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20/08/2020 Paul Ricouer e a hermenêutica de si no espelho das palavras

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versión impresa ISSN 1315-5216
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Utopìa y Praxis Latinoamericana v.14 n.47 Maracaibo dic. 2009
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Paul Ricouer e a hermenêutica de si no espelho das palavras
Como citar este artículo
Paul Ricouer and a Hermeneutics of Self, Not a Mirror of Words
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Walter SALLES Enviar articulo por email

PUC-Campinas / Brasil Indicadores

RESUMO Citado por SciELO

O objetivo deste artigo é refletir sobre a construção da identidade pessoal no Accesos


contexto do pluralismo que caracteriza o mundo globalizado. Nessa
construção, as diferenças culturais surgem, ao mesmo tempo, como riqueza Links relacionados
e ameaça às identidades pessoais. Esta reflexão tem por pressuposto a Compartir
importância da hermenêutica de textos fundadores das tradições na
construção da própria identidade, entendida como identidade narrativa. Este Otros
é o caso particular da identidade cristã cuja reflexão exige, ao menos por
parte da Teologia e das Ciências da Religião, considerar a filosofia como uma Otros
interlocutora privilegiada, no caso particular deste estudo a filosofia
hermenêutica de Paul Ricoeur. Permalink

Palavras-chave: Hermenêutica, identidade, pluralismo, texto.

ABSTRACT

This article discusses the construction of personal identity in the context of pluralism that characterizes the
globalized world. In this process, cultural differences appear at the same time as both richness and threat. This
discussion presupposes the importance of the hermeneutics of texts that gave birth to traditions of self-identity
construction, taken as narrative identity. This is the particular case of Christian identity whose discussion, at least
by theology and religious sciences, requires considering philosophy as a privileged interlocutor; in the particular
case of this study, Paul Ricoeur’s hermeneutic philosophy.

Key word: Hermeneutics, identity, pluralism, text.

Recibido: 20-10-2008 · Aceptado: 03-07-2009

INTRODUÇÃO

Ao iniciar a introdução deste ensaio, talvez não seja uma atitude desnecessária expor o porquê tomar a filosofia
como interlocutora na busca da melhor compreensão da identidade cristã diante de textos fundadores, motivação
que aponta para o entrecruzamento de convicções pessoais e exigências acadêmicas. Como expressão desse
entrelaçamento, tomo a liberdade de fazer minhas as palavras de Paul Tillich (1886-1965), ao afirmar que
“...nenhum teólogo devia ser tomado a sério – seja qual for a sua piedade e erudição – se a sua obra não mostra
que ele toma a sério a filosofia”1. Além disso, quero ressaltar que a reflexão em torno da construção de uma
identidade pessoal é um desafio tanto para a teologia como para a filosofia, uma vez que as diferenças culturais
surgem, ao mesmo tempo, como uma riqueza e uma ameaça às identidades pessoais. Diversos episódios da
história da humanidade mostram como que, diante de uma suposta ameaça do outro, do diferente, textos
fundadores são tomados para legitimar a própria identidade e negar a identidade alheia, por vezes de forma
autoritária e violenta. Em parte, porque essa apropriação pode ser inapropriada, pode significar uma deturpação do
que vem a ser um texto e de seu papel na constituição da identidade pelo ato da leitura que exige a refiguração do
sentido configurado pelo texto, ou seja, exige o trabalho de interpretação.

A maneira como entendo a reflexão em torno da construção de uma identidade pessoal no contexto do pluralismo
cultural de nosso mundo globalizado tem por pressuposto a idéia de que o entrelaçamento entre pluralismo e
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identidade pessoal na configuração de uma identidade religiosa extrapola as fronteiras da teologia e exige o diálogo
com a própria filosofia. É movido, pois, pela necessidade desse diálogo que tomo por fundamento a produção
filosófica de Paul Ricoeur (1913-2005), a fim de melhor compreender o diálogo entre tradições que fundamentam a
construção de suas identidades religiosas a partir de textos considerados sagrados. Textos que, como gosta de
afirma o próprio Ricoeur, são capazes de possibilitar a decifração da vida e a construção da própria identidade no
espelho das palavras.

I. RICOEUR E A TRADIÇÃO FILOSÓFICA

Paul Ricoeur é considerado por muitos como um dos grandes pensadores e filósofos franceses do século XX.
Nascido em Valença (27 de fevereiro de 1913) foi professor na Universidade de Strasbourg e na Universidade de
Sorbonne, antes de assumir o cargo de reitor na Universidade de Nanterre, trabalho que veio a ser um momento
particularmente difícil na sua trajetória intelectual e que acabou por obrigá-lo a renunciar ao cargo de reitor nessa
Universidade e “refugiar-se” nos Estados Unidos, como professor na Divinity School da Universidade de Chicago
(1970-1981)2. No período de 1981-1990, Ricoeur conhece o “retorno” e a consagração na França. Após um longo
período de uma profunda produção filosófica, Ricoeur veio a falecer em 2005, em Paris.

Pensador de tradição religiosa protestante, não se via, contudo, como um filósofo cristão, mas sim como um cristão
de expressão filosófica, como Rembrant era para ele um cristão de expressão pictórica. Com isso, queria manter
distintas, mas não totalmente separadas, essas duas áreas do saber: a filosofia e a teologia, mais propriamente a
investigação sobre a realidade religiosa. A sua reflexão filosófica é desenvolvida em um grande número de textos
filosóficos e literários que fazem dele mestre de uma das áreas mais significativas da filosofia contemporânea: a
hermenêutica. Em sua obra, a palavra hermenêutica possui ao menos três sentidos: a hermenêutica dos símbolos,
a hermenêutica do texto e a hermenêutica da ação, tripartição que para muitos marca três etapas no
desenvolvimento da reflexão filosófica de Ricoeur3. É possível igualmente dizer que sua obra filosófica é marcada
por uma antropologia que está empenhada em desenvolver o sentido do homem, sua maneira de se manifestar
(pelas obras da cultura) e atuar. Ricoeur entra em diálogo com o estruturalismo, reconhecendo o valor técnico da
análise das unidades que compõem o discurso, mas se dedica, sobretudo, a uma hermenêutica que vise o
descobrimento do ser que se manifesta nas múltiplas formas de discurso.

A reflexão ricoeuriana é desenvolvida no contexto das principais correntes filosóficas do século XX. Em 1983,
definiu seu posicionamento intelectual a partir do entrelaçamento de três perspectivas filosóficas: a filosofia
reflexiva, a fenomenologia husserliana e a hermenêutica4. No início de sua trajetória intelectual, o encontro com
Gabriel Marcel e a leitura da obra de Karl Jasper o conduziram ao estudo dos escritos de Husserl, do qual resultará
em 1950 no primeiro volume de uma Filosofia da Vontade (Philosophie de la volonté. Le volontaire et l’involontaire)
que toma distância crítica com relação ao idealismo transcendental husserliano. O segundo volume dessa Filosofia
da Vontade, é lançado em 1960, com o subtítulo Finitude e culpabilidade (Finitude et culpabilité. L’homme faillible.
La symbolique du mal). Estes estudos mostram a falibilidade da vontade, experimentada como culpabilidade e
apreendida na linguagem da confissão. O estudo em torno da simbólica do mal dá início a uma reviravolta em sua
reflexão a partir da hermenêutica dos símbolos, pois para ele o acesso à experiência do mal somente se torna
possível graças à mediação dos símbolos. O problema que se apresenta em torno da linguagem simbólica é como
compreender o sentido segundo que o sentido primeiro do símbolo oculta. Esta reflexão em torno da hermenêutica
dos símbolos se prolonga no diálogo com a psicanálise a partir da publicação em 1966 de Da interpretação: ensaio
sobre Freud (De l’interprétation, essai sur Freud), a qual já expressa a dimensão hermenêutica da fenomenologia
que caracteriza os trabalhos dos anos 1960 a 1980. Esse longo caminho percorrido por Ricoeur chega, em 1990, à
obra Si mesmo como outro (Soi-même comme un autre), na qual são colocados os traços de uma hermenêutica de
si.

A teoria da interpretação de Ricoeur está inserida em um arco que conhece ainda a publicação de outras obras de
grande relevância para o trabalho hermenêutico: em 1969, O conflito das interpretações (Les conflit des
interprétations); em 1975, A metáfora viva (La métaphore vive); no decurso de 1983-1985, surge sua trilogia
Tempo e narrativa (Temps et récit). Essas duas últimas são consideradas pelo próprio autor como gêmeas por
terem sido concebidas juntas5. O conjunto dessas obras gêmeas é perpassado pela idéia de que o enunciado
metafórico possui o poder de reescrever a realidade e assim se torna capaz de dar um sentido à vida humana
desde um processo de interpretação, tanto no campo da história quanto no contexto da ficção, na certeza de que
toda nova descrição da realidade desemboca em uma reconfiguração da experiência pessoal e coletiva, com a
marca do tempo. Essa dimensão temporal traz consigo uma questão fundamental: a temporalidade humana não
pode ser dita diretamente, mas somente a partir da mediação do discurso indireto da narração, o que mostra a
importância do caráter lingüístico da experiência humana, isto é, da capacidade humana de narrar uma história na
qual é possível o reconhecimento de um horizonte de sentido.

Para Ricoeur, as metáforas mostram que a linguagem não possui apenas a função descritiva e, ao renunciarem a
descrição direta da realidade, introduzem uma inovação semântica: a referência metafórica aponta para o poder do
enunciado metafórico de re-descrever uma realidade inacessível à descrição direta6. Essas duas dimensões da
linguagem humana – a metáfora viva e a função narrativa – estão presentes na noção de mundo do texto que não
é somente projeto e proposição de mundo, mas mediação da compreensão de si. Essa hermenêutica de si diante
do texto não visa o ser humano como um dado absoluto, acabado, mas como poder ser, na medida em que o texto
possibilita uma melhor compreensão de si. Uma dimensão da existência humana é explicitada, em 1986, com a
publicação da obra Do texto à ação: ensaios de hermenêutica II (Du texte à l’action, essais de herméneutique II),
como síntese do percurso hermenêutico traçado por Ricoeur. Nesta obra são reunidos artigos fundamentais que
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foram escritos na década de 70 e na primeira metade da década de 80, os quais evidenciam que para Ricoeur, ou
para a tradição na qual ele se insere, a teoria da interpretação se fundamenta no reconhecimento do lugar central
que a linguagem e os símbolos ocupam na existência humana.

No tocante à reflexão em torno da hermenêutica é preciso igualmente destacar outras obras mais recentes: Pensar
biblicamente (Penser la Bible) de 1998 e A hermenêutica bíblica (L’herméneutique biblique), surgida em 2000.
Nestas duas obras as relações entre hermenêutica filosófica e hermenêutica bíblica são articuladas de forma
sistemática, embora já na obra Do texto à ação Ricoeur busque explorar a contribuição da hermenêutica filosófica à
hermenêutica bíblica que é entendida como uma aplicação regional da hermenêutica geral, situando a
hermenêutica filosófica e a hermenêutica bíblica em uma relação complexa de mútua inclusão. Neste movimento,
ambas hermenêuticas devem superar tentações específicas: o exegeta não deve negligenciar o ato de ler no
trabalho de explicação do texto; o filósofo deve considerar como fundamental a especificidade do corpus bíblico no
que diz respeito ao seu gênero literário. Pensar biblicamente é aceitar a função mediadora do texto pelo ato da
leitura e igualmente admitir a possibilidade de o texto fundador fazer da tradição religiosa um autêntico lugar de
pensamento. No percurso filosófico de Ricoeur é preciso destacar, por fim, outras duas grandes obras: A memória,
a história e o esquecimento (La mémoire, l’histoire, l’oubli), de 2000, e Percurso do reconhecimento (Parcours de
la reconnaissance), publicada em 2004.

No horizonte de sua hermenêutica filosófica, Ricoeur considera a existência de dois movimentos que caracterizam a
história recente da hermenêutica: a desregionalização e a ontologização. História que foi objeto de numerosos
debates, mas que não é possível e nem cabível, neste momento, entrar em seus pormenores, mas apenas trazer à
memória e lembrar aspectos de uma história moderna da hermenêutica que nos conduz de Schleiermacher a
Gadamer passando por Dilthey e M. Heidegger7.
Gadamer,

A partir de F. Schleiermacher (1768-1834) e W. Dilthey (1833-1911), o problema hermenêutico se torna um


problema filosófico, sendo colocado ao lado da psicologia, ou seja, “compreender é, para um ser finito, transportar-
se para outra vida”8. Com Dilthey, de modo particular, temos a inclusão da exegese bíblica e da filologia no interior
das ciências históricas. Somente a partir desta inclusão é que se pode superar a lacuna deixada pelo pensamento
filosófico de Emmanuel Kant (1724-1804) que evidenciou um espírito impessoal, portador de condições de
possibilidade dos juízos universais. Com isto, não se deseja negar o impacto da reviravolta operada pela filosofia
kantiana com referência às ciências da natureza: colocar o sujeito como centro do universo do conhecimento
humano.

Com Wilhelm Dilthey (1833-1911), o problema hermenêutico fica subordinado ao problema propriamente
psicológico da compreensão do outro. Além disso, Dilthey trabalha com a distinção entre ciências da natureza e
ciências do espírito, e entre explicar e compreender. Às chamadas ciências da natureza cabe a explicação empírica
do real, ao passo que as ciências do espírito se restringem ao âmbito das formas de conhecimento que supõem a
compreensão das relações e produções históricas do ser humano. Assim, explicar significa buscar relações
regulares de causa e efeito entre os elementos da natureza. Compreender é apreender um sentido, entendido
como o significado da expressão de outro ser humano. Dilthey se debruça sobre a necessidade de se incorporar o
problema regional da interpretação dos textos no contexto mais amplo do conhecimento histórico, preocupação
que surge diante daquele que para muitos vem a ser o grande êxito da cultura alemã do século XIX: “a invenção
da história como ciência de primeira grandeza (...)Dilthey é antes de tudo intérprete deste pacto entre a
hermenêutica e a história”9. Por isso, antes da compreensão de um texto do passado vem a compreensão do
encadeamento histórico, considerado como a mais fundamental expressão da vida. Surge, assim, uma oposição
que atravessa toda a sua obra: a explicação da natureza versus a compreensão da história. Dilthey procura na
psicologia o traço distintivo do compreender que pressupõe a capacidade primordial de se transportar para a vida
psíquica de outro. Isto supõe que a intencionalidade do autor esteja objetivada no texto, o que possibilita ao leitor
discernir e identificar a manifestação do outro no texto. Nesta tentativa de compreensão do outro, mediada pelo
texto, temos o fundo psicológico da obra de Dilthey, ou seja, a compreensão não daquilo que diz o texto, mas
daquele que nele se expressa. Por isso, “a obra de Dilthey, mais ainda que a de Schleiermacher, elucida a aporia
central de uma hermenêutica que situa a compreensão do texto sob a lei da compreensão de outrem que nele se
exprime”10.

Com Martin Heidegger (1889-1976), a questão da compreensão desvincula-se da comunicação com outro,
desencadeando um processo de “des-psicologização”. Em certo sentido, o mundo toma o lugar do outro, pois a
ontologia da compreensão começa com a reflexão sobre o ser–em ( ser–no–mundo) e não sobre o ser–com (o
outro). “A primeira função do compreender é a de nos orientar numa situação. O compreender não se dirige, pois,
à apreensão de um fato, mas à de uma possibilidade de ser”11. Compreender um texto equivale a revelar a
possibilidade de ser indicada pelo texto, vale dizer, descobrir o sentido da vida pelo texto, ou ainda, “pro–jetar”
nele a própria existência. Na compreensão, a escuta é a relação fundamental da palavra com a abertura ao mundo
e ao outro. Compreender é entender, sendo a compreensão o modo de ser do ser humano e, portanto, a raiz de
todo conhecimento. O compreender compreendendo-se é visto por Heidegger como a estrutura original do ser–no–
mundo, constitutivo do ser–aí (Dasein), podendo-se assim afirmar que o existir possui uma estrutura
hermenêutica.

A função primeira da compreensão é orientar em uma situação no mundo, compreender é, pois, a abertura de uma
possibilidade de ser (no mundo) e não simplesmente o conhecimento de um fato bruto. Essa é uma pré–
compreensão constitutiva do Dasein, a qual uma concepção positivista de ciência ainda busca eliminar como
preconceito, na sua pretensa objetividade sem limites. Como lembra Ricoeur, para Heidegger qualquer ato
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interpretativo que busque a compreensão de algo, já deve ter compreendido, de certa maneira, o que será
interpretado12. A partir desse movimento de ontologização, Heidegger abandona, pois, a questão da distância
entre as ciências da natureza e as ciências do espírito, tal como fora formulada por Dilthey, bem como a oposição
entre explicar e compreender, e conseqüentemente a questão da compreensão é deslocada retroativamente para
um plano anterior ao debate epistemológico. Todavia, se Heidegger toma distância da distinção entre explicar e
compreender, acaba por promover outro distanciamento, ou seja, entre epistemologia e ontologia.

Segundo Ricoeur, essa temática ou distanciamento heideggeriano é o centro da importante obra de Hans-Georg
Gadamer (1900-2002): Verdade e Método, publicada em 1960. Esta obra retoma a reflexão sobre as ciências do
espírito a partir da reflexão de Heidegger em torno da ontologia. Nessa perspectiva, Gadamer fala de uma
experiência de pertencimento e contrapõe ao método uma verdade que tem sua origem na experiência, em uma
experiência hermenêutica. Em suma, a verdade não é alcançada a partir de um método, mas desde uma
experiência que se manifesta na arte, na história, na linguagem. A verdade não é produzida pelo sujeito, ela lhe
acontece ou precede à reflexão, o sujeito pertence à história antes mesmo de se pertencer a si mesmo13. Nesse
sentido, não podemos tomar distância da história a ponto do passado tornar-se um objeto para nós. Estamos
sempre situados na história e a nossa consciência é determinada por um devir histórico, e ao entrarmos em
contato com expressões significativas de outra situação histórica – de outro mundo – há um encontro de horizontes
de sentidos. Na linguagem de Gadamer
Gadamer, dá-se uma “fusão de horizontes” e não um conhecimento objetivo do
outro, e nessa fusão, o mundo ou o horizonte de quem compreende é ampliado pela abertura provocada pelo
horizonte alheio. O horizonte do outro é introduzido e apreendido nos limites do meu próprio horizonte que é então
ampliado, há um deslocamento do meu horizonte existencial, da minha história. Essa noção de pertencimento à
história é uma retomada da noção heideggeriana da estrutura de antecipação da experiência humana (ontologia),
pré-conceitos constitutivos da consciência humana essencialmente histórica.

Com a reflexão filosófica de Gadamer temos a síntese do movimento das hermenêuticas regionais em direção à
hermenêutica geral, bem como da epistemologia das ciências do espírito à ontologia. Em sua reflexão sobre o
papel da teologia no século XX, Rosino Gibellini afirma que para Gadamer a hermenêutica

indica o movimento fundamental da existência, que a constitui em sua finitude e historicidade e abraça, assim,
todo o conjunto de sua experiência no mundo. Não é arbítrio ou exagero sistemático de um aspecto particular dizer
que o movimento da compreensão é algo universal e constitutivo14.

O ponto de partida da proposta hermenêutica de Gadamer é a descrição da hermenêutica como diálogo entre o
intérprete e o texto, a qual possui pontos que se tornam essenciais para o que será afirmado mais adiante sobre o
paradigma do texto: o distanciamento (distância histórica) e a fusão de horizontes. Isto equivale dizer que não
vivemos em horizontes fechados e tampouco em um único horizonte, ficando excluída, portanto, a idéia de um
saber total e único, bem como a noção de objetivismo, ou seja, a absorção do próprio horizonte no horizonte do
outro. Assim, a comunicação entre duas consciências se dá a partir da fusão de seus horizontes existenciais, e o
que permite a comunicação na distância é o mundo do texto que não pertence mais ao seu autor e tampouco a seu
leitor15. Além disso, é importante ressaltar que um autor ou uma época chega até o intérprete mediado por uma
série de interpretações, em forma de texto, que determinam a pré-compreensão do novo intérprete,
desembocando desta maneira em uma nova interpretação (fusão de horizontes). Compreender implica, pois, em
inserir-se em um processo de tradições históricas, o que é diferente de se identificar com outra pessoa (autor do
texto) como pretendiam, embora de maneiras distintas, Schleiermacher e Dilthey.

A reflexão em torno da hermenêutica contemporânea é sem dúvida devedora do pensamento de Schleiermacher e


Dilthey, uma vez que essa reflexão somente pode ser levada adiante a partir desses dois pensadores, ambos
considerados como fundadores da hermenêutica moderna, sem, contudo, esquecer os limites presentes em suas
reflexões16. Por isso, se da aporia em Schleiermacher surgem as reflexões de Dilthey, as lacunas deixadas por este
pensador nos conduzem a Heidegger e a Gadamer
Gadamer.

II. A NOÇÃO DE MUNDO DO TEXTO

A partir do horizonte histórico esboçado acima, convém ressaltar que a noção gadamer
gadameriana de pertença e a noção
de ser-no-mundo de Heidegger estão na base da hermenêutica filosófica de Paul Ricoeur, uma influência que pode
ser sintetizada da seguinte maneira:

...a força da imaginação não existiria se o ‘compreender’ não estivesse ele mesmo enraizado no mundo, sempre
prévio a qualquer experiência e a qualquer explicação (...) Aquilo que o primeiro – Heidegger – designa como ‘pré–
compreensão’ e o segundo – Gadamer – por pertença, é o subsolo das reflexões ricoeurianas sobre a imaginação e
o poder concomitante de inovar semanticamente a partir do texto e de reescrever o real, correspondendo assim ao
apelo de uma veemência inesgotável17.

Todavia, como aceitar a idéia de pertencimento histórico sem abandonar a noção de distanciamento? Isto é
possível na medida em que se considera tanto o pertencimento quanto o distanciamento como condições inerentes
à história. Ricoeur articula pertencimento e distanciamento a partir da noção de texto, sendo sua hermenêutica do
texto um dos grandes legados à hermenêutica contemporânea. Entretanto, em sua reflexão filosófica, ele se
posiciona para além das polarizações que marcaram a história do pensamento hermenêutico: explicar e
compreender; distanciamento e pertencimento; hermenêutica e crítica das ideologias; conhecimento metódico e
experiência da verdade. Todavia, esse transbordamento exigirá um longo percurso pela questão da linguagem e da

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interpretação, uma vez que é na linguagem que se dá toda compreensão ontológica e é no movimento da
interpretação que percebemos o ser interpretado18. Em suma, “Ricoeur propõe-se um ‘via longa’, que o leva a
pensar a interpretação como um processo complexo que inclui tanto o momento da descrição das estruturas e suas
leis – a explicação – como o momento de apropriação do sentido pelo sujeito – a compreensão –, sem perder de
vista seu horizonte ontológico19.

A linguagem passa a ser entendida fundamentalmente como “discurso”, ou seja, “alguém diz algo de alguma coisa
a alguém”. Ou ainda, uma experiência pessoal de mundo trazida à linguagem, dotando-a de sentido e tornando-a
acessível a outras pessoas. Essa experiência humana do mundo é o fundamento extralingüístico de qualquer forma
de discurso que o estruturalismo desconsidera ou desconhece. Ricoeur reconhece o estruturalismo como um
momento necessário da análise de qualquer forma de discurso, embora o considere insuficiente. Por isso, a
reflexão entre pertença e distanciamento é feita de modo privilegiado a partir da noção de texto, sendo este
entendido como “discurso” fixado pela escrita. É a partir dessa idéia central, a noção de texto, que é desenvolvida
a sua contribuição à tradição hermenêutica20, de modo especial desde a pergunta sobre o que é um texto e pela
função hermenêutica do distanciamento. O texto passa a ser visto como o paradigma da comunicação no
distanciamento, o que manifesta um caráter fundamental da historicidade humana: uma comunicação na e pela
distância, uma função positiva e produtora do distanciamento no centro da experiência humana, no cerne da
história21.

Este tipo de comunicação supõe que o texto possa preservar o discurso de sua destruição ao longo do tempo.
Contudo, esta não é a única função da escrita, uma vez que a mesma promove igualmente a autonomia do texto
como algo que lhe é constitutivo. É graças à escrita que o mundo do texto faz explodir o mundo do autor, já que na
escrita temos a superação de seu horizonte intencional e finito. Desta maneira, o trabalho hermenêutico, a partir
da noção de texto, se afasta da alternativa que durante muito tempo marcou o seu exercício: ou compreender um
autor ou entender a estrutura do texto. Este distanciamento nos aproxima da idéia de que interpretar é trazer à
linguagem o tipo de ser-no-mundo que se desvela diante do texto, cabendo, pois, à hermenêutica elucidar esse
processo, no qual o discurso acontece como evento (alguém diz) e é apreendido como significação, ou seja, pode
ser transmitido e apreendido para além do momento presente (função do distanciamento inerente à linguagem).
No caso da escrita, o texto instaura uma distância que permite à hermenêutica superar a pretensão (romântica) de
definir a compreensão como sendo o colocar-se no lugar do outro. Na verdade, o discurso como escrita ganha
autonomia com relação a seu autor, ou como gosta de dizer Ricoeur, de maneira metafórica, a morte do autor
significa a autonomia do texto. Trata-se de na leitura considerar o autor como já morto e o livro como póstumo, e
como o autor já não pode mais responder a nossas questões, resta a nós leitores “apenas” ler e interpretar sua
obra.

Essa noção de texto acaba por promover uma revalorização da escrita, sendo que o discurso como escrita (texto)
suspende uma referência de primeiro grau: locutor–ouvinte. A relação entre autor e leitor é distinta do diálogo
locutor e ouvinte e nessa suspensão, ou melhor, na instauração de uma referência de segundo grau, texto–leitor, o
discurso é capaz de transcender as condições psicológicas e sociológicas de sua produção. E esse distanciamento
não surge como obstáculo a ser superado, mas como condição ou a possibilidade mesma da compreensão, pois um
texto ganha autonomia com relação ao autor, bem como diante do contexto no qual foi produzido. O texto pode,
portanto, ser apropriado em outras situações por leitores que se encontram distantes, ou seja, não compartilham
de modo imediato da mesma situação do autor do texto. Em outras palavras, o texto pode e deve ser
descontextualizado e recontextualizado no contexto do leitor, mesmo distante. A leitura de um texto passa pela
dialética entre explicar e compreender como partes integrantes de um processo mais amplo de interpretação, no
qual interpretar significa caminhar, pôr-se em marcha em direção ao mundo aberto pelo texto, ao passo que
explicar significa mostrar a estrutura interna de um texto.

Apropriar-se de um texto é, pois, apropriar-se dos vários mundos que o texto permite e incentiva desde o seu
potencial de sentido. Há aqui um elo entre hermenêutica e ontologia: não basta conhecer o sentido e a estrutura
de uma obra, também é preciso conhecer o mundo que ele veicula, desdobra, desvela diante de si e do leitor como
possibilidade de ser no mundo, na história. O texto possui “um” sentido que não deixa de ser atualizado pelo leitor
e apropriar-se desse sentido é todo o contrário da celebração de um eu narcisista, é na verdade despojamento do
próprio eu, uma vez que o texto fornece um “si mesmo” ao leitor, transformando-o em um “si mesmo como
outro”22. Assim, interpretamos e atualizamos um texto quando nos apropriamos de sua proposição de mundo,
sem, contudo, conceber a apropriação como posse, mas sim como despojamento: “... a hermenêutica convida a
fazer da subjetividade a última e não a primeira categoria de uma teoria da compreensão... Então, troco o eu,
dono de si mesmo, pelo si, discípulo do texto”23.

Por isso, a interpretação de um texto é todo o contrário da contemporaneidade, conforme supunham


Schleiermacher e Dilthey, é apropriação de uma proposição de modo de ser, entendida como objetivação típica das
obras da cultura. Além disso, significa a superação da distância cultural e possui o caráter de atualização, ou seja,
a efetivação de possibilidades semânticas descobertas na leitura, o que faz do ato de interpretar um risco, uma vez
que significa expor-se a si mesmo por meio da leitura interpretativa a fim de habitar uma proposição de mundo.
Interpretar, nas palavras de Ricoeur, é “decifrar a vida no espelho do texto”24. A consciência expõe-se ao mundo
que o texto cria, o que possibilita uma nova compreensão de si mesmo e nessa compreensão a subjetividade
perde-se como origem radical para colocar-se em uma postura mais modesta.

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Essa descentralização afasta o sujeito de uma atitude subjetivista, já que a compreensão de si acontece diante de
uma dimensão objetiva: o mundo do texto. É neste sentido que se pode falar do abandono do “eu”, dono de si
mesmo, para pensar no “si”, discípulo do texto. E nesse discipulado o leitor se compreende melhor, se compreende
diferentemente ou começa a se compreender. Contudo, não se trata de querer impor ao texto a nossa capacidade
finita de compreender, mas de se expor a ele, deixar-se formar pela proposição de mundo que nos é feita, pois “só
encontro-me como leitor, perdendo-me”25, o que faz da compreensão de si uma desapropriação e nova
apropriação de si. O leitor vem à leitura com sua pré-compreensão e suas conjecturas – muitas vezes não
formuladas explicitamente – e na medida em que avança na leitura do texto valida, refaz ou dá forma explícita às
suas expectativas. O que o leitor compreende na leitura? Compreende melhor a si mesmo e o mundo em que vive.
O que se interpreta no texto? O seu mundo, o “mundo do texto”, expressão que Ricoeur toma de Gadamer quando
este fala da “coisa do texto”.

Interpretar é, pois, trazer o mundo do texto ao mundo da ação, desvelando o mundo proposto pelo texto,
enunciando um novo discurso sobre o mundo do texto. A interpretação como apropriação é trazer para perto o que
estava longe, é tornar próximo o que era estranho, em um movimento de desapropriação de si mesmo. Interpretar,
segundo Ricoeur, é “pôr-se em marcha em direção ao oriente do texto” para onde o texto aponta, é abondonar-se
a ele, é atravessar o mundo do texto e deixar-se atravessar por ele. Em suma, é despojamento de si, é perda de si
para receber um “si mesmo” ampliado. Na interpretação dá-se a “fusão de horizontes” (Gadamer),
Gadamer uma fusão
entre o horizonte do mundo do texto e o horizonte do mundo da ação do leitor que se vê modificado nessa fusão,
modificação que é nomeada por Ricoeur em Tempo e narrativa como refiguração do mundo e da própria
identidade. E nessa refiguração feita a partir da apropriação do mundo do texto, o papel da tradição é
fundamental, uma vez que fora da comunidade viva dos intérpretes que cria e recria o texto pelo ato da leitura, o
texto nada mais é que um cadáver entregue à autópsia de um simples método de análise estrutural que ignora, no
corpo inerte, a face, o rosto, capaz de manifestar as marcas de uma história de vida. O texto é inseparável da
comunidade viva de leitores, o que implica a abertura à maneira como se deu e se dá a recepção do texto ao longo
da história que ele mesmo ajuda a tecer, na medida em que o texto, a sua leitura e interpretação, dá a pensar.
Dizer inseparável não significa que o texto não possa, ou melhor, não deva ser recontextualizado no mundo do
leitor que o interpreta.

III. A IDENTIDADE PESSOAL COMO IDENTIDADE NARRATIVA

O projeto filosófico de Ricoeur se radica no distanciamento da tentativa de fundamentação do cogito por Descartes
(1596-1650) e da sua destituição por Nietzsche (1844-1900). Com Descartes, o cogito é a primeira certeza de uma
identidade sem história e com Nietzsche temos a destituição do cogito a partir do caráter figurativo de toda
linguagem, ou seja, o cogito nada mais seria do que uma artimanha da linguagem. A meio caminho está Ricoeur,
ao tomar distância do cogito e do anti-cogito, e ao usar o termo “si” para se precaver contra a redução a um “eu”
centrado sobre si mesmo e compreender o “si mesmo como outro” como a possibilidade do sujeito, sem deixar de
ser o mesmo, vir a ser um outro.

Nessa trajetória filosófica pelos caminhos de uma ontologia hermenêutica, é possível considerar que o conceito de
identidade narrativa seja de certa forma o ponto de chegada da obra “Tempo e narrativat” que é retomado em “Si
mesmo como outro”. Identidade narrativa é para Ricoeur um tipo de identidade à qual o ser humano acede graças
à mediação da função narrativa26. Na elaboração do conceito de identidade narrativa é fundamental ter em conta a
distinção entre a narrativa de ficção e a narrativa histórica, sendo que ambas se aproximam como narrativas,
distinguem-se por sua intenção de verdade e entrecruzam-se na constituição da identidade pessoal e coletiva.

Nesse movimento de aproximação, distinção e entrecruzamento o sujeito só pode ser compreendido como sendo
atravessado e constituído por uma série de mediações e desdobrado no tempo. Este sujeito só tem acesso a si
mesmo por meio de mediações e de reflexões que considerem tanto sua permanência como sua transformação no
decorrer do tempo, tendo como parte integrante dessas mediações a narrativa histórica e ficcional. Entretanto,
uma distinção inicial se faz necessária: aquela entre mesmidade e ipseidade. A identidade como mesmidade (idem)
diz respeito a características inalteráveis do ser individual que continua a ser o mesmo apesar das mudanças
sofridas ao longo da vida, do tempo. A identidade como “si”, como ipseidade (ipse), supõe a permanência no
tempo. Trata-se de uma identidade que surge ao longo de uma história de vida, com referência a si mesmo. A
partir dessa identidade, um sujeito é capaz de se reconhecer como autor e, portanto, responsável por seus atos,
por seu agir. É capaz de se reconhecer responsável pelos efeitos do que fez, do que disse ou do que deixou de
fazer e dizer. Consequentemente, é no campo da ipseidade que a ética se enraíza.

Somente uma concepção de identidade narrativa é capaz de conjugar essas duas maneiras de permanência no
tempo: sou o mesmo, mas outro; sou outro, mas o mesmo; sou outro diverso de mim mesmo. A identidade
narrativa mantém juntas as duas extremidades: a permanência no tempo e a manutenção de si. Ao narrar sua
vida, o ser humano descobre o sentido da mesma, tornando-a também reconhecível pelos outros. Nesse processo
há um tempo que constitui esse sujeito (sua vida, sua história), o sujeito não é o mesmo do início da sua vida e da
sua história, mas ainda é ele mesmo. É no contexto dessa dimensão temporal que nasce o sujeito, é desde sua
alteridade temporal que surge a noção de identidade narrativa.

A narração de si representa a via privilegiada para o exame reflexivo da vida ou a hermenêutica de si mesmo. Uma
pergunta orienta essa reflexão: o que significa conhecer quando o visado é o si mesmo e não um objeto totalmente
distinto do sujeito? Para Ricoeur, as filosofias do sujeito são incapazes de responder a esta questão por estarem
arraigadas em preconceitos científicos, pois na proposição “conhecer a si mesmo” a separação sujeito-objeto se

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desfaz uma vez que é o si mesmo que se autocompreende. A maneira como Ricoeur concebe a identidade pessoal,
a coloca entre o cogito de Descartes, entendido como substância última, auto-fundadora, imóvel e a-histórica, e o
anti-cogito de Nietzsche que compreende o cogito como um mero artifício lingüístico. O sujeito que Descartes legou
à Tradição ocidental – a-histórico e a-temporal – desconhece o valor e o significado da tradição na construção da
identidade pessoal. Por isso, uma questão fundamental é conhecer esse “eu que pensa” e não fundar um “eu
absoluto” dado a priori. É preciso devolver o eu pensante formulado por Descartes ao fluxo da história e da
tradição que nos é transmitida pela linguagem, da qual aprendemos o que somos. Isto porque, para Descarte, o eu
(cogito) se apreende diretamente como certeza absoluta no exercício da dúvida e como acesso imediato a si
mesmo. Entretanto, segundo Ricoeur, a opção pela via curta da analítica direta não nos permite aceder a uma
hermenêutica de si mesmo, mas somente a via longa que nos conduz ao desvio pelo outro, à dialética do si mesmo
como outro. Em outras palavras, “Uma das coisas mais imediatas que pode ser aprendida com Paul Ricoeur é que a
alteridade representa o caminho adequado à descoberta efetiva de si mesmo [...] descobrir-se como um si mesmo
é simultaneamente aceitar-se como irremediavelmente um outro”27.

O sujeito somente pode chegar a si mesmo pela reflexão sobre os sinais de sua existência, seus atos e expressões,
sendo compreendido como reflexividade e historicidade. O sujeito é atravessado e constituído pela alteridade,
jamais transparente e sem acesso imediato a si mesmo, sendo, em certo sentido, estranho a si mesmo: um sujeito
que somente pode se conhecer pela mediação das obras da cultura que produz e nas quais se reconhece. O sujeito
não é jamais ponto de partida – absoluto – um “eu” dado a priori, mas um si mesmo como ponto de chegada de
um longo percurso no qual retoma de forma reflexiva suas ações e criações. Ponto chegada que é sempre um
recomeço, um ponto de partida. Para tanto, é preciso que o sujeito narre a sua história e que a mesma seja
narrada por outros, e nessa narração (drama, romance, comédia, tragédia,...) a história pessoal se entrelaça com a
história dos outros, a partir de relações próximas e distantes, no tempo e no espaço. A identidade desse si mesmo
que somos é, portanto, narrativa e ética, o reconhecimento de si acontece no reconhecimento do outro e no
reconhecimento de si pelo outro, reciprocidade de reconhecimento mútuo que marca a forma de presença do outro
na vida do sujeito. E nunca é demais lembrar que a narrativa de histórias é mais que o simples relato de fatos
brutos, pois narrar um fato histórico já é interpretá-lo.

A narrativa constrói, pois, o caráter durável de um personagem, o qual pode ser tido como sua identidade
narrativa. Essa narrativa é a condição de possibilidade de se organizar a diversidade temporal do agir humano em
uma unidade de vida que faça sentido para si mesmo e para os outros. É o esforço por articular em um enredo
inteligível as próprias experiências a fim de compreendê-las, assumindo-as como suas e integrando-as em sua
própria identidade. É o que Ricoeur chama de “tecer da intriga”, ou seja, a capacidade de compor/narrar uma
história a partir de uma diversidade de elementos, encadeando-os no tempo e em uma totalidade dotada de
sentido. É configurar a ação humana, conferir-lhe uma inteligibilidade ao organizar elementos díspares (sujeitos,
acontecimentos, motivos, circunstâncias,...), todo o contrário de amontoar elementos heterogêneos. A narração é
o ato pelo qual tomamos conhecimento do passado a partir da integração de eventos discordantes na unidade
concordante de uma história.

Desse conceito de identidade narrativa, podemos destacar três aspectos singulares. Primeiramente, seu caráter
dialógico: o si e o outro são dois conceitos relativos, não existe “eu” sem “outro”. A descoberta da própria
identidade não se dá de maneira isolada, mas sim a partir do diálogo com o outro, em torno de acontecimentos e
no interior de instituições. Um segundo aspecto diz respeito a seu caráter instável, a identidade narrativa não é
uma identidade substancial e fixa, mas construção indefinida que se dá ao longo do tempo. Ela não é algo já dado
a ser descoberto, tampouco um artifício fruto da invenção. A identidade narrativa é uma identidade móvel, uma
combinação entre a concordância da história (vista como uma unidade estruturada) e a discordância provocada
pelas peripécias contextuais. Um terceiro aspecto aponta para sua dimensão ética. As nossas narrativas estão
abertas ao olhar e à interpretação dos outros, a nossa identidade é construída e reconstruída em um diálogo com o
outro. Temos aqui a dimensão ética da identidade narrativa. E diálogo significa que a identidade pessoal se constrói
e se descobre não em um movimento de introspecção, mas em um movimento de projeção possibilitado pelas
narrativas que são feitas por nós e sobre nós. Projeção que possibilita a auto-compreensão em mundos novos nos
quais posso habitar. Assim, “enquanto mímesis da ação, a narrativa mergulha no terreno da práxis, permitindo à
pessoa situar-se como um si responsável; por outras palavras, a narrativa é uma via mediadora entre ser e deve-
ser, entre descrição e prescrição. Em segundo lugar, através da narração realiza-se a passagem da teoria da ação à
teoria ética”28.

Uma tese importante que emana do conceito de identidade narrativa aponta para o fato de haver uma estreita
ligação entre a experiência humana do tempo e a narrativa, seja ela histórica ou de ficção. Ricoeur trabalha com o
conceito de referência metafórica para ultrapassar os limites impostos aos textos de ficção e poesia, limites que
reservam aos discursos científicos a capacidade de dizer a verdade, ou ainda, de dizer algo sensato sobre a
realidade. Uma obra de ficção não é nem uma simples cópia da realidade e tampouco um puro exercício de
imaginação descolado da realidade. A narrativa ficcional parte da realidade de alguém, de sua experiência de
mundo que é dita a outro, alguém que vive em uma outra realidade e que assimilará algo dessa realidade que lhe
é dita, a partir de sua própria experiência.

É, pois, desde essa nova assimilação que o dito retorna à realidade em forma de ação. A narrativa é
fundamentalmente mediação entre uma experiência anterior e uma experiência posterior à qual se dirige, dá
sentido, completa e realiza, uma experiência que é configurada na linguagem ao ser narrada a outro que por sua
vez a reconfigurará em sua situação própria, dando-lhe uma nova configuração. Na linguagem de Ricoeur

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A reconfiguração pelo relato confirma esse traço do conhecimento de si que ultrapassa de longe o domínio
narrativo, a saber, que o si não se conhece imediatamente, mas somente indiretamente pelo desvio dos sinais
culturais de todo tipo que se articulam sobre as mediações simbólicas que sempre já articulam a ação e, entre
elas, as narrativas da vida cotidiana. A mediação narrativa sublinha esse caráter importante do conhecimento de si
ser uma interpretação de si29.

Ler a si mesmo no espelho das palavras da narrativa histórica e de ficção é ler uma vida marcada pela pertença
histórica desde representações simbólicas e também pela pertença a instituições. O leitor pode reconhecer nos
personagens de suas leituras atitudes, valores, virtudes, escolhas e decisões que o ajudam na compreensão de si
mesmo e a guiar suas ações. À diferença do pensamento moderno, insiste-se aqui no caráter indireto da presença
da consciência a si mesma, insistência que mostra a importância atribuída à mediação inerente à narrativa: o
sujeito é originalmente interpretação de si mesmo e nesse processo hermenêutico há uma dupla desapropriação do
sujeito da interpretação, há uma ascese primeira diante da obra e em um segundo momento um desalojamento da
identidade primeira que abre o sujeito a novas possibilidades de ser no mundo, de habitá-lo30.

Como consequência, a hermenêutica da pessoa acontece na história, no tempo e na relação com os outros, trata-
se de uma identidade que já não é mais fruto de uma mera conceituação (teoria), mas acontece no tempo e na
condição ética plural. O si mesmo constitui-se a partir da influência histórica e ética dos personagens apreendidos
na leitura, os quais encarnam grandes decisões de vida. Temos, pois, na narrativa histórica e na narrativa ficcional,
entendendo ficção como algo distinto de falso ou mentira, contribuições essenciais para a interpretação de nossa
condição histórica. Por meio delas temos uma reconfiguração de nossa condição humana, a qual pode ser
igualmente uma “des-figuração” dessa mesma condição. Com esse conceito de identidade narrativa, Ricoeur quer
mostrar como se dá a construção da identidade a partir da relação entre linguagem e experiência humana do
mundo, e pretende escapar a uma dicotomia que não contribui para a solução do problema da identidade: ou o
sujeito é um emaranhado de conhecimentos, emoções e vontades que jamais se unificam, a não ser ilusoriamente,
ou é pura permanência, alguém sempre idêntico a si mesmo.

A essa alternativa estéril, Ricoeur propõe o conceito de identidade narrativa e no modo como esse conceito é
desenvolvido em sua filosofia hermenêutica vemos ser incorporado uma estrutura temporal, da qual faz parte de
modo singular o texto narrativo, entendido como obra escrita. Esse texto narrativo emerge de uma determinada
situação e procura dar-lhe sentido por meio da expressão lingüística e nessa expressão pessoas, circunstâncias,
motivações, ações são articuladas pela narrativa em uma totalidade dotada de sentido, que faz e dá sentido. A
narrativa quer tornar inteligível uma história ao dizer o sentido dos fragmentos de uma experiência humana do
mundo.

IV. A HERMENÊUTICA DE SI DIANTE DOS TEXTOS BÍBLICOS

A aproximação feita até aqui do pensamento de Paul Ricoeur evidencia como sua reflexão filosófica contribui com a
investigação hermenêutica, tomando por ponto estratégico a sua teoria sobre o texto e a noção de identidade
narrativa. A maneira como se dá a interpretação do texto ajuda a entender a interpretação em geral e serve como
parâmetro para a compreensão do sujeito, da ação e da história, a partir da importância concedida à linguagem
humana. A meu ver, a trama na qual se entrelaçam as noções de texto e de identidade narrativa torna possível
perceber como uma tradição religiosa se compreende à luz de textos fundadores, compreensão que possibilita a
construção de uma identidade religiosa desde o horizonte de uma linguagem que narra experiências humanas com
o Sagrado31.

Daí decorre uma primeira contribuição para o discurso teológico cristão que vem a ser uma mudança de
perspectiva: de um discurso sobre Deus para um discurso sobre a linguagem que fala humanamente sobre Deus. E
por discurso entenda-se aqui também interpretação. Uma segunda contribuição para a melhor inteligibilidade das
relações entre a leitura do texto sagrado e a construção de uma identidade religiosa, aponta para a superação de
uma pretensa transparência do sujeito a si mesmo e também na medida em que se concebe a compreensão de si a
partir da mediação de signos, símbolos e textos: compreender-se diante de uma obra da cultura é receber um
outro si diferente daquele que se projeta na interpretação.

Além disso, a filosofia hermenêutica ricoeuriana ajuda a superar uma concepção de revelação divina que muitas
vezes concebe a composição do texto sagrado como ditado do autor divino a um interlocutor privilegiado: o que
está escrito na Bíblia, por exemplo, seria uma tradução literal das palavras de Deus. Sem essa superação, não
seria possível considerar as formas de discurso que compõem os textos bíblicos e que do ponto de vista teológico
são reveladores de um mundo, o mundo bíblico, diante do qual o leitor tem a possibilidade de ver se desvelar um
novo ser com relação à sua existência ordinária, ruptura movida pela vontade de fazer existir um mundo novo.
Essa filosofia hermenêutica possibilita igualmente um equilíbrio entre palavra e escritura ao considerar a situação
hermenêutica da primeira comunidade cristã, tomando distancia assim da obsessão por uma palavra original que
seja a voz do fundador ausente. Nas origens do Cristianismo não há a voz de Jesus Cristo, mas textos que já são
em si mesmos interpretações de sua mensagem, acolhida na fé por uma comunidade situada historicamente. A
filosofia hermenêutica de Paul Ricoeur nos convida ainda a manter o equilíbrio entre uma leitura crítica da Sagrada
Escritura e uma aproximação hermenêutica, nos ensina a valorizar a dimensão poética das grandes narrativas
bíblicas. Assim, a aproximação dos textos do Novo Testamento não deve se ater à descrição exata dos gestos e
das palavras de Jesus, mas narrar a história de Jesus como uma história que diz respeito aos homens e às
mulheres de todos os tempos.

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Esses aspectos supõem o caráter interpretativo de todo conhecimento humano, pois como já foi afirmado não
existe acesso imediato à realidade, uma vez que esse acesso é feito por meio da linguagem que já é
necessariamente uma interpretação que não se configura como uma espécie de criação do nada. No contexto do
Cristianismo, colocar a interpretação como apropriação criativa da Tradição é considerar o risco que está presente
em todo ato interpretativo: o risco da distorção e do erro, mas que também é o risco do próprio ato de crer, o qual
para ser fiel ao seu impulso originário deve conduzir a uma interpretação criativa da identidade cristã.

Esse risco inerente à hermenêutica de si significa arriscar-se em uma nova maneira de ser, possibilitada pela
interpretação da textualidade da vida, entendo-se também a história e a realidade social como um texto aberto à
interpretação. Nesse arriscar-se próprio da construção da identidade cristã é preciso levar a sério a historicidade da
verdade e a historicidade do intérprete da mensagem cristã que busca atualizá-la para a sua realidade. Nesse
processo, temos a compreensão do passado e a atualização criativa direcionada para o futuro, perpassando a
compreensão de si no presente, a partir de uma releitura dos objetos textuais, procurando decifrá-los para hoje, e
desde essa releitura proceder a uma nova escritura, a uma nova narrativa.

O trabalho hermenêutico na construção de uma identidade religiosa é, pois, o esforço constante para tornar cada
vez mais inteligível a própria identidade para si mesmo e para os outros, e conseqüentemente possibilitar o diálogo
com as outras tradições. Essa construção dialogal supõe uma verdade de fé que é fundamentalmente histórica,
recebida por via testemunhal, e supõe igualmente o não acesso imediato à verdade dos enunciados de fé. A
verdade cristã é sempre um devir entregue ao risco da interpretação, da história e da liberdade criativa daquele
que crê. Por isso, a hermenêutica de si na construção de uma identidade cristã não deve partir de enunciados
teológicos concebidos desde conceitos emanados de um pensamento meramente especulativo: Deus existe, é
onisciente, é onipotente, é todo-poderoso, mas deve voltar-se prioritariamente para as expressões que manifestam
a maneira como uma determinada comunidade de fé traduz para si mesma e para os outros suas formas mais
originais de relação com Deus32.

No contexto cristão, se tomarmos emprestado a idéia de fusão de horizontes, oriunda de Gadamer e desenvolvida
por Ricoeur, podemos afirmar que a hermenêutica de si promove a fusão do horizonte da vida do cristão com o
horizonte da vida de Jesus Cristo, unindo-se sob o mesmo horizonte hermenêutica e antropologia, uma vez que no
relacionamento com Jesus Cristo é o próprio ser do fiel que está em questão, constituindo-se em passagem
obrigatória para a construção de uma identidade cristã. Desde essa experiência religiosa cristã, a
conversação/diálogo entre o sujeito interpretante e o texto supõe uma condição prévia: o ato de fé, ou seja, um
prejulgamento favorável com relação ao texto que é recebido da tradição, assumindo-o como palavra de Deus, e
que é realizado sempre a partir da inter–relação entre a riqueza dos questionamentos que surgem da realidade e a
dimensão fecunda da tradição, relação capaz de produzir uma nova interpretação dos textos bíblicos. Nesse
processo hermenêutico há a busca por um equilíbrio entre a experiência pessoal e a tradição, ou ainda, a
valorização da pessoa dentro de um processo de relação interpessoal. Assim, a tradição não se configura apenas e
nem sobretudo como uma transmissão de valores e conceitos válidos de uma vez por todas, mas principalmente
como produção de sentido.

Por isso, o Cristianismo é tradição na medida em que vive de uma origem primeira que é dada, mas também é
tradição porque essa origem somente pode ser redita historicamente a partir de uma apropriação criativa da
mesma, apropriação que é, acima de tudo, interpretação da tradição em um novo contexto cultural, interpretação
criativa da linguagem da fé e conseqüentemente da identidade cristã. O conhecimento de si é interpretação de si,
como atesta a idéia de reconfiguração desenvolvida por Ricoeur. Pelo ato da leitura dos textos bíblico, o eu do leitor
é refigurado, o si mesmo torna-se outro, o que insere na hermenêutica do si a dimensão da alteridade: como
outrem (o si mesmo como outro), como o outro expresso na tradição e como outro que se manifesta na face do
outro humano com quem sou chamado a dialogar.

Apreender, pois, Nesta linha de raciocínio, é possível apreender os textos bíblicos como revelação de Deus é
possível porque eles desdobram diante do leitor a possibilidade de um ser novo no mundo e não porque foram
supostamente escritos sob o ditado de Deus. Por isso, a compreensão de si diante do texto implica na renúncia à
auto-constituição da consciência a partir de uma temporalidade puramente imanente. Em outras palavras, a
existência humana é moldada pelos eventos que nos atingem e isto faz com que dependamos de certos eventos
fundadores, aquilo que somos depende dos testemunhos históricos que acontecem por meio dos eventos que nos
atingem profundamente desde o seio de uma tradição.

CONCLUSÃO

Hoje, torna-se cada vez mais consensual a idéia de que a Tradição cristã encontra-se, hoje, sob o risco da
interpretação diante do outro “não-cristão” e não-ocidental que não nega a transcendência no ser humano e que
possui certa experiência mística como característica de sua tradição religiosa. Por isso, em certo sentido, o
pluralismo religioso é mais ameaçador para a identidade cristã do que o foi (ou o é) o ateísmo e o indiferentismo
religioso. Entretanto, estar sob o risco da interpretação não se restringe à dimensão negativa da ameaça
provocada pelo outro diferente de mim, aquele que não comunga da mesma tradição. Estar diante do diferente
pode significar a rica possibilidade de uma releitura dos fundamentos da própria identidade. Mais do que risco no
sentido negativo, o pluralismo religioso pode configurar-se como a possibilidade de uma nova percepção da
identidade pessoal entendida como uma identidade em contínua construção a partir da releitura de textos
fundadores.

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20/08/2020 Paul Ricouer e a hermenêutica de si no espelho das palavras

Mas essa releitura pressupõe que os textos bíblicos, como elemento estrutural da fé cristã e da identidade que dela
emana, sejam apreendidos não como narrativas de eventos históricos brutos, mas como atos interpretativos. E a
distância que separa esses textos do leitor-intérprete surge como a possibilidade de se estabelecer um ato de
reinterpretação da existência humana por meio da linguagem religiosa que fornece o instrumental linguístico a
partir do qual é possível interpretar e narrar uma vida que faça e dê sentido para si mesmo e para os outros. Neste
empreendimento hermenêutico o cristão encontra nos textos bíblicos e no conteúdo de sua experiência histórica
critérios fundamentais para avaliar a pertinência da atual interpretação da linguagem e da identidade cristã face ao
desafio do pluralismo religioso: como compreender o outro e como me fazer entender por ele? Eis a questão que as
noções de identidade narrativa e mundo do texto ajudam a responder desde a hermenêutica de si no espelho das
palavras, espelho que permite ver a si mesmo como um outro que não se vê necessariamente ameaçado pelo
diferente, mas certamente enriquecido em sua própria identidade.

Notas

1 TILLICH, P (1970). Religion biblique et ontologie. Paris, PUF, p.18.

2 DOSSE, F (2008). Paul Ricoeur. Le sens d’une vie (1923-2005). Paris, La Découverte/Poche, pp. 405-470.

3 CESAR, C (2002). “A ontologia hermenêutica de Paul Ricoeur”, em: CESAR, C (Org). A hermenêutica francesa:
Paul Ricoeur. Porto Alegre, Edipucrs, p. 43.

4 RICOEUR, P (1986). Du texte à l’action. Essais d’Herméneutique II. Paris, Seuil, p. 25.

5 RICOEUR, P (1983). Temps et récit, T.I. Paris, Seuil/Poche, p. 9.

6 Ibíd., p.12.

7 Para maiores informações ver RICOEUR, P (1986). Op. cit., pp. 39-118.

8 RICOEUR, P (1969). Le conflit des interprétations. Essai d’herméneutique I. Paris, Seuil, pp. 8-9.

9 RICOEUR, P (1977). Interpretação e ideologias. Rio de Janeiro, Francisco Alves, p. 23.

10 Ibíd., p. 28.

11 Ibíd., p. 33.

12 RICOEUR, P (1986). Op. cit., pp. 100-103.

13 Ibíd., p. 108.

14 GIBELLINI, R (1998). A teologia do século XX. São Paulo, Loyola, p. 63.

15 RICOEUR, P (1977). Op. cit., p. 41.

16 RICOEUR, P (1986). Op. cit., pp. 88-100.

17 HELENO, JMM (2001). Hermenêutica e ontologia em Paul Ricoeur. Lisboa, Instituto Piaget, p. 158.

18 RICOEUR, P (1969). Op. cit., pp. 14; 20.

19 GENTIL, HS (2004). Para uma poética da modernidade. Uma aproximação à arte do romance em Temps et
Récit de Paul Ricoeur. São Paulo, Loyola, p. 46.

20 RICOEUR, P (1986). Op. cit., pp. 113-130; 153-178.

21 RICOEUR, P (1977). Op. cit., p. 44; RICOEUR, P (1986). Op. cit., pp. 101-118.

22 Uso aqui o título da conhecida obra de Ricoeur Soi-même comme un autre.

23 RICOEUR, P (1986). Op. cit., pp. 53-54.

24 RICOEUR, P (1969). Op. cit., p. 322.

25 RICOEUR, P (1977). Op. cit., p. 58.

26 RICOEUR, P (1988). “L’identité narrative”, Esprit, nº140-141, juillet, p. 295.

27 HENRIQUES, F (2005). Filosofia e literatura. Um percurso hermenêutico com Paul Ricoeur. Porto, Edições
Afrontamento, p. 19.

28 ROCHA, ASE (2006). “Identidade, Alteridade e Hermenêutica. A exemplariedade do europeísmo de Ricoeur”,


em: HENRIQUES, F (Org.) (2006). A filosofia de Paul Ricoeur. Temas e percursos. Coimbra, Ariadine Editora, p.
65.

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29 RICOEUR, P (1988). Op. cit., p. 304.

30 GAGNEBIN, JM (2006). Lembrar, escrever, esquecer. São Paulo, Editora 34, p.168.

31 Para uma melhor compreensão da relação mútua e complexa entre hermenêutica filosófica e hermenêutica
bíblica no pensamento de Ricoeur ver a seguinte obra: RICOEUR, P (2005). Herméneutique biblique. Paris, Cerf.

32 RICOEUR, P (1977). «Herméneutique de l’idée de Révélation», em: La Révélation. Bruxelles, Publications des
Facultés Universitaires Saint-Louis, p. 30.

Referencias Bibliográficas

1. DOSSE, F (2008). Paul Ricoeur. Le sens d’une vie (1923-2005). Paris, La Découverte/Poche, p. 405-470.
[ Links ]

2. GIBELLINI, R (1998). A teologia do século XX. São Paulo, Loyola, p. 63. [ Links ]

3. GENTIL, HS (2004). Para uma poética da modernidade. Uma aproximação à arte do romance em Temps et Récit
de Paul Ricoeur. São Paulo, Loyola, p. 46. [ Links ]

4. HELENO, JMM (2001). Hermenêutica e ontologia em Paul Ricoeur. Lisboa, Instituto Piaget, p. 158.
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5. RICOEUR, P (1969). Le conflit des interprétations. Essai d’herméneutique I. Paris, Seuil, p. 8-9. [ Links ]

6. RICOEUR, P (1977). Interpretação e ideologias. Rio de Janeiro, Francisco Alves, p. 23. [ Links ]

7. TILLICH, P (1970). Religion biblique et ontologie. Paris, PUF, p.18. [ Links ]

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