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2009
Eduardo Guilherme Reiner
2009
iv
Declaro, para todos os fins de direito e que se fizerem necessários, que assumo total
responsabilidade pelo aporte ideológico e referencial conferido ao presente trabalho,
isentando a Universidade do Sul de Santa Catarina, a Rede de Ensino Luiz Flávio
Gomes, as Coordenações do Curso de Especialização Telepresencial e Virtual em
Direito Constitucional, a Banca Examinadora e o Orientador de todo e qualquer
reflexo acerca da monografia.
Blumenau 12/08/2009
Blumenau 12/08/2009
vi
DEDICATÓRIA
Dedico essa iniciativa a todos aqueles a todos aqueles que de alguma forma
contribuem para construir um Brasil e um mundo melhor, com mais justiça e respeito
aos direitos fundamentais; em especial aos Auditores Fiscais do Trabalho, que
apesar da falta de recursos, realizam um lindo trabalho.
vii
AGRADECIMENTOS
RESUMO
Palavras-chave:
ABSTRACT
This monograph treats the limits of the constituent power of reform, with main
focus on the limitations arising from the fundamental rights clauses as Petras then
are analyzed some aspects of these fundamental rights and presence in the 1988
Constitution. Based on these data show the insertion of social clauses as Petras our
current Magna Carta. Finally, it will be treated as current and relevant discussion on
the principle of non regression in social matters.
Key words:
Limits the power of reform, terms petras, fundamental rights, social rights, human
dignity, principle of non regression in social rights.
xi
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 01
CAPÍTULO 1
Reformas da Constituição 04
Introdução.
Temas sempre recorrentes nos noticiários, nas mesas redondas, nos livros,
na política; são a defesa do Estado mínimo e a chamada flexibilização dos direitos
trabalhistas. Num Brasil inserido em uma economia mundial globalizada e também,
atualmente, em uma crise global, não são poucos os que defendem os temas
citados como soluções para o desenvolvimento do país.
Daí decorre a justificativa e importância desse estudo: nesse contexto que a
defesa dos direitos sociais ganham corpo, pois tais conquistas alcançadas pela
população brasileira na Carta Magna estariam ameaçadas por reformas através de
emendas de um congresso nacional ,que em um período excepcional, desse ouvido
aos defensores da diminuição do estado social e da retirada de direitos sociais.
O aprofundamento em assuntos desse quilate é de vital relevância para a
nação e traz consigo diversas reflexões. Como o direito da dignidade humana dos
trabalhadores brasileiros, que não podem ver seus direitos e garantias serem
suprimidas em nome de maior retorno econômico aos empregadores, vedando essa
possível prática através da aceitação como cláusulas pétreas os direitos
fundamentais num sentido amplo.
Também vem a baila defender a importância de um Estado social pra
construção de uma sociedade verdadeiramente livre e com o mínimo de igualdade
de condições, promovendo a emancipação do homem.
O objetivo do presente trabalho é traçar as limitações materiais impostas pelo
Poder Constituinte à reforma constitucional relacionados aos direitos fundamentais.
Tais limitações, chamadas cláusulas pétreas, decorrem da imperiosa manutenção
da identidade constitucional. Os limites materiais refletem aquilo que constitui a alma
do Estado, conforme o desenho que lhe deu a Carta Cidadã de 1988. Quando o
constituinte afastou da competência reformadora por proposta de emenda tendente
os direitos e garantias individuai - em virtude do disposto no artigo 60, §4°, IV, da
Constituição - excluiu também alterações que eliminem ou restrinjam algum de seus
elementos essenciais.
Objetivamos apontar que esse dispositivo deve ser interpretado de maneira
ampla, de forma que a limitação é aplicável não só ao artigo 5º, mas a todos direitos
2
1. A Reforma da Constituição.
Ressalta-se a idéia de que surge novo Estado a cada nova Constituição, provenha
ela de movimento revolucionário ou de assembléia popular. O Estado brasileiro de
1988 não é o de 1969, nem o de 1946, de 1937, de 1934, de 1981, ou de 1824.
Historicamente é o mesmo. Geograficamente pode ser o mesmo. Não o é, porém,
juridicamente. A cada manifestação constituinte, editora de atos constitucionais
como a Constituição, atos Institucionais e até decretos (veja-se o DC. 1, de
15.11.1889, que proclamou a república e instituiu a federação como forma de
Estado), nasce o Estado. Não importa a rotulação conferida ao ato constituinte.
Importa a sua natureza. Se dele decorre a certeza de rompimento com a ordem
jurídica anterior, de edição normativa em desconformidade intencional com o texto
em vigor, de modo a invalidar a normatividade vigente, tem-se novo Estado.
Esse poder originário também é ilimitado, pode tratar da matéria que for e
como achar melhor, é absolutamente livre para expressar a vontade popular que ele
representa, como não existe ordem jurídica anterior não existem limitações matérias
e nem formais e dessa forma é também incondicionado. BRANCO (2008,p 2) define
resumidamente e perfeitamente essa característica:
Mas de nada adianta ter uma Constituição legítima, se ela puder ser
contrariada por leis infraconstitucionais , daí decorre a importância da Constituição
como o topo do ordenamento, sua supremacia sobre as demais emanações
legislativas. Assim infere-se que todas as normas integrantes do ordenamento
jurídico devem guardar consonância com as regras preconizadas pela Carta Magna.
Tais definições levam à conclusão de que existe de um sistema escalonado das
normas jurídicas, no qual o vértice é representado pela Constituição. Não é por outra
razão que se diz ser a Constituição o fundamento de validade de todas as outras
normas, que por sua vez devem ser interpretadas de acordo com os princípios nela
estabelecidos e com ela se harmonizar. Sistema esse preconizado por KELSEN
(2000, p. 247):
poderia levar a uma ruptura abrupta com a ordem, conforme lembra TEMER (2001,
p.34):
As Constituições se pretendem eternas, mas não imodificáveis. Daí a competência
atribuída a um dos órgãos do poder para a modificação constitucional, com vistas a
adaptar preceitos da ordem jurídica a novas realidades fáticas.
A constituição não pode ser tão rígida que leve a revoluções, deve-se evitar que o
poder constituinte originário tenha que se manifestar, às vezes para mudanças
meramente pontuais, o que reduz os riscos de quebra contínua da ordem
constitucional por revoluções, no seu sentido jurídico.
constitucionais ao poder têm por fundamento não a limitação pela limitação, mas a
limitação para que vigorem os direitos fundamentais.
2. Direitos fundamentais.
relacionados à globalização, à tecnologia, etc., mas que podem ser distribuídos nas
demais categorias.
Cabe destacar que não existe uma separação estanque entre as três
gerações de diretos fundamentais, por seu caráter histórico eles estão
constantemente sofrendo novas conformações e estão sempre interligados, com
inevitáveis colisões, mas que devem ponderadas sempre com base no principio da
dignidade da pessoa humana. Nessa linha, Flávia Piovesan (2000, p. 54-55)
explicita a essencialidade do princípio da dignidade da pessoa humana:
A dignidade da pessoa humana, vê-se assim, está erigida como princípio matriz da
Constituição, imprimindo-lhe unidade de sentido, condicionando a interpretação das
suas normas e revelando-se, ao lado dos Direitos e Garantias Fundamentais, como
cânone constitucional que incorpora as exigências de justiça e dos valores éticos,
conferindo suporte axiológico a todo o sistema jurídico brasileiro.
Nesse diapasão, observa-se que uma geração de direitos não exclui outra,
mas sim ocorre uma reinterpretação dos direitos postos com base na evolução
histórica, encontrando-se novos sentidos; é o que defende BRANCO (2002, p. 8):
Não se deve incorrer no equívoco de supor que uma geração haja suplantado a
outra. Os direitos de cada geração persistem válidos juntamente com os direitos da
geração seguinte. Apenas, pode ocorrer de o seu significado ter que se adaptar às
novidades constitucionais. Desse modo, o direito à livre circulação ou tantos outros
direitos a liberdade não guardam, hoje, o mesmo conteúdo que apresentavam
antes que surgissem direitos de segunda geração, com as suas reivindicações de
justiça social, e antes que surgissem direitos de terceira geração, como o da
proteção ao meio ambiente. Os novos direitos não podem ser desprezados quando
se trata de definir aqueles direitos tradicionais.
A visão dos direitos fundamentais em termos de gerações indica o caráter
cumulativo da evolução desses direitos no tempo. Não se deve deixar de situar
todos os direitos num contexto de unidade e indivisibilidade. Cada direito de cada
geração interage com os das outras e, nesse processo, dá-se à compreensão.
(...)do ponto de vista teórico, sempre defendi - e continuo a defender, fortalecido por
novos argumentos - que os direitos do homem, por mais fundamentais que sejam,
são direitos históricos, ou seja, nascidos em certas circunstâncias, caracterizadas
por lutas em defesa de novas liberdades contra velhos poderes, e nascidos de
modo gradual, não todos de uma vez e nem de uma vez por todas.
A despeito destes e de todos os demais aspectos que aqui poderiam ser versados
e por mais que se possa aderir a boa parte das críticas colacionadas no que diz
especialmente com a supervalorização histórica (dimensional) dos direitos
fundamentais, cremos que o mais importante segue sendo a adoção de uma
postura ativa e responsável de todos, governantes e governados, no que concerne
à afirmação e à efetivação dos direitos fundamentais de todas as dimensões, numa
ambiência necessariamente heterogênea e multicultural, pois apenas assim estar-
se-á dando passos indispensáveis à afirmação de um direito constitucional
genuinamente “altruísta” e “fraterno”.
Eles se caracterizam por não poderem ser divididos pelos atores isolados,
pertencem a todos ao mesmo tempo, não podendo ser concedidos a um ou a outro
indivíduo de forma separada. Pode-se afirmar que tais direitos constituem uma
verdadeira condição para que a vida possa continuar nesse planeta. Não se trata
mais de direitos de alguns menos favorecidos frente aos detentores do poder, como
observado nas primeiras gerações, e, sim, de direitos inerentes a todos, sem os
quais a vida não poderá prosseguir no mundo.
São direitos fundamentais da terceira geração os de solidariedade ou de
fraternidade, que demandam em face de sua implicação universal, notoriamente
transindividual, exigindo esforços e responsabilidades em escala até mesmo mundial
para sua efetivação. Foca-se o ser humano relacional, em conjunção com o próximo,
sem fronteiras físicas ou econômicas. O direito à paz, a autodeterminação dos
povos, ao desenvolvimento econômico dos países, à preservação do ambiente, do
patrimônio comum da humanidade e o direito à comunicação integram o rol desses
novos direitos.
Por isso é que eles são, além de fundamentais, inatos, absolutos, invioláveis,
intransferíveis, irrenunciáveis e imprescritíveis, porque participam de um contexto
histórico, perfeitamente delimitado. Não surgiram à margem da história, porém, em
decorrência dela, ou melhor, em decorrência dos reclamos da igualdade,
fraternidade e liberdade entre os homens. Homens não no sentido de sexo
masculino, mas no sentido de pessoas humanas. Os direitos fundamentais do
homem, nascem, morrem e extinguem-se. Não são obra da natureza, mas das
necessidades humanas, ampliando-se ou limitando-se a depender do influxo do fato
social cambiante.
individuais”. Tal capítulo foi uma novidade da atual constituição, que unificou e deu
maior relevância aos direitos sociais, no mesmo patamar que os direitos individuais.
Ademais, há outros direitos dispersos na Constituição que também podem ser
considerados cláusulas pétreas. A nossa Constituição incorporou todas as gerações
de direitos fundamentais, direitos esses que vão muito além dos previstos no art.
5º(embora ai já encontremos diversos avanços na proteção do homem), tanto os de
primeira, segunda e terceira gerações estão espalhados por todo o texto
constitucional, sempre o texto deve ser lido de forma sistemática.
Os direitos sociais são direcionado ao Estado, visando ações concretas desse
pra melhoria das condições de vida da população, de acordo com SILVA(2002, p.
199)são:
4.1.1 Surgimento
4.1.2 Função
A Constituição não só não pode ser infringida por qualquer outra norma, como
também não pode ser livremente alterada. Por isso, além de acrescentar ao
princípio da primazia, a rigidez constitucional reforça-o, pois o poder legislativo não
só tem de respeitar a Constituição, como também não pode alterá-la, livremente e
em qualquer momento
constitucional de crises pontuais, o mesmo autor (SCHIER, 2009, p.1) retrata esse
pensamento:
Art. 60...
§ 4º - Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir:
I - a forma federativa de Estado;
II - o voto direto, secreto, universal e periódico;
III - a separação dos Poderes;
IV - os direitos e garantias individuais.
inalterabilidade, por via de emenda, dos diretos e garantias individuais com base
unicamente nos valores e principios que outrora regiam, legitimavam e norteavam
os conceitos da velha corrente liberal. Já não é possível confinar a formulação
material e concreta da liberdade ai usufruto das classes privilegiadas e sua ordem
egocêntrica de interesses.
No direito pátrio, há quem sustente que os direitos sociais não podem em hipótese
alguma, ser considerados como integrando as “cláusulas pétreas” da Constituição,
isso pelo fato de não poderem (ao menos na condição de direitos de prestação) ser
equiparados aos direitos de liberdade do art.5º. para além disso, argumenta-se que,
se o Constituinte efetivamente tivesse tido a intenção de gravar os direitos sociais
com a cláusula da intangibilidade, ele o teria feito, ou nominando expressamente
esta categoria de direitos no art.60, §, inc. IV, ou referindo-se de forma genérica a
todos os direitos e garantias fundamentais, mas não apenas aos direitos e garantias
individuais. Tal concepção e todas aquelas que lhe podem ser equiparadas
esbarram, contudo, nos seguintes argumentos: a) a Constituição brasileira não
traça qualquer diferença entre os direitos e garantias de liberdade (defesa) e dos
direitos sociais, inclusive no que diz com eventual dos primeiros sobre os segundos;
b) os partidários de uma exegese conservadora e restritiva em regra partem da
premissa de que todos os direitos sociais podem ser conceituados como direitos a
prestações materiais estatais, quando, em verdade, já se demonstrou que boa parte
dos direitos sociais são equiparáveis, no que diz com sua função precípua e
estrutura jurídica, aos direitos de defesa; c) para além disso, relembramos que uma
interpretação que limita o alcance das “cláusulas pétreas” aos direitos fundamentais
elencados no art. 5º da CF acaba por excluir também os direitos de nacionalidade e
os direitos políticos, que igualmente não foram expressamente previstos no art. 60
§4º, inc.IV, da nossa lei Fundamental.
1
SANCHES,Sydney. Na ADI 939-DF, RTJ 151-03/755.
2
Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do
Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: I – a soberania; II – a
cidadania; III – a dignidade da pessoa humana; IV – os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; V – o
pluralismo político. Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes
eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição.
38
3
Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: I – construir uma sociedade
livre, justa e solidária; II – garantir o desenvolvimento nacional; III – erradicar a pobreza e a marginalização e
reduzir as desigualdades sociais e regionais; IV – promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça,
sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.
39
Por derradeiro, cumpre relembrar que a função precípua das assim denominadas
“cláusulas pétreas” é a de impedir a destruição dos elementos essenciais da
40
Cabe ainda defender que assim como a dignidade de uma pessoa, os direitos
fundamentais devem ser reconhecidos de forma integral, não podem ser entendidos
e defendidos de forma separada já que sem a efetividade de gozo dos direitos
econômicos, sociais e culturais, os direitos civis e políticos se reduzem a meras
categorias formais; há uma necessária integralidade, interdependência e
indivisibilidade quanto ao conceito e à realidade do conteúdo dos direitos
fundamentais, portanto a proteção contra os desmandos de certos momentos
políticos deve ser a mais ampla possível., de forma a manter a integralidade do
sistema de proteção das garantias fundamentais.
cidadania não pode mais ser abolido. Para melhor definir esse principio nada melhor
que recorrer a seu criador, CANOTILHO (1998, p.336):
(...)a idéia aqui expressa também tem sido designada como proibição de contra-
revolução social ou da evolução reacionária. Com isto quer dizer-se que os direitos
sociais e econômicos (ex: direito dos trabalhadores, direito à assistência, direito à
educação), uma vez obtido um determinado grau de realização, passam a
constituir, simultaneamente, uma garantia institucional e um direito subjectivo. (...)
O princípio da proibição do retrocesso social pode formular-se assim: o núcleo
essencial dos direitos sociais já realizado e efectivado através de medidas
legislativas (...) deve considerar-se constitucionalmente garantido sendo
inconstitucionais quaisquer medidas estaduais que, sem a criação de outros
esquemas alternativos ou compensatórios, se traduzam na prática numa ´anulação`
pura e simples desse núcleo essencial. A liberdade de conformação do legislador e
inerente auto-reversibilidade têm como limite o núcleo essencial já realizado.
5
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos
estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à
propriedade, nos termos seguintes:
42
por meio da dignidade da pessoa; assim o núcleo essencial dos direito fundamentais
e da dignidade só estarão a salvo com um mínimo de segurança jurídica como
adverte SARLET (2004B, p.5-6):
Se, feita uma opção legítima em face do direito posto, interpretado, revelado,
executado, cumprido e aplicado, pudesse, futuramente, ser ela tida por ilícita, ou
ser desfeita, não mais haveria segurança, nem, conseqüentemente liberdade, mas
dependência, sujeição e risco. O cidadão voltaria a ser súdito. Regrediríamos à
plenitude da era absolutista. Duas máximas retratam, com efeito, a filosofia e a
realidade do poder absoluto: princeps legibum ac magistrastum imperio solutus (o
soberano é imune às leis e ao poder dos juízes); quod princeps voluit legis (o
desejo do soberano tem força de lei): Nenhuma lei pelo Rei feita o obriga, senão
enquanto Ele, fundado em razão e igualdade, quiser a ela submeter seu real poder
(Livro II, Título 35, § 21, Ordenações Filipinas de 1602)”.
6
Convém não esquecer que, para Immanuel Kant, Fundamentos da Metafísica dos Costumes, in: Os Pensadores
– Kant (II), Tradução de Paulo Quintela. São Paulo: Abril Cultural, 1980, pp. 134 e ss., a pessoa humana
constitui um fim em si mesma e, portanto, não pode ser empregada como simples meio da vontade própria e
alheia. Assim, desde logo verifica-se que, na concepção de Kant (largamente incorporada ao pensamento
filosófico, político e jurídico contemporâneo) a coisificação e instrumentalização da pessoa humana encontra-se
desde logo vedada, ainda que – consoante oportuna lembrança de Ronald Dworkin, El domínio de la vida. Uma
discusión acerca Del aborto, la eutanásia y la libertad individual, Barcelona: Ariel,.1998, p. 310, isto não
signifique que em hipótese alguma as pessoas não possam ser colocadas em alguma situação de desvantagem.
7
Aqui vale colacionar a lição de Dominique Rousseau, les libertes individuelles et la dignité de la personne,
Paris: Montchrestien, 1998, p. 70, ao referir que os direitos fundamentais adquirem vida e inteligência por meio
da dignidade da pessoa, ao passo que esta não se realiza e torna efetiva se não pelos direitos fundamentais.
8
Convém lembrar aqui não existir uma necessária convergência entre o conteúdo em dignidade da pessoa e o
núcleo essencial dos direitos fundamentais, já que a garantia do núcleo essencial (que possui uma função
autônoma) pode ir até mesmo além da proteção assegurada pelo conteúdo em dignidade da pessoa, dependendo
do direito fundamental que estiver em causa.
44
9
Reportamo-nos aqui ao novamente ao nosso conceito de dignidade da pessoa tal como já citado neste ensaio,
destacando que uma vida digna é necessariamente uma vida saudável. De tal conceito aproxima-se a noção
recentemente sustentada por Luis Fernando Barzotto, A Democracia na Constituição, São Leopoldo: Editora
Unisinos, 2003, especialmente p. 175 e ss., ao referir-se a uma “vida boa” como objetivo e fundamento do
Estado democrático de Direito na Constituição de 1988.
10
A respeito da noção de mínimo existencial, remetemos ao indispensável e pioneiro estudo de Ricardo Lobo
Torres, O Mínimo Existencial e os Direitos Fundamentais, in: Revista de Direito Administrativo, nº 177, 1989,
p. 29 e ss., muito embora o autor – a partir de uma profunda análise especialmente da doutrina norte-americana
e germânica – esteja aparentemente a se inclinar em prol de uma noção tendencialmente liberal (embora não
necessariamente reducionista) de mínimo existencial, já que bem destaca o papel da dignidade da pessoa na
construção do conceito de mínimo existencial. Dentre as contribuições mais recentes, importa referir o já citado
estudo de Ana Paula de Barcellos, A Eficácia Jurídica dos Princípios Constitucionais, especialmente p. 247 e ss.
11
Registre-se aqui que, a despeito das críticas incisivas formuladas por Flávio Galdino, O Custo dos Direitos, in:
Ricardo Lobo Torres (Org), Legitimação dos Direitos Humanos, Rio de Janeiro: Renovar, 2002, p. 139 e ss.
(especialmente a partir da p. 173) sempre reconhecemos (embora talvez não com suficiente ênfase) a interligação
entre direitos negativos e positivos, assim como o fato de que os direitos positivos possuem uma dimensão
negativa (e a proibição de retrocesso é um dos aspectos que melhor dá conta desta circunstância). De outra parte,
convém não esquecer que ao priorizarmos o critério da eficácia jurídica (e não propriamente o da efetividade, a
45
de prestações básicas não poderá ser suprimido ou reduzido (para aquém do seu
conteúdo em dignidade da pessoa) nem mesmo mediante ressalva dos direitos
adquiridos, já que afetar o cerne material da dignidade da pessoa (na sua dupla
dimensão positiva e negativa) continuará sempre sendo uma violação injustificável
do valor (e princípio) máximo da ordem jurídica e social.
despeito de estar intimamente relacionado com o primeiro) acabamos sustentando – e assim seguimos
entendendo – que o fato de todos os direitos terem uma dimensão positiva (como bem enfatiza Flávio Galdino,
na esteira de Holmes e Sunstein), no sentido de que também para proteger o direito de propriedade e a liberdade
de expressão o poder público necessita disponibilizar todo um aparato judiciário, policial, etc, que implica em
investimentos de ordem econômica (aspecto que nunca negamos, pois seria negar o óbvio), não afasta a
possibilidade de qualquer Juiz (independentemente de uma dimensão positiva e economicamente relevante)
desde logo e sem qualquer intermediação do legislador, assegurar – em qualquer processo – a fruição e/ou
proteção dos direitos designados (por esta razão) de negativos ou defensivos.
46
(...) Pouco importa. Certo, quando já vigente à Constituição, se editou lei integrativa
necessária à plenitude de eficácia, pode subseqüentemente o legislador, no âmbito
de sua liberdade de conformação, ditar outra disciplina legal igualmente integrativa
do preceito constitucional programático ou de eficácia limitada: mas não pode
retroceder – sem violar a Constituição – ao momento anterior de paralisia de sua
efetividade pela ausência da complementação legislativa ordinária reclamada para
implementação efetiva de uma norma constitucional. Vale enfatizar a esclarecer o
ponto. Ao contrário do que supõem as informações governamentais, com o admitir,
em tese, a inconstitucionalidade da regra legal que a revogue, não se pretende
emprestar hierarquia constitucional à primeira lei integradora do preceito da
Constituição, de eficácia limitada. Pode, é óbvio, o legislador ordinário substituí-la
por outra, de igual função complementadora da Lei Fundamental; o que não pode é
substituir a regulamentação integradora precedente – pré ou pós-constitucional –
pelo retorno ao vazio normativo que faria retroceder a regra incompleta da
Constituição à sua quase impotência originária (...)12.
13
Ilustrativa é, neste contexto, a crise relativamente aguda vivienciada, já há bom tempo mas com ritmo
crescente, pela Alemanha, onde se intensificam os clamores em prol de uma reforma geral da Lei Fundamental,
acusada, em diversos círculos (inclusive no meio acadêmico) de estar tornando ingovernável o país (v., a
respeito, a ampla e bem documentada reportagem veiculada pelo importante periódico Der Spiegel, na sua
edição de 12.05.03, que ostenta o sugestivo título Die verstaubte Verfasung, que, em bom português, significa
“A Constituição empoeirada”). Registre-se, contudo, que muito embora significativa parcela das reformas em
andamento envolva o sistema de segurança social e a problemática do ajuste fiscal e do déficit público, o que
mais tem preocupado os críticos é a inviabilidade prática de mudanças com a rapidez necessária, tendo em conta
o intrincado e paralisante sistema federativo, a repartição de competências, o intrincado sistema partidário e a
complexidade do processo legislativo, além da possibilidade de pequenos blocos partidários e representantes dos
Estados impedirem a aprovação de projetos essenciais para o saneamento do País e retomada do crescimento
econômico. Se este discurso (entre nós igualmente difundido) há de prevalecer na sua íntegra, aqui não será
questionado, mas o exemplo serve para demonstrar o quanto a questão da reforma do Estado e das instituições,
num contexto social, político e econômico altamente explosivo e influenciado pela globalização econômica,
representa um fenômeno de proporções mundiais e não pode ser simplesmente desconsiderado na seara jurídica e
jurisdicional, especialmente no âmbito da discussão em torno da proibição de retrocesso.
50
Para fazer a ponderação das modificações trazida aos direitos sociais pelo
poder legiferante não há como partir de critérios abstratos e genéricos, o método
adequado é o tópico e sistemático nos diferentes caos concretos, como defende
SARLET (2001, p. 18):
Outro aspecto que merece ser destacado é o fato de que a amplitude e intensidade
da proteção outorgada pela ordem constitucional às posições jurídico-subjetivas na
esfera social, tanto no plano constitucional, quanto ao nível da legislação ordinária,
dependem de uma análise centrada nas especifidades do caso concreto, exigindo
um procedimento tópico-sistemático, já que nos parece inviável o estabelecimento
de critérios abstratos e genéricos, a não ser o próprio reconhecimento de uma
proibição meramente relativa de retrocesso.
Conclusão.
demanda uma proteção que vai muito além das garantias liberais previstas na
primeira fase de construção dos direitos humanos.
A Constituição de 1988, no dispositivo que expressamente trata das
limitações materiais à reforma constitucional, impede qualquer proposta de emenda
tendente a abolir os direitos e garantias individuais. Esse dispositivo deve ser
interpretado de maneira ampla, de forma que a limitação é aplicável não só ao artigo
5º, mas a todos direitos fundamentais, incluindo direitos fundamentais individuais,
coletivos e sociais. É preciso respeitar o projeto para o Estado brasileiro
estabelecido pelo constituinte, mantendo o espírito e a sistemática em torno da
dignidade humana.
Com o presente trabalho demonstra-se que as oposições a petrificação dos
direitos sociais na ordem constitucional não se justificam, essa estabilidade longe de
ser um risco democrático, é um ganho a democracia, pois a mesma ganha em
legitimidade. Somente em um Estado social de Direito em que as pessoas tenham
igualdades de condições e um standard mínimo de proteção é que a democracia
pode ser exercitada em sua plenitude
A atualidade do tema ainda se potencializa quando averiguamos uma
campanha velada (em outras oportunidades nem sempre tão velada) de
desconstituição das garantias sociais e coletivas conquistadas, com os discursos de
ganhos econômicos e maior competitividade numa economia globalizada. Mas em
que tipo de valores queremos forjar o país, um - que em nome do maior lucro -
passa por cima da dignidade das pessoas? É necessário dar um basta a essa
inversão de valores! O que necessitamos é de um desenvolvimento sustentável cujo
foco principal deve ser a preservação do nosso planeta e a busca de uma vida
decente para todos.
Para além, mais que tentar defender o que já é posto, devemos contra atacar
com a difusão de novas idéias e argumentos de expandir e concretizar os direitos
fundamentais; o principio de não retroceder em direitos fundamentais positivados
vem a esse encontro, pois – com uma segurança jurídica e social - teremos no
horizonte a busca de novas conquistas e não a simples defesa do que já temos.
Daí que a grande gama de direitos fundamentais trazidas pelo constituinte de
1988, podem ser assimiladas e aplicadas na esteira da legitimidade,
operacionalidade e efetividade que a dignidade da pessoa humana exige, sempre
53
Referências.