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―Deus nunca foi visto por alguém. O Filho unigênito, que está no seio do Pai, esse o
revelou‖ (ACF)
―Nenhum homem jamais viu a Deus, o deus unigênito, que está [na posição] junto ao seio
do Pai, é quem o tem explicado‖ (TNM)
―Ninguém jamais viu a Deus: O Filho Unigênito que está no seio do Pai, este o deu a
conhecer‖ (BJ)
―Ninguém nunca viu a Deus. Somente o Filho único, que é Deus e está ao lado do Pai, foi
quem nos mostrou‖ (NTHL)
―Ninguém jamais viu a Deus; o Deus unigênito, que está no seio do Pai, é quem o
revelou‖ (ARA)
―Ninguém jamais viu a Deus, mas o Deus Unigênito, que está junto do Pai, o tornou
conhecido‖ (NVI)
―A Dios nadie Le vio jamás; el unigênito Hijo, que está em el seno del Padre, el Le há
dado a conocer‖ (ACR)
―Dios nadie lo ha visto nunca; el Hijo unigénito, que es Dios y que vive en unión íntima
con el Padre, nos lo ha dado a conocer‖ (NVI)
―No man hath seen God at any time; the only begotten Son, which is in the bosom of the
Father, he hath declared him‖ (KJV)
―No one has ever seen God, but God the One and Only, who is at the Father's side, has
made him known‖ (NIV)
―No one has ever seen God. The only Son, God, who is at the Father's side, has revealed
him‖ (NAB)
―No one has ever seen God. The only one, himself God, who is in the presence of the
Father, has made God known‖ (NET)
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Muito embora sejam cinco as leituras variantes, normalmente tomam-se apenas como
duas opções de fato: as duas primeiras testemunham a mesma leitura enquanto a quarta e a
quinta são tão improváveis (do ponto de vista das evidências externas) que quase não são
consideradas. Sobre isso iremos falar mais adiante. Por ora, vamos conhecer melhor as
leituras disponíveis e os documentos que trazem tais leituras.
1
Exceto se você for defensor do TR (Filho unigênito) ou da TNM (deus unigênito), pois para ambos as
decisões já estão tomadas e consideradas como certas, mesmo que cada um esteja em um dos lados desse
dilema (alguém continua errado).
2
WRITE, Brian, Jesus as Theós (God): A textual examinaition. (Bible.org).
3
Exceto para a Cristologia Testemunha de Jeová, que se desfaz caso a leitura “monogenes theós” seja
verdadeira.
4
VINCENT, Martin, Vincent`s Word Studies. Vol.2 (Quickverse).
5
HARIS, W.H., Prologue (John 1.1-18). (Bible.org)
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6
À esquerda, Codex Sinaítico do site Bible Researcher, por Michael Marlowe: Only Begoten Son or God?; à
direita, Codex Washingtonensis adaptado de The Center for Study of New Testament Manuscript. Para ver o
original, clique aqui.
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Informações retiradas do site www.laparola.net.
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Posições Conhecidas
Velha Ortodoxia
Nesse artigo, passo a chamar Velha Ortodoxia o posicionamento de cristãos
ortodoxos que defendem o Texto Recebido (TR). Chamo velho não por estarem
desatualizados, nem por representarem uma determinada faixa etária, mas por se tratar de
um grupo que tem perdido sua expressão com o avanço do Texto Crítico. Os defensores do
TR são certamente cristãos genuínos que por zelo (eventualmente exagerado) tendem a
considerar a influencia Alexandrina no texto do NT como fermento e corrupção. E,
portanto, entendem toda aproximação dos textos alexandrinos como perversão da verdade8.
Para esse grupo a leitura “Deus unigênito” é uma perversão. Wilburn Pickering, que
escreveu um excelente livro sobre crítica textual9, defende essa posição. Segundo ele,
nesse texto uma anomalia séria é introduzida, pois “Deus como Deus, não é gerado”.
Sobre o assunto ele diz:
“‘Um deus unigênito‘ é tão deliciosamente gnóstico que a origem egípcia aparente desta
leitura a faz duplamente suspeita. Também seria possível traduzir a segunda leitura como
―unigênito deus!‖, enfatizando a qualidade [de ser Divino], e isto tem atraído muitos que
aí vêem uma forte afirmação da divindade de Cristo. No entanto, se Cristo recebeu Sua
―Divindade‖ através do processo de geração, então não pode ser a eternamente
preexistente Segunda Pessoa da Trindade. Também ―unigênito‖ não é análogo a
―primogênito‖, que se refere à prioridade de posição — isto poria o Filho acima do Pai.
Não importa como a encaremos, a redação da UBS introduz uma anomalia séria10”
Em outras palavras, o que Pickering quer dizer com isso é que, a anomalia produzida
acresce uma pessoa à Trindade, pois se o texto diz “Deus unigênito” não pode fazer
referência a Jesus Cristo. Mas, o que me chama mais a atenção é que para ele, tal variante é
deliciosamente gnóstica. Com isso, estamos falando de um copista alterando o texto para
apoiar suas próprias convicções e com isso defendendo uma opinião gnóstica.
É interessante que para Pickering, o conceito de “monogenes” tem que significa mais
que apenas monos, e com isso ele não acredita que os usos do NT justifiquem a tradução
“único” para o termo grego. Com isso, entendemos que ele apóia o entendimento de
8
Para ver como um cristão da Velha Ortodoxia se posiciona ante ao dilema de Jo.1.18, leia o artigo: Quem
está mentindo em Jo.1.18?. Para ler meu posicionamento sobre esse artigo, leia: Xiitismo Textual.
9
Seu livro pode ser baixado gratuitamente na internet: Clique aqui.
10
PICKERING, Wilbur, Qual é o texto do Novo Testamento. Pp.209.
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geração em “monogenes”. Por isso, não é de se espantar que ele considere a leitura da NIV
(God the One and Only) como uma “fraude piedosa”.
Como nota-se, para a Velha Ortodoxia, as evidências são claras e em maior peso: A
leitura Filho Unigênito é a original, enquanto, “Deus Unigênito” é uma alteração
possivelmente gnóstica. Sem contar que, no que se refere a quantidade de evidência (que
para eles é fundamental) há incomparável vantagem.
Também devemos atentar para o lembrete de Scrivener sobre esse texto: “Aqueles
que irão recorrer exclusivamente a evidências antigas para a recensão do texto,
provavelmente ficarão perplexos lidando com essa passagem. Os mais velhos manuscritos,
versões e escritores estão desesperadamente divididos11”. Essa consideração é importante
especialmente para aqueles que consideram a data como fator predominante para a tomada
de decisão.
Nova Escola
A Nova Escola é o nome normalmente atribuído ao movimento teológico não
necessariamente cristão. Liberais, agnósticos e ateus podem defender suas “novas” idéias
de “releitura” das escrituras do ponto de vista histórico. Trata-se de Teologia, pois no
estudo ainda fala-se sobre Deus, entretanto Ele não é o foco nesse estudo. Entre esses, Bart
Ehrman tem-se mostrado influente. Em seu livro The Orthodox Corruption of the
Scripture, Ehrman se propõe a demonstrar como os ortodoxos do passado alteraram o NT
para que ele defendesse o que eles entendiam por ortodoxia.
Para ele, Jo.1.18 é um claro exemplo disso: Os cristãos ortodoxos alteraram a
leitura original “Filho Unigênito” para defender a divindade do Logos. Nas palavras
de Ehrman:
“A leitura variante da tradição Alexandrina, que substitui ‗Filho‘ por ‗Deus‘, representa
uma corrupção ortodoxa, onde a completa divindade do Filho é afirmada: O único Deus
que está no seio de Deus, esse o fez conhecido12”
11
Scrivener, Introduction to the Criticism of the New Testament. pp.525. IN: ROBERTSON, A.T., Word
Pictures in the New Testament. (Quickverse).
12
EHRMAN, Bart, Orthodox Corruption of the Scripture. pp.78
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com ela nesse verso, pois ambos suportam que “Filho unigênito” é a leitura original. O que
me fascina é que a razão pela qual ele opta por essa leitura: A defesa da divindade de
Cristo. Como agnóstico, Ehrman não tem qualquer compromisso em defender a Fé
Ortodoxa, e por isso supõe que uma declaração tão estampada da divindade de Cristo só
pode ser uma fraude.
Do ponto de vista das evidências externas, Ehrman reconhece que os críticos
normalmente tem suas preferência pelos leitura Alexandrina nesse texto, até por que os
principais unciais ( א, B, C) e os mais antigos documentos (P66 e P75) favorecem essa
leitura. Entretanto, para ele, nesse caso seria um erro entender que as evidências externas
como obrigatórias.
Do ponto das evidências internas, ele chega a dizer:
―O problema mais comum para aqueles que optam por [oJ] μονογενής θεός, mas que
reconhecem que isso deve ser traduzido como ‗o único Deus‘, é que isso é virtualmente
impossível no contexto joanino, é como se entendesse o adjetivo substantivamente, e
construir a segunda parte intera de João 1.18 como uma série de aposições13‖
Ortodoxia Eclético-Racional
No que se refere ao cristicismo no NT, há uma escola chamado ecleticismo racional,
que defende que cada caso é um caso a ser analisado individualmente. Esse modelo de
crítica textual é normalmente favorável às variantes alexandrinas, por sua antiguidade e
qualidade do material. Entre esses, existem os cristão verdadeiros que adotam esse modo
de crítica e defendem suas posições com a preocupação de compreender a fé (com menos
exagero que a Velha Ortodoxia).
Esses, em oposição à Velha Ortodoxia e à Nova Escola, defendem que a leitura
“Deus Unigênito” é a leitura original e que, como essa expressão não acontece em nenhum
13
Idem, pp.81.
14
Idem, Ibid.
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lugar no NT foi harmonizada com tantas outras que trazem “Filho Unigênito” (Jo.3.16, 18;
1Jo.4.19). Nesse caso, tanto a leitura original (Deus) como a variante (Filho) teria sido
produzida por cristãos.
A.T. Robertson defende essa opinião:
Entretanto, o modo como se traduz o texto com essa variante é foco de constante
ataque. Tanto Ehrman, quanto Pickering tem suas opiniões sobre a impossibilidade de que
a fraseologia “μονογενής θεός” seja de fato joanina. Ou seja, os que adotam essa leitura
ainda têm apresentar de modo claro e convincente sua defesa gramatical para que essa
leitura possa ser aceita. Para quem está nessa posição, tem obrigação dobrada: além do
dilema textual, tem que entrar em um debate gramatical.
* * *
O que se pode dizer até aqui é que, independente da leitura adotada, teólogos liberais,
agnósticos e cristãos tem sua opinião sobre o que aconteceu com o texto. Mais interessante
do que isso é os motivos estampados na defesa da Velha Ortodoxia e da Nova Escola são
antagônicos: o primeiro rejeita a leitura com “θεός” por que é uma corrupção
aparentemente gnóstica, enquanto o segundo a rejeita por ser uma leitura muito ortodoxa.
A verdade é que o consenso nesse texto é: esse é um dilema de difícil resolução.
Por essa razão, vamos observar as evidências para considerar qual das opiniões
supracitadas parece mais adequada.
Evidências Externas
A análise da evidência externa nesse tem diversos dilemas, e à medida que
15
ROBERTSON, A.T., Word Pictures in the New Testament. (Quickverse).
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DATA
No que se refere a data das leituras variantes, as diferentes escolas tem apresentado
sua opinião. Alguns ortodoxos ecleticistas têm suas preferências para a leitura com θεὸς
em função da descoberta de dois papiros do segundo século que trazem essa leitura. Bruce
Metzger defende essa opinião: “Com a aquisição de P66 [≈200 d.C] e P75 [início do
terceiro século], ambos leem θεός , o suporte externo a essa leitura foi notavelmente
fortalecida16”. Kostenberger and Swain demonstram mesma opinião: “Com a aquisição de
P66 e P75, em que ambas lêem μονογενὴς θεὸς, a preponderancia da evidência agora nos
leva em direção da última leitura [μονογενὴς θεὸς] 17”.
Entretanto, Pickering defende P75 tem uma leitura conflada18. A leitura que P75 traz
é “ὁ μονογενὴς θεὸς” e Pickering entende que ela é resultado da leitura das outras duas
leituras possíveis para o texto: “μονογενὴς θεὸς” e “ὁ μονογενὴς υἱὸς”. Em outras palavras,
como “μονογενὴς” é um adjetivo (para ele) e não é modificado por artigo, algum copista
deve ter adaptado a leitura das duas leituras para produzir a leitura de P75. Se Pickering
está certo, ambas as leituras são atestadas com mesma antiguidade.
Já Ehrman entende que P66 e P75 não são tão significativos para a crítica textual
nesse verso. Segundo ele, a descoberta dessas duas testemunhas fez pouco para a
consideração das evidências documentais, e não fez “nada para alterar o quadro19” da
crítica nesse verso, pois eles acabaram por demonstrar algo que já era conhecido pelos
críticos: documentos do segundo (Diatessaron), ou terceiro século (Orígenes, Versões
Copta Boárica) já traziam essa leitura.
Essa argumentação em favor da antiguidade da data de ambas as leituras é percebida
pelas citações dos pais da Igreja: Herácleto, Ptolomeu, Irineu, Clemente e Orígenes já no
segundo e terceiro século usavam a leitura com “Deus”; enquanto Teódoto, Tertuliano,
Hipólito, Irineu, Clemente e Orígenes citavam a leitura com “Filho”. O fato de que o
mesmo Pai da Igreja tenha citado as duas possibilidades nos faz pensar no contexto em que
teriam usado, ou qual das leituras teriam apoiado. Porém, neste, ressaltaremos apenas o
16
METZGER, Bruce, A textual Commentary on the Greek New Testament. pp.198.
17
KOSTENBERGER, SWAIN, Father, Son and Spirit. pp.78 IN: WRITE, Brian, Jesus as Theós (God): A
textual examinaition. (Bible.org)
18
PICKERING, Wilbur, Qual o texto do Novo Testamento? pp.209.
19
EHRMAN, Bart, Orthodox Corruption of the Scripture. pp.79
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caráter cronológico das evidências. Ou seja, seja qual for a leitura que Irineu, Clemente ou
Orígenes tenham preferência, o fato é que ambas as leituras estavam disponíveis desde a
segunda metade do segundo século. Portanto, podemos dizer que, do ponto de vista da
idade da leitura, ambas parecem consistentemente conhecidas já no segundo século.
Contudo, temos que ter alguma reserva quanto a objeção de Ehrman sobre P66 e
P75. Muito embora outros cristãos ortodoxos concordem com ele (cf. Brian Write), em
termos de atestação documental, o P66 é o mais antigo manuscrito nessa disputa. Ainda
que os pais da igreja, nesse mesmo período, já conhecessem ambas as leituras, P66 acresce
valor documental à análise. Enquanto um pai da Igreja poderia aludir um texto, ou citá-lo
de memória e com isso apresentar um texto longe de sua forma original, ou até mesmo
disponível ao autor, um Papiro tem sua leitura claramente apresentada. Ou seja, para que
P66 não tenha valor nessa discussão tem que se assumir que P66 é uma fraude nesse verso,
o que não parece o caso (como demonstraremos com mais detalhes).
Ou seja, do ponto de vista documental, parece mais plausível que a leitura
predominantemente alexandrina, “μονογενὴς θεός”, seja a mais primitiva das leituras.
TIPO-TEXTO e GEOGRAFIA
Outro dilema para esse texto é que os defensores da leitura “ὁ μονογενὴς υἱὸς”
afirmam que a leitura com “θεός” não é consistente fora da tradição alexandrina. Pickering
defende que a leitura com “θεός” tem origem no Egito. Ehman defende que todas as
famílias de texto (Ocidental, Bizantina e Cesarena) estão coesas na defesa da leitura de
“Filho” enquanto a variante com “Deus” parece isolada na família alexandrina.
Sobre a tradição alexandrina nesse verso, não há dúvidas que o arquétipo textual é a
leitura com “θεός”, e não conheço alguém que ousasse discordar dessa opinião: Os mais
antigos papiros (P66 e P75) e o mais antigo uncial (B) suportam essa leitura. Entretanto, a
pergunta que cabe aqui é: Essa leitura é exclusivamente alexandrina?
Que a maioria dos manuscritos seguem a tradição bizantina, não há qualquer dúvida.
Que a leitura bizantina (Filho) é atestada com mais solidez nas diferentes famílias textuais,
também não há qualquer dúvida. A questão que precisa ser melhor analisada é a suposta
solidão alexandrina na defesa de “θεός”.
Um dos fatos que parecem ter sido ignorados por Ehrman e Pickering é que o Códice
Sinaítico traz a leitura com “θεός”. Em geral, o Sinaítico acompanha a leitura do Códice
Vaticano e de P75, e por isso é reconhecido como representante da tradição alexandrina.
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DEBATES TEOLÓGICOS
Alguns acreditam que a leitura “μονογενὴς θεός” teria surgido como uma reação
ortodoxa à teologia ariana. Entretanto, tal afirmação não faz o menor sentido, uma vez que,
segundo Epifânio, o próprio Ário teria usado essa passagem com essa leitura. Outro
detalhe importante é que Ário, como os Testemunha de Jeová, não tem o menor problema
em chamar o Logos de Deus. Em uma carta a Eusébio, bispo de Nicomédia, Ário escreveu:
“Mas, o que dizemos e pensamos? O que temos dito e ensinado? Que o Filho não é não-
gerado ou uma parte do Não-Gerado em nenhuma forma ou substrato, mas que pela
20
METZGER, Bruce, The Text of the New Testament. pp.46.
21
FEE, Gordon, Studies in the Theory and Method of New Testament Textual Criticism. pp.243
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vontade e conselho do Pai ele subsiste antes do tempo e das eras, cheio de graça e
verdade, Deus, o unigênito, imutável22”.
Outro fato que merece atenção, é que, para que essa acusação pudesse ser levada em
conta, dever-se-ia comprovar que essa leitura teria surgido no período da controvérsia
ariana, entretanto, já se demonstrou que ela é anterior. Isso, sem contar que, alterar o
prólogo do evangelho e permitir mais três outras citações da expressão “Filho unigênito”
na literatura joanina não faz o menor sentido. Caso um copista almejasse resolver a
controvérsia ariana alterando o texto do NT, ele teria feito um péssimo trabalho alterando
apenas uma ocorrência de quatro. Esse argumento não faz o menor sentido.
Há ainda, outro argumento para se rejeitar a leitura “μονογενὴς θεός”. Ehrman
argumenta que essa variante é fruto de uma alteração ortodoxa anti-adocionista. Uma vez
que para Ehrman a leitura com “Filho” lhe parece original, a explicação que ele oferece é
que um copista, visando defender a divindade de Cristo alterou o texto23. O conceito é o
mesmo que o anterior, entretanto, Ehrman é um pouco mais acurado cronologicamente. No
segundo século o ebionismo já era conhecido e combatido pelos Pais da Igreja. Tertuliano
e Orígenes já teriam escrito sobre eles no fim do segundo século início do terceiro.
Contudo, parece novamente improvável que um copista alterasse o texto justamente
essa parte do texto para promover a defesa da divindade de Cristo. Só nos primeiros
versos, o Logos já havia sido chamado de pré-existente, criador e Deus. Sem contar que
não existe qualquer conotação adocionista na nomenclatura de Filho do Logos. A questão
adocionista parece muito mais ligada ao “quando” essa filiação aconteceu do que ao fato
de o Logos é Filho.
Ou seja, defender a leitura “μονογενὴς θεός” como uma alteração ortodoxa do texto
para validar a divindade de Cristo em Jo.1.18, não parece aceitável.
PARECER PESSOAL
Em resumo às considerações levantadas acima, podemos dizer que:
1. Ambas as leituras eram conhecidas no segundo século, considerando apenas
que do ponto de vista documental, P66 traz relativa vantagem à leitura
“μονογενὴς θεός”.
2. No que se refere à distribuição geográfica há incontestável vantagem da
22
RUSH, William, The Trinitarian Controversy. pp.29-30 IN: WRITE, Brian, Jesus as Theós (God): A
textual examinaition. (Bible.org)
23
EHRMAN, Bart, Orthodox Corruption of the Scripture. pp.78-82
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Evidências Internas
Da mesma forma que a análise das evidências externas, na análise das evidências
internas vamos observar que a interpretação textual move-se para ambas as leituras. Aliás,
a leitura que pareceu favorável nas evidências externas, é atacada com mais intensidade
aqui. E à semelhança da análise já realizada, aqui trataremos dos dilemas à medida que
conhecemos os argumentos de cada lado da disputa.
CONSISTÊNCIA DA LEITURA
O principal argumento contra a leitura “μονογενὴς θεός” é que ela parece
inconsistente com a literatura joanina. Do ponto de vista da estatística, na literatura joanina
μονογενὴς refere-se exclusivamente ao Filho (Jo.1.14; 3.16, 18; 1Jo.4.19). No Novo
Testamento, à exceção de uma passagem (Hb.11.17), todos os usos de μονογενὴς fazem
referência a um filho que é único (Lc.7.12; 8.42; 9.38).
O segundo argumento é que a frase “μονογενὴς θεός“ não é encontrada em nenhum
outro lugar no Novo Testamento e é estranha a ele. O fato de que há relativo silencio
neotestamentário para essa terminologia, faz com que os defensores da leitura com Filho
defendam sua inconsistência. Outro detalhe que acresce-se a esse é que é muito incomum
uma declaração à divindade de Cristo tão clara no NT. Ou seja, existe um “quase” silêncio
teológico clarividente no NT que pudesse suportar essa visão.
O terceiro argumento atesta que, do ponto de vista do estilo, a leitura com Filho
parece mais natural ao texto, uma vez que o termo Deus é usado no início e o termo Pai no
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24
ALMEIDA, José Pedro de, Quem está mentindo em Jo.1.18: É ―Deus Unigênito‖ ou ―Filho Unigênito‖.
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copistas tinham certa tendência para facilitar um texto ao invés de complicá-lo. Também
era comum que eles tentassem harmonizar passagens para que fossem sinérgicas. No caso
de Jo.1.18, se considerarmos a leitura com θεός a leitura original, não era difícil que
alguém ousasse facilitar a leitura por substituí-lo por υἱός. Se o motivo não fosse o facilitar
a leitura do texto, certamente poderia ter sido uma questão de harmonização com a
terminologia do autor. Essa observação é importante, pois nos auxilia a compreender qual
das leituras parece ser responsável pela outras. Sobre isso, Metzger tem uma opinião
interessante:
“A leitura μονογενὴς υἱός, que é indubitavelmente mais fácil que μονογενὴς θεός, é
resultado de uma assimilação escribal a Jo.3.16,8; 1Jo.4.9. O uso anartro de θεός (cf. 1.1)
parece ser o mais primitivo. Não há razão para que o artigo fosse deletado, e quando υἱός
suplantou θεός,ele certamente foi adicionado. A menor leitura, ὁ μονογενής, enquanto é
atrativa por causa de considerações internas, é muito pobremente atestada para ser aceito
como texto25”
―O escrito já havia dito em 1.1 que o Verbo era Deus e no 1.14 que o Verbo se fez carne.
Agora ele combina as duas idéias no texto correto de 1.18: ‗Deus-unigênito‘. Somente o
Deus-homem poderia revelar a Deus completamente ao homem. Ele é Deus e Homem, e
pode e atua como intérprete de Deus para o homem26‖
25
METZGER, Bruce, A textual Commentary on the Greek New Testament. pp.198.
26
ROBERTSON, A.T., The Divinity of Christ in the Gospel of John. pp.45. Veja Também: ROBERTSON,
A.T., Word Pictures in the New Testament. (Quickverse); e BLUM, Edwin A., The Bible Knolodge
Commentary: John. (Quickverse).
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grande coesão estrutural no pensamento joanino27. Aliás, Martin Vincent parece defender
exatamente isso:
―A última leitura [μονογενὴς θεός ] meramente combina em uma frase dois atributos do
verbo já indicados – Deus (v.1) e unigênito (v.14)‘; o sentido é o ser único que é tanto
Deus como Unigênito28‖
Vale a pena ressaltar que, tanto no verso 1 (θεός), como no verso 14 (μονογενὴς),
encontramos as declarações desacompanhadas de artigo, o que parece favorecer a leitura
μονογενὴς θεός. Ou seja, do ponto de vista da consistência da análise interna, a leitura
majoritariamente alexandrina é claramente favorecida.
PROBLEMAS TEOLÓGICOS
No que se refere a problemas teológicos, os adeptos da leitura com “θεός” parecem
não identificar qualquer problema com qualquer uma das variantes. Harris, que tem
preferência por “θεός” em função de sua antiguidade e dificuldade, diz que “de modo
geral, eu não acredito que nenhuma das leituras altera de modo sério o sentido do texto29”.
Entretanto, os defensores da leitura “υἱός”, insistem que a leitura variante não é
possível, pois introduz problemas teológicos sérios. Estranhamente, Ehrman é um desses
que entende que existe um problema teológico na leitura com “θεός”. Muito embora isso
não fizesse qualquer diferença para o autor (exceto para sua defesa de corrupção
ortodoxa), Ehrman alega que Jesus só poderia ser o único Deus, se não houvesse outro
Deus, o que o contexto imediato já rejeita: “Ninguém jamais viu a Deus; o Deus unigênito,
que está no seio do Pai, é quem o revelou”. Essa argumentação é bem similar à aquela que
os defensores da Velha Ortodoxia apresentam.
Entretanto, para Pickering, acredita que o texto traz ainda um problema mais grave:
“se Cristo recebeu sua divindade no processo de geração, então não pode ser a
eternamente preexistente Segunda Pessoa da Trindade”. Ou seja, Pickering, embora
concorde com a leitura sugeria por Ehrman, não pode concordar com a tese de Ehrman.
Em parte, Pickering está dizendo que existe um conceito de geração na expressão e se a
divindade de Cristo está em sua geração, então um sério problema teológico é auferido. Por
27
JAMIESSON, FAUSSET, BROWN, New Commentary on the Whole Bible. (Quickverse)
28
VINCENT, Martin, Vincent`s Word Studies. Vol.2 (Quickverse).
29
HARIS, W.H., Prologue (John 1.1-18). (Bible.org)
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outro lado, ele concorda com a possibilidade de que “υἱός”, como texto original, é uma
defesa teológica ao adocionismo (!).
Normalmente, a Velha Ortodoxia sugere que a leitura “θεός” é uma forma de
influência gnóstica no texto, como se existissem diversas divindades: Deus, o Deus
unigênito, o Pai, o Logos. José Pedro de Almeida, um desses defensores zelosos da Velha
Ortodoxia, diz:
“Por não crerem na pre-existência do Filho [os gnósticos], eles não criam na divindade
do Filho, e nem mesmo na encarnação do Filho, eles sutilmente mudaram o texto de
modo a acomodar suas heresias. Eles criam na doutrina dos deuses intermediários. Jesus
Cristo para eles não era Deus, mas um "deus" intermediário com "d" minúsculo. Note que
esses desonestos se aproveitavam do fato de que, nos manuscritos antigos, todas as letras
eram do mesmo tamanho. Esse é o motivo pelo qual eles substituíram a palavra "Filho"
(huios) pela palavra "deus" (theos)30”
30
ALMEIDA, José Pedro de, Quem está mentindo em Jo.1.18: É ―Deus Unigênito‖ ou ―Filho Unigênito‖.
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Já Pickering, parece não ter atentado muito bem para o termo “μονογενὴς”. Para ele,
esse termo deve ser diferente de “μονος” (único) e no NT não existem evidências para que
se entenda “μονογενὴς” com essa idéia. Contudo, o uso do termo em Hb.11.17 deveria tê-
lo feito pensar nessa concusão: “Pela fé, Abraão, quando posto à prova, ofereceu Isaque;
estava mesmo para sacrificar o seu unigênito aquele que acolheu alegremente as
promessas”. O texto diz que Isaque era o unigênito de Abraão, entretanto, ele não era o
único filho gerado de Abraão: Ele era o Filho mais Amado de Abraão. Em Gênesis temos
exatamente essa visão: “Acrescentou Deus: Toma teu filho, teu único filho, Isaque, a
quem amas, e vai-te à terra de Moriá; oferece-o ali em holocausto, sobre um dos montes,
que eu te mostrarei” (22.2). O termo hebraico para descrever Isaque como único filho é o
termo “Yachiyd” que é traduzido na Septuaginta por “agapetós” (o amado de modo
especial). Não é à toa que Rudolf Bultmann defende que “a designação [de monogenes]
deverá ser compreendida como predicado de valor no sentido de 'amado acima de tudo' de
acordo com o uso lingüístico da LXX31”. Ou seja, “μονογενὴς32” não é usado apenas com o
sentido de geração como parece sugerir Pickering33, mas com sentido de único, especial,
31
BULTMANN, Rudolf, Teologia do Novo Testamento. Teológica:2004, pp.465.
32
Como título Cristológico, “μονογενὴς” assemelhasse a “ἀγαπητός” em sua aplicação. Isso é também
percebido pelo fato de que os autores dos evangelhos sinóticos utilizarem “ἀγαπητός” como o título
cristológico (Mt.3.17; 12.18; 17.5; Mc.1.11; 9.7; 3.22).
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Veja também o artigo: BERTI, Marcelo, O uso de monogenes em referência a Cristo. O debate semântico
de monogenes repousa na construção do termo. Três possibilidades são reconhecidas:
(1) monos e gennao: nesse caso monogenes deveria ser entendido como único gerado, uma vez que
genao significa gerar (Friberg Lexicon). Caso essa opção fosse válida, o termo deveria ser
monogennes, com o acréscimo de um “n”;
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PARECER PESSOAL
A mim me parece que as argumentações em descrédito da variante preferida na
análise de evidências externas não são consistentes, e minha preferências pela leitura
“μονογενὴς θεός” parece bem evidente a essa altura. No que se refere consistência, tenho a
impressão que essa leitura é mais consistente. No que se refere às possibilidades de
transcrição, entendo que essa justifica mais adequadamente o surgimento das outras, sem
contar que teologicamente, “μονογενὴς θεός” é certamente a leitura mais difícil. Assim,
tenho acredito que essa leitura é, muito provavelmente, a leitura original desse verso.
CONCLUSÃO
Se as análises realizadas nesse estudo são verdadeiras, a Cristologia Testemunha de
Jeová não poderia sustentar-se. É interessante notar que em todas as facetas dessa disputa
textual, os teólogos reconhecem que o texto com “μονογενὴς θεός” poderia reforçar a
divindade de Cristo. Aliás, para Ehrman isso é tão evidente que ele tem que supor que isso
é uma corrupção da ortodoxia posterior ao texto.
Contudo, é de se admirar que a Tradução do Novo Mundo use exatamente essa
leitura em suas traduções. Eu tenho a impressão que com o passar do tempo, eles deixarão
(2) monos e gnomai: nessa forma o termo deveria ser entendido único nascido (Liddel-Scot,
Strong`s); Contudo, não há qualquer uso no NT ou LXX que pareça justificar essa posição. Nem
mesmo a estrutura do termo parece indicar essa opção.
(3) monos e genós: se essa possibilidade está certa, a tradução seria único em espécie, uma vez que
genós descreve classe, espécie (BDAG, Thayer`s, Louw-Nida, DITNT)
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EHRMAN, Bart, Orthodox Corruption of the Scripture. pp.80.
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