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HOMICÍDIO PRETERDOLOSO E A POLÍTICA CRIMINAL DO TERROR

Palavras-chave: Preterintencionalidade – dolus eventualis – lesão corporal seguida de


morte - teoria finalista da ação - desclassificação própria

O presente artigo tem a singela pretensão de, a partir de uma visão


holística do Direito, fazer relações no espaço e no tempo entre o estudo do homicídio
preterdoloso (com a abordagem das teorias penais cabíveis) e - em sede de direito
processual penal - uma das mais relevantes teses defensivas no Tribunal do Júri, no
intuito de se demonstrar tanto a elasticidade do dolo eventual quanto a tal “política
criminal do terror”, servindo-se, para tanto, da específica análise do caso do índio
pataxó Galdino Jesus dos Santos, queimado em Brasília/DF em 1997.

Pois bem, crime preterdoloso (ou preterintencional) - uma das espécies


de crime qualificado pelo resultado - é aquele em que a ação do agente causa um
resultado mais grave que o pretendido. Trata-se de um crime híbrido, em que embora
a conduta inicial seja dolosa, o resultado final dela advindo dá-se culposamente; por
isso que em regra a tentativa é inadmissível. A preterintencionalidade, destarte,
pressupõe uma desproporção entre a intenção e o resultado, trazendo à baila, pois, a
noção de tipo penal incongruente.

Para a doutrina italiana, no crime qualificado pelo resultado há


duplicidade de resultados heterogêneos, dos quais somente um deles é desejado pelo
agente. Apenas para explicitar sua amplitude (que abarca quatro espécies), ocorrendo
lesões corporais culposas no trânsito (culpa na conduta) e posterior omissão de
socorro dolosa (dolo no resultado), caracteriza-se, por conseguinte, um crime
qualificado pelo resultado que é, aliás, o revés da espécie preterdolosa.

Nesse diapasão, há de se sustentar, adi exempli, que não é o latrocínio


um crime necessariamente preterdoloso (até pelo fato de ser configurado pela
expressão genérica “se resulta morte”, constante do art.157, § 3º, segunda figura, do
Código Penal), já que a morte da vítima poderá ocorrer intencionalmente ou, inclusive,
de forma premeditada.

Quanto ao homicídio preterdoloso, há, em síntese, dois exemplos muito


clássicos delineando-o: a) o agente desfere uma facada na perna de outrem com a
1
intenção apenas de feri-lo e, casuisticamente, secciona-se a artéria femural,
causando-lhe a morte culposamente; b) o agente desfere um soco no rosto da vítima,
com a intenção clara e inequívoca de causar-lhe apenas uma lesão corporal, porém, a
vítima bate com a cabeça em uma pedra, tem um traumatismo craniano e vem a óbito.

Em ambos os casos supra houve conduta inicial dolosa e resultado


agravador culposo, por isso que é muito comum se afirmar que no delito preterdoloso
há dolo no antecedente (minus delictum) e culpa no consequente (majus delictum). É,
pois, nos dizeres de Nélson HUNGRIA1, “um crime complexo, in partibus doloso e in
partibus culposo”.

Assim, como se vê, o homicídio preterdoloso nada mais seria que uma
“construção doutrinária” consistente em lesão corporal seguida de morte (art.129, §
3º, CP), com pena variando de 4 a 12 anos de reclusão2. Porém, o punctum saliens da
problemática é que o art. 129, § 3º, in fine, do Código Penal faz ressalvas para a
configuração de tal delito: “Se resulta morte e as circunstâncias evidenciam que o
agente não quis o resultado, nem assumiu o risco de produzí-lo” (destacamos) -
em alusão à figura do dolus eventualis. Aqui merece ser feito parênteses.

Quando se fala em dolo eventual, espécie de dolo indireto (assim como


o dolo alternativo) previsto expressamente pelo art.18, I, in fine, do Código Penal,
deve-se ter em mente que, para explicá-lo, surgiram diversas teorias: a da
representação (que confunde dolo eventual com culpa consciente), a da probabilidade
e a teoria do consentimento que, de fato, foi a teoria adotada pelo nossa lei penal
substantiva, com supedâneo na doutrina alemã - mais precisamente na “fórmula 2”
de Frank (teoria positiva do consentimento), conforme assinalam Damásio de
JESUS3, Luiz RÉGIS PRADO e Cézar Roberto BITENCOURT.4

Frank reconheceu, após anos de estudos, ser a previsibilidade


insuficiente para caracterizar o dolo eventual. Para ele, já não bastava a
representação do evento e a consideração da possibilidade de sua causação para

1
HUNGRIA, Nelson. Comentários ao Código de Direito Penal. 3.ed. Rio de Janeiro: Revista Forense,
1955, p. 361.
2
Apenas para efeito de comparação, a pena do homicídio qualificado (art. 121, §2º do CP) varia de 12
a 30 anos de reclusão, sendo, ademais, crime hediondo.
3
JESUS, Damásio E. de. Direito Penal. 26.ed. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 291, v 1.
4
PRADO. Luiz Régis e BITENCOURT, Cezar Roberto. Elementos de direito penal: parte geral. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 1995, p. 87.

2
caracterizar o instituto, sendo necessário, ademais, que o sujeito consentisse em sua
produção.

Em virtude desse reconhecimento pode-se depreender a elasticidade do


dolo eventual. A expressão “assumiu o risco”, constante do art.18, I, parte final do CP,
é insuficiente para identificar esse dolo condicionado, devendo, por conseguinte, ser
interpretada restritivamente. Dito de outro modo - para não se fazer tábula rasa do
princípio favor libertatis - , o dolo eventual não deve ser presumido, e sim provado.
Por isso, a propícia indagação de Lênio STRECK5 após assinalar que o direito não
deve ser aplicado hobbesianamente: “afinal, qual o posicionamento mais
garantista?”

Vale destacar que um dos maiores penalistas de todos os tempos,


Nélson HUNGRIA6, já aduzia em 1978 que, de fato, não se podia dar demasiada
elasticidade à expressão “assumiu o risco”. Realisticamente falando, quem senta
em um automóvel para dirigir no trânsito caótico de São Paulo está, em última análise,
assumindo o risco de produzir um resultado de lesões corporais e, dependendo do
caso, a morte de um desatento pedestre.

Todavia, ad argumentandum, é inolvidável que tal conduta se insere no


campo do risco permitido, já que o motorista, ao dirigir seu carro em velocidade não
excessiva desenvolve um “comportamento estereotipado inócuo”7, segundo a
propalada doutrina de Günther JAKOBS. Em outras palavras, não há criação de um
risco proibido.

Por isso que no intento de melhor configurar o dolus eventualis a lição de


Heleno Cláudio FRAGOSO8 aparece em posição de vanguarda, sendo inclusive
adotada pelo Supremo Tribunal Federal ao aduzir que: “a rigor, a expressão assumir o
risco é imprecisa, para distinguir o dolo eventual da culpa consciente e deve ser
interpretada em consonância com a teoria do consentimento”. Ora, se não for assim, é

5
STRECK, Lenio Luiz. Tribunal do júri: símbolos e rituais. 3. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado,
1997, p. 155.
6
Op. cit, p. 113, v 1.
7
JAKOBS, Günther. La imputación objetiva en Derecho penal, p.107.
8
FRAGOSO, H. C. Lições de direito penal – A Nova Parte geral. 13. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1991,
p. 223.

3
bom deixar bem claro que haverá confusão entre os dois conceitos, podendo-se
estabelecer, por conseguinte, uma “política criminal do terror”.

Nesse lume, o perfeito entendimento de tal discrímen é de suma


importância, uma vez que o nosso modelo fascista de Código Penal não distingue,
para efeitos de previsão in abstracto de pena cominada, entre dolo direto e dolo
eventual - espécie de dolo indireto. Em ambos os casos, segundo o Código, houve
dolo, e é isso o que importa.

Obviamente que o magistrado, valendo-se do bom-senso, deverá levar


em conta as peculiariedades do caso concreto na fase da aplicação da pena, sendo
que o dolo eventual fará jus a uma reprimenda menos severa que o dolo direto. Nesse
ínterim, vale frisar que no tocante ao dolo direto foi adotada explicitamente a teoria
da vontade, consubstanciada na expressão “quis o resultado” na primeira parte do
art. 18 da lei penal substantiva.

Quanto à competência para julgamento do homicidio preterdoloso, por


sua vez o art. 5º, XXXVIII, d, da Lei Fundamental dispõe ser o Júri juiz soberano para
o julgamento de crimes dolosos contra a vida, sendo que de acordo com E.
Magalhães NORONHA9 o referido dispositivo não pode ser interpretado
ampliativamente por ser o Júri tribunal especial. Em vista disso, o homicídio
preterdoloso, crime de forma híbrida, seria da alçada do juiz singular, inclusive por ser
infenso ao rol do art. 74, § 1º, do CPP - que disciplina a competência do Júri.

Destarte, em relação à essência do crime insta assinalar que não existe


animus necandi em “homicídio” preterdoloso. Em outras palavras, o Júri não julga
o delito de lesões corporais especificamente, em que é característica a intenção de
ferir (animus laedendi), mas sim o típico homicídio doloso tentado ou consumado,
em que sempre há a peculiar intenção de matar.

Por exemplo, no caso do índio Pataxó Galdino Jesus da Silva, que


morreu queimado em Brasília em 1997, houve intensa discussão acerca da existência
ou não de animus necandi por parte dos acusados. Ao final, prevaleceu a tese
encampada pelo parecer do mestre Damásio E. de Jesus, concluindo que, naquela
oportunidade, houve homicídio qualificado com dolo eventual.

9
NORONHA, E. Magalhães. Direito penal; dos crimes contra a pessoa. 26 ed. São Paulo, Saraiva,
1994, v.2, p.255.

4
Frise-se que, anteriormente, havia ocorrido a desclassificação do crime,
pelo juízo a quo, por entender que se tratava de típica lesão corporal seguida de morte
tendo-se em vista diversos argumentos, dentre eles: “o fogo normalmente não
mata”; “os acusados nunca anuíram ao resultado morte” e o “resultado morte
lhes escapou à vontade” só podendo a eles ser atribuído pela ‘previsibilidade’
(referindo-se à culpa).

Vale a pena destacar que o julgamento do Recurso Especial nº


192.049/DF pelo STJ, decidindo pela pronúncia dos réus nos termos da denúncia,
restou no ponto assim ementada:

“PENAL E PROCESSUAL PENAL. RECURSO ESPECIAL.


TEMPESTIVIDADE. PREQUESTIONAMENTO SÚMULA Nº 400-STF.
JÚRI. HOMICÍDIO QUALIFICADO E LESÃO CORPORAL SEGUIDA DE
MORTE. PRONÚNCIA DESCLASSIFICAÇÃO. REVALORAÇÃO E
REEXAME DO MATERIAL COGNITIVO (...) IV - A decisão, na fase da
pronúncia, aprecia a admissibilidade, ou não, da acusação, não se
confundindo com o denominado iudicium causae. V - A desclassificação,
por ocasião do iudicium accusationis, só pode ocorrer quando o seu
suporte fático for inquestionável e detectável de plano. VI - Na fase da
pronúncia (iudicium accusationis), reconhecida a materialidade do delito,
qualquer questionamento ou ambiguidade faz incidir a regra do brocardo
in dubio pro societate. VII - Detectada a dificuldade, em face do
material cognitivo, na realização da distinção concreta entre dolo
eventual e preterdolo, a acusação tem que ser considerada
admissível. Recurso reconhecido e provido” (Rel. Min. FÉLIX FISCHER)
(destacamos).

E, ainda reforçando a importância da análise de se conhecer o elemento


anímico do agente, percebe-se inclusive que no latrocínio - crime hediondo ex vi do
art. 1º, inciso II da Lei nº 8.072/90 - a finalidade de subtração patrimonial fará com
que o seu julgamento seja realizado pelo juiz singular e não pelo Tribunal popular,
muito embora haja a morte da vítima. Em outros termos, em tal crime a violência é
mero meio (modus operandi) para se alcançar o fim de se apropriar de coisa alheia
móvel.

5
É o que, aliás, categoricamente dispõe a Súmula 603 do Supremo
Tribunal Federal: “A competência para o processo e julgamento de latrocínio é do juiz
singular e não do Tribunal do Júri”. Excepcionalmente, porém, o latrocínio poderá ser
julgado perante o júri na hipótese de conexão (ex vi do art. 78, § 1º, do Código de
Processo Penal) com um caso que deva ser submetido a julgamento pelo Júri.

Assim, ante o exposto percebe-se icto oculi que a compreensão do que


seja um “homicídio preterdoloso” requer, do mesmo modo, a aplicação da teoria
finalista da ação, de Hans WELZEL10, adotada pelo Código Penal, sendo
perfeitamente compreensível que o latrocínio (não necessariamente preterdoloso) não
seja julgado pelo Júri - haja vista que o agente visa antes e prima facie, ferir o
princípio de que a res, onde quer que ela esteja, clama pelo seu dono; para
alcançar tal finalidade, ele simplesmente mata.

Ademais, no Tribunal do Júri - do ponto de vista agora da práxis forense -,


uma das teses defensivas mais relevantes é justamente a desclassificação própria
do homicídio doloso consumado para lesões corporais seguidas de morte, importando
em decorrência disso significativas alterações quanto ao sistema trifásico de
aplicação da pena no caso concreto.

Já a sorte do latrocida por diversos motivos estará lançada aos quatro


ventos. Caberá ao advogado criminalista, em última análise, a difícil missão de
defender a tese da cisão desse delito para o concurso11 entre homicídio e roubo (ou
furto), no intuito de que o latrocida seja, no final das contas, julgado pelo Tribunal do
Júri – onde poderá, inclusive, ser absolvido por seus pares ou, caso condenado, ter a
pena significativamente minorada pelo juiz presidente em face de eventual e relevante
defesa apresentada em Plenário.

10
WELZEL, Hans. Derecho penal aleman, Santiago de Chile, Ed. Juridica de Chile, 1993, p.
83.
11
Vale destacar, conforme referencia Fernando Capez, que o Supremo Tribunal Federal fez a
diferenciação entre: latrocínio e homicídio em concurso com roubo por ocasião do julgamento
do HC nº 84.217/SP, rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ: 27-8-2004. Cf.: CAPEZ, Fernando.
Curso de direito penal: parte especial. 6ª ed. ver. e atual. São Paulo: Saraiva, 2006, v.2, p. 424.

6
BIBLIOGRAFIA

CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal: parte especial. 6ª ed. rev. e atual.
São Paulo: Saraiva, 2006, v.2.

FRAGOSO, H. C. Lições de direito penal – a nova parte geral. 13. ed. Rio de
Janeiro: Forense, 1991.

HUNGRIA, Nélson. Comentários ao Código Penal. 3.ed. Rio de Janeiro:


Revista Forense, 1955, v 1.

JESUS, Damásio E. de. Direito penal. 26.ed. São Paulo: Saraiva, 2003, v 1.

JAKOBS, Günther. La imputación objetiva en derecho penal. Madri: Civitas,


1999.

NORONHA, E. Magalhães. Direito penal; dos crimes contra a pessoa. 26


ed. São Paulo, Saraiva, 1994, v.2.

PRADO. Luiz Regis e BITENCOURT, Cezar Roberto. Elementos de direito


penal: parte geral. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1995.

STRECK, Lênio Luiz. Tribunal do Júri: símbolos e rituais. 3. ed. Porto


Alegre: Livraria do Advogado, 1997.

WELZEL, Hans. Derecho penal aleman. Santiago de Chile, Ed. Juridica de


Chile, 1993.

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