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R Dental Press Ortodon Ortop Facial 21 Maringá, v. 12, n. 6, p. 21-23, nov./dez. 2007
Insight ortodôntico
polpa não teve tempo de depositar novas camadas os pré-odontoblastos e até as células vasculares a
de dentina reacional, pois a morte celular foi súbi- se diferenciarem, modificarem ou se transforma-
ta. No periápice de dentes com necrose pulpar por rem em odontoblastos, que iniciam uma produ-
coagulação ou asséptica, típica de traumatismos ção aleatória e desorganizada de dentina reacional,
dentários, pode-se identificar pericementite apical com células e vasos incluídos em sua estrutura, a
crônica ou lesão periapical crônica sugestiva de ponto de ser identificada até como osteodentina
granuloma periapical (Fig. 1). São lesões discretas, ou vasodentina. A osteodentina e a vasodentina
de longa duração e praticamente assintomáticas. O são formas primitivas de dentina e encontradas
principal motivo de procura do profissional ou de como parte de dentes de animais inferiores na es-
queixa por parte do paciente refere-se à coloração cala biológica evolutiva da vida animal.
alterada escurecida da coroa dentária. Este depósito aleatório de dentina displásica, ou
Em síntese, quando um traumatismo ocorre e o seja mal formada, geralmente é muito desorganiza-
dente permanece estruturalmente hígido, a polpa do e pouco mineralizado e pode até ter um direcio-
pode permanecer saudável ou evoluir para a ne- namento da periferia para o centro da polpa, mas
crose asséptica ou por coagulação, se o feixe vas- nem sempre. Com freqüência, esta aleatoriedade
cular e nervoso foi severamente comprometido. de deposição de dentina displásica é absoluta e
Mas o feixe vascular e nervoso pode ser ape- descontrolada. Após três meses, radiograficamente
nas parcial ou transitoriamente comprometido. As pode se notar apagamento dos limites pulpares nor-
células da polpa podem ser submetidas à hipóxia mais, redução do volume pulpar, fechamento dos
passageira, perda temporária de nutrientes e redu- espaços pulpares na câmara e/ou no canal radicular
zir seu metabolismo ao mínimo necessário para a (Fig. 1). O fechamento pode se completar com o
sobrevivência celular. apagamento dos espaços pulpares entre 6 meses e
Uma das formas de adaptação celular a condi- 1 ano após o traumatismo. Este fenômeno, muito
ções adversas é a metaplasia celular. A célula ma- conhecido e freqüente, também é simplesmente
dura se transforma, muda seu fenótipo para um conhecido como Obliteração Pulpar, mas deveria
outro tipo celular igualmente maduro de célula ser mais apropriadamente identificado como Meta-
e da mesma linhagem embrionária. A metapla- morfose Cálcica da Polpa, o nome mais utilizado na
sia representa uma forma eficiente de adaptação literatura pertinente sobre o assunto.
celular. Quando o indivíduo começa a fumar, as Clínica e radiograficamente a presença de Me-
células de revestimento da traquéia e dos brôn- tamorfose Cálcica da Polpa indica história pre-
quios mudam de células epiteliais ciliadas e mu- gressa de traumatismo dentário. Dentes trauma-
cosas, cilíndricas, e grandes produtoras de muco, tizados quando movimentados ortodonticamente
para células epiteliais escamosas e estratificadas, às têm mais chances de apresentarem reabsorções
vezes produzindo, inclusive, queratina superficial. radiculares mais severas, pois iniciam-se mais pre-
Enfim, a metaplasia representa uma metamorfose cocemente que os demais dentes.
na morfologia e função celular. Clinicamente, os dentes portadores de Meta-
Na polpa de dentes traumatizados e que perma- morfose Cálcica da Polpa gradativamente adqui-
neceram estruturalmente hígidos, mas com lesão rem uma coloração mais amarelada, inicialmente
parcial do feixe vascular e nervoso, as células pul- sutil, mas perceptível e incomodativa à medida
pares podem sofrer metaplasia para se adaptarem que progride no tempo, chegando a severos escu-
à hipóxia passageira e redução do metabolismo. recimentos coronários. A maior espessura dentiná-
Esta metaplasia leva os fibroblastos, os pericitos, as ria e a forma de desorganização com que a dentina
células indiferenciadas ou células-tronco teciduais, displásica é depositada deixam o esmalte translu-
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CONSOLARO, A.; BERNARDINI, V. R.
zir uma tonalidade bem escura e amarelada. se pulpar asséptica por traumatismo com lesão se-
Em muitos casos o profissional instala o apa- vera ou rompimento do feixe vascular e nervoso no
relho ortodôntico, movimenta o dente com Meta- forame apical (Fig. 1).
morfose Cálcica da Polpa, a reabsorção radicular As condutas a serem adotadas, nos casos de
mostra-se acentuada neste dente portador, o dente necrose pulpar asséptica ou por coagulação em
sofre escurecimento coronário e o paciente pro- dentes estruturalmente hígidos e nos casos de
cura outro profissional e o veredicto diagnóstico Metamorfose Cálcica da Polpa, envolvem ime-
inadequada e infelizmente poderá ser: o tratamen- diata e diretamente o endodontista. A aborda-
to ortodôntico induziu necrose pulpar, reabsorção gem endodôntica será, no tempo, inevitável,
acentuada, obliteração quer seja via canal ou
pulpar e, em conseqüên- via cirúrgica paraendo-
cia, o escurecimento co- dôntica. O mesmo ocor-
ronário! Na verdade o rendo com o esteticista,
diagnóstico deveria ser: que poderá ser requisi-
Metamorfose Cálcica tado visando a clareação
da Polpa por traumatis- dentária ou a colocação
mo dentário anterior e de facetas. A Metamorfo-
Reabsorção Radicular se Cálcica da Polpa é pro-
acentuada induzida pelo gressiva, escurece a coroa
tratamento ortodônti- e em 25% dos casos evo-
co. Houve falta de um lui com o tempo para le-
planejamento defensivo são periapical crônica.
para reabsorções radi- Neste insight, a in-
culares, a partir das ra- quietação advém das se-
diografias periapicais de guintes perguntas, cujas
todos os dentes, deter- respostas não são encon-
minante para uma boa tradas na literatura perti-
prática ortodôntica. nente:
O diagnóstico da 1) Em uma casuís-
Metamorfose Cálcica da FIGURA 1 - No incisivo central direito a Metamorfose Cálcica da Polpa carac- tica documentada com
Polpa pode ser feito clini- teriza-se pela obliteração da câmara pulpar e estreitamento do canal radicular radiografias periapicais
com apagamento dos seus limites pulpares. No incisivo central esquerdo a câ-
camente a partir do escu- mara pulpar e canal radicular estão com seus limites preservados, mas nota-se de todos os dentes, utili-
recimento isolado de um lesão periapical crônica, indicando necrose pulpar asséptica. Ambas as situa-
ções indicam história anterior de traumatismo dentário, reforçada pelas fraturas
zadas nos planejamentos
ou dois dentes hígidos. O coronárias e relato de acidente por parte do paciente. ortodônticos, qual a fre-
paciente pode até não re- qüência da Metamorfose
cuperar a história de traumatismo dentário, mas ele Cálcica da Polpa?
ocorreu quase que inevitavelmente. Na radiografia 2) Quantos casos foram previamente diagnosti-
periapical a obliteração do canal pelo apagamento cados nos planejamentos ortodônticos realizados?
de seus limites determinará o diagnóstico final. Mas 3) Qual foi o protocolo de conduta mais ado-
não será surpresa se no lugar da Metamorfose Cál- tado pelo ortodontista frente a este diagnóstico?
cica da Polpa, os limites pulpares estiverem preser-
vados e o dente escurecido, associados a uma lesão Endereço para correspondência
Alberto Consolaro
periapical crônica, um quadro indicativo de necro- E-mail: alberto@fobusp.br
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