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Belo Horizonte
Escola Superior Dom Helder Câmara
2007
JUAREZ DE JESUS SILVA
Belo Horizonte
Escola Superior Dom Helder Câmara
2007
JUAREZ DE JESUS SILVA
Belo Horizonte
Escola Superior Dom Helder Câmara
2007
AGRADECIMENTOS
Esta monografia trata da saúde mental em uma instituição militar. Ela se baseia
no estudo de caso de um policial militar, com um longo histórico de problemas
na sua atuação profissional. Baseado no Método Biográfico, proposto por Louis
Le Guillant, o autor realiza um estudo da trajetória desse policial, tentando
identificar e compreender os efeitos negativos da organização do trabalho na
sua saúde mental, bem como as medidas suscetíveis de minimizar tais efeitos,
permitindo uma melhor adequação homem/trabalho.
Portanto, o caso clínico que será apresentado a seguir, pode ser visto apenas
como o histórico biográfico de um Policial Militar, com 48 anos de idade e 29
anos de serviço prestados à PMMG. No entanto, se o analisarmos com
atenção, veremos que ele permite conhecer outros caminhos e aponta para
melhores maneiras de organizar o trabalho e gerenciar a vida profissional das
pessoas.
O Caso Paulo1 pode não ser mais um desafio para os estudiosos do autor
acima mencionado. O desafio agora é mostrar a outros teóricos da Psicologia e
da Psicopatologia do Trabalho, que as relações de trabalho podem interferir
positiva ou negativamente nos processos psíquicos.
2.1 A Infância
Quando criança, Paulo recebia muito carinho de sua mãe, mas por parte do pai
era muita rigidez e agressividade; apanhava do pai e foi educado em um
ambiente de família tradicional, tendo como referencial de família seus avós,
seus tios, pai, mãe e irmãos. Sua formação religiosa é Católica Apostólica
Romana e tem como referência moral e ética, seus pais e avós. Ele diz:
“são princípios básicos que meu pai me mostrou. É tanto que meu
pai, quanto minha mãe, minha avó era beata da Igreja Pompéia
ali, oh, dia de Santo Antônio eles faziam as festas lá e tal. Eu fui
criado na Igreja Católica.”
Após esse acidente, seus colegas de infância não brincavam com ele,
rejeitando-o por causa das seqüelas da queimadura. Fez o tratamento de pele
à base de azeite de dendê, mas, segundo ele, ficou sem amigos por algum
tempo.
“... eu fiquei um bom tempo, sem colega que ninguém queria
brincar comigo...”.
Apesar de tudo, sente-se bem ao pensar que aquele ato foi para socorrer sua
mãe.
Paulo começou a trabalhar muito cedo, aos 12 anos. Segundo sua mãe, desde
pequeno gostava de trabalhar e contribuir, dando-lhe alguns trocados:
Ele trabalhou cedo; ele gostava muito de trabalhar; ele vendia
cachorro-quente, picolé, uma porção de coisinha, que ele gostava
de fazer. Ele vendia, mas tinha o prazer de chegar e tirar um
pouquinho do trocado e me dar.
Quando recebia o dinheiro, dividia com a mãe, mesmo que o pai não
permitisse.
Paulo sonhava em entrar para a polícia. Sua mãe, diz que essa era sua
“doença”, devido ao avô ser da Polícia Militar.
Ah, rapaz era a doença dele. Queria entrar para a polícia, porque
meu pai era polícia!
Quando criança, ele guardou o retrato de seu avô materno, vestido de farda da
Polícia Militar. Seu desejo era o de defender a sociedade como fizeram seu avô
e seu pai:
“Quando eu comecei a entender que aquela pessoa que era meu
avô, que era polícia, não tive oportunidade de ver o trabalho dele,
porque eu era criança e quando eu comecei a apegar com meu
avô, ele faleceu. Então, eu via mais meu pai né, fardado. Via
aquela polícia, então eu pensei, né. Aí, eu vou ser um defensor da
sociedade”.
Mas diz que sempre foi obediente e respeitou muito a seus pais, o que
permanece até hoje. O pai confirma isso, dizendo:
“Que Paulo cresceu, mas nunca respondeu aos pais e que, até
hoje, acata e obedece”.
2.2 A Juventude
Mas como descobriram que ele tinha outro irmão que trabalhava no Jumbo,
teve de sair do emprego, porque não podia ter parente, na mesma empresa.
Após sair do Jumbo, Paulo trabalhou em diversos lugares: foi trocador de
ônibus, pela empresa Santa Inês. Trabalhou, também, como vendedor de
cachorro-quente no Xodó. Fez curso de vigilante ainda jovem. Ele gostava de
trabalhar, passear, ir ao cinema, coisas normais de jovens. Ele diz:
“Antes, minha vida era trabalhar, passear ir ao cinema, coisa de
jovem, normal. Naquela época de vigilância, eu viajava muito”.
Aos 18 anos, alistou-se para servir no Exército Brasileiro, mas foi classificado
como insuficiente físico temporário para o serviço Militar.
“No Exército me pôs com insuficiência física temporária para o
serviço militar”.
2.4 O Namoro
Nesse dia, Paulo foi embora, porque achou que a futura esposa dava mais
atenção para um colega, que os acompanhava, mas no outro dia, domingo à
tarde, foram ao cinema e lá, começaram a namorar.
2.5 O Casamento
Com essa esposa, eles tiveram muitos problemas, tantos que o levaram a
separação.
Ele é pai de quatro filhos, sendo três homens e uma mulher. P. A., foi o
primeiro filho e nasceu em janeiro de 1982. Em 1985, nasceu M. Em 1988,
estava em processo de separação da esposa, quando conheceu M. Os dois
namoraram e ela engravidou. A ex-esposa ficou sabendo e decidiu
reconquistá-lo. Nessa nova tentativa, ela também engravidou. Em julho de
1989, nasceu o seu terceiro filho, R., mas desta vez, com a namorada, seis
meses depois, em janeiro de 1990, nasceu F., seu quarto filho, mas o terceiro
com a esposa.
Depois do nascimento dos filhos, Paulo decidiu continuar apenas com primeira
mulher. Novamente, vieram as incompreensões, as brigas e as solicitações de
intervenções policiais para solucionar os problemas que tinha, sobretudo com a
esposa. Apesar de tudo isso, Paulo procurava não deixar a sua vida particular
interferir na sua vida profissional. Ele diz:
“Ela é uma pessoa muito difícil e eu comecei a ter problema. Ela
brigar comigo e eu ficar desorientado... eu nunca misturei uma
coisa com a outra”.
A situação emocional de Paulo chegou a tal ponto, que ele perdeu totalmente o
equilíbrio, adotando atitudes violentas e, até certo ponto, perigosas tais como a
intenção de atear fogo em sua casa e até arremessar objetos pela janela e
quebrar tudo dentro de casa, à exceção das camas de seus filhos, conforme
sua própria narrativa:
“Teve uma vez que eu quebrei tudo dentro de casa. Eu destruí
tudo; eu pegava a televisão 20 polegadas igual está ali, e jogava
pela janela, quebrava tudo. Eu destruí a casa toda. Eu só não
destruí as camas dos meus filhos, mas eu joguei álcool dentro da
casa e queria pôr fogo na casa”.
Ele pensou até mesmo em matar sua esposa e suicidar-se, tendo havido
momentos de intervenções policiais:
“Pus o revólver na cabeça dela duas vezes para matar ela, Deus
que não deixou. Pus revólver na minha cabeça para me matar,
cheguei no limite”.
Paulo foi transferido para o 16º BPM, ocasião em que recebeu a fama de
policial “pegador de ladrão”. Casos como o descrito acima, foram muitos, sendo
que ele fazia jus ao apelido.
“E foi muita gente que eu prendi”.
Ele se sentiu apoiado por alguns comandantes, mas como não conheciam sua
história de vida profissional e particular, não compreendiam que estava doente,
necessitando tratamento.
“Então, tinha um coronel M. Ele foi comandante de papai,
conhecia papai, não é que ele passou a mão na minha cabeça,
ele me ajudou. O coronel C. também, era o carrasco, eles falavam
que ele era o carrasco, também me deu a mão mais assim, igual,
por exemplo, ele não me prejudicou e nem me ajudou, tipo assim:
‘é ordem que eu estou te dando, você vai no médico’. Cê
entendeu? Eles apoiavam, mas não dava aquele suporte”.
Paulo relata que teve uma época, ocasião das internações, que não se
lembrava das coisas que aconteciam. Ele acordava no hospital e não entendia
porque estava ali:
“Às vezes, eu acordava amarrado na cama, que o sossega leão
não fazia efeito, eu amarrado na cama, eu falava assim: ‘gente o
que, que estou fazendo aqui?’ ‘Onde que estou aqui agora?’”.
Em 1988, Paulo foi excluído da PMMG, por pequenas faltas disciplinares, mas
no mesmo Boletim Interno que publicou sua exclusão, o comandante a
revogou. Na ocasião, a Polícia Militar estava passando por uma evasão de
efetivo, então, algumas exclusões estavam sendo revogadas por força da
necessidade de policiais. Paulo não se recorda nem mesmo porque foi
excluído. Sabe apenas que o comandante revogou sua exclusão por ser um
bom policial e pelos bons serviços prestados.
“Sei que em 88 eu fui excluído da PM. Eu não sei nem porque fui
excluído da PM. Eu sei que é coisa boba, eu nem lembro
Comandante pôs no Boletim lá que: revogo a exclusão do
Soldado Paulo pelos bons serviços prestados pela Corporação”.
O 22º Batalhão de Polícia foi fundado 1992, no bairro Santa Lúcia. Recebeu o
nome de Batalhão Favela, pela tropa, porque se localiza em um dos maiores
aglomerados urbanos da época, sendo destinados para servir nesta Unidade
Operacional, todos aqueles policiais que tinham um histórico disciplinar não
muito positivo.
Ele considera que a segunda esposa, foi uma pessoa que lhe deu muito auxílio
para organizar sua vida, Além disso, refere-se as suas dificuldades, mas
sempre ressaltando o fato de não ter deixado de ser honesto:
“Caindo e levantando, mas graças a Deus, igual eu falo: não tirei
um nada de ninguém, isso aí eu morro satisfeito. Deus sabe disso
aí, sempre fui honesto nesta vida, sempre fui honesto, a vida
inteira de polícia, desde quando eu entrei, quando eu comecei a
ser gente”.
Ele foi procurar ajuda na Igreja Evangélica, onde foi ouvido e aceito.
“Aí, eu peguei e comecei a freqüentar a Igreja Batista da
Lagoinha, e um dia eu estava lá na Igreja, uma das primeira vezes
que fui freqüentar, aí, pedi a Deus, falei: meu Deus, num tô
agüentando mais. Ali, eu chorava e chorava, eu quero uma
resposta, o Senhor sabe da minha agonia; o Senhor sabe o que
eu estou passando.
Uma semana depois, veio a resposta. Papai ligou pra mim,
Nossa, você ganhou na primeira instância e tal. Eles vão até te
reformar. Aí, eu comecei a animar. Aí, a minha vida já começou a
melhorar, tive aquela injeção de ânimo.”
Ele passou a acreditar que tudo na vida tem um sentido e que tudo que
aconteceu no período de exclusão foi para leva-lo a refletir sobre sua vida.
“Esses anos que eu fiquei de 96 a 99, eu refleti muito sobre muita
coisa na minha vida, acontece que nesse intervalo, em pensei
muito na minha vida sobre muitas coisas que eu fiz, aí, eu caí
numa coisa. Deus tá me dando um tempo para refletir. De
repente, se eu tivesse na PM ainda, eu tinha, ou talvez eu tinha
morrido ou talvez eu tinha matado”.
Paulo, mesmo excluído das fileiras da Polícia Militar, ainda colaborava com
seus ex-colegas de farda, efetuando prisões de cidadãos infratores.
“Eu ainda ajudava muito a PM ainda, porque eu prendia muito
vagabundo aí na rua. Pegava e entregava prôs polícia”.
Muitas vezes, sentia-se injustiçado, porque alguns colegas não lhe davam
atenção, virando as costas para o ex-soldado Paulo.
“E, muitas das vezes, o próprio colega meu, hoje, na época,
virava as costas pra mim. Quer dizer: ao excluído aí; ao excluído
aí, né? Às vezes, você queria conversar com o cara, queria que o
cara te cumprimentasse. O cara te via e virava as costas, com
coisa assim: não é ninguém mais, né?”.
2.12 A Reinclusão
O comandante do CAP perguntou para Paulo, onde ele queria trabalhar, tendo
como resposta que ele queria voltar para o 16º BPM. No Comando do Batalhão
estava o Tenente Coronel H. Sem passar por qualquer qualificação ou
atualização profissional, Paulo foi designado para trabalhar na 20ª Cia., para
atuar no serviço operacional.
O que mais o deixava inconformado é que, cada dia, era escalado para um
local e horários diferentes.
“O que me deixava chateado é que cada dia eu estava num
lugar. Eu queria trabalhar num lugar certo. Eu adoro trabalhar de
viatura. Sinceramente, eu gosto demais de viatura”.
2
Chefe da Seção de Identificação do Departamento de Pessoal da PMMG
Ele recebeu a sugestão de solicitar e reformar, ou seja, de que saísse do
serviço ativo, mas resistiu.
“Queria que eu reformasse, mandaram reformar o você, quer
dizer as pessoas ficam questionando a vida da gente, ao invés de
dizer assim: ‘que bom que você voltou e tal, vamos trabalhar, vê
se muda um pouco.’ E, por outro lado, vou falar para o senhor um
negócio, na verdade, na verdade, a vontade de Deus é tremenda.”
Paulo não estava mais suportando a pressão de seus administradores, por não
lhe dar oportunidade, sequer de expor seus problemas. Por outro lado, já
vigorava a Lei nº 14.210, de 19 de junho de 2002, que dispõe sobre o Código
de Ética e Disciplina dos Militares do Estado de Minas Gerais (CEDM), que não
era tão rigoroso quanto o Regulamento Disciplinar da Policial Militar (RDPM),
que não lhe propiciava o direito de defesa e no qual, as punições eram
baseadas no cerceio da liberdade, como prisões, detenções, reclusões e
exclusões. O Contraditório e a Ampla Defesa já eram preconizados no Código
de Ética, entretanto, não observados para o seu caso. Seu comandante parecia
não estar interessado em ouvi-lo e conhecê-lo
“Ouvia nada, ficava querendo ferrar a gente. Voltei, já era Código
de Ética, aí você já tinha uma força maior, que antigamente,
quando era RDPM eu deixei muita coisa passar, era direito que eu
tinha e não corria atrás, coisa que tava me prejudicando e eu
nunca corri atrás, eu podia tomar atitude contra determinadas
pessoas eu não tomava”.
Mas como Paulo sempre foi um policial destemido, sem medo, de muita
coragem e com boa vontade para trabalhar, às vezes, extrapolava nos
atendimentos de Ocorrências Policiais, abordando cidadãos em atitude
suspeita e colocando em risco sua própria vida. Em uma abordagem policial,
ele sozinho abordou oito indivíduos suspeitos, causando preocupação ao
comandante do policiamento da companhia que estava de serviço no momento
e levou o fato ao conhecimento do comando do Batalhão.
“O Coronel G, foi o cara que mais me apoiou na Polícia Militar, o
cara que mais me deu apoio. Vê como é as coisas. Eu tava
trabalhando de moto e teve um dia, que lançaram 8 suspeitos,
T01000 (Código de Ocorrência de Indivíduo Suspeito), lá no
bairro Floresta. Nesse dia o Sub Ten. A. estava de CPCia,
(Comandante de Policiamento da Companhia). Aí, eu cheguei e
fiquei monitorando os caras. Quando eu vi que os caras estavam
indo embora e não chegava ninguém, eu fui e abordei os caras.
Aí, depois chegou a viatura do Sub Ten. A. e outras viaturas”.
Na 23ª Cia PM, sob o Comando do Maj N., Paulo foi trabalhar na área
operacional, no atendimento de Ocorrências Policiais. Ele acreditava que o
Sargenteante da 23ª Cia, por ter trabalhado junto com ele e, pelo tempo de
serviço prestado, poderia ter algum tipo de consideração para com ele, mesmo
porque já era Cabo e poderia estar sendo escalando nos postos de
policiamento onde gostava de trabalhar e melhor lhe atendia.
“Aí, cheguei na 23, era o Sub M., e como nós trabalhamos juntos
como soldado, e pelo tempo de policia que tenho, eu achei que
ele ia ter um pouco de consideração comigo. Antiguidade, então,
eu não estava sentindo isso”.
Ele teve vontade de sair da companhia porque, como já disse, via outros
militares mais recentemente incorporados à PM, em serviços que ele gostava
muito de fazer, como motorista de Rádio Patrulha, sendo que e ele estava, em
cada dia em um horário e local diferentes. Tudo isso o incomodava:
“Eu senti com o Sub M., eu pelejei para sair da Companhia, e já
queria sair da Companhia, porque eu não tinha horário. Eu vejo
gente mais novo que eu, fazendo serviço que eu gosto.”
“Aquilo foi me irritando, eu já tava em tempo de perder a
paciência.”
Assim, ficou inconformado quando chegou para o trabalho, para o qual estava
escalado. Recusava-se a conversar, manifestando muito nervosismo,
gesticulando muito, gritando palavrões e dizendo que iria falar com o
Comandante do Policiamento da Capital, com o Comando Geral da Polícia,
mas não queria mais conversa com a Administração da Companhia. Foi
quando o Sargenteante chamou-o para uma conversa. De inicio ele não
acreditou, mas percebeu que havia realmente disposição para conversar da
parte do seu superior.
“Quando o senhor me deu a xícara de café, eu falei assim: ‘uai,
seu Sub tá querendo é conversar mesmo, vamos conversar’”.
O bairro Santa Inês foi indicado por ser um bairro com o índice de criminalidade
elevado.
Hoje, ele está tentando reconstruir sua vida familiar, aproximando-se dos filhos
e dos pais. Está com uma nova namorada e tenta reestruturar e construir uma
nova família.
“Feliz!!! E tô feliz com minha família também que meus filhos já tá
criados, já tá independente, é trabalhando né? Meu, é tipo assim,
eu tô melhor com minha família, não brigo mais. Se a mulher
brigar lá, encher o saco, eu não tô nem aí pra ela. O senhor sabe
por causa de que, se ela briga comigo lá, eu tenho meu refugio
com meu trabalho, o senhor está entendendo?”
“Estou bem hoje, se minha mulher ficar nervosa lá, eu saio, venho
trabalhar. Aí, eu fico tranqüilo aqui depois eu volto e a gente
conversa, né?”
“Igual eu falo, eu penso, o pessoal fala assim. Ah, que praça ser
amigo de oficiais, não existe isso não. E aquele negócio, oh, eu
passo perto do senhor e só faço a continência e vai embora, o
senhor entendeu? O senhor nunca vai me conhecer, mas se eu
passo perto do senhor, e falo: ‘o seu sub como vai o senhor, tá
tranqüilo?’ Como vai, a família do senhor tá tranqüila? E tal, dá
licença, entendeu, a continência”.
Está previsto para Paulo passar para o serviço inativo, em 24 de julho de 2008,
vide ficha de instrução de contagem previa de tempo de serviço, anexo IX. Ele
pensa em sair da instituição com reconhecimento e dignidade, pois ao passar
para inatividade receberá promoção imediata de 3º Sargento. Isso é tudo o que
sonhou em toda sua vida profissional e espera da Polícia Militar do Estado de
Minas Gerais. Ele diz:
Ter minha família, emprego, ter meus amigos, sair com dignidade.
Aliás, que eu sempre tive, né? Honestidade, dignidade, eu falo
assim: ‘Deus tarda, mas não falta’, não é que Deus tarda não.
Tudo no seu tempo certo. É igual eu falei para o senhor, eu acho
que estes três anos foi para mim refletir e muitas coisas que eu
fazia antes, que era subir numa favela sozinho, e hoje com a
mudança né,
Deus falou, eu acredito que ele falou: deixa eu barrar este filho
meu aqui, que ele está muito afoito. Tinha sargento que não
queria trabalhar comigo, eu parava a viatura, o cara corria, eu
nem pedia cobertura, nada, saía correndo atrás, pelo beco afora,
tal e coisa, em tempo de tomar um tiro”.
3. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A razão que nos levou à realização deste trabalho foi a percepção dos
problemas na atuação dos policiais militares, no local do atendimento de
ocorrências, levando-os, muitas vezes, a se descontrolar emocionalmente, o
que dificulta a resolução dos conflitos.
Na realidade, não foi preciso muito trabalho, apenas ouvir o que ele tinha a
dizer e de posse das informações, identificar algumas possibilidades mais
próximas do que almejava e, ao mesmo tempo, estava preparado para realizar.
Nos seus relatos ele deixa claro que, muitas vezes, não foi ouvido, dando a
entender que a rigidez hierárquica e disciplinar pode ter contribuído para o seu
adoecimento. Suas internações ocorreram no período compreendido entre
1992 e 1996, época em que esteve sob o comando de maior rigidez disciplinar,
o que reforça nossa hipótese. Portanto, ainda que seus problemas conjugais
tenham exercido um papel fundamental nos seus transtornos, não podemos
negligenciar a influência do trabalho, cuja rigidez, provavelmente, contribuiu
para o seu agravamento. Vale a pena retomar um trecho do seu depoimento:
“Ouvia nada, ficava querendo ferrar a gente. Voltei, já era Código
de Ética, aí, você já tinha uma força maior, que antigamente,
quando era RDPM eu deixei muita coisa passar, era direito que eu
tinha e não corria atrás, coisa que tava me prejudicando e eu
nunca corri atrás, eu podia tomar atitude contra determinadas
pessoas eu não tomava”.
6. MINAS GERAIS, Lei estadual n.º 14.310, de 19Jun02, que dispõe sobre o
Código de Ética e Disciplina Militares do Estado de Minas Gerais (CEDM).
IV – Ato de exclusão
V – Fichas médicas.
VI – Atestado de Origem