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DA NECESSIDADE DE UMA FORMAÇÃO CIENTÍFICA PARA UMA EDUCAÇÃO


PARA A CIDADANIA

Conference Paper · September 2007

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Amparo Vilches Luis Marques


University of Valencia University of Aveiro
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Daniel Gil Pérez


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I SIMPÓSIO DE PESQUISA EM ENSINO E HISTÓRIA DE CIÊNCIAS DA TERRA
III SIMPÓSIO NACIONAL SOBRE ENSINO DE GEOLOGIA NO BRASIL

DA NECESSIDADE DE UMA FORMAÇÃO CIENTÍFICA PARA UMA EDUCAÇÃO


PARA A CIDADANIA

THE ROLE OF THE SCIENTIFIC BACKGROUND TO EDUCATION FOR THE


CITIZENSHIP

A. VILCHES

Professora Catedrática de Física e Química do Ensino Secundário


IES Sorolla de València- Espanha
<amparo.vilches@uv.es>

L. MARQUES

Professor Associado com Agregação


Centro de Investigação Didáctica e Tecnologia na Formação de Formadores. Universidade de Aveiro.
Portugal
<lmarques@dte.ua.pt>

GIL-PÉREZ.

D. Professor Catedrático de Didáctica de las Ciencias Experimentales


Universitat de València- Espanha
<daniel.gil@uv.es>

J. PRAIA

Professor Associado com Agregação


Centro de Investigação Didáctica e Tecnologia na Formação de Formadores. Universidade de Aveiro.
Portugal
<jpraia@dte.ua.pt>
Abstract  This paper aims to contribute to the debate on the role of science and technology in science education. Particular at-
tention is given to the citizens’ preparation towards the development of decision making.

Keywords  Nature of science and technology; Scientific Literacy; Immersion in a scientific and technological culture; Sci-
ence-Technology-Environment-Society (STES); Education for citizenship; Decision making

Resumo  O presente trabalho tem como propósito dar uma nova contribuição para o debate que se vem desenvolvendo há já
algum tempo em volta do papel de uma formação em educação em ciência e, em particular, na formação de uma cidadania para
a participação na tomada de decisões.

Palavras-chave  Natureza da ciência e da tecnologia; Alfabetização científica; Imersão na cultura científica e tecnológica;
Relações ciência-tecnologia-sociedade-ambiente (CTSA); Educação para a cidadania; Tomada de decisões.

Linha temática  Formação de Professores de (Geo)Ciências.

E um segundo, A importância da superação


das visões distorcidas da natureza da ciência na edu-
1 Introdução cação científica

Iremos centrar a nossa intervenção em dois


1.Formação científica para uma
problemas estreitamente relacionados, que conside-
cidadania que permita participar em discussões
ramos da maior importância (Gil Pérez e Vilches,
tecnocientíficas.
2004, 2005a e 2005b; Cachapuz et al., 2005):
Um primeiro, A formação científica para
uma cidadania que permita participar em discussões Existe um amplo consenso acerca da necessidade de
tecnocientíficas e na tomada de decisões de interesse uma alfabetização científica que permita preparar as
social. cidadãs e os cidadãos para a tomada de decisões.
Assim, na Conferência Mundial sobre a Ciência para
o século XXI, sob os auspícios da UNESCO e do

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I SIMPÓSIO DE PESQUISA EM ENSINO E HISTÓRIA DE CIÊNCIAS DA TERRA
III SIMPÓSIO NACIONAL SOBRE ENSINO DE GEOLOGIA NO BRASIL

Conselho Internacional para a Ciência, declara-se: sem os quais é impossível compreender as opções em
“Para que um país esteja em condições de atender às jogo e participar da tomada de decisões fundamenta-
necessidades fundamentais da sua população, o ensi- das.
no das ciências e da tecnologia é um imperativo es- Consideramos útil analisar, como exemplo
tratégico (…) Hoje mais do que nunca é necessário paradigmático, o problema criado pelos fertilizantes
fomentar e difundir a alfabetização científica em to- químicos e pesticidas que, a partir da Segunda Guerra
das as culturas e em todos os sectores da sociedade, Mundial, produziram uma verdadeira revolução agrí-
(...) a fim de melhorar a participação dos cidadãos na cola, incrementando de forma notável a produção.
adopção de decisões relativas à aplicação de novos Recordemos que a utilização de produtos de síntese
conhecimentos” (Declaração de Budapeste, 1999). para combater os insectos, pragas, parasitas e fungos
Este argumento "democrático" é, talvez, o aumentou a produtividade num período em que um
mais amplamente utilizado por quem reclama a alfa- notável crescimento da população mundial o exigia.
betização científica e tecnológica como uma compo- E recordamos que alguns anos depois a Comissão
nente básica de uma educação para a cidadania. (Fou- Mundial do Meio Ambiente e do Desenvolvimento
rez, 1997; Bybee, 1997; DeBoer, 2000). (1988) advertia que o seu excesso constituía uma
Contudo, alguns autores têm vindo a pôr em ameaça para a saúde humana, provocando desde mal-
dúvida a conveniência e inclusive a possibilidade da formações congénitas até ao cancro sendo, por sua
generalidade dos cidadãos e cidadãs adquirirem uma vez, autênticos venenos para peixes, mamíferos e
formação científica realmente útil para, entre outros pássaros. As referidas substâncias que se acumula-
objectivos, participar na tomada de decisões (Atkin e vam nos tecidos dos seres vivos, chegaram a ser de-
Helms, 1993; Shamos, 1995; Fensham 2002a e nominadas conjuntamente com outras igualmente
2002b). Trata-se de trabalhos bem documentados que tóxicas, "Contaminantes Orgânicos Persistentes"
pretendem “abalar aparentes evidências”, como seria, (COP).
na sua opinião, a necessidade de alfabetizar cientifi- O que nos interessa destacar aqui é que a ba-
camente toda a população, algo que Shamos classifi- talha contra o DDT foi desenvolvida por cientistas
ca de autêntico mito no seu livro The Myth Of Scien- como Rachel Carson (1980) em conjunto com grupos
tific Literacy (Shamos, 1995). É preciso, pois, anali- de cidadãos que foram sensíveis às suas chamadas de
sar cuidadosamente os seus argumentos (Gil-Pérez e atenção e argumentos. De facto, Carson é hoje recor-
Vilches, 2004 e 2005a). dada como “mãe do movimento ecologista”, pela
Na opinião de Fensham (2002b), pensar que enorme influência que teve o seu livro no apareci-
uma sociedade cientificamente alfabetizada está em mento de grupos activistas que reivindicavam a ne-
melhor situação para actuar racionalmente frente aos cessidade da protecção do meio ambiente, assim co-
problemas sócio-científicos constitui uma ilusão que mo estando nas origens do denominado movimento
ignora a complexidade dos conceitos científicos im- CTS. Convém chamar a atenção sobre a influência
plicados, como sucede, por exemplo, com o proble- destes “activistas ilustrados” (“Knowledge based
ma do aquecimento global ou os relacionados com os activists”) e da sua decisiva participação na tomada
desenvolvimentos recentes das biotecnologias. de decisões ao fazerem seus os argumentos de Carson
Neste quadro, deveríamos, pois, renunciar à e exigirem rigorosos controles dos efeitos do DDT,
ideia de uma educação científica básica para todos, que acabaram por convencer a comunidade científica
susceptível de tornar possível uma participação de e, posteriormente, os legisladores, obrigando à sua
cidadania na tomada de decisões? proibição.
Julgamos exactamente o contrário, ou seja, Podemos mencionar muitos outros exemplos
tentaremos mostrar que a participação na tomada similares, como os relacionados com a construção de
fundamentada de decisões precisa dos cidadãos, mais centrais nucleares e o armazenamento de resíduos
do que de um nível de conhecimentos muito elevado, radioactivos; o uso dos "aerosóis" (compostos cloro-
da vinculação a um mínimo de conhecimentos especí- fluorcarbonetados), destruidores da camada de ozo-
ficos, perfeitamente acessível para uma cidadania, no; o incremento do efeito de estufa, devido funda-
com planeamentos globais e considerações éticas que mentalmente à crescente emissão de CO2, que amea-
não exigem qualquer especialização (Gil-Pérez e ça com uma mudança climática global de consequên-
Vilches, 2004). E tentaremos mostrar, também, que a cias devastadoras; os alimentos manipulados geneti-
posse de profundos conhecimentos específicos, como camente, etc., etc.
os que possuem os especialistas num campo determi- Em síntese, uma participação de cidadania
nado de saber, não garante a adopção de decisões na tomada de decisões é hoje um facto positivo, uma
adequadas, mas exigem enfoques que contemplem os garantia de aplicação do principio da precaução, que
problemas numa perspectiva mais ampla, analisando se apoia em uma crescente sensibilidade social frente
as possíveis repercussões a médio e longo prazo, às implicações do desenvolvimento técnico-científico
tanto no campo considerado como em outros campos. que podem comportar riscos para as pessoas ou para
E isso é algo para o qual os não-especialistas podem o meio ambiente. A referida participação, temos de
contribuir, desde que possuam um mínimo de conhe- insistir, reclama um mínimo de formação científica
cimentos científicos sobre a problemática estudada, que torne possível a compreensão dos problemas e

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I SIMPÓSIO DE PESQUISA EM ENSINO E HISTÓRIA DE CIÊNCIAS DA TERRA
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das opções - que se podem e se devem expressar nu- Percebeu-se assim que, se queremos mudar
ma linguagem acessível - para não se ver recusada o que os professores e os alunos fazem nas aulas de
com o argumento de que problemas como a mudança ciências, é preciso previamente modificar a epistemo-
climática ou a manipulação genética são de uma logia dos professores (Bell e Pearson, 1992), ou seja,
grande complexidade. é preciso levar em conta a importância da natureza da
O que acabamos de referir constitui um ar- ciência na educação científica. Mas, embora possuir
gumento decisivo a favor de uma alfabetização cien- concepções válidas acerca da ciência não garanta que
tífica dos cidadãos, cuja necessidade aparece cada o comportamento docente seja coerente com as ditas
vez com mais clareza perante a situação de autêntica concepções, isso constitui um requisito sine qua non
“emergência planetária” (Bybee, 1991; Vilches e Gil- (Hodson, 1993). O estudo das referidas concepções
Pérez, 2003) que estamos vivendo. Assim, na Confe- tem-se convertido, por essa razão, numa poderosa
rencia das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e linha de investigação e tem colocado a necessidade
Desenvolvimento, celebrada no Rio de Janeiro em de estabelecer o que pode entender-se como una ima-
1992 e conhecida como Primeira Cimeira da Terra, gem adequada, não distorcida, sobre a natureza da
se reclamou uma decidida acção dos educadores para ciência e da actividade científica, coerente com a
que cidadãos e cidadãs adquiram uma correcta per- epistemologia actual.
cepção de qual é essa situação e possam participar na Estamos conscientes das dificuldades que se
tomada de decisões fundamentadas (Edwards et al., colocam ao falar de uma “imagem adequada” da ac-
2001; Gil- Pérez et al., 2003). Uma situação cuja tividade científica, que parece sugerir a existência de
gravidade levou as Nações Unidas a instituir uma um suposto método universal, de um modelo único
Década da Educação por um Futuro Sustentável para de desenvolvimento científico. É preciso evitar qual-
o período 2005-2014. quer interpretação deste tipo, mas tal não se consegue
A alfabetização científica não só não consti- renunciando a falar das características da actividade
tui um "mito irrealizável" (Shamos, 1995), antes se científica; consegue-se com um esforço consciente
impõe como uma dimensão essencial de uma cultura para evitar simplismos e deformações claramente
de cidadania, para fazer frente aos graves problemas contrárias ao que pode entender-se, em sentido am-
com que há-de enfrentar-se a humanidade hoje e no plo, como aproximação científica ao tratamento de
futuro. Cabe-nos assinalar, por outro lado, que a rei- problemas.
vindicação desta dimensão não é fruto de “uma ideia Como a literatura tem mostrado, diversos es-
preconcebida” aceite acriticamente, como afirma tudos têm evidenciado, de forma convergente, a exis-
Fensham (2002a e 2002b). Muito pelo contrário, o tência de um conjunto de distorções, estreitamente
prejuízo tem sido e continua a ser que “a maioria da relacionadas, cuja superação pode servir de base a
população é incapaz de aceder aos conhecimentos um consenso acerca de como orientar a imersão nu-
científicos, que exigem um alto nível cognitivo”, o ma cultura científica, ou melhor dito, numa cultura
que implica, obviamente, reservá-los a uma pequena científica e tecnológica, pois as visões empobrecidas,
elite. A recusa da alfabetização científica lembra, distorcidas, afectam tanto a natureza da ciência como
assim, a sistemática resistência histórica dos privile- a da tecnologia e devem ser abordadas conjuntamente
giados a um alargamento da cultura e à generalização (Gil Pérez, 1993; Fernández et al., 2002; Gil Pérez e
da educação (Gil-Pérez e Vilches, 2001). É necessá- Vilches, 2003; Gil Pérez et al., 2005; Cachapuz et al.,
rio insistir, efectivamente, em que uma educação ci- 2005).
entífica como a praticada até aqui, tanto no ensino No entanto, como têm mostrado também es-
secundário como na própria universidade, centrada tas mesmas investigações, um trabalho colectivo de
quase exclusivamente nos aspectos conceptuais, é reflexão crítica permite um distanciamento destas
igualmente criticável como preparação para futuros visões deformadas e a aquisição de uma visão mais
cientistas e que dificulta, paradoxalmente, a aprendi- adequada da actividade científica e tecnológica, a
zagem conceptual. Com efeito, a investigação em qual expressa o consenso básico de diversos episte-
didáctica das ciências tem vindo a mostrar que "os mólogos (Popper, 1962; Khun, 1971; Bunge, 1976;
estudantes desenvolvem melhor a sua compreensão Toulmin, 1977; Feyerabend, 1975; Lakatos, 1982;
conceptual e aprendem mais acerca da natureza da Laudan, 1984...), à margem das suas discrepâncias e
ciência quando participam em investigações científi- debates pontuais. Podemos resumir este consenso nos
cas, desde que haja suficientes oportunidades e apoio seguintes pontos: i) a recusa da própria ideia de
para a reflexão" (Hodson, 1992). O que a investigação “Método Científico”, ii) há que ter em atenção a
está a mostrar é que a compreensão significativa dos recusa do que Piaget (1970) denomina “o mito da
conceitos exige superar o reducionismo conceptual e origem sensorial dos conhecimentos científicos”, isto
planear o ensino das ciências como una actividade, é, a recusa de um empirismo que concebe os co-
próxima à investigação científica, que integre os aspec- nhecimentos como resultado da inferência induti-
tos conceptuais, procedimentais e axiológicos (Vil- va a partir de “dados puros”. iii) evidenciar o pa-
ches, Solbes e Gil-Pérez, 2004). pel do pensamento divergente na investigação, que
se concretiza em aspectos fundamentais e erradamen-
te afastados nas abordagens empiristas, como são a

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III SIMPÓSIO NACIONAL SOBRE ENSINO DE GEOLOGIA NO BRASIL

criação de hipóteses e de modelos ou o próprio dese- ciências. Como já mostraram diversas linhas de in-
nho de experiências. iv) a busca de coerência global vestigação, uma aprendizagem significativa e dura-
(Chalmers, 1990). O facto de se trabalhar em termos doura é facilitada pela participação dos estudantes na
de hipóteses introduz exigências suplementares de construção de conhecimentos científicos e pela sua
rigor: é preciso duvidar sistematicamente dos resulta- familiarização com as estratégias e as atitudes cientí-
dos obtidos e de todo o processo seguido para os ficas (Hodson, 1992; Gil-Pérez et al., 1999; Fernán-
obter, o que conduz a revisões contínuas, a tentar dez et al., 2005; Cachapuz et al., 2005).
obter esses resultados por caminhos diversos e, parti- Propomos, em síntese, planear a aprendiza-
cularmente, a mostrar a sua coerência com os resulta- gem como um trabalho de investigação e de inovação
dos obtidos noutras situações; v) é preciso compre- através do tratamento de situações problemáticas
ender o carácter social do desenvolvimento cientí- relevantes para a construção de conhecimentos cientí-
fico, evidente não só no facto de que o ponto de par- ficos e a conquista de inovações tecnológicas suscep-
tida do paradigma teórico vigente é a cristalização tíveis de satisfazer determinadas necessidades. Isso
dos contributos de gerações de investigadores, mas deve ser considerado como uma actividade aberta e
também no facto de que a investigação responde cada criativa, devidamente orientada pelo professor, que
vez mais a estruturas institucionalizadas (Kuhn, se inspira no trabalho de cientistas e de tecnólogos e
1971; Matthews, 1991 e 1994) onde o trabalho dos que deveria incluir toda uma série de aspectos como
indivíduos é orientado por linhas de investigação os que passamos a enumerar (Gil-Pérez et al., 1999;
estabelecidas, pelo trabalho da equipa a que perten- Gil-Pérez e Vilches, 2004): i)A discussão do possível
cem, não fazendo praticamente sentido a ideia de interesse e da relevância das situações propostas que
investigação completamente autónoma. Além disso, o dê sentido ao seu estudo e evite que os alunos se vejam
trabalho dos homens e mulheres de ciências – como submergidos no tratamento de uma situação sem terem
qualquer outra actividade humana – não acontece à sequer podido formar uma primeira ideia motivadora
margem da sociedade em que vivem e é influenciado, ou percebido a necessária tomada de decisões, por
logicamente, pelos problemas e circunstâncias do parte da sociedade e da comunidade científica, acerca
momento histórico, da mesma forma que a sua acção da conveniência ou da inconveniência do referido tra-
tem uma clara influência sobre o meio físico e social balho, tendo em conta a sua possível contribuição para
em que se insere. Desenha-se assim uma imagem a compreensão e transformação do mundo, suas reper-
imprecisa, nebulosa, da metodologia científica – lon- cussões sociais e do meio ambiente, etc. ii) O estudo
ge de qualquer ideia de algoritmo com que frequen- qualitativo, significativo, das situações problemáti-
temente se apresenta – na qual nada garante que se cas abordadas, que ajude a compreender e a precisar
chegará a um bom resultado, mas que representa, sem tais situações à luz dos conhecimentos disponíveis, dos
dúvida, a melhor forma de orientar o tratamento de objectivos perseguidos… e a formular perguntas ope-
um problema científico (como atestam os impressio- rativas sobre o que se procura, o que supõe uma opor-
nantes edifícios teóricos construídos). tunidade para os estudantes começarem a explicitar
Por outro lado, é preciso ter presente que o funcionalmente as suas ‘concepções alternativas’; iii) a
trabalho científico exige tratamentos analíticos, sim- invenção de conceitos e a formulação de hipóteses
plificativos, artificiais. Mas não supõe, como às vezes fundamentadas nos conhecimentos disponíveis, capa-
se critica, incorrer necessariamente em visões parce- zes de focalizar e de orientar o tratamento das situa-
lares e simplistas: na medida em que se trata de análi- ções, enquanto permitem aos estudantes utilizar as suas
ses e de simplificações conscientes, tem-se presente a concepções alternativas para fazer previsões susceptí-
necessidade de elaborar sínteses e estudos de com- veis de ser submetidas a prova; iv) a definição e im-
plexidade crescente. plementação de estratégias de resolução, incluindo,
Cabe aqui perguntarmo-nos se todo este es- se for caso disso, o plano e a realização de experiên-
forço de clarificação “teórica” vale realmente a pena. cias para submeter à prova as hipóteses à luz do corpo
Como Guilbert e Meloche (1993) assinalam, “Uma de conhecimentos de que se dispõe, o que exige um
melhor compreensão pelos docentes dos modos de trabalho de natureza tecnológica para a resolução dos
construção do conhecimento científico (…) não é problemas práticos que possam surgir, como, por e-
unicamente um debate teórico, mas um debate xemplo, a redução das margens de erro nas medições;
eminentemente prático”. v)a análise e comunicação dos resultados, compa-
rando-os com os obtidos por outros grupos de estudan-
tes e aproximando-se da evolução conceptual e meto-
2. Importância da superação das visões dológica experimentada historicamente pela comuni-
distorcidas da natureza da ciência na educação
dade científica. Isso pode converter-se em ocasião de
científica.
conflito cognitivo entre distintas concepções, tomadas
O trabalho de clarificação realizado mostra a neces- todas elas como hipóteses e favorecer a ‘auto-
sidade de nos afastarmos dos habituais reducionismos regulação’ dos estudantes; vi) as sínteses e a possibi-
e de incluir aspectos que são, não só essenciais para lidade de outras perspectivas: articulação dos conhe-
uma investigação científica, mas que se tornam tam- cimentos construídos com outros já conhecidos, consi-
bém imprescindíveis para favorecer uma aprendiza- derando a sua contribuição para a construção de corpos
gem realmente significativa, não memorizada, das

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I SIMPÓSIO DE PESQUISA EM ENSINO E HISTÓRIA DE CIÊNCIAS DA TERRA
III SIMPÓSIO NACIONAL SOBRE ENSINO DE GEOLOGIA NO BRASIL

coerentes de conhecimentos que se vão ampliando e BYBEE, R. Planet Earth in Crisis: How Should Sci-
modificando, com especial atenção para o estabeleci- ence Educators Respond? The American Biology
mento de pontes entre distintos domínios científicos. Teacher, 53(3), 146-153, 1991.
Devemos ainda insistir na necessidade de di- BYBEE, R. Towards an Understanding of Scientific
rigir todo este tratamento para mostrar o carácter de Literacy. En Graeber, W. e Bolte, C. (Eds) Scientific
corpo coerente que tem toda a ciência, valorizando, Literacy. Kiel: IPN, 1997.
para isso, as actividades de síntese (esquemas, memó- CACHAPUZ, A.; GIL- PÉREZ, D.; PESSOA, A. M.;
rias, revisões, mapas conceptuais…) e a elaboração de PRAIA, J.; VILCHES, A. A necessária renovação
produtos, capazes de acabar com planos demasiado do Ensino das Ciências. Sâo Paulo: Cortez Editores,
escolares, de reforçar o interesse pela tarefa e de mos- 2005.
trar a estreita ligação ciência-tecnologia. CARSON, R. Primavera Silenciosa. Barcelona:
Contudo é conveniente realçar que as orien- Grijalbo, 1980.
tações precedentes não constituem um algoritmo CHALMERS, A. F. Science and its fabrication. Min-
que pretenda orientar passo a passo a actividade dos neapolis, MP: University of Minnesota Press, 1990.
alunos; são indicações genéricas que chamam a aten- COMISIÓN MUNDIAL DEL MEDIO AMBIENTE
ção sobre os aspectos essenciais a ter em conta na Y DEL DESARROLLO. Nuestro Futuro Común.
construção de conhecimentos científicos que, frequen- Madrid: Alianza, 1988.
temente, não são suficientemente tidos em conta na DeBOER, G. E. Scientific literacy: another look at its
educação científica. E estamos a referir-nos tanto aos historical and contemporary meanings and its rela-
aspectos metodológicos como aos aspectos axiológi- tionship to science education reform. Journal of Re-
cos: relações CTSA, tomada de decisões, comunicação search in Science Teaching, 37(6), 582-601, 2000.
de resultados… A aprendizagem das ciências é enca- DECLARACIÓN DE BUDAPEST. Marco general
rada assim como um processo de investigação orienta- de acción de la declaración de Budapest, 1999. Dis-
da que permite aos alunos participar colectivamente ponivel em
na aventura de enfrentar problemas relevantes e http://www.oei.org.co/cts/budapest.dec.htm.
(re)construir os conhecimentos científicos (Hodson, EDWARDS, M.; GIL-PÉREZ, D.; VILCHES, A.;
1992). PRAIA, J.; VALDÉS, P.; VITAL, M. L.; CAÑAL,
P.; DEL CARMEN, L.; RUEDA, C.; TRICÁRICO,
Importa fomentar a alfabetização científica e
H. Una propuesta para la transformación de las per-
tecnológica dos cidadãos através de uma imersão na
cepciones docentes acerca de la situación del mundo.
cultura científica e tecnológica, importante para a for-
Primeros resultados. Didáctica de las Ciencias Ex-
mação de cidadãos críticos que, no futuro, participarão
perimentales y Sociales, 15, 37-67, 2001.
na tomada de decisões… e do mesmo modo para que
FENSHAM, P. J. Time to change Drivers for Scien-
os futuros homens e mulheres de ciência consigam uma
tific Literacy. Canadian Journal of Science,
melhor apropriação dos conhecimento elaborados pela
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comunidade científica.
24, 2002a.
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scientifique. Canadian Journal of Science, Mathe-
matics and Technology Education, 2(2), 133-149,
2002b.
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J.; CACHAPUZ, J.; PRAIA, J. Visiones deformadas
Nada resta senão desejar-lhe boa sorte na preparação de la ciencia transmitidas por la enseñanza. Ense-
de seu artigo. Contamos com seu trabalho e sua pre- ñanza de las Ciencias, 20(3), 477-488, 2002.
sença no I Simpósio de Pesquisa em Ensino e Histó- FERNÁNDEZ, I.; GIL- PÉREZ, D.; VALDÉS, P.;
ria de Ciências da Terra e o III Simpósio Nacional de VILCHES, A. ¿Qué visiones de la ciencia y la activi-
Ensino de Geologia em Campinas de 4 a 8 de setem- dad científica tenemos y transmitimos? En: Gil- Pé-
bro de 2007. rez, D., Macedo, B., Martínez Torregrosa, J., Sifredo,
C., Valdés, P.eVilches, A. (Eds.). ¿Cómo promover
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