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significativo conteúdo sócio-econômico consiste, de igual sorte, no foco deste estudo, mais
precisamente sua forma contratual de transferência. A tecnologia, como vetor do
desenvolvimento e concebida como propriedade, pode ser transmitida a outro agente econômico
para que este a aplique e aufira as benesses a ela inerentes. Diante desta relevância analisa-se
aqui seu desenho, sua forma de transmissão, sob a égide da ciência jurídica, que tutela a
utilização do know how inserindo-o no sistema jurídico moderno de terceira geração. Diferencia-
se ainda o contrato de transferência de tecnologia, da licença e da prestação de serviços,
inclusive elucidando sobre o tratamento auferido no âmbito da OMC.
1. Introdução
O comércio tradicionalmente constituiu da troca de átomos, onde, o produto era despachado por
via marítima, consistindo, não raro, em uma massa volumosa, pesada e inerte, navegando por
milhares de quilômetros, a um alto custo por muitos dias. Ao passar pela alfândega declara-se os
átomos, ou seja, o produto material, e não os bits ou conhecimento, o bem imaterial. O desenho
hodierno do comércio mudou, a movimentação regular passa a ser de forma instantânea, os bens
passam a ser bits, o conhecimento passa a ter valor econômico, passível de ser transferível.
Assim, propõe-se aqui demonstrar a leitura jurídica dada ao Know how, à tecnologia,
elucidando seus conceitos e natureza jurídica, para que então verifique-se quais são as formas e
procedimentos adequados para que viabilize sua transferência. Informando ainda, a que
categoria, em uma visão sistêmica, encontra-se ligado o contrato de transferência jurídica, vez
que, uma das características próprias das relações internacionais hodiernas consiste no intenso
fluxo de capital, de forma transnacional. Destarte, a transferência de tecnologia não cria uma
dinâmica de desenvolvimento econômico senão quando contribui para um desenvolvimento que
corresponda às necessidades do país importador e às mentalidades locais.
De maneira geral, a informação, como tal, é um bem tutelado pelo Direito, ou seja, algo
que potencialmente será objeto de direitos e obrigações, os quais, por sua vez, serão objeto de
proteção jurídica. Tal proteção será conferida desde que haja um legítimo interesse, moral ou
econômico, na preservação, no uso (exclusivo ou não), na divulgação (exclusiva ou não) da tal
informação.
Já de início se percebe que, segundo tal perspectiva, tecnologia (1) é algo intrínseco à
atividade empresarial, o fator cognitivo da produção da empresa. Não se trata, pelo menos
diretamente, de um bem intelectual comunitário, ou nacional, que vise o bem do homem ou o
progresso dos povos, a não ser na medida em que a empresa é considerada como o meio ótimo
de alcançar tais objetivos.
A tecnologia surge no mundo econômico de várias maneiras diversas. Ela pode ser parte
de segredo comercial de uma empresa; surgirá como "informação confidencial" quando
transmitida sob reserva de circulação; será livremente divulgada mas sem terá sua utilização
restrita, se patenteada; será prestada sem nenhuma reserva, seja de divulgação, seja de utilização
no caso de serviços técnicos como o de projeto, de consultoria etc.
Desta feita, tem-se que o segredo comercial consiste no conjunto das informações
escassas, de caráter financeiro, econômico, comercial ou tecnológico, que permitem à empresa
que as detém uma posição privilegiada. Enquanto afetado à exploração de uma certa empresa,
este segredo é parte do fundo de comércio, e, como tal, um ativo não contabilizável, embora
apreciável economicamente quando a empresa, como um todo, ou parte dela, se transforma em
bem de troca (2).
A informação confidencial, que pode ser igualmente de caráter financeiro comercial etc.
inclusive tecnológico, é parte de um segredo comercial transmitido, sob reserva de divulgação,
de alguma vantagem para transmissor. Dentro desta ótica, o conhecimento técnico transmitido
com restrição de divulgação é uma informação confidencial, e será Know how (3) desde que sua
detenção represente uma vantagem comercial para o recipiente. Assim, como se verá, o contrato
de know how , ou de transferência de tecnologia, tem por objeto a cessão de posição na
concorrência mediante comunicação de experiências empresariais
Exara-se desta noção que o know how não é um conhecimento, mas uma conformação do
aviamento, uma forma de organizar a produção; sua transmissão, desta feita, consiste em
transplante de parcela da organização empresarial diretamente afeta à fabricação, reproduzindo o
aviamento do fornecedor do know how. A organização nova, já pelo fato de seu transplante, traz
consigo uma expectativa de reditibilidade, um poder novo sobre o mercado, poder tanto mais
efetivo quanto se assemelharem o mercado para o qual o know how foi concebido e para o qual
foi transplantado.
Em outras palavras, a aquisição do bem concorrencial não é originária. Tal raciocínio terá
talvez menos validade no futuro em que se multiplicaram as fábricas de tecnologia, unidades
empresariais cujo produto é a própria arte de fabricação; mantém-se, porém, ainda enquanto o
know how for parcela do aviamento de uma empresa, que o gera como instrumento de produção.
Possuindo então valoração econômica, o Know how consiste em bem imaterial, sujeito a
propriedade e passível de transferência a título oneroso ou gratuito. De sorte que, a propriedade
de uma informação implica no direito de guardá-la para uso próprio, usando-a como bem de
produção. Convindo-lhe passar a informação adiante, mediante um aluguel, no caso chamado
regalia (royalties), o proprietário goza dela, através de seus frutos. Não querendo, ou não
podendo, tirar seus resultados econômicos diretamente ou por via de terceiros, o dono pode
vender ou dar tal informação, mediante cessão. E, como no caso da propriedade das coisas
tangíveis, o dono da informação pode impedir que outros dela façam uso indevido. Em ambos os
tipos de propriedades existe um direito à exclusividade na utilização da coisa ou da informação,
ou, se quiser, um monopólio legal.
Evidentemente, é mais difícil conceber a propriedade sem uma coisa tangível para ser seu
objeto. Criou-se o sistema de propriedade legal de uma informação, no entanto, porque já havia
uma exclusividade de fato -, o segredo. Convém à Sociedade que os avanços técnicos sejam
divulgados, e para isto se dá uma proteção especial - a maior de que dispõe o Direito - a quem os
queira revelar. É uma barganha: troca-se um segredo, que talvez jamais fosse descoberto por
outros, pela exclusividade de sua utilização, mesmo contra aqueles que vierem autonomamente a
ter acesso à mesma informação. Assim pode-se com base nos dados revelados, ir além do
proprietário. Melhor ainda, como a propriedade concedida pelo Estado é temporária e sujeita à
exploração econômica obrigatória, ao fim do período exclusivo ou se o dono opta por não fazer
uso dela, um competidor vai ter direito de tomar posse, ou de simplesmente fazer uso dos dados
para seus próprios fins.
3.Caracterizando a Transferência
Em segundo lugar, concebe-se que a transferência se faça por veículos que extravasam o
objeto de presente estudo, o know how. A par de tais contratos, nota-se que se entende o
investimento direto, os contratos de assistência técnica (como sendo algo diverso do know how),
as marcas, os acordos de consultoria técnica, contratos turnkey e até a educação não específica
como meios de transferência do fator cognitivo da atividade empresarial. Conforme salienta
BARBOSA:
Definindo-se propriedade, não como o poder absoluto sobre a coisa, à maneira de Code
Napoleon, mas como a indisponibilidade legal de terceiros sobre bens que o direito dá a alguns o
poder de usar, pode-se dizer que só há transferência de tecnologia se há propriedade da
tecnologia que se define como mercadoria. Num universo anômico, em que lei nenhuma
proibisse o uso de todas tecnologias existentes por qualquer interessado, inclusive através da
penetração forçada na intimidade das empresas para extrair seu modelo específico de produção,
não haveria espaço para o comércio de tecnologia; é de se perguntar, inclusive, se haveria
tecnologia a se comerciar.