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A poética do fundamento;
ensaios de teoria e história da literatura. Niterói: Editora da Universidade Federal
Fluminense, 1996,
5 Ibidem, p. 23.
A. J. Minnis nos chama a atenção para a existência, no final da Idade
Média (1100-1400), de uma situação em que um certo número de auctores de
textos escritos em Latim é lido e estudado nas escolas e universidades. É
interessante, contudo, assinalar o sentido do termo para a época: "Em um
contexto literário, o termo auctor denotava alguém que era ao mesmo tempo
um escritor e uma autoridade [auctoritas, em Latim], alguém que não apenas
devia ser lido, mas também ser respeitado e acreditado."6 A partir da leitura e
análise destes textos, os eruditos produzem glosas e comentários, que hoje são
repositórios da recepção daquele época.
Minnis diz que o curso-preleção medieval sobre determinado auctor
começava com um discurso introdutório em que o texto abordado seria
considerado como um todo, e se daria ao aluno o esquema daqueles princípios
e critérios literários e doutrinais - que se supunha apropriados ao texto em
questão. Quando a série de preleções era transcrita pelos alunos, ou preparada
para publicação pelo próprio professor, a preleção inicial tornava-se o prólogo
ao comentário sobre o texto.
6 Ibidem, p. 10
7 Ibidem, p.13.
na América. E estas palavras de ordem indicarão uma figuração de discurso
padronizado por certa racionalidade.
João Adolfo Hansen8 aponta vários pressupostos desta racionalidade,
entre os quais uma articulação retórica e uma encenação de ordem social.
Em relação ao primeiro item, é importante assinalar que, para autores
e leitores barrocos, havia a pressuposição do conhecimento de um universo de
procedimentos retóricos que constituíam a base mesma do discurso
seiscentista. Em outras palavras, havia um contrato implícito entre autor e
leitor, caracterizando ambos como discretos, agudos e prudentes, conforme um
padrão apropriado e desenvolvido desde o século XV "nos livros de formação
do perfeito cavaleiro, que se tornara modelar em práticas cortesãs dos séculos
XVI e XVII."9 Não seria discreto, agudo nem prudente desconhecer aqueles
procedimentos, pois quem os ignorasse poderia ser classificado como vulgar,
o que significaria ocupar um lugar menor na encenação vigente de ordem
social.
A discrição, a prudência e a agudeza do discurso também tinham seus
auctores: Gracián, Tesauro, Pallavicino, entre outros. E a influência da
codificação discursiva proposta por eles atingirá até o século XVIII, como
veremos. Contudo, interessa-nos neste ponto enfocar um aspecto específico
da relação entre produção textual e leitura no século XVII. Trata-se de um
aspecto que não é mais auto-evidente para a maioria das pessoas em nosso
século: o circuito comunicacional da obra seiscentista era baseado numa
poética da imitação e da emulação. O que significa isto?
Para explicar melhor, vamos encenar uma possível reação de
receptores atuais e contrastá-la com uma provável reação de leitores
hipotéticos seiscentistas. Assim, imaginemos que um contemporâneo nosso
tivesse diante de seus olhos uma obra que imitasse ou emulasse Gôngora,
Quevedo ou Marino. Talvez este leitor julgasse negativamente esta obra,
exatamente porque ele valoriza a originalidade.
Entretanto, no século XVII, por exemplo, Gregório de Matos e seu
público provavelmente apreciariam a imitação de autores como Gôngora,
.........................................
logo mal te apelidaste
o Mestre da poesia
furtando mais em um dia
que mil ladrões em um ano:
não te envergonhas, magano?12
"...assim como eu propriamente não tomo, mas só roubo por metáfora, o lume
do meu vizinho, se com o lume do meu vizinho acendo outro lume para mim;
mas sim cometo furto, se lhe tomo para mim a mesma vela acesa de que é
11MATOS, Gregório de. Obra poética. 2. ed. Rio de Janeiro: Record, 1990.
V. 1. p. 603.
12Ibidem, p. 604.
13Cf. Tratatto dello stile e del dialogo, oue el cercarsi l'Idea dello scriuere
insegnatuo, Discorresi partitamente de' verij pregi dello Stile sì Latino come
Italiano. E della natura, dell'imitazione, e dell'utilitá del Dialogo. Composto
dal Padre Sforza Pallavicino Della Compagnia di Giesu. In Roma, Nella
Stamparia del Mascardi, 1662.
possuidor: da mesma sorte o tomar ou furtar uma cousa a outrem, então se diz
nos escritores propriamente roubo, furto e latrocínio, quando a mesma coisa
em indivíduo inventada por um, é usada por outro; porque se ela foi um
distinto indivíduo, já se não dirá tomada, nem furtada, mas imitada ou
competida: e só por metáfora se pode chamar roubo."14
PALLAVICINO
FERREIRA