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·Enciclopédia Einaudi

volume 20

I· Parentesco

/.
I

IMPRENSA NACIONAL· CASA DA MOEDA


íNDICE
.'
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) 1 -." \1i.'~r_le..~."".v~,~ r·i

e;.,z,~ / <UG. ~
,11 Masculino/feminino (Françoise Hériticr)

I . 81 ,Fam11ia (Françoise Hériticr) -l..•..


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l.',,~~.l - 95· I nces to (Franço18C.


. H~'b' \
.•••.•cri'" '_.-"Q'~""'''&5 L-,S;
IC''"'''''' V,""'/<, "'.
- 125 Endogamialexogamia (,Françoise Héritier)
21 Parentesco
~ 140 Casamento (Françoise Htriticr) :of' . ... ~.'lk"'."' ...ll"""':)'\kH.J
{FraaçoiIe Hériticr).
/141 'Homemluulber ~ Godelicr)
,/165 Mulhcr (Fnnca otigaro Basaglia)
199 Casta (Valerio Valeri)
220 Totem (Alain Tcstart)

,241 Plano da obra


249 Gráfico

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DireClor
Ruggiero Romano

ConndlOru do projeclO
Alfredo Salsano, Giorgio Benoldi, A1essandro Fontana,
Jean Petitot, Massimo Piallelli Palmarini, Massimo Galuzzi,
Fernando Gil, Krzysztof Pomian, Giuseppe Geymonat,
Giuseppe Papagno, Gian Paolo Caprettini, Renato Betti,
Giulio Gioreno, Clemente Ancona.

EDlçAO PORTUGUESA

Coordtnodor-respomáwl
Fernando Gil

SureUlriado
Vasco Rosa, Leonor Rocha Vieira

OriIfItaFIJo gráfu:a
Gabinete Editorial da INCM

C 1989 Imprenn Nacional·Casa da Moeda

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NOTA DO EDITC1k

Na sua venlo original, esta Erteic/opldia dispOe-se alfabeticamente, de eÁbacoo a~


cZeroa, num 'total de 551 entradas em 14 volumes. A Erttic/opldia foi pomn COIICe-
bida tematicamente, DI forma de 79 conjuntos de entradas. No fim de cada um
dos volumes da presente ediçIo, o leitor eDCODtrIrio gdfic:o da obra, tal como ela
se distribui pelos conjuntos tem4ticos: os conceitos sublinhados - chamados por-
t4IIIti DI ediçIo italiana, quer dizer, «portadores. do conjunto - correspondem aos
títulos dos nossos volumes. Com efeito, DI ediçIo portuguesa os conjuntos foram
reagrupados, segundo um critério de proximidade conceptUlI1,num CDT/1IU de 41 volu·
mes. 8eguir·se-Ihes-lo dois outros que correspondem ao vol. 15 da ediçlo italiana
(Sútllftdtica). Neles se apuram as correlações internas e as grandes linhas de fundo
da BneiclopIdia.
ApóI cada artiao, um pequeno texto, da responaabilidade da redacçIo da Enci·
í
c/opIdia, deman:a problClÚtica global rapec:tiva; nesse texto, as palavras em itá-
lico 810 deIignaç(les de outras entradas da obra. Todos os artiaos propllem assim
itinedrioa de leitura - difemltcs em cada caso - atra~s do torpIU. NIo se trata,
naturalmente, de recomeDdlÇGesrfaidas de leitura mas tIo-só de indicaç(les, que suge-
rem 10 mesmo tempo os encadeamentos na base da Ertticlopidia; e convidam tam·
~ o leitor a CODltruiros seus próprios percursos. A circu1açlo dos conceitos está
ainda _",Iada por um sistema de ref~ cruzadas dentro das próprias entradas,

Os nomes de autores que figuram no texto dos artigos entre pmnteses rectos,
assim como as dataa entre puinteses rectos que se seguem aos nomes dos autores,
reeovWn aos dados bibliogdtIcos completos no fim de cada entrada. SIo indicadas
•• traduçaea portU&Ue8ISaiJtentcs. Estes dados bibliogrdficos refemn-ao unicamente
u obras citadas ou meDCioDadano corpo dos artiaos: nIo alo de modo ~ biblio-
grafias. Os títulos das obras em italiano, frances, ingles, espanhol, citadas no corpo
dos artiaos, alo indicados DI llngua original. Quanto u obras em alemlo, russo,
úabe, chines, ele., menciona-se no texto do artigo o título em portugUes, seguido
pelo título original entre pmnteses curvos, se 010 se reenvia aos dadoS bibliognfi·
cos; se po«m tal reenvio é feito, o título original achar-se-1Inesses dados. No que
se refere aos c1úsicos gregos e latinos limitamo-nos a dar o título em português no
corpo do artigo, com as indicaçOes necessárias para identificar os passos citados. As
palavras em hebreu, grego, úabe, etc. foram transliteradas.

, As datas entre pmnteses rectos nos dados bibliognficos alo as da composiçlo


da obra ou representam uma referência cronológica diversa da 1.. ediçIo (que figura,
com indicaçlo do autor e do lugar de publicaçlo, depois do título), por exemplo
no caso das obras póstumas.

TraduçiJa

Magda Bigone de Fipciredo (Cuamento, BudopmiaIexopmia,


Fam1Iia, Homem/mulher, MucuJiDolfemilllno,
Parentesco, Totem),
MarprIda Santos (Mulher),
. R.ui SIDWII Brito (Cata),
ToDIIZ Vez da snva (lDcato).
II

! I
••

MASCULINOIFEMININO

, A sociedade ocldeSltal, pI[Il,'qUC',pl a observa, caracteriza-se por uma clara


dominaçlo masculina. A subotdinaçio da mulher é evidente no domínio do
político, do cconómico, do simbólico. Hll poucas representantes femininas
no~ órgãos locais ou centrais de governação (executivos ou administrativos).
No plano económico, as mulheres estio a maior parte das vezes confinadas
l esfera doméstica, da qual, alills, n10 saem, nunca absolutamente: de facto,
as mulheres que exercem uma actividade remunerada (artesanal, coJnercial,
etc.) devem na prlltica coordenar as duas actividades. Quanto tem activida-
des fora do campo doméstico, é raro que as mulheres coniigam ascender
ao topo, aos cargos de responsabilidade, de direcçio, de prestígio, na sua
profisslo.
No plano do simbólico, orientado pela tradiçlo e pela educaçlo dada aos ,
filhos, as actividades valorizadas e apreciadas 810 as que os homens exer-
cem. Para além disto, um conjunto de juizos de valor põe em evidência
diferenças, apresentadas como naturais e irremedi4veis tanto quanto irrecu·
sllveis por este facto, no que respeita ao comportamento, ls acçOes,ls capa-
cidades, ls «qualidades» ou aos «defeitos», considerados como marcados por
uma importAncia tipicamente sexual: um discurso negativo mostra as mulhe-
res como criaturas irracionais e ilógicas, desprovidas de espírito crítico, curio-

dota~
~discretas,
de espírito
faladoras,
inventivo,
incapazes
poucodecriativas
guardar especialmente
um segredo, rotineiras,
nas actividades
pouco
de tipO"intelectual ou estético, medrosas e cobardes, escravas do seu corpo
e, dos seus sentimentos, pouco aptas para dominar e controlar as suas pai.
xões., inconsequentes, hist&icu, inconstantes, pouco dignas de confiança e
até mesmo traidoras, manhosas, ciumentas, invejosas, incapazes de serem
boas camaradas entre si,' indisciplinadas, desobedientes, impúdicas, volúveis,
perversas. .. Eva, Dalila, Galateia, Afrodite. •. Existe um outro género de
discurso aparentemente menos negativo. Frllgeis, caseiras, pouco dotadas
tanto para a aventura intelectual como para a aventura física, doces, emoti·
vas, amantes da paz, da estabilidade e do conforto do lar, fugindo das res~
ponsabilidades, incapazes quer de espírito de decisão quer de espírito de
continuidade, crédulas, intuitivas, sensíveis, ternas e pudicas, passivas, as
mulheres têm por natureza necessidade de ser submetidas, dirigidas e con·
troladas por uin homem.
\,
MASCUUNOIFBMININO 12 13 MASCUUNOIPBMINlNO
., f~~::j.. , .
Em ambos os casos, e sem DOSpreocuparmos com as contradiçties papel importante e aetivo, afastado dos clDones da nossa pnSpria c:u1tura.
(a mulher ardente, a mulher fria; a mulher inconstante, a mulher flel, anjo Também DIo est4 excluído que uma peuetnçIo maciça no mundo dai mulhe-
do lar; a mulher pura, a mulher corrupta e impura, ele.), este disculso aim- res, levada a cabo por antropólogas e feministas, nIo faça aparecer c:enu
b6Jico remete para uma naturaa feminina, morfológica, biológica, psicoló- desvantagens suplementares aU aqui ignoradas. POI'outro lado, um traba-
gica. As Kries de qualidades enumeradas têm um sinal negativo. ou depre- lho receote [Whyte 1978] sobre correlaçGes estatísticas entre variáveis rela-
, i ciativo, ao passo que as .mes qualitativas masculinas correspondentes têm tivas 1 posiçIo das mulheres e ao sexo do observador - num estudo de
II DOYCDta e ~ popu1aç(ies- mostra que este último dado tem uma inci-
sinal positivo ou valorativo. Exiate um sexo principal e um sexo ~-
rio, um sexo «ÍOl'tCte um sexo cfraco», um espírito «ÍOl'tCte um espírito dência sem importAncia. O autor conclui que os relatórios masculinos nIo
«fraco». Esta fraqueza natural, co~nita, das mulheres implica e le8itima do necesaariamente exaustivos e seguros, mas que nIo existe distorçlo sis-
a sua sujeiçlo, at~ a do pnSprio corpo. '." telÚtÍCa na apresentaçlo da condiçlo feminina como anormalmente baixa.
Nlo se ponl aqui a questlo de saber se esta re1açIo Dlo igualitária. elos > "', U••• maior quantidade de documentos fornecidos por observadores de sexo

sexos na sociedade ocidental pode e deve mudar e, no caso afirmativo, em t ' feminino daria uma YÍ;do mais pormenorizada e, por consequência, mais
',' 'íuata do papel desempenhado pelas mulheres, mas nIo indicaria forçosamente
I que modalidades,
B passtvel masesta
dizer que colocar-se-Io
dominaçlo duas questlies
masculina totalmente
~ universal? Se diferentes.
aim. onde que a parte delas fosse melhor do que aquela geralmente admitida. a ver-
I se situa a origem, a explicaçlo desta desigualdade inata entre os sexos? dade, por exemplo, que Phyllis Kaberry [1939] rectificou a imagem, dada
NIo ~ de maneira nenhuma certo que se disponha de um recenseamento por Malinowski sobre os arborfgenes australianos, de mulheres humildes,
exaustivo das sociedades humanas existentes ou que tenham existido, e ~ diferentes perante o homem, esmagadas, mantidas 1distincia. Mas esta nova
indubitável que todas as sociedades conhecidas Dlo 810, por esse motivo, imagem Dlo chega para inverter o sentido geral da sua história.
necessariamente descritas. E, quando o do, Dlo ~ fOlÇOSlmentede uma Uma outra crítica, geralmente feita 1afirmaçIo da píobabilidade estatís-
maneira que ponha em evidência a natureza da re1açlo entre os homens e tica da universalidade da dominação masculina (baseada no exame de
as mulheres. Feitas estas reservas, que implicam a ausência de provas cien- documentos antropológicos), ~ a de que da nIo toma a história suficiente-
tíficas absolutas, hi uma forte probabilidade estatística da universalidade da mente em conta. Bate argumento ~.apresentado de duas maneiras diferen-
supremacia masculina que decorre do exame da literatura antropológica sobre tes. Nas grandes sociedades actuais existiria um nivelamento cujo eixo cen-
o assunto. tral ~ uma dominaçlo de tipo patriarcal que priva as mulheres de direitos
Uma das críticas feitas a esta afinnaçIo, de um ponto de vista feminista, ou de situaçGes privilegiadas que elas detinham anteriormente, por influên-
~. a de que a maior parte dos estudos antropológicos foi elaborada por cia de fac:tores VÚÍOI: as religiOes reveladas, a judaico-cristi, a isl4mica;
homens. AU se acrescenta que, quando 810 orientados por mulheres, estas o desenvolvimento do com&cio e da ind\1stria que privilegiam ·actividades
participam necessariamente da ideologia dominante da sua própria sociedade de tipo novo e que por essa razlo perturbam as situaç(les adquiridas; a inci-
que valoriza a masculinidade, e por consequência prestam mais atençlo ao dência do colonialismo que' promove e agrava estes dois !actores nas regiões
onde grasaou. Pode retorquir-se que se Dlo vê muito bem como ~ que reli-
mais acessível. Um duplo desvio, etnocêntrico e androcêntrico, faz co que gilies reveladas que privilegiam o papel do homem podem ter..nascido e
mundo
se dos homens,
observem considerado·
outras sociedades commais interessante
olhos e de qualqseira
da nossa sociedade e mais p '- desenvolver-se num sentido absolutamente inverso ao da ideologia dominante;
cularmente com os olhos do homem que na nossa domina. do mesmo modo, Dlo se percebe muito bem por que razlo as mulheres,
Por último, sendo o mundo das mulheres particularmente secreto e se tivessem sido dominantes politicaJbente, economicamente, ideolOgicamente,
fechado para um antropólogo, ainda por cima do sexo masculino, recorre- teriam sido incapazes de se adaptar ~ U'8DSformaçOessociaisprovoéadas pela
-se, no que lhes diz respeito, à vislo que os homens têm da sua ~iedade. alteraçio da ordem económica ou pela colonização. Em qualquer dos casos,
As mulheres das sociedades estudadll seriam desta maneira consideradas este nivelamento ~ o do agravame~t() de um estatuto, nIo da sUli inversão
aeaundo um critmo duplamente masculino, o que explicaria que Prevaleça
na .literatura antropológica a imagem da sua condiçlo humilhada, propsiva. I'
E verdade que muitas situaç~ ae confundiram e se modifit:8ram pelo
Nlo ~ possível refutar totalmente este argumento, mas ~ con~eniente desenvolvimento da economia m~til e pelo colonialismo. Deste modo,
atenuar-lhe o alcance,. por variadas razlies: admitindo que as antrP~logas sociedades matrilineares, ou seja, .ociedades em que o poder ecdnómico e
participam da ideologia dominante da sua pnSpria sociedade, ~ cobtraditó- político está na posse de homens qtH: pertencem a grupos definidos social-
rio pensar que noutras sociedades as mulheres possam ter uma rq1resenta-
tividade radicalmente diferente da dos homens. A tendência natural de qual- mente porlentamente
passaram uma regra adeformas
filiaçlobiliJieares
q~e passaou exclusivamente pelas mulheres,
mesmo patrilineares, enquanto
quer antropólogo ~ a de se interessar pelos aspectos exóticos e mais diferentes a inversa nunca se verifICa (porqu~, aliú, ~ impossível por razOes estrutu-
da sua pnSpria cultura, nIo sendo pois evidente que os homens sejam inca- rais). Na TanzAnia, por exemplo, os homens começaram a criar plantações
pazes de ver e de notar os casos em que as mulheres desempenham um nas terras colcetivas dos grupos matrilineares, para responder à procura curo-
MASCULINOIPEMININO 14 IS . MASCULINOIPEMININO
. ~
. - ··.•il •••
I :
peia. Passou-se então, lentamente, da grande fanúlia, que cultivava cereais (do igualmente elas que redistribuem o produto da ta masculina), o que
e outras plantas alimentícias em terrenos de propriedade comum, para a tiuní- é posstve1se tivermos em conta a estrutura social matrilinear favontve1 por_
lia individual centrali7Jldanum homem que ganhava dinheiro, depois da indi· que a actividade fundamental das mulheres, a agricultura de ~, nIo
vidualizaçlo da propriedade das te;rras. Tal nIo significa, todavia, que na é incompatível com a possibilidade de tomar conta dos filhos. Segundo a
sociedade matrilinear inicial as mulheroll e a sociedade não estivessem sob m~ autora, e d~ modo muito interessante, existem apenas três tipos de
controlo masculino. ~ económicas que permitem esta acumu1açlo de tarefas: a colheita,
No que respeita ao segundo modo do apresentar a argumentação baseada a agricfütura de enxada e o comércio tradicional (o que não significa que
todas &fi sociedades que pratiquem estas formas de actividade ofereçam às
primitivo, derivada de Bachofen [1861 , segundo o qual teria havido um m~erp situações privüesiadas). Acresce ainda que não é indiferente que
estado
na inicialtrata-se
história, da humanidade marcado a bem
da teoria evoluciO~'.ta, ignorância da paternidade
conhecida, fisio-
domatriarcado seJ~ ~ matronas a gozar de um alto estatuto no caso dos Iroqueses. Mais
lógica no culto das deusas-mães e pela' 40minaçlo feminina - polí*a, eco- adiantei ~ol,caremosa este palItO.
nómica e ideológica - sobre os homcQI. Não é este o lugar para fazer a . A PfOCWll de ~ verdede'oriIinal tenta apoiar-se no estudo das socie-
dades qde ConsiderImóe DÍak.primitivas (se' bem que elas próprias tenham
i
o termo fmatriarcado', que implica a eia de poder feminino, foi e conti- uma hÃlJt6ria),ou lleja, a dos caçadores-recolectores, essas populações qu~
nua a ser
crítica dasfrequentemente utilizado
teorias evolucionistas da em ....ferência dir-se-ll
h~'lanidade; a situaçl5esreais de matri-
simplesmente que não conhecem nem a agricultura nem a criaçlo de gado e que vivem da .'
linearismo; em que os direitos eminent!=Ssão os dos homens nascidos nos apanha ~ta dos frotos da natureza, através da caça, da pesca, da criaçlo
grupos de .filiaçãodefinidos pelas mulheres ou em refedncia a situaçOesmíti- de insectos e de pequenos animais, da apanha de b88ll8, frotos e gram{neas
cas como'a das Amazonas. selvagens.
A sociedade humana, que, do ponto de vista da antropologia, parece ter Aetualmente existem trinta e duas sociedaes de caçadores-recol~res
estado mais próxima da definição do matriarcado, é a dos Iroqueses [Brown que nIo oferecem aquela visão comum das relações homem/mulher que ~
1970b], estudada por numerosos autores, depois do jesuíta Lafitau [1724] supõe serem uma sobrevivEncia de um l1nico modelo arcaico. Todas mani-
e do relato da vida de Mary Jemison por Seaver [1824]. Nas seis naç(ieI festam a existência de uma supremacia masculina, mas com enormes dife-
iroquesas, as mulheres não eram tratadas com uma deferEncia ou com aten- renças que vlo da quase-igualdade dos dois sexos entre os Anasbpi, índios
ções especiais, e é possível que, segundo Morgan, os homens se consideras- pescadores, até àquase-escravatura das mulheres ezistente entre os Ona da
sem superiores, consagrando todas as suas actividades à caça a grande dis- Terra do Fogo. "
tãncia (uma campanha podia durar um ano) ou à guerra. Mas as mulherea, a verdade que em· certas sociedades de caçadores-recolectores da Aus-
ou pelo menos algumas delas, gozavam de direitos e de poderes raramente tntlia e de Africa as mulheres gozam de uma grande autonomia. Maurlce
igualados. . GodeUerexplica isto pelo facto de não haver diferença entre economia dolJ1&.
A regra de filiação passava pelas mulheres, e a residência era matriloca1. tic~ e econo~ pl1blica, pela .ausência de propriedade privada e porque a
As mulheres que pertenciam à mesma linhagem viviam na mesma grande e familiar não é exclUSivamente conjugal. Os homens Rio exercem
casa, com os seus maridos e fllhos, sob a tutela de «IIllltroDUll,as quais aí con~ imentos ~ísicos; os trajectos de um grupo que se desloca 810
não sabemos, infelizmente, com exaetidão, como eram escolhidas. As matro- escolhld para comb1D8ruma boa caçada e uma boa colheita· as mulheres
nas, que comandavam e dirigiam a vida das grandes casas, dirigiam igual- do livres dos seus movimentos e de disporem de si mesma's.
mente o trabalho feminino agrícola, apanágio das mulheres, realizado em , Mas estas viatlea«idílicasllnIo devem fazer esquecer a existEnciade outros
comum nas terras colectivas que eram propriedade das mulheres da famí- grupos que pertencem ao mesmo tipo de economia dos caçadores-recolectores
lia. As próprias matronas procediam à redistribuição da alimentação cozida, e. em q~e as re1açfteados homens e das mulheres são marcadas pela violEn-
Cl8. Anne Chapman, no seu livro sobre os Ona [1982], descreve uma socie-
por
nas lar, juntorepresentadas,
estavam dos hóspedes se
e junto dosGrande
não no membros do Conselho.
Conselho das SeisEstas mapo-
Naçõeslro- dade onde as mulheres não tEm qualquer direito, onde os maridos podem
quesas, pelo menos no Conselho dos Al)ciãos de cada nação, através de um bater, ferir e até matar a mulher sem qualquer sanção,' onde as mulheres
representante masculino que falava em nome delas e fazia ouvir as suas vozes. desp~ Rio conhecem diariamente seRlo a brutalidade na sujeição e,
Esta voz não era, de facto, negligenciável, dado que as matronas dispunham penodicamente, ~urante as sessl5esda sociedade de iniciação masculina que
de um direito de veto no que respeitava à guerra, se o projecto bélico lhes podem durar .v4rios meses, o terror e a violEncia infligidos pelas máscaras.
não agradava, e podiam, de qualquer maneira, impedir a realização de um Neste caso é mteressante notar que um mito de origem explica este estado
projecto de guerra impedindo simplesmente as mulheres de fornecerem aos de dependEncia.
guerreiros a provisão de alimentos secos ou concentrados que lhes era neces- . Na origem, ~lica Anne Chapman, os homens postos em abjecta sub-
sário levar consigo. Para Judith Brown, as matronas iroquesas devem este mlssã~ eram obngados a fazer todos 01 trabalhos, incluindo os domésticos,
estatuto elevado ao facto de controlarem a organização económica da tribo e BerVlamas suas esposas, reclusas na grande casa das mulheres de onde
MASCUUNOIPBMININO 16 17 MASCUUNOIPIMININO
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saiam OS rugidos de mMcaras aterrOrizantes. A,Lua dirigia as mulheres. Isto explicitamente que.tqUllquer cultura, qUllquer sociedade, se ~ na desi-
durou aÚ ao dia em que o Sol, homem entre todos os homens, que, trazia gualdade sexual e que esta desigualdade 6 uma violêIIcia. a DeCCllfriopor
I I
caça para junto da cubata inici4tica para alimentar as mulheres, surpreende isso acreditar em verdadeiros aetos inteneiooais de violeacia iDicial, como
I' a troÇa das jovens sobre a credulidade dos homens e compreende que as aeto8 fundadores da ordem social? Pode por isao lCl'editar-se numa perda
mMcaras nlo alo a emanaçlo de forças sobrenaturais aterradom, dirigidas hiatcSricade poder, ou tratar-se-ll simplesmente do discurao justificativo que
contra os homens, mas apenas um subterfdgio utilizado pelas mulheres para a sociedade pronuncia sobre si própria para dar conta de uma situaçAopro.
os manter em estado de dependencia. Os homens estrangUlaram entlo todas duzida por Um conjunto de causas Dlo intencionais, objectivas? Adiante vol-
as mulheres, à excepçlo de tres jovenzinhas, e inverteram os papéis. A Lua taremos a este ponto fundamental.
voltou para o ~, onde continua sempre a tentar vingar-se (os eclipses do O mito legitima a ordem social estabelecida, dissemos. No entanto, nem
Sol alo disso a prova). As mulheres alo mantidas na ignodncla da situaçlo todas as sociedades e1a,borarammitologias propriamente ditas para d'undar»
original (o mito só é transmitido aos homens durante os períodos de inicia- • dominaçlo masculina, para lhe dar um sentido. Mas todas têm um dis-
çIo); tanto elas como os homens veetn na Lua e nos seres que lhe ado curso ideológico, um corpo de peJ*Jnento simbólico que tem essa mesma
associados inimigos do género humano, na medida em que os sabem boItis funçlo de justificar a supremacia do homem aos olhos de todos os mem-
aos llCUS irmIos, filhos, maridos. bros da sociedade, tanto aos das mulheres quanto aos dos homens, porque
, Magnífico exemplo da natureza mftica, ou seja, puramente ideológica, do quer uns quer outros participam iJbr definiçlo da mesma ideologia, incul.
tema do matriarcado primitivo, cujo objectivo é legitimar a dominaçlo mas- cada desde a infIncia. ,
culina, numa sociedade .primitiva», de tipo patriarcal. NIo é um exemplo Bates discursos simbcSlicosalo Cbnstruídos sobre um sistema de Clteso-
isolado. Entre os Bemya da Nova Guiné, que nIo alo caçadores-recolectores, riu binúias, de pares dualistas, qUe ~ frente a frente séries como Sol
mas sim horticultores que também praticam as inici~ masculinas, ensina-se e Lua, alto e baixo, direita e esquerda, noite e dia, claro e escuro, lumi.
aos homens, no decurso desses períodos inici4ticos, que foram as mulheres JlOIOe sombrio, leve e pesado, frente e costas, quente e frio, seco e hl1mido,
quem na origem inventou o arco e as flautas cerimoniais. Os homens ma&CU1iDo e feminino, IUperior e ihferior. Aí se reconhece a estrUtura sim-
roubaram-lhos ao penetrarem na cabana menstrual onde esses objectos esta- bcSIicado pensamento filoIcSfiooe 1nédico grego, tal como o encontramos
vam escondidos. Desde aí, só eles sabem servir-se deles (a flauta é· O' meio em Aristóteles, Anaxjmandro, Hi~rates, onde o equiUbrio do mundo e
de comunicaçio com o mundo sobrenatural dos espíritos), o que lhes con- dos elementos como também o dó corpo humano e dos seus, hUmores se
fere toda a supremacia [Godelier 1976]. Entre os Dogon da África Ociden- fundam numa harmonioaa combinaçlo destes contrários, e, por consequên-
tal, cereaIicultores, o mito narra uma aúloga privaçlo do poder das mulhe- cia, qualquer excesso num dos ~pos causa desordem e/ou doença. No
res sobre o mundo do sagrado, tendo-lhes os homens roubado as' saias das
DWcuas feitas de fibras pintadas de encarnado. Em todos estes casos trata- pen-memo
e do hdmido,grego, as categorias
que estio directamebte do as do1quente
~trais associadas e do frib, do
masculinida~,(o seco
quente
:.sede sociedades com um nítido poder masculino, que se referem a Um estado e o seco) e • feminilidade (o frio e'leihl1mido) e, de maneira apaÍtntemente
inexplic:dvel, veem-se afectados de',valores, positivo por um ladd, negativo
fun, sociedades matrilineares, onde também o poder é detido peloS il , por outro, embora haja uma ccrtallmbivalência do seco e do hWnido, que
mítico
evocammatrlarca1 original.
nos seus mitos um Mas,
estadonas sociedades
original lacustres
inverso, da ~o
baseado, aqui;:' Mar-
insti·
, tuiç6es patrilineares. O Rio exise ao grupo o sacrifício de uma cribça antes nIo c:ontêmem
18lIOCiados, emdiVCl'108
~ mesmos valores:aJx>si~vosou
contextos. negativos,
assun que, na ordem domas ~•. assumem,
corpo, o quente
de se deixar atravessar. A mulher do chefe recusa oferecer o seu fiUio;a irmI e o hdmido estio do lado da vida, da alegria, do conforto, portanto do posi-
do chefe dá o dela, a fim de salvar o irmIo e o grupo todo. E o ch"'e decide tiw; o seco e o frio estio lado IaM da morte, do negativo por consequência
entlo que a partir desse momento a transmisdo dos poderes e dOa bens se (01 mortol têm sede). Mas na ordem das estações, o seco esU dO'lado posi-
passa a fazer nIo ao fJ1hodo homem'h- ao filho da irmI, 10 IObtinho ate-
rino. Mas aqui, nenhuma violeDclafeminina é exercida sobre os hGlbena por tivo com o quente
Se pauarmos do Vedo,
• ordem sexual,e as
o h1Írl1ido
do corpos
niUlheres, negativo frio d~ Inverno.
comeoportanto
vivos quentes
lhes terem tomado o poder. Duu mulheres: a mulher, a irmI; dua atitudes e hdmidOl que arrefecem e se aq\ll:cem com as perdas menstrUais, deve-
femininas sentidas como d.iametralmente opoIt8S e a partir da. q. o chefe riam por essa mesma razIo ser ma\s,secas do que ,os homens. oni, o macho
decreta a nova lei de filiaçlo: o egoísmo da eapou-estl'lJlPÍ1'l, o ~truílmo é seco e quente, associado ao fogo e 10 valor positivo; a tàea é fril, hWnida,
e a dedicaçlo da irmI-consaDgUínea. Mas j' o chefe é macho e .0 estatuto associada • que e ao valor negativ~ (Bmpédocles, Aristóteles, lnpcScrates).
do chefe permanece com o macho. . Trata-se, segundo Aristóteles, de Uma diferença de IIQturua na tipacidade
O facto é que o mitonlo fala da história: transmite uma mensagem. em tICOZe1'lI o sangue para a partir üele se constnúrem os humores do corpo
A sua funçlo é a de legitimar a ordem social existente. Os exemplos ona, próprios a cada um dos sexos: a inenstruaçIo na mulher é a forma inaca-
baruya, dogon explicam que a ordem social, encarnada na preeminencia do bada e imperfeita do esperma. O esperma, rarefacçlo e depuraçlo do san-
mIscu1ino, assenta numa violência original feita •• mulheres. O mito declara gue através de uma cocçio intensa, é a subst4ncia mais pura, que atingiu
MASCUUNOIFEMlNINO 18
19 ~LlNOIFBMININO
t~~
o dItimo grau de elaboraçio. A relação perfeiçiorunperfeiçlo, purezafunpu- mente, noutras culturas, outros sistemas binúios diferentes daquele que se
reza que é a do esperma e dos mênstruos, consequentemente do masculino baseia no calor e no frio podem designar as mesmas pnlticas ou entlo,' como
e do feminino, remete por isso para uma diferença fundamental, natural, nos Intuit, um sistema binmo baseado no calor e no frio pode inverter total-
biológica, na aptidão para a cocçlo: é porque o homem é à partida quente mente ou parcialmente a série das associações conexas. De faeto, Dio existe
e seco que conseguiu perfeitamente aqllilo que a mulher, porque é natural- nesta escolha uma racionalidade fundada na apreenslo objeetiva de um dado
mente fria e h11mida,só consegue imPJrleitamente, nos seus momentos de natural, nem mesmo quando eles parecem legítimos. a preciso considerar
maior calor, sob a forma de leite. estas oposições binárias como sinais culturais e Dlo' como portadoras de um
Este discurso fllosófico-médico, qU(ldá uma roupagem às crenças popu- sentido universal - o sentido reside na própria existência destas oposiç&ls
,,
lares é como o mito, um discurso p~isamente
, ideológico. As correlações e nIo no seu contel1do -; é a liDguagem do, jogo soCial e do poder.
das o~çôes binárias entre si Dlo tê~ qualquer re1açIo com qualquer rea- Q dtscurso da ideologia t~ eempre em toda a parte toda a apareneia
lidade, mas apenas com os valores pbtitivos ou negativos atribuídos desde da razão. O DOS8O ~rio diIc:uno cultural, herdado de Aristóteles, baseia
o início aos próprios termos. Tal comi? o mito, este discurso tem por fun- tambéJQek,em ~ ~, de uma pretensa natureza eterna, uma
çllo legitimar a ordem do mundo e a prdem social. Assim, num todo per- re1açIo aoc:ialin8titUrda. Deste ponto de vista, é interessante considerar o
feito, q,,~ une o mito, a classificação 41>& vegetais e a r;1açI~ ideológica dos discurso científico e médico do s6culo XIX, tal como ele se exprime por
sexos, Detienne [1977] explica (a ParW das lendas nutológtcas da concep- exemplo nos escritos de Julien Virey [ci. ICnibiehler 1976]. Através de evo-
çlo de Ares e de Juvenca' sua irmll; ~camente por Hera) por que razlo luções sucessivas, ele passa de uma caraeterizáçlo dos sexos de tiw binário
a alface~:legume- frio e h\lmido, é co~umida pelas mulheres: é excelente à justificaçlo da dominaçlo de. um sexo sobre o outro, a coberto da argu-
para favprecer a menstruaçio e o boDl;defluxo de sangue, mas o seu corol'· mentaçlo científica mais moderna, objectiva, racional, baseada na observa.
rio é a ftustraçio do prazer. a por esta ~ que os ho~ nunca a comem~ çlo de um dado biológico.' No entanto, nada mais nos é dado para além
com medo da impotência e de serem· pnvados do deselo e do prazer (f01 da reconstituiçlo do discurso de Aristóteles, ou dos esquimós Intuit, ou do
a alface ~ue tornou Adónis impotente), Porque o prazer sexual pertence por dos Baruya da Nova Guiné [Godelier 1976]. Para Virey, o casal ideal é um
direito aos homens, devendo as mulheres contentar-se em conceber e «macho moreno, peludo, HCO, qrunu e impetuoso (que) acha o outro sexo
preparar-se para tal através do cons~o dos alimentos adequados. delicado, hrlmido, liso e branco, tímido e pudico •. :aa energia do esperma
O pensamento grego condicionou a hossa cultura ocidental, como se verá. que confere a segurança e a coragem às mulheres casadas: cé certo que o
Mas como explicar, a Dlo ser por copstantes próprias do trabalho simbó· esperma masculino impregna o organismo da mulher e que ele lhe aviva
lico, com base no mesmo material, Í8Jo é, na relaçio social entre os sexos, todas a funçoes e as aquece». A mulher possui uma sensibilidade «requin.
que esta mesma lógica dos contrários, das oposições binárias com valores tada» devida aos seus tegw,nentos elásticos e finos e à sua ramificaçlo, mais '
positivo e negativo, se encontre nas sociedades onde a influência do pensa- intensa do que no homem, dos nervos e dos vasos sanguíneos sob a pele.
mento grego Dlo se fez de modo algum sentir? Esta sensibilidade requintada dá-lhe uma aptidão particular para o prazer,
a o caso do pensamento taoísta oQde o yin e o yang são dois princípios uma inflamaçIo fdcil das paixões e, portanto, um tendência grande Para o
consti~tivos do universo, euja existêllcia harmoniosa está baseada na unilo impudor, a depravaçio, mas também a impossibilidade de se concentrar e
cllll'lUDCflte
percebida dos contrários. Yin é o feminino, a terra, o frio, a som- de reflec:tir, aetos que 810 por si sós eminentemente e naturalmente mas-
bra, o Norte, a chuva, o inferior; yang é o masculino, o céu, o calor, a luz culinos. Esta mesma sensibilidade, que atribui por natureza à mulher o cui.

l'
do Sol, o Sul, a impetuosidade, o su~rior. Entre os Inuit do Arctico Cen- , dado da crianças, dos doentes, dos velhos, gera também sentimentos peri_
traI [Saladin d'Anglure 1978], onde Lua é do ~ masculino e onde o Sol I gosos e essa é a razlo pela qual o homem tem a obrlgaçlo de a controlar
de perto. Diz Virey em De l'éducatWn (1802) que, se a mulher é fraca por
constituição, a natureza quis portanto torná-Ia submissa e dependente na uniIo
dos
o calor,
termos
o cozido
em presença,
e a cultura
o frito,
do olado
cru da
e amulher,
naturezaoes~o
nuto do
dalad~
ongem
do hOflem,
Dlo faz sexual; ela nasceu portanto para a doçura, a ternura e até para a paciência,
das mulheres nada mais para além de «homens rachados»: foi de um homem a docilidade; deve portanto suportar sem queixume o jugo da dominaçio para
éque
suanasceu
irmã, aonde, ao contrário
primeira mulher, dose a exemplos gregos e chineses
mulher procriadora é apenaspara
umalguns
saco, t manter a concórdia na família através da submissão.
um recipiente que abriga temporariamente uma vida humana gerada pelo Contrariamente ao que pensa Yvonne Knibiehler, nlo se trata de um
homem. Sempre confmada aos espaço doméstico, ela só pode sair da ordem ponto de vista individual «ingenuamente- falocrata influenciado por estereó-
masculina onde se encontra através de uma evasão no sentido real da pala- tipos da época, mas sim de uma exposição constiuída, sob a forma douta,
vra que a conduz à morte por esgotamento. com arquétipos universais. Este texto justifica, de maneira pensada, os juí-
Muitos outros exemplos, africanos, indonésios, americanos, ele., se pode- zos de valor populares do tipo daqueles que foram enumerados no início
riam enumerar [cf. Héritier 1978; Ingham 1970]. Em todos os casos, con- deste artigo. Ele esd no prolongamento do pensamento de Aristóteles, que
juntos de reduçocs simbólicas conferem sentido às práticas sociais. Natural- elaborava ele próprio racionalmente arquétipos muito anteriores, e prefi-
21 MASCUUNOIPIMININO
20· (
. ~...
p. . ..
gora O diacuÍ10 dos m6dicos alienistas e higienistas do ~ XIX,e&pe- Existe, DO entanto, um tipo particular de mulheres que Dlo se compocwn
cialmente no que respeita à histeria feminina, e em particuJar o disc:urao com a reserva e a modátia do seu sexo, maa com qreasividade, arro"neia
de Freud sobre a inveja do pénis (P",imeitl): a mulher DIo tem esperma e aud4cia. NIo t~ contenslo nas palavras nem nos aetos (algumas urinam
nem capacidade natural para o produzir. publicamente como homens, cantam cantos de homens, intervem nas con-
O discurso simbólico legitima sempre, como vimos, o poder muc:u1ino, versas masculinas). Este comportamento existe pari panu com um domínio
quer seja em virtude das viol!nclas iniciais que as mulheres teDham feito perfeito das tarefas tanto masculinas como femininas que elas executam.
sofrer os homens e, por conseq\lêDda, de uma m4 utilizaçlo do poder quaDdo Fazem tudo mais depressa e melhor do que as outras. Orientam os seus
elas o detinham nas suas mIos (mito ona da Terra do Fogo), quer seja em próprios assuntos sem 'o apoio dos homens e por vezes at~ nem deixam que
.virtude da impossibilidade cnaturaP, bio16gica, .na qual se encontram, de o marido empreenda seja o que for sem o seu consentimento. Pensa-se que
aceder ao grau superior, o do homem. Em todos os casos, o homem 6 a sejam activas sexualmente e Dlo convencionais no amor, mas elas próprias
medida de todas as coisas: ele cria a ordem social. Os Baruya da Nem ~, apiram a uma maiot virtude do que as outras mulheres. NIo temem, em
sesundo Godelier, exprimem direc:tamente este mesmo conceito: as mu1he- . caso de adult&io, ser arrastadas na praça pl1bliea porque as acusam de estar
res representam a desordem; sIo certamente nWs criativas do que os homens, prontas a defender-se através de feitiçaria. Não temem tamh6m. as conse-
maa de forma trapalhona, deaordenada, impetuosa, irret1ecIida. Deste modo, quencias místicas dos seus aetos. Finalmente, têm direito, tal como os
no princípio dos tempos, foram elas que inventaram as tlautas e o arco que homens, a organizar danças do Sol e a participar nas ordálias. Elas tem a
os homens depois roubaram e que do o almbolo do poder masculino. Mas t1ÍOI'Ç8II.
elas tinham montado o arco ao contrúio e matavam às cegas, de maneira O que ~ que entlo é preciso para se ser reconhecida como mulher com
andrquica, l sua volta. Os homens, depois de o terem roubado, montaram coraçlo de homem entre os PieganiOscar Lewis indica que é pRclso a com-
o arco correctamente: desde entlo, o arco mata como deve ser. Onde as binIçIo de duas características: ~ pteeiso ser-se rica e ter uma pdsÍçAosocial
mulheres criativas trazem a desordem, o homem traz a ordem, a medida elevada; ~m dessa, ~ preciso ser tasada. Tambl!m ~ melhor ter mostrado
razoável das coisas. Assim falam o mito e os discursos· simbóliCoS. na idncia sinais precursores, ter ,lido uma filha preferida com um dote
Como explicar entlo o estatuto DIo particular, entre outros ttxemplos,
das matronas iroquesas? Iudith Brown [1970aJ declara que as fontes anti- de
tender
cavalos.
comportar-se
Uma mulher
comopobre
uma mulher
senlespancada
de coraçAode
ou metida
homem.
a ri~o
Cerfas mulhe-
se pre-
gas Dlo permitem saber o modo de designaçlo das «matronas», dhefes das res SÓ se tomam tICOraçIode homb. depois de muitos casamentos e viu-
grandes casas. Mas, ela própria, seguindo as pisadas dê outros abtores, as vezes sucesaivasem que herdaram Jma parte dos bens dos ~ defuntos.
desiana segundo o termo de decanas de uma certa idade (,lderlj he4ds of Uma vez tomadas «coraçio de hotnem-, casam (esquema mascUlino) com
houuIwlds). Daí concluímos que se tratava provavelmente de mUlhefes de maridos mais novos do que elas (dtlco a vinte e seis anos, segundo as esta-
idade avançada, e, se o seu turno à frente da casa DIo se efectuavt automa- tfstic:as de Oscar Lewis) que elas dominam sob todos os pontQi de vista.
ticamente por simples sucessAo,tratar-se-ia de mulheres de idade ~ pode- O casamento ~, pois, uma necessidade absoluta para se ser «coraçlo de
1'0888 do que outras, em earácter, em força de Animo, em autoridade. Deve homem» e 6 dele que prov~m riqu~za e estatuto elevado. a, aliú~ lamentá-
pois postular-se que o termo «matronas., utilizado pelos antigos autores, vel que Dlo saibamos mais nada ~bre o sistema de pensamento dos Pie-
designa mulheres de idade, ou seja, para dizer as coisas de· uma outra gan, maa ~ muito possível que as liideiasaristotélicas do tipo da .que Virey
maneira, segundo a sua verdade fisiológica, mulheres que ultrapaasaram ou desenvolveu em D, Ia f,mm, (1823) (a mulher casada tem qualquer coisa
. atioairam a idade da menopausa.:
A menopausa DIo 6 um assunto sobre o qual se possam encontrar. mui- mais viril, ~ masculina, mais iegura, mais audaciosa do qut a tímida
tas info~ na literatura antropológica; assunto sobre o q" DIo se quando se casam,. como se a ene , do esperma imprimisse lI1jÜsrigidez
pel18l, assunto incómodo, assunto C1tnsurado, se Dlo mesmo tabl1~Fala-se ee secura li
delicada ~suas fi~raS)
... Vêem-se raE próximas
fossem muto muitodasgordas perdeta
suas. O homóm,gordura
a qua-
do avanço da idade, da· velhice, como estádio da vida, maa nIo.tlo limiar lidade do esperma do homem, fatIa mulher. a qualidade da mulher.
em que tudo se torna irreversfirel. No entanto, sobressai de mod~ ~ nos a necessário que uma condiçãO[~plementar seja preenchida para se ser
relatórios antropológicos, quando se trata de mulheres, que o estatuto indi- uma mulher «com coraçlo de ho~. Ela DIo faz explicitament~ parte das
vidual delas tem tendência para se modificar na velhice, isto é, quando che- condições enumeradas pelos info.dores, o que nfo nos deve. surpreen-
garam à menopausa ou, no caso de serem estéreis, nas situaçõeS em que der, pois se trata da condição ~ flUI non: é preciso ter uma idade avan-
as mulheres nIo doou já nIo do capazes de conceber. çada. Nas cento e nove mulheres tasadas da amostragem de Oscar Lewis,
Um artigo muito interessante de Oscar Lewis [1941J fala daquelhs a quem catorze do do tipo lCCOraçlO de hdlnem». Uma tem quarenta e cinco anos,
ostndios Piegan canadianos chamam as mulheres com «coraçio de homem». outra tem quarenta e nove, as outras têm entre cinquenta e dois e oitenta
Nesta sociedade, descrita como perfeitamente patriarcal, o comportamento anos. Uma 11nicatem trinta e dois anos. Oscar 1..ewis, por consequência,
feminino ideal é feito de submisslo, reserva, doçura, pudor e humildade. junta aos dois critérios anteriores o da maturidade. Mas a palavra é certa-
22
MASCULlNOIPEMINlNO 23 • ~UNOIPEMININO
Í'~~
mente demasiado fraca. Para a maior parte da amostragem, trata-se de estéril Dio é ou j4 Dio é propriamente uma mulher. De maneira positiva
mulheres fora do período de fecundidade, na menopausa. Sobre nenhuma ou negativa. Mulher falhada ou homem falhado, ~ estll mais próxima do
"

delas é feita alusão aos fllhos que tedo podido dar à luz, o que é lamentá- homem. Deste modo, nio é o sexo mas a fecundidade que estabelece a dife-
vel porque teria sido interessante saber se a mulher de trinta e dois anos, rença real entre o masculino e o feminino, e a dominaçio masculina, que I I

considerada como mulher com «coraçIQde homem», esteve ou Dio grllvida. cony~ agora tentar compreender, é fundamentalmente o controlo, a apro-
De qualquer maneira, Oscar Lewis declara ele próprio que o desacordo entre priaçlo da fecundidade da mulher, no momento em que esta é fecunda.
as informaçOessobre o canleter «co~q de homem» desta ou daquela mulher O ~, as componentes psicológicas, as aptidOes particulares que compOem
apenas diz respeito às mais jovens. " os qulfdros da masculinidade e da feminilidade conforme as sociedades e
Menopausa e esterilidade suscitam imaginários, atitudes e instituições que .-o supostas justificar adominaçlo de um sexo sobre o outro, é um
extremaFente contrastados segundo .,'sociedades, e todavia explicáveis con- produ~ da educaçio, da ideokJIia, portanto: .Nlo se nasce mulher, torna-
soante ltIPesma lógica simbólica. Se a'modelo iroqu& ou piegan Dio é raro
no que respeita às mulheres de idadq, outras sociedades, africanas em par- -SC» (SlJnooc
tido em que de Baproir). Deste
este~CIlDteock modo, nIo ou
oanaaImente, existe
seja,instinto
em quematernal no sen-
a maternidade
ticular, fazem da mulher depois da lJlenopausa uma mulher perigosa, que seria algo puramente biológico e que, implicitamente, determinada pela sua
acumw-calor, e sobre quem há o n.co de pesar a acusaçlo de feitiçaria, natu~, a mulher tivesse vocaçlo para cuidar das crianças e, para al~
especiabnente se ela for pobre e vi\lva~e por consequ~ia sem «força»para cUsto, para cuidar da casa. A maternidade é tanto um facto social como um
reagir e Se defender. Não é pois o c'pntrllrlo do exemplo piegan, mesmo facto biológico (o mesmo acontece com a paternidade) e Dio há nada no
facto biológico em si que explique por que razIo a mulher deve ser ineluta-
se uma
de plhadela
hom.:m- que, rllpida o pudessesefazer
inversamente, ri Qassupor,
acusações de àqualquer
porque mulher de «coraçAo
ordem por- velmente ligada às tarefas domésticas e a um estatuto de subordinaçio.
que tem a .força» para responder imfunemente mediante a feitiçaria, tem Se nos basearmos nas an41ises antropológicas, 6 evidente que DIo pode-
de ser pca e casada. .. mos ~erizar as mulheres como universalmente esmapdas e dominadas
Na D1!ÚOr
parte das populaçOesdi~ primitivas, a esterilidade - feminina, pelo desejo daquilo que lhes falta: o falo. Segundo a teoria freudiana, a cona-
ci~ncia desta aus~ncia é que cria a inferioridade feminina. De facto, a teo-
nhecich(.•.. é dado
entend~-$e, a dominação
que a absoluta.
esterilida~AWsnem sempre.
masculina DioAssim, entre os Nuer
é geralmente reco- ria freudiana a este respeito é em si mesma um produto da ideologia domi-
da Afrij:a Oriental, uma mulher q~o é reconhecida estéril, isto é, depois nante, e o desejo de falo é um efeito secund4rio, e nIo a causa, do tipo
de ter lÍ~docasada e de ter permanec1CWsem filhos durante um ';Crto n~ de sujeiçlo femininil que se pode encontrar na nossa sociedade. Inversamente,
de anoll (possivelmente até à menopausa?) regressa à sua fam11iade ongem um certo ndmero de prllticas sociais ou mesmo corporais revelam um desejo
onde é a partir desse momento considerada como um homem: «irmIo» dos do macho em se apropriar do que constitui a superioridade fundamental
seus i.rmIos, «tio» paterno dos fdhos dos seus irmãos. Ela vai poder consti- do outro sexo: a fecundidade, a capacidade de se reproduzir. :a o caso dos
tuir um rebanho, como um homem, com a parte que lhe cabe enquanto ritos e comportamentos de «choco», em que é o marido que mima as dores
tio, ou com o gado entregue como preço da noiva para as suas sobrinhas. de parto, ou entlo se mete na cama, descansa, recebe os parabéns, as visi-
Com este rebanho e com o fruto da sua própria actividade pessoal, ela vai
tas e as prendas, se queixa do seu cansaço, enquanto a esposa, desembara-
poder por sua vez pagar o preço de uma noiva por uma ou duas esposas. çada, se ocupa dos seus afazeres habitUais, sem que o seu estado suscite
n enquanto marido que entra nestas relações matrimoniais institucionais.
As suas esposas servem-na, trabalham para ela, honram-na, testemunham-
masculinas, entre 08 Wogeo melanésios, que en periodicamente no mar,
-lhe o respeito devido a um marido. Ela recruta um servo de uma outra
etnia, Dinka na maior parte dos casos, a quem pede, entre outros serviços, fazem incisOesno pénis e deixam escorrer o sangue água [Guidieri 1975].
umaA atençlo particular
apropriaçAo atravésà do
sua corpo
volta. está
Ou destinada
ainda~. falsas regras menstrusis
o insucesso: Dio pode
o serviço sexual da sua ou das suas esposas. Os filhos nascidos destl\ rela-
nunca haver seDio simulacro. Ela passanl, pois, pelo controlo: apropriaçlo
ções são seus, chamam-lhe pai e tratam-na como é costume tratar um pai-
-homem. O genitor só desempenha um papel subalterno, ligado talvez efec- das próprias mulheres e dos produtos da sua fecundidade, repartiçAo das
mulheres entre os homens. As mulheres são fecundas, inventivas, criam a
tivamente aos seres que gerou, mas sem passar de um servo, como tal tratado
vida, mas o homem traz a ordem, a regulamentação, a ordem política. Este
pela mulher-marido, mas também pelas esposas e pelos filhos. Serll recom-
controlo é tornado possível através da desvantagem que acompanha a fecun-
pensado pelos seus serviços com uma vaca, «preço da procriação», de cada
didade: a mulher grllvida ou que amamenta tem uma menor aptidão para
vez que se casar uma das fdhas que tiver gerado.
Quer seja absoluta ou relativa, isto é, devida à idade, à menopausa, a este- a mobilidade do que o homem. Aasim, foi possível' demonstrar que, entre
rilidade e o corpo social das instituições e comportamentos que ela suscita os Bosquúnanos, caçadores-recolectores nómadas, sem animais domésticos
podem sempre ser explicados segundo os esquemas das representações sim- que lhes possam fornecer leite, um homem percorre entre cinco mil a seis
bólicas atrlls analisadas. O que sobressai, em todo o caso, é que a mulher mil quil6metros por ano e uma mulher entre dois mil e quinhentos e três mil.
I' MASCUUNOIPBMININO 24
) 25
••~I"
...
MASCUUNOIPBMINJNO

o entrave 1 mobilidade 010 implica por isso uma inferioridade das apti- só conhece comof ama a mie durante anos e continuará a dirigir-ae-lhe
d4lel ltaicas (nem, a fomori, das aptidoea intelectuais), no entanto, deve ter quando já 010 mamar, e isso tanto mais cnaturalmeotClt quanto o confina-
acarretado um certo tipo de repartiçlo de tarefas, no interior das socieda- mento social do papel de ama, de guarda e de maoutençlo tiver existido.
dea pn!-históricas de homens selvagens, caçadores-recolectores, que depen- A mie pode ser elevada muito alto, considerada com muita reverencia, mas
diam unicamente da natureza (sabe-se que a agricultura e a criaçIo de gado isto 010 es~ em contradiçlo com a noçlo mesma de poder masculino.
do invenções relativamente recentes da história da humanidade). Para os A apropriaçlo e o controlo da fecundidade das mulheres, o coofinamento
homens, a caça aos animais de grande porte e a protecçlo dos desarmados das mulheres no papel de amas facilitado pela dependência allioentar da
contra os predadores de toda a ordem; ls mulheres, a vigilAnciadas crian- criança, em suma, esta espécie de ~uestro, foram acompanhadas pela cria-
ças de peito e a colheita dos recursos alimentares de mais fácil acesso que çlo de capacidades técnicas especiàlizadas, ou seja, pela utilizaçlb exclusiva
a caça grossa (010 é fácil caçar com um bebé agarrado ls costas): repartiçlo por parte do sexo masculino de certas técnicas que necessitam de uma apren-
que nasce de limitações objectivas, e 010 de predisposições psicológjcu de dizagem real ou &lsamente sofisticada, mas às quais a mulher nIo tem acesso
um· ou de outro sexo para as tarefas que desse modo lhes do distribuídas, sem que nada na constituiçlo feminina explique a razlo disso. Os homens
nem de uma imposiçlo física feita por um dos sexos ao outro. Repardçio criaram um campo reservado, tal como havia um campo reservado, inaces-
que 010 comporta em si mesma qualquer princípio de valorizaçlo. sível, das mulheres: o da reprodu~o biológica. Deste modo, para retomar
O controlo social da fecundidadc das mulheres e a divido do trabalho um exemplo dos povos caçadores-recolectores, entre os Ona da Terra do
entre os sexos do provavelmente os dois ~ da dcsigualdadc sexual. Por- Fogo, a caça com arco é apan4gi(>dos homens, que aprendem a fabricar
tanto, convém entender os mecanismos que fazem desta dcsigualdadcuma o arco, U flechas e eventualmente o veneno. Desde a mais tenra idade que
relaçlo valorizada de domínio/submisslo. . eles aprendem a atirar com o arco, e esta aprendizagem é-lhes, exclusiva-
mente reservada. Anne Chapman ,'demonstra que, sem aprendÍiagem idó-
O parentesco é a matriz geral das relaçOes sociais. O homem d um ser oca, as mulheres 010 podem, no sêntido físico da palavra, servir-lIe daquele
que vive em sociedade; a sociedade só existe dividida em gruPOSl que se objecto. O domínio reservado de aptidões técnicas altamente es~ializadas,
baseiam no parentesco, e ultrapassam esta divido original através da coo- corolirio de uma repartiçlo sexual'prim4ria do trabalho e ba~ em limi-
peraçlo. taçGes objectivas, tem como efeito 'Uma nova limitaçlo das mulhetres a tare-
A instituiçlo prim4ria que d4 origem à solidariedade entre os grupos é fas que também requerem um conhecimento e uma capacidade técnica (nlo
o casamento. Um grupo que só contasse com as suas próprias forças inter- próprias de um sexo: os homens também podem efectuar as colheitas em
nas para se reproduzir biologicamente, que praticasse o incesto, e apenas tempo de pemtria), mas que nuo!:a f&rlo parte do domínio reservado aos
o incesto, estaria condenado à destruiçlo, indiscutivelmente. A troca das homens. O importante do é que· de tempos a tempos a1gumall mulheres
mulheres entre os grupos é a troca da vida, uma vez que as mulhcres for- consigam chegar ao domínio reserVado, é a própria razlo de ser,da existên-
necem os filhos e o seu poder de fecundidade a outrem que 010 aos seus cia do domínio reservado que est4 em causa. .
próximos. O nl1cleo fundamental da dominaçlo masculina, articulada com A isto vem juotar-se o trabalho 'intelectUal,a criação ideológiCa,quevimos
as restl'içOesecoDÓmicasda divido das tarefas, es~ certameote aí: na renl1n- em funcionamento nos simbolismo. expostos atrás: atribui-se wtl !valor desi-
cia ml1tua dos homens a beneficiar da fecuodidade da suas filhas e·das suas gual la tarefas desempenhadas. /I. ;parte das mulheres, no que respeita à
irmIs, das mulheres do seu grupo, em benefício de grupos estraogeir!Js. A lei colheita, atinge por vezes mais d,70 por cento dos recursoslÜimentares
da exogamia, na qual se baseiam todas as sociedades, deve ser ehtendida
como lei de troca das mulheres e do seu poder de fecuodidade entre,bpmens. do grupos
docia:' Da sociedades
o verdadeiro prestígio
de caçad~Jjes-recolectores,
es~ :IJ,gado1 funçlo do
mascaçador.
isso DIq•.
~!s-nos
~ impor-
con-
O que é no~ve1 é o facto de haver sempre, através de regras d' ~ fron~ o I1ltimo enigma. Ô. que é valorizado pelo hometn, do lado
e de aliança particulares, apropriaçlotinicial por parte dos homens ao poder do homem, é Certamente o facto 4e ele poder verter o seu saDg\le, arriscar
especttlco de reproduçlo das mulheres do seu grupo, bem como: das que a sua vida, tirar a vida dos outrost ·através da decido do seu livre-arbítrio;
lhes do dadas em troca das suas. :a só neste ponto que a viol~, a força a mulher «vê» correr o seu saoguee dá a vida sem necessariamente o que-
podem ser evocados como explicaçlo I1ltima. . rer ou poder impedi-Io. Nisto ~de talvez o motor fundamental de todo
A apropriaçlo do poder de fecuodidade das mulheres, vital plU1la cons- o trabalho simbólico exercido sobre a relação entre os sexos. [F. H.).
tituiçlo e a sobrevivência de qualquer sociedade, mediante a troca das·mulhe-
res, é acompanhada pelo coofmameoto das mulheres neste papel. Teremos
.a mie e a ama de leite. :a tanto mais fácil quanto a criança é amamentada
durante longos meses. Esta situaçio só termina, nas sociedades que 010 BachoCcn, J.
conhecem o aleitamento artificial nem as modernas técnicas de alimentaçlo 1861 Dtu Mllltm'lcht. EiM UIltmllt1nml ilNr dil GyMiMArcuie tÚr alun WI1, IIIIC" ih"r
dos bebés, por volta dos doia anoS e meio ou mesmo dos tres anos. A criança ~_ rmd rw:"tlie1mt NIIlIIr, KniI UDd Hoft"mann, Stuttprt.
MASCUUNOIFEMININO
26

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oBthnohiatory.
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XVII, 3-4, pp. 1Sl-67.

Chal'9~ ~ Powcr ÍII o HIUIling SocWty. The Scl1c'rri1711


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L'H 01IllDe., XV ". 2 pp 103·19 • o estudo do parentesc~ é O domínio porexce1ência da antropologia.
He!ritier, !-,~,,,m_.ali ,1IJdCyAJ_ O temor reverencial que isso incute deriva um pouco paradoxalmente da
1978 F. Flctmdill" . -'__ " Cnu",,,
ntrilitt. La tradIIclÍOll d, cc' no/lOlUauno L_A "'"":"5"'- ••
ICimlifiqIMI, in E. Sullerot (org.), Le Foit {tmittin, Fayard, Pans, pp. 387-96.
ideia, comum aos Dio-especialistas, de que não é necessário ser um técnico
para -compreender e até para praticar o que releva das ciências sociais. Para
In8= JOn Muiam Folk MedicÍIII, in oAmerican Anthropologiab, LXXII, 1, pp. 76-87.
além disto, como já acontecia com 'família' e 'cRl18mento', o termo 'paron-
Kaberry, Ph. M.
1939 Aborifirral WOIII/JII, Sacred and Pro{_, Roudedge, London. tesco' tem uma aparência tão familiar e benévola que faz al10rnr em quem
Knibiehler, Y. ., m . oAnnalea., XXXI , 't.

o escuta ou lê experiências tão íntimas e naturais que ninguém julga igno-
1976 ta na"',., {tmÍIIÍIII /JII umps dII Codc eífIil,
rar do que se trata nem sequer nutrir a suspeita de que as suas experiên-
1724 J.-F.
Lafitau, Mcnrs de, ,_,u amkiqllaÍIIs, compariu ou _" . ump"
de, prtIIIII" Sa••_IR
•••••••• cias familiares e aparentemente inteligíveis Dlo sejam as mesmas para todos
l'afDe!, Paris. os povos do mundo - à excepção de certOs costumes exóticos conhecidos
Lewis, O.
1941 Ma~,alf,d _11 /J1IIOIIf . «A.mencan
111,North PiIgaII, ID . Anth ropo oglSb, XLIII , I' e invejados, como a poliginial A literatura antropológica sobre o parentesco
destrói cruelmente estas ilusões.
2, pp. 173·87. .
De. facto, estas (tuas ideias do radicalmente falsas. Entrar no domínio
Saladin d' Anglure, B. . 1IIIUCII1'
1978 . L 'h_ (tmpl), I, {tI, (imiq) " '" /IImílrf (q/JII).. GIl " cm:" dll poIIfIOIr. 11I do parentesco significa entrar numa esfera de estranheza: um velho chama
cha lu llIuit de l'Arcliqll, cilJl/r/JI, in oAnthropolOSlca., n. S., XX, 1-2, pp. 101-44.
a uma rapariga «tnAo; um homem que goza da consideração geral pode casar-
1824 J. AE.Narratiw
Scaver, o{ Ih, Li{, 0/ M" MO'Y,JIIfIÚDII, . eanan •••••••
Beamis, •.••:_-..
•• N Y -se com a ftlha do irmão da sua mie, mas é considerado o mais miserável
Whyte,
dos seres, expulso, talvez espancado, ou condenado à morte, se tiver rela-
1978 M.Crou-eultural
K. ., probhm,
,1IId~, o{ womm and lhe mah buu vlOr Seienc:e
_1>_1._'
m ••••••••
ções suspeitas com a fIlha do irmlio do seu pai, ou até com a neta do irmão
Research», XIII, 1, pp. 6S-80.
do seu avô paterno; uma mulher brinca livremente com o irmlio mais novo
do seu marido, injuriando-o com termos obscenos, mas baixa humildemente
os olhos perante o irmão mais velho, a quem serve de joelhos e a quem.
o A dominaçlo do 1wmemsobre a mW1Icr(eC. IIl'fIOIllnhor) m&;nifeata-se~m tal evidbIc:ia .na nem sequer dirige a palavra ...
,ociedade ocidental DOplano do simbólico (eC. ,€IIIbolo), do poUueo (eC. polflica) e do econóDUCO
(eC. «OIIOIIIia), que'parece um reaultado de uma inferioridade ~jectiva e natural ~cf. ~lIIs4o/intc-
Tudo isto não significa, no entanto, entrar no reino de um total arbí-
INf'O, na",,.,.a) da mulher relativamente ao ~omem. Toda!ta, embora a aMlise hllt6=
hislma) e antropo16gica (cf. anthropos) de SOCIedadeaaetu8IS e passadas,. nIo ~ . trio. Os conjuntos
funcionam de mododiferentes
equilibradodo(quando
nosso, ela~s por outras
estas sodêdades não sãosociedades,
perturba.
nada que altere easa vislo, tnta-lIe, na realidade, de um reaultado de viIlles ~~ (cf.
ideologia) do problema em queatlo. De Cacto, a inveatipçlo de uma «verdade onainal. (cf. ~~-
turalculturaI e origens) eCecruadaem sociedades ditas primitivas (cC.~rimitifIII,~CIfJI-
I das pela introdução das religiões reveladas e pela extensão selvagem da civi.
lização ocidental) e encontram intelectualmente justificação aos olhos dos
f
IWdo' caça/colheita poIlorltia), se por um lado manifeata como condiçlo de aistencia da sociedade seus próprios membros através da própria harmoIÚada sua adequação a todos
hu~a e da ~açlo da eapc!cie, o tabu do inculo e a otroea de mulheres» (cf. lfIdoga-
mial'XDf/Jlllia, {amQia, ca,a_lD, pal'lnluco), por outro, faz en~der esta t~ como
tado de uma spropriaçlo (cf. propriMl4dc) do poder (cf. podcrIlIIIIOI'idadc) ~ fecundidade da
0= os domínios da actividade social, económica, política, natural e simbólica.
Há já muito tempo, desde o livro de Morgan [1871] sobre sistemas de con-
por pane do homem (eC. hDlllllltlmldh,r)j lato tornou-se posslvd ~evldo • me~r diaponibUi- sanguinidade e afmidade da fam11iahumana, que os costumes de parentesco
dade da mulher na descoberta e produçio dos meios de subslateocl& (cC. domuncaç4D, rmmos, diferentes dos nossos Dio do considerados com um interesse folclorístico como
,xced,",,) devido ao seu empenho, bastante maior do que o do homem, DOproceaao reprodu-
tivo (cC.,'para aipos aspectos partlcularea, hillcria), pelo qu~ menos como produt~ ,e ~, costumes «selvagensllou «bárbarosll destituídos de sentido, mas que se pro-
com lodu as coDaequêoeias que daqui tenham podido advlr, ate! no plano das 1/I$/ItII1f1lu. curam compreender e e1ucidar segundo as suas leis de funcionamento.
28 29 PARENTESCO

~t~~
o estudo do parentesco é, pois, o estudo das relações que unem os \ remeter para Murdock 1949; Fox 1967; Augé 1975; por outro lado, dar-se-
homens entre si mediante laços baseados na consanguinidade, enquanróiela- -li como conhecida a obra fundamental de Uvi-Strauss Les slnlCturtS lli-
çlo socialmente reconhecida, e na afmidade (a aliança matrimonial); tais rela- mentoim de Ia partnlé, 1967]. Parece preferível apresentar novos pontos de
ções encontram uma traduçlo nos sistemas de designação mútua (as termino- reflexlo e dados mais recentes no 4mbito da pesquisa sobre o parentesco,
logias de parentesco), nas rtgras de jiliaçiJo que determinam a qualidade dos e isso segundo três directrizes: 1) quais são as leis gerais a partir das quais
indivíduos como membros de um grupo e os seus direitos e deveres no inte- slo elaboradas as terminologias de parentesco; que possibilidade existe de
rior do grupo, nas rtgras de aliança que orientam positiva ou negativamente se chegarem um dia a estabelecer as correspondfncias profundas que unem
a escolha do cônjuge, nas regras de residência, nas rtgras de transmissão dos sistemas terminológicos, regras de ftliação e regras de matrimónio?
elementos que constituem a identidade de cada um e, fmalmente, nos tipos 2) pegando directamente nas questões levantadas por Uvi-Strauss (1965),
de agrupa""ntos sociais nos quais os indivíduos estio ftliados. de que modo funcionam as estruturas semicomplexas da aliança? 3) por
A especificidade do estudo antropológico do parentesco e o motivo pelo \lltimo, como surge a passagem b estruturas complexas?
qual ele se apresenta para muitos como um empreendimento aterrorizante
residem no facto de as unidades discretas do seu material humano, que cons-
tituem o seu objecto (sobretudo no que respeita aos campeis privilegiados 1. As leis gerais do parenlestO
do estudo das terminologias e das regras matrimoniais), se prestarem natu-
ralmente, por assim dizer, a análises técnicas de uma grande abstracção Foi dito que o estudo do ~tesco se refere às relações que unem os
(pense-se nos estudos formais e componenciais de terminologias de paren- homens entre si atrav& de laços. baseados na coosanguinidade e na afini-

.' \ ou
tesco, na moda durante
de Goodenough), um certo período, através
a formulaç(lesalgébricas de obras
e, em certa de sem
medida Lounsbury
dúvida dade.
blemasAe utilizaçlo do termo
remete para debates'coapanguinidade'
antigos retomadossuscita imediatamente
recentemente com a pro-
teo-
ria da selecçio de parentesco (lein sel«tion), proposta pela sociologia
\I menor,
tamentosmatemáticas [Buchler
por computador [cf.e Selby 1968; Ballonoff
Kunstadter 1963). 1974], e, ainda, a tra- americana. Antes de mais, trata~se de um problema de definiçlo: deixe-
T\ldo isto parece muito afastado dos dados concretos da experiência. mos de lado o facto de, em direito romano, tal designar exclusivamente
Porém, Dlo se deve crer que, por essa razlo, se submetam sempre os fac-
tos ao leito de Procustes, apenas pelo prazer de nos entregarmos gratuita- os parentes em
entendamo-Io como linha
um paterna, bs agnados,(dir-se-li
conjunto',cognlltico com excluslo
também dqs uterinos;
••ijilateral••ou
mente aos jogos do espírito: o computador tornou-se o meio indispensável t<indiferenciado••), ligado ao Ego por intermédio de homens e de mulheres,
para atingir as realidades do funcionamento matrimonial das sociedades que em ~ directa ou em linha: ~olateral, segundo cadeias, ,enea1ógicas
de outro modo Dlo se poderiam atingir, e as análises formais de Lounsbury preClSllS. ,
(1964), por criticllveis que possam ser, permanecem entre as maisestimu- ~ claro que esta defmição, propnamente biológica, RIo se adap.ta às socie-
!antes e esclarecedoras que têm sido escritas sobre a lógica interna!dos sis- dades humanas onde a co~e é o resultado de uma estólha. Podem
temas de parentesco crow e ornaM. Todavia, uma boa parte dos trabalhos dar-se alguns exemplos: em muitàS sociedades, incluindo a nos., epater ist
de tipo componencial ou matemático desemboca apenas numa tradu4ão labo- quem nuptiae demonstranb; a a4dpçlo cria laços de consangQiilidade fictí-
riosa n()utra linguagem d~ factos cuja concatenaçlo teria ficado totalmente cia cujos efeitos 810 tão constranltdores, juridicamente, quantel os da con-
clarificada através de uma exposição em língua natural. sanguinidade real: Dlo é lícito c~ com o irmão adoptivo; na' sociedades
. Um outro motivo de temor reverencial reside 00 facto de Dlo eiistirem, que tem um sistema de metades Côm casamento com a prima direita bilate-
ao que parece, domínios de antropologia que tenham suscitado disc:u.sOestio ral (cf; o artigo «Endogamial~), os primos cruzados, isto é, os filhos
vivas, tio duradouras, tio técnicas e tio bizantinas (e, por isso, apareJÍtemente de um irmão e de uma irmã, nIO se consideram em si como consanguí-
reservadas aos iniciados), como as quól:>puseram durante anos, por exemplo,
, os defensores da teoria da füiaçAoe os da teoria da aliança [cf. Barnei 1971; neos, ~o
que pertencem Porafins, ou seja,a,~etades
nascimento ~mo indivíduos casllveis
düerentes; e cailados,
só os prürlos dado
paralelos
Dumont 1971], ou as que se desencadearam em tomo do problem~4a exis- são considerados consangulneos: da filhos de dois irmãos pertencem à mesma
metade e não podem casar entre,lIi, tal como os fühos de duas Irmãs (nesta
! teneia ou Dlo de casamento patrilateral (com a filha da irml do pai [ef. Need-
I ham 1958; Maybury-Lewis 1965», ou"ainda, a um nível mais con~r.eto, as primeira parte do artigo, 'filhos', ~ utilizado sempre como 'filhos e filhas',
I levantadas a propósito das düerentes interpretações que se podem '.fâzer de salvo indicaçlo em contrmo). ,
descrições etnológicas sobre determinadas populações [Uvi-Strauss 1973], ou Portanto, a consanguinidade él nas sociedades humanas, apedlss uma rela-
a propósito da definição dos conceitos utilizados no campo do parentesco. çlo socialmente reconhecida, e 6 característica dos sistemas d~ parentesco
Nada disso constituirá explicitamente o nosso propósito neste artigo, que (conjunto de regras que presideni à filiação, à residência e à aliança) o facto
Dlo visa a exaustlo. Não se procuranl, pois, apresentar uma história ou uma de se distinguir por uma certa autonomia em relaçlo às leis naturais da espé-
crítica às teorias do parentesco nem acervos conceptuais [para tal, basta cie: a reproduçlo dos homens é um meio de reprodução da ordem social.
30 31
PARENTESCO •- ',lfi'"
""- PARBNTBSCO
f'"
Estas três relações naturais exprimem a diferença. a este material banal
na sua universal simplicidade que manipula em toda a parte o trabalho sim-
bólico do parentesco, através de séries de derivações que adiante se verão.
Indubitavelmente, estes factos foram há muito observados no domínio
da análise antropológica: todavia, não foram enunciados claramente como
os elementos de base da combinatória própria a qualquer sistema de paren-
tesco, devido à sua grande banalidade ou, mais precisamente, devido à força
da sua evidência.
Kroeber (1909], criticando a distinção- na altura corrente entre sistemas
terminológicos classificatórios e sistemas terminológicos descritivos, mostra
I!
que o m1meId total das~eren1a posições de parentesco possíveis num campo
de parentela· de exb!Ddo m&:Iia se eleva pelo menos a várias centenas; ! I
nenhuma lfogua possui termos diferentes para designar especificamente cada
Ela f~ parte da representação simbólica de tal ordem a ponto de ter sido
possível dizc;r que um sistema de parentesco existe apenas na consciência I gicos
uma destas posições de parentesco,
são classificatórios. «A nossa e,palavra
portanto, todosinclui
'irmão' os sistemas terminoló-
simultaneamente .
dos homens'. e não é senão um sistema arbitrário de representação. o irmão mais velho e o irmão mais novo e tanto o irmão de um homem como
Isto é in~ontestável. De outro modo não existiriam variações importan- o de uma mulher: compreende ou classifica juntamente quatro relações dife-
tes no modo de classificar, calcular e viver o parentesco, nem existiria a rentes. Apalavra inglesa 'cousin' denota ao mesmo tempo primo e prima,
distinção eIltre regras diferentes, e até opostas, que nos criam tantos pro- do lado do pai ou do lado da mãe, primos que descendem do irmAo oude
blemas. Pode afirmar-se que foi a parili de um dado biológico elementar, uma irmã do pai ou da mãe, primos respectivamente mais velhos ou mais
que não pode deixar de ter sido invariável desde sempre, que o pensamento novos que um determinado indiVÍduo (Ego), ou primos cujospais são res·
humano aperfeiçoou, simbolizou, explorando as possibilidades lógicas de pectivamente mais velhos ou mais jovens que os pais do indivíduo, e Ego
combinações paradigmáticas que este substrato podia fornecer, e elaborou é, ele próprio, no interior desta relação, um homem ou uma mulher. Uma
os grandes tipos de sistemas de parentesco de que se vêem actualmente as llnica palavra inglesa denota portanto trinta e duas relações de parentesco
formas tal como a história da humanidade as modelou. diferentes» (trad. it. p: 311). E se ultrapassássemos o nível dos primos de
Algumas das possibilidades lógicas de combinação não foram, todavia, rea- primeiro grau, acrescenta Kroeber, o nllmero de relações diferentes que tal
lizadas (cf. o artigo «Incesto»): é a sua ausência, mais do que a existência de termo poderá exprimir é incomensuravelmente superior a trinta e dois.
outras, que assinala os pontos fortes destas leis universais que procuramos. Por consequência, Kroeber procura fazer a recensão dos critérios de clas-
Deve ser claro que esta posição implica que estas escolhas de estrutura sificação ou, melhor, dos tipos de relações que são expressas de maneira
foram realizadas independentemente umas das outras entre o pequeno número regular pelo trabalho sintético e redutor que conduz, em lllrima' análise, às
de escolhas possíveis facultadas à reflexão humana desde a constituição do terminologias dúcteis que conhecemos. Ele distingue oito tipos de relações
homem em sociedades. Este ponto de vista recusa totalmente a ideia de uma possíveis que podem ser ou não ser utilizadas conforme os tipos de termi-
distinção progressiva dos sistemas de parentesco a partir de um estado de nologia. São elas, exprimindo o dado biológico de base:
indistinção cognática original, ou de uma predominãncia original do direito - a diferença de gerações, geralmente reconhecid~, com excepção dos
matemo e dos sistemas matrilineares. Mas não recusa a ideia, pelo contrá-
sistemas terminológicos crow e omaha relativamente a certos tipos de
rio, de exteriores
que estas escolhas estejam associadas de maneira sintagmática a im2C- consanguíneos;
rativos aos do dado biológico elementar (sistemas de produção, e&- - a diferença entre as relações de tipo linear ou colateral. Esta distin-
logia, etc.), nem a de que houve, com toda a verosimilhança, para muitos
grupos observados recentemente, importantes mudanças com as vicissitudes ção não é válida, por exemplo, quando um sistema utiliza um ~
termo para designar o pai e o irmão do pai, ou um mesmo termo
da história (veja-se um exemplo da passagem possível de estruturas matrili- para designar irmãos e primos;
neares a estruturas patrilineares no artigo «Masculino/feminino»). I - a diferença de idades na mesma geração;
O dado biológico de base é de extrema banalidade: - o sexo do parente que se nomeia;
_ existem apenas dois sexos, o masculino e o feminino; 1 -
-
o sexo de Ego;
o sexo da pessoa intermediária que estabelece a relação entre Ego e Alter:
_ a procriação comporta uma sucessão natural de gerações;
_ uma ordem de sucessão dos nascimentos no interior de uma mesma um avô é tanto um pai do pai quanto um pai da mãe. Esta distinção
geraçAo permite distinguir os mais velhos dos mais novos. não é-reconhecida pelo nosso próprio sistema terminológico específico;
PARENTESCO 32 33 PARENTESCO

"
- a distinçAoentre parentes consanguíneOs e parentes por afmidade (cri- das nomenclaturas" 'Parentesco Dlo a geração imediatamente superior •
tüio da aliança), devida l universalidade da proibição do incesto; de Ego mas a do próprio Ego, isto é, compara entre si os termos que desig-
- um \1ltimocritério, utilizado mais raramente, que tem em conta o facto nam QS germanos (irmlos e irmIs), os primos paralelos (nascidos de dois
de a pessoa intermediária poder estar sempre presente ou 010: pode irmIos OUde duas irmls) e os primos cruzados (nascidos de um irmão e
renunciar-se l designação de «sogro••, por exemplo, se o cônjuge tiver de um irmã).
morrido ou se tiver voltado a casar, ou entlo podem usar~se designa- Ele estabelece, sob a forma reconhecida actualmente, a tipologia dos seis
ções particulares para caracterizar relações que já 010 existem. grandes tipos terminológicos de parentesco, que, cruzados com as formas
de f1liação, lhe permitem elaborar a lista ·de onze grandes tipos de estrutura
Os sistemas europeus utilizam apenas quatro destes critérios (geraçlo; social. De facto, nIo existe uma relaçao necessariamente untvoca entre regras
sexo do parente ao qual se dá o nome; parentesco de sangue ou de casa- de filiaçlo e sistemas terminológicos, mas, no entanto, nem todas as com-
mento; parentesco linear ou colateral). binações 810 possíveis duas a duas, como ressalta claramente da relaçAo
Lowie [1928] aperfeiçoa o segundo critério, ao nível da primeira geraçlo numérica de 6 ali.
ascendente (a dos genitores de Ego), que lhe parece ser a mais apta a for- Podem representar-se estes seis tipos com as fórmulas seguintes (em que
necer uma base sólida a tentativas de dassificaçlo por famílias doi sistemas
G = Germanos, P = Paralelos (primos paralelos), I = Cruzados (primos cru-
terminológicos. Declara ele que trQ$ possibilidades l6gicas sIo as seguintes: zados), Ip = primos cruzados patrilineares, 1m = primos cruzados matrili-
1) tios e tias do assimilados terminologicamente aos pais; 2) o irmlo do neares):
pai é· assimilado ao pai, enquanto o irmIo da mie é designado POI:um termo Esquimó G=I:[P =/]
específico; simetricamente, a irmI da mie é assimilada l mie enquanto a Havaiano G= P =1
irmI do pai é designada por um termo específico; 3) tios e tias, conforme Iroquês [G= p]"1
sejam do lado paterno ou do lado matemo, distinguem-se tanto dos pais Sudanes G ri> P ri> Ip ri> 1m
como entre si; 4) tios e tias, do lado patemo ou do lado matemo, 810 per-
feitamente distintos dos pais, mas Dlo se distinguem entre si•• (p. 266). 1m
Mas Lowie engana-se: ao propor esta classificaçio, ele nIo faz um inven-
Omaba
rG= p]# <: Ip
tllrio das possibilidades 16gicas, mas apenas das que efectivamente do reali-
zadas. Falta uma posSIoilidade lógica, l qual se voltarll em seguida. Se esta- Crow
belecermos as eq~ (para parentes masculinos), obtemos: tG= p] # <: 1"'\
Ip ,lI

[MB-F] BOI
CIIJ
.~~
"F -MB
,."MB
"FB
"MB
FB-F
ffiIDJ
(Os sistemas crow e omaha constitu!tm variantes da fórmula iroq'uesa). Tam-
bém aqui falta uma possibilidade lógica que é a seguinte:
FB"F
[FB-MB]
[FB •••F] [G.' I] " P. I

mas falta a r""",


~ altura
e omaha, quedesenos determos
pensa um pouco
representarlql nos sistemas
as duas terminolõaicos
faces simétricas e'ihversascrow
de
uma mesma armaçIo lógica, uma adaptada. matrilinearidade (sistetnas CTOW),
a outra adaptada à patrilinearldader:(sistemas omaha). Detemo-nos, mais pre-
cisamente sobre os sistemas omah~l em primeiro lugar porque,~tes serão
amplamente tomados em considera~Aono seguimento deste artigd, e depois
porque do mais fáceis de represdlltar dada a sua patrilinearid.de.
Estes sistemas tem interessado Ptttrlcularmente e desde hll multb os antro-
pólogos [cf. Durkheim 1896-97; itbhler 1897] por causa do modo bizarro
(Neste artigo utiliza-se a notação inglesa das relações de' parentesco: de classificação dos consanguíneoll e. por causa do irritante enigtna da sua
F = Father, M = Mother, B = Brother, S=Sister, s. son, J.daughter,
H = Husband, W = Wife, ch •• child. MBd •• Mother's. Brothet's daughter 1952]. . .
razlo
Umdesistema
ser [cf.terminológico
Lesser 1929; Ld:i.ipode
omq 1934;
ser White 1939; Radcliffe-Brown
caracterizado da maneira mais
'fdha do irmAo da mãe'. A equação FB=F=MB le-se do segUinte modo:
.Irmão do pai••=«Pailt••drmlo da mle»). simples como se segue:
Murdock, no espantoso trabalho de dassificaçAo das formas de paren- - os fdhos dos germanos do' mesmo sexo, que 810 .primeiros primos
tesco que é Social StnIChn'e[1949], escolhe como base para a sua tipologia paraleloSlt, chamam-se entre si cirmAOSlte .irmAs••. Nas geraçOCs
PARENTESCO 34 35 . .. PARENTESCO
i
;"'4"1"

seguintes, os fJ.1hosde dois «irmão$Jtou de duas «~» serl~ sempre Sempre relativamente a Ego, os ftlhos da irmã do pai (primos cruzados
entre si «irmãos»e «ÍrmllSJt.Estes primos paralelos a vmos nívetSgenea·
lógicos chamam «pai»àquele que o seu pai cham~ «irmão., e chamam '\ Ego.
patrilaterais)
A própria remetidos
510 irmã do paiterminologicamente
está ligada a Ego para a geração
por uma inferior
relaçlo à de
particular
«mãe» às mulheres a quem a sua mãe chama «Irmã»;
\ de germanidade (dotada por vezes de um nome especial). Ego masculino
! chama aos f1I.hosda irmã do seu pai «fJ.1hos de irmã», tal como se eles fos-
I sem ftlhos da sua própria irmã, e chama aos f1I.hosdestes «ftlhos de irmã»

o/L
o/ _A/O ~Pai
:Lo- Germanos
A/t :LA-
6 / ~~/ 6 Germanos
I os seus «netos»; Ego feminino chama aos fJ.1hosda irmã do seu pai .ftlhos»
como se fossem fJ.1hosda sua própria irmã, e aos fJ.1hosdestes «fJ.1hos.,seus
«netos».
• Ego

i
Egc:»

- as denominações são mais complexas para o~ desce~dentes ~os ger-


manos de sexo diferente, verdadeiros ou classdicatórlOS, ou sela, para
*
os primos cru7..ados.

Em, relação a Ego, masculino ou feminino,. os fIlhos de ~ h~mem da


patrilitibagem da tnlie, ao qual a mãe chama «~ão." e. em p.nmelfO lugar
1
Ego
T
Ego
ftlh,OSdosuperior
a geração
(OS verdadeiro
à deirmão
Ego.da
Egomãe 510 remeudos
chama te~ologlcament~
ao ftlho do para
irmão da mãe «1fD1ão
da mllelt e à sua f1I.ha«mãe••. Os ftlhos de um homem chamado por Ego
cinnllo da mãe» 510 sempre para Ego, consoante o seu sexo, cinnllos da mãe..
ou ..niãeSJt;os fJ.1hosdas mulheres a que Ego chama «mãe» 510 ~pre para Netos (filhos dos filhos) Netos (filhos dos filhos)
ele «germanos... Os filhos ~os «irmão$Jt510, p~ Ego mascu~o apena~,
«fllhos»como os seus propnos, e os ftlhos das «lftnliS»51~~obrinhos uten- Lounsbury [1964J examina as possíveis variações terminológicas deste sis,
nos••ou «fJ.1hosdas irmãs••, como os fJ.1hosda sua própr18 1rmã. Para Ego tema de base. Noçntanto, mantêm-se em aberto as questões da razão de
feminino, os fJlhos daqueles a quem ela chama ~os» constituem uma ser destes sistemas e da imperiosa necessidade interior que explique a cons-
variedade particular de «germanos••, e os fJlhos das «irmãs» são «fJlhos».Os
filhos de «ftlhos.. e os ftlhos -de «fllhos de irmãs.. serão sempre «netos» tAncia dos seus traços específicos nas diferentes sociedades humanas que ()I
(filhos - masculinos e femininos - dos filhos\ utilizam. As an4llses baseadas na derivação automática dos termos deduzi-
veis imediatamente da relação fundamental de germanidade paralela ou cru-
zada com Ego ou Alter do genitor intermédio, ou dos genitores interm~-
Jk dios de Ego ou de Alter entre si, também não respondem a tais quest(les
lcf. Coult ]967. com base in Tax ]9371. ,
1
Ego
~
drmllo
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da ~e» Filho Filho drmio» «Filho
~ da irmI da irmL
«Irmlo

drmllo
da mãe••
eM§e"
llJjl I da-JDie"
Evidl:11temente,existiram inllmeras tentativas para explicar a génese dc:stl:S
sistemas. A mais famosa é a de Kohler que explica os sistemas terminológi-
Netos (ftlhos dos filhos) cos ,omaha como um resultado de o costume do casamento ser efectuado
PARI!NTBSCO 36 37 PARENTESCO
~~..
com a fllha do irmIo da esposa. O respectivo esquema é tirado de RadclifTe- ria, distinguindo ncrinterior dessa categoria apenas a düerença ~tre homens
-Brown [1952, trad. it. p. 76]: e mulheres. Quando se aplica este princípio l terminologia, uma pessoa exte-
rior 1linbagem, mas em relação com ela, utiliza os mesmos termos de paren-
tesco para todos os membros do mesmo sexo. .. pelo menos durante três
gerações. Levado ao seu mais alto desenvolvimento, quando aplicado ao clã,
A este princípio tem como consequencia que uma pessoa relácionada de certa
maneira com o clã aplique um tinico termo de parentesco a todos os mem-
bros do clb [ibid.).
E Assim, em virtude da aplicaçlo deste princípio, no sistema omaha, todos
. ii IllI3 I"l ...
os membros por nascimento da linhagem da mie do, indüerentemente dos
ii
I lIeUS genitores reais, tidos como tIIllies. e como tcinnlos da mãe.. Infeliz-
'I I Se D casar com C, filha do irmio da sua mulher (WBd), para. G e h,
mente, este princípio não é tio rigoroso como parece; Lounsbury [1964]
',' ,I seus filhos, C, que é a MBd deles, torna-se madrasta deles e é chamada GIe»,
e E, que é o MBs, torna-se o irmão da «mie» deles. Diz RadclifTe-l:lrown mostrou mediante exemplos étnicos precisos que os termos 'mie' e 'irmlo
I1
da mie' podem ser atribuídos a pessoas que nlo pertencem por nascimento
que Kohler «presume que a terminologia de parentesco preexiste.l realiza-
I
ção deste tipo de aliança» [ibid.); sem mesmo estar realizado o casamento,
1linhagem da mie (por exemplo, MMSs é um tcinnlo da mie» para Ego).
j
e inversamente que se encontram muitas vezes diferenciações terminológi·
G e h chamam «D1ie»a C, que é a sua futura madrasta eventual, e «irmão
eu DO interior desta linhagem (por exemplo, o irmão da mie esUl posto
de mie» a E que é o seu futuro tio matemo. Reciprocamente, f chamará na categoria -avô. e 010 na categoria .irmio da mIe»).
antecipadamente câllho. a G e «filha»a h, e E chamar-lhes-4 «filhos de irJnh. NIo haveR, pois, soluçio? Como j4 entio pensava White. pode con·
:a, naturalmente, difícil explicar, mesmo o mais engenhosamente possí- siderar-se que -aquilo de que necessitamos. .. não é procurar Cactossuple-
vel, um sistema terminológico através de um casamento secundário raro e mentares, mas reintegrar os factos que existem em quantidade suficiente sob
que, aliás, 010 é praticado por uma boa parte de populações que possuem, os nossos olhos. [1939, p. 573].
no entanto, uma terminologia omaha, mesmo quando este casamento secun- :a preciso voltar ao dado biológico de base: dois sexos, duas gerações

?. d4rio se coaduna perfeitamente com a terminologia. Restaria explicar o 'casa- que se sucedem, relações entre mais velho e mais novo, sobre o qual o génio
mento de D com c, que não pode ser ad infinitlmt um casamento com a WBd. hwnano tio engenhosamente teceu hipóteses.
Radcliffe-Brown tinha visto perfeitamente a importlncw da sucesdo das
em eatreita C()nexiocom a ti1iaçlo patrilinear, e os crows com a filiaçIo matri- geraçOCs,por um lado, e das relações entre os sexos, por outrO, como ele·
\ Criticando Kohler, Durkheim demonstrou que os sistemas omaha'estiO mentos explicativos dos sistemas terminol6gicos. Ele tinha corppreendido
f linear, mas todos os sistemas patri- ou matrilineares 010 possuem forçosa-
, mente uma terminologia crow ou omaha, donde se conclui que esta nAo é muito bem que a organização das terminologias decorre do modo como é
uma explicaçlo suficiente (se bem que necessária). considerada a relaçlo dos germanos, consoante eles do do mesmo sexo ou
de sexo diferente.
Lowie vai mais longe ainda neste ponto, ao associar estas terminologias
010 apenas l elristêncià de uma regra de unifiliaçlo mas ao desenvolvimento
Ele enuncia claramente um duplo princípio: o da solidarie4~de interna
do grupo dos germanos, do qual deriva o da «unidade do grupo dos germa-
máximo de grupos sociais clAnicos, baseados na unifiliaçlo. O eli é enten-
nos, não j4 no que respeita 1coesão interna do grupo que eles constituem,
dido como uma instituição que pode nascer, morrer, declinar e deSaparecer.
mas sim no que respeita ao modo como são colectivamente entendidos e
Nas suas formas juvenis, o sistema tertninológico será simplesmente iroquês;
tratados do exterior, por todos aqueles que se encontram numa relação par-
nas suas formas adultas, será crow. ou omaha. ticular de consanguinidade e de aliança com um deles.
Este ponto de vista, expresso sob'uma forma curiosamente evolucionista,
prefIgU1'llde uma certa maneira o de Radcliffe-Brown com a sua teoria da
dOlidariedade de grupo. e da «Unidadede linhagem». Escreve Radcliffe-Brown 2) 2)
a propósito dos sistemas crow e ornaM que, 14onde os grupos de unifl1iação
.corem importantes, podemos falar de solidariedade do grupo, que se revela f
em primeiro lugar nas relações internas entre os membros do grupo. libid.,
p. 88); por «princípio de unidade de linhagem., Radcliffe-Brown entende Para Ego, o grupo dos irmãos e das irmãs do seu pai é da mesma natu-
que uma pessoa. que 010 pertença l linhagem, mas que com ela está rela- reza do seu pai; todavia, Ego serve-se, na maneira de os designar, de dis-
cionada através de um laço importante de consanguinidade ou de aliança, tinç(les que traduzem a diferença de sexo e os estatutos relativos de mais
ClConsideraos membros de tal grupo como constituindo uma tinica catego- velho e de mais novo. Radcliffe-Brown explica deste modo por que razão
PARENTESCO 38 39 PARENTESCO "
~"",1"
FB = F e MS = M em inúmeras sociedades; por que razão FS ~ por vezes Existem três relações básicas: entre homem e muit'er (segundo os qua-
denominado «pai feminino" e MB .mie masculina., ou por que razão, em tro modos: irmiofuma, pailfiIha, mie/fIlho, marido/mulher), entre gerações
certas tribos australianas, Ego é designado por um mesmo termo pelo seu con~utivas, entre mais velhos e mais novos, mas a manipulação ideoló-
pai e pelos irmios e irmis do seu pai e por um termo diferente pela sua gica tende a considerar estas relações como mutuamente dependentes e iso-
mãe e pelos irmãos e irmãs da mie. No entanto, Radcliffe-Brown Dio explo- morCas. A relaçio entre homens mais velhos e mais novos pode traduzir-se
rou a fundo estas premissas. A este~ dois princípios fundamentais deve em termos de gerações como se se tratasse de uma relaçio de pai para fIlho.
juntar-se um terceiro, que é o da idelltidade e/ou da equivalência dos ger- ~ o c~ das populações austro-asiáticas Ho e Santal [cf. Bouez 1979];
manos do mesmo sexo, cujo coroláIiq é o da diferença dos germanos do e assim. acontecia na corte do Rei-Sol, segundo o sistema dos títulos em
sexo oposto. Remetemos para o ~ .Incesto", onde se encontram anali-
sadas as consequências estmturais de .~ terem ou ~o em consideraçio estes vigor flp os membros
rei usa O mesmo da fam11iapróxima
título (Monsieur) que o filhodomais
rei:velho
o irmio mais
do rei, e anovo do
mulher
princípios e seus corolários (identidadq .pos pares pai/filho, mãe/filha em opo- do irm40 IQIÍS novo do rei usa· o mesmo título (Madame) que a fllha do
sição à diferença dos pares pai/fJ.lha, ~ãe/filho), em particular no estabele- rei, enquanto o títq11 de J4aciemoiselle- era reservado às «J)Ctites-fillesde
cimento da proibição do incesto e d~s regras exogâmicas. FrancClt '(~ndo u du-tas 'da Princesa Palatina).
A identidade dos germanos do mesfllo sexo foi por vezes entendida, mas
Em geral, ~ a relação homem/mulher que pesa sobre o segundo ou sobre
de uma maneira passageira, sem que lne fosse atribuído o pleno valor expli-
o terceiro, sendo estes concebidos como modelos hierárquicos que expri-
cativo sobre a g~nese e a concatenaç~o dos sistemas terminológicos e d.os
sistema" 'sociais que nós lhe conferÍÍ1los. Deste modo, Kroeber escrevia:
.Uma mulher e a sua irmi 510 mais parecidas do que uma mulher e o seu
I memOs adois
dominaçiO masculina.
sexos nunca têm o mesmo valor. A sua diferença está traduzida
na linguagem corrente mas tam~ na linguagem do parentesco, como uma
fIlho, relaçio desigual, quer de pai para fIlha, quer de irmio mais velho para irmã
mesmoe tempo esta diferença é conceptual,
sociológica... Uma mqlher 'por outras
e a suapalavras,
irmi, ao linguística
pertencereme aoao
mesmo sexo, situam-se numa categoria de relação superior à da mesma mais nova (cf. ainda o artigo «Masculino/feminino.).
mulher com o seu irmão; isto quer ctizer que elas são mais parecidas em Poder-se-iam citar numerosos exemplos, tirados· da literatura antropoló-
termos de relaçio de parentesco e que é por isso natural denominá-Ias com gica ou jurídica, em que ao longo das páginas transparecem observações que· : I,

o mesmo termo" [1909, trad. it. pp. 320-21]. . estabelecem esta diferença hierárquica entre os sexos. Zuidema [1977] assi-
:a a consideração deste princípio fundamental que explica os casos ine- nala que entre os Incas uma irmI ~ uma fiIha para um irmIo adulto, e que,
xistentes na combinatória dos possíveis que vimos atrás. Pela mesma ordem do mesmo modo, depois· do casamento, uma mulher se torna a eftlha» do
, ..
de ideias não existe também uma possibilidade lógica de filiaçio: a filiação seu marido. Margaret Mead [1935] mostra como, entre os Arapesh, toda
a organizaçio social ~ baseada na analogia estabelecida entre os fIlhos e as
alternada, na qual o pertencer ao grupo e a transmissio dos dtrelt?S passa-
ria de pai para filha e de mie para filho. ~ impossível que Lowle [1928] mulheres que 510 considerados como um grupo mais jovem, menos respon-
ao enumerar as suas «possibilidades l~cas. Dio se tenha dado conta de que sável que a sociedade masculina. Entre os antigos Romanos a esposa tinha
faltava uma. O facto é que no seu conceito de .lógico", ele achava natural o estatuto legal da ftlha, para já Dio falar do Código Napoleónico.
que ela devesse faltar, mas isso só é natural se se puser em :vid~ncia, como Não podemos contentar-nos em alinhar índices desta maneira. Por meu
propriedade intrínseca aos factos do parentesco, que uma solidariedade para- lado, postulo que se o critério da valência diferencial dos sexos for de facto
lela é mais forte do que uma solidariedade cruzada. um parimetro do parentesco, os seus efeitos, quando ele é conhecido como
Trata-se de coisas que parecem tão naturais, tão evidentes, que não neces- um tipo de sistema de parentesco, devem aparecer na própria terminologia,
sitam de explicações, apesar de se es~rem a ver. Mas acontece tamb~m que quer da consanguinidade quer da aliança, quer como refer!ncia quer como
elas podem não ser vistas. :a o que se passa com um segundo princípio que indicaçio. Tal critério terá entio valor explicativo do sistema.
decorre da manipulação do dado biológico, que nos parece, combinadtJ com
Assim, entre os Gonja descritos por Esther Goody [1973], onde a filia-
o precedente, susceptível, para já, de fornecer uma explicação coerente sobre çio é bilateral e a terminologia havaiana ao nível de Ego (mas iroquesa ao
a lógica interna das terminologias omaha e até de fornecer uma resposta à
nível dos pais e dos fIlhos), a posiçio geneaJógica é extremamente impor-
questão colocada anteriormente: por que razão o sistema terminológico
tante, porque, escreve Goody, .no i~terior do grupo de germanos, o mais
quando associado de modo preciso à patrilinearidade não está submetido ~m
novo deve obediência ao mais velho, enquanto este é sucessor no título e·
todos os povos a uma regra de filiação patrilinear? Chamamos a este cflté-
, rio, esquecido pela teoria do parentesco, «8 valência diferencial dos sex~s». herdeiro em primeiro lugar. [ibid., p. 221]. Deste modo, ela refere-se mani·
Tal com" os "utros enumerados por Kroeber. este pode ser ou mo odo festamente à re1açio entre mais vc1hoe mais novo entre homens. Com dáto,
''=t.l :u re-~v~
('.::J .•. & j:'\L.-e::!~"'\"'~
,CO ~ & ::::'-...4li..~ D:I'l2 ~ ar:.b~ .~ ~.:icit~.e qz ~ tm'.t1:a~W) fII:f1:JXe,* 11'''.
posta à questão anterior. [íhid.J; elas Dio possuem nem transmitem direitos nem propriedades.
PARENTBSCO 41 PARENTESCO
".
::'!'r1- .
Terminologicamente - e ~ aqui que reside o mlcleo do problema -, se de meu pai, etc. ~, pois, qualquer que seja a nossa geraçtO de nasci·
a mulher tiver irmIs mais velhas ou mais novas, ela só tem como indicaçAo mento, todas iguais. Mas eu própria e todas as minhas «irmII-, ctiua e tias·
«irmIos mais velhos»; simetricamente, um homem tem irmIos mais velhos -avós paternas somos consideradas como tizendo parte da seraçio dos filhos
e mais novos, mas tem apenas «irmIs mais noV8S».Citamos textualmente: de meu irmIo, dado que a filha do meu irmlo chama aos seus próprios
«Enquanto os homens designam um irmIo mais velho com o termo nda filhos seus .tilhos», tal como, a1ids,o chama a todos aqueles a que eu chamo
(o meu irmIo mais velho) e umirmlo mais novo com o termo nsupo (o meu .tilhos»: um vertiginoso peso sociológico para baixo, que faz sempre do con-
irmIo mais novo), designam a totalidade das irmAs, mais velhas ou mais junto das mulheres nascidas de uma determinada linhagem o equivalente
novas, com o termo nsuputche (o meu germano feminino mais novo)>>[ibid.]. a «filhas», ou a netas, para os homens da Iteração mais recente. "
Este facto acarreta uma consequência importante que consiste no carácter
iroquês da terminologia na geração imediatamente ascendente, e, réciproca-
mente, na geração imediatamente descendente. Esther Goody sublinha, ,sem
explicar, que apenas os germanos paralelos do pai e da mie (FB, M$) do
: li
I
diferenciados por Ego em função do seu estatuto relativo de mais velhO ou
de mais novo relativamente ao pai ou à mie de Ego: existem assim -pais
mais velhos» (subentende-se: do que o pai); .pais mais novos», .mães mais
velhas», .mães mais novas». Mas existe apenas um terrtlO para designar
o irmão da mãe (n'wopa) e a irmI do pai (ntana).
Tudo isto parece ser a consequência do facto de as irmãs serem sempre ~
Filhos Alter
terminologicamenteas irmãs mais novas dos seus irmãos. Se a irmã de um
cleBgo Filhos de Bgd
homem for a sua irmã mais nova, a irmã do pai de Ego será sempre uma e de Alter
e de Alter
irmll mais nova do pai, e a mãe de Ego será sempre uma irmã mais nova
do tio matemo. Nllo é, pois, necessário especificar o estatuto atrav~ da ter-
minologia, uma vez que este é datW de facto pelo pr6prio uxo. Em contrapar- Por consequência, um sistema ttrminol6gico omaha corresponde a uma
tida, dada a importAncia atribuída ao estatuto relativo de mais velho e de visllo precisa do sexo feminino, onde as mulheres já Dlo silo consideradas
mais novo, ~ necessário que Ego faça terminologicamente a diferença no cotno irmAsmais novas (da mesma leração), como no caso precedente. mas
Imbito do grupo dos germanos do mesmo sexo de cada um dos seus Ptores. i como filhas (de geração inferior à de Ego). Isto corresponde a um êxito par-
"Eis, pois~ um sistema de fI1iaçAoindiferenciada. e terminologjcamente ticularmente acentuado de uma vÍSlo ideológica da relaçio en~ os sexos.
havaianafll'OQUCS8, que Dlo estabelece aparentemente diferença entre os sexos. Pode pôr-se como hipótese que os grandes tipos de sistemas de paren-
e onde transparece, no entanto. aminorizaçio (no sentido de tlCStadode tesco derivam de escolhas ideol6gic:asrealizadas. sob o influxo de factores
menOf», conceptualmente, estatutariamente. terminologicamente) I do sexo a dete~r. atrav~s das diversas ,combinações possíveis das três relações
fiemmmo.
•• .I de base entre sexos, entre gerações, 'entre primogénitos e irmãos _ novos,
Que dizer entio dos sistemas ornaha? A irmI pertence sempre\ de facto, cujas duas figuras extremas seriam: lj uma. a cisllo perfeita entre as' três rela-
à geraçio inferior à de Ego masculino. Lesser tinha claramente. visto esta ções; outra, a transcrição integral d~primeira e da terceira sob 'a' forma da
equivalência, quando escreveu: .o' facto de reunir o irmão da mlle e todos segunda, de tal modo que se pudeste escrever [homens/mulherest'e/ou [pri-
os seus descendentes masculinos sob o mesmo termo parece ser logicamente mogmitos/mais novos]=genitores/4fuos, mas nunca [mulheres/hoitlens] e/ou
consequência da igualdade em termos de parentesco de uma m~lher com [mais novos / prImogénitos] = [geni~ores/fllhos]. .
a irmã de seu pai e com a fllha cf seu irmão» [1929. p. 712]4
Se considerarmos o que se passa terminologicamente com Ego feminino
no interior da sua própria linhagem. o ponto comum das divel'Sllsvarieda- 2. As estruturas semicomplexas\ de aliança
des possíveis (no plano terminol6gico) de sistemas ornaha - 1) ej[istem ter-
mos para FS e MB; 2) não existem categorias FS; 3) MB.~ desi;nado pelo Numa conferência. realizada erl1 1965, sobre o futuro dos estudos de
mesmo termo que desig& o avô; 4) FS = S. ME = MÀ(C- é realmente a parentesco (o essencial do contel1dq dessa intervenção foi retomado no pre-
,I equivalência que é estabelecida entre irmã e filha é,-emse8uida. ~ntre irmã fácio à segunda edição das StnlCture~ êlémentaires de Ia parenté). Lévi·Strauss
do pai de Ego e fllhado pai de Ego, ou seja, irmI de Ego. tt!:. declara que Dlo se pode aspirar a I1mateoria geral do parentesco enquanto
O sistema omaha tem um peso sociológico para todas as mulheres per- esta nlIo tiver em consideraçllo todos os tipos de sociedade humana e não
tencentes à mesma patrilinhagem. Eu, Ego felninino. chamo "meus fllhos» for capaz de dar conta quer do funcionamento das estruturas elementares
aos fllhos das minhas irmãs, das «irmãs» de meu pai. das «irmãs» do pai quer do das estruturas complexas de parentesco e de aliança. Ele acres-
PARENTESCO 42 43
PARENTESCO
•.•.•'1'-
•.....
centa que o ponto crucial da compreensão da passagem de uns a outros reside af~tados serão proibidos, e até pessoas destituídas de qtaIquer relação genea-
na elucidaçio do funcionamento dos sistemas crow-omaha [1967, trad. it. lÓgIcacom Ego, mas que pertençam de direito ao mesmo grupo de unifllia-
pp. 27-28], daquilo a que chamaremos mais genericamente, ultrapassando ção. Por out.ro lado, .restringe aparentemente esse leque através da aplica.
o caso particular destes sistemas, as lle8truturas semicomplexas de aliança». ção da defimção de hnhagem ou de clã. Com efeito, o direito canónico, ao
Estas são, com efeito, consideradas como um ponto de articulaçto entre as que parece, não faz nenhuma distinção entre os diferentes tipos de primos
duas fórmulas, pelo facto de, ao dec~ proibições matrimoniais, e não no limite dos gra~s proibidos, enquanto, segundo a fórmula acima apresen. .". .
prescrições mas em termos de filiaçip a grupos, poderem ser consideradas tada, poucos pnmos entre os do segundo e terceiro graus canónicos
como depe~dentes das es~turas ele~entares, enquanto a r~e probabilis~a (incluindo os de relação oblíqua) ficariam sob a alçada da proibição. Consi-
de aliança, que estas proibições engepdram com toda a lÓgica, as faz den-
de~doexcIusi~ente os primos nascidos de germanos, a fórmulagene-
var das estruturas complexas. Mas q ~eu funcionamento, como mais generi- ralizante' de Uvi-Strauss não dá Fonta, numa óptica omaha, isto é, patrili.
camente o das estruturas complexas,;é até agora um terreno desconheCido near, seD40, da impossibilidade para um qualquer Ego (masculino ou
da antropologia do parentesco. '~
feminino) de casar ~. }UDll.,~.ou um primo que pertença às linhagens
Por «complexos» entendem-se oSllistemas de aliança em que a escolha (ou aos cas) de sua mãé e dj mie do seu pai, ou seja, apenas duas fIguraS
do cônjuge, longe de obedecer a uma designação pré-estabelecida em ter- das doze possíveis (MFBsd, FMBsd); tal fórmula não explica a impossibili-
mos de,.'filiação social, é aparelitemepte deixada à iniciativa individual no dade de casar com alguém do seu próprio grupo (FFBsd) ou a impossibili.
interior·de espaços relacionados que fião são unicamente determinados pelo dade de casar com alguém que pertença ao grupo da mãe da mãe (MMBsd).
parenteSco. É o caso do casamento llas sociedades ocidentais. No entanto, As proibições matrimoniais podem, ser formuladas tanto em relaçAoa gru.
mesmQ'aí, a estrutura complexa de ~roca obedece a uma lei que depende pos definidos na sua globalidade por um princípio de flliaçio (sistemas semi.
do aspecto elementar: a da proibiçãQ do incesto. De facto, a classifICação I complexos) quanto a graus de parentesco calculados genealogicamente (sis.

dos coqsanguíneos em parentes des~veis, por um lado, e não-desposáveis, I temas complexos das sociedades tradicionais; direito canónico), ou ainda em

por outro, efectuado nos sistemas elFmentares, tem como corolário tornar relação ao aparente total arbítrio da escolha do c6njuge devido à indistinção
incestuosa qualquer união com um pàrceiro que entre na categoria dos con- dos indivíduos nas sociedades ocidentais modernas, urbanas ou industriais:
sanguíneos não-desposáveis. Nas, sociedades ocidentais, a proibição só diz em qualquer dos casos as proibições provocam - ainda que retlectindo sim-
respeito a relações primárias do ponto de vista da flIiação e da colaterali- plesmente sobre os dados brutos do problema - aquilo a que Uvi.Strauss
dade (a mile, a fllha, a irmil para u~ Ego masculino), pelo menos na sua chama uma «turbulência permanente» do campo da aliança que torna impro-
versão mínima. É possível actualmente, depois de obtida a respectiva dis- vllvel, senão impossível, a existência de uma estruturação particular deste
pensa, casar entre primos germanos (ou entre tio e sobrinha ..• ), mas em campo. De facto, cada casamento realizado representa uma fórmula origi- II I'
direito canónico era considerada incestuosa qualquer uniilo não apenas com
~, difer.ente da das uniões contraí~ pelos ascendentes nas gerações supe.
"

primos germanos mas também com primos nascidos de germanos (terceiro nores, e mtroduz uma nova perspectiva de conjunto dos consanguíneos para
grau canónico), e tal proibição era ainda respeitada, pelo menos em certas a geraçio seguinte. Daqui se conclui que, excluída da consanguinidade
regiões rurais, no princípio do século. ~ e~olha do cônjuge, aleatória, obedece então a leis probabilísticas, o qu;
Isto reconduz-nos aos sistemas crow e omaha, que provêm das estruturas lmphca que se não conforma a nenhuma lei de recorrência ou de regulari.
semicomplexas da troca e que escolllemos pelo seu valor exemplar. Para dade. Por consequência, não haveria nenhuma estrutura detectllvel (pelo
além de uma terminologia de p~n'esco muito particular, estes sistemas menos no registo do parentesco) contrariamente ao que se passa nos siste-
, caracterizam-se pela unilinearidade dá filiação (os sistemas crow são matrili- mas elementares onde a escolha do cônjuge é orientada, geração após gera-
neares, os sistemas omaha são patrilineares) e pela presença de séries de proi- ção, para uma certa categoria de indivíduos ou de grupos. O problema que
se coloca é então de saber se surgem estruturas matn'moniais apesar de tudo
bições matrimoniais
as sociedades. - que vão
Lévi-Strauss de dois
forneceu a seis grupos
'a seguinte - variáveis
definição seiUIldo
geral: «Caãa vez e se o seu modo operatório é radicalmente diferente ou não daquele que
que se escolhe [segundo o princípio de flliação considerado) uma linha para ocorre nos sistemas elementares. .
obter um cônjuge, todos os membros dessa linha são excluídos do grupo dos Não sé deve pretender que o conhecimento do funcionamento dos siste-
cônjuges potenciais para os outros membros do grupo durante um período mas.semic~mplexos forneça imediatamente a chave dos sistemas complexos,
que cobre várias gerações» (ibid., p. 30). Deste ponto de vista, pode dizer-se quanto mais não se,a por causa da diferença assinalada acima (uns falam
que estes sistemas abrem ainda mais amplamente o leque de proibições do de graus genealógicos de parentesco no interior de um conjunto cognático;
que o direito canónico, dado que englobam entre os cônjuges proibidos indi- outros, baseando-se nos relatórios antropológicos, falam de grupos determi. (
víduos outros que os estritos consanguíneos colaterais, primos germanos e nados por um princípio de fl1iação, mesmo se, como se verá adiante esta
nascidos de germanos; desde que os laços genealógicos intermediários entre distinção não é absolutamente pertinente). Mas dado que eles são fo~al-
Ego e Alter sejam,todos do sexo do princípio de flIiação, primos muito mais mente de idêntica natureza e dado que os sistemas semicomplexos (parti.
PARENTBSCO 4" 45 PARENTESCO

}•..
•. o;or'}o

culannente cror»-Omaha) operam em populaçOCs de dimensões restritas onde O casamento secundário une entre si os indivíduos e nio as linhagens, depois
concretizaçoes especiais das formas de aliança têm mais oportunidades de da ruptura do casamento primário, por viuvez ou por separaçio cuja validade
surgir de modo visível do que nas vastas sociedades ocidentais, parece ldgico ~ reconhecida pelas fam11ias. O casamento secundúio faz-se entio nas mes-
começar por eles. mas comunidades locais. Quando se trnta da fuga de uma esposa, a uni40 seCun-
Na já citada conferência, Lévi-Strauss sugeriu duas vias de investigaçio dma! extreDiamente precú'ia devido às buscas efectuadaa pelo marido e pela
para os sistemas crow e omaha. Uma ~ de ordem matemitica: "trata-se de funi1ia da mulher, faz-se no exterior. a este tipo de casamento secundário que
calcular o nllmero de possibilidades teóricas de escolhas matrimoJiiaís para abre ao exterior o campo da aliança.
um dado indivíduo, em funçio de uma parte do nllmero e da qualidade O terceiro estatuto ~ uma relaçlo p~-conjugal oficial, que duraria três anos
se nIo desse fruto antes, caso em que a jovem e a criança seriam imediata-
das proibições que ele deve respeitar e do mlmero de grupos disc~tos de
mente entregues ao marido legítimo, sendo a criança considerada como o.pri-
J~~. A segunda ~ de ordem informática, baseada em prOcedimentos de
mogwto da união legítima.
simulaçio: em sociedades fictícias, defmidas por um dado mlmero de· uni-
dades de clA ou de linhagem - 1 reproduçlo das quais se aplica, aeraçio Apenas o casamento legítimo primário exprime uma vontade de linhagem;
mas todos devem obedecer às mesDUis proibições (com algumas alteraçocs no
ap61 geração, um certo ndmero de padmettos demogdficos - fazem-8e inci-
caso das duas últimas regras) que se ~nunciam seguidamente, sempnt em rela-
dir proibições matrimoniais na escolha do cônjuge durante um n\lmero de ção a um homem:" .
gerações suficientemente elevado a fun de que haja hipóteses de surgirem
regularidades, se elas existirem no empareJhamento dos matrimonidveis entre 1) um homem Dlo pode casar cohl uma mulher que pertença ~r nasci-
si. Um cálculo matemático foi empreendido por Bernard Jaulin, com base mento 1 sua própria linhagem Patrilinear,l da sua mie, ou às linhagens
em duas proibições apenas, atingindo valores incrivelmente elevados (23 436 da mie do pai (FM) e da mie da mie (MM); l'
possibilidades teóricas de aliança para um indivíduo no caso d~ existirem I 2) um homem Dio pode casar com uma mulher que pertença a usna linha-
sete clis, 3 766 140 quando existem quinze clls, etc.). Face a estes resulta- gem onde um cpai» - ?U seja, ~ homem da sua patrilinhagem perten-
cente 1 geraçio supenor 1 sull - ou entio um .irmlo» - isto ~ um
dos, "pode postUlar-se que qualquer confJgU1'8Çio particular e recorrente p0s-
homem da SUl patrilinhagem que pertence 1 sua geraçlo - já te~am
sível de ser observada, por simulaçAo ou de outra maneira, não' poáerd ler
tomado esposa; estas duas regtas, enunciadas separadamentd, corres-
c01I$equlncia do acaso. As raras tentativas de simwaçlo levadas li cabo at~
aqui falharam,· ao que" parece, por saturaçio rápida da memória. pon~ 1 defmiçilo generalizada dos sistemas crow-omaha proi>osta por
Lévi-Strauss;
O procedimento por D68 escolhido foi diferente; pareceu-nos que o pri-
meiro passo a dar era o de e1ucidar sobre o modo de funcionamerlto de uma 3) uma terceira regra
nio pode casar comvem
umajuntar-.
muniu a que
estaspertença
duas regras cl4ssicas:
a uma \lÚl homem
das quàtro linha-
sociedade real que apresenta estrUturas semicomplexas de parentesco e de gens de base de uma das suas' precedentes esposas (nas patrl1inhagens
aliança. Para tal, procedemos com a ajuda da informática ao tratamento de de W,. WM, e nas linhas disctetas de WFM, WMM).""
dados genea1ógicos e matrimoniais recolhidos para este efeito em três aldeiàs

. Tratava-se, n~te es~udo, de veri~car por u~ lado se as proibiçtÍes enun-


) gico de parentesco
dos Samo de tipo populaçlo
do Alto Volta, omaha [cf.patrilinear,
H~ritier 1974,
com 1976, e in Au8'!
um sistema 1975).
"terminoló- ci;adas pela p~pna SOCIedade 810 de·l~to respeatadas e, por outrd, ;de testar
As comunidades de aldeia autónomas agrupam linhagens excSga1:has, geral-
hipóteses
de partiCulares
uma reflexio atentaelaboradas a PIl'tircomo
sobre o mõ(Ib' dos as
dados de observaçlo~:J
regras 810 formul;Jas tam~m
tanto
. ) mente repartidas em duas metades de aldeia que Dlo parecem desempenhar
qualquer papel na troca matrimonial. As linhagens podem compórtar linhas as enunciadas pelos Samo como as equnciadas pelos antropólogos pára'outras
distintas, entendendo-se por 'linhas' os conjuntos genealógicos Aue termi- ~iedades ~~ plano mais geral, teRdo em conta Dlo apenas o que as regras
dizem explicitamente, mas tam~mds seus silêncios.
nam em antepassados masculinos específicos, sendo esta série de· antepassa-
dos fundadores de linhagens consit4Frada pelos membros vivos dk:linhagem
O ponto de partida desta reflexlu. ~ a defmição generalizante do~. sistemas
crow-omaha proposta por Uvi-Strau •• como vontade de dar conta dA mosofla
como irmIos classificatórios, sem que a memória destes vivos ~isa preci-
~bstraeta destes sistemas e das suas #alizações: «Sempre que se escblhe uma
ur qual o laço genealógico real em colateralidade agnlltica q~é os une. linha para obter um cônjuge, todos 01 inembros dessa linha vêm a ser automa-
Distinsuem-se três estatutos matrimoniais de casamento p~, con-
ti~ente. e Isto
~nc~, excluídos
durante dováriaS
n~mero dos <!O,hjugesdisponíveis
geraçõe ••. [1967, trad. it. p. para
30); atalIinh' de refe-
fotmulaçlo
siderado
indivíduos.indissohlvel, e um~ prometida
Uma rapariga contrato que
em une entre si ainda
casamento, duas linhdgens enio
de t~nra idade, unplica, pelo uso do neutro (emembrda» do grupo, indivíduos), que ela se aplica
pelos homens da sua linhagem, a um homem geralmente maduto, Ela terá tant~ às ~ulheres como aos h~mens do grupo. a assim que surge o problema
apenas um l\nico marido legítimo deste tipo, enquanto um homem pOderá da S1Dletna entre Ego masculmo e :ego feminino.
ter vúias mulheres em casamento primário legítimo. Em caso de fàlecimento Já vimos que esta definiçlo era insuficiente, dado que nIo cobre todos
do marido, ela deve em princípio casar leviraticamente com um irmIo mais os casos de proibições enunciadas, atendo-se estritamente aos indivíduos ins-
n~vo do seu marido. critos pelo nascimento em linhagens (ou clis) ou em linhagens proibidas.
I
PARENTESCO 46 47

.. PARENTESCO
.~:..•••
t""
.
,

Mas também é evidente que tal defInição extrapola, graças ao silêncio das grupo). Os pares de consanguíneos do mesmo sexo funcionam simetrica- i
.r
mente; os pares de consanguíneos de sexo diferente funcionam simetrica- I
regras sobre o ponto preciso da simetria, de uma relação de consanguini-
dade primária entre pessoas do mesmo sexo onde esta simetria existe, para mente; mas disto não se conclui necessariamente que estes pares unissexua-
uma outra entre pessoas de sexo diferente onde ela não existe. Com efeito, dos e bissexuados funcionem de modo homólogo. I
se um homem, num sistema patrilinCllr semicomplexo, casou com uma . A primeira vis!~ pode parecer que esta análise, se bem que pertinente, I
mulher de um determinado grupo (linhflgem ou clã), os seus «irmãos» e os seja de eSC!l8sautilidade. Com efeito, é esta inversão possível que fornece !
seus «filhos» - termos entendidos no s,ntido próprio e no sentido classifi- uma d~s i:haves do funcionamento dos sistemas semicomplexos, em parti-
catório no interior do grupo de unifll.~ão - não poderão casar com uma
I cular porq"e ela permite a troca das irmãs, reais ou classmcatórias em cada
mulher deste
puro rigor ~esmo
lÓgiCO,quegrupo de mulher
se uma unifilia~4.0.1st? implica,
iiver Sido dada em facto, coma um
ipsocasamento um duasSerá.W:Cesúrioabnr
~çges, ~ ~ um parê~:
nenhumaa regra.. '
etnologia da tribo Úldia dos Omaha
homem, as suas «irmãs» agnáticas e as lifllhas»dos seus «irmãos» não pode- propriamente ~ parece ~ostIV f8c:tos contraditórios relativamente ao que
rão ser dadas em casamento a um homem da mesma patrilinhagem ou patri-
acaba de ser di.to. Na~dei ,lCIUDdoo relatório elaborado por Dorsey
clã. Daqui decorre a simetria entre pessoas consanguíneas do mesmo sexo [1884], um homem podia casar-se com duas mulheres em m\1tua posição
de irmãs ou de irml de pai I. f1lha de irmão:

na qual A, B, C estão a representar os grupos de unifiliação patrilineares;


o sinal L-J indica casamento possível, e o sinlll L;LJ casamento proibido.
Mas nada, nem na maneira como são expressas as regras particulares reco- a possível que tenha existido esta possibilidade de sororato; tà1a-se de soro-
lhidas nas diversas sociedades, todas e sempre marcadas pelo androcentrlsmo, rato quando as três mulheres (.) do mesmo esquema se encontram estru-
nem na 16gicadas implicações que são Possíveis inferir a partir destas regras, turalmente na posição recíproca de irmãs, como se viu e de um certo
permite dizer que, se um homem casou com uma mulher de um grupo de ponto de .v~~, slo idên~c~s intercambiáveis (cf. o artig~ .incesto»). Mu
unifl1iação, a sua «irmã» ou a sua «fJ.1h!l»
(relação bissexuada: o «par assim\!- esta posSibilidade só CXlSbararamente e em casamento secunc:lúio com II
trico••segundo a expressão de Uvi-Strauss [ibid., p. 574]) não possam esco- pagamento, enquanto o primeiro casamento era validado por uma troca
I I,
lher um cônjuge nesse mesmo grupo, ou, simetricamente, que se uma mulher de. presentes, pelo menos segundo Fortune [1932, p. 20]. (Esta tolerAncia
tiver sido dada em casamento a um grupo de unifiliação, o seu «irmão» ou exlSte ta.qlbém entre os Samo, também em casamento secundário, ou seja
o «fllho»do seu «irmão••(relação bissexuada) não possa nele escolher mulher: aq~ele que ~ tratado pelos próprios indivíduos e não pelos membros mas:
fi cuJin08 da linhagem). Para além disto, ao examinar .os textos, não parece
BA B A
que esta mesma possibilidade tenha existido para os outros membros mas-
9
C
tt t' •
I
~08. da mesma gens que Ego (1 excepçllo talvez dos seus irmãos verda.
delCOs,sempre em razlo do princípio da equivalência dos germanos do
.~ ~ I mesmo sexo). Isto decorre da difícil exegese dos textos de proibições for-
muladas por ~rsey ~ ,~e constituem um ensaio de transcrição sob forma
abstracta das lmpo8S1billdadesde casamento próprias ao seu velho informa.
dor Two-Crows. Assim a fórmula .Um homem não pode casar com uma
mulher que pertença 1subgens da mulher do fllho, do sobrinho ou do neto;
nem. uma mulher que pertença 18ubgens do marido da sua ftlha, da sua
sobrinha ou da sua neta» [1884, pp. 256-57] (entendendo-se por 'sobrinho'
e 'sobrinha', f1lho e f1lha do irmão; e por 'neto' e 'neta' fllho e fllha do
(As duas figuras excluem-se mutuamente. Se tal não acontecesse, isso sig- fllho) dá conta do ponto de vista de um homem maduro' que declara não
nificaria que era permitido ao par de consanguíneos do mesmo sexo ~er ser casado, entre outras coisas, como o seu ftlho ou o seu neto. Toda.
(<<pai»l.fllho.,irmã de pailfllha de irmão) casarem-se dentro do mesmo V18, esta fóonula é reversível: um homem não pode escolher mulher no
PARIlNTESCO 48 49 PARENTESCO
•••

mesmo grupo onde o llCU pai escolheu, ou o pai do 8eUpai (reai" ou c/aslli- juge proibido (por e~tlo; ele nio.pode"casar-se com a sua FFJidd; uma
lIcat6rí(8), porque tal implicaria que o pai ou o avÔfosse casado do mesmo vez que ele pertence por nascimento 11 linhagem patrilinear da mie desta
i
,I' modo que o seu filllo ou neto. Simetricamente, uma mulher Dlo pode, pois, prima; outro tanto para FFSsd e FFSdd).
casar-se com um homem de uma geraçllo imediatamente superior· ou infe- Mas isto Dlo basta; para compreender a razlo das proibições respeitan-
rior li do grupo onde uma innI, irmll do pai e filha do i.rmliotenha já C8llado. tes aos consanguíneos até 80 ten:eiro grau canónico; que DlO pertencem toda-
via pelo seu nascimento a um grupo patrilinear proibido por Ego ou Alter
(MFBdd, FMSsd, FMBdd, MFSsd, MMSdd, MFSdd, MMBdd), somos
levados a introduzir a noçlo de partilha em comum das mesmas linhagens
da mie ou das avós, ou de tal maneira que a linhagem materna de um seja
uma linhagem de uma avó do outro, critério"totalmente diferente do da per-
9 tença por direito (por nascimento) a um grupo patrilinearmente definido,
expresso todavia unicamente pelas regras
(/;, I -

!
"ri

(Neste esquema apenas se representam as mulheres proibidas (I.) a Ego


relativas ao grupo de unifiliaçllo (a gem) da mulher do seu fdhb. Poderia
ter-se feito uma representaçllo relativa às gentes das esposas do neto (ss) e
do sobrinho (Bs». I
Alter ElO
t t l
Alter
Eis, pois, uma intereasante aplicaçllo do princípio da equival~hciarmter- Alter, nascida na patrilinhaaem da '
I Ego e Alter nIo oaaceram tecipro.
permutabüidade dos germanos de sexo idêntico, com um jogo mbito subtil mie de Ego, pertence a uma linha-
I· camente na patril.iohagem da mie
sobre a possibilidade p~pria aos sistemas omaha de considerarem estrutu- gem proibida por Ego do outro, mas partilIumaem comum
ralmente, objeetivamente, e até por vezes terminologicamente, como irmIs
'I;1 a mesma patrilinhagem materna
I
as mulheres do mesmo grupo de unifiliaçIo. Isto só'se aplica, como vimos,
I li geraçllo de Ego masculino, raramente e· em caso de casamentd lIecundá-
. Esta noçllo,
unportante queo na
quanto estratégia
facto ~trimonial
de se pertencer desempenha
ao grupo um papel
de unifdiaçllOt tão
implica
rio.' Mas a possibilidade existe, todavia. Entre membros de g~oes suces-
i sivas o que realmente opera é a regra de nio-aimetria para -ót1ollsanguC- uma exaeta ava1iaçlo das relações jenealógicas reais até aoterteiro grau
neos de sexô diferente. Existe mesmo um exemplo significativo na 'genealogia exacto, e, portanto, mesmo para sistemas deftnidos por uma JDe$ha regra
de Tow-Crows: o seu irmllo e a sua ftlha (<<pai» e «fdha-, consequ'ntemente, de unifiliaçlo estrita, um reconhecÍltltnto das relações de consaDJWnidade
1
I na denominaçlo recíproca) eram casados na mesma subgem. E isto basta para
puramente cognalticas, tal como U>unsbury tinha presumido at.-vés do
o que diz respeito aos Omaha. I aestudo formal
avaliaçllo dodas terminologias
parentesco de plÍ1'entesco
é claramijlte baseada nae avaliaçllo
crow omaha: «Nesta óptica
ge'ittaJógica.

,';';
I Uma anlllíse do mesmo tipo da da simetria, reforçada por um inquérito
aprofundado levado a cabo junto de duas sociedades de terminológia" omaha
As extensOes nllo 1140 conllideradaslçomo designações gerais dcl'''grupoS
sociais" . •• mas antes como prod~i4las por uma série de deriv~ões que
"I (os SkD10 e os Mossi), conduz li crítica da noçlo de fJliaçllouniJÜ1earcomo
se entrelaçam
gica» (1964, p. de umNllo
381). indivíduo
se tratap~ outro ao longo
naturalmente de uma linhlllgenealó-
de bilinearidade ou de paren-
; nec:easllriae sufsciente para circunscrever o conjunto das proibi~ semi-
tesco dito complementar, no sentido :em que o interpretava Meter Fortes
[l9S3j 1972). Esta visllo extensionistit,e genealógica opõe-se evidentemente
••.. rasa, dos grupos
'll~)-,,\ \ complexas, e leva unilineares de fÜÜ\llo
a pôr a questllo aos quais
da razlo de ser,estio geralmente
no plano qu~nosassocia-
inte-
i dos atei sistemas semicomplexos. Com efeito, para ser breve, acqntece que, li de Radcliffe-Brown [I952J, que e~~lica os sistemas de denominação e de
Deltas duu sociedades (aliás, como noutras sociedades do Oeat~ Africano aliança crow e omaha em função do Rrincípio da unidade de linha. excluindo
de que só ~ pouco tempo se deu conta terem sistemas omaha),nlo é pos- qualquer intervenção do parentescO!bilateral.
sível casar com nenhum dos primos ou primas do segundo ou tetetiro'grau Mas, enquanto as proibições baSeadas no facto de se pertencer a uma
canónico, se bem que na sua grande maioria estes Dlo pertençam: por nas- patrilinhagem proibida por Ego nlo reconhecem o critério de, geração
cimento às linhagens proibidas a Ego (F, M, FM, MM). Um certo nl1mero (enquanto os laços genealógicos intcrlnédios forem integralmente 'compos-
de cuos silo explicados pelo facto de a regra das quatro patrilinhagens proi- tos por homens, em sistema patrilineil1'.por exemplo ou, mais simpll:smente,
bidas ser também Vlilida para Ego feminino, apesar de a regra ser apenas enquanto existir a consciência da pertença a uma linhagem), as qúe se ba-
formulada no masculino, o que torna impossível a um homem a realizaçllo seiam na partilha em comum das mesmas linhagens da mie e das avós ape-
de uma unillo com alguém para quem ele se encontra em posição de côn- nas agem (nos casos africanos de que nos ocupámos) sobre três gerações -
PARENTESCO SO
SI PARBNTBSCO
'li.
·~l·
sendo a quarta aquela em que se situa o antepassado que está na origem mie de Ego, e reciprocamente, que ElO Dlo pen~ l sua linhagem
dos dois ramos. Este nl1mero DIo é ao acaso, corresponde evidentemente materna, mas ambos têm em comum uma mesma linhagem materna:
ao nl1mero de gerações que coexistem, mas também corresponde ~te
ao mimero de gerações, incluindo a de Ego, onde estão situados OSascen·
dentes directos que são tidos em consideração para estabelecer as regras de
proibiçio (F, M, FM, MM). Para cada Ego, o sistema de proibições age
sobre dois eixos e, em cada mudança de geração, o ponto de vista de Ego
difere em metade do do seu pai e desloca·se horizontalmente uma casa para
baixo. O esquema seguinte permite apenas uma representação estática:
í
Ora um princípio geral requer que qualquer sistema forme um conjunto
coerente que obedeça a leis que DIo suportem falhas lógicas ou excepções.
Se POStularmos o contrdrio, I aprendizagem de um dado sistema por parte
dos própriOs 'actores e~a reproduçlo desse sistema tornam-se impossíveis.
Gerações Por consequtacia, se tOdos 08 iiItemu omaha, pelo menos tanto quanto me
FM
proibidas. é dado saber, Dlo admitem o casamento com a MSd, isto implica a pre-
F M Nenhuma limita-
sença do critério da partilha em comum da mesma linhagem materna e, por
çAo do ntlmero extensão, a partir do momento em que mais de duas linhagens são proibi-
Ego de patriliDhagens das, a ·aplicaçAodeste mesmo princípio aosconsanguíneos bÜlteraÍ8 que se
II interessadas ligam por intermédio de mulheres a estas linhagens suplementares proibidas.
Área
I Dir-se-ll
.guinidade que a pertença
l?Ült~ a umaextremamente
são vamveis linhagem porinterdependentes
unifiliaçIo e_~~ que _~~.~~~
mtervêm
de consanguinidade
. Gru pos pa trilineares I siMultaneamente no plano da aliança nos sistemas aem.icomplexos.Mas a evi.
C~t1c. . proibidos. ) dencia da forma fixa e estável que representa o grupo de unifiliaçAofaz com
proIbIda Nenhuma limitaçAo . que ela domine a expressão autóctone das regras e mascare aos olhos dos antro-
do Dl1mero de gerações . pólogos o lugar ocupado pela realidade móvel da conaaDguinidade cognática.
As regras falam no masculino e falam de linhagens (resta mostrar em que é que
; isso corresponde a sistemas ideológicos), mas o seu silencio sobre as outras reali.
o critério da partilha em comum das mesmas linhagens maternas e das i dades DIodeve nem pode ser interpretado como a prova de que elas nAoexistem.
avós como fundamento para as proibições matrimoniais pode parecer à pri- Voltando aos Samo, tendo em conta as regras enunciadas e as suas exten.
meira vista não ter um valor universal no que respeita aos sistemas crow- sões cogriáticas, parece ser extremamente difícil encontrar cônjuges autori.
-omaha, que são considerados as formas extremas d~ matri- e de patrilinea- zados dentro de aldeias de pequenas dimensões. Com efeito:
ridade, e por isso apenas susceptíveis de serem aplicados a casos particulares,
não clllssicos, destes sistemas. - todos os membros das quatro patrilinhagens proibidas a Ego estio-
Tanto o caso dos Samo como o caso dos Mossi, nesta óptica, não passa- -lhe proibidos como cônjuges, qualquer que seja a sua relação real
riam de variantes abastardadas de modelos puros, DOSquais apenas a pertença de consanguinidade com ele;
de linhagem seria reconhecida. Este ponto de vista parece-nos contestável - nu11Íintervalo de tres gerações relativamente a um antepassado comum
por duas razões. Antes de mais, a definição destes modelos puros [Mur- situado na quarta, todos os consanguíneos provenientes de casamentos
dock 1949] foi feita a partir da recolha acrítica das formulaçOes autóctones de filhas pertencentes ls patrilinhagens proibidas a Ego estão proibidos
em casamento a Ego, qualquer que seja a sua miação de linhagem;
das regras (e é verdade que por toda a parte elas apenas fazem refera,cia -. cada União contraída por um homem fecha uma linhagem como área
a grupos de fJ1iação)e de inquéritos efectuados no local insuficientemente
possível de escolha aos seus cirmlos» e «fLlbos»da mesma linhagem,
aprofundados, isso tanto mais que o a priori da linhagem contribuía para
e simetricamente cada união contraída por uma mulher fecha uma
que se procedesse às cegas. Em segundo lugar, e principalmente, hll um
linhagem ls suas «filhas de irmIos» e às suas «irmãs»;
facto que se encontra de modo evidente em todos os sistemas omo;ha sobre
-por 11ltimo,cada união contraída por um homem fecha-lhe no futuro
os quais existem descrições (tanto quanto sei), facto esse que demonstra por
quatro outras linhagens como área possível de escolha.
si só a existência universal do critério da partilha em comum das linhagens
materna e/ou das avós para os sistemas semicomplexos: trata-se, em toda O material analisado em computador consiste nas genealogias da popu-
a parte, da impossibilidade de desposar a prima paralela matrilateral, a fJlha laçAode tres aldeias que formam uma unidade poUtico-social tradicional;
da irmI da mie (MSd). Se consideramos o nascimento e a pertença a patri- esta populaçAoestá repartida em vinte e seis linhagens patrilineares; a exten-
linhagens, ve-se perfeitamente que esta prima não pertence l linhagem da são cronológica das genealogias vai de cinco a nove geraçOes em linha agná·
PARBNTBSCO 52 53 PARENTESCO
.•.

tiea,.atc! ocasionalmente doze em linha uterina (diferença que se explica pela


diferença de idade no casamento e no primeiro nascimento segundo os sexos).
t;~:
mais afastados (tal a mie do pai da mie, ou a mie da mie do pai)
ou face a consanguíneos bilaterais alc!m do terceiro grau canónico. A hipó·
O corpru examinado retlne 2461 casamentos [cf. Hc!ritier 1976; 1975). tese c!, pois, a de que c! possível que haja uniocs efectuadas, preferencial-
Com base em simples deduções numéricas, três coisas surgiram imedia- mente na ausência de qualquer regra conscientemente formulada, entre indi·
tamente, que no entanto parecem • primeira vista incompatíveis com a estrita víduos nascidos de pais que nlo podiam eles próprios casar entre si pelo facto
aplicaçlo das regras de proibiçlo da aliança: de pesarem sobre eles as regras de proibiçlo fundamentais. A esta hipótese
, junta-se uma outra, segundo a qual escolhas desta ordem, entre consanguí-
- a taxa global de endogamia no interior das três aldeias c!.da ordem
\ ocos do quarto ou do quinto grau canónico, seleccionam e privilegiam linhas
dos 60 por cento, tendo em conta tanto casamentos primários como
\ genealógicas particulares no grande mimero de laços possíveis que vão de
secundários; ela ultrapassa 75 por cento para a aldeia que tem mais
j Ego a Alter. .
habitantes e mais linhagens;
, ; A segunda hipótese, que diz respeito às trocas regulares entre linhagens,
- se consideramos apenas os casamentos primários legítimos, ou seja, os
que implicam uma política deliberada de escolha efectuada peJds ..~ns ; . '. ~e da ideia de que as proibiçOCS, longe de acumularem os seus efeitos, se
anulam entre si, em consequência sobretudo das diferentes regras de simetria
da linhagem, 1,25 por cento apenas ocorrem com mulheres ~trangei-
que regem as escolhas matrimoniais Para pares de consanguíneos membros da
ras (10 em 800 casamentos primários masculinos); inversamente, 1,15
mesma patrilinhagem, consoante elesslo do mesmo sexo ou de sexo diferente.
por cento apenas de casamentos contraídos pelas mulheres fora das três
Só uma frataria (conjunto de Í1'Jt1Ios e de irmãs) possui em comum as
aldeias 810 de tipo primúio legítimo (7 casamentos em 601)t
mesmas quáúõproibições fundamentais: as patrilinhagens de Ego é da mie,
- por \lltimo, pode notar-se, com uma simples leitura das genealogias,
as patrilinhagens da mie do pai e da. mie da mie, e os consang\tíÍleos cag.
que existem laços' preferenciais de aliança entre linhagens, .~ quais
nllticos que a ela se ligam. Se os irmãos forem apenas meio-gel'Dlénos pelo
nos apercebemos facilmente ou porque 810 directos (A dá a B que
pai, já Dlo tênl os mesmos grupos 'de filiaçlo da mie, e da mieda mie,
dá a A) ou 810 mediatizados por um terceiro termo.
uma vez que um homem Dlo pode ter duas esposas aparentadas· entre si.

Por essa razlo, das duas uma: ou as proibições Dlo 810 respei~das ou
slo-no. Se o 810, isto pressupõe entlo a existência de estratc!gias plrticuJa-
Isto
dois c!tambc!m
irmIos Dloválido
podemparacasar
primos
com ~rmanos
mulheres paralelos
da mesmapatrllaterais, a verda-
linhagem. liado que
deiro a jortiori para os filhos de primos de primeiro grau (primos. paralelos
res e, por corolllrio, a presença de estruturas de aliança a descobrir.
patrllaterais igualmente) que não têhl, para além do mais, a mesn1a patrili-
Ora, efectivamente, as proibições 810 respeitadas em proporçMs variá-
nhagem para a mie do pai, uma vez que um "pai. e os seus «fIlhos» e dois
veis segundo, as regras; encontram-se 0,95 por cento de infracçõe8. à regra
cirmlos» Dlo podem casar dentro ~o mesmo grupo de unifiliaçilo.
no que respeita ao interdito que incide sobre as quatro patrilinhagFts fun-

\ damentais
de proibiçlode que (Ego, M,
ElO respeita aos·FM, MM); 3,5 bilaterais
consanguíneos por cento durante
de infracções à regra
três gerações
I (aqueles que partilham com ElO as mesmas linhagens materna e/ou de avós);
3,7 por cento de infracções • regra de proibiçlo de um homem se casar
na linhagem em que um «irma:o. já efectuou o seu casamento legítimo; "

7,5 por cento de infracções à regra que proíbe a um homem casar-*<: numa A.~.: AD
...
: D
das quatro linhagens fundamentais das suas esposas precedentes (W, WM,
WFM, WMM). Nlo c!, pois, na prática sistemática da infracçloàs regras
que se poderá encontrar uma explicação para os fenómenos oUservados. No esquema precedente, em rell\l1tado da primeira regra d' :proibição
da aliança que estabelece que as qU~tro linhagens de ascendentd directos
acima expostas sobre o problema da simetria entre ElO masc b e· ElO
, ,Partindo destas obse.rvaç.ões .con.-etas, e das reflexões =.:'. ;teóricas dé uma fJ;ltria
cônjuges, sejam distintas
O encontra-se dasAnlbito
fora do <tuatro do
linhagens de ascendentes
parentesco de A, A dt dos
B, Cseus
de
r feminino, e sobre o ,ent1'!Cruzamento de dois tipos de consanguini e, uma
derlDida puramente de maneira patrilinear sem Iimitaçlo de tempb, a outra B e E de B I • Em consequência da sefUnda regra, a esposa E de B I Dlo pode
definida de modo cognlltico sobre um lapso de tempo limitado a ,três gera- pertencer às linhagens A e C, dado cíUe um homem não casa com uma mulher
ções, construí hipóteses que foram submetidas a exame informátito sobre proveniente de uma linhagem ns qUal um irmão já se casou. Em consequên-
o corpus registado. cia da terceira regra, as duas mulijeres de B nilo têm qualquer relaçilo de
Em primeiro lugar, as regras proíbem a aliança com os membros de qua- parentesco entre si, uma vez que um homem não casa com uma mulher numa
tro patrilinhagens e, durante três gerações, com todos os consangutrleos nas- das quatro linhagens fundamentais, das suas esposas precedentes.
cidos de casamentos das filhas que pertencem a estas patrilinhagens,mas não Tendo recebido uma mulher de A, na geraçIo seguinte B pode, sem infrin-
falam da conduta a manter face às linhagens a que pertencem ascendentes gir qualquer regra (recorde-se o silêncio das regras acerca do comportamento
PARENTESCO 54 55 PARENTESCO
':~1~
matrimonial dos pares formados por consanguíneos de sexo diferente, e a O modelo abaixo reproduzido, que nAoinfringe neol. regra, apresenta
possível inverslo), dar uma filha à linhagem A. No caso particular ilustrado a acumulaçlo dos constrangimentos mais estritos: troca de irmIs reais entre
pelo esquema, ele dá ao f1lho do irmIo da sua mulher A, ou a f1lha que ele duas Unhas de descendencia apenas por linhagem. Vemos, no entanto, que
tiver tido da sua esposa C (com a linica condição de que a linha da mie de i a troca restrita pode ser realizada em cada duas gerações, efectuando para além
C e a da mie de D sejam diferentes), ou a filha que o seu irmIo ,B' tiver disso um fechamento no interior da consanguinidade nIo proibida na quinta
tido da sua esposa E (com a condiçlf:) de que a linhagem de E e a de D geraçlo. No caso em que houvesse maior n\1mero de linhas de descendência
e as linhas da mie de E e da mie d~ D sejam diferentes). e de ca~ntos em que se nlo trocassem irmls reais mas antes primas para-
lelas patrilaterais classificatórias(que sAochamadas terminologicamente tirmIs.
B por
A troca
primos
seria
paralelos
ainda mais
patrilaterais
fácil secl~~ificatórios;
sybstituíssemoso os
quepares
representa
fraternos
o caso,
A e por Ego), como é o caso entre linhas diferentes de uma mesma linhagem, as
aliás, o caso mais frequente, pois qqe, os casamentos primários se decidem troe8s tornar-se-iam possíveis combinando-se de modo alternado em todas as
ao nível da linhagem e D10 ao níve\9a fam11iaelementar. gerações. '
Poder-se~ia dizer q~e, a partir ~o fDomento em q~e as linha~en~ incluí- Fpram eStashipót4feSque,fortm submetidas a exame sistemático, em com-
rem no mínimo duas linhas agn4t1c8s,de descendênc18 (o que significa, no putador,1Obte o etII#tU de ca.1IIIl"mOS registados. Considerando todos os casa-
mínimo, os descendentes de dois innio!), a fortiori se incluírem mais, e sobre- mentos em que as genealogias ascendentes permitem conhecer para cada um
tudo se existirem no interior da ~ verdadeiras linhas nitidamente sepa- dos dois cônjuges entre dois a treze bisavós e mesmo mais, encontramos uma
radas do nível ancestral (cf. pp. 44-4S'- existem na verdade 92 linhas para percentagem de casamentos conaanguíneos que ultrapassa os níveis proibidos,
, 26 linhagens -, entlo, a trocare,strita regular torna-se possível entre patrili- da ordem dos 43 por cento, percentagem essa que seria provavelmente mais
nhagens ,duas a duas (ficando assente naturalmente que cada patrUinhagem alta ainda se todos os bisavós e tetravós dos dois cônjuges fossem conhe-
governa várias séries destas associaçOcsmatrimoniais regulares com outras cidos.
patrilinhagens), com a linica condiçlo 'de que as linhas distintas alternem as
Para além disto, demonstra-se estatisticamente que estas escolhas D10 inci-
suas prestações em cada geraçllo. Isto t possível, pelo facto de em.~da duas dem indiferentemente sobre todos os indivíduos ligados a Ego pelos diversos
gerações á série de esposas dos homens presentes numa mesma liJihagem pro-
vir de camadas familiares diferentes, lt pelo facto de serem reciprocamente
\ era
laçosconsiderado
genealógicos possíveis.
pelos Estas
genitores dosescolhas sAofeitas
cônjuges muito
incestuoso próximo
para do ~ue
eles própnos.
exclusivas em geraçOCsconsecutivas, para conservar a lógica de conjunto das
A ordem estatística estabelecida segue exactamente a ordem hierárquica de
regras para as duas situações represe~1tadasna fi8,Uraa p. 46.
classifiçaçlo dos consanguíneos dada pelo pensamento local: os co~sanguí-
Troca de irmIs neos ligados por intermédio de uma mulher a uma das quatro linhagens
consanguíneo
Troca original
primeiras linhas fundamentais de Ego (o par ancestral dos germanos é constituído por um
entre as duas
alternadas
deirmlsduas
permitido linhas Troca de irmIs irmlo e pela sua' irmI) estio mais próximos e muito mais escolhidos que
aqueles com que Ego partilha apenas uma linhagem de bisavó materna,
e fechamentt r
segundo qualquer cadeia genealógica (o par ancestral de germanos é com-
posto por duas irmls).

> > >


(No nível 3, as duas mulheres pertencem apenas reciprocamente à linha-
gem da mie do pai de um primo paralelo patrilateral (de terceiro grau canó-
nico) do seu marido. No nível 5, o fechamento efectua-se entre consangui·
neos que são legais reciprocamente em linha directa da linhagem da mie
do pai do pai do pai (linhagem 'não proibida) de cada um deles. A e A
e casam com FFFMBsssd, FFFFSsssd; O e • casam com FFFMBssss,
FFFFSssss).
>
PARBNTBSCO 56 57 .. " '" PARENTESCO
.i'\ '"
••

Parece, pois, que os sistemas semicomplexOl, de tipo omaha, funcionam melhor, como sist "'M de repaniçlo das mulheres. Mas enquanto os siste-
de modo endCSpmo como supenistemas aranda (os qusia dependem das mas elementares reservam o acesso' acenos consanguíneos próximos (por
estruturas elementares), escolhendo de maneira privilegiada parceiros na exemplo MBd), deixando os seus consanguíneos mais afastados à disposi-
çIo dos outros grupos para quem eles silo consangu{neos próximos, os siso
(Ve, J' quintalinhas
duas geraçIo seguinte àquela
de descendência onde
(isto está situado
é, desde o antepassado
a primeira geraçIoa comum
segUir àsa temas semicomplexos reservam o acesso aos consanguíneOS afastados, dei-
tr& gerações proibidas) no conjunto dos consangufneos cogn4ticos, mas selec- . xando os seus consanguíneos próximos Adisposiçllo dos outros grupos para
cionando de modo nIo alcatMo entre eles certas linhas genea1ógicassegundo I quem eles silo consanguíneos afastados.

os critérios de proximidade defmidos pelo sistema local. ' O princfpio de filiaçlo nos sistemas semicomplexos é um princípio de
No que diz respeito à segunda hipótese, relativa às trocas regulares entre ordem e de simplificação: este operil entre todos os consanguíneos cognáti-
linhagens, e se bem que os aflcu10saetua1mente disponíVeistratem apenas das cos clivagens que têm por objectivo ordenar e hierarquizar esses consanguí-
trocas regulares entre linhas distintas de linhagens - o que nIo representa &enio neos em relaç10 a Ego.
uma pane e Dlo a totalidade das trocas -, verifICa-se,no entanto, que 30 por Resta saber se este esquema pode ser aplicado de modo convincente a
i cento dos casamentos entram no jogo complexo das idas e vindas, quer com .,!:. todas as sociedades com estruturas semicomplexas de troca. Com base nas
f'
Iazões estruturais acima analisadasj, a resposta deveria ser aftrmativa. No
I\ por
séries simples
troca (sessenta séries
de ccinnls»quer de doaçio,
na geraçlo seguidaquer
seguinte) de contradoaçlo directa,
com séries mais quer
requinta- entanto, os trabalhos baseados em estatísticas aprofundadas Dlo existem para
das que vlo de três a dez trocas contempodneas ou sucessivas, alternadas gera· se poder sustentar com rigor esta afumaçllo. Mas, na descrição de outras
çllo apCSsgeraçllo (recordemos que as linhas discretas incluem tambént v(rias sociedades com sistema de parentCllCOomaha e estruturadas segundo proi-
linhas de descendência aptica). biçOes de aliança, encontram-se factos and1ogos aos que acabamos de des-
Como jd se viu, estes dois modos operatórios (casamento seJecti\io con- crever: por exemplo, entre os Minil&nkapatrilineares do Mali (segundo um
sanguíneo, a partir daquilo a que no Ocidente se chamou o quarto arau estudo inédito de Daniele Jonkhers), entre os Gagu bilineares dllCosta do
MarflOl, com sistema termino1CSgicdcrow (informaçllo fomecida por Jean-
. si. Conjugam-se por outro lado com um sistema cklico de p .sene- -Pierre Chauveau). A porta está l\)ena a outras experimentaçOCs.
canCSnico, e trocas
ra1izadas (A restritas
-. B -. entre
C -. •.• grupos)
-. A), cuja do perfeitamente
existência decorrecom:;tttve entre
quase au omati-
camente da combinaçAo entre a multiplicidade dos laços matrimoniais que
cada patrilinhagem mantém de modo reguJar com vdrias outras e o casa- 3. Passagem as 1StnIM'1U compl,xas d, aliança
mento .consanguíneo preferencial a partir da quarta geraçlo. •
Uma investigaçlo de ciclos orientados, com dez Jaços no tndxiDld, mos-
trou que os casamentos de tipo primdrio legftimo, isto é, os que sio trata- Falta-nos ainda tratar da passage~ das estruturas semicomplexas às estru-
dos pelos ancillos' da linhagem e os pais das filhas, defmem ciciei. numa Jizmente raros e tanto mais raros quándo fornecem dados estatísticos -, esco- ~.
proporçilo que é mais de vinte vezes superior à que encontramos. para os turas
lhidoscomplexas de parentesco.
na literatura UtiliIando
antropológica como basee alguns
cOiltemporânea trabalhos
que tratam das -formas
infe- ) -;..,',
casamentos realizados em unilo secunddria. :s periIÚtido pensar que. é por- complexas de aliança, vamos apresébtar algumas hipCStesesque poderio tal- ',;
que os primeiros obedecem a uma política impUcita de prestações generali- vez estimular futuras investigaçõesf, O assunto será abordado segUndo um
zadas entre linhagens, o que nllo acontece com os segundos. ; \lnico ponto de vista: o dos modos operatórios do fundonamentd :matrimo-
Perante o conjunto destes resultados, é claro que Dlo se podeíJl tratar
de concatenaçOes nascidas do acaso no interior de conjuntos pro~~bi1fsti- rica ou evolucionista (sempre que cates pontos possam ainda ser objecto de
cos, mas de verdadeiras concatenaçOesestruturais que decorrem logfcamente ) debate),
nial. O termo 'passagem'
mas num sentido nllo deve,;p<>is,ser entendido
meramen~llestrutural. numa ac~llo
A interrogaçlo histó-
cdnsiste em
da articuJaçllo entre as regras de classificaçlo dos consanguíneos e IIs regras mostrar se existe ou Dlo uma soluçpó de continuidade entre os mVdos ope-
da ,aliança. . ' ratórios observados nas sociedades copt estruturas semicomplexas, tais como
Bscolha preferencial entre os consattumeos de um ceno tipo, trbclas res- as apresentadas, e os observados em sociedades de estruturas complexas.
tritas entre linhagens,' Í'eprodução periódica das alianças, troca gen~raJizada' Esta questão apresenta todavia Wn aspecto complementar qde pode ser

11I0as modalidadesDemonstra-se,
por Uvi-Strauss. de funcionamento
entllo,dos
quesistemas elementares
os sistemas efdJdados
semicomptexos,' se formuJ~do da seguinte
mente numerosas maneira:
que Dlo parecemnals\,sociedades
~r socialmente contempodneas bumerica-
organizadas com base no
bem que funcionando ao contrário dos sistemas elementares (caracterizam· parentesco, este 11Itimodesempenha:nu Dlo um papel na escolha do cônjuge?
-se pelas proibições e Dlo por prescrições matrimoniais), obedecem ~s mes- O primeiro exemplo refere-se a algumas sociedades andinas onde a aliança
mas leis que estes e apresentam fonoas estruturais homólogas que podem é regida por proibições que Dlo silo de tipo crow-omaha,sem grupos de unifi-
ser reveladas. Podem igualmente ser defmidos da mesma maneira como Jiaçlo: entre os Incas cldssicos [Lounsbury 1978; Zuidema 1977) e nas comu-
modos de repaniçlo dos consanguíneos em casdveis e em Dlo-casdveis, ou nidades peruvianss modernas [Earl. 1971]. No entanto, no que respeita aos
PARENTESCO 58 59 PARBNTESCO
"",,1'-
Incas, Floyd Lounsbury, na já citada análise publicada recentemente em fran- r estrutura todo o resto do universo dos Incas. O sistema t~lcSgico inca DIo
cês pelos cAnnales», aventava, baseando-se nos textos históricos conhecidos, i seria ao mesmo tempo crow e omaJuJ, como na hipótese de Lounsbury, mas
que se tratava de um sistema terminoldgico raro com certeza, visto que simul- , de tipo havaiano, como propõe Murdock.
taneamente de tipo crow para os locutores femininos e de tipo omoha para os Sempre segundo os textos antigos, o casamento seria proibido entre os filhos,
homens, estando a totalidade relacionada com as linhas de filiação paralela, os netos e os bisnetos de dois cunhados, isto ~, os fundadores do panIJca, at~
agnática para os homens e uterina para as mulheres. Para além disto, teria e incluindo o conjunto conana (segundo Guam4n Poma e Ayala). O casamento
havido um casamento preferencial assimétrico com a prima cruzada matrilate- torna-se possível, por outras palavras, só entre descendentes de collana, ou
ral (MBd). Lounsbury chega a estas conclusões através de inteligentíssimas seja, ao nível can, tendo em conta apenas as linhas de filiação paralela. Uma
extrapolaçOCssobre algumas posiçOCsde ~ntesco cuja designação termino- tal possiQilidadede casamento, enquanto Dlo proibido, está comprovada como
lógica ~ conhecida, e a partir da qual ele .jnfere as designaçOCsdesconhecidas um tipo pectivamente realizado; Garcilaso de la Vega acrescenta que, só aos
de outras posiçOCs.Baseando-se nas mClSfnasfontes históricas, Zuidema des- nobres, e em,casos excepcionais, eta. poaíVeJ contrair casamento antes do limite
trói esta apresentação dos factos, conserv$do como um dado adquirido a acen- representado pelos quatro graQJ: os homens comuns podiam casar normalmente
tuação paralela da filiação. A sua argumeplação, que não ~ possível expor suma- com FFPS44d. Z~ cODlliera que é esta possibilidade endogAmicaque
faz com que o grupo local, nas culturas andinas, seja concebido segundo o
riamente,
nos é convincente.
baseamos Por consequênFia,
para apresentar é sobre a sua interpretação que
a realidade inca. modelo do ayUu e seja designado pelo mesmo termo. .
Os anti!os Incas não conheciam os ;grupos de uniflliação, fossem eles I se seO preferir,
fechamento do panaca na quinta geraçlo (incluindo a do fundador), ou
clAsou linhagens, mas apenas parentela~, que Zuidema define como .orien- todas as cinco gerações, é confirmado por Pércz Bocanegra na
tadas», porque elas apresentam linhas de .sucesslo masculina para os homens, sua obra e na famosa figura aqui reproduzida. Ele coDsidera a sucesslo de qua-
feminina para as mulheres, num conjunto de cinco gerações a partir de um tro homens e de quatro mulheres em linhas distintas como uma unidade. Um
núcleo inlçial formado por um genitor qusculino, pelos seus fdhos e fIlhas. casamento deve ser efectuado entre um tetraneto em linha agUtica e uma tetra-
Dois terqtos designam um tal grupo: p<lnIJca e ayllu. neta em linha uterina do fundador, para que uma nova unidade, um novo fHlnIJCa,
Panaca remete explicitamente para Q grupo formado por .irmlos» e por I possa nascer. a, pois, deste modo que o modelo com fechamento em cinco gera-
! çOCsestrutura o ayllu. A importância deste facto é tanto maior quanto existe
.irmãs» descendentes de um mesmo antepassado segundo o sistema de filia-
çlo paralela descrito atrás, ao longo de quatro geraçOCs,isto do ponto de necessariamente uma ruptura na sucesslo da filiaçlo propriamente uterina no
vista do falante masculino, membro do grupo. Inversamente, o termo ayllu momento em que um genitor-antepassado funda um novo ayUlI//HlnIJca, visto
remete para o mesmo grupo, mas do ponfo de vista exclusivo do antepassado- que ~a partir dele, e Dio da sua esposa, que se vão constituir ao longo de quatro
-genitor. Deve notar-se que neste esquema da unidade social inca se volta geraçõesas linhas de descendência uterina criadas a partir das suas filhas. O casa- 11

a encontrar o número cmeia) de cinco J[eracõcs: mento na quarta geraçio entre representantes das duas linhas de filiaçAopara-
lela sexuada suprime esta contradição e esta soluçio de continuidade. !. I

Mas Dlo ~ tudo; ao que parece, existiam usos, ou mesmo regras positivas
de aliança, que preconizavam a troca das irmis entre os homens, entendendo-
-se o termo 'irmis', na acepçio inca, como os membros femininos do mesmo
'
}eaylO I
P.ym Collana Cari panDCa segundo as linhas de filiação paralela própria à facilitação da troca
matrimonial da mesma geração. A confIrmar esta informação, algumas equi-
valênciastertninológicas (HMMB = WMF, o irmiI.oda mie da mie do marido
= ao pai da mil.e da esposa); HFMB = WFF (o irmio da mãe do pai do
marido = ao pai do pai da esposa) levam à construção de um modelo que
i . __.•. __\
permite, como no caso samo, ao mesmo tempo um fechamento sobre si pró-
prio todas as cinco geraçOCs(que é o fechamento endogAmico do panIJca) e
No âmbito dos pa11aCIJ as relações terminológicas de fraternidaJc nào desig-
séries de trocas regulares, geração após geração, entre matrilinhas e patrili-
nam apenas ligaçOCshorizontais entre germanos reais ou classwcatórios, mas nhas de ayllu/panIJca aliados. A troca das irmãs não deve ser tomada neces-
também as ligaçOCsverticais entre pais e fllhos. Cada um dos conjuntos de sariamente no sentido estrito de membros da mesma frataria: em cada nível,
fraternidade assim constituídos geração após geração tem um nome: cayao, os membros do mesmo panIJca slo entre si irmãos e irmãs.
payan, collana, ca";; estes correspondem aos quatro graus fundamentais de a necessário considerar que cada panaca dispõe de várias patrilinhas e
parentesco relativo ao genitor, mas que remete igualmente para uma divisão de várias matrilinhas, e portanto de m\lltiplas possibilidades de troca sem
quadripartida da sociedade que encontramos de maneira clara e evidente nos no entanto infringir as proibiçOCsde aliança até à quarta geração que inci-
mitos, na corte, nas organizaçOespolítica, hierárquica, militar, etc. Esta uni- dem sobre os descendentes reais de casamentos efectuados através de troca
dade social baseada no parentesco, numa visão particular da consanguinidade, de irmis.
1':\RI!S'fI!SC:O /~I 61 PARENTESCO
:~~ .

Zuidema não d6iiOe, naturalmente, de' uma documentaçio estÀtfsticapara


demonstrar a sua teoria; a sua an4lise baseia-se na difkil exegese dos textos
antigos. O mesmo acontece a JoOO'Earls, se bem que ele trate de sistemas
andinos peruvianos actuais, estudados nas duas comunidades vizinhas de
Vicos e de Samua. Em ambos os casos, nada nos é dito sobre o sistema
terminológico.
Em Sarhua estamos perante duas metades fortemente solidárias e rivais,
que se defmem de modo patrilinear, e do endógamas e nio localizadas.
A oposiçio marcada entre as metades encontra-se em diversos aspectos: nos
mitos, na cosmologia, na organizaçio política e nas estruturas ideológicas
de conjunto. No interior das metades coexistem unidades exógamas, que
não têm atributos orginicos para além de usarem em comum o mesmo nome
de grupo. Um indivíduo pertence simultaneamente 1 unidade de nome do
seu pai e 1da sua mãe. Todos aqueles que usam o mesmo nome de grupo
consideram-se entre si como irmios. :é proibido casar com alguém que tenha
. o mesmo nome de grupo que o seu (o do pai) ou o mesmo nome de grupo
que a mie. O. casamento preferido faz-se através da troca das irmls.
A partir da andlise escrupulosa destes dados, Bar1s demonstra que bas-
tam quatro grupos exógamos deste tipo para que todoi os indivíduos se pos-
sam casar correctamente, e que as relações alternedas dos grupos dois a dois
descrevem uma fórmula (de tipo ararula, sistema australiano com secçoes)
na qual se pode ver que a mesma estrutura se encontra em linha agnitica
1
em cada duas gerações - e isto graças troca de irmIs, casamento prefe-
rido, que é um operador de simetria - e em cada cinco gerações apenas
em linha materna. O que ele constrói é um modelo e nio uma representa-
çIo genealógica; modelo que simplifIcamosapresentando-o do seguinte modo:

Ad

Ca

(A letra maiúscula indica o nome db grupo do pai, a letra minliscula o nome


do grupo da mãe). t

Todavia, por muito que se trate de um modelo estrutural, o evidenciar


de matrilinhas, enquanto o ayllu ~ defme patrilinearmente, tem estreitas
relações com a realidade. De factoj Barls faz sobressair um princípio matri·
linear de herança para o gado e para as estandas (alguns casos do compro-
Fipra 1. vados durante cinco ou seis gerações); os agrupamentos para criaçio de gado
A partir de Pedro sucedem-se ao 1011IO de quatro seraçlles uma linha de .falhos» e uma do matrilocais, enquanto a transmisdo do nome se faz por linha paterna.
linha de «fiIhas». (A partir de P&e2: Bocanegra, RiIJuII1_lariD, ]63]). Num tal modelo, em cada cinco gerações um antepassado comum está no
63 PARENTESCO
PARENTESCO 62
"
...•.. ~
início de duas linhas; as duas linhas, uma masculina e a outra feminina,
juntaram-se exactamente como entre os Incas clássicos. O tetravO e o seu \ Os colaterais
sim~trica ou no interior odacasamento
alternada, mesma linhagem
que só podem
ElO _.t;roduzir, de pnSpriOl
com os seus maneira
tetraneto ocupam posições estruturalmente homólogas. Ora, todos os anos, ! germanos - Dio pode renovar. Basta que cada patrilinhagem tenha duas
durante uma cerimónia em honra da terra e dos antepassados, chamada linhas de descendência distintas, renovando cada uma as suas alianças em
_abertura da porta,., o patrão de uma ~tancia entra em transe e comunica . cada cinco geraçOes, com duas gerações de distAncia. Se se prefere, o casa-
com o seu tetravO, de quem ele ~ a ~carnaçlo, por meio de um duplo . mento de cada homem reproduz o do irmio do pai de seu pai (FFB),
! e 010 o do seu aVÔpaterno (FF).
percurso, e que foi, tal como ele, o matido da f1lhaherdeira. Os factos etno-
Isto é nem mais nem menos o esquema de funcionamento matrimonial de
gráficos confIrmam deste modo o mOflelo.
uma sooiedade com estrUturas semicomplexas, que vimos anteriormente a pro-
Na comunidade de Vitos, Barls deilcreve desta vez uma sociedade que
possui vC';rdadeirosgrupos de linhagenaj com forte patrilinearidade e solida- pdsito ~os Sarno: trocas regularea entre grupos (patrilinhagens, comunidades

den0lDf=,
que ~ qtmaca)de.alternadu.
grupo ~ ~ pOr linhas
pelo de descendência
menos (com a condiçlo
duas ünhas distintas), de
cada uma
das
riedade.
e fOIlDlll1,
Para além
portanto,
disso,unidades
estas linhagé~s
~te exógamas
individualizdveis.
estão d.esta vez Os
localiza-
Vico-
das ~ renovando Is IUlSpnSprias alianças em cada cinco gerações.
sinos, co~o os Sarhua, declaram 010 poiter escolher cônjuge no mesmo lugar Earls fornece alguns exemplos que ilustram os seus modelos, mas 010
de onde provém a mãe, e declaram praticar a troca preferencial de irmãs. dispõe ·infelizmente de um verdadeiro aparelho estatístico. Como Zuidema,
Calculam, além disto, a distância cor~ta entre futuros cônjuges segundo as suas demonstrações são no entanto apresentadas de maneira interessante
o critério explícito de que dois cOnjugejlpotenciais 010 devem ter antepas- e convincente com base na mitologia, nos rituais e na organizaçAo polí-
sados comuns no interior de um intervalo de cinco gerações. Dado que se tica.
trata sempre do universo cultural inca. voltamos a ·encontrar, sem que tal Nas sociedades puramente cogniticas, seD:lgrupos de filiaçio reconhe-
seja uma surpresa, estruturas idênticas ou muitíssimo próximas das dos Sar- cidos - unilineares, bilineares, paralelos ou outroe - as proibições matri-
hua e dos'·antigos Incas. A partir das ntgras matrimoniais enunciadas, Barls moniais incidem sobre os graus de parentesco. O ponto importante está,
chega à cóoousão de que bastam quatro·grupos de trocas para permitir trocas pois, em saber se nelas encontramos ou nio UDiileacoosanguíneas, ou seja,
I regulares entre !tropos e fechamentos c~nsanguíneos em cada cinco gerações. fechamentos no interior da consanguinidade ao fim de um certo nl1mero
de geraçaes, e isto de modo evidente. O problema elas trocas regulares, II

A B c D sim~tricas ou alternadas entre grupos de troca D10 se põe sob a forma I I


de grupos reconhecidos com base na filiaçio, lD.lI8pode pôr-se sob a de
grupos eu;a existência ~ reconhecida com base noutras características:
o património, por exemplo.
A primeira pergunta a fazer ~ se se pode estabelecer um limite 1 exten-
são de um parentesco cognitico? Esta questlo tem duas faces: qual ~ o
ndmero máximo de pessoal que qualquer individuo pode reconhecer como
sendo seu parente quando nIo existe a marca imediata de reconhecimento
que é a pertença a um corpo de linhagem constituído? a possível desco-
brir limiares? E a que níveis de memória se situam?
Em 1438, um arcebispo de Cantuária fundou a cátedra de A1l Soul's CoI-
lege, e nos estatutos de fundação, pediu que ela fosse sempre confiada, com
prioridade absoluta, a um membro da sua parentela. Em 1723, aquando de
uma eleição, houve contestação sobre o facto de saber se o professor em
questão podia ser ou Dio considerado como pertencente à parentela do fun-
dador (Freeman). Este problema permitiu a Blackstone publicar o seu Essay
on Collateral Consanguinity [1750] em que estabeleceu o seguinte cálculo:
Tirando todas as conclusões possíveis destes dados, Earls chega também partindo da suposiçio de que nenhum casamento se verifique entre consan-
ele à conclusão (como Zuidema) de que este modelo é compatível com tro-
r guíneos, na vigésima geraçio, cada homem tem já 1 048 576 antepassados.
I cas regulares entre as linhagens em cada duas gerações. A primeira vista Se cada casal destes antepassados tiver apenas dois fllhos e se cada um des-
isto parecia-lhe impoSSÍVel,uma vez que o casamento é proibido entre pri- tes fIlhos tiver outros dois e assim por diante at~ à vigésima geraçio, Ego
mos nascidos de germanos. Mas o que é proibido para os verdadeiros des-
cendentes 010 o é para os colaterais em linhas paralelas de descendência. ! nenhuma
conta entresociedade
a sua parentela274 877 906 944 pessoas. a,
humana pode evitar o casamento entre consanguíneos.
pois, evidente que
PARENTBSCO 64 6S PARBNTESCO
"
..
. ,
,:i
!
j,II
'~~.. . ,

'i O casamento entre parentes tem como consequencia nlo apenas a redução coa, reconhecidos q.~ por meio dos homens quer por meio das mulheres,
IIi
I de antepassados (se se casasse sempre com uma prima cruzada matrilinear, a~ l ~ geraçIo a partir de um aniepassado comum. O erro que se ~
J Ego teria apenas oito bisavós, em vez de dezasseis), mas também a de cola- tia consistia em interpretar este nWnero nIo contando as geraç6eI nas duas
terais [cf. Kasakoff 1974]. O facto é estatisticamente inevitável. O prot>lema liohas de descendencia, mas sim os graus: quatro numa das linhas e três
está em saber se ele é conscientemente procurado, a que nível é que Se situa na outra. A importAncia reside no facto de Piem Damien, ao defender
e em que proporções se realiza. .' a regra, ter plena consciência dos seus\'efeitos: a exopmia consanguíDeaabso-
Freeman demonstra que Dlo existem, ao que parece, socied*s .onde : luta fora da parentela deveria ser refofçada por alianças preferenciliis entre
a.relaçlo com primos nascidos de germanos Dlo seja conhecida (trata-se do consanguineos na geraçio seguinte l btinçlo das proibições. Escreve Pierre
terceiro grau canónico, do sexto grau civil, do segundo grau inglis). De Damien que quando se extingue a f~ia baseada no parentesco, ad mesmo
resto, o homem vive normalmente com trfs níVeis de coexistênci1tempo- tempo que as palavras para designar tata, a lei do casamento surgeHmedia-
ral: avós, pais, filhos e seus colaterais. :a bastante frequente, POÜlt'lIioJ?re- tamente e restabelece os direitos do atntigo amor entre os homens nbvos ...
tudo em sociedades diferentes da nossa, em particular sua formá' 8rbana, U, onde falta a mio do parentesco' que tinha reunido aqueles de que se
que se conheçam parentes ainda mais afastados. O reconhecimento âpeftn- apoderara, o casamento lança imediatlbente a sua garra .para trazel' ~ volta
tela nlo consiste tanto na capacidade de reconstruir •. verdadeira cadeia todo aquele que se afaste.. .I
geneal6gica quanto no facto de saber, ou de imaginar, que os a~ de Ego
e os de Alter tivessem sido primos germanos ou filhos de primoll germa- Guy
sante Tassin
sobre publicoudasem
a aetuaçlo .Inter~l:lord.
relações [1978Jdeumuma
~trimoniais artigo mui~res- do-
famt1ia,
nos; neste caso concreto, a parentela cogw(tica, intuída ou presumida, será
de quinto grau canónico ou décimo grau civil. A amplitude da Parentela sap ialandesa, dita de cfam1J.ia,o, l' ~a Sap. O autor, que patural-
conhecida varia evidentemente de sociedade para sociedade e de indivíduo -se no estudo
mente dasasgenealogias
verifICOU datas, pôdeq~e . em
trar ser reconstituídas
a existência atrav~
de uma .,deuma
nouvel con-
para indivíduo. Freeman, no seu notável trabalho sobre o conceito de .,aren- v~ia entre as infonnaçoes fomecidas nesta SIga e as retiradas de outros
textoll históricos. A consequtncia didd é a possibilidade de tratar eSte texto
tela (1961J,
nalável mostra, através
uniformidade para da
as documentaçto etnográfica
sociedades cognllticas de existente,
economia urp& assiM
'slmples: como documento histórico, e nIo a~ como literário. O período histó-
a maior parte limita-se a um conhecimento do quarto grau canónico (oitavo
rico
pela do qualislandesa,
Igreja trata vai por
de 884
voltaa de
130ij as proibiçOes
Ill2-23, canónicas
consideram o sextoestatielecidas
~u can6-
civil em
está ou romano,
situaçto terceiro ingles),primos
de reconhecer e um certo númeroe de
dos quinto sociedade
sexto ~gnáticas
graus C}lMnicos nico como o primeiro autorizado em tasamento, o que representa,~is, um
(como por exemplo, os Iban e os Melanau). Todavia, nem todos OStonsan- progresso relativamente l situaçlo aptesentada por Piem Damietl. Dir-se-
guíneos 810 reconhecidos do mesmo modo no interior dos mesmoll graus -ia que pua o autor também o sextO grau constituiria o limite .admitido,
de parentesco. A par da amnésia causada pelo maior ou menor afa*tiunento antes da criatianizaçlo, o que podem significar que a Igreja ~ ,tido em
residencial, existe uma camnésia estrutural» que pode ser bi- ou unilateral. conta a tradiçIo. "" ,
O jogo matrimonial vai desenrolar-se entre estes. Murdock [1949]estabe- Apenas cinco alianças se real~o' aquém do sexto grau can6~o, e de
lece como um princípio que as parentelas mostram normaIlnente u~ tenden-
cia pUa a exogamia comparávell das linhagens, e que mesmo nos Estados cada uma das vezes, tanto quanto parece, em troca de uma reccij:iliaçIo.
Unidos o casamento entre indivíduos que se reconhecem como perlençendo duos
Mas, casdveis,
e é isto classiflCldospor
que nos interessa,
geUI'i~,
~_~ e pertencentes
da sexta geraçlo,
aos nove
em gr:uposresi-
1~,9indiví-
l mesma parentela é normalmente «tabu». Freeman, no entanto, demonstra denclaia nomeados no texto, 62, ou :'si:ja, um pouco mais de metade, con-
que, inversamente, nas sociedades cOgnáticas, da Malásia especialmtnte, nllo traíram casamento de facto entre coris8nguíneos. Na própria sext8 geraçlo,
só d casamento no Ambito da Parentela Dlo é proibido, como é até ~ferido, relativamente ao antepassado, havia ~~ indivíduos casáveis, dos quais II se
casaram entre consanguíneos, tendo Ilpenas 5 escolhido o seu cMjuge no
a75partir dos primos
por cento de terceiroentre
dos casamentos grau os'ban,
ctDónico80(sexto civil).entre
por cento Desteostido, seriam
Sumbawa exterior da fam11ia.Para além disto, é 'claro que se efectuam estratélias polí-
e • volta dos 90 por cento entre os Bisaya. Estes números, na verdade notá- ticas em tomo das escolhas entre o é~ento consanguineo e o casamento
veis, deveriam ser suficientes para demonstrar a questlo, mas todavia será útil exterior.• 810 as ftlhas que preferencillbnente se dão aos consanguíneOs»[ras-
examinar também as sociedades cognáticas europeias. .I sin 1978, p. 86J: 66 por cento das raparigas casáveis 810 dadas a parentes,
Nas sociedades ocidentais 810 as proibições da Igreja e o seu prQgressivo contra 38 por cento de homens. O&.ramos primogénitos sobretudo casam-
abrandamento que têm conferido, ao longo dos séculos, os limiare. de con- ~se entre eles, e unem-se nIo apena~pelas obrigações mútuas dos consan-
sanguinidade além dos quais as uniões se tomam possíveis. . guíneos que tendem sem dúvida a ctnfraquecer por volta da sexta geraçllo,
No século XI, Piem Damien sai a campo a combater uma má interpre- mas também através das que unem 01 aliados entre si. Os ramos mais novos
taçlo que se estava a difundir sobre a regra canónica que regia a aliança: do mais atraídos pelo exterior e «SIo particularmente sensíveis à riqueza
as proibições pesavam então sobre o conjunto dos consanguineos' cognáti· dos futuros cônjuges, dado que devem estabelecer-se e Dlo apenas consoli-
PARENTESCO 66
67
. .... PARENTBSCO

dar as suas posições» [ibid., p. 95J. Do mesmo modo, os ramos mais novos f~1
têm um raio de aliança muito mais amplo (cerca de 80 km) do que os ramos No entanto, é preciso que as pessoas se casem; o tipo de casamento
preferido serd aquele que une um homem e uma mulher que 510 ambos
primogénitos, sobretudo quando estes praticam casamentos consanguíneos,
«segundos netos» do mesmo antepassado, que 510 pois entre si primos nas-
dado que nenhum dos futuros cônjuges está afastado do outro mais de
cidos de primos germanos. Este tipo de casamento representa 95 por cento
47 km. Pode concluir-se que existe uma estratégia matrimonial nestes casa-
dos casamentos realizados nesta ilha durante este século. A partir do
mentos consanguíneos: servem interesses políticos precisos, coesio, selida-·
riedade, prestígio. Em todo o caso, não do efectuados ao acaso: Tassin espe- (,)
T amomento
sua garraempara
quetrazer
cessa de
a proibição, como
volta aquele quedizia Damien,realiza-se
se afasta»; «Ocasamento deita
um fecha-
cifica que «os descendentes de Bjõrn Bpna têm um bom conhecimento da
mento np interior dos consanguíneos do terceiro grau canónico. Não esta-
sua genealogia e têm-na em conta antes de se casarem» [ibid., p. 87]. Vale
a pena, todavia, precisar que Tassin n4P considera os casamentos além do mos multo longe d? modelo do paruu:a inca, apesa; d.a dife~nça substan·
cial do tllodo de filiaçIo, paralela num dos casos e mdiferenciada no outro.
sexto graq como consanguíneos, reservaMo o termo, como fazem demógra-
J fos e genetistas, para os casamentos aqUém do terceiro grau canónico. Do Em ambospor
fraterno t
casoslaiIopo~.fYel
os. um reconhec.er
(irmIoIirmIo, a i~ponãncia
llmão/1lD1ã), social por
enquanto do mlcleo
outro
meu ponto de vista são-no, e do ponto '~e vista dos actores eram-no, dado
que tinh8lD como objectivo declarado aÇlUmularo estatuto de parentes e de sob;':':::l a importAncia do conjunto de consanguinidade formado por um
núm;;1fmito de gerações. Estes conjuntos finitos têm, além disso, em
consanguípeos: os /raendr tornam-se t~ir, reforçando com a redução dos ambos qs casos uma dupla extensio: ultrapassada a geração em que se
antepassadós a coesio dos grupos. Tam~ém Freeman [1961] tinha notado, pode efClCtuara aliança entre consanguíneos, duas gerações suplementares
a partir dQ$dados exóticos supracitadoll,)que o casamento regular entre con.
são recophecidas e contadas como fazendo pane dos S!!!!!BJl~eos •. mas .r ~ '
sanguíneos Jem como consequência a co"aolidação dos~, e que isso cons-
titui um traço significativo de um certo btimero de sociedades bilaterais que
netos
são designadas
«c~aros»e
lIOS»nos Incall:de«escuros»
maneira nos
a evidenciar
Tory islandeses,
a sua exclusio
filhos «nus»
do nl1mero
e «ma1cheiro-
central: ~'~.. -~
têm uma rede de parenteseo estreitamcltte cimentada e solidária, desempe- ,~JJ.
nhando o 'pápel principal nas múltiplas ~tividades da vida social, enquanto U
C4"'\.'_,,\~

ct:,~c' (·':rl.~.J,,:.J'"1
Tory Inca
estas mesmas sociedades carecem da +dura de coerência simplificadora
represent~da pelo grupo de unifiliação.'
Os habitantes da ilha de Tory desertos por Robin Fox (1979] repre.
sentam actualmente um aglomerado de· quatrocentas pessOas; a filiaçlo é
cognática e o sistema dos termos de n,ferência é esquimó. Seguem.se as Primeiroa netos
prescrições negativas canónicas no seu F&tadoactual: o casamento é proi-
bido normalmente entre primos germanos e aquém deste grau de paren. ,,~'/... ~. Segundos .
....•... netos
tesco, por exemplo entre tia e sobrinho.p grupo de descendência, o n11cleo
Netos cJaros»
de parente4, está centrado num antepal\88docomum que se situa no sexto
nível genealógico. Os indivíduos colocam-se sempre em relação a este ante-
passado cpmum: os primos germanos aAo os «primeiros netos» do ante-
passado, os primos nascidos de primos germanos 510 os «segundos netos» Filhos «malcheirosos>

do antepassado, e seguem-se os terceiros· netos ou netos «claros»,e os quar-


tos ou netos «escuros». (O representa indiferentemente um homem ou uma mulher·; • o6. indi-
Toda a vida social se estabelece em tomo da relação de germanidade en1lre cam que o casamento é possível nesta geração).
os filhos do antepassado, relação reproduzida em todas as gerações, com Ainda um último exemplo, desta vez francês. Pierre Lamaison [1979] ela~
uma nítida dominante agnática. Deste modo, as tripulações de pesca borou, com o auxaio de um computador, um trabalho muito interessante
efectuam-se entre irmãos, depois com primos paralelos patrilaterais (primos de recoJlStituiçlo e de análise das estratégias matrimoniais baseando-se nos
germanos e ftlhos de germanos) e, finalmente, caso seja necessário, com os arquivos genealógicos de uma paróquia de Gévaudan entre o século XVII e
maridos das irmãs. As relações de fraternidade dominam a vida social em o século xvm. O sistema é inegavelmente complexo, com filiação indiferen-
detrimento das relações de aliança. A vida conjugal não ocupa o primeiro ciada (cognática), nomenclatura de parentesco de tipo esquimó e interditos
plano, tanto que se prefere sempre viver entre germanos; as irmis mesmo matrimoniais estabelecidos pela Igreja, e que não ultrapassam na época os
casadas continuam a ocupar-se de cada um dos seus irmãos e vêm acabar primos nascidos de primos germanos (ou seja, de terceiro grau canónico).
os seus dias junto deles. A noção de património é neste caso fundamental. Lamaison demonstra,
seguindo o fio das gerações, que a preocupaçlo dominante é a manutenção
PARBNTBSCO 68 69 PARENTESCO
. tt'·~p~· ..
da intearidade do patrimdnio do onal, e até • poutvel o aumento da rela· (ou quase) se efectÚa entre herdeiros de. osurls düerentes-. a evidente que
tiva riqueza através de dotea trazidos pelos cônjuges do herdeiro. O patri. é necessdrio, a este nível, entender por linha patrimonial alio diverso do
mdnio a defender, a aumentar e a transmitir desempenha, neste sistema com- que acima foi dito. Com o sistema de excluslles previstas para cada gera·
plexo, a mesma funçlo de primeiro ,plano que a fJ1iaçlo ou· a repetiçlo da çIo, um casamento consanguíneo equivaleria a uma uniIo entre. membros
aliança nos outros sistemas, elementares ou semicomplexos, ou. que pode- de uma mesma frataria, ou entre primos germanos, se tivermos em conta
riam desempenhar outros elementos, a determinar cada uma das vezes, nou· a presença possível de herdeiros ditos menores (irmIos mais novos que per-
tros sistemas igualmente complexos. Em Ribennes, no Gévaudan, o impe- manecem junto do herdeiro maior, mas nIo a sua descend~ adulta).
rativo categórico, representado pela transmisslo do património intacto em -a preciso, plausivelmente, entender linha patrimonial como uma parte (ou
precípuo, desembQca numa negaç!o parcial da import4ncia do sexo:·os pais até a totaUdade) dos consanguíneos ~ticos descendentes do metmo casal
lICl'Í8m» um herdeiro em cada O$tal, macho ou fêmea (75 por cento 810 de antepassados, do qual parte a linha patrimonial propriamente dita; o con·
homens, 43 por cento sIo mulheres), escolhendo aquele que lhes parece mais ."'. junto numa profundidade m4xima tle oito a dez gerações a que t:hamare·
capaz de gerir os bens, ou aquele que se casa primeiro, com o de\'er 'de ~ lb08 .grupo de descendência •.
receber o encargo dos pais ou do herdeiro de dotar os irmIos e as irds ;. •. Cada indivíduo pertence desde que nasce a um ostal, a uma linha patri-
excluídos do património. A regra consiste em nIo se casarem dois herdei· monial, mas está ligado genealogi~ente a muitos outros grupos de des-
ros, pois que de outro modo chegariam a uma tal concentraçio de bens ceodeucia: através dos avós dos seuS avós, por exemplo, j4 est4 teoricamente
incompatível com uma vida social harmoniosa e com a própria subsiitaltCia Iipdo a 16 linhas diferentes. De resto, a escolha de um cônjuge mais novo
provido de dote, numa linha patrimonial düerente da sua, nIo exclui para
um herdeiro a procura de um casaúiento CODSIJ!8UÍIleo em quarto ou quinto
~ ~ \ um
~~..... lhe traz
ou mais
um Um
d.Osistema. irmIos
dote,herdeiro
o mais
qual novos
sem
(umageralmente
do herdeiro.
herdeira) utilizado
Emcom
casa 1576
para
casamentos
dotar
alguém pornoto
mais exImiDa·
~ que
.vez ou leI.to grau cancSnico.A técnica inform4tica utilizada pelo autor é tal que,
dos, dos quais 455 dizendo respeito a um herdeiro macho ou fêmea, apenas no que respeita a cada proponente. o cônjuge escolhido B6 é identif1Cldo,
tIfs se realizaram entre dois herdeiros pertencentes 1 paróquia de :Riben. isto é, genealogicamente situado, látivamente 1sua linha patrimonial. Ora,
nes, e vinte e tIfs entre um herdeiro de Ribennes e um herdeiro da 4rea por definiçIo, cotno se viu, ele pertence - através dos seus antepassados
do cantlo. Com excepçlo dos casos em que dois excluídos da herança se directos mais novos dotados que contraíram aliança na sua linha - a mui-
t08 outros grupos de descend!ncia. Cada indivíduo nIo tem apenas um linha
equivalem 1
casam entre concesslo
si (e poderio talvez
de dote fundar
entre duas um patrimómo),
linhagens. todas
Lamaiaon a~ unioes
chaD!i linha patrltnonial 1 qual pertence e que. 'o identifIca como membro de um ostal
especjfico mas também uma verdádeira parentela - de extenslo variável
tor do ostal, 08 filhos deste casal, seguidamente os filhOl do berdeitd ac0- conforme 'os indivíduos - na qual/ ele se reconhece menos em Junçlo de
\ ou linha patritno~t ao conjunto que engloba «O casal originalmen~ (Ieten·
p. 727], ele. Esta defmiçlo é importante, uma vezfllhos
lhido entre ospreeedentes, e depois de novo 01 que do berde:iroa
a an4lise [1979,
du imioes elementos precisos
menos seguro da possa
que ele cadeiaterge~gica
da relaçãodo
de que do conhecimento
consanguinidade ou' demais ou
aliança
coD8lJ1lUÚ1ClS realizadas com dispensa eclesiástica (e por uniOes con*nguí. que unia entre si os seus próprio~ ascendentes com os dos outros.
neas é preciso entender, como no caso de Tusin, as unioes aqu~ enio' AsSim, no esquema seguinte, Sgo, uma herdeira, 010 casard com um
além do terceiro grau cancSnico)mostra que nenhum casamento co~.
neo, isto é, necessitando de dispensa, se produz, dentro da mesDia linha tnonial (ele saiu da sua própria cda); mas o seu cônjuge mai&:hovo com
patrimonial, entre um herdeiro e um irmIo mais novo. Os trinta e cinco
casamentos que necessitaram dispensa verificaram-se entre innIos mais,novos
excluídos do patrimdnio, insuficientemente dotados para poderem casâr com
um herdeiro, e que pedem dispensa ao bispo epor motivo de póbreza ••
IIdote pode pertencer ao grupo de ~escendencia ao qual pertence Y, a sua
bisavó, irmI mais nova com dote qut casou com o seu bisavô em linha patri-
decendente
tnonial: estedecônjuge
N, porque ele podeda
possível se lig. aser
ela um
através da de
primo suaque
o avô ou a avó era primo ou priJha da sua própria avó paterna.
própria tUma....
patri-
ela soubesse que

Segundo Lamaison, os herdeiros das:Jinhas patrimoniais 010 transgridem


os interditos canCSnicosporque se movem exaetamente no sentido da ,lógica
do sistema matrimonial. que «Sebaseia numa circulaçlo de bens entre linhas;
a ,endogamiapatrimonial impediria que esta circulaçio se estabelecesse»[1977, N
--------
p. 265 ter]. Os mais novos têm um comportamento mais endogâmicoj tem·
torialmente falando, mas também em tertnos de consanguinidade, em comPa-
raçIo com os herdeiros para quem o raio de aliança é o cantlo e nIo a aldeia.
Existiriam, pois. pouqlÚSSimoscasamentos consanguíneos, e nunca den-
.tro da mesma linha patrimonial. «Nenhuma consanguinidade - escreve
Lamaison [1979, p. 733] - aparece entre proponentes pertencentes ao
mes~o ostal ou à mesma linha patrimonial. tal como nenhum casamento
PARENTESCO 70 71 ~~.
l~'
PARENTESCO

Se tivesse sido possível localizar, para os 3800 indivíduos analisados, o seu Os cálculos de MacCluer e Schull têm em conta a possibilidade de casar
exacto lugar nos diferentes grupos de descendência que constituem a sua com as quatro primas de segundo grau, os P-~-~~-~ oblíqua (por
parentela conhecida no momento do casamento, postulo que encontraría- exemplo: a fl1ha da ftlha do irmão do pai), e os do terceiro grau canónico
mos, a partir do quarto grau can~nico, uma frequente realização de uniões (estes primos alo designados à maneira inglesa como fazendo parte respec-
consanguíneas entre herdeiros de linhas e irtnãos mais novos com dote. Não. tivamente do primeiro e do segundo grau). Uma das conclusões mais inte-
se trata de querer fazer passar para primeiro plano o desejo de casar dentro ressantes - que é aquela a que eles se atém a maior parte das vezes para
da parentela a partir do momento em que cessam os interditos, mas esta o cálculo daquilo a que chamam matrimónio consanguíneo no limite do
vontade não seria incompatível com as outras estratégias que visam o casa- estatuto de primos em terceiro grau canónico - consiste no facto de, a par-
mento em mundo fechado e o reforço! do ostal. Tudo isto corresponde à tir do momento em que se tem a possibilidade de estabelecer genealogias
(fictícias ou reais) de mais deiete ou oito gerações, verificarmos que os
opiniãO dos entre
geralmente protagonistas
primos ••(.Segundo a lfadição
[ibid., p. 730p oral, àasdopessoas
e também autor: casavam-se
.Na reali- casamentOlfnointer;»r da coJ18lJlguinidade afastada (ou seja, além do ter-
ceiro grau canóDÍClO)flleDla1lDlelltlr consideravelmente o coeficiente médio.
dade, é visível que, depois de se ter t~ido um conjunto de laços com um
de consanguinidade da populaçio. Este facto verifica-se também através de
grande mlmero de [ostals] (da comuilid~pe local), as famílias preferem unir-
-se no exterior durante uma ou duas gerações [e isto significa o casamento trabalhos de simulação efectUados em populações artificiais que não apre-
sentassem qualquer preferência por nenhum tipo de casamento consan-
de hcrdeifOs com irmãos mais novos cOJIldote de paróquias vizinhas] e reno- gulneo. -
var posteriortnente as alianças no interior do seu antigo círculo•• [Lamaison
Seria pois muito surpreendente que em cerca de três séculos a popula-
, 1977, p. 2il]. Enfun, não é impossível 'tue se produzam até um certo ponto ção de Ribennes (Gévaudan) tivesse podido evitar totalmente casamentos
fechamentos consanguíneos de maneira puramente natural, se assim se pode consanguíneos afastados, dos quais uma parte é estatisticamente inevittfwl.
I dizer, a j~ar pelos trabalhos, especialmente de simulação, efectuados pelos Por outro lado, é possiVel que os casamentos consanguíneos a partir do
demógrafos e genetistas. qu8rtO grau canónico sejam mais frequentes quando o cônjUge provém de
MacChiér e Schull [1970] dedicaram-se a um trabalho ~e simulaçãO em uma paróquia vizinha (onde, por consequêilcia. o portnenor genealógico
conjuntos de características e de duraç40 variáveis (400 e 200 anos) cujos falta) do que quando ele provém da própria paróquia e da vizinhança
parâmetros demográficos alo calculados em função daqueles que alo real- directa.
mente observados na população japonesa da ilha de Takushima. Os resul- Outros trabalhos- de simulação - como o de Dyke [1971], baseado nos
tados da simulação podem deste modo ser comparados com os observados dados de uma população real (Northside, na ilha de Saint-Thomas DaI
na população real. A simulação é feita tm computador segundo o modelo Antilhas), que calcula os cônjuges potenciais por coortes, segundo impo-
de Hajnal, o qual postula que em nenhuma população humana o casa- sições demognflcas e sociais cada vez mais requintadãS e sempre em fun-
mento é realizado ao acaso (atribuindo a este tertno o seu sentido estatís- ção de re1açOesde parentesco primárias (que postula, erradamente em nossa
tico), mas sim sempre em função do intervalo que existe entre as datas opinião, terem possivelmente uma importância sociológica maior que
de nascimento dos futuros cônjuges. Este postulado acarreta uma série de outras) - demonstram que os casamentos endógamos, isto é, no interior
consequências. Assim, por exemplo, por' razões de ordem puramente demo- da comunidade local, são geralmente mais distantes do ponto de vista da
gráfica (idade conjunta dos dois sexos na altura do casamento, idade no consanguinidade que os casamentos exógamos, isto é, no exterior da comu-
nidade.
momento da primeira maternidade/paternidade, diferença de idades entre
os cônjuges, etc.), é mais fácil encontrar nas diversas sociedades humanas Isto poderia ser também o caso de Ribennes (Gévaudan) onde 1123 dos
um cônjuge potencial na pessoa da filha do irmão da mãe que na f1lha 1576 casamentos estudados portnenorizadamente põem em contacto um habi- .
tante de· Ribennes com um cônjuge originário das paróquias vizinhas e cuja
da irmã do pai, o que ilumina de modo interessante a controvérsia sol9re
genealogia Dio é reconstituída.
a existência ou Dio de sociedades que pratiquem de forma regular o casa-
r Em todo o caso, Laniaison demonstra de maneira explícita a existência
mento com a prima cruzada patrilateral [Leach 1961; Maybury-Lewis 1965;
i de um sistema que acumula as trocas restritas e as trocas generalizadas, enten-
Needham 1958].
didas no ·sentido da circulação de dotes entre irmãos mais novos e herdei-
De facto, as filhas casam-se e têm filhos geralmente mais cedo do que ros, entre as diferentes linhas patrimoniais. Uma das modalidades de ime- .
os seus irmãos, e são geralmente mais novas do que os seus cônjuges, diata reciprocidade, «sentida como ideal••, funciona como o modelo da troca
segundo números médios detertninados; o que implica, por consequência, restrita entre grupos (três no mínimo) que vimos atrás para os sistemas semi-
que uma ftlha de irmã do pai seja com toda a verosimilhança demasiado complexos nas sociedades poligAmicas:o chefe de um ostal, casado por duas
velha para Ego, enquanto as ftlhas de irmão da mãe se encontram nortnal- ve~es, casa uma fl1ha tida de cada uma das suas esposas com um parente
mente na situação correcta para se casarem. (irmão ou sobrinho) da outra esposa. Os exemplos de troca generalizada
PARBNTBSCO 72 73 PARENTESCO
..
.o::,.'~•
jV ~
põem em relaçlo quatro a sete oltals e levam por vezes vmas gerações, até cada tipo de sociedàde, se oAo cada sociedade, ~ capaz de apraentar uma
seis, para se fecharem. . fórmula totalmente original. Ora isto ~ impossível segundo a IcSgica,dado
que todas as sociedades humanas funcionam, como vimos no início, a par-
tir do mesmo reduzido material, que Dio permite seDio um ntlmero fmito
de figuras de base.
Lamaison evidenciou, em Gévaudan, duas destas fIgUras: a troCa restrita
e a troca generalizada. Os outros autores, no trabalho dos quais nos baseá-
Linha mos para tratar do funcionamento matrimonial dos sistemas complexos, mos-
patrimonial
,I';'.PO
traram
Ambito
a existência
da consanguinidade
de uma terceira
cogJ1ática-
fIgUra, segundo
a que chatnámos
fórmulas ovariáveis em
fechamento
01_ ; profundidade e em relação ao tipo de cadeia genealógica -, fIgUra acompa-
;. .\ ibada claramente ou Dlo de trocas, restritas ou generalizadas. Postulámos,
por llltimo, no furi de uma extensa análise sobre o trabalho de Lamaison,
a existência de fechamentos consanguíneos do mesmo tipo, tam~m no
i' I ~udan, que Dlo foram detectadbs pelo autor em virtude daS próprias
Seis gerações (isto ~, cento e quarenta anos) representam evidentemente condiçc1esda andlise (em Ribennes, as genealogias nio do estabe1ecidaspata
um, caso extermo, mas se se puder demonstrar, com exemplos p~isos de os cônjuges exteriores; os cônjuges. 110 confrontados em relaçlo l~ua linha
circ:u1açlonlpida de dotes .entre ma ou quatro OIt4ls, que se trata reâlmente patrimonial e oAo em relaçAo a todf, os grupos de descendência aos quais
de uma estratégia consciente e organizada, em que argumentos é 4ôe nos podem pertencer). '
podemos basear para pretender que ciclos mais longos, que levam mais NIo ~, necessúio que os indiví4uos que nascem dentro de Jna famí-
tempo e que unem mais grupos entre si, mas que funcionam rigoroH1nente lia, aí vivam e aí desenvolvam laços de sociabilidade com a vizinhança
segundo os mesmos principios (circ:ulaçãode dotes entre linhas patritiloniais mais ou menos próxima e com a ~ntela (porquanto estes dois termos
de mais novos para herdeiros, sendo o sexo indiferente) se devem ~lusi· se excluem reciprocamente) tenhlUft um conhecimento perfeito dos diver-
vamente ao acaso?
soa quadros de consangu.inidade na intersecçlo dos quais o nascimento os
A organizaçIo apresentada por Lamaison com os seus seis ciclos de troca
colocou. Do mesmo modo que pata a aprendizagem, durante .• infincia,
remete-nos para os debates, objecto de longas discussões, mais ou menos
do emprego correc:to da terminologia do parentesco, ~ sufic:ient~·conhecer
as regras de converslo que permitem passar do termo que o pai ou mie
tam positivas regras de aliança (prescrita ou preferencial), as populaç(b estio
utilizam para designar uma pessoá ao que deve ser utilizado para desig-
conscientes ou nIo das estratégias matrimoniais que elas desenvolvetn real-
nar essa mesma pessoa; assim, é:suficiente, para estabelecera sua rede
\ sofistic:as,
mente e que sobre os seguintes
se detectam problemas:
atrav~ se, em
de análises primeiro quando
estatísticas, lugar, quando fal-
estas estra-
de parentela afastada e a existênc:iá de um parentesco, por mai. ·vago que
tégias ultrapassam os níveis imediatamente perceptíveis, por causa tanto da
sua evidência física (como a troca de irmIs) quanto da sua frequentia;se, este sejp, conhecer a existência de ,uma relaçlo, ou apenas de uma desig-
em segundo lugar, se pode falar de estratégias e de estruturas quando:aquelas nação de parentesco, entre os seus ascendentes e os do outro:' bs nossos
que se detectam relevam do modelo estatístico e Dio do modelo conSCiente, avós eram primos.
Quando, por sua vez, Ego se tdma avô (avó) e que ele transrlUte a sua
ae se
certeza,
se podem
de uma
determinar
realidade
limiares,
social vivlta,
do! quais
inteligível
seja possível
para os
passar,
pro~iústas,
c4m toda rede de parentela aos seus netos (c~ todas as lacunas e esqueciirlbntos que
consciente de si mesma, para uma outra que DJo o seja, constitu1da por
mecllnismos obscuros aos indivíduos nela implicados; se, finalmente, se deve estatuto de primos pode deste m ~ cobrir, genealogicamente (aiando, at~
asete
história bem Lembremo-nos
gerações. como o moviment~'
de \te'tural
esteda
~ opopulaçlo impõem)"este
mlmero de vago
gerações proibi-
requintados de análise mas que Dio 510 imediatamente reconhecidas como das em casamento pela Igreja no século XI.
\ atribuir valor
suas pelas sociológico
populações quea estruturas
as põem emque pnltica.
se descobrem através de mitodos Três é o mlmero médio das gtrações que podem coexistir; cinco é o
Tais questões Dio slo, a priori, destituídas de sentjdo, mas, pírtsando n\lmero ~o de gerações conhecidas de Ego ao longo da sua vida: conheci
melhor, passam a sê-lo, na medida em que postulam necessariamehte que
existe, uma multiplicidade de soluções possíveis para o problema da aliança
e das, suas modalidades nas sociedades humanas e qJ1e, em última análise, I1 os meus avós, conhecerei os meus netos; sete constituem sem dúvida o valor
L da consanguinidade,
múimo da memória.:
do conhecimento e transmisslo oral directa, da apreenslo global
PARENTESCO 74 75 PARENTESCO
~j'.
Ii~

Não énecessúio insistir para recordar a import4ncia que têm estes valores A indiferenciaçAo social do sexo (e da ordem do riascimento) que torna
(sobretudo as três e as cinco gerações) na literatura etnológica, em virtude igualmente herdeiros os machos ou as fêmeas, fUhos segundos ou primogé-
da universalidade do dado ~·lIncr~·to quc elas rCI'rcsentam. nitos - o que é perfeitamente compatível com o próprio princípio de fllia-
ção indiferenciada -, é a astúcia social que permite às estratégias matrimo-
niaisconstituírem-se em ciclos de troca de dotes em volta dos patrimónios

Ego e Alter 1'0- I


dem transmitir L_
r- ,II
..•
Estudo
global de
a conservar, aumentar e transmitir, no interior de parentelas que teriam ten-
dência a fechar-se sobre elas próprias, ultrapassado o quarto grau canónico,
se a argumentação adoptada estiver correcta. Esta asnicia social é a que Uvi-
-Strauss [1967] designa «um elemento arbitrário, uma espécie de clinamen
uma área
aos seus netos o sociológico que, todas as v~ .que o mecanismo subtil da troca for blo-
possfvelde
conhecimento queado, vW como UlJl dnu ", IffQthina dar a ajuda indispensável ao forne-
consangui-
que eles próprios ter recíproco nidade cimento de um novo arranque» (trad. it. pp. 610-11).
têm de que os Sempre que a troca matrimonial se encontra regida por regras negativas
Coexistência
seus avós Cf8ID que incidem sobre um número finito de graus de consanguinidade (estrutu-
1':
primos em tercei- Al 1 Conhecimento ras complexas) e que surge no primeiro plano da escolha de cônjuge uma
ro grau canóJÜco
..
preo:cupaçio especial (percebida estatisticamente) em realizar preferencial-
Estas linhas de divagens sucessivas desenham áreas de densidade dife- mente algo que nada tem a ver com a preocupaçlo de casar dentro do seu
rencial deconsanguinidade, que sio de toda a maneira mas onde se exerce parentesco, como por exemplo a procura da consolidação do prestígio, da
uma certa familiaridade relativamente ao exterior. Reconhecer-se primo no segurança ou dos bens, devemos interrogar-nos qual é o «elemento arbitrá-
rio» que permite ao sistema funcionar segundo as modalidades elementares
acaso de uma conversa, por ocasÍlo de uma festa, de um casamento, de
da troca nas suas diversas flgUraS possíveis. .
um enterro, significa já dar um passo na intimidade de outrem; aproximar-
-se legitimamente e sem medo dele, é «poderem frequentar-se». De facto, e é esta a primeira hipótese avançada, em todas as sociedades
Formulamos como principio que estas áreas de consanguinidade máxima, que funcionam com estruturas complexas de parentesco e de matrimónio,
que estão para além do núcleo que formam os graus de consanguinidade proi· profundamente escon~das e difíceis de descobrir, se encontram estas moda-
'. bidos, constituem a área preferencial da escolha do cônjuge nas sociedades lidades elementares de troca de que demonstrámos a existência em socieda-
I tradicionais de estruturas complexas de parentesco. Todos os grupos huma- ! des que funcionam com estruturas semicomplexas de troca e das quais pelo
nos hesitam entre o que se pode chamar os dois pólos da recusa: o incesto menos se intuiu a existência, graças ao exemplo de um certo número de
e o estrangeiro, o demasiado próximo e o demasiado longínquo, e decidem sociedades dependentes das estruturas complexas.
através de regras culturais o que pertence a uma outra categoria (cf. o artigo Esta hipótese Dio pode deixar de ser demonstrada, seja qual for a lógica.
cEndogamia/exogamia»). Como escreveu. divertidamente e justamente James Uvi-Strauss tinha perfeitamente visto isso quando escreveu que «li estrutura
Bossard: ..cupido pode ter asas, mas aparentemente estas não estão adapta- de troca Dio é necessariamente solidária com a apreciação de um cônjuge
das a grandes voos» [1932, p. 222]. Falava ele sobre a residência dos futuros preferido. E mesmo que a multiplicação dos graus proibidos elimine primos
esposos, mas nio é tudo: as asas de Cupido não são suficientemente podero- de primeiro, segundo ou terceiro graus (segundo o senso comum; segundo
sas para que ele possa sair não apenas d,o campo deatracçlo da residência, o direito canónico, trata-se de primos de segundo, terceiro e quarto graus)
mas também das linhas de força do campo do parentesco. do número dos cônjuges possíveis, as formas elementares de troca, que nos
Casamentos consanguíneos cognáticos deste tipo, situados entre o de •. a- empenhámos em definir, continuarão ainda a funcionar» [ibid., p. 606].
siado próximo e o demasiado longínquo, podem harmonizar-se com muitas Troca restrita, troca generalizada, fechamento no interior da consangui-
outras exigências que aparentemente se tornam primordiais. Conforme os I nidade, repetição das alianças são as modalidades de base, tanto nas estru-
casos, tomar-se-á em consideraçlo em primeiro lugar a classe social, a pro- ! turasA troca
elementares comonas semicomplexas e complexas de parentesco.
generalizada,
nas estruturas elementares, liga entre si grupos de
fissão dos pais, o estatuto, a religião, o nível de fortuna ou de educação,
a vizinhança geográfica, etc. No Gévaudan, no século XVIII. trata-se de con- troca por intermédio do casamento assimétrico dos homens com a f1lha do
servar e de transmitir o património a um único herdeiro. Mas contraria- irmIo da sua mie (MBd). O fechamento no interior do parentesco consan-
mente ao que pensa Lamaison, o casamento consanguíneo cognático Dio favo- guíneo ocorre deste modo, em todas as gerações, no segundo grau canó-
rece a concentração dos bens entre as mesmas mlos, a partir do momento nico, e este fechamento reveste apenas uma única forma imediatamente
em que ele se verifica entre linhas patrimoniais diferentes, a menos que dois detectável (um único tipo de cadeia genealógica), mesmo que as suas con-
herdeiros se casem entre si. sequências sejam rigorosamente inversas consoante se considere o ponto de
PARENTESCO 77 PARENTESCO
, 76
..
I
vista masculino ou feminino e as rqral de rillaçlo. Quando os fechamentos i I çlo a outras ~t~' conhecidas. Lounsbury apercebeu~se disêo, • partir
COJ18IDIUÍDC08 810 mais tardios, sobretudo a partir do quarto grau canóilico, da análise das terminologias de parentesco consideradas como u formas tipi-
e os percursos genea1dgicos possÍVeis 810 numerosos (dezasseis nó quarto ,I camente mais puras de patrilinearidade (sistemas omaha) e de matrilineari-
grau; trinta e dois no quinto, etc ... ), poderia parecer legítimo pretender I \ dade (sistemas crow) e concluiu: «Parece•.• que nllo do muito numerosos
que os ciclos de troca generalizada, quando os descobrimos, Dlo exprimem , . os sistemas. .. que nilo têm em conta genealógica bilateral o parentesco indi
nada al~m do simples efeito de uma lei de ordem probabiUstica. Isto seria vidual, por mais unilinear que seja a aparência, ou oblíqua que seja a ava-
! , liaçIo da geraçllo» [1964, p. 381]. A escolha de um sexo como prindpio
talvez verdade se Dlo houvesse nunca a mínima vontade dirigista na esc0-
lha do cônjuge no interior das sociedades com estruturas complexas de de filiaçIo e/ou de um modo de flliaçllo orienta de maneira espetial uma
aliança. A nossa segunda hipótese introduz, por consequência, dois ...,j e DIo ordem hierárquica dos critérios de proximidade dos consangut'neos'relativos
apenas um - «elementos arbitrlbiosa para permitirem ao sistema ma.trimo- .;' • Ego, no pensamento local, sendo l>emclaro que Dlo existe umàsituaçllo-
nial funcionar. O primeiro é a tal ajuda que anula um dos dados do pro- -tipO, em resposta a uma mesma e~olha, por causa da história pi'ópria de
blema para permitir a realizaçIo recorrente de um projecto primordial P'I'I ;,..,. cada sociedade. '
todos os protagonistas da sociedade. No ~udan, é a indiferenc. do Esta mesma escolha remete pacl uma reflexão sobre o estatutb do par
sexo e da posiçao de nascimento de um t1nico herdeiro (se bem que Sé tenha
assinalado que se trata de datas fundamentais do parentesco) que il'll per_ I formado
J
por um irmllo[1967,
mula de Uvi-Strauss e por trad.
uma i~.
itmll, o «par tantas
p. 574], assimétrico»'~do
vezes entendido acomo
fór-
mitir aos dotes circulareln em ciclos de troca mais ou menos longos, ao particular nu sociedades tradicionais: os .belúSÍlDOSJo dos Wintu. «Ocon-
mesmo tempo que permite ao patrimdnio-ostal ficar intaeto. O segUndo é junto sagrado» da Nova Caledónia, ~ base do /HJ7UICtJ entre os locas, ou da
\ o seguinte: nos sistemas semicomplexos, as rqras que proíbem a éliança verdIdeira intimidade entre os Toryislandeses. A re1açlloirmllorll'JDl,aquela
referem-se a grupos definidos geralmente por uma regra de unifiliaçio e omi- em que a identidade dos germanos ido mesmo sexo oscila para a diferença
tem qualquer referência • consanguinidade cognática biologicamente, oU antes (d. o artigo .Incesto»), tal como s'e pode entend~-lo através dos, sistemas
genea1ogicamente, fundada. Todavia, esta parentela cogndtica desempenha de designação e dos comportament~ matrimoniais e outros que deles decor-
rem, ~ a fJSU1'8central onde se encartla a relaçllo religiosa, cconó1JÚdle social
Dlo só umsituados
bilaterais papel, fora
mas dos
um grupos
papel central na escolha
interditos do cônjuge.
de unifiliaÇlo Os primos
810 proibidos em entre íunç(les de produçllo e de repri>duçllo.Três fórmulas, apenâs, sIo pas-
I casamento para Ego durante um lapso de tempo que corresponde Imen- sfveis de conferir a estas funções PJsições respectivas dependent~ de uma
i sIo média da vida, ou seja, daquela coexistência de gerações de que fald- ref1exlo ideológica, e da qual de<ibtrem, por consequ~ncia, es40lhas de
\ mos. Ultrapassado este limite, constituem o campo preferido de ~, mas diversa ordem, entre as quais a da Sistemática do parentesco: irmllb = irmll,
i Dlo de maneira indiferente: segundo escolhas que 810 consequência'dá,hie-
irmIo > irmll, irmllo < irmll. Est.s três fórmulas, as l1nicas lojicamente
rarquia imposta pelo próprio princípio de riliaçlo. No vasto campo da con-
sanguinidade bilateral, a regra de filiaçlo secciona conjuntos organizados de
l
, possíveis, surJiram desde as origens reflexão humana sob aparências menos
.abstractas que as equações precedentbs, por causa do trabalho simbólico efcc-
consanguúleos perif~ricos, e as linhas de força da aliança reconduzetrl siste-
tuado debaixo das exig~ncias do dado biológico representado pelas relações
maticamente ao centro alguns deles. Inversamente, nos sistemas complexos,
homem/mulher, primogénito/mais r\ovo, genitor/fdho (ou anterior/posterior
onde a regra negativa de aliança é expressa em termos de graus genealógi-
em termos de geraçllo) que se imbricam estreitamente (cf. o ard80 «Mas-
cos sem qualquer referência a um princípio de filiaçio ou a uma qualquer
culino/feminino»). Deste modo, te~.mos: '
preferência por um tipo de percurso sexuado ao longo de cadeias intermé- I;:: ~ , f

dias,. e onde no entanto o exame atento da regulamentaçio matrimonial pode - um homem e a sua irmã são cônsiderados como pertericent~ âo mesmo
fazet àparecer igualmente a mesma at,pcçllo da periferia para o cenirb, Dlo
se pode excluir a hipótese de que a ari"álisedas escolhas realmente optradas nível genealógico,
tícia, mesmo ese~ lfC: encontram
entre primogénito mais nova;numa relaçio desJgual, fic-
por grupos humanos suficientemente vastos e com uma profundidad~ sufi- - um homem e uma mulher são considerados numa relação genealógica,
ciente faça aparecer a existência de critérios dependentes de um ,sistema e de autoridade, de pai a ~;
implícito de filiaçllo e de classificaçllo hierárquica dos diferentes tiPos de - um homem e a sua irmll sãdl considerados como tendo ultta relação
consangut'neos em virtude deste sistema implícito de ftliaçllo. . genealógica, simbólica mas dio de autoridade, de mie a fdho.

Para acabar, algumas achegas sobre outros temas de reflexão. É preciso Deveria ser possível, pois, estabelecer uma teoria geral do parentesco (ter-
repensar a noçllo de ftliação (unilinear, bilinear, paralela, alternada I etc.) minologia, fdiação, aliança) mostrando como se organizam, a partir das tr~s
como um artifkio que permite efectuar uma classif1C8Çllono conjunto dos fórtnulas iniciais, as grandes linhas das séries associativas paradigmáticas que
consangut'neos cognãticos, privilegiando certas linhas genea1ógicas em rela- se encarnam em sistemas concretos,. das sociedades reais, utilizando leis sim-
PARENTESCO 79
78 PARENTESCO

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