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Destarte, torna-se evidente a importância das questões citadas: paz mundial, respeito
pela soberania, direitos humanos. E tratar sobre a soberania entre os Estados é o intuito que
objetiva-se por intermédio do presente artigo.
Para isso, recorrer-se-á à obra do filósofo alemão Immanuel Kant, À paz perpétua1
(1795), do alemão Zum ewigem Frieden, a qual traz belíssimas passagens sobre a soberania e
a paz mundial, o que a torna uma obra cada vez mais atual. Recorreremos também à obra do
também filósofo alemão, Jürgen Habermas, A inclusão do outro (1996) para fazer um
contraponto com o pensamento do filósofo de Königsberg, em relação a um dos tópicos
apresentados por Kant, a soberania no federalismo de Estados livres.
Com as posições contrárias de Kant e de Habermas acerca da questão da possibilidade
de um Estado Mundial, Estado este defendido por Habermas e criticado por Kant, ao final
poderemos nos posicionar através de uma opinião pessoal. Trazendo assim ao debate assuntos
importantes e pertinentes para o Direito como um todo e para a construção de uma sociedade
mais justa, respeitadora dos direitos humanos e da soberania estatal.
A obra “À paz perpétua” foi publicada no ano de 1795, essa foi inspirada pelas
importantes cartas de direitos da época, haja vista o período denominado pela História como a
Era das Revoluções: Revolução Americana (1776), Revolução Francesa (1789), e ainda um
pouco antes, a Revolução Gloriosa (1688). Os ideais iluministas estavam em voga em toda a
Europa, e também sendo levados para todo o mundo ocidental.
Estruturalmente, a obra se divide em primeira e segunda parte. Kant a inicia com o
título: À PAZ PERPÉTUA – UM ESBOÇO FILOSÓFICO, e com as primeiras palavras já
deixam claros seus objetivos com o opúsculo:
1
Traduzido do idioma alemão, no original: Zum ewigem Frieden.
3
empíricos, e assim se pode deixar o teórico ficar sempre jogando o bolão, sem que
o estadista conhecedor do mundo tenha de importar-se com isso.”2
Kant salienta que seu trabalho não será considerado pelos políticos, mas mesmo assim
ele não se furtará de se posicionar, dando sua opinião, o que o faz de maneira brilhante. A
primeira parte traz os artigos preliminares para a paz perpétua entre os Estados, estes em
número de seis. A segunda parte traz os três artigos definitivos para a paz perpétua entre os
Estados.
É de se ressaltar que Kant escreveu a obra, conforme afirmado alhures, sob influência
das idéias das revoluções, principalmente da Revolução Francesa, evento este que encantou o
filósofo e que fez com que toda a história do ocidente sofresse sua influência, resultando em
eventos que trazemos conosco em nosso cotidiano, em nossas instituições, até os dias atuais.
O primeiro artigo preliminar para a Paz Perpétua entre os Estados, traz o seguinte
subtítulo: 1. Não Deve Ser Considerado Válido Nenhum Tratado de Paz que Possa Ser
Convertido, com uma Ressalva Secreta, na Matéria de uma Futura Guerra3. Para Kant, se
isso ocorresse, trataria-se de um armistício e não de uma verdadeira paz, pois o próprio
documento poderá, a qualquer momento, ser colocado a serviço de Estados para se fazer uma
guerra, fazendo como que o termo “perpétua” tenha um caráter suspeito.
O segundo artigo trata da questão da possibilidade de um Estado adquirir o outro por
troca, compra, com o seguinte enunciado: 2. Nenhum Estado Existente por Si (Grande ou
Pequeno, Tanto Faz) Poderá Ser Adquirido por Outro Estado Por Herança, Troca, Compra
ou Doação4. Este artigo traz uma questão bastante interessante e importante: o fato de o
Estado não ser considerado tão somente um ente físico, o qual pode ser, a qualquer tempo e
circunstância, alienado. O Estado é mais do que isso, ele é uma sociedade de homens, homens
que possuem histórias, ou como o próprio Kant diz, “raiz”.
Tal artigo reflete um aspecto histórico predominante na Europa de então, o casamento
entre famílias reais para que reinos fossem unidos, formando uniões pessoais e reais de
Estados. A interpretação da proibição implícita nesse artigo abrange também o fato de um
Estado não poder alugar tropas de outro.
Já o terceiro artigo traz: 3. Exércitos Permanentes (miles perpetus) Serão Com o
Tempo Abolidos5. Kant defende a abolição dos mesmos por considerar que os gastos com
esses se avolumam incessantemente pelo fato de que o incitamento de um para superar o outro
2
In: GUINSBURG, J. A Paz Perpétua: um projeto para hoje. pág. 31
3
In: Op. Cit. pág. 32
4
In: Op. Cit. pág. 32
5
In: Op. Cit. pág. 33
4
em número de homens, faz com que os gastos em tempos de paz sejam superiores aos gastos
em tempos de guerra.
Também existe a questão de se morrer em prol de uma causa, muitas das vezes,
ilegítima, como temos visto em nossos dias atuais, soldados são recrutados para lutar em uma
guerra que na verdade não compreendem, e as mortes são, descaradamente, mascaradas pela
mídia, mídia esta também controlada, muitas das vezes, pelo próprio Estado.
Em uma corrida armamentista, a tensão e a ameaça da guerra fazem com que ataques
antecipados sejam sempre comuns, e armas químicas, atômicas, de destruição em massa são
preparadas, secretamente, por Estados, tudo com vista à prevenção de um ataque por parte de
outro. É importante ressaltar a atualidade do terceiro artigo, ele reflete a nossa realidade em
relação às relações internacionais, à questão da política internacional, os conflitos no Oriente
Médio, o clima de tensão que existe num mundo dominado pela tecnologia de destruição em
massa.
O quarto artigo traz: 4. Não Devem Ser Feitas Dívidas Públicas em Relação a Rixas
Externas de Estados6. Kant inicia os comentários a esse artigo com os seguintes dizeres:
Kant não condena os empréstimos para serem usados em melhorias para o Estado, e
também para prevenção em casos de escassez, de anos infrutuosos. O que ele condena são os
empréstimos usados na promoção de querelas entre Estados.
Já no quinto artigo, com o postulado: 5. Nenhum Estado Deve Intrometer-se pela
Força na Constituição e no Governo de Outro Estado8, Kant trata de um dos temas mais
delicados e atuais no cenário político internacional, a questão da soberania internacional.
Se fizermos uma retrospectiva nos últimos anos, recordaremos diversos eventos que
trazem em si esta condição, como exemplo, temos a Guerra do Golfo, a invasão norte-
americana no Afeganistão usando o pretexto de acabar com terroristas, a Guerra no Iraque,
6
Op. Cit. pág. 34.
7
Op. Cit. pág. 34.
8
Op. Cit. pág. 35.
5
esta com o fito de instaurar uma democracia no país, sem citar outros, os quais são de
conhecimento de toda comunidade internacional.
A soberania estatal é um dos elementos, além de caracterizadores, marcantes do
Estado Moderno, sendo una e indivisível, não havendo Estado perfeito se essa não existir.
Kant indaga o que poderia autorizar um Estado invadir o outro. E lança a indagação se talvez
o escândalo provocado nos súditos do Estado que sofreu a intromissão seja a autorização.
E conclui a parte dos artigos preliminares para a paz perpétua com o sexto artigo: 6.
Nenhum Estado, em Guerra com um Outro, Deve Permitir Hostilidades de Tal Natureza que
Tornem Impossível a Confiança Recíproca na Paz Futura: como o Emprego de Assassinos
(percussores), envenenadores (venefici), a Ruptura da Capitulação, o Incitamento à Traição
(perduellio) no Estado Combatido9.
Kant afirma serem esses, estratagemas desonrosos. Apesar de Kant afirmar a
possibilidade e a realidade da guerra, defende o que poderíamos afirmar de “guerra justa”, ou
seja, uma guerra que tivesse por objetivo posterior um estado de paz, guerra que teria o seu
resultado arbitrado nos chamados juízos de Deus, o qual decidiria de que lado se encontra o
direito.
Kant, nos comentários ao presente artigo, também condena a chamada bellum
punitivum, ou seja, guerra de punição, pois nenhum Estado possui relação de subordinação a
outro. E também salienta o fato de que:
Após o sexto artigo supracitado, Kant inicia a segunda seção de sua obra, a qual
contém os chamados artigos definitivos para a paz perpétua entre os Estados, seção que
contém três artigos.
Kant, antes de introduzir os artigos definitivos, em seu preâmbulo aos mesmos, afirma
que a paz não é um estado de natureza entre os homens, e que do contrário, o estado de
natureza entre os homens é sim um estado de guerra, um estado que mesmo que não haja a
efetiva irrupção de hostilidades, a ameaça de guerra é constante. E assim conclama a todos os
homens que lutem por um estado de paz, afirmando que este precisa ser instaurado.
9
Op. Cit. pág. 35.
10
Op. Cit. pág. 36.
6
Para que não se confunda constituição republicana com democrática, Kant observa que
as formas de Estado (civitas) podem ser divididas de acordo com a diferença das pessoas que
detêm o poder supremo do Estado; de acordo com o modo de governar o povo adotado pelo
soberano.
À primeira, Kant dá o nome de forma imperii, e a divide em três: um só detém o poder
soberano (autocracia), alguns detêm o poder (aristocracia) ou todos detêm tal poder
(democracia). Em relação ao modo de governar, a forma de governo (forma regiminis), poder-
se-á ser dividido em republicano ou despótico. O republicanismo é o princípio político da
separação do poder executivo do legislativo; o despotismo é o da execução arbitrária pelo
Estado das leis por ele próprio originadas.
Passando para o segundo artigo definitivo, este objeto do título do presente artigo, por
ser objeto de reflexão do filósofo alemão Jürgen Habermas em sua obra A inclusão do outro
(1996), por fazer uma atualização da obra de Kant duzentos anos depois, nas próprias palavras
de Habermas. O posicionamento central da atualização se converte neste segundo artigo, no
qual Habermas traz opinião diversa da de Kant, conforme veremos mais à frente.
11
Op. Cit. pág. 40.
12
Op. Cit. pág. 42.
7
Ora assim como encaramos o apego dos selvagens à sua liberdade anárquica, que é
a de se combater incessantemente, de preferência a submeter-se a uma coerção
constituída por eles mesmos, portanto de preferir a liberdade louca à racional, com
profundo desprezo, e consideramo-lo como grosseria, falta de polimento e
13
Op. Cit. pág. 50.
8
Deste modo, fica claro posicionamento de Kant, apesar de o mesmo autor considerar
importante uma organização que congregue os Estados, tal organização não pode se tornar um
Estado Mundial. Em sentido contrário ao posicionamento de Kant, está o posicionamento do
filósofo Jürgen Habermas15 ao dizer:
Concordamos que a soberania de um povo deve ser respeitada, não sendo suscetível de
ameaça por parte de outros povos, mesmo que seja para estabelecer uma paz perpétua, em
defesa da democracia, como querem os atuais donos do poder, herdeiros de um poder que um
dia já pertenceu à poderosa Roma, que também invadiu para impor sua cultura.
Também afirmamos que Habermas tem razão, pois se não houver um órgão superior
externo para impor sanções, as regras para efetivação da paz perpétua não serão cumpridas,
mas em um contraponto entre soberania e invasão de soberania para a imposição de uma paz
perpétua, como foi colocado por Habermas, ficamos com o posicionamento da não invasão e
o respeito da soberania, de Kant, pois a soberania estatal é um dos elementos mais
importantes para a caracterização do Estado e uma de suas mais relevantes conquistas.
Conclusão
BIBLIOGRAFIA
GUINSBURG, J. (org). A paz perpétua: um projeto para hoje. São Paulo: Perspectiva,
2004.