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uas iniciativas da Organização das Nações Unidas (ONU) avançaram
sugeridos pela ONU.
na agenda técnica e político-institucional sobre as cidades, colocando
a necessidade de os países e seus institutos de geografia e estatística A perspectiva geográfica sobre os indicadores de cidade sustentáveis no Brasil
revisarem conceitos e métodos para se pensar e produzir informações sobre o nos remete, inicialmente, à própria análise de algumas dimensões espaciais que
espaço urbano na contemporaneidade. moldaram o processo de urbanização e de diferenciação das cidades no imenso
território brasileiro, aí incluída a questão da configuração e da hierarquia da
A primeira iniciativa foi a Resolução adotada em 25 de setembro de 2015, pela
rede urbana nacional, além daquela relativa à formação das concentrações
Assembleia Geral das Nações Unidas, propondo a Agenda para o
urbanas no país.
Desenvolvimento Sustentável para 2030, com o estabelecimento de 17
Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) e 169 metas. Cada um dos 17 Afinal, nunca é demais lembrar que as cidades e a intervenção sobre elas tem
ODS implica a produção de uma série de indicadores que subsidiarão a ação das uma importância decisiva para a dinâmica espacial e, portanto, para o
diferentes esferas de poder do Estado, assim como o acompanhamento e a desenvolvimento regional e nacional (EGLER, 2010), principalmente quando
participação da sociedade civil, no cumprimento das metas estabelecidas pela considerada na dimensão da sustentabilidade socioambiental.
ONU. A segunda ação foi a realização, em 20 de outubro de 2016, da Terceira
A evolução temporal e espacial dos municípios e de suas sedes são abordadas
Conferência das Nações Unidas sobre Moradia e Desenvolvimento Urbano
enquanto elementos fundamentais de entendimento do processo conjugado de
Sustentável (Habitat III). No Habitat III, 167 países se comprometeram a adotar
divisão municipal, povoamento e urbanização no Brasil, dada a vinculação entre
a Nova Agenda Urbana (NAU) com o objetivo de orientar a urbanização pelos
a organização política do território nacional e a existência legal das cidades.
próximos vinte anos em escala mundial. A ONU, através da NAU, assume uma
interpretação ampliada do fenômeno urbano ao assinalar que, até 2050, a Com efeito, o Decreto-Lei n. 311, de 02.03.1938, que organizou a estrutura
população urbana do mundo irá praticamente dobrar, o que a mantém como territorial brasileira, determinou que as cidades fossem as sedes dos municípios
tendência transformadora neste início do século XXI. Enquanto o Objetivo 11, atribuindo-lhes, portanto, forte sentido político-administrativo, a despeito de
dentre os 17 elencados para o Desenvolvimento Sustentável, tem como sua dimensão populacional.
enunciado “tornar as cidades e os assentamentos humanos inclusivos, seguros,
resilientes e sustentáveis até 2030”, o Habitat III propõe uma nova agenda para Nesse sentido, os atuais 5570 municípios brasileiros indicam a existência de um
orientar a “urbanização sustentável nos próximos 20 anos”. número idêntico de cidades, conforme observado no Mapa relativo à
população total estimada em 2015, que categoriza os municípios segundo
Assim, o tema das cidades sustentáveis tem estimulado em todo o mundo, e no estratos populacionais.
Brasil em especial, a formulação de inúmeras iniciativas públicas e privadas em
forma de programas, agendas e publicações. O Caderno Temático do Atlas Quando se compara os mapas relativos a 1900 (Mapa 1), 1950 (Mapa 2) e 2015
Nacional Digital 2017, intitulado “Cidades Sustentáveis”, constitui uma (Mapa 3) pode-se observar que o crescimento do número de municípios
oportunidade ímpar para se abordar, do ponto de vista geográfico, a discussão ocorreu simultaneamente ao próprio povoamento do território nacional. Assim,
em torno de conceitos, métodos e informações que darão suporte a essa o incremento da população e sua interiorização fez-se acompanhar da criação
temática no século XXI. A necessidade de instrumentalizar a sociedade e o de pequenos municípios.
poder público com informações capazes de incorporar as múltiplas dimensões Os mapas relativos à evolução da população total deixam antever, contudo, o
que compõem a noção da sustentabilidade urbana constitui um enorme desafio quanto os programas e agendas locais voltadas à sustentabilidade urbana no
às instituições voltadas à produção de informações geográficas e estatísticas, Brasil devem incluir questões e problemas aderentes aos pequenos municípios,
como o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). dada a numerosa presença desses últimos em todo o país.
Esse Caderno Temático tem, assim, como objetivo, fazer a leitura espacial de
um conjunto de informações produzidas pelo IBGE e por outras instituições
públicas que abordam a complexa questão da sustentabilidade em sua
Quadro 1 Mapa 1
Meta Indicadores
11.1 até 2030, garantir o acesso de todos a habitação
11.1.1 Proporção da população urbana que vive em
adequada, segura e a preço acessível, e aos serviços
favelas, assentamentos informais ou domicílios
básicos, bem como assegurar o melhoramento das
1
Nota: Os indicadores marcados com (*) não foram contemplados nesse Caderno Temático
devido à indisponibilidade de dados.
Além das fragilidades institucionais que marcam a administração dos pequenos
municípios para implementar uma agenda voltada à sua sustentabilidade, a
Mapa 2
imensidão territorial do país ainda traz o desafio de pensar essa agenda em
População total - 1950 condições das grandes diferenças encontradas em termos de acessibilidade das
sedes municipais aos eixos viários e/ou aos principais centros urbanos
regionais.
Com efeito, em grande parte das pequenas sedes municipais do interior do país
e, notadamente, nas Regiões Norte e Nordeste, o acesso às principais vias de
Caderno Temático: Cidades Sustentáveis
Com efeito, de acordo com Simões (2016, p. 41), até 1960, a maioria da
população residia na área rural do País, à exceção da Região Sudeste que, nessa
data, já apresentava 57,0% de sua população residente na área urbana. O
fenômeno da urbanização no Brasil está estreitamente associado à questão das
migrações internas que se intensificam a partir do início dos anos 60 e tendo,
inicialmente, como principal área de atração a Região Sudeste, que oferecia as
maiores oportunidades de emprego, em decorrência da concentração das
principais atividades econômicas então existentes no País. Já em 1970, a taxa
de urbanização na Região chega a 73,0%, enquanto nas demais, esse valor
ainda é inferior a 50,0%.
Por outro lado, nas regiões Norte e Nordeste, os níveis de urbanização ainda
Distribuição das Grandes Concentrações Urbanas Brasil - 2010 Rede Urbana Brasileira - 2007
Caderno Temático: Cidades Sustentáveis
Fonte: IBGE. Arranjos Populacionais e Concentrações Urbanas do Brasil, 2016. Fonte: IBGE. Regiões de Influência das Cidades, 2008.
Assim, a leitura geográfica dessa questão passa necessariamente por uma Nesse sentido, a discussão sobre os indicadores de sustentabilidade do ponto
contextualização inicial das cidades brasileiras feita em escala mais abrangente de vista geográfico carrega o necessário entendimento de observar a cidade em
em direção a uma perspectiva urbano-regional, isto é, em sua interação com as termos de seu papel de articulação e de gestão entre regiões no interior do
formas de apropriação e uso do território nacional com suas enormes território nacional e mundial.
diferenças ambientais e socioculturais.
É fundamental, portanto, incluir na discussão acerca da sustentabilidade urbana
Nesse sentido, na atualidade, a ação pública sobre o território nacional e as a diferenciação no que diz respeito à hierarquia das cidades, isto é, ao grau de
cidades brasileiras volta a estar no centro dos debates acadêmicos e influência que os centros de diferentes tamanhos e níveis de funcionalidade
governamentais quanto ao modo mais adequado e possível de se conduzir uma possuem em relação à sua região de influência.
intervenção planejada e ambientalmente comprometida sobre as cidades
Assim, em 2007, o Brasil possuía 12 metrópoles com forte relacionamento
brasileiras, analisadas em sua diversidade urbano-regional.
entre si e extensa área de influência direta, dentre as quais a cidade do Rio de
Essa perspectiva acompanha, enfim, a “virada geográfica” que marca esse Janeiro e de Brasília tinham o status de metrópoles nacionais e São Paulo de
debate no Brasil e no mundo, debate esse que pressupõe o respeito à Grande Metrópole Nacional (IBGE, Regiões de Influência das Cidades, 2008).
diversidade com o combate às desigualdades e vulnerabilidades de toda ordem
Com efeito, uma vez que as cidades são sedes dos múltiplos fluxos e redes que
que caracterizam as cidades brasileiras.
garantem a circulação e a integração regional através de seus serviços, elas
A configuração da rede urbano-regional (Mapa 7) constitui uma etapa constituem os principais agentes funcionais de ordenamento (BECKER, 2000) e
fundamental para o entendimento das diferenças e desigualdades construídas de decisão sobre a transfiguração do espaço geográfico.
ao longo do processo de urbanização do país e que marcam as cidades
Desse modo, pode-se afirmar que a análise da articulação, do poder de gestão e
brasileiras na contemporaneidade.
de governança2 sobre um território mais amplo e, enfim, da dinâmica de
Quando se observa a cidade no contexto de uma agenda de sustentabilidade
torna-se obrigatória a superação do fenômeno urbano enquanto um “ponto no
mapa” em direção a uma abordagem mais ampla que inclua também a região
2Governança definida enquanto o conjunto das várias maneiras pelas quais os diversos atores
sobre a qual ela exerce sua influência. sociais se articulam e cooperam, realizando ações, gerenciando seus problemas comuns e
acomodando seus interesses. Abrange instituições públicas e privadas, regimes formais de
coordenação e autoridade, como os aspectos gerenciais do Estado, mecanismos informais que
atendam a determinadas necessidades e redes sociais informais (MILANI; SOLINÍS, 2002, apud
KRONEMBERGER e COSTA, p. 361).
ocupação do espaço geográfico passa, necessariamente, pelo estudo dos IBGE. Evolução da divisão territorial do Brasil: 1872-2010. Rio de Janeiro: IBGE,
núcleos urbanos reconhecidos através de sua dimensão urbano-regional e, 2011.
portanto, de seu poder de influenciar as cidades menores e áreas contíguas.
IBGE. Regiões de Influência das Cidades. Rio de Janeiro: IBGE, 2008.
Nesse contexto, nunca é demais lembrar que, na contemporaneidade, o espaço
KRONEMBERGER, D. M. P e COSTA, V.G. Desenvolvimento local sustentável e
dos fluxos da “era da informação”, comandado pelas grandes cidades, parece
governança ambiental. In: IBGE. Brasil: uma visão geográfica e ambiental no
influenciar, cada vez mais, as mudanças ocorridas no espaço local que constitui,
início do século XXI. Rio de Janeiro: IBGE, 2016.
em essência, o lugar das diferentes comunidades territorialmente construídas
Que cidade queremos ter e que cidade vamos deixar para as gerações futuras? ____The United Nations Conference on Housing and Sustainable Urban
Essas são as questões básicas a serem respondidas e informadas através de Development, 17-20 October, 2016. Disponível em: <https://habitat3.org/>.
indicadores que permitam acompanhar e, principalmente, viabilizar novas Acesso em: 27 de abril de 2017.
escolhas de ação sobre os centros urbanos brasileiros. VECCHIATTI, K. Três fases rumo ao desenvolvimento sustentável: do
É justamente nesse ponto que reside a importância das políticas públicas, uma reducionismo à valorização da cultura. São Paulo em Perspectiva, 18(3), 90-95,
vez que somente uma articulação ético-política entre essas dimensões poderia 2004. Disponível em: <www.scielo.br/scielo.php?pid=S0102-
direcionar uma mudança sociocultural (VECCHIATTI, 2004), reorientando o 88392004000300010&script=sci_abstract>. Acesso em 10 de maio de 2017.
processo de urbanização, através da produção de bens materiais e imateriais
que reconciliem o crescimento econômico com as formas sustentáveis de
apropriação e uso do espaço urbano.
Essa realidade ainda está distante, mas não se pode negar que avanços foram
obtidos no campo da gestão pública e da organização da sociedade civil desde a
tomada de consciência das questões ambientais a partir da segunda metade do
século passado. Construir indicadores geográficos que permitam avaliar e,
principalmente, fazer emergir questões e formular recomendações de curto,
médio e longo prazos ao Estado e à sociedade brasileira é o caminho a ser
trilhado se se quer perseguir uma agenda comprometida com um processo de
“urbanização sustentável” para as cidades brasileiras.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BECK, U. Modernity in the Global Social Order. Cambridge: Polity Press, 1996.