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PERFIL SOCIAL E POLÍTICO DAS

LIDERANÇAS DE CEBS NO BRASIL


Pedro A. Ribeiro de Oliveira

Introdução
As Comunidades Eclesiais de Base -CEBs- têm sido objeto de muitas pesquisas e debates no
campo das Ciências Sociais, devido a seu caráter inovador, seja por seu impacto na estrutura clerical da
Igreja Católica, seja por sua atuação social e política. Nascidas no clima de renovação do Concílio
Vaticano II e da Conferência Episcopal de Medellín (1968), as CEBs representam uma ruptura na
tradição católica latino-americana, na medida em que, ao invés do anticomunismo militante, assumem a
defesa dos Direitos Humanos e isso as leva a posições sociais e políticas de "esquerda". Esse movimento
histórico, que une espiritualidade e militância política e social, tem sua elaboração teórica na Teologia da
Libertação, que dialeticamente acompanha e conduz as CEBs e as Pastorais Populares, constituindo uma
nova forma de ser Igreja1.
Entre os temas dessas pesquisas está o debate sobre o que teria levado a Igreja à "opção pelos
pobres". Bons autores como S. Mainwaring2 explicam a mudança a partir da lógica institucional da
própria Igreja em busca de uma posição mais forte diante do Estado. De minha parte, alinho-me entre os
que entendemos essa mudança no fato de terem os "pobres" (aqui entendidos genericamente como grupos
organizados das classes populares) ocupado um novo espaço na Igreja católica. Esse debate perdeu sua
intensidade quando o processo de restauração católica, em curso desde o início do Pontificado de João
Paulo II, calou a Teologia da Libertação e desmantelou tudo que pudesse ser identificado com alguma
forma de Igreja popular. Ao privilegiar os chamados “Movimentos Espirituais", inspirados numa teologia
de salvação individual, e relegar a segundo plano as comunidades de base, as pastorais populares e sua
teologia, a Cúria Romana teria retirado a hegemonia até então exercida pelas CEBs na Igreja da América
Latina. De fato, elas perderam visibilidade na Igreja e na sociedade, mas continuam presentes nas zonas
rurais e periferias urbanas animando movimentos e organizações populares como o Partido dos
Trabalhadores, sindicatos, associações de moradores, o MST e movimentos de grupos sociais
discriminados (negros, índios, mulheres). Isso levanta a questão: as CEBs continuam sendo sementeiras
de movimentos sociais, sindicais, culturais e políticos?
O objetivo deste trabalho, é apresentar uma resposta a essa questão, tomando como referência
dados empíricos sobre o perfil social e político das pessoas que ocupam posição de liderança nas CEBs.
Esses dados resultam de um questionário aplicado entre os delegado e delegadas de comunidades
presentes ao 10o Encontro Intereclesial de CEBs, realizado em Ilhéus- BA, em julho de 2000. Elaborado
de modo a poder ter ao menos alguns de seus dados comparados aos resultados de uma pesquisa realizada
em 1981, durante o 4o Encontro Intereclesial de CEBs, em Itaicí-SP3, ele traz informa sobre realidade
atual e permite evidenciar as mudanças ocorridas nos últimos 20 anos. Antes de analisá-los, porém,
convém explicitar a metodologia da pesquisa e fazer uma breve apreciação do seu potencial de
generalização.

Apreciação metodológica
Um Encontro Intereclesial exige uma longa preparação em nível diocesano e regional e reúne
representantes de comunidades de todo o país. Por isso, as pessoas delegadas pelas bases para representá-
las no Encontro em princípio podem ser consideradas como lideranças das CEBs no Brasil. Há indícios
de que nem sempre isso acontece, pois vários critérios intervêm no processo de escolha dos delegados e
delegadas, resultando que também pessoas de menor representatividade tenham participado do Encontro.
Apesar desta ressalva, no seu conjunto essas pessoas formam o quadro de liderança das CEBs do Brasil,
mesmo porque não há outro canal de manifestação das bases.
O questionário foi aplicado a todas as pessoas presentes ao Encontro, tendo sido apurados
separadamente as respostas dadas por delegadas e delegados das bases e por pessoas de outra condição
(bispos, sacerdotes, religiosas, representantes de Igrejas evangélicas, assessores e demais convidados).
Como a mesma precaução havia sido tomada na pesquisa de 1981, a comparação dos dados estava

Ex - Coordenador do Programa Memória e Caminhada. Universidade Católica de Brasília
1
Esta expressão é utilizada pelo documento através do qual a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil dá seu reconhecimento e
imprime suas orientações às CEBs em 1982.
2
Cfr. Igreja e Política no Brasil 1916-1986; Brasiliense, São Paulo, 1989.
3
Cfr. Pedro A. RIBEIRO DE OLIVEIRA: Oprimidos: a opção pela Igreja; Revista Eclesiástica Brasileira, vol. 41, dez. 1981,
p.643-653.
garantida. A discrepância entre o número de pessoas presentes nos dois encontros reflete o próprio
dinamismo das CEBs nesses 20 anos: enquanto a pesquisa de 1981, refere-se a 163 dos 184 delegado/as
presentes, a atual tem 1.439 respostas de um total de 2.395. Tendo em vista a dispersão dos participantes
ao Encontro (que se realizava simultaneamente em 4 locais diferentes), o número de questionários
respondidos pode ser considerado excelente. A apreciação das respostas revela que todos procuraram
responder as questões criteriosamente, dando até mais informações do que o solicitado. A dificuldade
maior ficou na análise comparativa, porque dos questionários de 1981 só restam hoje as tabelas com
dados agregados.
Consideradas essas ressalvas de ordem técnica, vejamos o que nos dizem os dados da pesquisa1.
Vamos aqui analisá-los em dois blocos. O primeiro refere-se a características pessoais e sócio-
econômicas dos delegados e delegadas; o segundo, à sua atuação no campo social e político.

Representantes das CEBs nos Encontros Intereclesiais


Caraterísticas pessoais
Gênero
58% dos questionários são de pessoas do sexo feminino. Embora seja majoritária a presença de
mulheres no encontro, está ainda longe da realidade cotidiana das CEBs, posto que pesquisas do
ISER/Assessoria2 indicam que as mulheres são cerca de 2/3 das animadoras das CEBs. De todo modo, sua
representação em Ilhéus é bem maior do que em Itaicí, quando eram apenas 34%.
Idade
A distribuição dos dados acompanha a realidade que se percebe em encontros diocesanos e
regionais de CEBs: muitos animadores adultos e mesmo idosos, e relativamente pequena presença de
jovens (apenas 23% com menos de 30 anos). Comparando com os dados de 1981, nota-se o
"envelhecimento" dos delegados presentes. Naquela época, os jovens eram 30% e os com mais de 50 anos
não chegavam a 9% (contra 22% hoje). Mas naquela época as CEBs eram ainda uma novidade na Igreja e
a adesão a elas geralmente passava por um processo de "conversão" a essa nova forma de organização
eclesial. Daí a ausência de pessoas de certa idade, menos afeitas a inovações.
Perfil social e econômico
É inegável que as CEBs tiveram sua origem e seu terreno mais propício de florescimento nas
zonas rurais e periferias urbanas, o que faz delas uma forma "popular" de ser Igreja. Mas isso não
significa que seus membros (ou, pelo menos seus líderes) sejam necessariamente pessoas situadas nos
estratos sócio-econômicos de menor prestígio e renda3. Os dados do questionário mostram, ao contrário, a
forte presença de delegados e delegadas cuja ocupação poderia situá-los nos setores médios da sociedade.
Vejamos cada um dos indicadores, para no final propormos uma solução ao problema.
Ao levantar dados que delineiam o perfil social e econômico dos delegados e delegadas, os
questionários revelam também sua notável modificação nesses 20 anos. Para realçar sua nitidez,
apresentamos primeiramente os dados atuais e depois a tabela comparativa.
Moradia e Migração
Embora as palavras roça centro e periferia possam simplificar realidades complexas, elas
tornam-se úteis quando contrastadas entre si para realçar as diferenças desses três contextos sociais.
Assim, as questões referentes ao local de nascimento e de moradia evidenciam o fato da migração rural-
urbana no Brasil: 63% dos informantes nasceram na roça, mas apenas 19% moram ali. Os dados
agregados indicam também o aumento de moradores do "centro" em relação a quem ali nasceu (20% para
33%), e aumento ainda maior para os moradores de "periferia" (de 17% para 48%). Mas o movimento
migratório é multidirecional: apesar das grandes tendências, sempre há pessoas que migram na direção
oposta. Por isso, vale a pena observar o fenômeno mais detalhadamente.
Tomando como base de comparação o tipo de espaço (roça, centro e periferia,
independentemente do lugar físico) onde a pessoa nasceu e onde mora, obtém-se um instigante quadro da
mobilidade humana, que mostra a periferia não como um local de passagem, intermediário, entre a roça e
a cidade, e sim como o espaço de maior fixação das pessoas que nasceram naquele ambiente.

1
Para facilitar a leitura dos dados, as tabelas apresentam apenas os percentuais calculados sobre o total de respostas válidas
(excluídas as não-respostas à questão). O sinal – na coluna referente a Itaici-1981 indica dado inexistente, por não constar do
questionário.
2
Cfr. Clodovis BOFF et alii: As comunidades de base em questão, São Paulo, Paulinas, 1997.
3
Esse fato propiciou a definição simplista de "base" como equivalente a "popular": pessoas que trabalham com as próprias mãos,
ganham pouco e têm pouco prestígio social. Um dos textos, por outros aspectos excelente, que difundiu essa confusão foi o livro de
Fr. BETTO: O que é Comunidade Eclesial de Base; São Paulo, Brasiliense, 1981
Tipo de local onde nasceu e onde mora
Onde nasceu Mora na roça Mora na cidade Mora na Periferia
Roça: 27% 28% 45%
Cidade 11% 61% 28%
Periferia 2% 19% 79%

TOTAL 19% 33% 48%

A comparação com os dados de 1981 fica prejudicada, porque na pesquisa anterior não foi feita e
distinção entre centro e periferia, considerando-se apenas a categoria cidade. Mas fica clara a diminuição
do percentual de delegados e delegadas moradores da roça, que eram 19% em Ilhéus e 27% em Itaicí.
Ocupação profissional
A maioria dos questionários indica ocupação em atividades não-manuais: 51% trabalham no
comércio, ensino, serviços, setor público, área de saúde ou são funcionários da própria Igreja; apenas
19% trabalham na lavoura ou indústria, enquanto 25% estão noutra situação (donas de casa,
aposentados, desempregados e estudantes) e 5% não identificaram sua ocupação econômica.
É muito forte o contraste com os dados de 1981, quando os trabalhadores manuais perfaziam
52%, enquanto os trabalhadores não-manuais eram apenas 21%.
É notável, também, o contraste entre as percentagens de empregados (58% hoje; 35% em 1981)
e autônomos (26% em Ilhéus, 43% em Itaicí). Isso se deve não só à menor proporção de trabalhadores
rurais em Ilhéus, quanto ao processo de "terceirização" em curso na economia brasileira.
Já entre os delegados e delegadas de outras situações (donas de casa, aposentados,
desempregados, estudantes) a diferença global é pequena (25% para 22%).
Rendimento mensal
Tomando por indicador de condição econômica os rendimentos mensais classificados por
salário-mínimo (na época, 1 s.m. = R$151,00), e considerando que seu valor deveria ser 3,5 vezes maior
para atender as necessidades básicas de uma família de 4 pessoas (conforme a norma Constitucional de
1988), define-se a faixa de até 3 s.m. como linha divisória entre os setores menos e mais desfavorecidos
da sociedade brasileira. A pesquisa mostra então que as CEBs continuam tendo um cunho marcadamente
popular, no sentido de que a maioria de seus membros e lideranças situam-se nos níveis inferiores da
pirâmide de distribuição de renda. Esta é a realidade para 58 % dos delegados e delegadas presentes em
Ilhéus. Tomando as faixas imediatamente abaixo e acima, temos respectivamente 44% dos delegados e
delegadas recebendo até 2 s.m. e 69% até 4.s.m. Já no pólo mais favorecido, estão apenas 4% dos
delegados e delegadas que recebem 10 ou mais s.m.
Comparados aos dados de 1981, observa-se uma sensível mudança nas faixas de rendimentos
dos delegados e delegadas, diminuindo os de salários mais baixos e aumentando os de níveis médios e
altos. Naquela época, os delegados e delegadas com rendimentos até 2 s.m. perfaziam 73%, e apenas 4%
tinham rendimentos acima de 5 s.m. (Para se ter uma idéia da realidade do 10º Intereclesial, os delegados
e delegadas com rendimentos acima de 4 s.m. eram 25%). Tal diferença requer uma explicação, uma vez
que nesses vinte anos não ocorreu uma verdadeira redistribuição de renda4 para o conjunto da população
brasileira. Teriam as lideranças de CEBs se deslocado para os setores médios da sociedade brasileira?
Antes de responder a questão, é necessário ter em vista a constatação de que em encontros de
nível diocesano não se percebe aquela mudança, sendo os delegados das CEBs pessoas situadas nas faixas
inferiores de rendimentos5. Existe, portanto, uma discrepância entre a composição das delegações ao
Encontro Intereclesial e a realidade cotidiana dos membros de CEBs nas bases. Tal discrepância, que
provavelmente não existia em 1981, levanta uma questão sobre a atual forma escolha de delegados ao
Intereclesial. Atualmente, as delegações são definidas por regionais, e estes contratam ônibus para a
viagem. Uma boa maneira de se reduzir o custo per capita é ocupar todos os lugares do ônibus. Assim, a
contribuição de pessoas com maior poder aquisitivo ajuda a pagar a viagem de quem tem menos. Em
1981, sendo muito menor o número de participantes, estes faziam a viagem em ônibus de carreira (e
podiam ter a passagem paga pela sua diocese, paróquia ou comunidade local).
Essas considerações permitem concluir que não houve propriamente um deslocamento das
lideranças de CEBs para os setores médios na pirâmide social de distribuição de renda, mas pode-se, sim,

4
É preciso levar em conta a perda de poder aquisitivo do salário mínimo, que não é indicador adequado de correção monetária em
períodos longos.
5
. Esta observação por dados aparentes se confirma nos dados de recente pesquisa em Ipameri-GO, com a seguinte distribuição de
rendimentos dos membros de CEBs que participaram da preparação da Assembléia diocesana:

Até 1 s.m.17455%De 1 a 2 s.m. 6721%De 2 a 3 s.m. 3411%De 3 a 4 s.m. 237%De 4 a 6 s.m. 134%De 6 a 10 s.m. 41%Mais de 10
s.m. 41%Total319100%
constatar a disparidade entre os representantes das CEBs em encontros de nível nacional e os
animadores e animadoras das comunidades locais.
Escolaridade
Tendo em vista que as CEBs têm sua localização preferencial nos setores populares, chama a
atenção o elevado nível de escolaridade de seus representantes, evidenciando-se o caráter da mobilidade
intergeracional que vem sendo observado no Brasil desde o início do processo de universalização da
educação básica6: 54% têm pelo menos o 2O grau completo (23% estão cursando ou cursaram o 3O grau).
É insignificante o número de pessoas analfabetas ou que não completaram as 4 primeiras séries do 1 O
grau (respectivamente 5 e 43 pessoas). Esses dados reforçam a observação de que a mobilidade
ascendente vem ocorrendo com maior intensidade nos estratos de menor escolarização do que nos estratos
médios e superiores. Nesse sentido, a comparação com os dados de 1981 mostra evidente contraste nesses
dois extremos. Com efeito, naquela época, 44% tinham no máximo o primário incompleto (ou seja,
menos de 4 anos de escolaridade) e apenas 16,5% tinham mais do que o 1O grau (5,5% tinham curso
superior).
Mesmo considerando que isso se deve, em grande parte ao aumento da escolaridade da
população brasileira no seu conjunto, devido à ampliação do sistema educacional em todos os níveis de
ensino, demanda maior profundidade de pesquisa o estudo do conjunto de variáveis que resultariam no
quadro delineado. Embora se possa questionar as relações entre qualidade e quantidade, o fato é que um
maior número de brasileiros têm tido acesso à escola e à faculdade e as lideranças de CEBs não fogem à
regra. Mas esse fator –por si só- não pode explicar uma mudança tão forte no perfil social dos delegados e
delegadas ao Intereclesial. Ele deve ser considerado em intrínseca relação com o anterior, isto é, a
presença de maior número de pessoas de nível de rendimentos acima de 3 s.m. e, portanto, com maiores
possibilidades de acesso ao ensino pago (posto que a ampliação do ensino deu-se principalmente na rede
privada nos níveis médio e superior).
Situação familiar
Eram casadas 54% das pessoas presentes no 10o Intereclesial, 35% solteiras e 5% viúvas.
Apenas 5% eram separadas ou divorciadas. Com exceção dos solteiros e solteiras, quase todas têm filhos.
A grande maioria tem 1 a 3 filhos, sendo 8,5% os que têm 7 filhos ou mais.
Essa distribuição dos informantes por condição familiar é muito semelhante à encontrada em
1981, exceto no número de filhos, que diminuiu sensivelmente (acompanhando a mesma tendência
demográfica em curso na sociedade brasileira em geral).
Tendo presente que nesses vinte anos cresceu muito no Brasil o número de pessoas divorciadas
ou separadas vivendo maritalmente, marca-se então, pela situação familiar, uma forte diferença entre as
lideranças de CEBs e a população em geral. Essa diferença deve ser explicada pelas normas da Igreja
católica, que restringem o acesso de pessoas em segunda união a cargos de responsabilidade eclesial, e
isso parece valer também para a animação de CEBs.

Conclusão
Esse primeiro conjunto de dados poderia levar à conclusão apressada de haver ocorrido uma
mudança no perfil sócio-econômico das CEBs, que já não seriam mais tão populares quanto no passado
devido à grande participação de pessoas que, por sua ocupação, rendimentos e escolaridade deveriam ser
classificadas como pertencentes às classes médias. Essa conclusão poderia levar a ilações de graves
conseqüências pastorais, uma vez que seu status social mais elevado lhes permitiria exercer grande
influência sobre as demais, menos escolarizadas e de menor autonomia econômica. Antes de levar adiante
tal hipótese, porém, é preciso ter em conta o que já foi dito sobre a desproporção entre os representantes
das CEBs presentes em Ilhéus e suas lideranças no cotidiano7.
Feita a ressalva, podemos buscar uma explicação para a mudança de perfil sócio-econômico no
próprio caráter do Encontro Intereclesial. Além de ser um encontro de CEBs, ele tornou-se um evento do
que se tem chamado a Igreja da Libertação, a qual exerce enorme atração sobre pessoas que desejam
aproveitar a oportunidade do Intereclesial para respirar o clima de celebração, animação e espiritualidade
bíblica marcado pela relação entre a Fé cristã e o compromisso de luta social e política ao lado dos
pobres. Por isso o Intereclesial atrai muitas pessoas de setores sociais médios, que por afinidade se unem
às CEBs e apoiam sua caminhada embora nem sempre participem do seu cotidiano em nível local.
Atuação na Sociedade e na Política

6
A educação básica compreende os níveis fundamental e médio, portanto, antigos 1º e 2º graus.
7
Aqui se coloca o problema prático dos critérios de escolha dos delegados e delegadas, que em muitos regionais são distribuídos
paritariamente pelas dioceses, independentemente do número e da força das CEBs em cada uma delas. Esse critério de distribuição
de vagas levaria as dioceses mais fracas a terem a mesma quantidade de delegados, dando ensejo à escolha de pessoas que talvez
não fossem as mais representativas das bases locais.
Um dos traços mais originais das CEBs, em relação a outras organizações católicas, é seu modo
de agir no espaço social e político. Diferentemente do modelo de "cristandade", no qual a Igreja cria seus
próprios meios de ação no mundo, as CEBs procuram exercer sua influência na sociedade através de
movimentos e organizações da própria sociedade. Assim, as CEBs estimulam seus membros a
participarem das lutas sociais lado a lado com as outras pessoas, sem que a Igreja enquanto tal dirija essas
lutas. Veremos em seguida as principais lutas em que estão envolvidas as CEBs e a participação de seus
líderes em organizações sócio-políticas da sociedade civil.
Participação nas lutas sociais
A expressão "luta" tem uma significação muito rica nos meios populares, evocando o esforço
pessoal e coletivo nas muitas formas de "luta pela vida". Nas CEBs, onde a leitura orante da Palavra de
Deus implica necessariamente a ligação entre Fé cristã e vida, a expressão "luta" recebe uma forte
valoração positiva como prática na qual se realiza a missão cristã de construção do Reino de Deus nas
realidades terrenas. Tanto assim que apenas 2% dos representantes de CEBs disseram não participar de
nenhuma luta, enquanto a média de lutas por pessoa é de 2,97. A tabela abaixo é bem expressiva, mesmo
porque permite comparar com os dados de 1981:

Participação nas lutas


Forma de luta Ilhéus – 2000 Itaicí - 1981
Bairro, moradia 55 % 80 %
Terra, sindical, operária 39 % 95 %
Renovação da Igreja 38 % 55 %
Mulheres, negros, índios 38 % 20 %
Saúde, educação, ecologia 84 % --
Juventude, crianças 26 % --
Cooperativismo e outras 14 % 12 %
Política, dívida externa 3% 38 %

É evidente o deslocamento das prioridades nesses 20 anos. Os temas relativos ao mundo do


trabalho e da organização política, que estavam na agenda popular no início do processo de
redemocratização do País, perdem importância diante de temas como a qualidade de vida (não esquecer
que os gastos públicos na área social são os primeiros sacrificados pela política neoliberal) e a defesa de
grupos socialmente desfavorecidos (negros, índios, mulheres, crianças). Essa dispersão das lutas não
significa, contudo, uma despolitização das CEBs, mas sim um alargamento do conceito de Política.
Um dado que chama a atenção é a perda de importância da "luta pela renovação da Igreja" que
foi citada por mais da metade dos líderes de CEBs em 1981, e hoje apenas ultrapassa 1/3. Não parece,
contudo, que a Igreja tenha se renovado o bastante para que aquela luta viesse a perder sentido.
A dimensão política dessas lutas pode ser avaliada pelas suas conseqüências: as diversas formas
de perseguição sofridas pelos membros das CEBs. A tabela abaixo compara os dados dos questionários de
Ilhéus e Itaicí, e mostra que a abertura democrática conquistada com a Constituição cidadã de 1988 só em
parte aliviou a violência contra as lideranças populares. Mesmo considerando que alguns desses
sofrimentos possam ter tido outro motivo, é grande o número de pessoas que se consideram perseguidas
devido à sua militância em causas populares.

Perseguições sofridas por causa dessas lutas


Ilhéus – 2000 Itaicí - 1981
Ameaça 37% 65%
Demissão/Lista de exclusão 26% 26%
Processo 5% 5%
Atentado 2% 9%
Violência física 5% 3%
Despejo/ Invasão de domicilio 4% 4%
Prisão 2% 9%
Intimidação/ Pressão 37% 18%
Calunia 53% --
Outra 6% 6%
Nenhuma 34% --
Total de Pessoas perseguidas 58% 48 %

Participação em organizações populares


As organizações da sociedade civil são os condutos institucionais das reivindicações sociais,
enquanto as "lutas" expressam as reivindicações de modo geral, referindo-se aos movimentos e
mobilizações esporádicas ou com finalidades específicas. A participação nas organizações populares da
sociedade civil é um bom indicador do envolvimento pessoal na continuidade de uma "luta", na medida
em que ela requer uma atividade perseverante e não se esgota na obtenção de resultados concretos. O
quadro seguinte mostra a diversificada participação das lideranças de CEBs nessas organizações.

Participação em Organizações da Sociedade Civil


Organização Ilhéus - 2000 Itaicí - 1981
Assoc. de bairro / moradores 36% 42%
Oposição sindical --- 38%
Clube de mães / de mulheres 8% 20%
Movimento contra a carestia --- 14%
Centro de Direitos Humanos 6% 13%
Cons. Com. de Saúde 14% ---
Cons. Com. de Educação 8% ---
Cons. da Criança e Adolescente 10% ---
Cooperativa (produção / consumo) 8% 18%
Outra organização 16% 14%
Nenhuma 24% ---

Duas observações devem ser feitas ao quadro. A primeira, refere-se à participação popular nos
Conselhos comunitários (de Saúde, Educação, da Criança) criados pela Constituição cidadã de 1988, que
representam um passo importante no controle cidadão das Políticas Públicas. A segunda, refere-se à
organização sindical. Em 1981, tendo o regime militar coibido a sindicalização, cresceu o movimento de
"oposição sindical" que visava a constituir um sindicalismo autêntico e autônomo. Com a derrocada
autoritária. aquele movimento extinguiu-se nada medida em que os sindicatos se consolidavam. Hoje é
outro o quadro da participação sindical, como mostra a tabela seguinte:

Participação em Sindicatos
Organização Ilhéus – 2000 Itaicí – 1981
Trabalhadores rurais 18% 55%
Construção civil 1% 6%
Metalúrgicos 1% 11%
Professores 15% 6%
Funcionários 11% --
Outros 6% --
Comercio 1% --
Já não é mais associado 15% --
Nunca foi associado 35% 21%
TOTAL de sindicalizados 65% 27%

Confirma-se a tendência dos líderes de CEBs à sindicalização, já grande em 1981, e ainda maior
em 2000. Outro dado importante é sua participação em cargos de direção nos respectivos sindicatos: 21%
dos sindicalizados foram alguma vez membros da diretoria (18% em 1981). Enfim, a pesquisa confirma a
característica das CEBs de estimularem seus membros à participação em organizações da sociedade civil
e política do país e, o mais importante, a assumirem nelas posição de comando.
Participação na política partidária
Este é talvez o ponto mais polêmico das CEBs: contrariando a tendência geral na Igreja de não-
envolvimento na política partidária8, elas estimulam seus membros a participarem da vida política
nacional por meio de partidos que defendam as causas populares. A pesquisa deixa evidente essa
politização de suas lideranças (embora 44% não sejam filiados a partido algum) e sua opção preferencial
pelo Partido dos Trabalhadores (ao qual estão afiliados 42%). É igual o número (4,5%) de afiliados a
outros partidos de oposição ao governo neoliberal (PDT, PSB, PPS e PCdoB) e aos partidos que formam
sua base de apoio (PMDB, PSDB, PFL). Outros 5% estão afiliados a pequenos partidos, ou não indicaram
seu partido.
Em 1981 já se podia perceber a mesma tendência, mas menos relevante numericamente: 70%
não eram afiliados a partido, 20% filiados ao P.T. e o restante se distribuía entre outros partidos (com
ligeira vantagem para os de oposição ao regime militar de então).
Enfim, cabe notar que 19% desses líderes de CEBs já se candidataram a algum cargo político
(quase todos em nível local) sendo que 3% já exerceram ou exercem mandato político. Confirma-se assim
o estímulo das CEBs para que suas lideranças se envolvam ativamente na política partidária em defesa
das causas populares, não temendo assumir responsabilidades políticas como as disputas eleitorais.

Conclusão
Desde os anos 1970 as CEBs vêm produzindo um laicato católico que articula teórica e
praticamente sua participação eclesial e sua atuação política. Diferentemente da chamada esquerda
católica dos anos 60, este laicato tem forte marca popular. Este fato implica significativas novidades na
história do catolicismo no Brasil. A primeira, é a ruptura com a tradição religiosa popular católica que,
incorporando ao campo religioso o modelo político assistencial/clientelista9, ao mesmo tempo ideologiza
e despolitiza a Fé religiosa. Ao fazer da Fé critério e razão para a ação política, as CEBs ligam Fé e
Política não mais como ideologia da ordem (a ordem do mundo vista como reprodução da ordem
cósmica) e sim como imperativo ético de ação transformadora do mundo. A segunda novidade está no
fato de sua opção política de esquerda compatibilizar-se com sua participação eclesial, diferentemente da
esquerda católica dos anos 60, cuja opção política levou-a ao afastamento da institucionalidade católica.10
Nas CEBs, é valorizada a pessoa que articula sua função interna à comunidade eclesial (como animador
de grupo ou agente de pastoral) com sua atuação no campo político, sem deixar que uma seja subordinada
à outra.
Neste sentido, a pesquisa deixa evidente que as lideranças de CEBs representam uma novidade
no laicato brasileiro. Nesses 20 anos desde o IV Encontro Intereclesial, que marcou o compromisso
político das CEBs com os movimentos e organizações populares, elas mantém a mesma luta, a mesma

8
Ao contrário de outros países de maioria católica, no Brasil a Igreja nunca expressou-se através de um partido, nem mesmo o
democrata-cristão. Sua posição pretende ser sempre suprapartidária.
9
O modelo de relação entre o devoto e seu santo protetor, que espelha a relação de dominação pessoal do senhor sobre seus
agregados, pode ser resumido na expressão “assim na terra como no céu, o grande deve proteger o pequeno, e o pequeno deve ser
submisso ao grande.” Cfr. Pedro A. RIBEIRO DE OLIVEIRA: Adeus à sociologia da religião popular: Religião e Sociedade, vol.
18, nº 02, 1997, pg 43 a 62.
10
Quando a opção foi à direita, como no caso do Centro Dom Vital e da Revista A Ordem nos anos 1930-50, o espaço eclesial
continuou aberto ao Laicato; mas no caso dos Movimentos de Ação Católica Especializada, aquele espaço fechou-se na medida em
que pendiam para a Ação Popular e tendências de esquerda.
militância, o mesmo engajamento. Muita coisa, contudo, mudou. Acompanhando o movimento geral da
sociedade brasileira (migração, urbanização, escolarização, novos campos de atuação), as CEBs também
descortinaram novas formas de luta, enquanto outras tiveram sua importância diminuída. Continuam
sendo sementeiras de organização popular, com seu trabalho de base em busca de mais consciência
política e busca de um projeto popular de corte libertador. Mostram-se sem medo de fazer política
(mesmo porque arrostam as perseguições e sofrimentos), mas entendem que política se faz nos diversos
campos da vida social: no sindicato, no partido, nos novos conselhos comunitários, nas experiências de
economia solidária, enfim nas diversas formas de luta popular.
A esse laicato popular veio somar-se muita gente de extratos sociais de nível médio e mesmo
superior. A comparação com os dados de 1981 deixa evidente essa incorporação de pessoas de classes
médias entre as lideranças das CEBs. Sua presença não chega a alterar substancialmente o caráter popular
das CEBs, mas sugere que sejam revistos os critérios de escolha de seus delegados aos grandes eventos,
como os encontros intereclesiais.
Enfim, a pesquisa comprova a continuidade da caminhada das CEBs nesses vinte anos. Sua
prática política é de esquerda, e sua prática religiosa pauta-se pela institucionalidade católica, inclusive
no que tange sua situação matrimonial conforme as normas eclesiásticas. Mais uma vez, confirma-se a
ligação entre a Fé cristã e a prática política libertária, que desde seu início marca as CEBs. Por isso,
termino este artigo prometendo retomar os dados da mesma pesquisa para analisar a atividade dos
animadores e animadoras em suas próprias comunidades e citando uma animadora de CEB da região de
Belo-Horizonte: "a força da comunidade está na oração, que é o alimento da alma. Quando a gente se
reúne para rezar, sempre aparece alguma atividade para fazer junto com o povo do lugar". Ela queria
dizer que quando não se reza sozinho, nem para si mesmo, mas refletindo em grupo sobre a Palavra de
Deus, a comunidade é necessariamente convocada a uma prática social e política libertadora.

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