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Socorro Gomes
Flávio Rocha de Oliveira e Paulo Kuhlmann
Igor Fuser
Atílio Boron
José Reinaldo de Carvalho
Autores: Socorro Gomes; Flávio Rocha de Oliveira e Paulo Kuhlmann; Igor Fuser;
Atílio Boron; e José Reinaldo de Carvalho
ISBN 978-85-62659-00-3
2
Sumário
Apresentação ............................................................ 5
3
4
Apresentação
Diretoria do Cebrapaz
6
A Quarta Frota é uma
ameaça aos povos
Socorro Gomes*
7
Neste seminário debateremos por que foi reativada uma força
militar com a magnitude da Quarta Frota, que possui navios de pro-
pulsão nuclear e que são eles próprios base para o lançamento de ar-
mas nucleares numa região caracterizada por resolver seus conflitos
de forma pacífica e se distingue no cenário internacional como uma
região de paz. Interessa-nos desvendar quais são as implicações políti-
cas do relançamento da Quarta Frota e se guarda relação com os abun-
dantes recursos naturais da região. Discutiremos como esta decisão do
governo dos EUA se insere no novo quadro político da América Latina
e como pode ser usada para pressionar os governos progressistas na
região.
O Cebrapaz tem algumas percepções sobre o tema, as quais apre-
sentarei sinteticamente como forma de contribuir para o debate.
Para nós do Cebrapaz, a reativação da Quarta Frota não é uma
mera ação administrativa do Pentágono, como alguns buscam afirmar,
mas uma decisão com objetivos bem definidos, que não são os anunci-
ados publicamente pelos EUA.
Criada em 1943, durante a II Guerra, a Quarta Frota estaduni-
dense que agora é reativada para operar nas águas da América do Sul,
América Central e Caribe, é uma verdadeira máquina de guerra e pos-
sui sofisticados armamentos de combate, inclusive armas com poten-
cial nuclear.
O seu comandante, o contra-almirante Joseph Kernan, ex-instru-
tor do Seal (grupo de elite da Marinha dos EUA - homens-rãs, treina-
dos para a guerra, com capacidade de sabotagem e destruição), parti-
cipou de diversas operações secretas de guerra no Iraque e no Afega-
nistão. Seu perfil não é o de um pacifista que veio prestar serviços
humanitários. Isso nos dá indícios da verdadeira intenção dos EUA
com a Quarta Frota.
Segundo declarações de um dos membros do Comando Sul, a
Quarta Frota está preparada para navegar não somente nos mares e
oceanos, mas também nos caudalosos rios da América Latina, como o
Amazonas, o Orenoco, o Rio da Prata e outros, o que, se vier a ocor-
8
rer, não poderá ser considerado senão como uma ação agressiva contra
o território de países da região.
Seu surgimento, depois de mais de cinqüenta anos, no momento
em que o continente como um todo muda de orientação política e elege
governos progressistas, é sintomático. Novas forças sociais e políticas
assumiram o comando destes países e se colocaram numa posição de
independência em relação ao imperialismo estadunidense.
A reativação da Quarta Frota se dá no momento em que se conso-
lida a Unasul (União de Nações Sul-Americanas), uma instância de
articulação política da região da qual não participam os EUA e o Ca-
nadá.
É importante destacar que a Unasul desempenhou um papel im-
portante na condenação do governo de Álvaro Uribe, da Colômbia,
quando este país invadiu o território equatoriano em ação conjunta
com os EUA. A Unasul também foi importante na defesa do governo
constitucional boliviano frente às tentativas de divisão do país por uma
elite coligada com os EUA. A União de Nações Sul-Americanas está
prestes a consolidar o Banco do Sul e o Conselho de Defesa Sul-Ame-
ricano, ambos sem a presença dos vizinhos do norte. Tais medidas
colocam em desuso a doutrina do Pan-Americanismo, que propunha
um alinhamento automático da região aos EUA.
Outro fato importante é a recente descoberta de jazidas petrolífe-
ras pelo Brasil em seu litoral, na camada conhecida como pré-sal. É de
conhecimento de todos que os EUA não possuem reservas petrolíferas
suficientes e nem abundância de recursos naturais. Para suprir tais
carências, eles buscam saquear outros países, já agrediram vários po-
vos nos últimos anos para obter o controle de fontes de recursos estra-
tégicos, prioritariamente o petróleo.
A Quarta Frota aumenta o poderio e a presença militar dos Esta-
dos Unidos no mundo. Em termos globais, segundo o próprio Pentágono,
em 2008 os EUA possuíam em torno de 865 bases militares espalhadas
pelo mundo, com porta-aviões, bombas nucleares, Frotas Navais em
todos os mares e oceanos e os Comandos Unificados. No nosso ponto
9
de vista, a reativação da Quarta Frota é parte da estratégia dos EUA de
utilizar seu poderio bélico para controlar o conjunto de rotas e fluxos
comerciais existentes, fontes de recursos naturais e evitar o surgimen-
to de novos polos de poder político e econômico.
Para tanto, organiza seu poderio bélico dentro de uma concepção
de que o mundo é um único campo de batalhas, um único teatro de
operações, no qual a sua vasta rede militar possibilita o controle per-
manente das chamadas “áreas comuns”, as regiões que juridicamente
não pertencem a nenhuma nação (como é o caso das 200 milhas de
nossa costa), mas que possibilitam o acesso às riquezas dos povos.
Isso nos leva a crer que o objetivo dos Estados Unidos com o
relançamento da Quarta Frota é intimidar os povos, reagir às mudan-
ças que estão ocorrendo na conjuntura internacional e particularmente
em nossa região e estabelecer bases com o intuito de se necessário
saquear os recursos naturais.
Mas, hoje acreditamos que os povos têm noção de quem faz guer-
ra, quem é a maior ameaça à paz. Estas são algumas das ponderações
iniciais que fazemos. Esperamos, a partir do diálogo com as destaca-
das figuras do mundo acadêmico e das lutas sociais que compõem esta
mesa, aprofundar o tema, fortalecendo nossa luta em defesa da sobera-
nia nacional e pela paz.
Obrigada a todos os companheiros de lutas pela Paz, por um
mundo e humanidade livres da dominação.Obrigada companheiros, e
vamos ouvir nossos conferencistas.
10
América Latina em
tempos de guerra
*
Flávio Rocha de Oliveira, cientista político, é coordenador do curso de pós-graduação
de Política e Relações Internacionais da Escola de Sociologia e Política de São Paulo
(EPG-FESPSP), professor de Relações Internacionais na Faculdade Santa Marcelina e
membro do Grupo de Análise e Prevenção de Conflitos. Pesquisa as áreas de Segurança
Internacional, Defesa e Política Externa Americana. Publicou, na francesa Géopolitique
o artigo La politique extérieure de Lula Da Silva et l’Amérique latine., e A ONU e a
Segurança Internacional, no livro ONU no Século XXI: Perspectivas., Editora Desatino,
2006.
**
Paulo Kuhlmann, cientista político, é professor de Relações Internacionais da Unesp
– Franca, e membro do Grupo de Estudos de Defesa e Segurança, da mesma universidade,
e professor do curso de Política e Relações Internacionais da Escola de Sociologia e
Política de São Paulo. É tenente-coronel da reserva do Exército Brasileiro. Em 2008
publicou Mudança de Missões e Estrutura de Defesa do Exército Brasileiro: 1985-
2007, disponível em http://www.brasa.org/abstractspapers. Pesquisa as relações civil-
militares e estrutura de Defesa.
11
Como o cenário internacional é um locus dinâmico, em que soci-
edades, Estados e corporações competem e cooperam em torno de inte-
resses e expectativas de futuro, a América Latina passa por transfor-
mações aceleradas desde o fim da Guerra Fria. A região foi relegada a
uma posição secundária frente ao terrorismo, o Oriente Médio, e a
emergência de China e Índia como competidores globais por recursos.
Apesar das diferenças entre os governos Lula, Kirchner, Morales
e Chávez, por exemplo, uma coisa é comum a eles: há uma firme busca
pelo desenvolvimento de caminhos autônomos no âmbito da política e
da economia, fora da tutela dos EUA. Isso implica num novo protago-
nismo desses países, que ganha força com a emergência de movimen-
tos sociais e étnicos importantes, que reivindicam uma fatia maior no
desenvolvimento econômico e a correção de injustiças históricas, como
se observa no caso dos grupos indígenas na Bolívia e no Equador.
O noticiário de gigantescos campos de petróleo na costa brasilei-
ra adiciona uma dimensão nova à região: se confirmados, os 33 bi-
lhões de barris de petróleo estimados dão ao Brasil a possibilidade real
de se tornar um jogador de peso no cenário internacional, atraindo a
atenção das grandes potências e provocando movimentos inesperados
na relação dos Estados Unidos com os fornecedores do Golfo Pérsico.
1
SAINT-PIERRE, Hector Luis, Introdução à análise e formulação de política de defesa.
2
ARAGÃO, Thiago de, A divisão geopolítica da América Latina, Disponível em http:/
/thiagodearagao.blogspot.com/2007/03/amrica-latina-diviso-geopoltica-da.html.
13
combater o narcotrático segundo os moldes de Washington, empregan-
do tropas estritamente militares, de defesa contra agressores externos,
no combate ao denominado “narcoterrorismo”, definição vinda da agen-
da de segurança estadunidense e que, na região tem como exemplo
emblemático o ataque ao acampamento das Farc em território equato-
riano. Esse tipo de atitude demonstra a condução do conflito no enqua-
dramento norte-americano, trazendo o conceito de guerra ao terror à
região3.
Após a modificação da estratégia de segurança norte-americana,
vários países, independente da tonalidade política que postulem ou da
proximidade política e econômica com os Estados Unidos, têm identi-
ficado a política externa norte-americana como passível de causar pro-
blemas em qualquer parte do mundo, quando reivindica o dever de
ingerência e o ataque preventivo.
Por esse motivo, há um sentimento de desconfiança crescente que
produz as mais diversas reações, desde uma busca pela melhora de
armamentos por parte da Venezuela, que começa a superar em quanti-
dade e qualidade militar diversos países da região4, até a busca do
Brasil em restruturar sua defesa5, política e praticamente, com a con-
dução de um Plano de Aceleração do Crescimento da Defesa, lançado
em setembro de 2007, a ser concluído em setembro de 2008. Na verda-
de, analistas consideram que vários países da região tem somente mo-
3
MURTA, Andréa, Lógica da “guerra contra o terror” ameaça democracias latino-
americanas. Entrevista com Juan Gabriel Tokatlian. Folha de S. Paulo, 10-3-2008.
4
Ver em Military Power o Ranking do poder militar — América do Sul — 2004/2005,
disponível em www.militarypower.com.br/frame4-ranking2004.htm; o Ranking do poder
militar — América do Sul — 2006/2007. Disponível em http://
www.militarypower.com.br/ranking.htm.
5
Claudia Jardim e Marcia Carmo, Sul-americanos buscam reforçar seu poderio militar,
BBCBrasil.com, 11-3-2008. Disponível em http://www.bbc.co.uk/portuguese/
reporterbbc/story/2008/03/080308_amsarmamentistars.shtml.
14
dernizado seus equipamentos militares, que estavam obsoletos, mas
após o ataque da Colômbia às Farc instaladas no território do Equa-
dor, alguns movimentos parecem sugerir um recrudescimento das rela-
ções na região.
6
O noticiário brasileiro deu conta do interesse nessa parceria. Ver http://
www1.folha.uol.com.br/folha/brasil/ult96u367498.shtml e http://www.estadao.com.br/
estadaodehoje/20071116/not_imp81236,0.php.
7
Disponível em http://www.centcom.mil/en/404/7.html.
8
Uma discussão mais detalhada do papel desses comandantes é apresentada por Dana
Priest, The Mission. New York, Norton, 2003.
16
De todos os comandos regionais, o Comando Sul foi, tradicional-
mente, o mais fraco em termos militares. Em função do papel secundá-
rio da região, durante e depois da Guerra Fria, a dotação financeira e o
número de tropas e equipamentos sempre foram menores do que dos
seus congêneres responsáveis pelo Oriente Médio e pela Europa. As
missões compreenderam a ajuda humanitária, como foi o caso do au-
xílio prestado à Nicarágua depois do Furacão Mitch, em 1998. O Co-
mando Sul, então dirigido pelo general Charles Wilhelm, coordenou
toda a ajuda. A partir daí, Manágua e Washington voltaram a estabele-
cer relações diplomáticas.
Mas não só de ajuda humanitária cuidou o Comando Sul. Existe
uma gama de atividades de cunho militar. Treinamento de oficiais da
América Latina e apoio logístico a operações de contra-insurgência
sempre estiveram na ordem do dia. O caso mais notável atualmente
envolve a Colômbia. O Comando Sul tem fornecido especialistas em con-
tra-guerrilha para treinar e auxiliar as forças governamentais colombianas
no combate às Farc e aos narcotraficantes. No início de 2008, foi uma
informação liberada por esse comando que permitiu o ataque, dentro
do território do Equador, que matou o segundo homem na hierarquia
das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia, Raúl Reyes.
O fato é que a atuação do Comando Sul, capaz de ajudar ou
complicar a situação política dos países da América do Sul, conforme
exemplifica o imbroglio envolvendo Equador e Colômbia, causa preo-
cupações entre os governos da região. Num momento em que o Equa-
dor declara que não manterá a base militar americana em seu territó-
rio, e em que o Paraguai, com o futuro presidente Lugo, não parece
disposto a levar até as últimas conseqüências a implantação de outra
base estadunidense9 , não é de surpreender que o atual comandante do
9
Apesar dessa postura, deve-se levar em consideração que os EUA tem desenvolvido
relações muito próximas com militares e forças de segurança paraguaias. Sobre isso,
ver Carolina Vila-Nova. Presença dos EUA no Paraguai é profunda. Publicado na Folha
de S.Paulo, em 25/9/2005. Disponível em http://www.defesanet.com.br/intel/
crise_al_29.htm.
17
Southcom, o almirante James Stavridis, numa visita recente a Brasília,
tenha dado garantias ao governo brasileiro. Segundo ele, a Quarta Frota
respeitará as 200 milhas marítimas como zona de exploração comer-
cial exclusiva do Brasil, e as reservas petrolíferas encontradas nessa
região.10
O fato é que a Política Internacional contemporânea assiste a um
redimensionamento do papel da América do Sul no cenário global. No
âmbito das discussões de defesa, o Brasil tem estabelecido conversa-
ções com os seus vizinhos com o intuito de criar o Conselho Sul Ame-
ricano de Defesa11. Essa proposta começou a ganhar força no governo
brasileiro após os problemas envolvendo Colômbia, Equador e Vene-
zuela, ou, dito de uma maneira mais clara, entre o maior aliado dos
EUA na região e dois países que têm contrariado os interesses e as
posturas norte-americanas no subcontinente. Duas coisas chamam a
atenção nessa proposta: a declaração, pelo Ministro da Defesa brasi-
leiro, Nelson Jobim, de que o órgão não será uma OTAN do sul, e o
formato desse conselho, que excluirá a participação dos Estados Uni-
dos da América.
Energia, movimentos sociais desejosos de corrigir problemas his-
tóricos, a emergência de, pelo menos, um futuro poder regional de
peso — o Brasil — e os conflitos locais, existentes entre os próprios
sul-americanos, começaram a demonstrar para a superpotência restante
que a região move-se de maneiras que não são, necessariamente, dos
interesses do poder hegemônico dominante.
10
Para um indicativo de propaganda das missões do Southcom, ver http://
www.southcom.mil/AppsSC/index.php.
11
Ver UOL — Jobim diz que Conselho Sul-Americano de Defesa não será uma OTAN
do Sul. Disponível em http://noticias.uol.com.br/ultnot/efe/2008/04/24/
ult1808u117772.jhtm.
18
Quarta Frota:
a volta das canhoneiras?
Igor Fuser*
19
de geográfica, é tratada sem cerimônia no vocabulário político norte-
americano como “our backyard” — em espanhol, “pateo trasero”, em
bom português: “quintal do fundo”.
Do ponto de vista estadunidense, o destino da região já está tra-
çado desde 1823, quando o presidente James Monroe anunciou a dou-
trina de política externa que leva o seu nome e tem por lema “a Améri-
ca para os americanos”. Mas a Doutrina Monroe ainda levou 80 anos
para se tornar realidade, o que só veio ocorrer com a Guerra Hispano-
Americana de 1898-1902, quando os últimos redutos do colonialismo
espanhol, em Cuba e Porto Rico, foram extirpados e o Caribe e a
América Central se converteram num “lago estadunidense”, submeti-
dos ao Big Stick, a “política das canhoneiras”.
O passo seguinte dos EUA foi aparar, pouco a pouco, as asas
britânicas, enfrentando ao mesmo tempo as incursões da Alemanha
nazista, que tentou, sem sucesso, explorar os ressentimentos gerados
pela dominação ianque com a finalidade de amealhar aliados para a
guerra que se aproximava. No pós-Segunda Guerra a hegemonia esta-
dunidense se tornou absoluta — com o peronismo argentino emitindo a
única nota dissonante, ainda por uma década. O instrumento político
para garantir a submissão dos governos da região foi a Organização
dos Estados Americanos (OEA), num esquema que tinha como braço
armado o Tratado Interamericano de Assistência Recíproca (Tiar).
Hoje o panorama hemisférico destoa radicalmente daquele em
que a OEA foi utilizada — não sem resistência de vários governos,
inclusive o brasileiro no período entre Juscelino e Jango — para armar
um “cordão sanitário” ao redor de Cuba e sua influência revolucioná-
ria. O Tiar virou uma sigla fantasma em 1982, na Guerra das Malvi-
nas, quando Washington, para a amarga frustração dos gorilas argen-
tinos, entre a parceria estratégica com a Grã-Bretanha e solidariedade
hemisférica estabelecida no Tiar, optou pela primeira, inequivocamen-
te. Quanto à OEA, só mostrou alguma efetividade quando se tratava
de agir em defesa dos interesses estadunidenses, como na intervenção
militar na República Dominicana, em 1965, ou na implementação do
20
bloqueio a Cuba, hoje unanimemente repudiado pelos governos latino-
americanos. Olhada daqui de baixo, essa organização internacional
pouca serventia teve, além de oferecer uma confortável pré-aposenta-
doria a medalhões do corpo diplomático.
A irrelevância da OEA nunca foi tão completa quanto no presente
momento. Verifica-se uma crescente autonomia dos governos latino-
americanos em relação a Washington — e, em alguns casos, de aberta
animosidade. A erosão da influência estadunidense ao sul do Rio Grande
acompanha a frustração generalizada com o fracasso das reformas
neoliberais dos anos 80 e 90 em cumprir suas promessas de desenvol-
vimento econômico e social. Três fatos marcam esse afastamento: a
eleição de Hugo Chávez como presidente da Venezuela (1998), o co-
lapso das políticas inspiradas no Consenso de Washington na Argenti-
na (2001) e a eleição de Lula no Brasil (2002). Em cada um desses
países, a dinâmica doméstica se funde com os impactos associados à
catástrofe neoliberal, produzindo resultados eleitorais contrários às pre-
ferências estadunidenses e estimulando outros países a trilhar pelo mes-
mo caminho.
Em 2008, uma década após a ascensão de Chávez ao poder, os
únicos países sul-americanos (além das Guianas, cujo contexto
geopolítico é muito mais o Caribe do que a América do Sul) em que os
atores políticos associados à implementação do neoliberalismo conti-
nuavam no governo eram os da Colômbia e do Chile. Mesmo no Peru,
hoje um firme aliado de Washington, a vitória eleitoral de Alan Garcia
só foi possível a partir de uma retórica de critica contundente às polí-
ticas liberal-conservadoras dos seus antecessores, às quais aderiu ime-
diatamente após a eleição, traindo seu discurso de campanha, tal como
outros fizeram antes dele em diversos países. Por outro lado, o Chile,
embora mantivesse até agora uma linha de continuidade na coligação
governante, já não exibe o mesmo entusiasmo em relação ao consenso
de Washington, chegando até mesmo a recuar na sua aplicação em
pontos essenciais, como a privatização da previdência. Ressalvas e
exceções à parte, a “onda rosa”, como ficou conhecida a ascensão de
21
governantes de esquerda e centro-esquerda na América do Sul, coloriu
com novas tonalidades o mapa da região, criando uma nova realidade
que tem como fato mais emblemático o naufrágio da Alca (Área de
Livre Comércio das Américas). Essa iniciativa de Washington, com o
mal-disfarçado objetivo de replicar na América do Sul a anexação eco-
nômica realizada com êxito nas América do Norte (Nafta) e Central
(Cafta), foi retirada sine die diante de uma forte oposição regional,
liderada pelos governos da Venezuela, do Brasil e da Argentina.
Evidentemente, tanto o Estado quanto os capitais privados esta-
dunidenses continuam a exercer um grande peso na definição das polí-
ticas governamentais na América do Sul (para não falar do restante da
América Latina). Mas essa influência hoje se vê limitada por um con-
junto inédito de fatores. Entre eles, destaca-se o ingresso da China
como um parceiro econômico significativo em quase toda a região, que
assim se torna menos dependente do mercado e dos investimentos esta-
dunidenses. Ao mesmo tempo, verifica-se uma expansão da presença
econômica brasileira em toda a América do Sul, aparentemente con-
cretizando uma vocação à supremacia regional há muito tempo detec-
tada, mas nunca antes traduzida em prática. Para completar, há ainda
a abertura de laços políticos e militares de um país importante da Amé-
rica do Sul, a Venezuela, com regimes rivais dos EUA, em especial
com a Rússia.
Não há duvida de que agora Washington precisa lidar com um
conjunto inédito de fatores: inclinação da América do Sul em direção à
esquerda, ainda que em graus bastante diferenciados; laços econômi-
cos crescentes com uma potência não-subordinada aos EUA (a Chi-
na); laços militares com uma potência rival (a Rússia); emergência de
uma potência regional (o Brasil) em condições de desafiar os EUA
numa zona até então tida como área de influência garantida. A ironia é
que esse desafio, que se desenvolve “debaixo do nariz” dos EUA, ocorre
justamente no período histórico em que a superpotência tenta consoli-
dar sua posição de hegemonia mundial obtida com o esfacelamento da
União Soviética.
22
Já em 1992, durante o governo de George Bush pai, veio a públi-
co o esboço de um documento de estratégia estadunidense que defendia
a mobilização de esforços para impedir o surgimento de potências re-
gionais capazes de rivalizar com os EUA em alguma parte do mundo.
Esse texto foi arquivado, mas seus mentores — Dick Cheney e Paul
Wolfowitz — assumiram posições de comando a partir de 2000, quan-
do George Bush filho se tornou presidente. O fiasco político-militar no
Iraque e a vitória eleitoral de Barack Obama afastaram de cena os
chamados neoconservadores, mas seria muita ingenuidade crer que sua
meta de supremacia mundial absoluta não é compartilhada por amplos
setores das elites estadunidenses, que manterão em suas mãos o con-
trole da política externa durante o mandato de Obama.
É com esse pano de fundo que se anunciou a ativação da Quarta
Frota. Contra qual inimigo esse dispositivo militar está sendo instala-
do, e quais são os interesses que ele se propõe a defender? No plano
imediato, o inimigo é obvio. Não é por acaso que a esquadra estaduni-
dense para a América Latina recebeu o apelido de “Frota Chávez”. A
Venezuela, sob o governo popular-nacionalista de Hugo Chávez, tor-
nou-se o maior inimigo do imperialismo estadunidense na região, e
talvez até no mundo inteiro. Chávez se propõe a varrer a influência dos
EUA nas antigas colônias ibéricas do continente americano. Em outras
palavras: arquivar a Doutrina Monroe. O seu “bolivarianismo”, nesse
sentido, é muito mais que um artifício retórico. De Bolívar, Chávez
reivindica, e é muito enfático nesse ponto, a ideia de que a verdadeira
independência dos povos latino-americanos só será possível manten-
do à distância os EUA. O governo venezuelano possui disposição e,
graças ao petróleo, recursos para liderar uma coligação antiestaduni-
dense na América do Sul, com a participação de governos e movimen-
tos sociais. Talvez não seja um exagero dizer que a Venezuela consti-
tui, hoje, um inimigo muito mais perigoso para os EUA do que Cuba
em qualquer época.
Outra dimensão do labirinto latino-americano, do ponto de vista
de Washington, tem a ver com a segurança energética dos EUA. Ou-
23
trora o maior produtor e exportador de petróleo do mundo, atualmente
os EUA dependem das importações para atender mais de 60% de suas
necessidades de combustíveis. Na época da invasão do Iraque, falava-
se da dependência energética como o “calcanhar-de-aquiles” de um
império exuberante em todas as demais dimensões do poder. A crise
econômico-financeira que eclodiu em 2008 colocou a nu outras fra-
quezas da superpotência estadunidense. As atenções de todos os inte-
ressados em preservar o capitalismo se voltaram para o combate à
depressão na economia mundial. Mas o problema da vulnerabilidade
enérgica dos EUA permanece sem solução.
A energia é um item essencial em todos os documentos de “segu-
rança nacional” dos EUA desde o final da Segunda Guerra. O acesso
às fontes de recursos energéticos indispensáveis para manter em funci-
onamento a economia e a máquina militar estadunidenses é definido
nesses textos como um objetivo “vital” do país, só inferior, na escala
das prioridades, à preservação da integridade territorial e da indepen-
dência política dos EUA. Nos anos 50, um novo conceito se incorpo-
rou ao discurso da política externa do império estadunidense: o “direi-
to petróleo”. Essa é a ideia de que os EUA, e o sistema econômico capita-
lista liderado por esse país, devem ter acesso irrestrito aos recursos enérgi-
cos do planeta, onde quer que esses se encontrem situados, a fim de explo-
rar com base nos princípios do “livre mercado”. Ou seja: passando por
cima da soberania nacional dos países proprietários desses recursos,
se isso for necessário para o bem da “segurança energética” dos EUA
e para o bom funcionamento da economia capitalista mundial.
Dois eventos de grande importância explicam a invenção desse
“direito”. O primeiro foi o conflito gerado pela ascensão, no Irã, do
regime nacionalista de Mossadegh, que nacionalizou as reservas e ins-
talações petrolíferas da Anglo Iranian (atual BP), dona da principal
riqueza daquele país desde o início do século 20. A crise foi resolvida
em 1953 com um golpe de Estado, articulado pela CIA e pelas forças
iranianas mais reacionárias, que tornaram o xá Reza Pahlevi um mo-
narca absoluto, encerrando pela intervenção estrangeira a primeira ex-
24
periência democrática num país do Oriente Médio. Um segundo mo-
mento crítico a acender a luz vermelha no “Ocidente” em relação ao
petróleo do Golfo Pérsico foi a breve guerra travada pela Inglaterra,
França e Israel contra o Egito em torno do controle do Canal de Suez,
em 1956. O conflito marcou a emergência no cenário mundial de um
nacionalismo árabe orgulhoso e assertivo, sob a liderança carismática
de Gamal Abdel Nasser.
A ascensão do nacionalismo nos países produtores se tornou cada
vez mais um obstáculo ao apetite voraz das grandes empresas petrolei-
ras estadunidenses e britânicas (as famosas “Sete Irmãs”), culminando
com o “choque do petróleo” em 1973 e com a nacionalização das re-
servas petrolíferas em quase todos os países produtores do chamado
“Terceiro Mundo”. Na época, o secretário de Estado estadunidense
Henry Kissinger chegou a ameaçar os países árabes (vários dos quais,
como a Arábia Saudita, regimes clientes dos EUA) com a intervenção
militar em caso de um novo embargo do fornecimento de petróleo. A
intimidação se mostrou eficaz, mas a ansiedade de Washington em
relação aos suprimentos enérgicos da região não parou de crescer. Em
1980, o presidente Jimmy Carter anunciou, no último ato significativo
do seu mandato, uma diretriz política considerada por muitos com uma
extensão da Doutrina Monroe para o Oriente Médio. Nos termos da
Doutrina Carter, qualquer ato que impeça o “livre acesso” dos EUA
aos recursos petrolíferos do Golfo Pérsico será considerado como uma
ameaça aos “interesses vitais” estadunidenses e, como tal, será com-
batido “por todos os meios, inclusive a força militar”. Os presidentes
que se sucederam na Casa Branca, democratas ou republicanos, não
regatearam no uso da força militar no Oriente Médio, promovendo
uma escalada intervencionista cuja expressão mais evidente são as duas
guerras contra o Iraque, em 1990-91 e novamente a partir de 2003.
A decisão de reativar a Quarta Frota foi anunciada num cenário
em que a energia se torna um fator cada vez mais importante para a
manutenção da hegemonia estadunidense e para a própria sobrevivên-
cia de um “estilo de vida” que tem entre seus principais alicerces o
25
consumo ilimitado dos recursos naturais de todo tipo, inclusive
energéticos. Os estrategistas dos EUA se afligiam, no ano passado,
com a alta dos preços do petróleo e do gás natural, com a crescente
dependência do país em relação à importação desses recursos, com o
fortalecimento do “nacionalismo energético” em áreas produtoras es-
senciais, como a América do Sul e a Rússia, e com os sinais de disputa
geopolítica pelo controle das fontes mundiais de energia, em particular
com a ofensiva econômico-diplomática da China no continente africa-
no. A crise mundial deflagrada em setembro de 2008 alterou alguns
desses tópicos e introduziu novas prioridades, mas não eliminou a ener-
gia como um fator estratégico central em qualquer cálculo de longo
prazo. E a perspectiva sombria da escassez enérgica permanece no
horizonte, mesmo com a situação temporária de oferta excessiva, um
efeito colateral da recessão.
Em quase todo o século 20, a América Latina foi considerada
pelos EUA como um fornecedor garantido de recursos energéticos —
um território de domínio assegurado, em contraste com a “instabilida-
de” no Oriente Médio. Esse quadro se alterou nos últimos dez anos
com a crescente afirmação da autonomia dos países da região em rela-
ção ao “grande irmão do Norte”. Diante de um futuro carregado de
incertezas, os estrategistas estadunidenses tratam de se preparar para
todas as contingências, inclusive para a possibilidade extrema de agir
militarmente na América Latina para garantir seus “interesses vitais”,
entre os quais se destaca o acesso às fontes de petróleo na Venezuela,
Brasil, México, Equador e Colômbia, entre outros, além do gás
venezuelano e boliviano.
Nesse contexto, são mais do que justificadas as apreensões das
autoridades brasileiras, civis e militares, diante da reativação da Quar-
ta Frota. É impossível afirmar, com as informações atualmente dispo-
níveis, se existe uma relação direta entre a formação dessa força naval
estadunidense e a descoberta de fabulosas reservas petrolíferas nas
camadas pré-sal do litoral brasileiro.
Na conjuntura atual, a soberania do Brasil sobre essas reservas
26
parece algo inquestionável — e é preciso um certo esforço de imagina-
ção para pensar que as canhoneiras dos EUA representam uma amea-
ça aos direitos brasileiros sobre o petróleo do pré-sal. Mas quem pode
prever o cenário daqui a cinco, dez ou quinze anos?
27
28
A Quarta Frota
destruiu o Império
Atilio Borón*
Um pouco de história
Poder-se-ia argumentar: mas a quem importa a morte de um des-
vario de dois intelectuais? Resposta: a muita gente e, especialmente, às
forças sociais que lutam pela construção de um mundo melhor, por
uma sociedade socialista. Para compreender melhor o porquê desta
resposta, convém fazer um pouco de história.
Precisamente quando o neoliberalismo começou a sofrer os em-
bates de uma resistência que nos inícios deste século se estendia pelas
mais diversas latitudes, apareceu o livro de Hardt e Negri. De imedia-
to, a obra foi saudada por toda a imprensa imperialista mundial como
o “novo” Manifesto Comunista do século 21, um manifesto que, dife-
rente de seu predecessor, escrito por Marx e Engels um século e meio
1
Consultar entre muitos outros: Alex Callinicos, “Toni Negri en perspectiva” (http://
revoltaglobal.cat/IMG/pdf/form_CallinicosToniNegrienperspe.pdf.Néstor Kohan), “ El
Imperio de Hardt & Negri y el Regreso del Marxismo Eurocéntrico” (http://
www.cuestiones.ws/semanal/030503/sem-may03-03-kohan.htm) Slavoj Zizek, ¿Han re-
escrito Michael Hardt y Antonio Negri el Manifiesto Comunista para el siglo XXI?
(2001) (http://es.geocities.com/zizekencastellano/arthardtnegri.htm) François Houtart,
Tarik Ali, Peter Gowan y Rafael Hernández, “¿Qué imperialismo?”, em Temas (La
Habana: 2003), no 33-34, Abril-Septiembre; Leo Panitch y Sam Gindin, “Capitalismo
global e imperio norteamericano” parte I y II, en Socialist Register en Español (Buenos
Aires: Clacso, 2004 y 2005); John Bellamy Foster, “Imperialism and ‘Empire’”, en
Monthly Review , Vol. 53, no 7, dezembro de 2001.
2
Ver nosso Imperio & Imperialismo. Uma leitura crítica de Michael Hardt y Antonio
Negri (5a edição, Prêmio Extraordinário de Ensaio 2004 da Casa das Américas) [Buenos
Aires: Clacso, 2004].
31
Para Hardt e Negri, o império é uma benévola constelação de
múltiplos poderes sintetizados em um regime global de soberania per-
manentemente tangida por uma fantasmagórica “multidão”: uma va-
porosa ou líquida, nos dizeres de Zigmunt Bauman, agregação alta-
mente instável e mutante de sujeitos que, por um incompreensível pa-
radoxo, eram simultaneamente os verdadeiros criadores do império e
podiam ser seus eventuais coveiros se, por um milagre, lograssem cu-
rar-se da esquizofrenia que os conduziu a criar algo que os oprimia e
que, por vezes, queriam destruir.
É, por tudo que se disse anteriormente, que poucas imagens pode-
riam ser mais do agrado do governo dos Estados Unidos e das classes
dominantes desse pais e seus aliados em todo o mundo que esta embe-
lezada visão de suas cotidianas tropelias, crimes, atropelos e o genocídio
que lenta e silenciosamente praticam dia após dia pelos quatro cantos
da terra, e muito especialmente no Terceiro Mundo.
Poucas também poderiam ter sido mais oportunas em momentos
em que os Estados Unidos se converteram em potência imperialista
mais agressiva e poderosa da história da humanidade e no estado-na-
ção imprescindível e insubstituível para sustentar com sua formidável
maquinaria militar, sua enorme gravitação econômico-financeira e o
fenomenal poderio de sua industria cultural (de Holliwood até suas
universidades, passando por seus tanques de pensamento e pelos meios
de comunicação de massa e, last but no least, seu controle estratégico
da internet, não compartilhado nem sequer com a União Européia ou
Japão, toda arquitetura do sistema imperialista mundial.
3
No Prólogo da 5a edição de nosso Imperio & Imperialismo dizíamos que “a guerra do
Iraque, declarada solitariamente pelos Estados Unidos, teve sobre a análise proposta
naquela publicação o mesmo efeito que a auto-estima norte-americana teve com a queda
das Torres Gêmeas de Nova Iorque.” (Cf. op, cit, p. 6).
33
estacionamento em nossa geografia de uma série de bases e “missões
militares” e por seu predomínio aéreo e do espaço exterior, especial-
mente no campo orbital dos satélites: o controle integral do que os
especialistas em geopolítica dos Estado Unidos chamam de “grande
ilha americana”. Graças ao Plano Colômbia, e em menor medida ao
Plano Puebla-Panamá, e às numerosas bases militares com que conta
na região, Washington detém um decisivo e monopolizador controle
territorial que se estende do México, no norte, à Tríplice Fronteira, à
Base Mariscal Estigarriba, no Paraguai, e inclusive à própria Terra do
Fogo, no extremo sul da Argentina, onde também há pessoal militar
norte-americano4.
Uma nota produzida faz poucos meses por Stella Calloni consig-
na que na Terra do Fogo o governo dessa província argentina emitiu
um decreto cedendo terras “para a instalação de uma base estaduni-
dense que se supõe realizará estudos nucleares com ‘fins pacíficos’”.
Esta decisão do governo provincial se apóia em uma lei aprovada
em 1998 pela Câmara de Deputados da Nação, durante a presidência
de Carlos S. Menen, em cujos anexos se contempla que ‘poderão rea-
lizar-se explosões nucleares subterrâneas com fins pacíficos’. O de-
creto do executivo foguenho autoriza a instalação de uma base do Sis-
tema Internacional de Vigilância para Prevenção e Proibição de Testes
e Explosões Nucleares... e habilita para ‘os integrantes desta base o
livre trânsito pela província, se assim o desejarem para seus estudos’.
Por último, anota Calloni que existe o perigoso antecedente da “imuni-
dade total” que o Paraguay outorgou, em 2005, às tropas estaduniden-
4
Sobre o tema das bases militares estadunidenses na América Latina consultar os diversos
trabalhos de Ana Esther Ceceña e, especialmente, “Subjetivando el objeto de estudio, o
de la subversión epistemológica como emancipación”, Ana E. Ceceña, compiladora,
Los desafíos de las emancipaciones en un contexto militarizado (Buenos Aires: Clacso,
2006), pp. 13-43. Também da mesma autora “Álvaro Uribe y la base de Manta” (http:/
/www.prensamercosur.com.ar/apm/nota_completa.php?idnota=3833) e, por último, seu
muito instrutivo site (http://www.geopolitica.ws/).
34
ses radicadas nesse país e que motivara a condenação unânime dos
organismos de defesa dos direitos humanos em toda a América Lati-
na5.
Resumindo: Na atualidade, o controle que os Estados Unidos de-
tém do espaço aéreo latino-americano é absoluto e inexpugnável, haja
vista sua enorme superioridade tecnológica que, entre outras coisas,
lhe permitiu organizar e ajudar a executar, passo a passo, a enigmática
“operação resgate” de Ingrid Betancourt e dos outros “reféns de ouro”
que as Farc6 tinham em seu poder.
À essa supremacia deve-se somar sua presença territorial e, ago-
ra, agregar o domínio dos mares, com o qual o círculo se fecha sobre a
América Latina e o Caribe. Círculo que estreita cada vez mais para os
quatro governos que em nossa região estão travando uma batalha diá-
ria e sem quartel contra o imperialismo: Cuba, Venezuela, Bolívia e
Equador.
5
Stella Calloni, “Alertan sobre una base estadunidense para estudios nucleares en Tierra
del Fuego”, La Jornada (México), 14 de outubro de 2007.
6
Esclarecemos, para que não haja a menor dúvida, que condenamos sem atenuantes a
utilização dos sequestros como arma de luta política e que por isso mesmo celebramos
a libertação dos reféns das Farc. De todo modo subsistem demasiadas incógnitas acerca
da natureza desse “resgate” que, seguramente, com o passar do tempo, poderão ser
solucionadas, reservando não poucas surpresas.
35
Quarta Frota... e não terá nenhum porta-aviões alocado” destacou que
entre as principais operações marítimas que poderiam ser levadas a
cabo com as armadas da região se incluem, significativamente em pri-
meiro lugar, “a assistência humanitária..., o apoio às operações de paz,
a assistência nas situações de desastres e as operações de auxílio, nas
operações contra o narcotráfico e.... nas cooperações regionais de trei-
namento inter-operacional”7.
É evidente que a linguagem empregada por Stavridis não por ca-
sualidade tem a suficiente ambiguidade como para ocultar as verda-
deiras intenções que jazem por sob tão significativa decisão. É conce-
bível pensar que os Estados Unidos vão reativar a Quarta Frota para
oferecer “assistência humanitária” à América Latina e ao Caribe? Isto
ninguém pode acreditar, porque para isso não faz falta uma frota naval
e, ademais, porque semelhante rasgo de altruísmo jamais figurou na
agenda da política exterior estadunidense. Esta segue fiel ao velho lema
de John Quincy Adams, sexto presidente dos Estados Unidos, quando
afirmou que esse país “não tem amizades permanentes senão que inte-
resses permanentes.”
Essa política, portanto, pouco tem de novidade. A Doutrina
Monroe, formulada em 1823 — vale dizer, um ano antes da batalha de
Ayacucho que complementaria a primeira etapa da luta pela indepen-
dência de nossos povos — apontava nessa direção e reafirmava o “in-
teresse permanente” dos Estados Unidos em controlar e dominar a Amé-
rica Latina. Tal como assinala o historiador Horacio López, em fins do
século 19 um oficial da Armada estadunidense, Alfred Thayer Mahan,
aperfeiçoaria no plano da geopolítica as recomendações que se
depreendem da Doutrina Monroe8.
7
Cf. “La importancia de trabajar juntos”, en La Nación (Buenos Aires), 10 de junho de
2008.
8
Horacio López, Secesionismo, anexionismo, independentismo en Nuestra América
(Caracas: El perro y la rana, 2008), p. 23. O livro fundamental no qual Mahan expõe
suas doutrina é The Influence of Sea Power upon History, 1660–1783 (1890, não por
casualidade reeditado nos anos de Ronald Reagan: 1987).
36
A preocupação de Mahan surgiu como resposta frente à proble-
mática desencadeada pela guerra hispano-americana que culminou, no
Caribe, com a incorporação de Cuba e Porto Rico à hegemonia norte-
americana, se bem que sob diferentes condições, e a estratégia que os
Estados Unidos deviam por em prática para assegurar seu indisputado
predomínio no Caribe, definido a partir de então como o Mare Nostrum
estadunidense. Contrariando as interpretações dominantes em seu tem-
po, Mahan sustenta que a extensão do poder continental dos Estados
Unidos passava pelo controle global dos oceanos e das linhas de comu-
nicações marítimas, o que exigia a conformação de uma poderosa fro-
ta militar e mercante.
A partir destas premissas Mahan, observa López, defendeu a ne-
cessidade de construir um canal na América Central para resolver, em
caso de conflitos, o rápido translado da frota de guerra estadunidense
de uma costa a outra, dado que a travessía pelo estreito de Magalhães
levava, nessa época, mais de sessenta dias de nevegação... Uma vez
que se construísse o canal, se levantaria o problema de sua defesa para
evitar que este caísse em mãos inimigas.
López cita o sociólogo portoriquenho Ramón Grosfoguel, o qual
afirma que: “como uma maneira de assegurar a defesa do futuro canal,
Mahan recomendou que antes de construí-lo os EUA deveriam adqui-
rir o Havaí e controlar militarmente quatro rotas marítimas caribenhas
a noroeste do canal: o Passo de Yucatán, entre Cuba e México; o Passo
dos Ventos, a principal rota norte-americana de acesso ao canal entre
Cuba e Haiti; o Passo da Mona, entre Porto Rico e República Domini-
cana; e o Passo de Anegada, próximo de St. Thomas, nas águas orien-
tais de Porto Rico. Mahan recomendou às elites norte-americanas a
construção de bases navais nessas zonas como pré-requisito para a
construção de um canal e como passo indispensável para transformar
os EUA em uma superpotência9.
9
Ramón Grosfoguel. “Los límites del nacionalismo: lógicas globales y colonialismo
norteamericano en Puerto Rico”, Jorge Enrique González, Editor. Nación y nacionalismo
en América Latina (Buenos Aires: Clacso, 2007).
37
Se se examina o itinerário da política exterior desse país, poder-
se-á comprovar que as recomendações de Mahan não caíram em saco
sem fundo: os EUA se apoderaram de Cuba e de Porto Rico e, indire-
tamente, das pequenas nações do Caribe e da América Central; fez o
mesmo com o arquipélago do Havaí em 1898 e em pouco tempo se
apropriou das Filipinas, das Ilhas Marianas e de outras possessões no
Pacífico Ocidental. Todo esse esforço se viu coroado com a cuidadosa-
mente planejada secessão da província setentrional colombiana do
Panamá, em 1903, e a assinatura de um tratado que permitiria a cons-
trução do respectivo Canal, que seria inaugurado em 191410.
Nessa oportunidade, as autoridades “independentes” do Panamá
concederão aos EUA os diretos perpétuos do Canal e uma ampla zona
de oito quilômetros de cada lado do mesmo em troca de uma soma de
10 milhões de dólares e de uma renda anual de 250 mil dólares. Esta
situação seria modificada graças ao Tratado Torrijos-Carter, firmado
em 1977, e que devolveria o Canal à soberania panamenha em 31 de
dezembro de 1999.
Desta sumária descrição surge com bastante clareza a coerência
da política exterior da Casa Branca para a América Latina, área consi-
derada importantíssima pela Armada e, em consequência, a muito fun-
damentada suspeita de que a reativação da Quarta Frota está chamada
a jogar um papel muito mais importante que o anunciado pela propa-
10
Importante sublinhar que esta estratégia do separatismo, recentememente tem sido
desengavetada pelo Departamento de Estado para conter a maré esquerdista que cresce
no continente. Não é casual que eventos separatistas, abertamente estimulados por
Washington, tenham aparecido em Zulia, Venezuela; no litoral equatoriano, ressuscitando
uma ancestral mas largamente esquecida demanda em prol da fundação da República
do Guayas, com sede em Guayaquil; e na Meia Lua boliviana, onde a estratégia da
secessão está na ordem do dia, potencializada sem dúvida pela acachapante vitória de
Evo no referendo revocatório de 10 de agosto de 2008 que parece ter convencido à
reação racista e fascista da Bolivia que a “solução” da crise contempla apenas duas
possibilidades: o golpe de Estado ou a secessão. O primeiro ensaio bem sucedido desta
estratégia imperialista de secessão teve lugar no Texas, em 1845, então pertencente ao
México, e que logo terminaria sendo anexado ao território dos Estados Unidos. Desde
então tem um lugar privilegiado no manual de operações do Departamento de Estado.
38
ganda oficial. Em outras palavras, que sua missão verdadeira pouco
tem a ver com a manifestamente declarada.
Sabemos por experiência os problemas conceituais com os quais
tropeça quem pretenda decifrar o significado de expressões tais
como “segurança regional”, “terrorismo” e “narcotráfico” quando elas
se fazem constar em discursos ou documentos oficiais do governo dos
EUA. Quem quer que se oponha aos desígnios imperiais pode ser
fulminado sob a qualificação de “terrorista’ ou “narcotraficante” ou,
mais facilmente, não obstante, de “cúmplice” daqueles.
O argumento da luta contra o narcotráfico não só é falso, como é
cômico. Afeganistão e Colômbia, dois países nos quais a presença nor-
te-americana é esmagadora, poder-se-ia mesmo dizer inclusive que,
sobretudo no primeiro caso, são países “ocupados” militarmente por
Washington, não por casualidade registram nos últimos anos uma vi-
gorosa expansão dos cultivos de papoula e coca, ademais, o tráfico de
substâncias proibidas, algo insólito que ocorra sob a ciosa observação
de quem agora se arroga a responsabilidade de combater o narcotráfico
na América Latina.
Um estudo recente conclui que a invasão e ocupação do Afega-
nistão desde outubro de 2001 “não destruiu a economia da droga nesse
país. Pior ainda, o Afeganistão voltou a converter-se no maior produ-
tor mundial de ópio... e o cultivo da papoula se estendeu por todas as
províncias do país, sua produção corresponde a 92% do ópio e a apro-
ximadamente 90% da heroína consumidos no mundo”. No tocante ao
caso colombiano, os autores sustentam que “apesar de anos de campa-
nhas de erradicação, a produção e o comércio de drogas ilegais perma-
neceram estáveis na região”11.
11
Segundo a Oficina das Nações Unidas contra a Droga e o Crime (UNODC), no ano de
2006 o cultivo de papoula cresceu 59% enquanto que o do ópio aumentou em 49%. Em
recente artigo, Peter Van Ham y Jorrit Kamminga, “Poppies for Peace: Reforming
Afghanistan’s Opium Industry”, Washington, últimos trimestre de 2006 e primeiro de
2007, pp. 69-81, examinam a fundo a situação da economia da droga no Afeganistão e
sua possível reconversão. Nada disto ocorreu, não obstante, sob a ocupação norte-
americana.
39
O Informe da ONU contra a Droga e o Crime (UNODC) de 2008
revela que em 2007 a colheita de papoula no Afeganistão foi a maior
desde que se realizam registros estatísticos e que a produção de ópio
duplicou entre 2005 e 2007. Também assinala que nesse país se verifi-
ca uma impetuosa expansão do cultivo de maconha12. Na Colômbia
estima-se que no último ano a superfície semeada com coca se
incrementou em 27%, em que pesem as campanhas de fumigação, a
presença de tropas norte-americanas e as políticas de “combate” ao
narcotráfico desencadeadas pelo governo colombiano mancomunado
com a Casa Branca.
Ante a contundência destes fatos, quem poderia ser tão ingênuo
ao ponto de acreditar que a Quarta Frota se mobilizaria para perse-
guir narcotraficantes quando sob a proteção de tropas norte-america-
nas o cultivo e o tráfico de drogas floresceu no Afeganistão e na Co-
lômbia? O que a experiência sugere com quase mais segurança é que
uma de suas principais missões será a de organizar o tráfico de drogas
no mundo de modo tal que os recursos gerados por esse comércio
escuso sejam canalizados para instituições financeiras norte-america-
nas encarregadas de lavá-los e pô-los em circulação.
O pretexto da luta antiterrorista contra o radicalismo islâmico é
tão convincente quanto o anterior: salvo os atentados à Embaixada de
Israel e à Amia (Associação Mutual Israelita Argentina), ocorrida em
Buenos Aires, em começos dos anos noventa, e cuja gênese, responsá-
veis e executores ainda se encontram nas sombras graças à surpreen-
dente ineficácia, ou corrupta cumplicidade, de alguns funcionários do
Estado argentino em suas diferentes ramificações, não existe na região
atividade alguma comprovada de células vinculadas à Al Qaeda ou
outra organização similar.
12
UNODC, Informe Anual 2008, p. 1 (http://www.unodc.org/documents/wdr/
WDR_2008/Executive%20Summary.pdf).
40
A luta contra o terrorismo internacional deveria orientar-se para
Washington, pois ali se encontram seus principais responsáveis: a es-
candalosa proteção oficial concedida ao terrorista comprovado e con-
fesso Luis Posada Carriles e a não menos escandalosa detenção — em
condições desumanas que não se aplicam nem ao mais desalmado cri-
minoso — dos cinco jovens cubanos que se infiltraram nas organiza-
ções terroristas sediadas em Miami, anulam toda verossímil pretensão
reivindicada pela Casa Branca para combater terrorismo13.
Porquanto as intenções humanitárias da Quarta Frota não
são mais que pretexto para encobrir suas verdadeiras e inconfessáveis
intenções: posicionar-se na região para estar prestes a intervir tão logo
o exijam os imperativos da conjuntura14.
Contrariando as piedosas declarações de Stavridis, um comuni-
cado oficial do Departamento de Defesa dos EUA manifestou que a
Quarta Frota contará com toda classe de navios, submarinos e aviões,
e que seu ancoradouro, Mayport, no estado da Flórida, é uma base
naval que conta com um vasto arsenal nuclear. Segundo esse comuni-
cado, o objetivo perseguido pela reativação da Quarta Frota foi “res-
ponder ao crescente papel das forças marítimas na área de operações
13
Sobre o caso Posada Carriles e a questão dos 5, consultar nosso “El terrorismo como
política de estado”, Página/12 e Rebelión, do dia 11 de dezembro de 2007.
14
Some a isso, em meados de junho de 2007, a Câmara de Deputados da Argentina
transformou em lei um projeto do Poder Executivo que reprime o apoio ao terrorismo e
também seu financiamento. A lei responde tanto a um reclamo dos Estados Unidos
como a uma pressão do Grupo de Ação Financeira Internacional, que ameaçava fazer
um pronunciamento público declarando a Argentina país não-seguro. Essa mesma
chantagem foi exercida sobre quase todos os países da região que, salvo algumas poucas
exceções, aprovaram em tempo recorde a legislação solicitada pelo império. Tão vaga
é a caracterização que faz a lei, que em vários países da região surgiram fortes protestos
por sua aplicação para perseguir militantes sociais ou movimentos que se opõem às
políticas neoliberais. Cf. “Aprueban una ley antiterrorista que era reclamada por Estados
Unidos”, Clarín (Buenos Aires), 14 de junho de 2007. Veja-se também a nota de Fernanda
Balatti, “El terrorismo según Argentina”, Le Monde Diplomatique (Buenos Aires), ano
IX, número 108, junho de 2008, p. 6.
41
do Comando Sul (dos EUA) e demonstrar o compromisso de Washing-
ton com seus sócios regionais”15.
Não é necessário forçar demasiadamente a imaginação para sa-
ber quem são os qualificados “sócios regionais” e quem, como Cuba,
Venezuela, Equador e Bolívia, são considerados como os “inimigos
globais” que desestabilizam a região e atentam contra a “segurança
marítima” da região.
A declaração oficial do Pentágono não poderia ter sido mais vaga:
esta força teria a seu encargo várias missões, num espectro que vai
desde “operações contingentes” e luta contra o “narco-terrorismo” até
certas atividades relacionadas com a “segurança no teatro de opera-
ções”.
Como se pode observar, a Quarta Frota tem um mandato para
fazer praticamente qualquer coisa, e não é casual que sua reativação
tenha coincidido com o bombardeio por parte da Força Aérea da Co-
lômbia de um acampamento das FARC precariamente instalado em
território equatoriano e a poucos quilômetros da fronteira, operação
que, semelhante à “libertação” dos quinze reféns em poder das FARC,
não teria sido possível sem o apoio de informações e de transmissões
por satélite dos EUA.
Tampouco é casual que tenha ocorrido quando os esforços pela
desestabilização dos governos da Venezuela, Equador e Bolívia reve-
laram suas limitações e quando os governantes desses países logra-
ram, ao menos até agora, superar todos os obstáculos e armadilhas a
eles interpostos pela Casa Branca e seus lacaios na região. A acacha-
pante vitória de Evo Morales no recente referendo revocatório do 10
de agosto deve ter contribuído para o desespero de muitos em Wa-
shington na Meia Lua boliviana.
Para resumir: o certo é que o Pentágono tem a intenção de dotar a
Quarta Frota com um equipamento similar ao que contam a Quinta
15
(http://www.defenselink.mil/releases/release.aspx?releaseid=11862).
42
Frota, que opera no Golfo Pérsico, e a Sexta, estacionada no Mediter-
râneo. Declarações posteriores do Pentágono admitiram que ao menos
um porta-aviões e vários submarinos formarão parte da frota encarre-
gada de patrulhar as águas latino-americanas.
Nesse mesmo informe originado em Washington, e publicado por
La Nación sob a assinatura de seu co-responsável nessa cidade, Hugo
Alconada Mon, se diz que “dentro da órbita do Comando Sul operam
hoje 11 barcos, um número que poderia aumentar no futuro. Que tipo
de naves se empregarão ‘é questão de momento, das missões específi-
cas’... mas os primeiro indícios apontam ao imponente porta-aviões
George H. W. Bush, que estará operacional desde o fim deste ano,
como possível coração da Quarta Frota”16.
Segundo o mesmo enviado a Washington, “o almirante Gary
Roughead, gestor intelectual do renascimento da unidade”, tem como
meta “assegurar a segurança neste mundo globalizado”. Interrogado
sobre o significado dessa expressão, Roughead se limitou a dizer que a
Quarta Frota poderá estar “pronta em todo momento para todo desa-
fio. Por isso, somos uma Armada global”.
Se se recorda a extraordinária amplitude que a nova doutrina
estratégica norte-americana anunciada em setembro de 2002 — a guerra
infinita e global contra o “terrorismo” — e o fato de que a paranóia
oficial reinante em Washington considera como “terrorista” todo aque-
le que resiste às agressões do imperialismo, poucas dúvidas cabem
acerca do papel real que desempenhará a Quarta Frota: ser um ele-
mento de chantagem e dissuasão para os governos da região que se
oponham aos imperialistas e um significativo apoio “além-fronteiras”
paras seus aliados entre as classes dominantes locais17.
16
Cf. Hugo Alconada Mon, “Estados Unidos con más presencia en la región”, La Nación
(Buenos Aires), 28 de abril de 2008.
17
Hugo Alconada Mon, “Estados Unidos pone en marcha la IV Flota”, La Nación
(Buenos Aires), 13 de julho de 2008.
43
O documento do Comando Sul dos EUA denominado “US
Southern Command Strategy”: 2016 Partnership for the Americas” é
qualificado pelo especialista em relações internacionais Juan Gabriel
Tokatlian como “o plano mais ambicioso que concebeu em anos uma
agência oficial estadunidense com relação à região”18.
Segundo esse documento, na nova conformação da política esta-
dunidense para nossa região não desempenham papel algum nem os
tradicionais instrumentos de predomínio militar, como a Junta
Interamericana de Defesa ou o já finado Tratado Interamericano de
Assistência Recíproca a Guerra das Malvinas, em 1982; nem tampouco
organismos multilaterais como a OEA ou as Nações Unidas. Assinala
mesmo que “as instâncias políticas internas — os Departamentos de
Estado, Justiça e Tesouro — de interação com o hemisfério esvaíram-
se no documento. O comando Sul anuncia seu papel e projeção na área
para os seguintes dez anos como o faria um pró-consul continental”19.
A militarização da política internacional é uma das consequênci-
as da nova doutrina estratégica anunciada ao mundo em setembro de
2002 e ratificada agora pelo Pentágono através de seu instrumento
regional: o Comando Sul. Note-se que o outro lado da moeda dessa
concepção que militariza a cena internacional é a criminalização do
protesto social no plano doméstico, para o que aponta a já referida
legislação antiterrorista aprovada, sob a forte pressão estadunidense,
em quase todos os países da área. Para combater em todos os terrenos,
o internacional e nacional, o império apela para a eficácia dissuasória
18
“El militarismo estadounidense en América del Sur”, Le Monde Diplomatique (Buenos
Aires), ano IX, número 108, junho de 2008, p. 5. Este artigo faz parte de um excelente
dossiê dedicado ao tema e que inclui os seguintes trabalhos: Fernanda Balatti, “El
terrorismo según Argentina”; “¿Adiós a la base de Manta en Ecuador”, por Adriana
Rossi; “La construcción de la soberanía regional”, por Daniel Pignotti; y “Apropiación
de recursos naturales”, por Serena Corsi.
19
Ibid., p. 5.
44
das armas. Esse e não outro é o real papel que a Quarta Frota está
chamada a cumprir na América Latina e no Caribe20.
20
Sobre a criminalização do protesto social existe uma amplíssima literatura
especializada. Em conexão com o tema de nosso trabalho remetemos à leitura do texto
de Fernanda Balatti mencionado mais acima.
45
cipal colunista de assuntos internacionais do NewYork Times, Thomas
Friedman, teriam proporcionado a si próprios um banho de sobriedade
e provavelmente se dado conta de que algo não funcionava demasiado
bem em sua teoria21.
Pouco antes da aparição de “Império”, Friedman escreveu uma
nota na qual dizia, sem meias-palavras, que “a mão invisível do mer-
cado global nunca opera sem um punho invisível. E o punho invisível
que mantém o mundo seguro para o florescimento das tecnologias do
Vale do Silício se chama Exército dos EUA, Armada dos EUA, Força
Aérea dos EUA e Corpo de Marines dos EUA (com a ajuda incidental
de instituições globais como as Nações Unidas e o Fundo Monetário
Internacional)... Por isso, quando um executivo diz coisas tais como
‘Não somos uma companhia estadunidense, somos IBM-US, ou IBM-
Canadá, ou IBM-Austrália, ou IBM-China’ lhes digo: ‘Ah, sim? Bem,
então da próxima vez que tiverem um problema na China, chamem Li
Peng para que os ajudem. E da próxima vez que o Congresso liquidar
uma base militar na Ásia — e você diz que não lhe afeta porque não o
preocupa o que faz Washington — chame a Armada da Microsoft para
que lhe assegure as rotas marítimas da Ásia. E da próxima vez que um
novato congressista republicano quiser fechar mais embaixadas esta-
dunidenses, chame a América-On-Line quando cassarem seu passa-
porte”22.
21
Não só não leram Friedman. Na realidade, não leram nenhum dos numerosos
intelectuais orgânicos do imperialismo como Robert Kagan, Charles Krauthammer,
Michael Ignatieff, Samuel Huntington, William Kristol, Norman Podhoretz e tantos
outros. Muitos deles reunidos em torno do projeto do Novo Século Americano e do qual
a administração Bush Jr. haveria de recrutar numerosos funcionários para ocupar cargos-
chaves na estrutura governamental como Richard Cheney, Paul Wolfowitz, Elliot Abrams,
John R. Bolton, Donald Rumsfeld e muitos mais.
22
Thomas L. Friedman, “Foreign Affairs; Techno-Nothings”, New York Times, 18 de
abril de 1998.
46
Este é o “império realmente existente”, o “xerife solitário” de que
fala Huntington, com a onipresença dos Estados metropolitanos, e so-
bretudo do Estado fundamental para a preservação da estrutura impe-
rialista mundial: os EUA; com a proliferação de grandes empresas
“nacionais” de projeção global respaldadas por seus Estados, os mes-
mos que em seu cândido idílio Hardt e Negri acreditavam desapareci-
dos; e com o decisivo componente militar que caracteriza esta época,
na qual os povos supostamente estariam colhendo os dividendos da
“paz mundial”, uma vez implodida a antiga URSS, causadora do equi-
líbrio do terror atômico dos anos da Guerra Fria, na qual, paradoxal-
mente, floresce a doutrina da “guerra infinita”, interminável e contra
todos proclamada por George W. Bush.
Se algo de bom pode surgir da desafortunada notícia da ativação
da Quarta Frota é que a mesma nos permite deixar para trás a alucinada
visão sintetizada em “Império” e que tanto atrasou a tomada de cons-
ciência das forças de esquerda, de seus partidos e de seus movimentos
sociais sobre a verdadeira natureza do inimigo imperialista.
Como o menino do conto que gritou “O rei está nu!”, a recente
decisão de Washington tem um valioso efeito pedagógico: despeja do
crucial terreno das idéias as interpretações erradas do imperialismo
contemporâneo, como a de Hardt e Negri, que é um imprescindível
primeiro passo para traçar um panorama mais claro e realista tanto
dos desafios que o imperialismo representa a nossos povos como para
construir as estratégias, táticas e instrumentos políticos mais apropri-
ados para combatê-lo com êxito.
47
48
Quarta Frota — Instrumento
estratégico da política de
domínio mundial dos EUA
49
Falsos pretextos
A decisão de relançar a Quarta Frota nas águas territoriais lati-
no-americanas e caribenhas nada tem a ver com a restauração de uma
força militar que respondia evidentemente a outra realidade política,
em meados dos século 20. Não é muito menos uma decisão técnica-
administrativa no quadro do aperfeiçoamento da gestão do Pentágono
e na distribuição das suas forças, como disse o tenente norte-america-
no Myers Vásquez, o encarregado das relações externas nas forças
navais do Comando Sul da Marinha estadunidense, o qual afirmou que
“em termos operacionais”, a reativação da Quarta Frota “não muda
nada”. O militar assevera que se trata apenas de uma medida para
ajustar melhor as unidades que compõem a estratégia marítima ameri-
cana. “Teremos uma sede trabalhando em conjunto com outros com-
ponentes do Comando Sul”, insistindo em que a reativação da Quarta
Frota não aumentará a presença militar dos Estados Unidos na região,
sendo assim uma medida administrativa.
Quando são obrigados a admitir objetivos mais amplos, os porta-
vozes estadunidenses fazem um discurso surrado e já desmoralizado
pelos fatos na América Latina. “Continuaremos as operações que esta-
mos fazendo nos últimos anos, principalmente o combate ao narcotráfico
e as missões de cooperação em segurança”, disse o tenente Vásquez. O
contra-almirante Joseph Kernan, designado para comandar a Quarta
Frota, foi mais explícito, ao declarar que o objetivo da mesma é “Com-
bater o terrorismo e as atividades ilícitas, como o narcotráfico”. O
argumento “técnico” cai por terra quando se sabe que “combate ao
terror” é o conceito pelo qual o imperialismo norte-americano está le-
vando adiante as suas guerras preventivas de agressão a países e po-
vos, como as do Iraque e Afeganistão. É também com este discurso
que os Estados Unidos financiam, armam e dão apoio político e diplo-
mático a Israel nas suas agressões ao Líbano e ao povo palestino e
ameaçam o que entendem como “estados párias”, como o Irã e a Repú-
blica Popular Democrática da Coréia.
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Quanto à luta “contra o narcotráfico” é o pretexto pelo qual pre-
tendem pôr em prática uma política intervencionista baralhando os fa-
tos para criminalizar os movimentos insurgentes colombianos como
“narcoguerrilha”. Os chamados Plano Colômbia e Plano Patriota fo-
ram elaborados e aplicados com tais justificativas e tinham inspiração
meramente militar. Aliás, é através destes que os Estados Unidos fi-
nanciam o regime militarista de Álvaro Uribe na Colômbia, onde man-
têm mais de 500 especialistas prestando assessoria militar.
Objetivos estratégicos
Os patriotas e amantes da paz, portanto, não se devem deixar
iludir nem enganar. O relançamento da Quarta Frota guarda relação
direta com os objetivos estratégicos gerais dos Estados Unidos na atu-
51
al situação mundial; com o novo quadro de forças na América Latina
surgido a partir das mudanças democráticas em curso e com a concep-
ção sobre o poderio militar e sua relação com os princípios gerais da
política externa norte-americana aplicados desde o início do século 20.
É direta a relação entre o relançamento da Quarta Frota e a estra-
tégia escolhida pelos Estados Unidos de acordo com a Doutrina Bush.
Esta visa a estabelecer e perpetuar o primado dos interesses estaduni-
denses no mundo, impor a todo o custo a sua hegemonia, mormente
num período histórico em que se delineiam os sinais da progressiva
decadência desse imperialismo e em que o capitalismo, com suas re-
correntes crises econômicas e financeiras, entrelaçadas com as crises
alimentar, ambiental e energética, exibe os seus impasses inarredáveis
e os seus limites históricos.
Muito antes da guerra ao Iraque e da guerra ao Afeganistão, an-
tes mesmo dos atentados às torres gêmeas em 11 de setembro de 2001,
já no governo de Bush, pai, foram anunciadas as intenções exclusivistas
e de unilateralidade unipolar por parte da Casa Branca. Em discurso
sobre o estado da união pronunciado em 1992, o presidente comemo-
rava a vitória na guerra fria afirmando que o vencedor, alçado à condi-
ção de superpotência única no planeta, não era mais apenas o líder do
mundo ocidental, mas o inconteste líder mundial. E com base nisso
proclamou a fundação da “novíssima ordem mundial”, cujos elemen-
tos centrais eram um conjunto de mecanismos de domínio unipolar.
A Doutrina Bush veio a plasmar-se como tal dez anos depois, na
presidência de George W. Bush, num documento intitulado Estratégia
de Segurança Nacional, em que o mandatário da Casa Branca dizia:
“Para derrotar as ameaças à nossa segurança devemos usar cada fer-
ramenta do nosso arsenal: poderio militar e melhores defesas da pátria.
A guerra contra terroristas de alcance global é um empreendimento
global de duração indefinida. Os Estados Unidos irão punir nações que
estão comprometidas com o terrorismo, incluindo aquelas que abri-
gam terroristas”.
A Doutrina Bush abarca os seguintes aspectos:
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Primeiramente a guerra infinita, pelo que foram catalogadas 60
nações consideradas “párias”, terroristas ou coniventes com o terro-
rismo, além de mais de uma centena de organizações políticas e milita-
res hostis aos Estados Unidos. Na época, chamávamos a atenção para
que se abria de fato uma era de horror infinito para os povos. O instru-
mento para tal guerra são a presença militar ostensiva em todas as
regiões do mundo e as guerras preventivas. Isto transformava em letra
morta o princípio do direito internacional de que um país só pode ata-
car outro em legítima defesa e com autorização das Nações Unidas,
com uma finalidade precípua e por tempo estritamente determinado.
Com isto temos o terceiro aspecto da Doutrina Bush que é o
unilateralismo nas relações internacionais. A mais contundente mani-
festação desse unilateralismo foi a assertiva do então secretário de
Estado dos Estados Unidos, Collin Powell, quando, em face da oposi-
ção de membros do Conselho de Segurança à guerra ao Iraque, decla-
rou que as Nações Unidas estariam transformando-se numa organiza-
ção irrelevante. A Doutrina Bush é impregnada ainda pela decisão de
usar, se for considerado necessário, o superpoder militar, inclusive
nuclear, dos Estados Unidos. Tudo isso é funcional a um dos objetivos
permanentes da política externa norte-americana no período pós-Guerra
Fria, que consiste em impedir o surgimento de poderes regionais ou
globais capazes de rivalizar com sua hegemonia imperialista.
Ainda é cedo para prefigurar o que será feito de semelhante dou-
trina pelo presidente eleito Barak Obama. Certamente, o novo presi-
dente anunciará nova política externa e fará algum gesto no sentido de
se diferençar dos aspectos mais agressivos da Doutrina Bush, mor-
mente quanto às aventuras militares no Oriente Médio. Mas nada indi-
ca que poderá mudar sua essência, porquanto esta se relaciona com os
objetivos permanentes do imperialismo norte-americano. A reativação
da Quarta Frota enquadra-se nesta categoria e tende, portanto, a per-
manecer como fato que atesta o militarismo como a opção preferencial
dos Estados Unidos para exercer seu domínio mundial. A América Latina
é um espaço estratégico no balanço de forças dos Estados Unidos com
53
o resto do mundo, vital para a manutenção da sua supremacia e para o
êxito dos seus planos geopolíticos. Uma política diferente deveria co-
meçar pela revogação da decisão de relançar a Quarta Frota e pelo
fechamento das bases militares norte-americanas na América Latina e
Caribe.
54
Intervencionismo — traço permanente nas relações EUA-AL
O intervencionismo é um traço permanente na política dos Esta-
dos Unidos em relação à América Latina desde finais do século 19 até
os nossos dias. Do intervencionismo duro da época do “big stick” de
Theodore Roosevelt, passou-se a um período em que, embora tenham
diminuído as intervenções diretas, as grandes empresas adquiriram um
predomínio decisivo sobre o Departamento de Estado e passaram a
interferir na política externa para a América Latina. O século 20 co-
nheceu também a “diplomacia missioneira”, de Woodrod Wilson, a
formação do sistema panamericano, a “diplomacia do dólar”, a políti-
ca da “boa vizinhança”, implementada por Franklin Delano Roosevelt,
a “doutrina de segurança nacional” na segunda metade do século 20 e
finalmente, com o pós-Guerra Fria, a política da “segurança hemisfé-
rica”. Todas essas políticas e fases tinham um denominador comum —
o intervencionismo, a tutela e a submissão da América Latina e do
Caribe aos interesses estratégicos do imperialismo estadunidense — e
nenhuma delas excluía em princípio a opção militar, embora não tives-
se havido intervenções militares diretas no período da “política de boa
vizinhança”, sob Franklin Delano Roosevelt.
As primeiras vítimas do intervencionismo militarista estaduni-
dense na América Latina e Caribe foram Cuba e Porto Rico. Este últi-
mo foi bombardeado e ocupado em 1898 e até hoje não goza de inde-
pendência nacional. Sob o pretexto de lutar contra a Espanha, no oca-
so da época colonial, os Estados Unidos submeteram Cuba a uma es-
pécie de neocolonialismo. O Congresso sediado em Washington pro-
mulgou a “Emenda Platt”, que posteriormente foi incorporada à Cons-
tituição cubana. Segundo essa emenda, os Estados Unidos se reserva-
vam o direito de possuir bases e de intervir em qualquer momento para
“proteger a independência de Cuba e manter um governo estável”. O
Exército norte-americano se retirou da Ilha em 1902, mas voltou a
ocupá-la de 1906 a 1909.
Outro alvo precoce do intervencionismo norte-americano foi o
Panamá, cuja independência, em 1903, não passou de uma cisão com
55
a Colômbia, de que fazia parte, por provocação dos Estados Unidos. O
Panamá concedeu aos Estados Unidos, por tempo indeterminado, di-
versas bases e uma zona nas margens do Canal. “Tomei o Panamá sem
consultar o gabinete”, confessaria Theodore Roosevelt em suas memó-
rias. Os marines norte-americanos ingressaram em território paname-
nho em diferentes ocasiões no início do século 20 – 1917, 1918 e 1925.
Entre 1915 e 1934 os Estados Unidos enviaram seus marines ao
Haiti. O pretexto guarda não pouca semelhança com o que até hoje
ocorre no malsinado país caribenho, tido nos dias correntes como “es-
tado falido”, um estranho e detestável conceito adotado contempora-
neamente: evitar o caos interno e impedir intervenções de outras potên-
cias.
A vizinha República Dominicana, que compartilha a mesma ilha
com o Haiti, foi outro país caribenho a sofrer a intervenção militar dos
Estados Unidos, que ali permaneceram entre 1916 e 1924. Em 1930,
os Estados Unidos entronizaram no poder Rafael Leônidas Trujillo,
que impôs ao país uma das ditaduras mais cruéis, duradouras e cor-
ruptas do século 20 na América Latina.
De 1912 a 1926 milhares de marines ocuparam a Nicarágua, con-
tra os quais lutou Augusto Cesar Sandino, o “general de homens li-
vres”. Tal como na República Dominicana, os Estados Unidos deixa-
ram no lugar das tropas uma ditadura implacável e corrupta, coman-
dada por Anastácio Somoza, que veio a ser derrocada pela Revolução
Sandinista vitoriosa em 1979.
O México, que teve boa parte do seu território roubado durante o
processo de formação e expansão territorial dos Estados Unidos da
América ao longo do século 19, também sofreu múltiplas intervenções
dos Estados Unidos entre a primeira e a segunda décadas do século 20,
como o desembarque em Vera Cruz (1914) e a expedição repressiva do
general Pershing em Chihuahua (1916).
O pós-Segunda Guerra Mundial é um período em que os Estados
Unidos voltam a intervir na América Latina e no Caribe para impor-se
como potência dominante. Em 1947, em aliança com setores entreguistas
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das Forças Armadas, derrubam o governo venezuelano de Rômulo
Gallegos. Em 1954, reagem à eleição de Jacobo Arbenz na Guatemala
com um golpe de Estado. Em 1961 invadem Cuba, sendo rechaçados
pelos revolucionários comandados por Fidel em Playa Girón. Em 1965,
invadem a República Dominicana contando com o apoio da ditadura
militar brasileira que levou as nossas Forças Armadas a cumprirem o
indigno papel de tropa mercenária, derrubando o governo de Juan Bosch.
Entre 1964 e meados dos anos 1980, a começar pelo golpe militar
no Brasil, os Estados Unidos fomentam, apóiam e financiam golpes de
Estado e ditaduras cruéis como a de Pinochet, no Chile, e as dos gene-
rais fascistas argentinos, uruguaios e brasileiros. Nesse período têm
lugar também as guerras contra-revolucionárias na América Central, a
invasão de Granada e o assassínio de seu presidente Maurice Bishop
(1983) e em 1989 a invasão do Panamá e prisão do seu presidente
Manuel Noriega. Os últimos anos se caracterizam pela ajuda direta
dos Estados Unidos ao regime de Uribe para esmagar a luta insurgente
e pelas pressões e tentativas de golpe contra a Venezuela Bolivariana
liderada por Hugo Chávez e a Bolívia democrática e popular presidida
por Evo Morales
espaciais.
O USTRANSCOM – responsável pelo transporte de pessoal e material mi-
águas próximas.
O USCENTCOM – Atua no Oriente Médio, exceto Israel, parte da Ásia
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Central e Egito. É o comando diretamente ligado às guerras ao Iraque
e ao Afeganistão.
O USEUCOM – Todo o continente europeu, a Rússia, países do Cáucaso,
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