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Ivan Teixeira
NEW HISTORICISM
Influenciado pelas obras de Michel
Reprodução
Foucault e Derrida, o new historicism
Fotos
de Stephen Greenblatt afirma que a
produção poética está incrustada no
discurso coletivo de seu tempo,
restaurando a historicidade do texto e
postulando a textualidade da história O crítico Stephen Greenblatt
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Não se trata de entender a obra como verdadeiro etc. Os valores essenciais dos O ensaio mais célebre de Greenblatt
reflexo do contexto e muito menos de povos são sempre circunstanciais e su- talvez seja Resonance and wonder, de
considerar a história como pano de fundo jeitos ao jogo transitório das formulações 1990. Nesse texto, o autor enumera três
para uma compreensão supostamente históricas, das quais depende a escolha características essenciais do velho histo-
politizada da obra. Trata-se, ao contrário, das instituições e das pessoas que elabo- ricismo: (1) crença na idéia de que a
de entender a produção artística como ram e preservam o código que regula a história é presidida por um processo
parte integrante de um discurso mais relação entre os indivíduos e destes com inexorável e cujo curso o homem pratica-
amplo, o discurso histórico, do qual a os padrões e os valores vigentes. mente não pode alterar; (2) convicção de
obra de arte participa como se fosse frase Outro traço importante do pensa- que o historiador deve evitar juízos de
intercalada ou procedimento retórico. mento foucaultiano é a idéia de que a valor em seu estudo do passado ou de
Hayden White, que também partilha culturas antigas; (3) veneração do passado
da necessidade da renovação dos estudos ou da tradição.
culturais, julga que o discurso historio- Greenblatt opõe-se a essas três
gráfico possui a mesma natureza do categorias, propondo alternativas polê-
discurso literário, chegando a aplicar micas para elas. A primeira grande
categorias importantes da crítica literária, diferença entre o historicismo tradicional
como os gêneros e os tropos de linguagem, e o novo historicismo consiste na incor-
à classificação das diversas modalidades poração da idéia de história como dis-
de historiografia. Estabelece-se, assim, curso: a história não é o fato, mas o regis-
uma relação de homologia entre história tro dele. Essa noção não se esgota no
e literatura, e não apenas uma relação de preceito marxista segundo o qual a
complementaridade. As manifestações perspectiva do historiador determina a
culturais de um período nada mais são natureza política do registro. Trata-se de
do que uma constelação de signos da algo mais. Para que o fato se converta em
realidade que as compõe. A obra de arte história é preciso primeiro assumir a
integra essa constelação, a que Stephen condição de discurso, de logos, o que não
Greemblatt chamou poética da cultura, no O crítico Hayden White quer dizer que o evento deva necessa-
ensaio Towards a poetics of culture, de riamente atingir condição de enunciado
encontra uma relação de
1987. verbal para ser história, mas sim mani-
homologia entre o discurso
Segundo Foucault, as vozes do tempo festar-se num sistema autoconsciente de
historiográfico e o discurso
são variadas e quase infinitas, mas podem significação social. A morte absoluta-
literário, aplicando
ser sintetizadas pela idéia de episteme, mente ignorada de um indivíduo no
entendida como o modo de articulação categorias como gêneros e
deserto não pertence à história. Mas o
entre os vários discursos que compõem a tropos de linguagem aos assassinato secreto de um sem-terra nos
história de um povo: política, arte, relatos dos historiadores confins de uma fazenda do Mato Grosso
poética, ética, moda etc. O pensador é história, porque se insere num processo
francês não entende a história como história não é teleológica, quer dizer, não catalogado pela consciência social do
narrativa ou análise dos acontecimentos se orienta para um fim racionalmente momento. Nesse sentido, a história não é
em sua relação de causa e efeito, mas concebido pelo próprio devir das insti- feita pelo homem (categoria metafísica),
como um imenso discurso gerado pela tuições e dos fatos, como pensava a tra- mas por homens em busca de significação
vida orgânica das ocorrências físicas e dição metafísica. A concepção teleo- (categoria circunstancial). Não se trata,
espirituais de determinado momento. A lógica da história elege o presente como portanto, de um processo absoluto e
noção de episteme foucaultiana implica o ponto de chegada de todos os esforços irreversível, mas do resultado impre-
o afastamento de qualquer crença univer- do homem. Foucault, ao contrário, não visível de situações concretamente assi-
salizante, pois explica os valores em entende o presente como espaço privile- miláveis.
termos estritamente sociais, sem nenhum giado no tempo. Interpreta-o apenas Em sua refutação do segundo
recurso à metafísica. Cada época cria o como o lugar de onde se produz o conhe- princípio do historicismo tradicional,
padrão que estabelece a noção de certo cimento, do qual decorrem os discursos Greenblatt afirma que o passado deve
ou errado, de belo ou feio, de falso ou e as várias formas de poder de uma época. ser entendido pela perspectiva do
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presente, isto é, partilha da idéia da Shakespeare se reveste de tanta atitude escreveu também um admirável poema
necessidade de juízos de valor sobre o política quanto se revestiu de propriedades herói-cômico: O desertor (1774), com-
passado. Todavia, temeroso talvez de dramáticas a coroação de Elizabeth I. Em pletamente esquecido hoje em dia. A
destoar da doutrina foucaultiana, outros termos, o new historicism atenua os escassa fortuna crítica desse texto se deve
Greenblatt não deixa de problematizar a limites entre discurso artístico e discurso principalmente ao magistério da inter-
aplicação desses juízos, criando uma social, entendendo aquele como projeção pretação romântica, que, por força de seu
estratégia operacional a que chama senso da estrutura deste. Não se trata, repita-se, nacionalismo, desqualificou o poema sob
de distanciamento. O senso de distancia- pretexto de não apresentar interesse para
mento leva-o a ratificar a noção de que o a formação da literatura propriamente
presente não decorre de suposta inevita- brasileira.
bilidade histórica (recusa da história Pela perspectiva do new historicism,
como progressão teleológica), devendo esse não seria o modo correto de ler O
ser entendido apenas como o ponto a desertor. Tendo sido escrito como parte da
partir do qual se reconstrói o passado. celebração da reforma da Universidade
Além disso, o ensaísta considera que de Coimbra, levada a efeito pelo Marquês
há dois modos de relacionamento entre de Pombal em 1772, esse texto deve ser
passado e presente: por analogia e por restituído ao discurso social de que fez
causalidade. Em qualquer dos casos, julga parte. Nesse caso, caberia ao crítico
inevitável a presença de juízos de valor, recompor o universo do mecenato
pois afirma que a suposta isenção do velho pombalino e estudar as instituições e os
historicismo não passa de subserviência valores que o ministro representava.
aos valores oficiais do Estado e aos estudos Caberia também investigar o rigoroso
acadêmicos, visto que a consciência da repertório coletivo de convenções que
impossibilidade de isenção do historiador estabelecia desde as tópicas literárias
na formulação do discurso histórico (coisas retóricas) e o modo de apro-
conduz ao cerceamento da imposição Há uma homologia priação delas até os princípios de organi-
arbitrária de valores atuais sobre o passado. histórica e artística entre zação da frase e do poema. Efetuada essa
Quanto ao terceiro item do paralelo a Estátua Eqüestre de operação, O desertor talvez renascesse para
de Greenblatt entre o velho e o novo D. José I e a retórica a sensibilidade atual, que poderia apreciar
historicismo, não parece necessário dizer celebrativa contida na nele não apenas a deliciosa ironia contra
que o ensaísta recusa a teoria da vene- poesia de Silva Alvarenga a neo-escolástica jesuítica, mas também
ração do passado e da tradição. Ao e Basílio da Gama o sugestivo encômio alegórico ao
contrário, empenha-se em criar categorias Marquês de Pombal, cuja política
substitutivas que incorporem e repre- colocava então a cultura lusitana em
sentem uma visão crítica da história. Em de entender a arte como reflexo ou como contato com o discurso ilustrado europeu.
lugar da veneração, propõe o sentimento produto condicionado por elementos O mesmo se pode dizer dos versos que
de maravilha (wonder), responsável pelo exteriores a ela, como fazem supor certas Basílio da Gama, mentor de Silva
desencadeamento do trabalho historio- aplicações do marxismo. Cumpre apenas Alvarenga na propagação do ideário
gráfico, que não deve apenas se dedicar à entendê-la como parte de discurso mais pombalino, escreveu para os festejos da
reconstrução da totalidade de culturas, amplo, para cuja compreensão é necessário inauguração da Estátua Eqüestre de D.
mas também se empenhar na análise da desintegrá-la do todo e, depois, em José I (1775), erigida por Pombal em
marginália dos processos unificadores, movimento heurístico, reintegrá-la ao homenagem ao rei. Os festejos dessa
como fragmentos de lendas, acusações de organismo de que é parte. inauguração incorporaram diversos
bruxaria, manuais médicos pormenores Tome-se um exemplo da literatura em traços retóricos da alegoria poética, assim
simbólicos que, segundo Greenblatt, língua portuguesa. Como se sabe, como os textos celebrativos do evento se
revelam toda a estrutura imaginária e Manuel Inácio da Silva Alvarenga, autor apropriaram de outras tantas fórmulas
ideológica da sociedade que os produziu. de Glaura (1799), o mais prestigiado políticas do Antigo Regime. Dentre
Nesse sentido é que se deve entender a poema lírico do setecentismo brasileiro outras coisas, esse monumento repre-
reveladora afirmação de que uma peça de depois de Marília de Dirceu (1792), sentou a glorificação da carreira política
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B I B L I O G R A F I A
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