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2020
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RESUMO
Essa breve dissertação tem como objetivo identificar elementos da concepção de visão
beatífica no exórdio (aqui considerado o primeiro parágrafo do primeiro livro) das Confissões
e discorrer sobre eles. Para tanto, faz-se necessário discorrer também sobre a relação entre os
seres humanos e Deus. Portanto, será brevemente analisado o que o exórdio das Confissões
tem a dizer sobre a condição do homem ante si mesmo e Deus, os atributos divinos, e o
abismo ontológico e moral entre Deus e os seres humanos — entretanto, isso será feito com
brevidade.
Palavras chave: Confissões; Agostinho; visão beatífica; condição humana; atributos divinos.
1.INTRODUÇÃO
No exórdio das Confissões vemos claramente um contraste abissal entre o ser de Deus
e o ser do homem — que se repetirá por toda a obra. Aquele é descrito como: “Tu és grande,
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Senhor, e demais louvável. Grande é tua potência, e tua sabedoria é inumerável”; enquanto
este é “fragmento qualquer de tua criação, e anda em círculos carregando sua mortalidade”.
Entretanto, uma oração estabelece o princípio de uma relação entre esses seres completamente
distintos: “Quer te louvar o homem”.
Agostinho afirma que apesar da distância ontológica abissal entre Deus e os homens,
estes querem louvar aquele. E o homem é fruto da criação divina. Há aqui ao menos a
tentativa de um relacionamento pessoal1 entre criatura e seu criador. Deus não é o Uno
impessoal, e o homem não é autônomo, autossuficiente, e livre de seu criador, pois foi feito
“rumo a ti”. Uma relação pessoal entre Deus e o homem é aqui esboçada: o homem quer
louvar a Deus, e Deus, que é “demais louvável2”, fez o homem para louvá-lo.
Entretanto, como fica evidente nesse exórdio, a distância ontológica, e até mesmo
moral (“[o homem] anda em círculos carregando a prova de seu pecado e a prova de que tu
resistes aos soberbos”), torna essa fruição humanamente impossível. Deste modo, faz-se
necessário analisar mais a fundo esse abismo ontológico e moral.
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volitivo, dotado de vontade; mas, não uma vontade livre e suficiente para tomar a direção que
venha a estabelecer para si e se satisfazer nela, mas que é direcionada a louvar a Deus. Isso é
de extrema importância para antropologia agostiniana, pois revela que o homem não foi feito
para si mesmo, mas para outrem, para louvar o seu criador. Revela que a vontade humana não
é livre, porque não se satisfaz em si mesma, mas precisa louvar a Deus, e, se não o faz, por
causa de sua condição depravada, temos que ela é desviada desde seu âmago para uma
direção contrária àquela que foi estabelecida originalmente, e por isso “anda em círculos”. O
homem não é, por esses motivos, um ser autônomo, e sua vontade é cativa e intrinsecamente
direcionada.
Segundo, “fragmento qualquer da tua criação”. O homem é parte, não todo. O homem
é pequeno, não grande. É parcela de algo muito maior. E como parte, ele não é completo em
si mesmo. O homem não é “ser em si mesmo”, mas um fragmento da criação Daquele que é.
[imagine] uma flecha em movimento, porém não a esmo ou sem rumo. Pelo
contrário, trata-se de uma flecha lançada na direção de um alvo específico.
Essa imagem poderia ser didaticamente explicitada da seguinte maneira: (1) o
cor nostrum [nosso coração] é como uma flecha; (2) o inquietum est cor
nostrum [o coração é inquieto] indica que o nosso coração não é como uma
flecha que está em repouso, mas, sim, como uma flecha em movimento e na
direção da um alvo específica; (3) o resquiat in te [repousar em ti] tem de ser
compreendido como a flecha no exato momento 4 em que atinge seu destino.
Nesse caso, o coração encontrará repouso apenas quando reencontrar sua
origem e, ao mesmo tempo, seu destino último. (MADUREIRA, p.75-6)
Nosso pensamento não pode estar plenamente satisfeito, nossa vida não pode
ser verdadeiramente chamada de feliz, a não ser que o conhecimento perfeito
do Espírito Santo, que conduz à Verdade, no gozo dessa Verdade e, graças a
Verdade, na união com a Medida suprema da qual ela procede: Espírito,
Verdade e Medida, que são apenas uma única substância, em só Deus
(GILSON, p.23).
Desse trecho do Gilson temos que nosso pensamento, ou seja, a nossa mente, não
encontra repouso, estabilidade e paz, sem o conhecimento do Espírito Santo, que é a pessoa
da Trindade que consola os fiéis, como afirma o texto bíblico: “mas o Consolador, o Espírito
Santo, a quem o Pai enviará em meu nome, esse vos ensinará todas as coisas e vos fará
lembrar de tudo o que vos tenho dito. Deixo-vos a paz, a minha paz vos dou; não vo-la dou
como a dá o mundo. Não se turbe o vosso coração, nem se atemorize” (Jo 14.26,27). Ou seja.
Somente através da relação com Espírito Santo, somos conduzidos à verdade, que consiste em
“todas as coisas” ensinadas por Jesus Cristo, o Filho. O conhecimento perfeito do Espírito
Santo, portanto, consiste em andar em tudo que Jesus Cristo falou.
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A visão beatífica, a beatitude, consiste no conhecimento de Deus. Mas esse
conhecimento não é meramente intelectual, nem tampouco basta adicionar afetividade a ele.
O conhecimento de Deus necessário para a beata vita é mais bem traduzido como uma
experiência profunda e mística5 com Deus, que de modo algum é incompatível com o
intelecto, mas vai além dele.
Só é feliz o coração que repousa em Deus, e ele repousa ao invocar a Deus. Invocar a
Deus manifesta a existência de um relacionamento com Deus. Entretanto, isso levanta outro
problema. Dado que o homem, como foi dito, é miserável e “carrega a prova de seu pecado” e
sua “soberba” (o efeito da Queda), como pode ele se unir a Deus invocando-O? Seria o
homem capaz de tal proeza?
A obra mais ampla de Agostinho é clara nesse aspecto. Entretanto, como a finalidade
desse trabalho é analisar o exórdio das Confissões, o foco recai sobre a seguinte frase:
“Invoca-te, Senhor, a minha fé, que tu me deste, que me inspiraste pela humanidade de teu
filho e pelo ministério de teu anunciador”. Nessa frase fica evidente o meio pelo qual se é
possível “invocar o Senhor”: a “minha fé”. Entretanto, o foco aqui não é definir o que seja fé,
mas o que Agostinho diz em seguida: “que tu me deste, que me inspiraste pela humanidade de
teu filho e pelo ministério de teu anunciador”. Agostinho não atribui essa fé ao homem, mas a
Deus, provavelmente ecoando uma passagem bíblica: “Porque pela graça sois salvos, por
meio da fé; e isso não vem de vós; é dom de Deus” (Ef 2.8). A fé é dada por Deus. Não é
fruto do esforço humano, nem um método a ser seguido. O homem é tão miserável e
suficiente que por si mesmo não pode ter fé em Deus para invocá-lo e repousar seu coração
Nele. A fé é dada por Deus e inspirada “pela humanidade de teu filho e pelo ministério de teu
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A palavra “mística” está relacionada ao mistério. E aqui é entendido como o âmbito espiritual e supraracional
da experiência com o divino
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anunciador6”. Ou seja, a fé é fruto da ação de Deus em reconciliar o homem por meio de Seu
Filho Jesus Cristo, o Deus homem: o mediador entre Deus e os homens.
Por fim, a discussão sobre a visão beatífica no exórdio das Confissões realizada nesse
trabalho pode ser sintetizada nas seguintes observações. É só invocando a Deus que o homem
encontra repouso para seu coração inquieto, findando sua miserabilidade. Entretanto, por
conta da sua condição pecaminosa (os efeitos da Queda) ele é incapaz de fazer isso por si
mesmo, necessitando da intervenção divina para reconciliá-lo lhe dando a fé para invocar a
Deus.
4.CONCLUSÃO
5. BIBLIOGRAFIA
AGOSTINHO. Comentário aos Salmos: Salmos 101-150. São Paulo: Editora Paulus, versão
ebook kindle.
FERREIRA, Franklin; MYATT, Alan. Teologia Sistemática. São Paulo: Edições Vida Nova,
2008
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É difícil afirmar categoricamente a quem Agostinho se refere com o termo “teu anunciador”. Pelo que foi dito
nesse mesmo parágrafo das Confissões (“Ou como acreditarão, se ninguém anunciou?”), o termo parece se
referir ao ministério genérico dos pregadores do Evangelho. Isso corrobora com o uso do termo em alguns
trechos bíblicos, em que “anunciador” vem acompanhado da expressão “boas-novas”, que é um eufemismo
para Evangelho (Cf. At.17,18; Is 40,.9;41.27)
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GILSON, Etienne. Introdução ao estudo de Santo Agostinho. 2ªed., São Paulo: Discurso
Editorial, 2007.
MADUREIRA, Jonas. Inteligência Humilhada. São Paulo: Edições Vida Nova, 2017.
SAGRADA, Bíblia. tradução de João Ferreira de Almeida. São Paulo: Sociedade Bíblica do
Brasil, v. 2, 1969.
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