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Com a redemocratização brasileira na década de 1980, surge um movimento de

educação progressista que concorreu para uma mudança na concepção de criança,


culminando na criação do Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA em 1990. A
nova legislação garantiu que crianças e adolescentes passassem da condição de
“objetos” para “sujeitos” do direito, a despeito de sua origem social. Essa passagem
marca a passagem da doutrina de situação irregular do extinto Código de Menores
para a doutrina de proteção integral do ECA.

A doutrina da situação irregular que vigorou entre 1927 a 1979, consistia em


legitimar sujeitos em situação de vulnerabilidade a absoluta disposição do Estado. Eram
clientes em potencial os chamados “menores” que estivessem em “perigo material ou
moral”, isto é, uma infância tida como desvalida e infratora.

O Estado justificava a situação irregular do menor a partir do descaso de pais, da


situação de mães solteiras, da desorganização familiar, uma vez que a falta de autoridade
expunha os menores a situação de risco social, ao crime e a marginalidade. Durante a
vigência do Código, muitos foram recolhidos pelo Estado. A doutrina da situação
irregular, enfim, investigava a conduta pessoal, a família e o abandono social, em uma
espécie de “controle da pobreza”.

Crianças e adolescentes sob a tutela do Estado eram vistos como ameaça à ordem
pública, era necessário transformá-los em cidadãos mais uteis e produtivos para a
sociedade. A legislação “menorista” assumiu assim caráter ambíguo: ao mesmo tempo
que o menor em situação irregular simbolizava perigo a ser detectado e disciplinado era
uma “inocência” a ser recuperada e educada.

O Código de Menores de 1979 manteve o mesmo ideário conforme seu art. 5:


“Na aplicação desta lei, a proteção aos interesses do menor sobrelevará qualquer outro
bem ou interesse juridicamente tutelado” (BRASIL, 1979). 60 anos depois com o
ECA, não só o termo “menor” passa a ser abolido como assiste-se a mudanças
estruturais significativas na política de assistência à criança e ao adolescente. O ECA
não protege mais apenas os desamparados, mas a todas as crianças e adolescentes,
independentemente de contextos socioeconômicos.

A expressão “menor” ainda encontra-se no imaginário social, como um símbolo


de exclusão, o que impede que jovens em situação de risco social sejam vistos como
crianças e adolescentes, principalmente quando cometem atos infracionais. A
manutenção do termo no imaginário social passa de uma condição etária para uma
condição sociológica e mesmo psicológica. O termo passa a ser sinônimo de “infrator”
ou “aberração”. A sentença do menor infrator passa a ser fruto das conversas informais,
apelos midiáticos e sensacionalistas, mobilizando o medo e a atenção de uma “corte
popular” que julga pelo senso comum, fazendo com que o julgamento rompa os
tribunais, o saber jurídico e se torne parte do cotidiano das pessoas.

Não escapam à essa visão aqueles que observam a lei e sua aplicação, isto é, os
Operadores do Direito. Estudos realizados na França tanto com leigos quanto
profissionais que lidavam com a delinquência, concluem que ela é, em certa medida,
definida pela cultura e que os julgamento e atitudes sobre os delinquentes depende do
lugar social ocupado. Em outros termos, não se pode falar em uma única representação
de delinquência ou atitudes universais em relação a ela, muito embora a Psicologia
Jurídica tipifique quatro delas: a delinquência ocasional, a psicótica, a neurótica e a
profilática. Ainda assim só confirma que a diversidade do termo só pode ser explicada
pelas práticas profissionais, adesões ideológicas e valores morais de uma cultura, de um
grupo social ou de uma categoria profissional.

Apesar do ECA, ainda usa-se elementos da doutrina da situação irregular na


representação jurídica do adolescente: na apuração do ato infracional, centralizado na
figura do Juiz do Menor e do Promoter, sendo a figura do defensor meramente
facultativa; mesmo nomeando os delitos praticados por adolescentes como atos
infracionais a referência é o Código Penal, já que o ECA não define nem categoriza os
atos infracionais, tampouco as medidas a eles respectivas. Velhas visões como a do
“discernimento” da doutrina da situação irregular ainda são observadas nas
práticas sociais onde o adolescente “se pode votar, pode ser preso”. A leitura
rígida de um estado psíquico, somente sob o olhar de uma infração, não condiz com o
compromisso da Psicologia com o sujeito sociohistorico em transformação que é o
adolescente. A educação também não é evocada como direito e sim como um dever
como atenuante de sua condição de infrator.

Enfim, concluindo temos o menor travestido de ““adolescente em conflito com a


lei integralmente protegido”. As análises compreendidas aqui mostram que ainda não
avançamos juridicamente em relação ao adolescente infrator: este ainda é visto sob a
ótica da “situação irregular”. Família, Escola, personalidade, sua “biografia infracional”
ainda
são fatores que pesam no julgamento do ato infracional. O mais grave é que as medidas
protetivas que deveriam atender a todo e qualquer adolescente, são acionadas pela
justiça infanto-juvenil apenas quando se refere ao consumo de drogas. Sendo assim,
tudo o que podemos compreender é que as representações sociais no âmbito da
Justiça ainda baseiam-se em um modelo que ainda considera o adolescente um objeto
do Direito, cujo futuro na condição de infrator ainda é decidido e traçado pelo Estado.

REFERÊNCIAS

CIARALLO, Cynthia; ALMEIDA, Ângela. Conflito entre Práticas e Leis: A


Adolescência no Processo Judicial. In: Fractal: Revista de Psicologia, v. 21 – n. 3, p.
613- 630, Set./Dez. 2009.

PINHEIRO, Carla. Psicologia Jurídica. São Paulo: Saraiva, 2013.

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