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Rishikesh

O ônibus estava praticamente lotado e elas se


acomodaram na parte traseira junto à bagagem. A maioria
dos passageiros ia para Meerut, assim havia uma
esperança de que depois desta parada elas poderiam ter um
pouco mais de espaço e conforto.
O motorista, um sikh de espessas sobrancelhas
brancas, sorridente e bonachão, trabalhava nesta linha há
muitos anos e conhecia bem o trajeto entre Delhi e
Meerut, que em dias sem chuva ele percorria em duas
horas e pouco dirigindo por uma estrada de terra e mão
dupla.
Assim, que os últimos três passageiros entraram e
acomodaram suas bagagens, ele fechou a porta e após
saudar a todos com um sonoro ‘Deus nos abençoe’, partiu
tomando a direção ao noroeste.

Nirmalá aproveitou para conversar um pouco com


Giovànna sobre o futuro.
 Giovànna, você está sentindo-se mais leve, não
é? – perguntou para puxar a conversa.
 Creio que sim. Estou sim, minha amiga.
 Espero que você seja feliz conosco, porque eu
sei que o seu trabalho era muito importante para você, não
era?
 Honestamente, eu não sei! Quando eu terminei
os estudos precisava encontrar um trabalho, porque tinha
que ter minha própria vida. Eu gostava muito de
antropologia e com o convite e a perspectiva de uma vida
acadêmica, eu me senti como se tivesse recebido um
premio da loteria. Ai, eu entrei de cabeça no trabalho e
aqui estou. Então, aconteceu você e meu mundo virou de
cabeça para baixo, porque você abriu meu coração para
uma outra dimensão e isto me fez repensar muitas coisas e
rever meus valores de vida. Eu sempre acreditei que para
ser alguém era necessário pertencer a um grupo de elite,
ser aceita e crescer dentro do grupo. Mas agora vejo isto
tudo muito distante, sem a importância que tinha no
passado. Agora eu tenho outra compreensão do que seja a
felicidade.
 E o que é a felicidade agora para você?
 É estar em paz, tentando compreender a vida
sem pressupostos e sem nada desejar, porque sinto que
precisamos de muito pouco para viver e ser feliz. Agora eu
vejo com clareza a importância do ser em vez do ter.
 Você fez um grande progresso em muito pouco
tempo e eu estou muito feliz por você e sinto que você está
pronta para dar um passo importante no caminho
espiritual.
 Foi sobre isto que você falou comigo em Delhi?
Nirmalá balançou a cabeça em sinal de afirmação.
 Eu estou esperando com ansiedade.
 Quando a hora chegar. Por enquanto aguarde
com paz no coração.
A viagem ocorreu sem incidentes e uma hora
depois elas estavam entrando em Meerut, um dos
principais aquartelamentos militares do norte da Índia.
Elas procuraram um albergue para passarem a noite, e
contrataram um carro de aluguel para o dia seguinte.
Após uma noite de sono reparador saíram antes da
alvorada em direção da vila de Hastinápura, pois já há
algum tempo Nirmalá queria conhecer a região que foi o
palco dos acontecimentos relatados na epopéia
Mahabharata.
Tão logo elas chegaram no local, Nirmalá pediu ao
motorista que as levasse até as ruínas da cidade velha,
onde existe um templo dedicado ao Senhor Shiva. Ao ver
a destruição do local, a tristeza invadiu seu coração que
relembrou as sucessivas invasões e a selvageria dos reis
mogois que destruíram milhares de templos em todo a
região Norte do país por volta do século XVI.
Pouco havia sobrado daquele que deveria ter sido
um dos mais belos templos do antigo império dos
kauravas, na cidade que outrora pertenceu ao reino dos
Bharatas.
Nirmalá caminhou até um local onde um grupo de
pessoas fazia uma escavação, e perguntou a que distância
ficava o rio Ganges. Um jovem arqueólogo apontou na
direção leste dizendo que havia uma trilha até o rio, a
cerca de seis ou oito quilômetros de distância.
Após andarem por cerca de duas horas, elas
escutaram o som do rio e logo em seguida avistaram suas
águas correntes, em meios a bancos de areia e rochas. Elas
estavam em uma enseada de areia branca e cascalhenta,
onde o rio se dividia em várias corredeiras pouco
profundas.
Manisha agachou-se, lavou as mãos e bebeu da
água sagrada. Em seguida lavou seu rosto e seus os braços,
passando as mãos molhadas sobre os cabelos num ato de
purificação. Enquanto isto Mitra e Ramba coletaram
galhos secos para fazerem uma pequena fogueira.
Nirmalá tirou as sandálias e com cuidado
caminhou sobre as pedras até uma rocha rio adentro. Por
um momento ela permaneceu de pé com a face voltada
para o sol, numa prece silenciosa, em seguida soltou os
cabelos ao sabor da brisa, sentou-se e fechando os olhos
entrou em estado de meditação. Sua respiração era
imperceptível e seu porte majestoso.
Manisha pegou Giovànna pelo braço e vendo a
fogueira que agora estava acesa, levou-a até lá. Mitra e
Ramba estavam sentadas observando as labaredas em
silêncio. Manisha pegou um galho em chamas, esfregou-o
no chão até que as chamas se extinguissem, permanecendo
somente brasas. Então, ela pediu que Giovànna
permanecesse em pé, de braços abertos em cruz, e após
recitar um mantra de louvor a Mãe Kalí, iniciou um rito de
purificação, passando o arbusto em brasa pelo seu corpo,
enquanto dava voltas em torno dela em lenta
circunvolução no sentido horário.
Giovànna sentiu alguns arrepios nos braços e nas
costas. Em seguida a pedido de Manisha postou as mãos
frente ao peito e permaneceu de olhos fechados. Mitra e
Ramba colocaram-se ao seu lado, formando com Manisha
um triangulo que tinha Giovànna no centro, e a fogueira
aos seus pés. Juntas as três mulheres iniciaram um canto
devocional em louvor a Ishaní, o aspecto da Mãe Divina
que reina sobre o Cosmos.
Então Manisha depositou o graveto sobre o fogo e
colocando-se atrás de Giovànna, tocou-a na base da coluna
cervical com os dedos indicador e médio da mão direita,
pronunciando uma série de mantras monossilábicos, que
se repetiam à medida que sua mão descia tocando-a em
pontos específicos da coluna até que finalmente colocou-
os na região perineal, e pronunciou o mantra ‘hrim’, por
dez vezes.
Giovànna sentiu uma estranha sensação, como se
seu útero tivesse se contraído. Emocionada ela não
conteve as lágrimas.
Nirmalá aproximou-se dela para dar continuidade
ao ritual.
 Hrim, hrim, hrim! - Nirmalá pronunciou o
mantra de chamamento da Mãe Divina, tocando-a no
púbis com a mão direita estendida, enquanto a esquerda
tocava o alto de sua cabeça, na região denominada ‘portal
para o Divino’. Giovànna arregalou os olhos ao sentir-se
percorrida por uma sensação elétrica que subiu pela suas
costas, tal como estivesse sendo roçagada por uma suave
penugem.
Então ela viu Nirmalá a sua frente e percebeu que
seu semblante estava iluminado, com um suave brilho
azulado. Nirmalá olhava-a de olhos semicerrados e ela
sentiu seu hálito na respiração lenta, através da boca
semiaberta. Então, ela pronunciou algumas palavras em
uma língua que Giovànna não entendia, mas cujo som
melodioso produzia nela uma sensação amedrontadora,
pois ela estava preste a perder a consciência. Giovànna
resistiu, resistiu, mas subitamente invadida por algo
grandioso, deixou-se levar. Ela não chegou a perder a
consciência, mas tudo que aconteceu em seguida foi
assistido a uma certa distância, como se ela fosse uma
testemunha silenciosa de sua própria iniciação.
Nirmalá colou sua boca na boca de Giovànna e
através da respiração compartilhou com ela o sacramento
do prâna. Giovànna sentiu um intenso calor na região
abaixo do cóccix e quase caiu de joelhos se não fosse
amparada por Mitra e Ramba, que a levantaram,
segurando-a, lado-a-lado.
Então, uma luz intensa iluminou sua consciência e
ela sentiu que tudo ao seu redor estava sendo consumido
pela luminosidade de milhões de sóis, que explodiam em
seu espaço consciencial, dissolvendo seus resíduos
mentais, e com eles o ego e a personalidade.
Ela viu o passado e o presente se desvanecerem na
luz, e não conteve as lágrimas quando Nirmalá, segurando
a sua cabeça entre as mãos, sussurrou em seu ouvido
direito um mantra e um nome. Naquele momento
Giovànna morria para o mundo, e Ganga Deví, nascia para
seguir o seu destino. A partir de agora elas estavam
ligadas para sempre.
Giovànna sentiu o corpo amolecer e deixou-se cair
nos braços das amigas, que a ampararam e a deitaram na
areia.
Por um tempo elas permaneceram ali, olhando-a
com carinho. Mitra deitou a cabeça dela em seu colo,
enquanto Manisha e Ramba friccionavam suavemente suas
mãos e pés. Nirmalá foi até o rio e molhando seu xale na
água gelada passou o pano umedecido em seu rosto, testa,
pescoço e nuca.
Ganga abriu parcialmente os olhos e um sorriso
tímido iluminou seu semblante. Nirmalá fitou-a nos olhos,
e acarinhando seus cabelos, disse-lhe:
 Ganga, sua hora chegou! A partir de agora você
é um ser livre das amarras do passado. Use a sabedoria
para viver a vida com alegria, luz e amor.
Ela ainda estava amortecida e com dificuldade em
articular as palavras, mas mesmo assim sussurrou:
 Ganga.....? O que aconteceu comigo?
Elas sentaram-na e Nirmalá abraçou-a ternamente
dizendo que agora seu nome era Ganga Deví, uma
homenagem a deusa do rio em cujas margens elas
estavam, e que ela não devia se preocupar com nada, pois
a partir de agora seu caminho seria iluminados pela Luz da
Mãe Divina.
Ganga ainda estava trêmula. Seu nariz escorria um
pouco e quando um calafrio percorreu seu corpo ela
vomitou e caiu.
Elas a levantaram e a ampararam caminhando
juntas até as águas. Nirmalá com as mãos em concha
pegou um pouco d’água e despejou sobre sua cabeça por
varias vezes, enquanto cantarolava um mantra em
homenagem a deusa cujo nome agora ela herdara e iria
carregar para sempre.

Ao voltarem para Meerut ela já estava bem melhor,


embora se mantivesse calada e com olhar distante. No dia
seguinte Ganga acordou bem disposta e muito alegre.
Após o desjejum elas tomaram um carro em direção a
Haridwar, e se hospedaram num hotel próximo do Ghat
Asthi.
Elas levantaram-se cedo e foram tomar o desjejum
na cafeteria do hotel. Nirmalá olhou o semblante de Ganga
Deví e ficou feliz ao ver que sua amiga estava serena e
alegre.
 Ganga, que bom que você está feliz!
Por um instante ela permaneceu alheia, porque
ainda não havia se acostumado a ser chamada pelo seu
nome espiritual.
 Desculpe-me Nirmalá, eu ainda não me
acostumei com meu novo nome.
 Eu sei, mas deixe que Ganga assuma o lugar de
Giovànna, porque assim o passado se dissolve mais
rapidamente.
 Eu compreendo e estou sentindo que uma
transformação está ocorrendo.
Nirmalá sorriu.  Amiga, teu porvir será
grandioso, confia!
Ela estava tranqüila porque nunca havia sentido
tanta paz em seu coração quanto agora. De fato, ela estava
começando a confiar.
Em seguida elas saíram e foram caminhando ao
longo dos canais, por onde as águas do Ganges cortam a
cidade, na direção do Ghat Har-Ki-Pairi.
 Nirmalá, o que é Har-Ki-Pairi?
 É uma das escadarias que adentram o rio
Ganges e onde as pessoas vão fazer seus ritos de ablução.
Segundo a lenda, Haridwar é um dos quatro locais em que
caíram gotas do amrita, o néctar da imortalidade, durante a
batalha em que os deuses enfrentaram seres demoníacos
pela supremacia dos céus.
 Conte-me esta história!
 Bem, esta é a história que deu origem ao
festival do Kumbha Mela, que é um festival que ocorre a
cada doze anos em quatro lugares sagrados da Índia e
Haridwar é um desses lugares.
 E qual é a lenda?
 É uma lenda antiga, do período védico. Segundo
contam, tudo se passou há milhares de anos, em uma
época em que os deuses e os demônios viviam em paz,
colaborando entre si na tarefa de recolher o néctar da
imortalidade do oceano primordial de leite, que era a fonte
da vida. Este néctar, denominado amrita, após ser
recolhido por deuses e demônios era guardado em um
pote, que em sânscrito nós denominamos khumba, daí o
nome Khumba Mela. Certo dia, os demônios roubaram o
khumba, que continha o néctar e fugiram pelos céus,
perseguidos pelos deuses. Por doze dias e doze noites, que
em nossa marcação do tempo equivale a doze anos, os
demônios carregaram o pote com eles, mas certo dia eles
foram atacados pelos deuses que queriam o néctar de
volta. Durante a batalha, gotas do néctar amrita caíram em
quatro pontos, que por isto se tornaram sagrados,
simbolizando a vitória do bem sobre o mal. O Ghat Har-
Ki-Pairi é um desses pontos.
 É uma bela história, mas qual o significado deste
néctar denominado amrita?
 Ganga, o néctar seria uma bebida que confere a
imortalidade a quem o ingere. Mas para entendermos,
precisamos refletir sobre o que é a imortalidade. Será que a
imortalidade seria permanecer para sempre neste corpo?
Vivendo a mesma personalidade, nas mesmas condições?
Não, isto não teria sentido, porque a experiência que
iríamos ganhar seria muito pobre.
Eu entendo a imortalidade como sendo a
iluminação. O momento em que nós nos identificamos
com a Luz interna, a Divindade que somos, e então
passamos a ter consciência contínua, vida após vida.
 O que é consciência contínua?
 É uma forma de dizer que não perdemos a
consciência de nós mesmos durante a morte e o
renascimento.
 Entendo, então é a interrupção da consciência de
si, a causa da mortalidade?
 Correto, a morte só existe pela interrupção da
consciência. Quando não temos consciência do que fomos,
porque esquecemos as vidas passadas, nós não estamos
centrados em nosso verdadeiro Eu que é atemporal. E, se
mantemos a consciência contínua, transcendemos a morte
porque então sabemos que não somos o corpo e sim a
imortal chama que é imagem do Divino. Você já está nesse
processo.
 Mas, e o néctar?
 Então, o néctar seria uma bebida que quando
ingerida, expande a consciência e nos mostra a
imortalidade do Ser que somos.
 Isto existe ou é uma lenda?
 Alguns dizem que o amrita seria uma bebida
denominada Soma, que foi usada no passado com o
objetivo de expandir a consciência do devoto, levando-o ao
mundo dos mortos e dos deuses. Outros dizem que o
amrita é um fluido sutil que percorre os nadis, que são
canais que interligam os chacras.
Giovànna ficou pensativa.  Sabe, quando eu
estive na Amazônia , conheci um pajé que usava uma
bebida para este fim, uma bebida que ele denominava
yagé. Eu participei de uma cerimônia.
 E?
 Foi uma experiência interessante, mas eu tive
muitas visões confusas e passei mal.
 O que você sentiu?
 Eu tive náuseas e vomitei muito.
 Eu creio que isto acontece quando a pessoa não
está centrada em sua Luz interna e a expansão da
consciência a leva para regiões obscuras da mente, onde
existem medos e condicionamentos ancestrais.
Giovànna concordou com Nirmalá.  Realmente
eu não estava bem naquela época.
 Aqui estamos. – disse Nirmalá apontando para o
Ghat.
O sol brilhava sobre as águas e seu reflexo agitado
era a imagem da energia da vibração divina em ação.
Nirmalá silenciou sua mente, respirou com suavidade e se
embebeu da luz que abundava no local. Então, ela elevou
seus braços ao alto abrindo-os num silencioso
agradecimento a Mãe Divina, e unindo as mãos na altura
da face, pronunciou silenciosamente uma oração:
“Ambálika, bendita sejas Tu, Luz do mundo,
princípio criador, fonte da vida e a origem de
Tudo. Sagrada seja a tua presença em nossos
corações e bendita seja a Tua Luz em nossas
vidas.”
Ela contemplava o rio e respirava a presença divina
que dele emanava. Sua tez estava iluminada e seus olhos
brilhantes irradiavam a emoção que Ela sentia ao vivenciar
a presença da Mãe Divina nas sagradas águas do Ganges.
Ramba e Mitra no topo da escadaria entoaram
baixinho o mantra da Deusa Ganga.
“Hrim Ganga Vidmahe, mahádeví dhimahi,
tanno Ganga Prachodayat.”
Ganga Deví e Manisha desceram as escadas e
foram se juntar a Nirmalá que voltava de seu curto estado
de êxtase. Ela olhou-as e sorriu. Então, pegando algumas
flores que Giovànna lhe oferecia depositou-as sobre as
águas do rio, pedindo que elas fizessem o mesmo.
Algumas pessoas vieram e ficaram em torno delas
para assistirem o ritual. Nirmalá sorriu para eles
cumprimentando-os com as mãos postas frente ao peito.
Uma mulher bem vestida, com um sári vermelho e
um colar de pérolas, passou por dentre as pessoas e veio
para perto dela.
 Quem é você jovem, que fala tão sábias
palavras? – perguntou a mulher que demonstrava ter uma
posição social elevada na casta dos kshatryas.
 Meu nome é Nirmalá e eu sou a filha da Mãe
Divina.
Giovànna conteve o sorriso ao ver a estupefação
nos rostos das pessoas, pois ela também tivera dificuldade
em entender a “filiação divina” de Nirmalá.
 Sei ..., e qual é a deusa que você declara ser a
sua mãe?
Nirmalá sorriu para a recém chegada.
 Ambá tem muitos nomes e muitas formas, mas
Ela é Uma e Única, minha irmã, Ela é a face feminina de
Deus.
A mulher olhou-a de cima a baixo.
 E eu, quem sou?
Nirmalá levantou-se sorrindo. A mulher não pode
sustentar seu olhar e abaixou o rosto.
 Você é alguém que busca mudar de vida, mas
não consegue e por isto vive em conflito.
 O que você sabe sobre mim? Você me conhece?
 Minha amiga eu sei quase tudo sobre você. Sei o
essencial.
 Hum..., então temos aqui uma vidente!
 Se você tem algo para me perguntar, por favor
pergunte.
A mulher permaneceu olhando-a enigmaticamente.
 Sabe, você me parece familiar, mas não sei de
onde eu a conheço.
Nirmalá esboçou um sorriso e disse que se ela
fizesse um esforço talvez se lembrasse. Mas ela
permaneceu parada e aturdida.
 Samiha, será que eu mudei tanto que você foi
incapaz de me reconhecer ? Afinal somente se passaram
quinze anos!
A mulher tomada pela surpresa arregalou os olhos.
 Já sei! Você é a cunhada daquele amigo de meu
pai, como é mesmo o nome dele?
Nirmalá sorriu para ela sem nada dizer. Samiha
aproximou-se e veio cumprimentá-la com as mãos postas
na altura do peito.
 Das Murtha, Krishna Das Murtha. – respondeu
Nirmalá.
 É verdade! Desculpe-me, por não ter te
reconhecido. Afinal você era uma garota inocente e parece
que tinha um outro nome, estou certa?. – disse abraçando-
a com uma atitude de reverência. E, então acrescentou: 
Me desculpe pois eu não quero atrapalhar o seu ritual. –
disse retirando-se.
Nirmalá virou-se para o Sol e orou.
 OM Tare Tuttare Ture Svahá! – e olhando para
todos acrescentou;  Meus irmãos, eu lhes fico grata por
compartilharem comigo esta oferenda a Mãe Ganga. Estas
águas que ela vivifica e sacraliza, simbolizam as águas da
vida em cujas margens grandes civilizações do passado
cresceram e deram seus frutos, para hoje sermos o que
somos. Ao entrarmos nas águas dos rios e dos mares,
devemos fazê-lo com respeito à vida que nelas tiveram
origem. Por isto, estas águas devem ser preservadas em sua
pureza, pois se as contaminarmos estaremos contaminando
a continuidade da vida.
Ela parou sua fala e vendo uma senhora que
segurava um buquê, pediu uma flor. Então entrando nas
águas depositou-a respeitosamente. Ao sair, mais uma vez
agradeceu a todos e chamando suas amigas se retirou,
tomando a direção da rodovia 58.
Um rapaz que estivera escutando-a, sentado sobre
sua bicicleta, cumprimentou-a acenando com a cabeça e
dizendo:
 Tua luz iluminou meu coração.
Nirmalá sorriu e continuou caminhando ao lado de
Manisha.
Um Rolls-royce preto estacionou um pouco à frente
delas, e o motorista, impecavelmente vestido, desceu
abrindo a porta de trás, para dar passagem a dona do
veículo.
 Afinal, o que você está fazendo por aqui? –
Samiha perguntou para Nirmalá.
Nirmalá olhou para a imponência do veículo e
sorrindo disse-lhe que estava levando a palavra da Mãe
Divina ao seu povo. Então, Samiha contou-lhe que havia
se casado e era a segunda esposa de Sua Alteza Real, o
Marajá Kumar-i-Rajaha Singh de Marwar. E que eles
estavam de passagem por Haridwar para tratarem da
Marajoa Sahiba Gayatrí, a primeira esposa de sua Alteza,
que estava adoentada.
 Gostaria que vocês viessem tomar um chá
conosco uma tarde dessas. O que você acha?
Nirmalá agradeceu e disse que se sentia honrada em
visitá-la.
Ao voltarem para o hotel elas foram almoçar. O
porteiro veio até elas e esperou que se sentassem.
 Senhora, algumas pessoas querem falar consigo.
 Onde eles estão? Em quantos são?
 São em cinco pessoas, senhora.
 Diga-lhes que assim que eu terminar a refeição
eu irei vê-los. Está bem?
O porteiro assentiu com um movimento de cabeça e
saiu.
Tão logo terminou o almoço ela foi até o quarto se
lavar e em seguida desceu para atende-los, que agora já
eram em número de sete pessoas, esperando-a no saguão
do hotel. Por sugestão de Nirmalá, eles foram para o pátio
e sentaram-se sob a sombra de uma grande paineira.
Eram dois casais e um senhor muito bem vestido à
moda do rajastão, com um belo turbante vermelho e
delicado óculos de aro de ouro.
 Eu sou Nirmalá. Vocês queriam falar comigo?
Os casais se entreolharam e uma das mulheres
pediu uma benção. Então, Nirmalá solicitou que todos se
sentassem e a acompanhassem numa prece em louvor à
Mãe Divina.
Ela colocou a mão esquerda sobre o coração e com
a direita estendida na direção deles, cantou:
“Oh Mãe Divina, possa o teu amor e a tua luz,
estimular a nossa mente e o nosso coração,
para que caminhemos em Tua direção.”
Em seguida ela olhou-os um-a-um e, despedindo-se
de todos com as mãos postas à altura do coração levantou-
se com intenção de sair. O senhor de turbante vermelho
fez uma reverencia e um sinal de que queria falar com ela
em particular. Ela compreendeu e voltando-se para ele
perguntou:
 É por sua alteza que o senhor veio?
O homem fez uma expressão de espanto.  De
fato, eu sou o secretário de sua alteza o Marajá Kumar-i-
Rajaha Singh de Marwar. Mas venho a pedido de sua
alteza a Marajoa de Marwar.
Nirmalá fechou os olhos e permaneceu em silêncio
por um instante. Ganga e Manisha estavam a seu lado e
sentiram um perfume de jasmim. Não era a primeira vez
que elas percebiam que Nirmalá emanava este perfume
quando entrava em introspecção profunda.
 Diga a suas altezas que poderei ir vê-los
amanhã, pela manhã.
 O marajá e sua esposa estão hospedados em
Rishikesh, e se a senhora me permitir, eu poderia vir
buscá-la às oito horas.
Nirmalá acenou concordando.
Ganga olhou para Nirmalá e sacudindo a cabeça à
indiana, sorriu dizendo:  Amiga eu não mais me
surpreendo com seus talentos.
Ela sorriu e fez um afago no rosto de Ganga
dizendo:
 Às vezes nós não precisamos da vidência para
concluir coisas, basta olhar e pronto. Quem em Haridwar
teria um secretário com tanta imponência? Somente um
Rajá! Por isto eu perguntei se era por sua alteza que ele
havia vindo.

Uma luxuosa limusine as esperava para levá-las ao


encontro do marajá. Nirmalá foi acompanhada por
Manisha e Ganga.
Ele estava hospedado em seu palácio de verão, nas
colinas de Narendranagar em Rishikesh. A limusine
estacionou em frente à porta principal guardada por dois
seguranças fardados. No alto da escada Nirmalá
reconheceu o secretário do marajá que, ao vê-las, desceu
para recepcioná-las.
 Bom dia! Sua Alteza a marajoa as espera no
salão azul. – disse fazendo um gesto para que elas o
seguissem.
Elas entraram em um amplo salão central em forma
circular, com piso de granito rosa e paredes com afrescos
em lápis lázuli. De cada lado da entrada, duas escadas
construídas em mármore branco davam acesso aos andares
superiores. Pinturas a óleo mostravam o marajá sentado
em seu trono, suas duas esposas e vários jovens que
deveriam ser seus filhos. Dois amplos arcos, à esquerda e
a direita, davam passagem para os salões azul e branco,
que eram as cores da bandeira do Reino de Marwar.
Sua alteza estava acompanhada de três pessoas que
se levantaram para recebê-las. O secretário fez as
apresentações:
 Sua Alteza Sahiba Gayatrí Kumarí Deví, a
Marajoa de Marwar. – disse fazendo uma mesura em
direção à sua patroa. Em seguida apresentou-as aos
convidados nomeando-os.  doutora Tabu Laho,
Archana, sua filha e o senhor Ananda.
Elas os cumprimentaram com as mãos postas
frente ao coração. Sua alteza, uma jovem senhora de seus
cinqüenta anos era uma típica mulher rajastã,
elegantemente vestida com um sári de seda multicolorido,
bordas em fio de ouro e drapeado ao estilo gujarati. Ela
levantou-se para cumprimentá-las. Manisha estava
deslumbrada com tudo ao seu redor. Ela nunca havia
estado em um lugar tão luxuoso.
A marajoa olhou-as com curiosidade. Ela tentava
adivinhar qual delas seria Nirmalá, a mulher que tanto
ouvira falar nos últimos dias.
O secretário apresentou-as à marajoa.
Ananda olhava-a encantado. Ele nunca vira uma
mulher tão linda e com uma expressão tão suave. Desde o
momento em que ele a viu no ghat, sua imagem não saía
de sua mente e dia e noite ele sonhava com este momento,
o momento de conhecê-la.
Sua alteza convidou-as para se sentarem.
 Eu a agradeço por ter aceitado o meu convite. –
disse olhando-a com um misto de curiosidade e carinho.
 Foram várias as coincidências que a trouxeram até
mim, apesar de que eu não acredito em coincidências. –
acrescentou sorrindo.  Primeiro minha terapeuta, aqui
presente, falou-me muito sobre você. – disse colocando
sua mão sobre a de Tabu Laho.  Depois meu secretário
Kumar Singh, a ouviu e ficou muito impressionado com
você. E como se não fosse o suficiente, Samiha, a segunda
esposa de meu marido, contou-me que já a conhecia dos
tempos de adolescência.
Nirmalá sorriu dizendo que ela também não
acreditava em coincidências, mesmo porque nada acontece
sem o conhecimento e a permissão da Mãe Divina.
A marajoa concordando, sorriu também.  Mas,
deixe-me apresentar a minha terapeuta, pois eu creio que
vocês ainda não se conhecem e foi ela quem primeiro me
falou sobre você.
 É verdade, nós ainda não nos conhecíamos
pessoalmente. – Nirmalá respondeu voltando-se para
Tabu.  Nós temos uma amiga em comum e eu prometi a
ela que se passasse por Haridwar iria lhe procurar.
Então, a marajoa pegou um sininho de ouro e
tocando-o por três vezes, chamou o mordomo para pedir
que ele servisse um chá no ‘jardim de Ganesha’.
Eles saíram por um dos portais de bronze,
atravessaram um belo jardim interno, com muitas flores
em um pequeno chafariz com água perfumada e passaram
para o jardim externo, através de um corredor
magnificamente decorado com lustres de cristal e quadros
com motivos de caça. O jardim de Ganesha era assim
denominado porque tinha uma imagem do filho de Shiva
esculpida em mármore branco.
Eles se sentaram e a marajoa pegou Nirmalá pela
mão levando-a para passear pelo jardim.
 Que bom que você está aqui. Quando Tabu
falou-me de você eu senti que nosso encontro seria
providencial. Confesso que fiquei surpresa ao vê-la, pois
após tudo que ouvi sobre você não esperava encontrar uma
mulher tão jovem e tão bonita.
Nirmalá limitou-se a sorrir, pois a estava escutando
de olhos semi-serrados e em silêncio. Elas caminharam
pelo jardim em direção a escultura de Ganesha.
 Aqui, teremos um pouco de privacidade, afinal
estamos somente nós duas e Ganesha, a minha divindade
de fé. Minha filha, eu creio que posso chamá-la assim,
afinal vejo que você tem a idade de Mohana, a minha
filha mais velha sobre quem quero vos falar. Você se
importa de nos sentarmos?
Nirmalá aquiesceu com um aceno de cabeça e elas
se sentaram ao lado do deus elefante.
Há dez anos meu marido conheceu Samiha durante uma
viagem que fizemos à Paris. Ela e Mohana estudavam
juntas em uma escola de línguas, e quando minha filha nos
apresentou sua amiga Samiha, o marajá começou a
cortejá-la abertamente e em menos de um ano depois,
apaixonado por ela decidiu casar-se novamente. Para mim
não foi uma surpresa, porque eu sabia que mais cedo ou
mais tarde ele iria querer ter uma segunda esposa. Mas
para Mohana foi um choque ver seu pai casar-se com
alguém da sua idade, e eu creio que isto deve ter
perturbado a minha filha, pois logo após o casamento ela
começou a ter atitudes estranhas, vive sempre irritada, não
dorme bem, não se alimenta bem e, de quando em quando
tem tido desmaios inexplicáveis. Eu já a levei a dois
médicos em Delhi e depois pedi que Tabu Laho a
examinasse. Mas segundo ela o problema de Mohana não
é físico, mas espiritual. Então, sabendo de sua vinda
sugeriu-me que eu falasse com você a respeito.

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