Вы находитесь на странице: 1из 246

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

E26 Educação em tempos de Covid-19: desafios e possibilidades, v. 1 /


1.ed. [Org.] Tiago Eurico de Lacerda, Anderson Luiz Tedesco. – 1.ed.
– Curitiba: Bagai, 2020.
Recurso digital.

Formato: PDF
Requisitos do sistema: Adobe digital editions
Modo de acesso: Word wide web
ISBN: 978-65-87204-20-8

1. Educação. 2. Covid-19 – pandemia. 3. Aprendizagem.


I. Lacerda Tiago Eurico de. II. Tedesco, Anderson Luiz. III. Título.

CDD 370
8/2020-08 CDU 37.01

Índice para catálogo sistemático:


1. Educação: aprendizagem
2. Covid-19: pandemia

Bibliotecária responsável: Aline Graziele Benitez CRB-1/3129

https://doi.org/10.37008/978-65-87204-20-8.04.8.20

1.ª Edição - Copyright© 2020 dos autores


Direitos de Edição Reservados à Editora Bagai.

Editor-Chefe Cleber Bianchessi

Revisão Os autores

Projeto Gráfico Giuliano Ferraz

Conselho Editorial Dr. Adilson Tadeu Basquerote - UNIDAVI


Dr. Anderson Luiz Tedesco – UNOCHAPECÓ
Dr. Ademir A Pinhelli Mendes – UNINTER
Dra. Camila Cunico – UFP
Dra. Elisângela Rosemeri Martins – UESC
Dr. Ernane Rosa Martins - IFG
Dr. Helio Rosa Camilo – UFAC
Dra. Larissa Warnavin – UNINTER
Dr. Marciel Lohmann – UEL
Dr. Marcos A. da Silveira – UFPR
Dr. Marcos Pereira dos Santos – UEPG
Dr. Ronaldo Ferreira Maganhotto – UNICENTRO
Dra. Rozane Zaionz - SME/SEED
Dr. Tiago Eurico de Lacerda – UTFPR
Tiago Eurico de Lacerda
Anderson Luiz Tedesco
(Organizadores)

EDUCAÇÃO EM TEMPOS DE COVID-19


desafios e possibilidades

Volume 1
SUMÁRIO

APRESENTAÇÃO - VOLUME I................................................. 9

AÇÕES DISRUPTIVAS E INOVAÇÃO NA ERA DA


PANDEMIA: RELATO DE EXPERIÊNCIA SOBRE O
USJ NO CAMINHO DA (RE)INVENÇÃO DAS
PRÁTICAS EDUCATIVAS.......................................................... 15
Ana Cristina Oliveira da Silva Hoffmann
Renato Brittes
Suzana Raquel Bisognin Zanon

A EMERGÊNCIA DA EDUCAÇÃO E DO CURRÍCULO


NA CULTURA DIGITAL EM TEMPOS DE PANDEMIA
E DISTANCIAMENTO SOCIAL...............................................32
Jayson Magno da Silva

A EDUCAÇÃO EM TEMPOS DE PANDEMIA:


ALTERIDADE E VULNERABILIDADE DAS
COMUNIDADES INDÍGENAS E QUILOMBOLAS
NA BAHIA..................................................................................... 49
Ana Karine Ribeiro Ferreira da Silva
Taylan Santana Santos

(RE)PENSANDO O ENSINO PARA SURDOS


DURANTE O ISOLAMENTO SOCIAL: UMA
PROPOSTA DE ENSINO........................................................... 66
Tayana Dias de Menezes
O OLHAR DA ORIENTAÇÃO EDUCACIONAL NA
FORMAÇÃO INTEGRAL DO ADOLESCENTE EM
TEMPOS DE PANDEMIA: POSSIBILIDADES E
DESAFIOS............................................................................................. 83
Caroline Becker
Clarice Conter
Suzana Diemer

REVISÃO SISTEMÁTICA: EDUCAÇÃO EM TEMPOS


DE COVID-19............................................................................... 98
Andreia de Bem Machado

COVID-19 (CORONAVÍRUS): É PRECISO REPENSAR A


EDUCAÇÃO NO BRASIL DO SÉCULO XXI.........................113
Jonas de Medeiros
Rafael Alberto Gonçalves

ENSINO REMOTO EMERGENCIAL – O DESAFIO


DOCENTE.................................................................................... 127
Mariana Medeiros Trautwein
Marli Afonso Dos Santos

PORTÕES FECHADOS, CANAIS ABERTOS: A


POTENCIALIDADE EDUCATIVA DO NÚCLEO DE
ORIENTAÇÃO PARA A SUSTENTABILIDADE................ 139
Adriano Gonçalves da Silva
Ana Cecília Estêvão

LA FAMILIA EN EL SORPRESIVO ROL EDUCATIVO


FRENTE A LA COVID-19: EL RETO..................................... 156
Yoisell López Bestard
Juan Eligio López García
María Caridad Bestard González
A IMPORTÂNCIA DA INTELIGÊNCIA EMOCIONAL
EM TEMPOS DE COVID-19: A (TRANS)FORMAÇÃO
DA RELAÇÃO PROFESSOR/ALUNO...................................170
Eloiza da Silva Gomes de Oliveira
Silvia Helena Mousinho

CARTOGRAFIA DA LITERACIA DOS ESTUDANTES


DA UNIVERSIDADE PÚNGUÈ EM TEMPOS DE
COVID-19.....................................................................................190
Juma Manuel
Álvaro Zacarias

AULAS REMOTAS: OS DESAFIOS DOS PROFESSORES


E DAS ESCOLAS PÚBLICAS DE CIDADES DO
INTERIOR DO PAÍS................................................................ 200
Máximo Luiz Veríssimo de Melo
Aldenize Santana de Souza Melo
Tiago Santana de Souza

COVID-19 E A FRAGILIDADE DA VIDA E DO


PLANETA............................................................................................. 214
Anderson Luiz Tedesco
Tiago Eurico de Lacerda
Leonel Piovezana

OS DESAFIOS E POSSIBILIDADES DA EDUCAÇÃO


EM TEMPOS DE PANDEMIA............................................... 230
Miriam Paulo da Silva Oliveira
Rosilene Pedro da Silva
Giselle Beatriz da Silva

SOBRE OS ORGANIZADORES..................................................243
APRESENTAÇÃO - VOLUME I

A educação mundial e, especificamente a brasileira,


caminhavam por grandes desafios no que se refere às meto-
dologias educacionais e também sobre a inclusão dos menos
favorecidos. Mas ninguém contava que em pouco tempo have-
ria um grande impacto que modificaria de uma vez por todas a
forma de se pensar a educação, ou seja, a Covid-19 nos trouxe
novos desafios que estávamos protelando sua resolução e que
ao mesmo tempo abriu um leque de novas possibilidades para
se pensar a educação na contemporaneidade. Se não bastasse
as dificuldades enfrentadas em sala de aula presencial, agora as
famílias e alunos em geral precisaram se adaptar a uma nova
metodologia com aulas a distância ou remotas. As tecnologias
que anteriormente eram “mal” vistas dentro do ambiente
escolar por alguns professores, pois dispersavam os alunos,
agora é a forma que a maioria utiliza para se comunicar, ou
seja, as relações educacionais mudaram radicalmente e todos,
sem exceção, também precisaram se atualizar.
Esta nova visão sobre a educação em tempos de Covid-19
é o ponto de encontro de vários autores que neste livro apre-
sentam em seus respectivos capítulos algumas propostas aos
desafios que encontramos. Este livro é de extrema importância
a todos os educadores que de uma maneira abrupta tiveram
que repensar as suas práticas pedagógicas e que agora vis-
lumbram todas as novas possibilidades de desenvolver seu
trabalho de uma maneira diferente ou simplesmente apri-
morando o trabalho que já vinham desenvolvendo.
Assim, iniciamos este volume com o capítulo Ações dis-
ruptivas e inovação na era da pandemia: relato de experiência sobre o USJ
no caminho da (re)invenção das práticas educativas, onde os autores
Ana Cristina Oliveira da Silva Hoffmann, Renato Brittes e
Suzana Raquel Bisognin Zanon debatem sobre os desafios da

9
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

universidade diante da pandemia como uma oportunidade de


se (re)inventar para que a vida acadêmica continuasse de pé e
com uma produção efetiva diante da atual crise. Na sequência
o autor Jayson Magno da Silva em seu capítulo A emergência
da educação e do currículo na cultura digital em tempos de pandemia
e distanciamento social, faz uma abordagem qualitativa sobre as
mudanças que a escola e o currículo sofreram nesse tempo de
pandemia e discute sobretudo a necessidade de tratarmos da
emergência da cultura digital, sem a qual não podemos mais
fazer uma educação na atual conjuntura.
E a atual conjuntura deve abarcar a todos, por isso pre-
cisamos lembrar também das comunidades indígenas. E é
nessa perspectiva que os autores Ana Karine Ribeiro Ferreira
da Silva e Taylan Santana Santos apresentam em seu capítulo
A educação em tempos de pandemia: alteridade e vulnerabilidade das
comunidades indígenas e quilombolas na Bahia, o resultado de um
projeto integrador com estudantes do 1° ano do Ensino Médio,
de uma forma interdisciplinar para levar aos estudantes
uma reflexão de uma atuação consciente e autônoma dentro
da sociedade. E para que a nossa prática pedagógica não se
torne vazia, ou um verbalismo como menciona as reflexões
de Freire é que a autora Tayana Dias de Menezes em seu capí-
tulo (Re)pensando o ensino para surdos durante o isolamento social:
uma proposta de ensino, aborda a necessidade de propor aulas,
especificamente de língua portuguesa para as pessoas surdas
utilizando as novas tecnologias para discutir as melhores
estratégias didáticas na atualidade em favor de todos.
Essas melhores estratégias devem começar na própria
formação docente para que o aluno tenha condições de ter uma
boa formação também diante de tantas vicissitudes, assim,
no capítulo O olhar da orientação educacional na formação integral
do adolescente em tempos de pandemia: possibilidades e desafios, as
autoras Caroline Becker, Clarice Conter e Suzana Diemer
propõem uma reflexão para que a educação promova um

10
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

desenvolvimento de diferentes competências, sejam elas aca-


dêmicas, tecnológicas, políticas e ético-estéticas. Na sequência
a autora Andreia de Bem Machado em seu capítulo Revisão
sistemática: educação em tempos de Covid-19, traz a reflexão das
mudanças ocorridas na sociedade após a Covid-19, tanto do
espaço de aprender, quanto da forma.
Pensar toda essas mudanças educacionais no Brasil
também é o escopo do capítulo Covid-19 (CORONAVÍRUS):
É Preciso Repensar a Educação no Brasil do Século XXI, onde os
autores Jonas de Medeiros e Rafael Alberto Gonçalves fazem
uma leitura política e social da crise em que vivemos e de
como poderemos superá-la pensando o papel da educação
ou de uma nova educação. Essa nova educação também é
apresentada no capítulo Ensino remoto emergencial – o desafio
docente, onde as autoras Mariana Medeiros Trautwein e Marli
Afonso Dos Santos apresentam as distinções do estudo remoto
versus educação a distância e os desafios encontrados pela
comunidade acadêmica para dar conta de tais novidades.
Mas foram tais novidades que impulsionaram muitos
educadores a criarem estratégias novas, no capítulo Portões
fechados, canais abertos: a potencialidade educativa do núcleo de orien-
tação para a sustentabilidade, os autores Adriano Gonçalves da
Silva e Ana Cecília Estêvão apresentam como esta crise foi ao
mesmo tempo oportunidade de se pensar nas novas demandas
e como reformular as estratégias educacionais para se encai-
xarem dentro das novas tecnologias. Esse problema de uma
maneira geral teve impactos diretos dentro das diversas famí-
lias e sobre esse assunto, no capítulo La familia en el sorpresivo
rol educativo frente a la Covid-19: el reto, os autores Yoisell López
Bestard, Juan Eligio López García e María Caridad Bestard
González apresentam uma reflexão que nasce dentro dos
lares, da preocupação em acompanhar os estudos dos filhos
e muitas vezes, são famílias sem uma preparação para isso,
o que fortalece a crise.

11
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

No capítulo A importância da inteligência emocional em


tempos de Covid-19: a (trans)formação da relação professor/aluno,
as autoras Eloiza da Silva Gomes de Oliveira e Silvia Helena
Mousinho apresentam uma reflexão crítica para que desde a
formação acadêmica de um professor ele se posicione tanto
político, quanto socialmente como um agente transformador
responsável por preparar cidadãos conscientes. Neste empasse
de transformação através da educação os autores Juma Manuel
e Álvaro Zacarias apresentam em seu capítulo Cartografia da
literacia dos estudantes da universidade Púnguè em tempos de Covid-
19, uma reflexão sobre a importância da literacia e de como
a leitura pode desempenhar um papel importante na vida,
levando em consideração todas as mudanças para o processo
de crescimento de cada indivíduo. O artigo ainda aborda as
implicações da Covid-19 no processo de desinteresse pela
leitura e as implicações que isso poderá ter na vida acadêmica.
Os autores Máximo Luiz Veríssimo de Melo, Aldenize
Santana de Souza Melo e Tiago Santana de Souza apresen-
tam em seu capítulo Aulas remotas: os desafios dos professores e
das escolas públicas de cidades do interior do país, uma reflexão
sobre as desigualdades econômicas presentes no país e como
elas influenciam diretamente na educação daqueles que não
possuem o mínimo para acompanharem as aulas remotas
ou on-line.
No capítulo Covid-19 e a fragilidade da vida e do planeta,
os autores Anderson Luiz Tedesco, Tiago Eurico de Lacerda
e Leonel Piovezana apresentam as preocupações políticas e
sociais das influências dessa pandemia como contadores de
histórias inspirados em duas narrativas do filósofo Walter
Benjamin. E em suas considerações inconclusivas deixam a
mensagem de que o reconhecimento do outro é fundamental
para construirmos uma sociedade melhor e que o capitalismo
com suas estratégias torna o ser humano, principalmente em
tempos de pandemia um animale diabolicus.

12
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

E por fim, no capítulo Os desafios e possibilidades da edu-


cação em tempos de pandemia, os autores Mirian Paulo da Silva
Oliveira, Rosilene Pedro da Silva e Giselle Beatriz da Silva,
fazem uma análise dos impactos da pandemia na educação
e ressaltam que este inimigo invisível conseguiu desestabi-
lizar toda a sociedade fazendo que procuremos novos meios,
métodos para dar a volta por cima tanto emocionalmente,
quanto economicamente.
Caro leitor(a), esta obra é um convite para renovarmos
as esperanças na educação, que se apresenta em uma pers-
pectiva diferente em um novo tempo. Cada um de nós somos
convidados(as) a sermos protagonistas nessa ressignificação
da maneira de ensinar e de aprender para reafirmarmos que
esse momento se traduz em lições educativas como uma fonte
emulativa para liberar o potencial criativo dos seres humanos.
São os votos dos organizadores, Anderson e Tiago.

13
AÇÕES DISRUPTIVAS E INOVAÇÃO
NA ERA DA PANDEMIA: RELATO DE
EXPERIÊNCIA SOBRE O USJ NO CAMINHO
DA (RE)INVENÇÃO DAS PRÁTICAS
EDUCATIVAS

Ana Cristina Oliveira da Silva Hoffmann1


Renato Brittes2
Suzana Raquel Bisognin Zanon3

INTRODUÇÃO

O ano de 2020 é marcado pela pandemia da Covid-19.


Vários cenários foram impactados pelo fenômeno, dentre
eles, o econômico, político e, principalmente, o da educação.
A necessidade do isolamento social obrigou as escolas e uni-
versidades a fecharem as portas, oxigenando um universo
de desafios e oportunidades para a re(invenção) de práticas
educativas. O ensino remoto, isto é, aquele em que se utilizam
plataformas digitais para que alunos e professores possam
interagir nos horários de aula, é a dinâmica que mais vem
sendo empregada para que o semestre letivo possa ter conti-
nuidade, mesmo que a distância. Neste sentido, considerados,
neste trabalho, recursos que fomentam a disrupção, como
Superintendente da Fundação Educacional de São José (FUNDESJ). E-mail: ana.
1 

hoffmann@reitoria.usj.edu.br
2 
Reitor do Centro Universitário Municipal de São José (USJ). E-mail: renato.brittes@
prof.usj.edu.br
3 
Professora do Centro Universitário Municipal de São José (USJ). E-mail: suzana.zanon@
prof.usj.edu.br

15
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

o G Suite for Education passaram a ser mais utilizados para a


organização de reuniões, gravação de videoaulas e chat para
a interação em tempo real.
Comentando o assunto, Filatro e Cairo (2015) salientam
que o poder da tecnologia on-line está na sua capacidade de
veicular todas as formas de mídia, e desafio é decidir qual é a
melhor mídia ou combinação de mídias para um programa,
um curso ou uma unidade de estudo, e qual é a tecnologia
mais apropriada para veiculá-la.
Questionado sobre os rastros a serem deixados pelo
coronavírus, Castells (2020, n/p) alerta que um das marcas
será exatamente “A capacidade de liberar o potencial de
ensino virtual, que estava injustamente menosprezada, e a
exigência de uma digitalização mais avançada do conjunto
do sistema universitário.” As metodologias ativas, por sua
vez, se apresentam como engrenagens deste processo a
fim de despertarem no aluno o desenvolvimento de com-
petências necessárias ao enfrentamento do mercado, e a
tecnologia da informação se posiciona como fator deter-
minante à inovação.
Seguindo todas as orientações da OMS (Organização
Mundial de Saúde) e demais órgãos de Saúde Federais, Esta-
duais e Municipais, o Centro Universitário Municipal de
São José (USJ) iniciou suas atividades remotas no dia 18 de
março deste mesmo ano a fim manter as atividades do semes-
tre, preservando a qualidade de ensino e a saúde de toda a
população josefense. Neste sentido, este capítulo se propõe
a relatar as ações disruptivas tomadas desde este período em
prol da inovação e investimento na qualidade de práticas de
ensino-aprendizagem.

16
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

CONHECENDO O CENTRO UNIVERSITÁRIO


MUNICIPAL DE SÃO JOSÉ (USJ)

O Centro Universitário Municipal de São José (USJ) foi


criado pela Lei Ordinária 4279/2005 de 15 de maio de 2005.
Primeira instituição de ensino superior público e gratuito
do Brasil, oferta os seguintes cursos de graduação: Adminis-
tração, Ciências Contábeis, Pedagogia e Tecnólogo Superior
em Análise e Desenvolvimento de Sistemas. Desde 2018, a
instituição conta com o curso de Pós-graduação em Didática
e Metodologias para a Educação Básica, cuja finalidade é qua-
lificar profissionais da educação para que adquiram novos
conhecimentos para lidar com as tendências da educação,
das tecnologias e metodologias ativas que se se fortalecem a
cada ano neste cenário.
O USJ é mantido pela Fundação Municipal de São José
(FUNDESJ), órgão que pertence à administração indireta da
Prefeitura Municipal de São José. A fundação é representada,
desde 2013, pela Superintendente, Profª Ana Cristina da Silva
Hoffmann. Desde fevereiro de 2018, o USJ tem como Reitor
Prof. Renato Brittes e Profª Janine Pacheco da Luz, como
Vice-Reitora Acadêmica.
As aulas são presenciais e ocorrem no período noturno
nas dependências do Colégio Maria Luiza de Melo (Colé-
gio Melão). O USJ tem como princípio ofertar atividades de
pesquisa e de extensão universitária a fim de contribuir ao
desenvolvimento econômico, social e sustentável da região.
A instituição também tem como finalidade valorizar a edu-
cação oferecida pelas escolas públicas do município de São
José. Neste sentido, a comunidade conta com um sistema de
cotas, isto é, 70% das vagas em cada vestibular (de verão e de
inverno) são destinadas a alunos que estudaram em escolas
estaduais, federais e do próprio município.

17
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

A PANDEMIA E SEUS EFEITOS: EDUCAÇÃO,


INOVAÇÃO E MOVIMENTO DISRUPTIVO

De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS)


(apud SCHUELER, 2020, n/p), uma pandemia é “[...] a disse-
minação mundial de uma nova doença e o termo passa a ser
usado quando uma epidemia, surto que afeta uma região, se
espalha por diferentes continentes com transmissão sus-
tentada de pessoa para pessoa.” Com o surto do coronavírus
(Covid-19), foi necessário que todos os países começassem a
tomar medidas emergenciais para evitar a elevação do con-
tágio, dentre elas o isolamento/confinamento social a fim
de se evitarem aglomerações. Estabelecimentos comerciais
fechados e aulas suspensas ilustraram, neste ano de 2020,
um cenário em que a prevenção foi a política de saúde pública
mais enérgica tomada até o momento para evitar o colapso
do sistema de saúde público e/ou particular.
De aulas presenciais a remotas, a educação precisou se
reinventar e, neste sentido, impactos no cenário se evidenciam
a cada dia. Muito embora estudiosos como Antonio Cabrales,
da University College de Londres, considere que o “[...] ensino
virtual pode ser até melhor que o presencial. O problema é
que dispor do curso gravado leva a que confiemos que “em
breve veremos a aula”. (SANZ; GONZÁLEZ; CAPILLA, 2020,
p. 09). Tal concepção enaltece a dificuldade de acesso das aulas
por alunos que sequer dispõem de ferramentas tecnológicas
básicas para acesso ao materiais e às aulas remotas. Na medida
em que o ensino on-line oportuniza novos meios de acesso ao
conhecimento, acaba acentuando as desigualdades sociais.
Frente a um século em que o prenúncio da era da tec-
nologia e do conhecimento ganham fôlego, a pandemia da
Covid-19 desordenou práticas habituais de ensino e acelerou
a prática de ações que pudessem (re)organizar um cenário
tecnológico ainda paralisado. Neste sentido, atrair os alunos

18
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

a participarem de aulas remotas é outro desafio que se coloca


nesta fase, primeiro, porque os professores não estão habi-
tuados a lidar com a emergência da cibercultura, conceituada
por Pierre Lévy (2007) como novas técnicas, sejam elas mate-
riais ou intelectuais, de novos formatos de práticas e valores
que se coadunam ao ciberespaço. Por outro lado, os alunos
precisam se sentir atraídos por aulas que se apresentam em
novas configurações. O data-show e a lousa, empregados em
aulas presenciais, foram substituídos por plataformas digitais
como G Suite for Education, Classroom, Instagram, Facebook,
Whatsapp e Youtube. As famosas Lives e Webconferências con-
quistam, de vez, o seu lugar como suporte ao ensino remoto.
De acordo com Couto, Couto e Cruz (2020, p. 209), “As lives
de professores reforçam a condição de que as nossas casas
conectadas são espaços de ensino e aprendizagem”. É perti-
nente elucidar que, com o novo modelo de aprendizagem, “[...]
professores e alunos matriculados em cursos antes presenciais,
migraram para atividades educacionais em rede. Conectados,
profissionais da educação produzem e distribuem conteúdos,
acompanham, orientam, avaliam e estimulam seus alunos.”
(COUTO; COUTO; CRUZ, 2020, p. 209),
Os efeitos na educação não se sobressaem apenas no
uso de novas tecnologias digitais, mas também na saúde de
muitos professores e alunos. A respeito do assunto, Araujo
et al. (2020 apud SILVA; ESTRELA; LIMA; ABREU, 2020, p.
3) expõem que “[...] pesquisas internacionais já revelam o
adoecimento docente expresso pelas incertezas, estresses,
ansiedade e depressão, levando à síndrome do esgotamento
profissional.” O acompanhamento das instituições de ensino
frente a estes casos se tornou uma ação constante e funda-
mental para as ações de ensino-aprendizagem de qualidade,
que valorizem, sobretudo, o ser humano como agente das
transformações na educação.

19
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

A era das lives, Webinars e das metodologias ativas, por


exemplo, acentuam uma era de inovação tecnológica nunca
antes vivenciada. É possível afirmar que foi a pandemia da
Covid-19 que potencializou tais fenômenos, principalmente
no contexto de ações pedagógicas. Muito embora se fale no
fenômeno da inovação, pouco se sabe acerca de seu conceito.
Sobre isso, Crainer e Daerlove (2014, p. 02) afirmam: “Inovação
é encontrar novas formas de mudar as coisas. Uma definição
bastante útil de inovação é “a criação de um novo valor”.” Neste
sentido, a inovação se revela como uma necessidade básica
de todo e qualquer tipo de organização. A respeito do ensino
superior, por exemplo, Marmolejo (2020, n/p) comenta que
estas instituições “[...] são o melhor laboratório social para
mudanças, mas ao mesmo tempo são profundamente con-
servadoras em seu comportamento, muitas vezes por uma
questão de prestígio e tradição.”
Aliada a esta conjuntura, a educação se encontra em
constante movimento, marcado pela disrupção. Neste sentido,
a educação, nas palavras de Garcia (2020, p. 116), “[...] não
deve contemplar qualquer tipo de restrição.” Tal concepção
evidencia a pluralidade de dinâmicas permitidas no atual
contexto pedagógico a fim de ampliar a qualidade de ensino-
-aprendizagem. Para tanto, “As tecnologias disruptivas são
aquelas que destroem o valor de uma tecnologia existente e
criam novos mercados.” (HITT; IRELAND; HOSKKISSON ,
2008, p. 35).
Tendo como premissa o movimento disruptivo como
aquele que fomenta a acessibilidade de produtos e/ou servi-
ços às pessoas que antes de uma mudança eram desprovidas
deste acesso, é pertinente citar o Google Classroom (também
conhecido como Google Sala de Aula, uma computação ubíqua)
como exemplo de uma ferramenta disruptiva. Tal plataforma
proporciona a interação entre professor e aluno de forma
diferenciada, de forma a promover um novo formato de sala

20
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

de aula por meio da colaboração instantânea. Segundo Witt


(2015 apud SCHIEHL; GASPARINI, 2016), o Google Classroom
é acessado a partir do G Suite for Education4, um aplicativo com
ferramentas destinadas a despertar a criatividade e intera-
ção para o desenvolvimento de habilidades de comunicação,
colaboração e pensamento crítico. Segundo o mesmo autor, o
acesso a esta tecnologia educacional propicia ao aluno mais
segurança para lidar com novas ferramentas digitais para
uma aprendizagem significativa. Schiehl e Gasparini (2016,
p. 5. Grifo dos autores) citam os benefícios trazidos pele Clas-
sroom, ao ressaltarem que os alunos se conectam com o “[...]
professor de forma síncrona (Hangout) ou assíncrona (Gmail),
o que possibilita um estreitamento na comunicação de pro-
fessor e estudante, não permitindo que as dúvidas se tornem
possibilidades de desmotivação.”
É pertinente enfatizar que foi a partir dos conceitos de
inovação disruptivas, de Clayton Christensen, que nasceram
as concepções acerca da disrupção na educação. A teoria (de
1997) do professor americano “[...] é suficiente para funda-
mentar a construção do conceito de educação disruptiva,
principalmente no que diz respeito a acessar novos mercados
e a focar nas futuras necessidades do aluno.” (SECURATO,
2017, p. 310). Ao fazer referência ao âmbito empreendedor,
Christensen afirmava que a inovação disruptiva dar-se-ia no
momento em que se pudesse mudar alguma coisa sem deixar
de exigir esforços do outro, como afirma Securato (2017). Com
base nestas considerações, afirma-se que embora a educação
passe a se reinventar, adquirindo novos moldes, a criação/
mediação de ações pedagógicas em todas as modalidades
de ensino não poderão se render a fragilidades e a possíveis
facilidades proporcionadas pelas tecnologias da informação,

4 
A plataforma G Suite for education oferece ferramentas como Gmail, Google Sala de Aula,
Google Drive, Google Agenda e Google Hangouts.

21
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

mas, sobretudo, usá-las como suporte ao alcance da excelência


do ensino-aprendizagem.
Portanto, contemplando a necessidade de públicos
mais exigentes, a inovação disruptiva na educação passará
a materializar um novo conceito de qualidade, que “[...] gira
em torno de um benefício, como acessibilidade, conveniência,
viabilidade ou simplicidade” (HORN; CLAYTON; CHRIS-
TENSEN, 2015, p. 5), com recursos rápidos, de baixo custo e/
ou gratuitos para o ensino on-line.

ENSINO REMOTO E METODOLOGIAS ATIVAS

Dizia Securato (2018, n/p) que “A educação do futuro


deve ajudar o aluno a resolver problemas na sua vida prá-
tica, seja na empresa, na startup ou na criação de um novo
negócio.” As palavras do autor enaltecem um novo conceito
de ensino-aprendizagem que norteia o campo de ações peda-
gógicas atuais, principalmente no ensino superior, isto é, as
metodologias ativas.
Morán (2015, p. 19) explica que “Nas metodologias ativas
de aprendizagem, o aprendizado se dá a partir de problemas
e situações reais; os mesmos que os alunos vivenciarão depois
na vida profissional, de forma antecipada, durante o curso.”
Neste sentido, o emprego de novos métodos de ensinar se
faz fundamental no século XXI, uma vez que a configuração
tradicional de educação não se sustenta mais quando ignora
que se vive na sociedade do conhecimento, da informação e
da aprendizagem, como alertavam Coutinho e Lisbôa (2011).
A respeito da sociedade do conhecimento e da revolução
tecnológica neste século, Castells (2003) reconheceu que a
aplicação do conhecimento e informação a novas formas de
construção de conhecimento seriam o caráter central deste
conhecimento. Além disso, o teórico evidenciava o poder da
inovação e da tecnologia como fenômenos a serem redefini-

22
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

dos e desenvolvidos pelas pessoas, cuja mente seria a própria


força produtiva direta de uma nova era.
Com o advento da pandemia da Covid-19, as instituições
precisaram optar pela adoção de ensino remoto ou EAD. Tais
modalidades possuem desdobramentos diferentes, ou seja,
a “[...] educação a distância pressupõe o apoio de tutores de
forma atemporal, carga horária diluída em diferentes recur-
sos midiáticos e atividades síncronas e assíncronas.” (COSTA,
2020, n/p). Por outo lado, a atividade remota consiste na “[...]
realização de uma atividade pedagógica de forma temporária
e utilizada pontualmente, com o uso da internet.” (DAROS,
2020, n/p).
Haja vista a necessidade de as instituições de ensino
superior darem continuidade ao semestre, as aulas em formato
remoto estão sendo bastante empregadas. Primeiro, porque
é possível utilizar plataformas de tecnologias educacionais
gratuitas e eficazes, como é o caso do G Suite for Education.
Segundo, porque as aulas devem ocorrer em horário prees-
tabelecido, obedecendo aos horários das aulas habituais.
Outro aspecto importante a se destacar é que para o ensino
EAD é necessário um elevado investimento financeiro para
empregar diferentes plataformas de ensino com mediação
do professor em outros momentos do dia.
Sob esta ótica, vale destacar que os professores ainda
não estão preparados para lidar com ferramentas digitais e
gravação de lives e videoaulas. Por mais que seja um desafio, é
necessário priorizar o uso de metodologias ativas que envol-
vam o aluno nas atividades propostas pelos professores. A
respeito do assunto, Grisa (2020, n/p) salienta a importância
da criatividade e força de vontade do professor para se rein-
ventar e criar novas dinâmicas de aprendizagem. Segundo
o Doutor em Educação “Com a facilidade do acesso, podemos
propor atividades que não sejam monótonas, atividades que vão

23
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

além das aulas online, como metodologias ativas e resolução de


projetos e problemas.” (GRISA, 2020, n/p).
Com base nos conceitos expostos, é possível afirmar que
o ensino remoto, adotado atualmente no USJ por conta da pan-
demia, exerce uma função primordial: oportunizar a todo o
corpo docente novas experiências e motivação para criar, inovar
e romper paradigmas que vão de encontro ao que propõem as
metodologias ativas. É sob este ponto de vista, que serão relatadas,
na sequência, as ações disruptivas empregadas pela instituição,
que garantiram a continuidade do ensino público, gratuito e de
qualidade à comunidade de São José.

USJ: AÇÕES DISRUPTIVAS E INOVAÇÃO NA


ERA DA PANDEMIA

O semestre 2020-1 do USJ foi iniciado com aulas pre-


senciais, que se estenderam até o dia 17 de março do cor-
rente ano. A partir desta data, passou-se a utilizar o ensino
remoto em todos os encontros, que contaram com momen-
tos síncronos (interação entre professor e aluno em tempo
real) e assíncronos (sem interação entre professor e aluno). É
importante evidenciar que a instituição continuou a fornecer
apoio e orientações constantes a alunos e professores desde
o início das aulas remotas, seguindo os protocolos Jurídico,
Pedagógico e de Saúde.
Para o início das aulas remotas, priorizou-se o uso da
Plataforma G Suite for Education e as ferramentas do Classroom,
dando continuidade a um projeto de ensino com tecnologias
digitais que já passava a se materializar em dezembro de
2019. Salienta-se que neste mês os professores receberam
treinamento, ministrado por um professor do USJ para lidar
com as ferramentas proporcionadas pelo G Suite for Education.
A utilização do G Suite se destaca como o mecanismo prin-
cipal/oficial empregado para as aulas remotas, muito embora

24
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

os professores tenham a liberdade de gravar as videoaulas no


YouTube e Zoom, por exemplo, e deixá-las disponíveis no Classroom.
Ao eleger a plataforma em questão, o USJ abriu portas a uma
nova concepção de ensino-aprendizagem, pautada na interação
e colaboração sem perder a qualidade de ensino. Observa-se o
rompimento do paradigma tradicional de ensino, no momento
em que a instituição propõe e abraça ações disruptivas, priori-
zando o uso de novas ferramentas de tecnologia da informação.
Frente ao cenário de confinamento social e a necessidade
de proteger a população acadêmica, muitas foram as ações
disruptivas e eventos realizados a fim de manter as aulas e dar
continuidade às ações de inovação e investimento em suporte
aos professores para trabalharem com metodologias ativas.
Destaca-se, primeiramente, a promoção da “Capacitação
Docente com Mentoria On-line”, ofertada gratuitamente a todos
os professores do USJ. O curso foi ministrado (via programa
Telegram) por 3 mentoras especialistas em metodologias ativas
de aprendizagem e recursos on-line para aulas virtuais. Com a
finalidade de instrumentalizar os docentes com novas ferra-
mentas digitais gratuitas e inovadoras, a FUNDESJ, juntamente
a Reitoria do USJ, oportunizaram momentos de troca de expe-
riências e aprendizagens para levar à sala de aula virtual uma
nova abordagem de ensino para despertar o interesse do aluno
pelas aulas e motivá-los. Com a duração de 7 dias, as atividades
foram voltadas aos seguintes eixos: Aprendizagem na ubiqui-
dade; Gravação de vídeos e recursos para compartilhamento de
tela (Google apresentações); Interatividade assíncrona (Padlet,
Jambord, Socrative, Forms, Flippity); Metodologia Webquest e Goo-
gle Site; Aula síncrona: participações e interações (Mentimiter,
fóruns e chats, timeline do Google Classroom, Kahoot; Faça como eu
faço: experiências no mundo on-line (PBL e Think Paire Share); e
Micro e Macroconteúdos.
Muitos foram os aspectos positivos destacados ao longo
da capacitação. Após a instrumentalização para uso da ferra-

25
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

menta Padlet (plataforma que cria um quadro/mural virtual


para interagir e partilhar conteúdo com os alunos), alguns
relatos foram feitos pelos professores após o teste durante a
aula remota. Um dos professores da disciplina “Engenharia
de Requisitos” relatou a sua experiência, dizendo: Na aula de
hoje, utilizei o Jamboard para mostrar aos alunos de Engenharia de
Requisitos que não precisamos ferramentas sofisticadas para elaborar
um protótipo de baixo nível de um sistema. Desenhei na hora um pro-
tótipo de uma tela para realizar os cadastros dos produtos de uma loja.
As webconferências foram dinâmicas contínuas da ins-
tituição ao longo do semestre. Com a participação da comu-
nidade acadêmica e convidados de outras instituições, estes
eventos se configuraram como práticas disruptivas no intuito
de fomentar, de uma nova forma, a interação e a socialização
de conhecimentos pertinentes e atuais.

Figura 1 – Pitch Final do “Escritório de Inovação do USJ”

Fonte: Projeto de extensão “Escritório de Inovação” (2020).

Foram promovidos também os “Meetups Mesa Redonda”,


conferências organizadas pelo projeto de extensão “Escritório

26
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

de Inovação do USJ”. As lives contavam com a participação de


profissionais externos do USJ com especialidades em áreas dis-
tintas, como Direito, Administração e Tecnologias, por exemplo.
Qualquer pessoa poderia assistir ao evento (divulgado na página
da instituição e Facebook), desde que realizasse sua inscrição
(gratuita) pela plataforma on-line de eventos, a Sympla.
De apresentação presencial, com a participação e pro-
fessores nas bancas, os Trabalhos de Conclusão de Curso
também seguiram um novo protocolo, ou seja, dois professores
avaliaram a pesquisa para dar o resultado via G Meet. As for-
maturas também passaram a adotar uma nova configuração
por conta da pandemia, isto é, aconteceram na modalidade
on-line, via Google Meet do G Suite for Education.
Observa-se o início de um novo ciclo no USJ, marcado pelo
fenômeno da transição de práticas educativas configuradas para
um novo cenário que passa a exigir, cada vez mais, a multiplici-
dade de ações mais assertivas para que todos possam ter acesso
à educação e ao conhecimento. Dessa forma, o destaca-se “[...]
mais importante não é apenas ter acesso à informação, ou possuir
um conjunto dado de habilidades, mas fundamentalmente ter
capacidade para adquirir novas habilidades e conhecimentos
(learning-to-learning)” (LEMOS, 2000, p. 168).
As aulas remotas exigiram o uso de metodologias ativas
e o emprego de várias mídias disponíveis para a mediação do
conhecimento. Os alunos passaram a frequentar um novo
universo, a partir da apresentação de trabalhos por Web-
conferências, dinâmica que permitiu uma preparação a mais
para o enfrentamento do mercado de trabalho, marcado,
atualmente, pelos serviços em home-office.
Portanto, neste cenário de rupturas de paradigmas em
diversos âmbitos da sociedade, a inovação no USJ se sustentou
nestas práticas disruptivas para atender a novas deman-
das que continuarão a se revelar neste ano de pandemia e
pós-pandemia.

27
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

CONCLUSÕES

Muitas foram as ações disruptivas realizadas pelo USJ


desde o início do isolamento social e das aulas remotas. No
entanto, este espaço não permite que se ampliem as discussões
em razão do limite de conteúdo.
Os desafios enfrentados pela equipe da Reitoria e FUN-
DESJ se configuram como uma experiência que beneficiou a
continuidade de um projeto da gestão atual, fundamentado nos
princípios de inovação, empreendedorismo e novas dinâmicas
de ensino-aprendizagem para o ensino superior, a exemplo
das metodologias ativas.
Romper, de maneira abrupta, com a tradição do ensino
presencial foi uma tarefa árdua, tendo em vista as limitações
tecnológicas que se revelaram ao longo do período como falta
de acessibilidade à internet e equipamentos para acessar as
aulas remotas, isto é, muitos alunos da instituição não dis-
punham de meios para acompanhamento das atividades. No
entanto, com o apoio e acompanhamento constante da equipe
de gestão estas lacunas foram sanadas até o fim do semestre.
Os treinamentos para o uso de metodologias ativas em
sala de aula virtual demonstraram que ainda há resistência
para a adoção de novas práticas, mas sobretudo, força de
vontade do corpo docente para aprender e se reinventar como
profissional da educação.
O G Suite, por sua vez, se tornou o grande aliado da insti-
tuição ao longo do semestre para o bom andamento das aulas.
Durante este período, dificuldades de professores e alunos
quanto ao uso da ferramenta foram reduzidos, tendo em vista
o acompanhamento da equipe de Tecnologia da Informação,
que não mediu esforços para que as aulas ocorressem de forma
tranquila e de acordo com o que se esperava.

28
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

O USJ demonstra que se renova a cada dia, e a pandemia


enalteceu os esforços da gestão em ofertar um ensino público,
gratuito e de qualidade a toda a comunidade josefense e região,
acompanhando as tendências da tecnologia e inovação no
mercado e no ensino superior. Portanto, a pandemia da Covid-
19 talvez tenha despertado um movimento revolucionário no
mundo da educação que se volta ao viés digital, empreendedor,
interativo e compartilhado.

REFERÊNCIAS

CASTELLS, M. A galáxia da Internet: reflexões sobre a Internet,


os negócios e a sociedade. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2003.

CRAINER, Stuart, DAERLOVE, Des. Inovação: como levar sua


empresa para o próximo nível. Porto Alegre: Bookman, 2014.

DAROS, Thuini. Covid-19 impulsiona uso de metodologias ativas


no ensino a distância. Desafios da educação. 2018. Disponível em:
https://desafiosdaeducacao.grupoa.com.br/coronavirus-metodolo-
gias-ativas/. Acesso em: 09 de jul. 2020.

FILATRO, Andrea; CAIRO, Sabrina. Produção de conteúdos edu-


cacionais. São Paulo: Saraiva, 2015.

FIOCRUZ. Fundação Oswaldo Cruz. O que é uma pandemia.


2020. Disponível em: https://www.bio.fiocruz.br/index.php/br/
noticias/1763-o-que-e-uma-pandemia. Acesso em: 10 de julh. 2020.

GRISA, Gregório. Não há possibilidade de comparar o recurso


remoto com a atividade presencial”, diz professor sobre aulas a dis-
tância. Gaúcha ZH. 2020. Disponível em: https://gauchazh.clicrbs.
com.br/educacao-e-emprego/noticia/2020/04/nao-ha-possibilida-
de-de-comparar-o-recurso-remoto-com-a-atividade-presencial-di-
z-professor-sobre-aulas-a-distancia-ck98x697r00lm017ni7xqi5jt.
html. Acesso em: 10 de jun. 2020.

HITT, Michael A., IRELAND, R. Duane, HOSKKISSON, Robert E.

29
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

Administração estratégica: competitividade e globalização. 2. ed.


São Paulo: Thompson Learning, 2008.

MARMOLEJO, Francisco. Universidades precisam se reinventar e


buscar inovações disruptivas. Ensino Superior. Disponível em:
https://revistaensinosuperior.com.br/inovacoes-disruptivas-ies/.
Acesso em: 10 de jun. 2020.

MORÁN, José. Mudando a educação com metodologias ativas.


2015. Disponível em: http://www2.eca.usp.br/moran/wp-content/
uploads/2013/12/mudando_moran.pdf. Acesso em: 10 de jun. 2020.

LA CRUZ, Fernanda. Entrevista: José Cláudio Securato e o modelo


onlearning. Desafios da educação. 2018. Disponível em: https://
desafiosdaeducacao.grupoa.com.br/entrevista-jose-claudio-secu-
rato-e-o-modelo-onlearning/. Acesso em: 10 de jul. 2020.

LÉVY, Pierre. Cibercultura. São Paulo: Editora 34, 2007.

LEMOS, Cristina. Inovação na era do conhecimento. Parcerias


Estratégicas, V. 5, N. 8, 2000. Disponível em: http://seer.cgee.org.
br/index.php/parcerias_estrategicas/article/view/104/0. Acesso
em: 09 de jul. 2020.

RABELLO, Maria Eduarda. Lições do coronavírus: ensino remoto


emergencial não é EAD. Desafios da educação. 2020. Disponível
em: https://desafiosdaeducacao.grupoa.com.br/coronavirus-ensi-
no-remoto/. Acesso em: 10 de jun. 2020.

RODRIGUEZ, Álex; FARRERAS, Carina. Castells debate pandemia,


público e educação. Outras Palavras. 2020. Disponível em: https://
outraspalavras.net/pos-capitalismo/castells-debate-a-pandemia-
-o-publico-e-a-educacao/. Acesso em: 10 de jul. 2020.

SAINZ, Jorge; CAPILLA, Ana. Efeitos da crise do COVID-19 na edu-


cação. 2020. Disponível em: https://www.oei.es/uploads/files/news/
covid19/1747/informe-covid-19pt.pdf. Acesso em: 10 de jul. 2020.

30
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

SCHIEHL, E. P.; GASPARINI, I. Contribuições do Google Sala de Aula


para o ensino híbrido. Revista Renote: Novas Tecnologias na Edu-
cação, v. 14, n. 2, 2016. Disponível em: https://doi.org/10.22456/1679-
1916.70684. Acesso em: 10 jul. 2020.

SILVA, Andrey Ferreira da; ESTRELA, Fernanda Matheus; LIMA,


Nayara Silva; ABREU, Carlos Tibúrcio de Araújo. Saúde mental de
docentes universitários em tempos de pandemia. Physis: Revista de
Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, v. 30(2), 2020. Disponível em: httbps://
www.ims.uerj.br/wp-content/uploads/2020/05/physis30_2_a16.
pdf. Acesso em: 10 de jul. 2020.

31
A EMERGÊNCIA DA EDUCAÇÃO E DO
CURRÍCULO NA CULTURA DIGITAL
EM TEMPOS DE PANDEMIA E
DISTANCIAMENTO SOCIAL

Jayson Magno da Silva5

INTRODUÇÃO

O presente capítulo toma como método a abordagem


qualitativa (CHIZZOTTI, 2013) com aportes na pesquisa teó-
rica, e tem por objetivo refletir sobre a escola e o currículo,
ora provocados a mudanças, ainda que parciais, diante da
crise pandêmica instalada na atualidade.
Primeiramente, situa o momento histórico atual, cenário
de uma pandemia que afeta a educação. Em seguida, retoma o
conceito de currículo, abordando sua polissemia, diferentes e
até mesmo antagônicas concepções e ideias, e pauta o conceito
de tecnologia e as questões que o envolve.
Após, discute as contribuições que as Tecnologias
Digitais de Informação e Comunicação (TDIC) trazem ao
desenvolvimento do currículo, com enfoque, sobretudo, a
emergência da cultura digital sob o argumento da integração
entre currículo e tecnologias digitais aliadas ao potencial de
conexão à Internet e à mobilidade, e apresenta, em síntese, o
conceito de web currículo, seus fundamentos e metodologias.
5 
Doutor em Educação (PUC-SP); Professor-Convidado, Curso de Pós-Graduação em
Gestão Escolar do Centro Universitário Senac-SP; Consultor em Educação. E-mail:
jaysonmagno@hotmail.com

32
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

Aborda, brevemente, duas iniciativas em políticas públi-


cas de educação na cultura digital, sendo uma desenvolvida em
território nacional, contexto do município de Piraí, estado do
Rio de Janeiro, e outra internacional, na República Oriental
do Uruguai.
Finaliza discutindo caminhos e possibilidades para a
educação, para a escola e o currículo nos dias de hoje.

A EDUCAÇÃO DIANTE DA CRISE


PANDÊMICA

Ocasionada por um vírus letal – Covid-19 (BRASIL,


2020) – com altas chances de mortalidade, inquietações e
certas mudanças foram provocadas na escola e no currículo,
e muito possivelmente tenha tirado o sono de governantes e
secretários de Educação pelo Brasil e mundo afora.
No surto e no susto, um grande desafio é colocado para a
educação formal professada nos bancos e carteiras escolares,
tradicionalmente, desde os tempos mais remotos.
Diante da crise pandêmica instalada por um inimigo
invisível que impiedosamente dissipa vidas, fere a economia
e muda o próprio acontecer do mundo, está posto um outro
desafio para a educação (SILVA, 2020a), talvez o maior nos
últimos tempos. Escola e currículo já não eram mais os mes-
mos! O “normal” já não era mais normal!
Até então, ainda por alguns ignorada, demonizada,
envolta a críticas basistas e de senso comum, tomada como
uma criatura ameaçadora, em uma relação esquizofrênica
entre o medo e a negação, estava agora as tecnologias digi-
tais num horizonte de possibilidades e perspectivas para
continuidade e a manutenção do trabalho e papel da escola
enquanto instituição cultural e social.

33
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

Contudo, restou aos sujeitos da escola, gestores, pro-


fessores, estudantes e comunidades, dar conta de, na ponta,
experienciar essas mudanças repentinas, sem terem passado
previamente por um momento de formação que precedia essa
ruptura brusca com a realidade tradicionalmente instalada.
Estaria anunciada agora, para o bem e para o mal, a
emergência de um novo cenário de educação que acena no
sentido de uma perspectiva de inovação para a escola em dire-
ção as possibilidades de redesenhar seus contextos, dar novos
contornos ao seu currículo, (re)pensar o uso das tecnologias.

CURRÍCULO E TECNOLOGIAS

Mas, o que é currículo? Ensaiando possíveis respostas


decorrem outras perguntas: É conjunto de disciplinas de um
curso? Conjunto de normas, procedimentos e métodos cien-
tificamente organizados? Trata-se de um rol de conteúdos?
Grade curricular?
A literatura de currículo surgiu em 1918 com a primeira
publicação do campo de estudos. Escrita por Bobbit, a obra The
Curriculum apresenta um modelo institucional do currículo
escolar, que remonta a ideia fabril e sua inspiração teórica à
administração científica do taylorismo.
A vasta e ampla teoria de currículo apresenta inúmeras,
diferentes e até mesmo antagônicas concepções, das mais
técnicas e burocratizadas (BOBBIT,1918) às mais críticas, que
desvelam sua politicidade (APPLE, 1989, 2006, GIROUX, 1986,
FREIRE, 1985, 2003, 2006, 2008, 2009), às mais flexíveis e
abertas (MOREIRA, 1997, ABRAMOWICZ, 2006, PACHECO,
2000, GOODSON, 2008).
Toda a teoria cede espaço para traçar contornos de uma
outra concepção mais autoral (SILVA, 2011, 2015, 2017, SILVA;
SILVA, 2013, 2014), pautada nos referenciais que compõe a

34
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

teoria de currículo, provocada pelos estudos realizados, pelas


experiências, dúvidas, incertezas, contradições etc.
Um currículo interpretado como uma prática concreta
que se estabelece na intimidade da sala de aula, nos corredores
da escola, na sala dos coordenadores e diretores, no laboratório
de ciências, nas reuniões entre professores e as famílias dos
estudantes, no recreio, na aula de matemática, na cor esco-
lhida para pintar as paredes ou as portas dos banheiros, nas
vestimentas dos funcionários ou dos professores, na forma de
organizar tempos e espaços, nas relações entre as pessoas. De
outro modo, o currículo é, em si, o próprio acontecer da escola.
Refere-se a um currículo que acontece pautado nos
objetos de estudos, nos documentos institucionais das redes
de ensino, na literatura, na economia, na sociologia, na antro-
pologia, na ecologia, nas ciências, na política, inclusive na
política educacional etc.
Um currículo que não se limita às definições e delibera-
ções, às ordens emanadas dos gabinetes e governos, que não se
detêm ao que foi traçado na esfera jurídica ou no legislativo,
mas que vai muito além... que tem vida, que tem cara, que
tem cor, que tem identidade, que tem marcas, traços, sonhos,
experiências, que envolve uma complexidade, e não é, mas
que está sendo. Um currículo em movimento!
E as tecnologias? São produtos dos homens? A huma-
nidade estaria em uma Era tecnológica? A serviço de quê e
de quem elas se apresentam?
O filósofo Álvaro Vieira Pinto (2005) recusa e rejeita a
ideia de que estamos em uma Era tecnológica, e argumenta “o
homem não seria humano se não vivesse sempre numa Era
tecnológica” (Ibid., p.18), por entender que essa compreensão
se pauta em uma armadilha ideologia que traça uma versão
de fim da história.

35
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

Para o estudioso, as tecnologias são um bem cultural que


pertence à humanidade, e, portanto os homens não podem
ganhar enquanto dádiva ou benevolência aquilo que é cons-
titutivo do seu próprio acontecer histórico, social e político.
Não sendo produtos nem bons nem maus em si, as tecnologias
são processos humanos, e pertencem aos homens.
Almeida (2009) ressalta que é oportuno voltar os olha-
res para as tecnologias no sentido de repensá-las em sua
verdadeira democratização, enquanto direito humano, uma
construção histórica, social, cultural e política.
Nesse entender, conectar-se também deve ser pensado
enquanto direito humano (SILVA, 2020b), pois sem conexão
à Internet as janelas para o mundo permanecem fechadas,
obstruindo aos sujeitos oportunidades de viver plenamente
o exercício da cidadania.
À luz das palavras de Rivoir e Escuder (2014), as TDIC
trouxeram consigo não somente novas oportunidades para
o desenvolvimento como também novas desigualdades
sociais entre os que acessam a estas oportunidades e os que
não acessam.
Nessa perspectiva, demonizar as tecnologias digitais,
refutá-las ou manter por elas uma fobia deliberada, não seria
em si uma ideia interessante quando se pensa em uma nação
democrática e em uma educação com potencial de transfor-
mação de realidades cruéis.
Mas, então, como articular tecnologias digitais ao desen-
volvimento do currículo aliadas ao potencial de conexão à
Internet e à mobilidade de modo a oportunizar uma educação
pautada nos princípios e ideias da democracia abarcando a
dimensão social e cultural da escola?

36
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

EDUCAÇÃO NA CULTURA DIGITAL

Educação é ato de conhecimento e de criação, que abarca


as dimensões pedagógicas, culturais, sociais, históricas, polí-
ticas, econômicas, ecológicas e tecnológicas.
Dentre essas dimensões, uma que ainda provoca a escola
e traz inquietações ao desenvolvimento do currículo diz res-
peito ao uso das tecnologias digitais aliadas à mobilidade e
à conexão à Internet em suas práticas, enquanto elementos
estruturantes na construção do conhecimento.
Almeida et al (2017) defendem que a integração entre
tecnologias e currículo mobiliza várias dimensões pedagógicas
simultaneamente e rompe com padrões existentes na rotina
escolar. Segundo os pesquisadores quando tecnologia e cur-
rículo são vislumbrados como produções humanas, possíveis
de incorporar demandas da sociedade, os envolvidos têm a
oportunidade de se assumir enquanto sujeitos e realizar um
trabalho que emerge dentro da realidade concreta da escola.
Além disso, a presença das tecnologias digitais no tra-
balho desenvolvido pela escola envolvendo gestores, pro-
fessores, alunos e comunidades mobiliza várias dimensões,
entre elas, a pedagógica que ao mesmo tempo rompe com
padrões existentes na rotina tradicionalmente constituída
no ambiente escolar.
Nas palavras de Valente et al (2014), quando tecnologias
e currículo são entendidos como processos e produções huma-
nas possíveis de incorporar demandas sociais, os envolvidos
têm a oportunidade de perceber que podem desenvolver
a autoria.
Dessa maneira, é possível alcançar ganhos e experien-
ciar contribuições tanto para os sujeitos, quanto para o próprio
currículo, para a aprendizagem, e para a escola enquanto
instituição viva, dinâmica e orgânica.

37
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

Quer sejam nos currículos oficiais definidos pelas redes


de ensino, os quais especificam as linhas mestras de uma polí-
tica, podendo ser marcadamente prescritivo ou mais abertos e
flexíveis, conforme as concepções trazidas em seu bojo, o que
se destaca é que na concretude da realidade de cada escola, na
ação e reflexão de seus sujeitos (gestores, professores, alunos
e comunidades), o que se desenvolve na ponta tem novos
significados, traçados a partir das experiências, estratégias,
visões, concepções, estilos, compreensões, concepções sobre
a contextura social, cultural, política, pedagógica, antropo-
lógica, econômica, ecológica e tecnológica em que essa ação
se desenvolve.
Ao falar sobre as tecnologias, como as TDIC aliadas
ao potencial de conexão à Internet e à mobilidade, no con-
texto da educação é preponderante pensar em suas diversas
possibilidades de compreensão, o que fica marcado em sua
presença (ou não) nas práticas escolares.
Entretanto, no mundo contemporâneo, as TDIC são
indispensáveis na vida cotidiana, e por vezes, utilizadas pelos
sujeitos (cidadãos) no seu fazer. Com um celular inteligente
(smartphone) ou qualquer outro dispositivo tecnológico conec-
tado à Internet ao alcance das mãos, quer seja para realizar
uma comunicação ou compartilhar fotos, áudios e outros
conteúdos digitais com amigos e familiares por meio de mídias
sociais como o Whats APP, o Facebook, o Instagram e outras
ferramentas, quer seja para solicitar uma refeição ou pagar
uma fatura ou boleto por meio das instituições bancárias
utilizando um APP, ou para uso institucional em ambiente
corporativo para realizar uma reunião online, ela está aces-
sível e disponível a uma parcela da população.
Ao considerar a função social da escola e a necessidade
da mesma estar em sintonia e em consonância com as deman-
das e experiências de seu tempo e espaço, que é histórico,
social, político, econômico, ecológico e cultural, seria condição

38
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

sine qua non articular o mundo fora dela com o seu acontecer,
contribuindo para a formação dos cidadãos no mundo, com
o mundo e sobre o mundo.
Nesse entender, desenvolver um currículo contextuali-
zado e em rede dinâmica, aberta e flexível, que trabalha com as
diversidades propiciadas por uma articulação entre educação e
todas as dimensões que a envolve, permite a interlocução entre
saberes científicos e do senso comum, na direção de novos
saberes construídos pelos sujeitos dentro e fora da escola.
Estudiosos como Valente et al (2014) defendem que as
tecnologias digitais enquanto linguagens constituintes e estru-
turantes dos processos de ensino e de aprendizagem, podem
provocar mudanças no currículo, trazer contribuições para a
educação e oportunizar a construção de tempos e espaços de
web currículo, o que estaria mais antenado com esse contexto
do acontecer humano nesses meados do século XXI.

TEMPOS E ESPAÇOS DE WEB CURRÍCULO

O termo web currículo foi cunhado pela pesquisadora


Maria Elizabeth Bianconcini de Almeida no ano 2008, ocasião
em que realizou junto a outros estudiosos e pesquisadores da
área o I Seminário Web Currículo promovido pela Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), por meio do
Programa de Pós-Graduação em Educação: Currículo.
Nesses últimos 12 anos, o Seminário Web Currículo se
constituiu agenda fixa da PUC-SP, por meio do referido pro-
grama de estudos pós-graduados, e contou com a participação
de estudiosos e pesquisadores de diferentes contextos ao redor
do mundo, envolvendo inúmeras instituições de pesquisa,
de ensino superior, programas de pós-graduação e escolas,
gerando dissertações de mestrado e teses de doutoramento,
em andamento e já defendidas no referido programa.

39
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

O desenvolvimento de web currículo nas palavras de


Almeida (2010, 2013, 2014, 2016) propicia a articulação entre
os conhecimentos do cotidiano dos sujeitos e a cultura digital,
com aqueles conhecimentos que emergem do processo de
ensinar e aprender e os conteúdos científicos sistematizados.
De acordo com a referida pesquisadora, na integração
entre currículo e tecnologias evidencia-se a emergência de
web currículo.
Segundo Almeida (2014) o desenvolvimento de web cur-
rículo acentua a relevância de reconfigurar o papel da escola
como um espaço público de formação e de produção de conhe-
cimento, ampliado pela conexão e pela mobilidade, e aliado
às relações estabelecidas entre os diferentes sujeitos, tempos
e espaços, abarcando um contexto que se expande para além
dos limites físicos da escola, de seus muros, mas que integra a
comunidade com a vida social, cultural, política, econômica,
ecológica, em um dado momento histórico, o que permite o
despontar da escola no mundo e com o mundo, em uma via
de mão dupla.
Para a estudiosa, a concepção de web currículo se coaduna
com as ideias sobre inovação pedagógica, e seu processo de
mudanças (no plural) significativas na educação. Tais mudan-
ças se colocam em posição diversa à educação tradicional
(DEWEY, 1979) centrada no professor (ou na própria tecno-
logia) que tudo sabe e se constitui um transmissor de infor-
mações ao aluno que nada sabe, ao enfatizar a experiência,
as relações, e a vida.
Por meio do desenvolvimento de web currículo a educação
pode se expandir para além dos espaços e tempos delimitados
da escola ou da sala de aula, permitindo aos sujeitos dialogar
com diferentes contextos e culturas, integrar a educação
formal, não-formal e a informal, os espaços institucionais
educativos com outros lugares e comunidades de produção
do saber científico e do senso comum, trazendo contribuições

40
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

para a criação de uma sociedade educadora. Em conformidade


com Almeida (2014) o espaço da escola não é mais o único
lugar de produção do conhecimento.
Não se trata, contudo, de refutar ou sobrepor um tipo
de educação ao outro, mas de entender que todas as formas
de educação, compõe e fazem parte de um arcabouço de con-
textos que constituem a formação dos sujeitos históricos,
culturais, sociais e políticos, dando contornos à vida mesma
em comunidades.
Portanto, nesses meados dos anos 20 do século XXI,
face as tecnologias digitais aliadas ao potencial de conexão
à Internet e à mobilidade, e os contextos de educação que
podem ser experienciados pelos sujeitos, se instala a oportu-
nidade de superar paradigmas de aprendizagem baseados na
reprodução, na memorização e fragmentação de informação.
Mais do que isso, se coloca a necessidade de não-negar aos
sujeitos por meio da escola, instituição formal e fundamen-
tal ao desenvolvimento humano, e suas práticas, o exercício
pleno da democracia.
Algumas experiências nessa direção são retratadas,
brevemente, nas próximas linhas.

CONTORNOS DE POLÍTICAS DE EDUCAÇÃO


NA CULTURA DIGITAL

No cerne da questão sobre a oferta de condições igua-


litárias de acesso e disponibilidade está também em pauta a
importância e necessidade e uma ação e intenção de governos
no sentido de desenhar e implementar política pública de
modo a favorecer e impulsionar a promoção de práticas e
iniciativas nas escolas e comunidades.
Para tanto, requer planejamento, gestão, formação,
condições de infraestrutura, disponibilidade de recursos,

41
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

equipamentos tecnológicos e conexão para as escolas e comu-


nidades, de modo a oferecer oportunidades aos sujeitos dentro
e fora da instituição.
Ainda que tal propositura figure no campo da utopia no
contexto da realidade brasileira, e pelo mundo afora, de um
modo geral, algumas iniciativas e experiências exitosas foram
implementadas. Entre outras, figuram as que foram estuda-
das em pesquisa concluída (SILVA, 2017), como os exemplos
do Programa Piraí Digital, que se desenvolve no município
de Piraí, estado do Rio de Janeiro, no Brasil, e o Plan Ceibal –
Conectividad Educativa de Informática Básica para el Aprendizagen
en Línea, desenvolvida na República Oriental do Uruguai.
O Programa Piraí Digital, entre outras ações, dispõe de
recursos tecnológicos e conexão gratuita em todas as escolas
públicas jurisdicionadas no município, quer seja da própria
rede de ensino, quer seja da rede estadual de educação, além
de outros pontos, equipamentos e espaços públicos da cidade.
Coelho (2004) aponta que o Programa Piraí Digital
nasceu em junho de 2002, a partir de um convênio da Universi-
dade Federal Fluminense (UFF) com a prefeitura do município
de Piraí, tendo por objetivo implementar laboratório para o
sistema educacional envolvendo as escolas e bibliotecas com
todos os pontos em rede, mas ampliou para uma visão de
acesso universal e disponível a toda comunidade.
Já no contexto Uruguai, a política pública Plan Ceibal
iniciada na cidade de Cardal, departamento da Flórida, nos
primeiros meses do ano 2007, chegou à capital Montevidéu
em 2009, universalizando e democratizando o acesso a com-
putadores portáteis com conexão à Internet, os quais foram
distribuídos a todas as crianças e jovens da rede pública de
educação, seus gestores, maestros6 e professores, e disponi-

6 
Expressão utilizada no país para se referir aos educadores que atuam na educação
infantil, de zero a 5 anos de idade, e na educação primária (escuela).

42
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

bilizou nas escolas outras tecnologias digitais apropriadas


para uso pedagógico.
Além disso, a política toma como princípios diminuir
a exclusão digital promovendo a igualdade de oportunidades
para todas as crianças e jovens, a democratização do conheci-
mento, e a inclusão social das famílias, uma vez que os compu-
tadores portáteis transitam fora da escola proporcionando o
acesso da comunidade às máquinas, além da possibilidade de
conexão à Internet sem fio livre e gratuita em locais públicos
em diferentes pontos do país.
A pesquisadora Vaillant (2013) revela que a Comissão
de Educação do Plan Ceibal elaborou em 2007, um Projeto
Pedagógico em que foram apresentados os objetivos da ação
política que se iniciava, entre outras, a dimensão socioedu-
cativa, no sentido de promover igualdade de oportunidades
a todos os alunos; contribuir na melhoria da qualidade da
educação mediante o uso das tecnologias no contexto escolar
e no núcleo familiar; desenvolver uma cultura colaborativa
que envolvesse alunos, maestros, professores, famílias e escola.
Em ambos os casos, tratam-se de políticas públicas que
apesar de todas as suas contradições e desafios, oferecem opor-
tunidades sociais e oportunidades educativas, e que, para além
disso, no momento atual, tempos de pandemia e distanciamento
social, tem oportunizado aos seus sujeitos melhores condições
para a oferta e disponibilidade de elementos, infraestrutura e
possibilidades para uma ação educacional junto às suas comu-
nidades, acertadamente, mais exitosas e profícuas.

ALGUMAS CONSIDERAÇÕES

A reflexão encetada neste texto permite avançar no


sentido de entender um pouco mais sobre os contextos das
tecnologias digitais, da educação, dos sujeitos, e de sua vida
mesma, que é histórica, social, cultural, política etc.

43
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

As ideias trazidas à baila sobre esses diferentes contex-


tos que se articulam na tessitura da vida em sociedades, e que
envolve a escola, oportuniza enxergar algumas possibilidades.
Possibilidades sobre o uso das tecnologias digitais aliadas à
conexão à Internet e à mobilidade na educação, possibilidades
a respeito do currículo e seu desenvolvimento, possibilidades
no campo das políticas públicas, possibilidades em relação
aos próprios sujeitos da educação.
Além disso, foram apresentadas nessas poucas linhas
algumas provocações. Provocações para repensar a escola, o
ensino e a aprendizagem. Provocações para rever planos de
governos, para rever políticas, concepções e práticas. Uma
oportunidade para rever!
Contudo, espera-se que as ações promovidas, quer
seja pelos governos, quer seja pelas escolas e seus sujeitos e
comunidades com uso das tecnologias digitais no contexto da
educação, não se limitem a uma resposta pontual restrita à
emergência para esse dado momento, no qual uma pandemia
aterroriza o mundo e as sociedades, mas que efetivamente se
possa pensar em uma política pública efetiva de continuidade.
Quiçá, as ideias expressas neste texto possam se tornar
realidade cotidiana no fazer dos sujeitos, das instituições e
redes de ensino pelo Brasil e mundo afora.
Quiçá!

REFERÊNCIAS

ABRAMOWICZ, M. Currículo e avaliação: uma articulação


necessária – textos e contextos. Pernambuco: Centro Paulo Freire;
Bagaço, 2006.

ALMEIDA, F. J. Paulo Freire. Folha Explica 81. São Paulo: Publi-


folha, 2009.

44
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

ALMEIDA, M. E. B. Integração de currículo e tecnologias: a emer-


gência de web currículo. XV Endipe. Encontro Nacional de Didática
e Prática de Ensino. Universidade Federal de Minas Gerais. Anais.
Belo Horizonte: UFMG, 2010.

ALMEIDA, M. E. B. (Coord.). O currículo no século XXI – inte-


gração das TIC ao currículo: inovação, conhecimento científico e
aprendizagem. Relatório Técnico-Científico. Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo, CNPQ. São Paulo: PUC-SP, CNPQ, 2013. Dispo-
nível em <http://www4.pucsp.br/gpcted/?>. Acesso em 25.04.2020.

ALMEIDA, M. E. B. Integração currículo e tecnologias: concepção


e possibilidades de criação de web currículo. In: ALMEIDA, M. E.
B.; ALVES, R. M.; LEMOS, S. D. V. (Orgs.). Web currículo: aprendi-
zagem, pesquisa e conhecimento com uso de tecnologias digitais.
Rio de Janeiro: Letra Capital, 2014, pp.20-38.

ALMEIDA, M. E. B. Currículo e narrativas digitais em tempos de


ubiquidade: criação e integração entre contextos de aprendiza-
gem. Revista de Educação Pública. Universidade Federal do Mato
Grosso, v.25, n.59/2, Cuiabá: UFMT, mai/ago, 2016, pp.526-46. Dis-
ponível em <http://www.periodicoscientificos.ufmt.br/ojs/index.
php/educacaopublica/article/view/3833>. Acesso em 22.04.2020.

ALMEIDA, M. E. B.; VALENTE, J. A.; KUIN, S.; SILVA, J. M. O currículo


na cultura digital e a integração currículo e tecnologias. In: CERNY,
R. Z. et al. (Orgs.). Formação de educadores na cultura digital:
a construção coletiva de uma proposta. Florianópolis: UFSC/CED/
NUP, 2017, pp.383-410. Disponível em <https://nupced.paginas.
ufsc.br/files/2017/06/PDF_Formacao_de_Educadores_na_Cul-
tura_Digital_a_construcao_coletiva_de_uma-proposta3.pdf>.
Acesso em 27.04.2020.

APPLE, M. Educação e poder. Porto Alegre: Artes Médicas, 1989.

APPLE, M. Ideologia e currículo. 3.ed. Porto Alegre: Artes


Médicas, 2006.

45
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

BRASIL. Ministério da Saúde. Coronavírus: COVID-19. Brasília,


DF: MS, 2020. Disponível em <https://coronavirus.saude.gov.br/>.
Acesso em 20.04.2020.

BOBBIT, J. F. The curriculum: The Houghton Mifflin Professional


Library for Teachers and Students of Education: Theory and Princi-
ples of Education. Boston, Massachusetts: Houghton Mifflin, 1918.

CHIZZOTTI, A. Pesquisa qualitativa em ciências humanas e


sociais. 5.ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2013.

COELHO, F. D. Ambiência produtiva e construção social no terri-


tório: o programa de desenvolvimento local no município de Piraí.
IX Congresso Internacional Del CLAD sobre la reforma del
estado y de la administración pública. Anais. Madri, España:
nov/2004, pp.2-5.

DEWEY, J. Como pensamos: como se relaciona o pensamento


reflexivo com o processo educativo, uma reexposição. São Paulo:
Editora Nacional, 1979.

FREIRE, P. The politics of education: culture, power and liberation.


Westport, CT: Bergin and Garvey, 1985.

FREIRE, P. Política e educação: ensaios. 7.ed. São Paulo: Cor-


tez, 2003.

FREIRE, P. A educação na cidade. 7.ed. São Paulo: Cortez, 2006.

FREIRE, P. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática


educativa. 37.ed. São Paulo: Paz e Terra, 2008.

FREIRE, P. Pedagogia do oprimido. 48.ed. São Paulo: Paz e


Terra, 2009.

GIMENO SACRISTAN, J. Poderes instáveis em Educação. Porto


Alegre, Artes Médicas, 1999, p. 147-206.

GIMENO SACRISTAN, J. O currículo: uma reflexão sobre a prática.


3ed. Porto Alegre: Artes Médicas, 2000.

46
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

GIROUX, H. Teoria crítica e resistência em educação: para além


das teorias de reprodução. Petrópolis: Vozes, 1986.

GOODSON, I. Currículo, narrativa e futuro social. Revista Brasileira


de Educação. v.12, n.35, mai/ago, 2008. Disponível em: <http://www.
scielo.br/pdf/rbedu/v12n35/a05v1235.pdf>. Acesso em 11.04.2016.

PACHECO, J. A. Flexibilização das políticas curriculares. O papel


dos diversos actores educativos na construção de uma escola
democrática. Seminário. Actas. Guimarães, Portugal: Centro de
Formação Francisco de Holanda, 2000, pp. 71-78.

PINTO, A. V. O conceito de tecnologia. v.1. Rio de Janeiro: Con-


traponto, 2005.

RIVOIR, A; ESCUDER, S. Brecha digital de gênero en Uruguay:


superada ou restringida? In: BOADO, M. (Coord.). El Uruguay
desde la sociologia. Universidad de la República. Faculdad de
Ciencias Sociales. Departamento de Sociologia. Montevideo: UR,
FCS-DS, 2014, pp.155-74.

SILVA, J. M. O som da integração das tecnologias digitais de


informação e comunicação ao currículo: a rádio na internet -
voz, poder & aprendizagem. Dissertação (Mestrado em Educação).
Programa de Pós-Graduação em Educação: Currículo, Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo. São Paulo: PUC-SP, 2011.

SILVA, J. M. Currículo e tecnologias – a rádio na educação: o som


da integração e a expressão da voz dos sujeitos do currículo no mundo
digital. Saarbrücken, Deutschland: Novas Edições Acadêmicas, 2015.

SILVA, J. M. Os colegas de classe na escola ubíqua: integração


currículo, tecnologias digitais e mobilidade em contextos Brasil
e Uruguai. Tese (Doutorado em Educação). Programa de Pós-Gra-
duação em Educação: Currículo, Pontifícia Universidade Católica
de São Paulo. São Paulo: PUC-SP, 2017.

SILVA, J. M. A escola e o currículo em tempos de pandemia e distan-


ciamento social. Revista Mais Educação. v.3, n.3. São Paulo: Centro

47
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

Editorial Sem Fronteiras, 2020a, pp. 131-7. Disponível em <https://


www.revistamaiseducacao.com/artigosv3-n3-maio-2020/14>.
Acesso em 08.06.2020.

SILVA, J. M. [No Prelo] Conectar-se, um direito humano! São


Paulo, 2020b.

SILVA, J. M.; SILVA, M. G. M. Autoria no mundo digital: o currículo


na voz dos sujeitos da aprendizagem. Revista de Educação PUC-
-Campinas. v.18, n.2. Pontifícia Universidade Católica de Campinas.
Centro de Ciências Humanas e Sociais Aplicadas. Programa de Pós-
-Graduação em Educação. Campinas: PUC-Campinas, 2013, pp.191-9.
Disponível em <http://periodicos.puc-campinas.edu.br/seer/index.
php/reveducacao/article/view/2028>. Acesso em 24.04.2020.

SILVA, J. M.; SILVA, M. G. M. Integração das tecnologias digitais


ao currículo: a rádio na internet e a emergência de web currículo.
In: ALMEIDA, M. E. B.; ALVES, R. M.; LEMOS, S. D. V. (Orgs.). Web
currículo: aprendizagem, pesquisa e conhecimento com uso de
tecnologias digitais. Rio de Janeiro: Letra Capital, 2014, pp.71-81.

VAILLANT, D. Las políticas TIC en los sistemas educativos de


América Latina: Caso Uruguay, Fondo de las Naciones Unidas
para la Infancia. Buenos Aires: Unicef, 2013. Disponível em <http://
www.unicef.org/argentina/spanish/Uruguay_ok.pdf>. Acesso em
09.10.2016.

VALENTE, J. A.; ALMEIDA, M. E. B.; SILVA, J. M.; KUIN, S. Curso de


Especialização em Educação na Cultura Digital: Núcleo de Base 2.
Brasília, DF: MEC, 2014. Disponível em <http://catalogo.educacaona-
culturadigital.mec.gov.br/hypermedia_files/live/nucleo_de_base2/
apresentacao.html>. Acesso em 31.05.2020.

48
A EDUCAÇÃO EM TEMPOS DE PANDEMIA:
ALTERIDADE E VULNERABILIDADE
DAS COMUNIDADES INDÍGENAS E
QUILOMBOLAS NA BAHIA

Ana Karine Ribeiro Ferreira da Silva 7


Taylan Santana Santos8

“A educação que precisamos há de ser a que


liberta pela conscientização. A que comunica e
não a que faz comunicados”.9

“Kwêkatu eté”.10

INTRODUÇÃO

O presente trabalho é fruto de um projeto pedagógico


multidisciplinar desenvolvido enquanto um “Projeto Inte-
grador”, cuja temática denomina-se “Alteridade e vulnerabi-
lidade em tempos de pandemia: as comunidades indígenas e

7 
Licenciada em Ciências Biológicas (UEFS); Especialista em Ciências da Natureza (UNB),
Especialista em Métodos e Técnicas de Ensino (UNIVERSO). Docente e egressa do Colégio
Nobre. Professora da rede estadual da Bahia. Email: akarine22@outlook.com
8 
Historiador (UEFS); Mestre em História (UNEB); Especialista em Metodologia Científica
(IF Baiano); Professor de História, Filosofia e Sociologia; Docente e egresso do Colégio
Nobre. Email: Taylansantos@hotmail.com
9 
Paulo Freire, um dos maiores educadores da história do Brasil.
10 
“Gratidão”, expressão proferida pela líder indígena Nádia Akuã, durante o lançamento
virtual do Projeto Integrador do Colégio Nobre em junho de 2020.

49
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

quilombolas na Bahia”. Tal projeto foi executado em junho de


2020, no Colégio Nobre situado em Feira de Santana, Bahia.11
O “Projeto Integrador” foi uma iniciativa de vanguarda
do Colégio Nobre, uma instituição de ensino consolidada há
mais de 40 anos na Bahia, cuja missão pedagógica é
Tornar os alunos a razão da sua existência,
por isso, tudo tem que ser feito em fun-
ção deles. Para concretizar o que está dito
acima, é que o Nobre trabalha em espírito
de cooperação com todos aqueles que estão
envolvidos na formação e educação dos
alunos...Perseguindo o objetivo de ser um
grande centro de conhecimentos e estu-
dos, onde o jovem aqui presente sinta-se
comprometido com o aperfeiçoar-se, des-
cobrir-se, formar-se e tornar-se um cida-
dão que se prepara para viver um mundo
globalizado (MISSÃO INSTITUCIONAL
COLÉGIO NOBRE).
Mediante sua concepção humanística de educação, o
Colégio Nobre adotou durante a pandemia, em um contexto
de aulas não presenciais, o recurso didático-pedagógico do
Projeto Integrador. O objetivo central desse projeto foi fomen-
tar as múltiplas competências e habilidades dos alunos, em
uma aprendizagem significativa de integração do ser estu-
dante com o seu meio social, e as questões que envolvem a
contemporaneidade.
O Projeto Integrador teve como mérito a inserção do
corpo discente aos principais dilemas que caracterizam a
nossa educação em tempos de Covid-19. Orientados pelo corpo
docente, os estudantes desenvolveram aprendizagens sobre
diversos aspectos da pandemia na hodiernidade, entre os
quais, ressaltamos o escopo do presente trabalho: “A alteridade

Agradecemos ao apoio de toda equipe do Colégio Nobre na pessoa da diretora Everilda


11 

Sampaio de Almeida, e em especial, aos estudantes do 1° ano do Ensino Médio- pela


participação, confiança e entrega na realização desse trabalho.

50
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

e vulnerabilidade em tempos de pandemia: as comunidades


indígenas e quilombolas na Bahia”.
Essa temática foi executada junto aos estudantes do 1° ano
do Ensino Médio, e mediada pela interface entre a Biologia com
a História, Filosofia e a Sociologia. Ao nos depararmos com o
desafio da intersecção entre essas distintas unidades curriculares,
selecionamos o referido tema partindo da premissa do perfil do
nosso alunado. Constituído por estudantes críticos e engajados
na construção e significação do conhecimento escolar, contamos
com o que denominados de uma “Geração protagonista”, que
diante da crise humanitária que vivemos, não poderia tanto se
resignar como renunciar ao necessário debate sobre o contexto
da sociedade em tempos de Coronavírus.
Para tanto, o título do nosso tema, evoca a necessidade
de compreender o lugar social do “outro”, partindo das suas
vivências e experiências históricas com a pandemia. Reivin-
dicando o conceito filosófico de “Alteridade”, cujo sentido
etimológico é oriundo do latim alteritas, ou seja, o “outro”,
demarcamos logo de saída, a concepção de que o “eu” existe
através do “outro”, e essa relação de interdependência deve
ser concebida com a mais ampla relativização. Esse conceito
antropológico estabelece a capacidade de vislumbrar o “outro”
não a partir do nosso espelho, mas por meio das próprias
singularidades e especificidades que constituem o “outro”.
Destarte, a nossa temática envolveu os nossos estudan-
tes no desafio de colocar-se no lugar do “outro”, conhecendo
as múltiplas vulnerabilidades que agravam determinados
grupos sociais de riscos em face da Covid-19. Entre os quais,
destacamos algumas comunidades indígenas e quilombolas
na Bahia, analisadas no curso do nosso Projeto Integrador.
Por sua vez, essa iniciativa contribuiu no processo forma-
tivo do papel cidadão dos nossos estudantes, alinhando o
conhecimento científico e a solidariedade nesse momento
de pandemia.

51
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

DESENVOLVIMENTO

Novos tempos diante da Covid-19

A recente pandemia resultou em um cenário de elevada


incerteza para as respostas e medidas necessárias ao seu
enfrentamento no campo sanitário, econômico e sociocultural.
As autoridades sanitárias internacionais reunidas na Orga-
nização Mundial de Saúde (OMS), preconizam a implemen-
tação de medidas que podem ser agrupadas sob três grandes
estratégias: a recomendação ou determinação do isolamento
e do distanciamento social, ampliação de atendimento nos
serviços de saúde e o auxílio econômico a cidadãos, famílias
e empresas.
Diante da crise sanitária imposta pelo Coronavírus,
Boaventura de Souza Santos, salienta:
A pandemia e a quarentena estão a reve-
lar que são possíveis alternativas, que as
sociedades se adaptam a novos modos de
viver quando tal é necessário e sentido
como correspondendo ao bem comum.
Esta situação torna-se propícia a que se
pense em alternativas ao modo de viver, de
produzir, de consumir e de conviver nestes
primeiros anos do século XXI (SANTOS,
2020, p. 15).
Esses novos tempos apontam que a realidade contempo-
rânea tem sido abruptamente transformada desde a vigência
da crise da pandemia do Coronavírus. Inclusive, a Escola tem
se configurado em um espaço de amplo contágio a Covid-19,
gerando um risco de contaminação em massa, visto que nela
os estudantes estão em permanente contato. Daí a suspensão
das aulas promovendo e assegurando o distanciamento social
da comunidade escolar como medida preventiva.

52
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

Por via de regra, o vírus não escolhe o seu público, mas


vale ressaltar que os índices de propagação e mortandade, são
deveras condicionados pelos fatores sociológicos, geográficos
e históricos que estruturam a nossa sociedade. Por conse-
guinte, há que se observar quais grupos sociais se tornaram
o alvo mais vulnerável da Covid-19, uma vez que esses gru-
pos vivenciam uma realidade caracterizada pela escassez de
recursos básicos de sobrevivência digna, tais como moradia
adequada, tratamento de água e esgoto, rede de saneamento
básico e políticas públicas (KENRICK, 2020).
Na sociedade brasileira, dentre os inúmeros setores
vulnerabilizados, destacamos as comunidades tradicionais
quilombolas e indígenas. Conhecer esses grupos sob o prisma
do altruísmo, da solidariedade e da empatia- ver o “outro” a
partir do “outro”, são também desafios e possibilidades de
uma educação protagonista e transformadora, tal qual con-
cebemos em nosso colégio.

Conceito e perspectivas sobre o Projeto


Integrador

O “Projeto Integrador” está circunscrito em um con-


texto de pandemia, com a consequente suspensão das aulas
presenciais e a substituição das mesmas por aulas remotas
não presenciais. Vale ressaltar que no Colégio Nobre, o refe-
rido projeto já faz parte da nossa experiência consolidada na
aplicação de projetos pedagógicos como o “Feira em Foco”, da
área de Humanas, acerca da História e cultura da cidade de
Feira de Santana, “FEMAT”- a Feira de Matemática e o projeto
de Iniciação Científica, ocorridos ao longo do ano letivo.
Por sua vez, o “Projeto Integrador 2020”, surgiu enquanto
uma ferramenta didática, substancial no processo de ensino
e aprendizagem referenciada pela pedagogia de projetos.
Concebemos que a principal meta desse modelo pedagógico

53
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

consiste em ressignificar a escola dentro da realidade contem-


porânea, permitindo que a Escola seja um canal de construção
e transformação do conhecimento (ZABALA, 1998). Nessa
perspectiva, o “Projeto Integrador”, foi um convite ao pleno
desenvolvimento das competências e habilidades, mediadas
pela orientação docente, que visaram o buscar, descobrir,
construir, criticar, comparar, dialogar, analisar e vivenciar o
próprio processo de construção do conhecimento por parte
dos nossos alunos.
De acordo com a filósofa contemporânea Marilena
Chauí, os contornos de um processo de aprendizado cons-
trutivista, perpassa pelo diálogo do estudante com o pensa-
mento e com a cultura (através das obras e práticas sociais),
tendo o professor como um mediador que possibilita uma
aprendizagem de maneira contextualizada e significativa
(CHAUÍ, 1980, p. 45). Assim sendo, partimos da premissa de
que o conhecimento não é algo estanque, mas um processo
de construção contínua, entre o fazer e o refazer diante das
condições ofertadas. Por conseguinte, o estudante passa a
ocupar o seu papel ativo em uma aprendizagem processual,
que permite a simbiose entre conhecer e intervir em proble-
mas e situações reais do cotidiano (LEITE, 2000, p. 25-29).12
Entre as vantagens do trabalho por projetos está a obten-
ção de altos níveis de motivação e participação dos estudantes,
promovendo pesquisas estruturadas, que articulem os saberes
curriculares com a situação atual da quarentena. Em nosso
caso específico, o presente projeto foi direcionado especial-
mente aos alunos do 1° ano do ensino médio, caracterizado
pelo início do processo de estudo individual visando a auto-
nomia discente, cujo aprendizado resulta no fazer, isto é, “só
se aprende, fazendo” (SEVERINO, 2012, p. 38).

12 
As discussões em torno dessa modalidade pedagógica apresentam parâmetros e
diretrizes alinhadas com o contexto sócio-histórico dos estudantes, em uma crítica direta
ao modelo pragmático e cartesiano de educação (SANTOS, 2011, p. 55).

54
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

No que tange ao nosso trabalho desenvolvido, é válido


ressaltar que o desenvolvimento da temática se fundamentou
na interface entre as Ciências Sociais (História e Filosofia) com
a Biologia, uma vez que conforme destacamos, a análise dos
aspectos biológicos da pandemia em voga, se entrelaça com
os fatores sociais.13
Outrossim, optamos pelas comunidades quilombolas
e indígenas como escopo do Projeto Integrador, como uma
estratégia pedagógica para que os alunos pudessem entrar em
contato com as raízes históricas do povo brasileiro, mediante
a concepção de uma História viva e dialética, radicalmente
oposta com a retrógada História analisada sob uma mera
linha do tempo, ou aquela vista por “cima”, sob as lentes dos
colonizadores. Conhecer, contemplar, analisar e engajar-se
junto às comunidades originárias e formadoras da nossa
cultura nacional, é de fato um encontro consigo mesmo, uma
conquista da nossa própria História.
Em suma, diversos cientistas sociais, em especial soció-
logos brasileiros, lograram uma monumental contribuição
através dos seus pensamentos e suas obras a respeito do “povo
brasileiro”. Aqui, reivindicamos as leituras delineadas por
intelectuais renomados e de inconteste capital intelectual, tais
como Darcy Ribeiro, Sérgio Buarque de Holanda, Florestan
Fernandes, Caio Prado Junior, dentre outros pensadores.
Antagonizando com as leituras do “racismo científico”
e o famigerado “mito da democracia racial” no Brasil, esses
autores sistematizaram uma nova perspectiva a partir do
entendimento em que a miscigenação, ou seja, a mistura entre
os povos formadores da cultura brasileira, os europeus, os

13 
Ou seja, uma melhor compreensão sobre o coronavírus e seus impactos na sociedade
contemporânea, prescinde de uma concatenação entre os saberes acumulados nas ciências
sociais e naturais, conforme adverte Hetan Shah, diretor executivo da Academia Britânica:
“se quisermos superar esse vírus, precisaremos da experiência e do conhecimento de uma
ampla variedade de disciplinas, desde ciências sociais e humanas até medicina, biologia
e engenharia” (CHAPARRO, 2020).

55
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

indígenas e os africanos, decorreu em um processo histórico


marcado pela espoliação promovida pelos colonizadores
contra os nossos povos originários (comunidades nativas) e
a escravização de africanos arrancados da sua terra e trazidos
para o Brasil enquanto uma mercadoria do sistema colonial
escravista.
No clássico O Povo Brasileiro, Darcy Ribeiro apresenta
o seguinte excerto:
Todos nós, brasileiros, somos carne da
carne daqueles pretos e índios supliciados.
Todos nós brasileiros somos, por igual, a
mão possessa que os supliciou. Descenden-
tes de escravos e de senhores de escravos
seremos sempre servos da malignidade
destilada e instalada em nós, tanto pelo
sentimento da dor intencionalmente pro-
duzida para doer mais, quanto pelo exer-
cício da brutalidade sobre homens, sobre
mulheres, sobre crianças convertidas em
pasto de nossa fúria (RIBEIRO, 1995, p. 120).
Ribeiro e demais teóricos negam e soterram o “Mito da
Democracia Racial”, sob a constatação de que a mestiçagem
não possibilitou uma harmonia social, ou um “equilíbrio de
antagonismos”, tal qual postulou o controverso antropólogo
brasileiro Gilberto Freyre (FREYRE, 1998, p. 372). No Brasil,
a mistura dos povos formadores não resultou em uma demo-
cracia social, seja pela natureza espoliadora/escravocrata da
colonização, assim como o caráter desigual e excludente do
capitalismo. Inclusive, em que pese a abolição da escravidão no
Brasil (1888), o povo brasileiro ainda é constituído pela nega-
ção da cidadania aos povos originários e aos afro-brasileiros.
Dessa forma, citamos mais uma vez Darcy Ribeiro: “a mais
terrível de nossas heranças é esta de levar sempre conosco a
cicatriz de torturador impressa na alma e pronta a explodir
na brutalidade racista e classista” (RIBEIRO, op. cit. p. 120).

56
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

Quanto a esse aspecto, a partir do século XX, tanto as


Ciências Naturais como as Ciências Sociais, fomentaram um
amplo debate étnico-racial que reformulou a leitura sobre o
conceito de “raça”. No campo da Biologia, os novos estudos
permitiram uma elucidação sobre a obra e teoria de Charles
Darwin, cuja deturpação deu vazão ao “darwinismo social” - a
atribuição do conceito de evolução/classificação biológica na
análise das sociedades, noção pseudocientífica hegemônica
ao longo do século XIX.14
Ademais, cumpriu às Ciências Sociais, a tarefa de rema-
nejar o conceito de “raça”, desnudando qualquer sentido bio-
lógico, e aplicando uma leitura étnica, a respeito da formação
e da construção de culturas em determinadas sociedades. Em
vista dessa perspectiva, surgiu uma insólita interpretação: o
que nos separa e diferencia não é uma pretensa divisão racial,
mas sim cultural, ou seja, são os costumes, as tradições, os
valores e os comportamentos socialmente estabelecidos que
diferem os povos distintos (SILVA, 2016, p. 10).
No Brasil, o pressuposto étnico-racial da miscigena-
ção deve ser encarado pela sua marcação a “ferro e fogo”
por meio da violência dos colonizadores (europeus) sobre os
povos colonizados (indígenas e africanos). Aqui, essa violência
econômica e sociocultural, assentou-se historicamente em
formações estruturadas pelo colonialismo em primeiro lugar
e o capitalismo, por conseguinte.15
Em seu pensamento sobre a sociedade brasileira, o
célebre sociólogo Florestan Fernandes, caracterizou com
14 
Contrapondo-se com essa vertente, sustentamos a improbidade da existência biológica
de “raças”, e reafirmamos o legado darwiniano no que tange ao processo de adaptação
dos seres à natureza, e não a “lei dos mais fortes”, conforme alegavam alguns dos seus
interpretes revisionistas.
15 
Dessa análise destacamos a obra Formação do Brasil Contemporâneo, do eminente intelectual
brasileiro Caio Prado Junior, cuja contribuição sobre o “sentido da história brasileira”
perpassou pela fundamentação da condição da exploração econômica e social desde o
nosso passado colonizador, e em consonância com a formação do capitalismo brasileiro
(JUNIOR, 2000).

57
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

perícia e solidez teórica os fundamentos de um capitalismo


segregacionista que ao dividir a nossa sociedade em classes,
legou aos povos indígenas e negros no Brasil o lugar social da
marginalização e da subalternidade. Em seu ensaio teórico
Mudanças Sociais no Brasil, Fernandes aprofunda o seu panorama
sobre a realidade brasileira, que por seu turno, reveste-se
pelas contradições da luta de classes e a opressão do racismo
contra os negros e indígenas (FERNANDES, 2015).
Ancorado nesse viés, o jurista contemporâneo Silvio
Almeida elaborou em O que é o Racismo Estrutural? um estudo
que se tornou um guia para a decodificação do racismo na
atualidade, mediante os profundos resquícios de uma socie-
dade constituída pelo racismo socialmente estruturado (DE
ALMEIDA, 2018).16 Por sua vez, as comunidades indígenas e
quilombolas aqui estudadas, estão inseridas nesse cenário da
realidade brasileira posto em tela, e podem ser compreendidas
a partir do bojo das análises teóricas aqui fundamentadas.

Experiências e Resultados: as
comunidades indígenas e quilombolas na
Bahia

Metodologicamente, a execução do Projeto Integrador


foi pautada em duas fases. Na fase inicial ocorreram discus-
sões temáticas mediadas pelos professores orientadores e um
levantamento de dados realizados pelos alunos. Por fim, o
corpo discente se debruçou na confecção de materiais infor-
mativos a respeito do tema, cujos resultados foram expostos
em um evento de lançamento realizado em meio virtual no
dia 17 de junho de 2020.

16 
Em conformidade com os teóricos aqui citados, Silvio Luiz de Almeida, ratifica a noção
de que o racismo, longe de ser um fato isolado, configura-se enquanto um mecanismo de
opressão estruturado desde as raízes da formação da sociedade até a sua conformação
política, econômica, jurídica, cultural e social.

58
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

No curso da realização desse trabalho pedagógico, as


turmas do 1° ano foram divididas em duas equipes de alu-
nos, sendo que essas equipes selecionaram determinadas
comunidades quilombolas e indígenas para o desenvolvi-
mento do projeto. A saber: comunidades indígenas “Pataxó”
e “Tupinambá”, e comunidades quilombolas “Lucas da Feira”
e “Quingoma”.
Após essa seleção, os estudantes produziram diferentes
estudos de casos, de acordo com a comunidade, referencia-
dos por um estado da arte com base em artigos científicos,
reportagens, documentários, artigos de opinião, matérias
jornalísticas, cartilhas das comunidades e documentos institu-
cionais que versam sobre a situação desses grupos vulneráveis
durante a conjuntura da presente pandemia.
Mediante esse repertório de conteúdo, os alunos siste-
matizaram as informações e difundiram o seu conhecimento
a partir dos seus materiais/produtos digitais. Uma das equipes
elaborou um site informativo, enquanto que a outra equipe
produziu um jornal eletrônico, cujas principais informações
serão apresentadas nesse artigo.
No site “PQNews – Pataxó Quingoma News”, a equipe
de estudantes da turma A, expôs seus resultados sobre as
comunidades indígena Pataxó e quilombola Quingoma. De
acordo com o site, “os índios Pataxós são uma comunidade
localizada no extremo sul da Bahia... São 31 aldeias, forma-
das por mais de 10.000 habitantes, segundo o censo de 2014
do SIASI” (SITE PATAXÓ-QUINGOMA NEWS). Por sua vez,
A comunidade quilombola “Quingoma”
está localizada na região do município de
Lauro de Freitas desde 1569. Seus primei-
ros habitantes eram negros escravizados
que fugiam dos senhores de engenho
e eram acolhidos por uma tribo indí-
gena tupinambá (SITE PATAXÓ-QUIN-
GOMA NEWS). 

59
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

Em artigo denominado “Indígenas e Quilombolas na


luta contra o vírus”, os estudantes situam historicamente a
vulnerabilidade das comunidades, sobretudo em face a epi-
demias virais. No caso dos povos indígenas:
Durante o período de conquista da Amé-
rica, pelos europeus no século XV e XVI,
esse grupo acabou sofrendo com as doen-
ças trazidas pelos colonizadores, como
por exemplo, a varíola. Isso devido ao fato
desses povos terem sido expostos às doen-
ças de forma massiva. Aliado a isso, tribos
sempre foram desprovidas de um serviço
de saúde adequado. Um dos motivos disso
é a desassistência de saúde pública, frente
às comunidades (SITE PATAXÓ-QUIN-
GOMA NEWS).
Quantos aos quilombolas no Brasil, os estudantes ainda
pontuaram:
Outros povos importantes para o legado
histórico do Brasil foram os Quilombolas,
descendentes e remanescentes de comu-
nidades formadas por escravizados fugi-
tivos (os quilombos), entre o século XVI e
o ano de 1888... Estes vivem, muitas vezes,
em condições precárias devido à falta de
recursos diversos (SITE PATAXÓ-QUIN-
GOMA NEWS).

Essas informações são de extrema relevância pois apon-


tam para o nível crítico de vulnerabilidade no qual essas comu-
nidades são submetidas. Conforme os estudantes destacaram,
a pandemia do Coronavírus não é apenas de caráter biológico,
mas também, sócio-histórico, uma crise humanitária que sua
compreensão depreende da correlação entre a Biologia e as
Ciências Sociais.
Nesse sentido, o texto conclui que:

60
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

A invisibilidade da doença em territórios


quilombolas e indígenas revela uma situa-
ção dramática, que não tem recebido a aten-
ção devida das autoridades públicas e dos
meios de comunicação dominantes. Aspec-
tos sociais desses grupos tornam a Covid-19
potencialmente perigoso para essas tribos
(SITE PATAXÓ-QUINGOMA NEWS).
Vale ressaltar ainda uma entrevista realizada pelos
estudantes com uma liderança quilombola dona Ana, líder
comunitária do quilombo Quingoma:
1  – Quais os principais problemas
no enfrentamento da Covid-19?
“A hipo insuficiência de políticas públicas que
nos tornam vulneráveis diante de uma pandemia
como a que estamos atravessando”
2 –  A comunidade local tem reali-
zado algum planejamento objeti-
vando o combate da doença?
Sim, Campanha de conscientização quanto à
importância do isolamento social, distribuição
de máscaras e kits de higiene.
3 – A população local tem sofrido pro-
blemas quanto à informação, ou o
povo tem sido bastante consciente
quanto à doença e seus perigos?
A população tem sofrido problemas de informação
quanto à gravidade dessa pandemia justamente
por ser uma comunidade que sempre esteve à mercê
do descaso dos governos municipal, estadual e
federal (SITE PATAXÓ-QUINGOMA NEWS).

Por seu turno, a equipe das turmas C/D, confeccionou


um jornal eletrônico denominado “Comunidades Inclusas?”.
Os estudantes selecionaram o quilombo “Lucas da Feira” e os
povos indígenas Tupinambá. Sobre o quilombo Lucas da Feira,
que se localiza em Feira de Santana, Bahia, os estudantes
destacaram que a comunidade,

61
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

Sofre com a negligência do Estado e tendo


negados os direitos sociais mais básicos,
habitando em moradias precárias, distri-
buição de água e energia elétrica de forma
irregular, sem saneamento básico e enfren-
tando todos os tipos de problemas sociais
(JORNAL ELETRÔNICO COMUNIDADES
INCLUSAS?, 2020).
Quanto aos Tupinambás, conforme discorrido na maté-
ria “Tupinambás e a sua luta contra a Covid-19- dificuldades e
o avanço da doença”, o lugar social de vulnerabilidade e risco
da comunidade é histórica, uma vez que:
Há mais de 10 anos esse grupo indígena luta
para retomar sua terra e permanecerem em
condição precária na pandemia...Muitos
fazendeiros desmataram os hectares que
sempre pertencem aos índios para a cons-
trução de seus patrimônios e também usa-
ram para fins lucrativos. Com isso, muitas
famílias ficaram sem suas casas e sem seu
sustento (JORNAL ELETRÔNICO COMU-
NIDADES INCLUSAS?, 2020, p. 5).
O espaço geográfico dessas comunidades tradicionais-
indígenas e quilombolas, tem se constituído em um cenário
caótico recrudescido pela realidade vivenciada durante a
pandemia da Covid-19. Assim, de acordo com o geógrafo
Milton Santos, citado pelos estudantes na matéria “Resistên-
cia Negra”, o espaço geográfico é “formado por um conjunto
indissociável, solidário e também contraditório, de sistemas de
objetos e sistemas de ações, não considerados isoladamente,
mas como o quadro único no qual a História se dá” (JORNAL
ELETRÔNICO COMUNIDADES INCLUSAS?, 2020, p. 4).
Como finalização do trabalho metodológico do nosso
Projeto Integrador, os estudantes de ambas turmas, sob a
nossa orientação pedagógica, organizaram um evento online
de lançamento dos seus materiais. O referido evento realizado

62
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

no dia 17 de junho de 2020, foi mediado pelos professores


orientadores, e consistiu na apresentação oral dos estudan-
tes, além da participação ilustre da liderança indígena Tupi-
nambá Nádia Akawã,17 e o professor pesquisador Aldrin da
Costa Cruz.18
Durante o evento online, aberto à comunidade escolar,
ocorreu a divulgação do Projeto Integrador, com a discus-
são temática aqui apresentada. Vale ressaltar que o evento
ficou marcado pela comunicação de Nádia Akawã, acerca da
importância histórica da cultura dos povos tradicionais no
Brasil e os desafios e dilemas enfrentados pelas comunidades
originárias na contemporaneidade. Ademais, o professor
Aldrin Cruz ainda contribuiu com aspectos pertinentes do
seu livro O índio no livro didático de História e a (des) construção de
representações pelo professor indígena Pataxó (CRUZ, 2018).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente artigo teve como objetivo apresentar um


relato de experiência docente sobre um projeto pedagógico,
cujo tema foi denominado “Alteridade e Vulnerabilidade em
tempos de pandemia: as comunidades indígenas e quilombolas
na Bahia”. O “Projeto Integrador”, conduzido pelas disciplinas
de Biologia e Ciências Sociais (História e Filosofia), foi apli-
cado no Colégio Nobre de Feira de Santana, Bahia, junto aos
estudantes do 1° ano do Ensino Médio.
Os resultados obtidos ao longo do Projeto pedagógico
e aqui analisados, foram utilizados pelos professores orien-
tadores como parte significativa de um processo avaliativo
17 
Liderança Indígena na Aldeia Tukum Território Indígena Tupinambá de Olivença.
Ilhéus-Ba. Licenciada em Artes e Linguagens pela UNEB, educadora indígena e popular,
formadora de educadores indígenas da Bahia. Membro do Fórum estadual de educação
escolar indígena.
18 
Professor de História da rede estadual de educação básica da Bahia, pesquisador sobre
o lugar do índio no ensino de História.

63
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

processual, tendo como alvo o desenvolvimento das habili-


dades e competências dos alunos, sobretudo em um contexto
de pandemia com aulas online.
Por fim, norteados por uma concepção humanística e
crítica de educação, reivindicamos a experiência relevante e
pertinente do “Projeto Integrador”, que propiciou o aperfeiçoa-
mento do ensino e aprendizagem diante da excepcionalidade
dos tempos em que vivemos. Ademais, o projeto resultou
no fomento da consciência e a prática da empatia frente aos
grupos sociais de vulnerabilidade, reafirmando uma educa-
ção que vise a emancipação do conjunto da nossa sociedade.

REFERÊNCIAS

Fontes utilizadas:

Missão Institucional do Colégio Nobre. Disponível em: https://


www.colegionobre.com.br/institucional/.

Site Informativo “Pataxó-Quingoma News”. 1° ano A. Colégio Nobre.


2020. Disponível em: http://www.pqnews.rf.gd/.

Jornal Eletrônico “Comunidades Inclusas?”. 1° ano C/D. Colégio


Nobre. 2020.

BIBLIOGRAFIA

CHAPARRO, Laura. A medicina não é suficiente: por que precisamos das


ciências sociais para acabar com essa pandemia. Site Café com História,
20 de abril de 2020, disponível em: https://www.cafehistoria.com.
br/ciencias-sociais-novo-coronavirus-pandemia/.

CHAUI, Marilena de Souza. Ideologia e Educação in revista Educação e


Sociedade. n. 5. São Paulo: Cortez Editora/Autores Associados, 1980.

64
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

CRUZ, Costa da Aldrin. O índio no livro didático de História e a (des) cons-


trução de representações pelo professor índigena Pataxó. Editora Zarte. 2018.

DE ALMEIDA, Silvio Luiz. O que é racismo estrutural? Belo Horizonte:


Letramento, 2018.

FERNANDES, Florestan. Mudanças sociais no Brasil. Global Edi-


tora, 2015.

FREYRE, Gilberto. Casa-Grande & Senzala. Editora Record, Rio de


Janeiro, 1998.

KENDRICK, Karen. É para isso que serve a Sociologia? Horizonte ao Sul,


03 de abril de 2020. Disponível em: https://www.horizontesaosul.
com/single-post/2020/04/03/%C3%89-PARA-ISSO-QUE-SERVE-
-A-SOCIOLOGIA.

RIBEIRO, Darcy. O povo brasileiro: a formação e o sentido do Brasil.


São Paulo: Companhia das Letras. 1995.

SANTOS, Souza de Boaventura. A cruel pedagogia do vírus. Editora


Boitempo, 2020.

SANTOS, Wildson Luiz Pereira; AULER, Décio. CTS e educação cientí-


fica: desafios, tendências e resultados de pesquisa. Brasília: Editora
Universidade de Brasília, 2011.

SEVERINO, Antonio Joaquim; SEVERINO, Estevão Santos. Ensi-


nar e aprender com pesquisa no ensino médio. 1ªed. São Paulo. Cortez
editora, 2012.

SILVA, da Honorário Wilson. O mito da democracia racial: um debate


marxista sobre raça, classe e identidade. Editora Sunderman, São
Paulo, 2016.

ZABALA, Antoni. A Prática educativa: como ensinar. Porto Alegre:


ArtMed, 1998.

65
(RE)PENSANDO O ENSINO PARA SURDOS
DURANTE O ISOLAMENTO SOCIAL: UMA
PROPOSTA DE ENSINO

Tayana Dias de Menezes19

INTRODUÇÃO

Segundo Freire (1996), a teoria sem a prática é vazia, vira


“verbalismo”, no entanto a prática sem teoria vira ativismo.
Mas, ao agregar a prática com a teoria, tem-se a práxis, a ação
criadora e modificadora da realidade. O objetivo primeiro
desse artigo é propor um exemplo de aula de língua portuguesa
para surdos que possa ser tanto aplicada presencialmente
como também mediada por novas tecnologias – uma forma
de adequar o ensino/ aprendizagem na atual situação de iso-
lamento social. Esses sujeitos, diferentemente dos ouvintes,
captam a realidade especialmente por meio do olhos, por esse
motivo a literatura especializada sugere o uso de imagens;
vídeos como um canal facilitador da aprendizagem para esse
novo público que encontramos dentro dos muros das esco-
las. No entanto, aqui cabe nos perguntar: o uso da imagem
pela imagem irá garantir a aprendizagem? Assim como para
ouvintes, na aula de português, o uso do texto como pretexto
não garante que aconteça, de fato, a aprendizagem, trazer
simplesmente imagens; vídeos; desenhos etc. para sala de aula
também não irá garantir para surdo um aprendizado eficaz.

19 
Professora doutora da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). E-mail: tayana.
menezes@ufpe.br

66
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

Para evitar cair na armadilha comentada por Freire


– tornar a prática ativismo –, iremos propor um trabalho
específico com o uso de imagens. O modelo de aula é fle-
xível podendo, por isso, ser usado como sustentáculo para
planejar outras tantas aulas sobre temas distintos da língua
portuguesa. Mas, para isso, vamos antes refletir sobre a
teoria que dá base para a prática, ou seja, vamos comentar
aspectos fundamentais da Semiótica Social e como essa
trata a multimodalidade – característica inerente a todos
os textos. Mas, antes disso, é preciso comentar algumas
especificidades sobre o surdo.

ESPECIFICIDADES SOBRE OS SURDOS

Os sujeitos surdos, segundo o conhecimento de senso


comum, são categorizados como deficiente e são, muitas vezes,
encarados como “socialmente inúteis”. Essa concepção, vem
sendo questionada e acreditamos que uma das maneiras mais
efetivas para alterar esse discurso é por meio da educação,
isto é, tornar o surdo um sujeito agente dentro e fora dos
muros da escola.
Uma vez que os surdos têm pouco ou nenhum acesso
ao som, na educação bilíngue o ensino/ aprendizagem
deve ocorrer através da libras – e não do português oral,
o canal tradicional de ensino/aprendizagem –, os seja, a
língua usada em sala de aula deve ser a língua de sinais,
considerada a primeira língua do grupo, mas estes devem
também adquirir a língua oficial do seu país – no caso, o
português escrito.
Em contraste com o que aconteceu no passado, o
surdo; a escola e a comunidade devem aceitar a surdez.
Isso significa afirma que o surdo não precisa almejar asse-
melhar-se ao grupo majoritário, mas deve assumir a sua
surdez: sua cultura, seus traços identitários e sua língua.

67
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

Esse posicionamento traz consequências para a educação


tradicional. Teremos em sala de aula um sujeito falante
de uma modalidade espaço-visual que interage por meio
das mãos e do corpo e que capta a realidade a sua volta,
especialmente, pelos olhos. Portanto, cabe ao professor, o
papel de rever estratégias de ensino para atingir esse novo
público: procurar engajar o estudante como agente cons-
trutor de seu próprio conhecimento; construir ambientes
de aprendizagem adequados utilizando-se dos recursos
apropriados para que os alunos reflitam criticamente.
Barbosa (2016, p.3) afirma que a surdez é encarada
como uma “experiência visual”, portanto, “o uso da infor-
mação verbal interligada à imagem, se configura como
um facilitador para o ensino/aprendizagem desse público
de alunos”. Podemos dessa maneira concluir que o uso de
recursos visuais pode ser uma meio facilitador para que
ocorra de fato a aprendizagem. Embora defendamos que
é, para a formação intelectual e cognitiva do surdo, fun-
damental que este aprenda como primeira língua a libras,
defendemos também que é importante para surdo aprender
a língua majoritária do seu país, especialmente, na moda-
lidade escrita. É fundamental, por isso, que o professor
tenha em mente que “aprender o português decorrerá do
significado que essa língua assume nas práticas sociais [...]
e esse valor só poderá ser conhecido por meio da língua
de sinais. O letramento na língua portuguesa, portanto,
é dependente da constituição de seu sentido na língua de
sinais” (FERNANDES, 2006, p. 6).
Uma vez que o uso de imagens integrado ao texto ver-
bal é um recurso possível e desejado dentro das estratégias
de ensino para o aluno surdo, vamos, inicialmente, pensar
na teoria que dá base para a análise das imagens para depois
sugerir um trabalho eficaz para aulas de português presenciais
como mediadas por tecnologias.

68
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

A SEMIÓTICA SOCIAL: PRINCÍPIOS TEÓRICOS

Dentre tantas outras teorias, por que a Semiótica Social


(SS)? Para responder essa pergunta fundamental é preciso,
pois, retomar o que foi discutido na sessão anterior. Inicial-
mente, é relevante lembrar que os surdos possuem como pri-
meira língua a libras, sendo o português escrito uma segunda
língua. A estrutura linguística da libras é distinta da do portu-
guês, a língua de sinais brasileira é uma língua de modalidade
espaço-visual, ou seja, os surdos captam a realidade por meio
dos olhos e interagem com as mãos e o corpo. Podemos, por
isso, concluir que imagens; vídeos; desenhos etc. gozam de
um lugar privilegiado no processo de ensino/ aprendizagem
dos surdos uma vez que estes utilizam os olhos para perceber/
entender/ refletir sobre a realidade.
Retomando a pergunta inicial, a perspectiva sociosse-
miótica trata a linguagem verbal e as outras semioses equi-
tativamente, isto é, não há uma hierarquia, dentro do texto,
entre a linguagem verbal e os outros modos que (re)constroem
os múltiplos significados. Isso significa afirmar que o profes-
sor pode, ao discutir sobre os significados do texto em sala
de aula, partir das imagens e de outros modos para chegar à
língua escrita.
Consciente do porquê da seleção da perspectiva teó-
rica, vamos esquadrinhar melhor conceitos basilares desta:
signo; modo; recursos semióticos; affordances e conjunto
multimodal.
O conceito de signo remonta pensadores gregos, filóso-
fos estoicos, perpassa as reflexões de Saussure e Pierce. Não
iremos, por uma questão de espaço, fazer toda a trajetória
teórica. Mas, o signo dentro da SS é encarado como “noção
chave” (KRESS e VAN LEEUWEN, 2006, p. 6). Os autores de
Reading image: the grammar os visual design propõem-se discutir
sobre “formas (significantes) como cor, perspectiva e linha,

69
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

bem como a maneira pela qual essas formas são usadas para
realizar significados (significados) na construção dos sig-
nos” (KRESS e VAN LEEUWEN, 2006, p. 6)20. Podemos, por
meio da citação, concluir que para a SS os signos são formas
semióticas impregnadas de significados. Segundo os autores
citados, O signo é uma combinação de forma e significado: a
menor unidade de sentido.
Kress e Van Leeuwen (2006) defendem que o signo é
motivado a partir do interesse dos agentes socais e do con-
texto de uso, “sob o nosso olhar o signo nunca é arbitrário, e
a ‘motivação’ deve ser formulada na relação entre o criador
do signo e o contexto que cada signo é produzido” (KRESS e
VAN LEEUWEN, 2006, p. 8)21. Isto é, o signo é carregado de
significado, mas esse é uma (re)construção motivada por
interesse e produzida num contexto social específico. Dessa
forma, o signo é um elemento atravessado por questões sociais,
culturais e históricas. Por isso, a SS se debruça especialmente
para o processo de produção de significado, os recursos ou
modos usados na (re)construção do significado, os agentes
sociais responsáveis pela (re)construção e o contexto em que
esses significados atuam.
O signo existe em todos os modos, no entanto signo e
modo são conceitos que não se confundem: o segundo diz
respeito aos diferentes recursos usados para a (re)cons-
trução do significado dentro do texto, exemplo: imagens;
gráficos; som; layout; mapas etc. Enquanto o primeiro,
origina-se, como já mencionado, na tradição filosófica dos
gregos; pensado também pelos estoicos – estes “já distin-
guiam entre expressão, conteúdo e referente”, segundo

20 
the key notion in any semiotics is the sign. Our book is about signs - or, as we would
rather put it, about sign-makers. We will be discussing forms (signifiers) such as colour,
perspective and line, as well as the way in which these forms are used to realize meanings
(signifieds) in the making signs.
21 
“In our view signs are never arbitrary, and ‘motivation’ should be formulated inrelation
to the sign-maker and the contexto in whitch the sign is produced”.

70
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

Lacerda (1950, p. 20) – e perpassa os pensamentos de Saus-


sure e Pierce, diz respeito à menor unidade de sentido:
uma combinação entre forma e significado. Os modos são
definidos por Santos e Gualberto (2019, p. 10) “como os
meios pelos quais o signo se torna evidente” e complementa
que “é utilizado para se referir a um conjunto de recursos
socialmente e culturalmente moldados para a produção
de sentido” (p.10), os signos “se materializam por meio dos
modos” (SANTOS e GUALBERTO, 2019, p. 12).
[...] os modos são resultados do trabalho
semiótico de membros de uma comu-
nidade específica e são continuamente
desenvolvidos no seu uso, visto que as
necessidades sociais e os interesses de
uma comunidade tornam-se visíveis nos
traços de cada modo. Nesta via, os signifi-
cados são acordados socialmente e espe-
cíficos cultural e socialmente. As escolhas
de determinados modos para a produção
de significados estão diretamente ligadas
à história do uso semiótico de uma mate-
rialidade específica, dado que o que um
produtor de signo faz está relacionado
com o que outro(s) produtores fizeram
antes, em resposta a necessidades sociais
semióticas similares (SANTOS e GUAL-
BERTO, 2019, p. 11).

Não apenas o signo é um elemento perpassado por


questões históricas, sociais e culturais, os diversos modos
também são. Cada modo tem suas possibilidades (affordan-
ces) de (re)construção, por exemplo na fala podemos usar o
tom de voz, na escrita podemos usar diferentes fontes etc.
Ou seja, affordances “indica as restrições e as possibilidades
oferecidas por cada modo para a produção de sentido em
eventos comunicativos” (SANTOS e GUALBERTO, 2019, p. 9).

71
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

Kress, segundo (SANTOS e GUALBERTO, 2019), defende


que há principios semióticos “que são comuns a todos os seres
humanos e que todos produzem signos em uma relação moti-
vada. Esses signos , por sua vez, são produzidos por diferentes
meios em diferentes modos e realizam os significados, usando
os recursos semióticos disponíveis pelos membros de grupos
sociais em uma determinada cultura” (p.5).
Podemos concluir que a multimodalidade é uma carc-
terística inerete aos textos, uma vez que estes apresentam
muitos (multi) modos em sua (re)constituição. Deste modo,
uma das preocupações da SS é refletir sobre a motivação do
uso/ escolha de determinados modos na (re)construção de
sentido, em contextos determinados, dentro de textos espe-
cificos como parte de uma construção social. A SS procura
dar conta dos significados socais (re)construídos por meio das
inúmeras forma semióticas e da relação da (re)construção do
significado dentro das interações sociais situadas. Por isso,
Santos e Gualberto (2019) apontam como princípios semióticos
de trabalho: 1) a noção de escolha do sistema de linguagem;
2) as configurações de significado a partir do contexto; e 3)
as funções semióticas da linguagem.
Podemos, portanto, concluir que a (re)construção do
significado dentro do texto, para a SS, não parte apenas
da linguagem estrita, mas se dá pelo conjunto de modos
selecionados pelo agente no momento da interação num
contexto específico para cumprir propósitos comunicativos.
Dessa forma, nós, porfessores, podemos planejar uma aula
de língua portuguesa e junto com nossos alunos esmiuçar os
significados a partir dos modos que compõe os textos que
serão analisados. Para os alunos surdos, podemos introduzir
uma discursão a partir de imagen; desenhos; gráficos etc
para depois, junto aos conhecimentos já ativados por uma
discussão anterior em libras, analisar e trabalhar a língua
portuguesa escrita.

72
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

ANÁLISE E PROPOSTA DE TRABALHO

A nossa proposta de trabalho não corresponde apenas


a uma aula, ela deve ser fracionada pelo menos em três aulas.
Nossa sugestão, será trabalhar a argumentatividade por meio
de recursos visuais e pelo uso do advérbio de intensidade,
assim como Kress e Van Leeuwen (2006), acreditamos que “o
que é expresso na linguagem através da escolha entre dife-
rentes classes de palavras e estruturas de oração, pode, na
comunicação visual, ser expresso através da escolha entre
diferentes usos da cor ou diferentes estruturas composicio-
nais (p. 2)22. Mas, para os surdos é interessante partirmos dos
significados contruído pela imagem para depois partirmos
para a linguagem verbal, esse processo – imagem- linguagem
verbal – pode auxiliar esses alunos a compreender os efeitos
de sentido (re)construídos pelos signos selecionados dentro
do texto analisado.
Como dissemos anteriormente a aula pode servir de
exemplo para outros tantos temas: basta o professor sele-
cionar os gêneros adequados que dêm suporte para atingir
os objetivos desejados. Além disso, a aula foi pensada para
atender uma demanda atual: de isolamento social, ou seja, uma
aula mediada por novas tecnologias – selecionamos para isso
a plataforma Google Classroom. Vale salientar que, embora a
adaptação seja imperativa no atual contexto de pandemia, não
é de hoje que o mundo globalizado e tecnológico atravessa o
cotidiano dos sujeitos, segundo Giddens (1991). Nossos alunos
vivem “cercados de hipertextos por todos os lados. Grande
parte das informações que inundam nosso cotidiano estão
hipertextualizadas” (XAVIER, 2015, p. 73).

22 
“what is expressed in language throught the choice between different word classes
and clause structures, may, in visual communication, be expressed through the choice
between different uses of colour or different compositional structures”.

73
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

Nossa proposta de analíse é sustentada pela Semiótica


Social por isso defendemos que os signos usados na construção
dos textos são motivados por questões históricas, culturais,
sociais e ideológicas. Deste modo, os textos são um conjunto
de signos selecionados por um agente e estes, por sua vez, são
organizados segundo os critérios que o produtor do texto julga
importante para atingir determinado propósito comunica-
tivo, além disso o olhar do agente sobre o objeto, seja físico
ou semiótico, como aponta Kress e Van Leeuwen (2006), é
organizado por meio desses critérios ou o “aspecto criterial”.
Kress, Leite-Garcia, Van Leeuwen (2000) apontam a
importância de ter consciência que tanto produtores como
leitores têm poder sobre o texto; os textos são construídos por
meio do arranjo de signos complexos: “o interesse descreve
a convergência de um complexo de fatores: histórias sociais
e culturais, contextos sociais atuais, incluindo expectativas
do produtor dos sinais sobre o ambiente comunicativo”23
(KRESS, LEITE-GARCIA, VAN LEEUWEN, 2000, p. 388), os
produtores selecionam os signos mais apropriados de cordo
com os seus interesses comunicativos.
Desta maneira, o professor pode dar início a sua aula
postando a imagem 1 no Google Classroom e, para orientar a
leitura dos alunos – à semelhança de Dionísio (2014) que inicia
as suas reflexões a partir do questionamento: “qual a função
das imagens na construção do livro?” (p. 14) –, questionar24:
qual a função da imagem – ou dos recursos semióticos – na
construção dos significados que perpassam o texto? A res-
posta a essa pergunta ativaria os conhecimentos que os alunos
possuem sobre: o momento histórico; os sujeitos que estão

23 
“el interés describe la convergencia de un complejo de factores: historias sociales y
culturales, contextos sociales actuales, incluso estimaciones del productor de los signos
acerca del entorno comunocativo”.
24 
Seria interessante que, antes da atividade proposta, o professor sugerisse alguma leitura
sobre multimodalidade. Poderia ser indicado, por meio do google classroom, o capítulo 2
do livro de DIONÍSIO (2014).

74
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

envolvidos no evento comunicativo; a situação socio- eco-


nômica específica do momento etc. Dionísio (2014) explica
o porquê da importancia da pergunta supracitada: “observar
a cumplicidade entre gênero textual, linguagens e áreas do
conhecimento é fundamental, visto que gráficos, tabelas,
mapas, desenhos anatômicos, por exemplo, apresentam con-
venções que vão além das do sistema linguístico” (p. 14).
A aula e, consequentemente, a pergunta seriam refe-
rentes à compreensão da charge:

Imagem 1: Texto base para aula

https://gauchazh.clicrbs.com.br/opiniao/noticia/2020/03/gilmar-fraga-
-fantasia-ck7pbvcae03zz01pqgph2093v.html

A multimodalidade pressupões que os significados que


atravessam o texto são construídos por meio de uma multi-
plicidade de modos. Assim, a aula de língua portuguesa deve
se concentrar na análise e na reflexão dos recursos usados
para gerar sentido dentro dos textos selecionados. Segundo
Dionísio (2014), Kress e Van Leeuwen (1996) defendem que a

75
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

imagens não são modos neutros, pelo contrário “o social e o


cultural são influenciadores dos significados potenciais que
a imagem pode encapsular”. É, por isso, trabalho do profes-
sor junto com o aluno desencapsular os significados sociais
e culturais que estão envolvidos nos modos que compõem o
texto. A leitura, dessa maneira, será feita sob um olhar crí-
tico e atento. “Os modos de representação verbal e visual não
meramente coexistem” (DIONÍSIO, 2014, p. 61), antes eles se
imbricam e (re)constroem um todo significativo. É preciso
dessa maneira que o professor esteja atento: “a imbricação
entre as somioses pode afetar a forma e a leitura da mensagem
veiculada” ((DIONÍSIO, 2014, p. 63).
Segundo Kress, Leite-Garcia, Van Leeuwen (2000), uma
análise de um texto multimodal sob a perspectiva da Semió-
tica social parte dos pressupostos: 1) “um conjunto de modos
semióticos está sempre envolvido em qualquer produção
ou leitura de textos”; 2) “cada modo tem suas potencialida-
des específicas de representação e comunicação, produzidas
culturalmente, mas inerentes a cada modo” e 3) “é necessário
entender a maneira de ler esses textos como textos coerentes
em si mesmos”25 (p. 388).
Desta maneira, os professores junto com os alunos
podem analisar os modos que compõe a charge e refletir sobre
os possíveis efeitos de sentido levando em consideração o
texto como um todo – um conjunto de signos – perpassado
por questões sociais, culturais e ideológicas.
Após a resposta dos alunos a primeira pergunta na
plataforma mencionada, o professor pode chamar atenção
para os personagens do texto e perguntar: quais são os signos
que permitem os leitores idenfificarem os personagens? O
25 
1) “un conjunto de modos semióticos está siempre involucrado en toda producción o
lectura de textos”; 2) “cada modo tiene sus potencialidades específicas de representación
y comunicación, producidas culturalmente pero inherentes a cada modo” e 3) “es preciso
comprender la manera de leer esos textos como textos coherentes en sí mismos”

76
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

primeiro personagem correspode a figura atual do presidente


do Brasil e pode-se identificá-lo pelas semelhanças entre o
sujeito e o desenho que o representa, além disso a faixa verde
e amarelo – cores que remetem ao Brasil – ratifica essa afir-
mação. O segundo personagem pode ser identificado como
Coronavírus, dentro da mídia ele tem sido recorrentemente
repersentado dessa maneira à semelhança de sua estrutura
micriscópica.

Imagem 2: Representação do Coronavírus

https://oglobo.globo.com/cultura/como-surgiu-imagem-que-virou-sim-
bolo-do-coronavirus-24343397

Pode-se refletir junto com os alunos: se o vírus é um


organismo microscopico, por que foi, no texto, representado
num tamanho agigantado? Há algum objetivo nessa represen-
tação aparentemente desproporcional? Para dar sequencia à
reflexão, o professor pode relembrar o discurso do presidente
no meio da crise quando classificou a pandemia como uma
“gripezinha” e perguntar: qual foi a extensão da crise cau-
sada pelo coronavírus? Atingiu apenas o Brasil? Ou afetou
outros países? Afetou apenas o sistema de saúde ou a crise
se estendeu para outros segmentos socais? Essas perguntas,
além de orientar a leitura do aluno, ajudará a turma ativar
os conhecimentos necessários para compreender a charge.

77
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

Num primeiro momento, Bolsonaro aparece sombreado.


Inicialmente não se sabe pelo o que ou por quem. A fala do
personagem retratado retoma o tom recorrente de seus dis-
cursos: “Muito do que tem ali é muito mais fantasia, não é isso
tudo que a grande mídia propaga...”. O residente questiona a
veracidade do que é informado pela mídia e afirma que tudo
não passa de uma fantasia. Minimiza um problema mundial
ao redizí-lo a mera fantasia criada pelos sistemas midiáticos.
Num segundo momento, vemos o que causa a sombra
no presidente: o Coronavírus representado num tamanho
desproporcional, agigantado. Pode-se perguntar novamente
aos alunos: por que o virus foi representado dessa maneira?
O problema que o mundo enfrenta é pequeno ou grande?
Quantos mortos houve na Itália; França; Espanha; Brasil; EUA;
Coreia; China etc? Um problama que afeta todo o mundo, é
razoável classificá-lo como pequeno ou “fantasioso”? Houve
um propósito comunicativo e argumentativo do produtor do
signo ou retratar o vírus de uma maneira agigantada?
Além de deixar claro o posicionamento do escritor sobre
a pandemia que enfrentamos, o tamanho do vírus retoma o
discurso do presidente e põe em xeque o seu discurso: não
se trata de uma gripezinha ou muito menos se trata de uma
fantasia criada pela grande mídia.
Podemos verificar que o agente causador do sombrea-
mento na figura do presidente é o próprio vírus. A fala do
próprio presidente chama atenção para a sombra causada pelo
vírus – “sem sombra de dúvidas!”. A fala pode ser entendida
como um trocadilho jocoso – uma vez que o gênero textual tem
como objetivo fazer uma crítica política por meio do riso – ,
a expressão significa a certeza do que foi anteriormente dito,
mas ela mesma desautoriza a fala do presidente: sua certeza
não passa de uma asneira.
Depois de refletir sobre a charge com os alunos, pode-
mos solicitar a turma que se posicione sobre o assunto na

78
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

plataforma: isso é interessante para que o professor verifique


quais são as informações que os alunos têm sobre o assunto.
Podemos, também, lembrar de que forma, na libras, se marca
intensidade nos enunciados. Vale salientar que é possível
postar vídeo em outra plataforma, o Youtube por exemplo, e
enviar o link no Google Classroom. Um exemplo – como este
será sinalizado, seria interessante gravar e postar –: se eu
quisesse dizer que um rapaz é alto, como faria? Mas, se eu
quisesse dizer que ele é MUITO alto, como faria? Podemos
perguntar se há diferença. Depois se eu afirmasse que o pro-
blema causado pelo Coronavirus é grande, como o faria? E
se eu quisesse dizer que ele é MUITO grande? Há também
diferença de sentidos?26 Podemos seguir uma linha de racio-
cínio e mostrar que o uso da intensidade, dentro do discurso,
pode assumir peso argumentativo. Dessa forma tanto o uso
dos advébios de intensidade no discurso do presidente como
a representação do vírus num tamanho agigantado possuem
propósitos argumentativos.
Como a proposta de trabalho é português para surdos
e um dos objetivos primeiros é trabalhar o português escrito,
após a análise da charge – já com os conhecimentos ativados
sobre o assunto – solicitaríamos um posicionamento dos
alunos por escrito, a atividade deve também ser postada na
plataforma. O texto seria corrigido e repostado pelo professor,
e os alunos precisariam reescrevê-lo.

CONSIDERAÇÕES

O presente artigo foi, em parte, fruto da atividade de


extensão desenvolvida na UFPE intitulada, Ensino de língua
portuguesa para surdos: estratégias didáticas. Discutimos, teorica-
26 
Na Libras, a marcação de intensidade no enunciado se dá por meio da expressão facial;
ou na alteração do movimento do sinal ou ainda por uma intensificação na performance
de um sinal na fala. Aqui, a comparação entre a Libras e o português pode ajudar os surdos
a entenderem de que maneira a intensidade dá peso ao argumento do escrito do texto.

79
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

mente embasados, as melhores estratégias didáticas para a


aprendizagem efetiva da língua portuguesa escrita para alunos
surdos e pensamos como essas estratégias podem ser usadas
no atual momento de isolamento. Na literatura especializada,
defende-se recorrentemente o uso de imagens como um meio
eficaz de se alcançar os objetivos de ensino. No entanto, o uso
da imagem – ou de outros recursos – por si só não irá garantir
um ensino/ aprendizagem significativo. Nosso objetivo, por
esse motivo, foi refletir e embasar teoricamente, por meio
dos pressupostos da Semiótica Social, o porquê do uso de
recursos que exploram a visão é eficiente dentro de sala de
aula especialmente para alunos surdos.
Levando em consideração que “[...] o sistema linguís-
tico é apenas um dos modos de constituição dos textos que
materializam as nossas ações sociais” (DIONÍSIO, 2014, p.
41), selecionamos uma charge para usá-la como sustetáculo
para a nossa proposta, sendo essa uma sugestão de aula com o
objetivo primeiro: analisar o uso de advérbios de intensidade
e a “sintaxis visual” (KRESS, LEITE-GARCIA, VAN LEEUWEN,
2000, p. 376) na (re)contrução argumentativa do texto. Essa
proposta é flexível, ou seja, pode-se usar a proposta de aula
como base para outros tantos temas, além da possibilidade
do uso de outro gênero textual.
Sabendo que os modos que constituem o texto são usa-
dos e selecionados com propósitos comunicativos específicos
e são perpassados por questões históricas, culturais e sociais
– “A ideologia, portanto, é um fator dos modos [...]”27 (KRESS,
LEITE-GARCIA, VAN LEEUWEN, 2000, p. 375) –, cabe ao
professor junto com os alunos desencapsular esses sentidos
que atravessam o texto. A discussão inicial auxiliará os alunos
ativarem os conhecimentos necessarios para realizar uma
leitura significativa. Daí, o professor pode trabalhar diversos
temas e explorar outras tantas atividades de leitura/ escrita.

27 
“La ideología es, entonces, un factor de los modos [..]”

80
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

REFERÊNCIAS

BARBOSA, Eva dos reis. Português como segunda língua e multimo-


dalidade: análise de um vídeo tutorial para alunos surdos. Revista
Escrita. Rio de Janeiro, ano 2017, n. 22, fev. 2017.

DIONÍSIO, Angela Paiva. Multimodalidades e leituras: funciona-


mento cognitivo, recursos semióticos, convenções visuais. Recife:
Pipa Comunicações, 2014.

ECKERT, A.; HIGGINS, D. [Ilustração médica do Coronavírus].


Disponível em: https://oglobo.globo.com/cultura/como-surgiu-ima-
gem-que-virou-simbolo-do-coronavirus-24343397

FERNANDES, Sueli F. Práticas de letramento na educação bilíngue


para surdos. SEED: Curitiba, 2006.

FRAGA, Gilmar. Fantasia. Charge. Disponível em: https://gauchazh.


clicrbs.com.br/opiniao/noticia/2020/03/gilmar-fraga-fantasia-
-ck7pbvcae03zz01pqgph2093v.html

FREIRE, PAULO. Pedagogia da Autonomia. Rio de Janeiro: Paz


e Terra, 1996.

GOLDFELD, Marcia. A criança surda: linguagem e cognição


numa perspectiva sociointeracionista. São Paulo: Plexus Edi-
tora, 2002.

GUALBERTO, Clarice L.; SANTOS. Záira B. dos. Multimodalidade


no contexto brasileiro: um estado de arte. D.E.L.T.A. São Paulo,
vol.35, n.2, p. 1- 30, Aug 12, 2019.

GIDDENS, A. As consequências da modernidade. São Paulo:


Editora UNESP, 1991. (Trad. de Raul Fiker)

LACERDA, Araújo Inês. Do signo ao discurso: introdução à filosofia


da linguagem. São Paulo: Parábola Editorial, 2004.

KRESS, G; VAN LEEUWEN, T. Reading images: the gramar of


visual design. London: Routledge, 1996.

81
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

KRESS, G.; LEITE-GARCIA, R.; VAN LEEUWEN, T. Semiótica Discur-


siva. In: VAN DIJK, T.A. El discurso como estructura y processo.
Barcelona: Gedisa Editorial, 2000.

SACKS, Oliver. Vendo vozes: uma viagem ao mundo dos surdos.


São Paulo: Companhia das letras, 2010.

XAVIER, A. Carlos. Desafio do hipertexto e estratégias de sobre-


vivência do sujeito contemporâneo. Estudos de Lingua(gem). V.
13, n. 4, p. 73- 90, 2015.

82
O OLHAR DA ORIENTAÇÃO
EDUCACIONAL NA FORMAÇÃO
INTEGRAL DO ADOLESCENTE
EM TEMPOS DE PANDEMIA:
POSSIBILIDADES E DESAFIOS

Caroline Becker28
Clarice Conter29
Suzana Diemer 30

INTRODUÇÃO

Múltiplos olhares e saberes de diferentes profissionais


da área educacional são fundamentais, por meio de uma
gestão pedagógica articulada, para o desenvolvimento de um
projeto educativo que visa à formação integral dos estudantes.
A educação integral não significa horário integral, segundo
Gadotti (2009), “o que se propõe na educação integral é inte-
gralidade, isto é, um princípio pedagógico, no qual o ensino
da língua portuguesa e da matemática não está separado da
educação emocional e da formação da cidadania” (GADOTTI,
2009, p. 41). Assim o que se pretende é o desenvolvimento de

28 
Doutora e Mestre em Educação. Psicopedagoga e Especialista em Neurocognição e
Aprendizagem. Orientadora Educacional da Rede Marista. E-mail: carolbeckerr@gmail.com
29 
Mestre em Gestão Educacional. Especialista em Psicopedagogia Institucional e em
Gestão Curricular Marista. Orientadora Educacional da Rede Marista. E-mail: clarice-
conter@yahoo.com.br
Especialista em Psicologia Escolar e Psicóloga. Orientadora Educacional na Rede
30 

Marista. E-mail: sudiemer@gmail.com

83
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

diferentes competências, sejam elas acadêmicas, tecnológicas,


políticas e ético-estéticas.
O texto das Diretrizes Curriculares Nacionais da Edu-
cação Básica expressa a compreensão da aprendizagem como
“ação coletiva conectada com a vida, com as necessidades,
possibilidades e interesses das crianças, dos jovens e dos
adultos” (BRASIL, 2013, p. 26). Nesse sentido, a formação
integral exige de todos os sujeitos que compõem a escola,
sejam eles estudantes, professores, funcionários, gestores e
familiares, a compreensão de que somos sujeitos em formação,
inacabados, que crescem, mudam e se constituem nesse jogo
de trocas e aprendizagens, sejam elas cognitivas ou sociais.
A escola é espaço / tempo de socialização, de aprender a
conviver para além das normas e combinações da família, de
reconhecer diferenças. Lugar que implica em corporeidade,
onde se aprende o que é público e privado, onde se reconhece
diferenças entre as pessoas, tanto físicas quanto culturais e
se trabalha a importância do respeito. Esse convívio de dife-
renças implica em conflitos necessários, em que os sujeitos se
transformam mediante a forma como vão lidando com eles.
A construção da noção de coletividade é um dos fundamentos
da educação integral, da formação do cidadão.
E é neste espaço de “pessoas” que acontecem
as relações. E estas vão constituindo e vão
transformando os sujeitos deste contexto.
A escola é uma instituição social e, para
tanto, pode manter ou transformar uma
sociedade. Ela também pode ser o lugar do
confrontar-se com o outro, discutir, fazer
política, de exercitar a autorregulação do
grupo, de trabalhar as questões éticas,
democráticas, da participação na fala e
na escuta. (CONTER, 2018, p. 75).

Pensamos, sonhamos e propomos uma escola num con-


texto de um lugar físico, concreto, presencial, espaço / tempo

84
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

de convivência, de troca de olhares, de conexões possíveis,


relacionada à posturas corporais. Lugar de diálogo, de des-
cobertas, de produções e de afeto. Lugar também de desafios,
onde é preciso abrir mão do conhecido para se aventurar no
que se vai conhecer. Espaço também de se autoconhecer, de
se ver por entre o olhar do outro, de enfrentar frustrações, de
compreender que o erro faz parte do aprender, a importância
de fazer de novo até acertar, de superar a si mesmo e de obter
reconhecimento. Lugar de formação de identidades.
Entretanto em 2020, mais especificamente no dia 11
de março, a Organização Mundial da Saúde (OMS) declarou
a situação de pandemia, decorrente do aumento significativo
dos casos diagnosticados da doença Covid-19, por todo o
mundo. No Brasil, o aumento exponencial da incidência da
doença, desencadeou o fechamento de todas as escolas, em
meados do mês de março. Desse modo, deparamo-nos com
um cenário que nos obriga ao afastamento social. Foi e ainda
tem sido preciso ficar em casa e evitar contatos físicos com
as pessoas. Situação que a princípio parecia ser por pouco
tempo, entretanto foi se ampliando, exigindo capacidade de
adaptação e resiliência. A tecnologia, entendida por muitos,
como um problema para os jovens, ou motivo de afastamento
das pessoas que dedicavam muito tempo ao seu uso, apresen-
tou-se como alternativa para as aproximações, salvando-nos
de ficarmos ilhados e sem conexão.
Rapidamente entendemos que era preciso manter as
rotinas para enfrentar a situação e seguir vivendo. Não era
possível fazer tudo do mesmo jeito, algumas questões neces-
sitaram de adaptação. A escola se organizou e precisou se
reinventar termo muito usado atualmente. Foi preciso aprender
mais sobre as ferramentas tecnológicas e fazer uso delas, para
dar continuidade ao trabalho escolar. Em muitos contextos,
com materiais no ambiente virtual e aulas síncronas permiti-
ram a continuidade das atividades que envolvem a cognição.

85
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

Em outros contextos menos favorecidos, a falta de acesso a


equipamentos eletrônicos e à internet, potencializa as dispa-
ridades sociais e se torna, mais um indicador de desigualdade.
Para as escolas que seguiram com seu propósito na
pandemia, suas práticas passaram a ser nomeadas como
Ensino Remoto Emergencial (ERE). E agora? Que escola é
essa? O professor fala por uma tela e, o estudante, em casa,
assiste e realiza as atividades propostas? Ou se diz presente
e se envolve com outras tarefas? Onde foi parar os olhares e
os “não ditos” que caracterizam a comunicação presencial?
Que conexões são possíveis e positivas nesses tempos de
relações virtuais? Quais os impactos no desenvolvimento
dos adolescentes em formação?

DESENVOLVIMENTO

Quando Bauman (2007) se refere a tempos líquidos e


traz a noção de que, no mundo em que vivemos tudo está em
constante mudança, ele nos ajuda a pensar que os tempos de
pandemia exigem criar novas formas do fazer escola. Nesse
sentido, quando se refere que assim, como o mundo muda e,
nós, seus moradores, também precisam estar prontos para
mudar, refere-se à busca de mais informações e à quantidade
delas disponíveis.
Ao refletirmos sobre a escola e sobre a formação integral,
precisamos falar acerca do papel da orientação educacional,
sobretudo em um contexto de pandemia. O orientador educa-
cional é responsável por acompanhar, articular e desenvolver
atividades que visem o pleno desenvolvimento dos diversos
sujeitos envolvidos na escola. É o profissional que propõe
questões como: que desafios esse isolamento social nos coloca?
O que é possível criar como possibilidade de conexão?
Partimos do entendimento de que é preciso dar voz; a
palavra precisa ser dita, a palavra de cada um desses sujeitos

86
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

da escola. Mais do que nunca precisamos de espaços de fala


e de escuta, de exercício de empatia, de reconhecimento do
público e do privado. Novas combinações precisam ser pen-
sadas, propostas, refletidas e combinadas. As redes sociais se
fazem necessárias, pois somos seres gregários, precisamos dos
outros e, nesse momento, este é o espaço da interação social.
Considerando a importância que os pares têm na adolescência
e a necessidade de interação na busca da formação da iden-
tidade, o uso das redes sociais se tornou ainda mais intenso.
Estudos e reflexões acerca do pensamento adolescente
buscam elucidar, ao longo da história, os processos men-
tais estabelecidos nesta fase do desenvolvimento humano,
caracterizada por conflitos e mudanças intensas no compor-
tamento. Compreender a forma como se processa o pensa-
mento, possibilita a busca por estratégias mais eficazes para
o desenvolvimento cognitivo, um dos propósitos que justifica
a existência da instituição escolar. Com o surgimento dos
exames de neuroimagem, ampliaram-se as possibilidades na
investigação para o mapeamento dos processos cognitivos,
o que tem avançado significativamente as pesquisas sobre
aprendizagem e cognição.
Entretanto, as pesquisas e contribuições de Jean Piaget
(1896-1980) ainda são bastante relevantes para a compreen-
são do pensamento, em uma perspectiva da epistemologia
genética, o que impulsionou a teoria cognitiva em seu tempo,
tornando-o um dos nomes mais citados, sobretudo na área da
Educação, quando o assunto é cognição. Destaca-se que, em
sua obra, o autor compreende a adolescência como o período,
em que o indivíduo passa a integrar a sociedade dos adultos.
Para ele, não cabe estabelecer a relação pensamento formal e
puberdade, já que o período da puberdade é um fator menos
variável, do que o período de integração no mundo dos adultos
nas diferentes culturas, o que inclui uma reestruturação da

87
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

personalidade, sendo que o aspecto intelectual complementa


ou acompanha o aspecto afetivo.
Inhelder e Piaget (1976) manifestam preocupar-se com a
interpretação errônea que pode surgir desta afirmativa, já que
toda pesquisa de Piaget está vinculada à maturação orgânica
dos processos cognitivos. Por isso, o autor reforça a relação
entre o amadurecimento orgânico - estruturas cerebrais - e
a condição de um pensamento formal, entretanto essa não
é uma ligação simples, pois, para os autores, a constituição
do pensamento formal depende do meio social, o que fica
reduzido significativamente, em um contexto de pandemia.
Destacam-se pontos relevantes decorrentes da interação
indivíduo e sociedade: a compreensão de que as estruturas
formais não são inatas e o conjunto das experiências, des-
tacando a importância dos exercícios feitos pelo indivíduo
neste esforço de adaptar-se ao mundo físico e social. Impor-
tante compreender o adolescente como um indivíduo que se
coloca em igualdade aos adultos e que passa a julgá-los em
um plano de total reciprocidade, também que se encontra
em um período reflexivo acerca de suas ambições presentes
e futuras no contexto social.
Talvez esses sejam os grandes desafios do isolamento
social, causados pela pandemia da Covid-19: a imprevisibili-
dade do futuro, dificultando o planejamento, os sonhos e as
ambições dos adolescentes; a falta de interação social com
seus pares e a garantia de espaços de pertencimento, diante
da constância do olhar da família; a falta de oportunidades de
se experienciarem, enquanto ingressantes no mundo adulto;
a falta da escola como espaço de interação e de desenvolvi-
mento pela diferença: nesta situação, os adolescentes estão
restritos às relações estabelecidas em seus contextos culturais
e familiares.
Para Inhelder e Piaget (1976) a criança não constrói
sistemas e nem é capaz de saber que não realiza, pois seu

88
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

pensamento não é autorreflexivo. Ao contrário, o adoles-


cente constrói teorias e é capaz de refletir sobre o seu próprio
pensamento. Ainda que suas teorias possam se apresentar de
forma limitada, pouco originais ou inadequadas, essa habili-
dade é fundamental, para que o adolescente possa integrar-se
moralmente e intelectualmente na sociedade dos adultos,
além de ser capaz de refletir sobre suas aspirações, projetos
e mudanças de vida.
Neste sentido, pode-se afirmar, segundo Inhelder e
Piaget (1976), que o adolescente passa a não se contentar mais,
em viver relações interindividuais proporcionadas pelo seu
ambiente, tão pouco com a utilização da sua inteligência
aplicada à resolução de problemas momentâneos. Ao colo-
car-se no mundo social dos adultos, necessita compartilhar
ideias, ideologias de um grupo mais amplo, utilizando como
mediação certo número de símbolos verbais, que antes o
eram indiferentes quando criança, o que se caracteriza pelo
pensamento formal. Dessa maneira, o pensamento formal
constitui a reflexão da inteligência sobre si mesma e uma
inversão das relações entre o possível e o real. A capacidade
adquirida, por meio do pensamento formal possibilita ao
adolescente compreender a sua realidade e projetá-la, de
forma abstrata, para a resolução de dois pontos apontados
por Piaget e comuns na condição do adolescente: o plano de
vida e a reforma da sociedade.
Inhelder e Piaget (1976) apresentam uma forma de ego-
centrismo presente na transição para o pensamento formal.
Após retomar os períodos de egocentrismo nas etapas ante-
riores, nomeia o egocentrismo na fase do pensamento formal
como egocentrismo superior, ao identificar que o adolescente,
não procura apenas adaptar o seu eu ao ambiente social, mas
também adaptar o ambiente social ao seu eu, pois ao refletir
sobre o ambiente, em que procura inserir-se, pensará não
somente nas suas atividades sociais nesse ambiente, mas

89
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

também nos meios para transformá-lo. Resultante disto, o


adolescente estabelece a indiferenciação entre o seu ponto de
vista e o ponto de vista do grupo que ele deseja transformar.
Em um cenário de distanciamento social, como o que vive-
mos atualmente, tais ações ficam restritas às poucas relações
sociais que o adolescente vivencia o que parece intensificar
os dilemas comuns a essa fase do desenvolvimento humano.
O autor faz um comparativo entre o egocentrismo
do adolescente e uma espécie de messianismo, como se o
adolescente se sentisse chamado a realizar uma atividade
transformadora, baseada nas suas teorias de representação
de mundo. Estabelecendo relação entre os aspectos gerais
deste fenômeno e as teorias abstratas elaboradas pelos ado-
lescentes, é possível identificar um programa de ação com
uma ambição ingênua e comumente desmedida, o que para
Inhelder e Piaget (1976) pode sugerir uma espécie de jogo
superior com funções de compensação e participação em
ambientes realmente inacessíveis.
O ponto alto de sua contribuição, acerca do pensamento
adolescente parece estar na compreensão de que, qualquer
dos patamares do desenvolvimento da Teoria Piagetiana,
conduz o indivíduo do egocentrismo à descentração e que,
portanto, o fato de adicionar conhecimento a outro não é
suficiente para a formação de uma atitude de objetividade.
É neste processo, em que o adolescente supera essa relativa
indiferenciação inicial e idealista para a percepção real, que
o adolescente ingressa de fato na vida adulta.
Outro aspecto relevante é a necessidade de perten-
cimento a grupos, identificada na adolescência, quando o
indivíduo apresenta tendência a se reunir em grupos com
semelhantes. Para o autor, essa prática é bastante relevante
no desenvolvimento do indivíduo, tanto na esfera intelectual
quanto moral, pois será principalmente na discussão com
os colegas, por meio da crítica do outro, que o adolescente

90
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

descobrirá quão frágil são as suas teorias, possibilitando o


processo de descentralização.
Ao considerarmos a adolescência como o período da
integração no universo social adulto é compreender também
como a idade de formação da personalidade, já que estes são
processos complementares e indissociáveis. Tanto o programa
de vida, quanto o plano de reformas, apresentados por Piaget
como pontos principais na conduta do adolescente, analisados
pela perspectiva das funções cognitivas e/ou do pensamento,
em que pode ser considerado o motor afetivo da formação da
personalidade. Para o autor, as aquisições afetivas fundamen-
tais na adolescência são paralelas, e não menos importantes,
do que as aquisições intelectuais. Reforça ainda a ideia de
compreensão do indivíduo, como um todo considerando seu
aparato e maturação orgânica, os estímulos do meio em que
está inserido, a formação da sua personalidade diante das
experiências de vida e a afetividade como condição subjetiva.
No campo educacional, todos esses aspectos teóricos
subsidiam o fazer pedagógico, pelo olhar da orientação educa-
cional. Em um processo que visa à formação integral do estu-
dante, neste capítulo, com enfoque no estudante adolescente, o
trabalho da Orientação Educacional estrutura-se em propostas
que promovam o diálogo e a escuta, comprometido com uma
prática libertadora, crítica, educativa, reflexiva e integral. Ele
é carregado de esperança, de expectativas e de desejos.
A escuta sensível reconhece a aceitação
incondicional do outro. Ela não julga, não
mede, não compara. Ela compreende sem,
entretanto, aderir às opiniões ou se iden-
tificar com o outro, com o que é enunciado
ou praticado (BARBIER, 2004, p. 94).

A escola é uma rede de escuta e de afeto e precisa estar


aberta a discussões. Neste contexto, o papel do Orientador
Educacional, como mediador de todo processo, é fundamental.

91
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

Dentre tantas questões que permeiam o fazer da orien-


tação educacional, o isolamento social, em tempos de pan-
demia, tem sido uma delas. O isolamento exige de todos nós
a capacidade de organização, de autogestão, autorregula-
ção, resiliência e de abertura ao novo, ao desconhecido. E no
período da adolescência, tudo é vivenciado de maneira mais
intensa, pois o estabelecimento de uma rotina, a convivência
social e o sentimento de pertencimento são determinantes
como já citados anteriormente. As relações e os contatos são
estruturantes na vida psíquica, e no período da adolescência
se tornam ainda mais relevantes.
Precisamos refletir acerca desses estudantes/sujeitos
que estão em nossas instituições de ensino, em que possuem
suas histórias, suas individualidades, seus desejos, suas angús-
tias e alegrias. E nesse período de isolamento, é de extrema
importância que, como instituição educativa, fiquemos atentos
a estas individualidades e a esta nova maneira de se relacionar,
de um modo “não presencial”, pois algumas incertezas do
período podem gerar ansiedade, angústia, estresse e outras
questões emocionais.
Assim sendo, reconhecemos a escola como
lócus privilegiado para o desenvolvimento
socioemocional e cognitivo, a partir e com
o outro. A escola não é perfeita em seu
propósito, nem tampouco está acima das
críticas. No entanto, nela, há uma rede de
profissionais que, coletivamente, refle-
tem e buscam aprimorar as ações por eles
propostas. Dessa maneira, a criança que
frequenta o espaço escolar pode contar com
uma diversidade de olhares e de perspec-
tivas que não haverá na intimidade do seu
lar. A escola torna-se, portanto, um mundo
de diversidades em que a criança amplia a
aquisição da cultura e do seu próprio olhar,
na medida em que outros olhares são com-
partilhados. Desta forma, a escola não é

92
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

reduzida a um espaço de socialização e de


aquisição do conhecimento. A escola é um
espaço de experiências e de existências.
(BECKER et. al., 2020, p. 10).
Ao mesmo tempo, o confinamento pode proporcionar
aos adolescentes oportunidades significativas de autocontrole
e autoconhecimento. E quais seriam as possibilidades de con-
tribuição, reflexão e intervenção do Orientador Educacional
na promoção da saúde mental e no equilíbrio emocional dos
adolescentes, neste tempo de isolamento?
Manter a rotina e os vínculos com a escola são importantes,
pois trazem segurança, ajudando a manter a estabilidade
emocional que é tão significativa no período da adolescên-
cia. Promover momentos, em que o adolescente possa ter a
experiência de aprender a lidar com as suas emoções, espaços
para significar as vivências no contexto de pandemia, como
rodas de conversa, assembleias de turma, encontro com os
professores conselheiros (tutores), são ações significativas
na manutenção dos vínculos. Ressaltamos a importância
da mediação do adulto nesse processo de autorregulação,
para que auxilie o adolescente na compreensão das próprias
emoções e no desenvolvimento de recursos, para que possa
lidar com elas de forma saudável e preventiva.
É comum o adolescente, em um pensamento egocên-
trico, manifestar sentimentos de injustiça ou de perceber-se
como vítima. A promoção de momentos de escuta do coletivo
e de compreensão da importância de um comportamento pau-
tado na alteridade e na empatia, sobretudo, em um momento
de pandemia e de vulnerabilidade é importante, para a cons-
trução do senso de coletividade e do comprometimento com
a própria saúde e a do outro. Momentos assim são oportuni-
dades, para o desenvolvimento da criticidade, da autoria, da
autonomia e de uma formação integral.

93
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

Em relação ao convívio social que foi interrompido, as redes


sociais passam a ser mais relevantes e sua função se amplia
mais pelas atividades propostas pela escola. Usar a tecnologia
a seu favor, neste momento, é crucial. Vale lembrar também
da importância da Orientação Educacional trabalhar com
os adolescentes, o “uso seguro das redes sociais”, pois é de
extrema importância que este canal seja utilizado com limite
e supervisão. Marcar vídeo chamadas com os amigos, contar
novidades, trocar ideias sobre filmes e séries, são formas de
se conectar de maneira afetiva e fortalecer os vínculos.
O envolvimento em ações solidárias e protagonismo estudan-
til são questões relevantes, para se pensar em novas pos-
sibilidades, em tempos de isolamento social. A Orientação
Educacional tem um papel determinante na formação desse
sujeito crítico, comprometido com os aspectos sociais. Pla-
nejar e dedicar tempo na rotina das atividades escolares para
o envolvimento, em ações solidárias e cuidados com o outro,
pode auxiliar o adolescente a manter o equilíbrio e o controle
emocional, além de trabalhar habilidades como: tomada de
decisão e promoção de um olhar empático.
Num mundo globalizado, transnacional,
nossos alunos precisam estar preparados
para uma leitura crítica das transforma-
ções que ocorrem em escala mundial. Num
mundo de intensas transformações cientí-
ficas e tecnológicas, precisam de uma for-
mação geral sólida, capaz de ajudá-los na
sua capacidade de pensar cientificamente,
de colocar cientificamente os problemas
humanos. Por outro lado, diante da crise
de princípios e valores, resultantes da
deificação do mercado e da tecnologia, do
pragmatismo moral ou relativismo ético,
é preciso que a escola contribua para uma
nova postura ético-valorativa de recolocar
valores humanos fundamentais como a
justiça, a solidariedade, o reconhecimento

94
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

da diversidade e da diferença, o respeito


à vida e aos direitos humanos básicos,
como suportes de convicções democráti-
cas (LIBÂNEO, 2003, p. 8).
Outro aspecto importante a ser considerado, como
uma excelente possibilidade na perspectiva de uma educação
integral é o trabalho das competências socioemocionais.
O conceito no qual compreendemos como
imprescindível para a definição de educa-
ção integral é aquele que considera o sujeito
em sua condição multidimensional, não
apenas na sua dimensão cognitiva, como
também na compreensão de um sujeito
que é corpóreo, tem afetos e está inserido
num contexto de relações. Isso vale dizer
que a compreensão de um sujeito deve ser
considerada em sua dimensão bio-psicos-
social. Acrescentamos, ainda, que o sujeito
multidimensional é um sujeito desejante,
o que significa levar em conta que, além da
satisfação de suas necessidades básicas, ele
tem demandas simbólicas, busca satisfação
nas suas diversas formulações de realiza-
ção, tanto nas atividades de criação quanto
na obtenção de prazer nas mais variadas
formas (GONÇALVES, 2006, p.130).
Diante desta concepção de Educação Integral, podemos
dizer que, em um momento de pandemia, o trabalho com
habilidades socioemocionais pode ser um grande aliado na
superação dos desafios que possam ocorrer.

CONSIDERAÇÕES

O Orientador Educacional, na perspectiva da integra-


lidade do sujeito, tem o seu papel como mediador e dinami-
zador de ações que contemplem propostas pedagógicas, em
parceria com o corpo docente, que trabalhem a empatia, o

95
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

foco e persistência, a responsabilidade, o autoconhecimento,


a resiliência, a autoconfiança e outras habilidades.
Algumas possibilidades de interação com os adolescen-
tes são trabalhos em parceria com os professores, de tal forma
que, os estudantes se conscientizem que estar em isolamento,
não significa estar sozinho e nem tampouco ter um compor-
tamento individualista. Ressaltar a importância de manter
contato com as pessoas como atitude saudável para a saúde
mental. Outra possibilidade importante é de criar rotinas
diárias, prevendo momentos de estudo, de descanso e de lazer.
De todas as possibilidades e propostas de trabalho, em
tempos de pandemia, o que precisamos destacar é que tudo
que estamos vivendo é de extrema importância e de profundas
reflexões, que podem produzir tantas aprendizagens quanto
às habilidades acadêmicas de um contexto escolar.
Que permaneça a escuta ao outro, o compromisso com
esse “novo” mundo que estamos construindo, com esta socie-
dade que estamos vivendo. Que possamos refletir com nossos
estudantes e professores sobre empatia e alteridade. E pensar:
que tipo de cidadãos seremos no pós-pandemia? Que lições
serão aprendidas de tudo que vivemos? A lógica da educação
será a mesma? De tudo, no meio de tantas incertezas, uma
certeza nós temos: a orientação educacional sempre será
partícipe desse processo, nas mais adversas circunstâncias
que envolvam o fazer escolar pautado na formação integral
dos sujeitos.

REFERÊNCIAS

BARBIER, R. A pesquisa-ação. Tradução Didio, L.. Série Pesquisa


em Educação, v. 3, Brasília, Líber Livro Editora, 2004.

BAUMAN, Zygmunt. Tempos líquidos. Rio de Janeiro: Jorge


Zahar, 2007.

96
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

BECKER. Caroline; GRANDO. Katlen Bohm; HATTGE. Morgana


Domênica. Educação domiciliar, diferença e construção do
conhecimento: contribuições para o debate. Revista Práxis
Educativa. V. 15, p. 1-12, 2020.

CONTER, Clarice. A prática das assembleias de classe em uma


escola da rede marista e sua relevância na concepção da edu-
cação integral. 2018.142f. Dissertação (Mestrado profissional em
Gestão Educacional) - Programa de Pós Graduação em Gestão Edu-
cacional, Universidade do Vale do Rio dos Sinos (UNISINOS), São
Leopoldo, 2018. Disponível em: http://www.repositorio.jesuita.org.
br/bitstream/handle/UNISINOS/7281/Clarice%20da%20Silva%20
Conter_.pdf?sequence=1&isAllowed=y. Acesso em: 10 jul. 2020.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários


à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra. 1996.

GADOTTI, Moacir. A escola e o professor: Paulo Freire e a paixão


de ensinar. São Paulo: Publisher Brasil, 2007.

GONÇALVES, Antonio Sérgio. Reflexões sobre educação integral


e escola de tempo integral. IN: Cadernos CENPEC / Centro de
Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária.
Educação Integral. Nº 2 (2006). São Paulo: CENPEC, 2006.

INHELDER, Bärbel e PIAGET, Jean. Da lógica da criança à lógica


do adolescente. São Paulo: Pioneira, 1976. Pág. 249-260, capítulo 18.

LIBÂNEO, J. C. et al. Educação Escolar: políticas, estrutura e orga-


nização. São Paulo: Cortez, 2003.

97
REVISÃO SISTEMÁTICA: EDUCAÇÃO EM
TEMPOS DE COVID-19

Andreia de Bem Machado31

INTRODUÇÃO

Ao longo da história, a educação passou por várias modi-


ficações e muitas delas intersectam o avanço das tecnologias.
Nesse percurso, o educador passou de detentor a mediador
do conhecimento e, daí, a professor de navegação. O conhe-
cimento está na nuvem. São barcos movidos a vento que nos
levam onde se oculta o que queremos conhecer.
Nesse avanço para além do conceitual, tem-se a expan-
são de diferentes metodologias educacionais como novas
formas de ensinar e aprender. Nesse cenário, estamos nos
reinventado em meio às tecnologias inovadoras atreladas
aos meios de comunicação. O ser humano vive em um mundo
interconectado por redes de relações dinâmicas e fluidas – o
que exige a necessidade de mudanças nas instituições de
ensino (MACHADO; SILVA; SPANHOL, 2017).
Na formação de profissionais para os diversos cam-
pos do conhecimento, surge, mediante a pandemia do novo
coronavírus, as discussões referentes ao processo de ensino
aprendizado, visando a formação do profissional com compe-

31 
Doutora em Engenharia e Gestão do Conhecimento, Mestrado em Educação Cientifica
e Tecnológica e graduação em Pedagogia. Atua como professora na Faculdade Municipal
de Palhoça e na Faculdade do Vale Itajaí Mirim.

98
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

tências e habilidades para reorganização do seu planejamento


em tempos de pandemia.
Para legitimar inquietações como essas, surge a Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) com ações
voltadas a conhecimentos e práxis do contexto do estudante,
exigindo uma escola voltada a um serviço especializado à
população, estabelecendo com ela uma relação de reciproci-
dade (BRASIL, 2009). Assim, as instituições de ensino tiveram
que passar por mudanças em suas práticas pedagógicas na
tentativa de aproximarem das demandas da realidade social
e também motivando docentes e discentes a articular novas
redes de conhecimento. Essas redes de conhecimento são
ligadas à modalidade de ensino desenvolvidas em tempos e
espaços diferentes. É importante retomar isso em contextos
como o atual, em situação de pandemia, mas utilizando novas
práticas e didáticas em tempos que o ensino presencial não
se faz possível.
Nesse contexto, procurou-se optar pela modalidade
não presencial, conforme diretrizes do Conselho Nacional
de Educação (CNE) que aprovou, no dia 28 de abril de 2020,
as orientações para escolas da educação básica e insti-
tuições de ensino superior durante a pandemia do novo
coronavírus (BRASIL, 2020). Nesse momento, adotou-se
ferramentas e metodologias para serem usados durante
o isolamento social necessário para o enfrentamento da
pandemia (de uma doença infecciosa, altamente contagiosa
e que afeta o mundo inteiro). Fez-se essencial adotar as
novas diretrizes, pois são embasadas na Lei de Diretrizes
e Bases da Educação Nacional, em que diz que “o ensino
fundamental será presencial, sendo o ensino a distância
utilizado como complementação da aprendizagem ou em
situações emergenciais” (BRASIL, 2009).
Por conseguinte, ao compararmos a educação a dis-
tância ao ensino não presencial, percebemos que estamos

99
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

tratando de duas situações, de momentos e de modalidades


diferentes. A adoção do ensino não presencial foi necessária
para que a educação no Brasil não parasse, foi um replane-
jamento necessário, momentâneo e emergencial, em que os
docentes, de suas residências, refazem aulas, replanejam
e reinventam o seu fazer pedagógico para manter o anda-
mento do ano letivo. Sendo que as aulas e atividades, que
antes eram realizadas presencialmente, nesse momento de
pandemia são enviadas por meio de plataformas virtuais
e meios digitais.
Nesse cenário em que a flexibilidade do ensino faz-se
necessária, optou-se pela modalidade não presencial no que
tange ao momento de aprendizado no contexto das casas
dos estudantes, onde esses são mediados por tecnologias de
informação e comunicação e assim fazem acesso ao conhe-
cimento, o que permite o ensinar e aprender em diferentes
plataformas digitais.
A modalidade não presencial assemelha-se muito à
educação a distância (EaD), porém a diferença entre elas é
que na EaD as interações ocorrem em interações geográficas
diversas, ou seja, em locais muito distante uns dos outros.
Enquanto na modalidade não presencial as localizações geo-
gráficas são em diferentes bairros da mesma cidade.
Com base nessa contextualização, o problema de pes-
quisa é saber qual o estado da arte da educação em tempos
de Covid-19. Para tanto, o artigo está organizado em três
seções: na primeira aqui explicitada, intitulada de introdução,
apresenta-se o contexto da pesquisa; na segunda, descre-
ve-se o desenvolvimento da pesquisa, em que se abordou a
modalidade não presencial de ensino adotada no momento
de pandemia no Brasil e também os caminhos metodológicos
para o estado da arte da educação nos tempos de pandemia,
bem como apresenta-se os dados, os resultados e uma aná-

100
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

lise bibliométrica dessa pesquisa; na terceira seção, faz-se as


considerações finais.

DESENVOLVIMENTO

No processo de ensino-aprendizagem, inicia-se a


comunicação para transposição de conhecimentos e tam-
bém para o compartilhamento de saberes. Nesse contexto,
em momentos de pandemia no Brasil foram adotadas dire-
trizes para orientar escolas da educação básica e instituições
de ensino superior durante o isolamento social, adotando a
oferta de atividades não presenciais em todas as etapas da
educação, iniciando no ensino fundamental o cumprimento
da carga horária obrigatória em ensino não presencial.
Assim, é essencial nesse processo a elaboração de guias
orientativos para as rotinas de atividades educacionais não
presenciais para orientação das famílias e estudantes, sob a
supervisão de professores e equipe diretiva das instituições
de ensino (BRASIL, 2020).
Nesse cenário, a modalidade de ensino não presencial
diferencia-se da modalidade de educação a distância nos
seguintes aspectos listados a seguir:

101
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

Quadro 1 – Diferenças entre aula em regime não presencial e educação


a distância

Características Aula em regime Educação a


não presencial distância
Legislação Diretrizes estabeleci- Decreto 9.057, de 25 de
das pelo CNE. maio de 2017.
Metodologia Medida extraordinária Tem uma metodolo-
orientada por manuais gia própria estabele-
confeccionados pela cida por uma equipe
instituição de ensino multidisciplinar.
prevendo encontro em
plataformas digitais.
Aulas Aulas ao vivo no dia Videoaulas.
e horário no ensino
presencial, que serão
gravadas e disponibili-
zadas para os estudan-
tes que não estiverem
presentes nesse dia.
Materiais Materiais adaptados Materiais elaborados,
e replanejados pelo padronizados e dese-
professor regente da nhados por uma equipe
turma. multidisciplinar em
conformidade com o
público-alvo do curso
que será ofertado.
Relações Interação entre pro- Interação entre pro-
entre ensino e fessor, conhecimento fessor, conhecimento,
aprendizagem e estudante. estudante, equipe mul-
disciplinar e tutor.
Conteúdo Utilização de dife- Utilização de dife-
rentes ferramentas e rentes ferramentas e
tecnologias digitais tecnologias digitais
para trabalhar com o para trabalhar com o
conteúdo. conteúdo.

102
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

Características Aula em regime Educação a


não presencial distância
Interações Atividades predomi- Atividades síncronas
nantemente síncronas. e assíncronas.
Calendário Calendário flexível, Calendário padroni-
conforme replaneja- zado, conforme ela-
mento da instituição borado na construção
de ensino. do plano para oferta do
curso.
Avaliações Avaliações adaptadas Avaliações
e centradas nas aulas padronizadas.
disponibilizadas nas
plataformas digitais.
Fonte: elaborado pela autora (2020)

No Brasil, para atender a demanda da educação em


tempos de Covid-19, foi adotada a modalidade de ensino não
presencial. E no mundo, quais foram as ações implementa-
das? Para responder a essa indagação, trabalhou-se a partir
de uma visão exploratório-descritiva, com o método indutivo
em que se tem como objetivo delinear o tema e ampliar a
familiaridade dos pesquisadores com o fato a partir de dados
suficientes, permitindo ao pesquisador inferir uma verdade
(MARCONI; LAKATOS, 2010).
Como método de pesquisa da literatura, utilizou-se
a busca sistemática em uma base de dados on-line, seguida
de uma análise bibliométrica dos resultados. A bibliometria
possibilita, a organização e análise quantitativa de dados
relevantes como: produção por região; temporalidade das
publicações; pesquisas por área do conhecimento; contagem
da citação do estudo; fator de impacto de uma publicação cien-
tífica entre outros. Essa análise permite a sistematização dos
resultados de uma pesquisa e a minimização da ocorrência de
possíveis vieses ao se olhar para uma determinada temática.

103
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

Para a análise bibliométrica, o estudo foi organizado


em três etapas distintas: planejamento, coleta e resultado. O
planejamento iniciou-se no mês de maio de 2020, quando a
pesquisa foi realizada. No escopo do planejamento, foi defi-
nida como relevante a base de dados Scopus32, devido à sua
contribuição no meio acadêmico, seu caráter interdisciplinar,
sua atualização constante e também por essa ser uma das
maiores bases de resumos e referências bibliográficas de
literatura científica revisada por pares.
Considerando-se que o problema de pesquisa, delimi-
tou-se, na fase de planejamento, os termos de busca. A saber:
“Learning in schools”, “Education” e “Covid-19”. Como princípio
básico para a busca, optou-se pela utilização dos termos nos
campos “title”, “abstract” e “keyword”, sem restrição temporal,
de idioma ou outra qualquer que possa limitar o resultado.
Na fase de coleta de dados, recuperou-se um total
de 18 trabalhos indexados, com registro datado de 2020,
momento em que a pandemia se faz presente em todos os
países do mundo.
Como resultado dessa coleta de dados, identificou-se
que os 18 trabalhos foram escritos por 70 autores, vincula-
dos a 56 instituições. Foram utilizadas 108 palavras-chave
para identificar e indexar as publicações, que se apresentam
distribuídas em seis áreas do conhecimento. Identificou-se
que, do universo de 18 trabalhos científicos, todos são artigos
revisados por pares compondo a amostra para uma análise
bibliométrica na área de Ciências Sociais, Psicologia, Ciência
da Computação, Energia, Engenharia e Medicamento. O que
permite tecer o estado da arte do tema a partir da base de
dados consultada.
Para a apreciação bibliométrica dos resultados, sele-
cionou-se as informações relevantes que foram classificadas

32 
Disponível em: http://www.scopus.com. Acesso em: 7 jul. 2020.

104
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

de acordo com: distribuição temporal; principais autores,


instituições e países em evidência; tipo de publicação na área;
principais palavras-chave e trabalhos mais referenciados.
Inicialmente, analisou-se a distribuição temporal dos
trabalhos e foram identificados cinco artigos do ano da pande-
mia da Covid-19. A partir de um olhar sistêmico e direcionado
desses trabalhos, observa-se uma variada lista de países que
se destacam na pesquisa no que tange à aprendizagem nas
escolas, educação e Covid-19. Com destaque significativo
para os Estados Unidos, com seis publicações; em segundo
lugar a Austrália, com três trabalhos; e, em terceiro lugar,
Vietnã, com dois artigos publicados. Os outros países que
publicam sobre essa temática são: Bélgica, Canadá, China,
França, Indonésia, Itália, Malásia, Nova Zelândia, Omã, Peru
e Reino Unido. Porém cada um desses tem uma publicação
com essa temática.
Outra análise quantitativa realizada a partir de um
olhar bibliométrico está no conteúdo de cada artigo sobre
essa temática. Dos 18 artigos pesquisados, 10 explicitam ações
de saúde em meio a pandemia e oito discutem a educação em
tempos de Covid-19. Esses oito trabalhos, foram analisados
e resumidos traçando o quadro 2 esquemático sobre as dis-
cussões de cada um dos artigos.

105
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

Quadro 2 – Quadro esquemático

Ano Autor Título traduzido Resumo


2020 Mulla, Novos coronavírus, O artigo apresenta
Osland- novos programas de modelos de transição
paton, desenvolvimento do do ensino presencial
Rodriguez, corpo docente: tran- para o ensino on-line
Vazquez e sição rápida para o em tempos de isola-
Plavsic. eLearning durante a mento social causado
pandemia pela Covid-19.
2020 Pather, Rompimento for- O artigo demonstra
Blyth, çado da anatomia alguns modelos para
Chapman, da educação na Educação em tempos
Dayal, Austrália e Nova de Covid-19, explici-
Flack, Fogg, Zelândia: uma res- tando ferramentas
Green, posta aguda à pan- do ensino síncrono
Hulme, demia de Covid-19 apresentado em sites
Johnson e remotos, expan-
Meyer. dindo as ofertas para
o remoto.
2020 Mailizar, Escolas secundá- O artigo examina
Almanthari, rias e as opiniões as visões do ensino
Maulina e dos professores de secundário em qua-
Bruce. matemática sobre tro níveis de bar-
barreiras de imple- reira, escola, cur-
mentação durante rículo e aluno nas
a pandemia da escolas de ensino
Covid-19: o caso da matemática com
da Indonésia implementação do
aprendizado online
durante a pandemia
da Covid-19.
2020 Salleh, Os impactos da O artigo apresenta
Ghazali, Covid-19 através as vantagens e des-
Ismail, da Internet: apren- vantagens do uso da
Alias e dendo o uso para Internet nas aulas
Rahim. Educação terciária ministradas nas pla-
na Malásia. taformas digitais no
ensino superior.

106
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

Ano Autor Título traduzido Resumo


2020 Gomez, Inovação nascida O artigo estuda fer-
Azadi e em isolamento: ramentas, materiais
Magid. transformação e software utilizados
rápida de radiolo- para engajamento e
gia presencial em colaboração do estu-
um estudante de dante de Medicina
medicina eletiva em tempos de isola-
para uma expe- mento social provo-
riência de apren- cado pela Covid-19.
d i z a d o r e m o to
durante a pande-
mia da Covid-19
2020 Zhao. Covid-19 como O artigo explicita
catalisador reflexões sobre fer-
de mudanças ramentas digitais
educacionais adotadas na educa-
ção em tempos de
Covid-19.
2020 Daniel.  Educação e a pan- O artigo discute os
demia da Covid-19 desafios da educa-
ção online nos tem-
pos de pandemia da
Covid-19.
2020 Tran, Ho, Como os nativos O artigo aborda
Pham, digitais aprendem novos formatos de
Nguyen, e prosperam na era educação, promo-
Nguyen, digital: evidências vendo a qualidade
Vuong, de uma economia segundo o Objetivo
Nguyen, emergente de Desenvolvimento
Nguyen, Sustentável 4, defi-
Nguyen e nido pela ONU para
Khuc. atender as demandas
do ensino on-line em
época de Covid-19.
Fonte: elaborado pela autora (2020)

107
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

Com base no levantamento geral, foi possível anali-


sar-se ainda as áreas de concentração dos artigos que estão
nos seguintes campos do conhecimento: Ciências Sociais,
Psicologia, Ciência da Computação, Energia, Engenharia e
Medicamento. Verifica-se que a maior taxa de publicação está
na área de Ciências Sociais, com 34% das publicações, seguida
da área de Psicologia com 22%, conforme o gráfico a seguir:

Gráfico 1 – Análise da porcentagem das áreas do conhecimento da publicação

Fonte: elaborado pelos autora (2020)

Outra análise realizada, a partir da análise bibliomé-


trica com base no grupo de trabalhos recuperados na base
de dados Scopus, foram as palavras-chave utilizadas que se
sintetizam em 108 diferentes palavras. O destaque ficou com
a palavra-chave “Covid-19”, com três ocorrências; seguida
de “aprendendo”, “aprendizagem online” e “pandemia”, com
duas ocorrências cada uma. As outras ocorrências não foram
consideradas nesse artigo, pois aparecem com a frequência
considerada baixa (uma vez apenas).

108
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

Na análise das palavras-chave, percebe-se que a discus-


são sobre educação e Covid-19 tem como ênfase o repensar
em uma proposta ativa de ensinar e aprender em tempos de
pandemia, utilizando de metodologias inovadoras disponíveis
em plataformas online.
Por fim, buscando uma análise de cunho qualitativo,
percebeu-se que esse debate envolve ainda a preocupação
com as propostas inovadoras, ao repensar prática pedagógicas
voltadas as interações no aprendizado online.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A pandemia da Covid-19 é um enorme desafio para os


sistemas educacionais. Esse tema fez com que instituições de
ensino repensassem suas práticas em um curto período de
tempo para atender as necessidades dos estudantes que, no
momento da pandemia, tiveram que contar com o aprendizado
realizado diretamente dentro de suas casas. 
Assim, as instituições de ensino tiveram que adequar-
-se aos recursos assíncronos e síncronos para disporem de
um novo espaço de ensino aprendizado, fora dos contextos
de salas de aulas de concreto, para um contexto digital. O
ensino, além dos temas compostos nos currículos, também
foi repensado nas tarefas variadas e trabalhos que colocam
a Covid-19 em um contexto global e histórico.
O mapeamento científico da produção relacionada ao
tema “educação em tempos de Covid-19”, feito na base de dados
Scopus, permitiu uma análise bibliométrica do tema que des-
crevesse as principais discussões da contemporaneidade e a
interseção entre as áreas. Como resultado, identificou-se que
a pesquisa emerge no campo multidisciplinar, intersectando
as discussões com as áreas de Ciências Sociais, Psicologia,
Ciência da Computação, Energia, Engenharia e Medicamento.

109
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

Propõem-se que estudos nas diferentes áreas sejam


analisados por um olhar integrado de novas maneiras de
aplicabilidade de metodologias ativas no que tange a ensinar
e aprender em tempos de pandemia. O tema carece de pes-
quisas que abordem novas práticas de ensinar e aprender em
tempos de pandemia, por ser muito novo.

REFERÊNCIAS

BRASIL. Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as


diretrizes e bases da educação nacional. Disponível em: http://www.
planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9394.htm. Acesso em: 30 jun. 2020.

BRASIL. MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. CNE aprova diretrizes


para escolas durante a pandemia. 28 abr. 2020. Disponível em:
http://portal.mec.gov.br/busca-geral/12-noticias/acoes-programas-
-e-projetos-637152388/89051-cne-aprova-diretrizes-para-escolas-
-durante-a-pandemia. Acesso em: 30 jun. 2020.

DANIEL, Sir John. Education and the COVID-19 pandemic. Pros-


pects, [s. l.], p. 205-230, 20 abr. 2020. Springer Science and Business
Media LLC. Disponível em: http://dx.doi.org/10.1007/s11125-020-
09464-3. Acesso em: 7 jul. 2020.

GOMEZ, Erin; AZADI, Javad; MAGID, Donna. Innovation Born


in Isolation: rapid transformation of an in-person medical stu-
dent radiology elective to a remote learning experience during
the covid-19 pandemic. Academic Radiology, [s. l.], p. 327-345,
jun. 2020. Elsevier BV. Disponível em: http://dx.doi.org/10.1016/j.
acra.2020.06.001. Acesso em: 7 jul. 2020.

PATHER, Nalini; BLYTH, Phil; CHAPMAN, Jamie A.; DAYAL, Manisha


R.; FLACK, Natasha A. M. S.; FOGG, Quentin A.; GREEN, Rodney A.;
HULME, Anneliese K.; JOHNSON, Ian P.; MEYER, Amanda J.. Forced
Disruption of Anatomy Education in Australia and New Zealand:
an acute response to the Covid-19 pandemic. Anatomical Sciences

110
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

Education, [s. l.], v. 13, n. 3, p. 284-300, maio 2020. Wiley. Disponível


em: http://dx.doi.org/10.1002/ase.1968. Acesso em: 7 jul. 2020.

MACHADO, A. B.; SILVA, A. R. L. da; SPANHOL, F. J.. Intersecções


da educação a distância e tecnologias assistivas: um novo modo de
inclusão social. TICS & EAD EM FOCO, v. 3, p. 1-20, 2017.

MAILIZAR, Mailizar; ALMANTHARI, Abdulsalam; MAULINA, Suci;


BRUCE, Sandra. Secondary School Mathematics Teachers’ Views on
E-learning Implementation Barriers during the Covid-19 Pandemic:
the case of indonesia. Eurasia Journal Of Mathematics, Science
And Technology Education, [s. l.], v. 16, n. 7, p. 1860, 6 maio 2020.
Modestum Limited. Disponível em: http://dx.doi.org/10.29333/
ejmste/8240. Acesso em: 7 jul. 2020.

MARCONI, M. de A.; LAKATOS, E. M. Fundamentos de metodo-


logia científica. São Paulo: Atlas, 2010.

MULLA, Zuber D.; OSLAND-PATON, Valerie; RODRIGUEZ, Marco


A.; VAZQUEZ, Eduardo; PLAVSIC, Sanja Kupesic. Novel coronavirus,
novel faculty development programs: rapid transition to elearning
during the pandemic. Journal Of Perinatal Medicine, [s. l.], v. 48,
n. 5, p. 446-449, 25 jun. 2020. Walter de Gruyter GmbH. Disponível
em: http://dx.doi.org/10.1515/jpm-2020-0197. Acesso em: 7 jul. 2020.

SALLEH, Farah Idayu Mohd; GHAZALI, Jamilahtun Md; ISMAIL,


Wan Nor Hana; ALIAS, Maizura; RAHIM, Nur Syafiqah. The impacts
of Covid-19 through online learning usage for tertiary education in
Malaysia. Journal Of Critical Reviews, [s. l.], v. 7, n. 08, p. 293-300,
2 jun. 2020. SynthesisHub Advance Scientific Research. Disponível
em: http://dx.doi.org/10.31838/jcr.07.08.30. Acesso em: 7 jul. 2020.

TRAN, Trung; HO, Manh-toan; PHAM, Thanh-hang; NGUYEN,


Minh-hoang; NGUYEN, Khanh-linh P.; VUONG, Thu-trang;
NGUYEN, Thanh-huyen T.; NGUYEN, Thanh-dung; NGUYEN,
Thi-linh; KHUC, Quy. How Digital Natives Learn and Thrive in the
Digital Age: evidence from an emerging economy. Sustainability,

111
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

[s. l.], v. 12, n. 9, p. 3819, 7 maio 2020. MDPI AG. Disponível em: http://
dx.doi.org/10.3390/su12093819. Acesso em: 7 jul. 2020.

ZHAO, Yong. COVID-19 as a catalyst for educational change. Pros-


pects, [s. l.], p. 317-327, 11 jun. 2020. Springer Science and Business
Media LLC. Disponível em: http://dx.doi.org/10.1007/s11125-020-
09477-y. Acesso em: 7 jul. 2020.

112
COVID-19 (CORONAVÍRUS): É PRECISO
REPENSAR A EDUCAÇÃO NO BRASIL DO
SÉCULO XXI

Jonas de Medeiros33
Rafael Alberto Gonçalves34

INTRODUÇÃO

Os efeitos da crise pandêmica desencadeada pela Covid-


19 (Coronavírus) entre o final do ano de 2019 e o início do ano
de 2020 foram maiores do que é possível mensurar, ape-
nas com o passar do tempo e o observar dos fatos ocorridos,
com neutralidade, será possível avaliar a real extensão dos
impactos provocados por essa crise que afetou não apenas
o Brasil, mas o mundo todo. Para isso será necessário que o
tempo permita expor as forças oportunistas advindas de uma
batalha político-ideológica a que foram submetidos todos
os brasileiros, haja visto que muitos agentes veiculadores
de informação (caracterizados pela mídia televisiva aberta),
nitidamente semearam caos e discórdia para atender, sabe-se
lá quais objetivos.
Em muitos momentos não era possível ter clareza se
a pandemia era a crise ou se o levante entre extremos polí-
ticos opostos (Direita e Esquerda) era o verdadeiro motor a

Mestre em Educação pela Universidade da Região de Joinville - UNIVILLE. Professor


33 

Universitário - E-mail: jonasdemedeiros@gmail.com.


34 
Mestre em Ciências Naturais e Matemática pela Universidade Regional de Blumenau
- FURB. Professor Universitário. E-mail: rafaelexcel@gmail.com.

113
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

impulsionar não apenas a contagem de mortos, mas também


o colossal acúmulo de danos a todos os setores econômicos,
sociais e também educativos. Era mais comum encontrar
pessoas com bandeiras em punho do que com máscaras no
rosto. E a comunidade acadêmica legítima, em meio a essa
disputa sofria em silêncio, tentando mudar sua realidade
através da oferta de uma formação de qualidade, entretanto,
nosso modelo educacional provou que não estava preparado
para suportar situações como a vivenciada no isolamento
compulsório imposto pela discussão política.
Com isso em voga, espera-se que em um futuro próximo
seja possível observar, mesmo que anestesiados pelo tempo,
os acontecimentos que marcaram histórica e ideologicamente
os anos de 2019 e 2020. Entretanto, se for direcionado o olhar
para o segmento educativo, será constatado que houveram
importantes aprendizados nesse período de crise pandêmica
e sim, moral, pois não se tratou apenas de contabilizar os
danos causados através das mortes diretamente provocadas
pelo patógeno, seja pela contração da doença ou pela impos-
sibilidade de acesso por parte das comunidades aos serviços
médicos em virtude do direcionamento de leitos e procedi-
mentos aos infectados, tratou-se de testar nossas capacidades
de reagir e ressurgir em meio a cenários catastróficos, sendo
a necessidade por capacitação um dos propulsionadores de
uma nova realidade que está por vir.
Assim, este capítulo aborda outro olhar para o contexto
situacional vivenciado pela Covid-19 (Coronavírus) e seus
impactos no setor acadêmico catarinense através do posicio-
namento docente o qual destaca-se, é aderente e consoante
ao cenário nacional brasileiro, sendo ainda considerado um
recorte crítico inicial, visto que o estado da arte desse pro-
cesso encontra-se em pleno desenrolar dos acontecimentos
ora citados.

114
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

CONTEXTUALIZANDO

Vale ressaltar que a Covid-19 é uma doença causada pelo


Coronavírus SARS-CoV-2, que apresenta um quadro clínico
que varia de infecções assintomáticas a quadros respiratórios
graves. Esse patógeno viral fora descoberto e disseminado glo-
balmente a partir da cidade de Wuhan, província de Hubei, na
República Popular da China. Segundo a Organização Mundial
da Saúde - OMS (2020, web):
Em 31 de dezembro de 2019, a Organização
Mundial da Saúde (OMS) foi alertada sobre
vários casos de pneumonia na cidade de
Wuhan, província de Hubei, na República
Popular da China. Tratava-se de uma nova
cepa (tipo) de Coronavírus que não havia
sido identificada antes em seres humanos.
Uma semana depois, em 7 de janeiro de
2020, as autoridades chinesas confirmaram
que haviam identificado um novo tipo de
Coronavírus. Os Coronavírus estão por toda
parte. Eles são a segunda principal causa
de resfriado comum (após rinovírus) e, até
as últimas décadas, raramente causavam
doenças mais graves em humanos do que
o resfriado comum.
Ao todo, sete Coronavírus humanos
(HCoVs) já foram identificados: HCoV-229E,
HCoV-OC43, HCoV-NL63, HCoV-HKU1,
SARS-COV (que causa síndrome respira-
tória aguda grave), MERS-COV (que causa
síndrome respiratória do Oriente Médio)
e o, mais recente, novo Coronavírus (que
no início foi temporariamente nomeado
2019-nCoV e, em 11 de fevereiro de 2020,
recebeu o nome de SARS-CoV-2). Esse novo
Coronavírus é responsável por causar a
doença Covid-19.

115
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

Vale destacar que a Organização Mundial da Saúde


(OMS) no dia 30 de janeiro de 2020, declarou que o surto pan-
dêmico provocado pela Covid-19 (Coronavírus) se constituiu
em uma verdadeira crise mundial, sendo tratado como uma
Emergência de Saúde Pública de Importância Internacional –
o mais alto nível de alerta da Organização, em conformidade
com o Regulamento Sanitário Internacional. Entretanto a
Covid-19 só foi oficializado como pandemia pela OMS a partir
de 11 de março de 2020.
Corroborando com este ponto, deve-se destacar que
o Governo Brasileiro já havia direcionado esforços no pla-
nejamento e possível enfrentamento da crise pandêmica
da Covid-19 em alinhamento com os relatórios e orienta-
ções da Organização Mundial da Saúde - OMS, conforme o
Decreto Presidencial Nº 10.212 de 30 de janeiro de 2020 o qual
alinhava a regulamentação sanitária nacional ao proposto
internacionalmente pela OMS e, a Lei Federal subsequente,
a Lei Nº 13.979 de 6 de fevereiro de 2020 a qual apresentava
as medidas de enfrentamento emergencial propostas para o
surto instaurado, determinações essas que não apenas foram
descumpridas e desconsideradas inicialmente em virtude
da proximidade das comemorações alusivas ao Carnaval
Brasileiro (que concentrou milhares de turistas de inúmeras
nacionalidades por todo território nacional (com destaque
para as regiões norte e nordeste do Brasil), sendo esse um
terreno fértil para proliferação viral descontrolada) e pos-
teriormente por questões de cunho ideológico-partidário,
ou seja, muitas unidades federativas (estados e municípios)
apenas iniciaram seus procedimentos com relativa tardia por
simples enfrentamento político, o que levou a medidas mais
bruscas de contenção, como exemplo do contexto vivenciado
nacional e internacionalmente, sendo que o Decreto Nº 562
de 17 de abril de 2020 do Governo do Estado de Santa Cata-
rina - Brasil apresentou:

116
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

Art. 1º Fica declarado estado de calamidade


pública em todo o território catarinense,
para fins de enfrentamento à epidemia
da Covid-19, pelo prazo de 180 (cento e
oitenta) dias.
Art. 5º … § 1º Para fins deste Decreto,
considera-se:
I - isolamento: separação de pessoas doen-
tes ou contaminadas, bens contaminados,
transportes e bagagens, em âmbito inter-
municipal, mercadorias e outros, com o
objetivo de evitar a contaminação ou pro-
pagação do Coronavírus; e
II - quarentena: restrição de atividades ou
separação de pessoas suspeitas de conta-
minação das demais que não estejam doen-
tes, ou de bagagens, containers, animais
e meios de transporte, com o objetivo de
evitar a possível contaminação ou a pro-
pagação do Coronavírus.
A partir desse estágio (declaração pandêmica interna-
cional), muitos governos ao redor do mundo implementaram
medidas de contenção da crise que se espalhava com a mesma
velocidade e ferocidade que os meios de comunicação, o com-
partilhamento cultural e a logística de recursos e insumos
eram capazes de propiciar. Entretanto, as medidas adotadas,
por mais extremas que foram, não puderam conter o efeito
bola-de-neve que se alastrou, levando consigo mais do que
apenas nossa liberdade, levou nossa saúde física, mental, espi-
ritual e financeira consigo. Não tardando para que governos
e sociedade interromperem bruscamente a oferta de serviços
educacionais, comprometendo significativamente o desempe-
nho e em um plano mais amplo, o futuro de toda uma geração
que teve seu processo de ensino-aprendizagem inicialmente
interrompido e posteriormente subaproveitado pela histórica
resistência de instituições, docentes e discentes na adoção de

117
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

práticas pedagógicas alternativas, as quais foram aplicadas


sem preparo e planejamento, o que mais prejudicou do que
ajudou em virtude da falta de capacitação e de estrutura para
adoção do modelo de Ensino e Educação a Distância - EaD.
Em junho de 2020 (Decreto Nº 630), o Governo Cata-
rinense ajusta seu Decreto nº 562, de 17 de abril de 2020, o
qual apresentou provisoriamente que:
Art. 8º Ficam suspensos, em todo o territó-
rio catarinense, sob regime de quarentena,
nos termos do inciso II do art. 2º da Lei
federal nº 13.979, de 6 de fevereiro de 2020:
II - até 2 de agosto de 2020, as aulas pre-
senciais nas unidades das redes pública e
privada de ensino, municipal, estadual e
federal, relacionadas a educação infantil,
ensino fundamental, nível médio, educação
de jovens e adultos (EJA), ensino técnico e
ensino superior, sem prejuízo do cumpri-
mento do calendário letivo, o qual deverá
ser objeto de reposição oportunamente;
(GOVERNO DO ESTADO DE SANTA CATA-
RINA - BRASIL, 2020, Web)
Destaca-se que a adoção da expressão “provisoriamente”
se dá em virtude do grande volume de decretos e leis que se
sobrepõem a cada novo entendimento, seja por um dado
técnico mais recente, um contexto situacional inusitado ou
ainda uma aliança político-partidária recém firmada, afinal,
o ano de 2020 no Brasil foi marcado pelo processo eleitoral
municipal em todo território nacional (eleição de prefeitos
e vereadores).
Dessa forma, a adoção de uma modalidade de ensino
alternativa (virtual ou não) objetivou dar cumprimento ao
calendário educacional definido pela Lei de Diretrizes e Bases
da Educação (LDB Nº 9.394 de 20 de dezembro de 1996) fora

118
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

arguido de fundamento e procedimento através da RESOLU-


ÇÃO CEE/SC Nº 009, de 19 de março de 2020, o qual:
Dispõe sobre o regime especial de ativida-
des escolares não presenciais no Sistema
Estadual de Educação de Santa Catarina,
para fins de cumprimento do calendário
letivo do ano de 2020, como medida de
prevenção e combate ao contágio do Coro-
navírus (Covid-19). (RESOLUÇÃO CEE/SC
Nº 009, de 19 de março de 2020)
Dá-se destaque que o principal argumento de funda-
mento da citada resolução estadual o cumprimento do calen-
dário escolar, em complemento ao argumento de compar-
tilhamento compulsório de responsabilidades no processo
de ensino-aprendizagem entre a família, as instituições e os
governos, o definido pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional dispõe quando define em seu artigo 23, § 2º que:
[...] o calendário escolar deverá adequar-se
às peculiaridades locais, inclusive climáti-
cas e econômicas, a critério do respectivo
sistema de ensino, sem com isso reduzir
o número de horas letivas previsto nesta
Lei; (RESOLUÇÃO CEE/SC Nº 009, de 19
de março de 2020)
O mesmo cenário apresentou-se quanto a adoção do
homeschooling (ou educação domiciliar) como uma das ferra-
mentas alternativas para o cumprimento do conteúdo pro-
gramático proposto, mesmo que de forma conceitual.
A proposta é fornecer alternativas de
estudo para orientar os pais e atender os
estudantes durante o período de distan-
ciamento social, complementando o que é
trabalhado em sala de aula. As atividades
propostas têm como objetivo complemen-
tar os conteúdos previstos nos planos de
ensino dos professores e não serão con-

119
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

sideradas como horas-aula no calendário


letivo de 2020. (GOVERNO DO ESTADO DE
SANTA CATARINA - BRASIL, 2020, Web)

Entretanto, para que esta, ou qualquer outra modali-


dade educativa não presencial (seja ela virtual ou não) logre
êxito, é preciso preparo, planejamento e estrutura adequada.
Destacando-se o caso específico do homeschooling, é preciso
enfatizar ainda que o mesmo carece de uma geração familiar
devidamente preparada para se instruir a próxima geração.
É preciso considerar que muitos pais e responsáveis necessi-
tam de trabalhar para poder prover os recursos necessários à
sobrevivência familiar, o ensino em casa torna-se uma barreira
a obtenção de alimentos e recursos financeiros, sendo esse
um dos principais motivos que leva a muitos pais e respon-
sáveis a recorrerem ao ensino presencial, pois necessitam do
apoio logístico de uma unidade escolar para poder trabalhar
e manter uma família.
Essas e outras dificuldades, sejam técnicas, operacionais
e mesmo culturais se apresentaram na adoção do ensino não
presencial em caráter emergencial, sendo também identifica-
das pelo Governo Catarinense (objeto contextual analisado):
“Ministrar uma aula em EAD não é o mesmo
que uma aula presencial. Requer material
diferente, lúdico, interativo e atraente para
obter a atenção do aluno por intermédio da
tela. Estamos trabalhando com todas essas
variáveis em uma situação completamente
diferente, que nunca vivenciamos, e cujo
período iremos transpor com responsabi-
lidade e com a participação de toda a nossa
rede de ensino”, reforça o secretário Nata-
lino Uggioni. (GOVERNO DO ESTADO DE
SANTA CATARINA - BRASIL, 2020, Web)
Assim, destacaram-se ainda nesse contexto pandêmico
muitos outros desafios ao se colocar em prática as alternativas
propostas para contorno e mitigação de impactos no setor

120
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

acadêmico, sendo destacado a seguir alguns dos pontos mais


críticos e que demandaram de atenção e de considerações por
parte dos idealizadores deste capítulo.

IMPACTOS, CONSIDERAÇÕES E REFLEXÕES


FINAIS

Frente ao contexto ora apresentado, não é possível dei-


xar de se tecer alguns comentários acerca dos impactos e con-
sequências que a crise pandêmica da Covid-19 (Coronavírus)
acarretou, tendo sido infligidos direta ou indiretamente sobre
todo segmento educacional. Em todos os níveis acadêmicos,
do maternal ao pós-doutorado e a livre docência, dos cursos
livres a formação continuada, todo segmento educacional fora
severamente impactado, ao ponto de praticamente colapsar,
quando não sustentado por verbas corporativas ou subsídios
governamentais.
Tal situação nunca antes fora vivenciada, ao menos
não a nível global, contexto esse que gerou, através de um
eficiente mecanismo de desinformação e potencialização do
caos chamado mídia aberta, um efeito cascata nos sistemas
econômicos, sociais e, por extensão, educativos, visto que o
próprio ambiente acadêmico é fomentador de círculos sociais
e depende de recursos para sua manutenção e qualificação.
Deve-se considerar ainda que muitos educandos não
têm ou tiveram acesso ou meios para estudar e/ou acompa-
nhar as aulas e atividades (em ambiente virtual - on-line ou
fisicamente a distância), as quais foram propostas como meio
de se contornar ou minimizar os impactos do isolamento
social imposto por governos locais e sociedade militante
político-partidária.
Os alunos que têm acesso à internet rece-
berão o material e farão as atividades de
forma online. Os demais poderão retirar

121
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

apostilas na escola ou receber em casa.


Nesse caso, a retirada poderá ser feita
pelos pais. As atividades feitas pelos alu-
nos também serão entregues nas escolas e
encaminhadas aos professores para acom-
panhamento. (GOVERNO DO ESTADO DE
SANTA CATARINA - BRASIL, 2020, Web)
Nesse cenário, os pais ou responsáveis, quando o edu-
cando é menor de idade, precisam agendar horários específicos
junto às instituições de ensino para poder acessar e acompa-
nhar todo o conteúdo que tem por objetivo auxiliar nos exer-
cícios propostos e que serão mediados por esses mesmos pais
ou responsáveis no lugar dos educadores, todos os dias, até a
retomada do setor. Isso por si só já dificulta a viabilidade do
processo, visto que o transporte público também está suspenso
em inúmeras localidades durante o mesmo período que as
instituições de ensino se encontram com as atividades edu-
cativas suspensas, o que compromete intimamente o acesso
aos já referidos materiais didáticos e de suporte educacional.
Entretanto, quando existia a possibilidade de acesso
e conectividade as plataformas virtuais disponibilizadas,
foi necessário se considerar que até os educadores não têm
conhecimentos, habilidades ou recursos suficientes para
trabalhar com plataformas virtuais fora de seu contexto nor-
mativo, assim, era de se esperar que pais e responsáveis que
já estão, na grande maioria dos casos, afastados do ambiente
acadêmico desde longa data, teriam dificuldades em assumir
o papel de tutores no aprendizado de uma geração, isso sem
considerar que muitos conteúdos não são familiares. Afinal,
o papel de uma instituição de ensino é instruir em novas e
melhores estratégias na relação aluno-professor, com con-
teúdos atualizados e ferramentas adequadas a cada geração
e não apenas cuidar de crianças, jovens e adultos como se
fossem simples recipiendários de educandos.

122
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

Deve-se dar destaque também que devido ao fecha-


mento de tantas instituições de ensino em virtude do cenário
pandêmico, muitos professores foram orientados e direcio-
nados para a aplicação de assuntos e conteúdos relativamente
fáceis, os quais deveriam ser revistos assim que o processo
de ensino-aprendizagem presencial retornasse à normali-
dade. Esse movimento “paliativo”, ou melhor, “alternativo”
por parte das instituições de ensino (a adoção de conteúdos
mais fáceis com a metodologia de ensino a distância funda-
mentada na RESOLUÇÃO CEE/SC Nº 009, de 19 de março de
2020) fora percebido de forma negativa pelos discentes no
decorrer da aplicação dos temas propostos. Afinal, a aplica-
ção de conteúdos programáticos e atividades avaliativas em
uma plataforma no mínimo estranha ao seu cotidiano, pode
provocar certa acomodação em todos os envolvidos com o
passar do tempo, visto que o modelo de Educação a Distância
é movido por automotivação e não uma simples cobrança ou
exigência protocolar, ou seja, tanto alunos quanto professores
precisam acreditar no modelo de educação a distância (EaD)
e de querer que este venha a funcionar para poder suportar a
mudança brusca de ambiente educacional. Não adianta impor
a modalidade não presencial a qualquer um, pois nem todos se
adaptam a metodologia ou possuem a força de vontade para
ser seu próprio instigador no processo educacional.
Também foi possível observar durante o período de
crise da Covid-19 (Coronavírus) que muitos acadêmicos
passaram a ter consciência instintiva de que sua aprovação
ao término do ano letivo, seria flexibilizada em virtude
da interrupção abrupta do processo educativo de forma
involuntária e situacional, colocando a todos, docentes,
discentes, instituições e corpo familiar em uma realidade
que não lhes era familiar, ou até de desconforto. Deve-se
considerar que o papel da escola também é o de propiciar
um ambiente saudável para construção do indivíduo em
conhecimentos e habilidades, bem como em atitudes e

123
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

comportamentos sociais, o que em séries iniciais foi seve-


ramente prejudicado pela falta de convívio e interação
de grupo.
Entende-se que em um mundo ideal, seriam necessárias
inúmeras variáveis a serem ajustadas para que o modelo de
ensino a distância (EaD) venha a lograr êxito. É preciso lem-
brar que em situações de crise, o que garante o sucesso de um
mecanismo contingencial é acima de tudo, a junção do planeja-
mento, da capacitação e do treino constante nas contingências
definidas para cada crise. Portanto, quando ocorrem os cenários
de adversidade, como o vivenciado pela pandemia da Covid-19
ocorrida em meados do ano de 2020, não há tempo para iniciar
um planejamento contingencial. Sem considerar ainda que no
caso em pauta (Coronavírus), houveram inúmeras interferên-
cias agravantes, como a questão político-ideológica, que aliada
aos mecanismos de mídia tendenciosamente corrompida por
outros interesses que não o bem coletivo, apenas agravou todo
cenário, deixando claro que a educação pouco importa para
muitos agentes político-sociais e que a partir da mobilização
de militâncias políticas antagônicas (direita e esquerda, mas
neste caso em especial a esquerda brasileira) preferiu-se o caos
anárquico ao invés do bem comum.
Por fim, vale destacar a indignação dos autores deste
capítulo frente ao cenário caótico apresentado, onde o que
restou foram os questionamentos não respondidos: 1º O que
tem mais valia para o futuro de uma nação? 2º Até quando
ficaremos discutindo posicionamentos político-partidário-
-ideológicos ao invés de resolvermos juntos os problemas e
unidos superarmos as barreiras e dificuldades por um futuro
melhor para todos?
Infelizmente, essas e outras perguntas permanecem
ainda sem uma resposta que seja agregadora e direcionada
ao futuro da educação em nosso país.

124
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

REFERÊNCIAS

Brasil. Decreto Presidencial Nº 10.212 de 30 de janeiro de 2020.


Promulga o texto revisado do Regulamento Sanitário Internacional,
acordado na 58ª Assembleia Geral da Organização Mundial de
Saúde, em 23 de maio de 2005. Brasília, DF: Planalto Federal, 2020.

________. Lei Nº 13.979 de 6 de fevereiro de 2020. Dispõe sobre


as medidas para enfrentamento da emergência de saúde pública de
importância internacional decorrente do Coronavírus responsável
pelo surto de 2019. Brasília, DF: Senado Federal, 2020.

________. Lei No 9.394, de 20 de dezembro de 1996. LDB - Lei de


diretrizes e bases da educação. Brasília, DF: Senado Federal, 1996.

Conselho Estadual de Educação de Santa Catarina - CEE/SC. RESO-


LUÇÃO CEE/SC Nº 009, de 19 de março de 2020. Florianópolis, 2020.

Governo do Estado de Santa Catarina - Brasil. Coronavírus em


SC: Governo do Estado estabelece sistema de trabalho para
atividades escolares não presenciais. Disponível em: https://
www.sc.gov.br/noticias/temas/coronavirus/ coronavirus-em-sc-
-governo-do-estado-estabelece-sistema-de-trabalho-para-ati-
vidades-escolares-nao-presenciais. Acesso em 06 - abril - 2020.

_________. Coronavírus em SC: Secretaria de Educação dispo-


nibiliza recursos de aprendizagem no site para orientar pais e
alunos. Disponível em: https://www. sc.gov.br/noticias/temas/
coronavirus/secretaria-de-educacao-disponibiliza-recur-
sos-de-aprendizagem-no-site-para-orientar-pais-e-alunos.
Acesso em 27 - março - 2020.

_________. Coronavírus em SC: Educação analisa EAD para


alcançar alunos sem acesso residencial a computador e inter-
net. Disponível em: https://www.sc. gov.br/noticias/temas/corona-
virus/educacao-analisa-ead-para-alcancar-alunos-sem-acesso-re-
sidencial-a-computador-e-internet. Acesso em 21 - março - 2020.

125
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

_________. Decreto Nº 562 de 17 de abril de 2020. Declara estado


de calamidade pública em todo o território catarinense, nos termos
do COBRADE nº 1.5.1.1.0 - doenças infecciosas virais, para fins
de enfrentamento à COVID-19, e estabelece outras providências.
Florianópolis, SC: GOV-SC. 2020.

_________. Decreto Nº 630 de 1º de junho de 2020. Altera o


Decreto nº 562, de 2020, que declara estado de calamidade pública
em todo o território catarinense, nos termos do COBRADE nº 1.5.1.1.0
- doenças infecciosas virais, para fins de enfrentamento à COVID-19,
e estabelece outras providências. Florianópolis, SC: GOV-SC. 2020.

_________. Governo do Estado determina suspensão por 30


dias das aulas nas redes estadual, municipal e particular de SC.
Disponível em: https://www.sc.gov .br/noticias/temas/coronavirus/
governo-determina-suspensao-das-aulas-nas-redes-estadual-mu-
nicipal-e-particular-de-santa-catarina. Acesso em 27 - março - 2020

Organização Mundial da Saúde - OMS. Folha informativa –


COVID-19 (doença causada pelo novo Coronavírus). 2020. Dispo-
nível em: https://www.paho.org/bra/index.php?option=com_con-
tent&view=article&id=6101:covid19&Itemid=875. Acesso em 02 de
Junho de 2020.

126
ENSINO REMOTO EMERGENCIAL
– O DESAFIO DOCENTE

Mariana Medeiros Trautwein35


Marli Afonso Dos Santos36

INTRODUÇÃO

A pandemia de CoVid-19, declarada em 11 de março de


2020 desencadeou na suspensão das aulas presenciais em
todos os níveis de ensino algumas semanas depois. Visto que
esta paralização não seria de curta duração, como ocorreu
em alguns estados na epidemia da gripe H1N1, em 2009, foi
necessário pensar em novas formas de dar continuidade ao
processo de ensino-aprendizagem. Os recursos tecnológicos
foram essenciais nestas estratégias, com a maioria das ins-
tituições buscando alternativas em plataformas digitais de
videoconferência, ambientes virtuais de aprendizagem, além
de aulas gravadas e disponibilizadas em canais abertos de TV
e no youtube – caso das escolas municipais e estaduais do PR.
O processo do ensino remoto emergencial, utilizado
pelas instituições de ensino públicas e privadas, foi a saída
encontrada para que discentes e docentes continuassem em
contato, mesmo que indireto, porém é importante ressaltar
que não se trata da modalidade de Ensino a Distância (EAD),
como muitos têm chamado.
Mestre em Linguística (UFPR), licenciada em Letras (PUCPR) e Pedagogia (Uninter).
35 

Professora do EF-AI nas redes pública e privada e no curso de Pedagogia da Unibrasil.


36 
Acadêmica do último período do Curso de Pedagogia – Unibrasil. Já atuou no EF-AI
nas redes pública e privada.

127
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

Após mais de 3 meses neste cenário de ensino remoto,


cabe verificar como os professores vêm percebendo a atuação
das instituições de ensino e de sua prática pedagógica neste
processo de ensino remoto.
Os dados desta análise surgiram a partir de um for-
mulário on-line, por meio da plataforma Google Forms, que
foi enviado a professores. Baseada em 178 participações, de
professores de diversas partes do país, uma análise sobre esse
momento desafiador será apresentada, refletindo sobre a dife-
rença entre ensino remoto e ensino a distância, a preparação
da classe docente para o ensino remoto emergencial, como
vem se caracterizando sua prática de ensino e o processo de
ensino-aprendizagem e quais as soluções e plataformas tec-
nológicas que têm sido utilizadas por diferentes instituições.
Pretende-se, então, propor uma reflexão sobre os desa-
fios vivenciados professores diante deste novo cenário causado
pela pandemia de CoVid-19, além de demonstrar que em meio
à dificuldade, pode-se encontrar uma oportunidade de rein-
venção de sua prática pedagógica e, até mesmo, a educação.

A EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA E ENSINO


REMOTO EMERGENCIAL

Apesar de ambos utilizarem a tecnologia como meio


para transmitir conteúdo, sendo a internet o grande inter-
mediador dessas modalidades, não podemos confundir seus
conceitos e práticas.
Educação a Distância é uma forma sistematicamente
organizada de auto-estudo onde o aluno instrui-se a partir do
material de estudo que é apresentado e que o acompanhamento
e a supervisão do sucesso do estudante são coordenados por
um grupo de professores. Moran (2009) afirma que a Educação
a Distância é uma modalidade de educação efetivada através
do intenso uso de tecnologias de informações e comunicação,

128
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

onde professores e alunos até podem estar separados fisica-


mente, mas unidos em um só propósito de ensino-aprendi-
zagem, podendo ou não apresentar momentos presenciais.
Belloni (2006) reitera que Ensino a Distância não pres-
cinde de professor, e se sua mediação pedagógica não deve
ser exercida por técnicos especialistas em informática. Ao
contrário, a função docente se alarga. Isto é possível através
da aplicação de meios de comunicação digitais, capazes de
vencer longas distâncias.
As primeiras experiências em relação à Educação a
Distância deram-se no século XIX - na Europa - por meio do
ensino via correspondência. Ao longo dos anos, essa metodolo-
gia de ensino foi sendo aperfeiçoada, por intermédio de novas
tecnologias que surgiam, e disseminada aos demais países.
Lopes et al. (2007) reforçam que, no Brasil, a Educação
a Distância teve seu início a partir do século XX, com o apelo
dos trabalhadores rurais, tendo em vista que essa forma de
ensino permitiria o não deslocamento até centros urbanos para
realização de cursos de formação profissional. Essas carac-
terísticas possibilitam, também, que a Educação a Distância
democratize o acesso à educação, pois possibilita a redução
dos custos, com a qualidade dos materiais e das plataformas
disponíveis e, ainda, desenvolve a autonomia do estudante na
sua forma de estudar, permitindo a flexibilização de horários,
a ausência de deslocamento e ampliando as oportunidades
de estudos em diversas áreas e níveis educacionais.
Neste momento de pandemia, as ferramentas tecno-
lógicas contribuem para a continuidade do aprendizado e
a possibilidade de interação com os professores, mas não
podemos classificar essa interação como EAD, pois não há
um planejamento integrado dos materiais e existe uma ten-
tativa de se manter, pelo menos parte, do horário de estudos
presenciais, seja com interações ao vivo ou aulas gravadas.
Esta modalidade está sendo chamada de Ensino Remoto, pois

129
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

mantém características e planejamento similar ao do ensino


presencial, porém acontece de forma remota. Por se tratar de
uma mudança sem preparação prévia, considera-se então esse
Ensino Remoto como Emergencial. De acordo com Hodges et
al. (2020), o Ensino Remoto Emergencial é uma mudança
temporária para continuar as atividades pedagógicas, sendo
uma alternativa devido à crise.
Há nesta modalidade a possibilidade de gravação da
aula para que os alunos que não puderam estar presentes,
devido a várias razões, entre elas, problemas de conexão com
Internet ou compromissos no horário agendado, possam ter
acesso posterior.
O professor também tem um papel diferenciado no
Ensino Remoto, devendo estar presente on-line no dia e horá-
rio marcado para sua aula em determinada plataforma ou
planejando e organizando, com recursos na maioria das vezes
próprios, a gravação de vídeos explicativos. Para quaisquer
necessidades de explicação, interação, questionamentos e
oferta de conteúdo faz-se necessário a sua presença on-line,
seja por chats, encontros, e-mails e até WhatsApp.
Neste cenário, o docente deve preparar-se, treinar com a
plataforma digital e buscar estimular os alunos a se engajarem
nas aulas, tudo isso de um dia para outro. Seu planejamento
passa a ocorrer de forma muito diferente do habitual e a busca
por novas ferramentas e estratégias de ensino passa a ser
constante. Para isto, as plataformas disponibilizam diversas
ferramentas e estratégias de ensino, como por exemplo, o
compartilhamento de vídeos, quizz, chats para esta interação
ao vivo com seu aluno.
É importante ressaltar, como demonstra Hodges et al.
(2020), que mesmo os professores tenham uma infinidade
de experiências em sua profissão, sejam criativos e busquem
soluções inteligentes, muitos ainda vão achar esse processo
estressante.

130
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

Também é importante considerar a situação dos mais


variados grupos familiares, em que foi necessária uma grande
adaptação, pois os pais passaram a ter que auxiliar no pro-
cesso de ensino dos filhos, ao mesmo tempo em que estão em
“home office” e cuidando da casa.
Mas mesmo neste contexto, pode-se buscar formas de
a educação se beneficiar da crise para se fortalecer e se rein-
ventar. Tomazinho (2020) acredita que
o ensino remoto emergencial vai nos ensi-
nar a ser a escola que sempre sonhamos e
nunca pensamos ser possível construí-la.
Uma escola que experimenta, que aprende,
que inova, que tenta o novo, e sempre busca
o melhor para o ator mais importante deste
processo e a razão da escola ou IES exis-
tir, o aluno e seu ganho de aprendizagem.
(TOMAZINHO, 2020, p.1)

Assim, é possível postular que o Ensino Remoto Emer-


gencial pode proporcionar à comunidade escolar uma nova
percepção quanto à escola do futuro, onde o tradicionalismo
e as aulas expositivas deixem de ser a prática mais comum e
em que o mais importante sejam os alunos e o seu processo
de aprendizagem de forma mais significativa e relevante.

OS DESAFIOS DOS DOCENTES EM TEMPOS


DE PANDEMIA

Diante da pandemia de CoVid-19, no setor educacional


podem-se verificar algumas dificuldades enfrentadas pelos
professores na adaptação ao processo de Ensino Remoto.
Com o objetivo de verificar suas práticas e dificuldades, rea-
lizou-se uma pesquisa com professores que fazem parte deste
contexto. Tal pesquisa aplicada de levantamento de dados foi
feita por meio do instrumento de formulário da plataforma
Google Forms, que foi distribuído de forma on-line, enviado

131
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

aos professores através de redes sociais e grupo de professores


no WhatsApp.
As respostas foram coletadas do dia 21 ao dia 29 de junho
de 2020 e, apesar do momento de incertezas, dificuldades
e desafios com a docência e carga horária comprometida,
felizmente conseguiu-se a participação de 178 profissionais
da educação, a grande maioria (81%) do estado do Paraná, no
qual ocorreu a pesquisa, e os demais representando outros
estados – AC, MT, BA, SP, MS, DF, MG, ES, PE, SC e CE.
Do total de participantes, 115 lecionam na rede pública,
58 na rede privada, e 5 em ambas as redes.
No gráfico abaixo pode-se observar que a grande maioria
dos professores atua no Ensino Fundamental – Anos Iniciais37,
Anos Finais e Educação Infantil.

Gráfico 1 – Atuação dos participantes

Quando questionados sobre os meios utilizados por


suas instituições de ensino, foi possível perceber um número
expressivo de instituições que estão utilizando aulas em TV
aberta, entrega periódica de atividades impressas, e canal
no Youtube. Este número provavelmente tem relação com
37 
Na coleta dos dados, via GoogleForms, utilizou-se a nomenclatura Ensino Fundamental
I e II devido à familiaridade com estes termos pelos docentes.

132
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

os professores que lecionam na rede pública, visto que são


os meios utilizados pela Rede Municipal de Curitiba, Regiões
Metropolitanas e pela Secretaria de Educação do Estado do
Paraná, além de outros estados.
É interessante perceber a diversidade de recursos uti-
lizados pelas instituições particulares, como plataformas
virtuais exclusivas, e-mail, WhatsApp, entre outros, como
demonstra o gráfico a seguir:

Gráfico 2 – Os recursos utilizados para o Ensino Remoto Emergencial

Os dados apontam que 68% dos professores afirmam


não terem recebido nenhum tipo de treinamento para a
migração do ensino presencial para o ensino remoto. Quando
questionados se a comunidade escolar estava preparada para
essa mudança repentina no processo de ensino-aprendiza-
gem, a resposta foi quase unânime: 97,2% afirmaram que a
comunidade escolar não estava preparada. Em uma pergunta
autorreflexiva sobre dar aulas em ambientes virtuais, a maioria
esmagadora, 165 participantes, afirmaram que não estavam
preparados.

133
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

Com base nas respostas verificou-se que apenas 53,6%


dos docentes têm consciência que o Ensino Remoto é Diferente
do Ensino a Distância, o que pode ser reflexo das formações,
lives, cursos on-line que têm ocorrido desde o início do recesso
escolar por causa da pandemia da Covid-19. Os quase 50%
que não souberam diferenciar as modalidades demonstram
uma realidade preocupante, possivelmente devido à falta
de instrução e treinamento aos profissionais da educação
por parte da grande maioria das instituições de ensino, bem
como a massificação das aulas remotas das prefeituras e
estados que podem dar uma sensação de Ensino a Distância.
Entretanto, no presente artigo apontamos as diferenças entre
Ensino a Distância e Ensino Remoto, demonstrando que
mesmo nestes casos de aulas massificadas, devido à falta de
recurso tecnológico para um planejamento mais individual,
não caracteriza EAD.
Ao serem questionados sobre o desempenho de seus
alunos quanto à entrega de atividades propostas, apenas 39
docentes afirmam que seus alunos realizam as atividades
satisfatoriamente, 21 afirmaram que os discentes perderam
o interesse na realização das atividades, e 119 professores
afirmam que seus alunos realizam as atividades parcial-
mente. Com base nesses dados, podemos então concluir que
o processo de ensino-aprendizagem tem sido afetado com
essa migração do presencial ao remoto e que um dos maiores
desafios é o engajamento dos educandos.
Quando questionados sobre a sua prática pedagógica,
surpreendente, 61 professores dizem estar satisfeitos com ela,
com base neste resultado, cabe então uma reflexão: diante
de tantos comentários, testemunhos de outros professores,
relatos de pais, informações veiculadas pela mídia... Estes
61 docentes realmente estão indo além em suas práticas de
ensino, ou ainda não compreenderam que de fato existem
grandes desafios a serem vencidos no que diz respeito ao pro-

134
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

cesso de ensino-aprendizagem neste momento tão delicado


que o meio educacional está passando?
Finalizando a pesquisa, verificou-se que apenas 13 pro-
fessores afirmaram não encontrar dificuldades nas aulas
remotas, um número quase que insignificante diante de 165
docentes que ainda estão em processo de adaptação às aulas
remotas, alegando que faltam recursos tecnológicos, têm
dificuldades com a adaptação à tecnologia, com os planeja-
mento das aulas remotas e que apontam também que a falta de
interesse dos alunos é preocupante. Mas ainda assim, diante
de todas essas tribulações, a grande maioria dos professores
afirma que nenhuma dificuldade é maior que a falta de inte-
ração e contato com os seus alunos.

Gráfico 3 – Dificuldades dos professores nas aulas remotas

Quando questionados, de forma discursiva, sobre as


consequências que a pandemia trouxe à educação, as respostas
abrangeram fatores emocionais, econômicos, de implementa-
ção tecnológica, mas principalmente de perda de aprendizado

135
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

diante da desigualdade de acesso e oportunidade evidenciada


entre diferentes estudantes de diferentes classes sociais.
Um dos participantes citou que houve um “distancia-
mento dos alunos carentes da aprendizagem, porque os bons,
classe media tem acesso ao ensino”; outro citou que houve “uma
adaptação forçada as tecnologias, mas que por conta da desi-
gualdade de condições e aprendizagem irão prejudicar muito
os alunos. Um déficit que levará anos para ser recuperado”,
entre mais de 20 respostas que fizeram referência direta à
desigualdade como fator de potencial impacto no processo
de aprendizagem durante a pandemia.
O fator psicológico/emocional foi citado por mais de
30 participantes, muito citando o distanciamento e a falta de
interação como prejudiciais ao desenvolvimento pleno das
crianças. Um participante respondeu que “acredito que nada
vai superar o prejuízo emocional. Qualquer outra dificuldade
pedagógica será superada em algum momento, mas os danos
emocionais ficarão marcados”.
Muitos participantes citaram as novas aprendizagens
que envolvem a tecnologias como uma consequência benéfica
desta pandemia que permitiu o desenvolvimento profissio-
nal, mesmo que forçado. Porém, a defasagem na aprendiza-
gem, ainda sem possibilidade de mensuração, foi apontado
pelo grande maioria, mais de 50 professores, como a grande
consequência.
Observar que os professores, apesar de todos os desa-
fios e aprendizagens em âmbito pessoal-tecnológico, ainda
demonstram-se desestimulados e desacreditados nos modelos
utilizados, após mais de três meses de ensino remoto, é um
indicador de que as consequências desta paralização das aulas
presenciais irá muito além do âmbito curricular. É necessá-
rio a pesquisa e o olhar por parte das equipes gestoras para
verificar constantemente os resultados e as consequências de
curto prazo que podem estar afetando docentes e discentes

136
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

nesse processo, buscando sempre aprimorar essa relação de


ensino-aprendizagem remota.
Com a pesquisa aqui exposta, concluímos que a grande
maioria dos professores não estava preparada para lecionar
em um ambiente virtual, crianças, adolescentes e jovens não
estavam preparados para fazer de sua casa, uma escola, assis-
tindo as aulas em frente a um smartphone, TV, ou até mesmo
realizando atividades sem muitas instruções diretas dos pro-
fessores. A educação neste momento não estava preparada
para essa transformação, do papel para o digital.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Em meio à pandemia de CoVid-19 de 2020, as institui-


ções de ensino precisaram se adaptar de maneira extraordi-
nariamente rápida para oferecer um o ensino com a melhor
qualidade possível dentro das condições do cenário atual.
Iniciou-se então o ensino remoto emergencial.
Com base nos resultados da pesquisa com professores
aqui apresentada, pode-se considerar que grande parte dos
profissionais da educação ainda confunde o ensino remoto
com o ensino a distância, o que pode ser um fator impactante
para a prática docente neste momento.
Verificou-se também que os meios utilizados pelas
instituições de ensino para o ensino remoto são canais de TV
aberta, entrega periódica de atividades impressas e canais
no Youtube, aulas por plataformas de videoconferência e
ambientes virtuais de aprendizagem. A grande maioria dos
profissionais da educação ainda está em processo de adap-
tação às aulas remotas, mesmo depois de mais de 3 meses
no estado do PR, e que dentre as dificuldades citadas por
eles, destacam-se os desafios com a adaptação à tecnologia,
o desinteresse dos alunos e a elaboração de planejamento.

137
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

Isso demonstra que de fato a comunidade escolar não estava


preparada para essa mudança abrupta na educação.
Apesar de alguns docentes avaliarem sua prática como
satisfatória, a grande maioria de fato reconhece que é necessá-
rio de uma preparação mais consistente para que o processo de
ensino-aprendizagem ocorra de maneira satisfatória dentro
deste modelo, enfatizando que, mesmo em meio a um contexto
tecnológico, o contato pessoal faz a diferença na educação.

REFERÊNCIAS

BELLONI, M. L. Educação a distância. 5. ed. São Paulo: Autores


Associados. 2006.

HODGES, C. The Difference Between Emergency Remote Tea-


ching and Online Learning. EDUCAUSE Review. 2020. Disponível
em: https://er.educause.edu/articles/2020/3/the-difference-be-
tween-emergency-remote-teaching-and-online-learning. Acesso
em: 15 jun. 2020.

LOPES, M. C., DORSA, A. C., SALVAGO, B. M., SANAVRIA, C. Z., &


PISTORI, J. O processo histórico da educação à distância e suas
implicações: desafios e possibilidades. In: JORNADA DO HISTE-
DBR, VII, 2007, Campo Grande. Anais. CAMPINAS: UNICAMP. 2007.

MORAN, J. M. O que é educação a distância. 2009. Disponível


em: http://www.eca.usp.br/prof/moran/dist.htm. Acesso em: 20
jun, 2020.

TOMAZINHO, P. (05 de abril de 2020). Medium. Acesso em 30 de


maio de 2020, disponível em Ensino Remoto Emergencial: A Opor-
tunidade da Escola Criar, Experimentar, Inovar e se reinventar.
Disponível em: https://medium.com/@paulotomazinho/ensino-re-
moto-emergencial-a-oportunidade-da-escola-criar-experimentar-
-inovar-e-se-reinventar-6667ba55dacc. Acesso em: 20 jun, 2020.

138
PORTÕES FECHADOS, CANAIS ABERTOS:
A POTENCIALIDADE EDUCATIVA DO
NÚCLEO DE ORIENTAÇÃO PARA A
SUSTENTABILIDADE

Adriano Gonçalves da Silva38


Ana Cecília Estêvão39

INTRODUÇÃO

O Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas


Gerais – (CEFET-MG) é uma instituição de ensino centenária
que tem sua origem no decreto nº 7.566, assinado pelo Presi-
dente Nilo Peçanha, em 23 de setembro de 1909. A partir deste
decreto foram criadas em quase todas as unidades federativas,
as “Escolas de Aprendizes e Artífices” destinadas ao ensino
profissional, primário e gratuito. Esta iniciativa trazia o ensino
técnico para o campo da política pública em nível nacional,
mantendo-o sob jurisdição do Ministério dos Negócios da
Agricultura, Indústria e Comércio (BRASIL, 2009).
A partir da década de 1930, o ensino técnico se expandiu
por meio de uma política de criação de novas escolas indus-
triais. Nesse período, o oferecimento do ensino profissional
passou a ser obrigatório no país e as Escolas de Aprendizes e
Artífices passaram a ser supervisionadas pela Inspetoria do

38 
Mestre em Estudos do Lazer, professor do CEFET-MG – Campus Curvelo, adrianogs@
cefetmg.br
39 
Mestre em Engenharia Civil, professora do CEFET-MG – Campus Curvelo, anacestevao@
cefetmg.br

139
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

Ensino Profissional Técnico, ligada ao Ministério da Educa-


ção e Saúde. A instituição mineira passou a ser denominada
Liceu Industrial de Minas Gerais em 1941, passando a Escola
Técnica de Belo Horizonte em 1942, Escola Técnica Federal de
Minas Gerais em 1969, e finalmente, Centro Federal de Edu-
cação Tecnológica de Minas Gerais em 1978, quando passou
a oferecer também o ensino superior.
Com o intuito de estimular a integração do ensino médio
à educação profissional brasileira, foi instituído, em 2007, o
Programa Brasil Profissionalizado, “enfatizando a educação
científica e humanística, por meio da articulação entre for-
mação geral e educação profissional no contexto dos arranjos
produtivos e das vocações locais e regionais” (BRASIL, 2007).
E no ano de 2008, foram legalmente integradas, sob a deno-
minação de Educação Profissional e Tecnológica, a formação
inicial e continuada ou qualificação profissional, a educação
profissional técnica de nível médio e a educação profissional
tecnológica de graduação e pós-graduação.
Ainda em 2008, foi instituída a Rede Federal de Educa-
ção Profissional, Científica e Tecnológica, da qual o CEFET-MG
faz parte juntamente com os Institutos Federais de Educação,
Ciência e Tecnologia, a Universidade Tecnológica Federal do
Paraná – (UTFPR), o Centro Federal de Educação Tecnológica
Celso Suckow da Fonseca – (CEFET-RJ), as Escolas Técnicas
vinculadas às Universidades Federais (BRASIL, 2008) e o
Colégio Pedro II, a partir de 2012.
Ao longo dos anos, a educação profissional técnica tem
se apresentado como um campo cultural que tem sua iden-
tidade elaborada nas relações estabelecidas através da inte-
ração com outros sistemas com os quais se relaciona, como
a política, a economia e a cultura. Medeiros, Leite e Pereira
(2013, p. 147) consideram que o currículo desta modalidade de
ensino pode ser entendido como lugar de articulação de dife-
renças, de negociação de sentidos dos processos identitários,

140
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

de contradições, resistência e reelaboração, “de embates e de


debates entre as diferentes perspectivas ideológicas, culturais
e político-sociais”.
Neste contexto, o CEFET-MG buscou se consolidar no
campo da formação científica e tecnológica, por meio do ensino
profissional de nível médio, ensino superior e pós-graduação.
A proposta apresentada pela instituição é a de propiciar uma
visão crítica da sociedade, formando para o mundo do trabalho
e para as múltiplas possibilidades e demandas colocadas pelo
contexto contemporâneo. Desta forma, a instituição é com-
preendida como um âmbito de socialização do saber, como o
lugar de sua elaboração, na medida em que divulga e socializa
o saber nela e por ela produzido. Esta compreensão da relação
universidade-saber equivale a reconhecer nesta instituição
uma estreita relação entre ensino, pesquisa e extensão nos
mais variados campos do conhecimento (FÁVERO, 1994).
Além de atuar em diferentes níveis de ensino e estar
balizado no tripé ensino-pesquisa-extensão, o CEFET-MG
buscou ampliar seu alcance territorial, tornando-se uma ins-
tituição multicampi que se estabeleceu em cidades do interior
de Minas Gerais, além dos três campi em Belo Horizonte. Neste
processo, o Campus Curvelo foi criado em 2010, na fase II do
Plano de Expansão da Rede Federal de Educação Profissional
e Tecnológica. Atualmente, este campus oferta três cursos
técnicos de nível médio (Eletrotécnica, Edificações e Meio
ambiente) e o curso de graduação em Engenharia Civil. Esta
configuração possibilita a verticalização, facultando aos/às
egressos/as dos cursos técnicos permanecerem na instituição
por meio do ingresso no Curso de Engenharia Civil.
Os cursos técnicos integrados de nível médio e o curso de
graduação em Engenharia Civil possibilitam aos/às estudantes
conhecer e refletir os conteúdos curriculares das respectivas
áreas, tendo em vista a aplicação prática na sociedade. Porém,
em função das limitações das experiências vivenciadas em

141
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

salas de aula e laboratórios, as atividades de extensão se apre-


sentam como fator imprescindível na formação e capacitação
profissional. Sobretudo, levando-se em consideração o enten-
dimento de Santos (2010) de que é impossível pensar o ensino
distante da investigação e da extensão. Nesta perspectiva, os
interesses sociais são articulados aos interesses científicos e
a produção do conhecimento ocorre em estreita ligação com
as necessidades dos grupos sociais.
A partir da consideração da importância da integração
ensino-pesquisa-extensão, o Núcleo de Orientação para Sus-
tentabilidade – (NOS), desenvolvido no CEFET- MG - Campus
Curvelo, tem como objetivo prestar assistência técnica para
habitação de interesse social com a aplicação de tecnologias
sustentáveis desenvolvidas no meio acadêmico. A proposta
é contribuir para a popularização da ciência e da tecnologia,
atuando por meio da implantação de um escritório público
na comunidade, e buscando construir soluções que visem o
desenvolvimento sustentável nos aspectos ambiental, eco-
nômico e social.
Participam do projeto de extensão, estudantes do ensino
técnico, graduandos/as em Engenharia Civil, professores/as e
servidores técnicos administrativos da instituição provenien-
tes de diferentes áreas. Além disso, o projeto se dá por meio de
parcerias com outros projetos do CEFET-MG, instituições de
ensino, organizações sociais e o poder público. A partir deste
projeto, o currículo é ampliado, experimentado, refletido e
dialogado. A relação docente-estudante é pensada para além
da visão binária tradicional, aproximando da abordagem
de Giroux (1997) na compreensão de uma pedagogia crítica
da aprendizagem. Os encontros possibilitados pelo projeto
problematizam os pressupostos pelos quais se sustentam os
discursos que legitimam as práticas sociais e acadêmicas,
buscando contribuir para a construção de um ensino que

142
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

integre a formação técnico-profissional à formação de cida-


dãos críticos e ativos.
Desde 2015, as ações do NOS têm se ampliado e envol-
vido também a organização de oficinas, a realização do Fórum
de Pesquisa e Extensão e a participação em eventos científicos
dentro e fora do CEFET-MG. Contudo, em março de 2020, com
a pandemia da doença ocasionada pelo novo coronavírus –
(Covid-19), o calendário escolar do CEFET-MG foi suspenso,
impossibilitando ações em que houvesse contato direto com
as pessoas. Ao mesmo tempo, a população de baixa renda,
público alvo do projeto, além de enfrentar o problema de
saúde física, enfrenta problemas de saúde mental e de ordem
econômica.
A nova situação requereu da equipe do NOS repensar
as possibilidades de ações, os meios utilizados para chegar
aos comunitários e o desenvolvimento de estratégias para o
atendimento das novas demandas que surgiram. Neste sentido,
foi submetido e aprovado, no edital de apoio a projetos de
extensão emergenciais visando o enfrentamento da Covid-19
do CEFET-MG, o projeto “NOS junto com você no combate
a Covid-19.” O principal desafio foi realizar as adaptações
necessárias, mantendo a perspectiva de integração curricular
do projeto, numa metodologia que envolve o encontro entre
pesquisa, ensino e extensão; entre professores/as, estudantes
e servidores técnicos administrativos; entre ensino médio e
graduação; entre formação técnica e formação humana; entre
CEFET-MG e comunidade. Neste sentido, a proposta apre-
sentada aqui é refletir sobre a potência educativa do Projeto
NOS durante a pandemia da Covid-19, buscando compreender
como a formação técnica e humana têm se apresentado na
perspectiva dos/as estudantes envolvidos no projeto.
Para tal, foi aplicado um questionário para os/as 30
estudantes participantes da equipe do NOS, dos quais 28
responderam. O questionário foi composto de 10 questões

143
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

fechadas em que os/as estudantes podiam marcar como


resposta uma graduação entre “discordo completamente”
e “concordo completamente”. Estas questões tiveram como
temática a percepção dos/as estudantes sobre conhecimentos
relacionados à formação humana e formação técnica, e sobre
a aproximação e conhecimento da realidade da comunidade
e da própria realidade. Em seguida, o questionário continha
quatro questões abertas sobre o significado de fazer parte da
equipe, sentimentos destacados e avaliação.
A análise dos dados quantitativos considerou sua impli-
cação qualitativa, buscando reconhecer os apontamentos
feitos pelas respostas dos/as estudantes com relação à temática
proposta. Para as questões abertas, utilizamos a análise de
conteúdo, primeiramente por meio de uma análise descritiva
visando dar conta do que nos foi narrado, seguida de uma
análise interpretativa, a partir das interrogações feitas face ao
objeto de estudo e à bibliografia disponível (GUERRA, 2006).

NOS EM AÇÃO DURANTE A PANDEMIA DA


COVID-19

A ação do NOS durante a pandemia tem como lócus


principal a comunidade da Rua Açucena em Curvelo. Esta
comunidade nasceu de um processo de ocupação territorial às
margens de uma estrada e apesar de oficialmente fazer parte
um bairro, está geograficamente separada dele e distante
do centro da cidade. Dividida entre características urbanas
e rurais, a Rua Açucena ou a Comunidade da Açucena, com
62.369,06 m², tem dificuldade de acesso a direitos sociais
básicos como rede esgoto, transporte público, comércio, posto
de saúde e espaços de lazer. A Associação de Pais e Amigos da
Escola Municipal Antônio Frederico Ozanam e da Rua Açu-
cena – (APAEMAFORA) que tem buscado atuar com projetos

144
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

de promoção da cidadania na comunidade, desde 2010, é a


principal parceira do NOS no desenvolvimento das atividades.
Assim que foi declarada a pandemia, o NOS reali-
zou junto à comunidade da Rua Açucena uma leitura dos
principais problemas gerados pelas orientações de “ficar
em casa”. Podemos agrupar os relatos em questões relacio-
nadas ao desequilíbrio mental ocasionado pelo isolamento
social e medo da doença, ausência de opções de lazer para
adultos e crianças, dificuldade de acesso a itens essenciais
de alimentação e saúde, e problemas financeiros, confir-
mando o esperado por diversos pesquisadores no mundo,
em relação ao impacto da pandemia nas áreas ocupadas
por população de baixa renda.
A equipe do NOS e da APAEMAFORA elaboraram
como medida emergencial a campanha “Açucena Chama”
que visa, através de doações, fornecer alimentos e materiais
de limpeza e higiene para famílias em vulnerabilidade
da Rua Açucena e de outras comunidades atendidas pelo
NOS. Paralelamente, por meio de um entendimento de
metodologia como núcleo significante de práticas sociais
articuladas entre si, foram elaboradas ações que podem ser
divididas em três eixos. 1 – “Informação e conscientização
para saúde”, 2 – “Fortalecimento e organização da comu-
nidade” e 3 – “Capacitação para o trabalho”. Esta organi-
zação vai ao encontro do proposto literatura brasileira
sobre integração curricular que define como dimensões
articuladoras o trabalho, a ciência, a tecnologia e a cultura
(MORAES e KÜLLER, 2016).
O primeiro eixo tem como foco a saúde e o bem-estar
dos/as comunitários/as. Tendo por base, as questões apre-
sentadas pela comunidade nos relatos iniciais, foram criados
um canal no Instagram intitulado Nossocientista e um grupo
de WhatsApp com membros do NOS, da APAEMAFORA e
moradores/as da comunidade, nos quais são veiculados dia-

145
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

riamente conteúdos científicos. Os temas envolvem orienta-


ções de combate à Covid-19 (saúde física e mental e questões
socioeconômicas), cuidados com a moradia e propostas de
atividades artísticas, lúdicas e culturais. O intuito é estabele-
cer um diálogo constante, extrapolando a simples divulgação
do conhecimento. Assim, as trocas realizadas por meio dos
canais possibilitam a adequação do material divulgado às
necessidades das famílias, o ajustamento da metodologia da
ação aos acontecimentos em curso na comunidade e a parti-
cipação efetiva dos/as moradores/as.
O eixo “Fortalecimento e organização da comuni-
dade” destaca a identidade social e o espírito de adesão à
comunidade da Rua Açucena. As atividades deste eixo se
dão principalmente por meio de três grupos de ações. 1.
Reuniões comunitárias periódicas em formato online. O
objetivo desses encontros é debater futuras ações locais,
discutir problemas internos e receber o feedback de práticas
já executadas e outras que estão em andamento no contexto
da comunidade. 2. Organização de um cadastro junto à
APAEMAFORA com dados sobre as famílias moradoras
da comunidade que possam subsidiar o planejamento de
ações. 3. Cursos, palestras e trocas de experiências sobre
empreendedorismo e funcionamento de organizações
sociais, direcionados, sobretudo, aos membros da APAE-
MAFORA, no intuito de qualificar o trabalho da ONG na
comunidade.
A produção e a realização de capacitação na modali-
dade de educação à distância – (EaD) é uma alternativa de
atualização ao mundo do trabalho que é uma das demandas
da comunidade. Além de ser uma modalidade de baixo
custo, a EaD é um meio alternativo à situação de isola-
mento social, visto que não se tem uma data efetiva do
término das restrições relativas à Covid-19. Neste sentido,
no terceiro eixo foi elaborado o “Projeto Catavento” com

146
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

o objetivo de organizar e oferecer cursos de capacitação


aos/às comunitários/as na modalidade EaD envolvendo
temas como empreendedorismo e marketing, legislação
trabalhista atualizada, costura criativa, rotina doméstica
profissional, cuidadores de criança, segurança do traba-
lho, pintura com tinta ecológica e leituras de projetos de
arquitetura e engenharia.
O andamento do projeto é acompanhado e avaliado por
meio de diálogos em grupos de Whatsapp em que participam
estudantes e professores/as de cada ação, reuniões gerais men-
sais, a elaboração de diários de campo e o compartilhamento
de drive com arquivos produzidos. Além disso, os/as estudantes
produzem vídeos no formato pitch, que são apresentações
sintéticas e objetivas sobre o andamento de cada ação.

APONTAMENTOS DE UM CURRÍCULO-NOS

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação – (LDB), atri-


bui ao ensino superior, entre outras finalidades, o estímulo
à criação cultural e o desenvolvimento do espírito científico
e do pensamento reflexivo, no intuito de formar cidadãos/ãs
aptos/as para a inserção nos respectivos setores profissio-
nais e para a participação no desenvolvimento da sociedade
brasileira (BRASIL, 1996). Da mesma forma, o conceito de
educação proposto nas políticas públicas para a educação
profissional e tecnológica está relacionado a uma formação
geral que encerra como objetivo fundamental o “desenvolvi-
mento integral do ser humano informado por valores éticos,
sociais e políticos, de maneira a preservar sua dignidade e a
desenvolver ações junto à sociedade com base nos mesmo
valores” (BRASIL, 2004, p.11).
O NOS, pautada nestas premissas, tem suas ações vol-
tadas para a integração entre a instituição educacional e a
comunidade atendida, buscando reconhecer e valorizar os

147
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

saberes extracurriculares e a efetivação de parcerias no tra-


balho educativo. Assim como Bezerra et al. (2010, p. 288), a
compreensão do papel da escola/universidade que perpassa
as ações do NOS é da importância de “oportunizar situações
de encontro a fim de conhecer os recursos da comunidade e
os aspectos da sua realidade, visando à melhoria do ensino-
-aprendizagem.” O efeito de tal perspectiva pode ser observado
nas respostas dos/as estudantes participantes do NOS em que
85,7% compreendem que a participação nas ações possibilitou
uma aproximação da realidade da comunidade na qual estão
inseridos. E 92,8% conseguem perceber de forma evidente
uma compreensão das diferentes realidades das comunidades
no enfrentamento à Covid-19.
Os relatos dos/as estudantes sobre o significado de
fazer parte do NOS também evidenciam o papel da apro-
ximação e compreensão da realidade da comunidade em
seus processos de formação. Como o relato de um/a dos
estudantes ressalta: “Compor essa equipe significa ter
cuidado não só comigo, mas também com a comunidade
que está mais vulnerável. Voltando o olhar para a realidade
de outras pessoas.” É também por meio dos relatos que os/
as estudantes evidenciam a solidariedade como principal
marca das experiências que têm vivenciado nas ações do
NOS relacionadas ao combate à Covid-19. Para grande parte
dos/as estudantes, participar da equipe do Projeto NOS
durante a pandemia significa “ajudar minha comunidade”,
“poder fazer algo relevante na vida do outro”, “sentimento
de empatia pelo próximo”, entre outros enunciados rela-
cionados ao sentimento de solidariedade.
Apesar dos efeitos da pandemia evocarem um senti-
mento de solidariedade, o desafio de uma proposta de ação que
leve em conta uma educação solidária envolve a necessidade
de uma mudança no plano cultural. Para que a postura soli-
dária se concretize é necessária uma reeducação, transitando

148
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

de uma lógica competitiva, de exploração para uma lógica


cooperativa (PINHEIRO et al., 2017). O NOS tem propiciado
experiências e diálogos que possibilitam a todos/as envolvidos/
as a reflexão sobre a relação que tem sido estabelecida entre
escola/universidade e comunidade.
As experiências vivenciadas no projeto também são
de aprendizagens percebidas de diferentes formas pelos/
as estudantes que atuam nos distintos grupos de ações.
Com relação à formação humana, 71,4% dos/as estudantes
compreendem que a experiência no projeto possibilita
aprofundar conhecimentos sobre humanidades vistos em
sala de aula, enquanto 89,3% compreendem que o projeto
tem possibilitado novos conhecimentos relacionados à
formação humana. Alguns relatos exemplificam essa apren-
dizagem: “não só levamos conhecimento como também o
adquirimos”, “uma forma de crescer, tanto pessoalmente
quanto em formação acadêmica.”
Um dos enunciados também destaca que o projeto vem
contribuindo cada vez mais para a “formação tanto técnica
quanto humana.” Contudo, de uma forma geral, a contribuição
para a formação técnica é percebida por um percentual menor
de estudantes. Compreendem que o projeto tem possibilitado
novos conhecimentos relacionados à formação técnica 57,2%
dos/as estudantes, e somente 39,3% percebem possibilidades
de aprofundamento de conhecimentos técnicos visto em
sala de aula.
O investimento do projeto na integração entre formação
técnica e humana, ainda que precise ser aprofundado, encon-
tra como barreira a forma como o saber escolar é produzido
e disseminado, dificultando aos/às estudantes relacioná-los
ao trabalho com a comunidade. A disputa política entre os
campos especializados faz proliferar o número de disciplinas
e de saberes escolares que devem ser dominados pelos/as
estudantes no presumível processo de socialização do saber

149
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

elaborado. Além da transposição didática, a organização


em séries e a grade curricular contribuem para uma trans-
missão descontextualizada do saber acadêmico, que deixa
de ter sentido existencial para os/as estudantes (MORAES e
KÜLLER, 2016).
Entretanto, um predomínio de formação humana
também é destacado como potencialidade do NOS face à
primazia de uma formação técnica. Segundo um/a estudante
“é muito interessante e importante poder participar de um
projeto tão humano dentro dessa instituição tão técnica que
é o CEFET.” Esta questão também pode ser observada quando
50% compreendem que o projeto incentiva pesquisas de
temas relacionados à formação técnica, enquanto 85,7%
se veem incentivados a pesquisar temas relacionados à
formação humana. Dessa forma, o projeto é considerado
principalmente como “um desafio para aperfeiçoar nas
áreas de menor domínio”, como destacou um/a estudante.
Levando à compreensão de que o encontro promovido pelo
NOS entre formação técnica e humana, entre educação e
sensibilidade, destaca a necessidade dessa articulação na
formação dos/as estudantes.
Por um lado, os/as estudantes percebem o projeto
como uma intervenção social em um campo que integra a
formação técnica e humana, como apresentado em relatos:
“além de conhecer a realidade de uma outra comunidade
a qual eu não estou inserida, eu posso ajudá-la de alguma
forma com os meus conhecimentos técnicos e humanos”,
“pesquisando para que toda essa pandemia tenha menos
impacto nas pessoas mais vulneráveis.” Por outro lado,
a experiência contribui para a compreensão da própria
realidade no enfrentamento à Covid-19, como pode ser
percebido por 78,6% dos/as respondentes. E para 57% dos/
as estudantes, a participação no projeto se apresentou
como estratégia de saúde mental durante o período de

150
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

isolamento social em decorrência da pandemia da Covid-


19. Como destacado por um/a estudante: “desenvolver os
trabalhos do projeto está sendo um aliado para a minha
saúde mental nesse momento.”
A proposta do NOS e as respostas dos/as estudantes
nos levam a compreensão de que o currículo do projeto é um
currículo que promove encontros, composições e possibili-
dades de integração curricular. Além disso, o currículo do
NOS é também um currículo de experiências. Sobretudo, a
experiência como destaca Bondía (2002, p. 21), como aquilo
que nos passa, o que nos acontece, o que nos toca. “A cada dia
se passam muitas coisas, porém, ao mesmo tempo, quase nada
nos acontece”. Este autor também destaca que a experiência é
cada vez mais rara no sujeito moderno por excesso de infor-
mação, de opinião, de trabalho e falta de tempo. O trabalho,
sobretudo aquele concebido como relação mecanizada e tec-
nicista estabelecida com as pessoas, com as palavras e com
as coisas, é contrário à experiência.
Neste sentido, o projeto NOS têm buscado possibilitar
aos/às estudantes experiências no contato com o conheci-
mento, com a comunidade, e na reflexão sobre si mesmos. A
potencialidade destas experiências tem se demonstrado na
possibilidade de tocá-los, transformá-los e provocar refle-
xões. Por meio da nuvem de palavras que se segue na figura 1,
estão apresentados diversos sentimentos que, segundo os/as
estudantes, traduzem a sua experiência como participantes
do projeto NOS no enfrentamento da Covid-19”.

151
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

Figura 1 – Sentimentos que traduzem a experiência com o NOS

Fonte: Elaborado pelos autores

Concordamos com Bondía (2002) no sentido de que


para promovermos um currículo de experiências temos que
romper com a lógica de formação de um sujeito que quer
conformar o mundo, tanto o mundo natural quanto o mundo
social e humano, tanto a natureza externa quanto a natureza
interna, segundo seu saber, seu poder e sua vontade. A expe-
riência, da forma como a percebemos nos/as estudantes da
equipe do NOS, requer um gesto de interrupção, suspender a
opinião, suspender o juízo, suspender o automatismo da ação,
cultivar a atenção e a delicadeza, abrir os olhos e ouvidos,
escutar os outros e cultivar a arte do encontro. Só assim, as
ações do projeto podem passar a ser mais do que informação,
mais do que opinião, mais do que trabalho e mais do que gasto
de tempo. Só assim é possível sentir a empatia, a gratidão, a

152
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

felicidade, o autoconhecimento, o desenvolvimento, o cres-


cimento e tantas outras experiências que nos passam.

CONSIDERAÇÕES

A pandemia da Covid-19 trouxe um desafio para o NOS


como projeto de extensão com um trabalho vinculado dire-
tamente ao contato com as comunidades. E esse desafio foi
enfrentado a partir do levantamento de novas demandas, da
reformulação de estratégias e do uso de novas tecnologias.
Esta nova condição também trouxe novas experiências, novas
conexões e reflexões sobre as ações propostas. Por meio do
NOS, a extensão, que tem um papel importante na integração
entre escola/universidade e comunidade/sociedade, se viu
ainda mais fortalecida em um momento em que as atividades
de ensino tiveram que ser interrompidas.
Os estudantes participantes da equipe do NOS evi-
denciam seu potencial integrador entre formação técnica e
formação humana, e mais notadamente, o incentivo às buscas
sobre conteúdos relacionados à formação humana para a
concretização das ações junto à comunidade. Entretanto, a
proposta de integração curricular enfrenta desafios por estar
vinculada a currículos fragmentados, organizados em disci-
plinas fragmentadas, muitas vezes, sem articulação entre si,
com as vivencias dos/as estudantes, nem com a efetiva prepa-
ração para a convivência social e para o mundo do trabalho.
Convivendo e resistindo à fragmentação, o currículo
do NOS, ou o currículo-NOS, tem se configurado por meio
dos encontros que tem estabelecido entre os atores do cur-
rículo e entre os diferentes segmentos numa proposta que é
nomeadamente de extensão, mas profundamente vinculada
ao ensino e à investigação. O currículo-NOS também é um
currículo que busca oferecer experiências para seus atores

153
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

relacionadas à reflexão sobre si, sobre o outro, e sobre a sua


ação no mundo que o cerca.

REFERÊNCIAS

BEZERRA, Zedeki Fiel et al. Comunidade e escola: reflexões sobre


uma integração necessária. Educar, Curitiba, n. 37, p. 279-291,
maio/ago. 2010.

BONDÍA, Jorge Larossa. Notas sobre a experiência e o saber da


experiência. Revista Brasileira de Educação, n° 19, 2002.

BRASIL. Ministério da Educação. Políticas Públicas para a Edu-


cação Profissional e Tecnológica. Brasília: SETEC, 2004.

BRASIL. Ministério da Educação e Cultura. Centenário da Rede


Federal de Educação Profissional e Tecnológica. Brasília, 2009.

BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Lei n°


9394, 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases
da educação nacional. Brasília, 1996. 

BRASIL. Lei nº 11. 892, de 29 de dezembro de 2008. Institui a Rede


Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica;
cria os Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia.
Brasília, 2008.

BRASIL. Decreto nº 6.302, de 12 de dezembro de 2007. Institui o


Programa Brasil Profissionalizado. Brasília, 2007.

FÁVERO, Maria de Lourdes de Albuquerque. Produção e apropria-


ção do conhecimento na universidade. In: MOREIRA, Antonio
Flavio Barbosa. (org). Conhecimento educacional e formação
do professor: questões atuais. Campinas: Papirus, 1994. p. 53-70.

GIROUX, Henry A. Os professores como intelectuais: rumo a uma


pedagogia crítica da aprendizagem. Porto Alegre: Artmed, 1997.

154
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

GUERRA, Isabel Carvalho. Pesquisa Qualitativa e Análise de


Conteúdo: Sentidos e Formas de Uso. Lisboa: Principia, 2006.

MORAES, Francisco; KÜLLER, José Antônio. Currículos inte-


grados no ensino médio e na educação profissional: desafios,
experiências e propostas. São Paulo: Editora Senac São Paulo, 2016.

MEDEIROS, Valéria Matos Leitão; LEITE, Jocileide Bidô Carvalho;


PEREIRA, Maria Zuleide da Costa. Trajetória histórica das políticas
curriculares da educação profissional técnica de nível médio no
Brasil. Trabalho e Educação. v. 22, n. 2, p. 137-153, mai/ago. 2013.

PINHEIRO, Daniel Cabino; GUERRA, Ana Carolina; TOLEDO, Dimi-


tri Augusto da Cunha. O papel da educação na transformação das
relações de trabalho na Economia Solidária: Contribuições a partir
da organização coletivista Cecocesola. Administração Pública e
Gestão Social, 9(2), abr.-jun., 2017, 76-86.

SANTOS, Boaventura de Sousa. A universidade no século XXI:


para uma reforma democrática e emancipatória da universidade.
3ª ed. São Paulo: Cortez, 2010.

155
LA FAMILIA EN EL SORPRESIVO ROL
EDUCATIVO FRENTE A LA COVID-19:
EL RETO

Yoisell López Bestard40


Juan Eligio López García41
María Caridad Bestard González42

INTRODUCCIÓN

La pretensión es colocar en tela de juicio público refle-


xiones en torno a cómo desde el hogar se enfrenta la necesaria
continuidad de la educación como proceso permanente, en
tiempos en que un flagelo inesperado azota sin piedad al
mundo: Covid-19. La reflexión se plantea desde una aproxi-
mación problematizada al pensamiento de cada miembro de
la familia, cada grupo etario, que convive en cualquier hogar
del mundo, en tales momentos.
El primer pensamiento en este caso, aunque no resulta
lo común cuando se habla de educación, es para los padres
de los estudiantes. Para ellos, apreciados como miembros del
hogar, de esa familia toda, como aquellos que conviven en ese
espacio más íntimo, con los estudiantes.

40 
Doutor Ciencias por la Universidade Federal do Rio Grande, Brasil. Profesor Escuela
Estadual de Enseñanza Fundamental Orestes Manfro. ylbestard@gmail.com
41 
Doutor Ciencias por la Universidad de Granada, España. Profesor de la Universidad
de Cienfuegos, Cuba. jelopez@ucf.edu.cu
42 
Doutora Ciencias por la Universidad de Oviedo, España. Profesora de la Universidad
de Cienfuegos, Cuba. mbestard@ucf.edu.cu

156
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

La mala jugada que nos ha dado el nuevo coronavirus


desde finales de 2019, y su entrada “triunfal” en el año 2020,
con su indeseada presencia repartida mundialmente, deja
percibir un rompimiento de la vida cotidiana poblacional que
se extiende a la comunidad, al barrio, al hogar. La primera y
negativa consecuencia que aporta es la de padecer, sufrir y,
hasta en muchos casos, morir, por esta enfermedad.
Para evitar tal desenlace, otra “cara de la moneda” (entre
las tantas derivaciones que pueden ser mencionadas), puede
identificarse a partir de conocerse las reacciones que ha pro-
vocado la más segura vacuna: el aislamiento social con su
consabido confinamiento higiénico, en casa.
El acercamiento analítico que se propone ante dicha
reacción, se enmarca en la educación como un proceso que,
obligatoriamente, ha debido continuarse en la casa, en medio
de la pandemia. ¿Cuántas ramificaciones de la reacción se han
podido observar en los miembros de la familia como efectos
de dar continuidad a la educación en el hogar en tiempos de
pandemia covidiana?
La respuesta a esta pregunta inicial se organiza en varias
ideas. La primera, alude al reconocimiento de la importancia
de la educación para el desarrollo y la necesidad de su perma-
nente presencia, en la que el profesor, el maestro, el enseñante,
desde el espacio de la escuela juega un papel fundamental.
Otra de las ideas hace referencia al análisis de la rutina
de acciones hogareñas a causa de dicho proceso, (hasta la lle-
gada del Covid-19). La idea se pretende desarrollar mediante
una comparación entre lo que “normalmente” sucedía, y el
hecho del cambio repentino que provocó en todos en un pri-
mer momento de “desconcierto”.
Lógicamente, al final quedará expuesta una idea refle-
xiva que, a modo de propuesta, alternativa, representa los
aprendizajes adquiridos, y que como en muchas partes del
mundo se ha dicho: “llegaron para quedarse”, pero que en

157
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

definitiva, apuntan, en realidad, a que la educación y los


actores que intervienen, desde fuera del hogar, en el desar-
rollo de ese proceso, sean mejor valorados, comprendidos y
apoyados, por los beneficiarios que, al interior, conviven en
cada hogar, en cada familia.

LA EDUCACIÓN COMO PROCESO: LO


HABITUAL Y LO INUSUAL

La educación, “es preparar al hombre para la vida”


(MARTÍ, 1883, p. 281). De las lecturas a José Martí recono-
cemos que “educar es ante todo una obra de infinito amor”
(MARTÍ, 1861, p. 139). Ambas ideas dejan apreciar claramente
que para que se produzca debe existir un enseñante (al menos)
y alguien que aprende.
La educación escolarizada, formal, dentro del espacio
áulico, precisa de un docente organizado, que conozca a sus
estudiantes, que sepa, desde las características psicológicas de
la edad y sus diferencias individuales, guiarlos por un proceso
educativo previamente conformado, a partir de programas de
asignaturas, con la definición de sus objetivos y habilidades a
desarrollar con cada contenido previsto. Encaminarlos hacia
un aprendizaje de conocimientos, desarrollo de habilidades,
actitudes, capaces de convertirlos en hombres y mujeres de
bien, aportadores de beneficios a la sociedad en el futuro.
Para lograrlo, el docente pone en juego su maestría
pedagógica: aplica métodos y procedimientos propios de la
profesión de enseñar, educar. Durante el tiempo de clases,
va evaluando el rendimiento académico de sus estudiantes, y
él mismo, auto evaluándose en su quehacer, para lograr cada
vez mejores resultados docentes.
En ese proceso se auxilia de medios, recursos de
enseñanza, y hasta donde le es posible, actualmente, por las
propias condiciones de la institución educativa donde trabaja,

158
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

el empleo de las nuevas tecnologías para la comunicación e


información. Algo que como se sabe, aunque llegaron para
quedarse y desarrollarse cada vez más, no sustituirá definiti-
vamente el papel del docente, puesto que es quien lo planifica,
organiza, dirige y evalúa.
Durante ese proceso educativo, los estudiantes aprenden
a desarrollar capacidades que tienen que ver con la interacción
social, como las de trabajar en grupo, en equipos, cuando
exponen conocimientos, ser creativos ante la solución de pro-
blemas que se le plantean. Mientras que, para convivir social-
mente, acorde a las normas sociales establecidas, adquieren
y ponen en acción patrones de educación para la vida, como
la responsabilidad, puntualidad, la forma de expresarse ante
los demás, demostrando respeto por los criterios de otros, y
con ética defender los suyos.
En este proceso, todos coincidimos en que debe ser inte-
gral. Este pensamiento conduce a analizar cómo la educación
precisa inevitablemente de aprendizajes sobre la cultura física,
la cultura artística y literaria, la participación en determina-
dos proyectos que les permita también interactuar dentro y
fuera de la comunidad escolar y así, continuar preparándose
para la vida.
Así se tienen en cuenta las asignaturas de Educación
Física, Educación artística, Educación laboral, Educación
ambiental, conjuntamente con la participación en activida-
des extraescolares que les vinculen a cuestiones propias de
sus aprendizajes para la vida, que de forma rápida pueden
observar y colaborar en la comunidad donde está enclavada
la escuela. Pero todo esto precisa organización, experiencia de
trabajo, profesionalidad, así de esta forma, concordamos con
Pestalozzi cuando defiende “el fin último de la educación no
es la perfección en las tareas de la escuela, sino la preparación
para la vida” (PESTALOZZI, 1827, p. 29).

159
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

A grandes rasgos, en una brevísima descripción, se ha


expuesto lo habitual, conocido, respecto a la educación como
proceso. Tan cotidiano, que a veces se hace invisible para los
que son beneficiados con tan importante tarea social: los
padres, la familia.
Mucho se ha publicado respecto a la participación de la
familia, de su concepto, su contenido para cumplir la función
social en el necesario vínculo con la escuela. La familia con su
apoyo a la escuela, tiene la posibilidad de ser continuadora del
proceso educativo con grandes beneficios en sus resultados.
También mucho se ha publicado, hablado, escrito de
la necesaria implicación de la familia en la educación de las
generaciones futuras. La sociedad puede recordar alternativas
de las “escuelas de padres”, las “reuniones de padres” para
ofrecer datos sistemáticos de los progresos o retrocesos de
los estudiantes en la escuela, para explicar a los padres cómo
proceder con sus hijos a la hora de realizar la tarea en casa.
Pero, estas actividades, ¿Se habrán tomado en serio, pensando
que alguna vez, en estos tiempos del siglo XXI la familia, ten-
dría que compartir con responsabilidad la continuidad a lo
planteado por la escuela en sus casas?, ¿Se había vivenciado
claramente esta importante responsabilidad al interior de la
vida hogareña?
Quizás las vivencias más cercanas puedan mencionarse
por algunas familias que se han visto en la necesidad de la
presencia de docentes en casa, cuando el estudiante ha estado
enfermo, o tener algún impedimento mayor que precise la
presencia de docente especializado con cierta regularidad en
casa, para dar atención a las necesidades educativas de algún
estudiante. Y en ese caso específico, la imagen que puede venir
a la mente para la familia es quizás, la de crear un mínimo de
condiciones para un tiempo planificado, en favor de que este
importante proceso se produzca de la mejor manera posible.

160
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

Pero ahora, año 2020, en el preciso momento de auge


de la pandemia por la Covid-19, ¿Por qué pensar en la edu-
cación de una forma más delimitada? ¿Cuál y por qué sería
esa delimitación? Aparentemente son muchas preguntas
de golpe, sin embargo, pueden surgir más, si se aclara que
la concreción de este proceso será apreciada en este caso al
interior de los hogares y la familia.
¿Qué era lo tradicional reconocido hasta ahora por
la familia respecto a la educación de los hijos?, ¿Cuál era
la rutina hogareña organizada por la familia, respecto a la
educación de los hijos?, ¿A quién era “entregada” casi toda la
responsabilidad de la educación, digamos: escolar?
Son preguntas para invitar a la reflexión de los lecto-
res de esta comunicación. Tales cuestionamientos tienen la
finalidad de que la familia analice cómo de pronto, (sin previa
etapa de sensibilización), la casa se convirtió en el contenedor,
como espacio, en un mismo tiempo, para toda la familia. Un
mismo espacio y tiempo para que cada cual realice las acciones,
tareas, responsabilidades, que cotidianamente se realizan
en su interior, (sin pensar que cada día, excepto los fines de
semanas, los niños y jóvenes de la casa están en la escuela).
La imaginación, (del latin imaginatio – õnis), y que según
la Real Academia Española (2001), reconoce desde la feno-
menología, que es “ver la realidad de muy diversas maneras,
según la persona que mira, y según la mirada que ésta ofrece”
ayudará a proporcionar diferentes respuestas.

LA EDUCACIÓN COMO PROCESO: LO


INUSUAL

Está claro que cada miembro de la familia se habrá pre-


guntado y quizás aún se está preguntando: - Y ahora, ¿cómo
quedo yo? - Porque cada cual tenía organizada su vida, a su
manera. Cada cual “tomaba su rumbo” cada día: al trabajo, a

161
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

la escuela, a las tareas del hogar (según correspondiera). No


había una planificación consensuada de actividades por los
miembros de la familia en cada hogar.
En el caso de la educación de los niños y jóvenes, la
mayor responsabilidad estaba dedicada al maestro, al profe-
sor, (aunque en casa, al regreso, después de haberse cumplido
el horario de la escuela, se ocuparan de que el estudiante
realizara la tarea).
De pronto todo cambió. La escuela tuvo que cerrar sus
puertas para evitar la propagación del virus, pero la educación,
debía continuar su ritmo, y la vida debía también. ¿Estaba
preparada la familia para ello?, ¿Habrían sido suficientes
aquellas ideas de capacitación a la familia proporcionadas
por la escuela, a través del tiempo?, ¿Qué se enseñaba a los
padres en tiempos pasados para dar seguimiento al proceso
educativo en casa por la familia?, ¿Qué se ha necesitado ahora?
Otra vez, muchas preguntas, pero intentan la reflexión,
no la crítica, sino, colocarnos en el “lugar de”. Ahora muchos
padres manifiestan no estar preparados para determinados
métodos y procedimientos educativos y aparentemente, se
aprecia un desconcierto, una especie de caos, que en el hogar
afecta a todos.
El análisis requiere un orden que permita una mirada
a este desafío, para la escuela y para la familia.

EL PROCESO DE LA EDUCACIÓN EN
TIEMPOS DE COVID-19: LAS VÍAS DE
COMUNICACIÓN EDUCATIVA COMO
DESAFÍO PARA LA ESCUELA

Es cierto que la escuela asume su responsabilidad en


esta etapa, fue de pronto, pero inició el enfrentamiento al
desafío. Apeló a las tecnologías educativas: la televisión, el

162
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

teléfono fijo, el móvil, el uso de internet, las plataformas


digitales interactivas. A partir de ellas, y en dependencia de
las posibilidades, de un lado: de las instituciones educativas,
la formación de sus docentes para enfrentarlas, y del otro
lado, las posibilidades económicas de las familias para tener
y acceder a las mismas, el dominio de los estudiantes para
manejar las tecnologías de la información y la comunicación.
(Es una certeza que, desde pequeños, los niños, adolescentes,
jóvenes, son muchas veces más diestros que las personas
mayores en el hogar, para el manejo de todos estos nuevos
artefactos tecnológicos).
Por parte de la escuela, aparecieron alternativas: las
clases online con los estudiantes y con ellas, los encuentros
virtuales, entre docentes para coordinar sus intervenciones,
entre los directivos y los docentes, para planificar, controlar
el proceso, por mencionar algún ejemplo de interactividad
entre educadores.
Canales de televisión dedicados a esta tarea en deter-
minados horarios, (en este, sentido es loable la implicación
e integración de otros sectores de apoyo a la educación). Es
una alternativa que conllevó a la preparación con urgencia
de profesores virtuales, previendo la planificación de las
clases lo más cercanas posible a la mayoría de los intereses
de colectivos docentes, (desde la idea de que no en todos los
países existe un sistema nacional de educación, en que todos
los niveles de enseñanza respondan y marchen a la vez por un
mismo sistema de contenidos y habilidades), la preparación
psicológica de profesores que quizás nunca pensaron que
“actuarían” ante la televisión.
Y más concretamente, por los propios docentes, ape-
lando a su alto nivel de creatividad y maestría pedagógica,
la conformación de grupos de Whatsapp para mantener la
comunicación, las interacciones en redes sociales como el

163
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

Facebook, el envío por e-mail de documentos digitalizados


con indicaciones, contenidos, tareas.
Con todo ello, la simulación de formas de intercambio
entre docentes y estudiantes, fueron, y son formas de accionar,
para mantener la comunicación educativa.
Desde la imaginación de todas las medidas posibles
tomadas por las escuelas, los niveles de enseñanza, las coordi-
naciones con docentes y otras empresas, la simulación urgente
del proceso y su puesta en marcha, fueron algunas acciones
emprendidas por los directivos de educación en cada espacio,
pero, una vez, organizado el proceso desde esas alternativas,
¿Cómo se desarrolló en las casas de los estudiantes?

EL PROCESO DE LA EDUCACIÓN EN
TIEMPOS DE COVID-19: LA COMUNICACIÓN
EDUCATIVA AL INTERIOR DE LOS HOGARES
COMO DESAFÍO PARA LA FAMILIA

El desafío es inmenso. Se examinará con mayor dete-


nimiento para hacer posible su comprensión, y contribuir
al logro de una reflexión más profunda, en favor de extraer
las inevitables enseñanzas, aprendizajes, y hasta moralejas,
¿por qué no?
Es preciso continuar auxiliándonos de la imaginación
para hacernos una idea paso a paso, del reto que para la familia
ha devenido la sorpresiva Covid-19, al menos en el plano de
la educación.
Simular el proceso de establecimiento de una cierta
“cotidianidad hogareña” en beneficio de la educación de los
estudiantes (de diferentes edades) en la casa, ayudará a la com-
prensión del mensaje que alternativamente se ofrece al final.
El lógico punto de partida: ya la familia está informada
de que tiene que “quedarse en casa” con los niños, adolescentes,

164
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

jóvenes… y dentro de las 24 horas del día, dedicar un buen


tiempo para contribuir a que se cumpla el proceso educativo.
Una serie de preguntas ayudará a la reflexión de lo que
se ha hecho o de lo que queda por hacer, para que “entre” en
casa el proceso educativo. Porque también debe pensarse en el
momento en que el proceso ya “entró”, pero, ¿cómo ayudar a
su comprensión, cumplimiento de las tareas encomendadas?
Ese es un análisis posterior.
Por tanto, para que “entre” el proceso en casa, las pri-
meras preguntas estarán dedicadas a la categoría tiempo. ¿A
qué hora sucederá el proceso?, ¿Cuánto tiempo puede durar
cada día? ¿Quién o quiénes en casa se ocuparán de que se
desarrolle con la calidad posible? ¿Todo el tiempo será para
los contenidos con cuadernos, libretas, libros y lápices?, ¿se
previó el horario de receso, de la merienda?
¿Fueron pensadas también las acciones para cambiar
de actividad entre una asignatura y otra?
¿Cuándo pueden desarrollar alguna actividad física?,
¿Cuál actividad física? ¿Cómo se selecciona, cómo se dosifica?
¿Cuándo prever actividades artísticas que ayuden
a su creatividad, a desarrollar sus actitudes y aptitudes
hacia el arte??
La segunda categoría de análisis: el espacio. ¿Cómo
organizar el espacio de los estudiantes para esta actividad
diaria?, todos los estudiantes que conviven en la casa, ¿están
en el mismo grado, en el mismo nivel de enseñanza? ¿Qué
comodidades le vamos a asegurar para que se sientan “como en
la escuela”?. ¿Se dispone de mesa, silla, suficiente iluminación,
ventilación, ya sea natural o artificial?, ¿El espacio es lo más
tranquilo posible para que el estudiante pueda concentrarse
al realizar sus actividades?
La tercera categoría de análisis: los recursos a emplear
para la comunicación. ¿Qué equipo utilizarán? Televisión,

165
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

teléfono fijo, computadora, tablet, teléfono móvil. Si hay


más de un estudiante en casa en distinto grado y nivel de
enseñanza, ¿Dispone la familia, y de ella los estudiantes, con
recursos para cada uno?, ¿Cómo será el uso de los recursos?
En el caso de los recursos de tecnología digital: ¿Se dis-
pone de conexión a internet? ¿Se cuenta con las aplicaciones
necesarias? ¿Se conoce de su manejo?
Parecen preguntas innecesarias, pero si no se tienen en
cuenta con antelación, todo el esfuerzo de la escuela queda
en el vacío.

SIN EL DOCENTE PRESENTE: EL RETO


MAYOR PARA LA FAMILIA

Pero el reto para la familia dentro del hogar aun es


mayor. Porque suponiendo que se cuenta con el tiempo, el
espacio, los recursos, la virtual presencia del maestro en unos
horarios y las orientaciones están dadas por el docente por
cualquiera de esas vías, después, corresponde a los estudiantes
cumplirlas. Aparece ahora una nueva situación que califica
como la más problemática. ¿Qué procedimientos emplear en
el hogar para que cada tarea orientada llegue a feliz término?
Si el estudiante precisa de un poco de motivación, de ánimo,
¿Cómo proceder? Si el estudiante precisa de una explicación
más profunda o detallada para lograr comprender e interpre-
tar, ¿Cómo proceder?
¿Quién o quiénes se responsabilizan con esta parte del
proceso educativo dentro de la casa? ¿Cómo debe proceder?
Moraleja: hay que aprender con el maestro y con el
estudiante. Se requiere una introducción juiciosa en el pro-
ceso educativo, con alto grado de responsabilidad en este
tiempo, y si la acción llegó con la Covid-19, para quedarse…
(No la Covid, de esa enfermedad quizás se tenga que asumir

166
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

su carácter endémico), entonces, hay que asumir el reto de


compartir conscientemente la responsabilidad de la educación
de los estudiantes dentro de la familia.

CONSIDERACIONES

No todo está perdido: se ofrece un corazón

El último epígrafe de esta comunicación toma del can-


tante Fito Páez la idea general de una parte de su alentadora
canción. El metafórico corazón que se ofrece corresponde a la
pretensión esbozada al inicio: reflexionar, en favor de sumar a
más actores sociales a la hermosa y necesaria tarea de educar.
Para los autores representa una sugerencia de alterna-
tiva a ser aplicada en encuentros entre la escuela y la familia
después de la pandemia. Siempre con la previa planificación
del objetivo que se persigue para beneficiar el resultado del
proceso docente – educativo.
El esquema de epígrafes presentado para el desarrollo
de la comunicación constituye una alternativa de organiza-
ción del análisis. Organiza el desarrollo de las ideas desde la
perspectiva con la que pudiera comprometerse cada parte de
los actores implicados.
El esbozo de las categorías tiempo y espacio, unido al
referente de los recursos, permite un desglose pormenorizado
de los elementos a tener en cuenta, al momento de pensar
cómo puede aportar la familia un orden al logro de futuros
momentos en que se requiera esta labor desde el hogar.
A la vez, ofrece una idea a la familia para el replantea-
miento futuro en relación a la satisfacción de necesidades
propias de los estudiantes en beneficio de su propia formación,
incluidas el incremento del respeto al tiempo del estudiante

167
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

en casa, con respecto a sus responsabilidades, el espacio del


que deben disponer para lograrlo, e incluso la necesidad de
determinados recursos materiales.
Queda claro que la familia precisa actualizarse en torno
a determinados procederes pedagógicos y psicológicos que
ayuden cada vez más a la formación inicial de sus hijos en
el hogar. También la escuela pudiera revisar la formación
de sus docentes en la actualización del manejo de las nuevas
tecnologías de la información y la comunicación y las formas
de utilizar las diferentes aplicaciones útiles al proceso docente
educativo.
La escuela puede contribuir con la promoción cultural
de acciones formativas que favorezcan una actualización
a la familia, en especial a los padres, respecto a procederes
propios de aplicar en el hogar durante la realización de las
tareas, y en la propia vida de los estudiantes.
Pero, sobre todo, la comunicación se convierte para
el futuro, en una huella, a modo de evidencia, de las vici-
situdes por las que transitó la sociedad ante la presencia
de la pandemia y las formas de solucionar las dificultades.
Las mismas aportan valiosas experiencias que no deben
quedar en el olvido, sino que deben ser estudiadas, anali-
zadas, como las más variadas formas de comportamiento
cotidiano, desde las que la escuela y la familia pueden
planificar y desarrollar acciones de promoción cultural
para el bien de la sociedad.
La principal enseñanza que se desea dejar expresada
en cuanto a la forma de desarrollar la comunicación, tiene
que ver con el proceso de problematización como forma
de contribuir a una simulación de las acciones de benefi-
cio al proceso docente – educativo para enfrentar futuras
contingencias.

168
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

REFERENCIAS

MARTÍ, J. Ideario Pedagógico. La Habana: Imprenta Nacional de


Cuba. 1961.

MARTÍ, J. Escuela de Electricidad. La América, Obras Completas,


Nueva York: Editorial Nacional de Cuba, v. 8, 1963.

PESTALOZZI, J.H. Carta vigéssima primera. En: Cartas sobre Edu-


cación Infantil. Londres, 1827.

169
A IMPORTÂNCIA DA INTELIGÊNCIA
EMOCIONAL EM TEMPOS DE COVID-19:
A (TRANS)FORMAÇÃO DA RELAÇÃO
PROFESSOR/ALUNO

Eloiza da Silva Gomes de Oliveira43


Silvia Helena Mousinho44

Ladislau Dowbor abre um pequeno e denso livro


com uma mensagem deixada por um prisioneiro
de campo de concentração nazista na qual, depois
de viver todos os horrores da Guerra – “crianças
envenenadas por médicos diplomados; recém-
nascidos mortos por enfermeiras treinadas;
mulheres e bebês fuzilados e queimados por
graduados de colégios e universidades” – pede que
os professores “ajudem seus alunos a tornarem-se
humanos”, simplesmente humanos. E termina: “ler,
escrever e aritmética só são importantes para fazer
nossas crianças mais humanas”. (Moacir Gadotti)

PRIMEIRAS PALAVRAS

Desde os cursos de formação docente, a escola sinaliza


os futuros professores sobre a necessidade de reflexões quanto
43 
Professora Titular da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ); Docente do
Programa de Pós-Graduação em Políticas Públicas e Formação Humana (PPFH); Diretora
do Instituto Multidisciplinar de Formação Humana com Tecnologias (IFHT). eloizago-
mes@hotmail.com
44 
Doutoranda em Políticas Públicas e Formação Humana (PPFH) pela Universidade do
Estado do Rio de Janeiro (UERJ); Coordenadora de Estágio Supervisionado (Licenciaturas de
Física/Matemática no CEDERJ/UAB - Pedagógicas- UERJ). silviamousinho.sm@gmail.com

170
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

ao seu papel, apontando a importância da não neutralidade


da prática educativa. A sua função formadora visando à pre-
paração de cidadãos conscientes, íntegros e participativos
reconhece no processo de construção do conhecimento a
multidimensionalidade do ser humano. Nas palavras de Santos
Neto (2006), encontramos essa conjunção:
Tão importante quanto conhecer e discutir
as ideologias políticas em vista da transfor-
mação social é também importante: o auto-
conhecimento; o trabalho com o corpo, com
as emoções, com a razão e com o espírito;
o desenvolvimento da consciência ecoló-
gica; o respeito pelas diferenças pessoais,
coletivas e raciais; a articulação entre o
mundo da interioridade e da exteriori-
dade sócio-político-econômica em uma
realidade onde todas as dimensões estão
interligadas. (NETO, 2006, p. 42)
Sem a presunção de promover ações ou estratégias que
exigem formação em áreas específicas, a nossa proposta é
trazer para o cenário educativo elementos nomeados emocio-
nais que, por sua dificuldade de mensurabilidade, têm pouca
visibilidade quando se trata de sua importância na formação
do educador e do educando. Em uma abordagem investigativa
do tema em tela, buscamos desvelar de que modo são tecidas
e articuladas as relações entre razão e emoção nos cursos de
formação de professores, a fim de qualificar os processos de
ensino e de aprendizagem. Esse interesse particularmente
convoca-nos a uma maior compreensão do papel da inteli-
gência emocional no contexto educacional.
A concepção de inteligência a partir do início do século
passado já passou por múltiplas revisões e considerações
que marcaram a sua história. Até o início dos anos 1980, a
psicologia tradicional partilhou o conceito de inteligência
preconizando o famoso QI - Quociente Intelectual - nascido
na França em 1905 e adaptado à realidade norte-americana,

171
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

como a medida para a obtenção de êxito na escola e, à época,


supostamente também na vida. Howard Gardner defendeu,
em 1975, a sua tese sobre a existência de inteligências múltiplas
com conceitos sobre as dimensões intrapessoal e interpessoal,
abrindo novas perspectivas no campo da psicologia como
precursor da inteligência emocional.
O conceito de Inteligência Emocional (IE) surgiu na
década de 90, suscitando polêmica e controvérsias ao possi-
bilitar novos olhares para os atuais paradigmas que regem
a sociedade. A reflexão como estratégia na construção do
conhecimento sempre esteve direcionada à racionalização
do processo pedagógico em detrimento de suas dimensões
emocionais e éticas. De algum modo, a supervalorização da
racionalização pode acarretar um certo grau de determinismo,
levando à desconsideração de sentidos que justifiquem alter-
nativas às situações.
A concepção de IE em 1990 ganha visibilidade com
Salovey e Mayer, através de um modelo que se processa pelas
capacidades de: percepção acurada das emoções; uso da emo-
ção para facilitar o pensamento; compreensão das emoções;
gerir as emoções para o crescimento pessoal (MAYER, J. D. at
al, 2002). Essa compreensão da Inteligência Emocional (IE)
ampliou o conceito de inteligência, abrangendo a habilidade
do indivíduo que inclui, por exemplo, identificar e lidar com
as emoções e os sentimentos resultantes da insatisfação com
o ambiente de trabalho e com as atividades profissionais.
Com o surgimento de novos modelos alternativos no
campo da IE, Goleman (1996) destacou-se por considerar,
também, como parte deste construto aspectos da persona-
lidade humana. O autor em 1996, em seu livro “Inteligência
Emocional”, explora os domínios básicos a partir dos quais
se desenvolve a Inteligência Emocional: Autoconsciência
- melhora no reconhecimento e designação das próprias
emoções (autoconhecimento emocional); Controle emocio-

172
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

nal - habilidade do sujeito para gerir as próprias emoções


(autocontrole); Automotivação – capacidade de canalizar
produtivamente as emoções (persistência); Reconhecimento
de emoções nos outros - capacidade de adotar a perspectiva
do outro (empatia); Habilidade em relacionamentos inter-
pessoais – aptidão social (sociabilidade) (GOLEMAN, 1996).
A crise de identidade e de valores que afeta hoje a huma-
nidade, com altos índices de criminalidade e de violência,
caracteriza uma sociedade enferma emocionalmente, onde se
preconiza a cultura do “ter” em detrimento do “ser”. Para nós,
educadores, comprometidos com o processo de transformação
dos mais diversos segmentos da sociedade, é crucial o enten-
dimento da necessidade de trabalhar com o “e” e não somente
com o “ou” quando se trata de razão e emoção. Para que haja
uma mudança de postura frente aos atuais paradigmas, a
aceitação e a compreensão de que somos seres emocionais e
racionais é um processo resultante de um repensar contínuo
em todos os espaços que não só o educacional.
Em janeiro de 2020, uma pandemia atinge o planeta
de modo inesperado, causada pelo novo coronavírus, e a
Covid-19 confronta-nos da noite para o dia com um inimigo
invisível e suficientemente poderoso para colocar em risco
de vida iminente 7,8 bilhões de pessoas (estimativa da ONU
em 2020 da população terrestre). Em meio ao vórtice criado
pela doença infecciosa provocada por esse invasor devasta-
dor, a prevenção mais eficiente anunciada pela Organização
Mundial de Saúde (OMS) e pelos organismos competentes é
o isolamento social.
A pergunta crucial que fazemos a cada instante: “quanto
tempo vai durar esse isolamento?” não tem resposta. Mas
mesmo em tempo de coronavírus, em um cenário desolador,
a vida segue..., impondo-nos mudanças radicais em nossas
rotinas. Estamos mergulhados em um caos e a insegurança é
um gatilho para o desencadeamento de emoções que se enre-

173
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

dam simultaneamente, como: medo, tristeza, raiva... E como


consequência do isolamento social, a solidão de muitos tem
gerado crises de pânico e sintomas físicos, tais como: dor de
cabeça, taquicardia, aumento da pressão arterial e diversas
alterações de ordem psicossomática.
Em um clima de tensão e desespero, famílias carentes e
privadas das possibilidades de fazer uso dos meios habituais
para a sua subsistência, e que ainda sofrem por não disporem
de espaço físico suficiente para acomodar todos os seus mem-
bros, acabam por intensificar nas suas relações interpessoais
manifestações de irritabilidade, ansiedade, rompantes de
raiva, culminado com o aumento dos atos de agressão e de
violência familiar. Em São Paulo, a violência contra a mulher
aumentou 44,9% durante a pandemia, segundo o Fórum
Brasileiro de Segurança Pública (FBSP) (BOND, 2020).
Na educação, o momento presente impacta-nos com o
seguinte quadro: escolas fechadas, ano letivo interrompido,
alunos e professores em casa. Em meio às consequências
avassaladoras da Covid-19, constatamos o empenho das ins-
tituições educacionais públicas e particulares na corrida para
a produção maciça de material educativo, disponibilizado
nos ambientes virtuais, para ser trabalhado em casa pelos
alunos. O que vem chamando a nossa atenção é a importância
dada no que se refere ao cumprimento do que foi planejado,
suscitando dúvida quanto a uma educação orientada para a
supervalorização dos conteúdos curriculares.
É preciso um olhar cuidadoso para a realidade viven-
ciada por muitas crianças, adolescentes e jovens que estão
sendo submetidos a essa maratona de atividades disciplinares.
Cabe aqui, apenas para fins ilustrativos, relatar o caso de uma
criança de oito anos que, ao escutar o toque do celular, corre
para o quarto e esconde-se debaixo da cama para fugir da
tarefa escolar na sala de aula virtual. Segundo a mãe, a criança
ultimamente rejeita, inclusive, conversar com a avó por cha-

174
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

mada de vídeo. Sabemos que, a princípio, este é um exemplo


isolado, mas que não pode e não deve ser desconsiderado.
Estamos vivendo um momento atípico, pois à proporção
que a Covid-19 avança, acometendo milhões de pessoas em
todo o planeta, cresce assustadoramente o número daqueles
que não conseguem se convalescer da doença e vão a óbito,
deixando familiares sofridos com a perda irreparável de seus
entes queridos.
A reflexão que situa as subjetividades no
cenário político e ético, compreendendo
uma nova proposta humanista e crítica,
precisa reposicionar o sujeito, em sua
intersubjetividade, e será aquela capaz
de promover as atitudes de solidariedade.
(MORAES; VIEIRA, 2015, p. 60)
A realidade vigente nos desafia a repensar os rumos que
a escola e nós, professores, temos que assumir para educar
visando à inteireza do ser humano. A compreensão de que é
preciso conciliar as mudanças nos cenários político e social
com a sua repercussão e implicação na educação envolve
processos sistemáticos de análise e criticidade, e a reestru-
turação da natureza da atividade docente pressupõe também
uma reforma do pensamento. Em tempos de coronavirus,
um profissional consciente de sua função docente não nega
o momento histórico, e é capaz de vislumbrar o caráter cole-
tivo e social de sua profissão, integrando-os no processo de
aprendizagem.
Além dos aspectos de necessidade de adaptação a
condições de trabalho extremamente novas, que exigem o
desenvolvimento de competências ainda inéditas, e da res-
ponsabilidade pelos processos de ensino e de aprendizagem
em condições remotas, os professores vivenciam, como a
maioria dos seres humanos, sintomas que se assemelham
aos de estresse pós-traumático, além de confusão, ansiedade
e insegurança. São frequentes as preocupações com o futuro,

175
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

com a escassez de suprimentos e com as possíveis perdas


financeiras, que também acarretam prejuízos ao bem-estar
psicológico, como indicam Shojaei & Masoumi (2020).
A globalização caracterizada pela integração e expan-
são econômica, política, cultural e social a nível mundial,
resume-se hoje na “globalização da Covid-19”. Nesse con-
texto de pandemia, onde a fragilidade e o abalo emocional
são inevitáveis, cultivar com os alunos uma relação de afeto
possibilita a manifestação de emoções e de sentimentos. As
abordagens e expressões sobre as mais diversas experiências
com que temos nos deparado são uma oportunidade histórica
para enveredar por novos paradigmas educacionais, com a
possibilidade de tornar factível uma educação voltada para
a construção de uma sociedade mais justa, verdadeiramente
comprometida com o cuidar do outro e cuidar do mundo, com
a concretização de uma prática educativa que não desvincule
inteligência intelectual e emocional.

AS EMOÇÕES

Os estudos sobre as emoções atualmente têm sido alvo


de interesse dos neurocientistas, psicólogos, biólogos, ou seja,
das mais diversas áreas, o que lhes tem conferido um conhe-
cimento mais amplo e mais aprofundado. Segundo Maturana
(2002), “do ponto de vista biológico, o que conotamos quando
falamos de emoções são disposições corporais dinâmicas que
definem os diferentes domínios de ação em que nos move-
mos” (p. 15). Para Damásio (2000), as emoções estão ligadas
à conservação da vida e podem ser entendidas como “con-
juntos complexos de reações químicas e neurais, formando
um padrão; todas as emoções têm algum papel regulador a
desempenhar” (p.74). Nesse sentido, as emoções são respos-
tas do organismo em decorrência de mudanças internas e
externas, conscientes ou inconscientes por circunstâncias de

176
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

origens relacionais, afetivas, cognitivas, fisiológicas, sociais


etc. (BRUNO, 2002).
Sabemos que quando estamos sob o domínio de uma
determinada emoção, há coisas que podemos fazer e coisas
que não podemos fazer, e que aceitamos como válidos certos
argumentos que não aceitaríamos sob outra emoção, mas
insistimos que o que define nossas condutas como humanas
é elas serem racionais (MATURANA, 2002). Para Goleman
(1996), todas as emoções são, em essência, impulsos para agir,
planos instantâneos para lidar com a vida que a evolução nos
infundiu, e esclarece ainda que:
A própria raiz da palavra emoção é movere,
“mover” em latim, mais o prefixo “e-”, para
denotar “afastar-se”, indicando que uma
tendência a agir está implícita em toda
emoção. Que as emoções levam a ações
é mais óbvio observando-se animais ou
crianças; só nos adultos “civilizados”
encontramos tantas vezes a grande ano-
malia no reino animal: emoções - impulsos
arraigados para agir - divorciadas de uma
reação óbvia. (GOLEMAN, 1996, p. 7)

Vivemos em sociedade, alimentados por uma cultura


que desconsidera o profícuo “entrelaçamento cotidiano entre
razão e emoção, que constitui o nosso viver humano” (MATU-
RANA, 2002, p.15), ignorando que:
O domínio racional em que nos movemos a
cada instante é constituído como um domí-
nio de coerências operacionais pela acei-
tação das premissas fundamentais que o
definem num ato emocional. As premissas
fundamentais que constituem um domínio
racional nós as aceitamos a priori porque
queremos fazê-lo, porque nos agradam.
(MATURANA, 2002, p. 92)

177
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

Para o cientista, na vida cotidiana, vivemos nossos argu-


mentos racionais sem fazer referência às emoções porque
acreditamos que tal condição seria uma limitação ao nosso
ser racional. Os estudos que propõem a articulação entre
razão, pensamento e emoção ainda são escassos, e o nosso
interesse é abrir espaço para desfazer concepções simplistas
sobre seus significados.
Dizer que a razão caracteriza o humano é
um antolho, porque nos deixa cegos frente
à emoção, que fica desvalorizada como algo
animal ou como algo que nega o racional.
Quer dizer, ao nos declararmos seres racio-
nais [...] não nos damos conta de que todo
sistema racional tem um fundamento emo-
cional. (MATURANA, 2002, p. 15)
Segundo Damásio (2000), “as emoções são processos
determinados biologicamente, e dependem de mecanismos
cerebrais estabelecidos de modo inato, assentados em uma
longa história evolutiva” (p.75). Para Maturana (2002), o viver
humano se dá num contínuo movimento de coordenações
consensuais de ações e emoções, pois “se queremos entender
as ações humanas não temos que observar o movimento ou
o ato como uma operação particular, mas a emoção que o
possibilita” (p.92). Para o neurocientista, quando mudamos
de emoção, mudamos de domínio de ação.
A partir da fala de Maturana, podemos inferir que nos
ambientes educacionais a nossa contribuição ao auxiliar o
aluno na identificação, compreensão e assimilação de suas
emoções ao pensamento, diante das experiências vivencia-
das, para que se dê conta da sua responsabilidade quanto às
consequências de suas ações, leva-o a perceber que é possível
aprender a escolher se deseja repetir ou não determinadas
manifestações emocionais.
Atualmente, com a adesão ao isolamento social para
evitar a disseminação da Covid-19, os noticiários têm feito

178
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

referências diárias, com a presença de especialistas, para


esclarecer a população sobre como lidar com os principais sin-
tomas físicos, como enxaqueca, problemas gastrointestinais,
fadiga; ou de natureza emocional: medo, ansiedade, angústia,
insônia, sentimento de solidão, resultantes do confinamento
aos espaços residenciais.
Chamar a atenção para a importância das condições
emocionais como garantia de saúde é essencial para o reco-
nhecimento de que as emoções permitem a ativação e julga-
mento consciente das ameaças ou das oportunidades com
que o indivíduo se depara (Damásio, 2000). As emoções são
indispensáveis para a adaptação às transformações e tensões
do cotidiano e determinam o modo como nos adaptamos
às mudanças e aos desafios intrapessoais e interpessoais
(Damásio, 2000).
Segundo Goleman (1996), o controle das emoções é
essencialmente importante para o desenvolvimento da
inteligência cognitiva do indivíduo. Portanto, se durante
a pandemia causada pelo novo coronavírus não podemos
evitar todo esse desgaste físico e emocional a que estamos
expostos, a nossa intervenção com a abertura de diálogos e
o hábito sistemático da autorreflexão, colocando os alunos
no centro do processo educativo, propicia a confiança para
a construção de vínculos afetivos importantes entre pro-
fessor e alunos para manter o equilíbrio emocional. Assim,
novas subjetividades vão se constituindo e transformando
todos os envolvidos. Esse processo de autoconhecimento
prepara-nos para encarar a realidade de forma menos
traumática, levando-nos a perceber que não estamos sós
no mundo e que a empatia é um valor essencial para a
convivência humana.

179
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

O PAPEL DAS EMOÇÕES NO CONTEXTO


EDUCACIONAL EM TEMPOS DE AMEAÇA
COM A COVID-19

O interesse pela dimensão emocional na formação


docente tem se intensificado pelo reconhecimento de que as
interações pessoais entre educadores e educandos estabelecem
um vínculo emocional que influi diretamente na conduta, na
cognição e na memória do aluno.
Para Goleman (1996), a alfabetização emocional amplia
a nossa visão acerca do que é a escola, deixando claro o nosso
papel como agente da sociedade encarregado de constatar se
as crianças estão obtendo ensinamentos que façam sentido
para as suas vidas. Para o psicólogo (1996), é essencial o apro-
veitamento das oportunidades, dentro e fora da sala de aula,
para ajudar os alunos a transformarem os momentos de crise
pessoal em lições de competência emocional. A realização de
um trabalho comprometido com esse objetivo pressupõe que
o professor parta de suas próprias competências emocionais,
cabendo aqui sinalizar que nos cursos de formação docente
são escassos os apontamentos nesse sentido. Em tempos de
pandemia, a lucidez de Freire (1981) convoca-nos à realidade:
“ninguém educa ninguém, ninguém educa a si mesmo, os
homens se educam entre si, mediatizados pelo mundo” (p.79).
Ao mesmo tempo em que reconhecemos a dificuldade
para lidar com a subjetividade inerente a tantas questões,
uma educação com objetivos exclusivamente cognitivos tem-
-se mostrado insatisfatória, pois, vivemos em uma socie-
dade em que:
O elevado índice de delinquência juvenil,
em todas as classes sociais, desde as mais
abastadas até as menos favorecidas econo-
micamente, é uma demonstração inques-
tionável de que os paradigmas educacionais

180
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

vigentes, sozinhos, não conseguiram levar


a humanidade para um patamar aceitável
de educação, por isso a necessidade de uma
reflexão mais profunda sobre eles (RÊGO;
ROCHA, 2009, p.143).

É interessante estabelecer a relação existente entre as


emoções e seus disparadores, ou seja, aquilo que as provocam,
e os comportamentos delas resultantes; isto é, a sensação do
medo é disparada quando uma ameaça potencial é anunciada,
provocando consequentemente um comportamento de fuga
(CHABOT, D.; CHABOT, M., 2005). Do mesmo modo:
A raiva, por sua vez, liga-se a um obstáculo
que impede a consecução de um objetivo
qualquer e engendra o ataque, destinado
a eliminar a fonte da frustração. A tris-
teza está associada a uma perda e provoca
um comportamento de retração interior,
o retraimento. [...] A alegria é disparada
quando uma situação desejada se produz,
induzindo um comportamento de apro-
ximação. (CHABOT, D.; CHABOT, M. ,
2005, p. 43)

Segundo esses educadores, as emoções primárias são


essenciais para a sobrevivência individual e coletiva e fun-
cionam como geratrizes para a criação de emoções secundá-
rias, adquiridas pelo aprendizado e pela experiência da vida
cotidiana, portanto, constituídas a partir da educação e da
cultura. Por exemplo, entendemos que algum desconforto
na escola (disparador) pode se configurar como ameaça, cau-
sando intimidação (emoção secundária do medo) e, por fim,
levando à evasão escolar (fuga como comportamento); do
mesmo modo, dificuldades em algumas disciplinas (dispa-
rador) causam frustrações (emoção secundária da raiva) que
são responsáveis por comportamentos agressivos (CHABOT,
D.; CHABOT, M., 2005).

181
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

Embora não tenhamos estudos para uma amostragem,


já estamos vivenciando algumas experiências que permitem,
sob a perspectiva descrita pelos autores, identificar alguns
efeitos danosos causados pela pandemia do novo coronavírus.
Crianças e adolescentes estão apresentando dificuldades de
concentração nos ambientes virtuais, criados para substituir as
aulas presenciais, e se recusam a aprender, demonstrando um
comportamento de intolerância e estresse. Nesse momento,
não devemos fazer uma leitura ao pé da letra, mas buscar
reconhecer o “disparador” que subjaz a essa aparente dificul-
dade de aprendizado, que talvez esteja bem próximo da falta
de estímulo, de motivação, de perspectiva, causadas por uma
limitação em suas vidas; e a “fuga como comportamento” é a
perda da vontade de aprender. Essas reações comportamen-
tais e emocionais são defensivas que se manifestam também
pela falta de atenção e de concentração, perda de iniciativa,
perda de interesse e desânimo.
Quando tratamos da pandemia causada pela Covid-19,
estamos falando de algo de alcance planetário, e, na mesma
dimensão, as consequências advindas são quantitativamente
inestimáveis. Em uníssono, o sofrimento humano, as carên-
cias materiais e afetivas, a desarmonia nas ações políticas e
sociais convocam-nos para trabalhar valores, consciência
ecológica e preservação ambiental para a formação de pessoas
mais humanas.
Na educação, que é a nossa esfera de interesse, temos
evidências que permitem algumas ações relevantes no sen-
tido de proporcionar atividades educativas que possibilitem
desenvolver a ideia de que o conhecimento está na vida, nas
relações e na natureza, devendo ser esse o grande eixo mobi-
lizador do currículo, pois essa perspectiva instiga as atitudes
dos sujeitos.
Todos nós, professores e alunos, precisamos nos adaptar
e olhar com realismo o que está à nossa volta, pois com a disse-

182
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

minação da pandemia defrontamo-nos com uma experiência


nova a cada dia e, lamentavelmente, desestruturante física e
emocionalmente. Será que faz sentido correr como ativistas
desenfreados em direção ao futuro quando o presente está
permeado de incertezas?...
Precisamos responder juntos a essa pergunta, assu-
mindo a nossa fragilidade, que é a expressão de humanidade
que nos fortalece, que nos contacta com as nossas emoções e
sentimentos mais profundos. Não significa que devamos nos
abster de promover conhecimentos acadêmicos e culturais,
mas é preciso uma análise criteriosa para o desenvolvimento
de um trabalho contextualizado, que integre a escola e a socie-
dade, reforçando o pertencimento.
Uma pesquisa realizada pelo Comitê Gestor da Internet
no Brasil (CGI. br), entre agosto e dezembro de 2018, aponta
que 58% dos domicílios no Brasil não têm acesso a computa-
dores e 33% não dispõem de internet. O fazer pedagógico em
tempos de coronavírus deve se constituir em uma oportuni-
dade para trabalhar a capacidade de se pôr no lugar do outro,
de romper os muros das escolas e socializar experiências que
ampliem a esfera social do aluno, de modo a conscientizá-lo
das diferenças que caracterizam as desigualdades sociais,
que vão se intensificar porque os alunos pobres não estão
realizando as atividades escolares que vêm sendo propostas
pelas escolas por não terem acesso à internet.
Não podemos fingir que nada está acontecendo, faz
parte da prática educativa dialogar com os alunos sobre o que
estão sentindo porque as mudanças estão acontecendo nos
nossos corpos. O medo frequente que nos acomete, em meio
à pandemia da Covid-19, provoca descargas de adrenalina e
quando relaxamos ocorre uma liberação de cortisol, o famoso
hormônio do estresse, que sabemos ser o responsável pela
baixa de imunidade. Somos educadores e a forma de organi-
zar o conhecimento privilegiando a integralidade da pessoa

183
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

humana compreende que as atitudes não se formam apenas


na razão, mas na complementaridade indissociável entre o
pensar, o sentir e o agir (VIEIRA; MORAES, 2015).
Constatamos o forte impacto que as emoções possuem
sobre as percepções, os processos cognitivos e o comporta-
mento. Ser emocionalmente inteligente é ser emocionalmente
educado, o que significa a partir da consciência de suas pró-
prias emoções ser capaz de lidar com as emoções alheias, sua
intensidade, suas causas e consequências (GOLEMAN, 1996).
O momento presente é favorável para o desenvolvi-
mento de atividades que promovam associações emotivas em
que os alunos em situações variadas exponham seus estados
emocionais, que podem ser positivos ou negativos. Santos
(2000) chama a nossa atenção para o fato de que:
se aprendemos a controlar a raiva e procu-
ramos divulgar suas formas de controle na
escola, em casa e com os amigos [...] segu-
ramente estaremos contribuindo para um
mundo melhor, sem tanta violência (SAN-
TOS, 2000, p. 52).

Cabe aqui retomar o propósito que é desconstruir a


visão dicotômica entre razão e emoção e da superioridade da
primeira sobre a segunda, que confere às emoções pouca ou
nenhuma importância no contexto educacional. Sendo assim,
buscamos referências que contribuem para que enveredemos
por novos paradigmas, pois:
Saber ler as emoções dos alunos permite
estruturar melhor a relação pedagógica,
facilitar a criação de um clima afetivo
propício às aprendizagens sem, contudo,
nunca perder de vista a concretização das
finalidades educativas inerentes ao ato
pedagógico. [...] Saber ler e gerir as emoções
dos alunos permite regular a disciplina pro-
porcionando, ao mesmo tempo, a criação

184
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

de um clima empático e o reforço da auto-


ridade docente. (FREIRE at al, 2012, p. 10)
O aprendizado acontece a partir do encontro genuíno
com o outro, surge quando se estabelecem relações autênticas,
marcadas pelos vínculos mútuos e recíprocos construídos no
processo educativo a partir do diálogo, da solidariedade, da
cooperação e do respeito.
Em tempos de coronavírus, a pandemia é um alerta para
a não banalização da perda da vida humana, para o exercício
da humildade pela consciência das nossas limitações, para um
aprendizado que garanta a formação de sujeitos solidários e
altruístas, e para a necessidade de refletir sobre a condição
humana, com a compreensão de que não devemos querer para
o outro aquilo que não desejamos para nós mesmos.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Esse capítulo é uma reflexão sobre os benefícios de uma


visão complexa da formação humana, que integre as dimen-
sões histórica, social, cognitiva, emocional, afetiva, atitudinal
do ser humano. No momento presente, queremos chamar a
atenção para sinais de expressão não verbais, como a postura
do corpo, animação do rosto, luz dos olhos, inflexão da voz,
tudo isso o professor deve saber ver, deve saber ler no corpo
dos seus alunos, pois são úteis para avaliar o andamento de
suas aulas (CHABOT, D.; CHABOT, M., 2005).
Em tempos de coronavírus, precisamos estar atentos ao
fato de que todo um conjunto de sinais se expressa de algum
modo por meio de ações e, para Maturana (2002), não existe
nenhuma ação humana sem uma emoção que a configure
como tal e a torne possível como ato, tanto o pensar como o
agir ocorrem no espaço determinado pelas emoções.
Embora saibamos que a dimensão emocional ainda está
distante do reconhecimento que lhe atribua credibilidade para

185
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

a inclusão nos cursos de formação docente e nos currículos


escolares, Goleman (1996) nos adverte para a importância:
do autoconhecimento emocional para um melhor reconhe-
cimento e designação das próprias emoções; do controle das
emoções para melhor tolerância à frustração, controle da
ira, menos ofensas verbais e físicas, menos comportamento
agressivo ou autodestrutivo, mais sentimentos positivos
sobre si mesmo, a família e a vida; da capacidade de lidar com
relações para uma maior compreensão e análise dos relacio-
namentos na solução de conflitos e negociação de desacordos
com menos impulsividade, mais envolvimento e cooperação
com os seus pares; de ser emocionalmente educado para pro-
mover maior capacidade de concentrar-se na tarefa imediata
e prestar atenção, objetivando um melhor aproveitamento
(GOLEMAN, 1996).
Ante essas considerações, na ausência de um plane-
jamento prévio, lidamos com as demandas emocionais que
surgem espontaneamente nas relações de todos os envolvidos.
Nesse contexto, Goleman (1996) sugere que se faça uso das
tensões no momento em que elas acontecem, embora não
seja fácil trabalhar aptidões no campo emocional exatamente
no instante em que o indivíduo está menos capaz de receber
novas informações e aprender novos hábitos de resposta.
Segundo Maturana (2002), é possível mudar uma emo-
ção a partir da reflexão, pois através da reflexão você a orienta.
“Ao fazer esta reflexão, já me encontro noutra parte. Mas
tenho que atrever-me a fazer esta reflexão ou treinar-me
para fazê-la; ou, em outras palavras, tenho que querer fazer
a reflexão” (p. 80).
Em tempos de Covid-19, a pandemia coloca-nos diante
de uma diversidade difícil de conciliar quando se trata de lidar
com alunos sofridos com perdas recentes de seus familiares,
que abruptamente deixaram de compartilhar as suas vidas.
Questões dessa natureza não podem ser vistas isoladamente,

186
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

pois entendemos que no universo educacional as relações


entre todos os elementos que o constituem são sistêmicas,
ou seja, esses elementos estão naturalmente interligados e
são interdependentes. Assim, os encontros com os alunos são
favoráveis à criação de um clima propício à exploração das
diferentes dimensões do ser humano no sentido de catalisar
mais facilmente processos reflexivos, formativos e trans-
formadores, estimulando por meio de recursos pedagógicos
adequados o desenvolvimento de comportamentos e atitudes
que incentivem a criatividade e a consciência crítica.
O momento é oportuno para promover conhecimentos
sem expectativa de reciprocidade, pois o mais importante é
explorar alternativas para que todos se sintam convidados a
participar em um clima afetivo e acolhedor. Talvez esse seja
o momento para desafiarmos o atual paradigma da educação,
dividida em áreas e fragmentos do saber, comprometida com
a formação das futuras gerações para um mundo hierárquico
e competitivo, em uma sociedade cada vez mais desigual.
Enquanto o coronavírus desafia a ciência e a medicina, a
pandemia coloca-nos frente a frente com a nossa interioridade,
contribuindo para que ampliemos a nossa inteligência emo-
cional, pois a vulnerabilidade nos expõe e ao mesmo tempo
possibilita uma maior conexão com as nossas emoções e a do
nosso próximo. A empatia como habilidade socioemocional
de se colocar no lugar do outro favorece o autoconhecimento
e o aprendizado, e as diferenças existentes entre as diversas
realidades podem ser compreendidas em meio ao turbilhão
que é viver.

REFERÊNCIAS

BOND, Letycia. SP: violência contra a mulher aumenta 44,9%


durante a pandemia. Agência Brasil: Direitos Humanos. São Paulo.
20/04/2020. Disponível em:

187
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

https://agenciabrasil.ebc.com.br/direitos-humanos/noti-
cia/2020-04/sp-violencia-contra-mulher-aumenta-449-duran-
te-pandemia Acesso em: mai 2020.

BRUNO, Adriana Rocha. A linguagem emocional em ambientes


telemáticos: tecendo a razão e a emoção na formação de educado-
res. Dissertação de Mestrado. São Paulo: Programa de Pós-Graduação
em Educação: Currículo, da Pontifícia Universidade Católica de São
Paulo, 2002.

CHABOT, D.; CHABOT, M. Pedagogia emocional: sentir para apren-


der. Sá Editora. 2005.

DAMÁSIO, A. O mistério da consciência: do corpo e das emoções


ao conhecimento de si. São Paulo: Companhia das Letras, 2000.

FREIRE, Isabel et al. A dimensão emocional da docência: contributo


para a formação de professores. Revista portuguesa de pedagogia.
ANO 46-2, 2012, 151-172. Disponível em: https://repositorio.ul.pt/
bitstream/10451/33023/1/Freire%20et%20al_A%20dimens%-
c3%a3o%20emocional%20da%20doc%c3%aancia_publicado.pdf
Acesso em: mai 2020.

GOLEMAN, D. Inteligência emocional. Rio de Janeiro, RJ: Obje-


tiva, 1996.    

FREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido. Rio de janeiro, RJ. Ed. Paz


e Terra. 1981.

MATURANA, H. Emoções e linguagem na educação e na política.


Belo Horizonte. Ed. UFMG. 2002.

MAYER, J. D. at al. Inteligência emocional como zeitgeist, como per-


sonalidade e como aptidão mental. In: BAR-ON, R.; PARKER, J. D. A.
(Org.). Manual de inteligência emocional: teoria, desenvolvimento,
avaliação e aplicação em casa, na escola e no local de trabalho. Porto
Alegre: Artmed, 2002. p. 81-98.

188
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

MORAES, Maria C.; VIEIRA, Adriano. A docência no paradigma


educacional emergente. In EDUCERE- XII CONGRESSO NACIONAL
DE EDUCAÇÃO. PUCPR (Pontíficia Universidade Católica do Paraná),
Curitiba, 26 a 29/10/2015. Disponível em: https://educere.bruc.com.
br/arquivo/pdf2015/16288_8237.pdf Acesso em: mai de 2020.

MORIN, Edgar. Cabeça bem feita: repensar a reforma, reformar o


pensamento. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2002.

NETO, Elydio dos Santos. Por uma educação transpessoal: a ação


pedagógica e o pensamento de Stanislav Grof. Rio de Janeiro:
Lucerna, 2006.

RÊGO, C. C. A. B.; ROCHA, N. M. F. Avaliando a educação emocional:


subsídios para um repensar da sala de aula. Ensaio: aval. pol. públ.
Educ., Rio de Janeiro, v. 17, n. 62, p. 135-152, jan/mar 2009.

SANTOS, J. O. Educação emocional na escola: a emoção na sala de


aula. Salvador: Faculdade Castro Alves, 2000.

SHOJAEI, S. F.; MASOUMI, R. (2020). The importance of mental


health training for psychologists in COVID-19 outbreak. Middle East
Journal of Rehabilitation and Health Studies, 7(2), e102846. Disponível
em: http://dx.doi.org/10.5812/mejrh.102846. Acesso em: mai. 2020.

VALADARES, Marcelo. Coronavírus faz educação a distância esbar-


rar no desafio do acesso à internet e da inexperiência dos alunos.
EDUCAÇÃO. G1- Globo. 23/03/2020. Disponível em:

https://g1.globo.com/educacao/noticia/2020/03/23/coronavirus-
-faz-educacao-a-distancia-esbarrar-no-desafio-do-acesso-a-in-
ternet-e-da-inexperiencia-dos-alunos.ghtml Acesso em: mai 2020.

189
CARTOGRAFIA DA LITERACIA DOS
ESTUDANTES DA UNIVERSIDADE
PÚNGUÈ EM TEMPOS DE COVID-19

Juma Manuel45
Álvaro Zacarias46

INTRODUÇÃO

Com o advento da Covid-19 em Moçambique, as práticas


lectivas sofreram um grande revés, tendo sido identificada a
tecnologia como a melhor alternativa para a área da educação.
Aliás, a ideia de uma sala de aula com os alunos sentados acom-
panhando o que o professor diz passou a não condizer mais
com a realidade imposta pela paralisação de aulas presenciais
por conta da pandemia em causa. Em consequência, as plata-
formas digitais foram convocadas para a superação do modelo
tradicional de ensino e garantir a continuidade das actividades
lectivas nas instituições de ensino, sobretudo o superior. No
entanto, a Universidade Púnguè, não sendo uma ilha, enveredou
por este caminho sinuoso, pelo que volvidos cerca de três meses
de cumprimento desta orientação justifica-se uma breve ava-
liação de como e em que medida o uso das plataformas digitais
impactaram na aprendizagem dos estudantes.
Diante do cenário acima aludido e com o intuito de melhor
analisar o efeito da plataforma digital no contexto educativo,
45 
Mestrando em Literaturas Africanas de Língua Portuguesa na Universidade Púnguè-
Moçambique e e Licenciado em Ensino de Português, jumadacrisma@ymail.com
Doutorando em Inovação Educativa na Universidade Púnguè-Moçambique e Mestre
46 

em Educação/Ensino de Matemática, alngueza@gmail.com

190
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

o presente estudo centrou-se na componente de leitura pelos


estudantes através do acesso às plataformas virtuais criadas
pela instituição para efeitos de ensino e aprendizagem. Como
metodologia usou-se a pesquisa bibliográfica e exploratória,
consubstanciadas por um inquérito dirigido a 1340 estudantes.
Ora, em termos percentuais, foram submetidos ao questioná-
rio cerca de (32%) estudantes da UniPúnguè-Sede e (68%) da
Extensão de Tete, perfazendo 23% da população estudantil da
instituição, sendo 65% do sexo masculino e os restantes 35% do
sexo feminino. Quanto à modalidade de ensino, do universo de
respondentes, 21% são do regime à distância, 52% do laboral
e, finalmente, 27% do regime pós-laboral.
Este estudo avaliativo revelou que os estudantes da Uni-
versidade Púnguè apresentam baixo nível de literacia como
resultado da ineficácia no uso das plataformas digitais no
ensino/aprendizagem, pois grosso número tem uma péssima
percepção sobre a mais-valia das aulas virtuais em tempos de
Covid-19, conforme elucidam as respostas constantes da secção
relativa ao grau de satisfação dos estudantes relativamente ao
decurso das aulas em época da pandemia em questão.
Ora, tendo em conta a abordagem aqui avançada, inte-
ressa-nos formular uma questão para que este estudo tenha,
desde logo, um ponto de partida. Para tanto, elaboramos a
interrogação seguinte:
• Até que ponto a inacessibilidade às plataformas digi-
tais, em tempos de Covid-19, impacta no nível de
literacia dos estudantes da Universidade Púnguè?

NOÇÃO E NÍVEIS DE LITERACIA

Depois de termos discorrido sobre o intróito do estudo


nas linhas antecedentes, neste espaço pretendemos encetar
uma “viagem” à volta do conceito e níveis de literacia, no sen-

191
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

tido de encontrarmos os elementos teóricos que assegurem


as nossas formulações.
A literacia é “a capacidade de processamento na vida
diária (social, profissional e pessoal), de informação escrita de
uso corrente contida em vários materiais impressos (textos,
documentos, gráficos)” (BENAVENTE, 1996, p. 7).
Para Soares, a literacia “corresponde ao estado ou con-
dição de quem interage com diferentes portadores de leitura
e de escrita, com diferentes gêneros e tipos de leitura e de
escrita, com as diferentes funções que a leitura e a escrita
desempenham na nossa vida” (SOARES, 1998, p. 43), pelo
que “o conceito de literacia em leitura não se apresenta como
um estado estático, mas está relacionado com as mudanças
constantes que se operam na sociedade enquanto processo
individual” (PINTO, 2002, p. 87).
Contudo, com base nas ideias subjacentes às teorias
anteriormente apresentadas, fica claro que a literacia é a
capacidade que um indivíduo tem de manusear e compreender
qualquer informação contida em textos escritos ou platafor-
mas afins, respeitando o que (PINTO, idem, p. 123) prefere
designar de níveis de literacia. Para este autor, existem cinco
(5) níveis de literacia, nomeadamente:
• Nível 0
Neste nível os alunos enquadrados são aqueles que
apresentam um total de 100% de incapacidade para resolver
qualquer tarefa. Não apresentam também características
homogéneas e, por isso, valerá a pena que sobre eles se façam
algumas considerações que permitam um conhecimento mais
preciso do seu perfil. Neste nível, os alunos tem ausência de
qualquer tipo de competências.
• Nível 1
Compete a este nível de literacia tarefas pouco exigentes
em termos de competências. Neste nível, a correcta resolução

192
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

das tarefas implica, em geral, apenas a localização, em tex-


tos pequenos e pouco complexos, de palavras ou expressões
referidas nas instruções.
• Nível 2
Neste nível de literacia encontram-se indivíduos com
competências adequadas à resolução de tarefas que reque-
rem, em geral, processamento de informação um pouco mais
elaborado, implicando a associação directa entre palavras
ou expressões que se encontram no texto ou documento e
nas instruções da tarefa a realizar ou, no caso do cálculo, a
realização de operações sequenciais com valores facilmente
identificáveis.
• Nível 3
Os alunos deste nível não têm as tarefas mais complexas
da prova. As tarefas deste nível implicam a capacidade de
seleccionar e organizar informação, relacionar ideias contidas
em textos um pouco mais longos e complexos, ou fundamentar
uma conclusão e, em termos de cálculo, o equacionamento de
problemas e realização de operações sequenciais.
• Nível 4
A este último nível, os alunos têm tarefas mais com-
plexas da prova. As competências implicadas na sua correcta
resolução envolvem a integração de informação múltipla em
textos mais longos e densos que os dois níveis precedentes.
São tarefas típicas deste nível a elaboração de síntese da ideia
principal de um texto, a fundamentação de um enunciado ou
a resolução de problemas quantitativos exigindo opções em
várias etapas estas tarefas fazem menção principalmente ao
ensino secundário geral e universitário.

193
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

RASTEIO DAS TENDÊNCIAS DE LEITURA


PELOS ESTUDANTES DA UNIVERSIDADE
PÚNGUÈ EM TEMPOS DE COVID-19

Antes de avançarmos para o panorama da literacia dos


estudantes, impõe-se que apresentemos uma breve carac-
terização da Universidade Púnguè, não pretendendo com
isso fazer um grande desenvolvimento, porém apenas dizer
o indispensável para contextualizarmos a proveniência dos
estudantes que enformam a amostra do estudo.
A Universidade Púnguè, abreviadamente designada
por UniPúnguè, com sede na Cidade de Chimoio – Província
de Manica, zona Centro de Moçambique, foi criada a 29 de
Janeiro de 2019, através do Decreto nº 4/2019 de 4 de Março
do Conselho de Ministros, como resultado da reestrutura-
ção da Universidade Pedagógica e fusão das Delegações de
Manica e Tete.
No presente ano académico (2020), a UniPúnguè conta
com 6.064 estudantes inscritos (3.479 são do sexo mascu-
lino e 2.585 do sexo feminino), distribuídos em três regimes
(laboral, pós-laboral e à distância), sendo que 51,3% dos estu-
dantes (3.112) estão na Extensão de Tete e os restantes 48,7%
(2952) na Sede.
Depois deste histórico, seguem informações relativas
ao processo de ensino/aprendizagem usando as plataformas
digitais, tanto mais que nas linhas subsequentes discorremos
sobre as condições com as quais os estudantes estão a interagir
com os seus docentes, focalizando assim os recursos usados,
o domínio sobre eles e sua acessibilidade, para depois ana-
lisarmos a sua relação com o nível de literacia apresentado
pelos estudantes.
O gráfico 1, que apresenta dados ligados à pergunta
sobre o uso de um modelo de ensino, em ocasiões anteriores,
similar ao actual mostra de forma clara que os estudantes

194
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

dos regimes laboral e pós-laboral (modalidade presencial)


afirmam ser pela primeira vez que têm aulas numa moda-
lidade online, contrariamente aos estudantes da modalidade
de Ensino a Distancia que, na sua maioria, afirmaram que já
vinham trabalhando nesta forma de ensino.

Gráfico 1: Alguma vez tinha tido aulas no modelo de ensino a distância ou


aproximado?

É facto que a maioria da população moçambicana reside


no meio rural, mas as universidades concentram-se no meio
urbano. Este elemento faz com que grande parte da popu-
lação estudantil, no ensino superior, durante o período de
formação, resida em locais diferentes dos que habitualmente
residem com as suas famílias (pais, cônjuges ou filhos). Com
a decretação do Estado de Emergência era espectável que
muitos destes tivessem que regressar às suas zonas de ori-
gem passando a estar, obviamente, em locais diferentes dos
próximos das cidades e que em muitos casos faltam serviços
básicos como acesso à electricidade, TICs e internet. Também,
porque as aulas continuam e na modalidade online, faltando
serviços para o acesso às matérias a partir de casa, muitos se
vêm na situação de ter que recorrer a casas de parentes ou
outros locais para o efeito.

195
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

O gráfico 2 mostra que muitos inqueridos dizem estar


a acompanhar as aulas, em tempos de Covid-19, a partir de
locais diferentes dos que habitualmente residem e os motivos
são os referenciados anteriormente.

Gráfico 2: De onde acompanha as aulas em tempos de pandemia da Covid-19?

Os gráficos seguintes (3, 4 e 5) mostram a tendência,


condiçoes de acesso e uso das TICs para o acesso às matérias
escolares, plataforma exigida em tempos de Covid-19 para a
prossecução das aulas, uma vez que “a tecnologia tem afetado
de maneira positiva diversas áreas da sociedade, incluindo aí
a área da educação” (MEDEIROS & MEDEIROS, 2020, p. 1).
No gráfico 3 pode ver-se que o meio mais usado é o
celular (smartphone), porém em muitos casos esse meio não
pertence ao estudante (é emprestado). No gráfico 4 mostra-se
que os inqueridos usam redes móveis para o acesso à internet
(uma percentagem insignificante usa redes de instituiçoes) e
noa gráfico 5 fica patente que pouco se recorre a plataforma
CEDIS, que é institucional e adequada para aprendizagem
online, mesmo sabendo-se que “a introdução de novas tec-
nologias, tais como o ambiente virtual de aprendizagem
ou a educação on-line podem colaborar para minimizar as

196
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

desigualdades de oportunidades escolares” (VIANNA & FER-


REIRA, 2018, p. 104).

Gráfico 3: Com qual dispositivo você acompanha as aulas usando plata-


formas digitais?

Gráfico 4: Percentagem do uso de redes pelo total dos inqueridos

197
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

Gráfico 5: Percentagem do uso de plataformas pelo total dos inqueridos

Em nosso entender, com base nos dados constantes dos


gráficos apresentados, a maioria dos estudantes não lêem
neste período da Covid-19, mesmo com a disponibilização de
plataformas digitais pela instituição para efeitos de ensino/
aprendizagem. Assim, temos como consequência deste quadro:
défice vocabular, fonética distorcida, ortografia incorrecta,
formação frásica anormal, conhecimento de cultura geral
nulo, etc., revelando, desta feita, um fraco nível de literacia
por parte de grosso numero de estudantes da Universidade.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Tendo chegado a esta fase do estudo, importa-nos, por


pertinência, deixar ficar as nossas ilações relativas ao desen-
volvimento da análise que encetamos, as quais consideramos
identificarem-se com o objectivo inicialmente formulado.
Com este trabalho foi possível perceber que em tempos
de Covid-19 os estudantes da Universidade Púnguè baixaram o
seu nível de interesse pela leitura, pelo que apresentam baixo
grau de literacia. Paralelamente quantificou-se os estudantes
que usando as plataformas digitais estão a aceder a conteúdos
de ensino e os que não estão.

198
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

Foi-nos possível igualmente arrolar os constrangimen-


tos que estão na origem da ineficácia das aulas virtuais em
tempos de Covid-19, pelo menos na Universidade Púnguè, o
que concorrera obviamente para o fracasso escolar de muitos
estudantes, já que os indivíduos com dificuldades de leitura
dificilmente desenvolverão o gosto por ela, porque, sem o
domínio dessa competência, o acto de ler torna -se uma tarefa
bastante complicada.

REFERÊNCIAS

BENAVENTE, A. (1996). A literacia em Portugal: resultados de uma pes-


quisa extensiva e monográfica. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian.

MEDEIROS, M., & MEDEIROS, A. (2020). Educação e Tecnologia: Explo-


rando o Universo das Plataformas Digitais e Startups na Área da Educação.
In V Congresso Nacional de Educação. São Paulo: www.conedu.com.br.
Retrieved from https://docplayer.com.br/180392217-Educacao-e-
-tecnologia-explorando-o-universo-das-plataformas-digitais-e-
-startups-na-area-da-educacao.html

PINTO, M. G. (2002). Da literacia ou de uma narrativa sempre imperfeita


de outra entidade pessoal. In Revista Portuguesa de Educação. Braga.

SOARES, M. B. (1998). Letramento: um tema em três Géneros. Belo Hori-


zonte: Autêntica Editora.

VIANNA, J. A., & FERREIRA, T. A. D. (2018). Plataforma Digital de


Educação: A Percepção dos Professores. E-Mosaicos, 7(14), 104–120. https://
doi.org/10.12957/e-mosaicos.2018.27928

199
AULAS REMOTAS: OS DESAFIOS DOS
PROFESSORES E DAS ESCOLAS PÚBLICAS
DE CIDADES DO INTERIOR DO PAÍS

Máximo Luiz Veríssimo de Melo47


Aldenize Santana de Souza Melo48
Tiago Santana de Souza49

INTRODUÇÃO

Em 2020, o mundo começou a vivenciar algo totalmente


novo e inesperado, que é o isolamento e afastamento social
causado pela pandemia do novo coronavírus, que provoca a
doença que foi denominada de Covid-19. Essa nova realidade,
provocou a suspensão de muitos eventos mundiais que viesse
a causar aglomerações de pessoas num mesmo lugar. Assim,
as escolas, por serem lugares naturais de aglomeração de
pessoas, o que podia aumentar o risco da disseminação da
doença, tiveram as aulas temporariamente suspensas.
Após alguns dias de suspensão das aulas, e por medo do
ano letivo de 2020 ser mais prejudicado ainda, alguns Estados
e municípios do Brasil começaram a baixar decretos permi-
tindo a implantação do que foi chamado de aulas remotas.
Porém, com as aulas remotas, principalmente por ser algo

Doutorando em Ciências da Educação. Professor da SEEC/RN e da SMEC/ARG/RN.


47 

E-mail: maximo.luiz@hotmail.com
Mestranda em Ciências da Educação (CECAP). Estudante. E-mail: aldenize.2009@
48 

hotmail.com
Mestrando em Ciências da Educação (CECAP). Estudante. E-mail: tdetrabalho@
49 

hotmail.com

200
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

novo e diferente, são acarretados uma série de problemas e


desafios, tanto para as escolas, quanto para os professores,
de modo individual.
Assim, neste trabalho de pesquisa, que é essencial-
mente de cunho bibliográfico, procura-se discutir quais são
os principais desafios que esse tipo de aula traz, sendo que
para isso, dividimos tal trabalho em três partes, ou grupos
maiores de problemas, onde em cada um desses grupos maio-
res, são discutidos mais de um desafio. Desse modo, esse
trabalho foi dividido em três partes, onde na primeira parte,
se discute os desafios ocasionados por questões econômicas e
sociais. Na segunda parte, discute-se os desafios decorrentes
das novas metodologias de trabalhos, que obrigatoriamente
devem incluir o uso das TICS (Tecnologias de Informação e
Comunicação). E por último, discute-se os desafios de cunho
individual, que envolve de modo particular, cada professor.

DESAFIOS ECONÔMICOS E SOCIAIS

Como já falado e sabido por todos, o Brasil é um país


subdesenvolvido, um país pobre, onde existe muitas desi-
gualdades econômicas e sociais, e com a pandemia do novo
coronavírus, com a Covid-19, tal realidade se mostrou de fato,
de modo bem aparente, revelando que essa situação é bem
pior e intensa do que muitos imaginava. A Covid-19 mos-
trou ao Brasil e aos brasileiros o tamanho do abismo social
e econômico que existe no país, com uma parcela enorme da
sociedade numa situação econômica bastante difícil e severa.
A pandemia mostrou ou revelou que o Brasil possui
uma quantidade bem maior do que se imaginava, de pessoas
necessitadas de tudo, que vive bem abaixo da chamada linha
da pobreza. A pandemia mostrou assim, que as desigualdades
são bem maior do que se achava ou acreditava que fosse. De
certo modo, tal realidade percebida agora, por ocasião da

201
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

pandemia, contraria Souza (2019), onde esse autor fala que as


desigualdades sociais, não precisão ser tão grandes, elásticas.
Ou seja, o abismo que separa o rico do pobre é enorme.
Assim, nesse atual cenário causado pela pandemia, onde
as escolas começaram a praticar as denominadas aulas remo-
tas, e considerando as desigualdades econômicas existentes no
Brasil, o primeiro desafio desse tipo de aula é exatamente nesse
campo ou aspecto. As aulas remotas, para poder acontecer, ser
colocada em prática, requer num mínimo um certo aparato
de ferramentas, como por exemplo, um aparelho de celular
(mais moderno, que acesse WhatsApp, ou que permita baixar
algum APP), ou um computador e/ou notebook, e associado a
essas ferramentas, uma rede de internet. Sem esses recursos
mínimos, as aulas remotas tornam-se quase inviáveis.
E esse é exatamente o primeiro desafio, pois, o Brasil
tendo uma enorme desigualdade econômica, o número de
pais e de alunos que possuem esse mínimo de ferramentas
“tecnológicas”, é muito pequeno, principalmente em lugares
que ficam mais no interior do país. Claro que o celular é hoje
um item, um produto que está muito presente no nosso coti-
diano. É difícil crer que ainda tenha pessoas que não possua
pelo menos um aparelho de celular, mas isso é sim, ainda
uma realidade. Do mesmo modo, também é uma realidade,
talvez mais comum ou presente, o fato de muitas pessoas ou
famílias não dispor de um computador ou notebook, como
também de uma rede de internet em sua residência. É bem
comum se ouvir que em casa tem o celular, mas não tem a
rede de internet.
Desse modo, as aulas remotas, tem nessa realidade, sua
primeira barreira, pois existe a exigência (aqui no Estado do
Rio Grande do Norte), de que essas aulas venham a atingir a
um público de pelo menos 75% dos alunos, o que é bastante
dificultado por essa realidade. Assim, o desafio aqui é a escola
correr atrás, para atingir um público que se aproxime desse

202
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

percentual. Para isso, cabe a escola lançar estratégias meto-


dológicas para atingir também essa parcela de alunos que não
dispõe de nenhum desses meios ou ferramentas tecnológicas
necessárias para a execução desse tipo de aulas, pois é neces-
sário que tais aulas chegue a casa de 100% dos alunos. Caso
contrário, ela está excluindo.
O segundo desafio fica no campo das desigualdades
sociais, mais especificamente, no campo das desigualdades
de instrução escolar e da desestrutura social das famílias dos
alunos. Assim, com relação as desigualdades de instrução
escolar, Luckesi (2018, p. 119), nos informa que os “dados
estatísticos da educação brasileira demonstram, de forma
sobeja, a exclusão social via escola”. De acordo com essa fala
de Luckesi, percebe-se que no Brasil a desigualdade está muito
presente e que nas escolas ela provoca uma exclusão social.
De acordo com Bourdieu, o aluno que tem uma realidade
social e econômica difícil, irá apresentar mais dificuldades
para aprender. Assim, de acordo ainda com esse autor, a
realidade social dos alunos e suas famílias, de desigualdade
social, provoca sim uma certa “exclusão” no processo de apren-
dizagem, pois os alunos que tem uma família com um nível de
escolaridade maior, e com menos desestrutura social, tendem
a aprender melhor, a se desenvolver mais.
Com relação a participação da família na vida dos filhos,
Bourdieu (1998, p. 42), Apud Wieczorkievicz e Baade (2020),
também diz que:
cada família transmite a seus filhos, mais
por vias diretas, um certo capital cultural
e um certo ethos, sistema de valores implí-
citos e profundamente interiorizados, que
contribui para definir, entre outras coisas,
as atitudes face ao capital cultural e à ins-
tituição escolar.

203
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

Podemos também nos apoiar na teoria sociointeracio-


nista de Vygotski, pois de acordo com essa teoria, o indiví-
duo se forma de acordo com o meio em que vive. Em outras
palavras, e trazendo para o âmbito da escola, de acordo com
o socio interacionismo, se o aluno está incluído num meio em
que não é dado importância ao conhecimento, a escola, etc,
ele também não vai dar importância. E essa realidade vai no
mínimo atrapalhar o trabalho que é desenvolvido pela escola
e pelos professores. E consequentemente, vai se refletir numa
situação de permanência da realidade das desigualdades
sociais, como também da exclusão.
Nas aulas remotas é necessário, e de modo imprescindí-
vel, a participação e ajuda dos pais, familiares ou responsáveis
pelos alunos, na execução das aulas. Não que nas aulas pre-
senciais isso também não seja necessário. Mas, com as aulas
remotas, tal participação se torna não só necessária, mas
imprescindível. No entanto, com o baixo grau de escolarização
e nível de conhecimento dos pais, familiares e/ou responsáveis,
essa ajuda, que é imprescindível, deixa de acontecer. Não que
essas pessoas não queiram fazer isso, prestar essa ajuda, mas
porque, mesmo querendo, eles não conseguem fazer isso, pois
esbarram na falta de conhecimento, pois ainda é grande o
número de familiares dos alunos que não são alfabetizados,
ou que mal conseguem escrever o próprio nome.
Esse é um desafio que existe independente de pandemia,
e que é um problema, um obstáculo ao sucesso do processo
de ensino e aprendizagem, e que, conforme Luckesi (2018),
causa exclusão social dentro das escolas, pois aqueles alunos
que tem pais mais escolarizados, que conseguem ajudar a eles
(filhos e alunos), se desenvolve mais, enquanto os alunos que
não tem pais alfabetizados, ficam em casa sem essa ajuda, esse
auxilio ou incentivo dos pais, acabam tendo mais dificuldades
para avançar em seu processo de aprendizagem.

204
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

O mesmo acontece com os alunos que em casa tem


famílias desestruturadas, que também é uma realidade, prin-
cipalmente na periferia. Alunos que, além de ter pais anal-
fabetos, tem pais separados, pais que vivem brigando, pais
viciados, etc, ou seja, pais que apresentam uma série de pro-
blemas desestruturais socialmente, pais que não dão atenção
ou importância para a educação dos filhos, procurando ajudar
ou auxiliar nas tarefas do cotidiano ou vida escolar do filho, e
assim, esses alunos não conseguem acompanhar as aulas de
modo satisfatório, nem as aulas normais, presenciais, muito
menos as aulas remotas, onde eles precisam de alguém para
ajudar, auxiliar, e até mesmo acordá-lo ou obriga-lo a assistir
ou fazer em casa as tarefas e atividades. E essa realidade acaba
também por prejudicar o processo de aprendizagem do aluno
e mantendo a exclusão social.

DESAFIOS METODOLÓGICOS: AS TICs E A


EAD

O segundo grupo de desafios trazidos pelas aulas remo-


tas diz respeito ao uso das TICs (Tecnologias da Informação
e Comunicação). De certo modo, as aulas remotas acabam se
concretizando como sendo uma metodologia de ensino bem
próxima da modalidade de ensino conhecida como EaD (Edu-
cação a Distância), e o ensino a distância, de acordo com Kenski
(2013), pressupõe algumas coisas, entre elas, a “utilização de
tecnologias de informação e comunicação para a realização
da mediação didático-pedagógica” (KENSKI, 2013, p. 110). Do
mesmo modo, as aulas remotas também pressupõem o uso
de algum tipo de tecnologia.
Para as aulas remotas que foram implantadas no Estado
do Rio Grande Norte acontecerem, é necessário e indispen-
sável a utilização de ferramentas tecnológicas, entre elas, o
celular e o computador/notebook. É necessário também, além

205
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

de ferramentas concretas, táteis (no caso celular e computa-


dor/notebook), ferramentas tecnológicas abstratas, como é o
caso da internet, rede wifi, aplicativos, vídeos, e etc. Ocorre
que para isso tudo ser usado, requer um mínimo de domínio
e habilidade por parte de professores e alunos.
Para Jordão (2009), existe um monte de recursos ou
ferramentas virtuais que podem ser usadas como ferramen-
tas pedagógicas. Porém, para o uso dessas ferramentas, não
somente essa autora, mas Kenski (2013), Barreto (2002), e
tantos outros, defendem que deve existir a formação conti-
nuada de professores para o uso das TICs.
Tal formação continuada, qualificação ou capacitação
profissional dos professores para o uso das TICs é necessária,
pois como falou Dado Schnaider, em um simpósio de educa-
ção em Campina Grande/PB, em 2013, que o professor, em
termos de tecnologia, é um velho, um dinossauro. Já para
Jordão (2009), é necessário a formação continuada de pro-
fessores para o uso das TICs pelo fato dos professores serem
uma geração denominada de “imigrantes digitais”, ou seja, os
professores são pessoas que nasceram antes do advento da
tecnologia moderna, por isso, são pessoas que não dominam
tão bem as ferramentas tecnológicas.
Melo (2018), em uma pesquisa sobre a participação de
professores em cursos de capacitação e formação docente para
o uso de ferramentas tecnológicas, obteve como resultado, que
71% dos professores do ensino fundamental II (anos finais), da
rede pública de ensino de uma pequena cidade do interior do
Rio Grande do Norte, nunca participaram de nenhum curso
ou formação nesse sentido.
Assim, o primeiro desafio desse segundo grupo é exa-
tamente o domínio dessas ferramentas por parte dos pro-
fessores, que por serem imigrantes digitais, são pessoas que
não apresentam um bom domínio das tecnologias. Desse
modo, isso é um desafio, pois os professores são obrigados a

206
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

empreender um enorme esforço para poder colocar em prá-


tica as aulas remotas, tendo que aprender a manusear uma
série de ferramentas tecnológicas que, a maioria deles, nas
aulas presenciais, não costumavam fazer uso. Porém, vale
ressaltar que muitos professores já viviam uma realidade de
uso costumeiro de muitas dessas ferramentas tecnológicas
pedagógicas.
Diante dessa realidade, em que o professor é obrigado
a fazer uso de muitas ferramentas tecnológicas modernas,
para poder conseguir tornar as aulas remotas uma prática, é
preciso que o professor comece a ser um indivíduo globalizado,
totalmente inserido nesse mundo cercado de tecnologias.
Assim, usamos as palavras de Melo (2019), para descrever
como deve ser esse professor globalizado:
o professor deve ser um profissional conec-
tado, globalizado, que faça uso das redes
sociais, que, mesmo sendo um imigrante
digital, procure viver no mundo dos nativos
digitais, que é o mundo da maioria de seus
alunos, que saiba o que é um ciberespaço,
que leia e faça hipertextos, que jogue jogos
virtuais, que zapeie em busca de conhe-
cimentos distintos, tornando-se assim
alguém letrado digitalmente, que deixa
sua condição de humano para assumir a
de pós-humano ou homem pós-moderno.
Essa deve ser a realidade do professor
como profissional e ser humano vivendo
no mundo da globalização e da tecnologia
moderna (MELO, 2019, p. 19-24).

O segundo desafio encontrado nesse segundo grupo de


desafios, é o compromisso, responsabilidade e participação
dos alunos nas aulas e atividades ou tarefas exigidas pelos
professores. As aulas remotas pressupõem que os professo-
res estão ministrando as aulas de suas residências, enquanto
que os alunos, do mesmo modo, se encontram também, no

207
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

interior de suas respectivas residências. E isso requer, no


primeiro momento, um compromisso do professor e, num
segundo momento, dos alunos. Do professor, o compromisso
para cumprir com os horários. Mesmo de casa, deve estar
cumprindo os horários de aulas e todos os demais deveres
do oficio.
Porém, o desafio maior aqui se refere ao compromisso
por parte dos alunos, de num primeiro momento, estar pre-
sente nos horários das aulas, e num segundo momento, e
principalmente, fazer as tarefas e atividades que são pedidas
pelos professores. Coloca-se isso como sendo um desafio das
aulas remotas, pelo fato disso já ser também, um desafio das
aulas presenciais. O fato é que um bom número de alunos,
de escolas públicas (não sabemos da realidade de escolas
privadas), costumarem demorar ou até mesmo não fazer as
atividades sugeridas pelos professores em sala de aula.
Esse problema, que é um descompromisso ou falta de
responsabilidade dos alunos em cumprir com suas obrigações
enquanto estudantes, com as aulas remotas se acentua ainda
mais, pois como já visto aqui, os alunos estando em casa, e
se no seu meio familiar não tem quem possa estar sempre
cobrando, o que é uma realidade, a tendência é exatamente ele
não ter o compromisso e a responsabilidade, nem de assistir
as aulas, e muito menos de fazer as atividades propostas.
Assim, essa realidade se constitui em um grande desafio,
tanto dos professores quanto das escolas, que tem a obrigação
de fazer chegar a todos os alunos, independentemente de
qualquer situação, o ensino e a aprendizagem. Do contrário,
o que vai estar acontecendo é exatamente um processo de
exclusão, e ao mesmo tempo, a escola vai estar também tirando
o direito constitucional do aluno estudar.
O terceiro desafio desse segundo grupo de desafios, é a
questão do tempo de trabalho para poder planejar as aulas e
fazer o controle e armazenamento das atividades dos alunos.

208
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

É sabido que no Brasil, no que diz respeito ao ensino público,


os salários são muito baixos, o que obriga a muitos profes-
sores, para melhorar e aumentar um pouco seus ganhos, e
assim poder dar para sua família um pouco mais de conforto,
trabalhar em mais de uma escola, tendo mais de um vínculo
empregatício.
Isso se constitui como um desafio, pois as aulas remotas
também pressupõem um aumento de trabalho, pois é preciso
que o professor agora em seu planejamento, inclua uma série
de coisas e ferramentas que até então não faziam parte de
sua rotina de planejamento. Os planos de aula agora incluem
usar muitos vídeos, onde é preciso que seja baixado, ou gra-
vado e editado pelo mesmo, baixar documentos e aplicativos
para vídeo conferência, para fazer aulas on line, (para isso, é
preciso que baixem também tutoriais sobre como fazer uso
desses aplicativos, o que também requer tempo), e após todo
o tempo necessário e gasto com o planejamento, ainda tem o
tempo que é usado para as atividades e tarefas, que deverão
ser guardadas e armazenadas pelo professor e a escola, como
prova de que as aulas remotas estão acontecendo.
Tudo isso exposto acima se constitui em um desafio, pois
requer do professor bastante tempo para poder executar todas
essas tarefas, e muitas vezes, como já falado anteriormente,
muitos professores não tem somente uma escola e sim duas, e
em alguns casos, até três ou mais escolas, e as aulas remotas,
requer todo esse trabalho a mais, onde a preocupação maior
agora é, não somente com o domínio do conteúdo, e sim, com
o domínio de algumas ferramentas tecnológicas para serem
usadas como ferramentas pedagógicas. Assim, o desafio maior
aqui é exatamente o professor encontrar tempo para poder
executar as aulas remotas e da melhor maneira possível, sendo
bastante interessante para o aluno e do mesmo modo, bastante
responsável com suas obrigações e deveres pedagógicos.

209
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

O DESAFIO PESSOAL DE CADA PROFESSOR

O professor Hamilton Werneck, em 2019, publicou mais


um livro. Este intitulado: Desaprender, Reaprender, Desobe-
decer. Nesse livro, o professor Werneck fala, como sugere o
título, que as pessoas, diante da modernidade atual, devem
desaprender muitas coisas que sabiam, depois reaprender
como faziam as mesmas coisas de antigamente, e por fim,
desobedecer a algumas regras ou tabus postos durante muito
tempo. Essa obra foi escrita exatamente para a realidade do
mundo atual, moderno, tecnologizado, automatizado, e com
a presença e desenvolvimento dos algoritmos.
No atual cenário trazido pela pandemia, e com a sus-
pensão das aulas presenciais e advento das aulas remotas,
cada vez mais é necessário, e até mesmo imprescindível, que o
professor realmente desaprenda e reaprenda, principalmente,
a sua prática pedagógica tradicional. Assim, o desafio pessoal
dos professores em tempos de pandemia da Covid-19, e das
aulas remotas, é desaprender o modo como trabalhavam antes
da pandemia, para reaprender a trabalhar de acordo com o
novo mundo que surgiu com a pandemia.
Do mesmo modo, outro desafio pessoal dos profissionais
da educação, diz respeito a capacidade individual de cada um
desses profissionais, em encontrar e praticar a resiliência,
encontrar seu ponto de equilíbrio diante de tantos percalços
e desafios que estão tendo de enfrentar durante essa pande-
mia. Percalços e desafios esses, que vão desde o lado pessoal
e particular, que é ter que ficar de quarentena, isolados e
afastados socialmente, que é algo extremamente novo, nunca
vivenciado pela grande maioria da população mundial, e
ainda convivendo com o pavor e o medo do invisível (o vírus),
realidade essa que está atingindo todos de modo igual e que
tem trazido uma imensa carga emocional, e ao mesmo tempo,

210
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

no lado profissional, ter que se reinventar, trabalhar de uma


forma bem diferente do comum e do normal.
Essa nova realidade profissional, que é ter que trabalhar
remotamente, que traz consigo enormes desafios, alguns
já discutidos aqui, vem trazer ou se constituir em mais um
desafio, nesse caso pessoal, e talvez o maior deles, que é cada
um desses profissionais ter a capacidade de serem resilientes,
de após todos esses desafios, conseguir encontrar um equi-
líbrio, encontrar seu ponto de equilíbrio e não surtar, entrar
em pânico, e como falam popularmente, jogar tudo pro ar.

ALGUMAS CONCLUSÕES

A pandemia mundial provocada pela Covid-19, que


obrigou entre outras coisas, a suspensão das aulas presenciais
no Brasil, e em muitos outros países, levou a decretação aqui
no Brasil, das chamadas aulas remotas. A criação das aulas
remotas levou em consideração diminuir o prejuízo ao ano
letivo de 2020. As aulas remotas é um formato de aulas onde
os professores, que estão em suas residências, cumprindo o
isolamento social, medida adotada como meio de diminuir
a propagação do vírus, passam a ministrar as aulas para os
alunos, que também pelo mesmo motivo estão em suas casas,
para que estes façam e cumpram tarefas pedidas e sugeridas
pelos professores. Ou seja, nesse formato de aulas, nem pro-
fessores e nem alunos precisam sair do isolamento.
Contudo, esse formato de aulas adotado durante esse
período de pandemia traz inúmeros problemas e desafios
para poder ser implantado e consolidado, e principalmente,
para conseguir atingir os melhores resultados possíveis de
aprendizagem dos alunos, como também, de chegar a todos
os alunos, de modo a não excluir nenhum deles.
Entre os diversos desafios trazidos pelas aulas remo-
tas, aqui colocamos os relacionados as questões de acesso

211
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

dos alunos a essas aulas devido as condições financeiras das


famílias da maioria dos alunos das escolas públicas do Bra-
sil. Foi colocado também, as dificuldades de acesso ou com-
preensão dos assuntos devido ao baixo nível escolar também
dos familiares ou responsáveis pelos alunos. Após isso, foi
discutido questões relacionadas as práticas pedagógicas dos
professores, que nessa nova realidade tem obrigatoriamente,
que levar em conta o uso das chamadas TICs (Tecnologias da
Informação e Comunicação), para a colocação em prática das
aulas. E por último, foi tratado dos desafios pessoais de cada
profissional da educação, que são obrigados a desaprender
sua antiga prática pedagógica, para depois reaprender uma
nova prática, e por fim, tem de serem bastantes resilientes,
para poder alcançar um ponto de equilíbrio e não começar a
enfrentar problemas ligados ao psicológico.
Ao final de tudo, conclui-se que diante de tantos desafios
que terão de ser enfrentados pelos professores e as escolas,
de modo geral, e estão sendo enfrentados diariamente, resta
acreditar na assimilação e conhecimento de uma nova reali-
dade escolar das escolas públicas brasileiras, principalmente
de regiões ou lugares do interior desse país, e que tais conhe-
cimentos e aprendizagens, e as novas práticas, permaneçam
no pós-pandemia, quando as aulas presenciais retornarem,
e que isso sirva para melhorar o processo de ensino e apren-
dizagem em nossas escolas, contribuindo assim para a tão
desejada melhoria da educação de nosso país.

REFERÊNCIAS

BARRETO, Raquel Goulart. Formação de professores, tecnolo-


gias e linguagens: mapeando velhos e novos (des)encontros.
São Paulo: Loyola, 2002.

JORDÃO, Teresa Cristina. Formação de educadores. A formação


do professor para a educação em um mundo digital. Salto

212
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

para o futuro. Tecnologias digitais na educação, ano XIX, boletim


19, nov./dez. 2009.

KENSKI, Vani Moreira. Tecnologias e tempo docente. Campinas:


Papirus, 2013. Coleção Papirus Educação.

LUCKESI, Cipriano Carlos. Avaliação em educação: questões


epistemológicas e práticas. O que aprendi em cinquenta anos
de vínculos com esse tema. São Paulo: Cortez, 2018.

MELO, Máximo Luiz Veríssimo de. A internet, alguns de seus


termos e o professor. Educação Pública, v. 19, nº 24, 8 de outubro
de 2019. Disponível em: https://educacaopublica.cecierj.edu.br/
artigos/19/24/a-internet-alguns-de-seus-termos-e-o-professor.
Acessado em 21 de maio de 2020.

MELO, Máximo Luiz Veríssimo de. Obstáculos ao uso das TIC


na rede pública de ensino de Alto do Rodrigues/RN, Brasil. In:
NETA, Josefa Gomes (Org.). Educação: em processo de reconstrução
e inovação. João Pessoa: Libellus Editorial, 2018.

WERNECK, Hamilton. Desaprender, Reaprender, Desobedecer.


Rio de Janeiro, Wak Editora. 2019.

WIECZORKIEVICZ, Alessandra Krauss; BAADE, Joel Haroldo.


Família e escola como instituições sociais fundamentais no
processo de socialização e preparação para a vivência em
sociedade. Educação Pública, v. 20, nº 20, 2 de junho de 2020. Dis-
ponível em: https://educacaopublica.cecierj.edu.br/artigos/20/19/
familia-e-escola-como-instituicoes-sociais-fundamentais-no-pro-
cesso-de-socializacao-e-preparacao-para-a-vivencia-em-sociedade.

SCHNAIDER, Dado. I Simpósio integrador da Sapiens: perspec-


tivas e desafios da educação no século xxi. Campina Grande-PB.
Outubro de 2013.

SOUZA, Jessé. A elite do atraso. Rio de Janeiro. Estação Brasil, 2019.

213
COVID-19 E A FRAGILIDADE DA VIDA E
DO PLANETA

Anderson Luiz Tedesco50


Tiago Eurico de Lacerda51
Leonel Piovezana52

INTRODUÇÃO

A presente reflexão tem seu início inspirado em duas


narrativas do filósofo Walter Benjamin, tais narrativas se
caracterizavam como histórias de marinheiros e histórias de
camponeses53, as primeiras histórias tratavam de feitos bizar-
ros, grandiosos, misteriosos, quase inacreditáveis, ocorridos
em lugares longínquos, sempre distantes [...]. Já as histórias
de camponeses, ocorriam como fatos próximos, familiares,
dos nossos cotidianos. Tais tipos de narrativas nos aproximam
da problemática construída neste ensaio, que se propõem
pensar os aspectos sociais e humanos da realidade vivida no
Brasil e no mundo e perspectivar que sociedade desejamos ou
teremos após essa pandemia da Covid-19?, para esta reflexão

50 
Doutor em Filosofia Pela PUCPR. Professor da Universidade Comunitária de Chapecó
– Unochapecó. E-mail: anderson.tedesco@unochapeco.edu.br
Doutor em Filosofia Pela PUCPR. Professor do Departamento de Ciências Humanas e
51 

Sociais da UTFPR – Campus de Londrina. E-mail: tiago.lacerda@escola.pr.gov.br


52 
Doutor em Desenvolvimento Regional com a Tese intitulada: Território Kaingang na
Mesorregião Grande Fronteira do Mercosul - Territorialidades em confronto (UNISC,
2010). Professor do Programa de Mestrado em Educação da Universidade Comunitária
de Chapecó – Unochapecó. E-mail: leonel@unochapeco.edu.br
Atentar-se para esses dois tipos de histórias que se encontram na abertura do libro: “44
53 

Cartas de um Mundo Líquido Moderno” do sociólogo Zigmunt Bauman, publicado em 2011.

214
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

assumimos uma postura de contadores de histórias de mari-


nheiros, mas realistas, pois nos encontramos na condição
de camponeses. Este posicionamento, considera imaginar
aquilo que parecia absurdo de acontecer, como esse cenário
que a Covid-19 se insinuou, a partir de Wuhan, na China, e
se difundiu velozmente, até se consolidar como pandemia
reconhecida pela Organização Mundial da Saúde, em 11 de
março 2020, e que colocaria em colapso as relações sociais e
humanas nas sociedades capitalistas, portanto, não trata-se
mais de algo distante, de uma história de marinheiro. Mas,
sim, de algo próximo a nós e real, trata-se de histórias de
camponeses.
Este tipo de história real tem apresentado exemplos não
só no Chile, mas na América Latina e Caribe54, de como a vida
é frágil. Ainda mais se acentua essa fragilidade quando vista
a partir das relações capitalistas, em que o cuidado ocorre
somente na direção do lucro e não da vida. Tratam-se das
“vidas desperdiçadas” ou como expressa Bauman (2005) das
“vidas refugadas”, que parecem estar distantes de nós, mas, que
na verdade, se encontram próximas, são os invisíveis, os sem
rostos, os descartáveis, ou seja, aqueles e aquelas que vivem
abaixam da linha da pobreza ou se preferíamos podemos fazer
o uso do termo miséria, pois trata-se daqueles e daquelas que
sobreviver nas sociedades capitalistas. Neste sentido, Juan
Pablo Bohoslavsky especialista da Organização das Nações
Unidas (ONU), recomendou aos governos que considerassem
pensar em uma renda emergêncial universal em razão da
pandemia da Covid-19 no mês de março de 202055. No caso do

54 
As notícias em jornais geram pânico, como pode-se constatar no título da capa do
jornal paraguaio: ‘É a principal ameaça’: situação de pandemia no Brasil gera temor em
vizinhos na América do Sul”, texto de Marcia Carmo - De Buenos Aires para a BBC Brasil.
Disponível em: https://www.terra.com.br/noticias/mundo/e-a-principal-ameaca-situacao-
-de-pandemia-no-brasil-gera-temor-em-vizinhos-na-america-do-sul,a62eb0866a488c-
6f2d368d51d75208d66scxnhvi.html Acessado em 18 de Maio de 2020.
Atentar-se para a notícia do RELATOR DA ONU PEDE QUE PAÍSES ADOTEM RENDA
55 

BÁSICA UNIVERSAL DIANTE DA PANDEMIA, 2020. Disponível em: https://nacoesunidas.

215
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

Chile, rapidamente foi pensado e aprovado os Cartões Covid


como forma de auxílio emergencial às famílias que não tem
condições mínimas para viver nesse cenário de pandemia56.
Também no Brasil foi aprovado o auxílio emergencial de R$
600,00, mas que ainda os sem rostos, precisamente os invisí-
veis socialmente que ainda não receberam a primeira parcela57.
Nesta reflexão optou-se no delineamento metodológico,
cuja característica principal será de natureza qualitativa, pela
pesquisa bibliográfica. Sabe-se que o aspecto qualitativo de
uma reflexão orienta todos os passos da interpretação trans-
disciplinar das relações que se estabelecem com o fenômeno
humano. Também entendemos que a pesquisa qualitativa na
área da educação, consiste em [...] um conjunto de práticas
materiais e interpretativas que dão visibilidade ao mundo.
Essas práticas transformam o mundo em uma série de repre-
sentações [...] Nesse nível, a pesquisa qualitativa envolve
uma abordagem naturalista, interpretativa, para mundo, o
que significa que seus pesquisadores estudam as coisas em
seus cenários naturais, tentando entender, ou interpretar, os
fenômenos em termos de significados que as pessoas e eles
conferem (DENZIN; LINCOLN, 2006, p. 17).
Entendemos, por isso, que no campo da educação, com
seus múltiplos fenômenos, a pesquisa de natureza qualitativa
tem maiores condições de auxiliar na produção de conhe-
cimentos válidos e pertinentes, que auxiliem a pensar em
diferentes proposições de modos de viveres, após pandemia. A
revisão bibliográfica, ou de literatura, consiste numa revisão

org/relator-da-onu-pede-que-paises-adotem-renda-basica-universal-diante-da-pan-
demia/ Acesso em 18 de Mario de 2020.
56 
Atentar-se para notícia Governo do Chile apresenta projeto de renda mínima para
afetados por coronavírus. Disponível em: https://valorinveste.globo.com/mercados/
internacional-e-commodities/noticia/2020/04/20/governo-do-chile-apresenta-projeto-
-de-renda-minima-para-afetados-por-coronavirus.ghtml Acesso em 18 de Maio de 2020.
57 
Atentar-se para a notícia sobre o “Desafio de dar auxílio rápido na crise revela: Brasil
não conhece o Brasil” Disponível em: https://exame.com/brasil/a-licao-do-auxilio-con-
tra-a-covid-19-para-as-bases-de-dados-do-brasil/ Acesso em 18 de Maio de 2020.

216
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

“desenvolvida a partir de material já elaborado, constituído


principalmente de livros e artigos científicos” (GIL, 2014, p.
50). Desse modo, a reflexão seguirá a perspectiva da herme-
nêutica filosófica, especialmente na perspectiva proposta por
Gadamer (2005 e 2007), com esforço para contextualizar,
compreender e aplicar os principais conceitos e categorias
oriundas da pesquisa. Conforme Stein (1996), a hermenêutica
é um paradigma de discussão presente em vários campos
científicos, principalmente nas ciências do espírito e nas
ciências humanas.

A REALIDADE BRASILEIRA NA PANDEMIA

O presente texto nasce a partir do meu isolamento social


físico e do olhar dos diversos meios de comunicação do Brasil
e do mundo e do processo de discussões, encontros, aulas,
reuniões, sejam on-line ou forma remota adotada pelas Escolas
e Universidades. Compartilhamos de um mesmo espaço no
período de isolamento: eu, professor universitário, esposa e
filha, professoras da rede pública e neta, estudante do sétimo
ano do ensino básico.
Durante as festas de final do ano de 2019, comemorações
do ano novo de 2020, férias de janeiro e carnaval, ouvíamos o
noticiário da pandemia do novo coronavírus na China, tudo
muito distante. Somente com o alastramento na Itália, é que
a sociedade brasileira começou a ficar inquieta e aí sim, o
Ministério da Saúde começa a tomar providências e aposta
no isolamento social de todo o País, que resulta de forma
positiva, apresentando em 16 de abril de 2020 relatório das
secretarias estaduais de saúde até as 23h30min., com 30.891
casos confirmados do novo coronavírus (Sars-Covi-2) no
Brasil e 1.952 mortes (g1.globo.com). Números que conforme
o então Ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta são com-
patíveis com a infraestrutura de atendimento hospitalar e

217
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

do SUS – Sistema Único de Saúde, responsável pelo êxito,


considerado exemplar e inédito nas formas de atendimento
e cuidados com a saúde no Brasil.
No final do dia 16 de abril de 2020 a história de sucesso
do combate ao coronavírus é surpreendida com a demis-
são do Ministro Luiz Henrique Mandetta pelo Presidente
da República e em seu lugar é nomeado Nelson Teich. É o
econômico e o mercado prevalecendo sobre a vida, sobre as
pessoas. Passa-se a impressão de que muitos vão morrer,
que é natural, principalmente idosos acima de 60 anos. Que
segundo o presidente, mais de 70% vão contrair o coronavírus
e as empresas que geram o emprego têm que sobreviver e
que tudo ficará bem. Então, a partir de 17/04/2020, começa
uma nova história e rumos da sobrevivência em um País com
uma das maiores taxas de desigualdade social do planeta, A
Bolsa família volta como viabilidade de acesso às pessoas que
vivem na miséria. E, por esse caminho foi fácil diagnosticar
a extrema pobreza e a falta da escola na alimentação única
das crianças e jovens estudantes, como também da falta de
acesso aos meios de comunicação para as aulas a distância,
não presenciais ou remotas.
O Brasil é um País continental com mais de oito milhões
e quinhentos mil quilômetros quadrados, com realidades
diferenciadas, com mais de um milhão de indígenas e que no
decorrer de um mês, o coronavírus se manifesta com vítimas
em todo território nacional.
Conforme pronunciamento de Luiz Henrique Mandetta
no dia 16 de abril de 2020, dependemos da China para aquisi-
ção de todos os tipos de equipamentos e materiais de segurança
hospitalar: máscaras, ventiladores e outros. Nossas indústrias,
há anos fecharam no País e foram para a China, os custos
aqui não compensavam e na China se produz muito aquém
dos valores e custos do Brasil. Sofremos pela dependência.

218
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

Além dessa dependência em quase todos os setores da


indústria e do comércio, enfrentamos os desafetos e interesses
políticos e ideológicos do governo e alguns de seus seguidores
contra a China, que considero irrelevantes nesse momento de
combate ao Coronavírus e de luta pela vida de todas as pessoas,
sem exceção! O governo destila ódio e rumores com objetivo
de combate à esquerda e mais especificamente ao comunismo.
Vejo tudo muito contraditório quando atacam a China
em prol do comércio e do econômico, ignorando que as empre-
sas, nesses deslocamentos causaram muitos desempregos
no Brasil e no Mundo. As pessoas, operárias da China não
contam nessas investidas, são como coisas para produção em
massa e de lucros. No mundo ocidental do capital, maioria
Cristã, o Amor ao próximo e humanizações são restritas,
asiáticos e africanos parece não fazerem parte do projeto de
humanização.
No dia 19 de março de 2020 o Brasil começa o isola-
mento social em um contexto de conflitos políticos que vão se
manifestando, de um lado observando os indicativos da OMS
e de outro, os interesses de alguns empresários com o aval
do Presidente da República, que desrespeita normas do seu
próprio ministério, desestabilizando brasileiras e brasileiros.
Isso fica claro nas mídias sociais e grupos familiares do Wasts,
onde são perpetuadas as rixas ideológicas da campanha elei-
toral de 2018. A saúde e a vida das pessoas passam para um
segundo plano, no meu entender, para os que sobreviverem.
Perde-se o foco, como diz Mandetta.
Infelizmente, o Coronavírus mostra para o mundo o
que foi deixado propositadamente para detrás das portas,
nos infernos da vida, milhões de pessoas, desprovidas de
qualquer possibilidade de bem-estar ou de bem viver, longe
do que se pode chamar de humano. Vêm à tona e mais uma
vez a pandemia começa de cima para baixo, quando não há
mais vagas nos hospitais, os pobres disputam as valas comuns

219
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

de sepultamentos. Resta-nos assistir atônitos a cada dia os


números de infectados e de mortes! Hoje, 20 de abril de 2020,
parece que tudo voltou ao normal, o governo federal está igno-
rando a ciência e tecnologias em prol à vida, as 2050 mortes
oficiais, e sabemos que a pandemia, recém está acontecendo.
Dá-se a impressão que a responsabilidade em defesa da vida
é apenas dos governadores, que felizmente se esforçam para
agirem conforme normas da OMS, sob ameaças do presidente
da república.
As Igrejas, templos majestosos, construídas nos espaços
nobres de cada cidade ou comunidades, de repente se vêm
vazias e por ironia, as casas, das favelas e periferias lotadas,
onde a pessoa, verdadeira Igreja, templo vivo, segundo Jesus
Cristo, maltrapilha, com fome, sem teto, somando mais de
30% da população brasileira. As pregações de curas rápidas
e milagrosas desaparecem, silenciam!
Universidade e escolas fecham suas portas e criam meto-
dologias de ensino a distância com denominações diversas:
ensino não presencial, ensino remota ou educação remota,
disponibilizando sites e programas midiáticos mais diversos.
O problema que 30% da população brasileira não dispões
desses recursos e as escolas que tinham dificuldades de oferta
de condições, materiais de aula indispensáveis para as salas
de aula, são convocadas a atenderem seus estudantes com
apostilas, livros e atividades orientadas. Prática que até o
presente momento não se concretizou e mesmo, mais de
50% das atividades solicitadas para estudantes com acesso
midiático das redes públicas, não são respondidas. Os pais,
quando responsáveis e que moram com seus filhos, pois mui-
tos vivem com avós, não conseguem ajudar nas atividades e
reclamam pelo excesso de tarefas. Outro fator é que esses pais
são garis, diaristas, empregados nos frigoríficos e atividades
indispensáveis, que não pararam, somam à solidão e desa-
tendimentos a essas crianças.

220
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

Reporto-me, mais especificamente à região de Chapecó


(SC), grande polo agroindustrial do Brasil, com mais de 37 Ins-
tituições de ensino superior, atuando na graduação, pesquisa
e extensão e um grande número de pessoas marginalizadas,
que no contexto do Coronavírus vêm à tona.
Dia 24 de abril de 2020 o Brasil anuncia 357 mortes
pela Covid-19 e as atenções foram desviadas por mais um
ato político do governo Bolsonaro demitindo o Diretor Geral
da Polícia Federal Maurício Valeixo que gera a demissão de
Sergio Moro: Ministro da Justiça e provedor da Lava Jato. Dia
27 são confirmadas pelo Ministério da Saúde 61.888 casos e
4.205 mortes, não contados aqui as que ocorreram e ocorrem
antes de chegar nos hospitais e sem a confirmação da Covid-
19 por testes. Assim, considero a triste realidade brasileira:
tragédias, hipocrisias e desatenções à vida.
A vida sem valor é a máxima de uma política que não
cria alternativas para superarmos o desemprego em curso e
aumentando, e isso também é morte, as mortes pela Covid-19
que não baixam nas estatísticas. Parece-nos que
A ideia conservadora de que não há alter-
nativa ao modo de vida imposto pelo
hipercapitalismo em que vivemos cai por
terra. Mostra-se que só não há alternativas
porque o sistema político democrático foi
levado a deixar de discutir as alternativas.
Como foram expulsas do sistema político,
as alternativas irão entrar cada vez mais
frequentemente na vida dos cidadãos pela
porta dos fundos das crises pandémicas,
dos desastres ambientais e dos colapsos
financeiros. Ou seja, as alternativas vol-
tarão da pior maneira possível. (SANTOS,
2020, p. 6).
Segundo dados do mês de julho do consórcio de veículos
da impressa, o Brasil atingiu a triste marca de 82.925 mortes
por Coronavírus e tantas outros colapsos ambientais e mortes

221
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

por corrupções. Em recente texto sobre “A cruel Pedagogia do


Vírus”, publicado por Boaventura de Sousa Santos (2020), se
considerar que se não aprendermos com esse momento vivido
de que o hipercapitalismo não é a única forma de vida no
planeta e de que existem outras alternativas para se pensar
os modos de vidas. Após esse período, ainda sofreremos as
consequências de um sistema ainda mais perverso com aqueles
e aquelas que são considerados pessoas não gratas na sociedade
do lucro. Por ora, parece que “sabemos que a pandemia não
é cega e tem alvos privilegiados, mas mesmo assim cria-se
com ela uma consciência de comunhão planetária, de algum
modo democrática” (SANTOS, 2020, p. 7).
Para Santos (2020, p. 7-8):
The Economist mostrava no início deste ano
que as epidemias tendem a ser menos letais
em países democráticos devido à livre cir-
culação de informação. Mas como as demo-
cracias estão cada vez mais vulneráveis às
fake news, teremos de imaginar soluções
democráticas assentes na democracia par-
ticipativa ao nível dos bairros e das comu-
nidades e na educação cívica orientada para
a solidariedade e cooperação, e não para o
empreendedorismo e competitividade a
todo o custo.
Trata-se de uma perspectiva de educação para a vida,
em seu sentido profundo, que possibilita pensar em diferentes
modos de viveres nas sociedades capitalistas e talvez abrir-se
para a construção de experiências solidárias. Haja vista, como
afirma Assmann (1998, p. 20) de que “os seres humanos não são
“naturalmente” tão solidários quando parecem supor nossos
sonhos de uma sociedade justa e fraternal”. Em nossa hipótese
interpretativa, talvez essa pandemia que teve sua origem em
Wuhan na China e que agora assola o Chile e os demais países

222
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

da América Latina e Caribe58, crie condições diferentes para


pensarmos os processos educativos; que contribuam para o
bem viver59:
A humanidade chegou numa encruzi-
lhada ético-política, e ao que tudo indica
não encontrará saídas para a sua própria
sobrevivência, como espécie ameaçada por
si mesma, enquanto não construir consen-
sos sobre como incentivar conjuntamente
nosso potencial de iniciativas e nossas frá-
geis predisposições à solidariedade. (ASS-
MANN, 1998, p. 20).

Trata-se de pensar em uma educação para a vida que


crie condições de superação dos laços humanos fragilizados,
tornando-se uma:
Sociedade onde caibam todos só será pos-
sível num mundo no qual saibam muitos
mundos. A educação se confronta com essa
apaixonante tarefa: formar seres huma-
nos para os quais a criatividade e a ternura
sema necessidades vivenciais e elementos
definidores dos sonhos de felicidade indi-
vidual e social (ASSMANN, 1998, p. 29).
Destaca-se também em sentido bioético a “Encíclica
Laudato Si”, (LS), contribuição inigualável assinada pelo Papa
Francisco no dia 24 de maio de 2015, nela reforça-se a tese de
58 
Por sua vez o Brasil segundo Tostes (2020, p. 34) “Propostas de saída fora da ordem
democrática liberal, como um autogolpe, se tornam cada vez mais fortes, mais presentes,
mais ruidosas, a ponto de produzir buzinaços na frente de hospitais em que doentes de
Covid-19 agonizam. O Brasil atual já era um barril de pólvora. A pandemia – que, tomada
por si só, mudaria pouco - é a fagulha que faltava para fazê-lo explodir”.
59 
Trata-se de uma mudança urgente de consciência que assegure no agir humano
condições para o Bem Viver, pois o viver em função do capital ou do dinheiro está nos
conduzindo a morte e a destruição do nosso Bem Viver. Segundo Jaegher (2017, p. 134)
“Visualizamos la ideas del Buen Vivir como fuentes epistémicas que se sitúan en la exte-
rioridad del pensamiento occidental, en este marco todos los seres que habitan la Madre
Tierra incluyendo los ríos, las montañas, los océanos, los bosques, la flora, la fauna así
como los seres humanos tienen dignidade”. Em outras palavras, o Bem Viver é a própria
dignidade constituída nos modos de viveres de cada povo.

223
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

que o planeta terra é a casa comum, ou seja, de todos; “Lanço


um convite para renovar o diálogo sobre a maneira como
estamos construindo o futuro do planeta” (LS 14, 2015). É,
portanto, um convite ao diálogo.
A relação íntima entre os pobres e a fragi-
lidade do planeta, a convicção de que tudo
está estreitamente interligado no mundo,
a crítica do novo paradigma das formas de
poder que derivam da tecnologia, o convite
a procurar outras maneiras de entender a
economia e o progresso, o valor próprio de
cada criatura, o sentido humano da eco-
logia, a necessidade de debates sinceros
e honestos, a grave responsabilidade de
política internacional e local, a cultura do
descarte e a proposta de um novo estilo de
vida (LS 16, 2015).

CONSIDERAÇÕES INCONCLUSIVAS

Para constituir uma reflexão sobre o não reconheci-


mento do outro, é preciso entender que na sociedade capitalista
os novos dispositivos60, em vez de tornar o ser humano mais
humano em tempos de Covid-19, o torna um animale diabolicus.
Em Agamben (2009, p. 48), encontramo-nos que “as socie-
dades contemporâneas se apresentam como corpos inertes
atravessados por gigantescos processos de dessubjetivação

60 
Ver ensaio do filósofo Agamben (2009, p. 40), quando ele nos diz: “chamarei literal-
mente de dispositivos qualquer coisa que tenha de algum modo a capacidade de capturar,
orientar, determinar, interceptar. Modelar, controlar e assegurar os gestos, as condutas, as
opiniões e os discursos dos seres viventes”. O pensador da continuidade em seu modo de
pensar sobre os dispositivos ao exemplificá-los como sendo “as prisões, os manicômios,
o Panóptico, as escolas, a confissão, as fábricas, as disciplinas, as medidas jurídicas etc.,
cuja conexão com o poder é num certo sentido evidente, mas também a caneta, a escri-
tura, a literatura, a filosofia, a agricultura, o cigarro, a navegação, os computadores, os
telefones celulares e – por que não – a própria linguagem, que talvez é o mais antigo dos
dispositivos, em que há milhares e milhares de anos um primata – provavelmente sem se
dar conta das conseqüências que se seguiram – teve a inconsciência de se deixar capturar”.

224
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

que não correspondem a nenhuma subjetivação real”, ou seja,


um ser humano desprovido de relações subjetivas é um ser
humano não humanizado61. Em plena era do desenvolvimento
técnico-científico, o processo de humanizar-se vem sendo
construído de forma virtual, ou seja, existe um emaranhado
de dispositivos cibernéticos que tornam a comunicação mais
rápida, porém virtual e sem aquele sentido profundo do lin-
guajar que contribui na construção da sensibilidade no rela-
cionar-se com Outro.
De modo que essas constatações dentre tantas outras
caracterizam as relações humanas em tempo de vida líquida.
Por isso, pensar a comunidade humana nessa discussão é mais
que apropriado, pois a “comunidade produz uma sensação
boa por causa dos significados que a palavra comunidade
carrega [...]” como um “lugar confortável e aconchegante.
É como um teto sob o qual nos abrigamos da chuva pesada,
como uma lareira diante da qual esquentamos as mãos num
dia gelado” (BAUMAN, 2003, p. 7). Agora cabe a seguinte pro-
vocação: Onde podemos encontrar essa comunidade humana
após pandemia?
Vive-se a sociedade do vigiar e do punir62, pois aquela
mesma tecnologia biométrica usada para identificar os pre-
sos ou infratores de trânsito, agora, na contemporaneidade,
ela passa a ser utilizada na “vigilância por meio de videocâ-
mara transforma os espaços públicos das cidades em áreas
internas de uma imensa prisão” e, ainda, segundo o filósofo,

61 
Ver, na análise interpretativa do pensamento de Maturana na obra Educação e Humani-
zação: por uma vivencia criativa, do professor Roque Strieder (2002, p. 32), quando ele afirma
que “a humanização acontece, segundo Maturana, quando conservamos um determinado
modo de vida que se sustenta no ato de recolher e compartilhar alimentos, na colaboração
do macho e da fêmea no cuidado dos filhotes, na convivência sensual, na sexualidade das
fêmeas não mais na exclusividade reprodutiva, mas, no seu próprio interesse e disposição.
Para Maturana a linguagem é uma manifestação peculiar do nosso viver e fazer humanos.
Somos seres imersos na linguagem e é ela que nos humaniza”.
Esses termos também representam a existência de uma obra do filósofo Michel Foucault
62 

com o nome de Vigiar e Punir.

225
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

“aos olhos da autoridade – e, talvez, esta tenha razão – nada


se assemelha melhor ao terrorista do que o homem comum”
(AGAMBEN, 2009, p. 50). Sinais mais que concretos têm sido
apresentados na realidade chilena e nos países latino-ame-
ricanos acerca das relações humanas. Em Agamben (2009,
p. 59), “um homem inteligente pode odiar o seu tempo, mas
sabe, em todo caso, que lhe pertence irrevogavelmente, sabe
que não pode fugir ao seu tempo”, resta-nos a esperança de
que surja cada vez mais os profanadores contemporâneo
percebendo e denunciando as injustiças sociais que espalham
o desencantamento sobre o mundo. Somos unos e múltiplos,
indivíduos e coletivos, competitivos e colaborativos. Somos
complexos – Homo complexus (MORIN, 2000) -, mantemos
relações de interdependência com tudo e todos, vivemos em
uma dinâmica caótica.
Viver-se no processo de desnaturalização do biológico
e a constituição de novas formas do viver. Eis, a boniteza
das diversidades dos viveres no após pandemia. Por isso, a
ideia de comunidade, como um “tipo de mundo que não está,
lamentavelmente, ao nosso alcance – mas no qual gostaría-
mos de viver e esperamos vir a possuir” (BAUMAN, 2003, p.
09). Também argumenta que a “Comunidade é nos dias de
hoje outro nome do paraíso perdido – mas a que esperamos
ansiosamente retornar, e assim buscamos febrilmente os
caminhos que podem levar-nos até lá”. (BAUMAN, 2003, p. 09).
Dentre esses caminhos, a educação surge como possi-
bilidade para pensar as diferenças do viver nas sociedades
capitalistas. Para tanto, a necessidade como diria Agamben
(2007, p. 7), de “ir em busca da infância, ou seja, de nossa
capacidade de jogar e de amar, a saber, de viver na intimidade
de um ser estranho, não para fazê-lo conhecido, e sim para
estar ao lado dele sem medo”. Para Bauman, “a finalidade da
educação nesses casos é contestar o impacto das experiências

226
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

do dia-a-dia, enfrentá-las e por fim desafiar as pressões que


surgem do ambiente social” (2009, p. 21).
Sendo a profanação o impulso para poder pensar em
uma educação que abra-se para “uma nova política, um novo
ser humano, uma comunidade, pensando e promovendo o
avesso da vida nua, a potência da vida, e a vida humana como
potência de ser e de não ser”. (AGAMBEN, 2007, p. 9). Esse
cenário da Covid-19 nos convida a repensar o conceito de
mixofobia, ou seja, o medo de se envolver com o Outro. Para
assim, incluirmos o cultivo do conceito de mixofilia, ou seja,
de envolver com a subjetividade do Outro. Esse é o chamado
para construirmos novos espaços de convivência, cujas raízes
estão no reconhecimento do Outro, não mais como algo, mas
sim, como outra Alteridade. É, portanto, um com-sentir ori-
ginário na doçura do existir que só ocorrer na/com a presença
do Outro em um novo Chile/Mundo, após pandemia.
Essa reflexão trata-se de um convite para pensar o
amanhã. Para tanto, a necessidade agir na construção de
políticas públicas e de direitos que assegurem o valor da vida
e do respeitar em seu sentido profundo os modos de vida e
as pluralidades de viveres. É tempo de aprendermos com as
Vespas, em um dos mais instigantes relatos acerca de um
estudo realizado no Panamá por um grupo de pesquisadores
da Sociedade Zoológica de Londres, Bauman (2011) revela
em suas reflexões que as vespas que saiam de seus ninhos
originais, quando chegavam próximos a outros ninhos, eram
recebidas como “legítimos membros do ninho”.
Tal tipo de comportamento das Vespas nos possibilita
ainda mais entender a origem de uma comunidade, que con-
sidere o reconhecimento do Outro como princípio educativo
para se viver em comunidade, segundo o estudo: as “vespas
nativas e imigrantes que viviam e trabalhavam lado a lado,
ombro a ombro – tornando-se indistinguíveis umas das outras”
(BAUMAN, 2011, p. 11). Sendo assim, com urgência, precisa-

227
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

mos pensar uma educação para o bem viver, em tempos de


após pandemia, e que nela se traduza o profundo sentido das
palavras do Papa Francisco em seu momento de solidão na
Praça de São Pedro:
Na nossa avidez de lucro, deixamo-nos
absorver pelas coisas e transtornar pela
pressa. Não nos detivemos perante os teus
apelos, não despertamos face a guerras e
injustiças planetárias, não ouvimos o grito
dos pobres e do nosso planeta gravemente
enfermo. Avançamos, destemidos, pen-
sando que continuaríamos sempre sau-
dáveis num mundo doente.63

REFERÊNCIAS

AGAMBEN, Giorgio. O que é o contemporâneo? E outros ensaios.


Trad. Vinícios Nicastro Honesko. Chapecó, SC: Argos, 2009.

AGAMBEN, Giorgio. Profanações. São Paulo: Boitempo, 2007.

AGAMBEN, Giorgio et al. Sopa de Wuhan: pensamiento contem-


poraneo en tiempos de pandemias. Buenos Aires: ASPO, 2000.

ASSMANN, H. Metáforas novas para reencantar a educação:


epistemologia e didática. 2. ed. Petrópolis: Vozes, 1998.

BAUMAN, Z. B . Vidas desperdiçadas. Rio de Janeiro: Zahar, 2005.

BAUMAN, Zygmunt. 44 Cartas do Mundo Líquido Moderno.


Trad. Vera Pereira. Rio de Janeiro: Zahar, 2011.

BAUMAN, Zygmunt. A ética é possível num mundo de consumi-


dores? Trad. de Alexandre Werneck. Rio de Janeiro: J. Zahar, 2011.

63 
Atentar-se para o Texto integral da homilia do Papa Francisco neste 27 de março de
2020. Disponível em: https://www.vaticannews.va/pt/papa/news/2020-03/papa-francis-
co-homilia-oracao-bencao-urbe-et-orbi-27-marco.html. Acesso em 19 de Maio de 2020.

228
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

BAUMAN, Zygmunt. A sociedade individualizada: vidas e his-


tórias vividas. Trad. de José Granei. Rio de Janeiro: J. Zahar, 2008.

BAUMAN, Zygmunt. Amor líquido: sobre a fragilidade dos laços


humanos. Trad. de Carlos Alberto Medeiros. Rio de Janeiro: J.
Zahar, 2004.

BAUMAN, Zygmunt. Comunidade: a busca por segurança no mundo


atual. Trad. Plínio Dentzien. – Rio de Janeiro: Zahar, 2003.

BAUMAN, Zygmunt. Confiança e medo na cidade. Trad. de Eliana


Aguiar. Rio de Janeiro: J. Zahar, 2009.

DENZIN; N LINCOLN, Y. A disciplina e a prática da pesquisa qua-


litativa. In: DENSIN, N. ; LINCONLN, Y [et al]. O planejamento da
pesquisa qualitativa: teoria e abordagens. 2. Ed. Porto Alegre:
Artmed, 2006, p. 15-41.

JAEGHER, C. Dialogando la dignidad para la Naturaleza a través


del Suma Kawsay, Suma Qamaña y Kvme Mogen. RIDH | Bauru, v.
5, n. 1, p. 129-148, jan./jun., 2017 (8).

SANTOS, Boaventura de Sousa. A Cruel Pedagogia do Vírus.


Coimbra: Edições Almedina, 2020.

TOSTES, Anjuli (Org.); FILHO, Hugo Melo (Org.). Quarentena: refle-


xões sobre a pandemia e depois. Ilustração de Carlo Giambarresi.
1. ed. Bauru: Canal 6, 2020.

229
OS DESAFIOS E POSSIBILIDADES DA
EDUCAÇÃO EM TEMPOS DE PANDEMIA

Miriam Paulo da Silva Oliveira64


Rosilene Pedro da Silva65
Giselle Beatriz da Silva66

INTRODUÇÃO

O objetivo do estudo é compreender como essa pande-


mia do Corona Vírus, também chamada de Covid-19, impactou
a educação de um modo geral trazendo mais desafios para os/
as professores/as e todos/as os/as profissionais de Educação
e mais ainda desigualdade aos/as estudantes. Já que se trata
de um inimigo que não conseguimos vê-lo, e que ainda não
tem vacina para essa enfermidade.
Outro desafio é o cuidado com a saúde emocional que
está trazendo transtornos para os/as estudantes e professores/
as e outros/as profissionais da educação, pois tiveram que em
emergência adaptar o planejamento, metodologia, currículo
e avaliação, tirando todos de sua realidade que viviam com
normalidade, tornando-se uma realidade fora do alcance da
gestão e dos/as professores/as, que não medindo esforços
correram contra o tempo para se reinventar numa pandemia

Mestra em Educação- UPAP; Professora de Língua Portuguesa, Diretora de ensino da


64 

Rede Municipal de Vicência -PE; Pedagoga, Psicopedagoga, mirampaulo@gmail.com


Mestra em Educação – UPE; Professora da Educação Infantil, Coordenadora, Pedagoga,
65 

Especialista em Docência Escolar, rosilenepalmeiras@hotmail.com


66 
Graduanda em Bacharelado em Enfermagem pela Universidade São Miguel- giselle-
beatrizsilva@hotmail.com

230
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

de grande proporção. E isso, com certeza desestabilizou o


emocional de todos/as, cito ainda as famílias que estão um
tanto atarefados para realizar e colaborar nas atividades dos/
as estudantes em casa.
Outro desafio importante a ser destacado é o impacto
na educação na forma mais didático-pedagógico, operando de
forma remota e não à distância, já que existe uma diferença
entre EAD e atividade remota. EAD é estruturado, guiado
por um/a tutor/a, o/a estudante acessa na plataforma quando
tem tempo e realiza as atividades e no caso de dúvidas, o
aluno deixa numa caixa para o e-mail do tutor, e no caso de
atividade remota o/a estudante tem aula online, vídeo aula,
o/a professor/a interage sobre as dúvidas, tem um retorno
mais imediato, o/a mediador/a é o/a professor/a, em que ele/a
interage no período estabelecido por ele/a.

UMA LUTA CONTRA UM INIMIGO


INVISÍVEL: O PERIGO ESTÁ LÁ FORA

Segundo as notícias que passam todos os dias nos tele-


jornais, A Covid-19 é uma doença causada pelo corona vírus
SARS-CoV-2, que apresenta um quadro clínico que varia de
infecções assintomáticas (em algumas pessoas) a quadros
respiratórios graves que podem levar à óbito. De acordo com a
Organização Mundial de Saúde (OMS), a maioria dos pacientes
com Covid-19 (cerca de 80%) podem ser assintomáticos e cerca
de 20% dos casos podem requerer atendimento hospitalar
por apresentarem dificuldade respiratória e desses casos
aproximadamente 5% podem necessitar de suporte para o
tratamento de insuficiência respiratória (suporte ventilatório).
O novo agente do Corona vírus foi descoberto, segundo
pesquisas indicam que foi em 31/12/19 após casos registrados
na China, provocando a doença chamada de Corona vírus
(Covid-19), apresentando os seguintes sintomas que podem

231
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

variar de um simples resfriado até uma pneumonia severa.


Sendo os sintomas mais comuns: Tosse, febre, coriza, dor de
garganta e dificuldade para respirar.
A transmissão acontece de uma pessoa doente para
outra ou por contato próximo por meio de: toque do aperto
de mão, gotículas de saliva, espirro, tosse, catarro, objetos ou
superfícies contaminadas, como celulares, mesas, maçanetas,
brinquedos, teclados de computador etc.
De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS)
as recomendações de prevenção à Covid-19 são as seguintes:
lavar com frequência as mãos até a altura dos punhos, com
água e sabão, ou então higienização com álcool em gel 70%,
ao tossir ou espirrar, cobrir nariz e boca com lenço ou com o
braço, e não com as mãos, evitar tocar olhos, nariz e boca com
as mãos não lavadas e ao tocar lavar sempre as mãos como já
indicado, manter uma distância mínima de cerca de 2 metros
de qualquer pessoa tossindo ou espirrando, evitar abraços,
beijos e apertos de mãos.
É necessário adotar um comportamento amigável sem
contato físico, mas sempre com um sorriso no rosto, higienizar
com frequência os principais acessórios como os celulares e
os brinquedos das crianças, não se pode compartilhar objetos
de uso pessoal, manter os ambientes limpos e bem ventilados
e, sobretudo, evitando a circulação desnecessária nas ruas,
estádios, teatros, shoppings, shows, cinemas e igrejas e se
possível, fique em casa.

O CUIDADO COM A SAÚDE EMOCIONAL

O isolamento social ou quarentena nos ocasionou uma


série de reflexões acerca das nossas vidas da nossa rotina. É
necessário projetar perspectivas futuras, pois a esperança é
uma das emoções que se faz necessária sua presença neste
momento tão atípico, ou seja, estamos em meio a uma crise,

232
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

uma mudança brusca, repentina e, necessariamente para o


pior. Logo, precisamos nos ofertar esse tempo, para refletir-
mos e compreendermos como agir/ reagir.
Cuidar do nosso estado emocional tem sido tão impor-
tante quanto os cuidados preventivos em relação a Covid-19.
Comumente vemos muitas pessoas com ansiedade, estresse e
até mesmo com pânico em meio a esta pandemia, portanto é
nesse momento que precisamos ter esse autoconhecimento de
nós mesmos para aprender a lidar com as dificuldades apre-
sentadas. Neste momento é de suma importância estabelecer
rotinas sistêmicas tais como: momento de descontração com a
família por intermédio de músicas e/ou brincadeiras, conversas
informais, boas leituras e alimentando uma projeção futurista
positiva, objetivando superar essa pandemia com dignidade.
É imprescindível acreditarmos que essa situação
irá passar e a maneira que estaremos dependerá do que
estabelecermos para nós como ponto de partida. É um
momento de suma importância para o nosso eu, uma refle-
xão crítica de quem somos e como estamos nos comportando
enquanto seres humanos, proporcionando-nos um cresci-
mento pessoal e a reflexão é a maneira mais profícua para
que essa reflexão se efetive de maneira significativa.
Não podemos e nem devemos aguçar sentimentos e/ou
pensamentos negativos como murmuração, medo, ansiedade
e estresse que, consequentemente, gera um desequilíbrio
emocional, mas devemos e podemos ser generosos com a
vida por estarmos bem em nossos lares, focar na solução
vindoura e que tudo ao meu redor irá melhorar e ficaremos
bem outra vez. Nos estudos das emoções que é importante
na redescoberta do homem e suas relações com o outro e o
mundo. Sendo assim a Base Curricular Comum (BCC), basean-
do-se na Base Nacional Comum Curricular (BNCC) 2017, traz
na competência 8 as questões relacionadas a desenvolver o
aspecto sócio emocional descrevendo que

233
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

Conhecer-se, apreciar-se e cuidar de sua


saúde física e emocional. Compreenden-
do-se na diversidade humana e reconhe-
cendo suas emoções e as dos outros com
autocrítica e capacidade para lidar com
elas. (BCC, 2008, p. 26).
Ao refletirmos, ressignificamos nossa maneira de enxergar
as coisas de tal modo, que nos empoderamos do que nos faz bem
mesmo que o momento demonstre que nada está nem irá ficar
bem, pois o que precisamos de fato é sobreviver a tudo isso de
maneira saudável. Somos conscientes da gravidade da situação,
mas não podemos ficar conectados às redes sociais com tal fre-
quência que nos transmitam pânico, mesmo porque nem todas
as fontes de informações são fidedignas, daí a real importância
do autocuidado e seguir uma rotina, conforme foi supracitada.
Nossas vidas nem pararam e nem podem parar, mas os cuidados
conosco e com os nossos familiares não podem ser minimizados,
pois a autovalorização refere-se a valorizar quem somos, mas
sem menosprezar quem está ao nosso lado.
A vida precisa valer a pena em quaisquer situações,
mesmo nas mais adversas, pois apenas estamos bem com o
outro se primeiramente estarmos bem conosco, por isso não
podemos nos acomodar, pois viver requer muita coragem,
determinação e o medo nos impossibilita de viver, de traçar
perspectivas de futuro e precisamos manter viva a capacidade
de liderar nossas vidas e gerir nossa história, pois somos
protagonistas e não coadjuvantes.

IMPACTOS CAUSADOS PELA PANDEMIA NA


EDUCAÇÃO

Assim como em todo nosso país, a pandemia no nosso


município causou grandes impactos em todas as áreas da nossa
sociedade, a insegurança da estabilidade econômica é uma
realidade e tem se tornado um dos fatores mais preocupante.

234
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

Não existem fórmulas mágicas para lidar com todo esse


cenário no qual estamos vivendo, é como se fosse um novo
paradigma, assim como o uso das tecnologias na realização das
aulas remotas que para muitos/as professores/as tem sido um
grande desafio, abrangendo todo o processo comportamento
de aulas com vistas na formação humana.
No entanto abordaremos esses impactos no âmbito
educacional e como os/as profissionais que atuam na educação
tem se mobilizado para que se mantenha os/as estudantes
envolvidos/as com o processo de ensino e aprendizagem. É
notório que existem muitas possibilidades de maneira não
presencial para se manter a continuidade desse processo como
a utilização de aplicativos como Zoom, Google Classroom,
Whatsapp, Facebook e/ou lives pelo Instagram e/ou Youtube,
portanto, é necessário que haja um ressignificado na prática de
muitos/as professores/as, pois as maiorias não dominam com
propriedade os novos suportes que as tecnologias oferecem
como aliados à educação. Segundo PERRENOUD, 2000 no
seu livro das 10 novas competências para ensinar, mas preci-
samente na competência 8 ele descreve a seguinte afirmação:
As novas tecnologias podem reforçar a
contribuição dos trabalhos pedagógicos e
didáticos contemporâneos, pois permitem
que sejam criadas situações de aprendiza-
gens ricas, complexas, diversificadas, por
meio de uma divisão de trabalho que não
mais com que todo o investimento repouse
sobre o professor, uma vez que tanto a
informação quanto a dimensão interativa
são assumidas pelos produtores dos ins-
trumentos. (2000, p. 139)

Percebemos que em relação a essa nova prática a maioria


dos/as professores mesmo sendo do século XX continuam
no século XIX e os/as estudantes por se tratarem de nativos
digitais, estão no século XXI. Mesmo porque suas formações

235
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

específicas e/ou continuadas não os prepararam para essa


prática, pois eles/as adotou-se de conhecimento específicos
e saem da formação com dificuldade em lidar com o cunho
desses/as estudantes que dominam esses avanços tecnológicos
para atender essa demanda e o distanciamento social não foi
e nem pode privá-los/as do conhecimento. Partindo dessa
premissa, os/as professores/as precisaram ressignifificar suas
práticas ainda mais com intencionalidade, visto que, estão
sendo mediadas pela tecnologia, ou seja, uma ferramenta que
nem todos/as têm domínio. Mas o momento está exigindo
muito essa mudança dos professores com relação a prática
pedagógica, que segundo Perrenoud recomenda que
Melhor seria que os professores exercerem
antes de mais nada uma vigília cultural,
sociológica, pedagógica e didática, para
compreenderem do que será feita a escola
de amanhã, seu público e seus programas.
Se lhes resta um pouco de disponibilidade,
uma abertura para o que se desenrola na
cena das NTIC seria igualmente bem –
vinda. (2000, p. 138).

A Educação Remota já existia à Distância (EAD) a pri-


meira pode haver uma flexibilidade no horário do/a estudante
assistir, na segunda existe um ambiente virtual, no qual os/
as estudantes respondem suas atividades no horário mais
propício, cada um/a identifica a melhor plataforma que se
adeque aos seus aparelhos e/ou PC. É sabível que essas aulas
não resolvem as problemáticas, mas facilitam o acesso à plu-
ralidade de tecnologias e os/as professores/as se redescobrem
mesmo não sendo nativos digitais, mesmo porque as práticas
pedagógicas não podem se tornar obsoletas, interagindo
simultaneamente com os/as estudantes.
Neste momento atípico, a escola tem buscado cumprir
sua função com a cooperação dos pais, mães e/ou responsáveis,
por intermédio dessa mediação grande parte dos/as estudan-

236
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

tes conseguem realizar as atividades propostas, tornando-se


uma amplitude neste momento. As maneiras de avaliação
precisam ser repensadas, tornando-se cada dia mais uma
educação híbrida, pois apesar dessa pluralidade de prática
dos/as professores/as que tem sido de suma importância,
não há tecnologia específica para dar conta da educação. É
valido salientar que as tomadas de decisões acerca da prá-
tica das aulas remotas em nosso município aconteceram de
maneira coletiva e harmônica que foi e é fundamental para
o andamento do processo.
É necessário negativar os processos destrutivos a
estudantes e professores neste momento delicado, pois as
mudanças bruscas sempre causaram e causarão impactos
negativos na vida de todos seres humanos, portanto precisamos
criar oportunidade de melhorar a prática educativa dos/as
professores que apresentam dificuldades com a utilização
das novas ferramentas tecnológicas a curto e longo prazo.

A IMPORTÂNCIA DA EDUCAÇÃO
EMOCIONAL EM MOMENTO DE PANDEMIA

Os estudos das emoções segundo as pesquisas apontam


surgiu no Brasil apenas nos anos 2000, então, apesar de ser
algo muito novo, sempre existiu, mas talvez nunca foi tão
preciso gerenciá-la como neste momento de pandemia. Por
isso, a educação emocional é imprescindível para mantermos
nosso autocontrole. Entretanto, o respeito mútuo, a aceitação
às diferenças e a compreensão do outro são valores impres-
cindíveis desde a mais tenra idade e precisa fazer parte de
todos os ambientes.
Neste momento tão atípico e delicado é necessário nos
encontrarmos numa viagem para dentro de nós mesmos
na qual somos passageiros únicos e solitários, pois a partir
dessa ação teremos resistência para limitar o que queremos

237
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

para nós e consequentemente, para o outro. Não é por acaso


ouvirmos tanto a palavra “empatia” durante esse período,
pois para praticá-la efetivamente precisamos desenvolvê-la
dentro de nós e só então, vivenciá-la.
O desenvolvimento desse controle emocional precisa
e pode se desenvolver em cada um/a de nós, reconhecendo
nossas falhas, fraquezas, limitações para saber lidar conosco
e com o outro. Essas emoções, estão atreladas as minhas
reações e consequentemente relações interpessoais, daí a real
necessidade de estarmos bem em todos os aspectos.
Essa pandemia que parecia tão distante de nós de
repente nos trouxe a reflexão acerca de pequenas coisas,
como por exemplo como estou/estava, o que preciso/precisava
ser modificado, enfim mobilizou toda nossa estrutura física,
emocional e, sobretudo, familiar.
A realidade dessa situação é que não temos o mínimo
de previsão de quando e como essa pandemia vai parar/
passar. É como se estivéssemos em meio a uma maratona,
não sabemos quando vai terminar. As relações familiares se
encaminharam para um desequilíbrio doméstico, pois nem
todos conseguiram manter o equilíbrio entre a família e o
trabalho e, infelizmente os noticiários afirmam que neste
período houve um aumento significativo tanto no índice de
violência contra mulher quanto no abuso infantil e as crises
de relacionamentos aparecem como os maiores causadores
do estresse até mais do que a própria pandemia.
Neste momento tão atípico a ansiedade está se tornando
mais um problema de saúde pública, pois o medo é o grande
causador dessa vilã que é a ansiedade. A inquietude predomina,
pois ao pensar no futuro, de como vai ser, se e quando volta-
remos as nossas atividades. No entanto, os/as profissionais
de Psicologia aconselham a focar no presente, analisar o que
e como estamos fazendo para vivermos da melhor maneira
o momento, pois é necessário filtrar as informações que são

238
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

essenciais para o momento, isto é precisa ter uma intenciona-


lidade e, sobretudo, contextualizar as informações, evitando
excesso de pensamentos negativos tanto do presente quanto
do futuro.
O presente precisa e pode ser pensando, mas com inte-
ligência e controle emocional definindo metas a curto prazo,
estabelecendo um cronograma como uma hora de lazer, a
leitura, a cozinhar e até mesmo brincadeiras interativas com
a família.
Os relatos de pessoas com ansiedade têm se acentuado
bastante neste período de pandemia, pois muitas pessoas têm
apresentado alguns dos sintomas que caracteriza um quadro
de ansiedade, tais como: medo, tristeza, queda de cabelo, insô-
nia, perca e/ou aumento do apetite, respiração ofegante, etc.

AS POSSIBLIDADES NESSE PERÍODO DE


PANDEMIA

As possibilidades que são importantes de se destacar é


que a maioria dos/as professores/as está se reinventando no
caos instaurado, buscando contato com as famílias, percebe-
mos que nunca os pais procuraram tanto falar e se comunicar
de forma pedagógica, se interessar mais como o/a filho/a
dele/a está aprendendo, as comunicações são muitas. E isso, é
importante para o elo entre família e escola. Nessa reinvenção
SOUZA afirma que:
Ocorre, então, uma análise e uma reflexão
sobre as informações novas e os seus sabe-
res anteriormente construídos. A compara-
ção entre eles vai possibilitar –lhes novas
FORMULAÇÕES. Essas conformam uma
maneira nova de conhecer e novos saberes.
Passa-se então, a ver as coisas já conhecidas
de outra forma e outra compreensão se
estabelece. Realiza-se, assim, o que esta-

239
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

mos chamando de processo de recognição.


Essa nova cognição que permitirá outra
forma de fazer e de emocionar-se, estamos
denominando de processo de reinvenção.
(1999, p. 25)

Sendo assim, vale salientar que os/as professores/as


têm passado por momentos difíceis, pois eles não tinham
formação continuada de como usar muitas ferramentas tec-
nológicas. Que segundo PERRENOUD, 2001, são essenciais
nos dias atuais, em sua obra que já quase em duas décadas ele
já recomendava para que o professor utilizasse a competência
de usar as novas tecnologias, então ele afirma que:
A formação é a oportunidade de experi-
mentar estratégias obtidas em parte dos
modelos e teorias explicitados. Ela cons-
titui o material de base da pesquisa sobre
as condições favoráveis a uma articulação
entre formação e prática. A ação consiste
em desenvolver a ferramenta educativa, em
experimentá-la nas salas de aula de modo s
poder depurá-la e adaptá-la aos contextos
para os quais foi concebida. (2001, p. 94)
Então, a partir dessa premissa a formação ao voltar a
“normalidade”, os professores vão continuar usando essas
ferramentas que agora à distância estão usando, de fato as
formações devem mudar o foco para essa nova demanda,
que o professor teve que usar com dureza, mas eles se rein-
ventaram. Mas se era uma necessidade, os docentes devem
está solicitando formações nessa área do letramento digital.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diante dessa realidade da Pandemia do Corona Vírus,


Covid- 19, houve impactos e, sobretudo, grandes desafios para
aqueles que atuam na educação, principalmente os professores

240
Educação em tempos de COVID-19: desafios e possibilidades – V. 1

que tiveram que se reinventar e utilizar diversas ferramentas


das tecnologias para fazer uma comunicação pedagógica com
os estudantes, e a desigualdade aparece pois a maioria das
escolas não consegue atingir nem 70% dos/as estudantes com
atividades, e os 30 % aproximadamente estão excluídos, pois
não tem acesso à internet e fica sem a conectividade. E isso,
expõe a desigualdade social no âmbito do nosso município,
Estado e do Brasil, pois de uma forma geral vemos e escuta-
mos as insatisfações em vários meios de comunicação e em
redes sociais, os estudantes e pais se queixando dessa falta
de conexão entre as escolas e os estudantes, então nem os
professores, nem as escolas podem ser responsabilizadas, os
governos Federal, Estadual e Municipal em um pacto federa-
tivo devem fazer um plano estratégico para atender as neces-
sidades dos estudantes que estão à margem da desigualdade
social em pleno século 21. Por isso, é inadmissível, esperamos
uma providência urgente, pois o que o panorama nacional
apresenta é que nem tão cedo iremos nos livrar desse vírus
invisível que se tornou tão mortal para muitos.

REFERÊNCIAS

BRASIL, Base Nacional Comum Curricular. Secretaria de Edu-


cação, Ministério da Educação, 2017.

SOUZA, João Francisco de. A Educação Escolar, nosso Fazer Maior,


Des(A)fia o nosso Saber: Educação de Jovens e Adultos. Recife:
Bagaço, Núcleo de Ensino, Pesquisas e Extensão em Educação de
jovens e Adultos e em Educação Popular da UFPE (NUPEP) 1999. 274p.

PERNAMBUCO, Secretaria de Educação, Base Comum Curricular


(BCC) para as redes públicas de ensino de Pernambuco, 2008.

PERRENOUD, Philippe. Dez Novas Competências para Ensinar.


Porto Alegre: Artes Médicas Sul, 2000.

241
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

______________, Philippe, Léopold Paquay, Marguerite Altet,


Évelyne Charlier; trad. Fátima Murad e Eunice Gruman. Formando
Professores profissionais: Quais as Estratégias? Quais as Com-
petências? – 2.ed.- Porto Alegre: Artmed Editora, 2001.

242
SOBRE OS ORGANIZADORES

Anderson Luiz Tedesco

Pós - Doutorando em Educação pelo Programa de Pós-Gradua-


ção em Mestrado da Educação da Universidade Comunitária
da Região de Chapecó (Unochapecó). Doutor em Filosofia pela
Pontifícia Universidade Católica do Paraná - PUCPR (2019).
Mestre em Educação pela Universidade do Oeste de Santa
Catarina - Unoesc, Campus de Joaçaba (2012). Especialista
em Psicopedagogia pela Universidade Regional de Blumenau
(2011). Especialista em Bioética e Pastoral da Saúde pelo Cen-
tro Universitário São Camilo (2010). Licenciado em Filosofia
pelo Centro Universitário São Camilo (2008). Pesquisador em
Projetos de Pesquisa/CAPES do Observatório da Educação do
Programa de Mestrado em Educação da Universidade do Oeste
de Santa Catarina e de Projetos de Pesquisas PIBIC/CNPq da
Pontifícia Universidade Católica do Paraná - PUCPR. Também
orientou Bolsistas do Programa de Bolsas Universitárias do
Estado de Santa Catarina - UNIEDU. Atualmente é professor
no Colégio La Salle de Xanxerê e na Unochapecó, desenvolve
pesquisas principalmente nos seguintes temas: Biociências e
Educação, Bioética e Religião, Educação e Filosofia, Iniciação
Científica na Educação Básica e no Ensino Superior. Participa
dos Grupos de Pesquisa: GRUPEVD - Grupo de Pesquisa em
Educação, Violência e Democracia – UFFS, Campus de Cha-
pecó, da Rede Sur Paideia – Universidade Tuiuti do Paraná -
UTP e do Grupo de Pesquisa Revitalizando Culturas: Sagrado,
Ética e Comunicação – UNISUL, cadastrados no CNPq.
Contato eletrônico: anderson.tedesco@unochapeco.edu.br

243
Tiago Eurico de Lacerda | Anderson Luiz Tedesco (Org.)

Tiago Eurico de Lacerda

Possui graduação em Filosofia (bacharelado e licenciatura);


Especialização em Filosofia e em Tutoria em Educação a Dis-
tância; mestrado e doutorado em Filosofia pela Pontifícia
Universidade Católica do Paraná (PUC-PR), com pesquisa
sobre procedimentos e métodos científicos em Nietzsche.
Atualmente é graduando em Letras: Português/Inglês pela
PUC-PR, professor do Departamento Acadêmico de Ciências
Humanas e Sociais da UTFPR - Campus de Londrina e profes-
sor de Filosofia do Quadro Próprio do Magistério da SEED-PR
no Colégio Estadual Nilo Peçanha. É autor de vários artigos
científicos na área de filosofia e do livro Deus como problema
filosófico na Idade Média (Intersaberes, 2018). Tem experiência
na área de filosofia e educação com ênfase em Fundamentos
da Ética, História da Filosofia Moderna e Contemporânea,
Filosofia do Direito, Ciência Política, Hermenêutica e Filosofia
da Educação.
Contato: tiago.lacerda@escola.pr.gov.br

244
Este livro foi composto em
Vollkorn 10,5 pt pela Editora Bagai.

www.editorabagai.com.br    /editorabagai    /editorabagai


   contato@editorabagai.com.br

Вам также может понравиться