Академический Документы
Профессиональный Документы
Культура Документы
2006/2007
Sequência 1
Os Lusíadas de Luís de Camões
Sequência 2
Poesia de Fernando Pessoa
- Mensagem
- Pessoa ortónimo
- Alberto Caeiro
- Álvaro Campos
- Ricardo Reis
Sequência 3
Memorial do Convento de José Saramago
Sequência 4
Felizmente Há Luar! de Luís de Sttau Monteiro
Sequência 1
Os Lusíadas de Luís de Camões
Contexto histórico-cultural
Situação económico-social:
- momento pós-descobrimentos
- esbanjamento das riquezas obtidas
- crises económicas
- surgimento do tribunal do Santo Ofício
- ameaça do monopólio marítimo
- corrupção dos costumes
Situação cultural:
- desenvolvimento cultural florescente de influência clássica e renascentista
- apologia do ideal humanista
- desenvolvimento científico
Características da obra:
- Acção épica;
- O protagonista;
- Unidade da acção;
- Os episódios;
- O maravilhoso (intervenção dos deuses);
- Modo narrativo;
- Intervenção do poeta;
- Estilo grandioso, solene e decassilábico.
__________________________________________________________________________________________________
*Nota: Epopeia: Uma epopeia, forma literária da Antiguidade Clássica, define-se como uma narrativa,
estruturada em verso, que narra, através de uma linguagem cuidada, os feitos grandiosos, de um herói,
com interesse para toda a Humanidade.
Estrutura externa:
‘Os Lusíadas’ - Dividida em 10 cantos (1102 estrofes) e estruturada em oitavas (estrofes de 8 versos) de
versos decassilábicos (heróico – acentos na 6ª e 10ª sílabas) e com rima ‘abababcc’
Estrutura interna:
1. Partes constituintes (4 partes)
Invocação (Canto I, estrofes 4-5; CIII, estrofes 4-5; C. VII, estrofes 78-82; C. X, estrofe 8)
Pede inspiração às Ninfas
- Acção fulcral: Acção núclear da epopeia – a Viagem da descoberta do caminho marítimo para a Índia
- Acção mitológica: Centra-se no conflito entre Vénus e Baco
- História de Portugal: É narrada a História de Portugal desde Viriato a D. Manuel. Com excepção dos
episódios líricos da Formosíssima Maria e de Inês de Castro (C. III), e dos preparativos para a viagem, que
incluem a despedida de Belém e o episódio do velho do Restelo (C. IV), predominam nesta longa narrativa
os feitos guerreiros.
Inicio da Narração
A narração fulcral está numa fase adiantada, os navegadores encontram-se no Oceano Índico,
próximo da costa moçambicana. A acção inicia-se ‘in media res’, por isso, as peripécias da viagem de
Portugal à Costa Oriental de África serão relatadas em analepse, por Vasco da Gama ao Rei de Melinde (C.
V).
Alternância Mar/Terra
Os 10 cantos apresentam uma alternância perfeita entre os elementos Água/Terra:
C. I, II, III C. III, IV C. V, VI C. VII, VIII C. IX, X
Mar Terra Mar Terra Mar/Terra
Viagem de Viagem de
Lisboa à costa regresso a
Armada no Armada em Ocidental de Armada em Lisboa; paragem
Índico Melinde África (analepse) Calecut numa ilha
e viagem até simbólica
Calecut
As personagens
- Plano da Viagem – Vasco da Gama (herói épico)
- Plano mitológico – Vénus (protectora dos navegadores portugueses) / Baco (opositor à viagem dos
portugueses)
Reflexões do poeta
Vertente pedagógica da obra:
C. I, estrofes 105/106 ‘O Homem é o causador de todas as guerras.’
C. V, estrofes 92-100 Fala do sentido da verdade, da glória, das artes e das letras às quais não se tem
atribuido grande importância em Portugal
Resumo
Canto I Canto II Canto III Canto IV Canto V
- Proposição (1-3) - Convite do rei - Invocação a - Crise após a - Partida para a Índia
- Invocação (4-5) de Mombaça (2- Calíope (1-3) morte de D. (1-3)
- Dedicatória (6- 4) - Início do discurso Fernando (1-5) - Viagem no
18) - Desembarque de Gama (3) - D. João I (15- Atlântico até ao
- Início da de dois - Narração da 50) Equador (4-13)
Narração (19) condenados História de - Batalha de - Cruzeiro do Sul /
- 1º Consílio dos portugueses (7- Portugal (de Luso a Aljubarrota (28- Fogo de Santelmo /
deuses (20-41) 9) Viriato) (22-24) 44) Tromba marítima
- Ilha de - Baco mais uma - Reis da primeira - Conquista de (14-23)
Moçambique; vez engana os dinastia / Batalha Ceuta (48-50) - Veloso (30-36)
Visita do régulo; portugueses (10- de Ourique (42-44) - Sonho - Adamastor (37-60)
Ataque traiçoeiro 15) - Afonso IV / profético de D. - Continuação da
de Baco; Vénus - Vénus e as “Fermosíssima Manuel I (67- viagem (61-83)
em auxílio dos Nereidas Maria” (101-106) 75) - Vasco da Gama
portugueses (42- auxiliam os - Batalha do - Preparativos elogia os
102) portugueses (18- Soldado (107-117) da viagem (84- portugueses (86-91)
- Chegada a 24) - Inês de Castro 87) - Camões faz
Mombaça (103- - Súplica de (118-135) - Despedida em considerações sobre
104) Gama à “Divina - D. Pedro I (136- Belém (89-93) os portuguess que
- Considerações Guarda” (29-32) 137) D. Fernando - Velho do desprezam a poesia
do Poeta sobre os - Chegada a (138-143) Restelo (94- (92-100)
perigos que Melinde (73-113) 104)
cercam o homem - Pedido do
(105-106) Mouro (108-113)
Sequência 2
Poesia de Fernando Pessoa
- Mensagem
Os símbolos numéricos
Em Mensagem, Pessoa recorre a uma série de referentes simbólicos que é necessário compreender
para poder interpretar a obra.
O conjunto de poemas de Mensagem está intencionalmente agrupado em blocos de 1, 2, 3, 5, 7 e
12, num total de 44 poemas.
1 – simboliza o Ser por excelência. Representa também a ideia de unidade entre pólos opostos,
remetendo assim para a Totalidade, para a Perfeição e para a comunhão com o transcendente.
2 – simboliza a divisão e a dualidade, seja ela expressaão de contrários ou de complementaridade. O dois
resume o paradoxo da existência: a vida e a morte.
3 – remete para a união entre Deus, o Universo e o Homem e repenta, por isso, a Totalidade. Aparece
também associado a Cristo, cuja figura concentra 3 vertentes: a de rei, a de padre e a de profeta. O três
sugere ainda as fases da existência: nascimento, crescimento e morte. A própria obra está dividida em 3
partes.
5 – é o número da Ordem, do Equilíbrio, da Harmonia e da Perfeição.
7 – corresponde a um periodo temporal unificante, os sete dias da semana e está, por isso, associado à
ideia de completude de um ciclo. O sete é igualmente um número mágico que remete para o poder e para
o acto da criação.
12 – remete para a unidade temporal do ano (12 meses). O doze está ainda associado aos 12 apóstolos
que reflectem, por sua vez, uma forma de estar no Universo diferente, forma essa pautada pela fidelidade
a Cristo, pela fraternidade e pela paz.
Símbolos unificantes
A Mensagem encontra-se repleta de símbolos que contribuem para a sua significação. Alguns deles
assumem uma particular importância, quer por serem recorrentes na obra, quer por deterem uma forte
carga simbólica.
Mostrengo – simboliza as lendas do mar, p desconhecido, os medos, os obstáculos a vencer.
Nevoeiro – representa a indefinição, a incerteza e a hipótese de revelação de novas realidades. É, por
isso, símbolo de esperança e regeneração.
Manhã – simboliza a luz, a vida e o mundo novo.
Noite – simboliza a morte e a inércia e implica a hipótese do renascimento.
Nau – simboliza a viagem, as provaçõs, o caminho a percorrer para atingir movos mundos, novos
conhecimentos e o heroísmo. Está ligada à iniciação, que pressupõe a morte, para se dar lugar a um novo
ser.
Grifo – é uma ave mitológica com bico e asas de águia e corpo de leão. Simboliza a união do terreno e do
celeste, do humano e do divino. A sua simbologua aponta para a construção de uma obra de carácter
divino realizada pelos humanos.
Timbre – simboliza o poder legítimo e remete para a ideia de sagração do herói para uma missão
transcendente.
Coroa – simboliza a realeza, o poder e a perfeição.
Castelos – simbolizam a protecção, a segurança e as conquistas dos heróis. Nesta obra, os castelos
remetem igualmente para a própria fundação da nacionalidade.
Quinas – representam as cinco chagas de Cristo, que é a imagem do sofrimento e da redenção dos
pecados humanos. As figuras históricas focadas no teceiro bloco da primeira parte remetem para a
dimensão espiritual, na medida em que são apresentadas como seres cumpridores de um desejo de Deus,
realizado através das suas próprias vidas.
Campo – adquire a mesma simbologia da terra, enquanto elemento passivo. Está, por outro lado, ligado à
dominante feminina, por se associar à ideia de vida, de fecundidade e de alimento.
Ilha – por ser de difícil acesso, representa um centro espiritual e primordial. Local paradisíaco, a ilha
funciona como uma recompensa, como uma conquista após a superação dos obstáculos e simboliza a
promessa de felicidade na terra.
Terra – aparece, por um lado, associada à ideia de passividade, na medida em que nela se cumpre a
vontade divina. Por outro lado, constitui um símbolo materno, já que está associada à ideia de refúgio. O
regresso à terra equivale ao regresso ao elemento natural do ser humano.
Símbolos herméticos
- A Ordem Rosa-Cruz
Origem: associação secreta que surgiu na Alemanha, em 1604;
Objectivo: renovar a Igreja romana e a sociedade;
Símbolo: a insígnia da federação (uma rosa vermelha, no centro de uma cruz, também vermelha)
simboliza a comunhão da realidade com Cristo: o homem, cumprindo uma vontade divina, deveria
procurar o Amor, a Paz e a Perfeição.
- A Maçonaria
Origem: a associação, que se opõe à Igreja de Roma, remonta aos grupos de pedreiros-livres medievais
que, para manterem a unidade da “classe”, comunicavam entre si através de sinais secretos;
Objectivo: construir “catedrais humanas” (o indivíduo, enquanto receptáculo de Deus, deveria
aperfeiçoar-se de forma a honrar o “Grande Arquitecto do Universo”); construir um reino de fraternidade,
amor, solidariedade, responsabilidade e liberdade; instituir o primado da espiritualidade sobre o
materialismo;
Pressuposto: a feitura de um percurso, com vista à obtenção de um grau de espiritualidade cada vez
maior, de um renascimento;
Símbolo: os diferentes símbolos – instrumentos ligados ao trabalho dos pedreiros (círculos, compassos,
esquadros, réguas, níveis, luvas, etc.); símbolos ligados ao sacerdócio (o altar e o livro sagrado) e à
cavalaria (luvas, espadas, etc.) – remetem para a intersecção simbólica da Ordem dos Templários e da
Maçonaria.
Caracterização da obra
• 1ª Parte – ‘Brasão’
Nota: O mito é uma história exemplar e simbólica, que fundamenta e justifica a existência do mundo,
atribuindo-a à acção de seres sobrenaturais. O mito testemunha uma realidade intemporal e funciona
como modelo para a acção humana.
Os Poemas
- O dos castelos
Localização de Portugal na Europa e em relação ao Mundo. Portugal é comparado a uma figura
feminina.
Neste poema, Portugal assume um lugar de destaque promovido por diversos factores. O poema
inicia e termina fazendo referência a Portugal. O título remete para os símbolos da conquista,
pertencentes à bandeira portuguesa, e o último verso que contém 7 palavras, apresenta Portugal como
sendo o rosto da Europa. Sendo o número 7 um número místico, o último verso remete para a completude
e para o poder da criação de Portugal. A expectativa de um futuro que faça ressurgir a glória do passado é
representada pelo olhar insistente e misterioso voltado para o Ocidente, olhar esse dirigido pelo rosto
português. A posição de Portugal, voltada para o futuro, está relacionada com a missão lusa de guiar a
Europa e o Mundo até um Império Espiritual. Aqui reside o nacionalismo profético que percorre toda a
Mensagem.
- Ulisses
Em Mensagem, o mito assume uma função crucial, pois considera-se que é do seu poder
fecundador que nasce a realidade. É o mito que ilumina o herói e transporta o valor das suas acções para
a dimensão do eterno.
- Viriato
Ulisses e Viriato são mitos em que o povo se baseia. A história não é uma sucessão de factos, mas
de símbolos, assim o passado glorioso de Portugal não é estático, interfere no presente e permite contruir
o futuro. Deus escolhe o Homem para ser o símbolo da nação.
- D. Afonso Henriques
É o Pai de todos os portugueses, é o fundador de Portugal.
- D. Dinis
Figura de grande importância para a cultura portuguesa. É conhecido como o Lavrador,
devido ao Pinhal de Leiria que ele mandou ‘plantar’, é feita uma alusão ao facto da madeira usada
posteriormente nas naus dos descobrimentos ser desses pinheiros e também como o Trovador devidos às
suas cantigas e poesias.
Para o carácter profético de mistério do poema contribuem:
- as referências de espaço nocturno e do domínio do oculto (o substantivo noite; o adjectivo obscuro; a
subordinada modal sem se poder ver);
- ideia do futuro, de novidade, de fecundação (a conjugação perifrástica a haver; a expressão trigo de
Império; a expressão caracterizadora por achar; o adjectivo futuro; o gerúndio ansiando);
- as expressões que realçam o estranhamento de sinais sonoros
(a antítese silêncio múrmuro; as personificações fala dos pinhais, voz da terra e rumor dos pinhais; a
sinestesia marulho obscuro).
- D. João, O Primeiro
Fundador da dinastia de Avis. Neste poema, Fernando Pessoa fala no ‘Templo’ – referência à
Ordem do Templo (Templários), instituida em Portugal em 1125, posteriormente a mais rica e poderosa
Ordem de Portugal. Mais tarde passa a ser a Ordem de Cristo.
Segundo Fernando Pessoa, tudo o que de importante houve em Portugal teve o apoio e a iniciativa
da Ordem de Cristo.
- D. Sebastião, rei de Portugal
É a ele que Camões dedica a sua Epopeia e dirige o apelo de continuar a tradição dos antigos
heróis portugueses, para fazer ressurgir a pátria da ‘apagada e vil tristeza’ do presente. Na Mensagem, D.
Sebastião é o mito organizador e articulador da obra, no sentido de que representa o sonho que ressurgirá
do nevoeiro em que Portugal presente está mergulhado, impulsionando a construção do futuro, da utopia.
Fala na 1ª pessoa.
- Nun’ Álvares Pereira
Herói de Aljubarrota. Neste poema é importante ter em conta a simbologia da ‘espada’, sendo um
símbolo da cavalaria, tendo valor profético e detendo o poder de dar luminosidade.
Resumo: A primeira parte da Mensagem encontra-se dividida em cinco partes e dá-nos conta da primeira
etapa da evolução do Império – a fundação de Portugal.
‘Brasão’ começa pela localização de Portugal na Europa, procurando certificar o seu enorme valor
na civilização ocidental. Segue-se a definição de mito como o nada é capaz de impulsionar a construção
da realiade. Depois, apresneta-se o heroísmo e o carácter guerreiro do povo português, não esquecendo
as mães dos fundadores. Efectivamente, em Brasão, são evocados personagens emblemáticos, históricos
ou lendários, cujo esforço exemplar distingue Portugal, Enquanto nação destinada a grandes feitos.
O carácter heróico da acção dos antepassados confere-lhes o valor de mito, fazendo com que
passem a funcionar como símbolos de valores tais como a coragem, o sonho, a concretização do
impossível, o cumprimento de uma missão transcendente.
São esses mesmos valores que servirão de base para a construção de um futuro império sustentado por
valores e atitudes de excelência.
• 2ª Parte – ‘Mar Português’
(Possessio Maris – A posse do mar)
Os Poemas
- O Infante
Neste poema Pessoa exprime a sua concepção messiânica da História logo no primeiro verso:
‘Deus quer, o homem sonha, a obra nasce.’. Este poema destina-se ao Infante D. Henrique pois foi ele que
impulsionou a expansão marítima. Deus destinou ao Infante a missão de unificar a terra. Na 3ª estrofe do
poema podemos ainda constatar o estado de decadência em que se encontrava Portugal.
- Horizonte
Neste poema fala-se na recompensa dos marinheiros ao atravessarem a ‘linha severa da
longínqua costa’ (horizonte) e encontrando assim novas terras, ‘receberem’ ‘os beijos merecidos da
Verdade.’ (a árvore, a praia, a flor, a ave a fonte) – alusão ao plano da Ilha dos Amores (Os Lusíadas).
- Ascensão de Vasco da Gama
Pessoa engrandece Vasco da Gama divinizando-o, os deuses pasmam, os homens extasiam-se e os
lugares ficam subitamente silenciosos. O poeta dá ao Gama o nome de Argonauta.
- O mostrengo
O processo de expansão marítima exigiu dos portugueses coragem e ousadia, para que
enfrentassem o perigo e o medo do desconhecido e conquistassem novas terras. As dificuldades que os
marinheiros tinham de enfrentar surgem, muitas vezes, representadas por monstros horrendos que
tentam amedrontar os que desafiam o oculto e tentam dominar o mar. É o caso do “Adamastor”, n’ Os
Lusíadas, e do “Mostrengo”, na Mensagem.
Para além do conjunto de referências relacionadas com a ideia de mistério (fim, mar, noite,
cavernas), impõe-se, no poema, um importante símbolo numérico, associado ao oculto e à trilogia Deus-
Homem-Universo. Efectivamente, o número três abunda no poema, associado à ideia de busca de
conhecimento e de unificação enquanto missão divina.
- Mar Português
Depois de, na primeira estrofe, referir as consequências negativas dos Descobrimentos
Portugueses, o sujeito poético inicia a segunda estrofe com a pergunta retórica ‘valeu a pena?’ que
reforça o tom épico do poema.
A resposta que se lhe segue pretende realçar o lado positivo do empreendimento. Os versos ‘Tudo
vale a pena/ Se a alma não é pequena’ realçam a grandeza da alma humana, disposta a enfrentar
desafios em nome da glória.
Em ‘Mar Português’, ficamos a saber que se concretizaram as profecias do ‘Velho do Restelo’,
relativamente ao sofrimento que os portugueses iriam passar caso decidissem seguir ‘o fraudolento gosto’
da cobiça e da ambição.
- Prece
Tal como o nome do poema indica, aqui o Poeta, em nome do povo português, faz um pedido ao rei
para que Portugal retome os dias de glória que outrota teve.
• 3ª Parte – ‘O Encoberto’
Bandarra - Poeta e sapateiro nascido nos princípios do século XVI, em Trancoso, e falecido,
provavelmente, em 1566. Ficou célebre pelas suas Trovas (proibidas pela Inquisição e só publicadas em
1603), que constituíram o ponto de partida para a mais importante tradição messiânica portuguesa, o
Sebastianismo.
Padre António Vieira - Notável prosador e o mais conhecido orador religioso português, o Padre António
Vieira nasceu em 1608, em Lisboa e faleceu na Baía em 1697.
Foi preso pela Inquisição sob a acusação de que tomava a defesa dos judeus. Acreditava nas
possibilidades de um Quinto Império e nas profecias de Bandarra.
O Quinto Império
Todavia, a visão portuguesa do Quinto Império não corresponde à figuração tradicional do mesmo,
associada à interpretação do sonho de Nabucodonosor pelo profeta Daniel. Movido por um forte
sentimento patriótico, o poeta afirmava querer contribuir para a criação do «supra-Portugal de amanhã» e
falava na vinda de um outro Camões, um Supra-Camões (que seria por certo ele mesmo), que apareceria
para restituir à Pátria, ainda que não a nível material, a glória perdida.
- Albero Caeiro
“poeta bucólico de espécia complicada”
Nasce em Lisboa em 1889. Morre tuberculoso em 1915.
Motivos poéticos:
- panteísmo sensual;
- deambulismo;
- “variedade inumerável da Natureza”;
- “aceitação calma e gostosa do mundo como ele é” (objectivismo);
- misticismo naturalista (“amor pelas coisas em si mesmas”);
- vivência do presente, gozando em cada impressão o seu conteúdo original (epicurismo);
- recusa do vício de pensar (“saber ver sem estar a pensar”); combate à instrospecção e à subjectividade
Características do eu poético:
- vive de impressões, sobretudo visuais (sensacionismo);
- “lírico espontâneo, instintivo, inculto (no sentido académico), impessoal e forte como a voz da Terra”;
- poeta do real objectivo;
- realismo ingénuo (as coisas existem de facto como as vemos).
Características da sua poesia/estilo:
- ausência do biogáfico;
- linguagem corrente, próxima da língua falada e da prosa;
- ausência de rima e de esquema métrico;
- importância dada ao substantivo concreto (ligado ao predomínio das sensações visuais) em detrimento
do adjectivo (quase despojado de valoração subjectiva);
- tendência para a coordenação adversativa;
- prendor discursivo e argumentativo;
- recurso à compração e ao paradoxo (pouca importância dada a figuras como a metáfora, a hipérbole ou
a sinestesia).
- Álvaro de Campos
Nasce em Tavira, em 1890. Engenheiro formado na Escócia.
Motivos poéticos:
Fase decadentista
- “nostalgia do além”;
- “ embriaguez do ópio e dos sonhos”;
- “tédio e horror à vida”.
Fase futurista
- exaltação da civilização industrial;
- “amor ao ar livre e ao belo atroz”;
- “apologia de um novo homem, isento de dor, livre”;
- procura de sensações fortes e modernas.
Fase abúlica
-reminiscência do mundo fantástico ..
- solidão interior, angústia existencial;
- cepticismo e dor de pensar;
- tédio, náusea, desenocntro consigo mesmo e com os outros.
Características do eu poético:
- realismo satírico;
- poeta futurista, sensacionista e por vezes escandaloso (segundo Pessoa);
- defesa de uma estética não aristotélica;
- poeta da “volúpia da imaginação” e da “energia explosiva”;
- lucidez vs. Semi-inconsciência.
Características da sua poesia/estilo:
- presença do biográfico;
- verso: decassílabos agrupados em quadras (“Opiário”);
- verso livre, longo;
- “estilo esfuziante, torrencial” (fase futurista);
- poetização do prosaico (“lâmpadas”, “êmbolos”, etc.);
- estilo exclamativo, anafórico, interjectivo; recurso à reiteração de apóstrofes e enumerações;
- comparações, metáforas e antíteses arrojadas.
- Ricardo Reis
Nasce no Porto, em 1887.
Educado num colégio jesuíta, forma-se em Medicina.
Por ser monárquico, parte para o Brasil em 1919.
Motivos poéticos:
- efemeridade da vida e do tempo (a ameaça permanente do Fatum, da velhice e da Morte e o sfrimento
daí decorrente);
- tema horaciano do carpe diem (epicurismo);
- aceitação calma e serena da ordem das coisas, do Destino (estoicismo);
- busca da ataraxia (ausência de perturbação) e da aponia (ausência de dor) – epicurismo;
- “preocupação em fazer da própria vida uma arte” (tal como os gregos);
- paganismo;
- sentimento de ser estrangeiro do Mundo.
Características do eu poético:
- “amante do exacto, evidencia um espírito grave, medido, ansioso de perfeição”;
- autodisciplinado;
- neoclassicista formal e ideológico;
- moralista;
- epicurista e estóico (à maneira de Horácio);
- poeta da razão e da intelectualização das emoções.
Características formais da sua poesia/estilo:
- preferência pela ode de tipo horaciano;
- irregularidade métrica;
- importância dada ao ritmo como unidade de sentido;
- linguagem erudita, não raras vezes alatinada (no vocabulário e na sintaxe);
- gosto pelo uso do gerúndio;
- uso frequente do imperativo (em consonância com a feição moralista das suas odes);
- estilo laboriosamente construído, pensado.
Sequência 3
Memorial do Convento de José Saramago
Memorial do Convento pode ser simultaneamente classificado como romance histórico, romance de
espaço e romance social. Porquê?
As Transgressões na obra
Transgressão do código religioso:
- Sumptuosidade do convento (pp.365-6) vs a simplicidade e a humildade (essência dos valores cristãos);
- Recrutamento à força;
- Construção da passarola vs a proibição de ascender a um plano superior/divino (p. 198) - 4 bases de
solidez do projecto: Bartolomeu, Baltasar, Blimunda e Scarlatti;
- A castidade vs as relações sexuais nos conventos (pp. 95,97);
- As estátuas dos santos (p. 344) vs a santidade humana (p. 342);
- Missa, espaço de vivência espiritual (p. 145) vs missa, espaço de namoros e de encontros clandestinos
(pp. 43, 162, 236);
- A benção de Deus vs a benção dos homens;
- Funeral do Infante D. Pedro, espectáculo de pompa e circunstância vs funeral do sobrinho de Baltasar,
manifestação isolada de dor.
Transgressão linguística:
- Inversão de expressões bíblicas;
- Jogos de palavras "os santos no oratório... não há melhor";
- Desconstrução e reconstrução das regras de pontuação;
- Aforismos "Não está o homem livre... com a verdade";
- Confluência de registos de língua:
Popular "Queres tu dizer na tua que a merda é dinheiro, Não, majestade, é o dinheiro que é merda";
Familiar "correram o reino de ponta a ponta e não os apanharam";
Cuidado "Tirando as expressões enfáticas esta mesma ordem já fora dada antes (...)".
Transgressão ficcional:
- A Música vence a Doença;
- A história vence a História;
- O espaço da ficção é o espaço da Utopia, da Liberdade Suprema;
- O Sonho é a Transcendência Humana.
Tempo
Tempo histórico (época ou período da História em que se desenrolam as sequências narrativas):
A acção passa-se no início do século XVIII (1711 – 1739).
Tempo da diegese (tempo durante o qual a acção se desenrola, segundo uma ordenação cronológica e em
que surgem marcas objectivas da passagem das horas, dias, meses, anos…):
1711 – 1739. Ao longo do romance, as referências temporais são escassas e, muitas vezes, deduzidas. O
crescimento e/ou envelhecimento das personagens também nos dá conta da passagem do tempo.
Chegou há mais de dois anos da Áustria para dar infantes à coroa portuguesa e até hoje (I) – deduz-se que
a acção tem início em 1711, pois o casamento real aconteceu dois anos antes, em 1709.
Apenas há seis anos aconteceu, em 1705(II) – confirma 1711 focado anteriormente.
Tempo do discurso (modo como o narrador conta os acontecimentos, podendo elaborar o seu discurso
segundo uma frequência, ordem e ritmo temporais diferentes):
Frequência temporal:
Discurso singulativo – o narrador conta apenas uma vez o que aconteceu uma só vez.
Discurso repetitivo – o narrador conta várias vezes o que aconteceu apenas uma vez.
Discurso iterativo – o narrador conta uma vez o que aconteceu várias vezes
Ordem temporal:
O narrador conta no presente acontecimentos já passados – analepse anisocronia temporal
O narrador antecipa acontecimentos futuros – prolepse anisocronia temporal
O narrador segue uma ordem cronológica dos eventos – ordem linear isocronia temporal.
Ritmo temporal:
O tempo da diegese pode ser maior do que o do discurso – anisocronia temporal (o narrador omite
(elipse) ou sumaria o que aconteceu em determinado período temporal)
O tempo da diegese pode ser menor do que o do discurso – anisocronia temporal (o narrador procede a
descrições, divagações, reflexões, pausas narrativas)
O tempo da diegese pode ser idêntico ao do discurso – isocronia temporal (exemplo: diálogos).
No “Memorial do Convento” o narrador manipula o tempo a seu belo prazer mas segue uma ordem
cronológica linear havendo, por vezes, algumas anisocronias, sobretudo prolepses (antecipação de
acontecimentos futuros) que reflectem o seu afastamento temporal da intriga:
O número de filhos bastardos de D. João V (IX)
A morte do sobrinho de Baltasar (X)
A morte do infante D. Pedro (X)
A morte da mãe de Baltasar (XII)
A morte de Manuela Xavier e de Álvaro Diogo (XVII e XXIII, respectivamente)
Da mesma forma, adoptando uma atitude distanciada e, não raro, irónica, o narrado tece comentários e
comparações entre épocas históricas diferentes, que marcam a distância entre o tempo da diegese e o do
discurso (prolepses).
Alusão à extinção dos autos-de-fé (V)
A referência às cores da bandeira portuguesa e à implantação da República (XII)
A menção à cor carmesim (XII)
A alusão à revolução do 25 de Abril (XIII)
A indicação do número de frades instalados no convento por altura das invasões francesas (XVII)
A referência ao cinema e aos aviões (XVII)
A alusão a Fernando Pessoa (XVIII)
O distanciamento do narrador relativamente ao tempo da história é, ainda, visível quando este interpela
directamente o narratário, esclarece termos que caíram em desuso e quando simula a voz de um cicerone
(guia os visitantes do convento de Mafra (XIX)), detectando-se aqui a oposição entre dois tempos
diferentes, com o intuito de corrigir a História através da lembrança daqueles homens verdadeiros e dos
quais não há registo histórico oficial.
É de salientar que o narrador tem consciência do desfasamento entre o tempo da história e o da escrita.
Com isso pretende lembrar e enaltecer os homens/heróis que a História quase sempre esquece, através
da oposição entre épocas distintas Vão aqui seiscentos homens que não fizeram filho nenhum à rainha e
eles é que pagam o voto, que se lixam, com perdão da anacrónica voz (XIX).
Há momentos em que o narrador recua no tempo diegético para contar acontecimentos situados num
passado, mais ou menos distante, que explicam determinados aspectos da acção no presente (analepses):
Desejo antigo dos franciscanos terem um convento em Mafra (II)
A língua portuguesa ser familiar a Scarlatti há já alguns anos (XIV)
O que aconteceu ao cravo de Scarlatti que se encontrava na quinta do duque de Aveiro (XVI)
No último capítulo há um salto de 9 anos no tempo da diegese em que o narrador sumaria em poucas
páginas o que aconteceu durante este período de tempo. Nesta elipse temporal, o narrador cinge-se
praticamente à peregrinação incessante de Blimunda e ao (re)encontro de Baltasar, 1739, desde o seu
desaparecimento em 1730, omitindo o que de supérfluo para a acção se passou durante estes anos.
Tempo psicológico (tempo subjectivo, relacionado com as emoções, a problemática existencial das
personagens, ou seja, a forma como estas sentem a passagem do tempo, vivendo momentos felizes e/ou
infelizes):
No percurso até Espanha, Maria Bárbara vai observando o que a rodeia e, a partir daí, medita sobre vários
assuntos, nomeadamente sobre o facto de nunca ter visto o convento erigido em honra do seu
nascimento (XXII).
Espaço
Evocação de dois espaços principais determinantes no desenrolar da acção: Mafra e Lisboa.
Mafra: passa da vila velha e do antigo castelo nas proximidades da Igreja de Santo André para a vila nova
em cujas imediações se vai construir o convento. A vila nova cria-se justamente por causa da construção
do convento.
Lisboa: descrevem-se vários espaços dos quais se destacam o Terreiro do Paço, o Rossio e S. Sebastião
da Pedreira.
Portugal beneficiava da riqueza proveniente do ouro do Brasil. D. João V em decreto de 26 de Novembro
de 1711 autorizou que se fundasse, na vila de Mafra, um convento dedicado a Santo António e
pertencente à Província dos Capuchos Arrábidos.
Ludwig, arquitecto alemão, estava em Lisboa, em 1700, contratado como decorador-ourives, pelos
Jesuítas. Foi a ele que entregaram o projecto do Mosteiro, destinado a albergar 300 frades. A traça do
edifício terá sido executada por volta de 1714-1715 ao passo que a igreja, avançada ate ao zimbório, foi
sagrada em 1730. Outras dependências foram construídas para além da igreja: portaria, refeitório,
enfermaria, cozinha, claustros, biblioteca.
Terreiro do Paço: local onde primeiramente trabalha Baltasar na sua chegada a Lisboa, descrição
pormenorizada e sugestiva da procissão do Corpo de Deus, em Junho. É um espaço fulgurante de vida,
com grande importância no contexto da sociedade lisboeta da época.
Rossio: surge no início da obra, relacionado com o auto-de-fé que aí se realiza. A reconstituição do auto-
de-fé é fidedigna, a cerimónia tinha por base as sentenças proferidas pelo Tribunal do Santo Ofício e nela
figuravam não só reconciliados, mas também relaxados, aqueles que eram entregues à justiça secular
para a execução da pena de morte. O dia da publicação do auto era festivo, segundo se pode constatar
das defesas efectuadas. A procissão propriamente dita saía na manhã de domingo da sede do Santo Ofício
e percorria a cidade de Lisboa antes de chegar ao local da leitura das sentenças, numa das praças
centrais. À frente seguiam os frades de S. Domingos com o pendão da Inquisição. Atrás destes os
penitentes por ordem de gravidade das culpas, cada um ladeado por dois guardas. Depois, os condenados
à morte, acompanhados por frades, seguidos das estátuas dos que iam ser queimados em efígie.
Finalmente os altos dignitários da Inquisição, precedendo o Inquisidor-Geral. A sorte dos réus vinha
estampada nos sambenitos (hábito em forma de saco, de baeta amarela e vermelha que se vestia aos
penitentes dos autos-de-fé) para que a compacta multidão que se aglomerava soubesse o destino dos
condenados.
S. Sebastião da Pedreira: local mágico ao qual só acedem o padre, Bartolomeu Lourenço, o Voador,
Baltasar e Blimunda. É lá que se encontra a máquina voadora que está a ser construída em simultâneo
com o Convento de Mafra. A passarola insere-se na narrativa como um mito, do qual o homem depende
para viver, mito proibido mas que se evidenciará e se deixará ver pelo voo espectacular que se realizará,
mostrando que ao homem nada é impossível e que a vida é uma grande aventura. S. Sebastião da
Pedreira era, àquele tempo, um espaço rural, onde não faltavam fontes, terras de olival, burros, noras, e
onde se situava a quinta abandonada. Ali irão as personagens, variadíssimas vezes e pelas razões mais
diversas.
Personagens
D. João V: proclamado rei a 1 de Janeiro de 1707, casou, no ano seguinte, com a princesa Maria Ana de
Aústria e vive um dos mais longos reinados da nossa história. Surge na obra só pela sua promessa de
erguer um convento se tivesse um filho varão do seu casamento. O casal real cumpre, no início da obra,
com artificialismo, os rituais de acasalamento. O autor escreverá o memorial para resgatar o papel dos
oprimidos que o construíram. Rei e rainha são representantes do poder, da ordem e da repressão
absolutista.
Baltasar e Blimunda: são o casal que, simbolicamente, guardará os segredos dos infelizes, dos
humilhados, dos condenados, enfim, dos oprimidos. Conhecem-se durante um auto-de-fé, levado a cabo
pela Inquisição, o de 26 de Julho de 1711 e não mais deixam de se amar. Vivem um amor sem regras,
natural e instintivo, entregando-se a jogos eróticos. A plenitude do amor é sentida no momento em que se
amam e a procriação não é sonho que os atormente como sucede com os reis.
Baltasar Mateus: de alcunha, o sete-sóis, esteve na guerra de sucessão de Espanha, durante quatro
anos, da qual foi dispensado por ter perdido a mão esquerda em combate. De regresso, começa por
trabalhar no açougue no Terreiro do Paço, em Lisboa. Num auto-de-fé conhece Blimunda, a quem se liga
amorosa e espiritualmente. A convite do padre Bartolomeu Lourenço, ajuda a construir a “passarola”,
sonho que passa também a ser seu. Mais tarde, trabalha nas obras do convento de Mafra, primeiro como
servente e, depois, como boeiro. Após a morte do padre, zela pela preservação da “máquina voadora” e,
um dia, por descuido, é levado ao acaso, acabando por ser queimado 9 anos depois num auto-de-fé pela
Inquisição. Trata-se de um homem do povo, analfabeto e humilde, que aceita a vida tal como esta se lhe
apresenta. Ao longo da acção, vai-se dando conta do seu envelhecimento (XIII).
Blimunda: com poderes que a tornavam conhecedora dos outros nos seus bens e nos seus males,
recusando-se, no entanto, a olhar Baltasar por dentro. Vai ser ela quem, com Baltasar, guardará a
passarola quando o padre Bartolomeu vai para Espanha onde, afinal, acabará por morrer. Ela e Baltasar
sentir-se-ão obrigados a guardá-la como sua, quando, após uma aventura voadora, conseguira aterrar na
serra do Barregudo, não longe de Monte Junto, perdido o rasto do padre que desaparecera como fumo.
Quando voltaram a Mafra, dois dias depois, todos achavam que tinha voado sobre as obras da basílica o
Espírito Santo e fizeram uma procissão de agradecimento. Começaram a voltar ao local onde a passarola
dormia para cuidar dela, remendá-la, compô-la e limpá-la.
Um dia Baltasar foi verificar os efeitos do tempo na passarola mas Blimunda não o acompanhou e ele não
voltou. Procurou-o durante 9 anos, infeliz de saudade, na sua sétima passagem por Lisboa encontrou-o
entre os supliciados da Inquisição, a arder numa das fogueiras, disse-lhe "Vem" e a vontade dele não
subiu para as estrelas pois pertencia à terra e a Blimunda.
Povo: todos os anónimos que construíram a História são representados através daqueles a quem o autor
dá nome: Alcino, Brás, Nicanor, etc.
Padre Bartolomeu de Gusmão: tem por alcunha O Voador, gosto pelas viagens, estrangeirado, a
ciência era, para ele, a preocupação verdadeiramente nobre. O rei mostra-se muito empenhado no
progresso do seu invento. A populaça troça dele, Baltasar e Blimunda serão ouvintes atentos das suas
histórias e sermões. A amizade destes dois seres, simples, enigmáticos, mas verdadeiros protagonistas do
Memorial, é tão valiosa para o padre como necessária à representatividade da obra como símbolo de
solidariedade e beleza em dicotomia com egoísmo e poder.
Baltasar, Blimunda e o padre Bartolomeu Lourenço formam um trio que vai pôr em prática o sonho de
voar. Assim, o trabalho físico e artesanal, de Baltasar, liga-se à capacidade mágica de Blimunda e aos
conhecimentos científicos do padre. Todos partilham do entusiasmo na construção da passarola, aos quais
se junta um quarto elemento, o músico Domenico Scarlatti, que passa a tocar enquanto os outros
trabalham. O saber artístico junta-se aos outros saberes e todos corporizam o sonho de voar.
Scarlatti: veio como professor do irmão de D. João V, o infante D. António, passando depois a ser
professor da infanta D. Maria Bárbara. Exerceu as funções de mestre-de-capela e professor da casa real
de 1720 a 1729, tendo escrito inúmeras peças musicais durante esse tempo. No contexto do romance,
para além do seu contributo na construção da passarola é determinante na cura da doença de Blimunda;
durante uma semana tocou cravo para ela, até ela ter forças para se levantar.
Crítica da guerra: absurda, sacrifica homens em nome de um interesse que lhes é completamente
estranho e abandona-os à sua sorte quando doentes ou estropiados.
Narrador
É maioritariamente heterodiegético, quanto à presença, e omnisciente, quanto à ciência/focalização.
No que respeita à sua posição, não raro profere juízos de valor, opiniões, comentários e divagações pelo
que, neste caso, é subjectivo.
Há, no entanto, momentos em que o narrador empresta a sua “voz” a diversas personagens,
adoptando deste modo o seu ponto de vista (focalização interna): e esta sou eu, Sebastiana Maria de
Jesus… (V); e, eu, patriarca, debaixo dele… (XIII); E eu, vosso rei, de Portugal, Algarves e o resto… (XIII)
O estatuto do narrador assume, por vezes, atitudes aparentemente contraditórias: por um lado, há uma
tentativa de aproximação à época retratada não só através da reconstituição do ambiente vivido,
mas também do vocabulário usado; e, por outro lado, há um distanciamento do narrador, perceptível
no recurso a prolepses, à ironia e a uma actualização ao nível da linguagem. (por exemplo, a narração do
cerimonial respeitante aos encontros sexuais entre o rei e a rainha (I), apesar de retratar o ritual próprio
da época, reveste-se de extrema ironia, o que evidencia um narrador distanciado do tempo histórico
apresentado.
No que diz respeito a actualizações ao nível do vocabulário, o narrador não só utiliza termos usado num
tempo posterior ao da diegese, como os que se prendem com a aviação; mas também procura
explicitar conceitos que, na actualidade, sofreram alterações como é o caso da denominação das
refeições: passou a manhã, foi a hora de jantar, que é este o nome da refeição do meio-dia, não
esqueçamos (VIII).
Trata-se, assim, de um narrador que se movimenta entre o passado, o presente e o futuro; detentor de um
vasto conhecimento que lhe permite controlar a acção e as personagens.
O narratário surge no interior da narrativa, como entidade fictícia, a quem o narrador se dirige, explícita
ou implicitamente. É, portanto, o destinatário da mensagem do narrador.
Ao longo do romance, há momentos em que transparece a ideia de que o narrador participa na
acção – Já passámos Pintéus, vamos no caminho… (XXII) – e outros em que o narrador envolve
igualmente um tu, através do uso da primeira pessoa do plural que ora assume contornos de um eu
nacional e/ou colectivo – nem parecemos aquele país civilizado… (X) – ora se trata claramente de uma
interpelação a um narratário a quem dirige a sua mensagem – Blimunda não nos ouve, saiu já de casa
(XXIV).
Elementos simbólicos
Começando pelo nome das personagens principais, há a referir que em ambas (Baltasar Sete-Sóis e
Blimunda Sete-Luas) é-nos transmitida uma ideia de união, de complementaridade e de perfeição,
traduzidas pela simbologia no número 7. Ambos os nomes representam, também, perfeição, totalidade e
até magia, sugeridas pela extensão trissílaba (e aqui reside a simbologia do número 3, revelador de uma
ordem intelectual e espiritual traduzida na união do céu e da terra).
Vários mutilados surgem na construção do convento, onde se inclui obviamente Baltasar. Tal situação
poderá levar à interpretação simbólica de luta desmedida na construção de algo, como realização de um
sonho. Baltasar, após ter perdido a mão esquerda num episódio bélico, empreende outras lutas: na
construção da passarola e na colaboração na edificação do convento de Mafra. Simbolicamente, a perda
de parte do seu lado esquerdo significou a amputação da sua dimensão mais nefasta, mais masculina,
mais passada; ganhou, assim, uma dimensão mais espiritual, marcada pela perseverança, força, luta e
sentido de futuro que sairá reforçada na associação com Blimunda.
A riqueza interior de Blimunda apresenta-se, simbolicamente, pela força do seu olhar, possuidor de um
poder mágico.
Metaforicamente, surgem as duas mil “vontades” (símbolo de todos aqueles que contribuem para o
progresso do mundo) necessárias para realizar o sonho do padre Bartolomeu. São vontades (nuvens)
estão carregadas de um carácter eufórico (positivo); contudo, de difícil acesso. Só uma personagem como
Blimunda conseguiria interpenetrar neste mundo não material.
Ainda no que concerne à simbologia dos números, o 7 não aparece só associado aos nomes de Baltasar e
Blimunda, como também à data e à hora da sagração do convento, aos sete anos vividos em Portugal pelo
músico Scarlatti, às sete vezes que Blimunda passa por Lisboa à procura de Baltasar, às sete igrejas
visitadas na Páscoa, aos sete bispos que baptizaram D. Maria Bárbara comparados a sete sóis de ouro e
prata nos degraus do altar mor.
O número nove surge também a simbolizar insistência e determinação quando Blimunda procura o
homem amado durante 9 anos. Este número encerra também simbolicamente a ideia de procura pois, o
que realmente acontece a Blimunda após os 9 anos de busca é que reencontra finalmente Baltasar, não
como um encontro físico, mas místico e completo.
Sequência 4
Felizmente Há Luar! de Luís de Sttau Monteiro
As Personagens:
Gomes Freire: homem instruído, letrado ("um estrangeirado"), um militar que sempre lutou em prol da
honestidade e da justiça. É também o símbolo da modernidade e do progresso, adepto das novas ideias
liberais e, por isso, considerado subversivo e perigoso para o poder instituído. Assim, quando é necessário
encontrar uma vítima que simbolize uma situação de revolta que se adivinha, Gomes Freire é a
personagem ideal. Ele é o símbolo da luta pela liberdade, da defesa intransigente dos ideais, daí que a sua
presença se torne incómoda não só para os "reis do Rossio", mas também para os senhores do regime
fascizante dos anos 60. A sua morte, duplamente aviltante para um militar (ele é enforcado e depois
queimado, quando a sentença para um militar seria o fuzilamento), servirá de lição a todos aqueles que
ousem afrontar o poder político e também, de certa forma, económico, representado pela tença que
Beresford recebe (16.000$00 anuais, uma fortuna para a época!) e que se arriscaria a perder se Gomes
Freire chegasse ao poder.
Matilde de Sousa: companheira de todas as horas de Gomes Freire, é ela que dá voz à injustiça sofrida
pelo seu homem. A suas falas, imbuídas de dor e revolta, constituem também uma denúncia da falsidade
e da hipocrisia do Estado e da Igreja. Todas as tiradas de Matilde revelam uma clara lucidez e uma
verdadeira coragem na análise que faz de toda a teia que envolve a prisão e condenação de Gomes
Freire. No entanto, a consciência da inevitabilidade do martírio do seu homem (e daí o carácter épico da
personagem de Gomes Freire) arrasta-a para um delírio final em que, envergando a saia verde que o
general lhe oferecera em Paris (símbolo de esperança num futuro diferente?), Matilde dialoga com Gomes
Freire vivendo momentos de alucinação intensa e dramática. Estes momentos finais, pelo carácter surreal
que transmitem, são também a denúncia do absurdo a que a intolerância e a violência dos homens
conduzem.
Sousa Falcão: é o amigo de todas as horas, é o amigo fiel em quem se pode confiar e que está sempre
pronto a exprimir a sua solidariedade e amizade. No entanto, ele próprio tem consciência de que, muitas
vezes, não actuou de forma consentânea com os seus ideais, faltando-lhe coragem para passar à acção.
Vicente, o traidor: elemento do povo, trai os seus iguais, chegando mesmo a provocá-los, apenas lhe
interessando a sua ascensão político-social. Apesar da repulsa/antipatia que as atitudes de Vicente
possam provocar ao público/leitor, o que é facto é que não se lhe pode negar nem lucidez nem acuidade
na análise que faz da sua situação de origem e da força corruptora do poder. Vicente é uma personagem
incómoda, talvez porque nos faça olhar para dentro de nós próprios, acordando más consciências
adormecidas.
Manuel, Rita: símbolos do povo oprimido e esmagado, têm consciência da injustiça em que vivem,
sabem que são simples joguetes nas mãos dos poderosos, mas sentem-se impotentes para alterar a
situação. Vêem em Gomes Freire uma espécie de Messias e daí, talvez, a sua agressividade em relação a
Matilde, após a prisão do general, quando ela lhes pede que se revoltem e que a ajudem a libertar o seu
homem. A prisão de Gomes Freire é uma espécie de traição à esperança que o povo nele depositava.
Podem também simbolizar a desesperança, a desilusão, a frustração de toda uma legião de miseráveis
face à quase impossibilidade de mudança da situação opressiva em que vivem.
Beresford: personagem cínica e controversa, aparece como alguém que, desassombradamente, assume
o processo de Gomes Freire, não como um imperativo nacional ou militar, mas apenas motivado por
interesses individuais: a manutenção do seu posto e da sua tença anual. A sua posição face a toda a
trama que envolve Gomes Freire é nitidamente de distanciamento crítico e irónico, acabando por revelar a
sua antipatia face ao catolicismo caduco e ao exercício incompetente do poder, que marcam a realidade
portuguesa.
D. Miguel: é o protótipo do pequeno tirano, inseguro e prepotente, avesso ao progresso, insensível à
injustiça e à miséria. Todo o seu discurso gira em torno de uma lógica oca e demagógica, construindo
verdades falsas em que talvez acabe mesmo por acreditar. Os argumentos do "ardor patriótico", da
construção de "um Portugal próspero e feliz, com um povo simples, bom e confiante, que viva lavrando e
defendendo a terra, com os olhos postos no Senhor", são o eco fiel do discurso político dos anos 60. D.
Miguel e o Principal Sousa são talvez as duas personagens mais execráveis de todo o texto pela falsidade
e hipocrisia que veiculam.
Principal Sousa: para além da hipocrisia e da falta de valores éticos que esta personagem transmite, o
Principal Sousa simboliza também o conluio entre a igreja, enquanto instituição, e o poder e a demissão
da primeira em relação à denúncia das verdadeiras injustiças. Nas palavras do Principal Sousa é
igualmente possível detectar os fundamentos da política do "orgulhosamente sós" dos anos 60.
Andrade Corvo e Morais Sarmento: são os delatores por excelência, aqueles a quem não repugna trair
ou abdicar dos ideais, para servirem obscuros "propósitos patrióticos".
Carácter Apoteótico
Carácter excepcional das personagens:
Gomes Freire, pela coragem, determinação e defesa intransigente dos ideais de liberdade;
Matilde de Melo, pela nobreza moral, pelo conflito que vive entre os seus "humanos" sentimentos e a
progressiva consciencialização do seu dever de verdadeira patriota.
A simplicidade da acção e o despojamento cénico.
O desenlace final: o martírio e a morte de Gomes Freire.
Tempo
Tempo histórico: século XIX.
Tempo da escrita: 1961, época dos conflitos entre a oposição e o regime salazarista.
Tempo da representação: 1h30m/2h.
Tempo da acção dramática: a acção está concentrada em 2 dias.
Tempo da narração: informações respeitantes a eventos não dramatizados, ocorridos no passado, mas
importantes para o desenrolar da acção.
Espaço
Espaço físico: a acção desenrola-se em diversos locais, exteriores e interiores, mas não há nas
indicações cénicas referência a cenários diferentes.
Espaço social: meio social em que estão inseridas as personagens, havendo vários espaços sociais,
distinguindo-se uns dos outros pelo vestuário e pela linguagem das várias personagens.
O título
O título da peça aparece duas vezes ao longo da peça, ora inserido nas falas de um dos elementos do
poder - D. Miguel - ora inserido na fala final de Matilde. Em primeiro lugar é curioso e simbólico o facto de
o título coincidir com as palavras finais da obra, o que desde logo lhe confere circularidade.
- Página 131 - D. Miguel: salientando o efeito dissuasor das execuções, querendo que o castigo de Gomes
Freire se torne num exemplo;
- Página 140 - Matilde: na altura da execução são proferidas palavras de coragem e estímulo, para que o
povo se revolte contra a tirania.
Num primeiro momento, o título representa as trevas e o obscurantismo; num segundo momento,
representa a caminhada da sociedade em busca da liberdade.
Como facilmente se constata a mesma frase é proferida por personagens pertencentes a mundos
completamente opostos: D. Miguel, símbolo do poder, e Matilde, símbolo da resistência e do anti-poder.
Porém o sentido veiculado pelas mesmas palavras altera-se em virtude de uma afirmação dar lugar a uma
eufórica exclamação.
Para D. Miguel, o luar permitiria que as pessoas vissem mais facilmente o clarão da fogueira, isso faria
com que elas ficassem atemorizadas e percebessem que aquele é o fim último de quem afronta o regime.
A fogueira teria um efeito dissuasor.
Para Matilde, estas palavras são fruto de um sofrimento interiorizado reflectido, são a esperança e o não
conformismo nascidos após a revolta, a luz que vence as trevas, a vida que triunfa da morte. A luz do luar
(liberdade) vencerá a escuridão da noite (opressão) e todos poderão contemplar, enfim, a injustiça que
está a ser praticada e tirar dela ilações.
Há que imperiosamente lutar no presente pelo futuro e dizer não à opressão e falta de liberdade, há que
seguir a luz redentora e trilhar um caminho novo.
Elementos simbólicos
Saia verde: encontra-se associada à felicidade e foi comprada numa terra de liberdade: Paris, no Inverno,
com o dinheiro da venda de duas medalhas. "alegria no reencontro"; a saia é uma peça eminentemente
feminina e o verde encontra-se destinado à esperança de que um dia se reponha a justiça. Sinal do amor
verdadeiro e transformador, pois Matilde, vencendo aparentemente a dor e revolta iniciais, comunica aos
outros esperança através desta simples peça de vestuário. O verde é a cor predominante na natureza e
dos campos na Primavera, associando-se à força, à fertilidade e à esperança.
Título: duas vezes mencionado, inserido nas falas das personagens (por D.Miguel, que salienta o efeito
dissuador das execuções e por Matilde, cujas palavras remetem para um estímulo para que o povo se
revolte).
A luz: como metáfora do conhecimento dos valores do futuro (igualdade, fraternidade e liberdade), que
possibilita o progresso do mundo, vencendo a escuridão da noite (opressão, falta de liberdade e de
esclarecimento), advém quer da fogueira quer do luar. Ambas são a certeza de que o bem e a justiça
triunfarão, não obstante todo o sofrimento inerente a eles. Se a luz se encontra associada à vida, à saúde
e à felicidade, a noite e as trevas relacionam-se com o mal, a infelicidade, o castigo, a perdição e a morte.
A luz representa a esperança num momento trágico.
Noite: mal, castigo, morte, símbolo do obscurantismo.
Lua: simbolicamente, por estar privada de luz própria, na dependência do Sol e por atravessar fases,
mudando de forma, representa: dependência, periodicidade. A luz da lua, devido aos ciclos lunares,
também se associa à renovação. A luz do luar é a força extraordinária que permite o conhecimento e a lua
poderá simbolizar a passagem da vida para a morte e vice-versa, o que aliás, se relaciona com a crença
na vida para além da morte.
Luar: duas conotações: para os opressores, mais pessoas ficarão avisadas e para os oprimidos, mais
pessoas poderão um dia seguir essa luz e lutar pela liberdade.
Fogueira: D. Miguel Forjaz - ensinamento ao povo; Matilde - a chama mantém-se viva e a liberdade há-de
chegar. O fogo é um elemento destruidor e ao mesmo tempo purificador e regenerador, sendo a
purificação pela água complementada pela do fogo. Se no presente a fogueira se relaciona com a tristeza
e escuridão, no futuro relacionar-se-á com esperança e liberdade.
Moeda de cinco reis: símbolo do desrespeito que os mais poderosos mantinham para com o próximo,
contrariando os mandamentos de Deus.
Tambores: símbolo da repressão sempre presente.