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Faculdade Unyleya

Pós-graduação em Ciências Sociais


Breno Bertoldo Dalla Zen

ROUSSEAU E O BOLSONARISMO: OS PROBLEMAS DA


INFLUÊNCIA DOS INTERESSES PARTICULARES NOS
NEGÓCIOS PÚBLICOS

Caxias do Sul
2019
Qual a função de um presidente eleito democraticamente? Bem, convenhamos que o
cargo de chefe de Estado esteja totalmente ligado à representação dos anseios do povo em
relação às políticas públicas. No entanto, o que fazer em uma nação ideologicamente dividida
como o Brasil de 2019? Governar para todos ou governar somente para os seus? Ou então,
diante de um profundo desconhecimento a respeito da natureza democrática, que tal governar
de acordo com interesses pessoais? Estas e outras questões serão discutidas neste breve
artigo, que relaciona a filosofia contratualista de Jean-Jacques Rousseau com algumas ações
realizadas pelo atual presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, ao início de sua gestão.
Desde que assumiu a Presidência da República do Brasil, Jair Messias Bolsonaro têm
se mostrado um líder bastante controverso. Primeiramente, por buscar constantemente ser
compreendido como um presidente “anti sistema”. Nega ter participação em conchavos
políticos, busca muito mais desconstruir do que propriamente construir e culpabiliza as
gestões anteriores por tudo que há de pior no país. Além disso, costuma afirmar que existe
um aparelhamento ideológico nas mais variadas áreas da atuação governamental. Defende
também que suas escolhas para cargos importantes nos ministérios são escolhas puramente
técnicas, e não pessoais, partidárias ou ideológicas. No entanto, com os poucos meses de
atuação deste governo, fica cada vez mais claro que Bolsonaro não busca um diálogo com
aqueles que não o seguem ideologicamente. Costuma desqualificar profissões de cunho
intelectual, como professores, jornalistas, filósofos e sociólogos, acusando-os de “doutrinar o
povo brasileiro para um viés comunista de pensamento”. E contrariando totalmente seus
posicionamentos, Bolsonaro está à frente de um governo que nos parece ser conduzindo por
fins puramente ideológicos.
Partindo deste breve panorama político, buscamos o referencial teórico em um
filósofo que muito contribuiu para inspirar as instituições políticas da contemporaneidade:
Jean-Jacques Rousseau. Conhecido como “o caminhante solitário”, desenvolveu a
compreensão filosófica de que o homem é bom por natureza, mas que a sociedade o
corrompe. Também conjecturou que um pacto social é necessário para que a sociedade possa
estar organizada e para que nela haja direito e justiça, uma vez que a plena liberdade já se
encontraria totalmente corrompida pelo estado social. Assim, na história da filosofia,
Rousseau figura ao lado de Thomas Hobbes, Montesquieu e John Locke como pensadores de
uma filosofia contratualista, que busca a plena organização social através de pactos sociais
contratuais. Esta abordagem inspirou documentos muito importantes na área dos direitos
humanos, entre elas a ​Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão​, de 1789, e a
Declaração Universal dos Direitos Humanos​, de 1948.
Em seu ​Contrato Social,​ Rousseau faz uma reflexão que pode nos ser útil para
atrelarmos ao tema aqui elencado:

Haverá sempre grande diferença entre subjugar uma multidão e reger uma
sociedade. Sejam homens isolados, quantos possam ser submetidos sucessivamente
a um só, e não verei nisso senão um senhor e escravos, de modo algum
considerando-os um povo e seu chefe. (...) Mesmo que tal homem domine a metade
do mundo, sempre será um particular; seu interesse, isolado do dos outros, será
sempre um interesse privado. (ROUSSEAU, 1973, p. 36)

Este apontamento que o autor faz é bastante interessante se notarmos que muitas
perspectivas que são defendidas com ênfase pelo atual presidente possuem uma ligação muito
forte com sua vida privada, ou seja, suas crenças pessoais. Isso pode nos levar a crer que
estamos diante de um político que não vê como prioridade a necessidade popular, mas o
cumprimento de suas ideologias particulares.
Um exemplo da falta de noção sobre as demandas populares está em uma ideia que
com muita ênfase é defendida pelo presidente, a de que ​o sistema legislativo sustenta uma
“indústria da multa” no Brasil​. Esta percepção já lhe levou a vetar um projeto do Ministério
da Infraestrutura que planejava instalar cerca de 8 mil radares em rodovias
federais — contrariando estatísticas que dizem que estes radares — também conhecidos
por “pardais” — ajudam a prever acidentes, e que após sua instalação o número de acidentes
na região específica diminuíram crucialmente, não só no Brasil como em rodovias do mundo
todo:

As estatísticas da Polícia Rodoviária Federal (PRF) também indicam o mesmo que


os estudos internacionais. Segundo a PRF, os acidentes vêm caindo nos últimos dez
anos. O período coincide com o aumento do número de radares nas estradas,
embora haja outros fatores que explicam essa queda – tais como o aumento da
fiscalização e a lei seca. Em 2009 foram 158.647 acidentes nas rodoviais federais,
segundo a PRF. Já em 2018 foram registrados 69.207, uma redução de cerca de
57%. (GAZETA DO POVO)

No entanto, parece que para Bolsonaro as estatísticas pouco importam, ainda mais se
as mesmas contrariam suas convicções. Vale citar aqui, inclusive, que ​o presidente também
tem o costume de questionar os métodos do IBGE​, mesmo sem conhecê-los com propriedade.
E muito além do simples questionamento, já tomou medidas para diminuir verbas destinadas
ao Censo 2020, processo que costuma realizar estatísticas e georeferenciamentos muito
importantes para a confecção de políticas públicas relacionados a desigualdade social,
emprego, entre outras questões sociais.
Bem, é possível dizermos que Rousseau não concordaria com este tipo de conduta:
para ele, é algo essencial que um governante conheça seu povo e legisle a partir de suas
demandas. Nas palavras do autor:

Assim como antes de erguer um edifício , o arquiteto observa e sonda o solo para
verificar se sustentará o peso do construtor, o instituidor sábio não começa por
redigir leis boas em si mesmas, mas antes examina se o povo a que se destinam
mostra-se apto a recebê-las” (ROUSSEAU, 1973, p. 66)

Deste ponto de vista, é muito perceptível que há um problema de compreensão por


parte do atual governo em relação às demandas do povo. Isto compromete, em parte, a
popularidade do presidente, que em apenas 3 meses de gestão, já figurava em 32% de
aprovação, ​segundo a última pesquisa do Datafolha​ — a qual ele também dá descrédito e
afirma estar aparelhada por “ideais comunistas”. Pelo jeito o marxismo cultural nunca esteve
tão forte no país! Especula-se que se as eleições fossem hoje, o político teria grandes
dificuldades em vencer.
Outro fator que vale a pena citar em relação ao presidente Bolsonaro, mais uma vez
retomando a suposta “indústria da multa”: ​ele e sua família somam inúmeras infrações de
trânsito​ — nos últimos 5 anos, foram mais de 40 infrações, que somam ao total quase 130
pontos na carteira dele e de seus familiares (a esposa e os três filhos). Também vale lembrar
que em 2012 o presidente foi multado pelo Ibama por pescar em área ilegal, fato nunca
esquecido por ele, e que ​recentemente culminou na exoneração do servidor que aplicou tal
multa​. Poderíamos dizer aqui que mais uma vez o poder fora usado a partir de interesses
próprios ou estaríamos nos precipitando? Diante disso, achamos plausível citar mais uma
passagem do Contrato Social de Rousseau, muito oportuna para que refletimos acerca do
interesse particular em detrimento da função de chefe de Estado:

Não será bom que aquele que faz as leis as execute, nem que o corpo do povo
desvie sua atenção dos desígnios gerais para emprestá-la aos objetivos particulares.
Nada mais perigoso que a influência dos interesses privados nos negócios públicos;
o abuso da lei pelo governo é mal menor do que a corrupção do Legislador,
consequência infalível dos desígnios particulares. (ROUSSEAU, 1973, p. 89-90)

A partir desta passagem e das reflexões propiciadas pelos fatos anteriormente citados,
nos parece muito verossímil afirmar que o atual presidente está cercado principalmente de
prioridades ideológicas, de cunho muito pessoal. Isso que nem entramos no assunto mais
polêmico, relacionado a uma de suas principais propostas de campanha: ​a revogação do
decreto de armas​. Mais uma vez contrariando estatísticas sobre violência civil, Bolsonaro
busca honrar sua formação militar criando políticas armamentistas, possibilitando que
cidadãos comuns possam comprar e portar desde armas mais simples até rifles. E por mais
que esta possa parecer uma demanda popular — afinal, o presidente foi eleito
democraticamente, tendo a pauta do armamento como uma de suas principais propostas -, ​a
última pesquisa do Datafolha sobre o tema indica que 64% dos brasileiros avalia que a posse
de armas deve ser proibida​. Além disso, a pesquisa também indica que 80% dos brasileiros
não pretendem comprar uma arma, caso as mesmas sejam liberadas em território nacional.
Conforme podemos perceber, são inúmeras as afrontas deste governante em relação
aos interesses do povo, e mesmo que haja uma grande massa que sustente seus
posicionamentos, nos parece legítimo admitir que estamos diante de uma liderança bastante
problemática, ungida por absurdos midiáticos, que se mostrava questionável desde o período
de eleições, repletas de escândalos e compartilhamento de informações falsas; e que também
bebe dos posicionamentos polêmicos que acompanham Jair Bolsonaro em sua história
política — repleta de declarações de cunho preconceituoso, violento e misógino. De todo
modo, mesmo que este histórico estivesse publicamente declarado, este foi o presidente
escolhido pela maioria dos cidadãos brasileiros, o que intelectualmente pode nos deixar
bastante preocupados com o perfil destes cidadãos. Querem eles o bem-estar social ou
estariam eles envolvidos apenas por uma busca pessoal, muito bem representada pela figura
de Bolsonaro?
A despreocupação pelo meio social e pelas necessidades coletivas, ou seja, pelas
políticas públicas de inclusão social, talvez possam nos dar pistas sobre o pensamento destes
cidadãos. Rogamos mais uma vez a Jean-Jacques Rousseau:

Quando o Estado, próximo da ruína, só subsiste por uma forma ilusória e vã,
quando se rompeu em todos os corações o liame social, quando o interesse mais vil
se pavoneia, atrevidamente com o nome sagrado do bem público, então a vontade
geral emudece - todos, guiados por motivos secretos, já não opinam como cidadãos,
tal como se o Estado jamais tivesse existido, e fazem-se passar fraudulentamente,
sob o nome de leis, decretos iníquos cujo único objetivo é o interesse particular.
(ROUSSEAU, 1974, p. 124)

Conjecturamos, portanto, um possível rompimento no senso comunitário do


brasileiro, ou de pelo menos de uma parte desta sociedade. Talvez os valores particulares hoje
sejam prioritários para muitos agentes de nossa sociedade, e isso interfira na expressão de
todo o tecido social. Sem uma real compreensão comunitária, e estimulados por um governo
que conclama por valores conservadores relativos à família e à propriedade, parece se tornar
adequado um comportamento onde os valores individuais se sobrepõem aos valores sociais.
Na obra “Discurso sobre a origem da desigualdade entre os homens”, de 1755,
Rousseau afirma que a família é uma das primeiras instituições sociais — mas com um
sentido muito diferente ao sentido bolsonarista, até porque o filósofo considera o homem um
ser bom por natureza, corrompido pela sociedade desde o surgimento da primeira instituição
social — a família. No entanto, mesmo que o pensamento rousseauniano nos leve a pensar
que a família seja o primeiro agente que estaria a corromper o “bom selvagem”, ela ainda
carrega um senso comunitário, na visão de Rousseau; na visão bolsonarista, ela está muito
mais como uma instituição de divisão, que denota propriedade, tradição, conservadorismo.
Poderíamos ir muito adiante neste debate, mas isso poderia corromper a brevidade deste
artigo.
Para encerrar, deixamos uma lembrança importante: nenhum governo é para sempre, e
assim como as palavras de Rousseau inspiraram a ​Revolução Francesa e a ​Declaração dos
Direitos do Homem e do Cidadão,​ ela pode inspirar a derrubada de outros governos, inclusive
este, que tem vigência programada até o fim de 2022, caso o mesmo não finde antes — os
motivos já são incontáveis. Segundo o filósofo:

Não há no estado nenhuma lei fundamental que não possa ser revogada, nem
mesmo o pacto social, pois se todos os cidadãos se reunissem para, de comum
acordo, romper esse pacto, não se pode duvidar que fosse muito legitimamente
rompido. (ROUSSEAU, 1973, p. 120)

Que assim seja, desde que legítimo e comprometido com a demanda popular. De
golpes políticos o Brasil já está farto.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ROUSSEAU, J. J. Do Contrato Social. In: ​Coleção Os Pensadores XXIV - Rousseau.​ Abril


Cultural. São Paulo, 1973.

ROUSSEAU, J. J. Discurso sobre a origem da desigualdade entre os homens. In: ​Coleção Os


Pensadores XXIV - Rousseau​. Abril Cultural. São Paulo, 1973.

MATTOSO, C. FABRINI, F. ​Em guerra contra radares, Bolsonaros somam mais de 40


multas de trânsito​. Folha de São Paulo. São Paulo, 28 abr 2019. Disponível em:
<​https://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2019/04/em-guerra-contra-radares-bolsonaros-som
am-mais-de-40-multas-de-transito.shtml​>. Acesso em 26 de junho de 2019 às 19:09:00.

ABRÃO, C. ​Briga de Bolsonaro com a Justiça por radares levanta a discussão: existe
indústria da multa? Gazeta do Povo. São Paulo, 11 abr 2019. Disponível em:
<​https://www.gazetadopovo.com.br/republica/radares-industria-da-multa-estradas-bolsonaro/
>. Acesso em 26 dejunho de 2019 às 19:11:00.

MARÉS, C. ​Ao falar de desemprego, Bolsonaro ataca IBGE e erra três vezes em menos de 1
minuto​. Agência Lupa - Revista Piauí. Rio de Janeiro, 3 abr 2019. Disponível em:
<​https://piaui.folha.uol.com.br/lupa/2019/04/03/bolsonaro-desemprego-ibge/​>. Acesso em 26
de junho de 2019 às 19:15:00.

INSTITUTO DATAFOLHA. ​Avaliação do presidente Jair Bolsonaro - Abril de 2019.​


Instituto Datafolha. São Paulo, abril de 2019. Disponível em:
<​http://media.folha.uol.com.br/datafolha/2019/04/08/574c277a171a64f166dee28d083f08cfab
2.pdf​>. Acesso em 26 de junho de 2019 às 19:21:00.
REDAÇÃO G1. ​Servidor do Ibama que multou Bolsonaro por pesca irregular é exonerado
do cargo de chefia​. Portal G1. Rio de Janeiro, 29 mar 2019. Disponível em:
<​https://g1.globo.com/natureza/noticia/2019/03/29/ibama-exonera-servidor-que-multou-bolso
naro-por-pesca-irregular.ghtml​>. Acesso em 26 de junho de 2019 às 19:25:00.

INSTITUTO DATAFOLHA. ​Pacote anticrime - Abril de 2019​. Instituto Datafolha. São


Paulo, abril de 2019. Disponível em:
<​http://media.folha.uol.com.br/datafolha/2019/04/11/3100581ecc8a17a619af6189cd665777p
ac.pdf​>. Acesso em 26 de junho de 2019 às 19:29:00.

MENDONÇA, L. ​Diante de derrota, Bolsonaro revoga decreto de armas e edita nova versão
similar.​ Jornal El País. São Paulo, 25 jun 2019. Disponível em:
<​https://brasil.elpais.com/brasil/2019/06/25/politica/1561494790_396911.html​>. Acesso em
26 de junho de 2019 às 19:31:00.

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