão atuando
como Químicos no mercado de trabalho, pois a estrutura curricular em Licenciatura em
Química, em que foram formados na UFMT propicia com que recebam as mesmas atribuições
de um bacharel junto ao Conselho Regional de Química (CRQ) de Mato Grosso, permitindo
assim exercerem atividades, como químicos.
Depois de feito esse levantamento de quem está atuando como professor, o passo
subsequente foi fazer contato por telefone com os sete professores/egressos, que atendiam os
critérios estabelecidos para participar da pesquisa, explicando novamente a finalidade e o
objetivo da investigação, e convidando-os para a realização da entrevista semiestruturada. Dos
sete professores/egressos habilitados a participar da pesquisa somente quatro
professores/egressos, sendo todas do gênero feminino, se propuseram a participar. Uma vez
aceito o convite, foi feito o agendamento de cada entrevista. Cada uma aconteceu no local de
38

maior conveniência para as entrevistadas, como na escola em que trabalham, bem como na
própria residência ou na UFMT.
Apresento, a seguir, os quatro sujeitos12 participantes desta investigação e algumas
informações a respeito desses sujeitos, as quais foram registradas por elas mesmas, por meio
do questionário de caracterização entregue via correio eletrônico e obtidas, também, por meio
da entrevista semiestruturada. Nesse sentido, alguns termos estão descritos abaixo, tal qual
estavam no questionário e entrevista. O nome, que é fictício, para resguardar a identidade de
cada uma, e foi de escolha do pesquisador.

CURIE – 28 anos; Solteira; Egressa de escola pública Ensino Médio; Concluiu o curso de
Licenciatura em Química em 2011; Participou do PIBID-Química na UFMT por 02 anos;
Mestre em Educação pela UFMT, na linha de pesquisa de Educação em Ciências; Trabalhava
como professora no Ensino Médio em escola particular no município de Cuiabá-MT. Para
Curie, ensinar Química no Ensino Médio é: Formar o aluno para ser cidadão crítico,
preparando-o tanto para um curso superior se ele o desejar, quanto para outras atividades
da vida.

MAYER – 30 anos; Solteira; Egressa de escola pública Ensino Médio; Concluiu o curso de
Licenciatura em Química em 2010; Participou do PIBID-Química na UFMT por 01 ano; Era
Mestranda em Ensino de Ciências na linha de pesquisa em Ensino de Química do Mestrado
Profissional em Ensino de Ciências da UFMT; Trabalhava como professora no 9º ano do
Ensino Fundamental e Ensino Médio em escolas pública e particular no município de Cuiabá
- MT. Para Mayer, ensinar Química nas séries finais do Ensino Fundamental ou Ensino
Médio: Ensinar Química é desenvolver no aluno a capacidade de participar da sociedade,
pois esta é uma ciência que está presente no nosso cotidiano. Logo, há necessidade que o
cidadão tenha o mínimo de conhecimento químico para participar ativamente e criticamente
da concepção de construção científico-tecnológica.

12
Os nomes fictícios femininos foram dados às professoras referenciando mulheres que definiram novos
paradigmas e trouxeram significativas contribuições à ciência. Marie Curie (1867-1934) foi vencedora do
prêmio Nobel de Química, descobrindo os elementos tório, rádio e polônio, sendo a primeira mulher a ser
laureada com o prêmio. Maria Mayer (1906-1972) venceu o prêmio Nobel de Física por sua pesquisa sobre a
estrutura atômica. Rosalind Franklin (1920-1958) considerada uma das maiores biofísicas de todos os tempos
com a descoberta do formato helicoidal do DNA, base para as principais descobertas genéticas nos anos que se
seguiram. Lise Meitner (1878-1968) é considerada a descobridora da fissão nuclear. (CHASSOT, Áttico Inácio.
Nomes que fizeram a Química e quase nunca lembrados. Química Nova na Escola, n.5, Maio, p.21-23, 1997
&http://blogs.ne10.uol.com.br/mundobit/2015/03/07/10-cientistas-mulheres-que-fizeram-historia/).
39

FRANKLIN – 29 anos; Casada; Egressa de escola pública Ensino Médio; Concluiu o curso
de Licenciatura em Química em 2010; Participou do PIBID-Química na UFMT por 02 anos;
Trabalhava como professora no 9º ano do Ensino Fundamental e Ensino Médio em escola
pública no município de Várzea-Grande - MT. Para Franklin, ensinar Química nas séries
finais do Ensino Fundamental ou Ensino Médio: É ensinar saberes científicos para que os
estudantes possam ter uma melhor leitura de mundo.

MEITNER – 28 anos; Solteira; Egressa de escola pública Ensino Médio; Concluiu o curso de
Licenciatura em Química em 2010; Participou do PIBID-Química na UFMT por 02 anos;
Trabalhava como professora no 9º ano do Ensino Fundamental e Ensino Médio em escola
pública no município de Cuiabá-MT. Para Meitner, ensinar Química nas séries finais do
Ensino Fundamental ou Ensino Médio: É trabalhar tudo aquilo que nós vivenciamos, como as
transformações que ocorrem nos materiais, pois tudo em nosso dia a dia como: alimentação,
vestimentas, as tecnologias, tudo tem a ver com a Química. Então, ensinar Química é ensinar
para a vida, ensinar para o futuro.
A seguir, apresento a metodologia de análise de resultados, pela impregnação nos
textos de campo e produção dos textos de pesquisa.

Análise de Resultados: Análise Textual Discursiva

Para analisar os textos de campo e produzir os textos de pesquisa por meio de


interpretações, em diálogo com a literatura (CLANDININ e CONNELLY, 2011), assumo a
Análise Textual Discursiva (MORAES e GALIAZZI, 2007), que corresponde a uma
metodologia de análise de informações de natureza qualitativa com o propósito de produzir
novas compreensões sobre os fenômenos e discursos, com um movimento interpretativo de
caráter hermenêutico, possibilitando novas compreensões sobre as narrativas investigadas.
A análise textual discursiva tem se mostrado especialmente útil nos estudos em que
as abordagens de análise solicitam encaminhamentos, que se localizam entre soluções
propostas pela análise de conteúdo e a análise de discurso (MORAES, 2003).
Moraes afirma que:

A análise textual parte de um conjunto de pressupostos em relação à leitura dos


textos que examinamos. Os materiais analisados constituem um conjunto de
significantes. O pesquisador atribui a eles significados sobre seus conhecimentos e
teorias. A emergência e comunicação desses novos sentidos e significados é o
objetivo da análise (2003, p. 193) [grifo nosso].
40

De acordo com Moraes e Galiazzi (2007), a Análise Textual Discursiva expressa o


caminho do pensamento do pesquisador, portanto, trata-se de um processo singular e
dinâmico que cada pesquisador constrói, sem ponto delimitado de partida ou chegada. Nesse
sentido, o caminho do pensamento é construído no processo, pelo próprio pesquisador,
conferindo ampla liberdade de criar e de se expressar.
Ao me impregnar do material empírico em um processo de desconstrução, seguido
de construção do corpus13 da pesquisa, busquei identificar e isolar enunciados e produzir
textos, integrando nestes, descrição e interpretação, utilizando como base de construção o
sistema de categorias construído. Para Moraes e Galiazzi (2007), ao identificar enunciados
significativos nos textos e ao categorizar esses elementos unitários, o pesquisador está
encaminhando a produção de metatextos, destinados a construir os produtos de suas análises.
Em cada leitura feita dos elementos que constituíam o material, nessa fase analítica,
emergiam três sensores interpretativos de forma caótica, concernentes às perguntas
norteadoras e ao problema de pesquisa: formação inicial, desenvolvimento profissional e
saberes docentes (FRAIHA-MARTINS, 2014). Ao ser envolvido nessa explosão de ideias em
diferentes tempos, retoma-se o processo, periodicamente, no sentido de o pesquisador ser
desafiado a explicitar novas ideias a partir das anteriormente produzidas.
O momento da unitarização da análise do corpus da presente pesquisa se revelou ao
mesmo tempo, desconstrutivo e construtivo e propiciou a sensação de que tudo estava
desorganizado, tornando caótico o que estava ordenado. É a fase denominada pelos autores de
caldeirão caótico. No entanto, essa desorganização é o caminho para a organização do novo.
Dessa forma, na busca da organização do novo, os corpus de pesquisa, imersos inicialmente
em um caldeirão caótico no tratamento analítico feito pelo pesquisador, deram forma a três
grandes eixos temáticos que apresento neste trabalho de forma horizontal, sem níveis
hierárquicos, com o objetivo de não apresentar apenas somas ou agrupamentos de itens, mas a
organização das estruturas conceituais de teorização sobre os temas trabalhados que
contemplam o objeto de estudo exposto. A seguir, descrevo cada um dos eixos temáticos
emersos do material empírico.
 Formação Inicial e Iniciação à Docência em Química na UFMT: Uma análise
documental: Este eixo narra a eclosão de um novo ramo da Química, a área de Educação
Química, e traz o histórico da constituição da formação inicial de professores de Química da

13
Conjunto de textos submetidos à análise. Esse conjunto de textos representa uma multiplicidade de vozes que
se manifestam nos discursos investigados. “O pesquisador precisa estar consciente de que, ao examinar e analisar
seu corpus, é influenciado por todo esse conjunto de vozes, ainda que sempre fazendo suas leituras a partir de
seus próprios referenciais” (MORAES e GALIAZZI, 2007, p. 113).
41

UFMT do Campus Cuiabá e a política de valorização e incentivo à docência por meio do


PIBID na UFMT e, especificamente, do subprojeto da Licenciatura em Química, do qual
participaram os sujeitos de pesquisa envolvidos. Para construir esse movimento de formação
inicial, recorro à análise documental de registros do curso, tais como: o Projeto Pedagógico do
Curso de Química da estrutura curricular de 1997/1 e 2010/1, bem como o contexto do PIBID
na UFMT e do Subprojeto Química – PIBID/UFMT na formação inicial dos sujeitos
investigados.
 Educadores Químicos Iniciantes e os Saberes Necessários à Atuação Profissional:
Das Narrativas de Si a Modelos Didáticos Adotados: Contextualizo este eixo temático de
análise, fazendo revisão sistemática sobre os saberes necessários à docência, com o objetivo
de fundamentar teórico-conceitualmente um foco norteador desta investigação sobre saberes.
Busco, também, trazer análises das trajetórias de formação inicial e continuada dos sujeitos
dessa pesquisa, relatadas por eles durante a entrevista semiestruturada, bem como narrativas
expressas nas dinâmicas do tempo de formação e de história, buscando evidenciar como essas
professoras constroem, trabalham e expressam os saberes necessários à docência, buscando
construir, à guisa de síntese, o modelo didático de cada professora colaboradora da pesquisa.
 Saberes Científicos e Pedagógicos de Conteúdos Químicos: Episódios de Aulas do
Ensino Médio: Neste eixo temático de análise, contextualizo os saberes científicos no
contexto do ensino de Química, os aspectos epistemológicos na perspectiva de Bachelard
(1996) e busco a compreensão, na perspectiva de Shulman (1986), de como se configuram os
Saberes Científicos e Saberes Pedagógicos dos Conteúdos Químicos, subjacentes à docência
dos sujeitos investigados, por meio dos relatos de episódios de aulas com conceitos químicos
do Ensino Médio. Para cada conceito, trago a literatura Química atual pertinente. Para a
construção deste eixo de análise, o material empírico analisado encontra-se, especialmente,
nos diálogos mantidos com os sujeitos durante o último bloco da entrevista semiestruturada e
o grupo focal.
Ao buscar organizar um conjunto de ideias na intenção de construir uma teia de
significação por meio da pesquisa, esta representa apenas mais uma interpretação do
fenômeno investigado, capaz de produzir nova significação a quem esta atingir (FRAIHA-
MARTINS, 2014).
Apresento, na próxima seção, o primeiro eixo temático de análise.
42

III - FORMAÇÃO INICIAL E INICIAÇÃO À DOCÊNCIA EM


QUÍMICA NA UFMT: UMA ANÁLISE DOCUMENTAL

A apropriação que cada pessoa faz do seu patrimônio existencial através de uma
dinâmica de compreensão retrospectiva é um fator de formação (António Nóvoa).

Nesta seção, apresento a eclosão de um novo ramo da Química, a Educação Química,


em termos nacionais e locais. Para tanto, consulto a legislação vigente, em termos brasileiros
e institucionais, considerando aspectos evolutivos do curso de Licenciatura em Química da
UFMT, em diálogo com a literatura pertinente, desde sua criação até o contexto de formação
dos sujeitos investigados, participantes do Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à
Docência na UFMT e o seu Subprojeto Química.
Um dos caminhos por mim escolhidos para a minha formação inicial de pesquisador,
como educador químico, foi a escolha consciente pela área de Educação Química. Consoante
com isto, faço um breve histórico da constituição da área de Educação Química no Brasil,
considerando-o pertinente neste trabalho de tese, pois nessa área a que pertenço, mais que em
outras áreas da Química, é preciso lutar pelo seu reconhecimento externo (principalmente dos
agentes financiadores de pesquisas) e interno (junto à comunidade epistêmica dos químicos),
como afirma Chassot (2014, p. 55): “em nosso meio pode-se afirmar que o reconhecimento
dos que nos são próximos tem sido mais árduo de conquistar que dos externos”. A afirmação
desse educador químico foi feita pela dura experiência pessoal pela qual passou em ver
diferentes oportunidades e iniciativas nessa área sendo bloqueadas. Essa triste experiência faz
parte da vida do pesquisador e de muitos educadores químicos no Brasil ao ter sempre que
lutar dentro da própria comunidade por reconhecimento.
Um maior reconhecimento da área de Educação Química, nas palavras de Schnetzler
e Aragão (1995), depende fundamentalmente da divulgação da sua capacidade de resolver
problemas que não podem ser resolvidos pelas outras áreas da Química, já que o domínio do
conhecimento químico é uma condição necessária, mas não suficiente para se alcançar um
bom processo de ensino-aprendizagem nessa ciência.
Pertencer à área de Educação Química é diferente de situar-se em outras áreas da
Química, que se preocupam com interações de átomos e moléculas, com a dinâmica e
mecanismos de transformações químicas, o que, sem dúvida, é relevante. Contudo, como
integrante da área em Educação Química, além de todas essas preocupações inerentes ao ramo
da Química, há o envolvimento com interações entre pessoas (estudantes e professores) e
43

destas com o conhecimento na dinâmica de construir uma educação de qualidade e educar


para a cidadania, por meio do ensino e da aprendizagem da Química.
A identidade da área de Educação Química como campo de investigação é marcada
pela especificidade do conhecimento científico, que está na raiz dos problemas de ensino e
aprendizagem investigados. Schnetzler (2002) argumenta que:

Esse campo de investigação não tem o propósito de se buscar métodos didáticos


mais adequados ao ensino daquele conhecimento, mas sim, de investigar processos
que melhor deem conta de reelaborações conceituais ou transposições didáticas
necessárias ao seu ensino em contextos escolares determinados. Isso significa que o
ensino de ciências/química implica a transformação do conhecimento
científico/químico em conhecimento escolar, configurando a necessidade de criação
de um novo campo de estudo e investigação, no qual questões centrais sobre o que,
como e porque ensinar ciências/química configura o cerne das pesquisas (p. 15).

Diante desse contexto, constato que a área de Educação Química no Brasil, em


termos de pesquisas é muito jovem, tendo mais de cinquenta anos em termos internacionais e
cerca de trinta e oito anos em termos brasileiros, já que as primeiras pesquisas em ensino de
Química no Brasil datam de 1978. Devido ao pouco tempo como área de investigação, é
natural que a Educação Química, tanto em termos internacionais como nacionais, não mereça
ainda, por parte da comunidade Química, como um todo, a mesma credibilidade dos outros
ramos da Química, como química orgânica, físico-química, analítica, dentre outros.
De acordo com Schnetzler (2002), os pesquisadores precursores da área de Educação
Química se sentem orgulhosos de terem dado os primeiros passos nesse novo campo de
pesquisa no Brasil. A autora revela que sem Áttico Chassot, Letícia Parente, Luiz Otávio
Amaral, Luiz Roberto Pitombo, Mansur Lufti, Maria Eunice Ribeiro Marcondes, Otávio
Maldaner, Roberto Ribeiro da Silva, Romeu Rocha-Filho, Roque Moraes, a própria Roseli
Pacheco Schnetzler, dentre outros, certamente a área de Educação Química no país não teria
ido tão longe como foi, formando e lançando novas gerações para a meta de constituir a área
de pesquisa em ensino de Química no Brasil. Segundo esta autora, o que unia esses
pesquisadores e educadores pioneiros era a necessidade, a condição e a sensação de
ostracismo que julgavam injustas e a crença na educação em Química para um país melhor.
Nesse sentido, Schnetzler (2010) revela que no espaço de apenas três décadas houve
a constituição de uma comunidade de educadores químicos brasileiros, que vêm
desenvolvendo pesquisas em uma nova área da Química, a Educação Química. E essas
pesquisas trazem os seguintes temas: identificação de concepções alternativas dos alunos e
propostas de modelos de ensino que levem em conta, resolução de problemas, experimentação
44

e práticas de laboratório, análise de materiais didáticos, relações entre ciência, tecnologia,


sociedade e ambiente em processos de ensino-aprendizagem, linguagem e comunicação, a
problemática e o emprego de modelos e analogias, concepções epistemológicas de
professores, proposta para uma formação docente mais adequada, questões curriculares e de
avaliação, e o papel das novas tecnologias de comunicação.
Um dado de grande relevância que evidencia o crescente desenvolvimento da
Educação Química, em nosso país, diz respeito às realizações sistemáticas de vários encontros
nacionais e regionais sobre o ensino de Química. Schnetzler e Aragão (1995) relatam o
histórico da realização desses encontros como a realização anual dos EDEQ (Encontro de
Debates sobre Ensino de Química), desde 1980, e dos ECODEQC (Encontro Centro-Oeste de
Debates sobre Ensino de Química e Ciências), a partir de 1989; dos ENNEQ (Encontro Norte-
Nordeste de Ensino de Química) a partir de 1990, e dos ESEQS (Encontro Sudeste de Ensino
de Química) desde 1992, que ocorrem à semelhança dos ENEQ (Encontro Nacional de Ensino
de Química), bianualmente, sendo que este último começou a fazer história em 1982.
Com o desenvolvimento da área de Educação Química no Brasil, é de se esperar que
as pesquisas tenham gerado avanços significativos no conhecimento e que possam contribuir
de forma potencial, para a melhoria do trabalho docente em Química no país (SCHNETZLER
e ARAGÃO, 1995).
De acordo com Chassot (2001), Educação Química é uma área de fronteira entre a
Educação e a Química, que se preocupa prioritariamente com o significado do ensino de
Química nos currículos dos diferentes graus de ensino. O educador químico é o profissional
que possui formação acadêmica em Química e que usa essa ciência para fazer Educação. O
autor ainda exemplifica que o professor ou a professora de Química, mesmo que não
vinculado a um grupo de pesquisa, mas que utiliza a sua sala de aula e faz dela um laboratório
para aprimorar sua ação docente, é educador químico.
Nessa perspectiva, Maldaner (2008) complementa que em uma visão ampliada,
educadores químicos são sujeitos sociais ou pessoas que lidam e trabalham com as coisas da
Química e sua atenção volta-se mais a aspectos como:

Processos de ensino e aprendizagem em Química; compreensão da Química como


ciência; responsabilidade social no uso dos conhecimentos da Química; currículos
de formação em Química; evolução/revolução química na história humana; Química
e qualidade de vida; ética na pesquisa química; conhecimentos profissionais dos
professores de Química (p. 271).
45

O objetivo central de trabalhar com os conhecimentos químicos e fazer Educação


com esses conhecimentos, segundo pesquisa realizada por Santos (1992), envolvendo vários
educadores químicos brasileiros, é de contribuir para a formação do cidadão, o que implica a
necessidade de vincular o conteúdo químico com o contexto social em que o estudante está
inserido. Essa concepção de ensino de Química, de acordo com Schnetzler (2008), traz ecos
de um movimento iniciado em educação em Ciências, no âmbito internacional, desde o final
da década de 1970, que defende a inclusão do ensino de CTSA – Ciência, Tecnologia
Sociedade e Ambiente nos cursos de Ciências.
A Licenciatura em Química é o locus privilegiado para a formação de educadoras e
educadores químicos no Brasil. Adiante, apresento um breve histórico da criação do curso de
Licenciatura em Química na UFMT do campus Cuiabá até a implantação da estrutura
curricular do curso que ficou vigente de 1997/1 a 2009/2, por meio da qual tanto eu como os
sujeitos investigados da presente pesquisa fomos formados como licenciados em Química.
Apresento, também a atual configuração do curso de Licenciatura em Química, com a nova
estrutura curricular, que entrou em vigência em 2010/1, bem como o contexto do PIBID na
UFMT e na formação inicial dos sujeitos investigados.

O Curso de Licenciatura em Química da UFMT campus Cuiabá: Situando o Contexto


da Formação dos Sujeitos Investigados

O primeiro curso de Química da UFMT foi criado no ano de 1972 com atribuição de
bacharelado, juntamente com o Centro de Ciências Exatas e Tecnológicas (CCET), com a
finalidade de proporcionar qualificação profissional com conhecimentos técnicos profundos
aos alunos do curso de Química e de outros cursos que demandassem conhecimentos
químicos. O CCET, em sua criação, foi composto pelos Departamentos de Engenharia Civil,
História Natural, Matemática, Física e Química, este acoplando os dois ramos da ciência em
um único Departamento (UFMT, 1997).
No ano de 1974, os cursos de Química, Física, Matemática e História Natural foram
transformados em cursos de Licenciatura em Ciências de curta duração com habilitação em
Química, Física, Matemática ou História Natural. Após a conclusão da Licenciatura em
Ciências de curta duração o estudante, para obter a habilitação em Química de duração plena,
devia cursar mais oitenta créditos equivalentes a 1200 horas, e de acordo com a estrutura
curricular do curso de Ciências com habilitação em Química, lhe era conferido o direito de
exercer o magistério na Educação Básica (na época, o 1° e 2° graus).
46

Passados onze anos, no ano de 1985, o curso de Licenciatura em Ciências de curta


duração, com suas respectivas habilitações específicas passou a ser Licenciatura Plena em
Matemática, em Biologia, em Física e em Química. E foram instituídos os cursos de
Licenciatura Plena em Química e o Bacharelado em Química. Porém, o estudante só poderia
cursar o bacharelado após a conclusão do curso de Licenciatura Plena em Química. Tal
condição gerou questionamentos, à época, quanto à especificidade de cada profissional,
atribuindo malfazeja fama de trampolim ao curso de licenciatura (UFMT, 1997).
No ano de 1990, a modalidade Bacharelado em Química ficava desvinculada da
licenciatura plena e, após a conclusão das disciplinas do 1º e 2º semestres, o estudante deveria
optar por uma das duas modalidades. Após essas mudanças, o curso de Licenciatura Plena em
Química e o curso de Bacharelado em Química da UFMT foram reconhecidos pelo Ministério
da Educação e do Desporto (MEC), por meio da Portaria n° 1.521, de 21 de outubro de 1993
(UFMT, 1997).
Finalmente, em 1997, os dois cursos foram totalmente separados e apresentados
dessa forma no edital do vestibular da Universidade Federal de Mato Grosso, constituindo-se,
a partir desse momento, em dois cursos distintos, ficando a escolha a critério do estudante, no
momento de sua inscrição no processo seletivo de ingresso à UFMT.
No que concerne à matriz curricular do curso de Licenciatura em Química, a
Resolução CONSEPE n° 65, de 1985, estabelecia uma carga horária de 3.315 h/aula que foi
alterada pela Resolução CONSEPE nº 24, de 1990, passando para carga horária de 3.375
h/aula, o que foi alterado novamente para 3.405 h/aula que deviam ser concluídas em um
período máximo de seis anos, pela Resolução CONSEPE nº 11, de 05 de fevereiro de 2001.
As disciplinas foram agrupadas em cinco blocos para o curso de Licenciatura em
Química, a saber:

Bloco I) Disciplinas de Formação Geral (Cálculo Diferencial e Integral I, II e II,


Introdução à Ciência da Computação, Probabilidade e Estatística, Vetores e
Geometria Analítica, Física Experimental I, II e III, Biologia, Filosofia da Ciência,
Mineralogia, Legislação e Ética Profissional), Bloco II) Disciplinas de Formação
Profissional ( Química Geral I e II, Química Orgânica I, II, III e IV, Química
Inorgânica I, II e III, Química Analítica I, II, III e IV, Físico-Química I, II, III e IV,
Bioquímica Geral, Química Bromatológica, Química do Ambiente), Bloco III)
Disciplinas Pedagógicas (Psicologia da Educação V e VI, Didática III, Organização
e Funcionamento da Educação Básica, Bioquímica Educacional e Práticas de Ensino
de Química I, II e III), Bloco IV) Disciplinas Optativas (Bioquímica Avançada,
Físico-Química IV, Inglês Técnico, Língua Portuguesa, Química Analítica V,
Cálculo Numérico), e Bloco V) Disciplinas de Legislação Específica (Educação
Física I e II). (UFMT, 1997, p.26, grifo nosso).
47

Pode-se perceber que essa estrutura curricular, vigente de 1997/1 a 2009/2, adotava o
esquema 3+1 de formação14, ou seja, havia polarização entre bacharelado e a licenciatura.
Sobre esse modelo de formação, Schnetzler (2008) tece severas críticas, pois de acordo com
essa educadora e pesquisadora em Educação Química, a formação propiciada na maioria dos
cursos de Licenciatura em Química do Brasil, por muitos anos, parecia estar pautada em uma
visão simplista, qual seja, a de que ensinar é fácil, bastando saber o conteúdo químico e
dominar algumas técnicas pedagógicas. Essa visão, de acordo com a pesquisadora:

É reforçada nas aulas de disciplinas de conteúdos químicos pela adoção do modelo


de ensino-aprendizagem centrado na transmissão-recepção, pela ausência e
despreocupação dos formadores (professores universitários) com reelaborações
conceituais dos conteúdos que ministram para que estes pudessem se tornar
disponíveis para serem ensinados pelos futuros professores nas escolas média e
fundamental, livrando-os de serem adotados por livros didáticos de Química
tradicionais (p.25-26).

Para Schenetzler (2008), esse modelo de formação não integra as disciplinas de


conteúdos químicos com as disciplinas pedagógicas, concebe e constrói a formação do
professor como técnico, por ser pautada na racionalidade técnica15 e entende a atividade
profissional como essencialmente instrumental, sendo esta dirigida para a solução de
problemas mediante a aplicação de teorias e técnicas, conforme expresso por Schön (1992).
Pérez Gómez (1992) explicita que a racionalidade técnica é uma concepção
epistemológica da prática que foi herdada do positivismo e que prevaleceu durante todo o
século XX, servindo de referência para a educação e socialização dos profissionais, de um
modo geral, e dos docentes em particular. O autor complementa que “segundo a racionalidade
técnica, a atividade profissional é, sobretudo, instrumental, dirigida para a solução de
problemas mediante a aplicação rigorosa de teorias e técnicas científicas” (p.96).
De acordo com Schnetzler (2004), os únicos momentos da formação que procuram
fazer a ligação entre os conhecimentos do conteúdo específico e o conhecimento pedagógico
para a realização do processo de ensino e aprendizagem, implicando transformações dos
conhecimentos científicos apreendidos nas disciplinas específicas em conhecimentos
escolares são as Práticas de Ensino e similares. Nesta disciplina, o professor formador,
normalmente, apresenta formação na disciplina específica em questão e pós-graduação na
14
Saviani (2006) explícita que o “esquema 3+1” foi adotado nas organizações dos cursos de licenciaturas e
Pedagogia (três anos para o estudo das disciplinas específicas e um ano para a formação didática) foi
estabelecido em todo o país por meio do Decreto-Lei n. l.190, de 04 de abril de 1939.
15
Para Fiorentini et al. (1998), a “racionalidade técnica” pressupõe que o professor deve ter primeiro uma
formação teórica-técnica para, posteriormente, fazer da prática uma instância de aplicação da teoria ou das
prescrições técnicas.
48

área de educação, sendo tal aspecto o que tenta fazer a ponte de ligação entre os dois eixos da
formação, que permaneceram caminhando em paralelo durante toda a licenciatura.
No que tange à Licenciatura em Química, cabe registrar o seu desprestígio, quando
comparada com dois outros cursos de graduação da UFMT nos dias atuais: Bacharelado em
Química com Atribuições Tecnológicas e Engenharia Química. Chassot (2014) expressa que
por muito tempo a licenciatura era apresentada como alternativa a estudantes que não
conseguiam fazer disciplinas avançadas de Química Inorgânica, de Química Orgânica ou de
Físico-Química, “para os quais se oferecia, como prêmio de consolação, a possibilidade de
fazer umas Didáticas” [grifo do autor] (p. 60). Defendo com o autor supracitado, que o
licenciado, mesmo que não vá operar com aparelhagem tão sofisticada quanto engenheiro
químico, nem trabalhar com produtos químicos tão puros quanto o bacharel em Química,
merece uma maior preparação e com melhor excelência, pois vai mexer na cabeça dos jovens
e adultos, ensinando-lhes uma nova maneira de ler o mundo com a linguagem química.
Na estrutura curricular de 1997/1 do curso de Química da UFMT16, as disciplinas de
Prática de Ensino de Química (PEQ) constituíram-se como componentes curriculares
principais na construção da identidade do educador químico, sendo exclusivas da área de
ensino de Química, também responsável pelo estágio supervisionado. Essas disciplinas, além
do estágio, são responsáveis por desenvolver, de maneira geral, atividades relacionadas com
estudos e práticas sobre: a reforma do Ensino Médio, segundo a LDB e as Diretrizes
Curriculares para o Ensino Médio; a reforma do Ensino Superior – apresentação e discussão
da proposta da reforma de ensino do Curso de Licenciatura em Química – habilidades
esperadas do (a) professor (a) de Química; elaboração e planejamento de curso; planejamento
de aulas e minicursos; Prática de Ensino e estágio supervisionado; regência (UFMT, 1997).
Com a finalidade de superar a racionalidade técnica da estrutura 3+1 da formação
dos licenciandos em Química dessa estrutura curricular de 1997/1, o grupo de docentes do
Laboratório de Pesquisa em Ensino de Química (LabPEQ) criou no ano de 2003, o projeto de
extensão com a realização da Semana de Minicursos das Práticas de Ensino de Química
(SEMIPEQ), que se encontra na XXVIII edição. Este evento tem por objetivo trazer os
estudantes do Ensino Médio de escolas públicas e privadas para o ambiente acadêmico da

16
No Departamento de Química do Instituto de Ciências Exatas e da Terra (ICET) da UFMT existem sete áreas
para atender os cursos que demandam as disciplinas de Química, em seus currículos, e os cursos de Licenciatura
em Química e Bacharelado em Química, sendo estas: Área de Química Analítica, Inorgânica, Orgânica, Físico-
Química, Bioquímica, Tecnológica e Ensino de Química. A área de Ensino de Química é responsável pelas
disciplinas pedagógicas que trabalham com os conhecimentos químicos e, atualmente, é composta por cinco
professores.
49

UFMT, favorecendo, assim, maior interação entre universidade e escola. Nesses eventos, os
estudantes do Ensino Médio participam de minicursos ministrados pelos estudantes das
Práticas de Ensino. Ressalta-se que a partir do ano de 2009, com a implantação do Programa
Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência (PIBID) Química no curso de Licenciatura em
Química da UFMT, os bolsistas do PIBID, além das atividades inerentes ao programa,
também ministravam minicursos na SEMIPEQ.
Na realização dos minicursos da SEMIPEQ, os temas abordados são variados e os
licenciandos, estudantes das Práticas de Ensino e/ou bolsistas PIBID em Química, procuram
títulos para os minicursos de modo a atrair os estudantes do Ensino Médio, como por
exemplo: Conhecendo homeopatia, Estudando os plásticos; Biodiesel; Drogas lúdicas e
viciantes; Água: o que você sabe além da fórmula; A Química dos produtos de beleza; Os
saberes populares e a Química; Fabricação de produtos de limpeza, A Química do Vagalume,
A Química do Chocolate, entre outros.
A avaliação dessa experiência da SEMIPEQ revelou importantes contribuições para
todos os envolvidos no processo. Contudo, é importante enfatizar a contribuição deste
formato de supervisão para a articulação entre teoria e prática a partir da experiência da
construção e aplicação dos minicursos. Inicialmente, os estudantes das Práticas de Ensino e
bolsistas PIBID apresentavam grandes dificuldades em articular os conhecimentos teóricos
desenvolvidos nas diferentes disciplinas do curso com as experiências vividas durante a
elaboração e execução desse tipo de extensão. As orientações periódicas por parte dos
docentes da área de ensino de Química são fundamentais para ajudá-los a superarem tal
fragmentação. Por isso, durante o processo da SEMIPEQ, os docentes da área de ensino de
Química esclareciam as dúvidas, debatiam as questões e pontos de vistas divergentes,
chamando à luz o acúmulo teórico que o curso lhes proporcionava. Ao mesmo tempo, os
estudantes das Práticas de Ensino e bolsistas PIBID, nesse contexto, sentiam-se mais à
vontade para expressar suas ideias e, também, liberdade para a construção de materiais
didáticos alternativos em temáticas que mais lhes agradavam no conhecimento químico.
A experiência narrada da SEMIPEQ tem proporcionado aos discentes licenciandos e
bolsistas do subprojeto Química-PIBID condições para reorganizar, integrar e aplicar os
conhecimentos adquiridos por meio da elaboração de material didático próprio e, muitas
vezes, inédito; da análise dos problemas e das dificuldades especiais do ensino de Química, da
inserção na comunidade por meio da regência de classe, realizadas em condições materiais e
físicas nem sempre necessárias e adequadas. No decorrer dessa atividade, o crescimento
intelectual é mútuo: os estudantes de licenciatura colocam em prática os métodos e técnicas
50

de ensino abordados em sala de aula, com a supervisão do professor-orientador da disciplina,


sendo esta, uma forma de introduzir o futuro docente, de maneira confiante, no meio
educacional.
Após esse breve histórico da implantação da formação do educador químico na
UFMT do campus Cuiabá, em que descrevi a estrutura curricular do curso de Licenciatura em
Química vigente de 1997/1 a 2009/2, apresento, a partir de agora, a atual configuração do
curso de Licenciatura em Química com sua nova estrutura curricular, que entrou em vigência
em 2010/1 e que obteve no ano letivo de 2014 o conceito de excelência com a nota cinco (5,0)
no indicador de qualidade, que avalia os cursos superiores via o Conceito Preliminar de Curso
(CPC) proposto pelo INEP.
Consta no histórico do PPC da Licenciatura em Química, de 2009, que desde a
aprovação da nova LDB, nº. 9394/96, a Educação Brasileira vivenciou um enorme
movimento de reflexão, dirigido, especialmente, ao estabelecimento de novas diretrizes
curriculares em seus diversos níveis. Contudo, muito antes da implementação dessas
diretrizes, o curso de Química da Universidade Federal de Mato Grosso iniciou, precisamente
em 1994, um processo de avaliação do seu curso de formação de professores de Química para
Educação Básica, que culminou no trabalho intitulado: Avaliação Emancipatória do Curso
de Licenciatura em Química da UFMT, publicado em 2006 (SANTOS, 1996)17.
Essa avaliação emancipatória do curso, realizada por Santos (1996), evidenciou a
necessidade de reestruturação curricular baseada em vários aspectos, tais como: identidade do
curso de Licenciatura em Química como um curso que prepara o discente para o exercício do
magistério; simultaneidade da formação profissional docente; redução da carga horária total
do curso; mudança do regime acadêmico do curso; funcionamento do curso em um único
turno; oferecimento da disciplina Fundamentos Matemáticos, na primeira série, anterior à
disciplina de Física, oferecida na segunda série; oferecimento da disciplina; Projeto de Ensino
de Química, que deveria acontecer ao longo de todo o curso com apresentação final de
monografia; oferecimento de disciplinas de Prática de Ensino de Química e Estágio
Supervisionado em um total de 360 horas; oferecimento da disciplina Evolução dos Conceitos
e o resgate da história da construção dos conceitos científicos ao longo das disciplinas
(UFMT, 2009).
Mediante essa avaliação emancipatória foi constituída uma comissão de
reestruturação curricular, composta por representantes de diferentes áreas da Química e por

17
SANTOS, Lydia Maria Parente Lemos dos. Avaliação Emancipatória do Curso de Licenciatura Plena em
Química da UFMT. Dissertação de Mestrado em Educação Pública. Cuiabá: UFMT, 1996.
51

três professoras da área de Ensino de Química na época composta pela professora aposentada
emérita do Departamento de Química Ms. Lydia Maria Parente Lemos dos Santos e as
professoras Dra. Irene Cristina de Mello e a Dra. Elane Chaveiro Soares. As discussões se
iniciaram a partir da seguinte questão: qual o perfil profissional que se deseja formar? Esse
debate ocorreu no interior das áreas (Físico-Química, Analítica, Orgânica, Inorgânica,
Bioquímica e Ensino de Química) e, posteriormente, entre estas.
Nesse mesmo período, em maio de 1998, o MEC solicitou à UFMT sugestões para a
elaboração das Diretrizes Curriculares dos cursos de Licenciatura em Química. A comissão,
então constituída pelo Colegiado do Departamento de Química da UFMT, elaborou um
documento que foi enviado ao MEC em dezembro de 1998 e que recebeu o seguinte título:
Pressupostos para a definição das Diretrizes Curriculares do Curso de Licenciatura em
Química. Esse documento apresentava algumas sugestões para as diretrizes curriculares
baseadas, essencialmente, no processo de avaliação realizado por Santos (1996).
No ano de 1999, durante o XXXIX Congresso Brasileiro de Química (CBQ) em
Goiânia, como reconhecimento do documento elaborado, o curso de Licenciatura em Química
da UFMT foi citado pelo representante do MEC participante do evento como o melhor curso
de Licenciatura em Química do Brasil. Na sequência, a comissão reorganizou o currículo do
curso de forma a inserir as disciplinas de Práticas de Ensino de Química, I, II e III, com carga
horária total de 300 horas para estrutura curricular antiga do curso de 1997/1 a 2009/2 como
já citado anteriormente (UFMT, 2009).
Com a instituição pelo Conselho Nacional de Educação (CNE) das Diretrizes
Curriculares Nacionais (DCNs) para a Formação de Professores da Educação Básica, em nível
superior, curso de licenciatura, de graduação plena, mediante Resolução CNE/CP1, de 18 de
fevereiro de 2002, a comissão de reestruturação interrompeu o trabalho que estava em curso e
decidiu participar de um processo de entendimento e debate local e nacional dessas Diretrizes.
O PPC da Licenciatura em Química de 2009 revela que depois de um longo silêncio
e pouco consenso sobre as Práticas como Componente Curricular (PCC), bem como um
desencontro de opiniões sobre as 400 horas de estágio supervisionado, o curso retoma as
discussões em 2005, com a constituição de um novo grupo, mas com a manutenção de alguns
membros da comissão anterior. Essa comissão organizou imediatamente um Seminário de três
dias, intitulado: Reestruturação Curricular do Curso de Licenciatura em Química da
UFMT, para que os docentes, os discentes e os técnicos pudessem discutir os novos rumos do
curso, na perspectiva dessas novas diretrizes.
52

Contudo, o rompimento com as estruturas curriculares anteriores, por parte da


comunidade acadêmica, apresentou-se como um dos prováveis aspectos para o não avanço
dos trabalhos da comissão e, à medida que a discussão sobre a atuação na formação dos
professores para Educação Básica não encontrou ressonância, mas, sobretudo, resistências
inclusive, entre membros da própria comissão. A negação da carga horária de práticas como
componentes curriculares e do estágio supervisionado provocou discussões ao longo de
alguns anos dentro do Departamento de Química da UFMT (UFMT, 2009).
No que tange ao quantitativo de carga horária destinada às práticas como
componentes curriculares e estágio supervisionado, Maldaner e Zanon (2010) complementam
que há espaços e tempos adequados para desenvolver a Educação Química na organização
curricular das licenciaturas atuais. Os autores corroboram que:

Para isso, competências e habilidades básicas de pesquisa educacional precisam ser


desenvolvidas. Se isso acontecer, as atuais 400 horas de Práticas de Ensino e 400 de
Estágio Supervisionado passam adquirir novos significados na formação de
professores. Há quem considere exagerado esse número de horas na atual estrutura
curricular das Licenciaturas. De fato, se não soubermos o que fazer na boa
distribuição dessas horas, elas parecem muitas. [...] Se não tivermos convicção sobre
a importância dessas horas, distribuídas ao longo do curso pelos contatos variados
com os conhecimentos próprios de professor, corremos o risco do retorno à antiga
fórmula 3 + 1 na organização das Licenciaturas (p. 359).

Diante desse contexto, e em um processo lento de reestruturação curricular, mas


considerado pela comissão de reestruturação necessária para o amadurecimento da forma de
entendimento da formação do licenciado em Química, o curso de Licenciatura em Química do
campus de Cuiabá foi, de 2005 até 2008, se reorganizando e teve o currículo discutido, em
uma constante troca dos membros da comissão de reestruturação.
Em janeiro de 2009, o curso de Licenciatura em Química do Campus Cuiabá recebeu
diligência do MEC instaurada no processo de “Renovação de Reconhecimento”. Nessa
diligência, o Ministério da Educação, mediante a sua Secretaria de Educação Superior (SESu)
e Diretoria de Supervisão (DESUP), solicitou a adequação da estrutura curricular, atividades
do curso, perfil do egresso e estágio curricular, em conformidade com as Diretrizes
Curriculares Nacionais. Essas solicitações foram atendidas e encaminhadas à Pró-Reitoria de
Ensino de Graduação (PROEG), que procedeu aos encaminhamentos necessários (UFMT,
2009).
Somente em sequência à resposta da diligência, que a comissão de reestruturação do
curso finalizou os trabalhos de reestruturação, sendo os documentos que balizaram o PPC da
Licenciatura em Química do campus Cuiabá de 2009 os seguintes:
53

1-Resolução CNE/CP 1, de 18 de fevereiro de 2002, que institui as diretrizes


curriculares nacionais para a formação de professores da educação básica, em nível
superior, curso de licenciatura, de graduação plena; 2-Resolução CNE/CP 2, de 19
de fevereiro de 2002, que institui a duração e a carga horária dos cursos de
licenciatura, de graduação plena, de formação de professores da educação básica em
nível superior; 3-Resolução CNE/CES 8, de 11 de março de 2002, que estabelece as
diretrizes curriculares para os cursos de bacharelado e licenciatura em Química; 4-
Resolução 001/2003/CONAC/UFSJ, de 15 de janeiro de 2003, que determina a
obrigatoriedade do projeto pedagógico por curso e fixa diretrizes para elaboração de
tal projeto; 5-Legislação vigente sobre formação do profissional da Química
(Conselho Federal e Conselho Regional de Química), em especial a resolução
normativa no. 60 de 05 de fevereiro de 1982; 6-As normatizações dos conselhos
superiores da UFMT; 7- Lei no. 10.436 de 24 de abril de 2002, que dispõe sobre a
Língua Brasileira de Sinais – Libras; 8- Lei no. 10.861, de 14 de abril de 2004, que
institui o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior – SINAES; 9-
Portaria Normativa no. 40, de 12 de dezembro de 2007, que institui o e-MEC,
sistema eletrônico de fluxo de trabalho e gerenciamento de informações relativas aos
processos de regulação da educação superior no sistema federal de educação; 10-Lei
no. 11.788/2008, de 25 de setembro de 2008, que dispõe sobre o estágio (UFMT,
2009).

A atual estrutura curricular do curso de Licenciatura em Química do Campus Cuiabá


entrou em vigência no semestre de 2010/1, com uma carga horária total de 3.620 horas,
distribuídas da seguinte maneira:

Tabela 2: Distribuição da Carga Horária do Curso de Licenciatura em Química 2010/1


DISTRIBUIÇÃO CARGA HORÁRIA
Disciplina Obrigatória 2460 horas
Disciplinas Optativas Obrigatórias 120 horas
Práticas Pedagógicas como Componente Curricular 420 horas
Estágio Curricular Obrigatório 420 horas
Atividades Complementares 200 horas
Total 3620 horas
Fonte: UFMT (2009)

O PPC de Licenciatura em Química, campus Cuiabá (aprovado pela Resolução


CONSEPE nº 183 de 30 de novembro de 2009, e pela Portaria de Reconhecimento do MEC
nº 615 de 30 de outubro de 2014) apresenta proposta curricular procurando romper o modelo
3+1 de formação, revelando um esquema em que a prática é entendida como eixo dessa
preparação. Neste sentido, o contato com a prática docente no PPC aparece desde os
primeiros momentos do curso de formação e tem o entendimento de que no novo currículo da
Licenciatura em Química é importante que todas as disciplinas tenham vínculo com a
educação, de modo que, ao mesmo tempo em que contribuem para a formação relativa ao
conhecimento químico, terão como foco em como esse conhecimento químico entra, interage
e funciona na escola fundamental e média e em situações de educação não escolar.
54

Nesse sentido, o exercício da Mediação Didática não deve ficar só a cargo dos
professores da área de ensino, mas sim de todos os professores das outras áreas que trabalham
no curso de formação de professor licenciatura. A prática como componente curricular - PCC,
em cada uma das disciplinas que abrigará, será uma reflexão sobre o conteúdo químico que
está sendo aprendido pelo graduando e que será ensinado por este, quando de sua atuação
profissional como professor. A PCC deve, pois, articular o conhecimento químico ensinado na
universidade com condicionantes, particularidades e objetivos deste conhecimento na
educação básica formal e em outros espaços não escolares de educação.
Segue a Tabela 3, para uma melhor visualização de como a carga horária da PCC foi
distribuída no currículo do curso de Licenciatura em Química.

Tabela 3: Distribuição da Carga Horária do PCC do Curso de Licenciatura em Química 2010/1


SEMESTRE DISCIPLINA CARGA HORÁRIA - PCC
PRIMEIRO Química Geral I 30 horas
SEGUNDO Instrumentação para o Ensino de Química I 60 horas
TERCEIRO Instrumentação para o Ensino de Química II 60 horas
Química Inorgânica I 30 horas
Química Orgânica I 30 horas
QUARTO Projeto de Ensino de Química 60 horas
Química Analítica Qualitativa 30 horas
SEXTO Bioquímica I 30 horas
SÉTIMO Toxicologia 30 horas
Tecnologias Educacionais para o Ensino de 30 horas
Química
Físico-Química IV 30 horas
CARGA HORÁRIA TOTAL DE PCC 420 horas
Fonte: UFMT (2009)

Por fim, o curso de Licenciatura em Química da UFMT campus Cuiabá com a sua
atual estrutura curricular tem a finalidade básica de formar profissionais reflexivos e aptos a
integrar o processo da Educação Básica, de maneira responsável, com participação ativa no
desenvolvimento de processos pedagógicos, principalmente, aqueles relacionados com o
conhecimento químico (UFMT, 2009).
Após esse breve histórico do contexto do universo de minha formação inicial e
profissional e, também, da formação inicial dos sujeitos desta pesquisa, dou a conhecer a
inserção do PIBID no contexto da UFMT e, mais especificamente, no curso de Licenciatura
em Química do campus Cuiabá com suas atividades iniciadas a partir do ano de 2009.
55

O Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência na UFMT

A Universidade Federal de Mato Grosso participa do PIBID desde o lançamento do


primeiro edital18, cujo programa institucional está ancorado na Coordenação de Programas de
Formação Docente da Pró-Reitoria de Ensino de Graduação (PROEG). Para o
desenvolvimento do programa nos cursos de licenciatura, a UFMT dá a contrapartida da
instituição em espaços físicos, materiais permanentes e outros recursos que não são
financiáveis pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES)19.
No Estado de Mato Grosso existe um grande déficit de professores habilitados para
atuar na Educação Básica e a UFMT é a IES responsável por parte considerável da formação
inicial de professores para trabalhar nas áreas de Códigos e Linguagens, Pedagogia, Ciências
Sociais, Matemática e Ciências Naturais20. A dificuldade na formação inicial dos professores
soma-se aos aspectos regionais do Estado por possuir grandes extensões territoriais, o que lhe
confere, em âmbito educacional, maiores desafios em todos os aspectos, sobretudo na
formação inicial. Associam-se a esses aspectos outros que contribuem para tornar o ensino
mais deficitário, tais como: baixa remuneração do corpo docente; insuficiência na formação
continuada dos professores; condições escolares desfavoráveis; problemas de gestão escolar,
dentre outros. Esse quadro, de acordo com Mello (2012), tem desencadeado muitos males, tais
como: violência, desvalorização da escola e do professor perante os educandos e suas
famílias, evasão escolar e, sobretudo, baixo nível de aprendizagem. Diante desse panorama,
inerente à formação inicial no Estado de Mato Grosso, o incentivo à docência por parte do
PIBID, ao menos em sua formação inicial, nas áreas supracitadas, torna-se altamente
relevante para o Estado de Mato Grosso.
O PIBID da UFMT envolve os campi de Cuiabá, Barra do Garças, Rondonópolis e
Sinop em todas as licenciaturas presenciais e a licenciatura em Pedagogia a distância. O
projeto institucional do PIBID/UFMT está alicerçado por alguns eixos norteadores que
formam uma espécie de engrenagem, que orienta e articula as atividades dos subprojetos,
sendo estes: Programa de Desenvolvimento Institucional (PDI), Diretrizes Curriculares
Nacionais para o Ensino Médio (DCNEM), Avaliação Emancipátória, Interdisciplinaridade,
18
Edital nº 01/2007 – Diretoria de Educação Básica Presencial (DEB)/CAPES.
19
A CAPES foi criada por Anísio Teixeira em 11 de julho de 1951, pelo Decreto nº 29.741 com a finalidade de
garantir a existência de pessoal qualificado em quantidade suficiente para suprir as necessidades e demandas dos
empreendimentos públicos e privados, visando o desenvolvimento do Brasil e concentrou-se durante décadas, na
Educação Superior, em especial a pós-graduação stricto-sensu, desempenhando papel fundamental na expansão
e consolidação dos programas de pós-graduação em todos os estados da federação.
20
Os cursos de Licenciatura em Química e Física são ofertados somente por IES da rede federal de ensino,
UFMT e IFMT.
56

Seminários Integradores e a pesquisa como princípio formativo. Observando os eixos


norteadores do projeto institucional do PIBID/UFMT, nota-se que está em consonância com a
concepção de formação que Nóvoa propõe: “A formação passa pela experimentação, pela
inovação, pelo ensaio de novos modos de trabalho pedagógico, a formação passa por
processos de investigação, diretamente articulados com a prática”(1992, p. 28).

A Figura 1, esboça o desenho metodológico do programa:

Saberes Prévios sobre


a Docência e
Representações sociais

Contexto e Vivência Colabora para a


Conhecimentos Construção de
Teórico-Práticos uma Nova
Cultura
Educacional

Saberes da Pesquisa e
Experiência Acadêmica
da Formação de
Professores

Figura 1: Desenho estratégico/interacionista do Programa PIBID


Fonte: Elaboração do autor, baseado em DEB/CAPES (2013a)

A reconstrução de uma nova cultura educacional que o PIBID pretende alcançar está
pautada em pressupostos teórico-metodológicos que articulam teoria-prática, universidade-
escola e formadores-formandos. Nesse sentido, e pautado no terceiro princípio pedagógico do
PIBID, que trata de criar inovações na educação, defendo, com Imbernón (2011), que o
professor não deve ser um técnico para desenvolver ou implementar inovações prescritas, mas
deve converter-se em um profissional, que participe de forma crítica e ativamente no
verdadeiro processo de inovação e mudança, sempre partindo do seu próprio contexto em um
processo dinâmico e flexível. O autor defende que se deve considerar o profissional da
educação:

Como um agente dinâmico cultural, social e curricular, que deve ter a permissão de
tomar decisões educativas, éticas e morais, desenvolver o currículo em um contexto
determinado e elaborar projetos e materiais curriculares em colaboração com os
colegas, situando o processo em um contexto específico controlado pelo o próprio
coletivo (IMBERNÓN, 2011, p. 24).
57

Os subprojetos das licenciaturas específicas da UFMT devem apresentar como ponto


de partida a dimensão interdisciplinar e transdisciplinar, instituindo os necessários coletivos
organizados, como propostos nos PCNEM, PCN+, OCNEM e Orientações Curriculares do
Estado de Mato Grosso. Essa orientação à constituição das propostas dos subprojetos a serem
desenvolvidos está subsidiado pela experiência inovadora do curso de Licenciatura em
Ciências Naturais e Matemática da UFMT que é a de promover, por meio de um trabalho
interdisciplinar e transdisciplinar, ações curriculares que proporcionem o diálogo entre
professores das disciplinas das áreas envolvidas no PIBID, na perspectiva de construirem
propostas pedagógicas, que busquem a contextualização interdisciplinar, social e cultural.
Nessa perspectiva, o objetivo dos subprojetos em cada área específica é de incrementar
experiências inovadoras, com o objetivo de consolidar práticas diferenciadas na formação dos
licenciandos (NÓVOA, 1992).
O projeto institucional PIBID/UFMT estabelece relações com a identidade da
política institucional e encontra-se orientado por alguns objetivos como: ampliar a oferta e
melhorar a qualidade do ensino de graduação e de pós-graduação; fortalecer o processo de
inclusão social; ampliar a articulação com a sociedade e contribuir da ambiência universitária.
Em decisão coletiva, institui-se no PIBID/UFMT, um conselho deliberativo, composto por
representantes dos membros participantes, com o objetivo de deliberar sobre as mais variadas
questões, sobretudo as relacionadas à aplicabilidade dos recursos disponíveis, tendo o mesmo
intuito à figura do pibidiano voluntário, que embora não receba bolsa, possui atribuições
claramente definidas nos subprojetos, participam também, como colaboradores eventuais ou
voluntários, os professores das escolas da Educação Básica e docentes da UFMT (MELLO,
2012).
De acordo com Mello (2012), as ações do PIBID na UFMT são variadas como:

Definição da política de execução do PIBID/UFMT com os coordenadores dos


subprojetos; seleção dos bolsistas e professores supervisores; constituição de grupos
de apoio, nas escolas e na universidade; socialização do projeto institucional nas
escolas envolvidas; organização e execução dos Seminários Integradores, de forma a
realizar integração entre os participantes, com a pós-graduação e com os
supervisores de estágio supervisionado das licenciaturas envolvidas, na UFMT;
levantamento de pesquisas e diagnósticos educacionais relativas às áreas específicas
em Mato Grosso; realização do diagnóstico educacional nas escolas; organização e
execução dos Ciclos de debates (envolvendo, inclusive, a pós-graduação) e definição
das ações coletivas; publicação das atividades do PIBID/UFMT no Portal do
Professor do MEC, dentre outros (p. 17-18).
58

Nessa perspectiva, Nóvoa contribui dizendo que: “a troca de experiências e a partilha


de saberes consolidam espaços de formação mútua, nos quais cada professor é chamado a
desempenhar, simultaneamente, o papel de formador e de formando” (1992, p. 26).
Nas atividades dos seminários integradores do PIBID foram expressas também
algumas dificuldades na execução e desenvolvimento dos subprojetos, tais como: articulação
dos horários dos bolsistas, supervisores e coordenadores de área, haja vista, que alguns cursos
de licenciatura ocorrem em período integral, atrasos eventuais nos pagamentos das bolsas e
liberação da verba de custeio para o desenvolvimento dos subprojetos, a alta rotatividade dos
bolsistas, as dificuldades dos coordenadores de área em articularem projetos e atividades inter
e transdisciplinares, dentre outros.
Diante dos apontamentos significativos já vivenciados pelo programa, reconhece-se
este como uma iniciativa, por parte do governo federal, em valorização no ingresso e
permanência na docência aos estudantes de licenciatura, pois se sabe que essa valorização
perpassa outros fatores.
Na pesquisa empreendida por Gatti (2013) sobre Valorização da docência e
avaliação do trabalho docente, a pesquisadora revela que a atividade docente, de modo mais
abrangente, é representada como carregada socialmente por sinalizações contraditórias e que
têm se mantido ao longo de décadas. Por exemplo, pesquisas empíricas recentes mostram
como os jovens têm uma representação contraditória em relação à figura dos professores. Essa
representação é composta, de um lado por uma imagem positiva do papel do professor para a
sociedade e para sua própria educação, e de outro, a imagem de seu baixo reconhecimento
como profissional, em função de sua carreira ser pouco promissora, em termos financeiros, e
pelas dificuldades visualizadas em seu exercício profissional, dadas as condições inóspitas de
trabalho que lhes são oferecidas e o comportamento e motivações das crianças e jovens na
atualidade.
A valorização social dos professores, nesse sentido, passa por uma reconstrução
sociocultural dessas representações, em forma menos ambígua ou contraditória, e esse
movimento depende de condições concretas relacionadas ao contexto de formação e trabalho
dos docentes na Educação Básica. A mudança em representações sociais é um processo sócio-
histórico-cultural complexo e lento, especialmente, quando uma representação perdura por
longo tempo sem ser abalada por fatos de impacto efetivo e duradouro. Gatti explicita que:
59

A representação de não valorização da docência na Educação Básica vem


perdurando uma vez que a constituição sócio-histórica e política de elementos para a
superação e reconstrução dessas representações sociais não tem alcançado
efetividade real. A gestão pública da educação tem faltado, em seus vários níveis,
um projeto articulado de formação docente e de trabalho nas escolas, com política
bem estruturada, organizada e planejada. A educação escolar pública, pela forma
que é realizada nas diferentes comunidades, favorece a construção de uma imagem
fragmentada de educação, empobrecida pela condição oferecida a seus professores e
alunos (2013, p. 155).

Neste sentido, a pesquisadora revela que valorizar o magistério com políticas


coerentes e convergentes, com apoio efetivo aos docentes que estão atuando e futuros
professores é o mote, e se apresenta como um dos vários caminhos rumo a essa valorização.
Sendo assim, o PIBID se revela como uma política de fundamental importância no cenário
nacional na trajetória dessa valorização à docência.
Tive a intencionalidade, com esta breve descrição do Programa Institucional de
Bolsa de Iniciação à Docência, como parte de uma política nacional de formação de
profissionais do magistério da Educação Básica na UFMT, contextualizar um dos contextos
formativos dos sujeitos pesquisados. Este esclarecimento se justifica pelo fato de não estar
estudando a proposta política, em si, mas por ter convicção de que a proposta não garante que
as melhorias pretendidas na formação e no ensino da Educação Básica se efetivarão, pois há
muitas interferências nos locais de trabalho dos professores, ou seja, as condições de trabalho
docente, via de regra, são adversas na escola pública.
Exatamente por não poder generalizar o contexto formativo do PIBID, em que pese,
na minha opinião, a importância desse programa no cenário nacional no âmbito da formação
inicial de professores, como uma das políticas de valorização à docência, apresento, na
próxima seção, a constituição do subprojeto Química/PIBID na UFMT, com o intuito de
caracterizar o contexto formativo sobre o qual se realiza a pesquisa.

Itinerário do Subprojeto Química – PIBID em Cuiabá na UFMT

O Subprojeto Química/PIBID21 foi implantado na UFMT campus Cuiabá,


envolvendo discentes e docentes dos cursos de Licenciatura em Química e professores do
Ensino Médio da rede pública, desde o lançamento do primeiro edital nº 01 da DEB/CAPES,
de 2007. Na participação do edital 2007, a coordenadora inicial do subprojeto foi a educadora
química Dra. Elane Chaveiro Soares, que escreveu o subprojeto da Química para submissão

21
Os projetos de cada área de conhecimento em específico vinculados ao projeto institucional da UFMT do
PIBID são denominados de subprojetos, por isso a denominação do projeto de Química-PIBID ser chamado de
subprojeto Química-PIBID.
60

ao edital, tendo sido aprovado pela DEB/CAPES. A professora fez a seleção das escolas
participantes, professores supervisores e estudantes, tendo sido esta equipe composta por onze
bolsistas estudantes da licenciatura, um voluntário, dois supervisores, um por escola, um
coordenador do subprojeto, uma coordenadora institucional e pelo grupo de apoio do
Laboratório de Pesquisa e Ensino de Química - LabPEQ/UFMT.
Esse subprojeto, aprovado no edital 2007, apenas teve início de suas atividades a
partir do primeiro semestre do ano de 2009 por problemas logísticos da CAPES. O período de
início das atividades do subprojeto coincidiu com o afastamento para qualificação docente em
nível doutoral da coordenadora que elaborou o subprojeto de Química e quem assumiu a
coordenação foi a professora aposentada Ms. Lydia Maria Parente Lemos dos Santos, durante
todo o primeiro semestre do ano de 2009. Nesse mesmo ano, ocorreu o meu ingresso na
UFMT, como educador químico para a área de ensino de Química do curso de Licenciatura
em Química do campus Cuiabá.
Na oportunidade, ao ingressar como docente no curso de licenciatura, trabalhando
com as disciplinas de Práticas de Ensino de Química (PEQ) da estrutura curricular de 1997/1,
assumi também a coordenação e condução do subprojeto Química-PIBID do campus Cuiabá,
estando na coordenação desse projeto a partir do segundo semestre de 2009 até o seu término,
em dezembro de 2010, e depois nos anos de 2011 a janeiro de 2013, com a participação do
subprojeto no novo edital da DEB/CAPES de 2011.
A experiência de conduzir os trabalhos do PIBID se revelou à época muito
desafiadora para minha própria formação profissional, pois ao mesmo tempo em que estava
me constituindo como formador de professores, pois eu acabara de ingressar na carreira do
magistério superior, me via na situação de programar atividades diferenciadas no subprojeto
para a formação desses licenciandos, de forma imediata, para atuarem na Educação Básica.
Portanto, considero essa experiência da minha passagem pelo PIBID muito significativa na
minha constituição como formador de professores de Química no contexto real de trabalho,
ou em outros termos, no chão da escola. Ao fazer essa breve reflexão de minha passagem pelo
PIBID e me apoiando em um dos teóricos que dão subsídios à minha pesquisa, pude
compreender o que Tardif (2012) chamou de temporalidade do saber, uma vez que o
amálgama de saberes para ir me constituindo e consolidando como profissional da educação é
adquirido no contexto de minha história de vida, e que para eu formar um professor foi
preciso eu aprender a formar este professor e isso aconteceu e está acontecendo com o tempo,
progressivamente, em relação ao meu trabalho docente.
61

O subprojeto Química/PIBID (edital 2007) foi desenvolvido nas Escolas Estaduais


com as quais a universidade possuía convênio estabelecido com a Secretaria de Estado de
Educação de Mato Grosso (SEDUC/MT), localizadas no município de Cuiabá, fazendo parte
a Escola Estadual Dona Maria de Arruda Muller – Liceu Cuiabano, situada na região central
da cidade e que recebe estudantes de todos os bairros da capital. Destaca-se, também, o fato
da escola possuir um amplo espaço físico e dispor de laboratório de Química. E a outra foi a
Escola Estadual André Avelino Ribeiro, situada na periferia de Cuiabá. As duas escolas de
Educação Básica participantes do PIBID possuíam reconhecidamente problemas de ensino-
aprendizagem na área de Ensino de Química, identificados nas atividades de estágio
supervisionado das disciplinas de Práticas de Ensino de Química (PEQ) I, II e III do curso de
Licenciatura em Química da UFMT e baixa média na avaliação no Exame Nacional de Ensino
Médio (ENEM).
Após o término das atividades do subprojeto Química-PIBID, do edital 2007, no ano
de 2011 foi lançado um novo edital como citado anteriormente, do qual o curso de
Licenciatura em Química da UFMT do campus Cuiabá participou da seleção e teve a proposta
aprovada pela DEB/CAPES. As atividades desse projeto foram realizadas somente em uma
escola que já havia participado do PIBID no edital anterior, que foi a Escola Estadual Dona
Maria de Arruda Muller – Liceu Cuiabano, com cinco bolsistas estudantes de licenciatura, um
estudante voluntário, uma professora supervisora da escola e eu, como coordenador do
subprojeto.
É imperioso destacar que no primeiro edital (de 2007) havia onze bolsas para os
estudantes e no segundo (edital de 2011) havia cinco bolsas, e conforme os estudantes
concluíam o curso de graduação na vigência do subprojeto eram feitas outras/novas seleções
para novos estudantes da Licenciatura em Química para ocupar a bolsa e para participar das
atividades do subprojeto nas escolas. Das edições de 2007 e 2011, do subprojeto Química-
PIBID, tiveram a oportunidade de vivenciar as atividades de iniciação à docência em
Química, vinte e três estudantes da licenciatura, todos oriundos da estrutura curricular de
1997/1 do curso de Licenciatura em Química da UFMT e como essa estrutura tinha a
característica de formação nos moldes do currículo 3+1 a participação no PIBID se revelou de
fundamental importância na formação inicial desses licenciados.
O subprojeto Química-PIBID participou novamente do edital de seleção dos
subprojetos 2013 da DEB/CAPES que nessa edição passou a ser de fluxo contínuo, agora com
a coordenação da professora Dra. Elane Chaveiro Soares, e nessa versão atual do subprojeto,
este está sendo desenvolvido em duas escolas de Educação Básica de Cuiabá: a Escola
62

Estadual Dona Maria de Arruda Muller – Liceu Cuiabano, situada região central da cidade e
que participa pela terceira vez do subprojeto e a Escola Estadual Pascoal Ramos situada na
periferia de Cuiabá. Essa versão do subprojeto conta com quinze bolsistas estudantes da
licenciatura, todos da nova estrutura curricular do curso implantado em 2010/1, dois
professores supervisores, um por escola, e um coordenador de subprojeto.
O Subprojeto Química-PIBID tem por finalidade o incentivo à docência em Química,
pois se entende que a melhora na atuação profissional passa pelo conhecimento e pelo
controle das variáveis que intervém no exercício da profissão. Em função dos processos de
ensino-aprendizagem serem extremamente complexos, torna-se necessário que se disponha e
se utilizem referenciais que ajudem a interpretar o que acontece nos processos formativos.
Tais referenciais puderam ser utilizados no planejamento e no próprio processo formativo
(ZABALA, 1998).
Neste sentido, o subprojeto Química-PIBID desenvolveu e desenvolve seu trabalho
junto com os bolsistas estudantes por meios de trabalhos e ações que estimulam a construção
de propostas pedagógicas, por meio de ações curriculares que incentivem a contextualização
interdisciplinar, social e cultural como propostos nos Parâmetros Curriculares Nacionais para
o Ensino Médio (PCNEM), e Orientações Curriculares Nacionais para o Ensino Médio
(OCNEM), pois é mister que a abordagem dos conceitos e dos conteúdos de Química seja
coerente com a visão atualizada, em termos científicos e pedagógicos, contemplando avanços
tanto do conhecimento químico quanto das concepções da Química como ciência, a
historicidade e as implicações sociais desta área, sendo essencial a busca sistemática de novas
referências e de novas e diversificadas fontes de informação (BRASIL, 2008).
Diante desse contexto, para incentivar e auxiliar a formação dos futuros professores
de Química da Educação Básica, o subprojeto Química-PIBID realizou e realiza atividades,
tais como:

 Ciclo de Estudos – Apresentação de seminários com temas relacionados à


Educação, Formação de Professores e Ensino de Ciências/Química;
 Realização de Pesquisas na área de ensino de Ciências/Química;
 Participação em eventos (encontros, seminários, congressos entre outros)
relacionada ao ensino de Ciências/Química;
 Acompanhamento dos bolsistas nas unidades escolares conveniada com a
UFMT para o processo de Estágios tais como: Observação, Monitoria e Regência;
 Participação dos bolsistas na Semana de Minicursos das Práticas de Ensino
de Química da UFMT;
 Participação dos bolsistas na semana pedagógica das unidades escolares bem
como no planejamento anual da disciplina de Química;
63

 Participação dos bolsistas no projeto “Sala do Educador 22” momento em que


os docentes das unidades escolares passam por “Formação Continuada”;
 Participação dos bolsistas da Química em atividades interdisciplinares com
outros bolsistas PIBID dos subprojetos de Biologia, Física e Matemática (UFMT,
2010).

Das ações do subprojeto Química-PIBID, com a intenção de acompanhar as OCNEM


de Química para o Ensino Médio e realizar a Avaliação Emancipatória das escolas
parceiras, o subprojeto orientou e orienta os licenciandos bolsistas que a dinâmica da vida do
professor na escola pode e precisa voltar-se mais para o favorecimento da (re) organização da
prática curricular, da (re) construção do processo ensino-aprendizagem, das decisões do que
ensinar, de como ensinar, de como avaliar o significativamente aprendido, da consolidação de
espaços efetivamente transformados da dinâmica social, por meio da instrumentalização
intelecto-cultural dos cidadãos potencialmente ocupantes de posições decisivas no cenário
coletivo da sociedade.
É importante destacar que a definição dos conteúdos de Química a serem trabalhados
nas escolas parceiras do subprojeto é um dos temas principais na capacitação dos bolsistas e
dos professores supervisores (o que se deve ensinar de Química? Por quê? Como? E para
quê?). Esses conteúdos só são definidos após o diagnóstico do contexto escolar, da leitura do
Projeto Político Pedagógico (PPP) da escola e do estudo sistemático das Orientações
Curriculares Nacionais para o Ensino de Química.
Ao fazer esses relatos, revivo experiências de participação/coordenação no
subprojeto de Química-PIBID para o incentivo à iniciação à docência em Química. Destaco
que a atuação dos bolsistas do PIBID no ambiente real de ensino vem sendo realizada
mediante diagnóstico do contexto escolar, por meio da inserção dos bolsistas e observação do
dia a dia escolar do sistema público de ensino. Os bolsistas, durante toda a execução,
planejamento de atividades de ensino, elaboração de materiais didáticos, tiveram o apoio dos
integrantes do Laboratório de Pesquisa e Ensino de Química (LabPEQ), dos professores
supervisores e coordenador do subprojeto. E cabe destacar que outra atividade, de grande
relevância, desenvolvida no subprojeto pelos bolsistas envolve a realização de atividades
experimentais na perspectiva de levar aos estudantes da Educação Básica os conhecimentos
químicos contextualizados, com base nos fenômenos diários.
Ao finalizar esse breve contexto do programa PIBID no curso de Licenciatura em
Química da UFMT, não poderia deixar de evidenciar a crise que esse programa passa junto ao
22
A Sala do Educador trata-se de uma proposta política de formação continuada implementada nas unidades
escolares da rede estadual de Mato Grosso, acompanhadas pelo Centro de Formação de Professores – CEFAPRO
da Secretária Estadual de Educação de Mato Grosso – SEDUC/MT.
64

DEB, no âmbito da estrutura organizacional da CAPES, devido à atual conjuntura política


financeira do Brasil nos anos de 2015 e 2016.
As perspectivas negativas de sua continuidade têm levantado um clamor pela
continuidade do programa PIBID organizados pelos coordenadores e supervisores dos
subprojetos PIBID das IES de todo o Brasil, juntamente com os pibidianos, apoiadas
justamente nas inúmeras conquistas para uma formação docente mais qualificada. Os bolsistas
não são meros expectadores ou executores no programa, nem tampouco estão no programa só
pela bolsa que recebem. No entanto, de acordo com Soares (2016), é viável perguntar se esta
última questão também pode ser feita ao programa de iniciação cientifica, o PIBIC. A
campanha para a permanência do PIBID ganhou eco nas redes sociais no final do ano de 2015
e todo o ano de 2016 com a chamada #FicaPIBID.
Nesta perspectiva, Soares (2016) corrobora que:

Aqueles que aquecem os bastidores políticos do nosso país precisam compreender


que a educação é processual e dinâmica e que a incorporação de transformações é
urgente e necessária, mas que isso precisa ser feito de forma gradativa e seriamente
assistida. Isso quer dizer que os investimentos na formação docente devem vir
acompanhados de políticas de valorização da profissão docente, sem a qual,
qualquer programa ou projeto se inviabiliza pela própria evasão (p. 9).

A seguir, apresento o próximo eixo de análise, no qual faço contextualização por


meio de revisão sistemática sobre os saberes necessários ao trabalho docente com o propósito
de buscar subsídios teórico-conceituais para análise de mais um eixo norteador desta
investigação sobre saberes docentes. Neste sentido, analiso, à luz da literatura pertinente, as
trajetórias de formação inicial e continuada dos participantes da pesquisa, obtidas por meio
dos relatos sobre si e dos diálogos entre pesquisador e sujeitos dessa pesquisa, durante a
entrevista semiestruturada e grupos focais. Analiso, portanto, narrativas expressas nas
dinâmicas do tempo de sua formação e de sua história, evidenciando como essas professoras
constroem, trabalham e expressam os saberes necessários à docência. A partir das
manifestações docentes, faço análises buscando responder às questões investigativas
propostas e, ao final, busco fazer síntese, construindo um modelo didático de cada professora
colaboradora da pesquisa.
65

IV - EDUCADORES QUÍMICOS INICIANTES E SABERES


NECESSÁRIOS À ATUAÇÃO PROFISSIONAL: DAS NARRATIVAS DE
SI A MODELOS DIDÁTICOS ADOTADOS

O saber é estruturado porque é organizado conceitualmente através de uma rede de


interconexões (cada pessoa cria sua própria rede associando tudo o que sabe ou sente
em relação a uma ideia) e possui uma linguagem própria que garante sua
comunicação e organiza o discurso do professor (Britt- Mari Barth).

A principal função da atividade docente é o ensino, que consiste em um processo


intencional e interpessoal, que desenvolve, essencialmente, a comunicação verbal e o discurso
dialógico utilizado como meios para favorecer, provocar e levar a aprendizagem em uma dada
situação ou contexto (ALTET, 2001). Ensinar é fazer aprender e, sem a sua finalidade de
aprendizagem, o ensino não existe. Este fazer aprender ocorre pela mediação e comunicação
do professor, que é um profissional da aprendizagem, da regulação interativa da sala de aula e
da gestão de condições de aprendizagem. Nesse sentido, “o professor profissional é antes de
tudo, um profissional da articulação do processo ensino-aprendizagem em uma determinada
situação, um profissional da interação das significações partilhadas” (ALTET, 2001, p. 26).
Na busca de compreender o movimento pela profissionalização do ensino e, da
profissionalização docente, diversos pesquisadores no âmbito internacional e nacional, tais
como: Shulman (1986, 1987), Nóvoa (1992), Schön (1992), Gonçalves e Gonçalves (1998),
Gonçalves (2000), Mizukami (2004), Tardif e Lessard (2009), Pimenta (2012), Tardif (2012),
Gauthier et al. (2013), dentre outros, dedicaram ou dedicam suas pesquisas à formação de
professores, abordando os diversos saberes que compõem a vida profissional na busca de
renovar os fundamentos epistemológicos do ofício de professor 23, discutindo a prática
educativa, e focalizando o professor investigativo, reflexivo, político, dialógico, intelectual.
Nesta seção, analiso os relatos dos participantes da pesquisa, buscando identificar os
movimentos de formação e docência que contribuíram para sua constituição docente,
buscando compreender como esses professores constroem, trabalham e expressam saberes
necessários à docência. Este tipo de pesquisa que vem sendo desenvolvido por Nóvoa (1992),
Gonçalves (2000), Josso (2004), Huberman (2007), Goodson (2007), Clandinin e Connelly

23
Para Gauthier et al. (2013) essas preocupações não são recentes se considerarmos que desde o início do século
XIX, muitos pesquisadores desenvolveram projetos em busca de um ensino mais eficiente. Todavia, foi somente
nos últimos vinte anos que na América e na Europa foram realizadas importantes pesquisas diretamente nas salas
de aula com vistas a descrever a prática docente.
66

(2011), dentre outros, considera as experiências vividas, quando tais professores realizam uma
reflexão sobre sua trajetória de vida profissional, evidenciando seus saberes.
Na formação de professores, Mizukami (2011) revela que a base de conhecimento
para o ensino consiste de um corpo de habilidades, compreensões, conhecimentos e
disposições que são necessários para que o professor possa propiciar processos de ensino e de
aprendizagem em diferentes níveis, áreas de conhecimento e modalidades de ensino.
Mizukami (2011) afirma que essa base envolve conhecimentos de diferentes naturezas, todos
necessários e indispensáveis para a atuação profissional. Todavia, a base de conhecimento é
mais limitada na formação inicial e se torna mais aprofundada, flexível e diversificada a partir
da experiência profissional.
Apoiados na premissa de que existe uma base de conhecimento para o ensino, vários
pesquisadores dedicaram-se a sistematizar e investigar saberes docentes. No âmbito
internacional, as pesquisas sobre saberes docentes se iniciaram na década de 1980 e no Brasil
essas pesquisas surgiram a partir da década de 1990. Os saberes docentes são tratados, nas
pesquisas, sob expressões, tais como: knowledge, em inglês, savoir ou connaissance, em
francês, saberes ou conhecimentos em português. Diversos estudos abordando a mesma
temática exploram-na a partir de outras categorias como crenças, concepções, competências,
pensamentos, representações e metáforas (CUNHA, 2003).
Existe, atualmente, um número significativo de produções a respeito da base do
conhecimento, a partir de orientações e concepções diversas, com uma diversidade conceitual
e metodológica das pesquisas. De acordo com Cunha (2007, p. 32), “o campo de pesquisa dos
saberes docentes é imenso e, nos últimos vinte anos, vem se desenvolvendo de maneira
exponencial”.
Neste sentido, a seguir construo uma revisão sistemática sobre os saberes necessários
à atuação profissional que, neste trabalho de tese, não tem como objetivo resumir o
conhecimento acumulado que já foi publicado, mas, sobretudo, fundamentar esta investigação
sobre saberes, que servirão de pano de fundo para responder o problema central da pesquisa.

A Base de Conhecimentos dos Professores em Questão: Tipologias e Concepções

Dado número expressivo de produções a respeito da base de conhecimento, abordo


as principais contribuições teóricas sobre os saberes docentes na perspectiva de quatro
67

autores: Gauthier et al. (2013), Pimenta (2012), Shulman (1986, 1987), e Tardif (2012)24, pois
considero as ideias desses teóricos fios condutores para a reflexão e análise acerca dos saberes
docentes dos sujeitos desta pesquisa.
Primeiro, fui à busca da definição da palavra saber e pude verificar que consiste em
uma noção polissêmica e pode ser usada em diversos modos e diversos contextos. A definição
geral de saber para Beillerot (1994) “é aquilo que, para um determinado sujeito, é adquirido,
construído, elaborado através do estudo ou da experiência” apud Altet (2001, p. 28). Para
diferenciar saber de conhecimento, Altet (2001) distingue informação, saber e
conhecimento:

A informação é “exterior ao sujeito e de ordem social”; - O conhecimento é


“integrado ao sujeito e de ordem pessoal”. O saber situa-se “entre dois polos” em um
intermédio interfacial entre o conhecimento e a informação. O saber constrói-se na
interação entre conhecimento e informação, entre sujeito e ambiente, na mediação e
através dela (p. 28).

Diversos textos sobre educação, normalmente, usam os termos conhecimento e


saber sem distinção de significado. Ao reconhecer que nem os filósofos possuem uma
posição clara sobre a diferenciação de significado destes termos, neste trabalho de tese,
concebo ambas as denominações sem uma diferenciação rígida.
Ao definir o saber, Tardif “dá uma noção em um sentido amplo, que engloba os
conhecimentos, as competências, as habilidades (ou aptidões), isto é, aquilo que muitas vezes
foi chamado de saber, saber-fazer e saber-ser” (2012, p. 255). E por comungar da mesma
definição de saber de Tardif justifico o título deste trabalho de tese, no qual optei pelo termo
saber em lugar de conhecimento.

Os Saberes docentes, na concepção de Gauthier et al.

Ao partir da afirmação de que o ensino é um ofício universal, que possui uma longa
história que remonta à Grécia antiga, Gauthier et al. (2013) sustentam que, atualmente, este
ofício ainda se mantém desempenhando um papel fundamental para as sociedades
contemporâneas. Os autores usam a sentença “conhece-te a ti mesmo”, do oráculo de Delfos,
para dizer que apesar desta longevidade do ofício, sabe-se muito pouco a respeito dos
fenômenos que lhe são inerentes.

24
Justifico a escolha por esses autores também, pois suas obras nas últimas décadas influenciaram tanto
pesquisas quanto políticas de formação e desenvolvimento profissional de professores no Brasil.
68

Segundo Gauthier et al. (2013), de fato, mal consegue-se identificar os atos do


professor que, na sala de aula, têm influência concreta sobre a aprendizagem dos alunos, e se
está apenas começando a compreender como ocorre a interação entre eles e o educador. Nesse
contexto, avançar na pesquisa de um repertório de conhecimentos sobre o ensino possibilita a
enfrentar dois obstáculos que, historicamente, se interpuseram à pedagogia: de um ofício sem
saberes e de saberes sem ofício.
O ofício sem saberes diz respeito à atividade docente que é exercida sem revelar os
saberes que lhe são inerentes. Explicam que “na verdade, mesmo que o ensino já venha sendo
realizado há séculos, é muito difícil definir os saberes envolvidos nesse ofício” (GAUTHIER
et al, 2013, p. 20). Enfatizo, também, que se faz necessário retomar certas ideias
preconcebidas que contribuem para o enorme erro de manter o ensino em uma cegueira
conceitual, ideias que, por exemplo, para ensinar basta apenas transmitir o conteúdo, sendo
suficiente, portanto, conhecer o conteúdo, ou apenas ter talento, ter bom senso, seguir a
intuição, ou ainda basta ter experiência e cultura.
Já os saberes sem ofício têm sua origem nos conhecimentos produzidos nos centros
acadêmicos, e muitos desses conhecimentos, segundo os autores, foram produzidos sem levar
em conta as condições concretas do magistério. Buscou-se formalizar o ensino, mas reduzindo
de tal modo a sua complexidade que ele não mais encontra correspondente com a realidade.
Esses saberes, que não se dirigiam ao professor real, cuja atuação ocorre em uma verdadeira
sala de aula, em que estão presentes muitas variáveis, que interferem no processo de ensino-
aprendizagem e exigem tomadas de decisões. Esse obstáculo contribuiu para
desprofissionalizar a atividade docente:

[...] ao reforçar nos professores a ideia de que a pesquisa universitária não lhes podia
fornecer nada de realmente útil, e que, era muito mais pertinente que uns
continuassem se apoiando na experiência pessoal, outros na intuição, outros no bom
senso, etc. (GAUTHIER et al., 2013, p. 27).

O grande desafio da profissionalização docente é evitar esses dois erros: ofício sem
saberes e saberes sem ofício. Esses autores admitem que as pesquisas já revelem a presença
de um repertório de conhecimentos próprios ao ensino e propõem um ofício feito de saberes.
Neste sentido, o conhecimento do repertório próprio ao ensino contribui para acabar com
ideias negativas preconcebidas sobre o ofício de ensinar, as quais “prejudicam o processo de
profissionalização do ensino, impedindo o desabrochar de um saber desse ofício sobre si
mesmo” (GAUTHIER et al., 2013, p. 25).
69

Gauthier et al. (2013) realizaram estudos e pesquisas sobre o ensino com o objetivo
de identificar as convergências em relação aos saberes mobilizados na ação pedagógica, com
o objetivo de formular problemáticas, de examinar as implicações, de avaliar resultados e de
esboçar uma teoria geral da pedagogia.
Nesta perspectiva, os autores concebem o ensino como a mobilização de vários
saberes que formam uma espécie de reservatório, no qual o professor se abasteceria para
responder a exigências específicas de sua situação concreta de ensino. E categorizam os
saberes de duas formas: o saber privado e os saberes públicos.
O saber privado é o saber experiencial, o qual:

É construído na prática pelos docentes no exercício profissional e que não chega a


ser socializado e validado pelo coletivo de professores. É um saber que, por se
originar do convívio diário na sala de aula, sofre restrições, principalmente nos
meios acadêmicos (GONÇALVES, 2000, p. 27).

Para Gauthier et al. (2013), mesmo que o professor viva várias experiências das
quais tira proveito, tais experiências, infelizmente, permanecem confinadas ao segredo da sala
de aula. Os autores complementam que cada professor sozinho, em seu próprio universo,
elabora uma espécie de jurisprudência particular, feita de mil e um truque que “funcionam” ou
que ele acredita que funcionam. Neste sentido, o que limita o saber experiencial “é
exatamente o fato de que ele é feito de pressupostos e de argumentos que não são verificáveis
por meio de métodos científicos” (p.33).
Já os saberes públicos, de acordo com Gauthier et al. (2013), são saberes oriundos
dos saberes disciplinares, curriculares, das ciências da educação, da tradição pedagógica e da
ação pedagógica. Para os autores, é muito mais interessante conceber o ensino como a
mobilização de vários saberes que formam uma espécie de reservatório, de acordo com a
Figura 2, no qual o professor se abastece para responder às exigências específicas de sua
situação concreta de ensino em sala de aula.
70

Saberes
Disciplinares
(A matéria)

Saberes
Saberes da Ação Curriculares
Pedagógica
(O programa)

Saberes Saberes das


Experenciais Ciências da
(A jurisprudência Educação
particular)

Saberes da
Tradição
Pedagógica
(O uso)

Figura 2: O Reservatório de Saberes em Gauthier et al.


Fonte: Elaboração do autor, baseado em Gauthier et al. (2013)

Os saberes disciplinares se referem aos “saberes produzidos pelos pesquisadores e


cientistas nas diversas disciplinas científicas, aos conhecimentos por eles produzidos a
respeito do mundo” (GAUTHIER et al., 2013, p. 29).
Os conhecimentos produzidos na sociedade são organizados em forma de disciplinas
e utilizados nas instituições de ensino. O professor, que atua em sala de aula, não produz o
saber disciplinar, todavia, ao ensinar, utiliza-se de conhecimentos produzidos por outros
pesquisadores. Para ensinar determinada disciplina, o professor precisa ter conhecimento
sobre o conteúdo trabalhado e, nesse processo, são utilizados inúmeros exemplos ou analogias
para facilitar a compreensão dos saberes disciplinares. Sabe-se que as analogias não são frutos
dos saberes disciplinares, mas produzidos pelo professor no contexto específico do ensino de
sua disciplina em sala de aula. Nesta perspectiva, cada professor adapta o saber disciplinar
conforme o seu próprio conhecimento ou de acordo com a realidade dos seus educandos.
Os saberes curriculares, na perspectiva de Gauthier et al. (2013), são os saberes que a
escola, como instituição, seleciona e organiza certos saberes produzidos pelas ciências e os
transformam em um corpus que será ensinado nos programas escolares. De acordo com os
autores:
71

No Brasil, eles também são transformados pelas diversas editoras em manuais e


cadernos de exercícios que, uma vez aprovados pelo Estado, são utilizados pelos
professores. O professor deve, evidentemente, “conhecer o programa”, que constitui
outro saber de seu reservatório de conhecimentos. É de fato, o programa que lhe
serve de guia para planejar, para avaliar (2013, p. 31).

Os saberes das ciências da educação, para Gauthier et al. (2013), são determinados
conhecimentos profissionais que todos os professores adquiriram, durante a sua formação ou
em seu trabalho que, embora não os ajudem diretamente a ensinar, informa-os a respeito de
várias facetas da educação de um modo geral e do seu ofício. Para os autores, esse tipo de
saber permeia a maneira do professor existir profissionalmente e exemplificam que:

O professor possui noções relativas ao sistema escolar, sabe o que é um conselho


escolar, um sindicato, uma carga horária. Talvez tenha também uma ideia da
evolução de sua profissão, e dominam determinadas noções sobre o
desenvolvimento da criança, as classes sociais, os estereótipos, a violência dos
jovens, a diversidade cultural, etc. Em suma, possui um conjunto de saberes a
respeito da escola que é desconhecido pela maioria dos cidadãos comuns e pelos
membros das outras profissões. (2013, p. 31).

Sobre os saberes da tradição pedagógica, Gauthier et al. (2013) afirmam que estes
passaram a ser considerados a partir do século XVII, quando se estrutura uma nova maneira
de fazer a escola, e dizem que:

(...) Essa maneira de dar aulas terminou se cristalizando naquilo que poderíamos
chamar de “a tradição pedagógica”. Ela chegou até nós e povoa não somente as
nossas recordações de infância, mas também boa parte das escolas atuais (...) é o
saber dar aulas que transparece numa espécie de intervalo da consciência. Nessa
perspectiva, cada um tem uma representação de escola que o determina antes mesmo
de ter feito um curso de formação de professores, na universidade (2013, p. 32).

Por fim, os saberes da ação pedagógica são os saberes experienciais dos professores
a partir do momento em que se torna público e que é testado por meio das pesquisas
realizadas em sala de aula. Para os autores, “os julgamentos dos professores e os motivos que
lhes servem de apoio podem ser comparados, avaliados, pesados, a fim de estabelecer regras
de ação que serão conhecidas e aprendidas por outros professores” (GAUTHIER et al., 2013,
p. 33).
Gonçalves (2000) explicita que, como formadores de professores, percebe-se que a
dicotomia entre os saberes públicos e privados parece ser uma prática usual nas universidades
e nos demais níveis de ensino. O autor afirma que:
72

Na verdade, a relação entre o saber público e saber privado não tem sido trabalhado
ou explorado em nenhum programa do qual o docente participa, desde o programa
de formação inicial aos programas de pós-graduação (especialização, mestrado
doutorado). E o fato de não ser trabalhada em nenhum dos níveis de ensino vem
sendo apontado como uma das prováveis causas da crise e do fracasso do Ensino
Fundamental e Médio, e dos cursos universitários, em especial, dos cursos de
licenciatura (GONÇALVES, 2000, p. 28).

Neste sentido, Gonçalves (2000) complementa que a pesquisa tem sido apontada por
D’Ambrosio (1998) e Fiorentini et al. (1998) e aqui complementa-se por Maldaner (2006)
como aquela que permite a construção de um elo de ligação entre a teoria (saber público) e a
prática (saber privado).

Os Saberes docentes, segundo Pimenta

Ao tratar sobre os saberes dos professores, Pimenta (2012) faz referência à


construção da identidade profissional, afirmando que essa identidade não é um dado imutável,
mas um processo de construção do sujeito historicamente situado, e essa identidade se
constrói, a partir da significação social da profissão, da revisão permanente desses
significados sociais, da revisão das tradições e da reafirmação de práticas consagradas
culturalmente e que sempre permanecem significativas.
A mobilização dos saberes docentes, referidos por Pimenta (2012), como saberes da
docência é um passo importante para mediar o processo de construção da identidade
profissional dos professores. Nessa perspectiva, a autora indica que esses saberes são
constituídos por três categorias, como mostra a figura 3, e essas categorias identificam o que é
necessário saber para ensinar:
73

Saberes da
experiência

Saberes
da
Docência

Saberes do Saberes
Conhecimento Pedagógicos

Figura 3: Saberes da Docência em Pimenta


Fonte: Elaboração do autor, baseado em Pimenta (2012)

Ao que denomina saberes do conhecimento a autora incorpora os saberes


disciplinares e curriculares identificados por Tardif (2012), e dá um destaque aos saberes da
experiência, destacando-o em dois níveis: os saberes da experiência dos estudantes em curso
de formação inicial para professores, construídos durante a vida escolar e os saberes dos
professores, que são produzidos no trabalho pedagógico cotidiano. Pimenta (2012) destaca
que há um reconhecimento de que para saber ensinar não bastam a experiência e os
conhecimentos específicos, mas se fazem necessários os saberes pedagógicos e didáticos e
enfatiza que há necessidade de considerar a prática como ponto de partida e de chegada e de
se reinventarem os saberes pedagógicos, a partir da prática social, para superar a tradicional
fragmentação dos saberes da docência.

Os conhecimentos docentes, de acordo com Shulman

Um dos autores mais citados, internacionalmente, sempre que se discutem os


conhecimentos dos professores, é o norte-americano Lee Shulman25. Na linha de pesquisa de
Shulman (1986, 1987), sobre conhecimento de professores, ganha destaque entre os
conhecimentos docentes o Conhecimento Pedagógico do Conteúdo (PCK, da expressão em
inglês, Pedagogical Content Knowledge) que, segundo o autor representaria o conhecimento
profissional dos professores. O uso da sigla em inglês se justifica pelo fato dela já ser

25
O leitor interessado poderá obter informações complementares, acerca deste autor e do paradigma perdido, no
artigo de: GONÇALVES, Tadeu Oliver; GONÇALVES, Terezinha Valim Oliver. Reflexões Sobre uma Prática
Docente Situada: Buscando Novas Perspectivas Para a Formação de Professores. In: FIORENTINI, Dario et al.
Cartografias do Trabalho Docente. 1.ed. São Paulo: Mercado das Letras, 1998, p. 105-133.
74

conhecida na literatura e que é tratada como sinônimo do próprio conceito. Nesse sentido, ao
tratar sobre os Conhecimentos/Saberes Pedagógicos de Conteúdos Químicos na presente tese,
adoto a sigla (PCKC, da expressão em inglês, Pedagogical Content Knowledge Chemicals).
Shulman (1986) chama a atenção que dentre os conhecimentos que o professor deve
possuir, se verifica a vigilância para a importância do Conhecimento do Conteúdo Específico.
O autor, como pesquisador do programa Knowledge Base, dedicou-se a investigar o que
sabem os professores sobre os conteúdos que ensinam, quais são as fontes desses
conhecimentos, como formam uma base de conhecimentos para a atuação profissional e
reflete sobre a prática pedagógica do professor em uma perspectiva entre os
conhecimentos/saberes relacionados ao conteúdo e conhecimentos/saberes relacionados ao
processo de ensinar.
Fernandez (2015) defende, com base em Shulman (1986, 1987), que a maior
competência do professor é a disciplina, pois o professor é sempre professor de alguma
disciplina e essa especificidade transparece, principalmente, no conceito de PCK. Ao utilizar-
se da terminologia de conhecimentos necessários aos docentes, Shulman (1986) os distingue
em três categorias, de acordo com a Figura 4: de conteúdo específico, pedagógico de
conteúdo e curricular.

Conhecimento
Curricular

Conhecimento
Conhecimento Pedagógico de
do Conteúdo Conteúdo (PCK)
Específico

Base de
Conhecimentos

Figura 4: Base de Conhecimentos na Perspectiva de Shulman


Fonte: Elaboração do autor, baseado em Shulman (1986)

O conhecimento de conteúdo específico refere-se a conteúdos específicos da matéria


que o professor leciona. Está pautado nas compreensões de fatos, conceitos, processos, entre
outros, de uma área específica. Trata-se, pois de um conhecimento, próprio da área do
conhecimento de que é especialista o professor, por exemplo, a Química. A diferença, para
75

Shulman, entre um químico pesquisador e um químico professor de Química, é que o


professor precisa transformar o conhecimento próprio do químico em conhecimento
compreensível para o educando, dentro do nível de escolaridade em que este se encontra. Esta
diferença é que distingue o professor de seu homólogo na área de conhecimento
(GONÇALVES e GONÇALVES, 1998).
Já o conhecimento curricular é o conhecimento sobre o currículo, isto é, o conjunto
de programas elaborados para o ensino de assuntos específicos e tópicos em um dado nível.
Este tipo de conhecimento:

Diz respeito ao conjunto de conteúdos a ser ensinado nos diferentes níveis e séries
de escolaridade e os respectivos materiais didáticos a serem utilizados para a
obtenção da aprendizagem pretendida. Por exemplo, os diferentes modos de
trabalhar o assunto átomo com alunos da 5ª série ou com estudantes de 1ª colegial: a
complexidade, a profundidade e a própria linguagem empregada em cada uma
dessas situações certamente serão diferentes (GONÇALVES e GONÇALVES,
1998, p. 110).

O conhecimento pedagógico de conteúdo - PCK é um tipo de conhecimento, em que


o professor transforma o conteúdo específico em situações de ensino-aprendizagem. Utiliza-se
de analogias, demonstrações, experimentações, ilustrações, exemplos e representações,
inclusive a sequenciação, que implica expor os conteúdos de um mesmo assunto em
diferentes tópicos. Nesse contexto, a competência pedagógica está atrelada a um conteúdo
específico, que é transformado, levando em consideração as dificuldades dos educandos com
esse conteúdo, o contexto, os objetivos, os modos de avaliação, as estratégias instrucionais, o
currículo, entre outros.
Neste sentido, Gonçalves e Gonçalves (1998) evidenciam que:

[...] este é o tipo de conhecimento que permite ao professor perceber quando um


tópico é “mais fácil ou difícil”, quais experiências anteriores os alunos possuem e as
relações possíveis a serem estabelecidas. Não se trata de um conhecimento
pedagógico geral, mas um conhecimento pedagógico do conteúdo a ser ensinado (p.
109).

De acordo com Mizukami26 (2011), o PCK é o único conhecimento pelo qual o


professor pode estabelecer uma relação de protagonismo, sendo de sua autoria e aprendido no
exercício profissional. Concordo com a autora, mas complemento que o PCK deve ser
estimulado e trabalhado nos cursos de formação inicial, nas disciplinas de estágio

26
Mizukami (2011) salienta que embora Shulman não coloque em forma destacada o conhecimento da
experiência como categoria de base de conhecimento, a experiência está presente em todo o processo de
raciocínio pedagógico, a ser considerado a seguir, e é condição necessária (embora não suficiente) para a
construção de conhecimento pedagógico do conteúdo por parte do professor.
76

supervisionado, nas regências de Ensino Fundamental ou Médio, por exemplo, ou disciplinas


como práticas de ensino em atividades de aulas simuladas, minicursos, atividades
experimentais, entre outros. Dessa forma, o licenciando poderá se instrumentalizar para fazer
a mediação didática do saber científico (conhecimento químico) para o saber pedagógico de
conteúdo químico - PCKC (conhecimento escolar) com o acompanhamento e orientação do
professor formador desses licenciandos. Compreendo, também, que existe certo “macete
pedagógico” para se ensinar determinados conceitos de Química, por exemplo, só no contexto
da experiência profissional o professor vai se aperfeiçoar.
A forma como Shulman (1986) se refere ao saber da experiência, embora não
trabalhe com este conceito, é proposta pela classificação que ele faz dos conhecimentos
necessários para os professores, e que ele chama de teacher knowledge (saber dos
professores? Saber docente?). O autor coloca três categorias de apresentação do
conhecimento: proposicional, de caso e estratégico.
O conhecimento proposicional expresso por Shulman ocorre pela apresentação de
princípios, máximas e normas. Segundo Monteiro (2001):

Os princípios são oriundos das pesquisas empíricas; as máximas são oriundas da


prática, não possuem confirmação científica (ex.: quebre um pedaço de giz antes de
escrever para evitar que ele provoque ruídos no quadro); as normas referem-se aos
valores, compromissos ideológicos e éticos de justiça, equidade etc.; eles não são
teóricos nem práticos, mas sim normativos. Ocupam a essência do que o autor
chama de saber dos professores. Eles guiam o trabalho do professor porque são
eticamente ou moralmente corretos (p. 136) [grifo da autora].

Para Shulman (1986), a forma útil de apresentar o conhecimento é o que ele chama
de conhecimento de caso. Neste contexto, quando o professor apresenta o conteúdo na forma
de casos, o mesmo favorece a articulação entre teoria e a prática, pois ambas estão fortemente
entrelaçadas em um relato de caso. Nessa mesma linha, Gonçalves e Gonçalves (1998)
corroboram que:

O conhecimento de caso é o conhecimento específico de um evento muito bem


documentado e ricamente descrito. Enquanto casos em si são relatos de eventos ou
sequências de eventos, o conhecimento que eles representam é que fazem deles
casos. Os casos podem ser exemplos de instâncias específicas da prática – descrições
detalhadas de como um evento instrucional ocorreu – completados com contextos
particulares, pensamentos e sentimentos. Por outro lado, eles podem ser exemplos de
princípios, exemplificando em seus detalhes, uma proposição mais abstrata ou uma
reivindicação mais teórica (p. 112).

A terceira categoria é o conhecimento estratégico que se refere ao modo como o


professor age em situações dramáticas e contraditórias. Esse conhecimento, de modo geral, se
manifesta em situações práticas reais de sala de aula, em que o professor tem que tomar uma
77

decisão no momento da sua ação docente entre princípios contraditórios que possam aflorar.
Esse conhecimento não é ensinado na universidade, mas é aprendido no contexto da prática
profissional. Para essa aprendizagem, parece evidente a concorrência, até mesmo de modo
não consciente, de casos e exemplos previamente vividos/conhecidos (GONÇALVES e
GONÇALVES, 1998).
Ao sintetizar as concepções de Shulman (1986, 1987) sobre os
conhecimentos/saberes necessários à atuação docente pode inferir que o referido autor
valoriza o conhecimento de conteúdo específico, mas enfatiza que o professor precisa
pedagogizar esse conteúdo específico de modo a fazer com o que os seus educandos consigam
entendê-lo. Para tanto, o professor precisa dominar e transformar muito bem os
conhecimentos da base em PCK.

Trajetórias da Formação Inicial e Continuada dos Educadores Químicos egressos do


PIBID

Tornar-se um educador químico, de fato, trabalhando na docência da Educação


Básica, supõe um determinado grau de formação correspondente ao nível de ensino pleiteado,
cuja exigência no Brasil é o curso de Licenciatura em Química como visto na seção anterior.
Ao tratar de trajetórias de formação docente, importante ter em conta que a formação
do professor como pessoa e profissional são inseparáveis e que se formar supõe troca,
experiência, aprendizagens, interações sociais, continuidades, um sem fim de relações e,
acima de tudo, processos intrínsecos de (auto) formação. Nesta perspectiva, ter acesso ao
modo como cada pessoa se forma é ter em conta a singularidade da sua história e, sobretudo o
modo singular como age, reage e interage em seus contextos. Com isso, parto do pressuposto
de que o processo de formação é um processo dinâmico, em que se vai construindo a
identidade pessoal e profissional de uma pessoa, processo esse, em que cada pessoa,
permanecendo ela própria e reconhecendo-se a mesma, ao longo da sua história, se forma e se
transforma sempre em interação (MOITA, 2007).
A escolha pela carreira profissional docente, ao contrário do que revela o senso
comum, não está pautada somente nas características próprias de sua personalidade, tais
como: a disposição, a inteligência, o caráter, a vocação, a aptidão, os dons e os méritos
pessoais, que podem ser cultivados de maneiras diversas, mas depende fundamentalmente de
ter nascido em um determinado momento histórico e em um certo momento sociocultural,
definido por elementos estruturais bem precisos como os de ordem econômica, política e
78

educacional. Esses elementos pesam sobre as opções na vida de cada um e acabam por
prescrever o futuro, orientando a escolha pessoal e exercendo forte influência sobre o
itinerário profissional (VALLE, 2006).
A origem social das professoras colaboradoras Curie, Mayer, Franklin e Meitner é
consideravelmente modesta, pois a maioria descende da população que reside em pequenas
cidades do interior e periferia da capital de Cuiabá-MT, provém das camadas sociais em
ascensão, passando das ocupações manuais às profissões intelectuais, fazendo parte dos
setores menos escolarizados, portadores de baixo capital cultural. Eis algumas falas das
colaboradoras:

Curie: Sou de família humilde, eu meus pais morávamos em Cacoal-RO e nos


mudamos para Cuiabá-MT para fazer tratamento de saúde de minha irmã que tinha
anemia falciforme. Em Cuiabá-MT para ajudar meus pais eu trabalhava de babá na
parte da manhã e estudava na parte da tarde e noite.

Mayer: Sou natural de Poconé-MT e meus pais residem lá até hoje e vim para
Cuiabá-MT para estudar o curso de Licenciatura em Química na UFMT.

Meitner: Sou de família tradicional de Cuiabá de origem simples. Eu e meus pais


moramos no bairro Nova Esperança na periferia da cidade.

Valle (2006) ressalta que em muitos estudos, a escolha de uma profissão é o


resultado de uma combinação entre a representação que o indivíduo tem de si e a experiência
vivida. A autora desenvolveu, em sua pesquisa, três conceitos para a compreensão da escolha
dos professores para o ingresso na carreira docente: a lógica de integração, a lógica da
profissionalização e a lógica da transformação.
O conceito de lógica de integração consiste no esforço contínuo de integração em um
determinado universo social ou profissional relativamente constante e esse esforço é
engendrado no seio da família (socialização primária), em que são nutridas as motivações
intrínsecas, incorporadas por meio de orientações coerentes e homogêneas.
Para Valle (2006), “estas visam adaptar as singularidades e expectativas pessoais e
delimitam as ambições profissionais, procurando engendrar em cada bifurcação (passagem de
um nível de ensino para o outro) as escolhas individuais” (p. 183).
Nesse sentido, as motivações para o ingresso no magistério de algumas professoras
investigadas permanecem no campo dos valores altruístas e da realização pessoal como é
possível constatar na narrativa de Curie:
79

Na escola, no Ensino Médio, eu tinha facilidade nas disciplinas e eu ajudava meus


colegas nas aulas, quem tinha o livro era eu, e eu passava a matéria para o
professor no quadro, e ajudava os meus colegas nas resoluções de exercícios
também. Por isso, me despertou a vontade de ser professora.

De acordo com Cunha (1994), a questão da vocação para a escolha do magistério é


um assunto complexo, pois não há dados suficientes que permitam generalizações. “Parece,
todavia, que há mais influência do ambiente social e das relações do que dos pendores
naturais” (p.83). Podem estes pesares, mas são os primeiros que mais apareceram no
depoimento das professoras. Veja-se a fala da Meitner: Para me tornar professora, digamos
que foi uma vocação que eu tinha e fui procurar em fazer algo em licenciatura no Ensino
Superior.
Para Goodson (2007), as experiências de vida e o ambiente sociocultural são
ingredientes-chave da pessoa que fazem sentido para si e do próprio eu. Uma característica
comum do ambiente sociocultural, colhida nas narrativas dos professores, no que diz respeito
à escolha da profissão docente é o que Goodson aponta, isto é, “aparecimento de um
professor preferido que o influenciasse, de modo significativo, a pessoa enquanto jovem
aluno” (p.72). Nas narrativas das professoras colaboradoras, nesta pesquisa, todas
expressaram a passagem da influência de um determinado professor, seja na Educação Básica
ou no Ensino Superior, que as influenciaram sobre a escolha e até mesmo a permanência na
profissão que, na perspectiva de Valle (2006), está centrada na lógica da transformação. Eis
alguns depoimentos:

Mayer: Do primeiro ao terceiro ano, eu tive um professor de Química que marcou


muito, achava que ele era o cara! (rsrsr) Foi ele que me despertou a vontade em
fazer licenciatura em Química e até hoje, eu em sala de aula com meus alunos me
vejo fazendo com eles algumas práticas que esse professor fazia com a minha sala,
quando eu era estudante do Ensino Médio.

Franklin: Eu tive uma professora muito boa de Química no primeiro e segundo ano
do Ensino Médio e desde então foi despertando o meu desejo em fazer Química, mas
eu não sabia se era para bacharelado ou licenciatura. Daí eu tive outro professor
de Química, também no terceiro ano, e eu falei: não! É isso! É Química que eu vou
fazer e sempre quando eu assistia às aulas dele eu dizia: um dia quero ser igual a
esse professor...

A opção por fazer o curso de Licenciatura em Química se evidenciou também nas


narrativas das professoras, no sentido de vislumbrarem melhores possibilidades profissionais
no curso. Essa escolha está centrada na lógica da profissionalização, como afirma Valle
(2006), pois o estudante que cursasse a Licenciatura em Química na estrutura curricular de
1997/1 da UFMT tinha as mesmas atribuições que o Bacharel em Química junto ao CRQ/MT
e para que o estudante se graduasse também em bacharelado para obter a dupla diplomação,
80

em licenciatura e bacharelado, o estudante da licenciatura complementava seus estudos para o


bacharelado em apenas um semestre a mais, já para o estudante do Bacharelado em Química
para obter o diploma de licenciatura ficava quatro semestres a mais por conta das disciplinas
da área de ensino que eram todas com pré-requisitos.
Deve-se levar em consideração, também, que a ampla concorrência para o ingresso
no curso de Bacharelado em Química, visto que este sempre foi o mais concorrido tanto na
época do ingresso à universidade por meio de vestibulares como na nova forma de ingresso
adotada pela UFMT, a partir de 2008, pela classificação do candidato no Exame Nacional do
Ensino Médio (ENEM). Dessa forma, o curso de licenciatura, por ter sempre uma
concorrência de ingresso menor, em comparação com a do bacharelado, devido a pouca
atratividade do magistério, assim, para muitos estudantes a entrada na Química pela
licenciatura servia de trampolim para o curso de Bacharelado em Química, uma vez que no
decorrer do curso de licenciatura se transferiam, por editais de transferência interna da
universidade, para o curso de bacharelado.

Meitner: Escolhi a licenciatura e já entrei consciente [de] que seria professora,


mas durante o curso me surgiu a oportunidade de fazer o bacharelado, mas me
convenci que queria apenas a licenciatura.

Franklin: A minha intenção no início em fazer o curso de licenciatura era obter o


título de bacharelado também, porque a licenciatura se diferenciava muito pouco do
bacharelado, complementando meus estudos mais seis meses eu teria os dois cursos,
podendo trabalhar tanto nas indústrias quanto a dar aulas.

Outro fator que influencia a escolha para ingresso no magistério, de acordo com
Goodson (2007), é o fato de o licenciado ter sido educado em um ambiente sociocultural
próprio da classe trabalhadora. Essa experiência de ter sido educado em um ambiente que
influenciasse a escolha pela profissão docente foi evidenciada na narrativa de Mayer: Em
minha família, há vários profissionais da educação, estive sempre envolvida nesse meio e, a
partir de então despertei o interesse em lecionar.
De forma geral, a escolha pela profissão professor ou ser educador químico, de
acordo com as narrativas dessas professoras, levando em conta cada singularidade, ocorreu
pela afinidade com a docência e o gosto de ensinar pautados na lógica da integração, a
possibilidade de melhores possibilidades de atuação no mercado de trabalho, pela lógica da
profissionalização, da influência do ambiente sociocultural próprio da classe trabalhadora com
a lógica da transformação. Estas lógicas não são autônomas, mas interdependentes, como
afirma Valle (2006).
81

Valle (2006) enfatiza que as lógicas de integração, de profissionalização e de


transformação estão articuladas e se concretizam a partir de outras lógicas: a lógica
institucional pautada nas políticas educacionais e os programas de formação inicial e
contínuo, que visam viabilizar os objetivos educacionais do Estado; a lógica de proximidade
que contempla a oferta de habilitações profissionais, fazendo com que essas escolhas sejam
feitas pela proximidade e disponibilidade nos estabelecimentos de ensino, e a lógica
corporativa que evidencia a mobilização de associações e sindicatos, que se dispõem a
consolidar a carreira docente, para (re) conquistar direitos que são considerados fundamentais
para a identidade profissional.
Em relação à formação profissional continuada, a principal constatação evidenciada
nas narrativas é a consciência que a formação é contínua, por parte de todas as professoras
entrevistadas, demonstrando consciência de que a formação docente é contínua e que
precisam sempre ir à busca de novos conhecimentos para se atualizarem. Segundo essas
professoras, dos cursos de formação continuada que realizam, alguns se encontram na
universidade, tais como congresso e seminário de educação, pós-graduação Scrito Sensu, e
outros se situam em momentos de estudos e reflexões sobre a ação pedagógica em cursos e
projetos ofertados no âmbito da própria escola em que lecionam, como a Sala do Educador,
Pacto pelo Fortalecimento do Ensino Médio entre outros.

Curie: Eu ainda me vejo hoje muito longe do que eu gostaria, por isso dei
continuidade em meus estudos na Pós-Graduação e estou no curso de Mestrado em
Educação na UFMT, e faço cursos que possam ser interdisciplinares com a minha
área também.

Mayer: Desde a minha formação inicial e até os dias de hoje, percebo que estou
cada vez mais empenhada e curiosa em aprender novas ferramentas para a sala de
aula, buscando sempre uma melhoria na qualidade do ensino, sempre tentando
adaptar as diversas problemáticas do cotidiano. Procuro também sempre participar
de cursos, seminários e congressos na área de educação.

Pesquisadores como Nóvoa (1992), Zabalza (2004) e Alarcão (2005) reforçam a


ideia de que a formação transcende a etapa escolar e os conteúdos convencionais da formação
acadêmica, vinculando-se a todo ciclo vital, constituindo, assim, um processo intimamente
ligado à realização pessoal e profissional dos indivíduos, ou seja, os sujeitos se formam ao
longo da vida.
82

Iniciação à Docência e os Saberes Necessários à Atuação Profissional na Perspectiva de


Tardif

No que tange à inserção profissional na Educação Básica, todas as professoras


investigadas estão em início de carreira com, no mínimo, dois anos e no máximo seis anos de
docência, e começaram a trabalhar, de fato, como educadoras químicas na Educação Básica,
somente após a conclusão do curso de Licenciatura em Química.
Todavia, algumas dessas professoras, antes da conclusão do curso de graduação,
tiveram experiências com a docência como monitora de disciplina no Ensino Superior:
(Meitner), e substituição temporária de professores de Química na Educação Básica: (Curie,
Mayer e Franklin). A experiência mais marcante relatada por elas foi a passagem pelo
PIBID, pois esse programa lhes proporcionou uma prática antecipada de docência, que
significou momento de entusiasmo, de descoberta e de encantamento pela docência, embora
marcado por dificuldades e insegurança (GONÇALVES, 2000).
As narrativas revelam também que o Programa contribuiu para a compreensão dos
fenômenos educativos, tais como: o trabalho coletivo, o planejamento de aulas, o
desenvolvimento de materiais didáticos alternativos, entre outros, tornando-as profissionais
compromissadas e engajadas com a educação. Eis alguns depoimentos das colaboradoras:

Curie: O PIBID me ajudou muito no desenvolvimento das disciplinas de Práticas de


Ensino de Química I, II e III, principalmente a III que era regência em sala de aula
do Ensino Médio, e eu não faria essa regência com tanta tranquilidade como eu fiz,
se eu não tivesse tido já a experiência de estar dois anos antes direto dentro da sala
de aula do Ensino Médio por conta do PIBID.

Mayer: Minhas experiências profissionais iniciaram-se durante a graduação


quando eu fui bolsista do PIBID. Considero excepcional a oportunidade de ter
participado do PIBID, pois permite a inclusão do licenciando no contexto escolar,
para que a iniciação à docência ocorra antes mesmo de chegar o estágio. O que me
marcou na participação desse programa foram os planejamentos de aulas, oficinas
e projetos. Nos dias atuais, essas experiências me ajudam e muito no
desenvolvimento e preparação das minhas aulas, atividades experimentais e até
mesmo nos projetos que temos que desenvolver na escola.

Franklin: Até antes de eu entrar no PIBID, eu não via relação do curso de


licenciatura da UFMT com a escola, os estágios que nós fizemos eu achei muito
vago e o PIBID me encorajou, tipo: “agora você vai!”. Só que era um “você vai
com auxílio do supervisor e orientador”, não era um “você vai com a cara e a
coragem” e isso me tranquilizou muito no meu início da docência.
83

Meitner: O PIBID me proporcionou experiência com a prática em sala de aula e a


vivência com os alunos. Quando eu apresentava as microaulas nas Práticas de
Ensino, o público era os colegas graduandos, diferença incomparável com os
alunos do Ensino Médio. Com o PIBID, eu ministrei aulas diretamente para os
alunos do Ensino Médio, verifiquei as dificuldades, as facilidades e, principalmente,
as experiências de elaborar aulas experimentais e de trabalhar com materiais
alternativos...

Pelas narrativas acima expressas, compreendo que a experiência inicial da docência


vivida no contexto do PIBID, pelas professoras colaboradoras possibilitou uma formação
inicial constituída pelo seu envolvimento, com processo de construção da sua prática escolar
caracterizada pela interação e parceria diretamente com os estudantes do Ensino Médio, de
modo prolongado com a escola e o não aligeiramento da formação do professor. Um dos
aspectos positivos sinalizados pelas participantes da pesquisa foi a partilha da formação
inicial com o docente da IES e o professor-supervisor da Educação Básica com orientações
dos planejamentos de aulas, oficinas e projetos junto ao bolsista licenciando. Com isto, é
possível inferir que a interação do PIBID favoreceu tanto a formação inicial do estudante,
quanto a formação continuada do professor-supervisor.
A construção de saberes docentes, na perspectiva de Tardif27 (2012), diz respeito a
uma realidade social materializada por meio da formação, de programas, de práticas coletivas,
de disciplinas escolares, dentre outros, e são, ao mesmo tempo, os saberes próprios do
professor. Nesse sentido, o autor propõe seis fios condutores que procuram situar os saberes
docentes entre a perspectiva individual e o social, entre o professor e o sistema em que atua, o
que caracteriza uma forte dimensão da pesquisa narrativa, que diz respeito ao social e
individual. Esses fios estão apresentados na Figura 5.

27
Para pesquisar os saberes profissionais docentes, Tardif (2012) propõe o conceito de Epistemologia da
Prática Profissional que de acordo com o autor é o estudo dos conjuntos dos saberes utilizados realmente pelos
profissionais, em seu espaço de trabalho cotidiano, para desempenhar todas as suas tarefas.
84

1º - Saber e Trabalho

2º - Diversidade do saber

3º - Temporalidade do
saber 4º - A experiência de trabalho enquanto
fundamento do saber

5º - Saberes humanos a respeito de


seres humanos

6º - Saberes e formação de professores

Figura 5: Fios Condutores dos Saberes Docentes em Tardif


Fonte: Elaboração do autor, baseado em Tardif (2012)

O primeiro fio condutor, que diz respeito ao saber e trabalho, compreende o saber do
professor em seu ambiente profissional e se refere às relações mediadas pelo trabalho, a partir
das quais constrói saberes para enfrentar e solucionar situações cotidianas em sala de aula.
O segundo fio condutor é a diversidade do saber, pelo qual é reconhecida a
pluralidade do saber do professor. Segundo o autor, esse pluralismo de saberes provém de
diversas fontes como, por exemplo:

[...] alguns deles provém da família do professor, da escola que o formou e de sua
cultura pessoal; outros vêm das universidades ou das escolas normais; outros estão
ligados às instituições (programas, regras, princípios pedagógicos, objetivos,
finalidades e etc.); outros ainda provêm dos pares, dos cursos de aperfeiçoamento,
etc. (p. 19).

O terceiro fio condutor é a temporalidade do saber, pois entende que o saber do


professor é temporal, uma vez que é adquirido no contexto de uma história de vida. O autor
argumenta que para ensinar é preciso aprender a ensinar e isso acontece com o tempo,
progressivamente, à medida que vai acontecendo a realização do trabalho docente.
A experiência do trabalho como fundamento do saber é o quarto fio condutor, que é
constituído pelos saberes advindos da experiência do trabalho e que constituem o alicerce da
prática e das competências profissionais. Ao ensinar, o professor mobiliza uma ampla
variedade de saberes, reutilizando-os no trabalho para transformá-los e adaptá-los para e pelo
trabalho.
85

O quinto fio condutor, saberes humanos a respeito de seres humanos, enfoca a ideia
do trabalho docente como interativo, ou seja, um trabalho em que o professor se relaciona
com o seu objeto de trabalho, fundamentalmente, por meio da interação humana.
O sexto e último fio condutor, saberes e formação profissional, reúne saberes
decorrentes dos saberes anteriores e expõe a necessidade de repensar a formação docente, em
que se devem levar em conta os saberes dos professores e as realidades específicas de seu
trabalho cotidiano.
Apresento a seguir, esses saberes para auxiliar na compreensão das relações que as
professoras colaboradoras estabelecem com esses saberes.
Os saberes da formação profissional dizem respeito ao conjunto de saberes
transmitidos, pelas instituições de formação de professores, como as escolas normais,
faculdades e institutos de educação ou construídos em processos autoformativos (JOSSO,
2004).
Tardif afirma que “o saber profissional está na confluência de vários saberes
oriundos da sociedade, da instituição escolar, de outros atores educacionais, das
universidades, etc (2012, p. 19)” [grifo nosso].
Os saberes disciplinares são os saberes que correspondem aos diversos campos do
conhecimento, saberes esses de que dispõe a sociedade, tais como se encontra hoje nas
universidades, no interior de faculdades e de cursos distintos sob forma de disciplinas. Nas
palavras do autor:

Os saberes disciplinares (por exemplo, matemática, história, literatura e etc.) são


transmitidos nos cursos e departamentos universitários independentemente das
faculdades de educação e dos cursos de formação de professores. Os saberes das
disciplinas emergem da tradição cultural e dos grupos sociais produtores de saberes.
(TARDIF, 2012, p. 38).

Nas entrevistas com as professoras colaboradoras, fiz a seguinte indagação: quais


conteúdos da disciplina de Química você mais gosta de trabalhar no Ensino Médio? Curie e
Franklin expressaram que gostam de trabalhar com modelos atômicos, Mayer e Meitner
gostam de trabalhar com ácidos e bases.
No que tange aos saberes curriculares, estes são os saberes que correspondem aos
discursos, objetivos, conteúdos e métodos a partir dos quais a instituição escolar categoriza e
apresenta os saberes sociais por ela definidos e selecionados como modelo de cultura erudita.
“Apresentam-se concretamente sob a forma de programas escolares (objetivos, conteúdos,
métodos) que os professores devem aprender e aplicar” (TARDIF, 2012, p. 38).
86

Sobre os saberes curriculares, na perspectiva de Tardif (2012) e Gauthier et al.


(2013), no momento da entrevista com as professoras, ao serem indagadas como estavam
organizado o currículo de Química no ano em que elas atuavam, todas as colaboradoras
Curie, Mayer, Franklin, Meitner expressaram que trabalham com o currículo de Química
como está apresentado na sequência dos livros didáticos: no nono ano do Ensino Fundamental
e quando trabalham com a disciplina de Ciências e essa é subdividida em um semestre com
conhecimentos de Química e um semestre com conhecimentos de Física; no primeiro ano do
Ensino Médio trabalham com química geral e inorgânica; já no segundo ano do Ensino Médio
com físico-química e no terceiro ano, com química orgânica.
Depreendo, com Sacristán (2000), que para que seja possível compreender o que é o
ensino, as práticas pedagógicas, o conhecimento dos docentes e o próprio currículo, em si,
têm que levar em consideração a elaboração curricular e a forma com que este se desenvolve
em uma determinada disciplina.
Todas as professoras colaboradoras da pesquisa Curie, Mayer, Franklin e Meitner
revelaram que utilizam somente o livro didático em seus planejamentos e desenvolvimento
curricular em Química. Elas se expressam nos seguintes termos:

Curie: Para o meu planejamento, eu sigo somente a apostila que a escola adota,
pois tenho que cumprir todo o conteúdo programático que vem nela.

Mayer: O planejamento da disciplina de Química é realizado junto com os


professores das outras áreas na semana pedagógica com os professores no início do
ano, mas sigo sempre o livro didático.

Franklin: Para desenvolver as minhas aulas de Química no Ensino Médio, eu


utilizo somente o livro didático adotado na escola pelo PNLD.

Meitner: Eu acabo ficando refém do livro didático, por ter muitas atividades a ser
feitas no dia a dia. É um instrumento mais prático, para desenvolver as minhas
aulas.

Os professores na Educação Básica, ao utilizar somente o livro didático no processo


de ensino-aprendizagem, justificam-se por falta de tempo, pelas múltiplas atribuições
cotidianas, em última análise das condições reais de trabalho docente. Contudo, é comum se
ouvir dizer que as mazelas educacionais se devem à incompetência dos professores que,
muitas vezes, acabam sendo adotados por livros-texto.
Nesse sentido, para eliminar essa visão simplista e distorcida do senso comum em
relação aos professores e com o intuito de não culpabilizar essas colaboradoras pelas mazelas
do processo de ensino-aprendizagem de Química na Educação Básica, para esse dado de
pesquisa, busco compreensão em Sacristán (2000), quando afirma que as condições nas quais
87

os professores realizam o seu trabalho não são, em geral, as mais adequadas para desenvolver
a iniciativa profissional, pois o número de educandos a serem atendidos, ao lado das diversas
facetas que o professor deve assumir, tais como, a atenção aos educandos, a correção de
trabalhos, a burocracia que origina sua própria atividade, as condições físicas precárias de
muitas escolas públicas, entre outros, são atividades que se somam à estrita tarefa de planejar,
ensinar e de avaliar o ensino. Essa debilidade da profissionalização dos professores e as
condições nas quais desenvolvem seu trabalho fazem que os meios elaboradores do currículo
sejam dispositivos intermediários, essenciais e indispensáveis no atual sistema escolar.
De acordo com o autor: “esta é a função capital que os meios didáticos cumprem,
mas, sobretudo os guias didáticos e os livros-texto, que são autênticos responsáveis pela
aproximação das prescrições curriculares aos professores” (2000, p. 149).
Dessa forma, Sacristán (2000) afirma, ainda, que os materiais didáticos desenvolvem
todo o currículo, pois:
1) São os tradutores das prescrições curriculares gerais e, nessa mesma medida,
construtores de seu verdadeiro significado para alunos e professores; 2) São os
divulgadores de códigos pedagógicos que levam a prática, isto é, elaboram os
conteúdos ao mesmo tempo que planejam para o professor sua própria prática; são
depositários de competências profissionais; e 3) Voltados à utilização do professor,
são recursos muito seguros para manter a atividade durante um tempo prolongado, o
que dá uma grande confiança e segurança profissional. Facilitam-lhe a direção da
atividade nas aulas (2000, p. 157).

Diante do exposto, os livros didáticos não são apenas recursos para serem usados
pelos professores e educandos, mas passam a ser os verdadeiros sustentadores da prática
pedagógica dessas professoras colaboradoras.
No que concerne à disposição do currículo de Química na Educação Básica, as
Orientações Curriculares Nacionais de Química para o Ensino Médio fazem sérias críticas aos
procedimentos usuais nas escolas, dizendo que:

De forma geral, nos programas escolares é que persiste a ideia de um número


enorme de conteúdos a desenvolver, com detalhamentos desnecessários e
anacrônicos. Dessa forma, os professores obrigam-se a “correr com a matéria”,
amontoando um item após outro na cabeça do aluno, impedindo-o de participar na
construção de um entendimento fecundo sobre o mundo natural. São visivelmente
divergentes o ensino de Química no currículo praticado e aquele que a comunidade
de pesquisadores em Educação Química do país vem propondo. (2008, p. 108).

Neste sentido, a inexistência de uma seleção de temas e o progressivo crescimento


do conhecimento na área de Química acaba impondo propostas de ensino de Química com
conteúdos exagerados em relação ao tempo disponível. As tentativas para solução desse
problema sempre se resumiram ao corte linear aplicado sobre o conjunto, obrigando dessa
88

forma os textos didáticos a discorrer sobre tudo um pouco, sem se aprofundar em nenhum
assunto. Essa redução do tempo dedicado à discussão dos temas, feita de maneira não seletiva,
torna os conteúdos fragmentados e difíceis de serem compreendidos pelos estudantes,
induzindo também à valorização dos conteúdos de simples memorização em detrimento da
reflexão e uso do raciocínio (RIBEIRO, 2009).
Ainda, em relação à metodologia do ensino de Química para a Educação Básica, as
Orientações Curriculares Nacionais de Química para o Ensino Médio afirmam que:

Em que pesem as abordagens consensuais na educação em Ciências, nos últimos 40


anos, dirigidas à superação de metodologias e conteúdos marcados pelo “modelo
bancário” (FREIRE, 1987) de ensino-aprendizagem, conclui-se que, no país, as
práticas curriculares de ensino de Ciências Naturais são ainda marcadas pela
tendência de manutenção do “conteudismo” típico de uma relação de ensino tipo
“transmissão – recepção”, limitada à reprodução restrita do “saber de posse do
professor”, que “repassa” os conteúdos enciclopédicos ao aluno. Esse, tantas vezes
considerado tábula rasa ou detentor de concepções que precisam ser substituídas
pelas “verdades” químico-científicas (2008, p. 105).

Nesta perspectiva, o tratamento metodológico referido confirma a crítica de Chassot


(2014), quando diz que a Química, da forma como é trabalhada no Ensino Médio, é
considerada uma ciência esotérica, concorrendo para o desestímulo do educando, que cria a
falsa ideia de que a Química é, em si, de difícil compreensão, portanto, para ser entendida por
poucos especialmente qualificados.
Mesmo trabalhando a sequência dos conteúdos de Química de forma tradicional, as
professoras investigadas expressaram sempre trabalhar os conteúdos de forma contextualizada
e na perspectiva de formar cidadãos críticos para atuar na sociedade em que vivem, tentando
dessa forma romper com a lógica tradicional de ensino. Nesta perspectiva, Curie destaca a
importância de trabalhar o conhecimento de Química, de forma contextualizada, ao lado do
desenvolvimento de valores éticos:

Eu sempre trabalho com meus alunos na perspectiva interdisciplinar e de forma


contextualizada. Hoje, quando um aluno fala que ele não vai usar Química, que ele
vai ser médico, ou porque ele vai ser advogado, eu falo: não! Você vai usar
Química, sim! Você já parou para pensar se uma indústria polui o rio e você como
advogado pega a causa dessa indústria para defender e não entende nada de
Química, como você vai garantir que essa indústria não poluiu esse rio ou poluiu
esse rio? Então você como advogado precisa conhecer Química.

Entendo que Curie, ao oferecer um ensino de Química para formar cidadão, tem
como intencionalidade pedagógica a de preparar seus educandos para que eles compreendam
questões locais e globais do mundo contemporâneo e façam uso das informações químicas
89

básicas necessárias para a participação efetiva na sociedade e no trabalho, em que os


conhecimentos e os avanços tecnológicos se modificam constantemente. De acordo com
Santos e Schnetzler (2003), o ensino de Química para formar cidadão:

Levaria o aluno a compreender os fenômenos químicos mais diretamente ligados a


sua vida cotidiana; a saber, manipular as substâncias com as devidas precauções; a
interpretar as informações químicas transmitidas pelos meios de comunicação; a
compreender e avaliar as aplicações e implicações tecnológicas; a tomar decisões
frente aos problemas sociais relativos à Química (p.94).

Ainda sobre o ensino de Química para formar cidadão, Santos e Schnetzler (2003)
alertam que esse ensino não consiste em ensinar a Química dos polímeros, das poliamidas,
dos policarbonatos, dos neoprenos, dos hidrocarbonetos, das sulfamidas, dos organoclorados,
dos sais de ácidos carboxílicos e de ácidos benzenossulfônicos substituídos, como pretendem
alguns livros, maquiados com o cotidiano. O conhecimento químico que se deve trabalhar
com os estudantes da Educação Básica precisa implicar também no desenvolvimento de
valores éticos (RIBEIRO, 2009).
No tocante aos saberes da experiência, de acordo com Tardif (2012) são saberes
constituídos no exercício da prática cotidiana da profissão, fundada no trabalho e no
conhecimento do meio. Estes incorporam-se à experiência individual e coletiva sob a forma
de habitus (isto é, certas disposições adquiridas na e pela prática real) que lhe permitirão
enfrentar os condicionantes indispensáveis da profissão.
Por este ângulo:

Os habitus “podem transformar-se num estilo de ensino, em “macetes” da profissão


e até mesmo em traços da “personalidade profissional”: eles se manifestam então,
através de um saber-ser e de um saber-fazer pessoais e profissionais validados pelo
trabalho cotidiano (TARDIF, 2012, p. 49)”.

No decorrer da entrevista, ao serem indagadas sobre como se veem como professores


que ensinam Química, desde a formação inicial até os dias atuais, Meitner expressou que a
experiência do dia-a-dia da sala de aula fez com ela ganhasse confiança em sua prática
pedagógica por se considerar uma pessoa tímida:

No meu desenvolvimento profissional eu me sinto sempre em constante evolução,


pois a cada ano eu sou surpreendida com dificuldades diferentes e eu consigo
superá-las. Eu me considero um pouco tímida, porém quando eu entro na sala de
aula eu me transformo e me surpreendo com uma sala com 35 alunos todos
prestando atenção no que eu estou explicando, mas essa confiança em sala de aula
eu só fui conquistando com o passar do tempo em sala de aula.
90

Meitner expressa, no excerto acima, a sua percepção de desenvolvimento


profissional, ao dizer: eu me sinto sempre em constante evolução, pois a cada ano eu sou
surpreendida com dificuldades diferentes e eu consigo superá-las. Ao reconhecer dificuldades
em sua prática docente e procurar superá-las, sente o êxito profissional e o próprio
crescimento na docência. Sente-se mais confiante, no exercício da docência, destacando que
essa confiança em sala de aula eu só fui conquistando com o passar do tempo, em sala de
aula. Ela não expressa, mas certamente, desenvolveu um jeito de ser e estar na profissão, um
habitus profissional, que conquista a atenção dos estudantes e a faz sentir-se confiante em sala
de aula. Evidencia, contudo, uma certeza, Tornou-se assim, com o passar do tempo, em sala
de aula, ou seja, aprendeu com a experiência, conforme ensina Tardif (2012).
Já Curie percebeu no contexto da prática que, embora ela trabalhe com os mesmos
conteúdos todos os anos, cada turma é diferente, então sempre há necessidade de fazer novos
planejamentos:
Eu me vejo ainda muito longe do que eu gostaria, porque eu tenho as minhas
limitações, minhas aulas são sempre planejadas antes e por mais que eu trabalhe
com turmas de primeiro ano já há três anos, todas as minhas aulas são preparadas
de novo, meus planos de aulas são escritos novamente porque cada turma de cada
ano são diferentes, então todo ano eu mudo as atividades e o que deu certo eu
sempre tento aproveitar e o que não deu certo então eu já mudo o método.

No excerto acima, Curie percebe a sua própria incompletude, ao dizer: Eu me vejo


ainda muito longe do que eu gostaria, porque eu tenho as minhas limitações. Ao reconhecer
sua incompletude, reflete e planeja novamente a cada turma, examina a sua prática e o que foi
bem sucedido, aproveita e muda o modo de ensinar para aspectos nos quais não houve
sucesso (FREIRE, 2013).
As professoras investigadas expressaram, em suas narrativas, que o PIBID ajudou de
forma positiva as práticas em sala de aula, colaborando de forma significativa para os seus
saberes pedagógicos de conteúdo - PCK, em Shulman (1986), os saberes da ação pedagógica
na perspectiva de Gauthier et al. (2013), os saberes pedagógicos e saberes da experiência na
perspectiva de Pimenta (2012) e Tardif (2012). Tendo em vista, que as relações da mediação
didática dos saberes científicos para os saberes pedagógicos de conteúdos químicos para
atuarem na educação básica foram realizados somente nas disciplinas de Práticas de Ensino na
graduação e as demais disciplinas do curso não lhe possibilitaram essa construção. Veja-se os
seguintes registros:
91

Curie: O PIBID contribuiu tanto para a minha escrita, na elaboração de texto, nas
leituras, nas interpretações dessas leituras que hoje eu sento e consigo ler um artigo
acadêmico e dizer: Não! Esse artigo está dizendo isso, onde e como eu posso
aplicar a contribuição desse teórico em minha sala de aula ...

Mayer: Hoje em dia eu não tenho dificuldades de preparar minhas aulas e eu não
só utilizo o livro didático adotado na escola, eu utilizo outros materiais para
complementar o conteúdo que irei trabalhar. Na escola onde eu trabalho tem
laboratório de Ciências, então eu sempre preparo atividades experimentais e levo
meus alunos para o laboratório para que eles possam associar o que estão
estudando na teoria com alguma aplicação prática. E nas minhas aulas
experimentais eu não tenho nenhuma dificuldade ou medo de prepará-las, porque
na escola estadual apesar de ter o laboratório não possui recursos para comprar
reagentes que nós necessitamos. Então, eu procuro trabalhar com materiais
alternativos e coisas do dia a dia dos alunos que eles possuem em casa. Nos roteiros
das aulas, os alunos usam a reflexão para resolver os problemas propostos nas
atividades experimentais. Dessa forma, com os conhecimentos químicos
trabalhados, os mesmo têm a possibilidade de se tornarem cidadãos mais críticos
na sociedade em que vivem.

No excerto acima, Curie expressa que, ao participar do PIBID, ela viveu várias
experiências formativas, mas o que mais lhe marcou foi a dedicação às leituras dos artigos no
âmbito da educação, pois no início e até a metade do curso de Química eles não tinham o
hábito de ler, só de fazer cálculos e, nos dias atuais, por meio de leituras de artigos teóricos,
tenta aplicar e contextualizar os conteúdos em sua sala de aula. Já Mayer expressa, que sua
experiência no PIBID contribuiu para que ela não ficasse refém de um único livro didático,
em sala de aula, e não tivesse medo de trabalhar com atividades experimentais na Educação
Básica. A experiência de trabalhar com atividades experimentais com materiais alternativos
proporcionados pelo PIBID na formação inicial, como expressou Mayer, evidencia o
consenso que há entre pesquisadores e professores de ciências naturais de que as atividades
experimentais devem permear as relações de ensino-aprendizagem, uma vez que estimulam o
interesse dos estudantes em sala de aula na Educação Básica e o engajamento em atividades
subsequentes de ensino (GIORDAN, 1999; LABURÚ, 2006).
Nessa mesma linha, pesquisas como de Galiazzi et al. (2004), dentre outras, acenam
para as múltiplas funções da experimentação na educação científica, entre elas: motivar e
estimular os estudantes, melhorar a aprendizagem de ciências, introduzir os estudantes ao
método científico e desenvolver habilidades científicas tais quais: observação, reflexão,
formulação de hipóteses e ensinar técnicas de laboratório.
Ao sintetizar a revisão sistemática sobre saberes docentes que foi apresentada nessa
subseção, identifiquei que embora Shulman (1986), Gauthier et al. (2013), Tardif (2012) e
Pimenta (2012) possam realizar abordagens teóricas distintas, é possível reconhecer que há
pontos de aproximação quando, por exemplo, Tardif (2012) trabalha com o conceito de saber
da experiência, Shulman (1986) com o conceito de conhecimento pedagógico de conteúdo
92

- PCK, e Gauthier et al. (2013) com o conceito do saber da ação pedagógica, e Pimenta
(2012) com o saber pedagógico, ou seja, o conteúdo específico reelaborado, por professores,
para ser ensinado aos educandos.
A seguir apresento a classificação e particularidades das pesquisas sobre saberes
docentes dos autores apresentados no Quadro 1, e construo uma síntese das tipologias dos
saberes por meio da figura 6.

Shulman • Conhecimento que os professores têm do conteúdos de


ensino e o modo como estes se transformam em ensino.
• Ofício feito de Saberes.
Gauthier et al. • Constituir Teoria Geral da Pedagogia.
• Epistemologia da Prática Profissional dos Professores.
Tardif • Ênfase no Trabalho Docente.
Mobilização dos saberes da docência.
Pimenta
Construção da Identidade Profissional dos Professores.

Quadro 1: Classificação e Particularidades das Pesquisas sobre Saberes Docentes


Fonte: Elaboração do autor, baseado em de Shulman, Gauthier, Tardif e Pimenta

• Shulman (1986)
- Conhecimento do Conteúdo específico
- Conhecimento Pedagógico de Conteúdo (PCK)
- Conhecimento Curricular

• Gauthier et al. (2013)


- Saberes Disciplinares
- Saberes Curriculares
- Saberes das Ciências da Educação
Saberes - Saberes da Tradição Pedagógica
- Saberes Experenciais
Docentes - Saberes da Ação Pedagógica

• Tardif (2012)
- Saberes da Formação Profissional
- Saberes Disciplinares
- Saberes Curriculares
- Saberes da Experiência

• Pimenta (2012)
• - Saberes da Experiência
• - Saberes do Conhecimento
• - Saberes Pedagógicos

Figura 6: Tipologia dos Saberes Docentes


Fonte: Elaboração do autor, baseado em de Shulman, Gauthier, Tardif e Pimenta
93

Após percorrer a exposição sobre as histórias de formação inicial e continuada e


iniciação à docência das colaboradoras de pesquisa, apresento, a seguir, o modelo didático
dessas colaboradoras, pois se trata de um instrumento de análise que pode ser acessado de
forma aproximativa com a realidade educativa dessas professoras.

Modelos Didáticos e Aproximação da Realidade Educativa

Várias pesquisas educacionais revelam que os professores, de forma geral, da


Educação Básica e do Ensino Superior, geralmente, manifestam suas ideias sobre a matéria, o
ensino, a aprendizagem, o aluno, a metodologia de trabalho, a avaliação, entre outros, de uma
forma muito simples, próprias do senso comum, e distantes do que propõem os
conhecimentos pedagógicos hoje aceitos pela comunidade científica. Segundo Porlán (1998),
Maldaner (2006), Carvalho; Gil-Pérez (2011), esse pensamento do senso comum está
impregnado por crenças e saberes tácitos, muitas vezes, não explicitados por estarem
configurados por um forte componente ambiental, desde as experiências como estudantes nos
graus iniciais de escolarização até a formação universitária de professor.
Nesta perspectiva, a maneira como o professor desempenha a docência e a relação
com o seu pensamento é objeto de investigação de várias pesquisas educacionais, como já
mencionado em pesquisas de Nóvoa (1992), Gonçalves (2000), Josso (2007), Huberman
(2007), Goodson (2007), Clandinin e Connelly (2011), dentre outros, e em ensino de Ciências
especificamente, e esses estudos apontam a relação intrínseca entre a prática pedagógica, o
comportamento e ações docentes e as suas crenças e concepções. Nesse sentido, estudos sobre
modelos didáticos de professores atestam que esses podem fornecer subsídios para explicação
de aspectos imbricados no ato docente e no seu desenvolvimento profissional (PORLÁN et
al., 1996, 1997, 1998; GARCÍA PÉREZ, 2000; GUIMARÃES, ECHEVERRÍA e MORAES,
2006; SANTOS JR e MARCONDES, 2010).
O conceito de modelo didático é um poderoso mecanismo intelectual para abordar os
problemas de ensino, em sala de aula, ajudando a estabelecer o necessário vínculo entre a
análise teórica com a mediação de sua prática docente. Trata-se de um esquema para estar
entre a realidade e o pensamento do professor, uma estrutura na qual se organiza o
conhecimento e terá sempre um caráter provisório e de aproximação da realidade, além de ser
um recurso para o desenvolvimento e fundamentação do professor (CHROBAK, 2006).
Nas pesquisas sobre conhecimentos profissionais desenvolvidas por Porlán et al.
(1997), os autores utilizam o termo concepções epistemológicas do professor, como sendo
94

um conjunto de ideias e formas de desempenho que se relacionam com o conhecimento


escolar, o seu processo de construção, sendo essas ideias possíveis de se manifestarem de
maneira implícita ou não. Nesse sentido, o termo “concepções epistemológicas” se coaduna
com o termo de modelo didático.
Partindo do pressuposto de que as crenças didáticas associadas a conhecimentos e a
valores influenciam nas escolhas e atuação de professores, García Pérez (2000) evidencia que
o conceito de modelo didático permite abordar (de maneira simplificada como qualquer
modelo) a complexidade da realidade escolar, ao mesmo tempo em que ajuda a propor
procedimentos de intervenção nesta instituição e a fundamentar, portanto, linhas de
investigação educativa e de formação de professores. Nessa perspectiva, o modelo didático
facilita as análises da realidade escolar com vistas a sua transformação.
Para fomentar as reflexões sobre as colaboradoras dessa pesquisa de tese, acerca de
que movimentos teóricos, metodológicos e epistemológicos de formação e docência
contribuem para a constituição e atuação dessas professoras, dentre vários instrumentos de
registros de informações que foram utilizados, como entrevista semiestruturada, grupo focal,
entre outros, apliquei um instrumento para identificar o modelo didático dessas educadoras
químicas com base em Santos Jr e Marcondes (2010) e nos pressupostos de García Perez
(2000).
Diante do exposto, entendo que partir de perspectivas particulares de aprendizagem,
nem sempre resulta em práticas pedagógicas específicas. Dessa forma, estou ciente, de que
não existe uma relação linear entre concepções e práticas, pois as condições de trabalho
docente podem interferir fortemente no que é possível fazer pelo professor na escola em que
trabalha. Parto do pressuposto de que qualquer tentativa de conformar os processos
educacionais em modelos é artificial, uma vez que a sua complexidade não nos permite
enquadramentos estáticos. Todavia, modelos são construções teóricas que possibilitam uma
aproximação mais sistemática da compreensão do objeto de estudo. Nesse sentido, acredito
que a análise das concepções das professoras de Química, colaboradoras da pesquisa, e a
caracterização do modelo didático predominante, em seus discursos, permite levantar
questionamentos sobre o seu desenvolvimento profissional e as possíveis práticas pedagógicas
(GUIMARÃES, ECHEVERRÍA e MORAES, 2006).
95

Detectando os Modelos Didáticos nos Discursos das Professoras Colaboradoras

Conforme García Pérez (2000), um modelo didático para um professor é constituído


pelas crenças, pela cultura, pelas relações sociais que permeiam o processo de ensino e
aprendizagem e a intencionalidade do professor em ensinar seus educandos na relação
pedagógica. E a construção desses modelos baseia-se em cinco dimensões didáticas, a saber:
(I) Por que ensinar? Qual o objetivo do ensino? (II) Que conteúdo deve ser ensinado ao
educando? (III) Como ensinar? (IV) Qual a relevância das ideias e interesses do educando?
(V) Como avaliar? Com base nessas dimensões, o referido autor propõe quatro modelos
didáticos: o tradicional, o tecnológico, o espontaneísta e o alternativo.
O modelo didático tradicional traz como pressupostos as concepções advindas da
transmissão cultural vigente, em uma perspectiva enciclopédica, de caráter fragmentado e
cumulativo, o educando é considerado um quadro branco, em que o conhecimento será
desenhado pela ação educativa do professor, o conhecimento, particularmente o concernente
às ciências naturais e exatas, é tido como algo pronto e passível de ser transmitido a esse
educando, sem que o mesmo tenha participação no planejamento das atividades que lhe são
ensinadas e ao professor cabe, além do planejamento, controlar a disciplina da sala de aula e a
avaliação centra-se no que foi memorizado no processo transmissão/recepção.
O modelo didático tecnológico surge da necessidade de adaptação da escola
tradicional a novos contextos socioeconômicos influenciados pelo desenvolvimento técnico-
científico. Nesse sentido, aos saberes disciplinares são agregados pela incorporação de
conteúdos ditos mais modernos vinculados a temáticas ambientais e sociais e à aquisição de
habilidades e competências, sem levar em consideração as concepções e os interesses dos
educandos. As concepções dos educandos, quando consideradas no processo, procuram ser
substituídas por conhecimentos científicos já elaborados, e a eles cabe executar todas as
atividades programadas pelo professor nesse processo que, nesse modelo, tem a função de
controlar o andamento das atividades propostas.
O modelo espontaneísta é percebido como um contraponto ao modelo tradicional,
pressupondo “uma crítica de caráter ideológico-político à cultura racionalista e academicista”
(GARCÍA PÉREZ, 2000, p. 8). Nesse modelo, o interesse do educando é um componente
fundamental, pois é a partir dele, juntamente com a realidade na qual está inserido, que o
professor elabora seu planejamento. O professor não tem um papel gerencial do processo, e é
visto como uma liderança que coordena o trabalho dos educandos, e estes possuem um papel
96

ativo, sendo esperado que eles sejam capazes de aprender determinados conteúdos por
descoberta e compreender o contexto social em que vivem.
E, por fim, o modelo alternativo tem como finalidade o enriquecimento do
conhecimento dos educandos, em uma direção que conduza uma visão mais complexa e
crítica da realidade. As ideias e os interesses dos educandos são considerados nesse modelo
didático, e tanto professor quanto os próprios educandos exercem papel ativo, sendo os
professores como investigadores de suas práticas pedagógicas e os educandos como
construtores e reconstrutores de suas aprendizagens, que são alcançadas pela implantação de
situações problemas, que exigem dos alunos posturas investigativas para a sua resolução.
Nas pesquisas sobre modelos didáticos de professores, empreendidas por Guimarães;
Echeverría; Moraes (2006) e Santos Jr; Marcondes (2010), os autores evidenciaram que o
professor, ao pensar sobre o seu próprio ato docente, se apropria de determinadas
características desses quatro modelos didáticos, construindo assim um modelo pessoal
divergente dos pressupostos delineados.
Adiante segue uma síntese das características de cada modelo, de acordo com o
Quadro 2:

DIMENSÃO TRADICIONAL TECNOLÓGICO ESPONTANEÍSTA ALTERNATIVO


DIDÁTICA
1 – Por que Transmitir ao aluno Proporcionar ao aluno Capacitar o aluno para Proporcionar ao aluno
ensinar? conteúdos uma formação que possa compreender uma compreensão cada
(Objetivos do consagrados na moderna e eficiente. a realidade. vez mais complexa do
ensino) cultura vigente. mundo e de como atuar
nesse.
2- Que conteúdo Conteúdos Conteúdos que Conteúdos presentes na Conhecimentos
deve ser ensinado disciplinares, propiciem uma realidade imediata do interdisciplinares, o
ao aluno? conceitos formação cultural aluno. enfoque está no contexto
específicos. atual, conhecimentos social.
não somente
disciplinares.
3 – Como ensinar? As atividades As atividades e Metodologia baseada no Baseada na ideia da
enfatizam a conteúdos privilegiam protagonismo do aluno, investigação escolar, o
memorização de o desenvolvimento que vai descobrindo o aluno constrói e
informações, das habilidades e conhecimento. reconstrói o
nomes, fórmulas e competências. conhecimento.
conhecimentos
fragmentados da
realidade do aluno.
4 - Qual a Não considera. Quando considera as Considera apenas os Considera os interesses e
relevância das concepções, essas são interesses imediatos do as concepções do aluno.
ideias e interesses vistas como erros aluno.
do aluno? conceituais.
5 - Como avaliar? Valoriza a Avaliação centrada na A avaliação é centrada A avaliação assume um
memorização dos quantificação da na observação e na caráter formativo,
conteúdos aprendizagem e análise de trabalhos e identificando as
transmitidos, verificar a eficiência no desenvolvimento dificuldades dos alunos e
realizadas por da sistemática do pessoal do aluno. promovendo uma reflexão
provas formais. ensino. sobre a sua evolução.
Quadro 2: Características dos Modelos Didáticos
Fonte: GARCÍA PÉREZ (2000)
97

Com base nos modelos didáticos, propostos por García Pérez (2000), Santos Jr e
Marcondes (2010), apliquei um instrumento para identificar os modelos didáticos de
professores de Química que atuam na Educação Básica, o qual concebo que pode ser
estendido também para verificar modelos didáticos de professores que atuam no Ensino
Superior, e que na presente tese foi aplicado às professoras colaboradoras para triangular com
as narrativas expressas nos outros instrumentos de registros de informações por mim
utilizados, de modo a apreender na relação pedagógica suas crenças, cultura, e relações
sociais que permeiam o processo de ensino-aprendizagem e a intencionalidade ao ensinar
Química na Educação Básica a seus educandos.
O instrumento aplicado às colaboradoras consiste de uma pergunta fechada,
correspondente às cinco dimensões didáticas, a saber, (1- objetivos do ensino; 2 – conteúdos;
3 - papel das ideias e interesses dos estudantes; 4 – metodologia e 5 – avaliação), e para cada
dimensão existem quatro proposições características de cada um dos modelos didáticos, sendo
estes: tradicional, tecnicista, espontaneísta e alternativo respectivamente, propostos por
Garcia Pérez (2000). A professora colaboradora devia atribuir para cada proposição um valor
seguindo o critério (0, completa rejeição; 3 completa aceitação; e os valores 1 e 2 são
intermediários entre a rejeição e a aceitação).
Nas análises do instrumento foi arbitrado que, sempre que a professora colaboradora
atribuísse os valores 2 ou 3 para cada uma proposição do instrumento, ela estaria aceitando
essa característica na composição de seu modelo didático pessoal. Nesta perspectiva, foi
elaborada uma representação em que as áreas coloridas correspondem às características
aceitas por essas colaboradoras, ou seja, aquelas que as docentes atribuíram os valores 2 ou 3
(SANTOS Jr e MARCONDES, 2010).
Segue abaixo, no Quadro 3, a organização dos modelos didáticos das professoras
colaboradoras de acordo, com suas respostas no instrumento:
Dimensão 1 Dimensão 2 Dimensão 3 Dimensão 4 Dimensão 5
Objetivos Papel das ideias
Conteúdos Metodologia Avaliação
do Ensino e interesses dos
estudantes
Professoras T C E A T C E A T C E A T C E A T C E A
Curie
Mayer
Franklin
Meitner
Quadro 3: Organização dos Modelos Didáticos das Professoras Colaboradoras
Legenda: T tradicional, C tecnicista, E espontaneísta, A alternativo.
98

Os resultados corroboram as reflexões de Guimarães, Echeverría e Moraes (2006)


sobre o fato dos professores se apropriarem de características de diferentes modelos didáticos
propostos por Garcia Pérez (2000), para compor o seu modelo didático pessoal, chamado por
esses pesquisadores por modelo eclético.
De acordo com Santos Jr e Marcondes (2010), os modelos didáticos tradicional e
tecnicista possuem em comum a tendência para a transmissão cultural dos conteúdos, já os
modelos espontaneísta e alternativo estão alinhados à visão construtivista do processo de
ensino e à aprendizagem do conhecimento científico. As aceitações, anteriormente
declaradas pelas professoras, por meio do instrumento com as perguntas fechadas, foram tidas
como consistentes, sempre que agregassem características de modelos didáticos de mesma
orientação pedagógica.
Neste sentido, um modelo didático eclético formado pelas características dos
modelos tradicional e tecnicista TC ou pelas características dos modelos espontaneísta e
alternativo EA são considerados coerentes. Já o modelo eclético formado pelas características
dos modelos tecnicista e alternativo do tipo CA, dos modelos tradicional, espontaneísta e
alternativo do tipo TEA, e dos modelos tecnicista, espontaneísta e alternativo do tipo CEA
foram considerados incoerentes.
Na mesma linha de raciocínio, o modelo eclético do tipo TCEA é mais incoerente
que os dos tipos CA, TEA e CEA, porque o primeiro é composto pelas características dos
quatro modelos, o segundo é formado por duas características antagônicas, e o terceiro e o
quarto são formados pelas características de três modelos didáticos.
Ao realizar a análise da visão das professoras colaboradoras do processo de ensino-
aprendizagem em Química pela metodologia indicada por pesquisadores como García Pérez
(2000), Guimarães, Echeverría e Moraes (2006) e Santos Jr e Marcondes (2010) pode-se
inferir que, se a professora tem visão coesa do processo de ensino-aprendizagem apresentará
modelos ecléticos parecidos em todas as dimensões analisadas, porque todas estão
relacionadas. Entretanto, se possuir modelos ecléticos muito diferentes em cada uma das
cinco dimensões didáticas, deduz-se que a mesma possui uma visão fragmentada do processo
de ensino-aprendizagem em Química.
A natureza eclética desses modelos didáticos apresentados pelas colaboradoras pode
ser um indicativo de que essas professoras precisam aprofundar a reflexão sobre a sua visão
do processo de ensino-aprendizagem em Química, bem como suas crenças e suas concepções.
Essa observação se deve ao fato de que algumas características dos modelos didáticos
99

propostos por García Pérez (2000) terem se mostrado antagônicas dentro da mesma dimensão
didática.
Contudo, deve-se considerar também, que os saberes profissionais que as professoras
colaboradoras apresentam são formulados em uma dimensão evolutiva e progressiva,
mediante um processo aberto de reorganização contínua de seus sistemas de ideias, sendo
assim, os modelos didáticos pessoais, que foram apresentados, representam momentos de
suas reflexões e suas práticas (GARCÍA e PORLÁN, 2000).
Ao analisar o modelo didático pessoal para a colaboradora Curie, identifico que ela
apresenta coerência na dimensão didática, o que ocorre na dimensão 4 (metodologia) com o
modelo eclético do tipo EA e incoerências nas dimensões 1 (objetivos do ensino), modelo
eclético do tipo CEA; 2 (conteúdos), modelo eclético CA; 3 (papel das ideias e interesses dos
estudantes), modelo eclético TEA e 5 (avaliação), modelo eclético CEA, revelando, dessa
forma, visão fragmentada sobre o processo de ensino-aprendizagem em Química. Como as
características do tipo tradicional foram apontadas uma vez e do tipo tecnicista três vezes por
Curie, contata-se que a colaboradora tem a tendência pedagógica no enfoque da transmissão
cultural dos conteúdos e, esse fato se reforça em uma passagem de sua entrevista, em que ela
expressa que suas aulas são sempre teóricas de forma bem tradicional, segundo exposição a
seguir:

[...] Durante o desenvolvimento da minha aula, inicialmente, ela é teórica, os


primeiros contatos é sempre com a teoria, porque meus alunos não costumam vir
com o material lido, nem com a apostila lida, então as minhas aulas costumam ser
bem tradicional.

Já o modelo didático pessoal da colaboradora Mayer apresenta coerências em três


dimensões didáticas 2 (conteúdos) com o modelo didático do tipo alternativo A; 3 (papel das
ideias e interesses dos estudantes), modelo didático do tipo alternativo A; 4 (metodologia),
modelo didático do tipo alternativo A, e incoerências em duas dimensões, sendo 1 (objetivos
do ensino), modelo eclético do tipo TCEA; 5 (avaliação), modelo eclético do tipo CEA,
apesar da colaboradora Mayer ter apresentado incoerência em duas dimensões, e por ter
apresentado consistência em três dimensões, infere-se que a mesma possui uma visão coesa
do processo de ensino-aprendizagem em Química, coerente com as concepções do tipo
alternativo, sendo assim, com base em suas concepções pedagógicas a intencionalidade de sua
prática pedagógica encontra-se no contexto do construtivismo, levando em consideração a
construção e os conhecimentos prévios do estudante nesse processo. O instrumento
100

respondido pela colaboradora tem consonância com uma das passagens de sua entrevista, em
que ela narra que relaciona os conceitos químicos estudados com o cotidiano de seus
educandos e que tenta trabalhar esses conceitos na perspectiva da interdisciplinaridade:

Inicialmente, na primeira semana de aula, eu sempre realizo atividades de


sondagem, gosto de conhecer bem a turma, quanto à escola de onde os alunos novos
vieram, o bairro em que vive, para em seguida elaborar um plano de trabalho que
deve ser voltado para o que fazer e como fazer; deixar claro os objetivos,
estabelecendo o que se quer ensinar; além de relacionar os conceitos químicos
estudados com o cotidiano dos alunos, tentar estabelecer relação dos conceitos
químicos com outras disciplinas [...]

No que tange ao modelo didático pessoal da colaboradora Franklin, este apresenta


coerência em três dimensões didáticas 2 (conteúdos), com o modelo didático do tipo
alternativo A; 3 (papel das ideias e interesses dos estudantes), modelo eclético do tipo
espontaneísta e alternativo EA; 5 (avaliação), modelo eclético do tipo espontaneísta e
alternativo EA, e incoerências em duas dimensões, sendo 1(bjetivos do ensino), modelo
eclético do tipo TCEA; 4 (metodologia), modelo eclético do tipo TCEA, apesar da
colaboradora Franklin ter apresentado incoerência em duas dimensões, e por ter apresentado
coerência em três dimensões, infere-se que a mesma possui uma visão coesa do processo de
ensino-aprendizagem em Química, apresentando-se coerente com as concepções do tipo
alternativo e eclético do tipo espontaneísta e alternativo, sendo assim, com base em suas
concepções pedagógicas, bem como a intencionalidade de sua prática pedagógica encontra-se
também no contexto do construtivismo, levando em consideração a construção e os
conhecimentos prévios do estudante nesse processo.
Por fim, no que concerne ao modelo didático pessoal da colaboradora Meitner, este
apresenta incoerências em todas as dimensões com modelo eclético do tipo TCEA, revelando,
portanto, uma indefinição em sua visão do processo de ensino-aprendizagem em Química. O
que chamou a atenção também foi a característica do modelo tradicional T ter sido aceita em
todas as dimensões por essa colaboradora, o que representa a tendência pedagógica no
enfoque da transmissão cultural dos conteúdos. Ao buscar uma reflexão sobre esse
ecletismo no modelo didático apresentado por essa colaboradora, Maldaner (2006) ajuda a
refletir sobre essa situação, quando afirma que o modelo psicopedagógico da aprendizagem
por transmissão está, ainda, muito presente nas salas de aula de Química na Educação Básica
e até mesmo na educação superior nos dias atuais, constituindo-se em prática hegemônica na
maior parte das escolas, embora no meio da pesquisa educacional ele seja sempre condenado.
101

Santos Jr e Marcondes (2010) expressam que, ao idealizarem esse instrumento de


possível identificação de modelo didático que, por sua natureza, apresentam-se imbricados
elementos como as concepções e crenças pedagógicas do docente, o contexto em que exerce a
docência e a sua visão do processo de ensino-aprendizagem. Esse instrumento pode ser capaz
de explicitar esses elementos e torná-los objeto de reflexão e análise e que poderia ser
utilizado no curso de formação inicial, com o intuito de fazer com que os futuros docentes
explicitem esses elementos e possam refletir a respeito. “Essa prática poderia, ao menos em
tese, dificultar a perpetuação de ideias e procedimentos tidos como tradicionais e que são
incorporados pelos licenciandos” (p. 113).

Diferenças e Proximidades nos Modelos Didáticos das Professoras Colaboradoras

Tendo em consideração as diferenças e as proximidades dos modelos didáticos das


colaboradoras é possível constatar proximidades de modelos entre Curie e Meitner, pois
possuem tendências pedagógicas situadas no enfoque da transmissão cultural dos
conteúdos. E entre Mayer e Franklin, por possuírem tendências pedagógicas situadas no
contexto do construtivismo, levando em consideração a construção e os conhecimentos
prévios do estudante nesse processo.
Delinear as diferenças se torna difícil, pois todas em algum contexto das dimensões
analisadas não apresentaram uma visão totalmente coesa do processo de ensino-aprendizagem
em Química. Na análise geral, dos modelos didáticos das colaboradoras, fica evidente a
presença de divergentes orientações didáticas resultantes de diferentes concepções de
educação escolar, que permeiam o pensamento dessas professoras. Diante dessas informações,
permite-se afirmar que não existe um modelo didático predominante que se enquadre nos
modelos identificados pela literatura, entre as colaboradoras investigadas. Nesse contexto,
percebo que os modelos didáticos propostos por García Pérez (2000) não foram capazes de
representar as quatro colaboradoras pesquisadas. Tal fato pode estar relacionado a uma
possível limitação do instrumento, mas também pode ser um indicativo de que essas
colaboradoras precisam aprofundar suas reflexões sobre a visão do processo de ensino-
aprendizagem em Química, bem como suas crenças e suas concepções.
Ao refletir sobre a primeira questão norteadora da pesquisa que consiste em
identificar que movimentos teóricos, metodológicos e epistemológicos de formação e
docência, que contribuíram para a constituição inicial das professoras colaboradoras,
considero importante entender sobre as histórias do contexto do curso de Licenciatura em
102

Química da UFMT e do Subprojeto Química – PIBID, como dois espaços que fizeram parte
da formação inicial e desenvolvimento profissional das colaboradoras dessa pesquisa, uma
vez que por meio desses contextos de formação e de suas narrativas expressas, e o apoio das
interlocuções feitas à luz dos referenciais teóricos assumidos, no desenvolvimento desta tese,
desenvolvo a compreensão que em termos epistemológicos a racionalidade técnica está
subjacente à formação e à docência dessas professoras. Em relação aos aspectos teórico-
metodológicos de formação e, por conseguinte, de desenvolvimento profissional, este está
pautado no enfoque que se pode denominar como híbrido de caráter da transmissão cultural
dos conteúdos ao construtivismo.
Adiante, apresento o último eixo temático de análise, em que faço a contextualização
dos Saberes Científicos no contexto do ensino de Química e os aspectos epistemológicos na
perspectiva de Bachelard (1996) e em que busco a compreensão de como se configuram os
Saberes Científicos e Saberes Pedagógicos dos Conteúdos Químicos, na perspectiva de
Shulman (1986), subjacentes à docência das professoras colaboradoras investigadas, por meio
dos relatos de episódios de aulas com conceitos químicos do Ensino Médio, sendo que para
cada conceito trago o que a literatura Química atual discorre sobre os conceitos em foco. Para
a construção deste eixo de análise, o material empírico analisado encontra-se, especialmente,
nos diálogos mantidos com as professoras colaboradoras durante o último bloco da entrevista
semiestruturada e o grupo focal.
103

V - SABERES CIENTÍFICOS E PEDAGÓGICOS DE CONTEÚDOS


QUÍMICOS: EPISÓDIOS DE AULAS DO ENSINO MÉDIO

Fazer Educação por meio da Química é criar alternativas e possibilidades de


contribuir tanto para alfabetização científica quanto para o letramento científico do
estudante e de fazer a migração do esoterismo ao exoterismo28 e assim facilitar a sua
leitura do mundo (Áttico Inácio Chassot).

Ao chegar neste último eixo de análise, tenho o propósito de ir à busca de possíveis


respostas ao problema de investigação expresso da seguinte maneira: Como se configuram e
se expressam saberes científicos e pedagógicos de conteúdos químicos subjacentes à
docência de professores egressos do Programa de Bolsa de Iniciação à Docência em
Química da UFMT, ao relatarem o ensino de Química que realizam na Educação
Básica?
Tenho a perspectiva de demonstrar o entrelaçamento entre os saberes científicos,
praticados/produzidos pela academia que, na perspectiva de Shulman (1986), podem ser
tratados de conhecimento do conteúdo específico, e no contexto desta pesquisa compreendido
como o saber disciplinar químico, e os saberes que emergem da prática de ensino e, portanto,
saberes que se manifestam na prática docente e, por meio da reflexão dessa prática, que na
obra do autor supracitado, corresponde ao conhecimento pedagógico de conteúdo – PCK, e
aqui assume-se a terminologia de saberes pedagógicos de conteúdos químicos – PCKC.
O PCKC se refere a um conteúdo específico de um conteúdo da disciplina de
Química reelaborado pedagogicamente para os estudantes. Nesta investigação foram eleitos
os conteúdos de modelos atômicos e ácidos e bases de Arrhenius como mote para investigar
o entrelaçamento dos Saberes Científicos e PCKC das colaboradoras. Acessar essa relação
entre esses dois saberes foi algo que se realizou por via de dois instrumentos de registros de
informações: uma parte do segmento da entrevista semiestruturada, que versava sobre esses
dois conceitos e o grupo focal, que foi dividido, em dois momentos com as colaboradoras, que
foram denominados de episódios de aula do Ensino Médio.
Neste ponto, as lentes da pesquisa já estão impregnadas de ideias e provocações
construídas no percurso teórico e metodológico. Contudo, ao me debruçar nos textos de
campo sobre os episódios de aulas, para a produção dos textos de pesquisa, foi necessária a

28
O termo esotérico antônimo de exotérico, apesar de ter a mesma pronúncia, se refere ao ensinamento que era
reservado aos discípulos completamente instruídos nas escolas filosóficas da Grécia antiga. Por extensão,
esotérico se refere a todo ensinamento ministrado a círculo restrito e fechado de ouvintes. Em filosofia, diz-se
dos ensinamentos ligados ao ocultismo. Disponível em: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Exoterismo> Acesso em:
16 julho 2015).
104

compreensão da relação dos saberes científicos ao PCKC pelas professoras colaboradoras


também do ponto de vista epistemológico.
Diante do exposto, examino o contexto do ensino de Química na Educação Básica, e
para ser possível entender os aspectos epistemológicos relacionados aos conceitos de modelos
atômicos e ácidos e bases de Arrhenius, recorro ao referencial teórico dos obstáculos
epistemológicos propostos pelo filósofo francês Gaston Bachelard (1996). Antes do início de
cada um dos episódios de aula, trato da conjuntura de cada conceito, primeiramente no âmbito
da literatura Química atual29.

Saberes Científicos na Educação Básica: O Ensino de Química em Foco

Uma das possíveis lentes para enxergar e compreender o mundo é a ciência Química,
pois cada área do saber tem a sua estrutura, o seu modo de perceber e interpretar o real. Barth
(1993) destaca que o pintor, o geógrafo ou o biólogo têm um olhar diferente sobre um lugar; o
político, o poeta ou historiador não interpretam os acontecimentos da atualidade da mesma
forma. Dessa forma, o conteúdo influencia o modo como o processo de abstração se realiza.
Nessa perspectiva, intenciono discutir as possíveis interfaces dos saberes científicos na
perspectiva dos saberes químicos para uma educação científica e leitura de mundo por meio
da Química no Ensino Fundamental e Médio.
Pesquisadores da área de Educação Química como Machado e Mortimer (2007)
destacam que dentre os aspectos fundamentais do processo de ensino-aprendizagem de
Química para a Educação Básica está a valorização do pensamento dos estudantes na
perspectiva das contribuições do construtivismo. Nesse sentido, o construtivismo como uma
teoria da aprendizagem tem sido um marco importante na forma de conceber o ensino de
Ciências. Segundo esses autores, apesar da diversidade de concepções que pode abarcar o
conceito de construtivismo, pelo menos dois pressupostos são conhecidos como gerais: “o

29
Para fazer a sinopse desses conceitos recorri a três livros textos que são referências de química geral em
cursos de graduação no Brasil: - ATKINS, Peter; JONES, Loretta. Princípios de Química: Questionando a Vida
Moderna e o Meio Ambiente.Tradutor: Ricardo Bicca de Alencastro. 3.ed. Porto Alegre: Bookman, 2006; -
BROWN, Theodore L., et al. Química a Ciência Central. Tradutor: Robson Matos. 9.ed. São Paulo: Pearson
Prentice Hall, 2005; - RUSSEL, John B. Química Geral. Tradutor: Márcia Guekezian et al. V.1, 2.ed. São Paulo:
Pearson Makron Books, 1994. Entretanto, fiz a opção de situar o leitor sobre os conceitos de modelos atômicos
apoiados em Brown et al. (2005) e Russel (1994), e ácidos e bases de Arrhenius baseado em Brown et al. (2005),
pois ao fazer um estudo e uma análise minuciosa dos três livros identifiquei-os como os que trabalham de uma
melhor forma os pressupostos epistemológicos desses conceitos, embora no contexto histórico, os três livros
façam abordagens de forma muito semelhante.
105

conhecimento não é transmitido, mas construído ativamente pelos indivíduos; aquilo que o
sujeito já sabe influencia na sua aprendizagem” (p.22).
A partir dessa concepção, uma ideia que se revela importante é que as concepções
que os estudantes trazem para as salas de aulas de ciência são muito diferentes daquelas
cientificamente aceitas e isso interfere na aprendizagem dos conceitos científicos. Nessa
perspectiva, Driver et al. (1999) corroboram que:

Aprender ciências não é uma questão de simplesmente ampliar o conhecimento dos


jovens sobre os fenômenos – uma prática talvez denominada mais apropriadamente
como estudo da natureza – nem de desenvolver ou organizar o raciocínio do senso
comum dos jovens. Aprender ciências requer mais do que desafiar ideias anteriores
dos alunos, através de eventos discrepantes. Aprender ciências requer que crianças e
adolescentes sejam introduzidos numa forma diferente de pensar sobre o mundo
natural e de explicá-lo (apud MACHADO e MORTIMER, 2007, p. 23).

Ao entender a ciência como discurso, Machado (2004) expressa que é possível


considerar a linguagem científica e a linguagem química, em específico, por poderem
possibilitar aos sujeitos uma nova maneira de pensar e falar sobre o mundo. A linguagem
científica possui características próprias, diferentes da linguagem comum, que foram
historicamente estabelecidas ao longo do desenvolvimento da ciência como forma de ampliar
e registrar o conhecimento científico.
Para a construção do conhecimento científico na Educação Básica se tem como
relevante considerar os vários discursos que circulam nas salas de aulas, tais como, do livro
didático, do professor, dos colegas, dos fatos experimentais, do senso comum, da mídia, entre
outros. E todos esses discursos são fundamentais para a elaboração de certa forma de pensar e
falar sobre o mundo, empregando a Química.
Defendo com Machado e Mortimer (2007), que toda compreensão é ativa e que ao
tentar atribuir sentido, ao que está aprendendo, o estudante formulará suas próprias respostas,
suas próprias maneiras de articular aquilo que está sendo ensinado com aquilo que ele já
sabia. Sendo assim, os estudantes vão incorporar os discursos e as visões de mundo que
circulam durante as atividades propostas em uma aula de Química no Ensino Fundamental ou
Médio, as aulas do professor, a discussão com os colegas, as leituras, entre outros.
Como professores, os sentidos que circulam durante as aulas não são uma
transposição direta dos conhecimentos/saberes científicos produzidos pelos químicos. Em
outros termos, o conhecimento que se considera nas aulas de Química é mediado por uma
série de instâncias que vão constituindo um discurso, que transforma o conteúdo específico
químico em aprendizagem PCKC.
106

Nessa mesma linha, Maldaner (2006) complementa que é importante considerar que
para que uma pessoa seja iniciada em Química não é suficiente que seja capaz de identificar
ou saber decifrar a simbologia Química. É fundamental que se compreenda o tipo de
pensamento próprio desse campo de conhecimento e as especificidades metodológicas
próprias da produção do conhecimento químico. Nas pesquisas desenvolvidas por esse autor,
ele considera a necessária superação das propostas tradicionais de ensino de Química que
centram sua abordagem em torno de conteúdos descontextualizados, a partir de uma lógica do
conhecimento sistematizado.
Em relação à superação das propostas tradicionais de ensino de Química, Chassot
(2014) tece críticas sobre o que ele denomina de a (re) produção do conhecimento químico,
e considera que os discursos de muitos professores de Química parecem distinguir-se pela
natureza hermética de seu conteúdo. Por exemplo, quando se fala com certa naturalidade para
os educandos sobre o colesterol, e se diz que este é um composto que tem o anel do
ciclopentanoperidrofenantreno, ou quando se diz aos educandos que quando dois orbitais
atômicos ligantes se unem e formam dois orbitais moleculares, um dos quais é ligante e
outro é antiligante, provavelmente, para eles, a sensação não é muito diferente daquela que
ocorre, quando se está diante de alguém que fala uma língua estrangeira, da qual não se tem
conhecimento.
Diante do exposto, uma grande importância para a formação do pensamento químico
seria a tensão entre o conceitual e o contextual. O trabalho nessa tensão, porém, não pode
perder de vista alguns aspectos importantes, relacionados com especificidades dos modos de
compreender, possibilitados e elaborados pelo conhecimento químico (MACHADO, 2004).
Dentre a seleção e organização de conteúdos químicos, é necessário levar em
consideração os focos de interesse da Química. Entre os principais objetos de investigação
nesse campo de conhecimento se encontram os materiais, as substâncias, suas
propriedades, sua constituição e suas transformações. O triângulo apresentado a seguir
representa esses objetos de interesse da Química, colocando no centro os materiais e as
substâncias e, em cada um dos seus vértices, aspectos diferentes do conhecimento químico
com eles relacionados.
107

Propriedades

Substâncias
e Materiais
Constituição Transformações

Figura 7: Focos de Interesse da Química


Fonte: Machado, Mortimer (2007).

O conhecimento das substâncias e dos materiais passa, necessariamente, pelo


conhecimento de suas propriedades e para explicar o comportamento dos materiais e mesmo
das suas propriedades, é necessário lançar mão de alguns conhecimentos químicos
relacionados à constituição desses materiais e substâncias como os diversos modelos para o
átomo e como esses átomos interagem para formar moléculas e íons e, ainda, como essas
moléculas, átomos e íons se agrupam para formar as substâncias e materiais que são
conhecidos; em outros termos, como ocorrem as transformações nessas substâncias e
materiais. Esses conhecimentos oferecem subsídios importantes para a compreensão, o
planejamento, a execução das transformações dos materiais. Ademais, as inter-relações entre
propriedades, constituição e transformações dos materiais são fundamentais para que se
possam ter ferramentas conceituais para compreender fenômenos químicos (MACHADO e
MORTIMER, 2007).
A Química como campo de conhecimento se estrutura mediante relações complexas
e dinâmicas, que envolvem um tripé bastante específico, em seus três eixos constitutivos
fundamentais, que compõem seu foco de interesse: os materiais e suas propriedades e
modelos explicativos e suas transformações químicas. Aprender Química pressupõe
comunicar-se por meio do uso da linguagem dessa ciência e para elaborar e comunicar
conceitos e teorias, a Química utiliza representações semióticas, que compõem um sistema de
instrumentos e signos como: equações, símbolos, enunciados, dentre outros (VYGOTSKY,
1998).
Do ponto de vista didático, para trabalhar com os conceitos em química é útil
distinguir três aspectos do conhecimento químico: fenomenológico, teórico e
representacional. A figura 8, ilustra o tripé da abordagem:
108

Figura 8: Aspectos do conhecimento químico


Fonte: Machado, Mortimer (2007).

Os aspectos fenomenológicos do conhecimento químico incluem a dimensão


macroscópica. Quando são observadas as reações químicas no laboratório ou no mundo ao
redor, se observa a matéria no nível macroscópio.
A abordagem dos conceitos químicos do ponto de vista fenomenológico pode
contribuir para promover habilidades específicas, tais como: controlar variáveis, medir,
analisar resultados, elaborar gráficos, entre outros. Os fenômenos também podem estar
materializados nas atividades sociais, pois são as relações sociais que cada estudante
estabelece, por meio dessa ciência, que dão significado à Química do seu ponto de vista, pois
mostram que a Química está na sociedade e no ambiente (MACHADO e MORTIMER, 2007).
Já os aspectos teóricos do conhecimento químico pautam-se na dimensão
microscópica. Esse aspecto relaciona-se com informações de natureza atômico-molecular,
envolvendo explicações baseadas em modelos abstratos e que incluem entidades não
diretamente observáveis, como átomos, moléculas, íons, elétrons, prótons, entre outros.
O aspecto representacional encontra os conteúdos químicos de natureza simbólica e
compreende informações inerentes à linguagem química, como fórmulas e equações
químicas, representações dos modelos e equações matemáticas. A famosa molécula (H dois
O) que se observa nunca é representada como feito aqui entre parênteses. Em vez disso, a
representação simbólica da água é H2O.
Após se observar o foco de interesse da Química e de como serem trabalhados os
conceitos químicos, do ponto de vista didático, é necessário levar em consideração também
que a produção do conhecimento na Química resulta sempre de uma dialética entre teoria e
experimento, pensamento e realidade, mesmo porque não existe atividade experimental que
não ofereça mais de uma possibilidade de interpretação, pois ainda que o educando não
conheça a teoria científica necessária para interpretar determinado fenômeno ou resultado
experimental, ele o fará com suas próprias teorias implícitas, suas ideias do senso comum,
pois todo o processo de compreensão é ativo. Dessa forma, a inexistência dos fenômenos nas
109

salas de aulas pode fazer com que os educandos tomem por reais as fórmulas das substâncias,
as equações químicas e os modelos para a matéria. É imprescendível que os três aspectos:
fenomenológico, teórico e representacional compareçam igualmente (MACHADO e
MORTIMER, 2007).
Sobre o ensino de Química em foco, Chassot (2014) busca discutir há mais de duas
décadas nos mais diferentes fóruns, com professores de Química, três interrogações que ele
entende como capitais em relação à Química: Por que ensinar? Como ensinar? O que
ensinar?30 O referido autor tem usado essas mesmas três perguntas de uma maneira mais
ampla, quando se dirige aos docentes da área de Ciências do Ensino Fundamental. Considero
essas três perguntas capitais, como uma bússula educacional, para que o professor faça um
ensino de Química consciente, mantendo o foco na aprendizagem de seus alunos.
Finalmente, as diferentes análises que têm sido feitas sobre o ensino de Química
revelam que não basta fazer transmissão de conhecimentos químicos (alguns de discutível
valor para a formação científica do cidadão), mas é importante que esses conhecimentos
sejam instrumentos para melhor fazer educação. Nesse contexto, exige-se, cada vez mais, um
ensino em que a Química seja um suporte para se fazer educação. Essa é síntese de um fazer
educação por meio da Química (CHASSOT, 2014).

Aspectos Epistemológicos do Conhecimento Científico em Gaston Bachelard

Ao fazer uma relação da epistemologia com o ensino de Ciências e o ensino de


Química percebo que a epistemologia da ciência pode contribuir para o estabelecimento de
estratégias para o ensino e para a compreensão do processo ensino-aprendizagem. Em alguns
aspectos, os epistemólogos divergem entre si, em outros, eles concordam. Assim, apesar de
não ser possível constituir um arcabouço coerente pela simples junção das obras dos
epistemólogos, é possível, por exemplo, o destaque de alguns elementos importantes para a
fundamentação de metodologias para o ensino de Ciências e Química. Destarte, para analisar
as narrativas dos episódios de aulas das colaboradoras sobre os aspectos epistemológicos
relacionados aos conceitos químicos de modelos atômicos e ácidos e bases de Arrhenius,

30
Para compreender melhor as discussões e respostas a essas perguntas capitais que Chassot propõe, sugiro a
leitura de: CHASSOT, Attico Inácio. Nossos Três Interrogantes Capitais. In: CHASSOT, Attico
Inácio.Catalisando Transformações na Educação. Ijuí: Ed. UNIJUÍ, 1993, p. 37-55.
110

desenvolvidos nesta investigação, apoio-me no referencial teórico dos obstáculos


epistemológicos proposto por Bachelard31 (1996).
A ciência do século XX consolida-se como a estreita relação dialética da razão e
empiria, não há experiência sem racionalização, não há razão sem aplicação. Nesse sentido, a
ciência deixa de ser a descrição da natureza, o pleonasmo experiência. O conhecimento não
se desenvolve por acúmulo de informações, nem o ser humano busca, simplesmente, a
verdade maior na natureza. O desenvolvimento da ciência é um processo descontínuo32, no
qual constantemente se faz necessário romper com os conhecimentos anteriores, desconstruí-
los para construir novos conhecimentos. Nesse processo, é preciso procurar superar os
obstáculos epistemológicos (BACHELARD, 1977).
Bachelard é considerado o pai da epistemologia contemporânea e a escolha por
este epistemólogo se deve, em grande parte, às possibilidades de questionamento da ciência
oferecidas por sua obra. À luz da ciência contemporânea, notadamente as Geometrias Não-
Euclidianas, a Física Relativista, a Mecânica Quântica, a Mecânica ondulatória de Louis de
Broglie, a Física das matrizes de Heinserberg, as Mecânicas abstratas e, em breve, as Físicas
abstratas, que ordenarão todas as possibilidades de experiência, Bachelard (1996) procede a
crítica ao realismo ingênuo, ao empirismo e ao racionalismo cartesiano que permeiam os
discursos e as práticas científicas. Nessa acepção, o discurso de Bachelard não se faz para o
cientista, mas para o filósofo. Nesse sentido, este epistemólogo francês não se debruça sobre a
pesquisa científica para definir as normas do bem-fazer ciência, mas para interpretar o que o
cientista faz e dialogar com os filósofos sobre a ciência de ponta. Dessa forma, ele questiona
as concepções dos filósofos a partir de novas interpretações científicas (LOPES, 2007).

31
Oriundo de uma província muito rústica e de uma família humilde, Gaston Bachelard sempre trabalhou,
enquanto estudava. Nasceu no século XIX, no dia 27 de junho de 1884 em Bar-sur-Aube, Champagne, França.
Em 1913 conclui a Licenciatura em Matemática e, em 1919, entra para o ensino secundário, dando início à
carreira de professor de Ciências (Química e Física), embora a sua ambição fosse ser engenheiro. Nessa época,
nos colégios, um professor dedicava-se a diversas disciplinas: para os poucos alunos das “turmas superiores” ele
foi, ocasionalmente, o encarregado pela filosofia. Teve que intensificar suas leituras e aos 35 anos empreende
novos estudos. Seus ensaios começam a aparecer a partir de 1928, tais como: ensaio sobre o conhecimento
aproximado; estudo sobre a evolução de um problema em Física: a propagação térmica dos sólidos. Em 1930 é
convidado para lecionar na faculdade de letras de Dijon e em 1940 entrou para a Sorbonne. Em 1961, obteve o
Grande Prêmio Nacional de Letras e, em 1962, morre em Paris, no dia 16 de outubro (MELLO, 2009).
32
A epistemologia de Bachelard contribuiu para elaborar perspectivas historiográficas descontinuístas, na
medida em que rompera com a visão linear do desenvolvimento da ciência, tão cara aos positivistas e
neopositivistas. Com as noções de racionalismos setoriais e ruptura epistemológica, Bachelard introduziu a
concepção de descontinuidade na cultura científica: há rupturas entre o conhecimento comum e o conhecimento
científico e no decorrer do próprio desenvolvimento científico. Para maiores discussões sobre a noção de
descontinuidade na epistemologia de Bachelard, ver: BACHELARD, Gaston. O racionalismo aplicado. Rio de
Janeiro: Zahar, 1977.
111

Bachelard aborda os obstáculos epistemológicos, particularmente em A Formação


do Espírito Científico, publicado pela primeira vez em 1938 e já traduzido no Brasil em sua
primeira edição em 1996 e, atualmente, em 2013 atingiu a décima edição. Nessa obra, o autor
afirma a necessidade de valorização do pensamento científico abstrato, apontando a
experiência imediata como um obstáculo ao desenvolvimento dessa abstração.

Nossa proposta, neste livro, é mostrar o grandioso destino do pensamento científico


abstrato. Para isso, temos de provar que pensamento abstrato não é sinônimo de má
consciência científica, como parece sugerir a acusação habitual. Será preciso provar
que a abstração desobstrui o espírito, que ela o torna mais leve e dinâmico.
Forneceremos essas provas ao estudar mais de perto as dificuldades das abstrações
corretas, ao assinalar a insuficiência dos primeiros esboços, o peso dos primeiros
esquemas, ao sublinhar também o caráter discursivo da coerência abstrata e
essencial, que nunca alcança seu objetivo de um só golpe. E, para mostrar que o
processo abstrato não é uniforme, chegaremos até a usar um tom polêmico ao insistir
sobre o caráter de obstáculo que tem toda experiência que se pretende concreta e
real, natural e imediata (BACHELARD, 1996, p. 8-9).

Tendo em vista que sempre se conhece contra um conhecimento anterior, retificando


erros da experiência comum e construindo a experiência científica em diálogo constante com
a razão, é preciso superar os obstáculos epistemológicos.

[...] E não se trata de considerar obstáculos externos, como a complexidade e a


fugacidade dos fenômenos, nem de incriminar a fragilidade dos sentidos e do
espírito humano: é no âmago do próprio ato de conhecer que aparecem, por uma
espécie de imperativo funcional, lentidões e conflitos. É ai que mostraremos causas
de estagnação e até de regressão, detectaremos causas de inércia às quais daremos o
nome de obstáculos epistemológicos (BACHELARD, 1996, p. 17).

Conforme Bachelard (1996), o processo de ensino-aprendizagem de um conceito


científico requer que se afronte, constantemente, um conhecimento anterior em um processo
de desconstrução daquilo que ficou mal estabelecido. Por esse motivo, não se pode considerar
os educandos do Ensino Fundamental e Médio como tábula rasa. Eles possuem
conhecimentos já construídos do senso comum e esse conhecimento, quando não criticado e
confrontado, pode se constituir em obstáculo para a construção do conhecimento
científico.
O conceito de obstáculo epistemológico não deve ser igualado à noção de erro como
contraposição à verdade, o que implicaria em uma posição filosófica racionalista, isto é, não
científica. “Ao contrário, obstáculos epistemológicos são formas de conhecimento que
resistem às mudanças devido o seu poder explicativo ou, em outras palavras, devido à sua
posição conceitual em um dado sistema de conhecimentos, permitindo avançar até certo ponto
112

na produção de conhecimentos para, a partir daí, gerar estagnação ou mesmo retrocesso”


(SILVA et al., 2014, p. 263).
Na concepção de Santos (1989), quando se está aprendendo conceitos científicos, o
abandono do senso comum é um sacrifício muito difícil, e essa dificuldade está na pertinácia
dos obstáculos epistemológicos e só uma constante vigilância epistemológica consegue
superar e, para que a aprendizagem seja significativa, deve haver uma dupla ruptura
epistemológica, sendo que a primeira ruptura visa responder à pergunta: como se faz
ciência?, ou seja, a indagação sobre os procedimentos concretos, que permitem o saber
científico constituir-se contra o senso comum. Já a segunda ruptura visa responder à pergunta:
para que queremos a ciência?, ou seja, a indagação sobre os procedimentos concretos de
aplicação ou contextualização desses saberes científicos, que podem conduzir à superação da
distinção entre ciência e senso comum.
Para Santos (1989), se o saber científico e o senso comum fossem totalmente
distintos, a ciência não podia aspirar a transformar-se em senso comum, e se fossem idênticas,
não podia pretender transformar o senso comum, portanto, a segunda ruptura é que dá sentido
à primeira, pois “a ciência só pode saber como se faz (contra o senso comum) se souber o que
pode fazer (transformar o senso comum, transformando-se em senso comum)” (p.50).
Diante do exposto, pode-se inferir que o obstáculo epistemológico tende a se
manifestar mascarando o processo de ruptura entre o conhecimento comum e o saber
científico, quando o pensamento procura prender o conhecimento real aparente, assim, o
obstáculo tende a se constituir como uma anti-ruptura. A razão, ao se acomodar ao que já
conhece, procurando manter a continuidade do conhecimento, opõe-se à retificação dos erros
introduzindo um número excessivo de analogias, metáforas e imagens33 no próprio ato de
conhecer, com o fim de tornar familiar todo conhecimento abstrato, constituindo, assim, os
obstáculos epistemológicos (BACHELARD, 1996).
Dessa forma, Bachelard (1996) delineia diferentes obstáculos exemplificando as
ações, principalmente, na Química e na Física, ciências consideradas por ele como mais
matematizadas e evoluídas. Assim, ele lista oito possíveis obstáculos epistemológicos 34: 1) a
experiência primeira, 2) o conhecimento geral, 3) verbal, 4) do conhecimento unitário e
pragmático, 5) substancialista, 6) realista, 7) animista, 8) conhecimento quantitativo.

33
Cabe esclarecer que Bachelard (1996) não é contrário à utilização de analogias, de metáforas e de imagens,
contudo, sua posição é de que a razão não pode se acomodar às imagens devendo, portanto, estar sempre pronta
a desconstruí-las toda vez que o processo de construção do conhecimento científico assim o exigir.
34
Na subseção dos Episódios de Aulas darei a definição de alguns desses obstáculos, em conformidade com o
referido autor e exemplificarei com os resultados dos textos de campo da presente pesquisa.
113

A maioria dos filósofos da ciência entre os séculos XIX e XX trabalhavam com um


foco na Física, já Bachelard trabalhou com questões epistemológicas tanto na Física, quanto
na Matemática e, sobretudo, na Química35. Os educadores de Química e Física têm à
disposição, até mesmo, livros de Bachelard dedicados à Química (O pluralismo coerente da
Química moderna e O materialismo racional) e à Física (A atividade racionalista da Física
contemporânea).
A pertinência de Bachelard para o campo de ensino de Ciências, sobretudo para o
ensino de Química, de acordo com Lopes (2007), torna-se maior se for considerada sua
trajetória como professor, pela escola secundária, que fez dele um filósofo constantemente
preocupado com o ensino. Todavia, é preciso esclarecer que não há em sua obra textos
exclusivamente voltados para a questão educacional, mas frequentemente ele pontua análises
filosóficas com interpretações a respeito da transmissão do conhecimento científico na escola.
Na obra supracitada, A Formação do Espírito Científico, ele ressalta a necessidade dos
professores conhecerem as concepções prévias de seus educandos, por intermédio da
problemática do obstáculo pedagógico, que são os obstáculos que impedem o professor de
entender o porquê do educando não compreender.
Outro aspecto singular da epistemologia bachelardiana, em relação aos demais
filósofos das ciências, é o caráter até certo ponto ímpar de sua linha de trabalho, pois não
existe uma continuidade em seus trabalhos e os de seus seguidores. Esses, contudo, têm a obra
de Bachelard36 como inspiração, mas produziram teorizações próprias, nos mais diversos
campos, tais como: Althusser, Bourdieu, Caguilhen, Foucault, Morin, dentre outros
(SANTOS, 1989).
A seguir, apresento e analiso episódios de aulas de Química no Ensino Médio com a
breve descrição da literatura Química atual sobre os conceitos de Modelos Atômicos e
Ácidos e Bases de Arrhenius. Cabe assinalar que para a construção do texto de pesquisa dos
episódios de aulas do Ensino Médio, foram levadas em consideração três pontos que serviram

35
Lopes (2007, p. 32) afirma que “Quanto à Biologia, Bachelard não viveu o suficiente para assistir às rupturas
empreendidas nessa área a partir do advento do enfoque molecular. Sua ideia do campo biológico era de um
campo mais limitado do que a Física e a Química, justamente por ser o campo da reprodução, e não da criação. É
em Caguilhem, discípulo de Bachelard, que os biólogos encontram interpretações mais pertinentes sobre as
ciências da vida contemporânea”.
36
As obras de Bachelard possuem duas vertentes: a científica e a poética. Outra forma conhecida de classificar as
obras desse epistemólogo da ciência seria a seguinte: Bachelard Diurno e Bachelard Noturno. As obras
classificadas em Diurno e Noturno são: Bachelard diurno – O Novo Espírito Científico (1934), A Formação do
Espírito Científico (1938), A Filosofia do Não (1940), O Racionalismo Aplicado (1949) e O Materialismo
Racional (1952); e Bachelard noturno – A Psicanálise do Fogo (1938), A Água e os Sonhos (1942), O Ar e os
Sonhos (1943), A Terra e os Devaneios da Vontade (1948), A Poética do Espaço (1957), (MELLO, 2009).
114

de lentes para a análise: 1) o conceito químico trabalhado nos episódios de aulas destinado a
estudantes do primeiro ano do Ensino Médio; 2) o conceito de saberes científicos e
pedagógicos de conteúdos tomado como apoio à compreensão de Shulman (1986); 3) A
perspectiva epistemológica desses conceitos tomada como base a concepção de Bachelard
(1996).
Esses episódios de aulas se revelam importantes, diante de todo o referencial teórico-
metodológico por meio do qual fui tecendo esta tese para a compreensão de como as
professoras colaboradoras configuram e expressam saberes científicos e pedagógicos de
conteúdos químicos subjacentes a sua docência, a partir dos enunciados de suas narrativas.

Modelos Atômicos em Destaque: O que a literatura Química atual aponta?

Como narrado na subseção Saberes Científicos na Educação Básica: O Ensino de


Química em Foco, a Química trata das propriedades das substâncias. No mundo, as
substâncias apresentam uma variedade de propriedades surpreendentes e, aparentemente,
infinitas. Além do mais, a matéria muda de uma forma química para outra. E o universo ao
redor é constituído por diferentes substâncias, algumas inanimadas e outras com vidas. Dessa
forma, com o objetivo de explicar essas observações, desde a antiguidade os filósofos já
exploravam sobre a natureza da matéria fundamental da qual o mundo era feito.
Nas palavras de Chassot (1993), nunca é demais insistir, que quando se fala em
átomos, em moléculas, em reações químicas, entre outros, estamos nos referindo a realidades
sobre as quais não conhecemos mais do que o resultado de algumas interações. Por isso,
foram construídos modelos dessas estruturas, que são mais ou menos aproximados, em função
do que se conhece do modelado. Desse modo, os modelos se apresentam importantes
ferramentas de que se dispõe, para tentar compreender um mundo, cujo acesso real é muito
difícil.
A primeira definição de átomo surgiu na Grécia antiga, quando Demócrito (460-370
a.C) e outros filósofos gregos da época pensavam que o material deveria ser constituído de
partículas indivisíveis muito pequenas denominadas de átomos, o que denotava indivisíveis.
Como essa ideia, de Demócrito e seus contemporâneos, não pôde ser comprovada, ela ficou
conhecida como o primeiro modelo atômico, mas puramente filosófico. Mais tarde, Platão e
Aristóteles formularam a hipótese de que não poderia haver partículas indivisíveis. Nesse
sentido, a visão atômica da matéria enfraqueceu-se por vários séculos, durante os quais a
filosofia aristotélica dominou a cultura ocidental (BROWN et al., 2005).
115

O átomo de John Dalton

A concepção sobre átomos37, de acordo com Brown et al. (2005), ressurgiu na


Europa durante o século XVII, quando os cientistas empenharam-se em explicar as
propriedades dos gases. Quando os químicos aprenderam a medir a quantidade de matéria que
reagia com a outra para formar nova substância, a base para a teoria atômica estava proposta.
Essa teoria surgiu durante o período de 1803-1807 no trabalho do professor inglês,
John Dalton. Argumentando a partir de um grande número de observações, Dalton enunciou
os seguintes postulados em sua teoria atômica:

1. Toda matéria é composta de partículas fundamentais, os átomos;


2. Os átomos são permanentes e indivisíveis, eles não podem ser criados nem
destruídos;
3. Os elementos são caracterizados por seus átomos. Todos os átomos de um dado
elemento são idênticos em todos os aspectos. Átomos de diferentes elementos
têm diferentes propriedades;
4. As transformações químicas consistem em uma combinação, separação ou
rearranjo de átomos;
5. Compostos químicos são formados de átomos de dois ou mais elementos em
uma razão fixa (RUSSEL, 1994, p. 207).

Dalton, ao usar essas ideias simples de seu postulado, fez com que as observações
químicas da sua época parecessem razoáveis. Sua teoria explica várias leis simples de
combinação química, uma delas é a lei química fundamental chamada de lei da conservação
da massa, também conhecida, como lei da conservação da matéria. Essa lei da conservação
da massa define que se cada átomo tem sua própria característica e se os átomos são
rearranjados, permanecendo inalterados durante uma reação química, então, a massa total dos
átomos dos reagentes deve ser a mesma que a dos átomos dos produtos. Outra lei é a da
composição constante, em que se expressa que se cada composto é caracterizado por
proporções fixas entre os números de átomos dos seus elementos componentes e se cada
átomo de um dado elemento tem a mesma massa, então a composição de cada composto deve
ser sempre a mesma (RUSSEL, 1994).
De acordo com Russel (1994) muitas ideias básicas que fazem parte da teoria
atômica de Dalton ainda são aceitas hoje em dia, embora saibamos que “átomos são formados

37
Farei referência somente aos modelos atômicos de Dalton, Thomson, Rutherford e Bohr, por serem esses os
modelos usualmente trabalhados no Ensino Médio.
116

de pequenas partículas e que, devido à existência de isótopos38, todos os átomos de um dado


elemento não têm a mesma massa” (p. 207).
Dalton chegou a sua conclusão sobre átomos com base nas observações químicas no
universo macroscópico do laboratório. Todavia, nem ele e nem quem o seguiu durante séculos
depois da publicação de seu trabalho teve evidências diretas da existência dos átomos. Hoje,
entretanto, “podemos usar novos instrumentos poderosos para medir as propriedades dos
átomos individuais e até fornecer imagens deles” (BROWN et al., 2005, p. 33). Contudo, a
teoria atômica de Dalton deixou dúvidas e lacunas em vários pontos, por exemplo, na
distinção entre um átomo e uma molécula, isso levou a propor fórmulas incorretas para certos
compostos em sua época.
Dessa forma, mesmo que a teoria atômica de Dalton apresentasse limitações, ainda
assim, sua contribuição para o entendimento químico foi de grande valor, não somente foi
capaz de fornecer respostas satisfatórias para alguns problemas químicos complexos, mas
também proporcionou estímulo ao mundo científico para começar a pensar seriamente sobre a
existência dos átomos. À medida que os cientistas começaram a desenvolver métodos para
uma investigação mais detalhada da matéria, o átomo, que se supunha indivisível, começou a
mostrar sinais de ser uma estrutura mais complexa.

O átomo de Joseph John Thomson

Por volta do século XVII, os cientistas iniciaram os estudos sobre a descarga elétrica
por meio de tubos parcialmente evacuados, que consiste em tubos bombeados até quase
esgotar-se o ar, como ilustrado na Figura 9. Uma alta voltagem produzia radiação dentro do
tubo e essa radiação tornou-se conhecida como raios catódicos, porque se originava no
eletrodo negativo, ou catodo. Brown et al. (2005) afirmam que, embora os raios em si não
pudessem ser vistos, seus movimentos podiam ser detectados, porque os raios faziam com que
certos materiais, inclusive o vidro, proporcionassem fluorescência ou emitissem luz39.
Nesse período, os cientistas defendiam opiniões divergentes sobre a natureza dos
raios catódicos, pois não era muito claro se os raios eram uma nova forma de radiação ou
mais propriamente consistiam de um jato de partículas. Experimentos mostraram que os raios

38
Isótopos são átomos de um elemento químico cujos núcleos possuem o mesmo número atômico, designado
por Z, ou seja, o mesmo número de prótons (+), partículas positivas, mas diferente número de massa. A massa
atômica é frequentemente designada por A.
39
Tubos de imagem de televisão são tubos de raios catódicos; uma imagem de televisão é o resultado da
fluorescência da tela do aparelho (BROWN et al., 2005, p. 33).
117

catódicos eram desviados por campos elétricos ou magnéticos, sugerindo que continham certa
carga elétrica [Figura 9(c)].

Figura 9: O tubo de raios catódicos simples, usado por J. J. Thomson 40.


Fonte: Página de blogue com adaptação de Brown et al. (2005)41

O cientista britânico Joseph John Thomson (1856-1940) observou muitas


propriedades dos raios, inclusive o fato de a sua natureza ser a mesma, independentemente, da
identidade do material do catodo, e que uma lâmina metálica exposta a raios catódicos adquire
carga elétrica negativa. Em um artigo publicado em 1897, ele apresentou suas observações e
concluiu que os raios catódicos são jatos de partículas com massa, carregadas negativamente.
Esse artigo foi conhecido como a descoberta daquilo que hoje se denomina de elétron
(BROWN et al., 2005).
Nessa época, ficou evidente para a maioria dos cientistas que os átomos consistem
em uma parte carregada positivamente e alguns elétrons, mas isto não estava totalmente claro.
De que os átomos são constituídos? (RUSSEL, 1994). Foi quando Thomson argumentou que
já que os elétrons compreendiam apenas uma pequena fração de massa do átomo, eles
provavelmente seriam responsáveis por uma fração igualmente pequena do tamanho do
átomo. Dessa forma, ele propôs que o átomo consistia em uma esfera positiva uniforme na
matéria, na qual os elétrons estavam incrustados, como demonstrado na Figura 10. Esse

40
(a) Em um tubo de raios catódicos, os elétrons movem-se do eletrodo negativo (catodo) para o eletrodo
positivo (anodo). (b) Uma foto do tubo de raios catódicos contendo uma tela fluorescente para mostrar o
caminho dos raios catódicos. (c) A rota dos raios catódicos é desviada pela presença de um magneto (BROWN,
2005).
41
Disponível em: < https://yuriso.wordpress.com/tag/tubo-de-crookes/ > Acesso em jun. 2016.
118

modelo, chamado de modelo atômico de pudim de ameixa, foi assim denominado em


homenagem a uma tradicional sobremesa inglesa.

Figura 10: Modelo atômico proposto por J. J. Thomson.


Fonte: Página da Espetacular Química42

Vale destacar que o modelo atômico de Thomson foi bem aceito por muitos anos, e
somente pouco depois do início do século XX, experimentos realizados na Inglaterra pelo
físico Rutherford e seus colaboradores levaram à substituição do modelo de Thomson.

O átomo de Ernest Rutherford

No ano de 1890, segundo Russel (1994) descobriu-se que certos elementos são
radioativos, e isso significa que eles emitem radiação de alta energia, da qual há três tipos,
partículas alfa (α), partículas beta (β) e raios gama (γ). Uma partícula alfa carrega uma carga
positiva e tem massa que é muito maior do que um elétron.
No ano de 1910, Ernest Rutherford (1871-1937) e seus colaboradores realizaram um
experimento que contestava o modelo atômico de Thomson. Naquele tempo, Rutherford
estava estudando os ângulos em que as partículas α eram dispersas à medida que elas
passavam por uma folha de ouro com poucos milhares de camadas atômicas de espessura, de
acordo com a Figura 11.

42
Disponível em: < http://espetacularquimica.blogspot.com.br/2013/02/o-modelo-atomico-de-thomson.html>
Acesso em jun. 2016.
119

Figura 11: Experimento de Rutherford sobre espalhamento de partículas (α) 43.


Fonte: Página da Espetacular Química44

Rutherford e seus colaboradores descobriram que quase todas as partículas α


passavam direto através da folha sem dispersão. Descobriu-se que uma pequena porcentagem
dispersava-se na ordem de um grau, o que era coerente com o modelo atômico de Thomson.
No entanto, de acordo com Brown et al. (2005), Rutherford, apenas por preciosismo, sugeriu
que Ernest Marsden, um estudante de graduação que trabalhava em seu laboratório,
procurasse com afinco por evidências de dispersão com ângulos grandes. E para a surpresa de
todos, observou-se uma pequena quantidade de partículas que se dispersavam em ângulos
grandes, sendo que algumas partículas foram refletidas até para trás, na direção de onde
provinha. Neste ponto, como, então os maiores desvios experimentados por algumas
partículas α poderiam ser explicados? A explicação para esses resultados não foi
imediatamente óbvia, mas eles eram claramente incoerentes com o modelo de pudim de
ameixa de Thomson.
Por volta de 1911, Rutherford conseguiu explicar essas observações, postulando que
a maioria da massa do átomo e toda a sua carga positiva residiam em uma região muito
pequena e extremamente densa, que ele denominou de núcleo, sendo que a maior parte total
do volume do átomo é espaço vazio, em que os elétrons movem-se ao redor do núcleo.
Nessa perspectiva, Brown et al. (2005) afirmam que estudos experimentais
subsequentes levaram à descoberta de ambas as partículas no núcleo, sendo as partículas
positivas (prótons) e as partículas neutras (nêutrons). Os prótons45foram descobertos em 1919
por Rutherford, sendo que os elétrons foram descobertos por Thomson em 1897, e os nêutrons
foram descobertos em 1923 pelo cientista britânico James Chadwick (1891-1972).

43
Nessa Figura 11, o elemento Polônio (Po) trata-se de um elemento radioativo, sendo fonte de partículas α.
44
Disponível em: < http://espetacularquimica.blogspot.com.br/search?q=Rutherford > Acesso em jun. 2016.
45
De acordo com Chassot (1996, p. 3), “Há modelos confirmados experimentalmente em abril de 1994 que
consideram os quarks e léptons como partículas formadoras dos prótons. Cientistas cogitam segundo anúncio
feito em fevereiro de 1996 à possibilidade dos quarks serem divisíveis. Se isto for confirmado, teremos uma
reedição do feito de Rutherford (1871-1937) quando anunciou que átomos tinham núcleo”.
120

Em síntese, Russel (1994) expressa que o modelo de Rutherford representa o átomo,


consistindo este em pequeno núcleo rodeado por um grande volume, no qual os elétrons estão
distribuídos. No núcleo são encontrados prótons e nêutrons na proporção correta com o
diâmetro do átomo, e este é extremamente pequeno. A maior parte do volume atômico é o
espaço no qual o elétron é encontrado, que foi denominado de eletrosfera. E os elétrons são
atraídos pelos prótons no núcleo pela força que existe entre as partículas de cargas elétricas
opostas. E devido o fato do modelo atômico de Thomson não ter sido usado para interpretar
os resultados dos experimentos de Rutherford e seus colaboradores, o modelo de Rutherford
logo o substituiu, como mostrado na Figura 12.

Figura 12: Modelo Atômico proposto por Rutherford 46.


Fonte: Página de Blogue 47

O modelo atômico de Rutherford48 consiste em uma ferramenta básica para o estudo


da Química no Ensino Médio, pois de forma clara e simples, ele permite explicar uma série de
processos químicos, contudo cabe salientar que esse modelo constitui uma representação e
não um átomo como ele é de fato (CHASSOT, 1993; SANTOS e MÓL, 2010).
Santos e Mól (2010) evidenciam, também, que esse modelo atômico de Rutherfod foi
comparado com o Sistema Solar, pelo fato de o seu modelo considerar que os elétrons giram
ao redor do núcleo do átomo em órbitas (trajetórias fechadas), assim como no Sistema Solar,

46
No núcleo do átomo, além dos prótons (esferas vermelhas) estão os nêutrons (esferas azuis). E as (esferas
pretas) ao redor do núcleo caracteriza os elétrons na região que foi denominado de eletrosfera. Essa
representação explica o desvio da partícula α, sendo que a carga positiva concentrada em uma região central no
átomo repele a radiação.
47
Disponível em: < http://alunosonline.uol.com.br/quimica/o-atomo-rutherford.html > Acesso em jun. 2016.
48
Compete destacar que a carga de um elétron é -1,602 x 10-19C, e a do próton é + 1,602 x 10 -10C. A quantidade
1,602 x 10-19C é chamada de carga eletrônica. Por conveniência, as cargas atômicas e subatômicas são,
normalmente, expressas em múltiplos desta carga, em vez de em coulombs. Assim, a carga do elétron é 1-, e a do
próton, 1+. Nêutrons não têm carga e, por consequência, são eletricamente neutros (daí seu nome). Os átomos
têm um número igual de elétrons e prótons, logo, possuem uma carga elétrica líquida neutra. O coulomb (C) é a
unidade de carga elétrica no SI (BROWN et al., 2005).
121

em que os planetas giram em órbitas ao redor do Sol. Embora essas comparações (analogias)
sejam muito frequentes nas Ciências, sempre se deve ter cuidado, ao comparar coisas
diferentes, pois o sistema idealizado por Rutherford não é exatamente como o Sistema Solar.
Afinal as dimensões, formatos e trajetórias das órbitas dos planetas no Sistema Solar são
completamente diferentes das dos elétrons.
O modelo atômico proposto por Rutherford permitia a compreensão de uma série de
fenômenos que não eram explicados por modelos anteriores, e o seu modelo constitui a base
para se entender os modelos atômicos mais modernos.
No entanto, esse modelo não era capaz de elucidar uma questão de grande
importância, a de como os elétrons, dotados de carga negativa, podiam movimentar-se em
torno do núcleo positivo sem perder energia e colidir uns com os outros e com o núcleo?
Nessa época, já se sabia que cargas de sinais opostos se atraem. A possibilidade de o elétron
atingir o núcleo do átomo apenas indicava aos cientistas uma discrepância entre o modelo de
Rutherford e a teoria da Física, que previa a atração de sinais opostos, ou se sugeria um
modelo compatível com a reflexão de uma pequena porcentagem das partículas α na lâmina
de ouro, ou se desenvolvia uma teoria, que sustentasse a presença de elétrons na eletrosfera.
Nessa perspectiva, o estudo da luz49 forneceu alguns subsídios para o início de uma
nova teoria da Física e para o aperfeiçoamento do modelo atômico.

O átomo de Niels Bohr

Este último modelo atômico complementa o de Rutherford e constitui o modelo


atômico atualmente aceito, por isso em alguns livros textos do Ensino Médio se pode
encontrar com a denominação de modelo atômico de Rutherford-Bohr, dando menção a uma
complementação. Nele são propostas maneiras dos elétrons se movimentarem em torno do
núcleo e a energia associada a esse movimento.
Com dados experimentais em relação ao espectro dos átomos de hidrogênios, Niels
Bohr (1885-1962) propôs, em 1913, um modelo de comportamento de elétrons no átomo, que
procurou estabelecer por que estes se mantêm na eletrosfera sem se dirigir para o núcleo e

49
Uma propriedade dos átomos conhecida desde o século XIX é a emissão de luz, que acontece quando eles são
aquecidos em uma chama e além de emitir luz, os átomos também emitem outros tipos de radiação, o que só é
permitido por instrumentos ópticos. A festa de Réveillon no Rio de Janeiro, embelezada quimicamente é um
exemplo. Nos tradicionais fogos de artifício são adicionadas substâncias, cujos átomos emitem radiações de
luminosidades diferentes (SANTOS e MÓL, 2010).
122

colidir com ele. Bohr sugeriu que uma teoria sobre a luz, proposta por Max Plank50 (1958-
1947) poderia ser aplicada ao átomo e com base nesse pressuposto, Bohr baseou seu modelo
em três postulados, a saber:

1. Somente órbitas de certos raios, correspondendo a certas energias definidas, são


permitidas para os elétrons de um átomo;
2. Um elétron em certa órbita permitida tem certa energia específica e está em um
estado de energia permitido. Um elétron em estado de energia permitido não
irradiará energia e, portanto, não se moverá em forma de espiral em direção ao
núcleo;
3. A energia só é emitida ou absorvida por um elétron quando ele muda de um
estado de energia permitido para outro. Essa energia é emitida ou absorvida
como fóton (BROWN et al., 2005, p. 190).

Com base nesses postulados, o modelo atômico de Bohr aprimorou o de Rutherford e


ficou expresso da seguinte maneira: que os elétrons giram em torno do núcleo, em órbitas
fixas circulares chamadas níveis de energia. Para mudarem de órbita, os elétrons emitem ou
absorvem energia. Na Figura 13 (a), ao receber energia, os elétrons saltam para os níveis mais
energéticos, e na Figura 13 (b) ao retornar aos níveis energéticos de origem há liberação de
energia. Átomos de elementos distintos emitem diferentes luminosidades, porque seus
elétrons ocupam diferentes níveis de energia. Em outros termos, os saltos quânticos que
realizam são diferentes.

(a) (b)

Figura 13: Transferência de energia para os elétrons, segundo Bohr.


Fonte: Página de Blogue51

De acordo com Russel (1994), embora o modelo atômico proposto por Bohr seja
atrativo em muitos aspectos, sua teoria é inadequada para explicar satisfatoriamente o
espectro de alguns elementos além do hidrogênio. O conceito de quantização de energia

50
De acordo com a tese de Planck, a radiação é emitida de forma descontínua e toda energia do elétron é
quantizada, de modo que os elétrons absorvem ou emitem quantidades fixas de energia e em minúsculas
quantidades fixas denominadas quanta (BROWN et al., 2005).
51
Disponível em: < http://www.mundoweb.com.br/quimica/teoria/modelo-atomico.asp> Acesso em jun. 2016.
123

eletrônica de Bohr é ainda considerado essencialmente correto, embora suas ideias sobre
órbitas não o sejam.
No ano de 1905, a teoria dos quanta, plural de quantum, foi usada pelo físico alemão
Albert Einstein (1879-1955) para explicar o fenômeno do efeito fotoelétrico, depois por Bohr,
em 1913 para formular o seu modelo atômico e, posteriormente, por diversos outros físicos,
que desenvolveram um novo ramo da Física: a Mecânica Quântica. E a partir da Mecânica
Quântica foi estabelecido um conjunto de leis e princípios para explicar o comportamento
energético dos elétrons no átomo. Daí surgiu o modelo pós-moderno para o átomo: o modelo
quântico52.
Ao fazer uma análise na perspectiva de Bachelard (1977, 1978) e Kuhn (1987) da
evolução dos diferentes modelos atômicos desde a antiguidade até os dias atuais, pois esses
dois epistemólogos apresentaram ideias que apontavam para algum tipo de evolução da
ciência em direção ao progresso, suplantando conhecimentos anteriores, superando obstáculos
ou através de rupturas, propondo que o conhecimento de hoje seria diferente do conhecimento
de ontem.
Compreende-se que, para Bachelard a História da Ciência deveria ser contada a partir
do presente, pois é o presente que ilumina o passado, isto é, a partir de verdades que a ciência
atual se tornou mais clara e melhor coordenada, que o passado de verdade surge mais
claramente na própria qualidade do passado.
A perspectiva epistemológica de Bachelard (1977) reforçava a ideia de que o
conhecimento científico avançaria e se aprimoraria de modo natural, superando os obstáculos
epistemológicos. Nessa perspectiva, a ciência no seu processo histórico de desenvolvimento
elaboraria teorias mais amplas que superariam as anteriores. Com essa compreensão, o
modelo de Thomson superou o de Dalton, o modelo de Rutherford superou o de Thomson, e o
modelo de Bohr superou/complementou o de Rutherford.
Já Kuhn (1987) procurou apresentar um modelo de desenvolvimento da ciência com
base nos momentos de grandes mudanças conceituais, ou seja, nas revoluções científicas.
Tomas Kuhn procurou estabelecer estreito contato com a História da Ciência, propondo a
existência de momentos de rupturas no processo do conhecimento científico. Dessa forma,
procurando suplantar as teses que defendiam o continuísmo, ele buscou justificar a
descontinuidade na ciência por meio da noção de paradigma.

52
O atual modelo quântico recorre a cálculos matemáticos bastante avançados que não têm como ser
demonstrados com base nos conhecimentos matemáticos do Ensino Médio. Para saber mais sobre o modelo
quântico sugiro a leitura nas obras de Russel (1994) e Brown et al. (2005).
124

A perspectiva epistemológica de Kuhn que o novo paradigma não explicaria, nem


mais e nem melhor, os fenômenos antes explicados pelo paradigma anterior. O que significa
que os conceitos e as teorias existentes no velho paradigma e aqueles formulados dentro do
novo seriam incomensuráveis (KUHN, 1987). Com base nessa noção de paradigma de Kuhn
pode-se inferir que foi havendo rupturas de paradigmas de Dalton, Thomson, Rutherford e
Bohr para a compreensão do comportamento e constituição do átomo nos dias atuais.
Com esses modelos atômicos de Dalton, Thomson, Rutherford e Bohr, os professores
da Educação Básica podem lançar a pergunta crucial, quando trabalham com esse conceito no
Ensino Médio, que consiste em: Qual o modelo de átomo que devo ensinar? A essa indagação
pode-se responder com o apoio em Chassot (1996) que pode ser: “Depende para que os
átomos modelados vão ser usados depois” (p. 3).
Os modelos de Dalton e Bohr, por exemplo, ainda hoje podem ser usados, quando
não se precisa de um tratamento mais sofisticado. Nesses termos, quer-se expressar que se o
professor no Ensino Médio for explicar balanceamento de reações químicas, o modelo de
Dalton se mostra eficaz para essa compreensão. E com o modelo de Bohr pode-se explicar,
com bastante adequação, as ligações químicas que ocorrem nos compostos iônicos, mas esse
mesmo modelo não é válido para explicar, consistentemente, os compostos covalentes.
Chassot (1993) afirma que Niels Bohr, por exemplo, recebeu o Prêmio Nobel de
Física, em 1922 por seu modelo atômico, e esse modelo seguiu em continuação a proposta de
modelo nuclear de Rutherford, que ganhou o Prêmio Nobel de Química em 1911, que foi
muito importante dentro das diferentes propostas de modelos atômicos. Com isso, o autor
predito sublinha duas situações:

Se Bohr, por este modelo, ganhou o Prêmio Nobel, significa que sua teoria recebeu o
referendo da Academia. Para os conhecimentos de então, sua proposta era
considerada adequada, pois explicava convenientemente as indagações sobre a
estrutura da matéria. O próprio Rutherford, que modificara o átomo de J. J.
Thomson, não aceitou logo a proposta de Bohr. Mas depois a aplaudiu, pois
verificou que a nova proposta, envolvendo limitações para os valores possíveis de
energia, era mais adequada. A segunda situação, às vezes não muito presente, é a
seguinte: mudam os modelos, mas não a realidade (p. 106).

Com essa passagem de Chassot (1993), ele evidencia que hoje em dia se tem uma
nova ideia de átomo, ou seja, um novo átomo para explicar uma realidade que não mudou. A
mudança que ocorre é no conhecimento sobre essa realidade. Esse alerta é feito, em vista de
comentários de estudantes que, quando veem a mudança de um paradigma na perspectiva de
Kuhn (1987), pensam que a natureza modificou-se.
125

Finalizo essa sinopse sobre os modelos atômicos afirmando que um modelo simples
pode ser até mais correto e mais útil de ser utilizado. É importante recordar, que a
simplificação de um modelo traz facilidades e adequações que, muitas vezes, um modelo mais
elaborado não apresenta. Recorde-se que foi afirmado poder-se explicar, com adequação, a
ligação da molécula de cloreto de sódio, NaCl que é um composto iônico, usando o modelo de
Bohr, e já uma molécula, aparentemente simples, como a do hidrogênio, H2 que é um
composto molecular para ser explicada, precisa de um modelo mais elaborado do que o
proposto por Bohr.
Assim, usam-se modelos de átomos para fazer representação de uma molécula, e se
tem um modelo de molécula; e com modelos de moléculas se faz, por exemplo, modelos de
reações. Portanto, ao se estudar Química, é importante recordar, sempre, que se tratam de
realidades com as quais se tem dificuldades de interagir e, por isso, precisa-se imaginar (fazer
imagens), ou fazer modelo (CHASSOT, 1993).

Episódios de Aula sobre Modelos Atômicos

Os episódios de aula do Ensino Médio ocorreram com a dinâmica da realização do


grupo focal53. Inicialmente, lembrei ao grupo que a conversa era entre as professoras
colaboradoras Curie, Mayer, Franklin e Meitner, e que elas não precisavam atuar como se
estivessem respondendo ao moderador todo tempo, pois o propósito não era uma entrevista
coletiva, mas sim, uma troca efetiva de saberes entre os participantes. Dessa forma, fiz a
introdução do assunto, contextualizando às colaboradoras quais eram os focos de interesse da
Química para abrir e aquecer o diálogo e foi lançada a seguinte indagação: Conte-me
episódios ou situações de uma aula que você tenha vivido sobre Modelos Atômicos na
Educação Básica, como ocorreu o planejamento, a introdução, a definição de cada modelo, o
desenvolvimento e a avaliação desses conceitos, e a partir daí o diálogo começou a fluir.

53
É necessário destacar que no momento dos relatos dos episódios de aulas eu não podia tecer nenhum
comentário para que não influenciasse as narrativas das colaboradoras, mas como professor formador no
andamento desses relatos não me faltou vontade de fazer algum tipo de intervenção. Contudo, após a transcrição
desses episódios de aulas com as narrativas orais das colaboradoras, duas semanas depois da realização do grupo
focal, eu enviei um e-mail para as colaboradoras com a transcrição dessas narrativas para que elas pudessem ler e
verificar se estavam de acordo e que elas poderiam, também, por meio de uma narrativa escrita expressar como
elas desenvolviam a aula daquele conceito no Ensino Médio. Minha intencionalidade foi ter uma postura ética
com as minhas colaboradoras nas narrativas que serão expostas e para que eu pudesse triangular as narrativas
orais com as narrativas escritas, pois eu parti do pressuposto de que muitas vezes no relato oral podemos ficar
nervosos e não expressar de forma satisfatória o que pensamos. Tive retorno de todas as colaboradoras com
narrativas escritas sobre os episódios de aulas e para minha surpresa a narrativa escrita retratava as mesmas
concepções das narrativas orais.
126

Em seguida, são apresentados os textos de pesquisa concernente às narrativas do


desenvolvimento da aula de cada colaboradora:

- A aula sobre Modelos Atômicos de acordo com a Professora Curie

O que expõe Curie?

No episódio de aula da professora Curie sobre modelos atômicos, ela revela que
gosta de trabalhar com esse conteúdo em virtude da possibilidade de poder trabalhar diversos
exercícios como atividades. Dessa forma, reforça que a tendência pedagógica de sua prática
profissional está pautada no enfoque da transmissão cultural dos conteúdos como observado
no instrumento de acesso ao seu modelo didático. Curie se expressa nos seguintes termos:
Como eu tenho trabalhado muito com turmas de primeiro ano, eu gosto muito dos conteúdos
de modelos atômicos, Linus Pauling, distribuição eletrônica, porque eu tenho “n” exercícios
para trabalhar com eles.
A professora Curie relata que faz o seu planejamento da temática e faz a introdução
desses conceitos a partir da História da Química. Entretanto, quando narra como faz com seus
educandos, Curie não problematiza os diferentes modelos e apesar de mencionar que trabalha
a partir da História da Química, ela não põe em evidência a história, como os diferentes
modelos foram sofrendo rupturas ou complementações e passa a impressão de que suas aulas
pautam-se em uma visão aproblemática e ahistórica (GIL-PÉREZ et al., 2005). Veja-se a
seguir o registro:

Por se tratar da primeira aula sobre o tema, ela foi planejada para iniciar a partir
da História da Química, onde além de contar sobre a descoberta da estrutura
atômica, falei também de quem foi cada um dos mentores das teorias. Na
introdução, discutimos os aspectos históricos para poder iniciar as discussões sobre
o modelo atômico de John Dalton. A partir do momento em que passamos a
dialogar sobre os modelos atômicos e os conceitos que são apresentados para cada
teoria, passamos a relacioná-los com o cotidiano.

Curie revela na passagem anterior, que relaciona a temática com o cotidiano.


Todavia, introduz sua aula sem contextualizar a origem da definição do átomo, e sem
problematizar as razões pelas quais, desde a antiguidade, os filósofos já buscarem, por
exemplo, uma explicação para a constituição da matéria. Ainda sobre o seu desenvolvimento
da aula com a temática, expressa:
127

Na definição de cada modelo defino assim, o modelo de Dalton os átomos são os


componentes principais da matéria, é a menor parte de um elemento. Com o passar
dos anos, novas descobertas indicavam que os átomos eram compostos por
partículas menores ainda. Assim para Thomson, o átomo consistia em uma esfera
positiva e uniforme da matéria, onde os elétrons estavam incrustados. Já o modelo
de Rutherford foi a partir de suas pesquisas realizadas com partículas α e a folha de
ouro. Rutherford conseguiu explicar que a maior parte da massa do átomo e toda a
sua carga positiva estavam localizados em uma região muito pequena e densa, a
qual ele chamou de núcleo. O restante do átomo era apenas espaço vazio, com o
movimento dos elétrons ao redor do núcleo. Bohr em suas pesquisas, conhecendo a
descoberta de Rutherford, chegou à conclusão de que os elétrons não se moviam ao
redor do núcleo de maneira aleatório, mas sim em órbitas circulares. Porém, esse
movimento circular os faria perder energia, o que explicaria o movimento dos
elétrons.

Pode-se observar no excerto acima, no que tange aos saberes científicos (Shulman,
1986), Curie mostra que possui domínio dos conceitos de cada modelo, quando expressa os
modelos de Dalton, Thomson, Rutherford, porém apresenta um erro conceitual na definição
no modelo de Bohr na passagem esse movimento circular os faria perder energia, o que
explicaria o movimento dos elétrons. O erro conceitual consiste em que não é o movimento
circular dos elétrons que os fazem perder energia, mas sim quando os elétrons mudam de uma
órbita para outra que eles emitem ou absorvem energia, veja-se a proposição de Bohr (1885-
1962): os elétrons giram em torno do núcleo, em órbitas fixas circulares chamadas níveis de
energia. Para mudarem de órbita, os elétrons emitem ou absorvem energia.
A mediação didática do saber científico ao saber pedagógico de conteúdo químico é
expresso do seguinte modo:

Para que os alunos possam associar os conceitos e as informações teóricas durante


as aulas, trabalho com ilustrações no quadro, demonstrando com uma linha do
tempo as descobertas e as mudanças que o modelo atômico passou até que se
chegasse ao modelo de Bohr. Em uma aula de revisão trabalho animação virtual,
onde é possível ver cada um dos modelos discutidos. Por trabalhar em uma escola
particular, utilizo a apostila dos alunos e o caderno de exercícios que são
adquiridos por eles e a produção em grupo de material didático que represente os
modelos discutidos na sala. Além disso, utilizo como material pessoal, livros
didáticos do PNLD para o primeiro ano do Ensino Médio e um livro de química
geral, de uso no Ensino Superior.

O PCKC de Curie para essa temática se configura por meio de ilustrações, de


recursos de multimídia, de linha do tempo dos modelos, e a mesma se apoia em vários livros
didáticos da Educação Básica ao Ensino Superior para planejar suas aulas.
128

- A aula sobre Modelos Atômicos segundo a Professora Mayer

O que diz Mayer?

No episódio de aula da professora Mayer sobre modelos atômicos, a mesma revela


logo de início como configura o seu PCKC ao trabalhar com esses conceitos, mostrando que
utiliza cartazes com ilustrações de cada modelo, bolinhas de isopor para fazer a representação
dos átomos e simuladores de cada modelo atômico na internet. Mayer se expressa do seguinte
modo:

As minhas aulas sobre modelos atômicos eu começo daquele princípio da evolução


de Dalton, Thomson e vai indo... De forma bem tradicional mesmo, e os alunos
gostam de cartazes. Daí eu faço cartazes para trabalhar com os modelos atômicos.
Além dos cartazes, eu utilizo bolinhas de isopor para representar os átomos e uso
simuladores dos modelos atômicos de forma on-line para os alunos visualizarem.

Pode-se observar, também, no relato da professora Mayer, que ela trabalha de uma
forma aproblemática, ahistórica e acumulativa como aponta Gil-Pérez et al. (2005), e que o
faz também de uma maneira “bem tradicional”. No acesso ao modelo didático de Mayer,
mesmo apontando que a intencionalidade de sua prática pedagógica encontra-se no contexto
do construtivismo se observa que a mesma possui uma visão eclética de vários modelos
didáticos, que justifica nesse contexto quando a professora anuncia que trabalha sob o
enfoque tradicional. Mayer diz: No final de toda a explicação eu faço exercícios específicos
de cada modelo como forma de fixação.
Em relação aos saberes científicos dessa temática, a professora apresenta uma visão
acumulativa de crescimento linear, não evidencia claramente as rupturas que aconteceram em
cada modelo, mas implicitamente mostra a complementação do modelo atômico de
Rutherford-Bohr e, também, não faz menção ao modelo atômico quântico ao trabalhar a
definição de cada conceito. Continuando, Mayer assim se manifesta:

O modelo de Dalton, apresento os postulados propostos por Dalton e defino como a


bola de bilhar. Quando eu explico o modelo de Thomson e aponto as diferenças não
apresentadas pelo modelo atômico de Dalton. E apresento o modelo atômico de
Thomson como pudim de passas. No modelo atômico de Rutherford, eu explico os
desvios das partículas alfas e no de Bohr os níveis de energia, quando eu falo do
átomo de Bohr eu explico como funciona os fogos de artifícios que são soltos nas
festas de Santos em Poconé, e ai eles vão entendendo. Passo a definição do modelo
atômico de Rutherford-Bohr como o modelo atômico planetário.

No excerto acima, levo em consideração que não observei aulas da professora. Estou
considerando os relatos que cada uma faz de sua prática. Essa condição me dá possibilidade
129

de levantar indícios sobre possíveis obstáculos epistemológicos no desenvolvimento de sua


aula, caso a realize tal qual relatou no excerto anterior, uma vez que o emprego
indiscriminado de termos científicos, sem distinguir seus significados em relação aos termos
da linguagem comum, pode não apenas impedir o domínio do conhecimento científico, como
também cristalizar conceitos errados, o que Bachelard (1996) chama de verdadeiros
obstáculos à abstração, denominando de obstáculo verbal.
O obstáculo verbal é a falsa explicação obtida com a ajuda de uma palavra
explicativa, nessa estranha inversão que pretende desenvolver e analisar um conceito, em vez
de inserir um conceito particular em uma síntese racional. Observam-se possíveis obstáculos
verbais na passagem da narrativa da professora Mayer, quando define apenas o modelo
atômico de Dalton como a bola de bilhar, como se a bola de bilhar, por si só, fosse o
suficiente para explicar que se trata de uma esfera maciça e indivisível e quando a professora
define também o modelo atômico de Thomson, apenas pela palavra pudim de passas.
Para Bachelard (1996), o realismo é a única filosofia inata que norteia o pensamento
do senso comum, sendo capaz de instituir a ciência do geral, do superficial. Na concepção
realista, conhecer um objeto ou um conceito é poder descrevê-lo, apresentar suas prioridades,
encaradas como fundamentalmente intrínsecas a ele. A razão do realista não encontra espaço
para se aplicar, pois todo seu ser resiste à abstração. Com isso, pode-se expressar que também
se pode identificar possíveis obstáculos realistas na narrativa da professora Mayer, quando a
professora define o modelo atômico de Rutherford-Bohr com a metáfora de modelo atômico
planetário. Dessa forma, a força da metáfora se sobrepõe à discussão racional desse modelo
atômico proposto.

- A aula sobre Modelos Atômicos na perspectiva da Professora Franklin

O que conta Franklin?

No episódio de aula da professora Franklin sobre modelos atômicos, ela propõe uma
atividade com seus educandos para mostrar que trabalha com modelos para explicar a
realidade. Essa atividade, ela denomina de “caixinha misteriosa” e o seu objetivo com os
educandos é que com um objeto dentro da caixa os estudantes possam tocar com as mãos e,
por meio disso, eles possam elaborar, com desenhos, uma possível explicação para o que eles
acham e o que possa ser um suposto objeto. Percebo a sua intencionalidade de trabalhar com o
abstrato perpassa de algo concreto e que podem no final trazer possíveis detalhamentos sobre
o objeto por meio de modelos. Dessa forma, a professora explica que, da mesma maneira,
130

foram propostos modelos para a explicação dos átomos, mas que são possíveis explicações
para uma determinada realidade. Assim relata Franklin:

Na aula de introdução ao conteúdo, faço a prática da caixinha misteriosa. Nessa


caixa, coloco um objeto (geralmente um brinquedo já usado, que não tenha
problemas de ser apalpado para que não machuque o aluno), aviso com
antecedência de que o objeto não pode ser retirado da caixa. O objetivo é que eles
“sintam” o objeto com as mãos e através disso, eles criam um desenho do que eles
imaginam estar dentro da caixa e escrevam suas características. Feito isso, peço
que eles exponham seus desenhos e expliquem por que acreditam ser “aquilo”.
Pergunto-lhes se é possível afirmar com certeza a respeito do objeto desenhado. A
partir daí começamos a falar sobre modelos e as possíveis formas para melhorá-lo.

Prosseguindo a narrativa de sua aula, a professora expressa que dias antes da


explicação sobre modelos atômicos ela solicita como “tarefa” uma pesquisa sobre os modelos
atômicos de Dalton, Thomson e Rutherford-Bohr, mas não menciona se orienta seus
educandos a como fazerem essa pesquisa e em quais fontes podem buscar o que está sendo
solicitado. Franklin diz: Uma aula antes da introdução do conteúdo deixei como “tarefa”
uma pesquisa sobre os modelos atômicos de Dalton, Thomson e Rutherfor-Bohr, para ser
entregue no caderno, destacando a característica de cada modelo atômico.
Nas suas aulas, a professora em seus PCKC utiliza-se de analogias e bolinhas de
isopor para representar os átomos para explicar os diferentes modelos atômicos, mas também
recai nos obstáculos epistemológicos verbais e realistas na perspectiva de Bachelard (1996),
quando define que o modelo atômico de Dalton é semelhante a uma bola de bilhar, que o
modelo de Thomson foi proposto por ele, quando ele estava com fome e ficou conhecido
como pudim de passas e que o modelo atômico de Bohr é comparado ao Sistema Solar.
Na explicação dos saberes científicos, a professora possui domínio dos conceitos em
que está trabalhando, contudo, ela os expressa de uma forma aproblemática, ahistórica e
acumulativa (Gil-Pérez et al.,2005), não evidenciando em que momento se deu a ruptura do
modelo de Dalton com o de Thomson, bem como a complementação dos modelos de
Rutherford e Bohr. Veja-se a exposição:

Na aula seguinte verifico a pesquisa que foi feita no caderno e explico sobre cada
modelo atômico destacando cada cientista. Para explicar o modelo atômico de
Dalton utilizo umas bolinhas (que é utilizado na aula do terceiro ano para trabalhar
ligações dos compostos orgânicos), no modelo atômico de Dalton os átomos são
esferas maciças, rígidas e indivisíveis. Átomos com as mesmas propriedades
constituem um elemento químico e elementos diferentes são constituídos por átomos
com propriedades diferentes. Depois de muitas aulas sobre o assunto percebi que
com essas bolinhas fica mais fácil para eles assimilarem o conceito de átomo e o de
elemento químico. Ai eu defino que o átomo de Dalton é semelhante a uma bolinha
de bilhar.
131

Destaco que o modelo de Dalton não leva em consideração que os átomos são
constituídos de cargas elétricas, sendo necessário um novo modelo que atenta a
essa necessidade. Thomson na hora que criou o seu modelo estava como fome e o
seu modelo atômico ficou conhecido como pudim de passas. O modelo atômico
de Thomson consiste em uma esfera carregada positivamente e que elétrons de
carga negativa ficam incrustados nela.

Para explicar o Modelo atômico de Rutherford-Borh eu digo que o átomo não era
como se pensava até então uma esfera rígida ou um pudim, mas que ele tem espaços
vazios semelhante ao Sistema Solar. Aí faço a definição que o átomo é composto por
um pequeno núcleo carregado positivamente e rodeado por uma grande eletrosfera,
que é uma região envolta do núcleo que contém elétrons. No núcleo está
concentrada a carga positiva e a maior parte da massa do átomo. Como eles
fizeram a pesquisa, comento de forma geral como foi feito o experimento. Faço o
desenho no quadro do modelo atômico para explicar o núcleo e suas partículas
(prótons e nêutrons) e a eletrosfera com os elétrons. Bohr representa os níveis de
energia, cada elétron possui a sua energia. É comparado às orbitas dos planetas do
Sistema Solar, onde cada elétron possui a sua própria órbita. Cada órbita
representa uma camada eletrônica. Na aula seguinte trabalhamos exercícios sobre
o assunto.

Ao acessar a intencionalidade da prática pedagógica da professora Franklin, através


do instrumento do modelo didático como demonstrado na seção anterior, compreendo que ela
se situa no contexto do construtivismo. Contudo, a professora em vários aspectos apresentou
visão eclética sobre diferentes modelos didáticos. A proposta de trabalhar com construção de
modelos com a prática da caixinha misteriosa indica a iniciativa da perspectiva construtivista
ao trabalhar com saberes científicos, mas, ao final, a professora expressa que finaliza sua aula
com resoluções de exercícios sobre os modelos atômicos como uma forma de memorizar os
conhecimentos que foram transmitidos. Franklin diz: Na aula seguinte trabalhamos
exercícios sobre o assunto.

- A aula sobre Modelos Atômicos conforme a Professora Meitner

O que narra Meitner?

No episódio de aula da professora Meitner sobre modelos atômicos, ela, de início,


me deixa perceber que o que conduz a sua prática pedagógica é o livro didático. A professora,
para acessar o saber científico aos seus estudantes em seu PCKC utiliza-se de histórias,
figuras, imagens, analogias e pesquisas em internet. Meitner se expressa nos seguintes
termos:

Eu trabalho com o livro didático, justamente pelo fato de contar histórias dos
modelos atômicos, e eu gosto de trabalhar com a visualização dos alunos, também.
e então, eu vou para a internet com eles para fazer pesquisa, daí eu encontro na
internet vários vídeos que trabalham os diferentes modelos atômicos com as figuras,
imagens e vidas de cada cientista.
132

A professora Meitner tenta trabalhar os modelos atômicos em uma perspectiva


problemática e histórica, mas não explica com detalhes como se originou e em qual
perspectiva atua em cada modelo, quais sofreram rupturas ou complementações. Meitner diz:
Nas aulas sobre modelos atômicos eu explico a evolução de cada modelo de modo que os
alunos percebam através da História da Química, como esses modelos são aprimorados ou
até mesmo substituídos para explicar melhor um fenômeno.
No que tange os saberes científicos dessa temática, Meitner manifesta apresentar
domínio dos conceitos, mas também recai em obstáculos epistemológicos verbais e realistas
como proposto por Bachelard (1996), quando expressa que o modelo de Thomson ficou
conhecido como pudim de passas e o modelo de atômico de Bohr ficou conhecido como o
modelo atômico do Sistema Solar, ficando só no nível da metáfora e não fazendo a devida
ruptura do senso comum com o saber científico. Eis sua narrativa:

Na teoria atômica de Dalton eu explico que Dalton considera o átomo maciço,


indivisível, e explico o conceito de elemento químico. No modelo atômico de
Thomson ele foi responsável pela descoberta dos elétrons e da radiotividade e o seu
modelo atômico ficou conhecido como pudim de passas. Para o modelo atômico de
Rutherford eu explico o experimento que ele fez a partir do bombeamento de
finíssimas placas de ouro com partículas alfa para a descoberta do núcleo do
átomo. E o modelo de Bohr, como ele compreende a natureza da luz nos espectros
de emissão e absorção da luz e que o seu modelo ficou conhecido como o modelo
atômico do Sistema Solar.

No acesso à intencionalidade da prática pedagógica da professora Meitner


compreendo que ela assume um enfoque de transmissão cultural dos conteúdos, o que reforça
com a passagem da finalização de sua aula somente com resolução de exercícios. A este
respeito, Meitner diz: Como atividade final, eu faço exercícios de cada modelo.

Diferenças e Proximidades nos episódios de aulas sobre modelos atômicos das


Professoras colaboradoras

Nos episódios de aula sobre modelos atômicos, posso constatar mais proximidades
que diferenças. Em relação à diferença, a única professora que não expressou em sua aula
possíveis obstáculos epistemológicos foi a professora Curie, mas isso não significa que a
referida professora não precise estar vigilante epistemologicamente. Outra diferença foi a
tarefa preparatória para a introdução do assunto pela professora Franklin, que pediu aos
estudantes para pesquisar a respeito na aula anterior. E entre as aproximações, posso destacar
os seguintes aspectos:
133

- Todas as professoras expressaram certo domínio do saber científico sobre a


temática trabalhada, ao relatar os episódios de aula;
- O PCKC se configura de diferentes maneiras, tais como analogias, ilustrações,
cartazes, vídeos, entre outros;
- Todas apresentaram indícios de uma prática docente em perspectiva aproblemática
e ahistória, mesmo quando, em seu relato, diziam considerar aspectos históricos da Ciência.
Gil-Pérez et al. (2005) mostram que o fato de transmitirmos conhecimentos já elaborados
conduz a ignorar quais foram os problemas que se pretendiam resolver, qual tem sido a
evolução de ditos conhecimentos, as dificuldades encontradas entre outros;
- Nenhuma professora levou em consideração os conhecimentos prévios de seus
educandos; talvez a professora Franklin tenha intencionado a constituição de tais
conhecimentos em seus alunos, ao solicitar pesquisa prévia sobre modelos atômicos em aula
anterior à sua explicação;
- Nenhuma professora fez a introdução da aula fornecendo justificativas para
estudarmos os modelos atômicos e para qual finalidade;
- Todas demonstraram necessidade de uma reflexão epistemológica na construção e
trabalho desses conceitos;
- Em certo ponto, todas narraram suas aulas em uma visão acumulativa do
conhecimento que, no ponto de vista de Gil-Pérez et al. (2005), trata-se de uma visão
simplista à qual o ensino costuma contribuir, ao apresentar as teorias hoje aceitas sem mostrar
o processo de seu estabelecimento e sem se referir às frequentes confrontações entre teorias
rivais;
- As explicações de suas aulas narradas não dão indícios de uma possível e
necessária ruptura epistemológica do senso comum com o saber científico;
- Do ponto de vista didático, para trabalhar com os conceitos em química seria útil
distinguir três aspectos do conhecimento químico: fenomenológico, teórico e
representacional, conforme Machado e Mortimer (2007). Observa-se que nas narrativas desse
episódio de aula, o aspecto teórico prevaleceu, e o fenomenológico e representacional não
foram destacados.
A seguir, apresento o que a literatura Química atual versa sobre os modelos de ácidos
e bases e os textos de pesquisa sobre os episódios de aula sobre essa temática das professoras
colaboradoras.
134

Ácidos e Bases em Questão: O que a literatura Química atual apresenta?

Está subseção trata dos episódios de aulas sobre os conceitos de ácidos e bases de
Arrhenius para o Ensino Médio, para tanto, assim como nos episódios de modelos atômicos,
traz-se uma sinopse de ácidos e bases para situar o leitor teoricamente nos episódios de aulas
sobre as concepções desse tema. Essa temática é ensinada a partir da diferenciação das
substâncias químicas que podem ser classificadas em dois tipos: orgânicas e inorgânicas.
As orgânicas são constituídas por moléculas formadas pela união consecutiva de
átomos de carbono, C, também chamadas por cadeias carbônicas, e são exemplos dessas
substâncias: a sacarose (açúcar branco), o ácido acético (presente no vinagre), o etanol (álcool
etílico), entre outros. As substâncias inorgânicas, em geral, são de origem mineral, como: o
nitrato de sódio, NaNO3, também conhecido como (salitre do Chile), sulfato de cálcio, CaSO4,
ácido clorídrico, HCl, hidróxido de sódio, NaOH (presente na soda cáustica), entre outros.
Algumas das substâncias inorgânicas constam, também, de átomos de carbono, como é o caso
do dióxido de carbono, CO2 e do carbonato de cálcio, CaCO3 (presente no calcário).
E dentre os vários tipos de substâncias inorgânicas existem alguns que comumente
são mencionados, quer por suas propriedades químicas, ou por seu largo emprego em
processos químicos. E desses grupos destacam-se os ácidos, as bases, os sais e os óxidos.
Na literatura Química contemporânea, os paradigmas para a compreensão do
conceito de ácidos e bases, Chagas (1999) aponta para oito modelos, sendo estes: as teorias de
Arrhenius (1887), dos sistemas solventes (1905), protônica (1923), eletrônica (1923), de Lux
(1939), de Usanovich (1939), ionotrópica (1954) e as críticas de Werner (1895 a 1911),
contudo, no Ensino Superior esses conceitos são trabalhados em três perspectivas a de
Arrhenius, de Brɵnsted-Lowry e a de Lewis. E na Educação Básica para a compreensão
desses conceitos comumentemente se ensina somente a partir do modelo de Arrhenius,
destarte, os episódios de aulas sobre essa temática foram propostos junto às colaboradoras
tendo como apoio essa teoria.
Desde os primeiros tempos da química experimental, os cientistas identificam os
ácidos e as bases por suas propriedades características. De acordo com Chagas (1999), os
termos ácidos e sal datam da Antiguidade, álcali, da Idade Média e base do século XVIII. Os
ácidos possuem sabor azedo (por exemplo, o ácido cítrico no suco de limão) e fazem com que
determinados corantes mudem de cor, por exemplo, o tornassol fica vermelho no contato de
ácidos, e no uso de indicador natural de extrato de repolho roxo a solução em contato com
135

ácidos ficam de vermelho a violeta dependendo do pH54. A palavra ácido vem do latim acidus
e significa azedo ou picante. As bases possuem sabor amargo e, geralmente, a sensação
escorregadia ao tato55 (o sabão é um bom exemplo), e fazem com que determinados corantes
também mudem de cor, por exemplo, o tornassol fica azul no contato de bases, e no uso de
indicador natural de extrato de repolho roxo a solução em contato com bases ficam de
amarelo a verde escuro dependendo do pH. A palavra base vem do inglês arcaico rebaixar
(BROWN et al., 2005).

Ácidos e Bases de Arrhenius

No ano de 1884, o químico sueco Svante Arrhenius propôs uma teoria para explicar a
condutibilidade elétrica de algumas soluções. Essa teoria ficou conhecida como Teoria da
Dissociação Iônica e a mesma viabilizou o estabelecimento de critérios para classificar as
substâncias em função dos seus íons presentes em solução. De acordo com esse químico, as
soluções capazes de conduzirem corrente elétrica eram as que apresentavam partículas
carregadas eletricamente com liberdade de movimento. Nesse sentido, ele realizou vários
testes de condutibilidade elétrica para tirar suas conclusões (LISBOA, 2010).
A partir daí, ficou estabelecido que as substâncias que conduzem corrente elétrica,
quando dissolvidas em água, são chamadas de eletrólitos. As misturas formadas são
denominadas de soluções iônicas ou eletrolíticas. Todos os compostos iônicos solúveis em
água são eletrólitos, porque sofrem dissociação iônica em água, e as soluções aquosas
resultantes apresentam íons livres. Assim, o cloreto de potássio, KCl (composto iônico) é um
eletrólito, e sua solução aquosa é eletrolítica.
Alguns compostos moleculares também são eletrólitos, porque sofrem ionização em
água, por exemplo, o ácido clorídrico, HCl (composto molecular), que origina íons livres
quando dissolvido em solução aquosa.
Por volta de 1830, era notório que todos os ácidos continham hidrogênio, mas nem
todas as substâncias que continha hidrogênio eram ácidos. Dessa forma, o conceito de ácido e
base de Arrhenius veio a ser expresso da seguinte forma: os ácidos são substâncias que,
quando dissolvidas em água, aumentam a concentração de íons H+, portanto, são
considerados eletrólitos, pois sofrem ionização em água, gerando uma solução condutora de

54
pH = potencial hidrogeniônico que compreende uma escala de 0 a 14 para medir a acidez ou basicidade de
uma solução. Trata-se da concentração molar de [H+] (aq) em solução. De modo geral, materiais que apresentam
pH abaixo de 7 são ácidos, acima de 7 são básicos e pH igual a 7 são neutros.
55
Muito cuidado com as bases, pois são substâncias altamente corrosivas.
136

corrente elétrica. Da mesma forma, as bases são substâncias que, quando dissolvidas em
água, sofrem dissociação iônica e aumentam a concentração de íons OH- (hidróxido).
A neutralização seria a reação dessas duas espécies iônicas, produzindo água:
H+ (aq) + OH- (aq) = H2O (l)
Para Chagas (1999), a teoria de Arrhenius foi muito importante, pois deu conta de
explicar um grande número de fenômenos já conhecidos e provocou o desenvolvimento de
várias linhas de pesquisa, contribuindo em termos expressivos para estabelecer as bases
científicas da química analítica. Alguns exemplos:

[...] aplicação de lei de ação das massas a equilíbrios iônicos e obtenção da lei de
Ostwald (Ostwald, 1887); a equação de Nernst (Nernst, 1888-1889), que relaciona a
força eletromotriz das pilhas com a concentração de íons; o efeito tampão (Fernback,
1900), o primeiro estudo quantitativo de um indicador (Friedenthal, 1904); o
conceito de pH (Sɵrensen, 1909), etc (p.28).

Santos e Mól (2010) expressam que a teoria de Arrhenius para o comportamento de


ácidos e bases foi muito criticada como é comum nas Ciências, sendo que uma das críticas foi
sobre a natureza do próton em solução aquosa, pois não é correto imaginar ionização de
ácidos produzindo prótons livres. Então, se propôs que esses prótons se ligariam a molécula
de água, por meio de ligação coordenada, formando o cátion hidrônio (H3O+). Outra crítica
está relacionada com substâncias que não contêm hidroxila e são bases, por exemplo, a
substância amônia, que age como base de Arrhenius, mas suas moléculas não têm hidroxila.
Nesse caso, é possível entender a razão se imaginar que a reação ocorra em etapas da seguinte
forma:
NH3(aq) + H2O (l) NH4OH(aq)
O hidróxido de amônio NH4OH(aq), por sua vez irá se ionizar:
NH4OH (aq) NH4+(aq) + OH-(aq)
Assim, pode-se representar a reação global da seguinte maneira:
NH3(aq) + H2O (l) NH4+(aq) + OH-(aq)

A despeito de todos os avanços proporcionados pela teoria de Arrhenius, desde o


início a sua teoria mostrou-se restrita à água, sendo que alguns casos foram possíveis estendê-
la a outros solventes, mas em sistemas sólidos não havia possibilidade de aplicá-la. Nesse
sentido, nos dias atuais existem outras teorias que definem ácidos e bases, considerando
outros fatores, como as teorias de Brɵnsted-Lowry e a de Lewis já referenciadas.
137

Episódios de Aula sobre Ácidos e Bases

Os episódios de aula do Ensino Médio sobre ácidos e bases também se deram com a
dinâmica da realização do grupo focal entre as professoras colaboradoras: Curie, Mayer,
Franklin e Meitner e, posteriormente, foi aplicado um questionário com perguntas
específicas sobre a temática, com objetivo de suplementar as narrativas do grupo focal. Após
os episódios de aulas sobre modelos atômicos, foi dada continuidade ao diálogo e lançada a
seguinte indagação: Conte-me episódios ou situações de uma aula que você tenha vivido
sobre Ácidos e Bases de Arrhenius na Educação Básica, como ocorreu o planejamento, a
introdução, a definição de cada modelo, o desenvolvimento e a avaliação desses conceitos e, a
partir daí, o diálogo continuou a fluir.
Nesta subseção apresento o texto de pesquisa com as narrativas de todas as
colaboradoras, pois em suas narrativas há muitas convergências de como desempenham no
contexto da prática as suas aulas sobre ácidos e bases de Arrhenius. As professoras Mayer,
Franklin e Meitner expressaram que iniciam suas aulas com a temática de ácidos e bases na
perspectiva empírica, através de atividades experimentais que possam identificar diversas
substâncias como sendo ácidas ou básicas.
A seguir os registros:

Mayer: Eu apresento as funções inorgânicas: ácidos, bases, sais e óxidos. Daí eu


começo pelo sabor, quando eu falo em ácido o que te lembra? Ai eles respondem:
Ah! Professora é muito azedo. Ai eu vou listando no quadro a laranja, o limão. E a
base? Eu falo para os alunos: alguém já comeu banana verde? Como fica a boca?
Aí, eu falo que a base tem sabor adstringente que amarra a boca e cito o exemplo
do leite de magnésio. Eu faço a identificação de substâncias ácidas e básicas com o
extrato de repolho roxo, eu preparo a solução, mostro a escala de pH para os
alunos e com copinhos plásticos de cafezinho. Eu coloco a solução de extrato de
repolho roxo e vamos testando pela coloração quais substâncias são ácidas ou
básicas. A gente testa shampoo, água sanitária, detergente, vinagre, o sumo da
laranja e do limão e pela coloração vamos identificando qual substância é ácida e
qual substância é básica.

Franklin: Quando a gente chega a ácidos e bases a gente já está lá no final do


terceiro bimestre, iniciando o quarto bimestre, então quando eu trabalho com
ácidos e bases eu falo dos sabores, ácido tem o sabor azedo, base é adstringente, ai
você vai falar do caju, da banana verde, do limão. Eu sempre faço aquela aulinha
prática do repolho roxo, que você consegue identificar uma substância ácida e uma
substância básica porque nem toda substância você não pode colocar na boca,
então você precisa de outros métodos, de outros meios para conseguir identificar.
Eu sempre faço a aulinha do repolho roxo, a gente pega sabonete, detergente, e
outros materiais para identificar.
138

Meitner: A aula sobre ácidos e bases eu fiz foi no laboratório utilizando o repolho
roxo, mas eu já tinha preparado em casa e então, eu levei esse preparo do repolho
roxo em tubos de ensaio. Eles foram adicionando coisas do dia a dia, shampoos,
sucos, então de acordo com a visualização da coloração eles puderam identificar
uma substância ácida ou uma substância básica. Eu coloquei no quadro a
construção de uma tabela identificando as substâncias e as suas colorações,
identificando se ela era ácida ou básica. Mas a princípio foi uma aula experimental,
porque eu acredito que às vezes a gente pode trabalhar com o experimento antes
mesmo de trabalhar com os conceitos teóricos.

É importante destacar que a identificação de substâncias com caráter ácido ou básico,


na época do PIBID, era atividade comum em realizar a atividade da extração da solução do
repolho roxo como indicador ácido-base, e com a solução era misturada uma determinada
substância que se queria identificar e, de acordo com a coloração da mistura, se podia
identificar como ácido ou básico pela a escala de coloração e pH do indicador do extrato do
repolho roxo. Pode-se identificar que essa prática, que era feita no PIBID, hoje em dia no
contexto profissional tem sido executada da mesma forma, mas sem problematizar como foi
possível perceber em suas narrativas. Dessa forma, como afirma Bachelard (1996), o
empirismo que não é racionalizado, não se constitui em conhecimento científico.
Já a professora Curie expressa que inicia suas aulas com a definição do que são
eletrólitos, para depois entrar com as definições de ácidos e bases de Arrhenius, reforçando
que sua aula com essa temática é bem teórica, e a mesma utiliza em seu PCKC exercícios,
simulações, pesquisas e a mesma experimentação com o indicador ácido-base do extrato de
repolho roxo.

Curie: A aula sobre ácidos e bases eu começo trabalhando com a diferenciação de


eletrólitos e não eletrólitos, depois com a definição do ácido e base de Arrhenius.
No início ela é bem teórica mesmo. Para essas aulas eu utilizo exercícios,
simulados, pesquisas e experimentação ilustrativa com a mudança de cor de um
indicador.

As professoras Mayer, Franklin e Meitner, ao narrarem suas aulas com essa


temática, ficaram somente no campo fenomenológico e as mesmas tentaram partir dos
conhecimentos prévios de seus educandos, ao tentar diferenciar com materiais do dia a dia
quais substâncias são ácidas ou básicas. Curie ficou somente no campo teórico e
fenomenológico, mas em nenhuma narrativa pude encontrar evidências de que suas aulas
levassem seus educandos a fazer a ruptura necessária do senso comum com o saber científico.
No grupo focal, ao trabalhar com esse tema, como as professoras ficaram muito no
campo empírico sem trazer as definições teóricas dos modelos de ácidos e bases de Arrhenius
139

comecei a indagar: Como você define para seus estudantes o que é um ácido ou uma base de
Arrhenius?
Feita essa indagação, pois um dos assuntos que os obstáculos substancialistas mais
encontram abrigo é a teoria de ácido-base ou, como se referem os livros didáticos, o
desenvolvimento das funções inorgânicas. Para Bachelard (1996), o obstáculo substancialista
ocorre quando:

A substancialização de uma qualidade imediata percebida numa intuição direta pode


entravar os futuros progressos do pensamento científico tanto quanto a afirmação de
uma qualidade oculta ou íntima, pois tal substancialização permite uma explicação
breve e peremptória. Falta-lhe o percurso teórico que obriga o espírito científico a
criticar a sensação. [...] O espírito científico não pode satisfazer-se apenas com ligar
os elementos descritivos de um fenômeno a uma respectiva substância, sem nenhum
esforço de hierarquia, sem determinação precisa e detalhada das relações com outros
objetos (p. 127).

De acordo com Lopes (2007), a presença do substancialismo se expressa na


racionalização mal feita, capaz de considerar as propriedades ácidas e básicas como
intrínsecas ao próton H+ e à hidroxila OH-, encerrados na molécula ou no agregado iônico. Eis
algumas falas das colaboradoras:

Curie: Ácidos eu defino que são substâncias que quando dissolvidas em água
aumentam a concentração dos íons H+ em água e mostro as suas representações
químicas. Bases eu defino que são substâncias que quando dissolvidas em água
aumentam a concentração de íons OH-.

Mayer: Ácidos são substâncias que liberam íons H+ quando dissolvidas em água e
base são substâncias que liberam íons OH- quando dissolvidas em água.

Franklin: Ácidos são substâncias que produzem íons H+ quando dissolvidas em


água e base são substâncias que produzem íons OH- quando dissolvidas em água.

Meitner: Ácidos são substâncias que liberam íons H+ quando dissolvidas em água e
base são substâncias que liberam íons OH- quando dissolvidas em água.

A professora Curie faz a definição de ácidos e bases de Arrhenius de forma correta,


e as professoras Mayer, Franklin e Meitner expressam em suas narrativas erros muitos
comuns que são encontrados em livros didáticos do Ensino Médio com o termo liberar e
produzir, indicando um obstáculo substancialista. A definição de Arrhenius não traz os termos
liberar e produzir determinados íons, mas sim aumentar a concentração do determinado íon
em questão.
140

Com a passagem pelo grupo focal foi possível perceber que se poderia explorar mais
essa temática com as colaboradoras. Assim, foi aplicado um questionário posteriormente,
visando suplementar as discussões que foram feitas no grupo focal.
As duas primeiras indagações são bastante objetivas e as respostas pretendidas eram
sim ou não e essas duas indagações foram pensadas na intenção de garantir que as professoras
colaboradoras que as respondessem corretamente saberiam em que se basear. Dessa forma,
elas poderiam se preocupar apenas com os fenômenos e não ter que lembrar o que diz a
definição. Contudo, abaixo das questões havia espaço para as devidas justificativas se elas
achassem necessário.
Alerto que a definição de Arrhenius não menciona a necessidade de ácidos terem
hidrogênio e bases terem hidroxila, como explicitado na subseção de ácidos e bases de
Arrhenius. Considero, novamente, a definição: os ácidos são substâncias que, quando
dissolvidas em água, aumentam a concentração de íons H+, portanto, são considerados
eletrólitos, pois sofrem ionização em água, gerando uma solução condutora de corrente
elétrica. Da mesma forma, as bases são substâncias que quando dissolvidas em água, sofrem
dissociação iônica e aumentam a concentração de íons OH- (hidróxido).
Na sequência, segue a primeira indagação: A) Ao reagir com a água, uma
determinada substância causa o aumento da concentração de íons H3 O+ no meio (ácido
de Arrhenius). Essa substância deve ter hidrogênio (H) em sua fórmula?

Curie: Sim, é necessária a presença do Hidrogênio.


Mayer: Não, o aumento na concentração de H+ se dá devido à constante de
dissociação.
Franklin: Não, a teoria fala que libera, mas, não necessariamente a substancia
tenha hidrogênio.
Meitner: Não.

A segunda indagação foi expressa da seguinte maneira: B) Ao reagir com a água,


uma determinada substância causa o aumento da concentração de íons OH-no meio
(base de Arrhenius). Essa substância deve ter hidroxila (OH) em sua fórmula?

Curie: Sim, é necessária a presença da hidroxila.


Mayer: Não, o aumento na concentração de OH- se dá devido à constante de
dissociação.
Franklin: Não, pelo mesmo motivo, porém agora voltado para hidroxila.
Meitner: Não.

Dessas duas primeiras indagações, entendo que as professoras Mayer, Franklin e


Meitner expressam ter clareza sobre a definição do modelo de ácidos e bases de Arrhenius e
141

o erro demonstrado pela professora Curie expressa um erro clássico frequente em salas de
aula e em livros didáticos do Ensino Médio e Ensino Superior, ao expressar a ideia de que o
hidrogênio deva fazer parte da própria substância causadora do aumento de concentração de
H+ para os ácidos e a hidroxila fazer parte da própria substância causadora do aumento de
concentração de OH-. Nessa situação, vejo que a amônia, por exemplo, não possui hidroxila
na constituição de sua molécula e comporta-se como base. Alerto que:

NH3(aq) + H2O(l) NH4OH(aq)


O hidróxido de amônio NH4OH(aq), por sua vez irá se ionizar:
NH4OH(aq) NH4+(aq) + OH-(aq)
Assim, pode-se representar a reação global da seguinte maneira:
NH3(aq) + H2O(l) NH4+(aq) + OH-(aq)

A terceira indagação trata de outro erro muito comum, em salas de aula do Ensino
Médio e diz respeito à ideia de que o sal é o produto de neutralização da reação de um ácido
com uma base, mesmo se tratando de reações em soluções aquosas. Essa indagação foi
expressa da seguinte forma: C) Qual o produto da neutralização entre soluções aquosas de
mesma molaridade de ácido clorídrico, HCl e de hidróxido de sódio, NaOH?

Curie: Água e Sal.


Mayer: Duas substâncias fortes apresentarão como produto da reação a água.
Franklin: H+ (aq) + Cl- (aq) + Na+ (aq) + HO- (aq)↔ H2O (l).
Meitner: NaCl e H2O.

Pude constatar que as professoras Curie e Meitner reproduzem o erro comum


encontrados nos livros didáticos e as professoras Mayer e Franklin demonstram domínio do
conceito nessa situação. Para essa indagação, de acordo com o formalismo das equações
químicas, em se tratando de dois eletrólitos fortes como HCl(aq) e NaOH(aq), pode-se
cancelar o que há de igual nos dois lados da equação, dessa forma, o professor no Ensino
Médio pode chamar a atenção para a dissociação do HCl(aq) e NaOH(aq), quando as soluções
forem diluídas, sendo assim a reação de neutralização desses eletrólitos pode ser expressa do
seguinte modo:

H+ (aq) + Cl- (aq) + Na+ (aq) + HO- (aq) ↔ Na+ (aq) + Cl- (aq) + H2O (l)
142

Nessa equação é possível cancelar os íons de sódio e cloreto, o que leva a concluir
que o único produto da reação de neutralização como definiu Arrhenius de um ácido forte
com uma base forte é a água. E o sal? Se removermos a água, serão obtidos cristais de cloreto
de sódio, que não é produto de nenhuma reação química, mas de um processo de evaporação
do solvente, uma vez que os íons de sódio e cloreto já estavam presentes na solução.
A última indagação sobre essa temática também foi realizada de forma direta e o
ideal é que todas as professoras colaboradoras respondessem que NH4Cl(S) e Al2(SO4)3(S), são
ácidos de Arrhenius, pois aumentam a concentração de H+ em solução aquosa e KCN(S) e
CaO(S), são bases de Arrhenius, pois aumentam a concentração de HO- em solução aquosa.
Segue como a indagação foi expressa e as respostas das professoras colaboradoras: D)
Considere as seguintes reações abaixo, e dentre as substâncias NH4Cl(S), KCN(S), CaO(S),
Al2(SO4)3(S), alguma delas pode ser considerada um ácido ou uma base de Arrhenius? Quais?
Justifique.

NH4Cl(S) + H2O(l) NH3(aq) + H3O+(aq) + Cl-(aq)

KCN(S) + H2O(l) K+(aq) + HCN(aq) + OH-(aq)

CaO(S) + H2O(l) Ca+2(aq) + 2OH-(aq)

Al2(SO4)3(S) + 12H2O(l) 2Al(OH)3(S) + 6H3O+(aq) + 3SO4-2(aq)

Curie: Bases de Arrhenius: KCN(s) e CaO(s); Ácidos de Arrhenius: NH4Cl(s) e


Al2(SO4)3(S).
Mayer: Sim, o NH4Cl(S), apresenta característica ácida. Já o Al2(SO4)3(S), apresenta
característica básica.
Franklin: NH4Cl(S) ácido, as demais acredito que não se aplica pois se trata de sais
e óxidos.
Meitner: NH4Cl(S) e Al2(SO4)3(S), são ácidos, porque aumentam a concentração de
H+. KCN(S) e CaO(S), são bases porque aumentam a concentração de OH-.

Para essa última indagação, Curie respondeu de forma exata. Entretanto, não
justificou a sua resposta. Já a professora Mayer respondeu de forma correta que o NH4Cl(S) é
ácido, mas não justificou o porquê e respondeu de forma equivocada que Al2(SO4)3(S)
apresenta características básicas, pois em sua reação com água se viu que essa substância
aumenta a concentração de íons H3O+(aq), portanto, se comporta como ácido. A professora
Franklin respondeu que o NH4Cl(S) é ácido, mas também não justificou o porquê e as demais
143

substâncias que KCN(S) e Al2(SO4)3(S) ela justifica que são sais e, realmente, estas são, mas
que ao serem dissolvidos em água aumentam as concentrações dos íons OH- e H3O+(aq) se
comportando como base e ácido respectivamente. A substância CaO(S) a professora diz ser
óxido e trata-se de um óxido, sim, que ao reagir com água aumenta a concentração dos íons
OH- e se comporta com uma base. E a professora Meitner respondeu com exatidão à
indagação com a devida justificativa.
A temática de ácidos e bases aparentemente parece ser a mais fácil de ser trabalhada
no Ensino Médio, tanto é que foi expresso pelas colaboradoras como um dos conceitos, com o
qual elas mais gostam de trabalhar. Todavia, observei que, em certas situações, as professoras
têm o pleno domínio de como aplicar o conceito de ácido e base de Arrhenius e, em outras
situações, acabam se confundindo. Esta realidade evidencia que, para além de uma atenção
maior ao trabalhar com esses conceitos no Ensino Médio, temos que ter uma constante
vigilância epistemológica para analisar muito bem os livros didáticos com os quais
trabalhamos, para evitar que sejam reproduzidos possíveis erros conceituais e obstáculos
epistemológicos que esses livros geralmente trazem.
Ao responder a indagação propulsora dessa pesquisa em: Como se configuram e se
expressam saberes científicos e pedagógicos de conteúdos químicos subjacentes à
docência de professores egressos do Programa de Bolsa de Iniciação à Docência em
Química da UFMT, ao relatarem o ensino de Química que realizam na Educação
Básica? Compreendo que os saberes científicos foram expressos com uma carência de
reflexão epistemológica dos conceitos químicos trabalhados e os saberes pedagógicos de
conteúdos químicos se configuraram, muitas vezes, em possíveis obstáculos epistemológicos
para o processo de ensino-aprendizagem em Química na Educação Básica. Sendo assim,
finalizo esta seção acerca de episódios de aula do Ensino Médio com o ensinamento de Morin
(2011) de que o conhecimento científico foi durante muito tempo e, com frequência, ainda
continua sendo concebido como tendo por obrigação dissipar a aparente complexidade dos
fenômenos, a fim de revelar a ordem simples a que elas obedecem. A complexidade em se
trabalhar com o conhecimento científico suporta uma pesada carga semântica, pois traz em
seu seio confusão, incerteza, desordem. Para Morin (2011, p. 5):

É complexo o que não pode se resumir numa palavra-chave, o que não pode ser
reduzido a uma lei nem a uma ideia simples. Em outros termos, o complexo não
pode resumir à palavra complexidade, referir-se a uma lei da complexidade, reduzir-
se à ideia de complexidade.
144

O pensamento complexo para trabalhar o conhecimento científico aspira ao


conhecimento multidimensional e implica o reconhecimento de um princípio de incompletude
e de incerteza. Dessa forma, conclui-se que os desafios de ensinar não se referem apenas a
Química, esses desafios são sociais e culturais associados ao currículo como um todo.
Especificamente, no que se refere à ciência Química, por exemplo, há uma acentuada marca
empírico-positivista, as inúmeras dificuldades de trabalho com a abstração, a permanência de
uma visão cientificista e a mitificação da prática real da produção do conhecimento científico.
Essas questões, contudo, não se desvinculam da problemática mais ampla referente ao saber
pedagógico de conteúdo químico. Por isso, entendo com Lopes (2007), serem necessários
processos de transformação que atinjam não apenas o conhecimento escolar químico na forma
do saber pedagógico de conteúdo químico, mas também as práticas curriculares e científicas.
Pode-se observar com os episódios de aulas das professoras colaboradoras que a
linguagem se torna fundamental, pois tanto ela pode ser instrumento para a discussão racional
de conceitos altamente matematizados, como pode veicular metáforas realistas, pretensamente
didáticas, que obstaculizam o conhecimento científico.
Compreendo que não será mantendo o educando preso ao conhecimento aparente do
cotidiano, ao realismo das primeiras interpretações, que será possível ensinar Química.
Defendo ser importante o duplo e desafiador trabalho de valorizar os conhecimentos prévios
do estudante e questioná-los, desconstruindo, dessa forma, os obstáculos epistemológicos, que
impedem o aprendizado.
Chegando ao final e, ao mesmo tempo, ao início de uma nova jornada acadêmica,
apresento a seguir o fechamento deste texto de tese, expressando considerações provisórias
acerca da pesquisa realizada.
145

CONSIDERAÇÕES PROVISÓRIAS

É pensando criticamente a prática de hoje ou de ontem é que se pode melhorar a


próxima prática (Paulo Freire).

Nesta última parte da tese, ao invés de chamar de considerações ou apontamentos


finais e/ou conclusivos, chamo de considerações provisórias, pois compreendo com Barth
(1993) que o saber é sempre provisório, não tem fim. O saber não é linear, não se constrói
como um prédio, em que se deve, necessariamente, começar pela base e acabar pelo teto. O
saber elabora-se segundo uma ordem pessoal e segundo a experiência de cada um. Nesses
termos é que compreendo a realidade investigada de saberes químicos das professoras
colaboradoras e sentida nos vários momentos de interação pessoal e social estabelecidos no
percurso investigativo. Quero, com isso, expressar, que a realidade que aqui foi observada
existe no tempo, como uma paragem, uma etapa e que as considerações tecidas são para esse
determinado tempo. Todavia, essa realidade de formação e desenvolvimento profissional pode
se modificar, pois a formação, seja inicial ou continuada, está em constante transformação, em
perpétuo movimento, tal como uma sinfonia inacabada.
Na tessitura do enredo desta tese eu fui fazendo reflexões do processo formativo
inicial de professores de Química na UFMT, sobre as bases de conhecimentos necessários
para a atuação profissional, das trajetórias de formação inicial e continuada das professoras
colaboradoras desta pesquisa, até chegar ao contexto da prática dessas professoras. Já para
essas considerações, farei o inverso. Começarei com as reflexões do contexto da prática aos
processos formativos.
Os momentos das entrevistas e da realização do grupo focal foram momentos de
grande importância, pois juntamente com as professoras colaboradoras tive boas interações e
paramos em um momento para nos (auto) avaliar e refletir sobre o que estamos fazendo em
nossas práticas no dia a dia. No primeiro momento, podíamos até não ter dado conta das
visões pedagógicas distorcidas, dos obstáculos epistemológicos ao trabalhar com os conceitos
químicos, mas tínhamos a sensação de que algo não estava bem.
A necessária renovação do Ensino de Ciências, documentada por pesquisadores, em
trabalhos de mestrados e doutorados, serve como um emblema de alerta de que algo não está
no caminho correto, e o ensino de Química não é uma exceção, fortalecendo a grande
necessidade de transformar a educação que está posta. Dessa forma, de acordo com Soares
(2012), leituras negativas são inevitáveis, uma vez que elas, geralmente, servem para (auto)
146

justificar e para tirar de nossos ombros a culpabilidade. Mesmo que inconscientemente,


estamos, uma vez ou outra, lançando mão de uma leitura negativa, seja da falta, da carência,
da ausência, da inexistência, ou da impossibilidade.
Dentre as várias possibilidades de leituras da realidade, justifico e sou até capaz de
manifestar desejo de continuar na chamada zona de conforto, lendo e discursando sobre o
cotidiano, sem nenhuma perspectiva de consciência crítica. Nesta perspectiva, que pode se
reproduzir no coletivo, somos frutos do conformismo e do condicionamento muito distante do
que diz Freire (2013) com a pedagogia da autonomia.
Autores como Lopes (2007) dedicaram estudos sobre os obstáculos epistemológicos
em livros didáticos de Química, baseados na epistemologia de Bachelard, que são entendidos
como entraves à aprendizagem dos estudantes. Essa pesquisadora procurou identificar a
existência desses obstáculos nos livros didáticos de Química. Contudo, no desenvolvimento
desse trabalho de tese identifico nas narrativas das colaboradoras, obstáculos epistemológicos
subjacentes em seus discursos na mediação didática dos conceitos de modelos atômicos e
ácidos e bases de Arrhenius. Como se trata de uma análise complexa, as professoras talvez
possam estar reproduzindo obstáculos epistemológicos expressos nos livros didáticos, tendo
em vista, que o livro didático é um instrumento configurador da prática pedagógica dessas
professoras, evidenciando, assim, a necessidade de uma reflexão e vigilância epistemológica
ao se trabalhar com os conceitos químicos.
Pesquisas na área de Educação Química já apontam que não se trata somente em
modernizar o livro didático, mas de promover uma reforma criteriosa em seu conteúdo e nas
ementas dos cursos, do nível médio ao Ensino Superior. Dessa forma, vigilância
epistemológica por parte dos professores de Química se faz urgente e necessária ao selecionar
livros didáticos e trabalhar com os conceitos de Química para evitar supostos obstáculos
epistemológicos no processo de ensino-aprendizagem de Química.
Nos episódios de aulas do Ensino Médio de nossas colaboradoras, a falta de reflexão
epistemológica ao trabalhar com os conceitos que foram propostos evidencia o retrato de um
ensino com as seguintes dimensões: descontextualizado, aproblemático, ahistórico,
acumulativo, que para Gil-Pérez et al. (2005) são concepções docentes sobre a natureza da
ciência e construção do conhecimento científico, fruto do senso comum devido à falta de
reflexão crítica e a uma educação científica que se limita, a uma simples transmissão de
conhecimentos já elaborados.
No contexto da prática profissional das colaboradoras ficou evidente, também, a
presença de divergentes orientações didáticas resultantes de diferentes concepções de
147

educação escolar, que permeiam o pensamento dessas professoras. Tal fato mostra um
indicativo de que essas colaboradoras precisam aprofundar suas reflexões sobre a visão do
processo de ensino-aprendizagem em Química, bem como suas crenças e suas concepções.
Assim, compreendo que a racionalidade técnica está subjacente à formação e à docência
dessas professoras, em relação aos aspectos teórico-metodológicos de formação e, por
conseguinte de desenvolvimento profissional pautado no enfoque que se pode denominar
como híbrido, de caráter da transmissão cultural dos conteúdos ao construtivismo.
Parto da premissa de que a prática pedagógica das professoras colaboradoras, por elas
relatadas no processo investigativo desta pesquisa, proporcionada por uma pesquisa
formalizada é capaz de revelar não apenas as necessidades formativas, relacionais e
profissionais, mas também e, principalmente, os limites e desafios que a universidade enfrenta
para formar e capacitar professores para lidarem com o cotidiano escolar.
As professoras colaboradoras desta pesquisa, assim como eu, que tive oportunidade de
trabalhar com elas, como professor formador e pesquisador, passamos por uma época de
formação docente de transição entre o paradigma da ciência moderna marcada fortemente
pelo positivismo para uma época, em que Santos (1989) denomina de paradigma da ciência
pós-moderna. Essa transição paradigmática para o referido autor, com a qual concordo,
consiste em um ambiente de incerteza, de complexidade e de caos, repercutindo nas estruturas
e nas práticas sociais, nas ideologias, nas instituições, na vida vivida e na personalidade.
Quero com isso expressar que compreendo não haver vítimas e culpados nesse
processo de formação, mas frutos de uma formação marcada pela racionalidade técnica, em
que é valorizado o conhecimento teórico da área específica, sem levar em consideração as
reflexões filosóficas e epistemológicas do processo de formação e da construção do
conhecimento científico, aqui nesse caso, o conhecimento químico.
E o PIBID? No que contribuiu na formação das professoras colaboradoras e está
contribuindo na formação de novos licenciandos? Vários benefícios podem ser observados a
partir da implementação do PIBID na UFMT, dentre os quais expresso a inserção dos
egressos do PIBID em programas de pós-graduação e no exercício da profissão docente e a
visível melhora na autoestima dos licenciandos da UFMT como futuros professores do Ensino
Médio, o que demonstra o potencial de tal iniciativa para o desenvolvimento das licenciaturas,
pois foi criado um clima de valorização dos estudantes de licenciatura e, muitas vezes, são
considerados como o PIBIC das licenciaturas.
No caso específico de nossas colaboradoras terem participado do PIBID foi
essencial, pois as professoras narram que esse programa lhes proporcionou pertencimento
148

como professoras, uma vez que na época, em que elas entravam em sala de aula como
pibidianas eram chamadas de “professoras” por estudantes do Ensino Médio e ficavam todas
felizes. E por meio das atividades desse programa, duas professoras, Curie e Mayer tiveram
possibilidades de ingressar na Pós-Graduação na UFMT em Educação em Ciências sendo
Curie no Mestrado acadêmico e Mayer no Mestrado Profissional.
E o que se pode fazer para mudar esse quadro de formação inicial e continuada de
professores de Química na UFMT? Com o trabalho que foi desenvolvido é possível tecer
alguns indicativos de possibilidades para mudança dessa realidade de formação, e eu terei o
compromisso político e ético de fazer esses indicativos ecoarem no colegiado de curso de
Licenciatura em Química e Departamento de Química da UFMT para juntos, no coletivo de
professores, as forças serem reunidas para mudar essa realidade. Pois o trabalho em equipe na
educação se revela importante, porque quando as decisões são tomadas em conjunto,
desfavorece, de certa forma, as resistências às mudanças e todos passam a ser corresponsáveis
e copartícipes no processo de formação.
Ao tecer considerações sobre a formação de professores de Química não só da UFMT,
mas em nível nacional, é fundamental não esquecer as reais condições da educação brasileira,
pois são vários os fatores externos ao processo pedagógico, que vem prejudicando a formação
inicial e continuada de professores do país, a exemplo do aviltamento salarial dos professores
e precariedade da infraestrutura escolar em várias escolas (MALDANER, 2006).
No que se refere aos modelos de formação docente, a grande maioria dos cursos de
Licenciatura em Química do Brasil não superaram o modelo chamado 3+1, portanto, percebe-
se que esse problema não é somente local da UFMT, mas um problema de âmbito nacional.
Pois vários pesquisadores da área de Educação Química como (ZUCCO, 1999; MALDANER,
2006; CHASSOT, 2014) apontavam a relevância da prática pedagógica na formação inicial de
professores de Química mostrando que uma das principais críticas ao currículo dos cursos de
Licenciatura em Química era frouxa articulação entre conhecimentos específicos e os
conhecimentos pedagógicos, bem como a universidade e escola da Educação Básica.
Na seção III da presente tese, apresentei o contexto de formação do curso de
Licenciatura em Química56 da estrutura curricular que ficou vigente de 1997/1 a 2009/2, do
qual eu e as colaboradoras desta pesquisa fomos licenciados, e foi mencionado que a
racionalidade técnica está subjacente à formação das colaboradoras dessa pesquisa, e uma

56
Atualmente a UFMT oferta o curso de Licenciatura em Química em três campi, a saber: Barra do Garças,
Cuiabá e Sinop. Toda a consideração mencionada do curso de Licenciatura em Química nesta seção trata-se do
campus de Cuiabá.
149

primeira proposta como professor formador e pesquisador da área de Educação em Ciências e


Química que eu poderia delinear é o rompimento com essa estrutura curricular de formação,
contudo, isso já se efetivou no ano de 2009 com a reestruturação curricular do curso, que
entrou em vigência em 2010/1. Efetivou-se no contexto curricular, pois no contexto da prática
a formação do curso continua nos moldes do formato 3+1.
Vale destacar que desde a instituição pelo Conselho Nacional de Educação (CNE)
das Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN) para a Formação de Professores da Educação
Básica, em nível superior, curso de licenciatura, de graduação plena, promulgado em
fevereiro de 2002, que o curso de Licenciatura em Química da UFMT discutia com a
comunidade acadêmica (professores, técnicos e alunos) a reestruturação curricular do curso,
mas nunca entravam em um consenso na reestruturação em virtude das Práticas como
Componente Curricular (PCC), bem como, em desencontro de opiniões sobre as 400 horas de
estágio supervisionado. E romper com o modelo de formação 3+1, não foi (e posso afirmar
como professor formador desse curso que até nos dias atuais não está sendo) fácil.
Um fato que ilustra bem isso foi a reestruturação curricular do curso ter sido
adequada às novas DCN somente após sete anos de sua promulgação, quando em janeiro de
2009 o curso de Licenciatura em Química recebeu diligência do MEC instaurada no processo
de “Renovação de Reconhecimento”. Contudo, no ano de 2015 o curso de Licenciatura em
Química foi laureado com o conceito de excelência com a nota cinco (5,0) no indicador de
qualidade que avalia os cursos superiores via o Conceito Preliminar de Curso (CPC) proposto
pelo INEP, pela participação dos nossos egressos no Exame Nacional de Desempenho de
Estudantes (ENADE) no ano letivo de 2014. Esse indicativo evidencia que o saber científico
está bem consolidado, mas eu me pergunto: e o saber pedagógico de conteúdo? E as reflexões
epistemológicas da construção dos conceitos químicos?
Na nova estrutura curricular do curso de Licenciatura em Química foi idealizado o
contato com a prática docente desde os primeiros momentos do curso de formação, pois
partiram da compreensão da importância de todas as disciplinas terem vínculo com a
educação, pois ao mesmo tempo, em que contribuem para a formação relativa ao
conhecimento químico, terão seu foco em como esse conhecimento químico entra, interage e
funciona na escola fundamental e média e em situações de educação não escolar. Em outros
termos, as disciplinas de Instrumentação para o Ensino de Química (Prática de Ensino) e
Estágio Supervisionado, assim como a Didática, não podem ser isoladamente
responsabilizadas pela qualificação profissional do licenciando em Química. Dessa forma,
viu-se que certa quantidade de horas de PCC é destinada às disciplinas de Química Inorgânica
150

I, Química Orgânica I, Química Analítica Qualitativa, Bioquímica I, Toxicologia e Físico-


Química IV.
No entanto, no período dos anos de novembro de 2012 a novembro de 2014 tive a
oportunidade de exercer a função de coordenador de ensino de graduação e foi possível
constatar, com base nos planejamentos de ensinos dessas disciplinas e relatos dos estudantes
de licenciatura, que as horas destinadas as PCC dentro das disciplinas de Química Inorgânica
I, Orgânica I, Analítica Qualitativa, Toxocologia e Físico-Química IV são ocupadas com
atividades experimentais de laboratório ou complementação do componente teórico da
disciplina e não se efetivavam da forma que eram para serem trabalhadas, sendo a mediação
dos saberes científicos aos saberes pedagógicos de conteúdo, com uma devida reflexão
epistemológica da construção dos conhecimentos químicos, pois os professores dessas
disciplinas de referência da Química não possuem nenhuma formação pedagógica e conhecem
a realidade da Educação Básica só de forma ambiental.
Neste viés, parece-me urgente a necessidade de serem desenvolvidas ações e
programas de formação continuada de formadores, com a presença conjunta de professores
universitários de Química e que atuam em cursos de licenciatura e a de pesquisadores da área
de Educação Química. Uma formação continuada de professores das disciplinas de Química
de referência, que atuam no curso de licenciatura, com interação direta com os professores da
área de ensino se faz necessário e urgente para introduzir os nossos colegas químicos na
investigação do/no Ensino de Química e auxiliando-os em proposições de melhorias à
formação e atuação docente.
Na UFMT, por exemplo, no campus de Cuiabá nos anos de 2012 a 2016 entraram via
concurso público cerca de quinze novos doutores em Química nas mais diferentes áreas
(Analítica, Bioquímica, Inorgânica, Físico-Química e Orgânica), para atuarem diretamente em
cursos de Licenciatura e Bacharelado em Química. São professores jovens, cheios de vida e,
principalmente, ansiosos por desenvolver carreira acadêmica. Esses professores realizaram
seus Mestrados e Doutorados em grandes universidades brasileiras, tornaram-se grandes
estudiosos em investigações químicas tão específicas que se distanciaram, sobremaneira, após
seus anos na Pós-Graduação, de preocupações com questões epistemológicas e pedagógicas
relacionadas à formação de professores de Química, quando não, nunca tiveram experiências
como professores de Química na Educação Básica e hoje estão assumindo disciplinas para
trabalhar em curso de formação de professores de Química para a Educação Básica.
Esses professores doutores novos que ingressaram na UFMT e os professores
doutores que já faziam parte do quadro docente do curso de Licenciatura em Química
151

precisam se constituir como formadores, devido à própria função social para qual foram
aprovados em concurso público na universidade. A necessidade de ações e programas de
formação continuada de formadores de Química, na visão de Schnetzler (2010) precisa ser
uma tarefa política assumida pela Sociedade Brasileira de Química, com a participação e
contribuição dos membros da sua Divisão de Ensino.
Reforço que é importante que a discussão sobre formação docente não fique restrita
aos pequenos círculos dos professores da área de Educação Química, mas que sejam
incorporadas as discussões mais amplas que acontecem em todas as áreas da Química dentro
do Departamento de Química da UFMT.
No ano de 2016, o curso de Licenciatura em Química está em um processo de novas
discussões para o que estão chamando de “Adequações Curriculares” que prevê adequação na
estrutura curricular do curso para atender as novas DCN57 para a formação inicial em nível
superior (cursos de licenciatura, cursos de formação pedagógica para graduados e cursos de
segunda licenciatura) que foi promulgada em julho de 2015, e para atender a Base Nacional
Comum Curricular, e as divergências das horas de PCC que não são trabalhadas no curso.
O resultado do trabalho desta pesquisa de doutoramento chega em uma hora
oportuna, em que discussões e reflexões estão fazendo parte do contexto de formação de
professores de Química da UFMT, pois este trabalho de tese faz refletir que discutir formação
de professores é uma tarefa que vai além da modificação da organização curricular no
esquema 3+1, com a introdução de disciplinas pedagógicas logo no começo do curso de
formação, porque isso, por si só, não romperá com a visão simplista do ato de ensinar e com o
racionalismo técnico que caracteriza grande parte da formação dos docentes. Compreende-se
que é preciso discutir e modificar, também, o conteúdo dos conhecimentos químicos
incorporando nesse currículo, estudos sobre a profissionalização do trabalho docente, a
natureza do conhecimento científico, o papel da experimentação no ensino de Ciências, o
papel da ciência e da educação científica na sociedade, em ter a pesquisa como eixo
articulador da formação e da prática, os fundamentos da elaboração curricular, uma
reorientação epistemológica da Educação em Química. Maldaner (2006) diz que essas
questões já fazem parte das pesquisas acadêmicas há mais de vinte anos, entretanto, não
foram até hoje incorporadas ao cotidiano da formação docente.

57
Resolução CNE/CP nº 2/2015. O artigo 22 da referida Resolução expressa que “os cursos de formação de
professores que se encontram em funcionamento deverão se adaptar a esta Resolução no prazo de dois anos, a
contar da data de sua publicação”. Essa Resolução considera que deve constar a articulação entre a graduação e
pós-graduação e entre pesquisa e extensão como princípio pedagógico essencial ao exercício e aprimoramento
do profissional do magistério e da sua prática educativa.
152

Vários outros aspectos podem e necessitam ser considerados na formação do


professor de Química. Os conhecimentos apontados por Shulman (1986) como necessários à
formação do professor são um exemplo do esforço intelectual que o docente tem de fazer na
compreensão de um corpo de conhecimentos necessários à prática pedagógica. Entendo que
esses conhecimentos têm de ser abordados na formação inicial. Por isso, o rompimento com o
modelo de formação que prioriza a teoria em detrimento da prática não pode significar um
currículo de supervalorização da prática em detrimento da formação teórica, mas sim uma
abordagem dialética desses modelos na formação do profissional.
Essa dialética entre os modelos se faz necessário, pois concordo com Maldaner
(2006) que a prática atual de formação inicial mais frequente de professores é a separação da
formação profissional específica da formação em conteúdo, que cria uma sensação de vazio
na mente do professor, pois é diferente saber conteúdos de Química, por exemplo, em um
contexto de Química, de sabê-los, em um contexto de mediação pedagógica dentro do
conhecimento químico.
Outro indicativo que este trabalho de pesquisa deixa é a possibilidade de criação de
um Núcleo de Pesquisa unindo Formação Inicial e Continuada de Professores de Química
junto ao LabPEQ/UFMT. A proposta de formação desse Núcleo até quatro anos atrás em
2012, por exemplo, era impossível, pois só havia um docente com nível de doutor no quadro
de professores da área de Educação Química e nos dias atuais já temos quatro professores
com nível doutoral. A ideia que fundamenta o Núcleo é a de promover interações
comunicativas tendo a prática pedagógica como objeto de estudo. Fomentar uma nova cultura
escolar com base na problematização da prática educativa será um grande desafio necessário
para a formação inicial e continuada dos professores de Química que atuam na Educação
Básica, pois concorre com o peso da mesmice cotidiana das escolas pobres em discussões
teóricas, e com a visão da racionalidade técnica que formou a todos nós, estudantes,
professores formadores e licenciados, e que está impregnada no tecido das instituições
escolares em todos os níveis.
Diante das narrativas das professoras colaboradoras expressas nos textos de pesquisa,
e o contexto de formação e construção do conhecimento científico expressos nesta pesquisa,
que defendo a tese de que a base de saberes científicos e pedagógicos de conteúdo
necessários ao ensino de Química pode ser catalizada na formação inicial, pela
participação em projetos de iniciação à docência no ambiente escolar desde o início do
curso, o que potencializa a produção de saberes sobre a docência e práticas pedagógicas
diferenciadas com vistas à educação para a cidadania.
153

Tratam-se de saberes que são elaborados pelo educador químico na escola média, que
possibilitam a compreensão de seus educandos do real significado da Química no cotidiano da
sociedade contemporânea. Para tanto, se faz necessária uma vigilância epistemológica para
tratar os saberes científicos na Educação Básica e na Educação Superior, tanto no contexto da
formação inicial, quanto no contexto da prática profissional, para constituir o entrelaçamento
necessário entre os saberes científicos e pedagógicos de conteúdo, proporcionando a ruptura
necessária entre o saber comum e o saber científico.
Nessa perspectiva, um dos principais pilares para a formação inicial e continuada de
professores, de acordo com Delors (1998), é aprender a conhecer, que é o prazer de
compreender, descobrir, construir e reconstruir o conhecimento, curiosidade, autonomia,
atenção. Delors diz que é inútil tentar conhecer tudo e isso supõe uma cultura geral, o que não
prejudica o domínio de certos assuntos especializados. Aprender a conhecer é mais do que
aprender a aprender. Aprender mais linguagens e metodologias do que conteúdos, pois estes
envelhecem rapidamente. Não basta aprender a conhecer. É preciso aprender a pensar, a
pensar a realidade e não apenas pensar pensamentos, pensar o já dito, o já feito, reproduzir o
pensamento. É preciso pensar também o novo, reinventar o pensar, pensar e reinventar o
futuro analisando e explorando possibilidades.
Percebe-se que a complexidade de ser professor não está somente em ser professor
de Química, mas sim em ser profissional-pessoa e ter a sensibilidade de perceber que o ser
humano está inserido em um mundo complexo, em que a cultura, a razão, o afeto e a vida em
sociedade podem conduzir os diversos caminhos da existência.
Dessa forma, percebo-me no mundo em processo ou no processo. Esta foi, talvez, a
maior recompensa teórica, afetiva, pessoal e profissional adquirida na realização desta minha
passagem na pós-graduação.
Concluo evidenciando a provisoriedade e a continuidade dos processos formativos,
uma vez que a nossa história e formação prossegue, e o crescimento é constante no contínuo
experiencial. Tenho, por otimismo e confiança, que minha história nesta caminhada
acadêmica ainda está longe do fim, pois as opções do meu caminhar acontecem em plenos
processos dialéticos que trarão e levarão pessoas, acrescentando e transformando as
certezas/incertezas que hoje carrego comigo.
154

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