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UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA

INSTITUTO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS


CURSO DE BACHARELADO EM DIREITO

MARCO ANGELO SOTO VIANNA

EUTANÁSIA SOB A ÓTICA DO FIM DO SOFRIMENTO DO SER HUMANO DE


FORMA DIGNA

BOA VISTA
2016
MARCO ANGELO SOTO VIANNA

EUTANÁSIA SOB A ÓTICA DO FIM DO SOFRIMENTO DO SER HUMANO DE


FORMA DIGNA

Monografia apresentada como pré-


requisito para conclusão do Curso de Ba-
charelado em Direito da Universidade Fe-
deral de Roraima.
Orientador: Prof. MsC. José Edival Vale
Braga

BOA VISTA
2016
Dados Internacionais de Catalogação na publicação (CIP)
Biblioteca Central da Universidade Federal de Roraima
V614e Vianna, Marco Angelo Soto.
Eutanásia sob a ótica do fim do sofrimento do ser humano de forma
digna / Marco Angelo Soto Vianna. – Boa Vista, 2016.
100 f.

Orientador: Profº. Me. José Edival Vale Braga.

Monografia (graduação) – Universidade Federal de Roraima, Curso


de Bacharel em Direito.

1 – Eutanásia. 2 – Dignidade da pessoa humana. 3 – legalização. 4 –


Direito à liberdade. 5 – Autonomia de vontade. I – Título. II – Braga,
José Edival Braga (orientador).

CDU – 342.71
MARCO ANGELO SOTO VIANNA

EUTANÁSIA SOB A ÓTICA DO FIM DO SOFRIMENTO DO SER HUMANO DE


FORMA DIGNA

Monografia apresentada como pré-


requisito para conclusão do Curso de Ba-
charelado em Direito da Universidade Fe-
deral de Roraima. Defendida em 14 de fe-
vereiro de 2017 e avaliada pela seguinte
banca examinadora:

__________________________________________
Prof. MsC. José Edival Vale Braga
Orientador/ Curso de Direito da UFRR

__________________________________________
Prof. MsC. Mauro José do Nascimento Campello
Curso de Direito da UFRR

__________________________________________
Prof.ª. MsC. Lívia Dutra Barreto
Curso de Direito da UFRR

BOA VISTA
2016
À minha mãe, Leonilda, e meu pai, Samuel,
por todo o carinho, educação, confiança e
apoio que me proporcionaram. Muito obri-
gado por tudo, jamais chegaria até aqui sem
vocês.
AGRADECIMENTOS

Nossas conquistas e momentos especiais sempre são compartilhados com todos a-


queles que nos rodeiam e fazem parte de nossa formação como pessoa. Assim, uso este espa-
ço para agradecer a todos.
À minha mãe, Leonilda, e meu pai, Samuel, por todo amor, carinho, atenção, confi-
ança e suporte que me proporcionam desde o meu nascimento.
À minha avó e madrinha, Maria, à minha irmã, Karina, ao meu irmão, Victor, avô,
tios, tias, primos, primas e amigos por fazerem parte da minha vida e me fornecerem suporte
quando necessário.
Ratifico minha gratidão especial ao Msc. Edival Braga, que veio a ser o orientador de
minha monografia e sempre ajudou com sugestões e ensinamentos durante os anos de curso.
Por fim, agradeço a todos os membros do corpo docente do Curso de Direito da U-
FRR, pelo apoio recebido durante minha formação acadêmica.
RESUMO
A eutanásia sempre foi um assunto complicado de se abordar em qualquer tempo e lugar do
globo. Afinal, a vida humana é um dos assuntos mais controversos de todo o mundo jurídico e
o tema apresenta interdisciplinaridade marcante. É da natureza do homem tentar postergar ao
máximo sua morte, entretanto, em alguns casos o ser humano roga para que lhe abreviem a
vida diante de tanto sofrimento físico-psicológico. Nesse contexto, a eutanásia se inclui no
mundo jurídico e causa imensa polêmica, sendo sua legalização um tema controverso. Ques-
tões como dor, sofrimento, dignidade e o embate entre os direitos fundamentais à vida e à
liberdade concentram-se no núcleo desta discussão. Assim, levando em consideração que a
dignidade humana é o valor fundante do ordenamento jurídico brasileiro, através do sopesa-
mento entre os direitos à vida e à liberdade, mostra-se possível uma pessoa requerer a eutaná-
sia como forma de encerrar o sofrimento e partir de forma digna.

Palavras chaves: eutanásia, dignidade da pessoa humana, legalização, direito à vida, direito à
liberdade, autonomia de vontade, sofrimento.

ABSTRACT
Euthanasia has always been a complicate issue to address at any time and place in the world.
After all, the human life is one of the most controversial issues in the legal world and the
theme presents striking interdisciplinarity. It is the nature of man to try to postpone his death
to the maximum, however, in some cases the human being begs to abbreviate his life in the
face of so much physical-psychological suffering. In this context, euthanasia is included in the
legal world and causes immense polemic, the legalization is a controversial subject. Issues
such as pain, suffering, dignity and the clash between the fundamental rights to life and free-
dom are concentrated in the core of this discussion. Thus, taking into consideration that hu-
man dignity is the value that underlies the brazilian legal system, through the weighting be-
tween the rights to life and freedom, it is possible that a person requires euthanasia as a way to
end the suffering and departing in a dignified manner.

Key words: euthanasia, dignity of the human person, legalization, right to life, right to free-
dom, autonomy of will, suffering.
LISTA DE ABREVIATURAS

CC – Código Civil;
CF – Constituição Federal;
CP – Código Penal;
PL – Projeto de Lei.
SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ........................................................................................................................ 9
CAPÍTULO 1: EUTANÁSIA E SEUS PRINCIPAIS ASPECTOS ................................... 12
1.1 – EUTANÁSIA .......................................................................................................... 12
1.1.1 Conceito ................................................................................................................... 12
1.1.2 – Aspectos Históricos da Eutanásia ......................................................................... 14
1.1.3 – Classificações Dadas Pela Doutrina ...................................................................... 16
1.1.3.1 – Quanto à forma: Ativa ou Passiva .................................................................. 16
1.1.3.2 – Quanto à Vontade ........................................................................................... 18
1.1.4 – Ortotanásia, Distanásia e Suicídio Assistido ......................................................... 20
1.1.4.1 – Ortotanásia ...................................................................................................... 20
1.1.4.2 – Distanásia ....................................................................................................... 22
1.1.4.2 – Suicídio Assistido ........................................................................................... 23
1.1.5 – Paciente Terminal e Morte .................................................................................... 24
1.1.5.1 – Paciente Terminal ........................................................................................... 24
1.1.5.2 – Morte .............................................................................................................. 24
CAPÍTULO 2: DIREITOS FUNDAMENTAIS .................................................................. 26
2.1– ASPECTOS GERAIS SOBRE OS DIREITOS FUNDAMENTAIS ........................... 26
2.1.1 – Origem dos Direitos Fundamentais ....................................................................... 26
2.1.2 – Caráter Relativo dos Direitos Fundamentais ......................................................... 27
2.2 – DIREITO À VIDA ....................................................................................................... 29
2.2.1 – Noções Gerais do Direito à Vida........................................................................... 29
2.2.2 – Histórico do Direito à Vida ................................................................................... 31
2.3 – DIREITO À LIBERDADE .......................................................................................... 32
2.3.1 – Aspectos Gerais do Direito à Liberdade ............................................................... 33
2.4 – DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA ..................................................................... 34
2.4.1 – Conceito ................................................................................................................ 35
2.4.2 – Histórico ................................................................................................................ 35
2.4.3 – Aspectos Jurídicos ................................................................................................. 36
CAPÍTULO 3: EUTANÁSIA NO DIREITO COMPARADO ........................................... 39
3.1 – ANÁLISE DA EUTANÁSIA NO DIREITO COMPARADO ................................... 39
3.1.1 – Holanda ................................................................................................................. 39
3.1.2 – Bélgica ................................................................................................................... 42
3.1.3 – Alemanha .............................................................................................................. 43
3.1.4 – Uruguai .................................................................................................................. 45
3.1.5 – Colômbia ............................................................................................................... 45
3.1.6 – França .................................................................................................................... 47
3.1.6 – Inglaterra ............................................................................................................... 49
3.1.6 – Estados Unidos ...................................................................................................... 50
3.1.7 – Demais Ordenamentos .......................................................................................... 52
CAPÍTULO 4: LEGALIZAÇÃO DA EUTANÁSIA – ASPECTOS JURÍDICOS E
CONSTITUCIONAIS ............................................................................................................ 54
4.1 – EUTANÁSIA NO BRASIL......................................................................................... 54
4.1.1 – Tratamento Atual da Eutanásia no Direito Brasileiro ........................................... 54
4.1.2 – Projeto De Lei 236/2012 ....................................................................................... 57
4.2 – NÚCLEO DA DIVERGÊNCIA EM RELAÇÃO À EUTANÁSIA: ASPECTOS
CONSTITUCIONAIS .......................................................................................................... 59
4.2.1 – A Disponibilidade e o Caráter Relativo do Direito à Vida ................................... 60
4.2.2 – Princípio da Proporcionalidade ............................................................................. 65
4.2.3 – Dignidade da Pessoa Humana como Núcleo do Ordenamento Jurídico Brasileiro
........................................................................................................................................... 66
4.3 – ARGUMENTOS A FAVOR E CONTRÁRIOS À EUTANÁSIA ............................. 71
4.3.1 – Vida: Sacralidade ou Disponibilidade ................................................................... 71
4.3.2 – Evolução da Medicina e a Incurabilidade do Paciente .......................................... 73
4.3.3 – Legalização da Eutanásia e Sua Consequência ..................................................... 75
4.4 – REQUISITOS PARA A AUTORIZAÇÃO DA PRÁTICA DA EUTANÁSIA ......... 76
4.5 – TESTAMENTO VITAL .............................................................................................. 77
CAPÍTULO 5: OPINIÃO MÉDICA – PESQUISA DE CAMPO ...................................... 81
5.1 – EUTANÁSIA NA VISÃO DOS MÉDICOS ............................................................... 81
CONCLUSÃO......................................................................................................................... 84
REFERÊNCIAS ..................................................................................................................... 88
ANEXOS ................................................................................................................................. 98
APÊNDICES ........................................................................................................................... 99
9

INTRODUÇÃO

A abordagem de temas que possuem relação direta com a vida e a morte é sempre
complicada, pois, em regra, tais assuntos trazem uma gama enorme de fatores atrelados à dis-
cussão e se relacionam com diferentes áreas científicas. A eutanásia, por seu ponto, não foge à
regra, pelo contrário, se caracteriza pela interdisciplinaridade em seu entorno, possuindo rela-
ção estreita com o direito, medicina, psicologia, ética e religião.
Por toda esta interdisciplinaridade, a eutanásia é um dos temas mais delicados, com-
plexos e controversos a ser debatido no direito, não só no Brasil como em todo o mundo. Em
todos os países do globo, a eutanásia se caracteriza por apresentar correntes em favor ou con-
trárias a sua legalização, com posicionamentos em total antagonismo entre si, de modo que
sua pacificação se mostra impossível de acontecer.
A divergência de posicionamento gerada por tal instituto não se restringe apenas ao
campo doutrinário, abrange, também, as determinações legais adotadas por cada ordenamento
jurídico no mundo. Assim, na maioria dos países do globo a eutanásia não é legalizada, sendo,
inclusive, considerada como crime, no entanto, corroborando para a controvérsia, há nações
em que a eutanásia é considerada prática legal, como, por exemplo, na Holanda, Bélgica e
Colômbia.
Quando se analisado a fundo o tema observa-se o porquê de tamanho antagonismo
entre defensores e opositores do instituto. A eutanásia apresenta o choque entre direitos fun-
damentais e, neste ponto, nasce toda a controvérsia entre aqueles que acham o direito à vida
de caráter indisponível e outros que consideram que tal bem deve ser relativizado, quando em
conflito com a liberdade, na forma de autonomia de vontade do ser humano.
No Brasil, país de marcante influência católica, a eutanásia não possui qualquer regu-
lamentação específica, embora a doutrina majoritária e jurisprudência entendam que a prática
de tal conduta se configura homicídio qualificado. É certo que a Constituição Federal de 1988
trouxe de forma expressa a vida e a liberdade como direitos fundamentais, no entanto, para se
discutir a possibilidade ou não da legalidade da eutanásia há de se analisar a hipótese em que
estes direitos entram em conflito.
Neste diapasão, é certo que não há no ordenamento jurídico brasileiro nenhum direito
fundamental que possa vir a ser considerado absoluto, estes próprios se caracterizam por não
estabelecer grau de hierarquia entre estes e apresentam o caráter relativo, como uma de suas
particularidades gerais. Assim sendo, quando da ocorrência de conflito envolvendo direitos
fundamentais, o constitucionalismo moderno vem utilizando o princípio da proporcionalidade
10

como forma de sopesar o caso concreto no qual exista tal celeuma, cuidando para que não
haja desaparecimento total de um direito perante outro.
Além da referida colisão entre direitos fundamentais e a supracitada técnica de pon-
deração entre tais direitos, é fundamental ressaltar a existência de outro importante compo-
nente nesta discussão, talvez o que venha a ter maior relevância nesta celeuma: a dignidade da
pessoa humana. Tal princípio se destaca como sendo a base do direito brasileiro e o valor fun-
dante do ordenamento jurídico pátrio, se situando no núcleo dos direitos fundamentais, isto é,
estes devem extrair sua legitimidade da dignidade da pessoa humana, não podendo contrariar
tal valor.
Desta forma, o debate jurídico a cerca da legalização da eutanásia no ordenamento
jurídico brasileiro parece bastante válido, de modo que da ponderação do confronto envolven-
do os direitos à vida e à liberdade, em consonância com a dignidade da pessoa humana, nas-
cem inúmeras interrogações a serem respondidas pela análise constitucional dos aspectos que
rodeiam este polêmico instituto jurídico.
Ademais, ressaltando a importância de se debater o tema, é nítido que a eutanásia
muitas vezes é incompreendida pela população em geral, vira alvo de uma série de tabus e,
sucessivamente, acaba obtendo grande repercussão em toda sociedade, gerando discussões
jurídicas, médicas, éticas, morais e religiosas. Tais questionamentos sempre atingem intensa
controvérsia, principalmente quando do aparecimento de algum episódio em que um paciente
clama por sua morte ou há proposta que regulamenta o instituto no ordenamento jurídico pá-
trio. Como exemplos da repercussão sobre o instituto em terras tupiniquins, pode-se citar a
recente proposta de edição de um novo Código Penal, o Projeto de Lei n°236/2012, e a edição
da Resolução nº 1805/2006, pelo Conselho Federal de Medicina, que autorizou a utilização da
ortotanásia pelos médicos brasileiros, mas que gerou grande polêmica por ser confundida com
a eutanásia e acabou sendo alvo de ação judicial.
Diante de todo o exposto, o presente trabalho visa, primordialmente, analisar os as-
pectos constitucionais que rodeiam a eutanásia, entre eles o embate entre direitos fundamen-
tais, de modo a buscar uma resposta quanto à constitucionalidade ou não de uma possível le-
galização do instituto supracitado. Além disso, objetiva abordar o instituto em ordenamentos
alienígenas, de modo a aprofundar melhor o tema e de se ter base de comparação através da
experiência de países que consideram a prática da “boa morte” legal; e, por fim, abordar a
possibilidade ou não da eutanásia vir a ser pleiteada por meio de testamento vital.
Para atingir tais objetivos, a pesquisa é divida em cinco partes. A primeira se caracte-
riza como uma parte conceitual do trabalho, nesta seção o tema eutanásia será analisado de
11

forma mais ampla, destacando-se seu histórico, classificações quanto à forma e a vontade e
sua distinção para com institutos que possuem relações estreitas com a eutanásia, como a orto-
tanásia, suicídio assistido e a distanásia. Outrossim, tópicos relacionados a pacientes terminais
e a morte fazem parte deste capítulo de cunho conceitual para o melhor entendimento do as-
sunto central da pesquisa.
Já o segundo, aborda os direitos fundamentais com um todo e algumas de suas espé-
cies que são vitais para o trabalho: como os direitos à vida e a liberdade, além de ser analisada
a dignidade da pessoa humana. Nessa linha, são apresentados aspectos conceituais, históricos
e jurídicos destes três pontos importantíssimos para se entender melhor a controvérsia relaci-
onada à legalização da eutanásia.
O terceiro capítulo, por seu turno, apresenta um exame do instituto em ordenamentos
jurídicos estrangeiros, destacando o tratamento que a eutanásia recebe em países que a consi-
deram uma prática legal, como Holanda, Bélgica, Luxemburgo, Canadá e Colômbia, e a sua
recepção em nações em que o instituto é considerado ilegal. Assim, a análise ao direito com-
parado mostra-se de vital importância para melhor se entender o instituto em apreço, princi-
palmente para observar o seu emprego em ordenamentos jurídicos que o consideram legal.
Em seguida, a quarta parte se caracteriza como a principal seção deste estudo. Nesta,
será apresentado um panorama atual do instituto tema do trabalho no ordenamento jurídico
brasileiro. Ainda, como ponto primordial do capítulo e da pesquisa, os aspectos constitucio-
nais que se encontram no núcleo da problemática envolvendo a eutanásia são analisados de
forma mais aprofundada, observando que a legalização de tal instituto se mostra em conso-
nância com a ordem constitucional pátria. Ademais, questões como: argumentos a favor e
contrários à eutanásia; requisitos a serem preenchidos pelo paciente a fim de requerer a ante-
cipação da sua morte; e a possibilidade de o testamento vital vir a ser utilizado como forma de
se garantir o direito à “boa morte” em enfermos que não mais possuem condições de declarar
sua vontade; também são aduzidas nesta importante seção.
Por fim, a última parte vem a encerrar o trabalho, nesta serão tratados os resultados
obtidos na pesquisa de campo, realizada na forma de questionário com médicos das mais di-
versas áreas sobre a legalização da eutanásia. Com isso, busca-se saber também a opinião de
profissionais, os quais estão diretamente ligados com o instituto jurídico, e reforçar o caráter
interdisciplinar da temática pesquisada.
12

CAPÍTULO 1: EUTANÁSIA E SEUS PRINCIPAIS ASPECTOS

A gigantesca controvérsia em torno da legalização da eutanásia é composta por inú-


meros fatores jurídico-constitucionais. No obstante, antes de se adentrar em tais aspectos, se
faz necessário uma análise de conceitos, classificações, distinções e características sobre o
instituto.
Sendo assim, o primeiro capítulo desta pesquisa terá como enfoque o destaque de as-
pectos gerais sobre a eutanásia.

1.1 – EUTANÁSIA

1.1.1 Conceito

O real significado do que seria eutanásia advém de tradução literal da junção de duas
palavras gregas, “eu” e “thanatos”. A primeira expressão significa “boa” enquanto a última
tem como significado o termo “morte”, motivo pelo qual este instituto também é chamado de
“boa morte”.
Ocorre que, o seu verdadeiro significado é muito mais complexo que uma simples
tradução literal de outro idioma. O conceito deste controverso instituto vem sofrendo inúme-
ras modificações conforme o transcorrer do tempo, inclusive sendo empregado de modo dife-
rente do sentido que hoje se tem conhecimento, para se relatar a prática da eutanásia em perí-
odos anteriores à criação do próprio termo que, ao ser mencionado, causa alvoroço em toda a
sociedade.
O conceito de eutanásia, em que pese ter sentidos não tão distintos, não encontra to-
tal consenso entre a doutrina especializada. Apresentando definição sobre o instituto, Maria
de Sá (2015, p. 86) ensina:

É a conduta, através da ação ou omissão do médico, que emprega, ou omite, com


consentimento da pessoa, meio eficiente para produzir a morte em paciente incurá-
vel e em estado de grave sofrimento, diferente do curso natural, abreviando-lhe a vi-
da (grifo nosso).

Em sentido parecido, Pimentel (2012, p. 24) disserta: “Neste diapasão, eutanásia, pa-
ra os fins do presente trabalho é a provocação de morte piedosa, por ação ou inação de tercei-
ro, de que se determine encurtamento da vida, em caso de doença incurável que acometa paci-
ente terminal a padecer de profundo sofrimento”.
13

Assim, de modo geral, eutanásia pode ser entendida como o instituto jurídico que
permite a pessoa, de acordo com sua autonomia de vontade, ter sua própria morte antecipada,
mediante ação ou omissão médica, desde que seja paciente incurável ou apresente grave lesão
irreversível ou já se encontrando em estado terminal, e esteja acometido de insuportável so-
frimento físico e/ou psicológico.
Entretanto, um ponto de divergência entre alguns doutrinadores encontra-se quanto
ao agente a realizar o procedimento da eutanásia. Nessa linha, uma corrente limita tal ativida-
de ao profissional de saúde médica enquanto outra opta por não limitar o agente.
Com efeito, a corrente que defende limitar apenas ao médico a condição de agente
que deve antecipar a morte do paciente incurável tem como objetivo a procura por resguardar
ao máximo a dignidade da pessoa e lhe proporcionar uma morte digna. A maioria dos doutri-
nadores vem optando por conceituar a eutanásia neste sentido, entre eles destaca-se o profes-
sor Roberto Dias que pondera (2012, p. 148):

Assim, eutanásia deve ser entendida como o comportamento médico que antecipa
ou não adia a morte de uma pessoa, por motivos humanitários, mediante requeri-
mento expresso ou por vontade presumida – mas sempre em atenção aos interesses
fundamentais – daquele que sofre uma enfermidade terminal incurável, lesão ou in-
validez irreversível, que lhe cause sofrimentos insuportáveis, do ponto de vista físico
ou moral, considerando sua própria noção de dignidade (grifo nosso).

No mesmo sentido de limitar a procedimento de aplicação da eutanásia ao médico,


pode-se citar a lição da ilustre professora Maria de Sá (2015, p. 85) ao falar sobre o conceito
deste instituto:

Nos dias atuais, a nomenclatura eutanásia vem sendo utilizada como ação médica
que tem por finalidade abreviar a vida de pessoas. É a morte de pessoa – que se en-
contra em grave sofrimento decorrente de doença, sem perspectiva de melhora –
produzida por médico, com o consentimento daquela. (grifo nosso).

Por outro lado, em sentido de não se limitar a eutanásia a atividade médica, de modo
a abranger uma gama maior de procedimentos que vise a antecipar a morte de uma pessoa por
motivos humanos, como a abreviação do sofrimento, encontramos uma segunda corrente em
relação à conceituação da eutanásia. Neste sentido, Vieira (2009, p. 103) discorre:

O conceito de eutanásia que se adota neste trabalho não se restringe aos atos de
caráter médico, entendendo-se eutanásia como a conduta que, ativa ou passivamen-
te, mas sempre de forma intencional, abrevia a vida de um paciente, com o objetivo
de por fim ao seu sofrimento (grifo nosso).

O teólogo Lepargneur (1999, p. 43. apud VIEIRA, 2009, p. 103) também segue o en-
tendimento de que não se pode limitar o agente que pratica a eutanásia, definindo o instituto
14

como uma espécie de uso ou omissão de procedimento que venha a antecipar a morte de paci-
ente incurável, tendo como intuito por fim aos insuportáveis sofrimentos que o acometem.
Conforme visto na apresentação dos dois conceitos, a distinção entre as correntes não
se mostra gritante, basicamente a única diferença encontra-se no agente que antecipa a morte
da pessoa doente com enfermidade incurável, uma vez que a essência do que seria a eutanásia
é a mesma nas duas concepções.
Não obstante, nota-se que na maior parte das vezes a eutanásia é relacionada com a
parte médica e em função disso parece prosperar, e com razão, a primeira corrente ao limitar o
médico como o agente que propiciará a “boa morte” à pessoa enferma. Desta forma, se garan-
te ao fato a ser realizado um grau maior de segurança médico-jurídica, pois cabe ao médico o
diagnóstico da doença e observação do estágio que determinada enfermidade se encontra, e,
ao limitá-lo como agente, assegura-se que através da eutanásia terá fim o sofrimento do paci-
ente de forma digna e indolor, pois é este o agente gabaritado e possuidor das técnicas e re-
cursos necessários para tal.
Obviamente que quando a primeira corrente ganha destaque nesta pesquisa não se
quer dizer que a segunda esteja totalmente equivocada, não é isso. O que se defende é que, em
regra, a prática da eutanásia deva ser de competência do médico, mas em casos excepcionais o
agente poderia vir a ser outra pessoa que não o profissional da área médica, sempre destacan-
do o caráter ainda mais extraordinário da situação, como uma situação de guerra, desastre da
natureza ou casos similares.

1.1.2 – Aspectos Históricos da Eutanásia

A origem do termo eutanásia remonta ao século XVII, quando o filósofo inglês Fran-
cis Bacon o utilizou pela primeira vez. Entretanto, muitos são os doutrinadores que destacam
a prática da eutanásia em períodos bem anteriores ao da criação desta expressão.
Os exemplos apresentados pela doutrina são inúmeros, mas quase sempre não cor-
respondem com o real significado dado ao instituto nos dias de hoje ou mesmo pela própria
tradução da palavra grega já apresentada no tópico acima, como se pode observar nas lições
de Vieira (2009, p. 114):

Porém, diversos doutrinadores apresentam registros históricos da prática da eu-


tanásia em épocas muito anteriores à criação do termo, ou à atribuição do sen-
tido que se lhe confere, alguns dos quais, no entanto não se compadecem com a
concepção de eutanásia ora adotada,eis que não se destinam a pôr fim ao sofri-
15

mento de um doente, mas, sim, a realizar determinados fins político-sociais, como,


em algumas épocas, a eliminação daqueles que não se mostravam capazes de traba-
lhar nem de defender seu povo na guerra (grifo nosso).

Os antecedentes históricos da eutanásia devem ser analisados com extremo cuidado,


uma vez que a utilização de uma variada gama de exemplos deturpados certamente pode vir a
produzir uma ideia tendenciosa, de modo a se associar à corrente contrária à eutanásia. O des-
taque de Vieira (2009, p. 114): “os espartanos jogavam os recém-nascidos deformados e os
anciãos do alto do monte Taijeto, por não terem condições de defenderem Esparta”, é um dos
exemplos que podem vir a atribuir sentido negativo à prática da eutanásia.
Outro exemplo aterrorizante que tende a causar entendimento deturpado sobre a eu-
tanásia se dá quando erroneamente se adota o termo para designar práticas genocidas feitas
pelos nazistas durante seu período de governo na Alemanha. Neste sentido, Singer (2006, p.
225, apud DIAS, 2012, p. 145) explica:

Os nazistas não tinham um programa de eutanásia no sentido específico do


termo. O seu chamado “programa de eutanásia” não era motivado pela preo-
cupação com o sofrimento dos que eram mortos. Se assim fosse, por que os nazis-
tas teriam mantido as suas operações em segredo, enganado os parentes quanto à
causa da morte das pessoas eliminadas e isentado do programa algumas classes pri-
vilegiadas, como veteranos das forças armadas ou parentes de membros das equipes
que praticavam a eutanásia? A “eutanásia” nazista nunca foi voluntária e, na maior
parte dos casos, era involuntária, nem mesmo não voluntária (grifo nosso).

Estes exemplos errôneos de “eutanásia”, atribuídos por muitos doutrinadores, faz


com que o assunto em estudo seja mal visto por parte da sociedade, por isso a necessidade de
cuidado para a análise dos antecedentes históricos deste instituto. Feita esta pequena pondera-
ção a determinadas lições empregadas de forma equivocada, é necessário ir adiante quanto
aos antecedentes históricos do tema pesquisado.
Ora, uma das experiências que se mostra próxima ao entendimento atual sobre a eu-
tanásia se dá na idade média, quando os guerreiros utilizavam um punhal para antecipar a
morte de outro combatente ferido em batalha e com isso impedir que o mesmo agonizasse até
o fim da vida. Neste sentido, Sá (2015, p. 85) exemplifica: “Na Idade Média, dava-se aos
guerreiros feridos um punhal afiadíssimo, denominado misericórdia, que lhes servia para evi-
tar o sofrimento prolongado da morte...”. Outro caso a ser destacado se deu na Índia antiga,
quando se eram jogados ao Ganges os incuráveis de doença.
Ao que pese estes antecedentes históricos, a eutanásia ganha um pouco mais de pro-
moção a partir da criação do termo pelo filósofo inglês Francis Bacon (século XVII), embora
a discussão viesse a se intensificar ainda mais no decorrer do século XX.
16

Há relatos de propostas envolvendo a legalização da eutanásia no inicio do século


XX, especificamente no estado de Ohio, Estados Unidos, entretanto a proposta não veio a ser
aceita. Assim, coube ao Uruguai se tornar o primeiro país do mundo a tolerar a eutanásia em
seu sistema jurídico, através do artigo 37 do Código Penal Uruguaio. Neste sentido, Vieira
(2009, p. 118) explica: “Em 1934, o Uruguai se tornou o primeiro país do mundo a abrir a
possibilidade de descriminalização da eutanásia, liberando da ameaça de prisão o autor de
‘homicídio piedoso’”.
Outro marco importante do debate envolvendo a eutanásia ocorreu em 1935, quando,
na Inglaterra, foi criada a EXIT, associação que tinha como objetivo a luta pela reivindicação
do direito à morte com dignidade. Tal associação se espalhou para diversos países e sempre
almejando a legalização da eutanásia.
No obstante, as discussões acerca da eutanásia aparecem na crista da onda ao final do
século XX, especificamente durante os anos 90. Importante destacar Jack Kevorkian, o doutor
morte, que teve papel fundamental na intensificação do debate envolvendo a eutanásia nos
Estados Unidos, suas ações geraram grande repercussão no cenário social, médico e jurídico.
Nos primeiros anos do século XXI a eutanásia veio a ser legalizada em países como
Holanda (GOLDIM 3, 2003), 2001, e Bélgica (GOLDIM 2, 2014), 2002. No Brasil, a eutaná-
sia causou maior impacto nas discussões jurídicas, a partir do fim do século passado, quando
propostas que permitiam a realização do instituto foram rejeitadas pelo Congresso Nacional.
Recentemente, novo projeto do Código Penal trouxe como proposta a positivação do instituto
como crime, mas abre uma lacuna para que em determinado caso não haja penalização pela
prática da eutanásia.

1.1.3 – Classificações Dadas Pela Doutrina

Inúmeras são as classificações doutrinárias a respeito da eutanásia. Algumas são uti-


lizadas por boa parte dos autores, outras, porém, apresentam viés mais específico.

1.1.3.1 – Quanto à forma: Ativa ou Passiva

Dentre todas as classificações adotadas pela doutrina acerca do tema, a em epígrafe


se destaca como a que aparece nas lições de todos os autores que versem sobre a eutanásia.
A eutanásia ativa é a forma mais controvertida a respeito deste instituto, certamente a
que causa mais espanto para uma parte da sociedade. Entende-se por ativa a forma de eutaná-
17

sia em que a antecipação da morte do paciente se dá por uma ação direta do médico (DIAS,
2012, p. 149).
A título de exemplificação, ocorre a forma ativa da eutanásia quando o médico, vi-
sando acabar com o sofrimento de um paciente com doença ou lesão incurável ou em estágio
terminal, aplica dose letal de algum tipo de medicamento. Neste caso, a morte do paciente foi
antecipada diretamente pela ação do médico e, por isso, se caracteriza como eutanásia ativa.
Por seu turno, entende-se por passiva a forma de eutanásia em que a antecipação da
morte do paciente se dá através de uma omissão do médico, ou seja, este deixa de aplicar de-
terminado tratamento para que o paciente possa, com a morte, ver seu sofrimento chegar ao
fim.
No obstante, cumpre destacar que tal conceito encontra polêmica dentre os autores ao
ser relacionado com o que atualmente se chama de ortotanásia. Parte da doutrina, podendo até
ser considerada corrente majoritária, afirma que a eutanásia passiva não é expressão sinônima
de ortotanásia, separando tal classificação de acordo com a utilidade do tratamento para o
prolongamento da vida que vem a ser omitido ou suspenso pelo médico, enquanto a outra
corrente utiliza os dois institutos como expressões sinônimas. Defendendo seus respectivos
posicionamentos, destacam-se os ensinamentos de Villas-Bôas (2008, p.67) e Sá (2015, p.
87):

A eutanásia passiva consiste na suspensão ou omissão deliberada de medidas que se-


riam indicadas naquele caso, enquanto na ortotanásia há omissão ou suspensão de
medidas que perderam sua indicação, por resultarem inúteis para aquele indivíduo,
no grau de doença em que se encontra. (Villas-Bôas – adepta da primeira corrente).

A eutanásia passiva ou ortotanásia (do grego orthos, normal, correto e thanatos,


morte) pode consistir tanto na não iniciação de um tratamento como na suspensão do
mesmo. Também pode ser caracterizada pelo não tratamento de uma enfermidade ou
complicação intercorrente, e a morte ocorrerá a seu tempo, sem o prolongamento
desnecessário da vida (Sá – adepta da segunda corrente).

A divergência entre as correntes apresentadas é de complicado esclarecimento, a li-


nha que separa a omissão de tratamento para antecipação da morte do paciente e a omissão ou
supressão de tratamento para que o óbito ocorra em seu estado natural é muito tênue, talvez
realmente não exista e, por este motivo, muitos adotam as expressões como sinônimas. Ques-
tionamento sobre tal dificuldade de distinção é realizado pelo professor Siqueira-Batista
(2005, p. 114), que posteriormente opta por usar apenas um dos termos:

Em outros termos, haveria um verdadeiro limite entre a eutanásia passiva – não in-
tervir e deixar de fato morrer – e a dita ortotanásia – deixar morrer no momento apa-
rentemente certo? A distinção se mostra conceitualmente precária, por vezes im-
possível de ser estabelecida – afinal, não entubar um paciente com uma neopla-
18

sia em fase terminal, ou seja, negar-lhe a possibilidade de se manter vivo, seria


deixar a morte chegar no tempo certo ou praticar de fato a eutanásia passiva?
(grifo nosso)

O exemplo dado pelo ilustre professor parece ser bastante razoável, pois encontrar
este chamado “tempo certo de morrer” é realmente muito complicado e soa até mesmo impos-
sível. Porém, ao colocar a forma passiva de eutanásia como sinônimo de ortotanásia, haveria
divergência quanto ao significado atribuído a este último vocábulo, pois, mesmo que indire-
tamente, estaria havendo uma antecipação da morte do paciente e não o “óbito no tempo cor-
reto”, como preceitua a sua definição. Talvez por isso predomine a corrente que distingue os
institutos.
Tal corrente aponta para uma divergência entre os termos, pois assim, na eutanásia
passiva a omissão ou suspensão de tratamento seria responsável pela antecipação da morte do
paciente, enquanto na ortotanásia a supressão seria de tratamento que prolongasse a morte,
pois a enfermidade seria a responsável pelo óbito do paciente, o processo de morte já teria se
iniciado, seria uma medida omissão para evitar a distanásia, como leciona Sanchez y Sanches
e Seidl: (Sanchez y Sanchez e Seidl, 2013, p. 24):

É importante ressaltar, também, a diferença entre ortotanásia e eutanásia passiva,


conceitos que são frequentemente confundidos. Na ortotanásia, é a doença de base a
responsável pela morte; na eutanásia passiva, a moléstia não é fatal, ou ainda não
chegou ao ponto da terminalidade, da reta final da vida. A eutanásia passiva abrevia
a vida e a ortotanásia permite a morte.

Realmente a doutrina majoritária parece distinguir conceitualmente os institutos, no


entanto, na prática mostra-se muito complicada observar esta distinção como bem asseverou
Siqueira-Batista (2005). Assim, talvez a distinção destes termos seja uma criação doutrinária
para se evitar todo o tabu social que envolve a expressão eutanásia.

1.1.3.2 – Quanto à Vontade

Esta classificação se mostra presente em basicamente todas as obras que tenham co-
mo tema central o instituto da eutanásia. No entanto, nem por isso deixa de ser controversa,
pois é comum parte da doutrina estabelecer dois tipos de classificação quanto à vontade do
paciente, entretanto, alguns apontam divisão distinta, acrescentando a espécie “não voluntá-
ria” às categorias voluntárias e involuntárias, já consagradas pela doutrina.
Na forma voluntária, o procedimento de realização da eutanásia é consequência da
vontade do paciente, ou seja, este pede para que sua morte seja antecipada. Tal classificação
19

encontra-se de acordo com o que a doutrina preceitua, uma vez que tal classificação é pacífica
na doutrina, embora esta categoria esteja no centro da discussão que envolve o instituto da
eutanásia.
No obstante, a dúvida nasce quanto à distinção da forma involuntária e “não-
voluntária” da eutanásia, que alguns doutrinadores acham prudente ser feita. Parece que a
divisão entre as três categorias é a ideia mais acertada, uma vez que possibilita uma melhor
análise do quão importante foi a vontade do paciente para casos que podem ou não serem re-
lacionados à eutanásia. BARROSO e MARTEL (2010, p. 72) entendem que a eutanásia deve
ser dividida nas formas voluntária, involuntária e “não-voluntária”.
Em termos gerais, a forma involuntária aconteceria quando o paciente negasse a op-
ção da eutanásia, mas, desrespeitando a sua vontade, a vida do enfermo é abreviada. Por outro
lado, a forma “não-voluntária” se caracteriza pela morte do paciente sem que a vontade do
mesmo seja conhecida. Neste sentido, Barroso e Martel (2010, p.72) destacam:

Diz-se que é voluntária quando há expresso e informado consentimento; não-


voluntária, quando se realiza sem o conhecimento da vontade do paciente; e in-
voluntária, quando é realizada contra a vontade do paciente. No que toca à eu-
tanásia involuntária, há um relevante e adequado consenso jurídico quanto ao seu
caráter criminoso. Os casos mais comuns da eutanásia não-voluntária são os que
envolvem pacientes incapazes (grifo nosso).

Como bem destaca a citação acima, a espécie involuntária é alvo de críticas de todos
os lados, seja de pessoas que se posicionam a favor ou contrários à legalização da eutanásia.
Ora, quando a vontade do paciente é de não antecipar a sua morte e mesmo assim a sua vida é
abreviada, não há o que se falar em eutanásia, pois este instituto presa pela vontade da pessoa
em por fim ao seu sofrimento físico e psicológico, de modo que se exige a autonomia de von-
tade do enfermo para que se caracterize tal instituto. O que parte da doutrina chama de euta-
násia involuntária, na verdade, deveria ser chamado de homicídio, pois nada tem a ver com o
instituto objeto desta pesquisa.
Em que pese a denominada eutanásia “não-voluntária” não ser alvo de críticas tão a-
cirradas como a forma involuntária e não figurar sempre em evidência como a eutanásia vo-
luntária, a categoria “não-voluntária” deve ser observada com bastante cuidado, uma vez que,
como a decisão pela realização da antecipação ou não da morte do paciente vai estar sobre as
mãos de outra pessoa, neste caso seu representante legal, há de se analisar cuidadosamente
aspectos que podem influenciar na importante decisão, principalmente quando questões finan-
ceiras estiverem ao redor do caso.
20

1.1.4 – Ortotanásia, Distanásia e Suicídio Assistido

Embora distintos, a ortotanásia, distanásia e suicídio assistido sempre aparecem no


meio de discussões e obras que tem a eutanásia como tema central. Não se pode confundir tais
conceitos, de modo que faz-se necessário a abordagem destes temas

1.1.4.1 – Ortotanásia

Na tradução literal do grego, o termo ortotanásia significa “morte normal”, “morte


correta” ou “morte ao tempo certo”, dentre outros utilizados pela doutrina. Em outras pala-
vras, em teoria, não há retardamento ou antecipação da morte do paciente com enfermidade,
assim, a ortotanásia, para aqueles que a distinguem da eutanásia passiva, seria realizada com a
não adoção ou paralisação de tratamento que não fosse útil para a saúde do paciente, ou sejá,
não lhe desse sobrevida alguma, de modo que este fato não seja o responsável pela morte do
paciente. Neste sentido, destaca Vieira (2009, p. 106):

Constitui a “morte a seu tempo”, sem abreviações nem prolongamentos desarra-


zoados do processo de morrer, verdadeira “morte correta”, alcançada através da
supressão ou limitação dos tratamentos fúteis e desproporcionados, diante da morte
iminente do paciente, sem se objetivar apressar a morte deste (grifo nosso).

Como já ressaltado em tópico anterior, há confusão e divergência quanto à separação


ou não da ortotanásia e da eutanásia passiva. A corrente majoritária defende a distinção entre
os termos, segundo eles, nesta última a morte do paciente é antecipada pela omissão de trata-
mento que poderia vir a prolongar a vida do enfermo, enquanto naquela a morte do paciente
não é antecipada em razão da omissão ou suspensão de tratamento ao prolongamento, ocor-
rendo no tempo correto ou natural. Este é o sentido defendido por Vieira (2009, p. 106):

Não se pode concordar, portanto, com aqueles que confundem a ortotanásia


com eutanásia passiva, isto é, com a atitude de abreviar a vida do paciente através
da supressão de tratamentos proporcionados e úteis, que poderiam propiciar o pro-
longamento da existência do doente de forma perfeitamente aceitável (grifo nosso).

Com efeito, a questão parece impossível de se chegar a um consenso, muito por en-
volver aspectos complexos em cada ponto de divergência entre as correntes de pensamento.
Ora, é difícil definir qual o momento correto para a realização da ortotanásia, sem que haja
antecipação da morte, ou seja, basicamente o que se dispõe sobre a eutanásia passiva. Mas ao
mesmo tempo, como já ressaltado, empregar a eutanásia passiva como sinônimo de ortotaná-
21

sia acaba por cair em divergência para com a própria tradução e conceituação do que seria
este instituto.
Na hipótese de se delimitar a ortotanásia ao desligamento de aparelhos ou supressão
de tratamentos em casos em que já haja início de morte cerebral, cair-se-ia na questão de que
se constatada a morte cerebral, para o direito, não haveria mais vida, então o procedimento
não teria contornos jurídicos, pois ele já estaria morto e, no fim, acabaria passando por todo o
sofrimento que tinha a vontade de evitar. Talvez a ortotanásia seja restrita a supressão de tra-
tamentos de pacientes que ainda possuem vida encefálica, mas que encontram-se em estado
vegetativo irreversível, mas ainda assim é difícil dizer se de fato não há abreviação da vida.
Tais fatos mostram o porquê da dificuldade na pacificação desta celeuma em especí-
fico e permitem que se crie por conta dos entusiastas da eutanásia o questionamento sobre a
verdadeira intenção por trás da criação do termo ortotanásia. Poderia, talvez, ser uma espécie
de fuga do tabu que envolve a eutanásia, de modo a tentar não relacionar a forma passiva da
eutanásia para com ortotanásia. Poderia ser a tentativa de não admissão da legalidade de uma
forma de se abreviar a vida. Dias (2012, p. 200) escreve:

Deve-se entender a interrupção de tratamentos fúteis como um tipo de eutanásia pas-


siva ou de ortotanásia. Com efeito, este entendimento é mais consentâneo com o
conceito de eutanásia adotado neste trabalho, visto que, se a medicina tem meios de
evitar a morte do paciente, ainda que impondo tratamento desumano ou degradante,
a não adoção ou suspensão dessas condutas caracterize-se como uma antecipa-
ção da morte e, portanto, uma forma de eutanásia (grifo nosso).

Além da diferença de conceituação, a ortotanásia se difere da distanásia por ser per-


mitida pelo ordenamento jurídico brasileiro e por ser defendida pela doutrina em geral, embo-
ra ainda haja quem seja contra.
A Resolução 1805/2006 do Conselho Federal de Medicina autorizou o médico a rea-
lizar a ortotanásia, desde que esta seja a vontade do paciente ou seus representantes legais,
conforme o disposto em seu art. 1°: “É permitido ao médico limitar ou suspender procedimen-
tos e tratamentos que prolonguem a vida do doente em fase terminal, de enfermidade grave e
incurável, respeitada a vontade da pessoa ou de seu representante legal” (CONSELHO FE-
DERAL DE MEDICINA, 2006).
Destaca-se que tal resolução gerou imensa polêmica, sendo, inclusive, alvo de ação
judicial por parte do Ministério Público Federal, a qual veio a ser julgada improcedente, tor-
nando, deste modo, a ortotanásia possível no Brasil.
22

1.1.4.2 – Distanásia

A distanásia se caracteriza como um instituto totalmente diferente do que se entende


por eutanásia. A palavra distanásia também é de origem grega, sendo que a doutrina utiliza
alguns termos como tradução para a junção dos vocábulos “dys” e “thanatos”, como “morte
adversa”, “morte má”, “morte sofrida”, dentre outros. Importante ressaltar que o termo dista-
násia não é utilizado em todo o globo, sendo que tal instituto também é chamado de medical
futility ou Obstinação terapêutica.
De modo geral, a distanásia é entendida como uma forma de se adiar ao máximo a
morte do paciente, utilizando recursos e tratamentos que mantenham a “vida” artificial do
enfermo, mesmo que tais tratamentos não ofereçam nenhuma chance de melhora do quadro de
saúde, servindo apenas para prolongar seu sofrimento. Neste sentido, nos ensinam os profes-
sores Roberto Dias (2012, p. 196) e Maria Elisa Villas-Bôas (2008, p. 67), respectivamente:

A distanásia é a morte lenta e com grande sofrimento. Trata-se do prolongamen-


to artificial da vida, à custa da agonia do paciente. É, em última análise, a transfor-
mação da pessoa em objeto da intervenção médica, com evidente prejuízo da digni-
dade do paciente (grifo nosso) (Roberto Dias).

A prática da ortotanásia visa a evitar a distanásia que é, por sua vez, a morte lenta
e sofrida, prolongada, distanciada pelos recursos médicos, à revelia do conforto e
da vontade do indivíduo que morre. Decorre de um abuso na utilização desses recur-
sos, mesmo quando flagrantemente infrutíferos para o paciente, de maneira
desproporcional, impingindo-lhe maior sofrimento ao lentificar, sem reverter, o
processo de morrer já em curso (grifo nosso) – (Villas Bôas).

Pode-se observar que há claro antagonismo entre eutanásia e a distanásia, enquanto


aquela antecipa a morte do paciente buscando por fim ao seu sofrimento, esta visa adiar a
morte o máximo possível, mesmo que de nada seja útil ao enfermo. Neste sentido, Sá (2015,
p.88) ensina:

Como se disse, na eutanásia o ato médico tem por finalidade acabar com a dor e a
indignidade na doença crônica e, no morrer, eliminando o portador da dor. A preo-
cupação primordial é com a qualidade da vida humana na sua fase final. A distaná-
sia, por sua vez, dedica-se a prolongar, ao máximo, a quantidade de vida humana,
combatendo a morte como grande e último inimigo.

Por fim, destaca-se que tal instituto encontra forte posição contrária de toda a doutri-
na, seja favorável ou contrária a eutanásia. Prolongar o sofrimento do ser humano é um ato
totalmente condenável, a própria Constituição Federal de 1988 proíbe ato de submeter ser
humano a tratamento desumano ou degradante, conforme disposto no art. 5°, III. Além disso,
o Código de Ética Médica, em seu capítulo I, inciso XXII, deixa clara a posição contrária à
23

distanásia: “Nas situações clínicas irreversíveis e terminais, o médico evitará a realização de


procedimentos diagnósticos e terapêuticos desnecessários e propiciará aos pacientes sob sua
atenção todos os cuidados paliativos apropriados” (CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA,
2009).

1.1.4.2 – Suicídio Assistido

O suicídio assistido frequentemente vem relacionado com a eutanásia, alguns, equi-


vocadamente, o colocam, inclusive, como uma forma de eutanásia. Este instituto ganhou
grande destaque através do doutor Jack Kevorkian, o qual construiu uma máquina de suicídio
no fim da década de 80 e auxiliou dezenas de pessoas a acabar com seu sofrimento.
No suicídio assistido, o paciente, contando com ajuda ou auxílio de um terceiro, põe
fim ao seu próprio sofrimento ao retirar sua vida. Há semelhanças para com a eutanásia, mas
nesta o ato ou omissão que antecipa a morte do paciente é praticado, de acordo com a defini-
ção utilizada por esta pesquisa, pelo médico e não pelo próprio paciente, como ocorre no sui-
cídio assistido. Neste sentido, ensina Rocha (2014, p. 148):

O suicídio assistido é muitas vezes confundido com a eutanásia e, de fato, existem


pontos semelhantes entre as duas situações uma vez que o suicídio assistido também
se verifica diante de um paciente que, por ser portador de uma doença incurável, em
estado terminal ou não, busca pôr termo ao seu sofrimento, provocando a própria
morte. No entanto, apesar da similitude de ambas as situações, as práticas não
se equivalem, pois, enquanto na eutanásia um terceiro age e desta ação advém,
diretamente, a morte; no suicídio assistido, a morte não decorre diretamente da
ação de terceiro. Ela é conseqüência de uma atitude do próprio paciente, sob a
assistência de um terceiro, assistência esta que pode compreender uma orientação,
o auxilio ou apenas a observação deste terceiro (grifo nosso).

Em mesmo sentido, posiciona-se Sá (2015, p. 89):

Próximo da eutanásia encontra-se o suicídio assistido. Contudo, não são figuras


equivalentes: Na eutanásia o médico age ou omite-se. Dessa ação ou omissão sur-
ge, diretamente, a morte. No suicídio assistido, a morte não depende diretamente
da ação de terceiro. Ela é consequência de uma ação do próprio paciente, que
pode ter sido orientado, auxiliado ou apenas observado por terceiro (grifo nosso).

Atualmente, tal instituto não é aceito no ordenamento jurídico brasileiro, sendo tipi-
ficado por nosso ordenamento penal, conforme o disposto no art. 122, Código Penal. No en-
tanto, vários países no mundo trazem a assistência ao suicídio como uma conduta legal, exis-
tindo, inclusive, uma clínica de auxílio ao suicídio chamada EXIT, em Zurique, Suíça, a qual
recebe pessoas do mundo todo querendo acabar com seu sofrimento (OGLOBO, 2014).
24

1.1.5 – Paciente Terminal e Morte

1.1.5.1 – Paciente Terminal

Para melhor prosseguimento em desta pesquisa, há de se fazer alguns esclarecimen-


tos quanto ao termo paciente terminal, tão presente na discussão envolvendo eutanásia, orto-
tanásia, suicídio assistido e distanásia.
Costuma-se definir paciente terminal como o enfermo acometido de doença grave,
que esteja em estágio avançado da enfermidade, de modo que não exista mais a possibilidade
de cura e que, consequentemente, tenha grandes chances de vir à óbito, em um espaço de
tempo relativamente curto. Neste sentido, Vieira (2009, p. 107) destaca: “é aquele cuja condi-
ção é irreversível, independentemente de ser tratado ou não, e que apresenta uma alta probabi-
lidade de morrer num período relativamente curto de tempo”.
Em mesmo sentido, Gutierrez (2001) nos ensina:

É quando se esgotam as possibilidades de resgate das condições de saúde do pa-


ciente e a possibilidade de morte próxima parece inevitável e previsível. O paci-
ente se torna "irrecuperável" e caminha para a morte, sem que se consiga reverter
este caminhar (grifo nosso).

Importante destacar que o tempo de vida curto é variável, entretanto, em geral consi-
dera-se um período de 3 a 6 meses, como dispõe a American College of Physians. Neste sen-
tido, destaca Villas-Bôas (2008, p. 79):

Pacientes terminais cuja doença se encontra em fase que já não responde a qualquer
tratamento curativo, de forma que a morte é evento inevitável, com ou sem a insti-
tuição de terapêutica, num prazo de três a seis meses (segundo define o American
College of Physians) (grifo nosso).

Assim, não há que se limitar o termo paciente terminal àquele enfermo que está a ho-
ras da morte. É elementar destacar que, na grande maioria dos casos, este período de estágio
terminal da doença é acompanhado de dores insuportáveis, gerando grande sofrimento para o
paciente.

1.1.5.2 – Morte
25

A morte é um assunto pouco discutido na sociedade de hoje em dia, basicamente vi-


rou uma espécie de tabu entre parte da população do ocidente, que prefere não pensar sobre o
fim da vida. Neste sentido, Pimentel (2012, p. 15) explica:

O homem, especialmente aquele imerso na cultura ocidental contemporânea, embora


tenha plena consciência de sua mortalidade, não parece estar devidamente prepara-
do, em termos psicológicos, para lidar com a ruptura que o fenômeno ― morte‖ re-
presenta. O pensamento sobre a finitude da vida e o conceito de morte como um es-
tado de inconsciência permanente, geralmente, o assusta e amedronta.

Talvez por esta razão a eutanásia seja um assunto não tão debatido no Brasil. No obs-
tante, o conceito de morte já sofreu inúmeras mudanças com o transcorrer do tempo, isso de-
vido aos avanços da tecnologia. Assim, hoje, a morte é tida como a morte encefálica, como
ensina Sá (2015, p. 82):

Inicialmente, a morte era entendida como o cessar dos batimentos cardíacos, o que
não mais é aceito. É vista hoje não mais como evento ou momento, mas como fe-
nômeno progressivo. Portanto, a revisão do conceito de morte definiu-a como
morte encefálica. Tal revisão tornou-se necessária tendo em vista o desenvolvimen-
to da medicina, que abriu possibilidades de prolongamento indefinido da vida hu-
mana por meios artificiais. Referida definição também possibilitou a realização de
cirurgias de transplante de órgãos (grifo nosso).
26

CAPÍTULO 2: DIREITOS FUNDAMENTAIS


Visto os aspectos conceituais que caracterizam esta pesquisa, mostra-se fundamental
a compreensão da base que vem a compor toda a divergência em torno da eutanásia: os direi-
tos fundamentais.
Assim, é necessário o estudo acerca dos direitos fundamentais, observando sua teoria
como um todo e, a partir deste ponto, desbravar de maneira adequada o direito à vida, à liber-
dade e também o princípio da dignidade da pessoa humana.

2.1– ASPECTOS GERAIS SOBRE OS DIREITOS FUNDAMENTAIS

2.1.1 – Origem dos Direitos Fundamentais

Muito se diverge em relação à verdadeira origem dos direitos fundamentais, alguns


doutrinadores apontam a Magna Carta, de 1215, como fato histórico inicial para o seu surgi-
mento. Através da Magna Carta os poderes, outrora absolutos do rei da Inglaterra, João sem
terra, passaram a ser limitados por tal diploma legal, incluindo uma série de liberdades para a
população, especialmente para os barões ingleses.
Em que pese tal ideia fazer sentido, a maior parte da doutrina destaca como grandes
marcos da positivação dos direitos fundamentais a Virginia Bill of Rights, 1776, e, principal-
mente, a Revolução Francesa, através da Declaração dos Direitos do Homem, 1789, como
aponta Vicente Paulo (2012, p. 98) ao citar ensinamentos do grande Canotilho sobre o tema:

a positivação dos direitos fundamentais deu-se a partir da Revolução Francesa,


com a Declaração dos Direitos do Homem (Déclaration dês Droits de l’Homme
et duCitoyen, em 1789), e das declarações de direitos formuladas pelos Estados
Americanos, ao firmarem sua independência em relação à Inglaterra (Virginia
Bill of Rights, em 1776). Originam-se, assim, as Constituições liberais dos Estados
ocidentais dos séculos XVIII e XIX (grifo nosso).

O surgimento dos direitos fundamentais esteve ligado a crescente necessidade de


proteção do homem em face do poder absoluto exercido pelo Estado na época. Diversas atro-
cidades eram cometidas sem que as pessoas tivessem quaisquer tipos de direitos.
A primeira geração dos direitos fundamentais, de grande importância para o tema
central desta pesquisa, trouxe a ideia de limitação do poder do Estado na vida do homem, tra-
zendo a positivação de inúmeras liberdades individuais, bem como impondo ao Estado o de-
ver de não atentar contra a liberdade, vida ou propriedade do homem. Neste sentido, Padilha
(2014, p. 524) ensina:
27

A primeira dimensão de direitos fundamentais foi construída em 1789 com a re-


volução francesa e buscava impor limites à atuação do Estado e à criação de um
Estado liberal; por isso, ficou conhecida como direito à prestação negativa (non fa-
cere) do Estado. São alguns exemplos os direitos à liberdade, à vida, à inviolabi-
lidade de domicílio, correspondência, telefônica, à propriedade e assim por dian-
te (grifo nosso).

Os autores divergem quanto ao número de gerações de direitos fundamentais que se


sucederam, embora a doutrina tradicional use os ideais da Revolução Francesa para destacar
três gerações, correspondentes a liberdade, igualdade e fraternidade, respectivamente.
Os direitos sociais ou de segunda geração derivaram das circunstâncias deixadas pela
Revolução Industrial (século XIX), na qual grande parte da população era explorada por uma
minoria, deixando aqueles em situações precárias. Tal fato fez crescer a necessidade de cria-
ção de direitos sociais que garantissem assistência social e melhores condições de trabalho.
Neste caso, o Estado deveria agir para garantir que tais direitos fossem respeitados.
A terceira geração, por sua vez, traz a positivação dos chamados direitos coletivos,
destacando o direito à paz, meio ambiente, desenvolvimento e dentre outros. Tal geração é
conhecida também por consagrar os ideais de fraternidade.
Muitos autores apontam inúmeras outras gerações de direitos fundamentais, como a
quarta geração referente aos direitos à engenharia genética, destacando os direitos a insemina-
ção artificial, congelamento do embrião, referentes às pesquisas de células tronco e outros
mais.
Como o foco desta pesquisa encontra-se, fundamentalmente, nos direitos individuais
de primeira geração, a estes será dado maior ênfase, conforme se verá a seguir..

2.1.2 – Caráter Relativo dos Direitos Fundamentais

Conforme ensinamentos do professor Rodrigo Padilha (2014, p. 515), pode-se definir


os direitos fundamentais como: “direitos considerados indispensáveis à manutenção da digni-
dade da pessoa humana, necessários para assegurar a todos uma existência digna, livre e i-
gual”.
A dignidade da pessoa humana encontra-se no núcleo de todo ordenamento jurídico
brasileiro e com os direitos fundamentais não seria diferente, haja vista que este conjunto de
direitos é o principal responsável por assegurar que tal condição seja respeitada.
Para melhor analisar o instituto da eutanásia, faz-se necessário o conhecimento de al-
gumas das características que distinguem os chamados direitos fundamentais dos outros. Den-
28

tre inúmeras características dos direitos fundamentais apontadas pela doutrina, como a histo-
ricidade, universalidade, imprescritibilidade, indivisibilidade e outros, de suma importância é
a análise do caráter relativo de tais direitos.
Os direitos fundamentais não apresentam, como característica, serem absolutos, na
verdade, nenhum possui tal tendência. A teoria dos direitos fundamentais traz a relativização
de tais direitos como uma de suas principais características, deixando claro, então, a não exis-
tência de um grau hierárquico entre as gerações ou mesmo entre os direitos fundamentais de
mesma dimensão.
Tal relatividade faz-se necessária, pois seria, neste sentido, de difícil resolução uma
controversa em que um direito fundamental fosse contrário a outro, não haveria maneiras de
se pacificar a celeuma caso esses direitos fossem de caráter absoluto. Como não há grau hie-
rárquico entre eles, não há como determinar de antemão qual direito fundamental prevalecerá
em caso de antinomia para com outro, devendo-se utilizar o princípio da proporcionalidade,
harmonização ou ponderação, tendo cuidado para que um direito fundamental não acabe sen-
do mitigado perante o ora conflitante.
Neste sentido Cavalcante Filho explica:

Nenhum direito fundamental é absoluto. Com efeito, direito absoluto é uma con-
tradição em termos. Mesmo os direitos fundamentais sendo básicos, não são absolu-
tos, na medida em que podem ser relativizados. Primeiramente, porque podem
entrar em conflito entre si – e, nesse caso, não se pode estabelecer a priori qual
direito vai “ganhar” o conflito, pois essa questão só pode ser analisada tendo
em vista o caso concreto (grifo nosso) (CAVALCANTE FILHO, S/D).

Importante destacar que este também é o entendimento jurisprudencial brasileiro,


tanto do Supremo Tribunal Federal como dos outros Tribunais que compõe o Poder Judiciário
pátrio. Nesse sentido, segue ementa em que fica claro o caráter relativo dos direitos funda-
mentais (BRASIL, TRT, 2014):

DIREITO FUNDAMENTAL À PRODUÇÃO PROBATÓRIA


(ART. 5º, XXXV E LV, CF/1988). RELATIVIDADE. CONVIVÊNCIA COM OS
DEMAIS DIREITOS DE IDÊNTICA HIERARQUIA.
Como todo direito fundamenta-lo direito a prova
(art. 5º, XXXV e LV, CF/1988) não é absoluto, devendo, no caso concreto, ser
sopesada a sua preponderância, a fim de conviver, harmonicamente, com di-
reitos de igual hierarquia, como, por exemplo, o direito fundamental a uma pres-
tação jurisdicional sem dilações indevidas (art. 5º, LXXVIII, CF/1988). Assim,
concretizando este direito, a lei confere ao magistrado do trabalho ampla liberdade
na direção do processo, devendo velar pelo andamento rápido das causas
(art. 765, CLT c/c art. 125, CPC), lhe sendo facultado, inclusive, indeferir diligên-
cias inúteis ou meramente protelatórias (grifo nosso).
TRT-5- RecOrd: 00014919120135050561 BA 0001491-91.2013.5.05.0561, Rela-
tor: MARIZETE MENEZES, 3ª. TURMA, Data de Publicação: DJ 04/04/2014.)
29

As posições destacadas são adotadas por esta pesquisa e são de grande importância
para uma melhor análise acerca das divergências existentes no entorno da eutanásia, tais dis-
cordâncias serão debatidas mais a frente, principalmente quando se adentrar na celeuma en-
volvendo o direito à vida e seu caráter relativo perante o direito de liberdade e, principalmen-
te, em relação à dignidade da pessoa humana, todos estes consagrados pelo ordenamento jurí-
dico pátrio através da Constituição Federal de 1988.
Destaca-se, por fim, que os direitos fundamentais encontram-se positivados especi-
almente no art. 5°, CF, embora o rol seja exemplificativo, conforme disposto no art. 5, §
2°/CF, e haja a possibilidade de existência de outros direitos fundamentais fora do diploma
constitucional.

2.2 – DIREITO À VIDA

Abordar a vida como tema de estudo é sempre uma tarefa árdua e extremamente
complicada de se fazer, seja em qualquer área e, no direito, não é diferente, muito pelo contrá-
rio. Certamente a eutanásia é um assunto tão complexo de se debater e impossível de se che-
gar a um consenso entre as correntes, porque o direito à vida está no centro da discussão acer-
ca deste controverso instituto.

2.2.1 – Noções Gerais do Direito à Vida

Já ressaltado o histórico do direito à vida com o transcorrer da evolução de nossa ci-


vilização, cabe uma análise mais profunda sobre este bem que é protegido, pelo menos em
teoria, por basicamente todos os ordenamentos jurídicos do mundo, seja este um país que ab-
sorva o instituto da eutanásia ou não.
Qualquer tema relacionado à vida é sempre de difícil debate, mesmo uma conceitua-
ção do que seria este bem se mostra deveras complicada, sendo que esta problemática também
atinge o direito e se mostra um dos pontos centrais da celeuma envolvendo a eutanásia.
Obviamente não é um dos objetivos deste trabalho definir o que vem a ser a vida,
mesmo porque seria muita prepotência diante da complexidade atribuída a tal bem jurídico.
Entretanto, sem pelo menos uma noção do que seria a vida, mostrar-se-ia muito complicada à
continuação desta pesquisa, razão pelo qual se apresenta necessária a observação das diferen-
tes concepções do significado da vida e, a partir deste ponto, entender melhor o significado
deste bem para as ciências jurídicas.
30

Assim sendo, duas tendências se destacam entre as concepções do que seria vida. De
um lado, uma corrente defende que a vida é um ciclo temporal e biológico, onde a vida teria
aspecto físico-existencial com o nascimento, passando por todo seu desenvolvimento e culmi-
nando com a morte, o fim de sua existência.
Por outra direção, a corrente que predomina na ciência jurídica é a que defende o ca-
ráter duplo da vida, este bem não só estaria apoiado no plano existencial da pessoa, mas tam-
bém numa gama bem maior de aspectos, que atribuam dignidade à vida, qualidade para a e-
xistência do ser humano. Nota-se a influência do princípio da dignidade humana no direito e
consequentemente na vida como bem jurídico.
Neste sentido, ensinam, respectivamente, os professores Vicente Paulo (2012, p. 120)
e Roberto Dias (2012, p. 117) sobre o direito à vida no ordenamento jurídico brasileiro:

Não se resume o direito à vida, entretanto, ao mero direito à sobrevivência físi-


ca. Lembrando que o Brasil tem como fundamento a dignidade da pessoa hu-
mana, resulta claro que o direito fundamental em apreço abrange, o direito a uma
existência digna, tanto sob o aspecto espiritual quanto material (garantia do mí-
nimo necessário a uma existência digna, corolário do Estado Social Democrático)
(grifo nosso).

Pode-se dizer que a vida é muito mais do que o ciclo que se inicia em um certo
momento e termina com a morte, pois a vida não é precisa. Viver é et cetera. A
vida deve ser compreendida em sua complexidade e, principalmente, em sua
qualidade, intensidade e dignidade, e não como um intervalo de tempo ou ape-
nas um fenômeno biológico (grifo nosso).

O duplo caráter jurídico da vida é adotado pelo ordenamento legal brasileiro através
da Constituição Federal de 1988, este bem é assegurado como direito de todas as pessoas,
conforme disposto no caput do art. 5° combinado com o art. 1°, III, ambos da CF, dispositivo
este que traz o princípio da dignidade da pessoa humana como ponto central do direito nacio-
nal.
Para o direito, não basta uma pessoa simplesmente existir, tem de ser assegurada uma
vida digna para cada ser humano. Com a positivação do direito à vida, o Estado não poderia
atentar arbitrariamente contra a existência das pessoas, tendo, também, o dever de zelar para
que cada indivíduo consiga elementos que garantam uma qualidade de vida digna.
Esta questão envolvendo a qualidade de vida como objetivo da aplicação do princí-
pio da dignidade da pessoa humana no direito à vida é um dos principais pontos de embate na
discussão envolvendo a eutanásia, como bem ressaltado por Sá (2015, p. 68): “A discussão
que permeia a garantia do direito à vida versa, não raro, em relação à sua qualidade e dignida-
de como construção diária”. Mais acerca deste embate será colocado em breve, quando da
análise específica em nosso ordenamento jurídico.
31

Outro ponto interessante e que certamente encontra-se em posição central na diver-


gência entre entusiastas e detratores da eutanásia diz respeito ao caráter relativo ou absoluto
do direito à vida. Muitos doutrinadores defendem o caráter sagrado e absoluto deste bem, de
modo que a prática da eutanásia seria totalmente ilegal e absurda. Por outro lado, defensores
da legalização da eutanásia entendem que o direito à vida possui caráter relativo, tal como
todos os outros direitos fundamentais, devendo-se harmonizar os direitos conflitantes de acor-
do com o caso concreto.
Nem se pode dizer que a controvérsia está longe de ser solucionada, até porque tal
celeuma jamais deve vir a ser pacificada em razão de pontos tão conflitantes. Parece que a
corrente minoritária encontra-se com mais razão, uma vez que não devem existir direitos ab-
solutos no ordenamento jurídico brasileiro, inclusive pela manifestação do princípio da unida-
de da Constituição, que veda a antinomia entre direitos positivados na Constituição Federal de
1988, devendo, nestes casos, tais direitos serem harmonizados, o que seria impossível com a
existência de algum direito absoluto.
Por fim, faz-se necessária uma breve explanação de como ordenamento jurídico bra-
sileiro acata a morte do ser humano. É sempre bom destacar que os critérios que identificam a
morte de uma pessoa foram se modificando com o tempo, passando de parada cardíaca ou
respiratória para, nos dia de hoje, ser utilizada a morte encefálica como critério para se identi-
ficar a morte de uma pessoa, conforme disposto no art. 3° da Lei 9.434/97 (BRASIL, 1997), a
lei do transplante de órgãos. Neste sentido, posiciona-se Vieira (2009, p. 96):

Tendo a própria legislação brasileira estabelecido como critério para definição da


morte a ‘morte encefálica’, não há dúvidas de que, constatada esta, não há mais ra-
zão para a continuidade de aplicação de qualquer procedimento médico no paciente,
que já então se encontra morto, apenas se justificando a manutenção dos sinais vitais
para fins de realização de transplante, caso a família autorize a realização deste.

2.2.2 – Histórico do Direito à Vida

No mundo de hoje, a vida se destaca entre grande parte da doutrina como o principal
bem a ser assegurado ao ser humano, tanto é que alguns conferem a este direito um caráter
absoluto, posição esta que se mostra equivocada, uma vez que, como já destacado, os direitos
fundamentais se caracterizam pela sua natureza relativa e não absoluta, como desejam deter-
minar esta parte da doutrina.
32

Mas, nos anais da humanidade nem sempre foi assim, na verdade, em grande parte da
história do homem, a vida não esteve assegurada de forma direta pelos ordenamentos jurídi-
cos que regravam as sociedades existentes. Neste posicionamento se alia Sá (2015, p. 67):

Mas, foi somente através dos séculos que o direito à vida passou a ser reconhecido e
protegido como bem jurídico. Antes, o que existia era a origem humana e social des-
te direito. É que não havia qualquer formalização para garantia do direito à vi-
da, e sua proteção era feita de forma reflexa, no sentido de que, quem a desrespei-
tasse, atentando contra ela era punido. Passo a passo, com a evolução, que levou sé-
culos, chega-se nos dias atuais (grifo nosso).

Um grande exemplo do retratado é o código de Hamurabi, onde se punia um eventual


assassinato com a retirada da própria vida do infrator. Além disso, mesmo quando se era res-
guardado de forma indireta, tal proteção não abrangia a todos os homens e mulheres, até por-
que, infelizmente, nem sempre todos os seres humanos eram considerados como tal.
Durante a idade média e idade moderna muitas foram as atrocidades atentadas contra
inúmeros direitos que hoje são considerados fundamentais, entre eles o direito à vida. É pos-
sível citar as barbaridades cometidas durante as Guerras Santas ou as atrocidades empreendi-
das pelos reis absolutistas que, sem que seus poderes fossem limitados, perpetraram inúmeras
violações contra a vida e a liberdade do homem.
A grande mudança de paradigma ocorrera com a eclosão da Revolução Francesa e
consequente Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, em 1789. Como já retratado
anteriormente, a diploma legal é um dos marcos da positivação dos direitos fundamentais,
com ela deu-se origem ao que se chama de primeira geração dos direitos fundamentais, direi-
tos de natureza individual, e, entre eles, estava o direito à vida.
Em que pese as barbáries cometidas contra a existência humana durante a Segunda
Guerra Mundial, após a Declaração dos Direitos do Homem, de 1789, a vida passou a ser pro-
tegida nos ordenamentos jurídicos, impedindo o Estado de atentar contra este importante bem
jurídico tutelado às pessoas. Após a guerra, com a onda crescente de tratados de direitos hu-
manos firmados entre as nações de praticamente todo o globo, o direito à vida passou a ter
aspecto similar ao observado nos dias de hoje.

2.3 – DIREITO À LIBERDADE

A positivação da liberdade como direito fundamental é uma das maiores conquistas


da história do direito. Como se sabe, tal como a vida, por muito tempo este direito fora supri-
33

mido dos ordenamentos jurídicos vigentes, na melhor das hipóteses ele não era estendido a
todos.
Hoje, já positivado em praticamente todos os ordenamentos jurídicos vigentes, a li-
berdade é um dos direitos explicitamente envolvidos na grande controvérsia acerca da eutaná-
sia, por este motivo sendo de grande valia para a realização do presente estudo.

2.3.1 – Aspectos Gerais do Direito à Liberdade

Pode-se afirmar que o direito à liberdade foi a grande base para o advento da primei-
ra geração dos direitos fundamentais, uma vez que, na época, a procura por ações negativas
por parte do Estado era imensa, resultando, consequentemente, no surgimento dos direitos de
liberdade, como fora chamado o conjunto de conquistas que compõe a primeira geração dos
direitos fundamentais.
No obstante, o advento da liberdade não significou que tal direito fora assegurado a
todos os seres humanos, muito pelo contrário, não são poucos os países em que o homem ti-
nha seu direito de ser livre negado. Podemos citar, como exemplo, o próprio Brasil, onde, até
o final do século XIX, a escravização era considerada legal, apenas sendo revogada pela Lei
Áurea (BRASIL, 1888).
Tal como preceitua a teoria dos direitos fundamentais, a liberdade foi um direito as-
segurado ao ser humano com o transcorrer do tempo. Hoje, todos os tratados de direitos hu-
manos e diplomas constitucionais asseguram o direito à liberdade às pessoas, destacando al-
gumas ressalvas a depender da sociedade em questão, mas que não vem ao caso quando se
fala sobre a eutanásia.
O ordenamento jurídico brasileiro não é diferente e assegura a liberdade como direito
fundamental de todo ser humano, como se pode observar através do caput do art. 5, CF
(BRASIL, 1988). Importante salientar que tal direito adquire múltiplas facetas e vai além da
liberdade da pessoa física, assegurando, também, liberdade de pensamento, crença, expressão
e outras nuances deste bem imprescindível.
Antes de se adentrar nas diferentes acepções dadas ao direito à liberdade, é necessá-
rio entender um sentido geral atribuído pelas ciências jurídicas a este bem de suma importân-
cia. Como bem asseveram diversos doutrinadores, definir tal valor mostra-se uma tarefa bas-
tante árdua, em razão da complexidade e diferentes nuances que este bem pode tomar.
34

Assim, como forma de estabelecer uma base para análise, destaca-se o art. 4° da De-
claração de Direitos do Homem e do Cidadão que traz a definição do que seria, em termos
gerais, a liberdade (FRANÇA, 1789):

Art. 4º. A liberdade consiste em poder fazer tudo que não prejudique o próximo.
Assim, o exercício dos direitos naturais de cada homem não tem por limites senão
aqueles que asseguram aos outros membros da sociedade o gozo dos mesmos direi-
tos. Estes limites apenas podem ser determinados pela lei.

Ressaltada a presente definição, se mostra relevante ponderar algumas acepções atri-


buídas pela doutrina a este bem tão relevante a discussão objeto desta pesquisa. Alguns cos-
tumam dividir a liberdade em seu aspecto negativo e positivo, sendo aquela relacionada as
ações de um homem sem que estas sofram impedimentos ou interferência de outrem, enquan-
to a nuance positiva refere-se ao poder do homem de estabelecer seus próprios objetivos ou
vontades, se autodeterminar, ou melhor, que suas decisões partam única e exclusivamente da
própria pessoa.
Neste sentido, posiciona-se Dias (2012, p. 132) ao dissertar sobre ensinamento de
Bobbio acerca do tema:

Nesse sentido, é possível perceber que, enquanto a liberdade negativa é uma qualifi-
cação da ação, a liberdade positiva é uma qualificação da vontade. E Bobbio conclu-
iu que uma ação é livre, segundo a noção de ‘liberdade negativa’, quando tal ação
pode ser levada a cabo sem obstáculos, sem impedimentos. Já, conforme a ideia de
‘liberdade positiva’, a vontade é livre se ela é autônoma, ou seja, quando a pessoa
pode se auto determinar.

Esclarecida tal diferença, observa-se que tal direito, em suas múltiplas nuances, en-
contra-se em posição central no debate acerca da eutanásia, principalmente no que tange à
autonomia de vontade por parte do paciente, considerando o quão válido é este desejo se posi-
cionado em conflito com o direito à vida, levando em consideração a interferência direta do
princípio da dignidade da pessoa humana. Por esta razão, o tema será ainda mais explorado
com o transcorrer da pesquisa.

2.4 – DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA

No atual estágio do neoconstitucionalismo, é inconcebível se falar sobre direito sem


que o princípio da dignidade da pessoa humana esteja intrinsecamente ligado ao tema, conse-
quentemente, com a problemática desta pesquisa não é diferente.
35

2.4.1 – Conceito

Se adentrar na esfera conceitual da dignidade da pessoa humana não é tarefa das


mais simplórias, haja vista que não há um conceito universal para tal valor. De toda forma, é
de suma importância buscar estabelecer uma base geral do real significado deste princípio
para que esta pesquisa possa vir a se desenvolver.
Tentando encontrar o significado da dignidade da pessoa humana, Tavares (2012, p.
590) ensina:

Pode-se dizer que a dignidade do Homem, enquanto princípio, tem uma dupla di-
mensão, tanto negativa quanto positiva. PÉREZ LUÑO, ancorado no magistério de
WERNER MAIHOFER, aponta o conteúdo dúplice do princípio da dignidade: “A
dignidade humana consiste não apenas na garantia negativa de que a pessoa
não será alvo de ofensas ou humilhações, mas também agrega a afirmação posi-
tiva do pleno desenvolvimento da personalidade de cada indivíduo. O pleno de-
senvolvimento da personalidade pressupõe, por sua vez, de um lado, o reconheci-
mento da total autodisponibilidade, sem interferências ou impedimentos externos,
das possíveis atuações próprias de cada homem; de outro, a autodeterminação (Sel-
bstbestimmungdesMenschen) que surge da livre projeção histórica da razão humana,
antes que de uma predeterminação dada pela natureza” (grifo nosso).

Em sentido semelhante, Fernandes (2011, p. 231) disserta:

Partindo das noções afirmadas pela teoria constitucional majoritária – ainda que pe-
sem as críticas feitas, bem como as incoerências internas a essa teoria –, com fortes
heranças germânicas e bases axiológicas, a dignidade da pessoa humana (art. 1º, III
da CR/88) é erigida à condição de metaprincípio (sic). Por isso mesmo, esta irradia
valores e vetores de interpretação para todos os demais direitos fundamentais,
exigindo que a figura humana receba sempre um tratamento moral condizente
e igualitário, sempre tratando cada pessoa como fim em si mesma, nunca como
meio (coisas) para satisfação de outros interesses ou de interesses de terceiros
(grifo nosso).

Tentando extrair um pouco de cada ilustre pensador, bem como de outros analisados,
entende-se que a dignidade da pessoa humana seja o direito que garanta que todos os seres
humanos sejam tratados como pessoas e não como uma coisa, de modo que a todos sejam
assegurados seus direitos fundamentais. Obviamente que esta definição não é completa e pro-
vavelmente nem há como contemplar o sentido total de dignidade da pessoa humana, mas
parece razoável partir deste ponto como uma base para posterior análise.

2.4.2 – Histórico
36

Hoje, o princípio da dignidade da pessoa humana encontra-se totalmente ligado ao


direito em si, não há ordenamento jurídico nem tratados internacionais de direito que não a-
barque a dignidade da pessoa humana como núcleo central do direito.
Entretanto, nem sempre foi assim, tal qual os direitos à vida e à liberdade, a dignida-
de humana nem sempre foi assegurada pelos ordenamentos jurídicos vigentes.
Foi somente com Kant (século XVIII) que a dignidade da pessoa humana passou a
ser tratado de forma parecida com a que se observa hoje, no entender do filósofo alemão, o
homem deveria ser tratado como fim em si mesmo, não podendo ser tratado como coisa.
Entretanto, apenas a partir do término da Segunda Guerra Mundial que este valor
passou a ter importância impar no direito, momento em que ficou escancarado o desrespeito
ao homem após a descoberta das execráveis atrocidades realizadas pelos nazistas frente a mi-
lhões de pessoas. Neste sentido, destaca-se a lição de Fernandes (2011, p. 230):

Para o Direito, a redescoberta da ideia de dignidade humana vem acompanha-


da de diversos documentos internacionais, na qual é citada – Estatuto (ou Carta)
da Organização das Nações Unidas (1945), Declaração Universal dos Direitos do
Homem (1948), Constituição italiana (1948) e da Lei Fundamental da República Fe-
deral Alemã (1949). Representa, de certo modo, uma contraposição aos horrores
vividos durante o período das Guerras Mundiais (grifo nosso).

A partir deste momento, o princípio da dignidade da pessoa humana passou a se fazer


presente em todos os ordenamentos jurídicos do mundo, bem como tratados internacionais de
direitos humanos, não só como um dos principais pilares, mas como valor principal do direito.
Corroborando para tal afirmação, Silva Neto (2006, p. 223) disserta: “A dignidade da pessoa
humana é o fim supremo de todo o direito”.

2.4.3 – Aspectos Jurídicos

Como visto acima, a partir do término da Segunda Guerra Mundial o princípio da


dignidade da pessoa humana ganhou gigantesca importância no universo jurídico mundial,
tanto através da positivação em cartas constitucionais, quanto na presença como valor funda-
mental de tratados internacionais de direitos humanos.
A influência de tal princípio logicamente abarcou o ordenamento jurídico brasileiro,
sendo previsto como fundamento central da República Federativa do Brasil, como se observa
da leitura do art. 1°, III, CF (BRASIL, 1988): “Art. 1º A República Federativa do Brasil, for-
mada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em
37

Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: III - a dignidade da pessoa huma-
na.”.
Fato é que a dignidade da pessoa humana vem se destacando como núcleo funda-
mental de todo o direito, não só dos direitos fundamentais, que já possuem grande relevância,
mas de todo o ordenamento jurídico. Para muitos, é a dignidade da pessoa humana que vai dar
legitimidade ao ordenamento legal, sendo real valor fundante de todo o sistema.
Atribuir a importância de valor supremo do direito ao princípio da dignidade da pes-
soa humana é a posição que esta pesquisa se vincula, também sendo a posição majoritária
encontrada na doutrina como se pode observar através da lição de Fernandes (2011, p. 231):

Sendo assim, para os teóricos do constitucionalismo contemporâneo, direitos – como


vida, propriedade, liberdade, igualdade, dentre outros –, apenas encontram uma jus-
tificativa plausível se lidos e compatibilizados com o postulado da dignidade huma-
na. Afirmam, portanto, que a dignidade seria um super princípio, como uma
norma dotada de maior importância e hierarquia que as demais [...] (grifo nos-
so).

Também ressaltando o aspecto nuclear do princípio da dignidade da pessoa humana


no direito, Vieira (2009, p. 49) traz alguns apontamentos ao falar sobre o papel desempenhado
pelo referido princípio:

Atualmente, os estudiosos entendem que a dignidade humana tem caráter fun-


dante do sistema jurídico em sua totalidade, devendo, pois ser garantida e res-
peitada em toda e qualquer situação que possa ser considerada relevante para o
direito... No mesmo sentido o pensamento de Rizzato Nunes, para quem o princípio
da dignidade é o fundamento maior de todo o sistema constitucional, “último arca-
bouço da guarida dos direitos individuais”, explicando que mesmo a isonomia, prin-
cípio importantíssimo que se presta a “gerar equilíbrio real”, visa a concretizar a
dignidade, que “dá a direção, o comando a ser considerado primeiramente pelo in-
terprete” (grifo nosso).

Silva Neto (2006, p. 223) defende que: “A dignidade da pessoa humana é o fim su-
premo de todo o direito; logo, expande os seus efeitos nos mais distintos domínios normativos
para fundamentar toda e qualquer interpretação. É o fundamento maior do Estado brasileiro”.
Como se nota ao longo destas lições, o princípio da dignidade da pessoa humana
possui importância ímpar no ordenamento jurídico brasileiro. Todos os direitos, inclusive os
fundamentais e, dentre eles, destaca-se a liberdade, vida e igualdade, possuem em sua base o
valor da dignidade da pessoa humana, como bem asseverou alhures Fernandes e como destaca
Dias (2012, p. 102):

Em outras palavras, a dignidade da pessoa humana está no núcleo de todos os di-


reitos fundamentais, isto é, tanto no cerne dos tradicionais direitos individuais
38

ligados à liberdade, que surgem para impedir a atuação do Estado, como dos
direitos que procuram assegurar a igualdade das pessoas por meio da prestação
do Estado (grifo nosso).

No obstante, em que pese não ser majoritário, alguns doutrinadores entendem que es-
te valor não possui este caráter supremo que muitos apontam, tal posicionamento é o defendi-
do por Tavares (ALEXY apud TAVARES, 2012, p. 591):

Para outra corrente, que, acertadamente, é contrária a essa supervalorização do prin-


cípio da dignidade humana, não será possível entronizar assim algum princípio, seja
ele qual for. ALEXY, dentre outros, deve ser aqui citado. Para ele, ao analisar a Lei
Fundamental alemã, que dispõe, em seu art. 1º, § 1º, que “A dignidade da pessoa é
intangível”, este dispositivo efetivamente “provoca a impressão de absoluto. Porém,
a razão desta impressão não reside em que através desta disposição de direito fun-
damental se estabeleça um princípio absoluto, senão em que a norma da dignidade
da pessoa é tratada, em parte, como regra e, em parte, como princípio, e também no
fato de que para o princípio da dignidade da pessoa existe um amplo grupo de con-
dições de precedência nas quais existe um alto grau de segurança acerca de que de-
baixo delas o princípio da dignidade da pessoa precede aos princípios opostos.

Visto a importância da dignidade da pessoa humana para todo o ordenamento jurídi-


co, é simples o entendimento do porque seu aprofundamento é de vital importância para a
análise da problemática que envolve o instituto da eutanásia. Ora, será necessário averiguar-
mos que posição prevalece quando do embate do direito à liberdade e o direito à vida, isto é,
sempre levando em consideração o fundamento da dignidade da pessoa humana.
39

CAPÍTULO 3: EUTANÁSIA NO DIREITO COMPARADO

Não é segredo para ninguém que é necessário um intercâmbio de ideias e experiên-


cias para que se possa haver um aperfeiçoamento maior, seja no direito, medicina, engenharia
ou outro qualquer outro ramo que seja.
No direito, para se entender melhor um instituto jurídico, é comum ser analisado a
evolução histórica de tal instituto, e uma observação espacial deste direito, melhor dizendo,
um exame aos ordenamentos alienígenas ou como se dá a aplicação deste instituto no direito
comparado.
O presente capítulo focará na análise de como os ordenamentos jurídicos estrangeiros
vêem e lidam com a eutanásia, especificando seus posicionamentos e apontando como se dá
aplicação deste controverso instituto jurídico em ordenamentos jurídicos que legalizam ou
aceitam a prática da eutanásia.

3.1 – ANÁLISE DA EUTANÁSIA NO DIREITO COMPARADO

3.1.1 – Holanda

A Holanda se destaca entre todos os países do globo por seu liberalismo quanto a
questões complexas que em boa parte do mundo ainda encontram-se em profundos debates.
Trata-se de o país mais liberal no mundo.
No que tange a abordagem da eutanásia não é diferente, em que pese não ter sido o
primeiro país a tolerar de alguma forma a eutanásia em seu ordenamento jurídico, foi a Ho-
landa, em abril de 2002, a primeira nação no mundo a legalizar este instituto jurídico.
Antes de sua legalização, a prática da eutanásia era entendida como uma espécie de
homicídio privilegiado. Entretanto, segundo entendimento que fora se consolidando na juris-
prudência holandesa, o médico poderia não ser punido caso demonstrasse a ocorrência da
força maior. Neste sentido, o professor Dias (2012, p. 160) ensina:

Apesar dessas disposições legais, a jurisprudência passou a construir um enten-


dimento no sentido de permitir as práticas eutanásicas, desde que respeitados al-
guns requisitos, com base no art. 40 do Código Penal, que disciplina o “o estado de
necessidade justificado”. Este artigo estabelece que não deve ser punida a pessoa
que comete um delito motivada por uma força frente à qual não pode exercer
resistência (grifo nosso).

Complementando tal lição, a professora Sá (2015, p. 147) explica:


40

Melhor dizendo: se um médico põe fim à vida de um paciente, a pedido deste, di-
ante de manifestação explícita e sem mácula, além de saber tratar-se de sofri-
mento insuportável e sem perspectiva de melhora, poderia eximir-se de cum-
primento de pena em virtude de força maior. Importantíssimo frisar que, em se
tratando de situação de força maior, julga-se caso por caso (grifo nosso).

Segundo ensinamento de Goldim (GOLDIM 3, 2003), a eutanásia passou a ser tole-


rada em 1993, através da edição da Lei Funeral, desde que houvesse a manifestação de cinco
requisitos:

1) A solicitação para morrer deve ser uma decisão voluntária feita por um paciente
informado; 2) A solicitação deve ser bem considerada por uma pessoa que tenha
uma compreensão clara e correta de sua condição e de outras possibilidades. A pes-
soa deve ser capaz de ponderar estas opções, e deve ter feito tal ponderação; 3) O
desejo de morrer deve ter alguma duração; 4) Deve haver sofrimento físico ou men-
tal que seja inaceitável ou insuportável; 5) A consultoria com um colega é obrigató-
ria.

Este precedente jurisprudencial serviu de base para que no dia 10 de abril de 2001
fosse aprovada a Lei relativa ao Término da Vida sob Solicitação e Suicídio Assistido, diplo-
ma legal que passou a legalizar a eutanásia nos países baixos, tornando a Holanda a primeira
nação a, de fato, legitimar a eutanásia em seu ordenamento jurídico (BBC, 2001). Destaca-se
que tal diploma entrou em vigência em 01 de abril de 2002.
A Lei relativa ao Término da Vida sob Solicitação e Suicídio Assistido veio a modi-
ficar os artigos 293 e 294 do Código Penal, legalizando a eutanásia. Segundo tradução de Sá
(2015, p. 150), destaca-se o art. 293:

Art. 293: 1 - Aquele que puser fim à vida de outra pessoa, segundo o desejo sério e
expressão da mesma, será punido com pena de prisão de até doze anos ou com pena
de multa da categoria quinta. 2 – O ato não será punível caso praticado por um
médico que tenha cumprido com os requisitos de cuidado, dispostos no art2 da
lei sobre comprovação e fim da vida em petição própria e de auxílio ao suicídio,
e se houver comunicação ao ‘forense municipal’, conforme o artigo 7, parágra-
fo segundo, da Lei Reguladora dos Funerais (grifo nosso).

Importante ressaltar os requisitos necessários para a realização da eutanásia, tais


condições vêm dispostas no art. 2° da Lei relativa ao Término da Vida sob Solicitação e Sui-
cídio Assistido, sendo imprescindível a vontade do paciente em se submeter à eutanásia, que a
doença que acomete o enfermo seja incurável, que haja consulta e parecer de incurabilidade
de mais de um médico, que o sofrimento seja insuportável e que a situação e possibilidades a
serem tomadas sejam discutidas com o paciente. Tal posicionamento é ressaltado por Sá
(2015, p. 151):
41

a) tenha se convencido que o pedido do paciente foi meditado e voluntário; b) tenha


se convencido de que o padecimento do paciente é insuportável e sem esperanças de
melhora; c) tenha informado ao paciente sua real situação e suas perspectivas de fu-
turo; d) tenha se convencido, juntamente com o paciente, de que não há outra solu-
ção razoável para a situação em que se encontra este último; e) tenha consultado, pe-
lo menos, um médico independente que, examinando o paciente, emitiu seu parecer
por escrito sobre o cumprimento dos requisitos de cuidado; e f) tenha praticado a eu-
tanásia ou auxílio ao suicídio com o máximo de cuidado e esmero profissional.

Como se pode ver, a eutanásia não foi legislada de modo imprudente, há uma série
de requisitos para que um paciente possa vir a ter sua morte antecipada, sendo a preparação do
profissional e do procedimento feito de forma séria. Como forma de exemplificar tal postura,
Bottega (2011, p. 57) ensina que na Holanda os médicos recebem treinamento de como reali-
zar a eutanásia ainda durante a faculdade de medicina.
Ademais, há um controle por parte do Estado dos casos de eutanásia no país, uma
vez que a Lei relativa ao Término da Vida sob Solicitação e Suicídio Assistido dispõe sobre a
criação de Comissões Regionais encarregadas de verificar e julgar se os procedimentos de
cada caso envolvendo o instituto estão sendo realizados em conformidade com o que precei-
tua a lei. Neste sentido, Molinari (2014) disserta:

Por fim, importante salientar que, embora legalizada, a eutanásia e o suicídio as-
sistido sofre intenso controle no país, sendo cada caso encaminhado a uma
comissão regional formada por médicos, juízes e sociólogos que devem se ma-
nifestar pela viabilidade ou não do procedimento e em caso de dúvida o caso é
submetido ao poder judiciário (grifo nosso).

Entretanto, obviamente não há um consenso quanto à legalização da eutanásia e a


forma com a qual este instituto é aplicado em solo holandês. Há denúncias envolvendo a rea-
lização de eutanásia sem o consentimento do paciente (SAPO, 2016), no obstante, parece que
o instituto se instalou com sucesso no ordenamento jurídico holandês, os casos de eutanásia
são numerosos, poupando, deste modo, inúmeros pacientes do sofrimento de uma morte lenta
(EXAME, 2012).
O sucesso da legalização da eutanásia em território holandês se mostra pela atual
perspectiva de ampliação do instituto no ordenamento jurídico da Holanda. As recentes pes-
quisas mostram que mais de 75% da população holandesa é a favor da eutanásia e a perspec-
tiva é que a eutanásia seja expandida de modo que a pessoa possa vir a reivindicar tal direito
mesmo que não possua doença incurável (O GLOBO, 2016).
A ideia se mostra muito liberal, não se sabe se esta proposta será aprovada, embora,
pelo histórico holandês, pareça que seja mais provável a admissão, mas tal pretensão indica
que o instituto pode vir a ser aplicado de maneira eficaz e satisfatória, obrigando uma série de
42

requisitos para a efetivação deste direito, gerando segurança médico-jurídica e ao mesmo


tempo acabando com o sofrimento de milhares de pacientes.

3.1.2 – Bélgica

Quando o assunto é eutanásia, a Bélgica sempre será mencionada na discussão, isso


porque os belgas foram o segundo país no mundo a legalizar a prática da eutanásia em seu
ordenamento jurídico.
A aprovação da Lei da Eutanásia se deu meses depois da entrada em vigência do di-
ploma legal que legalizou o instituto na Holanda, país vizinho dos Belgas. A Lei que regula-
mentou a eutanásia em território belga veio a ser aprovada em 16 de maio de 2002 e entrou
em vigência no dia 22 de setembro do mesmo ano (BBC, 2002).
A legislação deste país sobre a eutanásia traz grandes semelhanças com a vigorante
em solo holandês, entretanto, de início, o diploma belga se mostrou receoso quanto à prática
do instituto em menores de 18 anos, motivo este pelo qual a eutanásia não foi estendida para
pessoas com menos de 18 anos, exceto se as mesmas já fossem emancipadas, como dispunha
o art. 3, § 1° da lei na época de sua publicação (BÉLGICA, 2002).
No obstante, a que pese o maior rigor quanto à idade, na Bélgica não era necessário o
paciente encontra-se em estado terminal para pleitear a eutanásia. Neste sentido, Molinari
(2014) ensina: “Inicialmente a lei belga foi mais rígida que a holandesa, não se admitindo a
prática da eutanásia em menores de 18 anos, porém, a lei permitia a eutanásia em pessoas
que não estavam em estado terminal”.
Os requisitos para a realização da eutanásia são semelhantes aos exigidos na legisla-
ção holandesa, o paciente deve pedir por tal procedimento em sã consciência, o enfermo deve
estar acometido de doença incurável, deve haver consulta de outro médico para averiguar o
estado clínico do doente, o sofrimento deve ser insuportável e a antecipação da morte só po-
derá ser realizada 30 dias após o pedido. Neste sentido, Cabrera (2010, p. 69) destaca:

1) realização apenas por médico; 2) que o paciente seja adulto ou emancipado, com
plena capacidade de consciência quando do seu pedido; 3) que o pedido seja volun-
tário; 4) que o paciente se encontre em condição de saúde irremediável, com queixa
de sofrimento físico e mental, constante e insuportável, que não possa ser minorado
de outra forma; 5) que paciente esteja acometido de doença grave e incurável; 6) que
a persistência no tratamento cause sofrimento físico ou mental ao paciente; 7) que o
médico informe ao paciente seu estado de saúde, bem como, chances de cura e ex-
pectativa de vida; 8) que a opinião do médico esteja acompanhada por uma segunda
opinião médica.
43

Importante ressaltar que recentemente houve mudanças na legislação belga acerca da


eutanásia, esta veio a ser estendida para menores de 18 anos que sejam portadores de doença
incurável e em estado terminal, desde que os pais concordem com a vontade do menor. O
Parlamento veio a aprovar esta mudança em meados de 2014, gerando grande repercussão
sobre o tema (BBC, 2014). Como se vê, a diferença se deu não só na expansão do instituto,
mas também na limitação ao estágio terminal de doença para que a criança venha poder ter o
direito à eutanásia.
Assim explica Goldim (GOLDIM 2, 2014):

Em 13 de fevereiro de 2014, o Parlamento Belga aprovou uma proposta, com 86 vo-


tos a favor, 44 contra e 12 abstenções, que permite a eutanásia em qualquer idade. A
eutanásia será permitida apenas para pacientes em estado terminal, com grande so-
frimento, por solicitação da própria criança, quando possível e com o entendimento
de que tem discernimento para tomar tal decisão, e com a concordância do pai e da
mãe.

Com esta mudança, a Bélgica torna-se a única nação do mundo a legalizar a eutaná-
sia sem limitar a idade do paciente que possa vir a usufruir de tal direito, visto que na Holanda
há a limitação de 12 anos. Frisa-se que já houve casos de eutanásia em crianças após mudança
da lei (G1, 2016).
Por fim, é importante ressaltar que os procedimentos de antecipação da morte do pa-
ciente são rigorosamente controlados pela Comissão Federal de Controle e Avaliação
(Commission fédérale de contrôleet d'évaluation de l'application), cabendo a esta comissão
fiscalizar e averiguar se os procedimentos estão sendo aplicados do modo como se encontra
disposto em lei.

3.1.3 – Alemanha

A Alemanha se destacou como um dos primeiros países do mundo a possibilitar ao


paciente o direito a ter sua morte antecipada através da eutanásia. Em meados de 1935, houve
aprovação e entrou em vigência lei que dava direito ao paciente em estágio terminal acabar
com todo seu sofrimento por meio da eutanásia.
Entretanto, tal lei fora desvirtuada durante o hediondo terceiro Reich, que matou mi-
lhares de pessoas, dentre eles doentes e deficientes, sob o pretexto de não colaborarem para o
crescimento da nação, era o que os nazistas chamavam de limpeza ou purificação da raça ari-
ana. Importante ressaltar que as práticas nazistas não possuem qualquer relação com o que se
entende como eutanásia, na verdade, tratava-se de eugenia, uma limpeza étnica.
44

A grande consequência dessas ações para os rumos da eutanásia, em terras germâni-


cas é que o assunto passou a ser tratado como um tabu, a lembrança do ocorrido nas décadas
de 30 e 40 ainda assombram os alemães.
Hoje a eutanásia, que uma vez fora permitida, é tida como homicídio privilegiado,
com pena que pode variar de seis meses a cinco anos, conforme dispõe o art. 216 do código
penal alemão. Ponto importante a se destacar é que para a tipificação desta conduta não ne-
cessariamente é preciso que seja um paciente terminal. Em caso de o autor comprovar que a
“vítima” seria paciente em estado incurável, sua pena seria estabelecida no mínimo legal, po-
dendo até ser aplicada uma espécie de sursis. Neste sentido, explica Vieira (2009, p. 144):

Na Alemanha, a eutanásia pode ser considerada ato de homicídio contra pessoa


muito doente, mesmo em face de seu pedido expresso e sincero, para pôr fim aos
seus sentimentos. Informa que tal hipótese é considerada caso privilegiado de homi-
cídio voluntário, o “homicídio a pedido”, regulado no art. 216 do Código Penal,
tendo pena reduzida, de seis meses a cinco anos, em relação ao assassinato grave e
ao homicídio voluntário “comum”, não sendo necessário que a pessoa esteja do-
ente. (...) O autor afirma que seria possível, em caso de doença incurável, que a
Corte diminuísse a pena ao mínimo, caso em que o autor cumpriria apenas uma
curta prisão, havendo até a possibilidade de concessão de sursis por um período
de cinco anos (grifo nosso).

Solução para os doentes, já que legalmente o ordenamento jurídico alemão não auto-
riza a realização da eutanásia, o suicídio assistido, ato em que o médico ajuda o paciente a
tirar sua própria vida, ganha grande destaque em território alemão, uma vez que a ajuda médi-
ca ao suicídio não é penalizada em solo germânico (ESTADÃO, 2010). Ribeiro (2006, p.
1752) explica em tom crítico ao que se apresenta atualmente no Brasil:

Por sinal, na Alemanha, não é crime a participação em suicídio, cuja punição,


entre nós, tem pouca lógica jurídica, estando sustentada pela conveniência de uma
política criminal influenciada pelo Código Canônico, que previa, até 1982, punições
para os suicidas (grifo nosso).

Corroborando com tal entendimento, destaca-se a decisão do Supremo Tribunal A-


lemão, no caso do advogado Wolfgang Putz, que tinha aconselhado sua cliente a cortar os fios
dos aparelhos que mantinha a mãe viva. Em tal caso, o Egrégio Tribunal proferiu decisão que
legalizara o suicídio assistido, desde que haja um pedido do paciente neste sentido, absolven-
do o advogado (BOTTEGA, 2011, p. 55).
Ressalta-se, por fim, que o movimento favorável a volta da legalização da eutanásia
ativa cada vez mais ganha simpatizantes dentre o povo alemão. Entretanto, a legalização deste
instituto deve ser complicada, principalmente pela sombra do ocorrido no período nazista
(VIEIRA, 2009, p. 145).
45

3.1.4 – Uruguai

O Uruguai foi o primeiro país no globo a tolerar a possibilidade da realização da eu-


tanásia sem que o agente viesse a ser punido, conforme disposto no art. 37 do Código Penal
de 1934. A eutanásia não era verdadeiramente legalizada no ordenamento jurídico do país,
mas a depender do caso poderia ser admitida, desde que o agente tivesse antecedentes honrá-
veis, realizado a conduta por motivo piedoso e que a “vítima” tivesse feito reiteradas súplicas.
Neste sentido:

De acordo com a legislação uruguaia, é facultado ao juiz a exoneração do castigo a


quem realizou este tipo de procedimento, desde que preencha três condições básicas:
·ter antecedentes honráveis; ·ser realizado por motivo piedoso, e ·a vítima ter feito
reiteradas súplicas (GOLDIM, 1997).

As discussões acerca da eutanásia e sua legalização seguem em desenvolvimento,


sem que ainda se tenha um resultado definitivo quanto à criação ou não de uma lei que verse
sobre a eutanásia. Enquanto tal discussão não chega a um resultado, alguns casos envolvendo
eutanásia clandestina seguem gerando polêmica.

3.1.5 – Colômbia

A Colômbia vem se destacando nos últimos anos pelo progressivo avanço do movi-
mento favorável a eutanásia ativa. Em que pese, na época, a eutanásia não ser positivamente
legalizada na Colômbia, a Corte Constitucional Colombiana, em 1997, admitiu a prática da
eutanásia no país, encarregando o Congresso Nacional de regular através de lei o instituto em
questão. Neste sentido, nos ensina o professor Medina (2015, p. 50):

En Colombia, y con base em la Constitución Política de 1991, la Corte Consti-


tucional, em cumplimiento de la sentencia C239 de 1997, despenalizo la eutana-
sia y abrió la puerta para que las personas que sufren frente a una enfermedad
incurable y en fase terminal puedan pedir poner fin a su vida. Plantea que con-
respecto a los enfermos terminales que experimentan intensos sufrimientos, eldeber
estatal de proteger la vida cede frente al consentimiento informado del pacien-
te, que deseamoriren forma digna y en este caso el derecho fundamental a vivi-
ren forma digna implica entonces el derecho a morir dignamente, pues conde-
nar a una persona a prolongar por cuando no lo desea y padece intensas aflicci-
ones, equivale no solo a un trato cruel e inhumano, sino a una anulación de su-
dignidad y de su autonomía como sujeto moral 1(grifo nosso).

1
Na Colômbia, com base na Constituição Política de 1991, a Corte Constitucional, cumprindo a sentença C239
de 1997, despenalizou a eutanásia e abriu a porta para que as pessoas que sofrem frente uma enfermidade incu-
rável e em fase terminal possam pedir para que ponham fim a sua vida. Argumenta que, em relação aos enfermos
46

Como se vê, acertadamente, a decisão da Corte Constitucional não trata a vida como
um direito absoluto, abordando a dignidade da pessoa humana como valor preponderante nes-
te embate.
Ressalta-se que a Corte Constitucional da Colômbia, na mesma decisão (sentença
C239/97), estabeleceu cinco pontos para que a eutanásia ativa pudesse vir a ser realizada em
pacientes terminais, bem como exigia do Congresso a regulamentação do tema através de lei,
fato que ainda não ocorrera. Acerca dos requisitos para o paciente terminal vir a reivindicar
seu direito à eutanásia, destaca-se a sentença T970/14 (COLÔMBIA, 2014), que reafirmou
entendimento favorável à prática de procedimentos eutanásicos, além de ressaltar as condi-
ções para a efetivação de tal direito:

Existen cinco puntos fijados por la Corte que sirven como parámetros para realizar
esse procedimiento, al igual que medidas que el legislador debería adoptar. En pri-
mer lugar, (i) una verificación rigurosa del paciente, com el fin de corroborar la ma-
durez de su juicio y la voluntad inequívoca de morir. En segundo lugar, (ii) indica-
ción clara de los médicos que deben intervenir en el procedimiento. Em tercer lugar,
la forma y circunstancias bajo las cuales se debe manifestar el consentimiento. Em
cuarto lugar, (iii) las medidas que deben ser usadas por el médico para practicar la
eutanasia y, finalmente, en quinto lugar, (v) crear procesos educativos em relación
con valores como la vida para que esa decisión sea la última que se tome2.

Nesta mesma sentença, frente à inércia do Congresso, a Corte Constitucional orde-


nou que o Ministério da Saúde e Proteção Social que regulamentasse o conteúdo da decisão
proferida. Tal mandamento veio a ser cumprido em 2015, com a edição da resolução 1216
(MINISTERIO DE SALUD Y PROTECIÓN SOCIAL, 2015), de abril de 2015, que traz as
diretrizes acerca do procedimento para se exigir o direito de morrer com dignidade. Neste
sentido, Medina (2015, p. 50) ensina:

Cumpliendo la orden, el 20 de Abril de 2015, este Ministerio expidió la resolución


1216 que obliga a los hospitales a crear un comité para atender las solicitudes de
eutanásia activa, así como presentar los lineamientos generales para hacer efectivo
el derecho a morir com dignidade del paciente en fase terminal. De esta forma, Co-
lombia se convierte em el primer país em desarrollo en legalizar la eutanásia

terminais que experimentam intensos sofrimentos, o dever estatal de proteger a vida cede frente ao consentimen-
to informado do paciente, que deseja morrer de forma digna e neste caso o direito fundamental a viver de forma
digna implica o direito a morrer dignamente, pois condenar uma pessoa a prolongar sua vida quando não se
deseja e padece de intensas aflições, equivale a um tratamento cruel e desumano, uma anulação de sua dignidade
e de sua autonomia como sujeito moral (tradução livre).
2
Há cinco pontos fixados pelo Tribunal para servir como parâmetros para esse procedimento, bem como as
medidas que o legislador deve adotar. Em primeiro lugar, (i) uma verificação rigorosa do paciente, a fim de
corroborar a maturidade do seu juízo e vontade inequívoca de morrer. Em segundo lugar, (ii) uma indicação
clara dos médicos que devem intervir no processo. Em terceiro lugar, a forma e as circunstâncias em que devem
expressar o seu consentimento. Quarto lugar, (iii) as medidas que devem ser usados pelo médico para eutanásia
e, finalmente, em quinto lugar, (v) criar processos educativos, em relação aos valores da vida, para que esta deci-
são seja a última a ser optada (tradução livre).
47

activa, em los casos de enfermos terminales com dolores insoportables sin pers-
pectivas de mejora y que hayan expresado claramente su voluntad de morir,
incluso com anterioridad a la enfermedad3(grifo nosso).

Diante de tudo o que foi enfatizado, vê-se que a Colômbia encontra-se em um estágio
bem avançado de discussões acerca da eutanásia, tendo posição de destaque em relação ao
tema dentro da América do Sul.
Por fim, cabe ressaltar que já há casos da prática da eutanásia legal na Colômbia,
tendo o primeiro caso gerado imensa repercussão nacional e internacional (SEMANA, 2015).
Entretanto, obviamente que a discussão não irá se encerrar no país, trata-se de um tema con-
troverso e que sofre oposição brutal da Igreja Católica. Mesmo assim, a Colômbia deu impor-
tantes passos visando assegurar o direito a morrer com dignidade.

3.1.6 – França

Na França, berço de muitas ideias liberais e de defesa dos direitos de liberdade, há


muito tempo o debate acerca da eutanásia é travado e, até os dias de hoje, o embate é cercado
de polêmica, mesmo quando relacionado com sua forma passiva.
Alguns projetos de Lei, que legalizariam ou despenalizariam a eutanásia ativa em ter-
ritório francês, já foram apresentados, entretanto, nenhum, até o momento, veio a ser aprova-
do.
O debate acerca da eutanásia se intensificou e ganhou grande repercussão com o fatí-
dico caso de Vincent Humbert. Vincent era um bombeiro voluntário de 20 anos, entretanto, no
dia 24/09/2000, veio a sofrer grave acidente automobilístico que o deixou em coma por nove
meses. Saído do coma, descobriu-se que o jovem bombeiro havia ficado tetraplégico, cego e
mudo, conseguindo, apenas, exercer leve pressão com o polegar direito, meio este pelo qual
passou a se comunicar (FERREIRA JUNIOR, 2014).
Os pedidos de Vincent para a prática da eutanásia em si mesmo eram frequentes,
tendo feito, inclusive, solicitação ao Presidente Jacques Chirac a fim de assegurar o indulto
para que houvesse a possibilidade da prática da eutanásia e seu sofrimento chegasse ao fim,
entretanto, todos os pedidos foram negados. Foi sua mãe, em 24/09/2003, um dia antes do

3
Cumprindo a ordem, de 20 de abril de 2015, o Ministério emitiu a Resolução 1216 que obriga os hospitais a
criar uma comissão para responder a pedidos de eutanásia ativa, bem como apresentar as orientações gerais para
se efetivar o direito do paciente terminal de morrer com dignidade. Assim, Colômbia torna-se o primeiro país em
desenvolvimento a legalizar a eutanásia ativa em casos de doentes terminais com dor excruciante sem perspecti-
va de melhora, desde que manifestem claramente a sua vontade de morrer, mesmo antes da doença (tradução
livre).
48

lançamento de um livro em que Vincent defendia seu direito de morrer, que praticou a eutaná-
sia e finalmente terminou com o sofrimento do seu filho. Versando um pouco sobre o que
conta Vincent em seu livro, destaca-se VIERIA (2009, p. 138):

Tal procedimento foi combinado com Vincent, que não mais queria estar vivo quan-
do seu livro fosse lançado, no dia seguinte, tendo declarado que havia morrido
em 24/09/2000, e que, desde então, não vivia, apenas o faziam viver, isto é, era
mantido vivo, sem saber para quem ou para quê, chegando a dizer que era um
morto-vivo, e que jamais desejara aquela falsa morte (grifo nosso).

São casos assim que, talvez, deixam até o mais fervoroso opositor à eutanásia meio
balançado. Será que era necessário Vicent Humbert sofrer desse modo e por tanto tempo? Ele
estava mesmo vivendo? Ele não tinha o direito de morrer com dignidade, de deixar esta “vi-
da” de sofrimentos intensos? Parece absurdo que uma pessoa simplesmente seja obrigada a
permanecer viva em situação que esta considere em tais casos totalmente indigna e insuportá-
vel, não podendo acabar com seu sofrimento de forma digna, isto é, a eutanásia certamente
seria a saída mais humana para quem de fato interessa a situação, o paciente.
Como já destacado, o caso reacendeu os debates envolvendo uma possível legaliza-
ção da eutanásia em solo francês. Em 2005 veio a ser aprovada a Lei Leonetti, regulamentan-
do a possibilidade de serem interrompidos tratamentos inúteis para se evitar a distanásia. Seria
o equivalente a legalização da ortotanásia, levando-se em conta a visão doutrinária que distin-
gue eutanásia passiva e ortotanásia.
Recentemente a eutanásia veio ser forte tema de debate na última campanha presi-
dencial, ademais, houve um pequeno passo rumo à legalização do instituto em um futuro pró-
ximo, com o Parlamento aprovando a Lei do “sono profundo”, que, a pedido do enfermo, au-
torizaria o induzimento ao sono profundo de paciente em fase terminal até que chegue a hora
de sua morte. Trata-se de um passo rumo à legalização da eutanásia, a lei deve passar por vo-
tação no Senado, mas deve mesmo ser aprovada e sua repercussão foi positiva, ganhando a-
poio de uma boa parte dos franceses, que inclusive consideram que tal lei deveria vir a legiti-
mar a eutanásia ativa (FERREIRA, RITA, 2015).
Por fim, destaca-se o caso de Vincent Lambert, em coma desde 2008, onde sua espo-
sa trava uma briga com os pais de Vincent para que os aparelhos que mantém seu marido vivo
possam vir a ser desligados. Recentemente, o Tribunal Europeu de Direitos Humanos, corro-
borando com decisão anterior da Justiça Francesa, autorizou que fosse realizada a eutanásia
em Vincent Lambert (BBC, 2015).
Importante ressaltar que tal decisão legitimaria a utilização da eutanásia passiva e
não através da ortotanásia, no caso da adoção da distinção entre ambos, o que gera maior al-
49

voroço e pode servir de precedente para influenciar posicionamentos quanto à eutanásia em


todo o continente europeu. A expectativa é que a forma ativa venha a ser legalizada em terri-
tório francês em um futuro próximo.

3.1.6 – Inglaterra

A Inglaterra foi o berço da primeira organização a lutar em prol da legalização da eu-


tanásia, anteriormente chamada de EXIT, agora intitulada Voluntary Euthanasia Society, esta
organização encabeça um movimento que cada vez mais ganha apoio na luta pela legalização
deste controverso instituto que é a eutanásia.
Mesmo com atuação ativa desta organização, atualmente a eutanásia não é legalizada
em solo inglês, pelo contrário, é considerado homicídio, como ensina Vieira (2009, p. 131):

Apesar de tudo isso, a prática da eutanásia ativa ainda não foi legalizada na-
quele país. A jurisprudência considera homicídio voluntário o ato de matar volunta-
riamente um paciente com a administração de uma substância letal. Para tanto, é ne-
cessário que o agente tenha causado a morte, com intenção de fazê-lo (grifo nosso).

Cabe destacar que a chamada eutanásia de duplo efeito é permitida, ou seja, o médi-
co pode receitar ao paciente uma dose não letal de medicamento que reduza a dor do enfermo,
mesmo que aquele saiba que, como efeito secundário, a vida do paciente será abreviada.
Ademais, na Inglaterra cabe o chamado testamento vital, bastante útil para os casos
em que o enfermo venha a perder a consciência e não possa mais tomar decisões a respeito de
sua saúde. Sobre isso, destaca a professora Vieira (2009, p. 132):

Os ingleses têm o direito de redigir um testamento vital, que será útil em caso de se
tornarem incapazes de exprimir validamente sua vontade. No caso dos pacientes em
estado vegetativo persistente, podem-se suspender as medidas de sustentação da vi-
da, havendo acordo entre a equipe médica e a família.

Assim, observa-se que a ortotanásia ou eutanásia passiva, a depender da corrente que


se adote, é permitida pelo ordenamento jurídico inglês. Destaca-se, também, que o suicídio
assistido, tal como a modalidade ativa, é considerado ilegal na Inglaterra.
Importante ressaltar o caso de Tony Nicklinson, inglês de 58 anos e portador da rara
Locked-in Syndrome, doença que paralisa todos os músculos do corpo, deixando o paciente
mudo e totalmente paralisado, exceto por movimentos com os olhos, embora mantenha a
consciência. Tony entrou com ação perante a Justiça inglesa requisitando a antecipação de sua
morte através da eutanásia ativa, porém, a Corte de Apelação da Inglaterra negou-lhe o pedi-
50

do, afirmando que a prática é ilegal no país e que só o Parlamento poderia modificar tal en-
tendimento (PINHEIRO, 2013).
Tony Nicklinson veio a falecer dias depois de ter seu pedido negado pela Justiça da
Inglaterra, sua morte se deu de causas naturais após permanecer dias em greve de fome e ge-
rou imensa repercussão na imprensa e na sociedade.
Apesar disso, mesmo com o crescimento da Voluntary Euthanasia Society, ainda há
um caminho razoável a se percorrer em busca da legalização da eutanásia na Inglaterra. Tal
regulamentação, diferentemente da França, não deve ocorrer num espaço curto de tempo, fa-
zendo com que a eutanásia permaneça ilegal e sendo considerado homicídio.

3.1.6 – Estados Unidos

Os Estados Unidos sempre se diferenciam da maior parte dos outros países do mundo
quando há de se fazer uma análise de seu sistema jurídico em relação a qualquer que seja o
instituto que esteja em estudo. Ora, em razão da grande liberdade dada aos Estados que com-
põe a Federação, muitas vezes há diplomas legais de Estados diferentes legislando os mesmos
assuntos só que em posições contrárias.
Entretanto, a eutanásia propriamente dita, ou seja, a forma ativa, é proibida por lei
Federal, nenhum dos Estados americanos possui permissão para legalizar a eutanásia, uma
vez que o tema seria de competência legislativa da União, como decidiu a Suprema Corte
Americana. Neste sentido, Pimentel (2012, p. 92) disserta:

Nos Estados Unidos, a lei federal não autoriza a eutanásia. Embora a autonomia
dos Estados membros da federação seja bem ampla, inclusive no que diz respeito ao
tratamento de pacientes terminais, a Suprema Corte definiu que tal matéria (eu-
tanásia) seria de competência legislativa privativa da União (grifo nosso).

Ainda que o ordenamento jurídico americano proíba de forma categórica a realização


da eutanásia, a Suprema Corte Americana não restringe a possibilidade dos Estados que com-
põe a federação legislarem sobre a legalização do suicídio médico assistido. Neste sentido
informa Vieira, destacando ensinamentos de Rotman (2001, p. 19, apud VIEIRA, 2009, p.
127):

Segundo Rotman, a Suprema Corte deixou subentendido que inexistem barrei-


ras constitucionais para que um Estado aprove lei permitindo o suicídio assisti-
do por um médico, o que foi feito pelo Estado de Oregon. Dessa Forma, esclare-
ceu-se que o debate deveria continuar em nível estadual (grifo nosso).
51

Com tal possibilidade, Oregon, Washington, Montana, Vermont e Califórnia com-


põem um rol de cinco Estados americanos que atualmente permitem a prática do suicídio as-
sistido de forma legal, como ressalta Castro (2016, p. 358):

O suicídio assistido é legalizado em cinco dos cinquenta estados dos Estados U-


nidos: Oregon, Washington, Montana, Vermont e Califórnia . O Novo México
aprovou legislação condizente com a prática em 2014, mas a decisão foi revertida
em segunda instância, em agosto de 2015 . Já a eutanásia é proibida em todos os
estados  (grifo nosso).

O Estado de Oregon adquire grande relevância na questão do suicídio assistido em


território norte-americano, pois foi o primeiro dos Estados-membros da federação a legalizar
tal prática, além de ter servido de base legislativa para legalização do suicídio médico assisti-
do nos outros entes que vieram a regular tal instituto como permitido.
Em suma, tal Lei passou a permitir que um adulto domiciliado no Estado de Oregon
pudesse vir a pleitear por escrito que o médico lhe prescrevesse uma dose letal de determina-
do medicamento para que a pessoa pudesse vir a praticar o suicídio assistido. Obviamente que
para tal requerimento é necessário que o paciente seja portador de doença grave, incurável e
em estado terminal, tendo sido diagnosticado por pelo menos dois médicos.
Com a aprovação da Lei, que legaliza o suicídio assistido na Califórnia, a permissão
deste instituto em território americano se expandiu para o quinto estado, embora a Eutanásia
ainda não seja admitida de forma alguma em sua modalidade ativa. Uma análise de caso em
que o paciente atenda a todos os atributos para requerer o suicídio assistido, mas que seja in-
capaz de tomar a medicação prescrita pelo médico seria interessante. Será que por esta inca-
pacidade o paciente teria que permanecer sofrendo até o fim de seus dias ou permitiriam a
prática da eutanásia? Parece um tanto quanto contraditório a não incorporação do instituto da
eutanásia.
Em que pese o debate acerca da eutanásia e suicídio assistido não ter chegado a este
ponto, as Cortes e ordenamentos jurídicos americanos têm histórico de defesa pelos interesses
e liberdades individuais. Importante é a contribuição da Natural Death Act (Lei da Morte Na-
tural), que dá o direito ao paciente de estabelecer um testamento vital, a fim de deixar claro
quais procedimentos médicos está disposto ou não a passar em caso de não poder manifestar
sua vontade no momento, mesmo que a negativa de tais processos o faça ter sua vida abrevia-
da. Neste sentido, Dias (2012, p. 165) explica:

Depois desse rumoroso caso, o Estado da Califórnia aprovou, em 1976, uma lei (Na-
tual Death Act) reconhecendo o testamento vital (living will) com um dos documen-
tos que permitem ao signatário, antecipadamente, estabelecer as diretrizes acerca ds
52

procedimentos médicos que não devem ser usados para mantê-lo vivo, bem como
isenta de responsabilidade civil e criminal os profissionais de saúde que o respeita-
rem.

Tal diploma legal serviu de precedente para resolução de alguns casos envolvendo
supressão de tratamento de pessoas que se encontravam em estado vegetativo permanente,
embora sempre houvesse disputas jurídicas quanto ao desligamento ou não de aparelhos. Em
um dos casos, de Nancy Cuzan, a Suprema Corte admitiu a possibilidade de desligamento dos
suportes vitais, se fosse realmente a vontade do paciente, levantando-se a dúvida se seria uma
decisão que passava a legalizar a eutanásia passiva.
Parece que sim, uma vez que ao deixar um testamento vital estabelecendo quais tra-
tamentos não poderiam ser utilizados, em caso de quadro complicado e que o paciente não
mais tenha como declarar sua vontade, seria uma brecha para que a forma passiva de eutaná-
sia fosse admitida, uma vez que a dispensa de determinado tratamento certamente estaria an-
tecipando a morte do enfermo, por meio desta omissão ou supressão. Neste sentido, posicio-
na-se Vieira (2009, p. 129):

Embora sejam bastante liberais com relação à disponibilidade de direitos, inclusive


daqueles que são inerentes à personalidade humana, os Estados Unidos ainda não
firmaram posição efetivamente favorável à legalização da eutanásia ativa. Di-
versa é a situação no tocante à eutanásia passiva, sendo cada vez mais enfática
a afirmação do direito de qualquer pessoa a deixar registrada sua manifestação
de vontade acerca do tratamento que pretende lhe seja dispensado, no final da
vida, expressando se aceita ou não a aplicação de meios de manutenção da vida
e de reanimação (grifo nosso).

O tema, assim como em basicamente o resto do mundo, segue muito controvertido e


gera grande polêmica cada vez que vem a tona por meio de propostas que visem expandir o
instituto do suicídio assistido ou mesmo legalizar a prática da eutanásia. A população mostra-
se dividida quanto à hipótese de legalização, há muitos apoiadores desde o século passado,
que ficou evidenciado após a atuação do doutor Jack Kevorkian. No obstante, não se vislum-
bra num futuro próximo uma legalização deste instituto, mas, em um país em que alguns Es-
tados utilizam a pena de morte, não seria estranho se os debates se aprofundassem e a eutaná-
sia viesse a ser legalizada.

3.1.7 – Demais Ordenamentos

Os países destacados acima têm relevância por serem os que apresentam mais expe-
riência na aplicação ou discussões acerca da eutanásia em todo o mundo. Muitas nações ainda
53

não possuem um desenvolvimento de debates tão vasto acerca deste tema ou seu ordenamento
jurídico não dispõe nada de forma direta ao referido instituto.
Talvez seja este o caso do Brasil, que, como se verá a seguir, não possui nada especí-
fico à eutanásia em seu ordenamento jurídico, embora seja considerada uma espécie de homi-
cídio privilegiado.
Entretanto, cada vez mais os movimentos pró-eutanásia vêm ganhando força ao redor
do mundo. Importante destacar que Luxemburgo, seguindo os exemplos de seus vizinhos,
Holanda e Bélgica, veio a legalizar a eutanásia em 2009, em moldes bem similares ao encon-
trado nas duas nações acima citadas:

A lei de Luxemburgo se assemelha a da Holanda e da Bélgica, pois exige que a eu-


tanásia só possa ocorrer em pacientes com doenças incuráveis, por solicitação da
própria pessoa maior de idade e com a avaliação prévia de dois médicos e por um
painel de peritos (GOLDIM 4, 2014).

Liberada desde o ano passado pela Suprema Corte do Canadá, a eutanásia veio a ser
legalizada em território canadense em junho deste ano. A partir do momento citado, o Canadá
passou a admitir de forma legal a eutanásia ativa praticada por médicos e o suicídio médico
assistido, devendo o paciente possuir mais de 18 anos, estar em estágio terminal de doença
incurável, requer o pedido por vontade própria, ser acometido de grave sofrimento, tendo pa-
recer de outro médico sobre o diagnóstico e havendo um espaço de tempo entre o pedido e a
realização da eutanásia de no mínimo 10 dias (CANADÁ, S/D). A legalização do instituto
representou grande avanço em busca do direito do paciente morrer dignamente.
Obviamente, há ordenamentos jurídicos que não admitem a eutanásia e que tal insti-
tuto terá um caminho árduo em busca de sua legalização, sendo Brasil e Itália, países de forte
influência católica, exemplos desta colocação. Entretanto, cada vez cresce mais no mundo o
número de defensores e tendências a se legalizar este controverso instituto nos mais diversos
ordenamentos jurídicos.
54

CAPÍTULO 4: LEGALIZAÇÃO DA EUTANÁSIA – ASPECTOS JURÍDICOS E


CONSTITUCIONAIS

Passada a abordagem de conceitos, classificações, aspectos gerais e enfoque no direi-


to comparado acerca da eutanásia e os direitos fundamentais, o presente capítulo vem a anali-
sar os aspectos constitucionais do instituto no ordenamento jurídico brasileiro.
Será abordado o atual tratamento dispensado à eutanásia no ordenamento jurídico pá-
trio, os argumentos a favor e contrários a legalização do instituto, bem como uma abordagem
específica da constitucionalidade da eutanásia. Por fim, um exame relacionado ao testamento
vital no direito brasileiro.

4.1 – EUTANÁSIA NO BRASIL

4.1.1 – Tratamento Atual da Eutanásia no Direito Brasileiro

Como já relatado em alguns trechos desta pesquisa, o ordenamento jurídico brasileiro


não regulamenta a eutanásia de modo específico. Entretanto, em que pese a falta de tratamen-
to particular, a eutanásia é considerada como ato criminoso em nosso ordenamento legal. So-
bre isso, Castro (2016, p. 361) escreve:

Apesar de ainda não regulamentada, a questão no Brasil vem sendo amplamente


discutida entre médicos, filósofos, religiosos e profissionais do direito, que buscam a
melhor forma de inseri-la em nosso ordenamento jurídico. A eutanásia é conside-
rada crime de homicídio, segundo o artigo 121 do Código Penal, e, dependendo
das circunstâncias, a conduta do agente também pode configurar-se como crime de
induzimento, instigação ou auxílio ao suicídio, como consta no artigo 122 (grifo
nosso) .

Em mesmo sentido, Assumpção (2014, p. 44) discorre:

O ordenamento jurídico-penal brasileiro silencia quanto à eutanásia. Não há


tipo penal com este nomen iuris. A norma mais próxima que se vislumbra no
Código Penal é o homicídio “privilegiado”, praticado por motivo de relevante va-
lor social ou moral. Nesses casos, o agente do delito estaria impelido por sentimento
de compaixão, impondo-se a redução da pena por conta do menor juízo de censura
que recai sobre a conduta (grifo nosso).

Majoritariamente, a doutrina brasileira considera a prática da eutanásia como conduta


criminosa, variando-se o posicionamento quanto à sanção de homicídio comum ou a chamada
forma privilegiada. Guimarães (2009, p. 283), dissertando sobre os diversos pareceres da eu-
tanásia no ordenamento jurídico pátrio, leciona:
55

Assim, é que já se defendeu a fixação da eutanásia como homicídio, até mesmo


agravado, por ser entendida como uma forma de matar alguém que não teve possibi-
lidade de defesa, ou a teve dificultada, ou ainda porque o agente agira fútil ou tor-
pemente, guiado por sentimento egoístico ou meramente econômico. Também já se
compreendeu a eutanásia como sendo um delito de homicídio simples, sem qua-
lificadoras ou majorantes, de um lado, mas também ausentes quaisquer especi-
ais atenuações, de outro (grifo nosso).

Em que pese esta gama variada de entendimentos acerca da eutanásia no ordenamen-


to penal brasileiro, prevalece majoritariamente na doutrina brasileira a posição de que a euta-
násia se caracteriza como homicídio privilegiado, reduzindo-se sensivelmente a pena ao agen-
te. Assim, Guimarães (2009, p. 283) ensina:

Posicionamento bastante amplo, outrossim, mormente na doutrina pátria, foi de con-


siderar a eutanásia um homicídio, porém admitida ao agente sancionado a concessão
da figura do privilégio. O homicídio privilegiado, assim, costumou ser a fórmula
aceita para a solução de casos relativos aos chamados homicídios piedosos (grifo
nosso).

Em mesmo sentido, Sá (2015, p. 191) leciona:

A eutanásia, nas suas diversas formas, vem sendo tratada pelo Direito Penal pátrio
como homicídio, ainda que privilegiado. Do conteúdo da regra do art. 121, § 1°, do
Código Penal, depreende-se que o ato de tirar a vida de outrem que se encontre em
grande sofrimento pode ser considerado motivo de relevante valor moral e, por isso,
o agente que praticar o delito terá sua pena reduzida de um sexto a um terço.

Dentre as hipóteses de homicídio simples ou privilegiado, parece ser muito mais ra-
zoável o posicionamento quanto à eutanásia ser configurada como espécie privilegiada de
homicídio. Embora tais posicionamentos não se enquadrem com o entendimento desta pesqui-
sa, que analisa o instituto como legal, parece que a redução da pena se mostra mais razoável,
uma vez que a eutanásia seria realizada com o objetivo de se retirar o paciente dos intensos
sofrimentos e dores que o mesmo está acometido, tendo relação com o disposto no § 1°, do
art. 121, Código Penal.
Apesar disso, a legalização da eutanásia vem ganhando cada vez mais defensores em
terras tupiniquins, ainda que, não com a intensidade que se observa em outras nações, fato
este motivado pelo aspecto religioso que vigora no Brasil. Em sua maioria, os argumentos
possuem viés constitucional e serão aprofundados com o transcorrer deste capítulo, entretanto,
mesmo da seara penal, que não é o foco da presente pesquisa, advém argumentos que defen-
dem a legalização ou não criminalização da eutanásia, conforme expõe Guimarães (2009, p.
283):
56

Existe ainda, por evidência, de tempos em tempos, com mais ou menos força, quem
defenda a aplicação de excludentes ou dirimentes para os casos de eutanásia. A
fórmula de excludente de tipicidade foi defendida, dentre outros argumentos,
porque ausente o dolo homicida propriamente dito. Também houve posiciona-
mento que enxergava, na hipótese, uma causa de excludente de ilicitude, ou en-
tão uma situação em que estivesse excluída a culpabilidade, ou ainda uma cir-
cunstância de isenção de pena, chegando-se às escusas absolutórias, à graça ou
o perdão judicial. Mais recentemente, outrossim, verificou-se a defesa do entendi-
mento de que não seria função do Direito Penal preocupar-se com casos de eutaná-
sia, ou ao menos de quê, diante do que se compreende como função ou necessidade
da pena, não seria razoável sancionar-se o agente que praticou uma conduta eutaná-
sica. Dai adveio também a idéia de que não se poderia imputar objetivamente
uma responsabilidade penal a esse agente, anotada a noção de que com tal con-
duta não teria incrementado qualquer risco que, em princípio, seria permitido
(grifo nosso).

Como já relatado, o tema não possui atenção tão intensa quanto em outros países, en-
tretanto, a eutanásia recebe grande repercussão da mídia e da sociedade, a cada proposta de
legalização ou tipificação do referido instituto, como se verá no tópico a seguir.
Por fim, ressalta-se que a prática da ortotanásia é permitida pelo ordenamento jurídi-
co brasileiro, a resolução 1805/2006, do Conselho Federal de Medicina, autoriza os médicos a
realizar a ortotanásia, desde que seja vontade do paciente, conforme o disposto no art. 1° da
referida resolução: “É permitido ao médico limitar ou suspender procedimentos e tratamentos
que prolonguem a vida do doente em fase terminal, de enfermidade grave e incurável, respei-
tada a vontade da pessoa ou de seu representante legal” (CONSELHO FEDERAL DE ME-
DICINA, 2006).
Tal resolução veio a ser alvo de ações judiciais por parte do Ministério Público Fede-
ral, mas a decisão judicial proferida foi no sentido da validade da resolução que permitia a
ortotanásia em nosso território. Ocorre que, esta resolução gerou enorme confusão no mundo
jurídico brasileiro, uma vez que alguns juristas a criticavam por ela, no entender deles, passar
a permitia a forma passiva da eutanásia.
Parece que tal confusão vem da dificuldade já apontada em se distinguir ortotanásia
de eutanásia passiva, alguns doutrinadores entendem que ambas as práticas, na verdade, se
caracterizam como institutos iguais, sendo sinônimos. Outros conceituam os institutos de
formas distintas, os diferenciando pela utilidade que os tratamentos suspensos ou omissos
teriam para o quadro de saúde do paciente, como leciona Guimarães (2009, p. 157):

Anote-se, de qualquer modo, que parece mesmo ser mais conveniente, sobretudo pa-
ra fins de apreciação de cada uma das condutas no seu aspecto jurídico, o posicio-
namento de que a ortotanásia, como alhures indicado, a despeito de comumente ser
tida como termo sinônimo da expressão eutanásia passiva, com ela não confun-
dir-se, já que enquanto esta significa a deliberada suspensão ou omissão de me-
didas indicadas no caso concreto, antecipando-se a morte, aquela consiste na
omissão ou suspensão de medidas cuja indicação, por se mostrarem inúteis na
57

situação, já se mostraram perdidas, não se abreviando o período vital (grifo


nosso).

A diferença mostra-se bastante complexa, mas esta é a corrente dominante na doutri-


na tradicional, não permitindo que o paciente, no gozo de sua autonomia, escolha por não se
submeter a tratamento que na opinião dos médicos pudesse vir a ser útil, fato este que caracte-
rizaria a eutanásia passiva. Tal posicionamento parece não estar em consonância com o dis-
posto na Constituição Federal de 1988, fundamentalmente se levarmos em conta a dignidade
da pessoa humana, núcleo de ordenamento jurídico brasileiro, o direito à liberdade, autonomia
e o direito assegurado a todas as pessoas de não se submeter a tratamento degradante.
A despeito de todas estas considerações, no cenário atual, as duas espécies de eutaná-
sia, nas formas ativa e passiva, são consideradas condutas ilícitas, classificando-se como ho-
micídio qualificado, conforme o disposto no art. 121, § 1°, do Código Penal.

4.1.2 – Projeto de Lei 236/2012

Ao longo do tempo surgiram algumas propostas visando a regulamentar a eutanásia


no ordenamento jurídico penal brasileiro como tipo específico. A primeira proposta que veio a
efetivamente gerar polêmica data de 1984, que objetivava a reforma do Código Penal de 1940
e possuía autoria de Nelson Hungria. Porém, tal projeto somente veio chegar ao Congresso
Nacional em 1999, trazendo como conteúdo a legalização da ortotanásia, no sentido daqueles
que diferenciam este instituto da forma eutanásia passiva, e diminuía ainda mais a pena para a
conduta eutanásica, conforme o disposto nos dispositivos presentes no anteprojeto:

Eutanásia: art. 121, § 3º Se o autor do crime agiu por compaixão, a pedido da víti-
ma, imputável e maior, para abreviar - lhe sofrimento físico insuportável, em razão
de doença grave: Pena - Reclusão, de três a seis anos.
Exclusão de ilicitude: art. 121, § 4º Não constitui crime deixar de manter a vida de
alguém por meio artificial, se previamente atestada por dois médicos, a morte como
iminente e inevitável, e desde que haja consentimento do paciente, ou na sua impos-
sibilidade, de ascendente, descendente, cônjuge, companheiro ou irmão. (grifo nos-
so) (CERNICCHIARO, 1999).

Tal projeto não veio a ser convertido em lei, seguindo a eutanásia sem regulamenta-
ção específica no ordenamento jurídico brasileiro. No obstante, recentemente, o projeto de Lei
236/2012 (BRASIL, 2013) veio a ser apresentado no Senado Federal, a referida proposta de
reforma do Código Penal traz a eutanásia como um de seus conteúdos, gerando bastante re-
percussão e trazendo o tema novamente a tona das discussões (SIQUEIRA, 2012).
58

O PL 236, de 2012, propõe a regulamentação específica da eutanásia no ordenamen-


to jurídico brasileiro como ilícito penal, entretanto, traz a possibilidade de a conduta vir a não
ser sancionada, onde o juiz poderia não aplicar pena ao agente a depender do caso concreto.
Além disso, ratifica a posição de legalidade da ortotanásia no regramento pátrio, conforme o
disposto a seguir (BRASIL, 2013):

Eutanásia: art. 122 – Matar, por piedade ou compaixão, paciente em estado terminal,
imputável e maior, a seu pedido, para abreviar-lhe sofrimento físico insuportável em
razão de doença grave: pena – prisão, de dois a quatro anos.
§ 1° - O juiz deixará de aplicar a pena avaliando as circunstâncias do caso, bem co-
mo a relação de parentesco ou estreitos laços de afeição do agente com a vítima.
Exclusão de ilicitude: § 2° - Não há crime quando o agente deixa de fazer uso de
meios artificiais para manter a vida do paciente em caso de doença grave irreversí-
vel, e desde que essa circunstância esteja previamente atestada por dois médicos e
haja consentimento do paciente, ou, na sua impossibilidade, de ascendente, descen-
dente, cônjuge, companheiro ou irmão.

Como todo assunto relacionado à eutanásia, o proposto no PL n° 236/2012 causou


intensa divergência entre a doutrina que analisa o instituto supracitado. Os favoráveis à legali-
zação do referido instituto não viram com bons olhos o conteúdo previsto no projeto de re-
forma do Código Penal, afinal a eutanásia seguia sendo tipificada como crime e mesmo a pos-
sibilidade de perdão judicial não serviu para agradar esta parte da doutrina, como se pode ob-
servar na lição de Sá (2015, p. 193):

Um aspecto importante para a reflexão é o que está disposto no § 1° do Projeto de


Lei n° 236/2012. O ato constitui crime, mas é possível o perdão judicial. Ora, quem
praticará a eutanásia (pensemos no médico que detém as informações necessárias),
sabendo que a atitude só não culminará na pena de prisão caso o juiz entenda que as
circunstâncias do fato permitiam a realização do ato?

Criticando o proposto pelo Projeto de Lei no que tange à eutanásia, Ferreira (2015, p.
349) discorre:

Embora alguns estudiosos do Direito Penal tenham recebido a notícia da inclu-


são da eutanásia no anteprojeto do Código Penal como um avanço legislativo,
dada a coragem de tratar de um tema tão controverso, ousa-se discordar da
mencionada concepção. Reitera-se o posicionamento exposto para ratificar a ideia
de que criminalização da eutanásia, ainda que com penas infinitamente menores do
que aquelas previstas para o crime de homicídio simples e com a possibilidade de
extinção de punibilidade nas circunstâncias previstas no §1º, não é o meio apropria-
do para trazer à baila a discussão sobre a eutanásia.
Não se pode criminalizar uma conduta que definitivamente não preenche os e-
lementos de ilicitude e tipicidade, ainda que o objetivo maior seja salvaguardar a
conduta dos agentes que praticam a eutanásia para abreviar o sofrimento físico insu-
portável decorrente de uma doença grave e irremediável (grifo nosso).

Por outro lado, os que mais fortemente defendem sua contrariedade em relação à prá-
tica da eutanásia também não se satisfizeram com a proposta disposta no projeto de Lei, pois
59

não admitem em hipótese alguma que a conduta eutanásica não seja punida penalmente. As-
sim destaca Quixaba (2016, p. 41):

Atualmente no senado existe uma discussão muito grande de quem critica esse arti-
go, pois a bancada evangélica não aceita de forma alguma que seja possível a
não punição de quem comete a morte de alguém – veem isso como algo sem que
possa ter exceções. Além é claro dos outros temas abordados que tem um mesmo
pensamento todo e qualquer ato contraria a sobrevivência do paciente mesmo em
circunstancias relevantes não caberia à morte como fim eficaz (grifo nosso).

Segundo o pressuposto por cada lado desta celeuma jurídica, se mostra bastante pre-
visível a crítica ao texto legal do PL 236/2012, uma vez que claramente o conteúdo disposto
não agrada de forma completa a nenhum dos lados. O legislador parece ter tido o objetivo de
inovar, mas não adotou, pelo menos no que tange à eutanásia, ideias de caráter mais liberal.
Acertada se mostra a crítica dos defensores da legalização da eutanásia. Além do ins-
tituto estar sendo tipificado como conduta ilícita, posicionamento paternalista e divergente
para com a dignidade da pessoa humana e autonomia da pessoa (pontos que serão mais apro-
fundados a seguir), mesmo na hipótese de concessão do perdão judicial, disposta no art. 122,
§1°, o legislador peca pela obscuridade com que trata o assunto, não deixando claro em ne-
nhum momento os requisitos para que o agente possa vir a praticar a eutanásia, entendendo-se
a forma já conceituada na presente pesquisa, sem ser penalizado, motivo este que, como já
destacado acima por Sá, gera imensa insegurança jurídica e relutância do profissional de saú-
de em realizar a conduta eutanásica.
Em que pese esta ponderação, o texto legal disposto no PL 236/2012 mostra um a-
vanço, embora muito pequeno, das ideias relacionadas ao instituto da eutanásia, uma vez que
outrora seria inconcebível a reles disposição do perdão judicial pela prática de tal conduta.
Não é o ideal, mas, ao menos, para que se configura o início de um avanço.

4.2 – NÚCLEO DA DIVERGÊNCIA EM RELAÇÃO À EUTANÁSIA: ASPECTOS


CONSTITUCIONAIS

Este tópico talvez seja o mais importante de toda a pesquisa. Através da análise dos
direitos garantidos pela Constituição de um país é possível entender o ordenamento jurídico
de determinada nação.
Para se compreender toda a complexidade em torno da eutanásia e se tentar chegar a
respostas jurídicas que se apresentem em conformidade com o ordenamento jurídico pátrio, é
de suma importância uma análise da Constituição Federal de 1988, fundamentalmente no que
60

tange à dignidade da pessoa humana e os direitos à vida e à liberdade (este na forma de auto-
nomia de vontade).

4.2.1 – A Disponibilidade e o Caráter Relativo do Direito à Vida

Já se abordou acerca do direito à vida durante esta pesquisa (ver tópico 2.2), ressal-
tando aspectos gerais e o histórico deste direito fundamental ao longo da evolução da huma-
nidade.
No obstante, cabe uma análise mais específica aos aspectos constitucionais que tal
bem adquire no ordenamento brasileiro. Assim, o diploma constitucional traz, a priori, a vida
como um direito fundamental inviolável, conforme dispõe o caput, do art. 5°. da Constituição
Federal de 1988:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garan-
tindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade
do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos
termos seguintes (grifo nosso) (BRASIL, 1988).

Como já ressaltado em tópico anterior, o ordenamento jurídico pátrio não absorve o


bem vida unicamente em sua acepção biológica ou física, adota-se o caráter duplo da vida, ou
seja, no direito brasileiro este bem assume contornos não apenas de um ciclo biológico-
temporal, mas também ganha acepção de dignidade de existência. Assim explica Sá (2015, p.
74):

Tem-se que não se pode privilegiar apenas a dimensão biológica da vida huma-
na, negligenciando a qualidade de vida do indivíduo. [...] O ser humano tem ou-
tras dimensões que não somente a biológica, de forma que aceitar o critério da
qualidade de vida significa estar a serviço não só da vida, mas também da pes-
soa. O prolongamento da vida somente pode ser justificado se oferecer às pessoas
algum benefício, ainda assim, se esse benefício não ferir a dignidade do viver e do
morrer (grifo nosso).

Em mesmo sentido, destaca-se o ensinamento de José Afonso da Silva (2014, p.


199):

Vida, no texto constitucional (art. 5º, caput), não será considerada apenas no
seu sentido biológico de incessante autoatividade funcional, peculiar à matéria
orgânica, mas na sua acepção biográfica mais compreensiva. Sua riqueza signifi-
cativa é de difícil apreensão porque é algo dinâmico, que se, transforma incessante-
mente sem perder sua própria identidade (grifo nosso).
61

Tal sentido, atribuído pelo ordenamento jurídico brasileiro à vida, é de suma impor-
tância para uma análise mais concreta de toda a problemática da legalização da eutanásia no
direito pátrio.
Com efeito, a inviolabilidade atribuída à vida pela Constituição Federal de 1988 gera
intensos debates e possivelmente é o grande x da questão na conflituosa discussão acerca da
possibilidade de legalização da eutanásia no regramento brasileiro, pois, se utilizando desta
premissa, a parte da doutrina contrária à eutanásia confere caráter absoluto à vida, diversa-
mente do aspecto relativo defendido pelos advogados da legalização do instituto. Neste senti-
do, Ferreira (2015, p. 351) escreve:

A manutenção da vida em Kant é concebida como um dever absoluto que não admi-
te nenhuma limitação externa que não esteja voltada à sua preservação. Esse dever
se sobrepõe inclusive à liberdade e à autonomia do sujeito, permitindo que se chegue
à concepção de vida como obrigação e não como direito. Parte considerável da
doutrina do Direito Civil brasileiro parece anuir à concepção da vida como
‘bem jurídico absoluto’ (grifo nosso).

Defendendo a total indisponibilidade deste direito frente à possibilidade da realiza-


ção da eutanásia, Vieira (2015, p. 76) destaca em sua obra:

A indisponibilidade de tal direito é destacada com grande ênfase por todo e


qualquer cientista e jurista realmente preocupado com a defesa da pessoa hu-
mana e de sua dignidade, ressaltando Carlos Alberto Bittar, entre outros juristas,
que não existe um “direito sobre a vida”, mas, sim, um “direito à vida”, verdadeiro
direito subjetivo de caráter negativo, exigindo respeito por todos os membros
da comunidade, inclusive por parte do próprio titular (grifo nosso).

Ao discorrer sobre o que chama de sacralidade da vida, Siqueira-Batista (2005, p.


115) explica:

Segundo esta premissa absoluta, a vida consiste em um bem – concessão da di-


vindade ou manifestação de um finalismo intrínseco da natureza –, possuindo assim
um estatuto sagrado – isto é, incomensurável do ponto de vista de todos os “cálcu-
los” que possam, eventualmente, ser feitos sobre ela –, não podendo ser interrom-
pida, nem mesmo por expressa vontade de seu detentor (grifo nosso).

Ainda sobre o caráter absoluto e inviolável do direito à vida, destaca Krastins (2006,
p. 41):

A vida é o bem supremo do ser humano. E como tal é protegida pelo ordena-
mento jurídico, tendo prevalência sobre qualquer outra espécie de direito. Nes-
ses termos, havendo conflito entre o direito à vida e qualquer outro direito, o
primeiro sempre prevalecerá, pelo princípio do primado do mais relevante. Pois
é a partir deste direito que defluem todos os demais; assim, devemos compreender
o direito à vida como a base e o fundamento de todo o aparato jurídico. Sem a
vida, não há que se falar em direito (grifo nosso).
62

A doutrina clássica entende pela inviolabilidade do direito à vida, negando veemen-


temente a legalização da eutanásia no direito brasileiro, embora nem todos confiram, pelo
menos em teoria, o caráter absoluto ao direito à vida.
Por outro lado, a corrente doutrinária em favor da legalização da eutanásia, que cres-
ce com o transcorrer do tempo, defende a ideia de que a vida possui caráter relativo e não ab-
soluto, pois se assim não fosse, muitas vezes, principalmente nos casos passíveis da prática de
eutanásia, se estaria falando em dever de viver e não direito à vida. Neste sentido, destaca-se a
lição de Dias (2012, p. 122):

A expressão “inviolabilidade do direito à vida”, consagrada constitucionalmen-


te, não indica que a vida é um dever para consigo mesmo e para com outros,
tampouco pode ser entendida como um direito absoluto, indisponível e irrenun-
ciável. Nos termos da Constituição, a “inviolabilidade” de tal direito significa que
ele não tem conteúdo econômico-patrimonial e, mais do que isso, ninguém pode ser
privado dele arbitrariamente (grifo nosso).

Também seguindo este posicionamento, Ribeiro (2006, p. 1750) entende que a vida é
um direito renunciável para o seu titular e que, se assim não fosse, estaria configurado um
dever de viver e não um direito.
Ora, como já destacado nesta pesquisa (ver tópico 2.1.2), os direitos fundamentais
não possuem natureza absoluta, tendo como essência o caráter relativo. Assim sendo, não há
que se falar em caráter absoluto ou indisponibilidade da vida, mesmo porque o ordenamento
jurídico brasileiro não assegura esta premissa.
Como bem asseveram alguns doutrinadores, a Constituição Federal de 1988 traz de
forma expressa a inviolabilidade da vida e não sua indisponibilidade. Ora, há que distinguir o
que o emprego de cada termo proporciona para o ordenamento jurídico brasileiro, o primeiro,
que vem a ser assegurado pela Constituição, diz respeito à proteção de determinados direitos
quanto à ação do Estado ou de terceiros, enquanto o último termo tem relação quanto à possi-
bilidade ou não de se dispor de algum direito. Elucidando a questão (BASTOS, 2009):

Insista-se, neste ponto, que a Constituição acaba por assegurar, tecnicamente fa-
lando, a inviolabilidade do direito à vida, assim como o faz quanto à liberdade,
intimidade, vida privada, e outros tantos valores albergados constitucionalmen-
te. Não se trata, propriamente, de indisponibilidade destes direitos. Realmente,
não há como negar juridicidade a ocorrências nas quais pessoas se despojam intei-
ramente, v.g., de sua privacidade. Não se vislumbra qualquer cometimento de um
ato contrário ao Direito em tais circunstâncias. Por inviolabilidade deve compre-
ender-se a proteção de certos valores constitucionais contra terceiros. Já a in-
disponibilidade alcança a própria pessoa envolvida, que se vê constrangida já
que não se lhe reconhece qualquer discricionariedade em desprender-se de de-
terminados direitos. No caso presente, não se fala em indisponibilidade, mas
sim de inviolabilidade. O que a Constituição assegura, pois, é a "inviolabilidade
do direito à vida" (art. 5°, caput) (grifo nosso).
63

Corroborando com tal entendimento, Dias (2012, p. 125) ensina:

Com isso, pretende-se assentar a ideia de que a previsão constitucional acerca da


“inviolabilidade” do direito à vida se destina a impedir que as pessoas tenham a sua
vida ceifada arbitrariamente. Todavia, não significa que tal direito seja indisponí-
vel e que, portanto, as pessoas não possam escolher seus próprios caminhos no
que diz respeito à própria vida e à própria morte.
Tampouco é correto afirmar que o direito fundamental à vida é irrenunciável, sob
pena de transformá-lo em verdadeiro dever de viver (grifo nosso).

Como se pode observar há clara distinção entre os termos e as consequências disso


para o mundo jurídico são duas realidades completamente diferentes, uma vez que ao se ob-
servar que o ordenamento brasileiro permite a disponibilidade da vida, os defensores da lega-
lização da eutanásia ganham força nesta complexa celeuma.
Levando em consideração o disposto na Constituição Federal de 1988 e o caráter re-
lativo dos direitos fundamentais, com o direito à vida incluído, acertada parece a posição dos
defensores da eutanásia ao sustentar a possibilidade do ser humano de dispor de sua própria
vida, utilizando-se de sua autonomia de vontade, um dos fundamentos centrais da dignidade
da pessoa humana, núcleo de todo o ordenamento jurídico brasileiro.
Ora, a própria Constituição Federal de 1988 traz de forma expressa a possibilidade
de aplicação da pena de morte em caso de guerra declarada, conforme o disposto no art. 5°,
XLVII, “a”, CF (BRASIL, 1988). Tal dispositivo nada mais é do que uma forma de se relati-
vizar o direito à vida quando em conflito com a segurança nacional, mostrando que tal bem
não é totalmente inviolável, não é indisponível, não é absoluto, como discorre Assumpção
(2014, p. 134):

Fosse a vida bem indisponível, a Constituição Federal de 1988 não teria prescrito,
no seu art. 5º, XLVII, a autorização à pena de morte em caso de guerra declarada.
Estando diante de um ordenamento que valoriza a vida e se orienta pela dignidade
da pessoa humana, a possibilidade de aplicação da pena de morte indica que este di-
reito não tem caráter absoluto.

Assim, se o direito à vida é relativizado perante o conflito com a segurança nacional,


porque aquele bem teria caráter absoluto quando entra em rota de colisão com a autonomia de
vontade da pessoa respaldada pela dignidade da pessoa humana, núcleo de todo o ordenamen-
to jurídico pátrio? Parece haver uma contradição na questão.
Ora, obviamente a pena de morte vem a ser medida legalizada em caráter excepcio-
nal, mas a permissão de aplicação da eutanásia também seria, até porque não se pode mitigar
o direito à vida. Como já ressaltado, os direitos fundamentais, entre eles a vida e a liberdade,
possuem caráter relativo, não há que se falar em grau de hierarquia entre eles, de modo que o
64

conflito entre os mesmos deve ser resolvido levando em consideração os aspectos específicos
de cada um dos casos concretos e não decididos de forma abstrata.
Deste modo, não há o que se falar no direito à vida como absoluto, indisponível ou
irrenunciável, o ordenamento jurídico brasileiro assim não o prevê. Mesmo a jurisprudência
não considera o direito à vida de tal forma, como se pode observar em voto proferido pelo
Ministro Marco Aurélio Mello (BRASIL, STF, 2012):

Inexiste hierarquia do direito à vida sobre os demais direitos, o que é inquestio-


nável ante o próprio texto da Constituição da República, cujo artigo 5º, inciso
XLVII, admite a pena de morte em caso de guerra declarada na forma do arti-
go 84, inciso XIX. Corrobora esse entendimento o fato de o Código Penal prever,
como causa excludente de ilicitude ou antijuridicidade, o aborto ético ou humanitá-
rio – quando o feto, mesmo sadio, seja resultado de estupro. Ao sopesar o direito à
vida do feto e os direitos da mulher violentada, o legislador houve por bem priorizar
estes em detrimento daquele – e, até aqui, ninguém ousou colocar em dúvida a cons-
titucionalidade da previsão (grifo nosso).

Assim, parece prosperar o entendimento dos defensores da legalização da eutanásia


ao rechaçar o caráter indisponível e absoluto do direito à vida. Afinal, não há motivos razoá-
veis para se impedir que, mediante utilização do princípio da proporcionalidade, o paciente
tenha o direito de escolher abreviar sua vida em razão de dores ou sofrimentos físicos ou psi-
cológicos oriundos de doença incurável ou já em estado terminal. Dias (2012, p. 126) defende
tal posição:

A vida, então, deve ser entendida como um direito disponível para o próprio ti-
tular e, além de renunciável, tal direito deve ser compreendido como um princípio
constitucional e, portanto, passível de ponderação, controlada pela regra da pro-
porcionalidade, levando em conta a dignidade e a liberdade do indivíduo (grifo
nosso).

Ressalta-se que a legalização da eutanásia não significaria uma banalização da vida,


a regularização do instituto, naturalmente, viria com a positivação de uma série de requisitos,
que autorizariam a antecipação da morte do paciente, como ocorre em países como Holanda,
Bélgica e Canadá. A eutanásia não é um ato deliberado que visa o extermínio da vida e sim
uma ação que busca resguardar a dignidade do paciente. Neste sentido, Ferreira (2015, p. 347)
comenta:

Ao contrário do que fora percebido quando da elaboração do parecer citado, a práti-


ca da eutanásia não busca aniquilar a vida de paciente em situação de termina-
lidade, mas promover a busca por uma dignidade que transcende o formalismo
da norma e coloca o sujeito como condutor do seu processo de existência e de
morte (grifo nosso).
65

Além dos requisitos que permitiriam a antecipação da morte do enfermo, se trataria


de um direito, ou seja, uma possibilidade de se escolher tal caminho, e não de um dever de se
realizar a eutanásia, condição de dever que erroneamente é defendida pelos opositores da eu-
tanásia ao rechaçarem a disponibilidade da vida, fazendo com que o paciente tenha sua digni-
dade atacada pelas contínuas dores e sofrimentos que esteja acometido.
Portanto, conforme o observado, a vida tem lugar destacado no ordenamento jurídico
brasileiro, é assegurada a qualquer pessoa a inviolabilidade de seu direito à vida, ou seja, todo
ser humano possui o direito de que sua vida não venha a ser ceifada de forma arbitrária pelo
Estado ou por terceiro. Entretanto, o ordenamento jurídico pátrio em nenhum momento res-
guarda a vida como valor absoluto ou indisponível. Assim, este bem deve ser disponível ao
titular do direito, a pessoa humana, a depender do caso concreto, não havendo, deste modo,
motivos para que a eutanásia não possa vir a ser legaliza.

4.2.2 – Princípio da Proporcionalidade

O princípio da proporcionalidade insere-se nesta complexa discussão envolvendo a


legalização ou não da eutanásia como uma forma de sopesar o conflito de direitos fundamen-
tais existente nesta celeuma. A fim de se ter uma base sobre o que é este princípio, destaca-se
o disposto por Cabrera (2010, p. 13): “Princípio da proporcionalidade significa o sistema de
interpretação das normas, utilizado pelo legislador, que por meio dos subprincípios, da razoa-
bilididade, adequação e ponderação, deverá escolher por um princípio em relação a outro co-
lidente”.
Como já ressaltado, os direitos fundamentais possuem caráter relativo, não há hierar-
quia entre eles e nas hipóteses de conflitos entre tais direitos há de se analisar o caso concreto
para melhor resolver o embate.
Deste modo, para a resolução destas celeumas, utiliza-se o princípio da proporciona-
lidade, de modo a sopesar os direitos conflitantes. Neste sentido, Dias (2012, p. 43) leciona:

A Constituição, ao consagrar determinados direitos, não evita o choque de princípios


estabelecidos por ela, impondo, na prática, restrições e alguns bens protegidos cons-
titucionalmente, mesmo sem a intervenção do legislador ordinário.
Nessa hipótese, a colisão de princípios que preveem direitos fundamentais im-
porá, no caso concreto, que se leve em conta a técnica da ponderação de inte-
resses com base na regra da proporcionalidade (grifo nosso).
66

Corroborando para este entendimento, Mendes (2012, p. 335) ensina: “Ressalte-se


que o princípio da proporcionalidade vem sendo utilizado na jurisprudência do Supremo Tri-
bunal Federal como instrumento para solução de colisão entre direitos fundamentais”.
Em mesmo sentido, disserta Pimentel (2012, p. 138):

Se, de fato, ocorrer algum conflito entre direitos fundamentais, não há como se esta-
belecer, prontamente, uma hierarquia entre eles. Em situações onde há esse tipo de
colisão, portanto, deve-se analisar cada caso concreto em sua singularidade, ponde-
rando adequadamente os valores e bens jurídicos envolvidos, à luz da Carta Maior.

A utilização do princípio da proporcionalidade no caso da legalização ou não da eu-


tanásia é de suma importância. Como diversas vezes ressaltado, o direito à vida não possui
caráter absoluto ou mesmo indisponível como uma parte da doutrina defende, restando o so-
pesamento entre os direitos à liberdade e à vida para elucidação do embate.
Para tal, são utilizadas três regras para se chegar ao resultado que melhor se aplica
segundo o princípio da proporcionalidade, sendo elas: adequação, necessidade e ponderação.
Neste sentido, Cristóvam (2005, p. 6) explica:

A proporcionalidade ganha relevo a partir do estudo de seus elementos consti-


tutivos, a adequação, a necessidade e a proporcionalidade em sentido estrito.
Pela máxima da adequação, é avaliado se a medida adotada está conforme aos
fins previstos na lei, se é apropriada ao alcance dos objetivos dispostos no man-
damento normativo. A máxima da necessidade exige que a medida eleita, den-
tre aquelas aptas à consecução dos objetivos pretendidos, desponte como a me-
nos onerosa aos cidadãos, que traga a menor carga de restrição aos direitos
fundamentais dos cidadãos. Sendo adequada e necessária, a medida adotada pelo
Poder Público ainda deve vencer a máxima da ponderação. Muito embora adequadas
e necessárias, algumas medidas podem trazer uma carga excessiva de restrições e
limitações à direitos fundamentais. A máxima da ponderação ou proporcionali-
dade em sentido estrito exige uma relação de justa medida entre os valores res-
tringidos e os efetivados pela medida limitadora (grifo nosso).

Assim, para a resolução do conflito entre os direitos à vida e à liberdade há de se uti-


lizar o princípio da proporcionalidade, a fim de se averiguar qual dos direitos possui maior
peso, no caso concreto, envolvendo a possibilidade de eutanásia. Ora, seguindo tais elementos
constitutivos, na medida em que o paciente está acometido de intensas dores e sofrimentos
físicos ou psicológicos, de maneira que sua situação afete sua concepção de dignidade, parece
mais razoável a possibilidade de se permitir a antecipação da morte do enfermo, fundamenta-
do pelo seu direito de autonomia, cerne da dignidade da pessoa humana.

4.2.3 – Dignidade da Pessoa Humana como Núcleo do Ordenamento Jurídico Brasileiro


67

Muito já se foi falado sobre a dignidade da pessoa humana na presente pesquisa (ver
tópico 2.4 e sua divisão), entretanto, é necessária uma análise mais profunda acerca da digni-
dade da pessoa humana como núcleo do ordenamento jurídico brasileiro.
A Constituição Federal de 1988 assegura a dignidade da pessoa humana como fun-
damento basilar do ordenamento jurídico brasileiro através do disposto no art. 1, III, CF
(BRASIL, 1988). A dignidade da pessoa humana possui grande impacto não só no rol de di-
reitos fundamentais, que são os mais importantes dentre todo o direito pátrio, mas como tam-
bém de todo o ordenamento brasileiro.
Parece pacífico o entendimento de que a dignidade da pessoa humana é o valor fun-
damental de todo ordenamento brasileiro, se caracterizando como núcleo principal de todo o
direito nacional, cabendo à dignidade o caráter legitimador dos direitos fundamentais e de-
mais institutos absorvidos pelo regramento constitucional e infraconstitucional vigente no
Brasil. Segundo CABRERA, tal entendimento é defendido por Garcia (2004, p. 207, apud
CABRERA, 2010, p. 7):

Na Constituição brasileira, como visto, a dignidade da pessoa humana figura entre


os princípios fundamentais que estruturam o Estado como tal, portanto, inserindo-se
entre os valores superiores que fundamentam o Estado, a dignidade da pessoa
representará o crivo pelo qual serão interpretados não somente os direitos fun-
damentais mas, ao nosso ver, todo o ordenamento jurídico brasileiro, nas suas
variadas incidências e considerações (grifo nosso).

Em mesmo sentido, destaca-se a lição de Pimentel (2012, p. 140):

Fala-se muito, hoje, neste primado da dignidade da pessoa humana, designado


por muitos como “metaprincípio”, em razão de ele ter o condão de se debruçar
sobre todos os outros princípios de justiça em um Estado Democrático de Direi-
to contemporâneo, orientando a aplicação de todas as suas demais normas, atu-
ando também como base hermenêutica (grifo nosso).

Continuando com seus pensamentos, Pimentel (2012, p. 141), destaca ainda mais a
influência da dignidade da pessoa humana como valor que vem a justificar o rol dos direitos
fundamentais, entre eles a vida e a liberdade, tão primordiais na controvérsia envolvendo a
eutanásia, conforme o exposto a baixo:

A dignidade é, de fato, uma ideia polissêmica. Porém, sem prejuízo das diversas
vertentes conhecidas sobre o assunto, percebe-se um consenso razoável na dire-
ção de se aceitar a dignidade da pessoa humana como o fundamento e a justifi-
cação última dos direitos fundamentais, na medida em que se aceita que o signifi-
cado da ideia de dignidade e o seu conteúdo estariam lastreados, em última análise,
no imperativo categórico kantiano que afirma ser toda pessoa um fim em si mesma
(grifo nosso).
68

Sendo assim, todo e quaisquer direitos fundamentais possuem em seu núcleo a digni-
dade da pessoa humana, não devendo entrar em conflito com este valor basilar do ordenamen-
to jurídico brasileiro. Os direitos fundamentais sofrem vital influência deste importante valor
supracitado, pode-se compreender tal afirmação ao se observar a modificação do entendimen-
to do que vem a ser o direito à vida, destacando a vida digna e não apenas o caráter biológico
deste bem.
Sem embargo, a doutrina costuma dividir a dignidade da pessoa humana em duas
concepções, as ideias de autonomia e heterônoma. São duas dimensões totalmente distintas
uma da outra, mas que representam a acepção completa deste valor impar no ordenamento
jurídico pátrio.
A distinção e averiguação de qual das acepções da dignidade da pessoa humana pre-
valece mais no ordenamento jurídico brasileiro é de vital importância para uma melhor eluci-
dação acerca da problemática envolvendo a eutanásia, haja vista que autonomia como acepção
da dignidade da pessoa humana está sempre presente no meio dos argumentos da discussão.
A dignidade como autonomia de vontade teve em Kant seu primeiro defensor, o ilus-
tre doutrinador defendia que este valor supremo conferia ao homem, o ser racional, o direito
de ser tratado como fim de si mesmo e não como meio para se atingir algum objetivo, não
poderia a pessoa ser tratada como coisa. Assim, Kant (2007, p. 79) afirma:

E o que é então que autoriza a intenção moralmente boa ou a virtude a fazer tão altas
// exigências? Nada menos do que a possibilidade que proporciona ao ser racio-
nal de participar na legislação universal e o torna por este meio apto a ser mem-
bro de um possível reino dos fins, para que estava já destinado pela sua própria
natureza como fim em si e, exactamente por isso, como legislador no reino dos
fins, como livre a respeito de todas as leis da natureza, obedecendo somente àque-
las que ele mesmo se dá e segundo as quais as suas máximas podem pertencer a
uma legislação universal (à qual ele simultaneamente se submete)[...] Autonomia
é pois o fundamento da dignidade da natureza humana e de toda a natureza ra-
cional (grifo nosso).

Dissertando sobre os ensinamentos de Kant, Sandel (2012, p. 142) explica:

Quando agimos com autonomia e obedecemos a uma lei que estabelecemos pa-
ra nós mesmos, estamos fazendo algo por fazer algo, como uma finalidade em si
mesma. Deixamos de ser instrumentos de desígnios externos. Essa capacidade de
agir com autonomia é o que confere à vida humana sua dignidade especial. Ela
estabelece a diferença entre pessoas e coisas (grifo nosso).

Como se pode observar, a autonomia de vontade como dignidade possui viés bem
individualista, tendo o intuito de limitar a intervenção do Estado e de terceiros na autonomia
da pessoa humana, ou seja, defende a liberdade individual enquanto esta não vier a prejudicar
outrem. Ora, tal escopo possui caráter histórico, haja vista que por vezes o Estado veio a inter-
69

ferir e retirar de seus cidadãos, nas dimensões individuais e coletivas, sua dignidade, come-
tendo atos bárbaros sem quaisquer escrúpulos.
E esse viés individual é de suma importância para a problemática envolvendo a lega-
lização da eutanásia, uma vez que este instituto se resume a uma pessoa, paciente, optar pela
antecipação de sua morte, claramente fazendo uso de sua autonomia de vontade, de modo que
terceiros e o Estado não possam vir a interferir na sua opção ou que a resistência de terceiros
não atenda as regras requeridas no princípio da proporcionalidade (visto no tópico anterior).
Dworkin (2003, p. 268) escreve sobre a importância da autonomia na discussão sobre a euta-
násia:

As pessoas que acreditam que se deveria permitir que os pacientes competentes pla-
nejassem sua própria morte, com a assistência de médicos dispostos a ajuda-los se
assim o desejarem, invocam frequentemente o princípio da autonomia. Dizem que é
crucial, para o direito das pessoas, que lhes permitam pôr fim a suas vidas quando
quiserem fazê-lo, ao menos nos casos em que sua decisão não for claramente irraci-
onal. Contudo, alguns adversários da eutanásia também invocam a autonomia: preo-
cupam-se com a possibilidade de que, se a eutanásia for legalizada, pessoas que na
verdade preferem continuar vivas poderiam ser mortas.

Porém, a outra concepção da dignidade da pessoa humana possui um viés bem distin-
to, muitas vezes até antagônico. A acepção heteronômica da dignidade da pessoa humana a-
presenta um caráter mais coletivo, nela o interesse da sociedade prevaleceria frente ao do in-
divíduo. Fundamenta-se na possibilidade de que a autonomia de vontade de uma pessoa possa
vir a causar impacto em uma coletividade ou mesmo em toda a humanidade. Neste sentido,
explica Pimentel (2012, p. 147):

O aspecto heteronômico da dignidade da pessoa humana se traduz em uma a-


cepção onde os valores compartilhados pela comunidade – tais como moralidade,
bem comum, interesse público - prevalecem em relação às escolhas individuais.
Nessa visão de dignidade, a perspectiva do indivíduo não é o mais importante,
mas os ideais sociais vigentes (grifo nosso).

Explicando que a acepção heteronômica de vontade não vem da própria pessoa, Kant
(2007, p. 79) discorre:

Pois como o impulso que a representação de um objecto, possível por nossas forças,
segundo a constituição natural do sujeito, deve exercer sobre a vontade do sujeito
pertence à natureza deste, quer seja da sensibilidade (inclinação ou gosto), quer seja
do entendimento e dá razão, as quais se exercitam com satisfação num objecto se-
gundo a peculiar disposição da sua natureza, resulta que seria a natureza quem
propriamente daria a lei, e essa lei, como tal, não só tem que ser reconhecida e
demonstrada pela experiência e, portanto, em si mesma contingente e por isso im-
própria como regra prática apodíctica, como tem de ser a lei moral, mas sim que é
sempre só heteronomia da vontade; a vontade não se dá a lei a si mesma, mas é
sim um impulso estranho que lhe dá a lei a ela por meio de uma disposição na-
70

tural do sujeito acomodada à // receptividade desse mesmo impulso (grifo nos-


so).

Apresentadas as duas acepções da dignidade da pessoa humana, destaca-se que o or-


denamento jurídico brasileiro absorve ambas as concepções, não sendo positivada apenas uma
das dimensões. Pelo contrário, a autonomia corrobora para a efetivação do caráter limitador,
enquanto a heteronomia se relaciona com o viés prestacional da dignidade da pessoa humana.
Entretanto, é importante ressaltar que o ordenamento jurídico brasileiro, em regra,
prevalece a concepção de autonomia sobre a heteronômica, tanto na Constituição Federal de
1988, como na jurisprudência pátria. Este é o entendimento apontado por Barroso (2010, p.
14-16) em trechos:

Trazendo o debate para o âmbito do sistema jurídico brasileiro, não parece possível
adotar, de forma excludente, um ou outro viés da dignidade humana. No entanto,
tendo como ponto de partida a Constituição, afigura-se fora de dúvida o pre-
domínio da ideia de dignidade como autonomia. Dentro de uma perspectiva histó-
rica, a Carta de 1988 representou uma ruptura com o modelo ditatorial intervencio-
nista, constituindo o marco inicial da reconstrução democrática do Brasil. Daí a sua
ênfase nas liberdades pessoais, parte essencial de um longo elenco de direitos
individuais e garantias procedimentais. A dignidade como heteronomia obteve
menos ênfase. [...]Na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal há inúmeros jul-
gados que se referem à dignidade humana. Por vezes, o emprego da locução é pura-
mente ornamental. Em muitos casos, ela não é o único ou o principal fundamento de
decidir, sendo frequentemente associada a um direito fundamental específico, como
reforço argumentativo. Sem embargo, é possível detectar uma predominância da
ideia de dignidade como autonomia sobre a dignidade como heteronomia. [...]
Em suma: à luz do sistema jurídico brasileiro, é possível afirmar uma certa
predominância da dignidade como autonomia, sem que se deslegitime o concei-
to de dignidade como heteronomia. O que significa dizer que, como regra geral,
devem prevalecer as escolhas individuais. Para afastá-las, fora dos casos expressos
ou inequívocos, impõe-se um especial ônus argumentativo. O tema da
(in)disponibilidade dos direitos fundamentais situa-se na fronteira entre as duas ver-
tentes da dignidade (grifo nosso).

Como se vê, há a prevalência da dignidade da pessoa humana como autonomia no


ordenamento jurídico brasileiro. Deste modo, parece ter razão à corrente defensora da legali-
zação da eutanásia, quando defendem que uma pessoa, na plenitude de suas faculdades men-
tais, possa vir a dispor de sua vida e requer a eutanásia, desde que preencha determinados
requisitos. O ordenamento jurídico pátrio dá prevalência às liberdades individuais, assim sen-
do, não seria justo deixar um paciente exposto a intenso sofrimento, com sua dignidade sendo
afetada, em razão de interesses de outros ou por questões de ordem religiosas.
A dignidade da pessoa que se encontra em situação árdua deve ser observada priori-
tariamente para se tratar acerca da legalização da eutanásia. Muitas vezes, permanecer vivo,
no sentido biológico da palavra, não é a melhor alternativa para pacientes que sofrem de in-
tensas dores físicas e se veem acometidos de intenso sofrimento psicológico. A acepção de
71

dignidade da pessoa humana, na forma de autonomia de vontade, pode, em determinados ca-


sos, por fim ao sofrimento de um ser humano em estado de penúria, devendo prevalecer
quando o assunto for eutanásia.
Portanto, mostra-se clara a posição de destaque da dignidade da pessoa humana co-
mo núcleo de todo o ordenamento jurídico brasileiro, servindo como valor que vem a justifi-
car e resolver os mais variados conflitos entre direitos fundamentais. Assim, como já ressalta-
do, parece correta o posicionamento doutrinário que defende a preferência da liberdade, como
forma de autonomia de vontade, perante o direito à vida, de caráter relativo, pois, em situa-
ções como as que propiciam a eutanásia, claramente a manutenção da vida, ou negação à an-
tecipação da morte, é atentatória para com a dignidade da pessoa humana.

4.3 – ARGUMENTOS A FAVOR E CONTRÁRIOS À EUTANÁSIA

Para se compreender uma discussão e tentar chegar a uma análise mais coerente é
fundamental a apresentação e exame dos principais argumentos que envolvem ambos os lados
da celeuma.
Neste tópico serão apresentados os principais argumentos que compõe a discussão da
eutanásia, bem como serão analisados tendo em conta o já destacado na pesquisa e também no
disposto no ordenamento jurídico brasileiro.

4.3.1 – Vida: Sacralidade ou Disponibilidade

Provavelmente estes são os argumentos de maior discussão quando o assunto é a le-


galização da eutanásia. Como já apontado, esta celeuma não envolve apenas o direito e a me-
dicina, a eutanásia também é um assunto que sofre influência de outras áreas, inclusive da
religião.
Para muitos, como já apontado durante a pesquisa, a vida é um bem indisponível e ir-
renunciável, muitos o tratam como um direito absoluto. Tal bem é tratado como se fosse sa-
grado, não podendo o próprio titular do direito dispor acerca do mesmo. Neste sentido, desta-
ca-se o posicionamento de Azevedo (2002, p. 19 – apud VIEIRA, 2009, p. 75):

Em virtude dessa postura coerente e realmente comprometida com a defesa da dig-


nidade humana, Junqueira é firme em se posicionar radicalmente contra a eutanásia,
insistindo em afirmar que é absoluta a intangibilidade da vida humana, não admitin-
do exceção, o que decorre da norma prevista no caput do art. 5° da CR/88.
72

Nitidamente há clara influência religiosa neste argumento, uma vez que diversas são
as religiões que defendem a sacralidade da vida, entre elas o cristianismo, religião de grande
parte da população brasileira. Dworkin (2003, p. 275) discorre sobre a religião na discussão
entorno da eutanásia:

A convicção de que a vida humana é sagrada talvez ofereça a mais poderosa


base emocional para a oposição à eutanásia nas formas e nos contextos que até
aqui distinguimos. A Igreja Católica Romana é o adversário mais inflexível,
mais vigilante e, sem dúvida, a mais eficiente, tanto da eutanásia quanto do abor-
to (grifo nosso).

Por outro lado, os advogados da eutanásia defendem que a vida possui caráter relati-
vo e que a mesma possui o aspecto de inviolabilidade e não de indisponibilidade no ordena-
mento jurídico brasileiro (mais sobre: ver tópico 4.2.1). Assim, parece muito mais razoável
que o direito pátrio, que não prevê a vida como direito absoluto, assegure que o titular do di-
reito à vida possa vir a dispor de sua vida, conforme atuação fundamental da dignidade da
pessoa humana no sopesamento entre os direitos à vida e à liberdade, e, ao mesmo tempo,
tenha sobre este direito resguardado a sua inviolabilidade, ou seja, o direito de não ter este
bem ceifado de maneira arbitrária.
Como já deixado claro em item anterior (ver tópico 4.2.1), os causídicos da eutanásia
parecem ter razão neste antagônico conflito. O ordenamento jurídico brasileiro em nenhum
momento chegou a colocar a vida como um direito indisponível, pelo contrário, a própria
Constituição Federal assegura a relatividade do direito à vida ao permitir a aplicação da pena
de morte em determinada circunstância (BRASIL, 1988), só isso já seria o suficiente para
corroborar com aqueles que defendem a disponibilidade de tal direito.
Contudo, este caráter deveras religioso atribuído ao direito à vida não parece ser o
melhor entendimento acerca da questão. Ora, o Brasil é um país laico, é assegurada a liberda-
de de crença, de modo que num ordenamento jurídico que presa pela multiplicidade de con-
vicções não se deveria impor fundamentos religiosos a todas as pessoas, até porque algumas
ou muitas delas, no gozo de sua liberdade de crença, podem não crer em determinados dog-
mas religiosos (BRASIL, 1988). Neste sentido leciona Dias (2012, p. 170):

Contudo, como já se afirmou,o Brasil é um Estado laico e, nesse sentido, não ado-
ta uma religião oficial, com todas as consequências daí advindas... [...] A laicidade
implica a pluralidade de ideias, convicções e ações, independentemente das
crenças religiosas. Assim, as religiões podem, no máximo, impor sanções religiosas
a seus seguidores, mas não pode exigir a mesma conduta do Estado, que deve se
manifestar de modo positivo e negativo, garantindo o exercício da liberdade consti-
tucional de crença, que inclui a liberdade de não crer, bem como o direito de as
pessoas agirem ou se omitirem segundo sua fé ou com base na ausência dela (grifo
nosso).
73

Não se está dizendo que todos são obrigados a não acreditar que a vida é um presente
de Deus e que só ele pode vir a retirá-la do ser humano. Como já destacado, o ordenamento
jurídico brasileiro traz de forma expressa a liberdade de crença, ou seja, as pessoas são livres
para crer ou não crer nos dogmas que quiserem. É um direito da pessoa, que acredita na sacra-
lidade da vida, de não dispor deste bem em prol da eutanásia. Entretanto, os indivíduos que
não possuem tal fé não podem ser obrigados a acreditar na sacralidade da vida e impedidos
pelo Estado, que é laico, de dispor de sua existência em prol de sua dignidade.
Neste sentido, Dias (2012, p. 170) ensina:

Com fundamento nisso, em um Estado laico, se a pessoa acredita que a vida é um


dom de Deus e, portanto, tem um valor sagrado que a torna indisponível, obvi-
amente não estaria obrigada a praticar a eutanásia. Ao contrário, nessa hipóte-
se, ela teria o direito de exigir que a eutanásia não lhe seria imposta, com a pro-
teção do Estado voltada a garantir tal direito. Por outro lado, uma vez que num
Estado laico deve imperar o respeito à diversidade, também não se pode impor
a que quer que seja a crença de uns ou de muitos, exigindo, por exemplo, que
ninguém disponha, em certas circunstâncias, da própria vida por se acreditar
que ela é um dom divino (grifo nosso).

4.3.2 – Evolução da Medicina e a Incurabilidade do Paciente

Em qualquer ordenamento jurídico do mundo que contemple o instituto da eutanásia


como legal, a incurabilidade de uma doença é um dos requisitos a ser preenchido pelo enfer-
mo a fim de requer o direito à eutanásia (como se pode observar ao longo do capítulo 3). As-
sim sendo, o caráter incurável de uma determinada doença ou condição entra em confronto
com os frequentes avanços da ciência.
Os defensores da ilegalidade da eutanásia afirmam que não se pode permitir que uma
pessoa tida como incurável tenha sua vida abreviada, pois a ciência encontra-se em constante
evolução, de modo que uma cura para a enfermidade poderia ser descoberta a tempo de salvar
o paciente, sendo o termo incurabilidade deveras relativo. Neste sentido, França (2009, p. 02)
explica:

A incurabilidade é um prognóstico, uma presunção, uma conjectura. Por isso, é du-


vidosa. Mesmo o diagnóstico, apesar dos recursos da técnica e da ciência, não apre-
senta um estágio de rigorosa exatidão. Somem-se as disponibilidades terapêuticas e
diagnósticas de cada lugar e a capacidade técnica e intelectual de cada médico. Des-
sa forma, a incurabilidade ainda se coloca de modo duvidoso, pois há enfermi-
dades que numa época eram incuráveis e logo após deixaram de sê-las. (grifo
nosso).
74

Sobre a relatividade da incurabilidade como argumento contrário a prática da eutaná-


sia, Felix (2006, p. 71) discorre:

Asseveram que a incurabilidade é um dos conceitos mais polêmicos, porquanto o


homem atingiu um grau tão elevado de desenvolvimento na área biomédica que é
quase impossível crer-se na incurabilidade de uma doença. Ademais, rememorando
épocas passadas podemos elencar uma larga gama de enfermidades que dizimavam
multidões e que hoje são consideradas passíveis de cura, quando não, raras vezes, de
fácil erradicação.

Por outro lado, os advogados da legalização da eutanásia defendem o direito do paci-


ente de poder antecipar a sua morte quando acometido de enfermidade incurável ou já em
estágio terminal. Tal posicionamento reconhece que há a possibilidade de novos medicamen-
tos ou tratamentos surgirem em razão do progresso da ciência, entretanto, argumentam que
não se pode prever quando este fato ocorrerá e nem mesmo se de fato acontecerá. Assim, im-
pedir o direito à eutanásia, por mera especulação, seria um gigantesco prejuízo ao paciente,
que estaria fadado a dores e sofrimentos desumanos.
Criticando a posição contrária à eutanásia que utiliza tal argumento, Dias (2012, p.
171) explica que os prognósticos não podem depender de hipótese que não se sabe quando irá
ocorrer ou mesmo se irá ocorrer, devendo a escolha ser feita com base nos conhecimentos
médicos do momento.
Em mesmo sentido, porém em tom ainda mais crítico, Andrade e Souto (2007, p. 20)
destacam:

Outro argumento que se pretende combater é o que diz respeito ao dogma da infali-
bilidade científica, ou seja, alguns sustentam que a situação de extremo sofri-
mento pelo qual passa alguém não é motivo para se praticar a eutanásia, tendo
em vista que a ciência poderá, algum dia, eliminar a dor que aflige os pacientes.
[...]Ora, os argumentos científicos que trilham em favor da corrente da infalibi-
lidade da ciência são extremamente temerosos, principalmente, quando se pre-
tende manter vivos pacientes desenganados, além de submetidos a uma profun-
da dor e angústia indesejável, sem saber até quando, até onde, e em busca de
algo que nem se sabe se, verdadeiramente, chegará (grifo nosso).

Assim, pelo que se observou até o momento, parece mais correto e coerente com o
ordenamento jurídico brasileiro, que tem como núcleo fundamental a dignidade da pessoa
humana, os argumentos apresentados pelos defensores da legalização da eutanásia. Ora, obri-
gar um paciente a permanecer vivo em razão de uma possibilidade que não se sabe quando e
nem se de fato se concretizará não parece razoável, uma vez que, no caso em questão, a pes-
soa estará acometida de dores e sofrimentos desumanos.
Mais uma vez, frisa-se que a legalização da eutanásia não obrigaria o paciente a a-
breviar sua vida, seria um direito colocado a seu dispor, desde que preenchidos os requisitos
75

para tal. Se o paciente crê na possibilidade de advento de algo que possa vir a curá-lo, ele tem
o direito, baseado em sua autonomia, de esperar pelo progresso científico. No obstante, não se
pode fazer com que um enfermo seja obrigado a viver diante de condições desumanas basea-
do em uma possibilidade que pode vir a acontecer daqui a muitos anos ou pode nem vir a o-
correr. Assim, destaca-se novamente Andrade e Souto (2007, p. 20-21):

Por fim, pretende-se ir mais além, mesmo considerando-se que realmente a ciên-
cia possuirá a solução para o sofrimento de determinadas pessoas, que se en-
contram na situação que dá ensejo à eutanásia, o argumento perde enorme par-
te de sua consistência pelo seguinte: quando essa descoberta se dará? Amanhã?
Depois? Daqui a 10 minutos? Daqui a um século? Como não é possível ter certe-
za de quando a cura irá chegar, fica complicadíssimo embasar tal argumento, pois
estariam obrigando a pessoa em estado terminal a se manter naquela situação desu-
mana por anos, até quando, felizmente, a tão almejada descoberta científica resplan-
decerá. É cristalino que a decisão a respeito de se agarrar a esperança de que um
dia a cura chegue ou não, mais uma vez, será resultante da escolha, indubita-
velmente, pessoal do interessado e de mais ninguém (grifo nosso).

4.3.3 – Legalização da Eutanásia e sua Consequência

Um dos assuntos debatidos e que vira argumento contrário à legalização da eutanásia


são as consequências que tal fato poderia vir a gerar no ordenamento jurídico e na sociedade
de um país. As alegações quase sempre se baseiam no argumento do slippery slope, quanto ao
desvirtuamento do que seria eutanásia, ineficácia de fiscalização do instituto e outros mais.
Em suma, para os contrários à eutanásia, a sua legalização traria consequências ex-
tremamente prejudiciais em todos os sentidos. Assim explica Siqueira-Batista (2005, p. 115):

Traduzível em português como ladeira escorregadia, pretende justificar que


não devem ser feitas “concessões” aparentemente inócuas em temas controver-
sos, sob pena de se abrir o precedente para atitudes de inequívoco malefício.
Oposições alicerçadas no argumento “escorregadio” incluiriam: (1) a potencial des-
confiança – e subseqüente desgaste – na rela- ção médico-paciente; (2) a possibili-
dade de atos não inspirados em fins altruístas, mas motivados por outras razões (por
exemplo, questões de heranças, pensões, seguros de vida e outras); (3) a ocorrência
de pressão psíquica – por exemplo, o pensamento, pelo enfermo, de que sua condi-
ção é um verdadeiro “estorvo” para os familiares –, que poderia deixar os pacientes,
cuja morte se aproxima, sem perspectiva outra que não a “eutanásia”, de fato não
desejada e, portanto, de alguma forma imposta por razões circunstanciais; e (4) a e-
rosão definitiva do respeito à vida humana, tomando-se como base o recorrente e-
xemplo do nazismo (grifo nosso).

Em sentido semelhante, Vieira (2009, p. 220) discorre:

A esse respeito, alguns estudiosos afirmam que a permissão de realização de atos eu-
tanásicos, ou de práticas assemelhadas, pode conduzir a uma degradação moral cres-
cente da sociedade e a uma atitude cada vez mais permissiva em relação a práticas
condenáveis, como a eutanásia não voluntária e a eugenia.
76

O argumento da ladeira escorregadia não parece prosperar na discussão envolvendo a


eutanásia, mesmo opositores do instituto não destacam tal argumento como irrefutável ou algo
do tipo. Pelo contrário, como podemos observar nos ensinamentos de Vieira (2009, p. 220).

Impossível garantir que isso não vai acontecer; porém, trata-se de uma tentativa
de previsão do futuro totalmente incerta, meramente hipotética, especialmente
porque as consequências da legalização de alguma prática de caráter eutanásico de-
penderão de inúmeros fatores, entre eles a formação histórico-cultural da sociedade
em que isso ocorrer (grifo nosso).

Ora, apontar tais medos mostra-se benéfico para a discussão, mas não faz com que
seja um argumento válido para não se legalizar a eutanásia. Este instituto deve vir a ser legali-
zado, tomando-se medidas para se garantir a devida fiscalização de sua aplicação, asseguran-
do, assim, que o que vier a ser realizado trata-se da exteriorização da autonomia de vontade
do paciente, tendo o Estado a função de punir eventual desvirtuamento de conduta.
No sentido pró-eutanásia, Dias (2012, p. 172) argumenta contra o slippery slope:

Esses argumentos também não se sustentam, primeiro porque, além de os médicos


conhecerem a diferença “entre ajudar uma pessoa que implora para morrer e matar
outra que pretende viver”, é mais provável que o enfraquecimento dos instintos hu-
manitários dos profissionais de saúde ocorra com mais vigor, como afirma Dworkin,
ao se ignorar a dor dos pacientes que pedem para morrer. Ademais, o risco de abu-
so não torna ilegítimo o uso de um determinado procedimento Sem dúvidas os
abusos devem ser contidos. E o Estado tem o dever de reprimi-los (grifo nosso).

A eutanásia deve ser legalizada como um direito, a partir de determinadas circuns-


tâncias, preenchendo alguns requisitos anteriormente previstos. A fiscalização do instituto
deve ser realizada intensamente, de modo que eventuais deturpações de condutas, que ocorre
em toda a sociedade, sejam punidas. No obstante, a possibilidade hipotética de ocorrer um
desvirtuamento do instituto não se mostra razoável para impedir a legalização da eutanásia.

4.4 – REQUISITOS PARA A AUTORIZAÇÃO DA PRÁTICA DA EUTANÁSIA

Parece difícil pensar em inovação quanto aos requisitos previstos para que a eutaná-
sia venha a ser legalizada em determinado ordenamento jurídico. Em países em que a prática
do referido instituto é tida como legal, os estudos para tal encontra-se em estágio mais avan-
çado que, em geral, se mostra no Brasil, além de que a experiência, ao que parece, está dando
certo.
Como visto no capítulo referente à análise da eutanásia no direito comparado, inúme-
ros são os requisitos para que um paciente possa vir a requer o direito ao instituto. Sem em-
77

bargo, os ordenamentos jurídicos que veem a eutanásia como prática legal costumam adotar
requisitos bastante similares, como já observados no caso de Holanda e Bélgica.
Conforme mostra Pimentel (2012, p. 97), a Holanda adota uma série de requisitos:

a) O pedido do paciente deve ter sido refletido e voluntário; b) O sofrimento do do-


ente deve ser insuportável e sem esperanças de melhora; c) O paciente deve ser in-
formado pelo médico de sua real condição e suas expectativas de futuro; d) Não de-
ve haver outra solução razoável para o quadro do doente; e) O médico deve consul-
tar, pelo menos, um colega que concorde com a intervenção; f) A eutanásia ou a as-
sistência ao suicídio deve ser praticada com o máximo de cuidado e esmero profissi-
onal possível;

Ora, parece perfeitamente razoável e compatível com o disposto no ordenamento ju-


rídico brasileiro. A vontade do paciente deve ser sempre voluntária e desprovida de vícios,
uma vez que se não for assim não estará configurado o conceito de eutanásia utilizado nesta
pesquisa. A terminalidade ou incurabilidade deve ser analisada por mais de um médico, como
forma de se evitar ao máximo o erro de diagnóstico e se oferecer segurança jurídica a todos os
envolvidos.
Além disso, destaca-se que a doença não necessitaria de estar em estágio terminal pa-
ra que o paciente possa vir a requer seu direito à eutanásia. Em casos como o de Vicent Hum-
bert (GOLDIM 1, 2004), ordenamento jurídico nacional deve prover o direito à antecipação
da morte se a condição de vida da pessoa estiver atentando contra sua dignidade, como foi o
que ocorreu no caso supracitado.
Por fim, é importante ressaltar que, nos países em que a eutanásia é legalizada, há um
órgão ou comitê específico para a fiscalização do referido instituto. Ora, parece ser uma con-
dição que o ordenamento jurídico brasileiro obrigatoriamente deveria importar do direito alie-
nígena, de modo a garantir maior segurança jurídica ao impedir que os requisitos viessem a
ser burlados e a eutanásia seja deturpada.

4.5 – TESTAMENTO VITAL

A eutanásia é um assunto deveras complicado de se discutir, como se pode observar


ao longo de toda esta pesquisa. O instituto envolve um grande número de ciências e aspectos
morais, éticos e religiosos, o que torna a questão sempre muito complexa.
No entanto, a prática da eutanásia, seja ativa ou passiva, em pacientes que não este-
jam em condições de expressar sua autonomia de vontade quanto ao assunto é uma questão
78

ainda mais complicada, isso em razão do pedido de forma autônoma e livre de vícios ser um
requisito marcante do que se chama eutanásia.
Assim, o que os americanos, de onde tal instituto adveio com a Natural Death Act e a
PSDA (Patient Self-Determination Act), chamam de living will (testamento vital) poderia vir
a ser a solução jurídica para resolver situações em que o paciente esteja impedido de expressar
sua vontade quanto a abreviação de sua vida.
Este instituto costuma a ser definido como uma manifestação escrita em que a pessoa
deixa instruções a serem seguidas em caso de ela mesma não poder manifestar sua vontade
em relação a sua saúde. Nestes termos:

Já o testamento vital (living will) é um documento, surgido na década de 1960 nos


Estados Unidos da América, no qual os pacientes em fim de vida expressam seus
desejos, explicitando quais tratamentos, cuidados e procedimentos médicos desejam
ou não ser submetidos quando estiverem fora de possibilidades terapêuticas, comu-
mente associados à prática da ortotanásia (DADALTO).

Em mesmo sentido, Felix (2006, p. 86) discorre:

O testamento vital, também denominado de Living Will ou Testament de Vie, é uma


forma de respeito à autonomia do paciente que aparece ao lado da possibilidade do
consentimento informado. Através desse documento a pessoa determina, de forma
escrita, que tipo de tratamento ou não deseja receber caso se encontre doente, em es-
tado incurável, terminal, ou em estado clínico não condizente com a dignidade da
pessoa humana.

Discorrendo sobre a utilidade deste importante instituto jurídico, Raimundo (2014, p.


47) explica:

“A morte não nos diz respeito nem mortos nem vivos: vivos, porque ainda o esta-
mos, mortos, porque já não existimos” – ora o testamento vital visa justamente ul-
trapassar esta problemática, concedendo uma oportunidade ao próprio indiví-
duo de manifestar antecipadamente a sua vontade para que, ficando doente e
incapaz de expressar o seu arbítrio, ver respeitada a sua autonomia e a sua von-
tade real (grifo nosso).

Tal instituto possui grande histórico de utilização em ordenamentos jurídicos de ou-


tros países, como EUA, Holanda, Suíça e tantos outros, encontrando limitação para seu conte-
údo de acordo com a permissividade da eutanásia em cada uma dessas nações. Embora não
haja nenhuma norma que impeça a aplicação do testamento vital em terras tupiniquins, a utili-
zação deste instituto quase não é vista. Destaca-se ainda que não há no ordenamento jurídico
brasileiro uma forma detalhada sobre a regulamentação do instituto, tendo apenas uma resolu-
ção do Conselho Federal de Medicina. Neste sentido, explica SIRONI e TISOTT (2013, p. 7):

O Brasil não possui um regulamento ostensivo, no que diz respeito à possibili-


dade de testamento vital, como ocorre em outros países. Contudo, desde 31 de a-
79

gosto de 2012, a Resolução 1.995 do Conselho Federal de Medicina estabelece crité-


rios para que qualquer indivíduo, maior de idade e plenamente consciente, tenha
possibilidade de definir junto ao seu médico os limites terapêuticos a serem adotados
em uma fase terminal, por meio do registro expresso do paciente num documento
denominado “diretiva antecipada de vontade”, também conhecido como testamento
vital. Entretanto, embora não existam impedimentos em nosso ordenamento ju-
rídico que proíbam diretivas de última vontade, cabe lembrar que a resolução
não apresenta critérios, forma ou mesmo quaisquer outras regras que infor-
mem como deve ser feito o testamento vital, afirmando inclusive que o testamento
poderia ser feito de forma oral e reduzido a termo no prontuário, pelo médico (grifo
nosso).

No que tange aos limites alcançados por este instituto jurídico, Dadalto explica
(DADALTO, S/D):

Historicamente, o testamento vital tem sido atrelado ao fim de vida, e seus limites
são estabelecidos pelo ordenamento jurídico do país que o legaliza. Assim, o tes-
tamento vital na Holanda pode conter desejos de eutanásia, ou seja, pode um
paciente, na Holanda – país em que a eutanásia é legalizada – dizer em seu tes-
tamento vital que deseja que um profissional de saúde abrevie sua vida nas si-
tuações previstas na legislação vigente (no caso, quando o paciente tiver uma do-
ença física ou mental que cause uma vontade perene de não permanecer vivo). Sen-
do assim, em países em que a eutanásia é proibida, como no Brasil, o testamento
vital não pode conter pedido dessa prática, sob pena da disposição ser conside-
rada inexistente (grifo nosso).

Observa-se que o testamento vital seria o método ideal para garantir que a vontade
do paciente, que no momento está impedido de expressá-la por motivo de doença ou acidente,
possa ser respeitada em detrimento do desejo de terceiros, novamente destacando a dignidade
da pessoa humana como autonomia de vontade. Ademais, vê-se que tal instituto pode vir a ser
utilizado como forma do paciente abreviar sua vida através da suspensão de determinados
tratamentos, o que caracterizaria a forma passiva da eutanásia, ou mesmo através da eutanásia
ativa com a ação médica que visa antecipar a morte do enfermo, isso considerando que a eu-
tanásia venha a ser legalizada, é claro.
O testamento vital é pouco utilizado no Brasil, uma regulamentação por meio de Lei
parece fundamental para a segurança jurídica do instituto e para que o mesmo possa alcançar
maior visibilidade e mais pessoas venha a usufruir deste direito. Como já ressaltado, testa-
mento vital mostra-se de suma importância para que a vontade do paciente seja respeitada no
que tange ao seu próprio corpo e sua dignidade, podendo impedir que a pessoa tenha sua dig-
nidade ferida através da manutenção da vida em estágio que considere indigno.
Um eventual projeto de lei teria que definir as condições e modelo para a edição do
testamento vital. A julgar pelo disposto em nosso Código Civil, a pessoa teria que ser maior
de 16 anos, capaz e se mostrar em perfeitas faculdades mentais, como se pode retirar através
da leitura dos artigos 1857, 1860 e seu parágrafo único, ambos do Código Civil de 2002.
80

Também, do Código Civil de 2002, encontra-se fundamentos para a legalidade e re-


gulamentação do testamento vital no ordenamento jurídico brasileiro, trazendo a possibilidade
do testamento de caráter não patrimonial e ressaltando que a vontade expressa pelo testador
não perderia validade em caso de posterior incapacidade, justamente o que necessita o pacien-
te através do testamento vital, conforme disposição do § 2° do art. 1857 e 1861. Por fim,
cumpre destacar que um eventual pedido de eutanásia, ativa ou passiva, levando em conside-
ração que este instituto deveria ser legalizado por todo o exposto nesta pesquisa, poderia ser
modificado pelo paciente, tendo alusão o art. 1.858, CC/02.
81

CAPÍTULO 5: OPINIÃO MÉDICA – PESQUISA DE CAMPO

A legalização da eutanásia é um tema que envolve uma gama de áreas que ultrapassa
a ciência jurídica. A medicina é uma das áreas que estão estritamente relacionadas com o te-
ma em questão, de modo que analisar a opinião de profissionais da área de saúde sobre o as-
sunto enriquece o conhecimento acerca deste controverso instituto jurídico.
Assim, foi realizado um questionário com médicos de diferentes especializações e
este último capítulo do trabalho apresentará uma análise dos resultados desta pesquisa de
campo.

5.1 – EUTANÁSIA NA VISÃO DOS MÉDICOS

A busca pela cura do paciente de determinada enfermidade é, em regra, o grande fo-


co de todos aqueles que se tornam médicos. Sem embargo, em casos em que envolve a possi-
bilidade da eutanásia, onde o enfermo não possui mais condições de cura e está acometido de
intensas dores e sofrimentos, a opinião sobre a prática da eutanásia costuma ser divergente.
Assim, exatamente como acontece na área jurídica, a eutanásia torna-se um assunto bem
complicado quando discutido na medicina.
No questionário realizado com um grupo de 11 médicos de diferentes áreas e que a-
tendem em distintos estabelecimentos de saúde pode-se observar o quão complicado o assunto
é para os médicos. Aproximadamente 36,4% (quatro médicos) dos questionados responderam
ser a favor da legalização da eutanásia, enquanto aproximadamente de 63,6% (sete médicos)
dos questionados afirmaram que são contrários à legalização do referido instituto.

Legalização da
Eutanásia

4 contra
7 a favor

A maior parte dos questionados são contrários à legalização da eutanásia e tal resul-
tado não chega a surpreender, pelo contrário, já era esperado. O assunto é complexo e a opini-
ão varia de acordo com a formação ética, moral e religiosa dos profissionais e em um país
82

como o Brasil é de se esperar que a maioria venha a ser desfavorável à prática da eutanásia,
devido à influência católica em nossa sociedade.
Em razão deste aspecto, para os que defendem a legalização da eutanásia, parece que
a porcentagem dos médicos que responderam ser a favor da legalização da prática é bastante
significativa, demonstra que parte considerável da classe médica vê com bons olhos uma pos-
sível legalização do instituto, tornando a eutanásia disponível em determinados casos.
As justificativas que cada profissional utilizou para a fundamentação de sua resposta
são as mais variadas, no entanto, podemos observar claramente motivações éticas e religiosas
em inúmeras respostas que vieram a ser opor a legalização da eutanásia, por outro lado, os
médicos que responderam ser a favor da legalização do instituto focaram suas respostas na
possibilidade de evitar a dor e sofrimento dos pacientes de doenças incuráveis.
Alguns questionados, que vieram a responder ser contra a legalização da eutanásia,
mostraram ser a favor da prática da ortotanásia e tentar ao máximo confortar e diminuir a dor
do paciente até que chegue a hora exata de sua morte. Além deste argumento, destaca-se tam-
bém o aspecto religioso e ético de algumas respostas, afirmando ser totalmente a favor da
vida, ou que sobre a mesma depende a vontade de Deus ou, por fim, que a prática da eutanásia
não se alia com seus valores, de modo que o mesmo não conseguiria se ver envolvido em tal
processo.
Por outro lado, como já colocado, os que responderam ser a favor da legalização da
eutanásia deram ênfase na condição de sofrimento que os pacientes se encontram. Destacaram
que em casos especiais permanecer vivo é mais penoso para o paciente que a antecipação de
sua morte, de modo que a eutanásia poderia ser um recurso para acabar com o sofrimento do
enfermo, desde que esta fosse a sua vontade.
O que se vê com a realização deste questionário é a complexidade do tema em ques-
tão. Em conversa sobre o assunto e o questionário, os participantes destacaram a delicadeza
do assunto e como uma imensa gama de fatores está atrelada a prática da eutanásia, como o
sofrimento do paciente e da família, as consequências psicológicas para os próprios médicos
que viriam a realizar tal prática e, principalmente, em que condições eutanásia seria permitida.
Dentre outros fatores, estes parecem ter sido os elementos utilizados pelos participantes, para
que, juntamente com sua formação moral, ética e religiosa, pudessem vir a responder se seri-
am ou não a favor da legalização da eutanásia.
A princípio, é importante destacar que se esperava um resultado um tanto quanto
mais amplo contrário à legalização da eutanásia, sendo uma surpresa que aproximadamente
83

36,4% dos participantes vieram a ser favorável a legalização do instituto. Assim, parece que a
discussão em relação ao tema deve continuar e quem sabe atingindo novas bases.
84

CONCLUSÃO

Cada vez que a eutanásia vira alvo de estudos é possível observar como o tema se re-
laciona com questões que o ser humano tem imensa dificuldade em lidar. Neste sentido, mos-
tra-se clara a encruzilhada de problemas trazidos por assuntos envolvendo a vida, em seu as-
pecto biológico e qualitativo; a morte; a dignidade de um ser humano acometido por intenso e
insuportável sofrimento; e todos os valores que compõe o homem, tanto daquele atacado por
enfermidade e que suplica pela sua morte, quanto das pessoas que vivem este cenário triste e
delicado, sejam elas familiares ou profissionais.
A interdisciplinaridade que rodeia a eutanásia é nítida, no campo jurídico a questão
certamente nunca chegará a uma pacificação, uma vez que os pontos de vista sobre o instituto
são os mais antagônicos possíveis. Contudo, engana-se quem pensa que a polêmica envolve
apenas o direito, isto é, a reação dos profissionais de saúde que vieram a ser questionados pelo
pesquisador ao longo da pesquisa de campo demonstra o quão complexo é o tema e como é
complicada uma tomada de posição sobre a legalização ou não da eutanásia.
A abordagem de temas relacionados ao fim de uma vida sempre traz grandes contro-
vérsias no mundo jurídico, assim acontece com a celeuma envolvendo o aborto e a pena de
morte, e com a eutanásia não poderia ser diferente. Para muitos estudiosos, a vida é o bem
mais importante a se assegurar em um ordenamento legal, um direito inviolável e que deve ser
indisponível até mesmo para seu titular, o que faz parecer com que tal bem conquiste a aura
de direito absoluto.
No obstante, como ressaltado durante a pesquisa, os direitos fundamentais apresen-
tam duas características marcantes, a saber: eles possuem caráter relativo e inexistência de
hierarquia entre os mesmos. É claro que uma característica completa a outra, ora, se um direi-
to fundamental não é superior ao outro, então é óbvio que nenhum deles possa vir a adquirir
caráter absoluto em um ordenamento jurídico. Resta, então, a relatividade para hipóteses em
que ocorra conflito entre tais direitos.
Neste diapasão, encere-se toda a celeuma envolvendo a legalidade ou não da eutaná-
sia no ordenamento jurídico brasileiro. A problemática envolvendo tal instituto centraliza-se
na colisão entre os direitos à vida e à liberdade e a necessidade de estarem em consonância
com a dignidade da pessoa humana, valor fundante do ordenamento constitucional pátrio.
Sendo a vida um direito de caráter relativo, como se mostrou durante a pesquisa, o constituci-
onalismo moderno se destaca, através do princípio da proporcionalidade, pelo sopesamento
85

dos direitos fundamentais em conflito, de modo a se decidir qual deve prevalecer em seu res-
pectivo caso concreto.
Como se pode concluir ao observar a pesquisa, a vida, embora de grande importân-
cia, é tratada pelo ordenamento jurídico brasileiro como um direito relativo, a própria Consti-
tuição Federal de 1988 vem a limitar tal direito ao legalizar a pena de morte (Art. 5°,
XLVII/CF 88) em circunstância extraordinária. Sendo assim, não há qualquer razão para que
o direito à vida não possa vir a ser relativizado quando do embate contra o direito à liberdade,
na forma de autonomia de vontade, situação em que permitira a eutanásia e a tornaria um ins-
tituto constitucional.
Ainda que a eutanásia cada vez mais ganhe defensores nos mais variados países do
mundo e que vem sendo legalizada nos últimos anos em nações como a Colômbia e o Canadá,
no Brasil o instituto é tido como proibido, sendo considerado homicídio qualificado. Diante
do observado nesta pesquisa, pode-se dizer que tal posicionamento não traduz o que o orde-
namento constitucional brasileiro pressupõe.
Ora, como apresentado ao longo do trabalho, o que se prevê no ordenamento consti-
tucional brasileiro é o direito à vida e não o dever de viver, como acaba acontecendo quando
da não aceitação da legalização da eutanásia. Um paciente com doença ou lesão incurável ou
já em estado terminal, e que é acometido de insuportáveis dores e/ou sofrimentos físicos e
psicológicos, não deve ser obrigado a permanecer em vida se esta não é sua vontade, sob pena
de ter sua dignidade totalmente constrangida. A concepção de vida como bem jurídico não
deve ser a biológica e sim a que pressupõe a vida digna.
Neste cenário, o que deve ser observado fundamentalmente é a dignidade da pessoa
que se encontra em situação totalmente adversa. Atentar para um provável caráter sagrado da
vida parece inadmissível em um Estado laico como é o Brasil, em que há liberdade de crença,
isto é, uma pessoa pode acreditar no que desejar, assim como também pode vir a não crer.
Assim, utilizar crenças religiosas contra a legalização da eutanásia mostra-se em con-
tradição com o que pressupõe a Constituição Federal de 1988. Ora, mesmo sendo minoria,
não se pode obrigar aqueles que não acreditam que a vida é sagrada a permanecerem vivos,
sob intensos e insuportáveis sofrimentos, em condições que a própria pessoa acha indigna de
se viver.
O que deve ficar claro, e que talvez não seja compreendido através dos ensinamentos
dos opositores da eutanásia, é que a legalização do instituto não obrigará o paciente a fazer
uso da eutanásia, mesmo porque a dignidade é um valor deveras subjetivo. A antecipação da
sua própria morte não seria um dever e sim um direito do paciente, se o mesmo, ainda que de
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forma bastante sofrida, possui a crença de que deve permanecer vivo até o último suspiro ou
acredita em uma reversão milagrosa de seu quadro de saúde, tem ele o direito a permanecer
vivo e ignorar a eutanásia. Neste diapasão, é evidente que os médicos também não serão obri-
gados a participar do procedimento eutanásico, cabendo apenas àqueles que são a favor do
instituto.
Obviamente que quando se defende a legalização da eutanásia no ordenamento jurí-
dico brasileiro não se está dizendo que tal fato deva ser realizado de forma incontrolável. Co-
mo observado ao longo da pesquisa, pelo menos cinco países no mundo se posicionam pela
legalidade do instituto jurídico tema do trabalho, em todos eles são estabelecidos uma série de
requisitos a serem preenchidos para que o paciente possa vir a requerer a eutanásia, destacan-
do, entre outros: estar acometido de doença ou lesão incurável ou em estado terminal; ter opi-
nião de pelo menos dois médicos sobre seu quadro de saúde; estar sob insuportáveis dores
e/ou sofrimentos; e a eutanásia ser um pedido baseado única e exclusivamente em sua auto-
nomia de vontade. Ademais, destaca-se a existência de órgãos de fiscalização dos procedi-
mentos eutanásicos.
Situação idêntica teria de ser adotada no Brasil, como forma de impedir a deturpação
do instituto jurídico, claramente um dos medos dos que se opõe à eutanásia. Além disso, con-
forme exposto durante a pesquisa, parece muito mais humano e condizente com o princípio da
dignidade da pessoa humana que, nos casos relacionados à eutanásia ativa, o agente ativo de-
va ser o profissional da medicina. Tal afirmação deriva do conhecimento e técnica do médico
em tornar a antecipação da morte do paciente totalmente indolor, ademais, é o médico aquele
que irá diagnosticar e compreender a evolução do quadro de saúde do enfermo.
Outra consideração a ser retirada da realização da pesquisa diz respeito ao testamento
vital e a importância que a regulamentação deste instituto teria para a resolução de casos em
que o paciente permanece em estado vegetativo sem a possibilidade de declarar sua vontade
sobre tratamentos ou mesmo sobre seu desejo de abreviar a vida, em caso de a eutanásia vir a
ser legalizada.
Não são poucos os pacientes que permanecem em estado vegetativo permanente por
anos, o que em certos casos poderia facilmente caracterizar violação a sua dignidade. Regula-
rizar o testamento vital poderia impedir muitos destes casos, principalmente por ter a condi-
ção de popularizar um instituto tão desconhecido por parte da população em geral.
Portanto, a eutanásia, nas suas formas ativa e passiva, se mostra um importante direi-
to a se ter a disposição do paciente que se encontra em situação totalmente dolorosa, árdua e
sofrível. A legalização deste instituto jurídico se mostra em consonância com o que pressupõe
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o ordenamento constitucional brasileiro, ao se apoiar no direito de liberdade na forma de au-


tonomia de vontade. Mostra-se claro que o ordenamento jurídico pátrio não deve forçar ne-
nhuma pessoa a permanecer vivendo em situação de insuportável sofrimento físico-
psicológico, isto porque, tal conjuntura vem a denegrir a dignidade da pessoa humana, fun-
damento basilar do direito brasileiro.
Não há o dever de viver e sim o direito à vida, assim, em determinadas ocasiões
permanecer vivendo torna-se atentatório a dignidade da pessoa humana, de modo que a euta-
násia se apresenta como importante recurso para, de acordo com a autonomia de vontade do
próprio paciente, colocar fim ao sofrimento de um ser humano de forma digna. Por esta razão,
o instituto da eutanásia, que como destacado, se apresenta em consonância com o ordenamen-
to constitucional pátrio, deve vir a ser legalizado em solo brasileiro.
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98

ANEXOS
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APÊNDICES

MODELO DE QUESTIONÁRIO:

UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA


INSTITUTO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS
CURSO DE DIREITO

Informações para o (a) participante:

Este é um questionário anônimo que faz parte da coleta de dados para a pesquisa que
discorrerá sobre a eutanásia e servirá como parte de trabalho de conclusão do curso de direito.
A pesquisa em questão buscará investigar o complexo antagonismo em torno da eu-
tanásia, analisando se tal instituto seria um direito de o paciente morrer de forma digna ou se,
na verdade, seria uma forma de mitigação da vida.
Tal pesquisa é de responsabilidade do acadêmico Marco Angelo Soto Vianna da U-
niversidade Federal de Roraima.
Segue alguns pontos para ser lido com atenção: a) Você pode deixar de participar da
pesquisa sem que precise apresentar qualquer justificativa para tal; b) Sua identidade será
mantida sob sigilo; c) caso queira, poderá ser informado dos resultados finais da pesquisa.

Número de Registro: ___________


Profissão: ______________________

QUESTIONÁRIO

1. Você é a favor da legalização da eutanásia?


Sim Não

2. Por quê?
100

___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________

3. Em sua opinião, a eutanásia seria uma forma de o paciente morrer de forma digna,
ou seja, sem prolongar mais seu sofrimento?
Sim Não

4. O paciente deve ser forçado a permanecer “vivo” mesmo estando o mesmo em estado
terminal e sob sofrimento físico e psicológico?
Sim Não

5. Com a eutanásia legalizada, você realizaria a eutanásia em um paciente que atendes-


se os critérios?
Sim Não

6. Em caso da resposta acima for não, por qual motivo?


Religioso Ético Outro

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