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A ideia do registro de ponto por exceção é de somente anotar atrasos, falta, trabalho em sábados,
domingos e feriados, ou sejam, situações que fujam da rotina de trabalho pactuada entre a empresa e o
empregado.
Isso quer dizer os cartões de ponto somente devem ser marcados nos dias em que o empregado, por
qualquer motivo que seja, chegue atrasado ou antes do seu horário habitual; ou saia mais cedo ou mais
tarde do que a jornada de trabalho habitual.
As pessoas jurídicas cumprem relevante papel nas sociedades, porquanto favorecem o crescimento e o
desenvolvimento econômico social. Desnecessário dizer o potencial e a força geradora de postos de
trabalho dessas entidades, de arrecadação de tributos de distribuição de renda, de circulação de bens e
serviços, enfim, de um ímpio espectro de atuação do qual a sociedade hodierna, sobretudo, não pode
prescindir.
Importante destacar que o princípio da função social da empresa foi expressamente referenciado no
parágrafo único do art. 116 da Lei n.º 6.404/76 (Lei das Sociedades Anônimas), vejamos:
Art. 116. Entende-se por acionista controlador a pessoa, natural ou jurídica, ou o grupo de
pessoas vinculadas por acordo de voto, ou sob controle comum, que:
[...]
Parágrafo único. O acionista controlador deve usar o poder com o fim de fazer a
companhia realizar o seu objeto e cumprir sua função social, e tem deveres e
responsabilidades para com os demais acionistas da empresa, os que nela trabalham e
para com a comunidade em que atua, cujos direitos e interesses deve lealmente respeitar e
atender.
Nestes termos, ressaltamos que é o Código de Defesa do Consumidor e a Lei de Crimes Ambientais que
adotam a teoria menor da desconsideração da personalidade jurídica.
Senão vejamos:
Art. 28 da Lei n.º 8.078/90 (Código de Defesa do Consumidor): O juiz poderá
desconsiderar a personalidade jurídica da sociedade quando, em detrimento do
consumidor, houver abuso de direito, excesso de poder, infração da lei, fato ou ato
ilícito ou violação dos estatutos ou contrato social. A desconsideração também
será efetivada quando houver falência, estado de insolvência, encerramento ou
inatividade da pessoa jurídica provocados por má administração.
Art. 4º da Lei n.º 9.605/98 (Lei que dispõe sobre as sanções penais e
administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio
ambiente): Poderá ser desconsiderada a pessoa jurídica sempre que sua
personalidade for obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados à qualidade
do meio ambiente.
O Código de Defesa do Consumidor, até então vigente, logo em seu art. 28, incluir a conhecida “Teoria
Menor da Desconsideração da Personalidade Jurídica”, isto porque, o juiz togado poderá efetuar a
desconsideração da personalidade jurídica, quando, em prejuízo do consumidor, que é o elo
hipossuficiente da relação consumerista, se notar a ocorrência de abuso de direito, infração da lei, fato ou
ato ilícito, excesso de poder, ou até mesmo, evidenciar-se a violação do contrato social ou dos estatutos
que regem suas funções sociais.
CTN - Para outros, a desconsideração da personalidade jurídica em matéria tributária seria plenamente aplicável,
e se daria com fundamento no artigo 135 do Código Tributário Nacional, dentre outros, que possuiriam os
elementos centrais da teoria da desconsideração. Sob essa perspectiva, em diversas normas do Código Tributário
Nacional haveria previsão para o afastamento de qualquer dificultador da identificação exata e clara do sujeito
passivo do tributo, a exemplo do artigo 149, inciso VII. Por conseguinte, a existência de pessoa jurídica a
obstaculizar a tributação de pessoa física, efetivo sujeito passivo da obrigação tributária, não impede o Fisco de
desconsiderá-la (a pessoa jurídica) para fins de tributação. O Código Tributário Nacional, como visto, permite a
desconsideração, a partir da leitura de diversos de seus artigos.
Art. 135. São pessoalmente responsáveis pelos créditos correspondentes a obrigações tributárias
resultantes de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou
estatutos:
I - as pessoas referidas no artigo anterior;
II - os mandatários, prepostos e empregados;
III - os diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado.
Art. 149. O lançamento é efetuado e revisto de ofício pela autoridade administrativa nos
seguintes casos:
VII - quando se comprove que o sujeito passivo, ou terceiro em benefício daquele, agiu com dolo,
fraude ou simulação;
Mas o uso da pessoa jurídica para fins ilegítimos, para a realização de ilícito, deve permitir a
desconsideração da personalidade jurídica, nos exatos termos utilizados por Alexandre Couto SILVA:
Porém, caso a empresa faça parte de grupo econômico, a comprovação do abuso de personalidade
jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade ou pela confusão patrimonial, torna-se necessária para a
desconsideração. Assim, neste caso, ter-se-á a aplicação da Teoria Maior, em conformidade com a nova
redação do art. 50, parágrafo 4º, do CC/02.
Vale destacar que as empresas que integram grupo econômico continuam sendo solidariamente
responsáveis por dívidas resultantes da relação de trabalho. Significa dizer que o trabalhador contratado
por uma das empresas integrantes do grupo poderá cobrar a integralidade da dívida de qualquer uma das
demais empresas, sem que exista uma ordem de cobrança. Porém, ao requerer a desconsideração da
personalidade jurídica para que tenha a condenação da pessoa física dos sócios ou administradores,
deverá comprovar o abuso de personalidade a que se refere o art. 50, do CC/02.
[1] STOLZE, Pablo. A Medida Provisória da Liberdade Econômica e a desconsideração da personalidade jurídica
(art. 50, CC). Primeiras impressões. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 24, n. 5782, 1 maio
2019. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/73648. Acesso em: 20 set. 2019.
[2] TARTUCE, Flávio. Manual de Direito Civil. 7ª Ed. São Paulo: Gen, 2017, pág. 179.
[3] Cf. Novo Curso de Direito Civil - Parte Geral - Vol. I, Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho, 21ª ed.
São Paulo: 2019, págs. 312 a 314.
[4] REQUIÃO, Rubens. Curso de Direito Comercial, vol. I, 23ª ed. São Paulo: Saraiva, 1998, pág. 350.
[5] COMPARATO, Fábio Konder. O Poder de Controle na Sociedade Anônima. 3ª ed. Rio de Janeiro: Forense,
1983, págs. 284-286.
[6] GUIMARÃES, Márcio Souza. Aspectos modernos da teoria da desconsideração da personalidade jurídica.
Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 8, n. 64, 1 abr. 2003. Disponível em:
https://jus.com.br/artigos/3996. Acesso em: 22 set. 2019.
[7] ARAS, Vladimir. A polêmica data de vigência do novo Código Civil. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862,
Teresina, ano 7, n. 60, 1 nov. 2002. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/3517. Acesso em: 22 set. 2019.
[8] http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2019-2022/2019/Msg/VEP/VEP-438.htm , acessado em 22 de
setembro de 2019.
O QUE MUDA COM A LEI DA LIBERDADE ECONÔMICA?
LEI Nº 13.874/2019
Lorival Aureliano e Rosangela Gomes - 04.10.2019
A antiga MP nº 881/19, denominada como medida provisória da Liberdade Econômica foi aprovada e
sancionada em 20/09/2019, tornando-se definitivamente uma Lei nacional (Lei nº 13.874/19). A nova Lei
não tem só o intuito de trazer medidas para desburocratização e simplificação de processos para as
empresas e empreendedores, mas também flexibilizar algumas regras trabalhistas, sendo apelidada
também de “minirreforma trabalhista”.
Abaixo relacionamos algumas das principais mudanças trazidas pela Lei:
Migalhas
No último dia 20/09/19 foi sancionada e convertida em lei ( lei 13.874/19) a chamada medida
provisória da liberdade econômica, a qual trouxe significativas mudanças na Consolidação das Leis
Trabalhistas.
A primeira mudança diz respeito à criação da CTPS DIGITAL, a ser emitida pela Secretaria de
Trabalho do Ministério da Economia, contendo o número do Cadastro de Pessoas Físicas (CPF)
como identificação única do empregado, dispensando que o empregado emita recibo de entrega da
CTPS.
Além disso, de acordo com o § 7º do art. 29 da CLT (incluído pela nova lei), os registros eletrônicos
gerados pelo empregador nos sistemas informatizados da CTPS em meio digital equivalem às
anotações a que se referem a CLT. No caput deste mesmo artigo, mudou-se o prazo para realização
das mencionadas anotações, prevendo-se o prazo de 5 (cinco) dias, que antes eram de 48 (quarenta
e oito) horas.
Ademais, houve mudança legal no que tange ao controle de horário do trabalhador, pois a nova
redação dada ao § 2º do art. 74 da CLT estipula a obrigatoriedade dos estabelecimentos com mais
de 20 (vinte) empregados - e não mais 10 (dez) - a promoverem anotação da hora de entrada e de
saída, em registro manual, mecânico ou eletrônico, conforme instruções expedidas pela Secretaria
Especial de Previdência e Trabalho do Ministério da Economia, sendo permitida a pré-assinalação do
período de repouso.
Outra mudança é relativa ao controle de ponto por exceção, caracterizado pelo meio do qual o
empregador efetua o controle apenas da jornada extraordinária. Portanto, a partir da vigência da
nova lei, permite-se que sejam anotadas apenas as horas extras, ressaltando-se a necessidade de
autorização para tal prática, mediante acordo individual escrito, convenção coletiva ou acordo
coletivo de trabalho.
Tais alterações, segundo o governo - que propôs a medida provisória -, visam o desenvolvimento e o
crescimento econômicos do País, sobretudo a partir de modernização e simplificação de
procedimentos anteriormente estipulados em lei e utilização de tecnologia para diminuir a
complexidade, dualidade e desarmonia de informações.
Por fim, é importante ressaltar que a mencionada lei entrará em vigor a partir da data de sua
publicação, tendo como justificativa de que a necessidade da vigência imediata se dá pelo interesse
público.
A interpretação do que vem a ser cada um desses requisitos, no entanto, foi restringida a uma
interpretação pré-determinada pelo legislador.
O desvio de finalidade passa a ser “a utilização dolosa da pessoa jurídica com o propósito de lesar
credores e para a prática de atos ilícitos de qualquer natureza” (parágrafo 1º do parágrafo 50, Código
Civil).
São exemplos dessa variegada conformação da disregard doctrine no Brasil o artigo 50 do
Código Civil e o artigo 28 da Lei 8.078/1990. Quanto às formas de dilatação da responsabilidade
pessoal, vejam-se o artigo 4º da Lei 9.605/98, o artigo 18, parágrafo 3º da Lei 9.847/99, o artigo 23 do
Decreto 2.953/99, o artigo 34 da Lei 12.529/11, o artigo 14 da Lei 12.846/13 e, muitas vezes, a medida
é alicerçada no artigo 2º da CLT e nos artigos 124 e 125 do CTN.
Migalhas
A “lei da liberdade econômica” (lei 13.874/19) e os seus principais impactos para o
Direito Civil.
Seguimos o estudo e a análise da lei 13.874/19, conhecida como “lei da liberdade econômica” -
fruto da medida provisória 881, de 30 de abril de 2019 -, sancionada no dia 20 de setembro de 2019.
Neste segundo texto serão abordadas as principais mudanças realizadas na codificação privada em
vigor a respeito dos contratos, especialmente as alterações dos arts. 113 e 421, bem como a inclusão
do novo art. 421-A no Código Civil de 2002. Antes deste estudo pontual, começaremos com reflexões
sobre o âmbito de incidência da nova lei para os negócios jurídicos patrimoniais.
1. Abrangência da lei quanto aos contratos
Sobre a abrangência da nova lei, não se pode negar que o seu principal âmbito de aplicação diz
respeito aos contratos paritários ou negociados. Essa categoria jurídica surge quando do estudo da
classificação dos contratos quanto à negociação do conteúdo pelas partes.
Nesse contexto, os contratos de adesão são aqueles em que uma parte, o estipulante, impõe o
conteúdo negocial, restando à outra parte, o aderente, duas opções: aceitar ou não o conteúdo desse
negócio (take it or leave it). Tenho defendido uma visualização ampla do conceito, de modo a englobar
todas as figuras negociais em que as cláusulas são preestabelecidas ou predispostas de forma
majoritária, caso do contrato-tipo e do contrato formulário, em que as cláusulas são predeterminadas
até por um terceiro. Além disso, não me filio à antiga diferenciação entre contratos de adesão e por
adesão - sustentada, no passado, por Orlando Gomes -, no sentido da necessidade de haver nos
primeiros o monopólio de uma determinada atividade.
Essa diferenciação restou há tempos superada por duas razões principais. A primeira delas diz
respeito ao fato de os monopólios serem cada vez mais raros. A segunda razão de superação é relativa
à definição de contrato de adesão que consta do art. 54 do Código de Defesa do Consumidor, no
sentido de ser “aquele cujas cláusulas tenham sido aprovadas pela autoridade competente ou
estabelecidas unilateralmente pelo fornecedor de produtos ou serviços, sem que o consumidor possa
discutir ou modificar substancialmente seu conteúdo”. Nota-se que em nenhum momento a norma
jurídica em destaque estabelece a presença do monopólio para que o instituto esteja presente.
De toda sorte, apesar de essa definição constar da lei consumerista, o contrato de adesão não
necessariamente é de consumo, como se retira do enunciado 171, aprovado na III Jornada de Direito
Civil, promovida pelo conselho da justiça federal em 2004. A título de exemplo podem ser citados os
contratos de franquia, geralmente firmados entre empresários e que não são contratos de consumo,
pois o fraqueado não é destinatário fático e econômico dos produtos e serviços que recebe. A propósito
dessas afirmações, vale destacar importante julgado do Superior Tribunal de Justiça que concluiu não
existir mais a diferença entre os termos contratos de adesão e por adesão; e que a franquia figura entre
esses, mas não constitui um contrato de consumo. O aresto diz respeito à invalidade de cláusula
compromissória, tida como patológica, por não ter sido destacada, nos termos do art. 4º da lei de
arbitragem. Nos seus exatos termos, “o contrato de franquia, por sua natureza, não está sujeito às
regras protetivas previstas no CDC, pois não há relação de consumo, mas de fomento econômico.
Todos os contratos de adesão, mesmo aqueles que não consubstanciam relações de consumo, como
os contratos de franquia, devem observar o disposto no art. 4º, § 2º, da lei 9.307/96. Poder Judiciário
pode, nos casos em que prima facie é identificado um compromisso arbitral ‘patológico’, i.e., claramente
ilegal, declarar a nulidade dessa cláusula, independentemente do estado em que se encontre o
procedimento arbitral” (STJ, REsp 1.602.076/SP, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado
em 15/09/2016, DJe 30/09/2016).
Art. 4º A cláusula compromissória é a convenção através da qual as partes em um contrato
comprometem-se a submeter à arbitragem os litígios que possam vir a surgir, relativamente a tal
contrato.
§ 2º Nos contratos de adesão, a cláusula compromissória só terá eficácia se o aderente tomar a
iniciativa de instituir a arbitragem ou concordar, expressamente, com a sua instituição, desde que
por escrito em documento anexo ou em negrito, com a assinatura ou visto especialmente para
essa cláusula.
Ao lado dos contratos de adesão, têm-se os contratos paritários ou negociados, cujo conteúdo é
discutido entre as partes, geralmente em posição econômica de igualdade, o que constitui exceção no
meio social e não a regra, diante daquilo que Enzo Roppo denomina como “Império dos Contratos-
Modelo”. Não se pode negar, todavia, que muitos dos contratos celebrados entre grandes empresas
assumem essa última categorização, estando sujeitos à nova lei da liberdade econômica, em muitas de
suas previsões. Cite-se, a título de uma primeira ilustração, o aqui antes analisado art. 3º, inc. VIII, da lei
13.874/19, segundo o qual “são direitos de toda pessoa, natural ou jurídica, essenciais para o
desenvolvimento e o crescimento econômico do país, observado o disposto no parágrafo único do art.
170 da Constituição Federal. (...). VIII - ter a garantia de que os negócios jurídicos empresariais
paritários serão objeto de livre estipulação das partes pactuantes, de forma a aplicar todas as regras de
direito empresarial apenas de maneira subsidiária ao avençado, exceto normas de ordem pública”. O
dispositivo ressalta a importância da autonomia privada em tais negócios, mas releva a necessidade de
observância das normas de ordem pública ou cogentes, como sempre se afirmou e se entendeu, tanto
em doutrina como em jurisprudência.
Na verdade, como se verá do estudo dos tópicos a seguir, a minha posição é a de que o principal
âmbito de incidência da norma emergente diz respeito a tais contratos paritários ou negociados, sendo
esse o seu foco principal. A respeito das demandas que surgem desses negócios, não se pode negar
que muitas delas não estão no âmbito do Poder Judiciário, mas em painéis arbitrais em curso não só no
Brasil como também no exterior.
2. Inclusões no art. 113 do Código Civil a respeito da interpretação dos negócios jurídicos
em geral
O art. 113 do Código Civil traz em seu conteúdo a função de interpretação da boa-fé objetiva,
dirigida a todos os negócios jurídicos em geral. O seu âmbito de incidência, portanto, não é somente o
contrato, podendo o preceito ser aplicado ao casamento, ao testamento e a outros negócios jurídicos,
patrimoniais ou não.
Conforme o seu caput, os negócios jurídicos devem ser interpretados conforme a boa-fé e os usos
do lugar da sua celebração, valorizando-se a importância das regras de tráfego. Exatamente nesse
sentido, o enunciado 409 da V Jornada de Direito Civil preceitua que se deve incluir no sentido da
norma as práticas habitualmente adotadas entre as partes.
O comando recebeu dois parágrafos pela lei da liberdade econômica. Na originária medida
provisória 881 - pelo que constava dos pretendidos arts. 480-A e 480-B do Código Civil -, e também no
processo de sua conversão em lei, a ideia seria inserir novas regras somente para os negócios jurídicos
empresariais. Todavia, o relator do projeto de conversão, deputado Jerônimo Goergen, ouviu a
recomendação feita por alguns civilistas, caso de Maurício Bunazar, no sentido de que os novos
critérios interpretativos seriam interessantes para todo e qualquer negócio jurídico, o que é verdade, não
sendo viável que o Código Civil criasse uma separação entre negócios empresariais e civis na sua parte
geral. Muitos desses critérios, aliás, já eram aplicados na prática do Direito Privado, em julgados e
decisões arbitrais; e também retirados do art. 131 do Código Comercial, ora revogado.
Na redação do novo § 1º do art. 113 do Código Civil, a interpretação do negócio jurídico deve lhe
atribuir o sentido que: a) for confirmado pelo comportamento das partes posterior à celebração do
negócio, sendo vedado e não admitido o comportamento contraditório da parte, com ampla aplicação
prática (venire contra factum proprium non potest); b) corresponder aos usos, costumes e práticas do
mercado relativas ao tipo de negócio, o que já está previsto no caput do comando, pela valorização das
regras de tráfego; c) corresponder à boa-fé, o que igualmente se retira da norma anterior; d) for mais
benéfico à parte que não redigiu o dispositivo, se identificável; e e) corresponder a qual seria a razoável
negociação das partes sobre a questão discutida, inferida das demais disposições do negócio e da
racionalidade econômica das partes, consideradas as informações disponíveis no momento de sua
celebração. Parece-me que as previsões relativas às letras b e c ficaram sem sentido após a retirada da
aplicação restrita aos negócios empresariais.
Sobre a penúltima previsão, ressalvo que, muito mais do que a incidência principal quanto aos
contratos paritários, houve uma ampliação de tutela dos aderentes negociais e contratuais, aqueles
para quem o conteúdo do negócio jurídico é imposto. Isso porque qualquer cláusula passa a ser
interpretada contra aquele que redigiu o seu conteúdo, máxima há muito tempo reconhecida pelo Direito
(interpretatio contra proferentem). Alarga-se, portanto, o sentido do art. 423 do Código Civil, segundo o
qual a interpretação favorável ao aderente se daria apenas em havendo cláusulas ambíguas ou
contraditórias. De todo modo, também é possível aplicar essa interpretação a negócios paritários, desde
que seja possível identificar determinada cláusula ou cláusulas que foram impostas por uma das partes,
tidas isoladamente como de adesão, hipótese em que serão interpretadas contra quem as redigiu.
A respeito do último inciso do novo § 1º do art. 113 do Código Civil, valoriza-se a negociação
prévia das partes, especialmente a troca de informações e de mensagens pré-negociais entre elas.
Essas negociações devem ser confrontadas com as demais cláusulas do negócio pactuado, bem como
com a racionalidade econômica das partes. A expressão destacada é mais uma cláusula geral, a ser
preenchida pelo aplicador do Direito nos próximos anos, assim como ocorreu com a boa-fé objetiva e a
função social do contrato nos últimos quinze anos de vigência da lei geral privada. Para tanto, a título de
exemplo, devem ser considerados os comportamentos típicos das partes perante o mercado e em
outras negociações similares, os riscos alocados nos negócios e as expectativas de retorno dos
investimentos.
Como última nota sobre o diploma, foi inserido um § 2º no mesmo art. 113 do Código Civil,
prevendo que “as partes poderão livremente pactuar regras de interpretação, de preenchimento de
lacunas e de integração dos negócios jurídicos diversas daquelas previstas em lei”. Como se verá, há
norma muito próxima no novo art. 421-A, inc. I, da codificação, sendo necessário o devido controle
dessas regras de interpretação ou preenchimento de lacunas pelos julgadores em geral, para que
abusos não sejam cometidos. Adiante-se que a norma pode ser inócua em muitas situações, pois as
partes de um negócio jurídico podem sim pactuar a respeito dessas questões, mas isso não afasta a
eventual intervenção do Poder Judiciário em casos de abusos negociais ou em havendo a tão citada
lesão a norma de ordem pública. Pode-se também sustentar que não haveria a necessidade de inclusão
dessa previsão no texto legal, pois o seu conteúdo já vinha sendo admitido parcialmente pela doutrina
brasileira, pelo teor do enunciado 23 da I Jornada de Direito Comercial.
Porém, em alguns casos, especialmente em negócios paritários, pode ser muito útil para a prática
a inclusão de determinada regra de interpretação contratual que não contravenha disposição absoluta
de lei. A título de exemplo, imagine-se uma regra que determine que uma cláusula específica prevaleça
sobre uma geral, ou vice-versa.
3. Da nova redação do art. 421 do Código Civil
Sobre o art. 421 do Código Civil, é interessante confrontar a redação original do comando, a que
constava da MP 881/19 e a que acabou sendo adotada na sua conversão em lei.
Art. 421 do CC. Art. 421 do CC. Art. 421 do CC. Redação
Redação original. Redação com a MP 881. após a lei 13.874/19.
“A liberdade de “Art. 421. A liberdade “A liberdade contratual
contratar será exercida em de contratar será exercida será exercida nos limites da
razão e nos limites da em razão e nos limites da função social do contrato.
função social do contrato”. função social do contrato, Parágrafo único. Nas relações
observado o disposto na contratuais privadas,
Declaração de Direitos de prevalecerão o princípio da
Liberdade Econômica. intervenção mínima e a
Parágrafo único. Nas excepcionalidade da revisão
relações contratuais contratual”.
privadas, prevalecerá o
princípio da intervenção
mínima do Estado, por
qualquer dos seus
poderes, e a revisão
contratual determinada de
forma externa às partes
será excepcional.”
Sobre a redação original do dispositivo, seguindo a melhor doutrina, sempre sustentei que ela
trazia dois equívocos técnicos, que tenderiam a ser corrigidos pelo antigo projeto de lei Ricardo Fiuza, o
originário PL 6.960/02. Acatando as sugestões formuladas por Antônio Junqueira de Azevedo e Álvaro
Villaça Azevedo, professores da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, propunha-se a
mudança no texto exatamente como ele se encontra agora. Destaque-se que a professora Giselda
Hironaka também escreveu texto no mesmo sentido, logo após a entrada em vigor da codificação de
2002, apoiando as mudanças.
Como primeiro equívoco anterior, a norma mencionava a liberdade de contratar, relacionada com
a celebração do contrato em si e que, em regra, é ilimitada, pois a pessoa celebra o contrato quando
quiser e com quem quiser, salvo raríssimas exceções. Por outra via, tem-se que a função social - a
finalidade coletiva do instituto, com suas projeções internas e externas - limita a liberdade contratual,
relativa ao conteúdo negocial em si, às cláusulas contratuais propriamente ditas. Ademais, a função
social do contrato nunca foi e não é razão do contrato, constituída pela autonomia privada, pela
liberdade individual, sendo necessário excluir a locução “em razão e”.
Diante dessa realidade jurídica, quando da emergência da medida provisória 881, na sua
tramitação no Congresso Nacional, escrevi artigo científico, publicado neste canal, em que sustentei a
necessidade de alteração da lei com a correção desses dois equívocos. O texto trazido originalmente
pela MP estabelecia, ignorando a necessidade desses reparos, que “a liberdade de contratar será
exercida em razão e nos limites da função social do contrato, observado o disposto na Declaração de
Direitos de Liberdade Econômica”. Como se percebe, a redação também procurava reduzir
consideravelmente a abrangência da função social do contrato, limitando-a ao conteúdo do art. 3º da
norma, que trata da Declaração de Direitos de Liberdade Econômica, o que, por bem, acabou não
prosperando.
A proposta de emenda 199, apresentada pelo senador Jean Paul Prates no Congresso Nacional,
seguiu a minha sugestão a respeito do caput do comando, nos seguintes termos de justificativas: “com
apoio no texto intitulado ‘A MP 881/19 (liberdade econômica) e as alterações do Código Civil. Primeira
parte’, escrito por um dos mais respeitados civilistas brasileiros – o professor Flávio Tartuce –,
sugerimos a emenda em pauta”. A proposta acabou por ser adotada na tramitação legislativa na linha
do que sempre sustentei doutrinariamente e com base nas lições de Antônio Junqueira de Azevedo,
Álvaro Villaça Azevedo e Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka. Sendo assim, por bem, o texto do
art. 421 do Código Civil foi finalmente corrigido, para que tenha o real sentido, de que a liberdade
contratual, a autonomia privada, é que é limitada pela função social do contrato.
Pontue-se, a propósito, que, quando da tramitação legislativa, chegou-se a debater outro texto,
sugerido pelos Professores Otávio Luiz Rodrigues Jr. e Rodrigo Xavier Leonardo, por meio do Senador
Antonio Anastasia (emenda 158). Pela proposição, o dispositivo teria a seguinte dicção: “O contrato
cumprirá a sua função social”. A norma proposta era até mais abrangente e louvável, pois colocava a
função social do contrato no plano da validade do negócio jurídico. De todo modo, essa interpretação já
é realizada pela doutrina, conforme se retira do enunciado 431 da V Jornada de Direito Civil.
Sobre o parágrafo único do art. 421, continua ele trazendo uma obviedade, desde o texto original
da medida provisória, ao enunciar que a revisão contratual regida pelo Código Civil é excepcional. Na
verdade, o Código Civil de 2002 adotou uma teoria de difícil aplicação prática - a teoria da imprevisão
para uns, teoria da onerosidade excessiva, para outros -, com elementos insuperáveis para que a
revisão seja efetivada, notadamente o elemento da imprevisibilidade (arts. 317 e 478). Acrescente-se
que essa revisão também é dificultada por requisitos adicionais que constam do art. 330, §§ 2º e 3º, do
CPC/15, quais sejam a determinação da parte controversa e incontroversa da obrigação - com a
necessidade de eventual apresentação de cálculo contábil desses valores - e o depósito da parte
incontroversa; sob pena de inépcia da petição inicial. Por isso, afirmar que a revisão de um contrato civil
não é a regra significa dizer algo que já era da nossa realidade jurídica.
A encerrar o estudo do art. 421, parágrafo único, estou totalmente filiado às críticas de Anderson
Schreiber, constantes do nosso Código Civil Comentado, a respeito da inexistência do princípio da
intervenção mínima, agora previsto na norma. Vejamos suas palavras:
“A MP n. 881/19 também introduziu no art. 421 um parágrafo único, que estabelece a prevalência
de um assim chamado ‘princípio da intervenção mínima do Estado’ e reserva caráter ‘excepcional’ à
revisão contratual ‘determinada de forma externa às partes’. Mais uma vez, o equívoco salta aos olhos.
Não existe um ‘princípio da intervenção mínima do Estado’; a intervenção do Estado nas relações
contratuais de natureza privada é imprescindível, quer para assegurar a força vinculante dos contratos,
quer para garantir a incidência das normas jurídicas, inclusive das normas constitucionais, de hierarquia
superior à referida medida provisória. A MP n. 881/19 parece ter se deixado se levar aqui por uma certa
ideologia que enxerga o Estado como inimigo da liberdade de contratar, quando, na verdade, a
presença do Estado – e, por conseguinte, o próprio Direito – afigura-se necessária para assegurar o
exercício da referida liberdade. No que tange à revisão contratual, também parece ter incorrido a
medida provisória nessa falsa dicotomia entre atuação do Estado-juiz e liberdade de contratar, quando,
ao contrário, a revisão contratual privilegia o exercício dessa liberdade ao preservar a relação contratual
estabelecida livremente entre as partes, ao contrário do que ocorre com a resolução contratual, remédio
a que já tem direito todo contratante nas mesmas situações em que a revisão é cabível (v. comentários
ao art. 478). Se a intenção da MP foi evitar que revisões judiciais de contratos resultem em alterações
excessivas do pacto estabelecido entre as partes, empregou meio inadequado: afirmar que a revisão
contratual deve ser excepcional nada diz, porque não altera as hipóteses em que a revisão se aplica, as
quais são expressamente delimitadas no próprio Código Civil. O novo parágrafo único, acrescentado
pela MP, tampouco indica parâmetros, critérios ou limites à revisão contratual, o que leva a crer, mais
uma vez, que a alteração não produzirá qualquer efeito relevante no modo como a revisão contratual é
aplicada na prática jurisprudencial brasileira – aplicação que, de resto, já se dá com bastante cautela e
parcimônia, sem interferências inusitadas no conteúdo contratual”.1
De fato, esse tal princípio da intervenção mínima é desconhecido pelos civilistas, sendo mais um
argumento retórico e ideológico do que um princípio contratual com efetividade. Na verdade, a
afirmação de que a intervenção do Estado não constitui regra, mas exceção, já poderia ser retirada da
própria ideia da autonomia privada ou da força obrigatória da convenção. De todo modo, os abusos
contratuais são comuns no Brasil, e, em casos tais, é imperiosa a intervenção estatal, por meio do
Poder Judiciário.
4. O novo art. 421-a do Código Civil
Encerrando este artigo - sem prejuízo das reflexões que constarão das novas edições dos nossos
livros -, é necessário analisar o conteúdo do art. 421-A do Código Civil, igualmente inserido pela lei da
liberdade econômica, originária da MP 881. Na última norma, os seus conteúdos estavam colocados
nos arts. 480-A e 480-B, totalmente fora de contexto, pois o art. 480 trata de revisão de contratos
unilaterais. A nova inserção permite deduzir que o diploma emergente traz ideias complementares a
respeito da função social dos contratos.
Conforme o caput do novo comando, “os contratos civis e empresariais presumem-se paritários e
simétricos até a presença de elementos concretos que justifiquem o afastamento dessa presunção,
ressalvados os regimes jurídicos previstos em leis especiais”. Quanto à diferença entre contratos civis e
empresariais, sabe-se que o Código Civil de 2002 unificou o seu tratamento, não se justificando
diferenciação quanto a ambos a respeito das normas jurídicas incidentes na atual realidade jurídica. No
que concerne aos contratos empresariais - aqueles em que as partes figuram como empresários -,
aplica-se, assim, a teoria geral dos contratos prevista na codificação material, entre os arts. 421 e 480.
Sobre a necessidade de se elaborar uma teoria própria para os contratos empresariais, a propósito,
está sendo debatida no Senado Federal a necessidade ou não de um novo Código Comercial tratar
desse tema.
Entendo, por isso, que somente se justifica certa diferenciação quanto ao nível de intervenção
estatal desde que o contrato seja paritário ou negociado, hipótese em que a intervenção deve ser
menor. Nesse sentido, o enunciado 21 da I Jornada de Direito Comercial, de autoria do Professor André
Luiz Santa Cruz Ramos: “nos contratos empresariais, o dirigismo contratual deve ser mitigado, tendo
em vista a simetria natural das relações interempresariais”. Advirto que, na minha visão, essa afirmação
de mitigação do dirigismo contratual somente vale para os contratos paritários e não para os de adesão,
que, como visto, têm especial proteção na codificação em vigor (arts. 423 e 434), até ampliada pela
própria lei da liberdade econômica, diante do novo art. 113, § 1º, inc. IV, do CC, aqui antes já
comentado.
Seguindo essa ideia de menor intervenção nos contratos empresariais, apesar da aplicação do
Código Civil de 2002, destaque-se, da jurisprudência superior: “contratos empresariais não devem ser
tratados da mesma forma que contratos cíveis em geral ou contratos de consumo. Nestes admite-se o
dirigismo contratual. Naqueles devem prevalecer os princípios da autonomia da vontade e da força
obrigatória das avenças. Direito Civil e Direito Empresarial, ainda que ramos do Direito Privado,
submetem-se a regras e princípios próprios. O fato de o Código Civil de 2002 ter submetido os contratos
cíveis e empresariais às mesmas regras gerais não significa que estes contratos sejam essencialmente
iguais” (STJ, REsp 936.741/GO, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, julgado em
03/11/2011, DJe 08/03/12). Ou, ainda, como se retira de acórdão publicado no informativo 583 da Corte,
que trata de contrato agrário celebrado por uma grande empresa como arrendatária e sem prejuízo de
outros acórdãos: “efetivamente, no Direito Empresarial, regido por princípios peculiares, como a livre
iniciativa, a liberdade de concorrência e a função social da empresa, a presença do princípio da
autonomia privada é mais saliente do que em outros setores do Direito Privado. Com efeito, o controle
judicial sobre eventuais cláusulas abusivas em contratos empresariais é mais restrito do que em outros
setores do Direito Privado, pois as negociações são entabuladas entre profissionais da área
empresarial, observando regras costumeiramente seguidas pelos integrantes desse setor da economia”
(STJ, REsp 1.447.082/TO, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, Terceira Turma, julgado em 10/5/16,
DJe 13/5/16).
Reconhecida a necessidade de uma menor intervenção nos contratos paritários no atual sistema
jurídico - sejam civis ou empresariais -, voltando-se à essência do art. 421-A, o seu caput consagra uma
presunção relativa ou iuris tantum de paridade e de simetria econômica nessas figuras. Todavia, sendo
evidenciado que o contrato é de adesão - o que pode decorrer não só de prova construída pela parte
interessada, mas também das práticas e da realidade do meio social -, afasta-se essa presunção, o que
justifica a incidência das regras protetivas do aderente aqui antes estudadas (arts. 113, § 1º, inc. IV, 423
e 424 do CC). A nova norma também exclui expressamente o tratamento previsto em leis especiais,
caso do Código de Defesa do Consumidor, que, no seu art. 4º, inc. III, consagra a presunção absoluta
ou iure et de iure de vulnerabilidade dos consumidores. A propósito, no meu entender, pontuo que a
nova lei da liberdade econômica não traz qualquer impacto para os contratos de consumo, sendo
dirigida aos contratos civis em geral, não submetidos ao CDC.
O novo art. 421-A do Código Civil ainda preceitua, no seu inc. I, que está garantida às partes
contratuais a possibilidade de estabelecer parâmetros objetivos para a interpretação das cláusulas
negociais e de seus pressupostos de revisão ou de resolução. Trata-se de reprodução parcial do
enunciado 23 da I Jornada de Direito Comercial, novamente proposto pelo professor André Luiz Santa
Cruz Ramos, que participou do processo de elaboração da MP 881, que deu origem à lei da liberdade
econômica. Conforme essa ementa doutrinária, “em contratos empresariais, é lícito às partes
contratantes estabelecer parâmetros objetivos para a interpretação dos requisitos de revisão e/ou
resolução do pacto contratual”. Norma em sentido próximo, aliás, consta do antes analisado novo art.
113, § 2º, do Código Civil.
A título de concreção, as partes de um contrato civil podem fixar previamente quais são os
eventos que podem gerar imprevisibilidade, extraordinariedade ou onerosidade excessiva para um
determinado negócio, para os fins de rever ou resolver o contrato, e nos termos do que consta dos arts.
317 e 478 da codificação privada. Podem, ainda, a respeito da interpretação do contrato, estabelecer
que uma cláusula é a mais importante de toda a avença, devendo guiar a interpretação das demais.
Entretanto, ressalve-se, mais uma vez, que, caso haja lesão a norma de ordem pública, essa
previsão contratual interpretativa pode não prevalecer, por força do sempre citado art. 3º, inc. VIII, da
própria lei 13.874/19. Cite-se, a título de exemplo, uma cláusula de revisão ou de interpretação que
procure afastar as regras de limitação ou de redução equitativa da cláusula penal, previstas nos arts.
412 e 413 do Código Civil. O controle do julgador também deve ser maior caso haja um contrato de
adesão, mesmo que celebrado entre empresários, por força do art. 424 do CC/02, que estabelece a
nulidade de qualquer cláusula que implique a renúncia do aderente a direito resultante da natureza do
negócio. Cite-se, como ilustração da última, uma cláusula limitativa de indenização em decorrência da
resolução do contrato imposta ao aderente, que deve ser tida como nula de pleno direito.
Seguindo, conforme o art. 421-A, inc. II, do CC/02, a alocação de riscos definida pelas partes deve
ser respeitada e observada. Assim, é preciso levar em conta, por exemplo, os investimentos realizados
pelas partes e a oportunidade de reavê-los, sem prejuízo da obtenção dos lucros esperados, de acordo
com a racionalidade econômica e as regras de tráfego de cada negócio em si. Repete-se, assim, o
sentido já previsto no novo art. 113, § 1º, inc. V, do Código Civil, que, como visto, menciona a
racionalidade econômica das partes. Mais uma vez, se essa alocação de riscos gerar enriquecimento
sem causa de uma parte frente a outra, se acarretar onerosidade excessiva, se afrontar a função social
do contrato, a boa-fé objetiva ou outro preceito de ordem pública, poderá ser desconsiderada, tida como
nula ou ineficaz.
Como última análise, o inc. III do art. 421-A repete o parágrafo único do art. 421 ao estabelecer
que “a revisão contratual somente ocorrerá de maneira excepcional e limitada”. Valem os comentários
antes desenvolvidos sobre o último preceito, sendo a regra também desnecessária, pois a revisão
contratual já tem caráter excepcional, como antes pontuado, limitando-se às partes envolvidas.
Por tudo o que foi aqui analisado, nota-se que, em matéria de contratos, a lei da liberdade
econômica procurou valorizar a autonomia privada e resolver antigos problemas técnicos que existiam
no Código Civil, o que é louvável. Todavia, não se pode dizer que a autonomia privada, a força
obrigatória do contrato e a tal intervenção mínima passaram a ser princípios contratuais inafastáveis e
absolutos. Por óbvio que devem eles ser ponderados e mitigados frente a outros regramentos, caso das
sempre citadas função social do contrato e boa-fé objetiva. Com isso, busca-se o eventual equilíbrio
contratual perdido e a vedação dos abusos e excessos negociais, tão comuns em nosso país.
___________
1 SCHREIBER, Anderson. Código Civil comentado: doutrina e jurisprudência. Rio de Janeiro:
Forense, 2019. p. 245-246.
CONTRATOS PARITÁRIOS : Igualdade das partes na discussão dos termos do negócio, cláusulas e
condições.
CONTRATOS POR ADESÃO : excluem a liberdade sobre as cláusulas e condições,q ue são
previamente redigidas por um dos contratantes. Supõe : a) Uniformidade; b) Proposta permanente e
geral; c) Superioridade econômica de uma das partes.
Agora, com a criação da sociedade limitada unipessoal, resta a dúvida qual o tipo societário a ser
escolhido. Abaixo segue um quadro onde estão comparadas as principais características entre EIRELI e
sociedade limitada unipessoal, cabendo ao empresário, de acordo com as peculiaridades de seu
negócio decidir onde melhor se enquadra.
EIRELI UNIPESSOAL LTDA.
Responsabilidade do
Limitada Limitada
titular/sócio
Número de sócios necessários Uma Uma
Não exige valor
Capital mínimo integralizado 100 salários mínimos
mínimo
Restrições para pessoas Apenas uma sociedade dessa por
Não possui
físicas pessoa
Restrições para pessoas
Não possui Não possui
jurídicas
Portanto, as duas principais diferenças se encontram no capital mínimo a ser integralizado no
ato constitutivo e na impossibilidade de pessoas naturais serem titulares de mais de uma EIRELI.
Migalhas
Inicialmente, precisamos saber qual o objeto de referida lei, bem como quais regras podem ter
sido criadas ou alteradas para atingir tal objetivo.
A norma em questão se propôs a estabelecer regras para proteção da livre iniciativa e do livre
exercício da atividade econômica, e, para tanto, elencou em seu artigo 2º os princípios que norteiam
esta lei, isto é, a liberdade como garantia para o exercício de atividades econômicas, a boa-fé do
particular perante o ente público, a intervenção subsidiária e excepcional do Estado sobre o exercício de
atividades econômicas e o reconhecimento da vulnerabilidade (de quem?) perante o Estado.
Mas, o que esses princípios querem dizer?
Através deles, podemos perceber que a lei foi criada para proteger o empreendedor particular, ao
passo que reconhece que este possui menor capacidade probatória e de investimento se comparado ao
Estado, bem como que pretende desburocratizar a vida de tais empreendedores, deixando todo o
procedimento para abertura e continuidade da empresa mais simples.
Denota-se que a intenção do legislador foi reafirmar o princípio do livre mercado, através do qual
as empresas possuem o direito da livre definição dos preços dos seus produtos e serviços em
mercados não regulados. Mas então isso quer dizer que o Governo não pode interferir na fixação dos
preços e serviços? Sim, exatamente isso! Em sendo o mercado livre, não pode o Governo interferir nas
decisões por ele tomadas, inclusive com relação aos preços a serem praticados.
Da mesma forma, visando desburocratizar o procedimento, acaba com a exigência de alvará de
funcionamento, sanitário e ambiental, para abertura de empresas com atividades de baixo risco; limita
as opções de restrição do horário de funcionamento de comércios e serviços pelo Poder Público e
Sindicatos; e permite a abertura e fechamento automático de empresas por meio das Juntas
Comerciais.
Acerca das questões trabalhistas, apesar de inicialmente ter sido apelidada de “minirreforma
trabalhista”, por terem vários pontos iniciais de alteração vetados, isso não se concretizou, sendo
apenas alterados ou excluídos alguns artigos da CLT, tais como os artigos 17, 20, 21, 25, 26, 30 a 34,
inciso II do artigo 40, artigos 53, 54, 56, 141, parágrafo único do artigo 415, e artigos 417, 419, 420, 421,
422 e 633.
No tocante ao horário de trabalho, foram feitas duas grandes alterações: a alteração do artigo 74
da CLT, fazendo constar que os estabelecimentos com até 19 empregados, não precisam ter controle
de jornada, sendo que em havendo 20 ou mais empregados, a anotação será obrigatória.
A segunda alteração é a permissão de utilização do ponto por exceção – quando são anotadas
apenas as horas extras prestadas, presumindo sua inexistência se não houver registro –, desde que
haja previsão em acordo individual, convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho.
O Sistema E-Social será substituído, em todo o país, por um sistema simplificado de obrigações
previdenciárias, trabalhistas e fiscais.
Houve ainda a instituição da CTPS de forma eletrônica, a qual possuirá apenas o CPF como
documento de identificação, sendo que a emissão do referido documento de forma física será em
caráter excepcional e aplicável apenas quanto o empregador não for obrigado a utilizar o E-Social (ou o
sistema que irá substituí-lo).
Acerca dessa novidade, e visando disciplinar como tal emissão ocorrerá, foi publicado no Diário
Oficial de 24/9 a portaria SEPRT 1.065, que prevê que para todos aqueles que já possuem CPF a
carteira de trabalho digital já está previamente emitida, sendo que basta a pessoa acessar
o site acesso.gov.br, ou baixar o aplicativo em seu smartphone, para habilitá-la.
Todos os registros eletrônicos ali gerados equivalerão às anotações na CTPS física.
A lei, ainda, altera o CC, para fazer constar que a Pessoa Jurídica não se confunde com os seus
sócios, associados, instituidores ou administradores, instituindo a autonomia patrimonial das pessoas
jurídicas, impondo que os bens particulares dos sócios e administradores da pessoa jurídica somente
poderão ser afetados se restar caracterizado o desvio de finalidade desta ou a confusão patrimonial,
definindo assim os conceitos de desconsideração da personalidade jurídica.
Após essas explanações acerca das alterações trazidas pela lei da liberdade econômica, volto ao
questionamento contido no título do presente artigo. Precisávamos de uma lei para isso?
Na atual conjuntura econômica e política do país, em que tivemos inclusive a intervenção do
governo acerca dos preços praticados pelas companhias de petróleo quando do episódio da greve dos
caminhoneiros (e novamente alguns meses depois), acredito que a melhor forma de demonstrar à
sociedade, e principalmente aos empreendedores, a liberdade para praticar as atividades por eles
decididas, seria respeitar as normas.
Não nego que a desburocratização trazida pela lei da liberdade econômica é bem-vinda, mas suas
regras serão seguidas pelo Governo, pelos órgãos fiscalizadores e pelo Judiciário?
Será mesmo que o ponto por exceção será um benefício ou trará só mais uma complicação às
demandas Judiciais? Afinal, de quem será o ônus de provar a jornada em empresas que o adotarem e
tenham mais de 20 funcionários? E quando da desconsideração da personalidade jurídica, quem
validará se houve ou não o referido desvio ou confusão patrimonial?
Se a redução burocrática é sempre um alívio ao empreendedor, ainda precisaremos de anos para
saber se o restante das providências nela contidas, efetivamente, trará o resultado almejado.
Talvez a mera simplificação das normas já existente, reduzindo esse cipoal jurídico em que se
embrenham os empreendedores, teria sido mais que suficiente, não sendo necessária a criação de
mais uma lei a ser considerada na hora de empreendermos?
LIBERDADE ECONÔMICA
APENAS UMA DECLARAÇÃO DE (BOAS) INTENÇÕES – OU MUITO MAIS DO QUE ISTO?
1. PRINCÍPIOS NORTEADORES
O Brasil ocupa o 110º lugar (em 190) no ranking do Doing Business World Bank e é colocado de
maneira impressionante em alguns sub rankings relacionados às interações com o Estado: iniciar um
negócio (140o lugar em 190), licenças de construção (175o em 190) e pagamento de impostos (184ºde
190). Além disso, o Brasil é um dos países mais litigiosos do mundo - nossos tribunais receberam cerca
de 28 milhões de novos casos em 2018, ou quase 11.800 casos por cada 100.000 habitantes. Leis
como a proveniente da referida Medida Provisória visam levar esses números a um nível mais racional.
A Lei nº 13.874 foi elaborada com base nos seguintes princípios norteadores:
(i) a liberdade como uma garantia no exercício de atividades econômicas;
(ii) a boa-fé do particular perante o poder público;
(iii) a intervenção subsidiária e excepcional do Estado sobre o exercício de atividades
econômicas; e
(iv) o reconhecimento da vulnerabilidade do particular perante o Estado.
Alguns desses princípios não são novidade - a Constituição Federal já prevê, por exemplo, a
livre iniciativa, o livre exercício da atividade econômica e a intervenção mínima e excepcional do Estado
na exploração direta da atividade econômica, mas, na prática, sempre se observou uma grande carga
burocrática e dificuldade para que os agentes privados iniciassem e desenvolvessem suas atividades.
Alguns exemplos da presença dos princípios norteadores descritos acima no conteúdo da Lei no
13.874 encontram-se:
2. em seu artigo 3o, inciso I, o qual prevê que as atividades econômicas de baixo risco poderão
ser desenvolvidas sem a necessidade de quaisquer atos públicos de liberação da respectiva atividade.
A classificação de atividades de baixo risco, por sua vez, dependerá de ato do Poder Executivo federal,
o qual deverá ser observado na ausência de legislação estatual, distrital ou municipal específica e,
quando não houver o referido ato do Poder Executivo federal, deverá ser aplicada a resolução do
Comitê para Gestão da Rede Nacional para a Simplificação do Registro e da Legalização de Empresas
e Negócios – CGSIM; e
em seu artigo 3o, incisos IX e X, os quais preveem, respectivamente, que o particular (a) deverá
ser cientificado expressa e imediatamente pela autoridade competente sobre o prazo máximo estipulado
para análise de seu pedido, de modo que, após transcorrido o prazo fixado, o silêncio da referida
autoridade importará aprovação tácita para todos os efeitos, ressalvadas as hipóteses expressamente
vedadas em lei e (b) poderá arquivar qualquer documento por meio de microfilme ou por meio digital,
conforme técnica e requisitos estabelecidos em regulamento, hipótese em que se equiparará a
documento físico para todos os efeitos legais e para comprovação de qualquer ato de direito público.
Embora já reconhecida pela Lei no 13.105, de 16 de março de 2015 (Código de Processo Civil),
a desconsideração inversa da personalidade jurídica (ou seja, a possibilidade de extensão das
obrigações de sócios e/ou de administradores à pessoa jurídica em caso de desvio de finalidade e
confusão patrimonial) foi inserida no artigo 50 do Código Civil.
Além disso, também foi inserida previsão expressa no Código Civil, mediante a inclusão do
artigo 49-A, no sentido de que a pessoa jurídica não se confunde com os seus sócios, associados,
instituidores ou administradores e que a autonomia patrimonial das pessoas jurídicas é um instrumento
lícito de lei com a finalidade de estimular empreendimentos, para a geração de empregos, tributo, renda
e inovação em benefício de todos.
Importa notar que as novas regras sobre desconsideração da personalidade jurídica se
restringem à matéria cível e não se aplicam à discussão da responsabilidade de natureza trabalhista,
tributaria, ambiental, consumerista e concorrencial e outras que são reguladas por leis especificas.
Com relação à Lei das S.A., foi inserida a possibilidade de dispensa de assinatura de lista ou de
boletim de subscrição no ato da subscrição de ações a serem realizadas em dinheiro, caso a liquidação
da oferta pública em questão ocorra por meio de sistema administrado por entidade administradora de
mercados organizados de valores mobiliários, nos termos do §2o do artigo 85 da Lei das S.A.,
introduzido pela Lei no 13.874.
Trata-se de medida de desburocratização para companhias abertas, estimulando o acesso ao
mercado de capitais.
7. ALTERAÇÕES NA LEI DE REGISTRO PÚBLICO DE EMPRESAS MERCANTIS
As alterações introduzidas pela Lei no 13.874 na Consolidação das Leis do Trabalho, no intuito
de desburocratizar o empreendedorismo brasileiro, dizem respeito
(i) às anotações do contrato de trabalho e da carteira de trabalho;
(ii) à anotação da jornada de trabalho; e
(iii) ao Sistema de Escrituração Digital de Obrigações Fiscais, Previdenciárias e Trabalhistas (E-
Social).
8.1. Anotações do Contrato de Trabalho e da Carteira de Trabalho
Alterações e revogações dos textos contidos nos artigos no 13, 14, 15, 16, 29, 40 e 135 da CLT,
com a implementação da Carteira de Trabalho e Previdência Social (“CTPS”) eletrônica, sendo a física
apenas emitida em caráter excepcional, competindo ao Ministério da Economia essa atribuição, são
algumas das alterações introduzidas pela Lei no 13.874 na CLT.
Com a entrada em vigor da Lei no 13.874, a CTPS estará vinculada apenas ao CPF do
trabalhador. O empregador terá 5 (cinco) dias úteis para proceder à anotação da contratação mediante
um novo cadastro eletrônico de empregador. Em 48 (quarenta e oito) horas após a anotação da CTPS,
o trabalhador deverá ter acesso às informações.
Por fim, está revogado o inciso II do artigo 40 da CLT, retirando a necessidade de prova das
anotações da CPTS para fins de comprovação de dependentes perante a Previdência Social.
Para os empresários, a alteração simplifica a burocracia de contratar e segue a tendência digital.
Indiretamente, mitiga registros precários e imprecisos. Logo, é positiva.
8.2. Anotação da Jornada de Trabalho
Foram implementadas, ainda, alterações e revogações no texto do artigo 74 da CLT, de modo a
aumentar de 10 (dez) para 20 (vinte) o número de empregados do estabelecimento para que o
empregador tenha a obrigação do controle e registro de ponto.
Serão anotadas as jornadas de trabalho por meio manual, mecânico ou eletrônico, conforme
regulamentação administrativa do Ministério da Economia, sendo possível a pré anotação do período de
repouso. Também há novas regras para a anotação da jornada de trabalho daqueles que laboram fora
do estabelecimento do empregador.
Por fim, por acordo individual escrito, por Acordo Coletivo ou por Convenção Coletiva de
Trabalho, será autorizada a anotação da jornada pelo regime de “exceção” (anotação apenas da
jornada extraordinária).
As alterações parecem positivas para os empresários, especialmente a que diz respeito ao
número mínimo de empregados para registro de horário obrigatório. O texto original é muito antigo e a
atividade econômica muito mais modesta. Assim, a alteração parece ser mais fiel ao espírito da norma
do que a sua literalidade atual.
A anotação do horário do empregado externo deve ser entendida em harmonia com a regra do
artigo 62 da CLT, portanto, sendo aplicável apenas aos casos em que seja possível o controle dessa
jornada.
A anotação pelo regime de exceção é mais prática com vantagens para o empregador pela
simplificação, sem prejuízo para o empregado. O argumento por vezes apresentado de que ele inibiria o
registro de horas extras, na verdade, serviria a qualquer forma de anotação ou não haveria tanto
contencioso por horas extras.
8.3. E-SOCIAL
Por fim, o Sistema de Escrituração Digital de Obrigações Fiscais, Previdenciárias e Trabalhistas
(E-Social), que unifica o envio de dados de trabalhadores e de empregadores, será substituído, em nível
federal, por um sistema mais simples, de informações digitais de obrigações previdenciárias e
trabalhistas.
As dificuldades operacionais do sistema são notórias, bastando ver os sucessivos adiamentos.
Não se trata de eliminar registros, mas de procurar um sistema digital mais eficiente.
A proposta original de permissão geral para o trabalho aos domingos caiu, assim como a
regulamentação da alteração do dia de descanso e do adicional.
9. DIREITO DO CONSUMIDOR
A Lei no 13.874 não altera expressamente qualquer artigo da Lei no 8.078, de 11 de novembro
de 1990 (“Código de Defesa do Consumidor” ou “CDC”)1. Assim, genericamente falando, a opção da
Lei no 13.874 parece ter sido a de não restringir direitos dos consumidores, ao menos não aqueles
previstos expressamente no CDC. Ao garantir ‘a livre definição, em mercados não regulados, do preço
de produtos e de serviços como consequência de alterações da oferta e da demanda’ (art. 3o, III), a Lei
no 13.874 foi ainda mais específica e excluiu expressamente desse âmbito a legislação de defesa aos
direitos do consumidor, assim como a de defesa da concorrência e às demais disposições protegidas
por lei federal (art. 3o, § 3o, II, da Lei no 13.874). Mas essa foi a única exclusão relacionada a direito do
consumidor, ou seja, tão somente no que se refere à definição de preços de produtos.
Ocorre que o sistema de proteção e defesa do consumidor no Brasil não se resume ao que está
disposto no CDC, mas é composto por uma série de normas infralegais e regras que compõem um
vasto sistema regulatório que transcendem ao Código de Defesa do Consumidor, de modo que as
alterações trazidas pela Lei no 13.874 deverão impactar em alguma medida também as relações de
consumo, inclusive podendo flexibilizar algumas perspectivas protetivas, desde que não afrontem
diretamente disposições do CDC.
Publicidade e propaganda. Um claro exemplo de impacto da Lei no 13.874 nas relações de
consumo refere-se à maior flexibilização dos critérios a serem observados para publicidade e
propaganda de serviços e produtos.
O art. 4o da Lei no 13.874 define ser “dever da Administração Pública [...] evitar o abuso do
poder regulatório de maneira a, indevidamente [...] restringir o uso e o exercício da publicidade e
propaganda sobre um setor econômico, ressalvadas as hipóteses expressamente vedadas em lei
federal” (inciso VIII). Nesse contexto, não sendo expressamente vedado pelo CDC, não restam dúvidas
que a Lei no 13.874 conferiu às empresas fornecedoras maior liberdade na veiculação da publicidade
sobre produtos, justamente com o objetivo de evitar restrições indevidas no que tange a tal direito de
expressão, comunicação e/ou interação dirigida ao público visando à promoção, divulgação ou venda
de um produto ou serviço.