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Prefácio
Cícero Roberto Pereira
Universidade Federal da Paraíba
Os objetos naturais são todos aqueles cuja existência não pode ser
atribuída à ação humana, pois existiriam na natureza mesmo numa
situação hipotética na qual o ser humano não existisse, ainda que as
categorias e os rótulos que lhes atribuímos sejam produtos da ação
humana. São exemplo típicos desses objetos “naturais” aqueles
elementos encontrados na fauna, na flora, nos astros, i.e., tudo que
existe e que não é resultado da ação humana. A formação das
categorias nas quais são alocados os objetos naturais tem como
critério fundamental a percepção de que todos os elementos da
categoria têm uma essência fixa e de muito difícil mudança que faz
com que sejam como são e que assim permaneçam. Os objetos
artificiais, por sua vez, existem porque são o resultado direto da ação
humana. As suas características não podem ser essencializantes
porque são meros artefatos humanos, i.e., são não naturais”, voláteis
e facilmente mutáveis. São exemplos típicos desses objetos os obras
arquitetônicas, a literatura, a arte, a ciência, as religiões, as leis e
normas de conduta. O mais interessante para a análise psicossocial
do problema da exclusão é a presença de um tipo especial de
categorias artificiais, mas que as percebemos como se fossem
naturais. São as categorias sociais, i.e., aquelas formadas por
pessoas.
De fato, a compreensão dos processos psicológicos e sociais
associados ao problema da exclusão se coloca mais explicitamente
quando as informações que recebemos do ambiente envolvem a
percepção de pessoas. Isto é, quando os “objetos” a serem
categorizados são “sociais”. Passamos do domínio da mera
classificação e organização pragmática de objetos, para o universo
da percepção que temos de nós mesmos e das outras pessoas. É o
domínio da categorização social, conceito-chave para uma
compreensão mais aprofundada dos processos psicossociais
associados às origens, às causas e às consequências da exclusão
social. É a categorização social que nos permite perceber como as
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Metodologias e Investigações no Campo da Exclusão Social
Apresentação
Elder Cerqueira-Santos
Ludgleydson Fernandes de Araújo
Capítulo 1
1
http://dgp.cnpq.br/dgp/espelhogrupo/8729572444025191
2 http://reapodere.unilab.edu.br/
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Metodologias e Investigações no Campo da Exclusão Social
negra, dos países do terceiro mundo, dos indivíduos nas periferias, dos
jovens e de outros grupos sociais. De forma interseccional, esse
processo de subalternização do conhecimento e de desumanização
estaria no corpo das mulheres negras periféricas terceiro mundistas
(Brah, 2006). A interseccionalidade funciona como esse prisma de
compreensão das matrizes de dominação que estão articuladas
(Crenshaw, 2002). A origem da desumanização desses marcadores
identitários está no processo de construção da centralidade do Ego
Cogito na ciência e na sociedade ocidental. De acordo com
Quijano (2005), com a colonização e a criação da ideia de América,
o mundo passou por uma transformação global com a estruturação
cognitiva da sociedade em um mundo moderno colonial com uma
base valorativa do homem branco europeu heterossexual. Essa
estrutura surgiu a partir da criação da ideia de raça e de racismo que
antes da colonização era inexistente de maneira global.
Segundo Grosfoguel (2016), para legitimar o genocídio e
escravização da população negra do continente africano e
indígena das América, foi necessário criar a ideia de superioridade
da raça branca europeia, sendo a raça indígena e negra inferiores
e subdesenvolvidas que precisavam ser colonizadas. Dessa maneira,
para o surgimento do “Penso, logo existo” foi necessário existir o
“Conquisto, logo existo”. No entanto, essa conquista somente era
possível com o “Extermino, logo existo” que foi a base da colonização
com a ideia de que os povos sem religião, como a população negra
africana e os indígenas, passaram a ser vistos como povos sem alma
que poderiam ser escravizados, catequizados e assassinados
(Grosfoguel, 2016).
No entanto, essa conquista e extermínio ainda são
constituintes das sociedades ocidentais, a partir da colonialidade.
Quijano (2005) concebe que há um padrão valorativo de base
colonial que configura um sistema cognitivo das sociedades,
situando a branquitude, a masculinidade, o Norte, a
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Metodologias e Investigações no Campo da Exclusão Social
3 Se é razoável supor que toda pesquisa é também intervenção, na medida que a simples presença do(a)
pesquisador(a) interfere no campo pesquisado, afirmar nosso modo de investigar como pesquisa-
inter(in)venção é se lançar ao mergulho no plano das experiências que produzem modos de subjetivação
infantojuvenis e seus cotidianos, atentando inclusive para a análise de nossas implicações nesse processo.
É também criar ou potencializar dispositivos de análise de coletiva das condições psicossociais que
engendram redes e circuitos de violência contra juventudes periferizadas, bem como dispositivos de
experimentações coletivas de processos de singularização e modos de (re)existência infantojuvenis em
contextos onde suas próprias vidas são aviltadas sistematicamente e essas juventudes são posicionadas
como indignas de vida.
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Metodologias e Investigações no Campo da Exclusão Social
4
“O conceito de “máquina de guerra” responde à questão da ambiguidade da “linha de fuga” (que consiste
menos em fugir de uma situação do que em “fazê-la fugir”, em explorar as pontas de desterritorialização):
sua capacidade de se converter em linha de abolição” (Zourabichvili, 2004, p.33).
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Metodologias e Investigações no Campo da Exclusão Social
Considerações Finais
Tendo como objetivo analisar as especificidades da pesquisa
em contextos periféricos, fizemo-lo de modo articulado aos processos
e achados de pesquisa, destacadamente aqueles referentes à
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Metodologias e Investigações no Campo da Exclusão Social
Referências
Capítulo 2
PRODUÇÃO. Fonte:
http://www.pretaenerd.com.br/2017/04/odiadejerusa.htm)
Considerações Finais
Consideramos que não é suficiente justificar a urgência do
estudo do envelhecimento a partir de argumentos demográficos,
atualmente utilizados para representar a velhice como um problema
social. O envelhecer no Brasil tem sido entendido como um “arauto
do apocalipse” fiscal, restringindo a discussão a uma demografia
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Metodologias e Investigações no Campo da Exclusão Social
Referências:
Capítulo 3
Gênero e Desenvolvimento
Das telenovelas da TV aberta às discussões acadêmicas, as
questões de gênero estão em voga nos mais variados espaços.
Discutem-se os significados sobre as identidades sociais e assim,
ainda que restritos, multiplicam-se os espaços de fala das pessoas
com experiência de gênero dissidente. Isso quer dizer,
especialmente, sobre aquelas que transgridem as normas de gênero
pretensamente naturais e reivindicam sua autodeterminação.
Desse modo, cotidianamente, as pessoas trans são
interrogadas sobre aspectos de suas vidas. Postas em uma posição
de explicação, geralmente se veem diante de um outro que
questiona: o que significa ser trans? Em que momento você se
reconheceu trans? Perguntas permeadas pelo imaginário do que
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Metodologias e Investigações no Campo da Exclusão Social
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Momento em que a pessoa se identifica com um gênero diferente àquele atribuído socialmente. (Jesus,
2013).
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Metodologias e Investigações no Campo da Exclusão Social
O Uso da Fotografia
A fotografia nasce do desejo de apreender em um papel a
imagem obtida na câmera escura, de manter o registro daquele
momento de tempo e espaço delimitados. A verossimilhança entre o
que se vê além das lentes e a imagem obtida é a característica que
lhe diferencia de outros instrumentos de representação e, por isso, lhe
foi atribuída credibilidade, um peso do real bem singular. Além disso,
por conta do seu processo de registro, através de reações químicas
e físicas, pressupõe-se neutralidade ao se produzir um retrato da
realidade (Dubois, 1998).
A questão do realismo produziu diferentes discursos sobre a
fotografia, sendo resumidos por Dubois (1998) em três perspectivas.
Inicialmente, a fotografia foi compreendida como uma cópia fiel da
realidade, uma mimese, uma prova documental irrefutável, sendo
utilizado o argumento da neutralidade do processo. Em seguida,
insere-se a questão do fotógrafo como um agente transformador do
real, pois a imagem era um efeito produzido por um olhar que
transmite uma mensagem. E, por fim, a imagem como um traço do
real, no qual
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Metodologias e Investigações no Campo da Exclusão Social
O estudo
Participaram desse estudo três jovens auto-declarados
transsexuais: Iolanda, mulher trans, 23 anos; Benjamin, homem trans,
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Metodologias e Investigações no Campo da Exclusão Social
O que emergiu?
Construir uma narrativa para si implica relacionar esse
passado ao presente, de maneira a abrir possibilidades para um
futuro. Na questão trans, isso também diz respeito a romper com
discursos que buscam homogenizar suas experiências para colocá-
las em caixinhas limítrofes. Desse modo, o método, ao aliar a história
de vida às fotografias do passado, assim como a narrativa livre sobre
o fotografar apareceu como um instrumento potente para se criar
possibilidades de se contar histórias, não em busca da “verdadeira”
história da infância trans, mas de histórias e sentidos outrora
entendidos como desviantes ou inaudíveis, resguardados a uma
gaveta esquecida da memória.
Na primeira fase, a fotografia serviu à memória. Pediu-se aos
participantes que contassem a história de suas vidas e trouxessem
fotos da época. Os dois entrevistados que estiveram diante destas
imagens, correlacionaram-nas as suas histórias e viram emergir em
suas falas afetos e acontecimentos outrora esquecidos. O terceiro
participante utilizou a narrativa livre e as imagens mentais que tinha
da época para expor seus sentimentos atuais e buscou no passado
indícios do presente.
Dos conteúdos relembrados, os três citaram, com frequência,
os momentos de experimentação de gênero através das
brincadeiras. O espaço lúdico se provou privilegiado por permitir,
principalmente nas brincadeiras de faz-de-conta, a troca de papéis
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Metodologias e Investigações no Campo da Exclusão Social
Referências
Capítulo 4
Handelsman, 2012).
Logo, tais achados sugerem que a lacuna de gênero nos
campos STEM não é meramente devido à falta de interesse das
mulheres, e sim porque as pessoas (mulheres inclusive) percebem que
as mulheres têm menos das características consideradas necessárias.
O que é possível concluir é que as escolhas profissionais das mulheres
(e também dos homens) se dão, em grande parte, em função de
estereótipos que se fundamentam na divisão sexual do trabalho. A
consequência disso é que as profissões e carreiras são
compreendidas como destinadas, ora para homens, ora para
mulheres, em função das exigências que acarretam e reforçadas por
processos de socialização e educação sexista.
De acordo com a teoria da congruência de papéis (Eagly,
2004), a incompatibilidade de estereótipos de gênero com
estereótipos ocupacionais e outros papéis sociais são a base do
preconceito e da discriminação contra as mulheres. Entre as
características mais valorizadas no mercado de trabalho estão a
racionalidade, a competitividade e a busca pelo sucesso, as quais o
senso comum e as construções sociais e culturais ainda atribuem
como pertencentes ao universo masculino. Inclusive, há estudos que
apontam que candidatos são vistos como mais valorosos para
organizações quando demonstram características entendidas como
“masculinas”, tais como assertividade, liderança, ousadia, coragem
e “pulso forte”, o que inclusive tende a elevar os salários (Alksnis,
Desmarais, & Curtis, 2008). Já quando o assunto são os cuidados
domésticos e da família, envolvendo a valorização do amor, da
compaixão, da empatia, logo considera-se as mulheres como aptas
para tal, pois essas características seriam “exclusivamente” femininas
(Barreto, 2014). Não por coincidência, ocupações que priorizaram
tais características tendem a ser mais precarizadas e pior
remuneradas (vide o trabalho de professoras da educação básica,
enfermeiras, entre outras).
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Metodologias e Investigações no Campo da Exclusão Social
Considerações Finais
Seguindo a lógica da necessidade de reduzir as disparidades
profissionais baseadas em gênero, é imprescindível o uso de
estratégias metodológicas que possam ajudar a diminuir tais
diferenças. Portanto a criação de ações afirmativas e políticas
públicas que possam auxiliar nessa tarefa é fundamental. É nesse
sentido que se propõe a teoria do Empoderamento Social
(Empowerment) (Rappaport, 1987; 1993; Zimmerman, 1995; 2000) e o
procedimento do Grupo de Discussão (Ibañez, 1979; 1994; Callejo,
1998; 2001; 2002) como alternativa metodológica para se alcançar
tais objetivos. Este modelo teórico-metodológico, comumente
utilizado no âmbito de pesquisa-ação participante e da psicologia
comunitária, enfatiza o protagonismo dos atores sociais e o
compartilhamento mútuo de suas experiências como forma de
estimular a consciência crítica (Callejo, 1998). Produzir mudanças em
contextos sociais historicamente construídos tem-se demonstrado
uma tarefa hercúlea para os pesquisadores sociais e profissionais da
área, sendo necessária a união de modelos teórico-metodológicos e
de intervenção de diferentes matrizes epistemológicas.
Como foi descrito ao longo do capítulo, estudos quantitativos
demonstram, claramente, como os estereótipos de gênero
influenciam no preconceito e na exclusão das mulheres de
determinadas áreas no âmbito do trabalho. Portanto propõe-se aqui
o modelo do empoderamento social, associado à técnica do grupo
de discussão, como forma de produzir ações concretas com o intuito
de realizar mudança social em contextos específicos, como a esfera
laboral por exemplo. As próprias mulheres, através de suas
experiências e de suas contradições, são o elemento central a hora
de se buscar soluções para resolver o problema abordado aqui.
Programas sociais e políticas públicas, nesse sentido, devem ser
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Metodologias e Investigações no Campo da Exclusão Social
Referências
Capítulo 5
Considerações Finais
A associação entre relacionamento abusivo e romantismo
feita por adolescentes é preocupante. Conforme se verificou em
pesquisa nacional realizada por Oliveira et al. (2014), 85% dos
adolescentes participantes admitiram já ter praticado algum tipo de
violência contra o parceiro. Nesse sentido, é importante ressaltar que
a violência vivenciada no namoro é preditora de uma vivência de
violências em relacionamentos na fase adulta, visto ser na
adolescência que os indivíduos tendem a iniciar seus
relacionamentos afetivos-sexuais e manter o padrão ao longo da
vida.
Os resultados apontam para diferentes aspectos e níveis de
legitimação da violência de gênero e a "romantização do ciúme",
sugerindo a importância de intervenções educativas voltadas para
esta população. A ampliação de estudos e intervenções que
foquem na violência psicológica se faz urgente, uma vez que, apesar
de tantos avanços nas políticas públicas de combate a todas as
violências contra a mulher, tal violência ainda é invisibilizada e até
mesmo banalizada por diversos segmentos da sociedade. Ademais,
a violência psicológica tende a perpassar todas as outras violências,
como a física, a patrimonial, a moral e a sexual, que acarretam
sofrimento psicológico para as vítimas. Ainda vale destacar que a
violência psicológica é preditora da violência física, isto é, quando
esta vem a ocorrer, a outra já faz parte da vivência da mulher.
A relevância do desenvolvimento de pesquisas somado à
criação de estratégias metodológicas a fim de dar visibilidade à
violência para a população de adolescentes fica claro nos
resultados dessa pesquisa, principalmente no período de iniciação
afetivo-sexual. Nesse sentido, é importante a reflexão e,
consequentemente, a desconstrução de crenças que favorecem a
manutenção de relações de gênero marcadas pela desigualdade.
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Metodologias e Investigações no Campo da Exclusão Social
Referências
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115
Metodologias e Investigações no Campo da Exclusão Social
Capítulo 6
O L da sigla LGBT
Até o final da década de 1960, a sexualidade humana estava
submissa ás discussões acerca do sexo biológico dos indivíduos
(Nicholson, 2000). O sexo simbolizava a expressão do poder que
disseminava nos processos identitários dos sujeitos as raízes
conceituais do patriarcado. De modo rápido, ampliaram-se os
discursos biologicistas que justificavam as diferenciações sexuais, em
que essa posição constituía o poder da determinação biológica, em
prejuízo da personificação das diferenças da sexualidade (Butler,
1990).
Após a conexão de acadêmicos e dos movimentos feministas
acerca dos estudos de gênero e da sexualidade, começava no
mundo, uma discussão mais intensa e complexa sobre a sexualidade
humana (Haraway, 1991). As discussões de gênero e sexualidade
começaram a apresentar distinções de expressões sexuais e
identidades, independentes do “sexo”, promovendo uma maior
complexidade teórica para a inclusão de novas categorias analíticas
presentes na sexualidade (Marques, Oliveira, & Nogueira, 2013).
Nesse sentido, foi a partir da ampliação dos estudos de gênero e a
intensificação dos debates sobre sexualidade que se passou a
problematizar, de modo menos estatutário, as diversidades sexuais.
No entanto, gênero não é somente um dado, é uma
experiência processual (Butler, 1990). Assim, problematizar a
sexualidade e as questões de gênero, automaticamente se
apresenta a necessidade de uma articulação simbólica acerca da
diferença entre orientação sexual, que se refere a um envolvimento
temporal, sensual e afetivo, com pessoas de sexos opostos e/ou
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Metodologias e Investigações no Campo da Exclusão Social
Considerações Finais
A proposta deste capítulo, de modo geral, impulsionou uma
problemática acerca das representações sociais de mulheres
lésbicas no contexto brasileiro. Desse modo, foi a partir dessa
articulação teórica que se pôde perceber que os estudos sobre as
intersecções que contornam os processos de envelhecimento são
muito restritos. Fenômeno este que ressalta e denuncia um
involuntário tabu que ainda hoje existe quando se trata da temática
velhice de mulheres lésbicas.
Assim, foi-se criado um cenário que possibilitasse uma reflexão
sobre como as representações sociais apontam uma sociedade
preconceituosa ditadora de regras e sobre como cada vez mais é
emergente problematizar a velhice de mulheres lésbicas. Ou seja, foi
possível reconhecer que a sexualidade representa um contexto
dinâmico e composto por modos de subjetivação, corporeidade e o
universo social na experiência lésbica. Desse modo, conclui-se que é
imprescindível que pesquisadores e profissionais da saúde,
educação e de contextos sociais atuem de forma direcionada e
específica na atenção com a pessoa que envelhece, bem como, a
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Metodologias e Investigações no Campo da Exclusão Social
Referências
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Metodologias e Investigações no Campo da Exclusão Social
Capítulo 7
Juliana Fernandes-Eloi
Tainara Rodrigues Teixeira Nunes
Marina Duarte Ferreira Dias
Introdução
O envelhecimento populacional é uma demanda urgente
em todo o mundo e as estimativas são de que a população com 60
anos ou mais irá duplicar até 2050 (Organização Mundial da Saúde,
2017). Devido a essa expectativa de vida elevada, a trajetória dos
estudos sobre o envelhecimento, atualmente, tem sido alvo de
amplas discussões, devido ao significado de viver mais,
acompanhada de uma melhor qualidade de vida. Tal fenômeno
vem sendo manifestado em diversos campos e contextos de
diferentes formas, seja através de debates políticos, do
aprofundamento de pesquisas sobre o envelhecimento e em
questões e reflexões nos âmbitos social e psicológico (Carvalho &
Araújo, 2011; Veras, 2009).
Em vista disso, o Brasil, nos últimos anos, vem tendo relevantes
transformações na alteração demográfica da população idosa,
representando o envelhecimento como um fenômeno marcante e
as projeções são de que em 2030 haja 18,6% de idosos no país e em
2060 com 33,7% (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, 2015).
Estima-se, também, que em 2020 haja 34 milhões de pessoas idosas
no país, representando a sexta população mais envelhecida do
planeta (Minayo & Coimbra, 2002).
134
Metodologias e Investigações no Campo da Exclusão Social
Método
Este estudo possui caráter exploratório e de natureza
qualitativa, por buscar compreender os aspectos do cotidiano, de
forma a investigar, detalhadamente, como os idosos elaboram o seu
contexto (Alvino, 2016; Flick, 2009). Para a realização da pesquisa
empregou-se como procedimento de coleta de dados o grupo
focal, sendo um método que proporciona uma vasta discussão
acerca da temática ou de um ponto específico a partir da
comunicação entre o grupo (Backes, Colomé, Erdmann, & Lunardi,
2011).
Participantes
138
Metodologias e Investigações no Campo da Exclusão Social
Procedimentos Éticos
A presente pesquisa foi submetida ao Comitê de Ética do
Centro Universitário Estácio-FIC, e foi aprovada. As pessoas que
participaram desta pesquisa foram esclarecidas sobre a importância
deste estudo. Após a explicação, foi solicitado a amostra do termo
de consentimento livre e esclarecido (TCLE), conforme as exigências
do Comitê de Ética em Pesquisa.
Resultados e Discussões
Dimensões da Qualidade de Vida: Bem-estar, Satisfação e Saúde na
Velhice.
As relações interpessoais, as práticas de sociabilidades
públicas em lugares e espaços são importantes para o bem-estar e
satisfação na velhice, pois são aspectos que podem vir a fortalecer
e a contribuir na qualidade de vida e suporte social dos idosos.
Acerca disso, Ramos (2002), destaca que o suporte social
desempenha uma função importante, por estar proporcionado e
assegurando a saúde no âmbito físico e mental. Como relatado por
Augusto:
[...] Eu venho pra cá tanto faz jogar como não jogar, eu olho
pra cara desses velho e fico satisfeito, porque eu tô
mangando deles (P2, 76 anos).
[...] O bem estar, é... Relacionamento bom, muito bom, viu.
Influenciam, claro! O homem é um ser social, né, sem o
relacionamento social ele seria, é... (P3, 71 anos).
Você, você ter uma vida social nem que seja aqui jogando
dominó e tudo, no lago, mas tem que ter um convívio social
que também faz parte da integridade da pessoa, da, do
comportamento da pessoa. É só isso, qualidade de vida pra
mim é isso ai viu (P3, 71 anos).
Considerações Finais
Com este estudo, foi possível identificar uma construção rica
de trajetórias, pensamentos, significados sobre o envelhecimento e a
posição que os participantes assumem na sociedade. Diante de um
contexto que desvaloriza a pessoa idosa, carregando uma visão
distorcida e preconceituosa do mesmo (Cachioni & Aguilar, 2008).
Reconhecem assim, um pensamento limitador do que seja a velhice,
mas, ao mesmo tempo, são situações pelas quais muitos dos idosos
passam a viver e tomando para si de forma naturalizada,
transmitindo uma imagem cheia de ideias distorcidas sobre a velhice
e que contribui para acelerar o processo do envelhecimento, pois, a
vivência do preconceito interfere na percepção subjetiva do que
seja qualidade de vida (Couto et al., 2009; Pereira, Teixeira, & Santos,
2012).
No entanto, verificou-se que qualidade de vida na velhice
ultrapassa um simples conceito, que começa a criar forma na
medida em que eles colocam em suas falas vivências, afetividades
e aprendizagens singulares, sendo vivido na relação com a
temporalidade e atemporalidade nos campos: sociedade e
subjetividade. A qualidade de vida é assim, interligado a aspectos
como a saúde, a cultura, a política, as questões emocionais, dentre
outros.
Ou seja, qualidade de vida não envolve apenas questões de
saúde, ou felicidade, contentamento, mas ambos circundam na
interação e formação de outros elementos que também fazem parte
desses pontos, e da maneira subjetiva que cada um compreende
152
Metodologias e Investigações no Campo da Exclusão Social
Referências
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157
Metodologias e Investigações no Campo da Exclusão Social
Capítulo 8
A internet e o ciberativismo
160
Metodologias e Investigações no Campo da Exclusão Social
Considerações Finais
Considerando a importância de compreender as mídias
sociais como campo de pesquisa fértil e útil para a ciência, devido
ao grande impacto da globalização e da comunicação na era
digital, este capítulo se propôs a apresentar reflexões acerca das
possibilidades de investigações em Psicologia Social, a partir dessas
novas formas de comunicação.
Entende-se que foi possível traçar um panorama de pesquisas
recentes que se utilizam ou que têm como conceito principal, o
ciberativismo. A maioria das pesquisas encontradas, centram-se em
métodos como a observação do participante e a análise de
discursos, utilizando-se de inspiração etnográfica. Percebe-se, assim,
a necessidade de investimento das futuras pesquisas em Psicologia
Social em propor métodos diversos para se estudar o ciberativismo,
incluindo formas online e offline. Sente-se falta, também, de métodos
que tragam diversos atores deste processo como os criadores de
conteúdo e aqueles que o consomem.
A Internet traz a possibilidade de pessoas geograficamente
distantes se unirem em prol de um mesmo objetivo, alterando, desse
modo, a forma como as pessoas se socializam e como os grupos são
formados.
Os grupos sociais, independentemente de estarem reunidos
física ou digitalmente, unem-se a partir de questões identitárias. Faz-
se necessário, portanto, olhar para esse ponto como um fator
fundamental na constituição e unidade desses grupos. A partir das
considerações teóricas tecidas aqui, entende-se que o caminho da
173
Metodologias e Investigações no Campo da Exclusão Social
Referências
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Metodologias e Investigações no Campo da Exclusão Social
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177
Metodologias e Investigações no Campo da Exclusão Social
Capítulo 9
Descrição Metodológica
Em uma pesquisa realizada com Empregadas Domésticas por
meio de um roteiro de entrevista semiestruturada e do Teste de
Associação Livre de Palavras – TALP foi possível ter acesso às
elaborações das empregadas domésticas referente à sua profissão;
somado a isso, foi possível conhecer também as representações
sociais construídas por parte de empregadores que participaram da
pesquisa respondendo ao TALP. As 15 empregadas domésticas
entrevistadas foram todas mulheres, com idades entre 19 e 56 anos,
haviam cursado até o Ensino Fundamental, a maioria com a CTPS e
nenhuma residia na casa do empregador. O grupo dos
empregadores foi formado por 11 participantes de ambos os sexos,
com idades entre 28 e 64 anos, todos com curso superior de
escolaridade e mantinham contrato assinado com as empregadas
domésticas.
Em relação à escolha dos instrumentos utilizados, foram
escolhidos a fim de ser utilizada uma abordagem que possibilitasse
analisar as demandas dos participantes a respeito de suas
colocações sobre o tema. O Teste de Associação Livre de Palavras
consiste em um tipo de teste projetivo que permite fazer surgir
espontaneamente associações relativas às palavras exploradas em
relação às representações existentes (Bardin, 2011). O roteiro de
entrevista semiestruturado foi elaborado a partir dos objetivos do
estudo com a finalidade de analisar as justificativas elaboradas a
respeito do tema em questão. Considerando que para cada tipo de
182
Metodologias e Investigações no Campo da Exclusão Social
Considerações Finais
O trabalho, ao longo da história humana, passou por longas
modificações, porém o mesmo não pode ser dito do emprego
doméstico, cujas modificações ao longo do tempo estão sendo
percebidas de formas lentas e pouco perceptíveis. Diante dessa
realidade, observa-se o quanto a trajetória do trabalho para as
classes menos favorecidas está atrelada à questão da sobrevivência
e conquistas de realizações materiais a custa de sofrimentos, na
tentativa da realização de seus planos pessoais (Albuquerque &
Pazinato, 2010).
187
Metodologias e Investigações no Campo da Exclusão Social
Referências
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24 de julho de 1991, a Lei no 5.859, de 11 de dezembro de 1972,
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189
Metodologias e Investigações no Campo da Exclusão Social
Capítulo 10
Thaís Blankenheim
Natacha Führ Ramos
Adolfo Pizzinato
Angelo Brandelli Costa
Resultados e discussão
Sexualidade e gênero na Educação Infantil: as lacunas na formação
Durante todo o procedimento do grupo focal, ficaram
evidentes os descontentamentos das educadoras com a falta de
formação sobre os temas que envolvem sexualidade e gênero
durante os seus cursos de magistério e/ou pedagogia. Frases como
“falta formação”, “a formação inicial eu vejo ainda muito frágil nesse
sentido”, “a gente não tem formação nenhuma na verdade”, “a
197
Metodologias e Investigações no Campo da Exclusão Social
gente fica muito sem saber”, “a gente não olha para isso, né?” foram
muito recorrentes.
Outra questão relacionada, conforme citado pelas
professoras, à falta de formação, diz respeito à dificuldade de
responder tanto às crianças quanto as suas famílias sobre assuntos
que perpassam o cotidiano e as relações família-escola, como pode-
se verificar no seguinte relato:
na barriga. São coisas que eles veem né?”, “às vezes eles se beijam,
por exemplo. As crianças fazem experiências desde muito novinhas,
elas estão se descobrindo, né? Mas a gente se assusta muito”, “eu
tenho uma dúvida sobre até que idade seria adequado eles usarem
o mesmo banheiro... se eu estou despertando (a sexualidade) ou
não... daqui a pouco é coisa nossa também, da nossa cabeça”.
Além da defesa da formação oficial sobre o tema, Oliveira e
Maio (2012) apontam que o/a educador/a deve sempre se manter
informado e atualizado no que diz respeito ao conteúdo, para que
não oriente discussões por informações ultrapassadas. Ademais,
os/as professores/as não devem ditar normas do que é certo ou
errado, ou impor seus valores pessoais. O trabalho com a educação
em sexualidade pode abrir portas para trabalhar o respeito ao
próximo, as relações familiares, a relação com os/as colegas, etc. As
atividades que envolvem as discussões de gênero, diversidade sexual
e sexualidades devem integrar-se às atividades do dia-a-dia, quando
a criança apresenta alguma curiosidade ou tem alguma atitude em
que o/a professor/a considere adequado intervir (Oliveira & Maio,
2012).
Miskolci (2005) afirma que se informar sobre uma temática
envolve um compromisso que o educador pode assumir com a
construção de uma sociedade mais igualitária e justa. O autor
enfatiza a necessidade de buscar fontes de conhecimento, pois a
informação adequada permite que o profissional enfrente alguns
desafios no contato com as diversidades. Ainda se percebe, na
prática, uma abordagem biologicista e heteronormativa ao se
trabalhar a temática na escola. Em relação às/aos professoras/es,
sugere-se a incorporação de discussões sobre a temática de gênero,
sexualidades e diversidades, acompanhadas de um processo
contínuo de formação e sensibilização. As práticas na escola
precisam avançar muito para a promoção de uma educação
201
Metodologias e Investigações no Campo da Exclusão Social
(1) É muito difícil pela experiência que ele tinha ele não
desenvolver... ele não ser um menino homossexual, por
exemplo. Mas eu estou falando isso bem a grosso modo, sem
conhecimento científico nenhum, tá? Ele era uma
sensibilidade até nos gestos corporais. Ele brincava... Ele só
ganhava Barbie da família, ele tinha uma coleção de Barbies.
Ele levava as coisas para a escola, ele levava Barbies. Ele fazia
roupinhas de bonecas, com quatro anos, faixa etária três para
quatro. Ele levava as roupas... as bonecas não tinham
roupinhas na escola e ele levava as roupinhas, ele fazia com
a avó dele as roupinhas e levava para a escola. E ele era uma
sensibilidade..., mas assim, ele era um menino de uma
delicadeza, eu digo como ser humano, não por.... Eu jamais
taxaria ele. Porque eu tinha medo, muito medo do que dizer,
por eu não ter conhecimento eu estar taxando a criança
como uma coisa que podia passar, podia ser uma fase dele!
Só que a vida dele, na casa dele, era uma vida de consumos
202
Metodologias e Investigações no Campo da Exclusão Social
Considerações finais
Considerando o ambiente proporcionado pela técnica do
grupo focal, permitiu-se interação entre os membros do grupo e
observou-se que as informações prestadas pelas integrantes
estimulavam as demais a falar sobre o assunto. O debate entre o
grupo enriqueceu a qualidade das informações, pois o fato de se
encontrarem em um grupo de iguais deu segurança para que as
participantes expressassem suas opiniões, com respostas
espontâneas e genuínas e, além disso, sentiram-se à vontade para
compartilhar algumas de suas vivências com o grupo.
Os resultados apontaram, além de lacunas, a inexistência do
assunto na formação oferecida pelos cursos de magistério e
pedagogia, o que resulta em insegurança das professoras no manejo
do tema, com as crianças e famílias. As dúvidas mais frequentes, e
que necessitam de abordagem em intervenções e formações, são
relacionadas às condutas apropriadas em situações em que as
crianças rompem as fronteiras socialmente estabelecidas como
205
Metodologias e Investigações no Campo da Exclusão Social
Referências
Capítulo 11
Método
O estudo é de abordagem qualitativa e tem como objetivo
apresentar os desafios e as perspectivas na trajetória profissional de
professoras travestis e transexuais em Rondônia a partir do viés da
psicologia social. O método de coleta de informação ocorre a partir
de três técnicas indispensáveis: o encontro focal, entrevistas
narrativas individuais e registro de informações em um diário de
campo, sendo as duas primeiras captadas por meio da utilização de
vídeos como instrumento de coleta de dados.
A primeira interação entre as participantes ocorreu a partir de
um encontro focal com cinco professoras travestis e transexuais,
realizado em uma sala de aula do Instituto Estadual de Educação
Carmela Dutra, em Porto Velho, Rondônia, no dia 01 de setembro de
2018. O critério de seleção do local para o encontro ocorreu a partir
de dois aspectos fundamentais: o primeiro foi em razão da escola
está localizada no centro da cidade facilitando o acesso de todas
as participantes. Outro aspecto fundamental para a escolha do local
foram os fundamentos históricos da formação de professores em
Rondônia por se tratar de uma escola criada em 1947 como Escola
Normal do Guaporé destinada para formação de professores.
O encontro focal teve a duração de 45 minutos e contou com
registro de imagens, vídeos e sons como técnica de captação das
informações. Todas as participantes foram convidadas
anteriormente e foram informadas quanto aos objetivos da pesquisa
e a importância da participação de todas. A partir do avanço da
investigação, a pesquisa se consolida como forma de compreensão
dos desafios na trajetória de vida escolar das participantes e os seus
delineamentos quanto à escolha do magistério como profissão e a
217
Metodologias e Investigações no Campo da Exclusão Social
Participantes
218
Metodologias e Investigações no Campo da Exclusão Social
Quadro 2
Tema 1: Caracterização da construção e afirmação da
identidade de gênero
Quando
Identificação Onde aconteceu Como aconteceu
aconteceu
Nas relações de
Fase adulta, aos trabalho, embora Após independência
Professora A 30 anos de sempre teve financeira e de modo
idade. conhecimento da prazeroso
identidade transexual
No espaço universitário
Na
associado com a
adolescência, Na busca pelo
Professora B aquisição de
entre 13 e 14 conhecimento acadêmico
conhecimento e
anos
compreensão crítica.
Nos grupos de
Na
movimento social LGBT Sinto que está em eterna
Professora C adolescência,
com ações e projetos de construção
com 15 anos.
garantia de direitos.
Na família, no convívio
Desde os 7 anos com os próximos. Com as experiências e a
Professora D
de idade Sempre foi vista como família.
menina
Convívio com amigos de
Na infância, aos Desde menina na escola, professores e
Professora E 12 anos de escola, em casa e com demais profissionais. Minha
idade. toda a família. família não foi difícil para
aceitar.
Fonte: Elaborado pelos autores/2018.
Quadro 3
Tema 2: Caracterização da escolha da docência como
profissão
Identificação Quando aconteceu: Situações Relevantes
“Parecia que o que era difícil pra mim era o que seria bom, que era estudar”.
Na infância o pai retirava os filhos da escola para trabalhar na roça.
Professora A Entretanto, uma vizinha a matriculou e deu o primeiro caderno. Aquele desejo
de ir pra escola na infância fez com que surgisse o desejo de tornar-se
educadora e recompensar a vizinha que a tirou da roça para a sala de aula.
Na infância nasce o desejo de ser professora a partir da afetividade pela
professora do “primário”. Nas brincadeiras de infância sempre queria ser a
Professora B
professora e já imitava a forma como a professora mexia nos cabelos e
cruzava as pernas.
“Minha família sempre teve receio de que eu entrasse na vida de prostituição
e sofresse violência”. Os pais pagaram uma faculdade de Pedagogia e logo
Professora C
que concluiu o curso foi aprovada em um concurso público no interior do
Estado de Rondônia onde trabalha como professora dos anos iniciais até hoje.
O exemplo das irmãs professoras de matemática fez com que surgisse o desejo
Professora D de ensinar. Com o trabalho e a ajuda dos pais conseguiu pagar a faculdade
de Matemática e se tornar uma professora trans.
A família teve oportunidade de contribuir na formação da filha com boas
Professora E escolas. O desejo em se tornar professora surgiu a partir da comunicação e o
estudo de novas línguas.
Fonte: Elaborado pelos autores/2018.
Relata que por não ser filha biológica, passou por “maus
bocados” que lhe serviram de incentivo para concluir os seus estudos
e ingressar no curso de Licenciatura em História na Universidade
Federal de Rondônia, UNIR. Atualmente, após enfrentar todos esses
desafios, a professora cursa doutorado no Programa de Pós-
graduação em História pela Universidade Federal do Rio Grande do
Sul, UFRGS.
Eu olhava pra mim e dizia: eu não sei dançar, não sei fazer
outra coisa. Só me resta estudar. Passei em um concurso e fui
trabalhar num órgão federal. Ganhava um salário razoável.
Mas eu percebi que o trabalho que eu fazia não me dava
prazer, não era o que eu gostava. Ai eu pensei: vou fazer
vestibular. Fiz o vestibular após ter terminado o ensino médio
pelo supletivo. Fiz o vestibular e ao mesmo tempo eu fiquei
sabendo que aqui na escola Carmela Dutra ia ter um curso
de magistério para pessoas que já tinham o ensino médio que
seria somente uma complementação pedagógica. Era o
magistério especial. Daí eu disse: eu vou fazer. Assim que
236
Metodologias e Investigações no Campo da Exclusão Social
Considerações Finais
O estudo propôs apresentar, de modo qualitativo, os desafios
e perspectivas de professoras travestis e transexuais que atuam em
escolas da rede pública estadual e municipal no Estado de
Rondônia, tendo como instrumento de coleta a realização de um
grupo focal e entrevistas individuais.
Entretanto, a trajetória e história de vida destas cinco
professoras foram de fundamental importância para a construção
dessas perspectivas. Isso porque os desafios para o exercício da
docência deram início durante o surgimento do desejo em serem
professoras, mesmo sabendo os desafios que seriam enfrentados
nesta trajetória.
Importante destacar que a construção da identidade de
gênero destas professoras esteve marcada com o desejo pela
docência acompanhado com as marcas da exclusão escolar, tanto
pela família (deixando de matricular seus filhos para trabalhar na
agricultura), nas proibições ao uso de roupas adequadas a
identidade de gênero, assim como todas as formas de exclusão de
direitos enquanto estudantes associadas à violência e à
discriminação. As diferentes formas de exclusão, vivenciadas pelas
docentes, foram utilizados como referência no combate às
desigualdades, fazendo com que cada uma delas chegassem à
conclusão dos seus estudos até a aprovação em concurso público.
Em outras palavras, foram os desafios que levaram estas
docentes ao êxito profissional. Entretanto, com base nos relatos e
experiências, a trajetória de estudantes cis-hetero nas escolas
239
Metodologias e Investigações no Campo da Exclusão Social
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241
Metodologias e Investigações no Campo da Exclusão Social
Capítulo 12
A Inserção Ecológica
Para a realização deste estudo, utilizou-se um desenho
metodológico de natureza qualitativo. Foi escolhido o Modelo
Bioecológico do Desenvolvimento Humano, proposto por Urie
Bronfenbrenner (2011), que tem como delineamento quatro
componentes interdependentes que são o processo, a pessoa, o
contexto e o tempo.
Pode-se perceber que, neste estudo, o processo pode ser a
configuração das relações de violência existentes no microssistema
(violência familiar) e no mesossistema (violência escolar e
comunitária); a pessoa é representada pelos sujeitos da pesquisa,
com suas particularidades biopsicológicas e características
ambientais; o contexto pode ser entendido como a interação de
todos os sistemas, ou seja, o microssistema, o mesossistema, o
exossistema e o macrossistema, unidos, compõem o meio ambiente
ecológico. E o tempo que pode ser considerado o tempo histórico,
em relação aos fenômenos contemporâneos da violência, da
pobreza, das relações familiares e comunitárias, como também o
tempo do sujeito, do adolescente em desenvolvimento.
Essa é uma proposta de levantamento com Inserção
Ecológica como modelo de investigação, que acontece a partir da
observação naturalística, em que os pesquisadores se inserem no
246
Metodologias e Investigações no Campo da Exclusão Social
Locus da Pesquisa
O estudo foi realizado em uma comunidade de baixa renda,
na cidade de Fortaleza-CE, tendo como palco inicial uma escola
estadual. A escolha desse lócus se deu por conveniência e em
função da referida comunidade estar localizada em um espaço que
é considerado pela mídia jornalística e pelos próprios moradores
como violento. Portanto, centralizar inicialmente a atenção no
espaço da escola se justifica porque neste cenário diversos casos de
violência são detectados, diariamente, pelo núcleo gestor. Assim,
este espaço escolar é terreno fértil para elencar os participantes que
possam ter em suas relações ações de violência, podendo assim
fazer parte da amostra.
Participantes da Pesquisa
Participaram da pesquisa, adolescentes, alunos da escola
supracitada, com faixa etária entre 14 a 18 anos, de ambos os sexos,
e a família desses adolescentes, que constitui, na perspectiva
ecológica, o microssistema familiar. Participaram também os
professores que trabalham na escola, constituindo assim pessoas que
fazem parte do micro e mesossistema dos adolescentes.
O número de famílias, de adolescentes e de professores que
participaram da pesquisa estava imbricado a duas turmas que foram
sorteadas, uma para o turno da manhã e outra para o da tarde. A
pesquisa aconteceu com alunos, pais e professores do 1º ano do
Ensino Médio, a “amostra” foi aleatória e por conveniência. Dessa
forma, foram entrevistados 10 alunos do turno da manhã e 10 alunos
do turno da tarde.
247
Metodologias e Investigações no Campo da Exclusão Social
Procedimentos Éticos
Foram seguidas todas as recomendações éticas da
Resolução 510/16 do Ministério da Saúde. O projeto foi encaminhado
ao Comitê de Ética em Pesquisa, o qual foi aprovado com o parecer
de número 3.169.957.
Caracterização do aluno
Esta categoria retrata sobre as características dos alunos em
relatos feitos pelos próprios alunos e por professores. Foram
observadas, na análise das respostas dos alunos às entrevistas, que a
maioria dos adolescentes gosta da escola, por ser perto de casa,
pelos amigos e porque a escola impõe limites.
Dentre os relatos dos alunos, podemos destacar que alguns
consideram que a escola proporciona um “bom ensino”. Porém,
outros relatam que a dificuldade de seu aprendizado se deve à
didática do professor. Os escolares também pontuam que precisam
ser mais respeitados e que deveriam participar de forma mais efetiva
das decisões organizadas pela gestão da escola.
Para o aluno Lucas, “a escola é uma boa oportunidade, às
vezes a gente não dar valor o que tem, mas a escola é boa, o ensino
é bom”. No entanto, para outro aluno chamado Claive, tem um
significado diferente, ele relata que
é chato ir para a escola, o que me faz ter vontade é só pra
encontrar com meus amigos. Eu já estou repetindo o ano, ai
tenho que me esforçar um pouquinho. Tenho desinteresse
porque não entendo nada da aula, porque parece que o
professor explica só pra ele mesmo, tudo é muito rápido.
que dos alunos. Assim, ele não faz com que a violência cesse
(Aluno X).
De acordo com o relato do aluno, podemos perceber que
eles apreciam o professor que demonstra interesse pela
aprendizagem e solicita comportamento adequado na sala de aula.
Destaque para a afetividade sem perda de autoridade fato esse
verificado em estudo recente de Lira, Cerqueira e Gomes (2016), os
professores, embora preocupados com questões de ensino e de
aprendizagem, mostram-se frágeis em lidar com os conflitos em sala
de aula e acabam deixando os alunos resolverem seus conflitos ou
fingem que não percebem o que está acontecendo.
Na observação relativa aos momentos de avaliação escrita,
dois aspectos se destacam: a preocupação pela aprendizagem e a
fragilidade no interesse pelos alunos em situação de recuperação.
Alguns alunos nem tentavam resolver a prova, apenas colocavam
seu nome e argumentavam dizendo: “não vou fazer mais não tia,
não sei fazer. Já vou reprovar mesmo” (Danilo - aluno). As
reprovações nas escolas, principalmente nas públicas, tem sido um
problema na Educação Básica. Os adolescentes se mostram
desinteressados e sem muitas expectativas de futuro. O abandono
dos estudos, pelos adolescentes, no Ensino Médio, é motivo de
preocupação para o Estado (Fritsch, Vitelli, & Rocha, 2014).
Os adolescentes citaram, também, situações de preconceito.
Ao conversar com um aluno do 1º E, o mesmo relatou: “eu demonstro
ser uma coisa que eu não sou, porque se eu demonstrar ser um
homem sensível, que não pego todas, que não bebo etc, não sou
aceito pelos meus colegas” (Luke - aluno). Uma aluna do 1º A
também relatou que não consegue ser ela mesma na escola e diz:
“me sinto rejeitada pela minha família e não quero ser rejeitada
também na escola, então finjo ser a pessoa mais feliz do mundo, que
vivo muito bem e que sou muito feliz, porque se eu me mostrar como
sou triste eles também vão me rejeitar” (Barbie - aluna). Pode-se
252
Metodologias e Investigações no Campo da Exclusão Social
Caracterização do professor
Nesta segunda categoria, serão abordadas as características
dos professores, tendo como relatos os próprios professores, alunos e
pais. Foi possível observar que os professores se sentem cansados
com a carga horária que precisam assumir, destacando que muitos
trabalham os três expedientes.
Os professores demonstram ter medo de trabalhar na
comunidade e explicitam que não podem exigir muito dos alunos
porque não sabem o “que eles são capazes de fazer, caso sintam
raiva do professor”. Sendo assim, uns são mais exigentes, enquanto
outros preferem seguir um perfil mais liberal.
Sabe-se que a violência é um fenômeno social presente nas
ações que se manifestam nas relações sociais, que pode ser por
conflitos de comunicação, de poder ou mesmo por experiências de
vida de cada pessoa, levando em consideração os fatores históricos,
sociais, biológicos e pessoais (Assis & Marriel, 2010). Então, pode-se
inferir que a maneira como os professores se sentem ou enfrentam a
violência na escola pode estar relacionada também com sua
individualidade.
Pesquisa norte-americana, The APA Task Force on Violence
Directed Against Teachers, assinala que dos 2 mil professores
investigados sobre a experiência de violência na escola, 80% relatou
ter sofrido pelo menos uma experiência de violência no último ano,
sendo 94% praticadas por alunos (Mcmahon et al., 2014). A violência
no espaço de trabalho tem consequências na saúde física e
psicológica, além de prejudicar os objetivos mais amplos da escola,
como educar, ensinar e aprender (Becker & Kassouf, 2016).
Durante esta pesquisa não foi presenciado nenhum conflito
dos professores com os alunos, eles se mostravam receptivos com os
255
Metodologias e Investigações no Campo da Exclusão Social
Caracterização da família
Esta categoria trata sobre a relação do aluno com sua família.
Essas informações foram adquiridas nas entrevistas com alunos, com
professores e com os pais dos alunos. Nas entrevistas com os pais,
somente duas mães compareceram para participarem da pesquisa.
Os alunos entrevistados comentam que sentem falta da
atenção dos pais, e que essa atenção poderia ajudá-los a melhorar
seu comportamento na escola, o aluno X relata: “Eu acho que
precisa sim os pais serem mais atenciosos com os filhos, isso iria ajudar
na educação aqui na escola”. Eles relataram também que se sentem
seguros junto à família, somente a aluna Renata teve uma opinião
contrária. Ela disse que não se sente segura, pois é muito difícil a
relação com os irmãos, eles são agressivos, e apenas se sente segura
na presença de sua mãe.
Quanto à relação dos alunos com os pais no ambiente
doméstico, eles disseram que sofrem violência física e verbal. A aluna
Raissa, disse ter sofrido violência física: “Sofri uma violência muito
grande do meu pai, que me bateu muito. Isso só criou revolta. Fiz tudo
para mostrar pra ele que eu não era como ele pensava”. Pode-se
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Metodologias e Investigações no Campo da Exclusão Social
porque meu pai usa e me dá, ele compra pra mim e ele” (aluno da
escola – conhecido dessa mãe). A mãe continua falando do
exemplo e conclui: “Já vi ele vir pra escola drogado. Ele disse
também, que na casa dele todo mundo é agressivo, que o irmão
dele é matador”.
Com as declarações dessa mãe podemos observar que ela
concorda com a opinião dos professores, de que a violência na
escola tem como fomento a violência familiar.
Caracterização da comunidade
Esta categoria discute sobre as características da
comunidade onde a escola está inserida, os relatos foram feitos pelos
alunos, por professores e por pais. Foi observado, nas entrevistas, que
os alunos sentem medo de viver na comunidade, pois a “violência
pode ser encontrada em qualquer esquina”. Demonstram tristeza em
constatar que as pessoas que promovem a violência na comunidade
foram seus amigos na infância. Pode-se então observar que a
violência comunitária também acontece pelas mãos dos
adolescentes.
Pesquisas apontam que os adolescentes estão mais
vulneráveis à violência familiar e à comunitária do que outras faixas
etárias (UNICEF, 2012). Assim, a violência na adolescência, seja como
perpetrador ou vítima deve ser percebido como um grave problema
de saúde pública (Braga & Dell’Aglio, 2012).
Os alunos apontam que as facções são o maior problema em
termos de provocar violência, pois atinge quem faz parte das
facções e quem não faz parte. A aluna Lorena relata: “domingo fui
à casa de um amigo no outro bairro e fiquei morrendo de medo da
outra facção. Não importa se você é envolvida ou não. E eles sabem
quem é do bairro e quem não é”.
Esse é um dos motivos que os alunos não se sentem seguros
na comunidade, temem serem atingidos pelas facções, pelo crime,
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Metodologias e Investigações no Campo da Exclusão Social
Concepções de violência
Nesta categoria estão reunidos os relatos dos participantes
que indicam tanto sua compreensão em relação às concepções de
violências como as possíveis ações de enfrentamento que poderiam
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Metodologias e Investigações no Campo da Exclusão Social
Considerações Finais
O estudo constatou que as manifestações de violência se
apresentam em diversas facetas, entre os próprios alunos, entre
alunos e professores, entre alunos e a família, entre alunos e a
comunidade. Sendo assim, a violência aparece de forma sutil ou
direta, através de agressões verbais ou físicas, entre alunos e seus
pares como também entre alunos e professores.
As atividades educativas e projetos desenvolvidos na escola
proporcionam, aos adolescentes, informações sobre os tipos de
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Metodologias e Investigações no Campo da Exclusão Social
Referências
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