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A Sífilis: O fato da grande miscigenação que ocorreu no Brasil desde o início da sua
colonização, acabou por favorecer a proliferação da sífilis, tendo em vista que essa
doença foi trazida pelos primeiros europeus que atracando no Brasil logo se misturaram
com a população indígena, e junto a eles, a sífilis. Ela esteve tão presente na vida
cotidiana colonial que era aceita normalmente pela sociedade, chegando ao ponto de
que ''o brasileiro a ostentava como quem ostentasse uma ferida de guerra'' (Martius apud
Freyre, 2006, p. 109).
Neste capítulo Freyre quis concluir que através do levantamento histórico, cultural,
entre outros do período colonial, foi possível ter um entendimento da construção do
Brasil como nação, e que este se deu por bases de antagonismos, como bem expressa
Basile (2006), ''que a formação brasileira tem sido um processo de equilíbrio de
antagonismos. Para compreendermos o hoje é necessário entendermos o ontem''.
Escrita de uma forma que nos lembra a leitura de um romance, fato este que ajuda na
própria leitura do capítulo e com certeza do livro como todo. Apenas encontro duas
ressalvas na leitura do capítulo: a primeira é a necessidade de sempre recorrer ao
dicionário durante a leitura do capítulo, pois devido o livro ter sido escrito na década de
30 do século passado há um grande número de palavras pouco utilizadas atualmente o
que acaba atrasando a leitura e o segundo é o fato de que Gilberto Freyre ao querer
recriar a vida colonial de forma tão detalhada, o mesmo acaba por repetir algumas
afirmações já expostas. Más tais observações em nada diminui a importância e o grande
valor desta obra, que foi um marco para várias áreas como a história, sociologia,
antropologia entre outras. E que é de fundamental importância a sua leitura, tanto por
leigos quanto por intelectuais, principalmente em todas as instituições de ensino.
O paulista Caio Prado Júnior (1907 – 1990), foi um militante político marxista, sendo
filado ao Partido Comunista Brasileiro – PCB – e por sua posição e militância foi preso,
perseguido e exilado pela ditadura do Estado novo, nos anos 30 e também pela Ditadura
Militar nos anos 60 – após lançar A Revolução brasileira em 1966, e conceder uma
entrevista, em 1967, criticando a luta armada - tendo também cassado o seu título de
Livre Docente pela faculdade de Direito da USP.
Geógrafo, formado em direito, é na História que Caio Prado finca toda sua obra
literária, iniciada com Evolução Política do Brasil de 1933 e que teve em Formação do
Brasil Contemporâneo, de 1942, um clássico, segundo definiu Florestan Fernandes, e
obra de referência para toda uma geração de historiadores, sociólogos e acadêmicos.
O negro aparece com um ser boçal, uniformizado pela escravidão, um braço sem cultura
e sem vontade própria, do qual o colonizador serviu-se de sua força e do forte apelo
sexual de suas mulheres e rejeita a tese que a escravidão foi “(...) um molde comum que
os identificou.” (p. 81).
Ao falar do índio, é dito que “(...) o índio foi o problema mais complexo que a
colonização teve de enfrentar”. (p. 86). O colonizador objetivava retirá-lo da selva e
oferecê- lo uma vida cristã em troca de sua escravidão, situação amenizada pelas
missões jesuítas que mereceram um destaque no livro, além da Legislação Pombalina.
A miscigenação e a mestiçagem do povo brasileiro era feita mais branco/negro e
negro/branco, no livro não se descreve com a mesma ênfase a relação branco/índio e em
escala inferior negro/índio. Há também a escassez de mulheres brancas e também a sua
falada “frieza”.
Nesta primeira parte do livro somos apresentados a um grande diferencial entre Caio e
outros autores que trataram do mesmo tema. Caio analisa mais profundamente as
correntes de povoamento, levando em conta suas diferenças regionais e culturais , não
generalizando, transformando em uma massa uniforme.
Ao falar sobre “Vida Material”, Caio dá uma ênfase à economia colonial, que tem na
agricultura seu mais forte expoente, seguida da mineração e em escala menor a
pecuária. Predominava a monocultura, trabalhada por escravos, era uma agricultura de
coivara, descrita como uma continuação da agricultura indígena, com imenso
desmatamento e totalmente extrativista, sem preocupação em trabalhar o solo e sim
esgotá-lo e abandoná-lo em prol de outro ainda virgem.
A lavoura determinou toda organização social e econômica através da “(...) disposição
das classes e categorias de sua população, o estatuto particular de cada uma e dos
indivíduos que as compõem.” (p. 142). Havia a agricultura de exportação com forte
trabalho escravo e a agricultura de subsistência trabalhada pelo próprio lavrador,
modesto e mesquinho.
Os produtos mais cultivados eram o algodão, a cana de açúcar e o tabaco que “(...)
constituem os fundamentos da agricultura colonial.” (p. 151). Em escala menor era
cultivado o cacau, o arroz e o anil, que é descrito como uma esperança frustrada, pois
não era competitivo perante o anil indiano.
A mineração - a mais conhecida pelo senso comum, através do ouro das Minas Gerais -
é descrita sob a forma de uma indústria mineradora que esgotava os recursos minerais
da colônia e enviava quase toda sua produção para fora do país e (...) deixou to poucos
vestígios, a não ser a prodigiosa destruição dos recursos naturais que semeou pelos
distritos mineradores, e que ainda hoje fere a vista do observador (...)” (p. 173)
A pecuária é analisada sob as particularidades regionais, nos estados do sul era mais
avançada, devido ao domínio espanhol na pecuária da região, outro grande centro foi
Minas Gerais e havia o contrabando interno de bestas, muito úteis na lavoura e no
transporte da produção.
A região amazônica tem seu destaque na cultura extrativista principalmente pela
extração madeireira, além da extração do sal e da caça à baleia – também realizadas em
outras regiões e encerra falando de atividades ligadas as artes e a indústria, onde se
destacam o artesanato, com sua cerâmica e a indústria incipiente e de pouca expressão.
O comércio é analisado através de sua estrutura fincada na base colonial de produção de
gêneros tropicais e matais preciosos para um comércio exterior – feito essencialmente
por via marítima – e o pequeno comércio interno, onde “o contrabando era mais fácil e
proveitoso.” (p.237)
As vias de comunicação e transporte são dissecadas em sua particularidades e
dificuldades. No transporte terrestre, a precariedade de estradas, onde há o predomínio
de matas fechadas, e o transporte fluvial e suas dificuldades diversas, como o grande
número de pedras e quedas em nossos rios e as correntes marítimas que dificultavam a
navegação de cabotagem.
Das três partes em que está calcada a obra, é essa que merece maior atenção e esmero
por parte do autor que traz uma farta e pormenorizada informação sobre a economia
colonial.
Ao falar sobre a “Vida Social”, é deixado claro que a mola mestra pra o funcionamento
da sociedade colonial foi a mão de obra escrava e no início deste capítulo é feito um
paralelo entre a escravidão empregada no Brasil Colônia e a escravidão antiga.
Surge assim um corpo estranho que se insinua na estrutura da civilização ocidental, em
que já não cabia. E vem contrariar-lhe todos os padrões morais e materiais
estabelecidos. Traz uma revolução, mas nada prepara. (...) Nada mais particular,
mesquinho e unilateral. (P. 278)
Caio Prado com essa observação atenua um pouco o discurso racista que usa contra o
escravo negro, que é citado em toda a sua obra e cita que a religião católica, mesclou-se
com rituais e crenças africanas. Mesmo assim mais a frente Caio volta com seu discurso
racista dizendo: “A contribuição do escravo preto ou índio para a formação brasileira é
além daquela energia motriz quase nula.” (p. 280)
A organização social estava centrada na figura da “família patriarcal” – como também
defendeu Sérgio Buarque de Holanda em seu Raízes do Brasil - as cidades tinham uma
hierarquia e organização social herdada dos grandes engenhos. Tudo gravita em torno
da sociedade patriarcal, católica e escravocrata.
Caio neste em que usa várias páginas para discorrer sobre a escravidão, cita também ao
preconceito do colonizador, que não aceitava seus descendentes realizando “trabalhos
mecânicos” que eram destinados a negros ou a libertos, que eram enxergados sob a
mesma ótica.
É citada uma pequena massa de profissionais liberais e é descrita a classe dos vadios,
que sem ocupação oficial, tendem a enveredar pelo crime e praticar desordem.
Habitavam as vilas assim como as prostitutas.
Aqui Caio cunha o conceito de orgânico – no qual insere a família patriarcal e a total
mão de obra escrava. E o inorgânico – formado por essa população livre que praticava a
agricultura de subsistência e pelos “vadios”.
Além da família patriarcal uma segunda esfera de poder na colônia era a igreja, com
seus laços estreitos na família patriarcal, constitui uma base econômica sólida e
centralizada na colônia.
Formação do Brasil Contemporâneo: Colônia, é uma obra para ser lida e relida, devido a
grande gama de informações nela contidas e que com sua riqueza de detalhes vem
elucidar e desfazer algumas coisas que ficaram como “senso comum” e enraizadas no
inconsciente popular causando visões distorcidas e juízos de valor errôneos sobre as
relações colônia/metrópole, principalmente sob seu viés econômico.
Caio Prado coloca-se assim como uma grande referência – assim como seus
contemporâneos Gilberto Freyre e Sérgio Buarque de Holanda - e leitura obrigatória a
quem quiser entender mais sobre a formação e a organização que originou o que
vivemos hoje.
Com seu olhar materialista Caio nos dá uma excelente fonte de recursos diversos, onde
bebemos e outra gerações beberão, pois é uma obra que perpassa as gerações e com seus
críticos e admi5radores vai atravessando o tempo.
Os ibéricos são conceituados por Sérgio Buarque como aventureiros, ou seja, aquele
que pensa diretamente no objetivo final, busca novas experiências e a mira de seu
esforço tem tanta relevância capital que chega a dispensar os processos intermediários
para chegar ao ponto final. Quer ganhar dinheiro fácil.
Ao contrário do trabalhador – que estima a segurança e o esforço, que enxerga primeiro
o obstáculo a vencer e aceita compensações em longo prazo – o português chegou ao
Brasil graças a seu espírito aventureiro. E aqui permaneceu graças a sua grande
capacidade de adaptação.
Unindo sua forte adaptabilidade e a não disposição para trabalho braçal junto à fidalguia
trazida de sua terra, o português instaurou no Brasil a lavoura de cana como ocupação
da terra e dinheiro fácil unida ao trabalho escravo que resolvia, de maneira lucrativa, a
não disposição ao trabalho, mas sim à senhoria. Antônio Cândido ainda completa:
“A lavoura de cana seria, nesse sentido, uma forma de ocupação aventureira do espaço,
não correspondendo a „uma civilização tipicamente agrícola‟ (pág. 18), mas a uma
adaptação antes primitiva ao meio, revelando baixa capacidade técnica e docilidade às
condições naturais” (p. XVI).
A vida rural foi um marco muito forte na formação da sociedade brasileira. A estrutura
de nossa sociedade colonial era rural, já que quem detinha o poder na época colonial
eram os senhores rurais.
Em 1850 instaura-se a lei Eusébio proibindo o tráfico de escravos. Entre 1851 e 1855 há
notável crescimento urbano por causa das construções das estradas de ferro. O
progresso chegando, o café como nova fonte de capital e os filhos de fazendeiros sendo
mandados para nas cidades estudarem. Dessa classe rica e intelectual veio um progresso
social que demoliu suas próprias bases: a escravidão. A partir daí, os capitais ociosos do
tráfico foram para as cidades, para investimentos e especulações.
Aqui nessa época Sérgio Buarque enfoca a enorme incompatibilidade entre o mundo
tradicional e o moderno, entre rural e urbano. O Brasil não tinha estrutura econômica,
política e social para desenvolver a indústria e o comércio. Os homens do campo que
migravam para a cidade eram os mais importantes, os colonos que diziam que o
trabalho físico não dignificava o homem, mas sim o intelectual. Dessa forma, é possível
imaginar as dificuldades que chegaram com a Revolução Industrial, onde o homem vira
máquina.
Assim, a vida na cidade se desenvolveu de forma desorganizada e prematura, o que nos
leva ao capítulo seguinte: o estudo da importância da cidade como instrumento de
dominação e como ela foi fundada nesse sentido.
Aqui Sérgio Buarque prende-se um pouco nas colonizações portuguesa e espanhola,
identificando-os como semeador e ladrilhador. O ladrilhador seria o espanhol que
coloniza parte da América construindo cidades planejadas, com a intenção de
estabelecer um prolongamento estável na Metrópole. Suas cidades eram construídas nas
regiões internas do continente tomando conta, assim, de toda cultura local.
Os portugueses, semeadores, agarraram-se ao litoral semeando cidades irregulares, sem
ordem e sem objetivos fortes de dominar a cultura do local, norteados por uma política
de feitoria, querendo fortuna rápida para tornarem-se nobres.
A urbanização no Brasil, irregular que foi, criou um desequilíbrio social. O peso da
família tradicional dificultou a formação da sociedade urbana moderna.
No Brasil, círculo familiar e família patriarcal, muitas vezes são confundidos com
Estado. Sérgio Buarque afirma e reafirma que são completamente diferentes, explicando
que um comportamento pessoal e familiar não funciona numa burocracia democrática,
pois um é individual e o outro é coletivo, um é privado e o outro é público.
“O Estado não é uma ampliação do círculo familiar e, ainda menos, uma integração de
certos agrupamentos, de certas vontades particularistas, de que a família é o melhor
exemplo. (…) Há nesse fato um triunfo do geral sobre o particular, do intelectual sobre
o material, do abstrato sobre o corpóreo e não uma depuração sucessiva” (p. 101).