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Programa de Governo 2002

Índice
Crescimento, Emprego e Inclusão Social
Introdução .......................................................................................... 2
Política Externa para Integração Regional e Negociação Global............... 6
O Desafio é ter uma Economia menos Vulnerável ................................ 10
Mobilização pela Produção e pelo Emprego ..........................................12
Inclusão Social com Justiça Ambiental................................................. 14
Educação e Cultura para Fortalecer a Coesão do País........................... 14
Programa de Reformas ...................................................................... 16
· Reforma Tributária .......................................................................... 16
· Reforma da Previdência................................................................... 17
· Reforma Agrária .............................................................................. 21
· Reforma Trabalhista ........................................................................ 22
· Reforma Política .............................................................................. 24

Desenvolvimento, Distribuição de Renda e Estabilidade


A Herança Econômica ........................................................................ 26
A Herança Social ................................................................................28
O Social como Eixo do Desenvolvimento ..............................................30
O Fortalecimento da Economia Nacional .............................................. 32
A Dinâmica do Novo Modelo................................................................34
A Política Industrial do Novo Modelo....................................................35
A Transição para o Novo Modelo tem como Alvo o Crescimento ............ 38

Inclusão Social
A Política de Garantia de Renda Mínima .............................................. 41
Programa de Combate à Fome ............................................................43
A Política de Educação ........................................................................44
Uma Nova Política Educacional ............................................................46
A Política de Saúde ............................................................................ 46
A Política de Assistência Social ............................................................ 51

Infra-estrutura e Desenvolvimento Sustentável


Diretrizes Gerais ................................................................................ 53
Fontes de Financiamento ....................................................................54
Nova Política Nacional de Desenvolvimento Regional ............................56
Reconstrução das Cidades e Desenvolvimento Urbano ..........................58
Projeto Moradia..................................................................................60
Mobilidade Urbana..............................................................................61
Transporte ........................................................................................ 62
Políticas Ambientais, Saneamento e Meio Ambiente ..............................63
Recursos Hídricos .............................................................................. 64
Energia ..............................................................................................65
Setor Elétrico..................................................................................... 65
Setor Petróleo ....................................................................................68
Álcool Combustível............................................................................. 69
Tecnologia da Informação .................................................................. 69
Política de Infra-Estrutura de Comunicação Telecomunicações ..............71

Expediente ......................................................................................72

1
Um Brasil para Todos
Crescimento, Emprego e
Inclusão Social
Introdução
1. Para mudar o rumo do Brasil será preciso um esforço conjunto e
articulado da sociedade e do Estado. Esse é o único caminho para pôr em
prática as medidas voltadas ao crescimento econômico, que é fundamental
para reduzir as enormes desigualdades existentes em nosso País. A
implantação de um modelo de desenvolvimento alternativo, que tem o social
por eixo, só poderá ter êxito se acompanhada da democratização do Estado e
das relações sociais, da diminuição da dependência externa, assim como de um
novo equilíbrio entre União, estados e municípios. Da mesma forma, o
estabelecimento de segurança e paz para a cidadania, da plena defesa da
integridade territorial e de uma orientação externa que permita a presença
soberana do País no mundo são condições necessárias para a construção de
um Brasil decente.
2. Só um novo contrato social que favoreça o nascimento de uma cultura
política de defesa das liberdades civis, dos direitos humanos e da construção de
um País mais justo econômica e socialmente permitirá aprofundar a
democratização da sociedade, combatendo o autoritarismo, a desigualdade e o
clientelismo. Na busca de um novo contrato, a mobilização cívica e os grandes
acordos nacionais devem incluir e beneficiar os setores historicamente
marginalizados e sem voz na sociedade brasileira. Só assim será possível
garantir, de fato, a extensão da cidadania a todos os brasileiros. É
indispensável, por isso, promover um gigantesco esforço de desprivatização do
Estado, colocando-o a serviço do conjunto dos cidadãos, em especial dos
setores socialmente marginalizados. Desprivatizar o Estado implica também um
compromisso radical com a defesa da coisa pública. A administração deixará de
estar a serviço de interesses privados, sobretudo dos grandes grupos
econômicos, como até agora ocorreu. Um Estado eficiente, ágil e controlado
pelos cidadãos é também a melhor arma contra o desperdício e a corrupção.

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3. A imensa tarefa de criar uma alternativa econômica para enfrentar e
vencer o desafio histórico da exclusão social exige a presença ativa e a ação
reguladora do Estado sobre o mercado, evitando o comportamento predatório
de monopólios e oligopólios. O controle social dará também mais transparência
e eficácia ao planejamento e à execução das políticas públicas nas áreas de
saúde, educação, previdência social, habitação e nos serviços públicos em
geral. A boa experiência do orçamento participativo nos âmbitos municipal e
estadual indica que, apesar da complexidade que apresenta sua aplicação no
plano da União, ela deverá ser estendida para essa esfera. Em outras palavras,
nosso governo vai estimular a ampliação do espaço público, lugar privilegiado
da constituição de novos direitos e deveres, o que dará à democracia um
caráter dinâmico.
4. O contrato social que desejamos promoverá não só a independência
entre os três poderes da República como também uma relação mais equilibrada
e respeitosa entre União, estados e municípios. Somente um novo pacto
federativo poderá corrigir as históricas desigualdades regionais, agravadas nos
últimos oito anos, quando a União descentralizou atribuições e encargos
administrativos para estados e municípios, ao mesmo tempo que concentrou
recursos em Brasília. O novo pacto deverá observar os seguintes princípios:
(a) uma política tributária justa;
(b) pleno cumprimento do orçamento federal;
(c) novos critérios de financiamento compatíveis com o modelo de
desenvolvimento que buscará a integração equilibrada do País;
(d) respeito à diversidade e às especificidades regionais e locais nas suas
dimensões econômica, social, política, ambiental e cultural;
(e) reconstituição de agências regionais encarregadas de aplicar políticas de
desenvolvimento. Os problemas regionais têm de ser entendidos como
questões nacionais, que pedem um esforço do Estado e de toda a sociedade
brasileira para resolvê-los.
5. O combate às desigualdades econômicas e sociais é condição necessária
para que seja garantido a todos os brasileiros e brasileiras o status de
cidadãos, homens e mulheres realmente iguais perante a lei. Mas também é
preciso um esforço político e cultural para que se afirme no País o princípio da
igualdade. Não basta que sejam combatidas as causas econômicas das
múltiplas formas de desigualdade. São necessárias ações positivas para que se
ponha fim às formas de discriminação existentes contra mulheres, negros,

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índios, portadores de deficiências e pessoas que possuam distintas orientações
sexuais, para só citar os casos mais notórios.
6. É flagrante que a população negra está concentrada nas mais baixas
faixas de renda, de menor escolaridade, nas piores ocupações e detém maior
participação proporcional no contingente de desempregados. Esta situação não
pode ser vista como simples herança da escravidão. O racismo vem sendo
recriado e realimentado, reforçando um ciclo cumulativo de desvantagem para
os negros, que aumenta a cada geração. Os resultados do racismo causam
danos materiais, simbólicos e culturais para toda a população negra, agredindo
a própria essência da democracia.
7. Nosso governo vai agir no sentido de fortalecer e ampliar as conquistas
até agora alcançadas pelas mulheres e atuar para favorecer a construção de
uma nova ordem nas relações entre homens e mulheres. Relações mais plurais
e democráticas, baseadas na eqüidade, sem os preconceitos de raça e etnia e
com oportunidades iguais em todos os aspectos da vida social.
8. As discriminações aparecem também em relação aos jovens, às pessoas
da terceira idade, aos migrantes de regiões historicamente abandonadas ou
golpeadas por crises econômicas e sociais, e até mesmo em relação a
estrangeiros pobres provenientes de vários países.
9. A radicalização do processo democrático no Brasil deve ser entendida
como um grande movimento cultural que vai além da adoção de medidas de
democracia econômica e social e da realização de reformas políticas. Iniciativas
no plano da cultura permitirão ao povo brasileiro expressar e valorizar suas
identidades e experiências regionais, sociais, étnicas e apropriar-se dos frutos
da civilização em toda a sua diversidade. Esse movimento de democratização
cultural da sociedade brasileira só estará completo se for acompanhado da
democratização dos meios de comunicação. É fundamental garantir a mais
irrestrita liberdade de expressão. Os avanços tecnológicos pelos quais vêm
passando o setor de comunicações deverão ser utilizados para colocar velhos e
novos meios a serviço da sociedade, permitindo que se expressem da forma
mais livre e plural possível. As comunicações cumprirão também importante
papel a serviço da educação, da valorização e difusão da produção cultural do
País e do mundo.
10. O povo brasileiro está dominado por um sentimento ge-neralizado de
insegurança e, por isso mesmo, nosso governo buscará instituir um sistema de
Segurança Pública nacionalmente articulado(*). A exclusão social, que tem no
desemprego a sua principal expressão, afetando milhões de homens e

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mulheres, lança diariamente muitas pessoas na desesperança, quando não na
criminalidade. As estatísticas mostram as armas de fogo como principal causa
mortis da juventude e a impunidade com que vem agindo o crime organizado
ameaça comprometer o funcionamento das instituições democráticas,
freqüentemente infiltradas pela ação de quadrilhas. A mesma impunidade pode
ser constatada nas centenas de crimes cometidos contra trabalhadores rurais,
sindicalistas, advogados e religiosos que lutam pela Reforma Agrária.
11. O despreparo material e humano dos aparelhos policiais e a lentidão da
Justiça estimulam a violência e agravam a criminalidade, que é reproduzida e
ampliada pelo absurdo sistema prisional. A impunidade dos poderosos e as
brutais condições de miséria de grande parte da população, que contrastam
com os constantes apelos ao consumo, provocam uma crise de valores que
alimenta a violência. Ricos e pobres estão amedrontados e encerrados em seus
bairros e casas. As formas de sociabilidade dos brasileiros se restringem cada
vez mais. Os pobres são estigmatizados como criminosos e a convivência civil
se vê ameaçada. As próprias instituições de defesa nacional são postas à prova
pelo avanço cada vez mais insolente do crime organizado.
12. Nos últimos 20 anos, as Forças Armadas (FFAA) têm procurado
estabelecer uma nova identidade. O declínio das doutrinas de segurança
nacional anteriores não foi capaz de nos legar uma concepção moderna sobre o
papel que as FFAA devem desempenhar em um Brasil democrático e em um
mundo em que se multiplicam as ameaças à paz e à soberania das nações. As
Forças Armadas brasileiras resistem às pressões nacionais e internacionais para
que venham a desempenhar papel de polícia. As FFAA encontram-se, porém,
com poucos recursos, não sendo capazes de oferecer a seus contingentes a
formação e os meios compatíveis com as exigências da defesa nacional. É
imperativo que o novo governo proponha ao Congresso Nacional um debate
sobre o papel das FFAA no próximo período. A partir daí será possível definir,
com clareza, uma orientação para o reequipamento material das Forças
Armadas, coerente com o redesenho da política de defesa nacional. O governo
Lula reforçará, modernizará e prestigiará as FFAA do País. A introdução
permanente de novas tecnologias para a plena defesa do território nacional, do
mar territorial e do espaço aéreo constitui um vetor fundamental para a
soberania nacional.
13. Desde já fica claro, porém, que as FFAA cumprirão sua missão
constitucional, especialmente aquelas relacionadas com a defesa das fronteiras
e a proteção de regiões ameaçadas em sua integridade, como é o caso da

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Amazônia. Elas deverão estar aptas também para desempenhar missões de paz
no mundo.
Política Externa para Integração
Regional e Negociação Global
14. A política externa será um meio fundamental para que o governo
implante um projeto de desenvolvimento nacional alternativo, procurando
superar a vulnerabilidade do País diante da instabilidade dos mercados
financeiros globais. Nos marcos de um comércio internacional que também vem
sofrendo restrições em face do crescente protecionismo, a política externa será
indispensável para garantir a presença soberana do Brasil no mundo.
15. Uma nova política externa deverá igualmente contribuir para reduzir
tensões internacionais e buscar um mundo com mais equilíbrio econômico,
social e político, com respeito às diferenças culturais, étnicas e religiosas. A
formação de um governo comprometido com os interesses da grande maioria
da sociedade, capaz de promover um projeto de desenvolvimento nacional,
terá forte impacto mundial, sobretudo em nosso Continente. Levando em conta
essa realidade, o Brasil deverá propor um pacto regional de integração,
especialmente na América do Sul. Na busca desse entendimento, também
estaremos abertos a um relacionamento especial com todos os países da
América Latina.
16. É necessário revigorar o Mercosul, transformando-o em uma zona de
convergência de políticas industriais, agrícolas, comerciais, científicas e
tecnológicas, educacionais e culturais. Reconstruído, o Mercosul estará apto
para enfrentar desafios macroeconômicos, como os de uma política monetária
comum. Também terá melhores condições para enfrentar os desafios do
mundo globalizado. Para tanto, é fundamental que o bloco construa instituições
políticas e jurídicas e desenvolva uma política externa comum.
17. A política de regionalização, que terá na reconstrução do Mercosul
elemento decisivo, é plenamente compatível com nosso projeto de
desenvolvimento nacional. A partir da busca de complementaridade na região,
a política externa deverá mostrar que os interesses nacionais do Brasil, assim
como de seus vizinhos, podem convergir no âmbito regional. De imediato,
nosso governo desenvolverá ações de solidariedade para com a Argentina, que
permitam a este país irmão superar suas dificuldades atuais e contribuir para
uma aliança latino-americana consistente.

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18. Essa política em relação aos países vizinhos é fundamental para fazer
frente ao tema da Área de Livre Comércio das Américas (ALCA). O governo
brasileiro não poderá assinar o acordo da ALCA se persistirem as medidas
protecionistas extra-alfandegárias, impostas há muitos anos pelos Estados
Unidos. Essas medidas foram agravadas recentemente pelas condições
definidas no Senado norte-americano para a assinatura do tratado e pela
proteção à agricultura dos Estados Unidos. A política de livre comércio,
inviabilizada pelo governo norte-americano com todas essas decisões, é sempre
problemática quando envolve países que têm Produto Interno Bruto (PIB)
muito diferentes e desníveis imensos de produtividade industrial, como ocorre
hoje nas relações dos Estados Unidos com os demais países da América Latina,
inclusive o Brasil. A persistirem essas condições a ALCA não será um acordo de
livre comércio, mas um processo de anexação econômica do Continente, com
gravíssimas conseqüências para a estrutura produtiva de nossos países,
especialmente para o Brasil, que tem uma economia mais complexa. Processos
de integração regional exigem mecanismos de compensação que permitam às
economias menos estruturadas poder tirar proveito do livre comércio, e não
sucumbir com sua adoção. As negociações da ALCA não serão conduzidas em
um clima de debate ideológico, mas levarão em conta essencialmente o
interesse nacional do Brasil. Nosso governo se esforçará para construir um
relacionamento sadio e equilibrado com os Estados Unidos, país com o qual
mantemos importante relação comercial. Além disso, o Brasil deverá propor aos
países do Continente relações fundadas no equilíbrio, na cooperação e em
mecanismos compensatórios que favoreçam um desenvolvimento harmônico.
19. O Brasil buscará estabelecer relações econômicas, políticas e culturais
com todo o mundo. Uma relação equilibrada com os países que integram o
Acordo de Livre Comércio da América do Norte (NAFTA), a União Européia e o
bloco asiático em torno do Japão permitirá contornar constrangimentos
internacionais, diminuir a vulnerabilidade externa e criar condições mais
favoráveis para a inserção ativa do País no mundo. Ao mesmo tempo, nosso
governo conduzirá a aproximação com países de importância regional, como
África do Sul, Índia, China e Rússia. Trata-se de construir sólidas relações
bilaterais e articular esforços a fim de democratizar as relações internacionais e
os organismos multilaterais como a Organização das Nações Unidas (ONU), o
Fundo Monetário Internacional (FMI), a Organização Mundial do Comércio
(OMC) e o Banco Mundial. O Brasil, como segundo país com maior população
negra no mundo, deverá voltar-se para a África, explorando os laços étnicos e
culturais existentes e construindo relações econômicas e comerciais. Com a
África do Sul, em particular, buscará aproximação para construir nova política

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em direção àquele Continente, sobretudo no que se relaciona aos países de
língua portuguesa.
20. Nos últimos oito anos, muita coisa mudou no Brasil. A inflação foi
contida, mas não foram criadas oportunidades melhores para o povo. Apesar
de todas as promessas, o atual governo fracassou ao não criar as condições
para o crescimento sustentado do País. A desigualdade continuou em níveis
inaceitáveis. A indigência e a marginalização social aumentaram, com milhões
de famílias sem ter sequer o que comer. O desemprego se infiltrou como uma
doença na sociedade. A superação desse quadro deixado pelas atuais políticas
do governo requer uma atenção especial para os milhões de jovens que
anualmente tentam entrar no mercado de trabalho, mas não encontram reais
oportunidades de emprego. É preciso evitar que a juventude se torne presa
fácil da criminalidade, do tráfico de drogas e do contrabando de armas.
21. O atual governo fracassou também porque vendeu a ilusão de que o
Brasil poderia se erguer como Nação sem esforço exportador, sem políticas
públicas capazes de levar as empresas e a comunidade científica e tecnológica
a investir recursos e esforços em inovação, registro de patentes,
desenvolvimento de marcas e produtos aptos a competir internacionalmente. É
chocante o fato de que Brasil e Coréia do Sul tivessem, em 1980, o mesmo
volume anual de registro de patentes e, 22 anos depois, o Brasil permaneça
estagnado (100 por ano), enquanto a Coréia multiplicou por 15 o seu número
de registros (1.500 por ano). O governo atual errou ao vender a idéia de que
basta abrir a economia para que a produtividade das empresas aumente. Ao
pensarmos em políticas ativas de incentivo à produção e à inovação
tecnológica, não propomos a volta do velho protecionismo, mas a implantação
de políticas industriais com metas explícitas e controle público. Na era do
conhecimento em que vivemos, um país com as dimensões e potencialidades
do Brasil não pode abrir mão de desenvolver software, máquinas inteligentes e
bens industriais ou agroindustriais de alto valor agregado e elevado conteúdo
tecnológico. O Brasil tem uma base única no setor sucroalcooleiro, ainda longe
de ter atingido o pleno desenvolvimento como parte da matriz energética
nacional. Num momento em que o mundo se empenha em buscar recursos
energéticos alternativos e não poluentes, o desenvolvimento tecnológico do
complexo alcooleiro pode permitir uma importante base de negócios, de
geração de emprego e renda, com uma estrutura de negócios voltada tanto
para o mercado interno quanto para o mercado externo.
22. O Brasil não deve prescindir das empresas, da tecnologia e do capital
estrangeiro. Também não pode menosprezar a capacidade da comunidade

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científica, tecnológica e empresarial brasileira de desenvolver produtos que
sejam mundialmente competitivos. Os países que hoje tratam de desenvolver
seus mercados internos, como a Índia e a China, não o fazem de costas para o
mundo, dispensando capitais e mercados externos. As nações que deram
prioridade ao mercado externo, como o Japão e a Coréia, também não
descuidaram de desenvolver suas potencialidades internas, a qualidade de vida
de seu povo e as formas mais elementares de pequenos negócios agrícolas,
comerciais, industriais e de serviços.
23. A agroindústria é hoje um dos maiores bens do Brasil e deve ser
incentivada, inclusive por seu papel estratégico na obtenção de superávits
comerciais. Mas não aceitamos a idéia daqueles que acreditam ser suficiente o
Brasil firmar-se como grande e eficiente produtor de commodities agrícolas,
para serem industrializadas, embaladas e rotuladas em outros países. Nosso
governo tratará de estimular a produção voltada para o mercado internacional,
sem descuidar da agricultura não diretamente voltada para a exportação, que
será fortalecida com a Reforma Agrária e a agricultura familiar. Isso é
fundamental para incluir socialmente milhões de brasileiros.
24. A Agricultura Familiar, que segundo relatório do Convênio INCRA/FAO, é
responsável por 37,9% do Valor Bruto da Produção agropecuária brasileira, tem
um extraordinário papel a desempenhar, principalmente no que se refere à
produção de bens agrícolas e alimentares, geração de emprego e renda,
preservação da cultura do campo e fortalecimento da identidade da
organização social rural. Nesse sentido, será estimulado o crescimento sócio-
econômico da Agricultura Familiar, com apoio à comercialização e à
agroindustrialização, ampliando e melhorando as condições de acesso a
políticas de financiamento estáveis, à assistência técnica e à extensão rural,
visando um novo modelo de desenvolvimento rural sustentável.
25. Nos serviços, o Brasil tem potencial e nosso governo vai impulsionar o
turismo como uma indústria avançada. Com a diversidade da costa brasileira e
dos ecossistemas do interior do País, é mais do que justificável estimular e
atrair investimentos de peso para o turismo receptivo, explorando as vocações
regionais. Esse turismo estará voltado tanto para a atração, crescente, do
visitante estrangeiro quanto para o estímulo às viagens da família trabalhadora
brasileira, que tem poucos recursos e quase nenhum financiamento para
conhecer seu próprio País. Vamos também dedicar toda a atenção para o
turismo de negócios nos principais centros urbanos, especialmente por sua
ligação com setores de ponta como a agropecuária empresarial e as indústrias
da moda, de calçados, de móveis, de informática e outras, que se reúnem

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periodicamente em grandes feiras de negócios. Essa indústria, assim
desenvolvida, terá impacto em quase todos os ramos de atividade, como por
exemplo hotelaria, aviação comercial e transportes rodoviários, constituindo-se
em poderoso fator gerador de emprego e renda.

O Desafio é ter uma Economia


Menos Vulnerável
26. A questão chave para o País é voltar a crescer com equilíbrio em todos
os ramos de atividade, na agricultura, na indústria, no comércio e nos serviços.
A volta do crescimento é o remédio para impedir que se estabeleça um círculo
vicioso entre juros altos, instabilidade cambial e aumento da dívida pública em
proporção ao PIB. O atual governo estabeleceu um equilíbrio fiscal precário,
criando dificuldades para a retomada do desenvolvimento. O resultado é que a
âncora fiscal que procura evitar o crescimento acelerado da dívida pública
interna, pela via dos superávits primários, exige um esforço enorme de todos
os brasileiros, afetando especialmente a viabilidade dos programas sociais do
poder público. A âncora fiscal, ao ter como um de seus fundamentos uma carga
tributária amplamente baseada em impostos cumulativos, acaba tendo um
efeito limitador da atividade econômica e das exportações. Entretanto, esta é,
do ponto de vista objetivo, a realidade que o futuro governo vai herdar e que
não poderá reverter num passe de mágica. O problema de fundo é que o atual
governo colocou o Brasil num impasse financeiro, que nos obriga, com
freqüência, a contrair empréstimos novos para pagar empréstimos velhos. A
superação desses obstáculos à retomada do crescimento acontecerá por meio
de uma lúcida e criteriosa transição entre o que temos hoje e aquilo que a
sociedade reivindica.
27. É preciso evitar que se consolide uma segunda armadilha, que
estabiliza, mas impede o crescimento econômico do País. Já tivemos a
armadilha cambial. Saímos dela em 1999 com muitas dores, mas sobrevivemos.
Agora, temos o dilema da âncora fiscal. A questão é como superá-la, sem
atentar contra a estabilidade da economia. Nosso governo vai preservar o
superávit primário o quanto for necessário, de maneira a não permitir que
ocorra um aumento da dívida interna em relação ao PIB, o que poderia destruir
a confiança na capacidade do governo de cumprir seus compromissos. Mas vai
trabalhar firmemente para reduzir a vulnerabilidade externa e com ela as taxas
de juros que hoje asfixiam as contas públicas e o setor empresarial produtivo.
Não há governo petista nos estados e nos municípios que não esteja

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comprometido com a responsabilidade fiscal e a estabilidade das contas
públicas. O nosso governo não vai romper contratos nem revogar regras
estabelecidas. Compromissos internacionais serão respeitados. Mudanças que
forem necessárias serão feitas democraticamente, dentro dos marcos
institucionais.
28. Nosso governo vai criar um ambiente de estabilidade, com inflação sob
controle e sólidos fundamentos macroeconômicos, para que a poupança
nacional aumente e seja orientada e estimulada, através de taxas de juros
civilizadas, para o investimento produtivo e o crescimento. É somente nesse
cenário que a política de metas de inflação pode funcionar.
29. A rigidez da atual política econômica pode provocar a perda de rumo e
de credibilidade. O Brasil já demonstrou, historicamente, uma vocação para
crescer em torno de 7% ao ano. É essa vocação que o nosso governo vai
resgatar, trabalhando dia e noite para que o País transite da âncora fiscal para
o motor do desenvolvimento. O Brasil precisa navegar no mar aberto do
crescimento. Ou será que estamos proibidos de buscar o porto seguro da
prosperidade econômica e social?
30. Sem crescimento dificilmente estaremos imunes à espiral viciosa do
desemprego crescente, do desarranjo fiscal, de déficits externos e da
incapacidade de honrar os compromissos internos e internacionais. O primeiro
passo para crescer é reduzir a atual fragilidade externa. O Brasil precisa de
cerca de US$ 1 bilhão por semana para fechar suas contas e até que um novo
rumo seja estabelecido para a economia teremos de administrar a herança da
equivocada política cambial e de abertura desordenada dos anos 90. Para
combater essa fragilidade, nosso governo vai montar um sistema combinado de
crédito e de políticas industriais e tributárias. O objetivo é viabilizar o
incremento das exportações, a substituição competitiva de importações e a
melhoria da infra-estrutura. Isso deve ser feito tanto por causa da fragilidade
das contas externas como porque o Brasil precisa conquistar uma participação
mais significativa no comércio mundial, o que o atual governo menosprezou por
um longo período.
31. Nosso governo vai iniciar, sem atropelos, uma transição para um novo
modelo de crescimento sustentável, com responsabilidade fiscal e compromisso
social. Trabalhará com a noção de que só a volta do crescimento pode levar o
País a contar com um equilíbrio fiscal consistente e duradouro. A estabilidade e
o controle das contas públicas e da inflação são, como sempre foram, aspiração
de todos os brasileiros. Não são patrimônio só do atual governo, pois a

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estabilidade foi obtida com uma grande carga de sacrifícios, especialmente dos
setores mais vulneráveis da sociedade. Nosso governo trabalhará também com
o princípio da responsabilidade social, que terá objetivos e metas claramente
definidos a cada ano. Nessa direção, governos, empresários e trabalhadores
terão de levar adiante uma grande mobilização nacional para fazer renascer a
confiança de que podemos investir, criar empregos e combater os abismos
sociais existentes. O poder público tem responsabilidade especial para
reorientar a economia nessa nova direção.

Mobilização pela Produção e


pelo Emprego
32. A globalização não pode ser entendida como um milagroso atalho para o
desenvolvimento. Os exemplos de políticas bem-sucedidas foram marcados
pela combinação de práticas internacionais com inovações nacionais. Nosso
governo pretende construir estratégias próprias de crescimento do País,
articulando investidores, trabalhadores e instituições nacionais com esse
objetivo. Há muito tempo o Brasil precisa desse esforço consciente, de modo a
erguer-se com sua própria fisionomia no mundo global. Havia condições para
essa grande mobilização nacional nos últimos oito anos? Claro que sim. Mas,
infelizmente, as políticas escolhidas foram outras. Ao contrário do que foi feito,
nosso governo buscará mobilizar a sociedade em favor do crescimento,
aproveitando toda a capacidade técnica, empreendedora e criadora do povo. É
uma tarefa difícil, mas se a sociedade for ouvida e os consensos facilitados, o
País poderá viver um novo ciclo virtuoso de crescimento, em que milhões de
brasileiros marginalizados socialmente serão trazidos para o mercado de
trabalho e terão acesso ao consumo de bens de primeira necessidade.
Desenvolver a economia solidária, combatendo a fome e a indigência,
promover os pequenos negócios e as cooperativas, apoiar as micros e
pequenas empresas, juntamente com as iniciativas para aumentar a
competitividade internacional, são caminhos viáveis para que o Brasil possa dar
um salto de qualidade. A ampliação do nosso mercado interno e a geração de
emprego e renda são passos fundamentais para a construção de uma Nação
que seja respeitada no cenário internacional.
33. Nas cinco décadas que se sucederam à II Guerra Mundial, o mundo viu
nações emergirem e outras estagnarem e até regredirem. O mundo mudou de
forma dramática para milhões de seres humanos e, nunca como antes, os
povos tiveram tão ao alcance das mãos os instrumentos da democracia e do

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conhecimento, da educação e da tecnologia para avançar. É possível orientar,
disciplinar e canalizar adequadamente os recursos externos e internos para o
desenvolvimento econômico de qualidade, reforçando a capacidade produtiva
nacional, impulsionando a absorção e a produção de tecnologia e estimulando a
inovação. Assim o Brasil poderá superar a fragilidade das suas contas externas,
além de aumentar e melhorar sua participação no comércio internacional. Com
esse objetivo, o investimento externo terá o seu lugar garantido ao lado do
capital privado nacional.
34. O desenvolvimento de nosso imenso mercado, com a criação de
empregos e a geração de renda, revitalizará e impulsionará o conjunto da
economia, oferecendo ainda bases sólidas para ampliar as exportações. As
ações para ampliar nosso comércio internacional serão coordenadas por uma
Secretaria Extraordinária de Comércio Exterior, subordinada diretamente à
Presidência da República e articulada com o trabalho na área externa
desenvolvido pelo Ministério das Relações Exteriores.
35. Alguns dos maiores erros do atual governo foram a supervalorização das
políticas macroeconômicas voltadas para a estabilização da moeda a qualquer
custo, a abertura econômica desordenada e a remuneração privilegiada do
capital financeiro, em detrimento de políticas voltadas para o desenvolvimento
e a remuneração adequada do capital produtivo. Estabilidade macroeconômica
é indispensável, é ponto de partida, mas não é suficiente. Não é o que faz a
riqueza do País. A mola propulsora da nação é o seu sistema produtivo, são os
trabalhadores bem capacitados e em constante progresso; é uma população
com escolaridade cada vez maior; são os empreendedores dispostos a assumir
riscos; são os seus cientistas e pesquisadores; são os profissionais que formam
o corpo técnico e gerencial capaz de aplicar as melhores práticas na iniciativa
privada e no setor público.
36. Trata-se de um equívoco a idéia de que basta equilíbrio
macroeconômico, abertura e livre ação das forças de mercado para que o
desenvolvimento flua naturalmente. Nos últimos oito anos, esse tipo de política
produziu instabilidade cambial, juros astronômicos que asfixiaram o
financiamento de novos negócios, desestímulo à inovação tecnológica e
enfraquecimento das exportações. O descaso com a capacitação técnica e a
eficiência do Estado provocou um verdadeiro apagão no planejamento
estratégico, como mostrou a crise aguda provocada pelo governo no setor
energético. O crescimento requer um equilíbrio adequado na administração
federal entre os ministérios que cuidam das políticas econômicas e os que se
dedicam à produção e ao desenvolvimento social, com requalificação de suas

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equipes. Aqui se coloca um dos maiores desafios: recriar e recompor relações
saudáveis entre o governo, suas agências e o setor produtivo.
37. O Brasil precisa de um novo compromisso na produção. Diferentemente
do condomínio espúrio entre maus empresários e maus governantes, que
infelizmente marcou grande parte da história republicana brasileira, nosso
governo será marcado pela construção de mecanismos apropriados para o
debate, a elaboração e a implementação de propostas relevantes para o
interesse público. A começar pela busca de uma Reforma Tributária que acabe
com o caráter regressivo e cumulativo dos impostos. Já em seu primeiro ano,
nosso governo vai lutar por um regime tributário mais equilibrado e justo, que
desonere a produção e a exportação. Junto com a sociedade e o Congresso
Nacional, negociará uma reforma que seja duradoura. Em resumo, buscará
aumentar a eficiência da atividade reguladora e de planejamento do Estado.

Inclusão Social com Justiça Ambiental


38. Nosso governo trabalhará por um novo padrão de desenvolvimento,
com crescimento econômico, inclusão social e justiça ambiental, de modo que,
resguardado o direito das gerações futuras, todos tenham acesso justo e
eqüitativo aos recursos naturais. Na última década, a sociedade brasileira foi
marcada por baixas taxas de crescimento econômico e altos índices de danos
socioambientais. Nosso governo se comprometerá com a melhoria da qualidade
ambiental como geradora de novas oportunidades de inclusão social, através
de três estratégias: (a) adoção de critérios socioambientais de sustentabilidade
para as políticas públicas, fortalecendo os sistemas nacionais de meio
ambiente, recursos hídricos e defesa do consumidor; (b) estabelecimento de
metas de melhoria dos indicadores socioambientais – desmatamento, focos de
calor, emissão de CO2 e CFC, esgotamento e tratamento sanitário,
abastecimento de água, controle de vetores, resíduos sólidos, qualidade do ar,
acesso aos bens naturais, consumo de energia, tecnologias limpas; (c) controle
social por meio da participação popular, da educação e da informação
ambientais, e da valorização das iniciativas da população e da sociedade civil
organizada.

Educação e Cultura para Fortalecer


a Coesão do País

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39. Em grande parte do seu mandato, o atual governo voltou as costas para
questões de primeira importância, como o investimento na educação. É preciso
investir eficientemente no ensino, ampliando o acesso das crianças à escola. É
vital recuperar a rede pública, tanto no nível fundamental quanto no médio e
nas universidades, valorizando principalmente a qualidade. Uma boa formação
da juventude colabora para a retomada do desenvolvimento sustentável, além
de ser um diferencial para a competição do País no mercado internacional. A
educação de qualidade é fator de emancipação e cidadania, contribui para que
os jovens se integrem ao mercado de trabalho e evita a fragmentação social
que alimenta a violência e o crime organizado.
40. Nosso governo adotará políticas públicas de valorização da cultura
nacional, em sua diversidade regional, como elemento de resgate da identidade
do País. Ao mesmo tempo, abrir-se-á para as culturas do mundo. A política do
nosso governo estimulará a socialização dos bens culturais e contribuirá para a
livre expressão de todas as manifestações no campo da cultura. A inclusão
cultural não é apenas conseqüência da inclusão social, mas contribui para o
pleno acesso à cidadania e a uma existência econômica e socialmente digna.
Para realizar esses objetivos será necessário encontrar novos mecanismos de
financiamento da cultura e de suas políticas, que não podem continuar, como
hoje, exclusivamente submetidos ao mercado. Impõem-se aumentos
substantivos das dotações orçamentárias para a cultura e a criação de fundos
que permitam uma distribuição mais justa de recursos para a produção cultural.
Ao mesmo tempo, será necessária uma consistente reforma do Ministério da
Cultura, descentralizando suas iniciativas pelo conjunto das regiões do Brasil e
estabelecendo as bases para que todas as cidades brasileiras venham a ter os
seus próprios equipamentos culturais.
41. O governo federal e os governos estaduais precisam atacar de modo
eficiente tanto a degradação social quanto a indústria do crime organizado, do
contrabando de armas e de drogas. O crime nem sempre nasce da pobreza.
Nasce também da inação e da perda de controle dos governos e da Justiça.
Para o Brasil manter a coesão social, precisará combinar o combate implacável
contra a criminalidade ao investimento estratégico em educação. Só assim o
Estado voltará a ter o respeito dos cidadãos. Só assim a sociedade reforçará a
crença nas instituições e o respeito aos marcos legais.
42. Nosso governo será marcado pelo diálogo permanente com a sociedade
civil. Uma das tragédias do Brasil tem sido a incapacidade dos dirigentes de
estabelecer pontes, acordos, entendimentos com os quais todos possam
ganhar. Quase sempre valeu por aqui a idéia de que poucos têm de ganhar e

15
muitos têm de perder. Aboliu-se a escravatura, mas o negro não foi
verdadeiramente integrado, com igualdade de oportunidades. Instituiu-se o
registro em carteira do trabalhador, mas conseguir ganhos reais de salários, a
partir dos aumentos de produtividade nas empresas, sempre foi um parto
doloroso. Fala-se muito em lisura e honestidade, mas a corrupção continua
corroendo os recursos públicos. Nosso governo não vai prometer respostas
mágicas. Mas pode, sim, prometer uma postura ética e uma luta incansável
para o País avançar.

Programa de Reformas
43. Nosso governo, orientado pelo interesse público, desenvolverá um
programa de reformas institucionais e políticas, ouvindo as sugestões e
negociando as divergências com toda a sociedade. É com esse espírito nacional
e democrático que o novo governo trabalhará decididamente com o Legislativo
e o Judiciário, mas fundamentalmente com a sociedade civil, para aprovar as
reformas necessárias ao Brasil.
Reforma Tributária
44. A primeira das reformas a ser encarada pelo novo governo, ainda no
primeiro ano de mandato, tem como objetivo o aumento da eficiência
econômica e a redução das desigualdades sociais através da correção de
distorções na área tributária. A meta será claramente a de simplificar o sistema
tributário nacional, especialmente com o fim da cumulatividade das
contribuições e a redução ao longo do tempo da carga tributária incidente
sobre a produção e os assalariados de baixa e média renda. A atual carga de
impostos sobre a produção é um fator de perda de competitividade dos
produtos brasileiros no mercado internacional, na medida em que a legislação
que desonera os produtos é difícil de ser cumprida na prática. Além disso,
também não permite uma menor incidência sobre bens de consumo dos
assalariados de menor renda. Mas essa reforma só poderá ocorrer por meio de
um processo negociado com a sociedade, no âmbito do Congresso Nacional, de
modo a não confundir a necessidade estrutural de tornar o País mais justo do
ponto de vista tributário, e mais competitivo internacionalmente, com as
restrições impostas por um quadro fiscal que requer um processo de transição
responsável, para não estourar o equilíbrio fiscal do Estado nem prejudicar os
investimentos sociais cada vez mais necessários. Sem prejudicar a classe média
brasileira, a Reforma Tributária terá também como função corrigir distorções,
como o elevado nível de sonegação e o chamado planejamento tributário.

16
Antes do fim do prazo legal para término da CPMF, nosso governo vai
encaminhar projeto para que esta contribuição seja mantida em nível simbólico,
para efeito de fiscalização do processo de arrecadação. Embora frustrado pelo
atual governo, o acordo obtido no Congresso Nacional ao final de 1999, a partir
das várias emendas apresentadas por parlamentares para a Reforma Tributária,
é um bom ponto de partida para a retomada desse tema. Nesse sentido, nosso
governo apresentará para o debate as seguintes propostas:
§ Desoneração da produção, com o fim da cumulatividade das
contribuições (PIS, Cofins, CPMF);
§ Simplificação do ICMS, transformando-o em IVA (Imposto sobre o
Valor Agregado);
§ Desoneração das exportações;
§ Desoneração do investimento produtivo.
Ao mesmo tempo, nosso governo irá investir na negociação de
uma política tributária justa e progressiva, que contemple:
§ Tributação da fortuna e da herança, conforme já prevê a
Constituição desde 1988;
§ Redução da carga tributária que recai sobre os setores médios
assalariados;
§ Redução da carga tributária sobre os bens de consumo de massa
(alimentos, vestuário, material de construção e outros).
45. Temos consciência de que é preciso investir sistematicamente na
modernização e profissionalização da Receita Federal e na simplificação da
legislação infraconstitucional, de modo a combater eficientemente a sonegação
e a elisão fiscal. Nosso governo priorizará a reestruturação do ICMS, no sentido
da criação de um IVA (Imposto sobre o Valor Agregado) amplo e de uma
legislação unificada e com poucas alíquotas. O modelo atual do ICMS, com 27
leis e 44 alíquotas, abre espaço para a sonegação. Juntamente com a Reforma
Tributária, nosso governo proporá aos estados e municípios a redefinição do
Pacto Federativo, cujo princípio será a descentralização das ações sociais e a
valorização da ação local, do município como ente federado realizador de
políticas públicas. O novo Pacto Federativo deverá também incluir duas
instâncias novas: as macrorregiões e as microrregiões, com atribuições políticas
e administrativas, compostas por conjuntos de municípios, especialmente nas
áreas metropolitanas.

Reforma da Previdência

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46. Um dos maiores desafios políticos e administrativos do futuro governo é
o equacionamento da questão previdenciária. Para dar conta desse desafio, é
necessário um conjunto de iniciativas de curto, médio e longo prazos, para
construir soluções estruturais, capazes de permitir que a presente e as futuras
gerações de brasileiros possam estar plenamente conscientes e relativamente
tranqüilas quanto aos direitos que poderão usufruir após o término de uma
longa dedicação de vida laboral. Essa profunda reformulação deve ter como
objetivo a criação de um sistema previdenciário básico universal, público,
compulsório, para todos os trabalhadores brasileiros, do setor público e
privado. O sistema deve ter caráter contributivo, com benefícios claramente
estipulados e o valor do piso e do teto de benefícios de aposentadoria
claramente definido. A gestão deve ser democrática, a cargo de um órgão
quadripartite, incluindo representantes do Estado, dos trabalhadores da ativa,
dos aposentados e dos empresários, conforme já prevê a Constituição Federal,
mas que o atual governo não respeitou.
47. Em complemento ao sistema público universalizado, aos trabalhadores
tanto do setor público como do privado, que almejam valores de aposentadoria
superiores ao oferecido pelo teto da previdência pública, haverá o sistema de
planos complementares de aposentadorias, com ou sem fins lucrativos, de
caráter facultativo e sustentado por empregados e empregadores.
48. O referido sistema básico universal só terá viabilidade como resultado de
um processo de longo prazo, construído a partir da participação de
trabalhadores e empresários, e da sociedade em geral, por se tratar de tema
sensível que afeta o futuro de todos os cidadãos, e que ao mesmo tempo
representa um eficaz mecanismo de distribuição de renda. Também por incidir
diretamente sobre as contas públicas, e por lidar com um conjunto de direitos
adquiridos ao longo de décadas, a implementação plena de uma Reforma
Previdenciária atravessa um longo período de transição.
49. Além de planejar e dar início à discussão de um novo sistema
previdenciário brasileiro, racional e adequado à realidade social e econômica, e
condizente com as tendências demográficas, as quais demonstram um
acelerado processo de envelhecimento da nossa população, devemos tomar
uma série de medidas estratégicas a serem implementadas imediatamente no
interior do atual sistema previdenciário.
O atual sistema previdenciário brasileiro é constituído por:
a) Regime Geral de Previdência Social (RGPS), de filiação
compulsória e que dá guarida a todos os trabalhadores que

18
exercem atividades remuneradas – excetuando os que
estejam filiados ao Regime Próprio de Previdência – e é
administrado pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS);
b) Regime Próprio de Previdência Social (RPPS), de filiação
compulsória, organizado no âmbito de cada ente federado –
municípios, estados, Distrito Federal e União –, acessível
exclusivamente aos servidores titulares de cargo efetivo,
conforme determina o artigo 40 da Constituição Federal, com
a redação dada pela Emenda Constitucional nº 20/98;
c) Previdência Complementar, de caráter facultativo e que supre
a necessidade de renda adicional superior ao teto dos regimes
básicos, por ocasião da inatividade. É administrada por
entidades privadas.
50. Quanto ao RGPS o déficit apontado para o presente exercício fiscal é da
ordem de R$ 16 bilhões. Cabe ressaltar, porém, que esse déficit deve-se em
parte à desvinculação das receitas de contribuições sociais (Cofins e CSLL),
conforme emenda constitucional 27, que vem drenando recursos da seguridade
social para o caixa do Tesouro. Além disso, em virtude do mecanismo de
contabilização das contas do INSS, benefícios de caráter mais assistencial que
previdenciário, normalmente concedidos à margem da obrigatoriedade
contributiva, são considerados como benefícios do sistema contributivo.
Portanto, um dos objetivos de uma reforma estratégica é adotar normas de
clareza, transparência e eficácia contábil, definindo claramente cada
modalidade de benefício e sua fonte de financiamento.
51. O reduzido número de trabalhadores contribuintes ao RGPS, em relação
à população economicamente ativa, expressa uma gravíssima situação social –
altas taxas de desemprego e de informalidade das relações de trabalho –,
decorrente, principalmente, do próprio modelo econômico adotado pelo atual
governo. O aumento do desemprego, a falta de uma estrutura adequada de
fiscalização trabalhista e previdenciária e os incentivos à flexibilização do
mercado de trabalho acabaram por restringir o índice de cobertura do sistema.
Os trabalhadores não contribuintes do sistema previdenciário totalizam
aproximadamente 56% da população ocupada, segundo dados da Pesquisa por
Amostra de Domicílios/1999 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
(PNAD/IBGE).
52. A ampliação da fiscalização, a adoção de punições mais severas aos
praticantes de sonegação e fraude, a maior eficácia na cobrança da dívida ativa

19
e o incentivo à formalização do trabalho são elementos que podem abrir
caminho, para o ingresso de novas receitas para o sistema previdenciário,
permitindo assim, uma discussão mais racional quanto à eventual redução da
alícota de contribuição. As fontes de financiamento devem ser objeto de
negociação no âmbito da Reforma Tributária. O peso da contribuição dos
empregadores (20% sobre a folha de pagamento) é um elemento de redução
de competitividade dos produtos brasileiros (pois poucos países adotam
alíquotas tão altas) e, ao mesmo tempo, é um incentivo à falta de registro
formal do trabalhador ou ao registro com salários mais baixos que os
praticados.
53. Uma política de forte crescimento econômico resultará em elevação do
salário médio na economia e da quantidade de empregos e de sua
formalização, com conseqüências positivas no equilíbrio financeiro do sistema
previdenciário.
54. Em relação à previdência do setor público, o desequilíbrio apontado é
três vezes maior que o apresentado no Regime Geral, ou seja, próximo de R$
50 bilhões, o que representa 4,1% do PIB, conforme dados do Ministério da
Previdência e Assistência Social/SPC para o ano de 2000. A falta de empenho e
a pouca sensibilidade, por parte do atual governo, na negociação da Reforma
da Previdência ocorrida em 1997 e 1998, em grande parte, explicam como se
chegou a esta dramática situação previdenciária no setor público.
55. Os segurados dos Regimes Próprios de Previdência Social, os servidores
titulares de cargo efetivo, têm garantia constitucional para as regras de cálculo
de benefício, bem como para o reajustamento desse valor e a elegibilidade ao
benefício. Ainda de acordo com as disposições da Constituição Federal, o RPPS
deve ser regido pelo princípio da contribuição obrigatória.
56. Nosso governo, respeitando o princípio do direito adquirido, combatendo
privilégios, buscando uniformizar e racionalizar os procedimentos
administrativos que hoje estão expressos em uma miríade de centros difusos
de administração previdenciária nos entes federados, acelerando o processo de
implementação dos RPPS de sorte a recepcionar as contribuições
previdenciárias dos servidores para fins de aposentadoria, já que atualmente
em muitos entes federados não há contribuição para aquela finalidade, deve
buscar a negociação de um contrato coletivo do setor público, no qual os
assuntos trabalhistas e previdenciários devem ser objeto de ampla e
democrática negociação.

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57. Quanto ao terceiro pilar do atual sistema previdenciário brasileiro, a
previdência complementar, que pode ser exercida através de fundos de
pensão, patrocinados por empresas ou instituídos por sindicatos (conforme a
Lei Complementar 109), voltada para aqueles trabalhadores que querem renda
adicional além da garantida pelos regimes básicos, deve ser entendida também
como poderoso instrumento de fortalecimento do mercado interno futuro e
fonte de poupança de longo prazo para o desenvolvimento do país. É
necessário crescimento e fortalecimento dessa instituição por meio de
mecanismos de incentivo.
58. Por outro lado, é imprescindível que seja revisto e aprimorado todo o
sistema regulatório da previdência complementar, uma vez que ele tem se
mostrado, em alguns de seus aspectos, inibidor do crescimento do setor. A
gestão paritária, pelos participantes e patrocinadores, é um fator de segurança
e credibilidade para o sistema. A democratização e fortalecimento da Secretaria
de Previdência Complementar também devem ser objeto dessas mudanças. A
regulamentação dos novos fundos de pensão, com foco no estímulo à sua
difusão, beneficiará notável contingente de participantes atualmente excluídos
desse sistema.

Reforma Agrária
59. A Reforma Agrária é instrumento indispensável de inclusão social, num
País de grave concentração de renda como o nosso. Associada aos demais
instrumentos convencionais, incluindo uma política auxiliar de crédito fundiário
para regiões e setores específicos, ela é estratégica para enfrentar a crise social
e fomentar as cooperativas, a agricultura familiar e a economia solidária. A
aceleração do processo de Reforma Agrária e um programa de recuperação dos
assentamentos já efetuados é indispensável para aumentar o emprego na
agricultura e proporcionar segurança alimentar aos trabalhadores e suas
famílias. A expansão e integração da produção de alimentos, ao lado da
consolidação das diversas formas e níveis de organização produtiva dos
beneficiários, desempenhará um papel central na regulação dos fluxos de
abastecimento nas esferas local e regional e nacional. Sem prejuízo de outras
formas que possam ser utilizadas em situações determinadas, o instrumento
central de obtenção de terras para a Reforma Agrária será a desapropriação
por interesse social, nos termos do que estabelece a Constituição Federal. A
elevação da eficácia da reforma será alcançada, também, por meio da
ampliação da participação dos beneficiários em todas as suas fases e da

21
implantação de sistemas de financiamento e comercialização que contribuam
para viabilizar economicamente as unidades produtivas criadas. Mesmo que o
processo de desapropriação dependa de recursos orçamentários escassos, o
governo vai se orientar pela aplicação, nos próximos quatro anos, de um plano
progressivo de distribuição de terras, a partir dos excedentes de arrecadação
gerados no processo de retomada do desenvolvimento. Essa reestruturação
fundiária contribuirá para a redução do êxodo rural, que ainda pressiona os
mercados de trabalho urbanos, e para fotalecer as raízes do homem no campo,
enquanto a implementação de uma política agrícola adequada influenciará a
geração de empregos e renda no setor primário. Nesse sentido, a Reforma
Agrária permitirá a geração de emprego e renda no campo. Esta é uma medida
importante para efetivar um Plano Nacional de Emprego e Trabalho, pois, ao
contrário dos países industrializados, que possuem entre 2% e 5% da
população ocupada no campo, o Brasil ainda tem, pelo menos, 21% de sua
mão-de-obra no meio rural. Para isso, nosso governo buscará:
§ A ampliação da produção de alimentos por meio de uma
política agrícola dirigida para o binômio agricultura familiar e
agricultura organizada em bases empresariais. Essa política,
que terá como base o fortalecimento da agricultura familiar
através de políticas de crédito estáveis previstas nas leis
orçamentárias da União, assistência técnica e políticas sociais,
visa melhorar as condições de trabalho e renda das famílias
exclusivamente agrícolas, que residem no campo e trabalham
a terra por conta própria, e das famílias rurais cujos membros
combinam atividades agrícolas e não-agrícolas;
§ Fortalecer os centros de pesquisa e de extensão agrícolas, que
deverão estar integrados a esses programas, atuando junto às
comunidades e associações de pequenos agricultores para
desenvolver tecnologias e práticas apropriadas às suas
atividades;
§ Realizar a Reforma Agrária no Brasil, de forma a contribuir
decisivamente para a construção da Nação e o fortalecimento
da democracia.

Reforma Trabalhista
60. A construção de uma legislação trabalhista verdadeiramente moderna
somente será possível se no seu processo de discussão for assegurada a

22
participação dos diferentes setores sociais interessados. A garantia dessa
participação é de responsabilidade do Estado. Entretanto, a peça fundamental
para que ocorra esse movimento é a liberdade sindical, instituto fundamental
para a consolidação da democracia. Os desafios colocados hoje para o mundo
do trabalho requerem soluções cada vez mais duradouras, que somente serão
alcançadas com o reconhecimento de que os conflitos são parte constitutiva
das relações entre capital e trabalho. A garantia e o estímulo ao diálogo, às
negociações e ao fortalecimento das instituições representativas do patronato e
dos trabalhadores devem integrar, de forma relevante, as políticas de Estado.
Mais do que uma legislação sobre direitos mínimos, o equilíbrio nas relações de
trabalho requer a existência de sindicatos livres, autônomos, representativos e
independentes. Para tanto, nosso governo vai encaminhar um amplo debate
sobre a reforma da estrutura sindical brasileira. A construção de um novo
modelo de relações de trabalho deverá ter como pressuposto o reconhecimento
das instituições representativas dos empregadores e dos trabalhadores,
livremente constituídas com a função de promover o diálogo e o entendimento
sobre as contradições inerentes às relações de trabalho. Nesse sentido, um
primeiro passo necessário será reconhecer as centrais sindicais como
interlocutores dos interesses dos trabalhadores.
61. Com o objetivo de promover a mais ampla reforma na legislação
trabalhista, o governo convocará todas as entidades sindicais representativas
dos trabalhadores e empregadores a constituírem um Fórum Nacional do
Trabalho, estruturado de forma triparte. Sua finalidade imediata será a de
preparar, democraticamente, as propostas de alteração da legislação atual.
Dentro do tempo previsto pelo governo, o Fórum Nacional do Trabalho deverá
apresentar suas propostas, que se traduzirão num conjunto de Leis para
modernizar a atual Consolidação das Leis do Trabalho. Após a sua aprovação
pelo Congresso Nacional, essas leis passarão a regulamentar o novo sistema de
relações do trabalho. O objetivo central desse processo é a melhoria da
qualidade do emprego e principalmente a ampliação da formalização do
trabalho, incorporando milhões de trabalhadores ao mercado regulado de
trabalho, com reflexos importantes nas contas previdenciárias e nos fundos
públicos.
62. Um dos principais desafios para evitar a exclusão do mercado de
trabalho é diminuir a taxa de desemprego entre jovens, situada hoje em torno
de 30%. A queda da renda familiar provocada pela relativa estagnação da
economia, a alta taxa de desemprego e a inadequação do sistema de ensino
vêm gerando um número cada vez maior de jovens que não conseguem

23
ingressar e permanecer no mercado de trabalho. O primeiro emprego para o
jovem equivale, no mínimo, a abrir uma janela de esperança para o seu futuro
e o de suas famílias. Por isso mesmo, nosso governo vai dar especial atenção a
esse problema, criando um Programa Nacional de Incentivo à contratação de
jovens pelas empresas e de estagiários comunitários, ampliando o que já vem
sendo posto em prática por governos municipais e estaduais administrados pelo
PT e pelos demais partidos coligados.

Reforma Política
63. A reforma do sistema político brasileiro é urgente e necessária para
promover uma efetiva democratização da sociedade e do Estado, permitindo
que as disputas eleitorais sejam mais transparentes, equânimes e capazes de
abrir espaço para o surgimento de novas lideranças. Tal reforma acontecerá a
partir de uma ampla discussão na sociedade e no Congresso. Não haverá
pacote ou receitas prontas a serem impostas de cima para baixo. Essa reforma
buscará introduzir um sistema de financiamento público das campanhas
eleitorais, o que contribuirá para a diminuição do peso do poder econômico e
da corrupção, tornando mais efetiva a representação política. Para fortalecer os
partidos, dar-lhes maior nitidez programática e consistência, será proposta a
instituição de listas partidárias nas eleições proporcionais, assim como a adoção
de mecanismos de fidelidade partidária, impedindo a atual troca de partidos,
que atingiu cerca de 50% dos deputados federais da atual legislatura.
64. Finalmente, deverão ser adotadas medidas que assegurem a efetiva
proporcionalidade da representação. Isso implica um equilíbrio entre o número
de eleitores de cada estado e o de parlamentares, na medida em que a Câmara
Federal, expressão da soberania popular, deve representar a sociedade da
melhor maneira possível. Essas medidas centrais da Reforma Política serão
desenvolvidas e complementadas visando a uma efetiva extensão da cidadania,
ao fortalecimento do espaço público e a um maior controle social do Estado
pelos cidadãos.

Desenvolvimento, Distribuição de
Renda e Estabilidade

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1. No Brasil, onde o número de jovens em idade de trabalhar aumenta a
cada ano, o crescimento econômico a taxas substantivas não é uma escolha,
mas uma necessidade. Desta perspectiva, nosso programa econômico está
estruturado a partir de duas dimensões: a social e a nacional. A dimensão
social será o principal eixo do novo modelo de desenvolvimento, assegurado o
seu caráter democrático e nacional.
2. O desenvolvimento com justiça social implica uma ruptura com duas
tendências históricas da sociedade brasileira: a excessiva dependência externa
e a aguda concentração de renda, que gera forte exclusão social. Por isso
mesmo, a dimensão social tem de ser o eixo do desenvolvimento e não mero
apêndice ou um suposto resultado natural do crescimento econômico. A
recuperação da capacidade de definir e operar políticas econômicas ativas, a
ampliação do mercado interno de massas, o aumento da competitividade
brasileira e o impulso às exportações constituem aspectos indissociáveis do
novo estilo de desenvolvimento, voltado para o fortalecimento da economia
nacional.
3. No atual estágio do país, as prioridades relativas à dimensão social do
desenvolvimento são as seguintes: a) ampliação do nível de emprego, para
prover ocupação aos que ingressam no mercado de trabalho, reduzir o
desemprego e combater a precariedade do emprego; b) melhoria no perfil de
distribuição de renda, sobretudo por meio do aumento do salário mínimo e de
uma tributação não regressiva; c) crescente universalização da moradia
própria, dos serviços urbanos essenciais (saneamento e transporte coletivo) e
de direitos sociais básicos (saúde, educação, previdência e proteção do
emprego); d) combate à fome e à pobreza absoluta, com assistência social aos
excluídos.
4. Trata-se também de valorizar os empreendimentos fundados na mão-de-
obra familiar ou solidária e organizados sob a forma de pequenas e médias
empresas ou cooperativas. É importante lhes assegurar condições econômicas
de operação favorecidas, com serviços de apoio, linhas de crédito e tratamento
tributário diferenciados, em relação aos grandes empreendimentos. Essas
medidas agregam-se ao processo de democratização da propriedade, através
da execução das reformas agrária e urbana.
5. Na dimensão nacional do desenvolvimento, ocupa um lugar central a
recuperação da capacidade de definir e implementar políticas econômicas com
maior autonomia ante os mercados globais. Isso supõe o fortalecimento da

25
capacidade de regulação do Estado direcionada a três objetivos: (a)
capacitação tecnológica das empresas nacionais, privadas e públicas; (b)
ampliação das fontes de financiamento internas como meio de superar a
recorrente dependência de recursos externos; (c) reforço à integração
econômica nacional por meio da implantação de uma divisão do trabalho mais
adequada ao desenvolvimento de cada uma das regiões.

A Herança Econômica
6. Uma década de políticas neoliberais produziu no Brasil taxas de
crescimento médio ao redor de apenas 2,5% ao ano. Isto se deveu ao
abandono do mercado interno e à ausência de políticas ousadas de exportação,
que desarticularam e desorientaram o setor produtivo. As políticas ativas de
liberalização promovidas pelo atual governo fragilizaram as contas externas do
País e desequilibraram as contas públicas. A abertura financeira executada
aumentou a vulnerabilidade externa e reduziu a capacidade de financiamento
das atividades produtivas, em especial no que se refere ao investimento.
7. Excetuando-se o investimento direto estrangeiro – que apresentou um
crescimento acelerado por causa do volume de aquisições de patrimônio
nacional nos últimos anos –, os demais fluxos mostraram-se bastante voláteis e
reversíveis nos momentos de grande turbulência dos mercados financeiros
globais. Várias formas de absorção de recursos financeiros constituíram-se em
aplicações especulativas, sem representar financiamento de fato para as
empresas e as atividades produtivas. Os investimentos diretos estrangeiros,
embora volumosos, tiveram um significado menor na elevação da taxa de
investimento da economia, já que se destinaram, em grande parte, às
privatizações e aquisições de empresas preexistentes. Os ciclos de inversões
derivados das privatizações, como o das empresas de telecomunicações,
embora relevantes, não tiveram capacidade para dinamizar o conjunto da
economia, na medida em que foram intensivos em importações.
8. A abertura financeira restringiu fortemente a autonomia da política
macroeconômica. A liberalização dos fluxos de capitais sujeitou a taxa de juros
doméstica às regras de formação dos mercados financeiros globais. Essa forma
de abertura dificultou a fixação da taxa de juros de curto prazo, que passou a
se orientar pela variação do valor dos títulos da dívida externa pública
brasileira.
9. A abertura comercial, por sua forma e velocidade, produziu em muitos
casos uma regressão do setor produtivo, enfraqueceu as cadeias produtivas e

26
comprometeu nossa competitividade e capacidade exportadora. Disso resultou
uma ampliação do coeficiente importado, sem a contrapartida do aumento das
exportações, implicando perda de participação no mercado internacional,
atrofia do mercado interno e redução dos encadeamentos intersetoriais.
10. O Brasil é hoje, com poucas exceções, um importador de bens de
elevado conteúdo tecnológico e um exportador de commodities largamente
intensivas em recursos naturais; em alguns casos, intensivas em escala ou
capital. Esta é a razão estrutural para os déficits setoriais na balança comercial,
difíceis de serem transformados em superávits mesmo por desvalorizações
cambiais expressivas e forte desaceleração do crescimento. É certo que as
importações contribuem para a modernização do parque produtivo nacional,
mas é fundamental responder ao desafio de ampliar as exportações,
aumentando a corrente de comércio do País e criando um expressivo superávit
comercial.
11. A quebra das cadeias produtivas da estrutura industrial tornou-a mais
dependente de importações, debilitando a capacidade nacional de geração de
tecnologia. O tão apregoado aumento da produtividade decorrente desse
processo resultou, sobretudo, de um crescimento econômico medíocre e de
uma redução significativa do emprego.
12. O crescimento econômico pífio e os ciclos breves e setorialmente
concentrados do investimento mantêm importantes segmentos com capacidade
ociosa, localizados prioritariamente na indústria de bens de consumo duráveis,
particularmente nas montadoras, e nos segmentos produtores de bens e
serviços de consumo de massa (têxtil, calçados, alimentos). Estes segmentos
podem suportar um aumento rápido da demanda, mas convivem com outros,
de bens intermediários ou de insumos como energia, em que a ausência de
investimentos impõe limites importantes para a rápida ampliação da produção.
13. As privatizações e a fragilização financeira do Estado debilitaram a infra-estrutura
econômica e social, comprometendo a competitividade e o potencial de crescimento da
economia. Essas modificações estruturais estiveram associadas a uma determinada
estratégia de estabilização: o Plano Real baseou-se na articulação entre o aumento
acelerado das importações e absorção de recursos financeiros externos. As dívidas interna e
externa daí resultantes implicam a manutenção de taxas de juros permanentemente
elevadas.
14. O País possui um déficit muito elevado e estrutural, de cerca de 4% do
PIB, na conta de transações correntes do balanço de pagamentos. O passivo
externo líquido, estimado em mais de US$ 420 bilhões, aumentou muito nos

27
últimos anos, em decorrência do endividamento externo acelerado e da forte
desnacionalização da economia. A dívida externa é predominantemente
privada, mas o setor público continua com uma dívida bruta de cerca de US$
90 bilhões, enquanto o passivo dolarizado de curto prazo é muito elevado e de
grande potencial desestabilizador. Os encargos anuais desse passivo externo –
exclusive amortizações da dívida – já superam 40% do valor das exportações,
criando uma fragilidade externa permanente.
15. O crescimento explosivo da dívida líquida do setor público a partir de
1994, seu perfil de curto prazo e, principalmente, o aumento excessivo da
conta de juros, aprisionaram a política fiscal do governo e sua capacidade de
realizar gastos ativos com maior conteúdo social. Nunca é demais lembrar que
essa expansão da dívida líquida do setor público, de mais de 20% do PIB entre
1994 e 2001, ocorreu apesar da venda de empresas estatais no valor de US$
100 bilhões. O potencial desestabilizador da economia decorrente dos encargos
financeiros internos e externos e o comprometimento da capacidade de
regulação do Estado serão, seguramente, os grandes desafios de uma política
fiscal de caráter redistributivo e indutora do crescimento.

A Herança Social
16. O Brasil tem sido, desde as suas origens coloniais, o país das
desigualdades. Durante o período da moderna industrialização, entre 1930 e
1980, mostrou-se incapaz de melhorar significativamente a distribuição de
renda e da riqueza, apesar de ter obtido altas taxas de crescimento econômico.
Recentemente, sobretudo depois das reformas na década de 1990, não evitou
que a desesperança tomasse conta de grandes contigentes da população.
17. O desemprego está na raiz dessa frustração. Até o início dos anos 90, a
economia brasileira sempre havia sido capaz de gerar, mesmo que
precariamente, empregos que acomodassem uma força de trabalho em rápida
expansão. Essa característica foi eliminada na última década, como resultado
de um novo padrão de crescimento cuja marca principal é o baixo dinamismo.
Pela primeira vez em décadas, assistiu-se à ampliação tendencial do
desemprego aberto e de longa duração, cuja taxa chegou a alcançar 8,5% em
1999/2000, mantendo-se acima de 7% de meados de 1998 até o presente.
18. O desemprego tem outras dimensões perversas. Na região
metropolitana de São Paulo, segundo pesquisa da Fundação Sistema Estadual
de Análise de Dados e do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos
Sócio-Econômicos (Seade/Dieese), a taxa total era de 8,7% em 1989 e de

28
19,3% em 1999, ultrapassando 20% em 2002. Sua incidência é maior nos
setores mais desprotegidos da sociedade, como jovens, mulheres, negros e
migrantes. Não se conclua daí que seja confortável a situação daqueles que
possuem emprego. Para esses, aumentou expressivamente a informalização, o
emprego à margem da proteção da legislação trabalhista e da previdência
pública. Hoje, cerca de 45% dos empregos no setor industrial são informais,
contra 38% em média na década passada. No setor terciário são 50,5%, contra
44,5% na década anterior.
19. Essa deterioração geral nas condições do emprego poderia ter sido
parcialmente compensada por melhorias na renda, no seu patamar ou na sua
distribuição. Não foi. Tomando-se a chamada distribuição funcional entre
lucros, salários e rendas financeiras, nota-se ao longo da década uma queda da
participação dos salários na renda nacional. O exemplo do setor industrial é
ilustrativo dessa perda, pois em 1990 as remunerações perfaziam 45% do valor
adicionado, caindo para 41% em 1997. Dados do IBGE mostram que a
participação dos salários no PIB é hoje menor do que 30%.
20. Quanto à renda pessoal, e mais precisamente nos vários tipos de
rendimento do trabalho – depois de um breve crescimento entre 1994 e 1997,
como subproduto do Plano Real –, ocorreu, desde 1998, um recorrente declínio
para todos os tipos de ocupação. Assim, os rendimentos do trabalho são hoje
menores do que aqueles de 1997. O crescimento e posterior declínio das
rendas do trabalho são acompanhados por trajetória semelhante nos
indicadores da distribuição desses rendimentos. Dessa forma, a participação
dos 50% mais pobres na renda caiu de 16,5% em 1989 para 13,3% em 1999.
21. Há ainda uma outra dimensão da situação social a ser considerada e
que diz respeito às mudanças nos padrões de consumo. Dois aspectos
essenciais da política de liberalização, a abertura comercial e as privatizações,
causaram importantes mudanças nos preços relativos – o barateamento de
produtos industrializados e o encarecimento dos serviços públicos – e,
conseqüentemente, na estrutura de gastos das famílias, inclusive das mais
pobres.
22. Ao tornar objeto de exploração mercantil um conjunto de serviços
públicos e aumentar os seus preços, as privatizações terminaram por elevar os
gastos da população com os mesmos. Foi o caso, por exemplo, de água e
esgoto, energia elétrica, telefonia e transportes. Por causa da renda baixa de
grande parcela dos usuários, ocorreu também uma crescente inadimplência,

29
mesmo em segmentos nos quais houve ampliação significativa do acesso, como
na telefonia.
23. Em termos genéricos, a folga obtida nos orçamentos pela queda dos
gastos com produtos industrializados foi utilizada para pagamento dos serviços
com preços majorados. No caso das famílias de baixa renda, essas
modificações tiveram contornos mais dramáticos em razão da menor margem
de manobra para acomodar modificações de orçamento, diante da
essencialidade de todos os itens.

O Social como Eixo do Desenvolvimento


24. O aumento do desemprego e a precarização do emprego, a estagnação
dos níveis de renda e a continuidade de sua má distribuição, o aumento da
concentração da propriedade e o encarecimento dos serviços públicos
essenciais caracterizam a situação de exclusão social produzida pelas políticas
liberais que urge corrigir. O sentido geral do nosso programa é diminuir esses
grandes desequilíbrios, convertendo o social no eixo do novo modelo de
desenvolvimento. A constituição do novo modelo priorizará três aspectos: (a) o
crescimento do emprego; (b) a geração e distribuição de renda; (c) a
ampliação da infra-estrutura social.
25. O aumento do emprego depende em grande medida da taxa de
crescimento do PIB. Mas não somente. O próprio estilo de crescimento, vale
dizer, os setores líderes sobre os quais se fundamenta, também joga um papel
relevante na dinâmica da criação de postos de trabalho. Assim, por exemplo,
um modelo que enfatiza a ampliação da infra-estrutura social, segmento
intensivo em construção civil e mão-de-obra, cria mais empregos do que outro
centrado na ampliação do consumo privado.
26. É necessário considerar também que a ampliação do emprego pode ser
potencializada por um conjunto de medidas legais que evitem a sobre-utilização
da força de trabalho e a sua precarização. Em razão do elevado grau de
marginalização da mão-de-obra, expresso em taxas de subemprego muito
altas, e da pressão exercida pelo aumento da força de trabalho a cada ano,
será necessário acionar mecanismos de ampliação da ocupação via incentivo às
cooperativas de crédito e de trabalho.
27. No âmbito da distribuição de renda, a primeira medida se refere a
mudanças na estrutura tributária. A experiência histórica mostra que só é
possível realizar modificações substantivas das parcelas dos salários, lucros e

30
rendas financeiras no Produto por meio da tributação da renda e da riqueza.
Ademais, uma estrutura tributária menos regressiva também pode contribuir
para a melhoria da distribuição nos rendimentos do trabalho. As reformas
agrária e urbana também serão importantes instrumentos de desconcentração
da riqueza. Além disso, visando aumentar a massa de rendimentos e o perfil de
distribuição de renda, nosso governo trabalhará com um programa de reajuste
progressivo do poder de compra do salário mínimo.
28. Nosso governo atuará no sentido da ampliação da oferta e do acesso da
população aos serviços públicos e à infra-estrutura social. De um lado, é
necessário ampliar a disponibilidade da infra-estrutura social – saneamento,
transporte coletivo, habitação popular. De outro, é imprescindível assegurar o
acesso universal aos serviços que constituam direitos inalienáveis do cidadão
contemporâneo, como educação, saúde de qualidade e previdência pública.
29. A ampliação do emprego, a melhoria das remunerações e de sua
distribuição, e a ampliação da oferta de bens e serviços públicos têm
significativos impactos econômicos. Sua maior implicação será o rápido
crescimento do emprego e da renda, aumentando, portanto, a massa de
rendimentos da economia. Com a sua melhor distribuição, haverá estímulo ao
desenvolvimento de um amplo mercado de consumo de massas.
30. O apoio às formas de organização da atividade econômica fundada nos
pequenos e médios empreendimentos e na economia solidária constitui uma
dimensão central do novo modelo de desenvolvimento pela sua relevância na
produção e, sobretudo, no emprego. Esses empreendimentos possuem uma
forma de operação que, diante das recessões e das crises, preserva ao máximo
o emprego, tornando-os um fator de estabilização social. Por isso, nosso
governo apoiará essas formas de organização da produção, destacando os
seguintes mecanismos: (a) ampliação de rede de serviços de apoio visando
assegurar aos empreendimentos acesso às tecnologias de produção, de
marketing e de financiamento; (b) capilarização da rede bancária visando
assegurar financiamento sem maiores trâmites burocráticos e a taxas
diferenciadas para essas atividades.
31. Ganha relevo, nesse quadro, como ingrediente de um programa de
complementação de renda familiar, a instituição de uma renda mínima
associada à educação (como os programas bolsa-escola), abrangendo todo o
território nacional. O bolsa-escola do governo federal é ainda muito tímido
quanto aos benefícios e se sustenta numa visão estanque e insuficiente do
problema da exclusão social.

31
O Fortalecimento da Economia Nacional
32. O fortalecimento da economia nacional é o segundo eixo de
desenvolvimento proposto. Além de um papel mais ativo na consecução dos
objetivos relativos à distribuição de renda, e do apoio às cooperativas de
crédito e de trabalho, às pequenas e médias empresas, o Estado deverá
desempenhar um papel estratégico nas atividades de infra-estrutura,
financiamento e ciência e tecnologia, que são fundamentais para aumentar a
eficiência de qualquer sistema econômico. O Estado também tem
responsabilidade central na articulação de políticas que aumentem a
capacidade competitiva e as exportações do País.
33. O Estado não pode limitar as suas ações a administrar o curto prazo e
as questões emergenciais, mas deve se pautar por uma visão estratégica de
longo prazo, articulando interesses e coordenando investimentos públicos e
privados que desemboquem no crescimento sustentado. Isso implica reativar o
planejamento econômico, assegurando um horizonte mais longo para os
investimentos.
34. A ampliação da autonomia e o fortalecimento da economia nacional
requererão a implantação de políticas ativas em três frentes distintas:
(a) Capacitação tecnológica das empresas nacionais, privadas e públicas:
A política industrial propriamente terá como foco central o adensamento das
cadeias produtivas e o desenvolvimento tecnológico das empresas. Dados os
seus objetivos, deverá ser implementada através das cadeias setoriais
integradas, com uma visão ampla que compreenda desde a produção das
matérias-primas até a comercialização final, passando por seus elos
manufatureiros. Esse formato abrangente das políticas setoriais integra
concretamente as bases agrícolas e minerais às indústrias processadoras e
transformadoras, tornando sem sentido a velha separação entre os chamados
setores primário, secundário e terciário. Da mesma forma, as atividades de
logística, serviços, comercialização, marketing, financiamento de vendas
precisam ser consideradas na formulação das estratégias de desenvolvimento.
(b) Reconstrução da infra-estrutura econômica do País:
O atual governo foi responsável por um verdadeiro sucateamento da infra-
estrutura econômica do País, do que a crise energética é a manifestação mais
palpável. Além dessa área, há uma clara insuficiência em várias outras,
especialmente nos vários segmentos de transporte. Caberá ao novo governo,

32
em parceria com o setor privado, definir e implementar um programa de
investimentos nessas áreas, visando assegurar um crescimento sustentado da
oferta e evitar que haja um obstáculo ao crescimento.
(c) Ampliação das fontes de financiamento internas como meio de superar a
recorrente dependência de recursos externos:
§ Apesar da crescente desnacionalização e privatização do setor financeiro
brasileiro, há ainda elementos neste sistema que podem e devem ser
recuperados na construção de um novo modelo de financiamento capaz de
alavancar o crescimento interno e reduzir a dependência de recursos externos.
O primeiro deles se refere às instituições especiais de crédito, tais como o
Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), a Caixa
Econômica Federal, o Banco do Brasil, o Banco do Nordeste (BNB) e o Banco da
Amazônia (BASA). Esse tipo de instituição, presente também nos países
capitalistas avançados, é essencial para o financiamento de atividades de maior
risco (agricultura, inovação tecnológica, pequenas e médias empresas,
comércio exterior) ou de setores com retorno de mais longo prazo (infra-
estrutura, habitação);
§ O segundo elemento se refere ao envolvimento mais intenso do setor
bancário privado com o financiamento das atividades produtivas. Isso pode e
deve ser conseguido, sobretudo, por meio da redução da distância entre as
taxas de juros de captação e de empréstimos (spread). A diminuição dos
depósitos compulsórios e da cunha fiscal poderão ser instrumentos para a
redução dessa diferença e o barateamento do crédito.
§ O terceiro elemento relevante é o da ampliação da poupança doméstica de
longo prazo. O Brasil tem uma experiência significativa e de relativo sucesso
com os fundos de poupança compulsória (FGTS, PIS-Pasep e FAT), que
constituíram e constituem a única base de financiamento de longo prazo da
economia nacional. Uma gestão mais eficaz e transparente desses fundos,
acompanhada de novas prioridades na alocação de recursos, certamente
alongaria o horizonte de um processo do crescimento sustentado. A maior
formalização do emprego ampliaria os recursos desses fundos e permitiria
alavancar o financiamento de longo prazo. Fundos de pensão têm-se
constituído como um mecanismo de crescente importância de mobilização da
poupança de assalariados. Isso daria também a oportunidade de direcionar
recursos adicionais para as instituições especiais de crédito, reforçando os seus
fundos emprestáveis.

33
A Dinâmica do Novo Modelo
35. Especificadas as linhas estratégicas do novo modelo, cabe apontar os
aspectos gerais da dinâmica de crescimento proposta. O motor básico do
sistema é a ampliação do emprego e da renda per capita, e conseqüentemente
da massa salarial que conformará o assim chamado mercado interno de
massas. O crescimento sustentado a médio e longo prazo resultará da
ampliação dos investimentos na infra-estrutura econômica e social e nos
setores capazes de reduzir a vulnerabilidade externa, junto com políticas de
distribuição de renda.
36. A ampliação da infra-estrutura econômica e social implicará o
crescimento significativo da demanda dos bens e serviços necessários,
intensivamente, à construção civil. Nesses segmentos, a indústria brasileira
possui baixo coeficiente importado. Tal desenvolvimento acarretará também o
aumento da massa salarial, composta sobretudo de salários relativamente mais
baixos da mão-de-obra menos qualificada. A demanda daí derivada,
concentrada em alimentos, vestuário, calçados e móveis, poderá também ser
atendida por um segmento da indústria com menor coeficiente importado.
37. Para atender à demanda decorrente da ampliação da infra-estrutura,
combinada com uma melhor distribuição de renda, o setor privado será
incentivado a ampliar a sua produção e o emprego no segmento que produz
bens de consumo. Desse processo poderão resultar efeitos multiplicadores
adicionais, potencializados pela melhora na distribuição de renda. Nos setores
industriais eletroeletrônico e de bens de capital, a ampliação da produção seria
feita com um coeficiente importado comparativamente maior. Daí a
necessidade imperiosa de políticas industriais e tecnológicas claras e
coordenadas, capazes de viabilizar um programa de substituição competitiva de
importações e de promoção de exportações.
38. O modelo é portador de uma injeção de aumento de produtividade na
estrutura existente, que acompanha o processo de investimento nos segmentos
modernos da economia nacional. São três os mecanismos principais que se
somam na elevação de produtividade engendrada por esse modelo de
crescimento: ganhos de escala, progresso técnico e absorção de trabalhadores
subempregados pelos setores modernos. A partir desses ganhos de
produtividade poderá se estabelecer o seguinte círculo virtuoso: aumento de
rendimentos das famílias trabalhadoras, levando à ampliação do consumo
popular, que reforça, por sua vez, os investimentos, com aumento de

34
produtividade, fechando-se o ciclo com a elevação do rendimento das famílias
trabalhadoras.
39. Nosso governo trabalhará para estabelecer um forte vínculo entre, por
um lado, investimentos e progresso técnico e, por outro, salários e demais
rendimentos dos trabalhadores. Para tanto, vai desenvolver políticas sociais de
modo a compensar a fragilidade do mercado no que se refere à transmissão do
aumento de produtividade aos salários e ao necessário aumento da renda da
família trabalhadora.
40. Neste nível horizontal, o modelo não requer a identificação de setores
líderes, porque implica essencialmente a ampliação da estrutura produtiva já
existente. Por sua vez, suaviza a restrição externa ao crescimento, na medida
em que o consumo popular é menos intensivo em bens importados do que o
consumo de luxo. Ao conduzir ao aumento da produtividade, o modelo também
estimula as exportações e a substituição de importações. No entanto, nada
disso elimina a necessidade de políticas setoriais especiais, verticais, como a de
ampliar mais que proporcionalmente as atividades da ponta tecnológica, por
sua função geradora de divisas e deflagradora de processos de aprendizagem e
capacitação.
41. Diferentemente do velho desenvolvimentismo, esse modelo requer a
configuração de um ambiente econômico que leve ao aumento constante da
competitividade do País. Esta será a base para o desenvolvimento ativo de
políticas industriais e para a construção de um sistema nacional de exportações
competitivas. Sem isso o Brasil não estará em condições de alcançar um lugar
próprio no mercado mundial. Para tanto, são fatores-chave:
(a) estabilidade de preços;
(b) eficiência do sistema tributário;
(c) financiamento de longo prazo;
(d) investimento em pesquisa e desenvolvimento;
(e) educação e qualificação da força de trabalho;
(f) investimentos seletivos em infra-estrutura.

A Política Industrial do
Novo Modelo

35
42. Partindo desse terreno, uma nova política industrial deverá ser
construída distanciando-se do velho estilo cartorial e clientelista que viciou as
experiências passadas, pródigas na distribuição de subsídios. Nesse sentido,
articulando-se com as medidas horizontais de fortalecimento do mercado e da
infra-estrutura interna, a nova política industrial será:
(a) planejada nacionalmente a partir das potencialidades regionais;
(b) seletiva e vertical;
(c) formada a partir da explicitação de metas a serem atingidas pelas
empresas como contrapartida do apoio público;
(d) baseada na transparência dos custos envolvidos e do retorno que
a economia do País poderá receber;
(e) orientada pela cobrança de desempenho e metas publicamente
fixadas;
(f) definida no tempo;
(g) transparente à opinião pública.
43. Para implementar essas políticas, será necessária uma maior articulação
de todos os órgãos de governo envolvidos com o comércio exterior e a
capacitação produtiva. Isso significa uma grande reestruturação dos setores
hoje responsáveis pelas exportações e relações internacionais. Na execução
dessa política, teremos de reunir as melhores competências na área
internacional, unificando os especialistas e constituindo um centro nacional de
referência para as exportações.
44. Esse esforço de construção de um sistema nacional e inovador de
competitividade precisa:
(a) articular as políticas comercial e tecnológica;
(b) aumentar significativamente o investimento em pesquisa e
desenvolvimento;
(c) combinar as políticas horizontais voltadas para o mercado
interno com as verticais e setoriais, voltadas para a capacitação
tecnológica e as exportações.
(d) estimular as empresas brasileiras a se adaptarem às novas
tecnologias via Pesquisa & Desenvolvimento e à cooperação
tecnológica nas áreas de pesquisa de longo prazo. Isso significa
que a nova política de competitividade estará orientada

36
para facilitar os processos de investimento crescente
em conhecimento e capacitação.
45. Nosso governo estará chamado a incentivar uma profunda mudança
estrutural nos sistemas produtivos, especialmente aqueles intensivos em alta
tecnologia. Por isso, dará especial atenção aos setores que tenham
possibilidade de disputar mercados e investimentos internacionais e de vencer
a forte concorrência existente. Isso significa que as políticas governamentais
deverão também intervir seletivamente na reestruturação dos setores de ponta,
a começar do complexo eletroeletrônico, do setor de bens de capital e da
indústria química.
46. Nessa nova configuração da política econômica e industrial, a
agroindústria deverá ter destaque fundamental. Tanto por sua capacidade de
responder amplamente ao crescimento da demanda interna como pela sua
competitividade mundial e seu papel decisivo na geração de grandes saldos
comerciais.
47. Como resultado da abertura indiscriminada e da falta de planejamento
estratégico para a inserção competitiva do País na economia global, o Brasil
tem hoje uma pauta de exportações envelhecida, sem produtos nem serviços
de alto valor agregado para oferecer no exterior. O setor eletroeletrônico
permite uma verificação prática desse problema, em face do agudo déficit em
componentes eletrônicos, especialmente microchips. No todo, a balança do
setor eletroeletrônico acumula um déficit anual em torno de US$ 8 bilhões, com
tendência a se acentuar nos próximos anos. O Brasil, que nos últimos 30 anos
deixou escapar a primeira onda da microeletrônica, não pode ficar de novo à
margem da segunda onda da microeletrônica mundial (que combina chips com
software), ainda mais às vésperas de definir qual o padrão de TV Digital que o
País adotará. O atual governo despertou tardiamente para este problema e não
conseguiu atacar o atraso do País em tecnologia da informação e indústria
eletroeletrônica com um plano coerente e prioridades definidas. O Brasil não
pode abrir mão de mobilizar sua comunidade científica e empresarial nesta
direção, ao lado da atração das empresas globais de microeletrônica, sob pena
de se ver cada vez mais na condição de importador de bens de alto conteúdo
tecnológico que a própria indústria cultural requer. Para participar desta
segunda onda, forjada pela disseminação da internet e pelo avanço da
comunicação móvel, é preciso reativar mecanismos de política científica,
tecnológica e industrial. Significa também implementar políticas sociais
vinculadas à massificação das tecnologias da informação, para que os avanços
da computação e da telefonia cheguem à população pobre do País,

37
combatendo na prática a exclusão digital. Soluções e parcerias inteligentes
podem e devem ser buscadas com países que vivem, nesse particular,
problemas afins com os da sociedade brasileira.

A Transição para o
Novo Modelo tem
como Alvo o Crescimento
48. A atuação essencial do nosso governo será, portanto, a busca
incessante da retomada do crescimento econômico como meio privilegiado para
a geração de empregos e a distribuição de renda. Esse será o instrumento
essencial para a superação do círculo vicioso entre déficit externo, juros
elevados, instabilidade cambial e aumento da dívida pública, criado pelo atual
governo. Exatamente por isso, o esforço pelo crescimento será estruturado
simultaneamente a uma criteriosa e responsável transição entre o que temos
hoje e o que a sociedade brasileira reivindica. Mesmo porque o agravamento da
vulnerabilidade de nossa economia não se originará da mudança do atual
modelo econômico, mas sim da sua continuidade.
49. A responsabilidade fiscal e a estabilidade das contas públicas marcarão
as políticas do nosso governo. Um ambiente com sólidos fundamentos
macroeconômicos e com a inflação sob controle contribuirá para a queda
gradativa da taxa de juros e o redirecionamento das energias do País para o
investimento produtivo e o crescimento da economia.
50. Nosso governo terá uma atitude ativa no sentido de buscar a redução
das taxas de juros. Para tanto, vai concentrar esforços para diminuir de forma
rápida e continuada o déficit em transações correntes, com a obtenção de
saldos comerciais crescentes e a melhora na conta de serviços. O regime de
câmbio flutuante constitui um instrumento relevante, ainda que insuficiente,
para acelerar a resolução da restrição externa, mas a retomada do
desenvolvimento depende, sobretudo, da concentração de esforços nas
políticas industriais e de crescimento.
51. Como já foi enfatizado, o novo modelo de estabilidade econômica que o
nosso governo quer construir tem no crescimento sua força motriz. Para tanto,
o nosso governo será incansável na arte de ouvir, propor e negociar

38
permanentemente com todos os segmentos da sociedade brasileira, de modo a
impulsionar a recuperação da auto-estima e da confiança que o País tanto
precisa.

Inclusão Social
1. A ênfase no desenvolvimento social articulado com a retomada do
desenvolvimento econômico fundamenta-se nos princípios éticos e nas
prescrições constitucionais relacionados com o direito à vida, à dignidade da
pessoa humana e à justiça social e com compromissos cívicos e patrióticos.
Impossível conceber um futuro para nosso povo sem integrar os 53 milhões de
brasileiros excluídos da cidadania.
2. A implementação de políticas sociais como eixo do desenvolvimento exige
medidas audaciosas e criativas. As políticas sociais quase sempre foram
tratadas no Brasil como questões marginais, vinculadas ao assistencialismo.
Para mudar essa lógica, o primeiro passo é romper com as ações fragmentadas
e dispersas, os feudos e loteamentos temáticos e clientelísticos que
descaracterizam as políticas sociais no Brasil em todas as esferas, do município
à União. O País precisa de políticas sociais integradas, estratégicas, formuladas
e implementadas por meio de ações intersetoriais, buscando sempre parcerias
com os diversos segmentos, entidades e movimentos sociais.
3. As bases sobre as quais se ergueu o sistema de proteção social no Brasil
– emprego, renda, contribuição e benefícios sociais configurando o modelo de
seguro social apoiado na capacidade contributiva – relegaram ao plano da
assistência, supostamente residual, o enorme contingente de brasileiros
excluídos da proteção. Atualmente, o princípio da universalização (de base não
contributiva) se refere legalmente à educação básica (obrigatória e gratuita), à
saúde e aos benefícios e serviços estabelecidos pela Lei Orgânica da Assistência
Social. Como resultado deste quadro, e após uma década de políticas liberais,
há um saldo de 53 milhões de pobres, dos quais 23 milhões de indigentes, 11,5
milhões de desempregados, crianças desamparadas e moradores de rua,
analfabetos declarados e analfabetos funcionais; recrudescimento de doenças
do século XVIII, como a tuberculose; trabalho infantil; agravamento da
concentração de renda e violência urbana e rural.
4. Não é possível enfrentar semelhante quadro exclusivamente no âmbito
das políticas de saúde, educação e assistência social. Nosso governo terá a

39
tarefa histórica de implementar uma política nacional de inclusão social,
abandonando a oposição entre política econômica e política social. É por isso
que a dimensão social da retomada do desenvolvimento terá como prioridades,
em nosso governo, a ampliação do emprego e a melhoria no perfil de
distribuição de renda, sobretudo por meio do aumento do salário mínimo, do
fim da tributação regressiva e da adoção de programas de renda mínima.
5. A estratégia de inclusão social supera a lógica de uma pobreza assistida e
focalizada de modo estreito, tanto em termos quantitativos quanto qualitativos.
Evita a sobreposição de programas, que pulveriza os recursos públicos, causa
disputa entre as instituições e fragmenta as ações, tornando-as pouco efetivas.
6. Na experiência de quase oito anos do atual governo, a fragmentação
institucional, a focalização excludente e a superposição têm sido
extraordinárias. Assim, temos o programa Bolsa Alimentação, destinado às
famílias com crianças entre 6 meses e 6 anos de idade, gestantes e nutrizes,
implementado pelo Ministério da Saúde; o programa Bolsa Escola, para famílias
com crianças entre 6 e 15 anos, sob responsabilidade do Ministério da
Educação; o Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (PETI), dirigido às
famílias com crianças entre 7 e 14 anos, sob a responsabilidade da Secretaria
de Estado de Assistência Social do Ministério de Previdência e Assistência Social
(SEAS/MPAS); o Programa Agente Jovem, destinado aos adolescentes entre 15
e 17 anos, também na SEAS-MPAS; o Programa Bolsa Renda, que se destina às
famílias residentes em áreas atingidas pela seca e com renda familiar per capita
de até 1/3 do salário mínimo, vinculado ao Ministério da Integração Nacional.
Finalmente, há o Programa Vale Gás, do Ministério das Minas e Energia, que
transfere R$ 15 por bimestre para famílias de baixa renda.
7. Ainda para complementação de renda, existem os programas de
prestação continuada da Lei Orgânica da Assistência Social: o benefício
destinado aos idosos de famílias com renda familiar per capita de até 1/4 do
salário mínimo (substituto do benefício previdenciário conhecido como renda
mensal vitalícia) e, com o mesmo critério de renda, o benefício destinado aos
portadores de necessidades especiais, incapacitados de obter renda por meio
do trabalho.
8. Os demais benefícios, para o empregado assalariado e com carteira de
trabalho (abono salarial e salário família) e para o demitido do setor formal
(FGTS e seguro desemprego), só atingem as pessoas que contam com
emprego formal.

40
9. Além da dispersão e fragmentação que atingem os programas sociais do
governo federal, eles operam com o princípio da focalização, como se a
pobreza fosse residual. Para enfrentar a questão social no Brasil e reverter esse
quadro, é necessário um movimento duplo: rever o modelo de desenvolvimento
adotado e implementar uma nova geração de políticas públicas de inclusão
social de caráter universal e sem fragmentação. É necessária, portanto, uma
ação coordenada dos programas e das políticas, modificando a lógica
setorializada e departamentalizada, que tem alto custo com os meios e baixo
retorno nos fins. Para tanto, são imprescindíveis: a definição de uma nova
concepção de gestão administrativa intersetorial, criando-se um Conselho de
Desenvolvimento Social, e o estabelecimento de metas sociais que sejam
acompanhadas, avaliadas e tenham um sistema de incentivos.
10. O Conselho de Desenvolvimento Social trabalhará com Câmaras
Técnicas Setoriais e terá como atribuição coordenar, definir metas e desenhar
instrumentos de incentivos para a estratégia do governo federal de inclusão
social. A partir do estabelecimento de metas sociais, o Conselho atuará na
implementação articulada e integrada dos programas nacionais de
enfrentamento da pobreza, do desemprego, da desigualdade de renda e das
carências educacionais. Tendo em vista que 67% dos trabalhadores brasileiros
não possuem ensino fundamental completo, será dada especial atenção à
formulação de programas de formação profissional e de educação de jovens e
adultos.
11. A imensa dívida social acumulada ao longo da história do País pode ser
saldada também com a ajuda de milhares de organizações que fazem parte do
chamado Terceiro Setor e dos investimentos sociais das empresas socialmente
responsáveis. Os recursos do governo e da sociedade devem ser mobilizados
de forma articulada, eficiente e produtiva em torno das grandes prioridades do
nosso governo: a promoção da justiça social, a retomada do crescimento
econômico e a geração de emprego e trabalho.

A Política de Garantia de
Renda Mínima
12. As primeiras discussões, no Brasil, sobre a instituição de um programa
de garantia de renda mínima remontam à década de 1970, mas o debate
nacional sobre a importância e a legitimidade de programas desse tipo ganhou

41
visibilidade no início dos anos 90, com o projeto de lei que instituía o Programa
de Garantia de Renda Mínima, do senador Eduardo Suplicy (PT-SP).
13. Na primeira metade dos anos 90, o tema entrou na agenda pública com
uma nova característica: renda mínima vinculada à família e à educação. No
centro do argumento encontra-se a idéia de que a baixa renda das famílias
induz ao ingresso precoce de seus filhos e dependentes no mercado de
trabalho, fazendo com que seja muito alto o custo de oportunidade de mantê-
los na escola. Oferecer um complemento de renda às famílias pobres,
condicionado à matrícula e à freqüência escolar, é uma maneira de superar a
reprodução da pobreza de geração para geração, de reduzir a pressão sobre o
mercado de trabalho e de garantir que crianças, em lugar de trabalhar,
brinquem e estudem.
14. O resultado do debate do começo dos anos 90 manifestou-se em 1995,
quando tiveram início as primeiras experiências municipais, em Campinas e
Ribeirão Preto, e a do Distrito Federal. Os programas receberam denominações
particulares em cada localidade, mas explicitaram algo em comum: a
articulação, de forma inédita e inovadora, do reforço da renda familiar e do
estímulo à educação das crianças como opção estratégica de combate à
pobreza.
15. Às experiências municipais e algumas iniciativas estaduais juntou-se o
Programa de Garantia de Renda Mínima Associado a Ações Sócio Educativas,
instituído pela Lei nº 9.533/97. O programa federal executado em 1999 e 2000,
sob responsabilidade do Ministério da Educação e do Desporto (MEC), aderiu à
mesma estratégia presente na centena de programas que o antecedeu: reforço
da renda familiar e elevação da escolaridade das crianças e adolescentes
pobres.
16. O Programa Bolsa Escola e os demais programas de complementação de
renda (Bolsa Alimentação, PETI e outros já descritos) voltados ao mesmo
público-alvo e com o mesmo critério de seleção serão revistos, com o objetivo
de evitar superposição, disputa entre gestores e pulverização dos recursos
públicos.
17. No campo da renda mínima, nosso governo atuará em quatro frentes:
(a) implementação de programas nos municípios, atendendo à faixa de 0 a 15
anos de idade. A transferência de renda às famílias com renda per capita igual
ou inferior a meio salário mínimo será feita com a complementação ao valor
pago por programas municipais; (b) adoção de bolsas de estudo para jovens
entre 16 e 25 anos, provenientes de famílias de baixa renda, para que

42
completem o ensino médio ou superior, com contrapartida de realização de
serviços comunitários (c) programa de garantia de renda e valorização
profissional de trabalhadores desempregados entre 22 e 50 anos,
encaminhando-os para atividades comunitárias e de capacitação ocupacional; a
remuneração será garantida com o seguro-desemprego, no caso dos
trabalhadores formais, e com um auxílio de renda, para os informais; (d)
programa Nova Oportunidade, para desempregados de 51 a 66 anos,
oferecendo-lhes uma alternativa de ocupação.
18. A renda mínima que nosso governo vai propor deve ser vista como um
passo na direção da implementação – quando houver condições fiscais – de
uma renda básica de cidadania.

Programa de
Combate à Fome
19. A miséria no Brasil não é algo ocasional, mas resultado de um processo
histórico que não resolveu questões básicas. Com a explosão dos índices de
desemprego nos anos 90, ela se agravou. Hoje, há um amplo consenso de que
o mais terrível dos efeitos da miséria, a fome, não é causado pela falta de
produção de alimentos, mas pela falta de renda das famílias para adquirir os
alimentos na quantidade necessária e com a qualidade adequada.
20. A implantação de políticas estruturais para erradicar a miséria requer
muitos anos para gerar frutos consistentes. Mas a fome não espera e segue
matando a cada dia, produzindo desagregação social e familiar, doenças,
desespero e violência crescentes. Para combater a fome, não podemos nos
limitar às doações, bolsas e caridade. É possível erradicar a fome por meio de
ações integradas que aliviem as condições de miséria. Articuladas com uma
política econômica que garanta uma expansão do Produto Interno Bruto de,
pelo menos, 4% ao ano, esse objetivo pode ser conseguido em até uma
geração. Os instrumentos que colocaremos em ação permitirão promover o
desenvolvimento, gerar emprego e distribuir renda. O combate à fome se
integra, assim, à concepção de um novo tipo de desenvolvimento econômico.
21. O Projeto Fome Zero inclui, além de medidas estruturais, uma política
de apoio efetivo à agricultura familiar; o direito à Previdência Social para todos
os trabalhadores familiares, da economia rural ou da economia informal
urbana, garantindo a universalidade prevista na Constituição; o direito à
complementação de renda para que todas as crianças das famílias pobres

43
possam ter formação educacional adequada; a ampliação da merenda escolar,
atingindo todas as crianças que freqüentam escolas públicas, inclusive creches;
e, finalmente, o apoio aos inúmeros programas criados por governos estaduais,
municipais e pela sociedade civil organizada que buscam combater a fome por
meio de restaurantes populares, bancos de alimentos, modernização do
abastecimento, incentivo à agricultura urbana, apoio ao auto-consumo
alimentar e à agricultura familiar.
Para atacar de imediato o problema da fome será fornecido “o cartão de
alimentação” para as famílias muito pobres, possibilitando-lhes comprar os
alimentos de que necessitam.
22. A falta de políticas de geração de emprego, de saúde e de educação
tem um custo elevado para o País. Há também o custo da falta de consumo e
da produção de bens e o custo para o empregador, entre outros. Por isso,
combater a fome não deve ser considerado apenas um “custo”, mas também
um investimento no Brasil. Uma cesta básica que garanta alimentação
adequada para 10 milhões de famílias vulneráveis à fome pode gerar cerca de
R$ 2,5 bilhões a mais em arrecadação de impostos. Além disso, pode dar
ocupação permanente a mais 350 mil pessoas na agricultura familiar de arroz e
feijão. Assim, combatendo a fome, o pior efeito da miséria, estaremos
combatendo também a miséria.
23. O Brasil tem as duas condições necessárias para reduzir a fome para
números mínimos num curto espaço de tempo. Uma é a nossa agricultura,
capaz de produzir todos os alimentos necessários e ainda exportar
amplamente. A outra são os recursos necessários para garantir o direito a uma
alimentação adequada aos milhões que não têm renda. Por isso, podemos
afirmar que é possível eliminar a fome, assim como acabar com o
analfabetismo e com as outras mazelas sociais próprias da ausência de políticas
públicas adequadas.

A Política de
Educação
24. A educação é antes de tudo um instrumento de promoção da cidadania
e, sobretudo nos dias de hoje, instrumento fundamental para o
desenvolvimento e a inserção competitiva de qualquer nação no mundo. Se o
país aceita a condição de subalternidade, ele dispensa cidadãos ativos,
criativos, com sólida formação humanística e científica. Se o país se quer

44
soberano e sem exclusão, precisa desenvolver as ciências humanas, naturais,
exatas, a tecnologia, as artes, as múltiplas linguagens. Isto se faz garantindo
educação de qualidade para todos. A escolaridade média do brasileiro, de
pouco mais de quatro anos, é um indicador da dramática situação de
desigualdade e injustiça existente no Brasil.
25. As características da atual política educacional são a descentralização
executiva, o controle centralizado e a privatização do atendimento,
principalmente no nível superior, e a insuficiência global de recursos.
26. A descentralização se confunde com a desoneração do Estado para com
o sistema de educação. No âmbito da escolarização obrigatória, a criação do
Fundo de Manutenção e de Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de
Valorização do Magistério (Fundef), se trouxe avanços importantes,
principalmente em regiões mais pobres, o fez com certo grau de perversidade.
27. O Fundef obriga o governo federal a repassar recursos aos estados cujo
investimento aluno/ano seja menor que o mínimo estabelecido nessa lei.
Portanto, ao estabelecer um valor mínimo anual por aluno menor que a média
geral do investimento aluno/ano, o governo federal deixa de repassar recursos
da União à maioria dos estados: poucos são aqueles cujo investimento fica
abaixo do valor mínimo. Dessa forma, o governo não só se desonera do
repasse de recursos, como também consolida as desigualdades entre estados,
praticando uma “política de eqüidade” que, de fato, não passa de uma “política
de igualdade na pobreza”.
28. A ação centralizada do governo federal sobre as diversas formas ditas
de avaliação, como o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) e o Exame
Nacional de Cursos (Provão), focaliza apenas o produto final e não o processo
educativo. Essa forma de avaliação serve para destacar alguns efeitos
especiais, pelos quais o MEC tem grande interesse, como o ranking dos
estados, no caso da educação básica, e o das universidades, no caso da
educação superior. Esse tipo de avaliação, para ser eficaz, precisaria vir
acompanhado de programas consistentes de melhoria de qualidade do ensino,
por meio tanto de formação, retreinamento e melhor remuneração de
professores, a partir de critérios de desempenho, quanto da rediscussão das
grades curriculares, com a valorização de conteúdos.
29. Quanto ao avanço da privatização do sistema, ela não se dá pela venda
das universidades e escolas públicas, mas pelo acelerado aumento proporcional
da rede privada, a cada dia com maior peso no sistema, principalmente na
educação infantil e na superior.

45
Uma Nova Política
Educacional
30. Os desafios qualitativos e quantitativos da educação são de tal
magnitude que não pode mais haver vacilação quanto à importância estratégica
dos investimentos nessa área. Todos os elos educacionais, da creche à pós-
graduação, têm de ser verdadeiras prioridades e contar com recursos
progressivamente maiores.
31. Nosso governo terá como meta promover a educação infantil a um novo
estatuto, de modo que todas as crianças tenham os meios para sua formação
intelectual igualmente assegurada. Será prioridade, nos próximos quatro anos,
universalizar o ensino do nível pré-escolar até o médio e garantir o acesso à
creche.
32. No caso do ensino médio, formularemos uma política que inclua os
jovens trabalhadores. Para tanto, o Fundef deve ser ampliado para todo o
ensino básico e contar com recursos suplementares do governo federal,
revertendo-se o atual processo de municipalização predatória da escola pública.
Além disso, a exemplo da saúde, a educação tem que ser concebida como um
sistema nacional articulado, integrado e gerido em regime de colaboração
(União, estados e municípios) e de forma democrática, com a participação da
sociedade.
33. Os dados do Censo da Educação Superior de 2000 mostram que os
jovens das camadas mais pobres praticamente não têm acesso à educação
superior pública: apenas 7,7% dos jovens entre 18 e 22 anos freqüentam
cursos universitários. Cerca de 70% deles estudam em estabelecimentos
privados. Quando conseguem chegar ao ensino superior, o custo é tão alto que
apenas os que têm bons empregos ou apoio econômico da família conseguem
pagar a faculdade. Por isso, há elevada inadimplência e evasão, até porque o
sistema de crédito educativo, que poderia ser uma alternativa, é insuficiente e
inadequado. São tarefas inadiáveis a ampliação significativa das vagas nas
universidades públicas e a reformulação do sistema de crédito educativo
vigente.

A Política de Saúde

46
34. No fim da década de 1980, com a Constituição Federal e a Lei Orgânica
da Saúde, o Brasil montou um sistema único e nacional de saúde, que integrou
os subsistemas de saúde pública e previdenciária, assim como os serviços
públicos e privados, em regime de contrato ou convênio. Trata-se do Sistema
Único de Saúde (SUS), que está organizado de forma regionalizada e
hierarquizada, sob comando único em cada nível de governo e segundo as
diretrizes da descentralização administrativa e operacional, do atendimento
integral à saúde e da participação para o controle social. O SUS representa a
conquista de uma forma ampla de entender a saúde, definida
constitucionalmente como direito de todos e dever do Estado.
35. Em nosso governo, a saúde será entendida e gerenciada no contexto
dos direitos sociais compreendidosna Seguridade Social, devendo ser financiada
por toda a sociedade, mediante recursos provenientes dos orçamentos da
União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios, além de contribuições
sociais e outras fontes. A experiência tem mostrado também que as iniciativas
do chamado Terceiro Setor e das Organizações Não Governamentais (ONGs)
funcionam bem e complementam a ação do Estado. Não serão, por isso
mesmo, subestimadas.
36. Em defesa da vida e de um direito fundamental da pessoa humana,
nosso governo trabalhará para garantir acesso universal, equânime e integral
às ações e serviços de saúde, assim como a políticas sociais e econômicas que
reduzam o risco de adoecimento e que promovam a qualidade de vida.
Desenvolverá políticas promotoras de saúde e bem-estar nas cidades e no
campo, estimulando a participação dos diversos segmentos da sociedade e
respeitando o controle social dos Conselhos de Saúde.
37. O Brasil passa, atualmente, por mudanças no perfil demográfico e
epidemiológico da população: crescimento populacional com aumento da
expectativa de vida; aumento da população idosa; atendimento e mortes
provocados por agravos decorrentes de causas externas, como acidentes,
violência e envenenamento; existência de doenças transmissíveis com quadro
de persistência (malária, tuberculose, meningite, leishmaniose, febre amarela
silvestre, hepatite e esquistossomose), doenças reemergentes (dengue e
cólera) e doenças emergentes (Aids e hantaviroses); aumento das doenças
cardiovasculares (doenças isquêmicas do coração, doenças cérebro-vasculares
e hipertensão) e também das doenças crônico-degenerativas (câncer, diabetes,
doenças renais e reumáticas, entre outras), além dos transtornos mentais
reconhecidos como um problema de saúde pública. Nosso governo buscará
garantir o direito constitucional da população ao atendimento de suas

47
necessidades, desde a prevenção dessas doenças até o atendimento dos casos
mais complexos.
38. A direção do SUS deve ser descentralizada efetivamente, com os
municípios e os estados desenvolvendo condições técnicas, financeiras e
políticas para coordenar a organização dos serviços no seu território, exercer a
gestão, prestar contas e implementar as deliberações dos Conselhos de Saúde.
Essa disposição constitucional é importante porque a responsabilidade
compartilhada entre as três esferas de governo com respeito às prerrogativas
dos municípios e estados permite que as ações e os serviços de saúde tenham
a organização necessária em cada território, conforme indicar o planejamento e
deliberar o controle social.
39. Nosso governo respeitará e efetivará o que a lei estabelece, oferecendo
cooperação técnica e financeira para fortalecer estados e municípios para que,
respeitando o controle social, exerçam a gestão descentralizada do SUS e a
regulação do sistema privado suplementar.
40. Nosso governo fortalecerá a cultura e a prática de gestão solidária entre
as três esferas de governo, com a formalização legal e o respeito às instâncias
de pactuação das políticas de saúde entre os gestores. No plano nacional, além
da construção consensual das estratégias para todo o País, serão discutidas e
pactuadas formas de monitoramento de metas e resultados a serem
alcançados, substituindo as atuais formas de controle centralizado e
exclusivamente administrativo do Ministério da Saúde. Essa pactuação da
gestão substituirá as numerosas e fragmentadas iniciativas impostas de cima
para baixo, como têm sido as campanhas e os programas do atual governo,
que desrespeitam a realidade dos municípios e não atendem às necessidades
da população que procura os serviços de saúde.
41. O Ministério da Saúde, em nosso governo, fará efetivamente a gestão
nacional do SUS, sem concorrer com os estados e municípios. Uma das
estratégias fundamentais para induzir a implementação do SUS será capacitar
estados e municípios para planejar o sistema de saúde no âmbito de suas
competências, de forma a identificar corretamente os problemas e prioridades,
ordenar e tornar mais eficientes os recursos financeiros e assistenciais
existentes, ampliar os serviços nas áreas de carência, avaliar e regular as ações
e os serviços oferecidos. Além de fortalecer o planejamento local, o Ministério
da Saúde estabelecerá mecanismos de acompanhamento da gestão
descentralizada. Para um Brasil mais saudável, os serviços de saúde precisam
ser organizados e controlados de baixo para cima, facilitando a participação e o

48
controle da sociedade. Em nosso governo, ações firmes impedirão a exposição
dos usuários dos serviços de saúde aos riscos de tecnologias desnecessárias e à
sua incorporação indiscriminada.
42. O Ministério organizará efetivamente um Sistema Nacional de
Informações em Saúde para suporte e monitoramento da gestão e da atenção.
A informação é uma ferramenta indispensável para gestão, diagnóstico de
prioridades, identificação de debilidades, planejamento, acompanhamento da
atenção e exercício do controle social. Com isso, será organizada uma política
nacional de disseminação de informações, bem como de capacitação de
trabalhadores de saúde, gestores e usuários, principalmente os conselheiros de
saúde.
43. O Ministério da Saúde será reorganizado, de modo a tornar sua
estrutura horizontal e unificar as diversas áreas concorrentes entre si. Deverá
ter estrutura enxuta, com forte capacidade de gerir e monitorar o sistema de
saúde nacionalmente e cooperar técnica e financeiramente com os estados e
municípios. O Ministério formulará políticas com os gestores e as submeterá a
controle social, normatizando apenas os aspectos relativos à competência
federal de gestão.
44. Os vínculos dos hospitais universitários com o SUS serão fortalecidos. Os
quadros de servidores desses hospitais serão recompostos, para garantir sua
eficáciae a formação de trabalhadores comprometidos com o sistema.
45. A relação do SUS com os serviços privados de saúde respeitará a
prioridade definida legalmente para os serviços de natureza filantrópica e será
formalizada mediante contratos e convênios, que deverão estabelecer metas
físicas, de resolubilidade e de qualidade assistencial. Os contratos e convênios
estabelecerão mecanismos e fluxos de acompanhamento do poder público e de
controle social sobre sua vinculação ao SUS, inclusive nos aspectos financeiros.
46. A política de pessoal do SUS será fundamentada na humanização do
atendimento, na implantação do sistema democrático de relações de trabalho,
na formação profissional e na valorização profissional. Será implantada uma
mesa nacional permanente de negociação, com representação das três esferas
de governo e dos trabalhadores para implantar um sistema democrático de
relações de trabalho no SUS. Essa mesa de negociação deverá elaborar uma
política de pessoal que contemple o acúmulo de discussões sistematizadas
atualmente pelo controle social do SUS e que atenda aos interesses da
população, articulando-se continuamente com os Conselhos de Saúde.

49
47. A regulação das ações e serviços suplementares na instância federal
será subordinada integralmente ao Ministério da Saúde e englobará todos os
aspectos econômicos, jurídicos e assistenciais, com ação sobre as operadoras e
todos os seus prestadores credenciados. O funcionamento da saúde
suplementar deve pressupor a busca contínua do bem-estar de seus usuários,
pois cerca de 40 milhões de brasileiros encontram-se sem a efetiva garantia da
qualidade da assistência prestada. A saúde suplementar deve operar
preservando o SUS de ações predatórias em que o alto custo dos
procedimentos mais complexos é transferido para o sistema. O ressarcimento
ao SUS deve ser imediatamente expandido para todos os procedimentos
hospitalares e ambulatoriais.
48. Nosso governo vai se empenhar no cumprimento da Constituição
Federal e da Lei Orgânica da Saúde, respeitando a boa gestão e as fontes de
financiamento especificadas no Orçamento da União. O Ministério da Saúde
desenvolverá política intersetorial para otimizar ações setoriais e minimizar
custos, desvios e atropelos da duplicidade de ações setoriais sobre o mesmo
objeto.
49. Os recursos financeiros do SUS devem ser repassados diretamente do
Fundo Nacional de Saúde para os Fundos Estaduais e Municipais de Saúde, que
devem ser geridos pelo respectivo Gestor do SUS, gastos em conformidade
com os Planos de Saúde (estadual ou municipal), com acompanhamento e
fiscalização dos respectivos Conselhos de Saúde. Além disso, serão
estabelecidos instrumentos e mecanismos de controle da aplicação dos
recursos. Um controle que transcende o critério contábil, o fluxo de caixa e o
balancete do fundo de saúde e requer uma análise de impacto, de resultado,
da modificação dos indicadores e da qualidade de vida.
50. Nosso governo adotará as Conferências de Saúde como prática regular
para a avaliação da situação de saúde, de discussão e deliberação de diretrizes
para a formulação das políticas setoriais, respeitando os encaminhamentos das
mesmas e adotando medidas para fortalecer os Conselhos de Saúde. O respeito
às prerrogativas do controle social por parte de todos os gestores e do sistema
de saúde será uma das metas prioritárias a serem pactuadas pelo Ministério da
Saúde com os estados e municípios.

50
Política de
Assistência Social
51. A Constituição Federal e a Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS)
estabelecem que a assistência social é um direito de base não contributiva,
integrante do campo da seguridade social, que visa prevenir e superar
diferentes formas de exclusão, garantindo padrões mínimos de cidadania. A
LOAS desenhou um modelo institucional no qual estão previstos a
descentralização, o comando único, a gestão compartilhada com a sociedade
civil e o controle social. Legalmente, o financiamento conta com fontes
definidas, orçamento assegurado e com gestão via Fundo de Assistência Social.
No entanto, desde a aprovação da LOAS, em 1993, a política de assistência
social enfrenta graves dificuldades para se afirmar como promotora do
exercício dos direitos sociais legalmente estabelecidos.
52. A política do atual governo não respeita as definições constitucionais e
legais e, mais que isso, aprofunda as relações clientelistas, assistencialistas e
tuteladoras, promovendo ações focalizadas, seletivas e desconectadas das
demais políticas sociais. Nosso governo, ao contrário, estará comprometido
com a universalização dos direitos, sem clientelismo nem tutelas.
53. Para superar o modelo vigente, os principais desafios são: garantia de
eqüidade e universalização do acesso; responsabilidade estatal pelo
financiamento da Política de Assistência Social na gestão e execução;
construção de uma relação qualificada entre estados e municípios, fortalecendo
o sistema descentralizado e participativo; unidade da política social por meio de
um esforço permanente de articulação dos programas; ampliação da
capacidade do Estado, entendendo que as entidades de assistência e ONGs são
complementares e não substitutas das ações estatais. Quanto ao financiamento
da política de assistência social, é necessário garantir o orçamento fiscal
definido em lei.
54. Em resumo, o sistema único de assistência social descentralizado e
participativo é uma conquista de cidadania. Na prática, ele quebra a política
patrimonialista expressa pelo favor, pelas subvenções parlamentares, entre
outros tantos desvios, e institui o direito de cidadania e o controle social.
55. O caráter público da assistência social será assegurado nas parcerias,
mantendo relação qualificada e transparente de transferência de recursos entre
estados e municípios, observado o pacto federativo. Como protagonista da
política de inclusão social, a assistência social é parceira na vigilância das

51
exclusões e na atenção à criança e ao adolescente, e aos adultos em risco
social e pessoal.

Infra-estrutura e Desenvolvimento
Sustentável
1. O esforço fundamental do nosso projeto é a busca de elaboração
eimplementação de políticas de médio e longo prazo voltadas para o
assentamento dos alicerces de um Brasil sustentável, mais justo e
ambientalmente equilibrado e sem as desigualdades que vêm marcando nossa
história de exclusão. Nesse sentido, o novo governo terá no centro de suas
preocupações a construção e implementação de estratégias que melhorem a
distribuição de renda e reforcem a conservação da diversidade ambiental, a
pluralidade e a singularidade das nossas diferentes culturas.
2. O programa que ora apresentamos procura estabelecer as linhas
estratégicas do futuro governo para recuperar a infra-estrutura produtiva do
País. Nesse sentido, o novo governo buscará consolidar e ampliar os pilares de
sustentação do parque produtivo brasileiro, tendo como eixo o planejamento
integrado nacionalmente, combinado a uma perspectiva regional flexível e
descentralizada.
3. Nosso governo manterá distância tanto do velho nacional-
desenvolvimentismo das décadas de 1950, 1960 e 1970 quanto do novo
liberalismo que marcou os anos 90.
4. No primeiro caso, apesar do sucesso obtido com a industrialização do
País, o modelo implantado estimulou práticas clientelistas, às custas de
subsídios e benefícios distribuídos às empresas, sem preocupação com a
competitividade e sem a definição de cronogramas e metas. Em uma palavra,
sem claras políticas de reciprocidade entre o setor público e o privado. O
resultado foi a distorção das estruturas de mercado, a geração de ineficiências
econômicas e um quadro de má distribuição de renda.
5. De seu lado, a experiência liberalizante dos anos 90 provocou corrosão do tecido
industrial, com perdas de elos importantes das cadeias produtivas, enfraquecendo a
capacitação interna e ampliando a vulnerabilidade externa do País. Ao longo dos últimos

52
anos, as políticas do atual governo aprofundaram a fragmentação da estrutura econômica e
industrial, as desigualdades regionais e a concentração de renda.
6. Um novo modelo de desenvolvimento exigirá a superação efetiva de
importantes estrangulamentos na infra-estrutura existente hoje no País, cuja
insuficiência e desgaste tem se revelado como um obstáculo decisivo ao
crescimento sustentado.
7. As bases programáticas do nosso governo apontam para um País
diferente. Um Brasil capaz de construir seu próprio futuro e de sustentar seu
desenvolvimento econômico e social.
Diretrizes Gerais
8. O plano do novo governo para os setores de infra-estrutura está
sustentado por três pilares básicos:
a) Uma nova concepção de Planejamento e Desen-volvimento. O
planejamento público é ação precípua e intransferível do Estado. O novo
governo retomará a prática do planejamento estratégico, tanto nacional como
regional, como instrumento para a definição de ações práticas em todos os
setores da infra-estrutura. O debate com a sociedade será determinante nas
relações entre estados e União, de modo a permitir um lugar de destaque para
a atuação regional voltada para o desenvolvimento. O novo governo fixará
macroprioridades nacionais para revitalizar a Federação, integrando União,
estados e municípios, dando origem a um novo modelo de descentralização
coordenada. Será possível planejar e ao mesmo tempo descentralizar a partir
da recuperação do papel indutor do governo federal, aliado a um maior
controle e participação social nas ações de desenvolvimento regional e local.
b) Reconstrução das Cidades e Desenvolvimento Urbano. O novo
governo enfrentará os principais problemas urbanos acumulados ao longo dos
últimos anos, como a: (1) ausência de moradia e saneamento adequado
(acessibilidade a água potável, sistemas de esgotos, destinação e tratamento
de resíduos sólidos); (2) a baixa mobilidade urbana (transportes ágeis e não
poluidores); (3) a falta de ação coordenada entre os executivos municipais,
estaduais e federal de modo a dar forma a uma efetiva Política de
Desenvolvimento Urbano, com propostas específicas para as regiões
metropolitanas e os demais centros urbanos do País, inclusive os pequenos
municípios.
c) Energia para o desenvolvimento. A política econômica do nosso
governo visa promover um novo ciclo de expansão da economia e atender

53
demandas reprimidas existentes. Para isso, novos projetos de reestruturação
da base produtiva serão necessários, de modo a viabilizar, a médio e longo
prazos, uma articulação entre o local, o regional e o nacional, com o objetivo
de dar forma ou restaurar cadeias produtivas e melhor identificar e controlar os
impactos socioambientais, integrando nesse esforço lideranças da sociedade
civil. O novo governo trabalhará com um planejamento energético integrado,
de maneira a viabilizar novas dinâmicas para os setores de hidroeletricidade,
petróleo e gás natural, carvão, de geração nuclear, fontes alternativas (eólica,
solar e biomassa), de eficiência energética e co-geração e geração distribuída,
devolvendo ao Ministério das Minas e Energia as atribuições de principal gestor
do sistema.

Fontes de Financiamento
9. O montante global dos recursos a serem despendidos pelo nosso governo
com os diferentes programas propostos está vinculado às suas perspectivas de
captação de recursos, ao grau de racionalização das despesas do Estado e à
articulação com os setores público e privado. Assim, o alcance dos programas
propostos será tanto maior quanto melhor for o desempenho da economia e da
gestão fiscal. Para a realização dos programas do novo governo, além da
reorientação dos fundos atualmente disponíveis (como o FGTS e o FAT) e de
instrumentos como o BNDES, a Caixa Econômica Federal e a Financiadora de
Estudos e Projetos (Finep), serão considerados os seguintes determinantes
básicos: (1) Crescimento econômico; (2) Melhoria na gestão das receitas; (3)
Racionalização das despesas administráveis; (4) Redução gradual dos encargos
financeiros; (5) Adoção de parcerias com o setor privado; (6) Parcerias com
outros níveis de governo; (7) Substituição e integração de programas
governamentais.
§ Crescimento Econômico. O determinante mais importante do volume
dos recursos públicos é o nível da atividade econômica. Quanto mais cresce a
economia, mais recursos públicos são gerados. Na realidade, esses recursos
crescem acima do nível da própria atividade econômica, pois as empresas e os
demais contribuintes passam a ter maiores condições de pagar os impostos e
contribuições. Um crescimento econômico de 4% do PIB ao ano permite uma
expansão da receita pública de 5% a 7% ao ano. Como a política econômica do
novo governo será sustentada pelo crescimento econômico, significativo
volume de recursos será carreado aos cofres e fundos públicos para dar
sustentação financeira aos programas propostos.

54
§ Melhoria na gestão das receitas. O alto nível de sonegação e
inadimplência existente em nosso país está relacionado, em boa medida, às
dificuldades financeiras pelas quais passam os agentes econômicos, e também
à precariedade da gestão das receitas públicas, pelo insuficiente nível de
informatização e integração dos diferentes sistemas de arrecadação existentes.
Historicamente, as receitas vêm crescendo com as melhorias constantes e
crescentes das gestões fazendárias em todos os níveis de governo. Nos últimos
dez anos, esta eficiência tem representado um crescimento de cerca de 2% ao
ano. A ampliação da informatização a ser desenvolvida pelo novo governo, o
cruzamento de cadastros dos diversos sistemas de arrecadação inter e
intragovernamentais e o aperfeiçoamento da máquina fazendária com a
ampliação e a valorização dos profissionais do setor, permitirão que novos
recursos sejam obtidos para o financiamento de novos programas.
§ Racionalização das despesas administráveis. Entre 1995 e 2001,
segundo o Tesouro Nacional, as despesas com pessoal representaram 24% das
despesas correntes, os encargos financeiros 17% e as outras despesas
correntes 59%. Este último item poderá ser reduzido via compras efetivadas
por meio de novos sistemas eletrônicos, de pagamento pontual dos
compromissos (estimulando a concorrência no fornecimento de bens, serviços e
obras) e de maior controle sobre a execução dos programas.
§Redução gradual dos encargos financeiros. Com o refinanciamento das
dívidas de estados e municípios, quase toda a dívida mobiliária do país pertence
ao governo federal. Essa dívida vem sendo diretamente afetada pelas altas
taxas de juros e pelas bruscas oscilações da moeda, dado que boa parte da
dívida (em torno de 30%) é corrigida pela variação do dólar. A nova política
econômica irá reduzir gradualmente as taxas de juros e o estoque de títulos da
dívida com vinculação cambial, liberando importantes recursos para os diversos
programas.
§ Adoção de parcerias com o setor privado. O novo governo
impulsionará um movimento nacional pela retomada do crescimento do País,
cujo pressuposto é a democratização das relações entre o governo e a
sociedade civil. O esforço pela melhoria da competitividade da economia está
ligado à criação de um ambiente ativo, com a valorização dos empreendedores
e da capacidade de iniciativa no meio empresarial brasileiro. Nesse sentido, o
governo buscará intensamente compartilhar investimentos com o setor privado
de modo a viabilizar o novo Compromisso pela Produção. Ganha todo sentido,
para tanto, a utilização do mercado de capitais, seja pelo uso de recebíveis e
lançamento de debêntures, seja pela abertura do capital das empresas. Essa

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alternativa pode permitir a mobilização de capitais, não só do grande investidor
como, se bem articulado e com segurança, do pequeno poupador, hoje sem
opções fora da caderneta de poupança. Tal mobilização, via Bolsa de Valores,
pode levar ao aumento da poupança nacional voltada para o investimento
produtivo, resultando na revitalização do hoje minguado mercado de capitais
brasileiro.
§ Parcerias com outros níveis de governo. O nosso governo
implementará novos programas em parceria com estados e municípios,
ampliando substancialmente o alcance da ação governamental e otimizando
ativos e investimentos.
§ Integração de Programas. Com a definição de novas prioridades,
alguns programas poderão ser substituídos, anulando-se despesas existentes
para a criação de novas, conforme exigência da Lei de Responsabilidade Fiscal.
O novo governo diminuirá a excessiva pulverização dos programas atuais,
integrando-os em programas articulados e de maior alcance, economizando e
racionalizando recursos.

Nova Política Nacional de Desenvolvimento


Regional
10. Nosso governo implementará uma nova política regional capaz de
equacionar a herança de desigualdades que caracteriza a realidade espacial do
País. Ela combina regiões desenvolvidas e industrializadas com áreas de imensa
pobreza e atraso econômico, social e cultural. O novo governo estimulará a
discussão sobre uma Política Nacional de Desenvolvimento Regional, que seja
um instrumento de avanço do conjunto das regiões e de apoio à sua inserção
ativa no mundo globalizado. Caberá a essa nova política a abertura de diálogo
com estados e municípios, a partir do reconhecimento de suas potencialidades
e dos obstáculos ao seu pleno desenvolvimento e inserção na economia
internacional. Sustentada na base produtiva regional já instalada, a nova
política trabalhará pela sua ampliação a partir de:
§ Redução sistemática das desigualdades regionais. O novo governo
terá a eqüidade como princípio estratégico. Isso se traduzirá em uma luta
incansável por redução das desigualdades de renda, ampliação das
oportunidades e melhoria das condições de trabalho em todas as regiões do
País.

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§ Investimento em eficiência e competitividade. Esse investimento
será estratégico para o planejamento regional e para a montagem de uma
estrutura produtiva que objetive ganhar os mercados interno e externo num
contexto cada vez mais competitivo;
§ Enfrentamento das tendências à fragmentação. Economias
continentais, como a brasileira, exigem cada vez mais políticas capazes de
combinar o esforço de integração ao mercado mundial, que algumas regiões e
sub-regiões já desenvolvem, com uma atuação no sentido de se evitar que
determinadas regiões fiquem à margem, condenadas ao atraso permanente.
Políticas de complementaridade serão implementadas de modo a não duplicar
esforços e a otimizar a capacidade produtiva de toda a economia brasileira.
Nesse sentido, o respeito à heterogeneidade e à diversidade que caracterizam o
País, tanto em termos de indicadores pessoais como espaciais, será
fundamental;
§ Combate à disputa predatória entre estados e municípios. O Brasil
está maduro para implantar um modelo descentralizado-coordenado, distinto
da atual competição predatória entre estados e municípios. De fato, a “guerra
fiscal” só persiste dada a ausência de verdadeiras políticas de desenvolvimento
regional, de investimentos da União e da falta de incentivo à qualificação das
agências regionais e ao planejamento de médio e longo prazo. O novo governo
buscará eliminar o desamparo atual de governadores e prefeitos, que buscam
trazer o progresso às suas regiões, hoje esquecidas pela União. A coordenação
responsável e flexível do esforço dos estados e municípios será capaz de
corrigir o que há de predatório na atual disputa, sem eliminar um certo grau de
competição saudável para agilizar a ação pública, revigorar o corpo técnico e os
equipamentos públicos estaduais e municipais;
§ Desconcentração das bases produtivas. O novo governo estimulará a
desconcentração das bases produtivas, fortalecendo especializações regionais a
partir da classificação das regiões em: (1) Áreas dinâmicas (modernas e
competitivas); (2) Em processo de reestruturação (áreas com potencial de
competitividade); (3) Estagnadas (áreas de baixo dinamismo econômico); (4)
De potencial pouco utilizado (marginalizadas como as áreas estagnadas, que
demandam maior esforço de reconhecimento de suas potencialidades); (5)
Faixas de fronteira (a oeste e ao norte, elas apresentam especificidades que
precisam ser trabalhadas).
§ Criação de um Conselho Nacional de Políticas Regionais. O novo
governo proporá a criação de um Conselho Nacional de Políticas Regionais,
assim como a criação de um Fundo Nacional de Desenvolvimento Regional,

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estruturado como um instrumento capaz de implantar os objetivos e metas
destinados a diminuir as desigualdades regionais. Caberia também ao
Conselho, acima referido, analisar e aprovar propostas de regionalização,
obrigatoriamente explicitadas nas políticas setoriais, uma vez que elas têm
impactos regionais diferenciados num país heterogênio como o Brasil e
portanto precisam ser conciderados a priori. A política regional do novo
governo será sustentada pelo Fundo Nacional e por fundos específicos que,
quando existentes, terão sua gestão democratizada. Historicamente, o
investimento público foi concentrado nos pólos dinâmicos e nas áreas mais
competitivas, produzindo desequilíbrios regionais crescentes. É para as áreas
com maiores carências e onde os desafios são maiores, que será destinado
tratamento suplementar em apoio aos esforços de seus habitantes e lideranças
locais. Das ações prioritárias no plano regional, nosso governo dará ênfase a
duas macrorregiões: a Amazônia, pela sua importância estratégica, e o
Nordeste, pelo enorme déficit social. Nestas regiões, o novo governo buscará
recuperar e restaurar toda a capacidade de planejamento e articulação das
extintas Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste (Sudene) e
Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia (Sudam).

Reconstrução das Cidades e Desenvolvimento


Urbano
11. O município é o espaço preferencial da política de desenvolvimento
urbano, onde a sociedade se organiza social e economicamente. É no município
que se situam as atividades produtivas que contribuem de forma decisiva para
a formação do PIB e onde o cidadão se reconhece como agente político no
sistema democrático. No entanto, os municípios brasileiros enfrentam enormes
desafios. Num mundo de crescente competitividade e complexidade, ficaram
delegadas aos governos municipais responsabilidades para as quais não
possuem a respectiva autonomia institucional e financeira que lhes permita
responder às demandas criadas e tratar dos problemas urbanos.
12. O governo federal não pode se eximir de sua responsabilidade e deve
participar do esforço das administrações municipais na busca das condições
que viabilizem: o aumento da produção, do fluxo de bens e serviços e da
qualidade de vida da população urbana e a superação das atuais condições de
exclusão territorial em que se encontra a maior parte da população urbana. Os
impactos ambientais decorrentes da velocidade do processo de urbanização,
aliados à implementação de políticas urbanas que jamais dialogaram com a

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dinâmica da cidade real, geraram uma incapacidade crônica do poder público
de garantir o efetivo acesso a saneamento, habitação, transporte, segurança,
educação e saúde, revelando os riscos a que significativas parcelas da
população urbana estão submetidas: deslizamento de encostas, inundações,
contaminações do solo e de cursos d’água, proliferação de lixões a céu aberto.
Com o crescimento das aglomerações urbanas ampliou-se a pobreza urbana,
tornando cada vez mais complexa a resolução dos problemas que afligem as
cidades. Entre os fatores que contribuíram para essa situação, destacam-se a
dificuldade de acesso à terra e a inadequação da política urbana às
necessidades da população, que acentuaram a proliferação de assentamentos
urbanos informais.
13. Em pouco mais de 50 anos, a taxa de urbanização passou de 31,4%
para mais de 80%. No entanto, esse crescimento não foi acompanhado da
oferta de bens e serviços urbanos capazes de atender ao contingente
populacional que se dirigiu às cidades, onde grande parcela da população se
reagrupou em assentamentos humanos informais ou ilegais, em favelas,
mocambos e palafitas. Diante desse quadro, o nosso governo se dispõe a:
§ Articular a política nacional de desenvolvimento com as políticas urbanas,
de modo a revelar, construir e potencializar as identidades e vocações dos
municípios. Para isso, é fundamental que todas as vantagens competitivas
locais sejam exploradas;
§ Escolher as características diferenciadas das cidades de modo a orientar os
investimentos estratégicos;
§ Incentivar a participação dos governos estaduais na definição das políticas
urbanas, de forma a promover redes regionais com funções complementares;
§ Construir efetivamente a gestão cooperativa nas regiões metropolitanas,
incentivando consórcios e outras formas de associativismo comprometidas com
o desenvolvimento das regiões;
§ Estimular a implementação do Estatuto da Cidade, apoiando os municípios
no esforço de manejar o uso e a ocupação do solo.
Diante da gravidade da situação urbana, o novo governo vai desenvolver em
caráter de urgência ações no âmbito institucional e operacional, como:
a) Reforço da capacidade de gestão municipal. Desenvolver e
executar, em parceria com os estados, programas de desenvolvimento
institucional que contribuam para a modernização da gestão urbana e para a

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capacitação técnica e gerencial dos agentes públicos, particularmente das
administrações municipais;
b) Combate à exclusão por meio de ações de emergência social. A
União deverá ampliar a oferta de alternativas de produção de habitações,
incluindo a regularização fundiária e a urbanização de assentamentos informais,
aliada à ampliação da oferta no mercado formal para as faixas de baixa renda
familiar;
c) Investimento em Infra-Estrutura. O novo governo dará prioridade aos
investimentos em saneamento ambiental (água, esgoto, drenagem, lixo) e
sistemas de transporte coletivo para os municípios.
Projeto Moradia
14. O novo governo mobilizará a sociedade civil pelo direito à moradia
digna, buscando assentar as bases para a superação do enorme déficit
habitacional queatinge principalmente os mais necessitados e suas famílias. De
1995 a 1999, foram construídas no Brasil 4,4 milhões de unidades
habitacionais. Desse total, apenas 700 mil foram produzidas pelo mercado. Isto
é, nada menos de 3,7 milhões de moradias foram construídas, em condições
precárias, pelas próprias famílias excluídas. Essa tragédia permanente, em vez
de diminuir, cresce constantemente. Em 1970, apenas 1% da população da
Grande São Paulo vivia em favelas. Em 1995, esse índice saltou para 20%. Em
Belo Horizonte, 25% dos habitantes moram em favelas. No Rio de Janeiro,
28%. Em Salvador, 33%. Em Belém, 50%. O Brasil demanda 600 mil novas
casas por ano, que devem ser somadas ao déficit habitacional já existente de
5,5 milhões de moradias. Para superar essa situação, o novo governo vai:
§ Priorizar o estímulo à construção de moradias, aquecendo a indústria da
construção civil;
§ Orientar sua atuação pela Constituição Federal, que define a Função Social
da Propriedade, de modo a racionalizar o uso de milhões de imóveis urbanos
vagos em todo o País;
§ Implantar o Projeto Moradia do Instituto Cidadania, de modo a coordenar
as ações de política urbana e habitacional, articulando suas principais agências
responsáveis;
§ Impulsionar o barateamento dos materiais de construção, por meio da
implantação de políticas específicas para este setor, com ênfase em critérios de
padronização e fixação de normas para os produtos;

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§ Incentivar ações das Prefeituras no sentido de elaborar Planos de Ação e
Planos de Moradia integrados, que especificarão os investimentos e as obras
destinadas às diversas regiões da cidade, com o duplo objetivo de racionalizar a
ocupação do solo e assegurar a oferta de serviços essenciais à população;
§ Concentrar o financiamento da habitação nos Fundos de Moradia
(nacional, estaduais e municipais), articulando as diferentes fontes de recursos
e uniformizando os critérios de financiamento. A Caixa Econômica Federal será
a gestora operacional do sistema de financiamento. Para assegurar a oferta de
crédito em escala ampla e diversificada será adotado um sistema altamente
descentralizado, com a utilização de agentes e promotores de financiamento de
diversos portes, distribuídos pelos estados e municípios.
§ Financiar, prioritariamente, a população com renda familiar de até 12
salários mínimos e as regiões onde o déficit habitacional é maior. A solução do
problema da moradia digna não depende somente da existência de recursos e
sim da criação de condições que garantam o acesso das famílias de baixa renda
ao financiamento disponível. Para isso, o novo governo implementará uma
política maciça de concessão de subsídio, possibilitando que as famílias
beneficiárias paguem o financiamento, a partir de mecanismos que ajustem o
valor da prestação à sua renda mensal. As principais fontes de recursos dos
Fundos de Moradia virão principalmente do FGTS e de dotações do Orçamento
Geral da União;
§ Mobilizar os governos estaduais, prefeituras, câmaras de vereadores e as
entidades da sociedade civil no sentido de valorizar o Imposto Predial e
Territorial Urbano (IPTU) como imposto promotor da justiça social e da
distribuição de renda nos municípios. Se essa mobilização for alcançada, nosso
governo terá lançado as bases para a eliminação do déficit habitacional.

Mobilidade Urbana
15. Os grandes centros urbanos vivem hoje uma grave crise de mobilidade.
No que se refere à circulação, houve avanços na redução de mortes e maior
eficácia na gestão do trânsito com a municipalização e com o Novo Código de
Trânsito Brasileiro. No entanto, o País precisa definir uma Política Nacional de
Mobilidade Urbana, que dê prioridade para o transporte coletivo.
Nesse sentido, o nosso governo vai:
§ Priorizar o transporte coletivo, aumentando a mobilidade nas cidades e a
segurança do usuário, garantindo financiamento para os grandes sistemas;

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§ Garantir e ampliar a cidadania por meio de uma política nacional de
acessibilidade para as pessoas com mobilidade reduzida;
§ Incentivar a melhoria da qualidade ambiental em todas as regiões do país;
§ Estimular a consolidação de redes de transporte público, de grande e
média capacidade, e a utilização de mecanismos de integração intermodal;
§ Implementar o Programa Nacional Paz no Trânsito para reduzir o índice de
acidentes e mortes no trânsito, com campanhas educativas e linha de
financiamento a programas concretos.

Transporte
16. O novo governo desenvolverá uma política nacional de transportes, cujo
objetivo será melhorar o serviço aos cidadãos e suprir as demandas do
mercado interno e do mercado exportador. Em sua característica mais
determinante ao longo de décadas, o setor de transportes no Brasil tem
mantido uma excessiva concentração da demanda no domínio rodoviário, tanto
no tocante à movimentação de carga como de passageiros. O novo governo
trabalhará no sentido de ampliar a participação das modalidades de grande
porte, como ferrovias, navegação de cabotagem e navegação interior
(hidrovias).
17. No âmbito nacional, estima-se que 96,2% dos passageiros/km são
transportados em rodovias, 1,81% em ferrovias e metrôs e o restante por
hidrovias e meios aéreos. Em relação às cargas, 60,48% das toneladas/km são
transportadas em rodovias, 20,89% em ferrovias, 13,85% em hidrovias e o
restante por gasodutos/óleodutos ou meios aéreos.
18. Assim, as ações prioritárias nesse campo serão: (1) Implementação de
políticas de incentivo à melhoria do setor de transportes tanto de passageiros
como de cargas; (2) Identificação e apoio à implantação de projetos de infra-
estrutura de transporte que impulsionem processos de formação de pólos
regionais de desenvolvimento; (3) Criação do Conselho Federal de Transportes
e estímulo à implantação de instâncias similares nos âmbitos estadual e
municipal.

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Políticas Ambientais
Saneamento e
Meio Ambiente
19. O Brasil apresenta índices elevados de internações hospitalares
decorrentes de doenças causadas pela deficiência ou mesmo a inexistência de
saneamento básico. A implantação desses serviços tem forte impacto na
redução das doenças e das taxas de mortalidade infantil, influindo na melhoria
de indicadores sociais como o Índice de Condição de Vida da população e do
Índice de Desenvolvimento Humano.
20. O novo governo vai se orientar no sentido de: (1) Atender aos mais
pobres e às regiões menos favorecidas; (2) Reduzir a poluição e a incidência de
doenças relacionadas à insuficiência do saneamento; (3) Aumentar a eficiência
dos prestadores de serviços e a eficácia das ações; (4) Estimular o uso de
tecnologia apropriada; (5) Estimular a associação de municípios para resolver
problemas comuns; (6) Prestar assistência técnica e sanitária, especialmente
em pequenos municípios e áreas rurais; (7) Incluir o saneamento na agenda de
trabalho dos agentes de saúde, com a identificação de carências; (8) Estimular
a construção de fossas e banheiros para os segmentos de baixa renda; (9)
Construir laboratórios regionais de referência para análise da água e dos
efluentes sanitários; (10) Ampliar a fiscalização sobre a qualidade da água
distribuída.
21. Instrumento para a consecução das prioridades macrossociais do nosso
governo, abrangendo ações no âmbito de abastecimento de água, esgoto
sanitário, gestão dos resíduos sólidos, drenagem urbana e controle de vetores e
reservatórios de doenças transmissíveis, a Política Nacional de Saneamento
Ambiental tem como objetivo último assegurar os direitos humanos
fundamentais de acesso à água potável e à vida em ambiente salubre nas
cidades e no campo, e será desenvolvida de modo planejado, orientando-se por
critérios epidemiológicos para a priorização das ações, sob gestão pública,
integrando os três níveis de governo.
A Política Nacional de Saneamento do nosso governo estará
baseada em:
§ Estruturação dos Comitês e Agências de Bacia Hidrográfica, incentivando a
implementação da lei de recursos hídricos;

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§ Subsídio ao tratamento de esgotos onde a poluição afetar mananciais
necessários ao consumo humano;
§ Integração das ações de saneamento, desenvolvimento urbano e recursos
hídricos, constituindo meios de cooperação entre governos e sociedade;
§ Cooperação federativa como meio de superar impasses nas políticas de
saneamento. Para tanto, o novo governo desenvolverá uma política nacional
participativa, que busque e instrumentalize a universalização dos serviços, a
eqüidade e a eficiência;
§ Modernização dos prestadores públicos de serviços de saneamento,
tornando-os sustentáveis e profissionalmente gerenciados;
§ Revisão dos tributos incidentes sobre prestadores de serviços de
saneamento, provendo igualdade tributária entre as diversas formas de
prestação de serviços;
§ Incentivo à gestão associada dos serviços, com a formação de consórcios,
associações e empresas regionais;
§ Estímulo à efetivação de parcerias com o setor privado, de modo a buscar
a universalização e a ampliação dos investimentos, o desenvolvimento
tecnológico, o aumento da eficiência e a redução de custos, com ações
apropriadas a cada realidade local e regional.

Recursos Hídricos
22. O Brasil, com 2,8% da população mundial, ocupa o primeiro lugar em
termos de disponibilidade hídrica do planeta, com 12% das reservas mundiais
de água doce, sendo que três grandes bacias hidrográficas respondem por 80%
desse total.
23. Ao considerar o ambiente (ar, água, solo) como recursos, deve-se
trabalhar com o conceito de economia ambiental. Assim, gerenciar
adequadamente esses recursos significa utilizá-los com critério, de modo a que
possamos satisfazer as nossas necessidades sem esgotá-los, preservando-os
para os usos das gerações futuras. A consciência de que os recursos naturais
são limitados diante das necessidades humanas fez com que em vários países
(principalmente nos mais desenvolvidos) se criassem mecanismos para
administrar esses recursos da melhor maneira possível.

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24. O novo governo, aproveitando o conhecimento acumulado pelos
organismos responsáveis pela administração dos recursos hídricos, pelas
empresas responsáveis por hidrelétricas, pelas organizações ribeirinhas e por
outras tantas organizações que vivem em função de nossos rios, vai dar
prioridade à revitalização de bacias, numa visão de integração nacional,
entendendo que os rios são corredores de desenvolvimento fundamentais.
25. Nas cidades brasileiras, 11 milhões de pessoas não têm acesso ao
abastecimento de água tratada, estando sujeitas a inúmeras doenças
gastrointestinais. Ainda assim, há um enorme desperdício, da ordem de 45%
do volume produzido. Destacam-se os seguintes pressupostos para a ação do
governo em relação à água: a) definição desse recurso como um bem de
domínio público; b) entendimento de que se trata de um recurso natural
limitado, que possui valor econômico e que deverá ter uso racional e utilização
mais preservacionista; c) respeito ao uso múltiplo do recurso dando condições
igualitárias de acesso a todas as categorias usuárias (saneamento, pesca, lazer
e outros).

Energia
26. O novo governo vai restabelecer o planejamento estratégico que existia
no setor elétrico e foi abandonado com a tentativa de implantação de um
modelo de mercado. Com o desmonte do planejamento integrado, a cisão e
privatização de empresas, o Brasil abriu mão da sinergia de seu sistema e de
uma de suas principais vantagens: a produção da energia elétrica mais barata
do mundo. O planejamento integrado proposto exige uma nova estrutura
institucional, envolvendo: hidroeletricidade, petróleo e gás natural, carvão,
geração nuclear (Angra I e II), fontes alternativas (eólica, solar e biomassa),
eficiência energética e co-geração e geração desconcentrados.
27. Para os objetivos definidos no planejamento, deverá ser mobilizado o
setor público e incentivado o setor privado. Para isso deverá trabalhar a partir
de requisitos de qualidade e confiabilidade; modicidade das tarifas; respeito à
legislação ambiental, e reinvestimento de parte dos lucros em projetos
destinados a modernizar o sistema e a expandi-lo proporcionalmente ao
desenvolvimento econômico.

Setor Elétrico

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28. A crise vivida recentemente por este setor tem raízes no modelo
anteriormente adotado, em que havia praticamente um monopólio estatal.
Apesar do esgotamento e das falhas desse modelo, a possibilidade de fazer um
planejamento integrado permitia detectar os problemas em tempo de se adotar
as providências e fazer as reformas necessárias para que se evitasse
sobressaltos.
29. O país viveu, nos anos 80, graves desajustes neste setor tão sensível
para a economia, com os governos da época utilizando as empresas saudáveis
do setor para ampliar o endividamento externo do país.
30. Ao longo da década de 1990, o atual governo concluiu que os
problemas existentes resumiam-se, simplesmente, à presença do Estado no
setor elétrico. O modelo de mercado que se procurou impor desestruturou o
planejamento e, mesmo sem fazer as alterações cabíveis, privatizou empresas
e modificou as regras do setor abruptamente. Como resultado tem-se um setor
elétrico profundamente desajustado, necessitando ser “revitalizado”.
31. No nosso governo, as bases de sustentação dessa atividade não serão
entregues apenas às forças do mercado nem a uma visão tecnocrática e
autoritária, centralizadora. Devem ter caráter participativo, criando
mecanismos de controle social e de incorporação de contribuições dos diversos
segmentos da sociedade, dos consumidores residenciais, da indústria, da
agricultura, do comércio e dos serviços.
32. A política energética do novo governo, além de garantir a continuidade
do abastecimento, sem os sobressaltos de racionamentos, visará ao
desenvolvimento sustentável. Também estará em harmonia com o meio
ambiente, considerando a diversidade na otimização do aproveitamento das
fontes de energia disponíveis localmente.
33. Deve-se garantir políticas que levem as empresas estrangeiras, recém-
chegadas ao setor com as privatizações, a realizar investimentos no país a
partir de uma perspectiva justa de ganhos. A internalização também deverá
ocorrer na forma de transferência de tecnologias, principalmente nos
aproveitamentos do potencial de energias renováveis, além do aproveitamento
de equipamentos de produção nacional, estimulando a indústria nacional.
34. No plano internacional, a complementaridade regional é um dado da
realidade. O Brasil importa petróleo, gás natural ou energia elétrica de vários
países vizinhos: Venezuela, Argentina, Bolívia e Paraguai, com o qual
compartilha a hidrelétrica de Itaipu. Por isso mesmo, a integração energética

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no continente sul-americano pode ser um instrumento eficaz para a ampliação
do Mercosul.
35. Apesar dos graves problemas da Medida Provisória 14, transformada na
Lei 10.438/2002 – sobretudo os encargos financeiros do racionamento, que o
governo repartiu com a população que tanto soube colaborar para evitar o
apagão –, mesmo esta medida traz em seu bojo três providências importantes:
1) PROINFA – Programa de Incentivo às Fontes Alternativas de Energia
Elétrica; 2) CDE – Conta de Desenvolvimento Energético; 3) medidas visando
garantir a universalização do serviço de energia.
36. Tais programas deverão ser valorizados, pois têm o mérito de apontar
soluções para questões que o Brasil sempre deixou em segundo plano, seja o
aproveitamento de seu enorme potencial energético a partir de fontes limpas,
alternativas e renováveis, seja as metas de universalização ou o significativo
potencial de conservação de energia existente no País.
37. As políticas do nosso governo estarão voltadas para evitar uma reedição
da crise de 2001, restabelecer a segurança dos agentes e evitar os freqüentes
apagões regionais, alguns de abrangência quase nacional. No caos
organizacional do setor elétrico existe um sério conflito de competências, dada
a indefinição e/ou sobreposição de atribuições nas diversas instâncias criadas
na tentativa de garantir o modelo de mercado. Por isso, o nosso governo vai
restituir o ordenamento de atribuições das instituições envolvidas na política
setorial, como o Ministério de Minas e Energia (MME), a Agência Nacional de
Energia Elétrica (Aneel), o Operador Nacional do Sistema (ONS), o Mercado
Aberto de Energia (MAE) e a Eletrobrás. O objetivo é definir claramente as
funções de cada instância, extinguindo aquelas cuja existência se mostrar
desnecessária. Após esse momento inicial, de ajuste das atribuições e
responsabilidades, será iniciado um processo gradativo, sem rupturas nem
atropelos, de redefinição setorial, com o estabelecimento de mecanismos de
participação e gestão por parte da sociedade.
38. As ações básicas serão desenvolvidas no sentido de impedir a
transferência de renda do setor energético; retomar os investimentos setoriais,
alavancando os expressivos recursos próprios das empresas públicas e atraindo
o capital privado para expansão do sistema; impedir a cisão de Furnas,
Eletronorte e Chesf, orientando as empresas que se mantêm sob o controle da
União e dos estados a reinvestirem na expansão, de acordo com a capacidade
financeira de cada uma.

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39. Será adotado o conceito de concessionário de serviço público de
geração de energia elétrica para garantir o abastecimento, respeitando
contratos e valorizando a figura do concessionário de geração para serviço
público, prevista na Lei 9.074; serão definidos os critérios de garantia da
energia, com especificação das situações em que o suprimento poderá ser
interrompido e qual a margem de segurança adequada para ser seguida. Uma
vez definidos, os níveis de risco deverão ser divulgados para permitir ao
consumidor o exercício de fiscalização sobre a situação da energia elétrica.
40. Todas as usinas hidrelétricas de porte devem ser administradas como
concessionárias de serviço público, sejam elas estatais ou privadas.
41. Subsidiariamente ao Planejamento Energético Integrado, deve-se
ganhar capacidade de planejamento de longo prazo, integrando geração e
transmissão com vistas a ampliar a sinergia entre regiões, bem como o uso
racional da água e das demais fontes de energia.
42. Será adotado o conceito de planejamento regional, levando em conta os
problemas ambientais e os benefícios do empreendimento à região e às
populações atingidas.
43. Nosso governo vai estimular a ampliação dos investimentos de
empresas privadas na expansão do setor. Vai desenvolver políticas para
garantir que a expansão do setor elétrico se dê em bases sustentáveis; para
estimular o uso eficiente de energia e também vai fomentar a pesquisa
científica e o desenvolvimento tecnológico, articulados com a política industrial.
44. Vai, por fim, rediscutir o Programa de Termeletricidade, de modo a que
ele não seja um fator de elevação do custo marginal da energia elétrica, com
impacto sobre as tarifas para o consumidor.
Setor Petróleo
45. O petróleo, seus derivados energéticos e não energéticos e o gás
natural ocupam uma posição central e estratégica para a vida moderna. Por
isso mesmo, nosso governo vai aprofundar as políticas que projetam a
Petrobrás como empresa integrada de energia vocacionada para a atuação
regional e global. A companhia tem especialidades e competências, como a
tecnologia de águas profundas, que a credenciam como um competidor global.
Assim, ela deve assumir, de forma crescente, seu papel estratégico nacional e
internacionalmente.
46. É da característica intrínseca desse setor o conceito de companhia
integrada. A empresa não renunciará às atividades de pesquisa e lavra;

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transporte (óleo e gasodutos, terminais e navios especiais); refino e
industrialização de produtos de transformação (petroquímica e fertilizantes) e
distribuição e comercialização de derivados energéticos e lubrificantes. Mais do
que isso, a empresa deve afirmar seu caráter de companhia integrada de
energia, que trabalha com várias matrizes, como o gás e o álcool. Entretanto,
justificam-se as exigências e necessidades de controle social sobre a empresa,
tanto do ponto de vista dos negócios quanto do ponto de vista ambiental, o
que se faz e se fará por meio do Congresso Nacional e da Agência Nacional de
Petróleo.

Álcool Combustível
47. Nosso governo desenvolverá política de incentivo à produção e uso do
álcool pelo seu valor nacional e ambiental. Essa proposição pressupõe o
estímulo da produção de carros à álcool, de renovação de frota vinculada a este
combustível e outras medidas a serem definidas em fórum específico para o
setor.

Tecnologia da Informação
48. A Tecnologia da Informação é o grande fenômeno do final do século XX
e deste início de século XXI. Com a disseminação do computador, da internet e
da comunicação móvel, as sociedades ganharam grandes ferramentas para a
massificação do conhecimento e para o aumento de produtividade das Nações,
de suas indústrias, de seus serviços e do conjunto de sua atividade econômica
e cultural. O desafio, na era do Conhecimento, é evitar que a Tecnologia da
Informação acabe criando um fosso entre os que têm e os que não têm acesso
aos bens e à habilidade requeridos na Era Digital.
49. Mais que nunca, a política setorial deverá ser integrada, para que
aproveitemos a sinergia e os ganhos de produtividade no atendimento às
demandas sociais. Temos a oportunidade histórica de tirar proveito da
convergência tecnológica decorrente da digitalização dos sinais de voz, imagem
e dados.
50. A Tecnologia da Informação, ferramenta imprescindível em todos os
setores da vida nacional, principalmente dentro de uma nova política de
produção cultural e de acesso à informação, será colocada a serviço do
desenvolvimento de uma nova consciência cidadã, crítica e participativa.

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51. O nosso governo vai estimular o pleno envolvimento da sociedade na
definição das políticas setoriais, tanto do ponto de vista da inserção industrial
do País quanto do emprego maciço da Tecnologia da Informação nos serviços
públicos, na atividade produtiva e na educação. A Lei de Informática em vigor
fornece o quadro legal a partir do qual deverão ser aprofundados os esforços
no sentido do investimento em Pesquisa & Desenvolvimento, mobilizando a
comunidade científica, os institutos de tecnologia e as empresas privadas para
a produção de software e o desenvolvimento da microeletrônica naqueles
nichos que apresentarem oportunidades tanto para a substituição de
importações como para as exportações.
52. No âmbito de uma administração pública eficaz, o novo governo dará
especial atenção aos serviços ao cidadão, com atendimento de qualidade,
transparente e informativo. Caberá, portanto, ao governo garantir a plena
acessibilidade do cidadão, por meios digitais, à rede de serviços públicos,
ampliando e tomando novas iniciativas no sentido de construir o governo
eletrônico.
53. A Tecnologia da Informação permite, na agricultura, o controle da
distribuição fundiária por região, o cadastro de terras, a identificação de terras
agriculturáveis, a gestão dos projetos de assentamento e assistência técnico-
financeira.
54. Na educação, o uso da Tecnologia da Informação abrange os
procedimentos administrativos e pedagógicos, ambos intrinsecamente
dependentes de um esforço de capacitação dos agentes de ensino
(professores, coordenadores e apoiadores) no uso desse recurso tecnológico.
55. Na questão habitacional, a Tecnologia da Informação será utilizada
para a correta identificação das necessidades de moradia globais e localizadas,
gerais e específicas da população, bem como para a gestão eficaz e
transparente dos programas.
56. Na saúde, as aplicações de Tecnologia da Informação como suporte às
ações governamentais têm caráter de integração, racionalização e fomento às
ações necessariamente descentralizadas do poder público em todo o país,
através do Sistema Único de Saúde (SUS).
57. Na segurança pública, a Tecnologia da Informação será instrumento de
grande utilidade tanto em soluções de infra-estrutura (equipamentos e pessoal)
como na montagem de uma rede com bases de dados voltados para o combate
ao narcotráfico e ao contrabando de armas, cadastro centralizado de
criminosos entre outros fins.

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O novo governo tratará, portanto, a gestão de informações a partir
de três eixos principais:
§ Gestão e Governabilidade. Promover a integração horizontal e vertical
das estruturas de governo e a coordenação e acompanhamento de suas ações;
§ Governo Eletrônico. Estimular a mais ampla prestação de serviços e
informações de qualidade para os cidadãos;
§ Democratização do acesso às Tecnologias de Informação.
Incentivar a criação de mecanismos e políticas que permitam o aprendizado, o
acesso e a incorporação maciça das tecnologias de informação e que
possibilitem o compartilhamento de soluções entre diferentes níveis de
governo.

Política de Infra-Estrutura de
Comunicação Telecomunicações
58. Em 29 de julho de 1998 ocorreu a privatização do sistema Telebrás. O
modelo adotado pelo atual governo nas telecomunicações mudou
profundamente o panorama das comunicações no País, pulverizando na
sociedade o número de telefones, tanto fixos quanto móveis, e multiplicou as
redes de comunicação, mas vai enfrentar desafios importantes em duas
direções. De um lado, a universalização dos serviços, de outro, as acomodações
que deverão advir da crise internacional do setor, resultante do estouro da
bolha financeira das empresas de tecnologia. Uma das características em todo
o mundo, mesmo diante da pretensão de se implantar um modelo competitivo,
é que no mercado local a competição dificilmente se efetiva, pois as operadoras
dominantes inibem a entrada de concorrentes. No Brasil, menos de 10% dos
municípios têm mais de uma opção de prestadora de telefonia fixa. Mesmo
assim, as operadoras dominantes possuem mais de 95% do mercado.
59. A universalização pretendida pelo atual governo ignorou os efeitos da
perversa distribuição de renda nacional. Na telefonia fixa, cresceu a densidade
telefônica que era de 13,6 em 1998 para 27 telefones por 100 habitantes no
final de 2001. Entretanto, cerca de 10 milhões de telefones estão nas
prateleiras das operadoras, por falta de renda dos potenciais consumidores dos
serviços. Nas cidades mais pobres, a densidade telefônica prossegue muito
baixa.

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60. O modelo tarifário adotado dificulta a universalização. A assinatura
residencial acumula um reajuste de mais de 3.700% no período de 1995 a
2001, quando, no mesmo período, o índice do custo de vida ficou em 174%. É
uma das principais razões para o alto nível de inadimplência, que se soma à
estagnação dos níveis de renda. Dos mais de 5.000 municípios brasileiros,
menos da metade, 2.300, são cobertos pela telefonia celular.
61. Cabe, neste quadro, fomentar uma ampla discussão para revisão do
cálculo de reajuste tarifário do serviço telefônico fixo local, aliviando os serviços
mais utilizados pelos segmentos de menor renda.
62. Dentro dos marcos regulatórios e contratuais vigentes, caberá
acompanhar e co-participar dos processos de fusão e incorporação das
empresas, visando assegurar a manutenção dos espaços competitivos.

Expediente

Coligação Lula Presidente


Luiz Inácio Lula da Silva – Candidato a Presidente
José Alencar – Candidato a Vice-Presidente

Partidos da Coligação
Partido dos Trabalhadores (PT) – José Dirceu de Oliveira e Silva (Presidente)
Partido Comunista do Brasil (PCdoB)- José Renato Rabelo (Presidente)
Partido Liberal (PL) – Valdemar Costa Neto (Presidente)
Partido da Mobilização Nacional (PMN) – Oscar Noronha Filho (Presidente)
Partido Comunista Brasileiro (PCB) – Zuleide Faria de Melo (Presidente)

Comissão de Programa de Governo

Coordenador
Antônio Palocci Filho
in memorian
Celso Daniel

Membros
Aloizio Mercadante, Gilney Viana, Jorge Bittar, Luiz Dulci, Luiz Marinho, Marcel Frison, Marcelino Pies, Marcelo
Déda, Márcio Meira, Marco Aurélio Garcia, Maria da Conceição Tavares, Maria Victória Benevides (Ouvidora),
Marina Silva, Marta Suplicy, Matilde Ribeiro, Miguel Rossetto, Nelson Pelegrino, Oded Grajew, Patrus Ananias,
Ronald Rocha, Tania Bacelar, Tarso Genro.
Convidados
Gilberto Carvalho, Ivete Garcia, Newton Lima Neto, Ricardo Carneiro,
Ana Maria M. da Fonseca
Coordenação Executiva
Antonio Prado e Clara Ant

Programa de Governo: Coligação Lula Presidente

Capa: Duda Mendonça

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Diagramação: Sérgio Gerber
Colaboração: Silene Santos e Cesar Ogata

Comitê Lula Presidente


Rua José de Magalhães, 340 – São Paulo – SP - CEP 04026-090
Tel. (11)5908-6888 – Fax (11) 5908-6888 ramal 142
e-mails: secretariapag@pt.org.br
ouvidoria@pt.org.br
pag2002@pt.org.br

Sítios Úteis
www.lula.org.br
www.pt.org.br
www.liderancadopt.org.br
www.icidadania.org.br
www.fabramo.org.br

2002

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